8
13 1. PSORÍASE É uma doença crônica inflamatória, caracterizada por lesões eritematoescamosas. Acomete em torno de 2% da população, igualmente entre os sexos, com pico de incidência entre 20-30 anos. [DICA]É mais comum nos países afastados da linha do Equador. O sol é fator protetor. Quanto menos sol, mais psoríase. (FIGURA 1) Figura 1. Psoríase. É imunomediada (resposta Th1, Th17 e Th22) e acredi- ta-se que ocorra por uma interação de predisposição genética (HLA B27, cW6 e DQ9) com fatores ambientais. A psoríase é desencadeada por: estresse emocio- nal, infecções (S. pyogenes, HIV), tabagismo, fatores físicos (trama, mudança climática) e medicamen- tos (*BALACO). Está também associada à Síndrome Metabólica. É importantíssimo saber esses fatores desencadeantes. Betabloqueadores Antimaláricos Lítio AINES Captopril (IECA) Outros 9 Psoríase e líquen plano

Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

13

Psoríase e líquen plano Cap. 9

1. PSORÍASE

É uma doença crônica inflamatória, caracterizada por lesões eritematoescamosas. Acomete em torno de 2% da população, igualmente entre os sexos, com pico de incidência entre 20-30 anos.

[DICA]É mais comum nos países afastados da linha do Equador. O sol é fator protetor. Quanto menos sol, mais psoríase. (FIGURA 1)

Figura 1. Psoríase.

É imunomediada (resposta Th1, Th17 e Th22) e acredi-ta-se que ocorra por uma interação de predisposição genética (HLA B27, cW6 e DQ9) com fatores ambientais.

A psoríase é desencadeada por: estresse emocio-nal, infecções (S. pyogenes, HIV), tabagismo, fatores físicos (trama, mudança climática) e medicamen-tos (*BALACO). Está também associada à Síndrome Metabólica. É importantíssimo saber esses fatores desencadeantes.

BetabloqueadoresAntimaláricosLítioAINESCaptopril (IECA)Outros

9Psoríase e líquen plano

Page 2: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

14

Psoríase e líquen plano Capítulo 9

1.1. CLÍNICA

Placas eritematoescamosas (escamas prateadas) quase sempre assintomáticas.

O Sinal de Auspitz (orvalho sangrante) consiste no surgimento de gotículas de sangue na base da lesão após a curetagem metódica de Brocq (retirada das escamas – chamado de sinal da vela). (FIGURA 2)

Figura 2. Sinal de Auspitz.

O Fenômeno de Koebner é o surgimento de uma lesão típica da doença em área de trauma cutâneo (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA 3) O Fenômeno de Koebner reverso é o desaparecimento da lesão de psoríase após trauma local (no local da biopsia).

Figura 3. Fenômeno de Koebner e Koebner Reverso.

As articulações são acometidas em 30% dos casos, em forma de artrite soronegativa, podendo preceder as manifestações de pele. Pode ser mono/oligoar-ticular assimétrica (forma mais comum), simétrica (pequenas e médias articulações), axial (coluna vertebral e sacrilíaca, HLA B27) e mutilante (forma rara e grave, com deformidades permanentes – “dedo em telescópio”). (FIGURA 4). Importante diagnós-tico diferencial com artrite reumatoide, espondilite anquilosante, gota etc.

Figura 4. Falta título.

DICA 80% dos pacientes com artrite apresentam manifestações ungueais.

Page 3: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

15

Psoríase e líquen plano Cap. 9

Existem diversas variantes clínicas:

X Vulgar ou “em placas”: é a mais comum (90%). Locais mais prevalentes: couro cabeludo (não respeita as margens de implantação capilar e possui as margens bem delimitadas – sebor-ríase – diagnóstico diferencial com dermatite seborreica) e áreas extensoras, como cotovelos e joelhos. (FIGURA 5)

Figura 5. Falta título.

X Invertida: pouca ou nenhuma descamação (mas-carada pela sudorese), nas regiões intertriginosas (axilas, genitália). (FIGURA 6). Diagnóstico diferen-cial com micoses.

Figura 6. Falta título.

X Pustulosa generalizada (Von Zumbusch): hipe-raguda, disseminada, com sintomas sistêmicos (febre, mal-estar, fraqueza, leucocitose, aumento do VHS...). (FIGURA 7)

Figura 7. Falta título.

DICA Geralmente ocorre após suspensão abrupta de corticoide.

X Ungueal: acometida em 50% dos casos, podendo preceder as lesões em anos. A lesão pode ocorrer na matriz ungueal (levando à formação de pitting/depressão cupuliforme) ou no leito (levando à formação das manchas de óleo/manchas salmão e hemorragias em estilhaço). (FIGURA 8)

Figura 8. Falta título.

DICA Correlaciona-se diretamente com a gravi-dade das lesões cutâneas e articulares.

Page 4: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

16

Psoríase e líquen plano Capítulo 9

X Eritrodérmica: o eritema difuso prevalece sobre a descamação. É grave e apresenta risco de dis-túrbios hidroeletrolíticos e choque. Internação e medidas de suporte. Também pode ser causada por suspensão abrupta de corticoide. (FIGURA 9).

Figura 9. Falta título.

X Palmoplantar: Hiperqueratose intensa, bem demarcada e simétrica. Diagnóstico diferencial com micose, porém é transgressiva (acomete a lateral dos pés).

X Gutata: início abrupto de lesões pequenas arre-dondadas no tórax e extremidades proximais. Costuma desaparecer espontaneamente após 2-3 meses. (FIGURA 10)

Figura 10. Falta título.

DICA Geralmente acomete crianças após infecção estreptocócica do trato respiratório superior.

1.2. PATOLOGIA

Figura 11. Falta título.

DICA O ciclo celular dos queratinócitos está encur-tado, levando à hiperproliferação da epiderme (espessamento e descamação) com paraqueratose (aumento da camada córnea com persistência dos núcleos, pois não dá tempo de perdê-los).

Observam-se neutrófilos dentro da camada cór-nea (microabscesso de Munro), formando coleções (Pústula de Kogoj), ausência de camada granulosa, acantose regular (espessamento da camada espi-nhosa), papilomatose quadrangular (projeção das papilas dérmicas sobre a epiderme) com afinamento suprapapilar e vasos dilatados.

Existem índices de gravidade para seguimento clí-nico e avaliação da eficácia do tratamento: o PASI é o mais utilizado (leva em consideração eritema, descamação e infiltração e multiplica pela superfície corpórea = varia de 0 a 72), DLQI (qualidade de vida) e NAPSI para as unhas.

1.3. TRATAMENTO

O objetivo é o controle da doença.

DICA O tratamento tópico é usado nas formas localizadas.

Sempre incluir hidratantes, mesmo quando em remis-são. Os mais utilizados são: corticoides, Calcipo-triol (análogo de vitamina D) e Imunomoduladores

Page 5: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

17

Psoríase e líquen plano Cap. 9

(Tacrolimus e Pimecrolimus – podem ser usados na face e dobras).

A Fototerapia é indicada para doença mais extensa. Deve ser feita numa frequência média de 3x/ semana. Existem 2 tipos: PUVA (psoraleno via oral para sensi-bilizar + UVA 1h após) / Método Goeckerman (coaltar pomada para sensibilizar + UVB narrow band ou banda larga). Aumento do risco de catarata, fotoen-velhecimento e câncer de pele.

DICA O tratamento sistêmico é indicado para os casos graves e extensos.

X Acitretina: derivada da vitamina A, indicada prin-cipalmente na psoríase palmoplantar. Aguardar 2 anos para engravidar após o término do uso, pois é teratogênico (homens não precisam, pois não altera a espermogênese).

X Metotrexato: inibidor da síntese de DNA e antago-nista do ácido fólico. Geralmente são feitas doses esparsas por intolerância gástrica e deve ser feito controle da função hepática. Demora para começar a fazer efeito (4 semanas). Aguardar 3 meses para engravidar, pois é teratogênico. Bons resultados na artrite psoriásica.

DICA   A toxicidade do Metotrexate é identificada precocemente por úlceras orais (indicam leucope-nia) → usar o antídoto ácido folínico.

X Ciclosporina: imunossupressor (bloqueia IL-2) com ação de melhora rápida, usado apenas para res-gate da crise, nas formas eritrodérmica e pustulosa generalizada. Efeitos colaterais: nefrotoxicidade e hipertensão. Pode ser usado em gestantes.

DICA Corticoide sistêmico pode levar ao rebote grave da psoríase, sendo evitado.

X Biológicos: Existem diversos tipos: W Ação anti-TNF α (Adalimumab, Etanercept e Infliximab): são os mais imunossupressores, e o risco de reativação da tuberculose é maior nesse grupo. Podem causar descompensação de ICC grau III e IV. O Etanercept é o único liberado para crianças.

W Ação anti-IL 12 e 23 (Ustequinumab), anti-IL 23 (Guselcumabe), anti-IL 17 (Secuquinumabe e Ixequizumabe).

DICA Os disponíveis no SUS são Adalimumabe, Ustequinumabe e Secuquinumabe.

Antes de iniciar o uso de biológicos:

1. Solicitar: PPD + RX tórax, laboratoriais gerais, teste de gravidez e sorologias (hepatite B e C e HIV). Se houver infecção latente de tuberculose, iniciar Isoniazida e após 30 dias já pode iniciar o biológico.

2. Pesquisar neoplasias. Se houver tumor sólido tratado há mais de 5 anos, está liberado.

3. Checar cartão vacinal 30 dias antes. Após o iní-cio, não pode vacinar para agentes vivos (febre amarela, tríplice viral e varicela).

Efeitos colaterais dos biológicos: 1° infecção de vias aéreas superiores, 2° cefaleia, 3° reação no local da injeção.

2. LÍQUEN PLANO

É uma doença crônica inflamatória, caracterizada por lesões papulosas. Acomete menos de 1% da população, predominando em adultos de 30-60 anos, sem diferença entre sexos e etnias.

A etiologia é desconhecida, porém acredita-se que seja uma doença autoimune associada a fatores genéticos (HLA DR1) e ambientais, em que os quera-tinócitos passam a ser antigênicos, havendo grande

Page 6: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

18

Psoríase e líquen plano Capítulo 9

infiltrado de linfócitos T e destruição da camada basal.

Os fatores desencadeadores são: infecções (hepatite C principalmente), alérgenos de contato (metais) e medicamentos (IECA, diuréticos tiazídicos, anti-maláricos). É importantíssimo saber esses fatores desencadeantes.

DICA A clínica é caracterizada pelos “7 Ps”: Pápula ou Placa Poligonal Plana Purpúrica Pruriginosa Pequena (0,5 a 1cm) nos Punhos. (FIGURA 12)

Figura 12. Falta título.

Geralmente as lesões são cobertas por uma rede reti-culada fina e branca, chamada de Estrias de Wickham (observadas com mais facilidade à dermatoscopia) – (FIGURA 13). As lesões tendem a ser múltiplas e simétricas, classicamente nas áreas flexoras dos punhos e antebraços e no terço inferior das pernas. Regridem, deixando hiperpigmentação residual.

Figura 13. Falta título.

O Fenômeno de Koebner está presente, assim como na psoríase, e consiste no aparecimento das lesões típicas em local de trauma ou cicatriz. (FIGURA 14)

Figura 14. Falta título.

DICA Existe também a resposta isotópica de Wolf, que consiste no surgimento de lesão de líquen no local onde outra doença cutânea ocorreu e já foi curada (ex.: sobre cicatriz de herpes zóster prévio).

Page 7: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

19

Psoríase e líquen plano Cap. 9

Quando acomete o couro cabeludo, é chamado de líquen plano pilar, que causa alopecia cicatricial, ou seja, não nasce mais cabelo. Existe uma variante chamada Alopecia frontal fibrosante (AFF), em que há retração progressiva da linha frontotemporal de implantação do cabelo, podendo acometer também as sobrancelhas. (FIGURA 15)

Figura 15. Falta título.

DICA Pode acometer as unhas em 15%, com o achado clássico de pterígio PROXIMAL (FIGURA 16), além de outros inespecíficos.

Figura 16. Falta título.

DICA Pode acometer as mucosas em 60%, inclu-sive de forma isolada. A mucosa oral é a mais acometida (FIGURA 17), sendo a forma reticulada a mais comum e a forma erosiva associada ao maior risco de desenvolver Carcinoma Espinocelular. A mucosa genital também é acometida, sendo a forma anular a mais comum.

Figura 17. Falta título.

Existem diversas variantes clínicas. Algumas mais comuns são:

X Hipertrófica: predomina nos tornozelos, espes-sas, elevadas e acastanhadas, podendo adquirir formato verrucoso. Pode evoluir para Carcinoma Espinocelular. (FIGURA 18)

Figura 18. Falta título.

Page 8: Psoríase e líquen plano Cap. 9 Psoríase e líquen plano 9 · (cicatriz, queimadura, depilação, incisões, escoria-ções, tatuagens) em pacientes portadores da doença. (FIGURA

20

Psoríase e líquen plano Capítulo 9

DICA É a variante mais pruriginosa.

X Bolhosa: surgimento de bolhas localizadas ape-nas sobre as pápulas do líquen plano (FIGURA 19) (diagnóstico diferencial com líquen plano penfi-goide, que acomete a região do líquen e a pele sã). Resulta de uma inflamação intensa e dano epidérmico importante, levando à separação der-moepidémica e formação de bolha.

Figura 19. Falta título.

X Actínica: exclusiva nas áreas fotoexpostas (in-cluindo face). O prurido é ausente. Incide mais em crianças. Pode ocorrer melhora espontânea nos meses de inverno.

X Anular: formato de anel, com bordas elevadas e porção central hiperpigmentada ou cor da pele. Mais frequente na axila, pênis e escroto.

O diagnóstico é baseado na clínica e exame anato-mopatológico. Este caracteriza-se por ortoqueratose (camada córnea espessa e compacta, sem os núcleos), hipergranulose em forma de cunha, acantose em “dentes de serra”, degeneração da camada basal + infiltrado linfocitário “em faixa” na derme superficial (que “borra” a junção dermoepidérmica) (FIGURA 20). Na epiderme inferior, existem queratinócitos necrosados chamados de Corpúsculos de Civatte ou corpos coloides hialinos. (FIGURA 21)

Figura 20. Falta título.

Figura 21. Falta título.

À imunofluorescência observa-se depósito de IgM na camada subepidérmica em 93% e reatividade para fibrinogênio-fibrina na junção dermoepidérmica em 100%.

O tratamento varia conforme a extensão das lesões. Nas formas localizadas, usa-se o corticoide tópico. Nas formas generalizadas, pode-se utilizar fototera-pia ou corticoide sistêmico (dose mínima 20 mg/dia) como 1° opção. Imunossupressores são usados como alternativa nos casos graves. As recidivas ocorrem em 20% dos casos.