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Anais do I Seminário Brasileiro de Valorização da Profissão de Relações Públicas – SEMBRARP 2007 ISBN: 978-85-60936-02-1 Relações Públicas investigando o desenvolvimento de cidadania na relação entre cultura e comunicação no Programa Rede Cidadania Beatriz Alves Marra Regina Escudero César (orientadora) RESUMO Tendo como objeto de estudo o Programa Rede Cidadania da Secretaria de Cultura da Prefeitura de Londrina (PR), este trabalho tem como objetivo discutir a relação existente entre cultura e comunicação na construção de cidadania, investigando as concepções dos conceitos- chave do trabalho e analisando novas alternativas para a atuação do profissional de relações públicas. Projeto de pesquisa, diante de uma contextualização teórica que evidencia o debate acerca da cultura no mundo atual, assim como a relevância do papel da comunicação participativa, investiga a cidadania cultural, linha guia deste trabalho, uma vez que representa o direito à cultura que todo cidadão deve ter. Palavras-chave: Comunicação, cultura e cidadania. INTRODUÇÃO Diante do crescimento da informação global e do intercâmbio simbólico, raízes da globalização, busca-se compreender a relevância da cultura, cidadania e comunicação neste cenário, a fim de desvendar seus conceitos e descobrir papéis e atuações que tragam benefícios ao homem frente às contradições que o momento impõe. Parte-se, então, do debate acerca da cultura, sua concepção antropológica, a multiplicidade e riqueza que lhe é intrínseca para que seu papel na construção da cidadania seja compreendido. Sob tal perspectiva, os conceitos de cidadania são descritos e um enfoque na contextualização de “novas cidadanias” se dá, chegando-se, então, à cidadania cultural, que atua como linha guia deste trabalho, uma vez que representa o direito à cultura que todo cidadão deve ter. O debate sobre a comunicação se faz na perspectiva transformadora que lhe cabe, uma vez que, compreendida como o local onde se dá o reconhecimento social, a discussão acerca 1

Relações Públicas investigando o desenvolvimento de ... fileFaz-se, então, a conceituação acerca das Relações Públicas incitando um raciocínio alternativo sobre seu papel

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Anais do I Seminário Brasileiro de Valorização da Profissão de Relações Públicas – SEMBRARP 2007 ISBN: 978-85-60936-02-1

Relações Públicas investigando o desenvolvimento de cidadania na relação

entre cultura e comunicação no Programa Rede Cidadania

Beatriz Alves Marra

Regina Escudero César (orientadora)

RESUMO

Tendo como objeto de estudo o Programa Rede Cidadania da Secretaria de Cultura da Prefeitura de Londrina (PR), este trabalho tem como objetivo discutir a relação existente entre cultura e comunicação na construção de cidadania, investigando as concepções dos conceitos-chave do trabalho e analisando novas alternativas para a atuação do profissional de relações públicas. Projeto de pesquisa, diante de uma contextualização teórica que evidencia o debate acerca da cultura no mundo atual, assim como a relevância do papel da comunicação participativa, investiga a cidadania cultural, linha guia deste trabalho, uma vez que representa o direito à cultura que todo cidadão deve ter.

Palavras-chave: Comunicação, cultura e cidadania.

INTRODUÇÃO

Diante do crescimento da informação global e do intercâmbio simbólico, raízes da

globalização, busca-se compreender a relevância da cultura, cidadania e comunicação neste

cenário, a fim de desvendar seus conceitos e descobrir papéis e atuações que tragam

benefícios ao homem frente às contradições que o momento impõe.

Parte-se, então, do debate acerca da cultura, sua concepção antropológica, a

multiplicidade e riqueza que lhe é intrínseca para que seu papel na construção da cidadania

seja compreendido.

Sob tal perspectiva, os conceitos de cidadania são descritos e um enfoque na

contextualização de “novas cidadanias” se dá, chegando-se, então, à cidadania cultural, que

atua como linha guia deste trabalho, uma vez que representa o direito à cultura que todo

cidadão deve ter.

O debate sobre a comunicação se faz na perspectiva transformadora que lhe cabe, uma

vez que, compreendida como o local onde se dá o reconhecimento social, a discussão acerca

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das diferenças que se entrelaçam em nossa sociedade, a comunicação desempenha o papel de

interlocutor cultural, promovendo cidadania.

Faz-se, então, a conceituação acerca das Relações Públicas incitando um raciocínio

alternativo sobre seu papel enquanto atividade de comunicação, uma vez que o enfoque se dá

nas Relações Públicas como construtoras de cidadania e mediadoras de transformação social,

atuando como um “nó” na rede de relacionamentos da coletividade.

Posteriormente, a sistemática de organização do programa Rede Cidadania é descrita,

assim como o contexto no qual se deu sua criação, suas propostas e objetivos com a certeza de

que investigar seu papel na cultura do município é um passo decisivo para o fomento de

políticas culturais efetivas e em conseqüência para a construção de cidadania.

Dá-se, dessa forma, o primeiro passo na elaboração de uma visão dialógica sobre três

conceitos fundamentais na vida do homem, sua cultura, raízes, crenças, valores; sua

cidadania, o direito de ser homem e viver em sociedade; e, sua comunicação, algo que lhe é

intrínseco e natural, com o objetivo único de relacionar as potencialidades que todos esses

termos tão completos e complexos representam na continuidade da vida e na busca por

melhores condições humanas.

CULTURA

Desde seu surgimento e ao longo de sua evolução, o homem encontra diferentes

maneiras de se relacionar com o universo no qual está inserido, seu habitat, absorvendo de

suas experiências diferentes aprendizagens que evoluem e mantêm um ciclo de transformação

constante desse todo.

Vivendo em sociedade, troca em suas relações com semelhantes, diferentes percepções

acerca dos ensaios cotidianos, somando e produzindo conhecimentos, multiplicando-os,

divulgando sua cultura. Dessa forma, cultura é vida, uma vez que tende ao crescimento e

desenvolvimento contínuo.

Há duas concepções básicas de cultura, segundo afirma Santaella (2004), a humanista

e a antropológica. A primeira, mais seletiva, define apenas alguns aspectos e segmentos da

produção humana como culturais, utilizando o termo a fim de descrever a organização

simbólica de um grupo. Ou seja, cultura seria o conjunto de valores que dão subsídio para a

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representação e compreensão que determinado grupo tem de si mesmo e das relações que

mantém com seu universo.

A antropológica, mais abrangente por sua vez, afirma como cultura a somatória dos

costumes de determinada sociedade, a herança social em sua completude, referindo-se às

crenças, à língua, às idéias, aos gostos estéticos e ao conhecimento técnico que somados

colaboram na organização do ambiente humano. Dessa forma, cultura, além do âmbito

intelectual, é também as representações materiais que o homem cria para moldar seu universo

de maneira mais apropriada.

Marilena Chauí (2006) faz considerações sobre a origem e os significados da cultura

afirmando que a definição original da palavra, que significa “cultivo, cuidado”, vai se

perdendo ao longo da história e só no século XVIII ressurge relacionada ao conceito de

civilização e em conseqüência ao estudo do homem e do tempo, afirmando que:

[...] Durante o século XVIII, a cultura é o padrão ou o critério que mede o grau de civilização de uma sociedade. Assim, a cultura passa a ser encarada como um conjunto de práticas (artes, ciências, técnicas, filosofia, ofícios) que permite avaliar e hierarquizar as sociedades, segundo um critério de evolução. No conceito de cultura introduz-se a idéia de tempo, mas de um tempo muito preciso, isto é, contínuo, linear e evolutivo, de tal modo que, pouco a pouco, cultura torna-se sinônimo de progresso. (Chauí, 2006, p. 129-130)

Assim como Santaella, Chauí (2006) comenta a visão antropológica da cultura, ou

seja, há diferentes culturas que são singulares, uma vez que são formadas por uma série de

fatores diversos entre si, tendo, portanto, cada uma, sua estrutura específica.

A partir desse momento, o termo cultura ganha abrangência e passa a significar o

campo das formas simbólicas, ou seja, sob a concepção antropológica, a cultura passa a ser

compreendida como criação coletiva das linguagens e ideologias que cercam determinada

sociedade, tais como, costumes religiosos, culinários, de vestimentas, lazer, dança, pinturas e

também regras e valores morais de conduta, relações de poder, entre outros.

Sob tal perspectiva, que revela uma visão micro cósmica da cultura, onde cada

elemento tem sua relevância na formação do conceito, o termo ganha um caráter dinâmico,

mais aberto à complexidade cultural de nossos dias.

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Em outras palavras, há, de um lado, uma “cultura” que define, em relação à natureza, as qualidades propriamente humanas do ser biológico chamado homem, e, de outro lado, culturas particulares segundo as épocas e as sociedades [...] uma cultura constitui (dessa forma) um corpo complexo de normas, símbolos, mitos e imagens que penetram o indivíduo em sua intimidade, estruturam os instintos, orientam as emoções. (Edgar Morin, 1981, p. 14-15).

Compreendida então como a rede de ideologias que educam e constituem o homem,

afirmamos que todos temos cultura já que todos temos o domínio do cultural, e interessa,

dessa forma, compreender qual seu papel na formação do ser humano, qual o papel da cultura

na concepção do cidadão?

A Cultura e seu papel na formação do cidadão

Vivemos um momento caracterizado pelo contato com muitas culturas diversas,

proporcionado, principalmente pelos avanços tecnológicos que instauram novas maneiras de

nos relacionarmos com a imensidão de diferentes identidades; identidades essas que, por sua

vez, trazem temporalidades menos largas ou até mesmo ausentes.

Nesta nova configuração cultural, Barbero (2003) defende que a percepção do homem

acerca do universo se modifica e a diversidade cultural que até pouco tempo foi pensada como

disparidade radical entre culturas, diante do processo de globalização emergente, estabelece

um movimento de potencialização da diferença e de exposição constante de cada cultura às

outras.

Diante desse cenário, defende a construção de um novo paradigma cultural que,

beneficiado pela miscigenação do plano coletivo das culturas com o plano dos indivíduos

fomenta o reconhecimento e respeito crescente dos direitos e diversidade dos indivíduos que

absorvem essas culturas.

Este reconhecimento do alheio se dá, ainda sob a ótica deste autor, no local, no

território onde a formação cultural se inicia, ganhando dessa forma, a essencialidade na vida

humana, ou seja, uma vez que, envoltos pelas redes que o novo paradigma cultural estabelece

- redes globais - onde há a miscigenação de diferenças, o local é onde se dá o início dessas

trocas, onde se inicia a história das relações sociais realizadas pelo homem ao longo de sua

vida, tornando-se essencial à sua formação, pois é nele que se dão os primeiros contatos com

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o desenrolar da vida cotidiana, os primeiros contatos com as culturas que nos corporificam.

E afirma que:

[...] isso implica um permanente exercício de reconhecimento daquilo que constitui a diferença dos outros como enriquecimento potencial da nossa cultura, e uma exigência de respeito àquilo que, no outro, em sua diferença, há de intransferível, não transigível e inclusive incomunicável. (Barbero, 2003, 60-61).

Diante da crescente relevância que o local ganha enquanto fomentador de diversidade

e pluralidade cultural, uma vez que possibilita a convivência de diversas formas culturais, a

utilização de muitas linguagens expressivas, busca a participação das minorias, promovendo o

envolvimento de todos os setores da sociedade.

Dá-se, então, uma reconfiguração também no sentido de cidadania, Barbero (2003)

citando Ianni, afirma que diante do crescimento exarcebado das cidades, elas adquirem

características de muitos outros lugares, somando-se diversos valores culturais em um mesmo

lugar, como uma “síntese do mundo”.

Os diversos guetos que fazem parte, então, destes mesmo locais, sobrevivem e

perpetuam-se diante da tendência à uniformalização da cultura mundial, por meio das

representações e participações sociais e políticas nas comunidades que se localizam.

Francisco Weffort, na apresentação do livro Cultura e Desenvolvimento (2000),

comenta uma fala do ex-presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e

intelectual, que ressalta a necessidade de se reconhecer as culturas locais, já que a cultura tem

um caráter essencial ao desenvolvimento do homem, uma vez que, é expressão de um povo,

dessa forma, afirma que só há desenvolvimento, se além do crescimento econômico existir a

conscientização acerca do processo de evolução, ou seja, a compreensão do povo sobre suas

próprias potencialidades enquanto nação e suas peculiaridades culturais, e afirma:

[...] Não se trata apenas, quando se fala de cultura, de mencionar aspectos de uma cultura erudita ou de uma cultura de elite. Eu me lembro, por exemplo, de algumas reflexões do presidente José Sarney, em outras oportunidades, quando ele afirmava que provavelmente – pensando sobretudo no caso do Brasil – uma das fontes de resistência cultural mais sólida está exatamente no campo da cultura popular, no campo da cultura do povo, muito mais que no campo da cultura de elite ou da cultura erudita. (Weffort, 2000, p.13)

Essas idéias colocam em evidência os conceitos da diferença e singularidade numa

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identificação possível de construir uma comunidade de sentido único, pautada em ideologias

universais que não eliminam as particularidades culturais.

No entanto, vale ressaltar o raciocínio de Elizabeth Jelín, em artigo intitulado

Processos Culturales em la Construcción de la Ciudadanía (2000), onde apresenta as

disparidades acerca da América Latina em relação às outras partes do mundo, e afirma que as

sociedades latino-americanas, em sua grande maioria, apesar de governadas sob a forma

democrática configuram-se em democracias recentes e frágeis que por estarem passando pelo

processo de reestruturação econômica, se vêem sujeitas a políticas de ajuste da economia

globalizada.

Dessa forma, as desigualdades históricas dos países da América Latina, que diante da

continuidade de cenários extremamente contrários entre si, se revelam como um desafio

social. Considerando o caráter formador da cultura, o acesso à mesma, compreendida como

conhecimento, é um ato que exige inserção coletiva e política de todos os homens, exige que

haja cidadania.

Acrescentando que:

[...] Son también sociedades donde la exclusión y la polarización social del mundo, la América Latina es en donde la distribución del ingreso es más desigual, y en donde la polarización social es mayor. En América Latina se verifica, con claridad que: crecimiento económico, justicia distributiva y democracia no se mueven necesariamente por el mismo camino. (Jelín, 2000, p.89).

Como comenta Jélin, os países da América Latina tem condições sociais bastante

peculiares, onde há o predomínio de desigualdades, a problemática neste contexto se dá uma

vez que, considerando especificamente o caso do Brasil, onde valores nacionais corruptos tais

como clientelismo, malandragem, honra pessoal, etc. se fazem presentes, como estruturar

melhores condições e relações mais harmoniosas entre os homens, relações tragam sentido

concreto no cotidiano a que dão vida?

O caminho que estudiosos indicam é amparado pela comunicação e cultura no

fomento de cidadania, com o objetivo da revalorização do ser humano e da ocupação efetiva

do homem na sociedade enquanto cidadão. Tal como afirma Martinell (2003, p.98):

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A cultura não é a solução para a violência. A cultura não é a solução para a pobreza. Mas sua contribuição para esses problemas é importante e temos que criar os instrumentos para medir a real repercussão dos efeitos das ações culturais. É preciso poder evidenciar a contribuição da cultura na solução de problemas sociais. [...] É preciso desenvolver em cada população a auto-estima, a valorização daquilo de que dispõem em termos de cultura.

Desse contexto, decorre a necessidade de ações que transformem os direitos de pensar,

dizer e fazer, reconhecendo a diferença como o sentido de se justificar e defender-se,

reconhecendo a imanência do outro, já que nesse mesmo direito está o próprio, pautados por

uma ética que prime pelo reconhecimento de homens para com outros homens em plena

cidadania.

CIDADANIA

O estudo do conceito cidadania é complexo. Complexo, ressalta-se, pela completude

do termo, sua mutabilidade e peculiaridades.

Bastante utilizado, o termo cidadania remete-nos aos direitos e deveres dos homens

numa sociedade civil, em que atuam veementemente para seu desenvolvimento, participando

dos processos decisórios, consciente, em tempo integral, da sua importância nesse cenário. E

para que a dinâmica da cidadania se efetive, há, no processo, constante intercâmbio de

informações, conhecimentos, onde os componentes dessa organização se relacionam de

maneira plena, ou seja, as trocas são horizontais, os diversos papéis dessa história têm

equidade de importância e respeito.

Paulo Freire em sua obra “Educação como prática da Liberdade” (2000, p.49),

descreve de forma intensa a relação do homem com o mundo, definindo, a meu ver, o ser

cidadão:

[...] O homem existe – existere – no tempo. Está dentro. Está fora. Herda. Incorpora. Modifica. Porque não está preso a um tempo reduzido a um hoje permanente que o esmaga, emerge dele. Banha-se nele. Temporaliza-se. Na medida, porém, em que faz esta emersão do tempo, libertando-se de sua unidimensionalidade, discernindo-a, suas relações com o mundo se impregnam de um sentido conseqüente. Na verdade já é quase um lugar-comum afirmar-se que a posição normal do homem no mundo, visto como não está apenas nele mas com ele, não se esgota em mera passividade. Não se reduzindo tão-somente a uma das dimensões de que participa – a natural e a cultural – da primeira, pelo seu aspecto biológico, da segunda, pelo seu

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poder criador, o homem pode ser eminentemente interferidor. Sua ingerência, senão quando destorcida e acidentalmente, não lhe permite ser um simples espectador, a quem não fosse lícito interferir sobre a realidade para modificá-la. Herdando a experiência adquirida, criando e recriando, integrando-se às condições de seu contexto, respondendo a seus desafios, objetivando-se a si próprio, discernindo, transcendendo, lança-se o homem num domínio que lhe é exclusivo – o da História e o da Cultura.

O homem, ser social, e em conseqüência mutável, enquanto sujeito das ações que

transformam o universo que o rodeia, transforma também, como que por inércia, as relações

que dão suporte e forma a todo esse contexto. Assim como se deu a evolução da espécie, a

evolução da cultura, a evolução das formas de manifestações comunicativas, as evoluções

tecnológicas, entre tantas outras evoluções que presenciamos, se dá também a evolução e

transformação das relações sociais. A transformação da relação do homem com o mundo em

que vive. E dentro dele está a cidadania.

Como afirma Kunsch (2007), os estudos sobre cidadania mostram mutações na

compreensão desse conceito e afirma que apesar de ser um conceito antigo, o tema é

constantemente discutido na atualidade, contando ainda com o acréscimo constante de novas

‘teorias da cidadania’.

O termo cidadania se deu na Roma Antiga, indicando a situação política de uma

pessoa, seus direitos e deveres e só com a Revolução Francesa, em 1789, surge a moderna

concepção de cidadania que afirma a eliminação de privilégios, instaurando a idéia de

igualdade, graças às transformações ocorridas na sociedade. Dessa forma, falar em cidadania

implica recorrer a aspectos ligados à justiça, direitos, inclusão social, respeito mútuo,

coletividade e causa pública na esfera de um Estado-nação.

No entanto, o conceito cidadania, ao longo da história é apropriado e até mesmo

banalizado diante de diferentes contextos, surgindo então sentidos e intenções bastante

díspares.

Dagnino (1994) afirma que a cidadania ganha um caráter de estratégia política, uma

vez que, expressa aos interesses, vontades e ambições de uma parte significativa da sociedade,

porém, que certamente não a representa em sua totalidade, e nos coloca duas principais

dimensões acerca das concepções de cidadania.

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A primeira seria aquela que tem seu significado originado às experiências de

movimentos sociais, tanto os de tipo urbano (relacionado ao termo cidade), como os

movimentos sociais de parcelas marginalizadas (mulheres, negros, homossexuais, ecológicos

etc.) e, neste sentido, a significação de cidadania se dá por meio da luta de ter direitos à

igualdade e à diferença.

Em segundo lugar, a concepção seria resultado da contribuição das experiências

sociais históricas na construção da democracia, sua extensão e aprofundamento, ou seja, a

noção de cidadania expressa o regulamento teórico e político que a democracia assume no

mundo.

Semelhante à primeira definição de Dagnino, Murade (2007, p.152), ao tratar da

concepção de cidadania, ressalta que a classe hegemônica, ao valer-se da sua ação discursiva

ideológica dominante, estabelece a mesma como verdade absoluta, valendo-se até mesmo dos

discursos históricos e literários para o estabelecimento de uma visão destorcida da realidade,

sustentando estereótipos e preconceitos, e afirma que “[...] criado pela classe hegemônica para

controlar a circulação de informação e a deliberação na esfera pública, o exercício da

cidadania fica prejudicado, pois os sujeitos estabelecem acordos baseados em dados e

opiniões tornados disponíveis”.

Retomando ainda o raciocínio de Dagnino (1994, p.104), a autora nos coloca que

diante do universo atual, surge um novo elemento que se faz decisivo na concepção de

cidadania,

[..] o fato de que ela organiza uma estratégia de construção democrática, de transformação social, que afirma um nexo constitutivo entre as dimensões da cultura e da política. Incorporando características da sociedade contemporânea, como o papel das subjetividades, a emergência de sujeitos sociais de novo tipo e de direitos de novo tipo, a ampliação do espaço da política, essa é uma estratégia que reconhece e enfatiza o caráter intrínseco e constitutivo da transformação cultural para a construção democrática. Nesse sentido, a construção da cidadania aponta para a construção e difusão de uma cultura democrática.

Cidadania é, então, um conceito inerente a cada época, a cada contexto histórico, a

cada sociedade. Dessa forma, o tripé direitos civis-políticos-sociais formou-se de diferentes

maneiras mundo afora e no caso do Brasil, cuja cultura é carregada de sistemas de

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classificações sociais, que dão sustentabilidade a desigualdades gritantes, a emergência de

novos conceitos de cidadania é crucial para a efetivação de uma cultura democrática.

A Cidadania no Brasil

No Brasil, a noção de cidadania sempre foi falha. Intrínseco à história do país, o

descompasso político, marcado por calmarias armadas e saídas negociadas para todos os

momentos de crise, gerou uma descrença generalizada e o sentido falho e abstrato do ser

cidadão.

O paternalismo e patriotismo, características políticas que perduram ainda hoje,

impõem ao homem uma relação infundada com seu ser cidadão, onde as trocas não são

efetivas, a participação inexiste, mantendo-se a relação de subserviência e trocas de favores.

Descrédito generalizado – tanto em relação ao seu papel no mundo quanto em relação ao

papel da política em seu universo.

Meksenas (2002) faz uma análise interessante acerca do surgimento da cidadania no

Brasil e questiona a possibilidade da existência de sociabilidade numa sociedade fortemente

caracterizada por relações patrimoniais1, afirmando que devido a distancias físicas entre

metrópole e cidades e/ou comunidades, os problemas eram resolvidos pelos “governantes

locais”, famílias que detinham o poder de determinada região, sustentando a política

paternalista regionalista de nosso país. Afirma (Meksenas, 2002, p.57):

[...] Não basta perceber que os escravos e os pobres, de modo geral, não possuíam o status de cidadão. O mesmo pode ser observado em relação às elites brasileiras, a quem faltava o significado da cidadania no sentido mais elementar e liberal [...] O exercício dos “direitos” na vida municipal – a sociedade civil – se concentrava nas mãos das famílias proprietárias, que utilizavam a justiça municipal como um mecanismo do poder pessoal. [...] Assim, as populações pobres recorriam mais à população dos proprietários locais e menos à organização política das suas reivindicações.

Dessa forma, nota-se, a instauração lenta da significação dos direitos em nosso país,

uma vez que, ao longo da história, as relações hierárquicas tinham um caráter local bastante

1 Meksenas entende por relações patrimoniais aquela que Weber (apud Meksenas, 2002, p.55) coloca como “um subtipo da dominação tradicional.”

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evidente; característica essa peculiar ainda hoje, quando grande parte da população não

desfruta de seus direitos civis.

O passado colonial que sobreviveu no Império seria superado se a instauração da república ressignificasse a história na perspectiva do aprofundamento das relações liberais. Entretanto, as práticas sociais anteriores à República não foram capazes de criar as precondições dessa ressignificação. As revoltas, manifestações cívicas ou ações coletivas sempre foram duramente reprimidas e aparecem mais em nome do patriotismo de sentimento local do que na perspectiva da sociabilidade pautada por direitos. (Meksenas, 2002, p. 58)

O autor (Meksenas, 2002, p. 59) coloca ainda que, “no Brasil, ainda hoje, o poder

político patrimonial se afirma continuadamente e produz a cultura do privado que se apropria

do público”.

A grande importância que o poder local ganha, neste cenário, cria obstáculos na

consolidação e regulamentação da vida social de maneira universal, ou seja, no sentido de

nação, que abranjam todo o território nacional, uma vez que, sendo os poderes locais os

detentores do domínio político, a capacidade, a responsabilidade e até mesmo o papel do

Estado dilui-se. Dessa forma, afirma que nascem, no interior da nação, espaços

completamente governados por sistemas locais que pela atuação caracterizada por uma

ditadura paternalística, impõem um código legal próprio.

A inversão dos papéis políticos em nosso país sustenta a descrença no estado, como

afirma Oliveira (1999, p. 272), “as leis são vistas com desconfiança e, por serem percebidas

como instrumentos de controle do estado ou de manipulação do poder, não representam a

garantia de liberdade ou de acesso aos direitos de cidadania”.

Essa visão reducionista estabelece uma percepção tortuosa e desfigurada acerca da

política nacional. Os direitos do homem brasileiro não foram conferidos, mas conquistados,

porém o que permanece é a sensação de que foram concessões dos que hierarquicamente se

sobrepõem à sociedade civil.

E, em decorrência dos populismos e autoritarismos paternalistas, tão presentes em

nosso território, a compreensão errônea e abstrata do popular é comumente encontrada no

Brasil, dessa forma, ora é encarado como ignorância ou atraso e por vezes como saber

autêntico e fonte de emancipação.

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A compreensão errônea do conceito popular em nosso país traz, em conseqüência, a

apreensão da cidadania como algo paralelo às práticas populares, algo que não faz parte da

sociedade civil, mas que é permitido, oferecido, doado a ela. Tal como afirma Maksenas

(2002, p. 61),

A discussão dos direitos na sociedade brasileira deve considerar, portanto, o esforço das classes dominantes em descaracterizar as lutas pela cidadania quando protagonizadas pelas classes trabalhadoras. [...] Ou seja, há uma história oficial dos direitos e da cidadania no Brasil que oculta as práticas populares. É certo que o respeito às liberdades civis, a garantia da participação política para amplos setores da população e as condições sociais para uma vida digna também foram aspirações das classes trabalhadoras. Entretanto, tais aspirações aparecem encobertas, na luta política, pela versão dos vencedores: os setores mais conservadores da sociedade.

Há, podemos perceber, no cotidiano de todos os brasileiros, a descrença generalizada

acerca dos poderes públicos. Há, também, as saídas emergenciais para os problemas

enfrentados, a busca pelo status, muitas vezes representado por algo ou alguém de

determinado setor que sempre fará o possível para colaborar com seu problema, etc. As

relações corruptas, que desde o primeiro dia de nosso país estão tão presentes na vida de todos

e eliminam a força da cidadania real, dando lugar àquela forjada, que custamos a apreender.

A discussão se faz em torno da capacidade ou não de decidir e exigir direitos. Mas

como haveria tal exigência e tal empenho social dentro do cenário político corrompido no

qual crescemos? Pois bem, o passado que nos parece distante emerge por todos os lados

continuamente, como diz Prado Júnior (1999, p.11), “[...] quem percorre o Brasil de hoje fica

muitas vezes surpreendido com aspectos que se imagina existirem nos nossos dias unicamente

em livros de história; e [...] verá que traduzem fatos profundos e não são apenas

reminiscências anacrônicas.”

Este autor, que define a sociedade brasileira como um “aglomerado heterogêneo de

raças”, critica o caráter comercial de nossa formação, devido à escravidão que reuniu

abruptamente três raças distintas (brancos europeus, negros africanos e indígenas do

continente) sem fornecer preparo e educação mínima para a convivência numa sociedade tão

estranha, para um momento tão assustador de suas vidas. Ofereceu, sim, aliás, a imposição

violenta de costumes e comportamentos. Neste sentido, Prado Júnior (1999, p.341) garante

que:

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Numa população assim constituída originariamente e em que tal processo da formação se perpetuava e se mantinha ainda no momento que nos ocupa, o primeiro traço que é de esperar, e que de fato não falhará à expectativa, é a ausência de nexo moral. Raças e indivíduos mal se unem, não se fundem num todo coeso: justapõe-se antes uns aos outros; constituem-se unidades e grupos incoerentes que apenas coexistem e se tocam.

Essa cultura separatista presente em nossa sociedade, onde prevalecem os pré-

conceitos e o não respeito às diferenças culturais, mantêm a situação daqueles que vivem à

margem da sociedade, dificultando ou até mesmo impedindo o acesso e a possibilidade de

participação plena, de cidadania.

Candau, em artigo intitulado Multiculturalismo e Direitos Humanos (2007), afirma

que,

A nossa história esta marcada pela eliminação do “outro” ou por sua escravização, que também é uma forma de negação de sua alteridade. Esses outros que são “eus” na construção da identidade latino-americana. Neste sentido, o debate multicultural [...] nos coloca diante dessa questão, desses sujeitos, sujeitos históricos que foram massacrados, mas que souberam resistir e hoje continuam afirmando suas identidades fortemente nas nossas sociedades, mas numa situação de relações de poder assimétricas, de subordinação e exclusão ainda muito acentuadas.

Diante da visão de Candau, o homem, dentro do sistema social que abafa as

particularidades sociais individualizadas, precisa ser instigado à exigir, de forma crítica, a

validação dos discursos dos grupos e comunidades das quais participa, como que retomando

para si, o direito de ter sua cultura reconhecida, suas particularidades com valor dentro da

sistemática universal, transformando-se no ator de uma nova cidadania, a cidadania cultural.

Cidadania Cultural

Ao analisarmos novas definições do termo cidadania, deparamo-nos com um ponto a

ser debatido: a cultura na democracia.

Considerando-se a visão antropológica da cultura, que a define como prática social

que institui um campo de símbolos e signos, de valores e comportamentos, cada qual com

características peculiares, torna-se evidente o papel fundamental do Estado enquanto

disseminador e também parte integrante da cultura, neste sentido, ao mesmo tempo que irradia

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as culturas da sociedade afim de utiliza-las como doutrina, é, enquanto organização social,

uma vertente da cultura.

Dessa forma, Chauí (2006), apresenta qual seria a relação entre Estado e cultura, e

afirma que o sistema político vigente deve, “[...] concebê-la como um direito do cidadão e,

portanto, assegurar o direito de acesso às obras culturais produzidas, particularmente o direito

de fruí-las, o direito de criar as obras, isto é, produzi-las, e o direito de participar das decisões

sobre políticas culturais”.

Não se trata, portanto, de delimitar o conceito de cultura às belas-artes, porém,

expandi-lo, efetivando o direito à participação na cultura pelos cidadãos.

Jelín (2000) acredita que não há reconhecimento do papel cidadão do homem se este

não tiver direito à cultura, afirmando que:

[…] Hablar de derechos culturales es hablar de grupos y de comunidades colectivas y del derecho de sociedades y de culturas autodefinidas como tales, a vivir en su propio estilo de vida; a hablar su propio idioma; a usar su ropa y a perseguir sus objetivos y derechos de ser tratadas justamente por las leyes del Estado-Nación en que les toca vivir casi siempre como minoría.

Incorporando características da sociedade moderna, mosaico cultural, emerge a

necessidade de uma perspectiva que privilegie o processo de construção de uma cidadania

ativa, aberta à participação das diferenças. Dessa forma, faz-se necessário que surja neste

cenário, uma cidadania que delineie culturas mais democráticas, ou seja, que se efetive uma

sociedade em que a relação, entre homens e culturas, seja horizontal, participativa e plural,

que a cultura seja direito de todos.

Chauí (2006, p. 138), ao definir cidadania cultural, afirma que:

Trata-se pois, de uma política cultural definida pela idéia de cidadania cultural, em que a cultura não se reduz ao supérfluo, ao entretenimento, aos padrões do mercado, à oficialidade doutrinária (que é ideologia), mas se realiza como direito de todos os cidadãos, direito a partir do qual a divisão social das classes ou a luta de classes possa manifestar-se e ser trabalhada porque, no exercício do direito à cultura, os cidadãos, como sujeitos sociais e políticos, se diferenciam, entram em conflito, comunicam e trocam suas experiências, recusam formas de cultura, criam outras e movem todo o processo cultural.

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Assim, cidadania cultural é o reconhecimento dos bens simbólicos, do direito a ter

uma identidade coletiva, de pertencer a uma comunidade e acima de tudo, do direito a

comunicar e respeitar diferenças culturais.

COMUNICAÇÃO, CULTURA E CIDADANIA

O cenário de transformações paradigmáticas que se estabelece, propõe, por meio quase

que exclusivo da comunicação, maneiras de relacionamentos culturais diversos, ao ponto que,

e também pelo seu caráter informacional, a cultura passa a ser inexistente fora de contextos

comunicativos. Martino (2005) é categórico quando, sob esta visão, determina uma

interdependência entre comunicação e cultura, afirmando que, em nossos dias, é impossível

distinguir os limites claros entre ambas as concepções.

Não obstante, Barbero (2003) ressalta a comunicação como questão de cultura, onde

se dá o reconhecimento social, a formação dos imaginários e neste sentido, as maneiras como

os processos de comunicação se efetivam, ganham papel de destaque nos discursos que

socialmente representam. Ou seja, a comunicação se confunde com a cultura, uma vez que é

percebida como o contexto cotidiano do reconhecimento social, da formação e expressão dos

imaginários coletivos, onde as representações dos medos e crenças acontecem.

Os meios de comunicação, dessa forma, ganham destaque ao se tornarem decisivos na

maneira como o homem absorve suas informações e toma para si o discurso das mídias como

representação.

A compreensão de todas as manifestações culturais como válidas, independente de

suas origens, como afirma Martino (2005, p.29), valendo-se das proposições de Wilianms,

Hoggast e principalmente Stuart Hall, cria debate acerca do panorama sociocultural que se

esquematiza, onde a cultura é vista não “como um espaço simbólico de dominação e

reprodução das idéias dominantes, mas fundamentalmente como um lugar de luta entre

diversas culturas, vinculadas a determinados estratos da sociedade”.

E sob esta linha de raciocínio, Barbero apresenta então, a cultura como questão de

comunicação e chega num ponto crucial para a compreensão da relevância da comunicação no

processo de estruturação das ideologias, crenças, valores, enfim, das culturas. O autor (2003,

p.68-69) afirma que “[...] as culturas vivem enquanto se comunicam umas com as outras e

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esse comunicar-se comporta um denso e arriscado intercâmbio de símbolos e sentidos”.

A comunicação, diante de tal problemática, desempenha papel fundamental na

viabilização das redes de relacionamentos e na conquista da cidadania, não a partir do papel

da mídia numa visão simplista como alguns colocam, mas da comunicação sendo interlocutor

cultural entre as relações que se estabelecem nos movimentos populares, comunitários e das

demais organizações que tenham como objetivo a efetivação de interesses coletivos.

Comunicação mediando os processos participativos

No cenário global, permeado por relações complexas, fragmentadas pela convivência

do global com a relevância do local, o processo da comunicação se faz, de forma crescente,

denso enquanto possibilitador do reconhecimento pleno do homem como cidadão e do

respeito às diferenças com as quais convive.

Ao afirmarmos as fronteiras pouco definidas entre comunicação e cultura e, se

relembrarmos que todos temos cultura, uma vez que, enquanto seres sociais, somos a

somatória de diferentes ideologias e valores, ou seja, culturas diversas, a comunicação

desempenha o papel de mediação entre o comum do âmbito global na sua relação com o local.

No entanto, há no imaginário geral, a simplificação excessiva da compreensão acerca

dos processos comunicacionais, uma vez que, desde o início dos processos de concepção

humanos, como afirma Freire (2000, p. 101), a educação sob a qual somos submetidos é falha

já que não se tem o “gosto da comprovação, da invenção, da pesquisa. Ela é verbosa.

Palavresca. É “sonora”. É “assistencializadora”. Não comunica. Faz comunicados, coisas

diferentes.”

Diante da emergência de novas relações sociais, os processos comunicacionais não

podem ser pontualizados, resumidos às mídias, devem, em contrapartida, estar presente nas

relações sociais estabelecidas, ganhando papel de mediador que põe a comunicação no

universo social, tal como afirma Barbero (2003, p.69),

[...] Comunicação significará então colocação em comum da experiência criativa, reconhecimento das diferenças e abertura para o outro. O comunicador deixa, portanto, de figurar como intermediário – aquele que se instala na divisão social e, em vez de trabalhar para abolir as barreiras que reforçam a exclusão, defende o seu ofício: uma comunicação na qual os emissores-criadores continuem sendo uma pequena elite e as maiorias

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continuem sendo meros receptores e espectadores resignados – para assumir o papel de mediador: aquele que torna explícita a relação entre diferença cultural e desigualdade social, entre diferença e ocasião de domínio e a partir daí trabalha para fazer possível uma comunicação que diminua o espaço das exclusões ao aumentar mais o número de emissores e criadores do que o dos meros consumidores. (Barbero, 2003, p.69)

Assim, a comunicação se efetiva da melhor maneira, tal como sua natureza define,

sem donos, compartilhando informações, identidades e culturas, estruturando relações

orquestrais. Neste sentido, Vieira (2002, p.53) cita Marcuse e Habermas, e diz que “só se os

homens pudessem se comunicar sem coação e se cada homem pudesse reconhecer-se no

outro, só então a espécie humana poderia eventualmente reconhecer a natureza como o seu

outro, [...] e a si mesmo como sendo o outro desse sujeito”.

Diante de uma dinâmica de engajamento social, por meio da comunicação, propõe-se

estabelecer novas maneiras de atuação na sociedade, pautadas por uma ética de participação

que crie novos paradigmas culturais propícios ao desenvolvimento da cidadania.

Conceituaremos, pois, Relações Públicas com enfoque nas potencialidades dessa

atividade comunicativa no desenvolvimento de ações sociais.

RELAÇÕES PÚBLICAS: CONCEITOS

Andrade (2001), um dos principais teóricos de Relações Públicas em nosso país, dizia,

ao conceituar esta atividade, que a realidade do termo tem uma multiplicidade de significados

para diferentes pessoas, afirmando que encontrar uma definição pacífica é algo distante. No

entanto, apresentaremos algumas definições e breve debate acerca das Relações Públicas, sua

atuação e potencialidades.

O Conselho Federal dos Profissionais de Relações Públicas (CONFERP) em 1969

define a atividade como sendo todas as ações de uma organização que, por meio da

comunicação, independente de sua natureza, objetive estabelecer e manter a compreensão

mútua com seus públicos. Caracterizada pela aplicação de conceitos e técnicas de

comunicação estratégica, dirigida e integrada, a atividade desenvolve funções administrativas

de direção e de comunicação, independentemente de nomenclaturas de cargos e funções que

venham a ser adotados.

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Kunsch (2003, p.90) afirma que Relações Públicas trabalham na promoção e

administração de relacionamentos, mediando conflitos por meio de estratégias e programas de

comunicação que sejam moldados de acordo com as situações reais do ambiente social,

dizendo que, “[...] essencialmente, o grande desafio para a área é conseguir gerenciar a

comunicação entre as duas partes, mormente na complexidade da sociedade contemporânea”.

Delineiam-se, claramente, as funções das Relações Públicas pelas definições feitas

acima, e nota-se que a atividade estará sempre vinculada aos objetivos políticos das

organizações, direcionando-as à convivência produtiva.

Ao trabalhar com os públicos efetivos de uma organização, Relações Públicas

objetiva, por estratégias comunicacionais, promover bons relacionamentos entre os dois pólos,

atuando como viabilizadora da comunicação.

No entanto, diante do cenário atual, com as mudanças paradigmáticas que se efetivam,

a manutenção de relações hierárquicas entre organizações e públicos dá continuidade às

amarras sociais de nossa cultura.

Considerando-se, que a informação, matéria constitutiva de Relações Públicas, pode

ser coercitiva, libertária e alienante, a construção de discursos intencionais, se faz muito

presente, ou seja, ao maquiar informações, dá-se continuidade à ausência de participação nos

sistemas sociais.

Sob tal problemática, César (2007) afirma que as teorias da atividade, influenciadas

por conceitos metodológicos e funcionais, faz com que sempre se busque preservar o sistema

vigente, uma vez que,

A força das Relações Públicas é ainda pautada na criação de imagens por intermédio da promoção de eventos e apoios institucionais e determinadas campanhas, até mesmo sociais. O que se questiona nestes apoios é sua capacidade de reverter o quadro social e criar, verdadeiramente, públicos capazes de corresponder às belas “definições” de Relações Públicas.

Em contrapartida àquela comunicação que mantêm os públicos como meros

espectadores da dinâmica social, onde as trocas comunicativas não são críticas, muito menos

participativa, aflora uma nova maneira de atuação que, diante da revalorização do local e

frente à multiplicidade cultural de nossa sociedade, busca alternativas mais democráticas de

comunicação.

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Neste sentido, as Relações Públicas atuam a fim de contribuir para a transformação

social, pautada pela democracia e dialogacidade, posicionando-se como mediadora das trocas

comunicacionais, possibilitando que os públicos sejam verdadeiros cidadãos de sua

comunicação.

Relações Públicas desenvolvendo cidadania e cultura

A forma de atuação, denominada como Relações Públicas Comunitárias e/ou

Populares, busca possibilitar novas visões de mundo aos grupos populares com os quais atua,

ao incentivar a expressão das informações e valores culturais e ao despertar o interesse pela

ampliação do conhecimento, por novas informações, como coloca Murade (2007).

Sob tal perspectiva, ao atuarem no sentido de ofertarem possibilidades de participação

em ações cotidianas caracteristicamente sociais, ou seja, ao sugerir o envolvimento em

práticas que atuam diretamente sobre os anseios de determinadas comunidades, as Relações

Públicas possibilitam que se fomente um processo de educação informal, cuja idéia nasceu de

Paulo Freire, contribuindo para a (re)elaboração das culturas populares, incentivando a

criticidade, possibilitando cidadania. Ao incentivar autoconhecimento, promove educação e

em conseqüência, dá significância à compreensão do mundo aos homens, que com a

comunicação, transformam sua relação com a sociedade.

Perruzo (2007) nos define então essa maneira alternativa de atuação da atividade

como,

[...] “novas” no sentido de estarem comprometidas com a realidade concreta e com as necessidades e interesses majoritários da população sofrida, impossibilitada de usufruir dos direitos plenos de cidadania. Portanto, as relações públicas populares implicam num olhar inconformado do status-quo, e ao mesmo tempo, implicam num “apostar” na transformação social.

A partir de 1980, com crescente importância em nosso país, Relações Públicas

Comunitárias e/ou Populares ao trabalhar na comunidade, ou seja, participativamente,

oferecendo conhecimento, aprendendo com os envolvidos e repartindo as soluções, no sentido

de colaborar para a comunicação livre, àquela à que todos tem acesso, usufruem com

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equidade de seus benefícios e tornam-se críticos ao estarem presentes nos processos criativos

de sua comunicação.

Peruzzo (1986), pautada pelas ideologias de Paulo Freire aposta que no âmbito

comunitário e popular, as Relações Públicas não visam a acomodação da classe dominada,

porém sua integração à realidade a fim de modificá-la, definindo-as como um processo

político-pedagógico não neutro, uma vez que opta pela liberdade de expressão, equidade de

poderes, superação da alienação, libertação de oprimidos, ou seja, um processo de

conscientização da sociedade e construção da cidadania por meio da compreensão, validação

e respeito de suas particularidades culturais.

Então, Relações Públicas não são uma simples técnica ou um conjunto de técnicas, mas todo um processo científico em que se busca conhecer, articular e transformar o homem, a sociedade e o mundo para construir o mundo, a sociedade e o homem. (Peruzzo, 1986, p.132)

A vinculação com as realidades locais e o entrelaçamento com os elementos da cultura

e da identidade nacional com o paradigma cultural global, possibilita que a dinâmica social se

dê numa grande rede de relações, que não se fecha, pois são fluídas e descentralizadas, com o

predomínio de trocas comunicacionais horizontais unidas pela diversidade de “nós” que

estruturam sua organização. Dentro dessa rede social, todos são mediadores da comunicação,

a participação se faz de forma efetiva sob um modelo democrático e não-hierárquico.

Aí está a complexidade da comunicação atualmente, e neste sentido os comunicadores,

ou seja, pessoas que detêm o conhecimento das técnicas de comunicação, participam e atuam

a fim de potencializarem a capacidade criativa e crítica do homem, que ao se tornar ciente e

ator do processo social no qual vive, perdendo a comodidade pré-estabelecida que o sufoca

em um universo de relações desiguais, torna-se cidadão, reconhecendo e respeitando-se

mutuamente, transformando a sociedade em que vive.

CULTURA EM LONDRINA: o Programa Rede Cidadania

O Projeto de Investigação Internacional do Observatório de Políticas Culturais de

Montevidéu e a UNESCO (2007), realizou no ano de 2002, o estudo de caso intitulado “Rede

da Cidadania: a cidade como um circuito cultural integrador”, realizado pela psicóloga social

da Universidade de Minas Gerais, Patrícia Monteiro Lacerda.

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O relatório aponta que, no ano de 2000, durante a campanha eleitoral pela

prefeitura do município de Londrina, foi diagnosticado o anseio por melhor qualidade de

vida por meio de alternativas de cultura, lazer e renda, por parte de todas as camadas

sociais da cidade, surgindo então a proposta de um programa que integrasse políticas

públicas tendo como norte a cultura: Rede da Cidadania.

O diagnóstico de que o desejo de participação e de acesso à produção, produtos e

serviços culturais, evidenciou que as expressões e políticas culturais da cidade

concentravam-se numa região delimitada do município, onde, as áreas mais periféricas não

acessavam e acompanhavam tais ações. Era hora de entrelaçar as regiões de Londrina e

universalizar a pluralidade e riqueza das linguagens culturais.

Diz Lacerda (UNESCO, 2007) que:

[...] Até então, os políticos discutiam a cultura dentro do viés da cultura artística, do fomento cultural, numa interlocução apenas com os produtores culturais já consolidados. A proposta de uma política pública voltada para toda a população, era um fato novo, e foi melhor entendida pelos eleitores do que pelos políticos adversários. Estes últimos demonstravam dificuldade em sair do paradigma elitista/populista para pensar possibilidades de, ao mesmo tempo, fazer parceria com a classe artística e ampliar o acesso cultural à população.

Dessa forma, com a eleição dos proponentes da Rede Cidadania, deu-se início a um

processo contínuo de troca com as comunidades e os grupos de criação cultural, a fim de

encarar a cultura como uma política pública, ou seja, socializar, por meio da participação

efetiva de todos os envolvidos no programa, as experiências de produção oferecendo novas

perspectivas de vida, ressaltando a importância das partes na somatória do todo, fugindo da

característica voraz da indústria cultural. O relatório da UNESCO afirma que “[...] estamos

falando da superação da distância entre os produtores e os receptores de informação e cultura,

pela criação de condições de intercâmbio desses papéis na comunidade”.

Ligado a Secretaria Municipal de Cultura, o programa, resultado do esforço de

produtores culturais e diversas comunidades, com sede localizada à Praça 1º de Maio, nº 110,

tem como finalidade, por meio de políticas culturais, promover o desenvolvimento humano,

comunitário e revitalizar a relação entre cidadãos e a cidade, fazendo que a arte faça parte do

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cotidiano londrinense. Ou seja, a Rede Cidadania objetiva implantar a “Cultura pela Polis”,

que, segundo seu programa de 2007, é:

um entendimento contemporâneo do papel do poder público de fomentar políticas onde a arte volte-se para o sentido de fraternidade, o que se traduz em presença na arte na vida coletiva, na vida da cidade como espaço de urbanidade e convivência, assumindo o desafio de ofertar um processo cultural capaz de superar isolamentos e despertar potenciais criativos, colocando em primeiro plano a qualidade de vida do cidadão e agindo para colocar a cidade a seu serviço. (Programa Rede Cidadania 2007, p.1)

Democratizando o acesso à formação, fruição e produção cultural, levando oficinas de

criação artística a todas as regiões do município e distritos rurais, com objetivos convergentes

à sua finalidade.

Segundo o programa anual da Rede Cidadania, são cinco seus objetivos principais: o

primeiro é ter a criação artística como força motivadora de todas as oficinas, das de iniciação

às linguagens artísticas até as de aprimoramento, trabalhando como estímulo constante de

crença nas potencialidades de cada um dos envolvidos nos projetos.

Recepcionar todos os projetos independentes ou estratégicos que tenham por

finalidade ações de produção e formação no sentido de inclusão social, somando experiências,

elevando, dessa forma, a qualidade dos trabalhos. Fomentar uma intensa circulação cultural

dos processos criativos resultantes das oficinas dos projetos, a fim de contribuir para o

reconhecimento do papel da Rede Cidadania e contribuir com o programa Rede Alegria na

oferta de programação cultural para a cidade.

Desenvolver intensa parceria com as escolas municipais e estaduais, enriquecendo a

educação com programações culturais, tornando-as mais abertas e receptivas às comunidades,

potencializando seus espaços físicos e promovendo renovações pedagógicas que atendam as

Leis de Diretrizes e Bases da educação, em especial a relação entre liberdade, criatividade,

aprendizado e responsabilidade. E por fim, fomentar políticas públicas, em ações paralelas à

outras secretarias do governo municipal explorando o potencial criativo do trabalho conjunto

afim de trazer melhorias para todos os setores da sociedade.

Operacionalizado por seis membros, o programa consiste na somatória de diversos

projetos culturais que trabalham com doze áreas artísticas, que são: teatro, música, dança,

artes plásticas, cultura integrada e popular, circo, artes de rua, patrimônio, artesanato, artes

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visuais, artes gráficas e literatura, cinema e vídeo. Ressalta-se que em 2007, o programa é

composto por 48 projetos que abarcam as doze linguagens artísticas.

Indicado como referência para os países da América Latina pelo Observatório de

Montevidéu e a Unesco no ano de 2002, a Rede Cidadania torna-se exemplo vivo de política e

experiência cultural de sucesso.

O Programa 2007 da Rede Cidadania afirma que as linguagens artísticas, quando

desenvolvidas, oferecem às pessoas (principalmente crianças e jovens) o contato com seu

imaginário, seus sonhos, emoções, opiniões, leituras de mundo e a possibilidade de expressão

de maneiras alternativas; algo que as políticas públicas e sistemas educacionais convencionais

não oferecem.

Cada projeto é coordenado por um proponente, conhecido como agente singular.

Os Coordenadores

A Rede Cidadania é coordenada por seis membros que operacionalizam o

funcionamento do programa e se dividem em três cargos, o de coordenação, de coordenação

técnica de produção e acompanhamento e, o de assistência técnica de produção e

acompanhamento.

O cargo de coordenador do programa é ocupado por Valdir Grandini Alvarez, que é o

representando oficial da Rede Cidadania, articulando o programa com os públicos envolvidos.

José Cláudio Rodrigues é o coordenador técnico de produção e acompanhamento,

sendo responsável pela organização das oficinas, assim como os pontos nos quais irão

acontecer, gerenciando a grade de atividades da Rede Cidadania. Atua como articulador dos

pontos físicos onde as atividades do programa se efetivam, comunicando-se com parceiros,

assegurando a infra-estrutura para sua realização. Responsável, ainda, pela programação

cultural do programa e sua circulação, promovendo intercâmbio da comunidade com as

atividades.

Alessandra Aparecida Silva, Maria Virgínia Gonzáles Veja Gil e Paulo Roberto

Munhoz são os assistentes técnicos de produção e acompanhamento, responsáveis pela

realização do acompanhamento de todos os projetos da Rede. Por meio das visitas, buscam

estabelecer maior contato com todas as comunidades envolvidas estimulando melhorias no

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contato com parceiros, alunos e familiares, a fim de contribuir na conscientização sobre o

trabalho desenvolvido.

E a coordenação do programa conta com uma estagiária, Andréa Naomi Inoue.

Os Agentes Culturais Singulares

As agentes culturais singulares são os proponentes dos projetos e os oficineiros que

desenvolvem as oficinas de caráter arte-educativa no programa, ganhando papel decisivo no

alcance dos objetivos, uma vez que são o contato direto das comunidades com o propósito da

Rede Cidadania, como que, a personificação das possibilidades advindas com a cultura.

Segundo o Programa 2006, os oficineiros são:

São Agentes Culturais porque sua ação se dá para efetivar a idéia holística da reconciliação entre a cidade e o cidadão, exigindo atitudes enfáticas para que a cidade possa acolher sonhos, emoções e criatividade. É quando as pessoas passam a ser o centro em termos de importância. São singulares justamente porque terão que dar o tom de um trabalho baseado na aprendizagem com afetividade e prazer, implicando ter como estimulantes tanto o processo como o produto da aprendizagem artística. São singulares porque toda leitura de mundo que propiciarem deve também estimular que se torne uma promessa de produção.

Dessa forma, são os responsáveis pelo fluxo contínuo das linguagens artísticas,

trabalhando a fim de efetivar a liberdade de expressão, a criatividade, a participação, a

criticidade, facilitando a absorção de conhecimento e de comunicação dos envolvidos nos

projetos.

A capacitação e reciclagem de experiências dos agentes se dão através de processos de

avaliação e acompanhamento das oficinas e de encontros periódicos chamados

referencialização, onde são discutidas metodologias e o desenvolver das atividades propostas

criando um grande debate, efetivando a troca de experiências e referências.

Fundamental para a continuidade dos projetos, o programa 2006 afirma que:

As avaliações serão sempre baseadas nos próprios projetos e no Programa, realizadas de forma democrática e horizontal, com sentido soma e colaboração. Para o êxito do Programa é fundamental o relato vivo e sincero sobre o desenvolvimento dos projetos em cada uma dessas reuniões, considerando-as como momentos de concentração dos saberes gerados na Rede e fraterna troca de opiniões.

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A sistemática de avaliações realizadas pela coordenação do programa possibilita a

retro-alimentação dos projetos com debates e reflexões democráticas, representando

importante estímulo a participação e integração de todos os agentes culturais singulares.

CONCLUINDO... Muitas vezes porta-vozes do discurso hegemônico, nosso intuito é debater as relações

públicas como possibilitadora de transformação da sociedade, no aspecto da formação de

públicos, formando, assim, também cidadãos, atuando no sentido de eliminar exclusão,

conformismo e acomodação, efetivando o pensamento crítico, informando e formando

públicos. Tal como afirma Murade (in Kunsch, 2007, p.160):

A cidadania está diretamente articulada com a capacidade de manejar conhecimento. As relações públicas populares podem contribuir com os grupos para a produção do auto-conhecimento. Com esse propósito, elas se tornam relações públicas educacionais, pois já não se trata de informação, mas de formação, na qual o conhecimento construído pela comunidade vale tanto quanto o conhecimento científico, pois ganha em significado a partir do momento em que se estabelece relação/transformação da realidade. A comunicação/relações públicas tem por função desenvolver a inquietude social e, assim, formar a cidadania. O dissenso é um meio para chegar à cidadania, que só será efetivada quando se conseguir formar agentes de mudança dispostos a correr riscos para construir um mundo melhor.

A proposta desta discussão, baseado em pesquisa bibliográfica é investigar e

reconhecer o papel da comunicação na construção de cidadania na relação entre cultura e

comunicação a fim de ir além das visões alternativas acerca da atividade.

Não basta discutir os aspectos alternativos das relações públicas, é preciso investigar

continuamente possibilidades de ação com o propósito de redescobrir relações públicas,

redimensiona-lá e recoloca-lá no âmbito das ciências sociais como aquela que, capaz de

efetivar processos comunicativos, torna-se capaz de transformar realidades.

REFERÊNCIAS ANDRADE, Cândido Teobaldo de Souza. Para entender relações públicas. 3ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2001.

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