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Revista Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sutentável 03_10/2000

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Carmen Deere fala sobre as mulheres rurais e o poder.

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Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável

Revista trimestral publicada pela EMATER/RS

Porto Alegre/RS - BRASIL - V. 1, n° 4 Out/Dez 2000

Editorial

Intercalando idéias para a sustentabilidade

Neste final de milênio, os editores de Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável se sentem muitoanimados pelo conjunto de fatos que vêm consolidando o enfoque agroecológico como via adequada para apromoção do desenvolvimento rural. Vale mencionar que a preparação deste quarto número coincidiu com arealização do I Seminário Internacional sobre Agroecologia, em Porto Alegre. Contando com mais de milparticipantes, este evento pemitiu que colaboradores altamente qualificados abordassem temas de carátersocioambiental da maior relevância. A matéria especial sobre o evento demonstra um esforço de síntese do querepresentou o Seminário e dos encaminhamentos dele resultantes. Aliás, em Opinião, Rosset evidencia que asuposta Revolução Verde II, baseada nos avanços da engenharia genética, constitui apenas mais um sonho.Assim como a Revolução Verde I, ela não acabará com a fome no mundo: é preciso que os pobres tenhamdinheiro para comprar sua comida, ao mesmo tempo em que se reconheça a inviabilidade dos modelos deprodução altamente dependentes de recursos não-renováveis. Rosset não hesita em afirmar que o únicocaminho para acabar com a pobreza rural, proteger o ambiente e preservar a produtividade da terra para asfuturas gerações é uma agricultura de pequenas propriedades que, ademais, siga os princípios da agroecologia.A questão da segurança alimentar também aparece na entrevista com Deere, professora da Universidade deMassachussets que, em Porto Alegre, palestrou no Seminário Mulher, Trabalho e Propriedade da Terra. Sua teseé de que a propriedade da terra fortalece processos de afirmação da mulher, melhorando sua auto-estima eampliando oportunidades de participação nas decisões, tanto no lar como nas atividades produtivas ecomunitárias. Significa que, quando a mulher tem o controle sobre a propriedade, geram-se condições quepermitem uma maior garantia de segurança alimentar para as famílias.

Abordagens de ordem conceitual também merecem destaque neste número. Entre elas, destaca-se o TópicoEspecial, assinado por Ahumada Arenas, coordenador-geral do Movimento Agroecológico da América Latina eCaribe, apontando a importância de que a sociedade enfrente a crise provocada pelo modelo hegemônico dedesenvolvimento rural, crise esta que muitos governos e instituições de pesquisa e extensão insistem em nãoreconhecer. Sob a perspectiva institucional, os principais desafios incluem a necessidade de incorporar a noçãode sustentabilidade, o fortalecimento das organizações populares, a transformação gradual de valores e práticasatuais, assim como correspondentes programas de capacitação voltados à sociedade. Em linha similar, oprofessor Cimadevilla, da Universidade de Río Cuarto, Argentina, analisa a evolução de conhecimentos sobreprocessos de adoção de novas tecnologias de caráter agroambiental, o que sugere novas orientações e desafiospara a pesquisa e extensão rural, face às exigências impostas pela realidade contemporânea. Já o artigo deCostabeber e Moyano examina, sob um enfoque conceitual e com apoio de evidências empíricas observadas noRio Grande do Sul, a convergência entre processos de ação coletiva e de ecologização na agricultura familiar,evidenciando que a transição agroecológica exige avaliação em espectro multidimensional. Suas análisesrevelam que, embora a ação social coletiva surja como conseqüência de desafios que extrapolam a capacidadede resposta individual, dependendo de seu êxito transforma-se no principal motor que impulsiona a transiçãopara estilos de agricultura de base ecológica, com maiores níveis de sustentabilidade econômica, social eambiental.

A Revista também apresenta exemplos concretos de alterações bem sucedidas em práticas tradicionais daagricultura. Em Relato de Experiência, Cotrim e seus colegas mostram resultados positivos que vêm sendoalcançados através da integração entre orizicultura e piscicultura, enquanto Kirchof, em Alternativa Tecnológica,aborda alguns avanços obtidos na pecuária leiteira via adoção do pastoreio racional. No âmbito da pesquisa,Schaffrath e Miller trazem informações reveladoras da importância do cultivo consorciado de mandioca comadubos verdes, apontando redução significativa na ocorrência de plantas espontâneas nos cultivos consorciadosem relação aos solteiros. Por fim, sugere-se aos leitores que visitem os sites apresentados na seção Eco-Links,onde poderão encontrar valiosas informações de caráter socioambiental. Ademais, acreditando que em 2001 seconsolidarão maiores e melhores oportunidades para o debate e intercâmbio de idéias, conhecimentos eexperiências produtivas, os editores desejam, a todos, sinceros votos de saúde, paz, alegria e realizações. Boaleitura.

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Entrevista

Carmen Deere

Propriedade da terra garante poder às mulheres

por Fellipi, Ângela - Jornalista da EMATER/RS

Há uma relação direta entre a posse da terra e o poder das mulheres no meio rural. A tese é defendida pelaprofessora de economia da Universidade de Massachussets, Carmen Diana Deere, que pesquisa a situação dapropriedade da terra na América Latina e a questão de gênero. Ela esteve no Rio Grande do Sul em novembro,participando do Seminário Mulher, Trabalho e Propriedade da Terra, realizado na Emater/RS, em Porto Alegre.

Carmen dirige o Centro de Estudos sobre América Latina e Caribe da Universidade onde dá aulas. Tem livros eartigos publicados sobre mulheres rurais, políticas públicas e direito à terra na América Latina. No Brasil, estádesde fevereiro, participando de uma pesquisa sobre a situação das mulheres do campo no país, naUniversidade Federal do Rio de Janeiro, através da Fundação Fullbright.

Para ela, quando a mulher tem a posse da terra, participa mais das decisões na propriedade. No entanto, naAmérica Latina, ainda é baixo o percentual de mulheres com o título da terra. É do que ela fala nessa entrevista.

Revista - Por que na América Latina a propriedade da terra se concentra nas mãos dos homens?

Carmem Deere - Há três formas principais de acesso à propriedade da terra: primeiro, por herança, segundo,através do mercado e terceiro, pelo Estado. Pesquisamos cada forma de acesso para ver quais têm sido asbases da discriminação da mulher. No caso da herança da terra privada da família, o que vemos em toda aAmérica Latina é que a terra é um privilégio masculino. Em quase todos os países, os pais tendem a favoreceros filhos e quando se faz uma distribuição eqüitativa, são os homens que ficam com as áreas maiores oumelhores. Isso, em parte, compreende-se como uma estratégia familiar de reproduzir a gleba campesina atravésda transmissão para os homens, com a esperança de que as mulheres vão sair, casar-se, e, então, por que dara elas terras. Mas é uma forma de discriminação.

No caso do mercado de terras, os dados disponíveis indicam que o homem quase sempre participa muito maisno mercado de terras, comprando ou vendendo-as. As mulheres, muitas vezes, gostariam de comprar, masestão em piores condições, porque para comprar terras é preciso um capital e esse capital depende do tipo derenda, de empregos que homens e mulheres podem conseguir. Então, como há uma discriminação da mulher nomercado de trabalho - ela ganha menos, não pode trabalhar em atividades agrícolas todo o ano -, não tem essepoder de poupança, de acumulação para poder comprar terras. Então, ela não participa. Também, outra situaçãoé que uma família compra terras usando tanto a renda da mulher quanto a renda do homem. Como o homemsocialmente se considera o chefe da família, a escritura dessa terra fica no nome dele, quando foi o esforço deambos que resultou nessa compra. Mas, se o nome dela não aparece no título, então nem sempre seus direitoslegais se cumprem, e se o casal se separa, é ela que fica sem a terra.

R -Esta situação tem avançado na América Latina?

CD - Sim, sem dúvida. Tem avançado pela terceira forma de aquisição, pelo Estado, através da reforma agráriae dos projetos de colonização, que resultam na distribuição de terra, na maioria dos casos aos homens, comochefes de família. A idéia do governo pode ser a de estar beneficiando a família na sua totalidade, com o títulode propriedade em nome do chefe. Desta forma, a mulher não tem segurança de que ela também vai terbenefícios de ser proprietária, beneficiada com a reforma agrária. O que tem mudado nos últimos anos é que,

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devido a um conjunto de mudanças, em nível internacional, já há uma maior consciência da importância da terrapara a mulher. A propriedade da terra está vinculada ao bem-estar da mulher e de sua família. Se ela tem ocontrole sobre uma propriedade é muito mais seguro que a alimentação da família esteja garantida. Também, aterra é importante para criar as bases de uma igualdade real entre homem e mulher. E, por fim, que a terra e apropriedade em geral são importantes para os processos de empowerment (aumento de poder) da mulher, tantopara melhorar sua auto-estima, quanto sua possibilidade de participar das decisões no lar, das decisões naprodução e na comunidade, etc.

R - Há uma relação direta entre a posse da terra e o poder de decisão no negócio familiar?

CD - Esse é o resultado das minhas pesquisas na América Latina. No Brasil, ainda estou investigando, mas háindicativos que as mulheres proprietárias têm maior poder de barganha.

R - Quais os avanços na América Latina?

CD - São duas políticas públicas que têm sido bem importantes. Primeiro, a adjudicação e titulação conjunta (daterra) a casais. Em segundo, a prioridade na distribuição da terra a mulheres chefes de família. A política públicamais comum, que foi adotada na Colômbia, Nicarágua, Costa Rica, Peru, República Dominicana, Equador,Guatemala, é a que coloca como requisito nos programas de redistribuição de terras a titulação no nome docasal. No Brasil, essa é uma opção que foi colocada na Constituição de 1988, mas não é um requisito. É algoque o casal tem que pedir. No entanto, dada a socialização, a cultura etc no campo, são poucos casais quepedem. Por isso, eu acho que a participação da mulher aqui no Brasil na reforma agrária é muito menor do queem outros países que têm como requisito a titulação conjunta.

Da mesma forma, a prioridade (de distribuição da terra) às chefes de família, adotada em Colômbia, Nicarágua eChile. O que isso significa é o reconhecimento por parte dos governos que muitas vezes as mulheres chefes defamília na zona rural são os grupos mais pobres dentro dos pobres. Assim, pode-se melhorar a situação dessasfamílias e crianças. Também é, um pouco, uma maneira de compensar as mulheres pela discriminação quetiveram no passado, incrementando e melhorando a distribuição das terras, da propriedades entre os sexos.

R - E a aquisição de terras através de herança e de compra por parte da mulher tem avançado?

CD - Acho que não. Só através de políticas públicas. O Estado, através da legislação, pode criar mecanismosde inclusão da mulher, não somente a igualdade formal, de direitos iguais, mas colocar a titulação a casaiscomo prioritária na reforma agrária, em que homens e mulheres participem juntos nos assentamentos,cooperativas, associações. E o que assegura isso é que o nome de ambos apareça na titulação.

No caso da herança, a coisa curiosa é que na América Latina, desde os tempos coloniais, a herança deveriabeneficiar todos os filhos igualmente, mas, na realidade, isso não acontece. Pode ser que as mulheresherdavam também dos pais, porém não herdaram terra na mesma proporção. Herdaram uma vaca, as coisas dacozinha, mas a terra, que é o bem mais importante, não.

R - No Brasil, hoje, não é assim?

CD - Legalmente talvez não seja, mas, na prática, a cultura ainda favorece o filho homem. Muitas vezes,compensam-se as filhas com educação. O que se torna um fator de saída do campo. São as mulheres quemigram mais para os centros urbanos. Se elas são discriminadas na família, se não são socializadas, não lhesdão capacitação para serem administradoras da terra, então elas não vão ver possibilidades no meio rural e,obviamente, vão buscar outras maneiras de sobreviver. A educação e o emprego urbano são possibilidades.Mas quando não tem muito emprego urbano, como nos últimos anos, a situação, tanto para homens quanto paramulheres, é difícil nas capitais, centros urbanos. Isso põe a mulher numa situação muito insegura.

R - E depois da posse da terra, como se dá a relação de poder no assentamento?

CD - Aqui no Brasil, não trabalhei ainda essa questão. Mas é certo que a terra sozinha não resolve o problema,mas é bem importante para mudar as relações de gênero porque incrementa o fator de barganha. Conforme aspesquisas que estou fazendo no Brasil, quase sempre as únicas mulheres que participam das decisões nosassentamentos são as que são as cadastradas. As esposas não participam porque não têm o direito e nem odever. Tem que ser o proprietário. Por isso, argumentamos que se o governo quer fortalecer os assentamentos,fortalecer a agricultura familiar, é muito importante que se dê atenção à propriedade e à titulação da mulher juntocom o marido.

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R - Quais os índices de participação das mulheres assentadas no Brasil como proprietárias?

CD - Doze por cento das terras em assentamentos pertencem às mulheres. Os índices são mais altos noNordeste e Norte. É mais baixo no Sul - Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul - este com 9%. Os fatoresdessa distribuição é o que vou pesquisar agora aqui no Brasil. Minha hipótese é de que nesses Estados, onde oíndice é maior, o percentual de mulheres chefes de família também é maior, o percentual de migração masculinaé alta. Em três dos Estados - Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco - a produção da cana-de-açúcar éimportante e as mulheres têm uma alta participação. Nas entrevistas que fiz, um fator que apareceu é que asmulheres desses Estados foram sindicalizadas muito mais cedo que nos outros Estados, no começo dos anos80, através de um movimento forte para incrementar a participação das mulheres nos sindicatos. Foi devido àcontribuição da Paraíba e de Pernambuco que o direito da mulher - ou do casal - ser proprietária da terra entroupara a Constituição de 1988.

R - Por outro lado, aqui no Sul também houve um movimento sindicalista forte e berço do movimentopela reforma agrária. Então, como se explica?

CD - Isso é uma das coisas que quero perguntar à Fetag (Federação dos Trabalhadores do Rio Grande do Sul),ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) na pesquisa que estou fazendo.

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REPORTAGEM

SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE AGROECOLOGIA REÚNE MIL PESSOAS.

Matéria elaborada por Ângela Felippi e Roberto Villar, jornalistas da Emater/RS e Pró-Guaíba, respectivamente.Colaboraram Guta Teixeira e José Otávio Ferlauto, do Pró-Guaíba, e Marlei Ferreira, da Secretaria da Agriculturae Abastecimento.

Os participantes do I Seminário Internacional sobre Agroecologia, II Seminário Estadual sobre Agroecologia e IIEncontro Nacional sobre Pesquisa em Agroecologia, que aconteceu em Porto Alegre, dias 20, 21 e 22 denovembro de 2000, consideram que a resolução dos problemas socioambientais deve estar baseada naconstrução participativa de um conjunto de políticas e atividades. O evento reuniu mais de mil pessoas, entreagricultores, técnicos, professores, pesquisadores e estudantes, vindos de oito países

O governo do RS tem na Agroecologia uma das linhas de seu programa de desenvolvimento para o setoragropecuário. Os seminários e o encontro fazem parte de uma série de ações que visam estimular a produçãode alimentos limpos e o desenvolvimento rural sustentável. Conforme os organizadores, é preciso o engajamentopermanente da sociedade civil na reflexão e definição de alternativas viáveis para o desenvolvimento ruralsustentável.

O Seminário Internacional trouxe nomes como os pesquisadores Miguel Altieri e Clara Nichols, da Universidadeda Califórnia/EUA, o ecologista Ramón Fernández Durán, do Ecologistas en Acción e Movimiento Anti-Maastricht/Espanha, o professor Xavier Simón, da Universidade de Vigo/Espanha e o extensionista DemetrioJosé Neschuk, do Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária/Argentina (leia depoimentos dos participantesna seqüência).

Nos eventos, foram aprovadas a Carta Agroecológica 2000 e a Moção de Apoio para o RS ser zona livre detransgênicos. A Carta é uma recomendação ao governo federal e aos demais Estados brasileiros paraestabelecimento de políticas públicas de apoio à agricultura familiar e à transição para sistemas agroecológicos.Também destaca a necessidade e a urgência das instituições de ensino e extensão rural desenvolverem suaspesquisas voltadas a estes dois temas.

A Moção alerta sobre os riscos dos transgênicos, exigindo moratória à produção e importação e EIA-Rima antesda liberação. Ainda responsabiliza o Ministério do Meio Ambiente e da Saúde, afirmando que o acompanhamentonão deve ser apenas da Comissão Técnica Nacional de biosssegurança (CTNbio). A Carta e a Moção foramencaminhadas para todo o país, para instituições de ensino, pesquisa e governos.

O evento foi promovido pelas secretarias da Agricultura e Abastecimento, por meio da EMATER/RS, deCoordenação e Planejamento, através do Pró-Guaíba e da Ciência e Tecnologia, com a FEPAGRO. O Encontrodeverá se repetir em 2001 e já tem data: de 26 a 28 de novembro.

Sugestões podem ser enviadas para o email:[email protected]

Carta agroecológica

Na Carta Agroecológica aprovada, os participantes recomendam o seguinte:

1) Que os governos federal, estaduais e municipais estabeleçam políticas públicas e propostas dedesenvolvimento baseadas nos princípios ecológicos e centradas na agricultura familiar. O espaço público deveincorporar gradativamente aspectos de participação organizada e controle social, opondo-se às políticasneoliberais e priorizando o atendimento das necessidades ambientais e demandas sociais.

2) Que as instituições públicas e privadas de ensino, pesquisa e extensão incorporem em suas missõesinstitucionais a dimensão socioambiental e valorizem as atividades desenvolvidas por organizações deagricultores, entidades governamentais e não-governamentais, adotando os princípios da Agroecologia comoeixo orientador de suas ações.

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3) Que a agricultura familiar e comunitária receba suportes e estímulos especificamente direcionados àconsolidação e à expansão dos processos de transição agroecológica.

4) Que os participantes deste evento se responsabilizem pela implementação, multiplicação e articulação deações concretas, em defesa da vida e do meio ambiente, em todas as suas dimensões.

Moção de apoio

Rio Grande do Sul Livre de Transgênicos

Os 1.090 participantes do I Seminário Internacional sobre Agroecologia, II Seminário Estadual sobreAgroecologia e II Encontro Nacional sobre Pesquisa em Agroecologia, reunidos no Clube Farrapos, em PortoAlegre, Rio Grande do Sul (Brasil), nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2000, preocupados com o agravamentoda dependência dos agricultores às empresas transnacionais e com a ameaça à biodiversidade, à saúde humanae animal imposta pelo cultivo de plantas transgênicas, decidem:

a) Reafirmar nosso compromisso de apoiar medida concretas, tomadas pelo Governo do Estado do Rio Grandedo Sul, no sentido de manter este Estado como zona livre de transgênicos. Este compromisso é extensivo aoutras propostas neste sentido, em âmbito nacional.

b) Exigir do Governo Federal que sejam realizados Estudos de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) e que osMinistérios da Saúde e do Meio Ambiente assumam sua parcela de responsabilidade no que respeita à avaliaçãotoxocológica e ambiental dos transgênicos, cuja liberação para o cultivo não é nem poderá ser atribuiçãoexclusiva da CTNBio.

c) Propor que seja decretada moratória, no Brasil, para o cultivo e importação de produtos transgênicos, até quesejam apresentadas à sociedade evidências científicas conclusivas de que os mesmos não provocam impactosnegativos sobre a saúde humana e o meio ambiente.

Porto Alegre, 22 de novembro de 2000.

COMENTÁRIOS :

"Estou muito impressionado com o que conseguiu o Rio Grande do Sul: institucionalizar aAgroecologia. É fundamental para a região a prática da Agroecologia, tendo em conta as característicasdos produtores agropecuários, que muitas vezes não têm dinheiro para comprar insumos agrícolas.Creio que a Agroecologia não só é uma alternativa. É a única solução possível para toda a AméricaLatina".

Santiago Sarandón, professor da Universidad Nacional de La Plata/Argentina

"É uma experiência que está servindo de referência não só para o Rio Grande do Sul, mas para todo oBrasil, e para nós de Santa Catarina, em especial. É uma experiência em que se verifica a possibilidadede uma mudança de um paradigma de desenvolvimento e essa mudança vem alicerçada numa opçãopolítica. Isso é muito importante."

Eros Mussoi, diretor técnico da Epagri/SC

"O mundo está olhando para o Rio Grande do Sul. É o único governo daAmérica Latina que está levantando a bandeira da Agroecologia e da pesquisaparticipativa com os agricultores."

Miguel Altieri, pesquisador da Universidade da Califórnia/EUA

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"Não é possível sustentá-la [a forma tradicional de exploração econômica] aolongo do tempo, já que estamos destruindo nossos recursos naturais, estamosconsumindo reservas de recursos minerais. Uma minoria de pessoas desfrutadesses recursos".

Xavier Simón, professor da Universidade de Vigo/Espanha

"Eu creio que é uma coisa única no mundo o que está acontecendo no RioGrande do Sul e temos que aprender com os debates e com a participaçãohorizontal que há aqui".

Ramón Fernández Durán, membro do Ecologistas en Acción e Movimiento anti-Maastricht/Espanha

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Opinião

A nova revolução verde é um sonho

Rosset, Peter*

Diante do problema das 786 milhões de pessoas que sofrem de fome no mundo, os propagandistas de nossaordem social têm uma solução fácil: obtermos mais alimentos através dos prodígios da engenharia química egenética.

Monsanto, Novartis, AgrEvo, DuPont e outras companhias químicas, junto com o Banco Mundial e outrosorganismos internacionais, asseguram que o mundo pode ser salvo se permitirmos a essas mesmas empresas,estimuladas pelo livre mercado, que façam sua mágica.

Para os que recordam da promessa original da Revolução Verde de acabar com a fome através do emprego desementes milagrosas, este chamado em favor da Revolução Verde II deveria soar vazio. De fato, se paraenfrentar o problema da fome a fórmula limita-se a aumentar a produção de alimentos, ela fracassará, já que nãoserão modificados a pronunciada concentração do poder econômico e, especialmente, o acesso à terra.

Inclusive, o Banco Mundial chegou à conclusão, num importante estudo realizado em 1986, que a fome mundialsó pode ser aliviada por meio da "redistribuição do poder de compra e dos recursos em favor dos que estãodesnutridos". Em poucas palavras, se os pobres não têm o dinheiro para comprar alimentos, o aumento daprodução não os ajudará.

Apesar das décadas de rápida expansão da produção de alimentos, ainda existem 786 milhões de pessoas quepassam fome no mundo. Cerca de dois terços delas vivem na Ásia, precisamente onde as sementes daRevolução Verde contribuíram para o maior êxito produtivo. Segundo a revista Business Week, "embora os silosda Índia estejam abarrotados, atualmente, cinco mil crianças morrem por dia devido à desnutrição nesse país.Como os pobres não podem comprar o que é produzido, só resta ao governo armazenar milhões de toneladas dealimentos".

Tanto a Revolução Verde como qualquer outra estratégia para estimular a produção de alimentos depende dasregras econômicas, políticas, culturais, que determinam quem se beneficia como provedor da incrementadaprodução e quem se beneficia como consumidor, quem obtém os alimentos e a que preço. Os pobres pagammais e obtêm menos. Os agricultores pobres não podem comprar fertilizantes e outros produtos nas quantidadesnecessárias e nem oferecer melhores preços, como fazem os grandes produtores agrícolas. Os créditos ou ossubsídios governamentais beneficiam enormemente os grandes agricultores.

Além disso, a Revolução Verde faz com que a atividade agrícola seja dependente do petróleo. Na Índia, aadoção de novas sementes esteve acompanhada por um aumento exponencial do uso de fertilizantes.Entretanto, o aumento da produção agrícola para cada tonelada de fertilizante utilizada nesse país caiu em doisterços. De fato, durante os últimos 30 anos, o crescimento anual do uso de fertilizantes nos cultivos asiáticos dearroz foi de três a 40 vezes mais rápido do que o crescimento da produção. Nos Estados Unidos, as sementesmelhoradas combinadas com fertilizantes permitiram maiores colheitas que, por sua vez, fizeram baixar ospreços que os agricultores obtêm por sua produção. Entretanto, os cursos da atividade agrícola aumentaramvertiginosamente, diminuindo drasticamente as margens de lucro dos agricultores.

Diante desse estado de coisas, quem sobrevive agora? Dois grupos muito diferentes: os poucos agricultores queescolhem não depender da agricultura industrializada e os que são capazes de continuar aumentando suaextensão de terra. Entre este último e seleto grupo estão 1,2% de estabelecimentos com altas rendas, os quetêm, pelo menos, US$ 500 mil de vendas anuais. Em 1969, as superfazendas ficaram com 16% da renda líquidado total da produção agrícola, mas, no final da década de 80, respondiam por quase 40%.

Os Estados Unidos viram diminuir o número de fazendas em dois terços, enquanto o tamanho médio daspropriedades aumentou mais que o dobro, desde a Segunda Guerra Mundial. A decadência das comunidadesrurais, o surgimento de bairros marginalizados no centro das cidades e o aumento exagerado do desempregoaconteceram depois da vasta migração do campo para a cidade. Pensemos o que significa o equivalente êxodorural no Terceiro Mundo, onde o número de desempregados já é o dobro ou o triplo do registrado nos EstadosUnidos.

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O único modelo com o potencial para acabar com a pobreza rural e para proteger o meio ambiente e aprodutividade da terra para as futuras gerações é uma agricultura baseada na exploração de pequenas fazendasque sigam os princípios da Agroecologia. Dos Estados Unidos à Índia, a agricultura alternativa está semostrando viável. Nos Estados Unidos, um estudo que representou um marco, feito pelo National ResearchCouncil, diz que os agricultores alternativos produzem mais por acre, com custos mais baixos por unidadecolhida, embora muitas políticas federais desestimulem a adoção de práticas alternativas.

Numa análise final, se a história da Revolução Verde nos ensina algo, é que o incremento da produção dealimentos pode, e freqüentemente é assim, seguir de mãos dadas com o aumento da fome. É por isso quedevemos ser céticos quando à Monsanto, DuPont, Novartis e outras companhias químico-biotecnológicas nosdizem que a engenharia genética estimulará o rendimento das colheitas e alimentará os famintos. Tudo leva apensar que a Revolução Verde II, do mesmo modo que a primeira, não acabará com a fome (IPS).

* Ph.D., Co-Diretor Food Firts/The Institute for Food and Development Policy, Califórnia, e co-autor do livro"World Hunger". Este artigo foi extraído do site da Envolverde, http://www.envolverde.com.br, dia 6 de outubro de2000.

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Relato de Experiência

Rizipiscicultura: um sistema agroecológico de produção

* Cotrim, D. S.; Valente, L. A. L.; Rojahn, P. R.; Sacknies, R. G. S.; Oliveira, R. G.; Severo, J. C. P., Rojahn, L.A.; Leal, D. R.; Lara, V. H.

Rizipiscicultura é um sistema sustentável caracterizado pelo cultivo consorciadode arroz irrigado e criação de peixe, sem o uso de agrotóxicos, sem o uso deadubo mineral solúvel e reduzindo o uso de máquinas.

Introdução

Este trabalho busca informar e orientar sobre os princípios ecológicos que regem o ecossistema simbióticoarroz/peixe desde a sistematização do solo até a despesca. Sintetiza o resultado de experiências práticasacumuladas nos trabalhos de extensão rural desenvolvidos por extensionistas da EMATER/RS em parceria comtécnicos de outras instituições, bem como com produtores que atuam na atividade de rizipiscicultura. Espera-seque os conceitos, orientações e recomendações aqui contidos possam representar uma ferramenta e umreferencial para produtores e extensionistas rurais que venham a ingressar na atividade. Salienta-se, ademais,que as técnicas agroecológicas de produção de arroz permanecem como um conjunto de princípios, paraadaptação e adequação às condições específicas dos mais diversos agroecossistemas.

Proposta do sistema

Rizipiscicultura é um sistema sustentável caracterizado pelo cultivo consorciado de arroz irrigado e criação depeixes, sem o uso de agrotóxicos, sem o uso de adubo mineral solúvel e reduzindo o uso de máquinas (restammecanizadas a semeadura e a colheita). Este sistema conserva o meio ambiente e proporciona o aumento derenda por área. O trabalho baseia-se no plantio de arroz no sistema pré-germinado e/ou mudas com quadrossistematizados e a criação de peixes na técnica do policultivo de carpas.

Por que rizipiscicultura?

a) O consórcio de arroz com peixes é uma alternativa de redução de custos da lavoura arrozeira.

b) O peixe prepara o solo para o próximo cultivo do arroz irrigado, recicla a matéria orgânica e consomesementes de plantas invasoras contidas neste solo, como arroz vermelho, capim arroz, ciperáceas e outrasplantas aquáticas. O peixe também consome larvas de insetos, caramujo e bicheira da raiz do arroz. Sãoalimentos, também, sementes de arroz perdidas na colheita e restos culturais da lavoura que, por vezes, sãofocos de doenças, como por exemplo a bruzone. É importante salientar que, ao realizar o trabalho de limpeza doquadro, desde a fase inicial até a colheita, os peixes não consomem as plantas de arroz e, conseqüentemente,não causam prejuízos econômicos.

c) Existe uma adição de renda gerada pelo peixe que entra na propriedade em um momento de poucadisponibilidade de recursos, na época da formação da nova lavoura.

Calendário da rizipiscicultura

Para ter-se uma noção, no tempo e espaço, das ações no sistema, apresentamos abaixo o calendário darizipiscicultura:

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Descrição do calendário

Para iniciar-se o sistema, o quadro de arroz deve sofrer o processo de sistematização, com nivelamento de solo,construção de taipas reforçadas e montagem de um refúgio para os peixes. O arroz pré-germinado deve sersemeado entre os meses de outubro e dezembro, respeitando-se sempre o zoneamento agroclimático da região.Passados 20 dias da germinação do arroz, deve-se realizar a alevinagem no quadro. Durante os meses deverão, a lavoura arrozeira e o policultivo de carpas convivem harmoniosamente. Normalmente no mês de marçoocorre o rebaixamento do nível da água e a colheita mecânica do arroz. Nesta fase os peixes sobrevivem norefúgio do quadro. Após a colheita, é elevado o nível da água de modo que os peixes possam consumir aresteva da lavoura na totalidade do quadro. Os peixes habitam este quadro por aproximadamente oito meses,aproveitando como alimento a resteva do arroz, o plâncton formado naturalmente na água e os alimentos do lodo(bentônicos, sementes de invasoras e larvas de insetos). Nestes meses existe a redução do banco de sementesde invasoras do solo, o preparo e a fertilização do solo através da ação do peixe e o crescimento dos peixes. Nomês de outubro ocorre a despesca dos peixes adultos e a semeadura da nova safra de arroz, reiniciando o ciclo.

O peixe no sistema

As funções do peixe no sistema de rizipiscicultura são o preparo do solo (com eliminação da resteva), o controlede invasoras (inços) e o controle de pragas. Para obter tais resultados, são utilizadas espécies de peixes(carpas) que possuem hábitos alimentares diferenciados, facilitando a execução deste trabalho. Descreveremos,a seguir, as principais ações destes animais:

Carpa Húngara (Cyprinus carpio variedade húngara): É a espécie de peixe que revolve o solo à procura deinsetos, organismos do lodo e sementes de invasoras. Por ter hábito alimentar onívoro (come de tudo), "engole"o lodo, separa o seu alimento e regurgita as sobras, realizando, assim, o trabalho de preparo do solo. É aespécie mais importante no sistema, pois é através dela que obtemos o preparo do solo para a semeadura dapróxima safra de arroz, sem a utilização de máquinas e a fertilização do solo através da incorporação doesterco.

Carpa Capim (Ctenopharyngodon idella): Esta espécie alimenta-se de vegetais superiores, como por exemplo aplanta do arroz e gramas boiadeiras. A carpa capim é a responsável pela eliminação da resteva e das ervasinvasoras .

Carpa Prateada e Carpa Cabeça Grande (Hypophthalmicthys molitrix e Aristichthys nobilis): Estas duas espéciespossuem hábitos alimentares semelhantes, são filtradoras de plâncton. A carpa prateada filtra somente ofitoplâncton e a cabeça grande somente o zooplâncton, aproveitando assim o alimento natural na água.

A criação conjunta destas quatro espécies é o que caracteriza o sistema chamado "Policultivo de Carpas".

Densidade de peixes

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Os trabalhos desenvolvidos em propriedades mostraram bons resultados (preparo de solo satisfatório) comlotação de 3.000 alevinos por hectare. Pode-se, todavia, utilizar densidade média de até 4.500 alevinos se otécnico estiver em dúvida sobre a existência de fatores que aumentem o índice de mortalidade como, porexemplo, predadores.

Percentual das espécies de peixe

Para obter um bom preparo de solo, com a densidade referida, utiliza-se o seguinte percentual por espécie.

Carpa Húngara 70%

Carpa Capim 20%

Carpas Filtradoras 10%

Limite detectado no processo: os predadores

É importante ter presente que o descuido no controle da ação dos predadores pode inviabilizar o sistemaproposto. Deste modo, o ponto-chave para o sucesso da rizipiscicultura depende do cuidado do produtor comestes predadores. Uma técnica recomendada sugere que, ao final de cada ciclo (outubro, após a despesca), sejafeita a desinfecção do refúgio com cal virgem. Em condições de campo, observa-se que o índice normal demortalidade dos alevinos, desde a colocação no quadro até a despesca, é da ordem 50%.

Muitos são os predadores que atacam os peixes, principalmente na fase inicial, quando os cuidados devem serredobrados. Os predadores aquáticos são: traíra, jundiá, lambari, muçum, jacaré, tartaruga e cobra d'água, entreoutros. Recomenda-se a utilização de barreiras físicas como filtros nas entradas e saídas de água. As telasplásticas de malha fina são úteis na entrada de canos de PVC. No caso de canais de terra que alimentam osquadros, recomenda-se filtro com britas grossas.

Os predadores aéreos são: garça, martim-pescador, bem-te-vi e biguá, entre outros pássaros. Recomenda-se autilização de espantalhos mecânicos (canhões a gás), o uso de espantalhos luminosos e/ou de cachorroadestrado.

Alguns outros limitadores podem ser arrolados, como por exemplo áreas inundáveis ou de topografia acidentada,porém, esses são fatores que também inviabilizam o arroz pré-germinado e, conseqüentemente, arizipiscicultura.

Resultados do sistema

a) Arroz irrigado

Os resultados das lavouras testadas demonstram valores de produtividades similares às lavouras de arroz nosistema pré-germinado (6.500 kg/ha), dentro da mesma propriedade. Salienta-se que o uso do peixe no sistematem reduzido para próximo de zero o aparecimento de plantas de arroz vermelho, devido à redução do banco desementes invasoras no solo. Conseqüentemente, o arroz colhido tem sido comercializado na forma de sementecom maiores ganhos financeiros.

Deste modo, existem ganhos econômicos na redução de custos operacionais da lavoura (redução do uso demáquinas, eliminação do uso de agroquímicos e eliminação do uso de adubação mineral solúvel) e ganhos nosvalores de comercialização, devido à ausência de arroz vermelho, permitindo a venda como sementes. Existeainda a possibilidade de venda como "arroz orgânico", aumentando ainda mais as vantagens econômicas.

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Com o objetivo de instrumentalizar avaliações das vantagens econômicas do sistema rizipiscicultura, estádisponível no anexo 1 o quadro "Análise receita/custos dos sistemas de cultivo de arroz: rizipiscicultura,convencional e pré-germinado" .

b) Peixe

O resultado médio das despescas nos quadros testados é de 1.000 quilogramas de biomassa de peixe porhectare no período de 12 meses. Salienta-se que os peixes têm peso individual de 600 a 800 gramas, nãoestando adequados ao atual mercado consumidor, exigindo uma fase posterior de engorda em açudes depiscicultura ou a reutilização destes mesmos animais, a partir de março, nas lavouras de arroz que nãorealizaram a alevinagem em outubro.

A aceitação dos peixes da rizipiscicultura no mercado consumidor de peixe cultivado é muito boa, tendoocupado espaço relevante. Do mesmo modo que o arroz da rizipiscicultura, o peixe do sistema pode sercomercializado como "peixe ecológico", ampliando-se as vantagens econômicas.

Conclusões

1. O sistema proposto apresenta-se potencialmente como uma forma sustentável, agroecológica eeconomicamente viável de produção de arroz que, entretanto, necessita de adequação e adaptação aosdiversos agroecossistemas.

2. Devido ao trabalho dos peixes, restam apenas como operações mecanizadas a semeadura e a colheita.Deste modo, no sistema há uma forte redução no uso de máquinas.

3. Não é necessário o uso de nenhum agroquímico no decorrer do sistema.

4. Houve vantagens econômicas na utilização do sistema devido à redução dos custos da lavoura arrozeirae incremento de venda devido à venda dos peixes.

Anexo 1

Análise receita/custo dos sistemas de cultivo de arroz: rizipiscicultura, convencional epré-germinado

Sistema de produção de arroz Receita Total (ha) Custos totais (ha)Custos diretos + Margem Bruta (ha)

Rizipiscicultura

Pré-germinado

Convencional

2.560,00

1.560,00

1.074,00

1.219,00

888,00

1.058,00

1.314,00

672,00

16,00

Manual Prático de Rizipiscicultura, EMATER/RS, 1999.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BERNARDO, S. Manual de irrigação. 3.ed.. Viçosa: UFV, 1984. 463 p.

COTRIM , Decio. Manual Prático de Piscicultura. Porto Alegre: EMATER/RS, 1998. 38p.

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COTRIM, Decio et al. Manual Prático de Rizipiscicultura. Porto Alegre: EMATER/RS, 1999.

DÍAZ, A., Carboneli, J. Adecuación de tierras para la siembra de arroz. In: ARROZ: investigación yproducción. Cali: CIAT, 1985. p. 159-181

BRASIL. Ministério da Agricultura. Secretaria Nacional da Produção Agropecuária. Provárzeas Nacional: 1 havale por 10 . Brasilía, 1982. 254 p .

CAI, Renkui, NI, Dashu, WANG, Jianguo. Rice-Fish Culture in China: the past, present and future.,1998.(http://www.idrc.ca/books/focus/776/cairenk.html)

VERONEZZI, L. Aproveitando o esterco. A Granja, Porto Alegre, v.40, n.435, p.16-18, abr.1984.

* (1) Eng. Agr., Extensionista Rural da EMATER/RS, Escritório Regional Metropolitano. Rua Botafogo, 1051,Bairro Menino Deus, Porto Alegre (RS), Fone 233-3144 ramal 2220, (e-mail: [email protected]), (2) Eng.Agr., Extensionista Rural da EMATER/RS, Divisão Técnica. Escritório Central, (3) Eng. Agr., Extensionista Ruralda EMATER/RS, Escritório Municipal de Santo Antônio da Patrulha, (4) Eng. Agr., Extensionista Rural daEMATER/RS, Escritório Regional Metropolitano, (5) Med. Vet., Extensionista Rural da EMATER/RS, EscritórioRegional Metropolitano, (6) Med. Vet., Extensionista Rural da EMATER/RS, Divisão Técnica. Escritório Central,(7) Tec. Agr., Extensionista Rural da EMATER/RS, Escritório Municipal de Santo Antônio da Patrulha, (8) Tec.Agr., Extensionista Rural da EMATER/RS, Escritório Municipal de São Sebastião do Caí, (9) Tec. Agr.,Extensionista Rural da EMATER/RS, Escritório Municipal de Pantano Grande.

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Artigo

Consórcio de mandioca com crotalária - efeitos sobre plantas espontâneas*

Schaffrath, V. R** e. Miller, P. R. M.***

O objetivo deste trabalho é identificar novas espécies de leguminosas que se adaptem a este tipo de manejo, tolerantes abaixa fertilidade do solo e de uso exclusivo para a adubação verde.

Resumo

O cultivo de mandioca consorciado com adubos verdes apresenta características interessantes ecológica, econômica esocialmente. Bem manejado, traz vantagens para a pequena propriedade familiar. Este trabalho comparou mandioca solteira comadubação nitrogenada e mandioca consorciada com leguminosas, para avaliar os efeitos dos dois sistemas sobre as plantasespontâneas. Observou-se uma redução muito significativa na ocorrência de plantas espontâneas nos tratamentos consorciados(13,68%) em relação aos de cultivos solteiros (66,08%), demonstrando a eficiência do cultivo consorciado. A análise de co-variância explicou melhor a variação entre parcelas do que a análise de variância simples, demonstrando a utilidade destaferramenta estatística para pesquisa em sistemas de produção da pequena propriedade familiar.

Foi utilizado um delineamento experimental de blocos casualizados, e a análise estatística foi feita com e sem uma co-variável, aaltura da mandioca aos 150 dias.

Introdução

O consórcio da cultura da mandioca com outras culturas é bastante tradicional, nas pequenas propriedades familiares, em SantaCatarina, e apresenta características distintas dos seus respectivos monocultivos, pois surgem várias interações que nãoocorreriam no cultivo solteiro. As principais vantagens potenciais dos cultivos consorciados são: maior estabilidade de produção(principalmente em áreas de instabilidade climática), interceptação mais efetiva da radiação luminosa, melhor utilização da terra,maior retorno por unidade de área, melhor exploração de água e nutrientes nas diferentes camadas de solo, melhor utilização daforça de trabalho (muito importante em pequenas propriedades familiares), maior eficiência no controle de plantas espontâneas _melhor equilíbrio da população de pragas e doenças, melhor proteção do solo pela cobertura foliar e sistema radicular,disponibilidade de mais de uma fonte alimentar e maiores retornos econômicos_ Leihner, (1983), Mattos & Dantas, (1981) e Mattos& Souza, (1981) citados por Zanatta et al., (1993).

A consorciação da mandioca com leguminosas para adubação verde também não é inédita. Porém, os resultados de outrospesquisadores no Estado de Santa Catarina não são muito animadores, no sentido de que as leguminosas competem com acultura de interesse (Mondardo et al, 1983). No nosso trabalho buscamos identificar métodos de manejo das leguminosas, quepermitam um bom desempenho das plantas envolvidas no consórcio; diminua a intervenção do homem e permita um manejo dafertilidade do solo por tempo indeterminado, aportando nitrogênio através das leguminosas, e reciclando os demais nutrientes.Estes atributos são particularmente importantes em areias quartzosas, que caracterizam uma extensa faixa de solos que ocupatodo o litoral de Santa Catarina, (2,2 % da área cultivada do Estado). Estes solos são de baixa fertilidade química e apresentamproblemas de erosão eólica e hídrica. O uso de culturas de cobertura do solo podem atenuar os problemas de erosão eprincipalmente melhorar a fertilidade, permitindo melhores colheitas das culturas subseqüentes ou intercalares (Amabile et al.,1994).

A mandioca é uma cultura de desenvolvimento inicial lento e de ciclo longo, por isso, uma cultura intercalar que auxilie nacobertura do solo, aporte nutrientes e permita um maior equilíbrio biológico do sistema, é extremamente interessante sob todos osaspectos, quando comparada com os sistemas tradicionais de monocultivo. Nas areias quartzosas, mais que em outros solos,outras culturas comerciais exigem maior aporte de insumos do que a mandioca. Portanto, em sistemas com poucos insumosexternos e sem pousios prolongados para recuperar a fertilidade do solo, a mandioca tem sido cultivada em monocultura, o queacaba por acelerar a degradação do solo.

O objetivo geral deste trabalho é identificar novas espécies de leguminosas que se adaptem a este tipo de manejo, tolerantes àbaixa fertilidade do solo e de uso exclusivo para a adubação verde. A presença de uma cultura intercalada tem ainda efeitosbenéficos no sentido de diminuir os espaços biológicos vazios no solo, que certamente viriam a ser ocupados por outras espécies,muitas vezes indesejadas (Widdowson, 1993). O objetivo específico foi a avaliação fitossociológica das espécies de plantasespontâneas das parcelas experimentais e buscou-se fazer uma relação dos fatores envolvidos para explicar a maior ou menorpresença de plantas espontâneas e também das espécies de maior ocorrência.

Material e métodos

Este experimento foi realizado na fazenda experimental do Centro de Ciências Agrárias - UFSC, no bairro da Ressacada, emFlorianópolis, Santa Catarina., no período de setembro de 1994 à julho de 1995. O solo, classificado como areia quartzosahidromórfica (UFSM, 1973), foi preparado pelo sistema convencional, com aração e gradagem, numa área com histórico deutilização como pastagem. Uma coleta de amostras de solo foi realizada, seguindo-se os padrões de altura da mandioca: alta,média e baixa, aos 84 dias do plantio, cujos resultados estão apresentados na Tabela 1.

O ensaio foi realizado com cinco tratamentos e quatro repetições (Tabela 2). A adubação nitrogenada em cobertura foi comparada

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com o uso de leguminosas intercaladas na fase inicial de crescimento da mandioca. O tratamento testemunha não recebeuadubação e foi cultivado solteiro. As parcelas utilizadas foram de 6 x 8 m ( 48 m2); a mandioca foi plantada com 0,8 m entre linhase entre manivas, com um total de 7 linhas de mandioca em cada parcela. O ensaio foi realizado em blocos completoscasualizados, com cinco tratamentos e quatro repetições.

As leguminosas foram semeadas nas entrelinhas simultaneamente com o plantio das manivas. As adubações nitrogenadas foramefetuadas em duas etapas, aos 56 e 70 dias do plantio, com metade da dose em cada etapa, (89 kg de uréia no tratamento com 80kg de N/ha, e 44,5 kg de uréia no tratamento com 40 kg de N/ha, em cada etapa). Aos 90 dias do plantio, as entrelinhas de todosos tratamentos foram roçadas, a 15 cm do solo, com uma roçadeira costal motorizada, objetivando-se manejar as leguminosas eas demais plantas espontâneas do sistema.

A avaliação da cobertura do solo nas entrelinhas, por leguminosas ou por outras plantas foi realizada em 25/02/95, 150 dias após oplantio. Foi esticado uma trena, transversalmente, dentro da 2ª e 5ª entrelinha de cada parcela, em baixo da mandioca; foramobservados pontos perpendiculares à trena a cada 20 cm, num total de 80 por parcela, que permitiram avaliar a presença ouausência de cobertura do solo. A altura da mandioca foi mensurada com uma régua de madeira a cada duas fileiras e dois metrosdentro de cada uma delas, num total de 15 amostras por parcela, na mesma época da avaliação da cobertura do solo. Os dadosforam avaliados estatisticamente através de análise de variância, co-variância e testes de separação de médias.

Resultados e discussão

Cobertura do Solo

O consórcio com crotalárias diminuiu significativamente a ocorrência de outras espécies de plantas no sistema (13,68 %), quandocomparada com os tratamentos sem crotalárias (66,08 % em média). A figura 1 demonstra as interações entre a crotalária e asplantas espontâneas. A cobertura do solo por espécies plantadas e espontâneas demonstram a eficiência do consórcio de culturaspara diminuir a interferência humana no manejo das plantas espontâneas. Isto é um indicativo de que sendo o sistema bemmanejado, a interferência do homem pode ser reduzida, principalmente no controle de plantas espontâneas, que é a maiordemanda de mão-de-obra nos sistemas em monocultivo de mandioca tradicionais, em pequenas propriedades.

A amostragem da altura da mandioca aos 150 dias do plantio mostra que não houve efeito dos tratamentos sobre a altura damandioca (tabela 3). Nos tratamentos com nitrogênio solúvel esperava-se maior altura das plantas de mandioca, o que nãoocorreu, isto pode ser justificado pelo fato de que normalmente ocorrem perdas significativas de nitrogênio por lixiviação,especialmente nos solos de areia quartzosa.

Composição florística

As espécies de plantas espontâneas de maior ocorrência cobrindo o solo no sistema foram: Paspalum conjugatum (grama forquilha- 20,0 %), Borreria latifolia (erva quente - 7,3 %), Waltheria indica (malva branca - 3,15 %), Commelina benghalensis (comelina -1,85 %) e Cyperus esculentus (tiririca - 1,0 %). Houve uma especialização de determinadas plantas em determinados tratamentosrefletindo, provavelmente, a fertilidade natural do solo e as diferenças de nutrição dentro dos tratamentos (Figura 2).

A testemunha apresentou uma miscelânea de espécies, com predominância de gramíneas que refletem o menor teor de fertilidadee maior incidência de luz no estrato inferior do tratamento. Enquanto que os tratamentos com adubação nitrogenada apresentaramespécies mais específicas, provavelmente com maior capacidade de aproveitamento do nitrogênio em abundância, no início doexperimento - como exemplo se pode citar a erva quente (B. latifolia), além das gramineas. Já os tratamentos com crotaláriasapresentaram situação intermediária entre os dois extremos, demonstrando um maior equilíbrio do sistema, onde algumasespécies vegetais, além da leguminosa e mandioca, conseguiram se manter de forma mais equilibrada, com um menor número deindivíduos de cada espécie.

Pôde-se comprovar que houve uma especialização das plantas que ocupam o estrato inferior do sistema consorciado, onde ascondições criadas pela altura da mandioca (sombreamento) e a ocupação deste estrato pela leguminosa acabam por impedir osurgimento e/ou a permanência de outras espécies de plantas espontâneas. Algumas plantas se adaptam às condições criadas epermaneçem vegetando no sistema consorciado. Este sistema mantém um número reduzido de espécies espontâneas, quenormalmente acabam por não afetar o rendimento das culturas de interesse econômico.

Análise estatística

Na Tabela 4, são apresentados os valores da análise de variância e co-variância, para os dados de cobertura do solo por plantasespontâneas. A co-variável é significativa e reduz a soma dos quadrados do resíduo. A co-variável introduzida, altura da mandioca,fácil de avaliar e que reflete as condições de fertilidade do solo (Tabela 1) pode melhorar a nossa compreensão a respeito docomportamento biológico dos tratamentos analisados.

Fazendo-se um estudo comparativo da separação de médias usando análise de variância e de co-variância, podemos ver como aintrodução de uma co-variável melhora a separação das médias do tratamentos na tabela 5. Em experimentos futuros, commétodos que levam em conta a variabilidade dos solos, pode-se obter resultados mais exatos dos efeitos que cada variávelbiológica tenha sobre os resultados obtidos. Os autores Souza, Diniz e Caldas (1996) obtiveram resultados semelhantes, quando,além do uso da co-variância, utilizaram a análise do vizinho mais próximo, e conseguiram melhorar o coeficiente de variação de

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um experimento com clones de mandioca, onde a grande variabilidade do solo era o fator de maior dispersão dos dados.

Considerações finais

O consórcio com crotalárias diminuiu a ocorrência de plantas espontâneas de 66,08% nos tratamentos sem consórcio, para13,68% nos tratamentos com consórcio. Houve predominância de gramíneas no tratamento testemunha, gramíneas e erva quentenos tratamentos com adubação nitrogenada, e uma miscelânea de espécie em número reduzido nos tratamentos comleguminosas, refletindo uma tendência do sistema se manter em equilíbrio, sem que uma espécie domine totalmente as outras.

Culturas consorciadas costumam ter mais interações entre as espécies e estas interações são mais afetadas por pequenasvariações no ambiente físico. Isso acaba elevando a variação entre parcelas em ensaios com delineamento convencional, muitasvezes inviabilizando a interpretação dos dados com os métodos normais de análise. A análise de covariância explicou melhor avariação entre parcelas do que a análise de variância simples, demonstrando a utilidade desta ferramenta estatística. Estas eoutras ferramentas são necessárias para adaptar os métodos convencionais de pesquisa aos sistemas de produção da agriculturafamiliar.

Tabela 1: Resultados da análise de solo, coletado sob mandioca com altura inicial diferente, CCA - UFSC, 1997.

Altura da mandioca pH M.O.*** P ** K

*Ca+Mg

*Al*

Porte baixo 4,20 1,90 2,95 26 1,5 0,8Porte médio 4,17 2,90 3,70 30 1,4 0,8Porte alto 4,05 3,70 2,10 26 1,2 0,8*** em%; ** em ppm; * em m.eq./dl

Tabela 2: Tratamentos utilizados no cultivo de mandioca com leguminosas, para a análise das plantas espontâneas, CCA -UFSC, 1997.

TRATAMENTOS SÍMBOLOSMandioca solteira com adubação nitrogenada de 40 kg/ha 40 kg N/haMandioca solteira com adubação nitrogenada de 80 kg/ha, 80 kg N/haMandioca consorciada com crotalária grantiana C. grantianaMandioca consorciada com C. grantiana e crotalaria lanceolata C. grant. + C. lanc.Mandioca solteira sem adubação nitrogenada e sem consórcio Testemunha

Tabela 4: Valores comparativos da análise de variância e co-variância para a percentagem de cobertura do solo porplantas espontâneas, CCA - UFSC, 1997.

Análise de variânciaGraus de

liberdade

Soma dosQuadrados Quadrado médio Valor de F Valor de P

Blocos 3 1.596 533 1,04 .4026Tratamentos 4 15.994 3.999 7,79 * .0011 *Resíduo 16 8.205 513 -- --Análise de co-variânciaFatores

Graus deliberdade

Soma dosQuadrados Quadrado médio Valor de F Valor de P

Blocos 3 2.564 855 2,62 .0893Tratamentos 4 14.721 3.680 11,27 * .0002 *Altura 1 3.305 3.305 10,12 * .0062 *Resíduo 15 4.900 327 -- --· Demonstra que os valores são significativos a 5%.

Tabela 5: Valores médios de cobertura do solo por plantas espontâneas e a sua significância frente duas análises estatísticasdiferenciadas, usando-se os tratamentos na análise de variância e os tratamentos e a altura na análise de co-variância, CCA -UFSC, 1997.

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Tratamento % de cobertura do solopor plantas espontâneas

separação de médias comanálise de variância

separação de médias com análise deco-variância

C. grantiana + C. lanceolata 1 a aC. grantiana 26 ab aTestemunha 62 bc bAdubação 40 kg N/ha 63 bc bAdubação 80 kg N/ha 74 c b* Médias seguidas de mesma letra não diferem significativamente entre si, pelo teste Tukey a 5%.

Referências BibliográficasAMABILE, R. F., CORREIA, J. R., FREITAS, P. L. de, BLANCENEAUX, P., GAMALIEL, J. Efeito do manejo de adubos verdes na produção de mandioca (Manihotesculenta Crantz). Pesq. Agrop. Bras. Brasília, v. 29, n. 8, p1199, ago. 1994.

LEIHNER, D. Yuca en cultivos associados: manejo e evaluación. Cali. CIAT, 1983. 80 p. apud ZANATA, J. C., SCHIOCCHJET, M. A ., NADAL, R. de, MandiocaConsorciada com milho, feijão ou arroz de sequeiro no Oeste Catarinense. Florianópolis: EPAGRI, 1993, 37 p. (EPAGRI Boletim Técnico, 64)

MATTOS, P. L. P. de; DANTAS, J. L. L. Utilização do cultivo da mandioca consorciada com feijão. Cruz das Almas. EMBRAPA-CNPMF, 1981. 22p. (EMBRAPA-CNPMF. Circular Técnica, 2) apud ZANATTA, J. C., SCHIOCCHET, M. A ., NADAL, R. de, Mandioca consorciada com milho, feijão ou arroz de sequeiro no OesteCatarinense. Florianópolis: EPAGRI, 1993. 37 p. (EPAGRI Boletim Técnico, 64).

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MONDARDO, E., MORAES, O. De, FROSI, J. F., TERNES, M. Mandioca em fileira dupla consorciada com leguminosas no Sul de Santa Catarina. Florianópolis:EMPASC, 1983, 7 p. (comunicado técnico, 63).

ZANATTA, J. C., SCHIOCCHET, M. A., NADAL, R. de. Mandioca consorciada com milho, feijão ou arroz de sequeiro no Oeste Catarinense. Florianópolis:EPAGRI, 1993. 37 p. (EPAGRI Boletim Técnico, 64).

SOUZA, L. da S., DINIZ, M. de S., CALDAS, R. C. Correlação da interferência da variabilidade do solo na interpretação dos resultados de um experimento de

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA. Levantamento de reconhecimento dos solos do Estado de Santa Catarina. Porto Alegre: 1973. 490 p.

WIDDOWSON, R. W. Hacia una agricultura holistica. Un enfoque científico. Buenos Aires: hemisfério Sur, 1993. 270 p.

* Este artigo é parte da Dissertação de Mestrado em Agroecossistemas do primeiro autor.

** Eng. agro. MSc em Agroecossistemas. CREA-PR 55099-D, Rua Tietê, 43, Bairro Zona 7, CEP 87020-210 - Maringá (PR) e-mail:[email protected]

*** Dr. Em Ecologia. Professor do Depto.Eng. Rural, Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Santa Catarina CP476, Florianópolis, SC 88010-970 e-mail: [email protected]

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Alternativa Tecnológica

Produção de leite a pasto / Pastoreio Rotativo

Kirchof, Breno*

As pequenas propriedades familiares podem obter maior produção de leite, com menor custo, usando melhor as pastagens.Hoje, como antigamente, as pequenas propriedades agrícolas possuem somente um, ou no máximo dois, potreiros paraseus animais. Como conseqüência, algumas partes do potreiro nunca são pastejadas e as partes pastejadas nãoconseguem se recuperar porque, quando rebrotam, são imediatamente consumidas. As pastagens começam a se degradare acabam sendo tomadas pelos pastos menos produtivos, pelos inços e arbustos.

A mudança do pastoreio num potreiro para o pastoreio rotativo (vários piquetes) é a primeira atitude para melhorar arentabilidade da exploração leiteira.

Com isto, estarão melhorando a sustentabilidade de suas propriedades e produzindo um leite mais barato e mais ecológico.Também, é importante que o produtor tenha boas pastagens, tenha um número de vacas com razoável padrão zootécnicoe que saibam manejar adequadamente estes pastos.

A EMATER/RS vem trabalhando esta idéia com os pequenos produtores de leite, faz três anos. Os resultados alcançadosforam além da expectativa, tanto que hoje já existe um número muito grande de produtores que adotaram este esquema,principalmente na Região Noroeste do Estado.

O manejo é uma parte fundamental na produção e durabilidade dos pastos. O manejo tem por objetivo ter disponível umpasto jovem e abundante para as vacas na maior parte do ano e que este pasto não se degrade. Isso é conseguidodividindo-se a área dos pastos, fazendo pastoreio rotativo e fazendo-se adubação orgânica.

Para dividir a área de pastagens usa-se a cerca elétrica fixa. Os piquetes devem estar localizados perto da sala de ordenhae da casa para facilitar o controle. O pastejo das vacas dura, no máximo, um dia e deve-se ter, no mínimo, 30 piquetes.Calcula-se o tamanho de cada piquete em 50 metros quadrados por vaca por dia. A quantidade de vacas na propriedade éa chave para determinar o tamanho dos piquetes.

Os piquetes devem ser desenhados com um corredor que permita o manejo fácil das vacas e sendo possível, permita àsvacas procurarem sombra nos dias mais quentes do ano. Cada dois piquetes devem ter uma torneira com água quepermita acoplar um pequeno bebedouro móvel. A água nos piquetes é muito importante, uma vaca necessita de 50 litros deágua por dia que deve estar à disposição nos piquetes. Os piquetes também devem ter um cocho móvel para sal mineral.

No manejo, um fator importante é que não deve sobrar pasto após a passagem das vacas. No caso de haver sobra estadeve ser ceifada. Há a possibilidade de integração das vacas leiteiras com ovinos. Os ovinos devem seguir as vacas nospiquetes onde comerão o pasto que as vacas não consumiram. Com esta integração não necessitamos cortar o pasto quesobrou e temos outra fonte de renda com os ovinos. Após a saída dos animais, deve-se espalhar o esterco e se for o casoaplicar a adubação orgânica.

No primeiro pastoreio devemos usar animais mais leves (jovens). O esquema é fazer o primeiro uso deixando os animaisapenas pela manhã. No segundo uso deixar os animais de manhã e à tarde e no terceiro uso o dia inteiro. Em agosto,setembro e outubro é o início do uso mais intenso dos pastos, deve-se acompanhar a sobra ou falta de pasto. Emnovembro, dezembro, janeiro e fevereiro considera-se o uso normal, as sobras de pasto devem ser cortadas para feno ousilagem. Em março, abril e maio deve-se readequar o uso à disponibilidade do pasto. Nos meses de junho e julho o usovisa sempre a manutenção do pasto e é mais esporádico. O pastejo inicia somente quando o pasto jovem está na alturaadequada.

Se a pastagem sofrer por seca ou geada, a primeira providência é diminuir o tempo de permanência dos animais e noscasos mais graves retirar os animais. Na época de muito pasto cuidar para não passar do ponto porque os animais não dãoconta. Neste caso deve-se ceifar os piquetes que sobram para fazer feno ou silagem. Se deixar o pasto passar do pontoele ficará velho, aumentará a fibra, baixará a proteína e a digestibilidade.

No pastoreio rotativo aumenta a produção de leite porque há um aumento da proteína e da energia nos pastos, que ficamcom um valor muito mais alto do que num pasto sem este manejo, conforme podemos ver na informação a seguir:

Com o pastoreio rotativo, a produção de leite é maior e mais estável porque as vacas estão recebendo, todos os dias,pasto no ponto ótimo de consumo para a época. Os dados de produção de leite, a seguir, são de duas propriedadesemelhantes quanto ao rebanho:

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Propriedade A- Pastoreio rotativo: nenhuma queda brusca na produção de leite que lentamente diminui a produção daprimavera ao outono.

Propriedade B- Potreiro único: menor produção de leite, quedas bruscas de produção e queda acentuada na entrada dooutono.

Com o pastejo rotativo diminui os inços e melhora a digestibilidade do pasto, como podemos ver pelos dados a seguir:

Através do corte regular, com sobra adequada e boa adubação do esterco, melhora a produção do conjunto de gramíneas eleguminosas no piquete. O pasto duro e os inços diminuem bastante. A melhora da qualidade do pasto traz comoconseqüência uma maior produção de leite e das sobras de pasto um feno ou silagem de melhor qualidade.

Junto aos piquetes deve haver uma área de sombra para que os animais possam se abrigar nas horas mais quentes dodia. Esta área de sombra pode ser um mato limpo, algumas árvores ou uma área coberta. Nas horas mais quentes doverão, mais ou menos das 10 horas até as 16 horas as vacas devem permanecer na sombra. Num bom pasto as vacasnão necessitam mais do que 4 a 5 horas para encher o rúmen, o que pode ser feito pela manhã e a tardinha sem prejuízopara a produção.

Com este sistema, usamos em torno de 1.600 metros quadrados por vaca, contra, no mínimo, 5.000 metros quadradosusados no método convencional.

Bibliografia

KLAPP, E. Wiesen und Weiden. 4.ed. Berlim: Paul Parey, 1971. 620p.

*Engenheiro Agrônomo da EMATER/RS. Escritório Central, fone (51)233-3144

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Artigo

Comunicación de innovaciones ambientalesPara un replanteo de la teoría clásica

Cimadevilla, Gustavo*

Resumen

La teoría clásica sobre la difusión y adopción de innovaciones, así como los enfoques teóricos de lamacroeconomía, han dejado de lado el análisis de la circulación y adopción de innovaciones vinculadas aracionalidades que no siempre responden a principios económicos, como por ejemplo las ambientales. Lasclásicas categorías de la capacidad de difusión de esos bienes merecen entonces revisarse a la luz de lacomplejidad comunicacional que suponen y sus posibilidades de extensión.

Palabras-clave: innovaciones, adopción, difusión, tecnología, ambiente

Introducción

La teoría clásica sobre la difusión y adopción de innovaciones (Rogers, 1962), centrada en los procesos deinformación, decisión y caracterización de los adoptantes y la tecnología y racionalidades modernas, así comolos enfoques teóricos del campo de la macroeconomía sobre los paradigmas tecnoeconómicos dominantes ysus procesos de hegemonización (Schumpeter, 1939; Mandel, 1986; Huber, 1986; Ominami, 1986), o losestudios del valor relativo o determinante del impacto tecnológico en el medio social (Elster, 1990), han dejadode lado, por ejemplo, el análisis de la circulación y adopción de innovaciones ambientalmente compatibles (IAC)con una racionalidad social crítica, por lo general no vinculada a una necesaria búsqueda de mayor producción yproductividad económica, sino de una preocupación con el ambiente y el futuro de existencia y calidad de vidade las especies.

Para ese marco, las clásicas categorías evaluativas de la capacidad de difusión de las tecnologías según su: a)ventaja relativa; b) grado de compatibilidad; c) complejidad; d) divisibilidad; y e) observabilidad -ligadas en mayorgrado y específicamente a la lógica de la producción-, parecen no dar cuenta de los procesos sociales en losque aquellas tengan cabida y requieren de un nuevo enfoque comunicativo que privilegie la lectura de sucapacidad de difusión como bienes intangibles y de alta complejidad conceptual. Algunos resultados de nuestrasinvestigaciones recientes (Cimadevilla, Carniglia, 1994; 1995; 1996; 1997) permiten iniciar esa discusión.

Acerca de las innovaciones

Pero ¿de qué estamos hablando cuando el objeto de análisis son las innovaciones? En general hay acuerdo endesignar como innovaciones a las ideas, métodos u objetos que pasan a considerarse nuevos en un determinadoambiente sociocultural. Si bien para ciertos intelectuales de mediados de este siglo -Barnett, Douglas - no hayuna diferencia sustantiva entre este término y el de invención, en la tradición schumpeteriana, la literaturadifusionista y los aportes posteriores se prefirió discriminar ambos conceptos. Así, la innovación se asocia a laidea de que algo es percibido como nuevo, independientemente de cuándo o dónde haya sido generado. Sereserva el término invención, por el contrario, para el descubrimiento o generación de lo nuevo (Rogers, 1971;Quesada, 1980; Van den Van y Hawkins, 1996). Elster (1990) y Pérez (1986) -siguiendo a Schumpeter-, en tanto,prefieren hablar de invención para referirse a la creación de alguna idea científica, teoría o concepto que,trasladado al campo de los procesos productivos, luego pasará a convertirse en innovación.

Las múltiples discusiones a su entorno, se han detenido también en el análisis de los calificativos queacompañan al término. Por ejemplo, en cuanto a si necesariamente una innovación se supone un bientecnológico o no (innovación tecnológica), si el término se reserva sólo para los bienes con valor económico(innovación productiva) o si podemos hablar de innovaciones sociales o culturales (como bien podría designarse,respectivamente, a los graffitis o a ciertas instituciones antes no conocidas y ahora más o menos generalizadas

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como los movimientos de defensa del ambiente, por citar dos casos). Lo cierto es que, más allá del encuadreque puede asumir un determinado análisis, el concepto ha sido útil para analizar como en los procesos decambio social aparecen elementos nuevos que lo explican y que, a decir de Barnett (op. cit., 1986), difierencualitativamente por ser diferentes de los antes existentes.

Ahora, como en la literatura vinculada al cambio social decididamente la dimensión de lo económico ha sidodominante, quizás porque es el terreno obligado en donde se dirime el modo por el cual el hombre resuelve suexistencia material, el término ha cobrado especial relevancia en los análisis económicos. Desde la obra deMarx, en la que el cambio técnico ocupa un capítulo específico para explicar el desarrollo del capitalismo , hastael replanteo Schumpeteriano o los enfoques contemporáneos de los paradigmas tecnoeconómicos , lainnovación -particularmente tecnológica y productiva- ha cobrado dimensión en la literatura como responsable depeso en las grandes transformaciones de los dos últimos siglos.

Para Marx, sostiene Elster (1990), el cambio tecnológico -en cuanto desarrollo de las fuerzas productivas- era elprincipal motor de la historia. La innovación, en ese marco, estaba en función del desarrollo de las fuerzasproductivas y, por tanto, era una variable explicativa con significado propio. Al igual que en el pensamientoneoclásico, se interpretaba la aparición de una innovación en cuanto ésta se debía a cierta elección racional delempresario que estaba en busca de una maximización de sus ganancias. Esa lectura racional de unacombinación de medios para la obtención de fines, tuvo posteriormente con Schumpeter cierto replanteo de sulógica de funcionamiento. Si bien para este autor la innovación era la principal causa de las fluctuacionescíclicas de la economía y el motor del desarrollo productivo, la explicación de su irrupción en la economía teníaque ver con factores muchas veces irracionales vinculados a la psicología del empresario, más que a unadecisión de calculada especulación económica. Este acento en el costado menos predecible de la conductahumana, se apoyaba en la tesis de que el empresario tiene sueños y voluntades de encontrar un reino privado; lavoluntad de conquistar y de tener éxito no por los frutos, sino por el éxito mismo; y finalmente por disfrutar de laalegría de crear, de ¨que las cosas se hagan¨ (Elster, 1990:107) .

Los planteos actuales del cambio tecnológico a nivel de macroestructuras, por su parte, parecen rescatar elpapel paradigmático atribuido a la tecnología cuando de innovaciones se trata . Así, se sostiene que cuandocierta innovación radical tiene la capacidad de conformar una constelación de sistemas tecnológicos , sudifusión se concreta a lo largo y ancho del sistema productivo transformándolo: ¨La revolución industrial enInglaterra, la ¨era del ferrocarril¨ a mediados del siglo pasado, la electricidad y el acero Bessemer en la ¨BelleEpoque¨, el motor de combustión interna, la línea de ensamblaje y la petroquímica en el reciente ¨boom¨ depostguerra (y la microelectrónica de nuestra era), son todos ejemplos de este tipo de revoluciones de impactogeneralizado capaces de transformar el modo de producir, el modo de vivir y la geografía económica mundial¨,resalta Pérez (1986:48).

Ahora bien, aún cuando cambie el enfoque o el carácter más o menos determinista de las tesis que sepropongan para explicar el impacto tecnológico sobre el medio social, una constante sigue todos losrazonamientos, cual es, la de ambientar los planteos en torno a las funciones económicas que cumplen lasinnovaciones. O dicho de otra forma, la de procurar entender cómo se multiplica la presencia de una innovacióny por qué esta es aceptada a partir de los análisis de costo beneficio que determinado bien potencialmentepuede generar en un contexto productivo o social. Así, sea más o menos racional o irracional la conducta,macroestructural o localizada, es la economía la que le da sentido estratégico a las lecturas y la que endefinitiva justifica los análisis.

Acerca de los estudios

En la década de 60, E. Rogers (1962) - reconociendo múltiples tradiciones anteriores - se dispuso a sistematizarel conocimiento sobre el camino que las innovaciones seguían en su proceso de adopción. Para ello propusoobservar, a partir del cúmulo de investigaciones existentes, las cinco características que permitían discutir porqué variaba el índice de adopción entre unas y otras . Estas características eran: a) ventaja relativa; b) grado decompatibilidad; c) complejidad; d) divisibilidad; y e) observabilidad (comunicabilidad). Entendiendo por ello quetoda innovación implicaba o no: a) cierta superioridad en relación a la que suplantaba, b) cierto reconocimiento yconciliabilidad con los valores y costumbres vigentes en el lugar, c) cierto grado de comprensión defuncionamiento y uso, d) cierta experiencia de manipulación previa, y e) cierta visibilidad de los resultados oconsecuencias esperadas.

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En ese marco, entonces, una tarea significativa es la de tratar de identificar la serie de supuestos que dansentido a la selección de los criterios de análisis y permitan discutir su alcance. En primer lugar, la ventajarelativa como superioridad implica un procedimiento de juicio de valor respecto a cualidades que siempre seránrelativas a cierta dimensión de análisis. Por ejemplo, si un bien es superior a otro por ser más eficaz, lo será entérminos de los resultados que brinda y en un esquema valorativo donde el resultado sea el fin último para elsistema de valoración. Pero también podría ser superior por la regularidad en el funcionamiento, durabilidad,posibilidad de predicción mecánica o la combinación de varias de esas propiedades, entre otras, etc. Lasuperioridad, entonces, puede juzgarse por múltiples factores. La pregunta, en todo caso, es a través de quéfactor(es) es juzgada y qué nivel de coincidencia tiene o no ese criterio con el que la propia innovación define ypropone para su adopción. Dicho de otra manera, hasta qué punto esta característica es independiente de lapropia definición con la que el difusor establece el sentido de la innovación. Así, si por ejemplo el marco en queuna innovación cobra existencia como tal es el productivo, su superioridad o no será necesariamente valoradadesde esa dimensión económica de análisis.

Pero esto nos lleva a otra pregunta: ¿qué innovación no está en función de la producción o de uncomportamiento instrumental, en cuanto interesa a partir de la mensuración de costos y beneficios estrictamenteeconómicos a los que se atiene? Para el marco general y sistémico de nuestro contexto inmediato, sociedadesde mercado, de industrialización y de consumo, la respuesta no puede ser otra que la de la generalizaciónproductiva y, por tanto, de una lógica instrumental dominante. Y ello, aún cuando se aplique a políticas sociales,en las que se verifica -por ejemplo en el campo de la salud- que, salvo excepciones, las decisiones de vacunar opromocionar determinada profilaxis social se vincula más a la existencia de presupuestos y estrategias porcostos comparativos que a la estricta resolución del problema existente.

Ahora bien, este último aspecto nos lleva al análisis de la segunda característica tenida en cuenta, la de lacompatibilidad de la innovación con su medio de recepción. En ese sentido, para la evaluación tradicional sesupone que la no concordancia de valores vigentes y presentes en el bien pueden ser determinantes para elrechazo. Pero, ¿tienen los bienes por sí mismos valores intrínsecos o es el contexto de su aplicación el que lesguarda su sentido ideológico? Para el pensamiento marxiano, por ejemplo, los instrumentos carecían deideología fuera de su modo de producción. Serán sus seguidores , en todo caso, los que insistirán en el devenirtécnico ligado a los intereses de clase y a considerar a la ¨ciencia y técnica en cuanto ideología¨, dando lugar auna popularización de las lecturas que específicamente valoraban la técnica en sí. Lo cierto es que, desde una uotra perspectiva, si se busca el paradigma dominante de referencia para comparar o no la adecuación de unainnovación con su medio de recepción será fundamentalmente el de los valores que antes asociáramos a lasociedad de mercado, industrialización y consumo.

Si esto es así, en realidad lo que se juzga al evaluar la compatibilidad de una innovación es hasta qué puntoquien adopta ha incorporado ya o no esos valores dominantes. Por cuanto la innovación de por sí ya se suponefuncional a los intereses que están por detrás de su difusión.

Ahora bien, el tercer elemento a tener en cuenta es la complejidad que implica la innovación en cuanto grado dedificultad que presenta para que se comprenda y use. La dificultad en este caso es poder separar la experienciaque tiene su usuario o adoptante, y por tanto de lo que resulte en su relación con la innovación, de laspropiedades específicas del bien. Ejercicio que fácticamente no tiene sentido si lo que se busca es analizarlo entérminos de su potencial difusión y, por tanto, de su relación con los adoptantes. Así, se verifica entonces quesu grado de complejidad siempre es relativo a las audiencias que se toman como referentes y a su conocimientopráctico o sistematizado, por tanto, a cierto sentido de vivencialidad sobre la innovación.

Este último punto, que deriva en el problema de la posibilidad de manipulación de lo que pueda adoptarse, estoes, de la divisibilidad de lo que se difunde en tanto pueda ser experimentado sobre una base limitada -a decir deRogers-, lleva el análisis al plano de lo tangible y mensurable. O sea, a la posibilidad de prueba y medición de loque resulta y su proyección a lo potencialmente alcanzable. El acto de la manipulación, entonces, puedecomprenderse como un reaseguro o evidencia para la decisión de lo que se adoptará, en términos de habersometido al bien a la experiencia en un marco de condiciones limitadas.

Para quien manipula el bien, entonces, será el resultado que pueda exteriorizar a otros - con o sin intención - unindicador que no sólo hablará de las propiedades de la innovación, sino del grado de acierto o no que tuvo ladecisión de experimentación y posible adopción de la innovación. El planteo de la difusión, en ese marco, sehace sobre la base de que puede aspirarse a adoptar sólo aquello que es al menos conocido.

Sintetizando, el razonamiento evaluativo que tradicionalmente se ha seguido para analizar la capacidad que tiene

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una innovación de trascender a un medio a través de la adopción se ha basado en los siguientes principios decomplementariedad: i) el reconocimiento de un contexto de sociedad industrial, de mercado de producción yconsumo que se toma como referencia para valorar la superioridad del bien y, por tanto y subyacente a ello, deuna valoración de la búsqueda de maximización de la ganancia en el menor tiempo posible; ii) el caráctertangible del bien; y iii) los valores, experiencias y conocimientos del propio y posible adoptante como parámetropara explicar parte significativa del nivel de circulación. Así, en realidad ese esquema evaluativo encierra dosdimensiones conjugadas. Una que podríamos designar como objetiva, en tanto realidad exterior o envolvente delsujeto (el propio contexto de la sociedad de mercado) y la existencia real y no virtual de la innovación, y otrasubjetiva, en tanto depende de las propiedades relativas al propio sujeto (esto es, a sus valores, experiencias yconocimientos adquiridos).

Visto así, veremos que ese tipo de razonamiento encaja más o menos ajustadamente para analizar la capacidadde difusión de innovaciones compatibles con el mercado, pero tiene dificultades para dar cuenta de otrasalternativas como las compatibles con el ambiente.

Ello, por las siguientes razones:

1. Las innovaciones ambientalmente compatibles pueden definirse, en términos muy generales, como unconjunto de propuestas procedimentales y técnicas orientadas por la búsqueda de una interacción y uso mássaludable de los recursos naturales por parte del hombre y la sociedad organizada .

2. Porque su finalidad gira en torno a la preservación y respeto del ambiente, su funcionalidad capitalista essecundaria.

3. Por tanto, su capacidad instrumental sigue modelos temporales y productivos más ligados a las condiciones yprocesos ambientales que a cualquier lógica artificial de transformación del entorno.

4. En consecuencia, los retornos de su adopción no son evaluados principalmente por el lucro obtenido, sino porlos estados ambientales resultantes.

5. Esto, en muchos casos y según el grado de deterioro ambiental, supone plazos temporales que exceden laexperiencia de los ciclos productivos o incluso de los horizontes de vida del propio sujeto adoptante, con lo cual,los resultados esperados son virtuales, en el sentido de que sólo serán probablemente observables en períodoscorrespondientes a futuros generacionales.

Cuadro Comparativo: Principales características a tener en cuenta para evaluar la capacidad dedifusión de las innovaciones productivistas y ambientales

Características de las InnovacionesProductivistas

Características de las InnovacionesAmbientalmente Compatibles

Ventaja Relativa: grado por el cual la innovaciónes productivamente superior a la que suplanta.

Ventaja alternativa: grado por el cual la innovaciónes superior por su compatibilidad ambiental a la quesuplanta

Compatibilidad: grado por el cual la innovaciónes conciliable con los valores y experienciasexistentes.

Valores Asociados: cualidades y juicios que lainnovación sugiere al adoptante y su relación a laposición que éste asigna al ambiente entre losfactores productivos.

Complejidad: grado por el cual la innovación esdifícil de comprender o usar.

Facticidad: grado de posibilidad cierta que unainnovación tiene de ser aplicada, sin que por elloponga en riesgo la continuidad de la unidadproductiva.

Divisibilidad: grado por el cual una innovaciónpuede ser experimentada en una base limitada.

Complementariedad: grado de articulación posiblede la innovación con el resto del conjunto detécnicas y procedimientos utilizados en la unidadproductiva.

Comunicabilidad: grado por el cual losVirtualidad: rango de posibilidad que se le asigne ala innovación de transformar a futuro y con mayor

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Comunicabilidad: grado por el cual losresultados consecuencia de la innovación sonvisibles a otros.

y ygrado de deseabilidad ambiental el sistemaproductivo.

Las innovaciones ambientales compatibles: una reformulación característica

Así planteado, el clásico esquema evaluativo de la capacidad de difusión puede replantearse, desde unaperspectiva complementaria, en los siguientes términos:

I) Dado que el referente paradigmático es ambientalista, más que productivo, aunque aplicable en un sistema deproducción que sigue los principios del modo de producción capitalista, correspondería evaluar la ventajaalternativa (y no únicamente la relativa) de la IAC. Esto es, el grado por el cual la innovación es superior a otraen términos de no agresión y degradación del ambiente (o de rangos de modificación tolerables) y de respeto delos procesos de reproducción naturales y de la conservación y mejora de las cualidades ambientales existentes.

II) Definido el marco anterior y partiendo del supuesto que los razonamientos dominantes son productivistas,resulta conveniente analizar las cualidades y valores asociados a la IAC y cómo estos se vinculan a la posiciónque el sujeto le asigna al ambiente en términos de los factores de la producción con los que interactúa.

III) En tercer término, además de analizar la complejidad como grado de dificultad de comprensión y uso de lainnovación, observar la facticidad de la adopción, en términos del grado de posibilidad cierta que una innovacióntiene de ser aplicada en un ambiente productivo sin que involucre como costo de oportunidad el riesgo extremode su desaparición como unidad productiva y, por tanto, de la expulsión de la unidad social dependiente de ella.

IV) Como desprendimiento anterior, luego de analizar la divisibilidad de la innovación, estudiar sucomplementariedad, en cuanto grado de articulación posible de la innovación con el resto del conjunto detécnicas y procedimientos utilizados en la unidad productiva. Esto es, de la posible compatibilidad tecnológicade las innovaciones correspondientes a paradigmas productivos diferenciados.

V) Finalmente, y dado que entre el subconjunto considerado las IAC suelen actuar en marcos temporales delargo plazo y bajo condiciones de baja comunicabilidad, dado la intangibilidad primaria de sus resultados ,observar su virtualidad, en tanto rango de posibilidad que se le asigne a la innovación de transformar a futuro ycon mayor grado de deseabilidad ambiental el sistema productivo.

Así planteado, la propuesta de actualizar los esquemas de análisis de la capacidad de difusión de lasinnovaciones de este tipo, puede regirse complementariamente adoptando el esquema abajo:

La teoría en terreno

Pero veamos ahora en un ejemplo el sentido instrumental y la capacidad explicativa que las categoríaspropuestas tienen para dar cuenta -de modo complementario- de la capacidad de difusión de las innovacionesambientalmente compatibles.

En un estudio de años recientes, Marcellino (1992) se abocó a identificar y analizar el conjunto de innovacionesque facilitaban la conservación del suelo en una región próxima a Río Cuarto (provincia de Córdoba, Argentina),caracterizada por la presencia de empresas agropecuarias de pequeños y medianos productores con sistemasmixtos y, desde el punto de vista ambiental, significativos procesos erosivos (hídricos y eólicos) quecomprometen la rentabilidad de las unidades y la capacidad de sus recursos naturales.

En la ocasión los investigadores utilizaron una encuesta de carácter cerrado, con preguntas de opcionesmúltiples, voluntaria y anónima. La tarea permitió recoger 66 cuestionarios que, en todos los casos, fueronrespondidos por los titulares de la explotación. La población consultada se caracterizó por contener en un 80% alos propietarios de sus unidades -algunos de ellos con arrendamientos complementarios-, con una gran mayoríade entrevistados que estaban por encima de los 40 años de edad (dos terceras partes del grupo).

Uno de los objetivos principales del estudio fue identificar la disponibilidad y uso de maquinaria de labranza ysiembra compatibles con sistemas conservacionistas.

Así, ante la consulta sobre la disponibilidad y el uso de herramientas, se observó que en un 80% de los casosse disponía de arados a reja (labranza tradicional), aunque su uso se manifestaba en el 64% de la muestra. El

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arado a cincel, en tanto, más apropiado para la conservación del suelo, estaba disponible en el 73% de loscampos y utilizado en la totalidad de los casos. Se observaba, no obstante, que ese dato no permitía inferir queel manejo de los rastrojos y las operaciones de siembra resultasen luego adecuadas para responder a la finalidadconservacionista. Otros implementos de labranza vertical, incluso de difusión reciente para la época, se hallabanpresentes y eran de uso habitual para una tercera parte de la muestra.

La encuesta también se orientó a conocer la disponibilidad de sembradoras equipadas con sistemas (plantadorde discos dobles) que se complementaban con el uso del cincel para obtener una labranza reducida. En esepunto se observó que en la mayoría de los casos existía cierta ¨brecha de complementación¨. Esto es, encuanto se contaba que en un 73% de los casos se utilizaba el arado de cinceles, sólo un 20% aplicaba luegosembradoras con sistema plantador de discos dobles que complementaba la práctica conservacionista.

En ese sentido se observó que, de acuerdo a lo manifestado por los productores, las prácticas conocidas,probadas y adoptadas -aunque en algunos casos discontinuas- seguían la siguiente distribución de casos:

a) Un 45% de los productores manifestó realizar cultivos que permitían cortar las pendientes;

b) Un 19% expresó efectuar labranza reducida (con rastrojo en superficie);

c) En un 17% de los casos se dijo practicar la siembra directa;

d) Un 13% empastaba los desagues;

e) Finalmente un 4% decía cultivar en curvas de nivel y un solo caso (1,5%) en terrazas paralelas.

f) En lo que refiere a la las rotaciones planificadas, en tanto, un 71% decía tenerlas en cuenta para el manejo desu explotación, pero al analizar las prácticas habituales se reconocía que la relación pasturas perennes/cultivosera muy baja y, por tanto, generalmente insuficiente la restitución de los nutrientes extraídos por los cultivos.

La percepción que del problema de la conservación de suelos en el campo propio y en la zona tenían losproductores, permitió observar que para los casos individuales un 61% los reconocía en sus terrenos, un 33% nolos consideraba y un 6% decía desconocer si tenía o no problemas. Llevado al plano de la zona, un 8% no leasignaba importancia, un 6% lo consideraba moderado, un 35% lo reconocía importante, un 6% moderadamenteimportante y un 45% muy importante. Esto es, en un 86% de los casos se reconocía su importancia, por tanto,se percibía como problema existente para la región, en tanto -por lo visto anteriormente- la cifra disminuía unpoco para el reconocimiento del problema en el terreno propio.

Cómo explicar entonces algunas de las características propias que asume la adopción en la región. Cómoexplicar, por ejemplo, que para una población en la que 8 de cada 10 productores reconoce la importancia de losproblemas de conservación del suelo sólo la mitad realiza prácticas de cultivos para cortar las pendientes, unacuarta parte efectúa labranza reducida y una mínima proporción hace curvas de nivel o terrazas paralelas. Cómoexplicar la alta convivencia de laboreos tradicionales (con arados de rejas) y conservacionistas (arado a cincel) yla presencia de herramientas innovadoras de labranza vertical en una tercera parte de los casos al mismo tiempoque la brecha de complementación entre arados y sembradoras compatibles coloca aproximadamente en unosobre tres a la relación (un 73% de aplicación de arado a cincel y un 20% de sembradoras compatibles).

El estudio, llevado a explicitar en la percepción de los propios productores su opinión acerca de las limitantespara la expansión de las tareas conservacionistas, permitió observar que, según su manifestación, la ¨falta demaquinaria¨ y ¨crédito¨ (con un 32% y 26% de las opiniones), la ¨preferencia por el laboreo tradicional¨ (27%) yfinalmente la falta de ¨información¨ y ¨asesoramiento¨ (11% y 4% respectivamente) incidían significativamenteante la posibilidad de innovación. De ese modo, variables de mayor condicionamiento estructural vinculadas a lacapitalización de las empresas o al acceso de apoyo profesional compartían con otros aspectos másdependientes del sujeto -sus hábitos, cultura de trabajo y valoración ambiental- ese escenario de convivencia ycombinación tecnológica.

Las consideraciones sobre las ventajas relativas de una tecnología, su compatibilidad, complejidad, divisibilidadu observabilidad no alcanzan, desde esa perspectiva, para explicar en ese marco el parque tecnológico existentey utilizable y el complejo combinatorio resultante. Una profundización de tipo más cualitativa respecto al conjuntode razonamientos productivos que reconocen los productores y las valoraciones que éstos les adjudican yaplican en sus prácticas; así como la viabilidad que le atribuyen a las propuestas tecnológicas conservacionistasque adoptan total o parcialmente y/o sólo conocen o rechazan, parece fundamental para interpretar ese cuadro y

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que adopta tota o pa c a e te y/o só o co oce o ec a a , pa ece u da e ta pa a te p eta ese cuad o yconocer qué conjunto de razonamientos orienta sus tomas de decisiones para la adopción o rechazo de lasinnovaciones que se les ofrecen o están presentes.

La complementariedad entre el enfoque tradicional - rogeriano - y el análisis de las ventajas alternativas, valoresasociados, facticidad, complementariedad y virtualidad de las innovaciones, pretende cubrir ese vacío.

Desafíos para la investigación y la comunicación: consideraciones finales

Si el razonamiento que se postula propone que para explicar la difusión y adopción de innovacionesambientalmente compatibles es necesario, al tiempo que se presta atención a aquellas característicasconvencionales de los estudios -ligados particularmente a las lecturas instrumentales de la circulación-, tambiénobservar a aquellas características vinculadas al nuevo paradigma de orientación productiva preocupado por elambiente, es porque supone que la acción social no sólo se orienta por principios instrumentales, sino tambiénpor otras racionalidades igualmente presentes en el quehacer social. Desde esa perspectiva, entonces, lo que setoma como marco referencial para analizar la existencia y difusión de una probable cultura productivaproambiental es la coexistencia entre un paradigma dominante instrumental y otro emergente que no lodesconoce. En ese sentido, la propuesta de cierta ecologización de la economía y una economización de laecología para que la difusión de innovaciones ambientalmente compatibles sea viable, parece ser la más realistaen términos de la forma que adopta, se presenta y evoluciona el modo de producción capitalista.

Profundizar con un enfoque complementario ambas dimensiones de análisis, entonces, es avanzar en unapropuesta con mayor capacidad explicativa de lo emergente, en cuanto nuevo paradigma innovativo, perotambién del modo en que el sujeto razona frente a la innovación, más allá de los componentes instrumentalesque esta suponga. En ese sentido, la recuperación que Leff (1994) hace de las clásicas categorías de Webersobre la acción social resulta auspiciosa para observar tanto las premisas racionales como las marginales a lacultura instrumental. Una investigación de ese tipo tendrá que revisar, también, el sentido de lo que en el análisisclásico se postula para categorizar a los sujetos según el momento en que se posicionan como adoptantesfrente a la innovación (innovadores, adoptantes rápidos, mayoría inicial, mayoría tardía y retardatarios).

Si esto sigue cierta lógica plausible, el planteo podrá ser útil para quienes trabajan con estrategiascomunicacionales de intervención para un desarrollo más sustentable y llamará la atención de quienes tienencapacidad de decisión respecto a cómo se instrumenta la difusión de esos proyectos. En ese sentido, elreconocimiento de que además de lo instrumental también orienta la acción innovativa lo vinculado a otro tipo deracionalidades, por ejemplo ambiental, permite ubicar el terreno de la discusión en las consecuencias de laintervención únicamente a largo plazo. En ese marco, la problemática de la intervención para el desarrollorequiere revisar la orientación hipodérmica (Cimadevilla, Carniglia, 1995; Cimadevilla, 1998) que han seguido laspolíticas de comunicación y extensión y reconocer, por ejemplo, que -como plantea Etzoini - no habrá progresosen el ambiente natural si no se revitaliza antes el medio ambiente social (Logan, 1995). Desde esa perspectiva,por tanto, la comunicación tiene frente a sí problemas de información pública y acciones colectivas quetrascienden las propias lógicas de las agencias de intervención y traslada la problemática de la difusión a laspolíticas del Estado (Cimadevilla, Carniglia, 1997) y a los compromisos de la sociedad civil (Redclift, 1996).

Referências Bibliográficas

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Weber, M. Economía y Sociedad. México: Fondo de Cultura Económica, 1996.

Notas

1 Programa de Investigación Nuevos Actores y Demandas en el Contexto Institucional de la Extensión RuralPampeana, SECYT-UNRC, CONICOR, Fase I y II.

2 En Diccionário de Ciencias Sociais, Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro, 1986. Págs. 607-8.

3 Como lo plantea desde una perspectiva de la difusión cultural el clásico trabajo de Linton, The Study of Man(New York, Appleton-Century, 1936). En Quesada (1980: 34).

4 El Capital, tomo I, capítulo XIII (Maquinaria y Gran Industria), México, Fondo Cult. Económica, 1986.

5 Principalmente en la obra Business Cycles: A theoretical and statistical analysis of the capitalist process. NewYork and London, Mc Graw Hill-Book Company, 1939.

6 Del cual es un clásico el trabajo de G. Dosi, ¨Technological Paradigms and Technological Trajetories¨ enResearch Policy, Vol. 11, Nro. 3, 1982.

7 Planteo particularmente desarrollado en su obra Theory of Economic Development (1934), publicado porCambridge, Mass, Harvard University Press.

8 Ver, por ejemplo, la obra editada por Carlos Ominami (1986) La tercera revolución industrial. Impactosinternacionales del actual viraje tecnológico. Buenos Aires, RIAL-Grupo Editor Latinoamericano.

9 Definido en términos de sistemas de ¨innovaciones interrelacionadas técnica y económicamente que afectanvarias ramas del aparato productivo (...) Desde la perspectiva de un nuevo sistema tecnológico, se estableceuna lógica que encadena sucesivas innovaciones radicales interrelacionadas en una trayectoria natural global.Una vez establecida la lógica del sistema, es posible predecir una sucesión creciente de nuevos productos yprocesos, cada uno de los cuales visto individualmente aparece como una innovación radical, pero, dentro delconjunto del sistema puede considerarse como un cambio incremental¨ (Pérez, 1986 :47).

10 Rogers (op. cit.), capítulo 4, ¨Perceived attributes of innovations and their rate of adoption¨. Para este trabajose consultó la segunda edición de la obra: Rogers, E. & Shoemaker, F. (1971) Communication of Innovations.New York, London, The Free Press-Collier Macmillan Publlishers.

11 Decía Marx en su obra cumbre: ¨Los antagonismos y las contradicciones inseparables del empleo capitalistade la maquinaria no brotan de la maquinaria misma, sino de su empleo capitalista¨ (El Capital, 1986:366).

12 Particularmente los intelectuales francfortianos como Horkheimer, Adorno y Marcuse en su crítica a la razóninstrumental. Habermas (1968), escribirá al respecto un trabajo que cobró particular difusión, denominado¨Ciencia y técnica como ideología¨. Edición española de Tecnos, Madrid, 1984. Para este trabajo se consultó laversión portuguesa de Ed. Abril Cultural (1980).

13 No discutimos aquí el carácter armónico o no que puede asumir la relación economía-ambiente, sino quepartimos del supuesto de sutensión permanente. Tampoco suponemos que la interacción del hombre con lanaturaleza pueda suponer un grado ¨0¨ de transformación de sus condiciones ambientales, por cuanto la propiaevolución del ambiente supone una dinámica de transformaciones constantes. Se plantea si, una interaccióntolerable en términos de que esta no inhiba o ponga en riesgo la propia regeneración del sistema. Para unadiscusión de estos tópicos pueden consultarse los trabajos de Huber (1986), Martínez Alier y Klaus Schlüpmann(1993), Tamames (1995) y Jiménez Herrero (1996), entre otros.

14 En ese sentido, las innovaciones ambientalmente compatibles han de entenderse como un subconjunto delas propuestas contenidas en los planteos del desarrollo sustentable. Desde esa perspectiva, aún cuando nohaya acuerdo sobre una definición generalizable este se vincula o caracteriza a partir de plantear su

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haya acuerdo sobre una definición generalizable, este se vincula o caracteriza a partir de plantear supreocupación con el ambiente, la capacidad de reproducción de los recursos naturales, la conservación de lascondiciones naturales para las futuras generaciones y las relaciones del ambiente con la marginalidad, lapobreza y la búsqueda de equidad entre los grupos humanos y entre estos y la explotación de los recursos.Puede consultarse, entre otras, las siguientes obras: WCED (Informe Brundtland) (1987), Our common future,New York, Oxford University Press; versión castellana: Nuestro Futuro Común, Madrid, Alianza Edit. (1987) yGoodland et alli (1997) Medio ambiente y desarrollo sostenible. Más allá del Informe Brundtland, Madrid, Edit.Trotta.

15 Con el concepto de intangibilidad primaria de sus resultados hacemos hincapié en la idea de que los efectosesperados de una tecnología que pretende actuar a favor del ambiente generalmente puede evaluarse sólo alargo plazo, por tanto, no genera indicadores inmediatos que puedan demostrar las consecuencias buscadas. Porejemplo, una planificación de laboreos que contemple la rotación de cultivos con períodos de pasturas perennesno necesariamente permitirá verificar a corto plazo que la restitución de nutrientes sea la suficiente paracompensar la extraída por los cultivos (Marcellino, 1992:10).

16 El estudio se desarrolló en la localidad de Gigena, a unos 45 km. al norte de la ciudad de Río Cuarto.

17 La tecnología o prácticas aplicadas, merecen también otras discusiones en torno a consecuenciasambientales no deseadas. Por ejemplo, en cuanto la siembra directa permite una mayor preservación del suelofrente a la erosión, no obstante también agrega contaminantes químicos fatales para el ambiente. Un ejemplo deello es la mortandad considerable de aguiluchos langosteros (una variedad de pájaros que combate naturalmentela langosta de los cultivos y que, por ingestión de venenos químicos, hoy peligra su existencia), lo que por suvez exige mayor aplicación de venenos para proteger los cultivos. Esto es, se inhibe una fuente de agresión,pero se potencia otra. Este aspecto, que escapa al objetivo de este trabajo, requiere sin dudas de una discusióny profundización específica. Para un análisis, por ejemplo, de usos de agroquímicos y condiciones desustentabilidad mediante la comparación de indicadores en distintos países, puede consultarse a Verde yViglizzo (1994 y 1995). Para un análisis de aspectos comunicacionales vinculados al fenémeno puedeconsultarse a Canuto (1988).

18 Discusión que se sigue en los planteos de Martínez Alier (op. cit.) y Huber (op. cit.), entre otros.

19 En el proyecto Los productores rurales frente a la sustentabilidad seguimos esta orientación teórica ymetodológica (Programa de Investigación Nuevos Actores y Demandas en el Contexto Institucional de laExtensión Rural Pampeana, op. cit.).

20 Weber plantea que la acción social, como toda acción, puede ser: a) racional con arreglo a fines ; b) racionalcon arreglo a valores ; c) afectiva ; y/o d) tradicional. Weber (1996:20).

21 Aspecto que comenzamos a discutir en nuestro trabajo Nuevas preguntas y reformulación del modelo parauna teoría de la difusión de innovaciones. GT Comunicação Rural, XXI Congresso INTERCOM, Recife,setiembre de 1998.

22 Etzoini, A. (1993) The spirit of community rigths, responsibilities and the Communitarian Agenda. New York,Crown.

* Docente-investigador. Departamento de Ciencias de la Comunicación. Universidad Nacional de Río Cuarto([email protected]) Agencia Postal Nro. 3 / 5800 RIO CUARTO, ARGENTINA

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Tópico Especial

A pesquisa agrícola: mudanças e inovações institucionais*

Ahumada Arenas, Mario**

Os conteúdos deste documento são o resultado de uma recompilação de opiniões, trabalhos e experiências quemuitos profissionais, técnicos, camponeses e produtores vêm propondo à opinião pública, desde ONGs,universidades, redes, organizações e do Fórum Mundial de Dresden, sobre a crise do modelo produtivo daRevolução Verde, as novas estratégias de manejo dos recursos naturais e as mudanças necessárias noprocesso de geração e difusão de inovações.

Nos últimos 30 anos, a agricultura convencional ou moderna, baseada no modelo produtivo da Revolução Verde,tem dominado a pesquisa e os processos de câmbio tecnológico no âmbito mundial e, especialmente, naAmérica Latina. O propósito fundamental tem sido incrementar a produção e a produtividade agropecuária, o quefoi conseguido com relativo êxito, porém, lamentavelmente, sem importar a questão social e ambiental. O mundosofre, atualmente, os efeitos e seqüelas deste processo implementado às custas do homem e da natureza, entreos quais merecem ser destacados:

Efeitos nocivos sobre a população por contaminação e envenenamento do solo, do ar e da água.

Destruição do equilíbrio natural dos ecossistemas pela erosão e morte dos solos, redução dabiodiversidade e desertificação etc.

Maior dependência e custos de produção pelos aumentos crescentes nas doses de fertilizantes,agrotóxicos e no uso de insumos externos.

Perdas econômicas pela diminuição de horas de trabalho devido às intoxicações, pelo aumento dosgastos médicos das pessoas intoxicadas e os efeitos na saúde e pelos custos de implementação desistemas de vigilância epidemiológica.

Deterioração das condições sociais e laborais dos trabalhadores agrícolas por baixos salários,instabilidade do emprego, falta de previsão e exploração no trabalho.

Marginalização dos processos tecnológicos de muitos pequenos agricultores que carecem de recursoseconômicos e que não têm acesso aos programas de capacitação e assistência técnica.

Entretanto, ainda se insiste em continuar com esta forma de produção, o que significa que os impactos aindanão são suficientes para convencer os governos e as instituições de pesquisa e de extensão de que se requerum enfoque distinto, no qual se considerem os efeitos negativos mencionados anteriormente e se incorporem ascentenas de milhões de famílias rurais que ficaram à margem das tecnologias porque essas não foramapropriadas às condições sociais, ambientais e econômicas existentes nessas comunidades.

A situação nos obriga a enfrentar este novo milênio necessariamente através de um modelo de desenvolvimentorural que busque reduzir a pobreza, alcançar a segurança e a auto-suficiência alimentar, conservar os recursosnaturais e a biodiversidade, assim como fortalecer as comunidades rurais. Estes propósitos somente poderãoser atingidos se nos propusermos a encarar os seguintes desafios:

Compreender que as mudanças que apresenta o futuro da produção agropecuária são um problema detodos, de empresários, agricultores, trabalhadores, consumidores, técnicos e governos.

Iniciar um processo de transformação paulatina dos sistemas produtivos convencionais a orgânicos oulimpos, para responder às tendências do mercado, alcançar a segurança alimentar, proteger a saúde dosconsumidores e trabalhadores e preservar o meio ambiente.

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Estabelecer mudanças na normativa legal e na fiscalização dos aspectos laborais dos trabalhadoresrelacionados à produção agropecuária, assim como do uso de agrotóxicos, fertilizantes químicos,biotecnologias etc.

Prevenir efeitos sobre a saúde humana com a implementação de sistemas de vigilância epidemiológica,fortalecimento das políticas de prevenção da saúde, coordenação intersetorial e capacitação dostrabalhadores e empresários sobre os efeitos dos insumos químicos e das biotecnologias.

Incorporar a sustentabilidade ambiental nos programas públicos de apoio, escolas, universidades emunicípios para impulsionar a produção agropecuária sustentável.

Fortalecer as organizações de trabalhadores e as instâncias de coordenação com setores empresariais ede governo.

Implementar programas de capacitação para trabalhadores e empresários, abarcando todos os aspectosda problemática: cívicos, técnicos, consciência ambiental e direitos civis.

Os efeitos e desafios, mencionados anteriormente, nos indicam que devemos ingressar num caminho detransformações em tudo o que se refere ao mundo da ruralidade, pela grande e heterogênea população queenvolve e pela importância econômica e riqueza ambiental que ainda possui. As mudanças devem serorientadas para que se possa desenvolver e implementar uma estratégia de manejo dos recursos naturaisalicerçada nos seguintes princípios básicos: a) alívio da pobreza; b) segurança alimentar; c) fortalecimento dascomunidades rurais; d) incorporação das diversas condições de vida dos habitantes rurais; e) manejo e usosustentável dos recursos locais; f) melhoramento integral dos sistemas agrícolas em nível de propriedades oubacias.

Neste cenário, a proposta de agricultura ecológica surge como um processo produtivo integral e holístico,necessário e fundamental para esta nova estratégia que se distingue porque engloba pelo menos quatroimportantes âmbitos.

Político: como o desenvolvimento de políticas agrárias de mercados e preços, ambientais, laborais etc.

Econômico: como a produção estável e eficiente de recursos produtivos, alimentos e matérias-primas emqualidade e quantidade, ademais da eqüidade e viabilidade econômica.

Ambiental: como a preservação dos recursos naturais e a biodiversidade, a estabilidade produtiva e afunção ecossistêmica.

Social: como a sustentabilidade das comunidades, através da segurança e auto-suficiência alimentar, dapreservação da cultura local e da pequena propriedade e do incremento da participação e da autogestãodas comunidades.

Em conseqüência e sob estes preceitos, devemos impulsionar o desenvolvimento de um novo processode geração e difusão de conhecimentos e tecnologias, o qual deve atender uma série de propósitos, taiscomo se expõem a seguir.

Construir o processo sob um corpo de conhecimentos amplos, incluindo as distintas especificidadesprofissionais, porém também a riqueza e experiência do saber local.

Adequar as tecnologias à demanda dos produtores, camponeses ou habitantes rurais, isto é, que surjamde baixo para cima com o propósito de satisfazer necessidades reais, sejam sociais, ambientais oueconômicas, e que, além disso, se coloquem ao alcance dos sujeitos do desenvolvimento.

Desenvolver as tecnologias incorporando os recursos e conhecimentos locais para assegurar a auto-sustentação e a independência produtiva e alimentar.

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Incorporar voluntariamente aos atores e/ou comunidades rurais em todo o processo de criação deestratégias de manejo de recursos naturais e de agendas de pesquisa, evitando a aplicação de pacotestecnológicos e estimulando formas conscientes de geração, difusão e reprodução de conhecimentos etecnologias.

Incluir na geração de inovações tecnológicas tanto as instituições de pesquisa, como as universidades,ONGs, organizações de agricultores, de modo a incorporar neste processo as experiências e idéiasrecolhidas no trabalho direto com os habitantes rurais.

Gerar conhecimentos e tecnologias não apenas nos laboratórios dos centros de pesquisa, mas tambémna realidade onde se aplicarão, de maneira a permitir sua viabilidade econômica e acessibilidade aosagricultores, devendo referir-se tanto a temas técnicos como também aos processos produtivos.

Baseados nesta nova forma de gerar e difundir conhecimentos, se torna indispensável uma série detransformações na institucionalidade da investigação, com o objetivo de que o trabalho e os resultadossejam mais pertinentes e eficientes.

Transformações relacionadas à pertinência

Relacionamento dos sistemas de pesquisa entre si e também com as instâncias públicas e privadas deeducação, capacitação e assistência técnica, com a finalidade de obter-se um acordo institucionalorientado a difundir, do local ao nacional e regional, os benefícios das experiências de agriculturaecológica e de manejo sustentável dos recursos naturais.

Interação horizontal e eqüitativa dos institutos de pesquisa nacionais com a sociedade civil, sejam ONGs,organizações de agricultores, redes ou universidades, com o objetivo de criar instrumentos para que, emconjunto, se estabeleçam agendas e prioridades de pesquisa e se alcance uma participação mais amplano processo de geração e difusão de conhecimentos e tecnologias.

Geração de espaços de participação para que antropólogos e cientistas sociais ajudem os biólogos efísicos a elaborar métodos de participação e a valorizar e entender o conhecimento e as culturas locais.

Criação e funcionamento permanente de mesas de acordos entre as instituições de pesquisa, asociedade civil e os agentes que tomam decisões nacionais e internacionais, as quais possibilitaminformar sobre as agendas de investigação e influir na formulação de políticas.

Os atores primordiais, como os pequenos agricultores, os sem-terra, os pescadores, os trabalhadoresflorestais, os povos indígenas, os consumidores pobres e as ONGs, devem ser reconhecidos pelossistemas de pesquisa agrícola como os atores-chave do processo de geração de conhecimentos etecnologias e ser envolvidos em todos os níveis: nacional, regional e mundial.

Transformações relacionadas à eficiência

Reciclagem dos cientistas ou pesquisadores para que possam entender esta nova forma de gerarconhecimentos, modificar sua linguagem e idear metodologias de participação etc.

Reorientação do trabalho dos institutos nacionais de pesquisa e dos recursos públicos para investigaçãoem direção às necessidades dos setores produtivos mais pobres, já que as empresas privadas ou osgrandes produtores podem produzir ou comprar a pesquisa sem necessidade dos recursos estatais.

Ampliação do campo de ação dos sistemas nacionais e regionais de pesquisa agrícola, englobando oagrícola e também os assuntos que afetam os pequenos agricultores em todo o mundo, tais como areforma agrária, o acesso eqüitativo aos recursos naturais, a formulação de políticas para definição depreços e a organização de mercados, assim como as política de rendas e direitos de agricultores econsumidores.

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*Título da versão original em espanhol: La investigación agrícola. Cambios e innovaciones institucionales.Tradução ao português: José Antônio Costabeber.

**Médico Veterinário, Mestre em Desenvolvimento Rural, Coordenador Geral do Movimento Agroecológico daAmérica Latina e Caribe (MAELA).

E-mail: [email protected]

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ECONOTAS

Efeito Estufa - de kioto a Haia

A emissão de gases de efeito estufa, que são capazes de provocar o aquecimento do planeta, deve ser reduzidanos próximos anos. Só que isto significa investimentos de muitos bilhões de dólares.

A conferência de Kyoto, realizada há três anos no Japão, definiu que os países desenvolvidos, responsáveis por75% do CO2 emitido em 1990, têm de reduzir suas emissões. Este gás (CO2) permanece até 150 anos no ar.

De um modo geral os países industrializados, apesar de terem assinado o Protocolo de Kyoto, estão hesitantes.

Países como Alemanha e Reino Unido já vêm reduzindo as emissões, mas o grupo que engloba EstadosUnidos, Canadá, Japão e Austrália está mais resistente a aceitar mecanismos de redução.

O grupo G-77, que reúne cerca de 140 países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, acha que os países ricostêm que fazer a parte deles porque são os grandes poluidores mundiais e nada mais justo de que eles paguemessa conta.

A conferência de Haia discutiu três questões fundamentais sobre o problema: as penalidades financeiras para ospaíses que estão descumprindo as metas firmadas em Kyoto, os mecanismos de flexibilização para se chegar aum consenso e a transferência de tecnologia limpa para os países em desenvolvimento.

Arrozais ecológicos aumentam a produtividade

Agricultores chineses, liderados por uma equipe internacional de cientistas, dobraram a produção de arroz epraticamente eliminaram a brusone, doença devastadora causada por fungo, sem usar química ou gastar umcentavo a mais. Isto aconteceu na província de Yunnan, onde os camponeses em vez de plantarem um únicotipo de arroz, como sempre fizeram, plantaram fileiras intercaladas com dois tipos de arroz diferentes. Com istoa incidência da brusone ficou radicalmente restrita.

"O que realmente importa nesse estudo é que ele mostra como perdemos de vista o fato de que existemalgumas coisas simples que podemos fazer no campo para controlar as colheitas", disse Shahid Naeem,ecologista da Universidade de Washington.

Adubos verdes

Em Uganda, África, um grupo de pesquisadores, em conjunto com agricultores, desenvolveu alternativas demanejo do solo usando crotalária, mucuna, lab-lab e feijão de porco como adubos verdes em sistemas de pousiode ciclo curto. Este trabalho mostrou que nas culturas de feijão e milho a produtividade aumentou em mais de50% nos sistemas de pousio enriquecidos com as plantas utilizadas como adubos verdes. Além do milho e dofeijão, as culturas de batata doce, café e banana também tiveram benefícios com estes consórcios de adubosverdes. Os agricultores também verificaram uma melhoria na fertilidade do solo (textura e umidade), controle deerosão e supressão de plantas invasoras.

McDonalds não usará transgênicos

A partir de abril de 2001, a McDonalds, multinacional do lanche rápido, servirá somente carne de frango isenta deingredientes transgênicos. Mas isto só ocorrerá na Alemanha, Dinamarca e Suécia, fruto de intensa campanha epressão por parte da ONG Greenpeace da Alemanha, que provou que o McDonalds alimentava frangos com sojageneticamente modificada.

Novo golpe contra transgênicos nos EUA

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Uma das grandes companhias americanas processadoras de milho está sugerindo, por carta, aos agricultoresque "a única forma de se selecionar sementes verdadeiramente seguras é ter sementes de milho livres dequalquer modificação genética". A Tate & Lyle mandou cartas aos agricultores que abastecem as suas quatrounidades processadoras de milho, nos EUA. Como esta empresa processa, diariamente, milhares de toneladasde milho e não tem como separar grãos convencionais dos geneticamente modificados, e também pelos recallsde alimentos contendo milho transgênico, achou mais prudente sugerir aos agricultores que evitem plantaçõestransgênicas.

Aventis negocia sua divisão agroquímica

O conglomerado franco-alemão Aventis está vendendo sua divisão agroquímica. A justificativa para esta decisãosão as dificuldades que o seu milho StarLink, geneticamente modificado, vem enfrentando no mercadoamericano e europeu. Este milho, por causar reações alérgicas nos consumidores, levou a uma onda deprotestos, recalls de consumidores e produtores e chegou a prejudicar as exportações de milho dos EstadosUnidos. Com isso, o produto foi banido e cresceram as pressões para que a Aventis acabasse com a lavouradesta variedade de milho transgênico.

Soja não-transgênica atrai europeus

Os produtores franceses, ingleses, espanhóis e alemães, que estão proibidos de alimentar suas criações com afarinha animal, em função da doença da vaca louca, terão que importar maiores quantidades de soja. Há umapreferência clara, do mercado europeu, em consumir alimentos sem a presença de transgênicos. A soja vendidapelos americanos e argentinos, especialmente, é transgênica. Por isso, abrem-se enormes perspectivas para asoja brasileira.

Também a Noruega, através da companhia Denofa, do grupo Orkla, enviou para a Europa mais de um milhão detoneladas de grãos de soja brasileira. Esta empresa, através da GenLab, verifica se o produto enviado é ou não-transgênico, pois o mercado europeu é exigente quanto à origem do produto.

Agricultura ecológica na Costa Rica

Os produtores da Jugar del Valle S.A., na Costa Rica, têm conseguido reduzir custos, aumentar a produtividadee a lucratividade com a produção de diversas hortaliças, como a beterraba, o brócolis e a cebola.

Estes produtores conseguiram, utilizando sistemas de produção ecológicos, reduzir o ciclo de produção e comum melhor controle, reduziram as perdas. Comparados os resultados do sistema de produção ecológico com aforma de produção convencional, o sistema ecológico apresentou lucratividade superior a 50%.

Empresas de testes e certificação se instalam no Brasil

A Genetic ID, dos Estados Unidos, e a alemã GeneScan Europe AG vão instalar laboratórios próprios no Brasil,em 2001. Isto se deve à crescente demanda das empresas brasileiras por testes que eliminem suspeitas sobrea presença de transgênicos em seus produtos.

Estas duas empresas de biotecnologia disputam o mercado mundial de testes e certificação de produtos não-transgênicos e são especializadas em analisar o DNA em alimentos.

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Dica Agroecológica

Uso de Alho (Allium sativum) para controle fitossanitário.

O alho é considerado um antibiótico natural e pode ser usado como inibidor ou repelente de parasitas de plantasou animais. A seguir seguem algumas dicas sobre maneiras de fazer preparados caseiros a base de alho ecomo usá-los. Bom proveito!

ALHO - 1

3 cabeças de alho

1 colher grande de sabão de côco picado

2 colheres de sopa de parafina líquida

Amassar as cabeças de alho misturando em parafina líquida. Diluir este preparado para 10 litros de água, com osabãopicado. Pulverizar logo em seguida.

Indicação: Repelente de insetos, bactérias, fungos, nematóides, inibidor de digestão de insetos e repelente decarrapatos.

ALHO - 2

100g de alho

0,5 litro de água

10g de sabão de côco

2 colheres (de café) de óleo mineral

Os dentes de alho devem ser finamente moídos e deixados em repouso por 24 horas em 2 colheres de óleomineral. À parte, dissolver 10 gramas de sabão em 0,5 litro de água.

Misturar então todos os ingredientes e filtrar. Antes de usar o preparado, diluir o mesmo em 10 litros de água,podendo, no entanto, ser utilizado em outras concentrações de acordo com a situação.

ALHO - 3

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1 pedaço de sabão de côco (50g)

4 litros de água quente

2 cabeças de alho finamente picadas

4 colheres pequenas de pimenta vermelha picada

Dissolver um pedaço de sabão do tamanho de um polegar (50 gramas) em 4 litros de água. Juntar 2 cabeçaspicadas de alho e 4 colheres de pimenta vermelha picada. Coar com pano fino e aplicar.

Indicação para Alho 2 e 3: Trips, pulgões, mosca doméstica, lagarta do cartucho do milho (Spodoptera sp.),mosquito da dengue (Aedes aegupti), Xanthomonas campestris, míldio, brusone, podridão do colmo e da espiga,mancha de Alternaria, macha de Helminthosporium, podridão negra, ferrugem, mosca dos chifres e mosquitos.

Fonte: STOLL (1989), SABILLÓN & BUSTAMANTE (1996)

ALHO - 4

1Kg Alho

5 Kg de Sal mineral

Moer dentes de alho, se necessário, juntar milho, para facilitar a mistura com o sal.

Fornecer em períodos de maior infestação.

Indicação: Vermífugo, repelência para mosca dos chifres e ectoparasitas.

Fonte: Normas da AAO

As indicações acima estão publicadas em:

ABREU JUNIOR, H. de (coord.) Práticas alternativas de controle de pragas e doenças na agricultura:coletânea de receitas. Campinas: EMOPI, 1998. 115 p.

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Eco Links

http://www.planetaorganico.com.br

Idioma: português

Planeta Orgânico

Este portal nacional disponibiliza diversas informações ligadas a produção, comercialização econsumo de produtos orgânicos. A linha editorial tem cunho comercial, porém apresentainformações interessantes e relevantes.

http://members.fortunecity.com/consciencia/ecolinks.html

Idioma: português

Eco-links

Este site fornece inúmeras referências de links sobre agricultura ecológica e atividades afins.Trata-se de uma "porta de entrada" para outros sites, fornecendo acesso facilitado através de umaclassificação de temas relacionados à questão do meio ambiente e ecologia.

http://www.alternet.com.br/bionatur/

Idioma: português

Bionatur

A Bionatur representa uma das conquistas produtivas do processo de reforma agrária no RioGrande do Sul. Através de uma cooperativa (Cooperal), os agricultores assentados produzemsementes agroecológicas, sendo que "o uso destas são a garantia do resgate da biodiversidade,dos cultivares, das questões sociais, culturais e econômicas, que formam a base da agriculturasustentável".

http://www.biodiversidadla.org/

Idioma: espanhol

Biodiversidad em América Latina

Local de intercâmbio entre organizações latino-americanas que trabalham em defesa dabiodiversidade. Existem diversos documentos e notícias ligadas à questão de recursos genéticos(OGMs, Biopirataria, Biodiversidade) e desenvolvimento local sustentável.

http://www.worldwatch.org.br/

Idioma: português

Worldwatch Institute

O Worldwatch Institute , sediado em Washington, trabalha na promoção de uma sociedade sustentável.Disponibiliza diversos artigos sobre a questão da sustentabilidade, tal como a questão de sustentabilidade,transgênicos etc. Publicação interessante deste Instituo é o livro Estado do Mundo 200, que pode ser adquirido

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através deste endereço.

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Artigo

Transição agroecológica e ação social coletiva*

Costabeber, José Antônio** e Moyano, Eduardo***

Resumo: O objetivo deste artigo é oferecer um marco teórico para analisar o processo de introdução de estilos deagricultura mais sustentáveis, prestando especial atenção às formas de ação social coletiva como via para favorecer atransição agroecológica no âmbito da agricultura familiar. As análises tomam como referência básica pesquisa mais amplaque se centrou na evolução de experiências associativas de agricultura de base ecológica no Rio Grande do Sul (Brasil). Aaplicação do modelo proposto permite concluir que a transição do modelo de agricultura convencional para estilos deagricultura de base ecológica não é um processo unilinear, mas sim de múltiplas dimensões. Além disso, a ação coletivase converte de conseqüência à motor da transição agroecológica, apoiando a continuidade das mudanças em direção aestágios mais avançados de sustentabilidade econômica, social e ambiental.

Palavras-chave: Transição agroecológica, ação coletiva, agricultura familiar, processo de mudança, ecologização, análisemultidimensional, Rio Grande do Sul.

1. Introdução

O processo de ecologização da agricultura consiste na introdução de novas práticas, mais respeitosas com o ambiente, emsintonia com o novo paradigma da sustentabilidade e o desenvolvimento sustentável. Dentro deste processo, a agriculturade base ecológica tem se convertido em uma via utilizada por agricultores familiares para fazer frente à exclusãoeconômica e social e à deterioração ambiental, utilizando-se distintas formas associativas. Neste trabalho, se analisa opapel do associativismo como uma das formas de ação coletiva utilizada por agricultores familiares para pôr em marchaprojetos de agricultura ecológica. Tomando-se como referência empírica algumas experiências associativas de agriculturaecológica no Rio Grande do Sul (Costabeber, 1998), se conclui, em primeiro lugar, que o associativismo vem sendoutilizado por agricultores familiares para enfrentar problemas que surgem ao introduzir-se novas práticas agrícolas e degestão de suas propriedades, problemas estes que não podem ser solucionados pela via da ação individual. Em segundolugar, ademais de ser resultado do processo de ecologização, a ação coletiva se converte em motor de dito processo, jáque graças a ela os agricultores familiares encontram condições de evoluir em direção a estágios mais avançados desustentabilidade e de desenvolvimento sustentável.

2. Sobre a transição

O termo transição, em sua acepção semântica, pode designar simplesmente a ação e efeito de passar de um modo de serou estar a outro distinto. Isto implica, desde logo, a idéia mesma de processo, ou seja, um curso de ação mais ou menosrápido que se manifesta na realidade concreta a partir de uma intrincada e complexa configuração de causas - passadas,presentes ou futuras -, e que sempre há de provocar conseqüências e efeitos, previsíveis ou não, na nova situação que seestabelece. Fenômenos físico-naturais podem representar, por si mesmos, processos de transição, tais como são oscâmbios climáticos em distintos períodos de tempo e em um dado contexto espacial. Isto não depende necessariamente daação, da intenção ou da interação humanas; a observação de sua repetição cronológica e espacial, assim como aidentificação de suas causas, pode aumentar os graus de previsibilidade de sua ocorrência, evolução e estado futuro.

No entanto, onde interferem processos sociais, costumam ocorrer externalidades na transição. Estas externalidades, frutode complexas redes de relações e interações entre os atores sociais e entre estes e o meio ambiente, implicam novas emaiores dificuldades para a previsibilidade de seu desenvolvimento, evolução e estado final. Isto é, "não há regraspredeterminadas que regem à evolução das sociedades em seu conjunto à margem das sociedades mesmas". O que sepode observar, não obstante, são regularidades no fato de que sociedades concretas têm evoluído como conseqüência deestratégias desenvolvidas com base na consecução de seus interesses específicos. Com efeito, a transição - comoprocesso de mudança social - pode ser entendida como o resultado de estratégias mais ou menos conscientes dosdiversos atores e grupos sociais, surgidas como conseqüência da confrontação de interesses distintos e contraditórios.Antes que a um processo unilinear de câmbio, mais bem parece, pois, que o conceito de transição se adequaria à noção demultilinearidade, como resultado das intrincadas e complexas relações sociais que lhe são subjacentes (González deMolina e Sevilla Guzmán, 1993: 59-60).

Ademais da multilinearidade de seu desenvolvimento e evolução, a transição supõe também a noção de coexistência. Apassagem da sociedade tradicional para a sociedade moderna pode resultar útil como exemplo: a modernizaçãorepresentou um processo de transição que, antes de generalizar-se de maneira homogênea, converteu-se, ao contrário, emfonte geradora de heterogeneidade e diferenciação social. A coexistência do tradicional e do moderno, inclusive no seio das

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atuais sociedades pós-industriais, mostra a pertinência de considerar-se a transição como processo social multilinear edinâmico, onde a diferença e a coexistência estão presentes. "Seu êxito ou fracasso dependeria, em todo caso, doresultado de um conflito de interesses (...) que dinamiza processos de resistência, confrontação ou, finalmente, deadaptação" (González de Molina e Sevilla Guzmán, 1993: 60).

Cremos que estas breves notas sobre a transição, como conceito sociológico, podem ser adequadas para contextualizarteoricamente os câmbios que se produzem nos processos de transição agroecológica. Isto é, a crise sócioambiental exige,por uma parte, pensar globalmente sobre suas causas e efeitos, assim como sobre as formas de frear sua evolução. Poroutra parte, sugere a necessidade de atuar em nível local e/ou comunitário, com a finalidade de ampliar os espaços para aemergência e viabilidade de formas alternativas de produção, gerando novos caminhos que conduzam à conformação deuma sociedade sustentável, desde os pontos de vista social, econômico e ambiental.

Quando se analisam os limites do modelo tecnológico herdado da Revolução Verde, e se examinam as propostasorientadas ao desenvolvimento sustentável, se evidencia que a transição a uma agricultura de base ecológica não é umprocesso unilinear, mas sim de múltiplas dimensões, o que reflete a própria complexidade da noção de sustentabilidadeagrária, enquanto meta a ser alcançada a médio e longo prazos.

Sob esta perspectiva, o processo de transição agroecológica não pode ser compreendido a partir de apenas uma dimensão.Embora a dimensão econômica costume representar uma categoria fundamental nas análises teóricas e empíricas quetratam esta questão, aqui propomos a inclusão das dimensões social e ambiental, a fim de estabelecer um quadro teóricoque permita a compreensão das razões e atitudes dos atores sociais que se envolvem em processos de câmbiotecnológico e em formas associativas dirigidas à construção e experimentação de estilos de agricultura de base ecológica.

3. A multidimensionalidade do processo de mudança

Um dos traços mais significativos do processo de introdução de práticas agrícolas mais respeitosas com o meio ambienteé o papel que desempenham as formas associativas, de tal modo que pode afirmar-se que a ação coletiva é um elementofundamental para compreender-se a consolidação de novos estilos de agricultura. Este aspecto constitui uma das principaiscontribuições deste artigo, motivo pelo qual aqui se analisa a convergência entre o processo de transição agroecológica eos processos de ação coletiva na agricultura.

Nosso ponto de partida sustenta que o enfoque da unidimensionalidade _ que enfatiza a dimensão econômica e que é tãofreqüente nas explicações dos processos de câmbio na agricultura, enquanto atividade orientada ao mercado _ éinsuficiente para dar conta da complexa e heterogênea realidade da agricultura enquanto espaço de produção e reproduçãosociocultural, econômica e ambiental. Por isto, adotamos um enfoque multidimensional para referir-nos às dimensõeseconômica, social e ambiental, enfoque este que conformaria um marco teórico mais idôneo para compreender-se asrazões que movem alguns segmentos da agricultura familiar a aderirem-se a processos de câmbio tecnológico eorganizacional orientados a ecologização da agricultura. Sob esta ótica, adquire relevância uma visão mais ampla daagricultura não só como espaço de transações econômicas, mas também como cenário de atividades socioculturais,interações ecológicas e relações ambientais.

Nosso modelo explicativo (Diagrama 1) conjuga, portanto, as três dimensões básicas que estariam determinando a buscade alternativas por parte daqueles segmentos da agricultura familiar que se vêem gradualmente submetidos às pressões daestagnação econômica (dimensão econômica), da exclusão social (dimensão social) e da degradação do meio ambiente(dimensão ambiental).

Neste modelo, a transição agroecológica _ enquanto processo social orientado à obtenção de níveis mais equilibrados desustentabilidade, produtividade, estabilidade e eqüidade na atividade agrária, utilizando estilos mais respeitosos com o meioambiente _ supõe, pois, a consideração das três dimensões articuladas entre si, porém, em constante processo deadaptação e retroalimentação. Seus pontos de articulação funcionam umas vezes favorecendo o estabelecimento de umarelação harmônica entre os propósitos e metas das distintas dimensões do processo em curso, e, outras vezes, comoelementos de conflito entre elas. Por exemplo, embora a obtenção de melhores níveis de rentabilidade na agricultura possaser valorada em termos positivos desde o ponto de vista econômico, seus resultados ecológicos serão opostos nos casosem que isto determinar novas agressões nos agroecossistemas. Além disso, tomando-se como referência apenas ossupostos maximizadores implícitos na racionalidade produtiva dominante, objetivos como o respeito ao meio ambiente e amelhoria da qualidade de vida podem resultar incompatíveis com o desejo de alcançar a máxima rentabilidade econômicada exploração agrícola (que provocaria, em conseqüência, novas formas de agressão ambiental e de deterioração dascondições de vida nas comunidades rurais). Em qualquer caso, o processo de mudança estaria dirigido à busca de novospontos de equilíbrio entre as ditas dimensões, com o propósito de superar a crise enfrentada pelos agricultores. Esta crisepode ser percebida tanto sob o ponto de vista "econômico", como "ecológico" ou "social"; "combinadas duas a duas"; ou"conjugadas as três ao mesmo tempo".

Entre as alternativas elegidas, que variarão segundo a percepção da crise e segundo as possibilidades e limitações quetenham os agricultores, em termos de recursos e apoio externo, poderia optar-se por estilos de agricultura de "base

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ecológica", cujo suposto implícito principal seria sua potencialidade para gerar maiores níveis de sustentabilidade mediantea ecologização das práticas agrárias. Porém, também, e como processo que se manifesta de modo quase paralelo aoanterior, poderiam desenvolver-se estratégias de ação coletiva, como forma de dinamizar e potencializar os recursoshumanos, naturais e materiais existentes, possibilitando o avanço do processo de transição agroecológica e a consolidaçãode novas formas de agricultura sustentável.

Como se pode observar (Diagrama 2), este processo de transição agroecológica _ que estaria se manifestando mediante aecologização das práticas agrárias _ e o processo de ação social coletiva _ que estaria se caracterizando pela adesão deseus autores sociais a projetos coletivos baseados em seus interesses, expectativas, crenças e valores compartilhados _poderiam representar, em seu conjunto, uma alternativa para superar a crise sócioambiental percebida pelos agricultoresfamiliares.

Diagrama 1 - As dimensões do processo de mudança

Diagrama 2 - A ecologização e a ação coletiva como processos complementares

O Quadro 1 (abaixo) representa uma síntese dos fundamentos básicos destes dois processos em relação às trêsdimensões consideradas básicas para explicar a adesão dos agricultores familiares a formas de agricultura de baseecológica. Para efeitos analíticos, estas três dimensões podem ser tratadas como "tipos ideais", no sentido weberiano,cujos elementos característicos são expostos a seguir. Vale lembrar que sua consideração de "tipos ideais" significa quesão categorias analíticas de um certo nível de abstração teórica e que, na prática, nunca poderão ser encontradas de formaisolada, mas combinadas entre si.

Quadro 1 - Fundamentos básicos da ecologização e da ação coletiva sob a perspectiva multidimensional

Dimensões e Processos Ecologização Ação coletiva

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Dimensões e Processos Ecologização Ação coletivaEconômica

Luta contra a estagnação e amarginalização econômica

Incorporação e intensificaçãotecnológica via implementação deestilos alternativos de produçãopoupadores de capital energia.

Estratégias para incrementar e diversificar asrendas agrárias via organização da produção econquista de novos mercados.

Social

Luta contra a exclusão social e aperda da qualidade de vida

Incremento da qualidade de vidamediante a produção de alimentossadios e a melhoria das condições detrabalho e de saúde.

Estratégias para a inclusão social e direito aparticipação cidadã na construção de alternativasorientadas às necessidades locais.

Ambiental

Luta contra a degradaçãoambiental e a perda dacapacidade produtiva doagroecossistema

Recuperação da capacidadeprodutiva dos agroecossistemasatravés da adoção de métodos etécnicas mais prudentesecologicamente.

Estratégias para o intercâmbio de experiências egeração de conhecimentos aplicados aoaperfeiçoamento do processo produtivo.

·Uma dimensão econômica, determinada pela resistência dos pequenos agricultores e suas famílias à estagnação emarginalização econômica a que se vêem submetidos sob o avanço do processo de acumulação capitalista na agricultura,processo este seletivo e excludente e que gera um desenvolvimento desigual das oportunidades de participação e das"bondades" das tecnologias agrícolas intensivas em capital.

Em primeiro lugar, é preciso ter em conta que a agricultura, como atividade econômica orientada ao mercado, está inseridaem uma dinâmica que privilegia o uso de recursos naturais em direção à maximização de seu valor de troca, o que costumadificultar ou impedir o uso planejado dos agroecossistemas, de maneira que pudessem atender a outros valores, orientadosa preservação do meio ambiente, melhoria da qualidade de vida ou eqüidade social. As contradições que se geram entre osobjetivos econômicos e as necessidades de renovação agroecossistêmica põem em risco a manutenção dos níveis deprodução de biomassa através do tempo, assim como sua distribuição eqüitativa intra e inter-geracional. Ou seja, aracionalidade instrumental _ que se estabelece com base em supostos meramente economicistas _ se sobrepõe àracionalidade substantiva, portadora de valores que vão mais além da mera apropriação da natureza como forma deacumulação de capital.

A dimensão econômica, pois, adquire notável relevância no momento de explicar a intensificação e incorporaçãotecnológica, já que os atores sociais envolvidos na lógica de mercado são induzidos a maximizar seus benefícioseconômicos como forma de manter-se no negócio. O treadmill of technology de Cochrane seria ilustrativo desta dinâmicade mudança tecnológica imposta aos agricultores desde a perspectiva econômica, uma dinâmica que não leva em conta seos processos produtivos são ou não são poupadores de recursos naturais, se deterioram ou não deterioram o meioambiente, e se causam ou não causam desequilíbrios sociais e perda de qualidade de vida nas comunidades rurais.

Por outro lado, seria a percepção mesma das dificuldades econômicas e financeiras para seguir o ritmo marcado por estesavanços tecnológicos, o que poderia explicar a opção por um "novo" padrão tecnológico por parte dos agricultores. Nocentro do processo de ecologização, desde a dimensão econômica, estaria, pois, a incorporação e intensificaçãotecnológica via adoção de estilos de produção agrícola poupadores de capital e energia, abrindo caminho, assim, para aimplementação de uma agricultura de base ecológica.

Paralelamente ao processo de ecologização, se geraria um processo de ação coletiva, através do qual os atores sociaisidentificam seus interesses, necessidades e expectativas comuns a respeito do desenvolvimento das alternativas elegidas.Neste caso, a elaboração e colocação em prática de estratégias coletivas dirigidas ao incremento da renda agrária _ via aorganização da produção e conquista de mercados alternativos, por exemplo _ constituiriam o fundamento principal da lutados agricultores para superar a estagnação e a marginalização econômica a que estariam submetidos.

· Uma dimensão social, caracterizada pela resistência dos pequenos agricultores ante o processo de exclusão queexperimentam sob o avanço do processo de acumulação capitalista na agricultura. Esta luta incluiria também a busca demelhores níveis de qualidade de vida e de trabalho, mediante a produção e consumo de alimentos mais sadios, o quecomporta a eliminação do uso de insumos agrotóxicos no processo produtivo agrícola.

Com efeito, se consideramos que o patrimônio de recursos naturais existente na biosfera (insumos energéticos,biodiversidade, solos, ar) está formado por bens públicos à disposição da humanidade para seu desenvolvimento eevolução, veremos que sua apropriação privada geram externalidades que passam a ser socialmente compartilhadas. Poruma parte, as externalidades negativas, tão comuns nessas transações econômico-ecológicas, costumam incluir acontaminação do meio ambiente, a concentração da posse da terra, a perda da qualidade dos alimentos, a destruição dasculturas locais e a exclusão socioeconômica das camadas sociais menos favorecidas pelos padrões de produção e deconsumo dominantes.

Por outra parte, as externalidades também incluiriam a perda de importância de valores substantivos (éticos, morais,culturais, estéticos, religiosos) capazes de contribuir para a conformação de novos padrões sustentáveis de relação

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homem-natureza na agricultura, não só como negócio, mas como espaço de reprodução sociocultural e relaçõesambientais. A tecnologia agrícola convencional, enquanto materialização da ciência que representa a racionalidadeinstrumental desde a ótica da acumulação de capital, passa a constituir, por um lado, uma fonte geradora de rendas paraaqueles agricultores que reúnem as condições para a sua adoção, ao menos quando se consideram os resultadoseconômicos de curto prazo sem a devida consideração dos efeitos ecológicos e sociais de médio e longo prazos. Porém,por outro lado, essa mesma tecnologia também constitui uma fonte geradora de desigualdades sociais ao não ser acessívela uma grande massa de agricultores com menos recursos ou pouco motivados e preparados para inserir-se na espiraltecnológica com a velocidade e a dinâmica por esta exigidas.

Neste contexto, é a percepção mesma das externalidades e suas conseqüências negativas sobre as oportunidades dereprodução econômica e de participação social, assim como sobre a qualidade de vida e condições de trabalho destesagricultores, o que poderia gerar atitudes favoráveis a uma mudança em suas orientações tecnológicas e formasorganizacionais. Pode-se assinalar, portanto, que determinados segmentos da agricultura familiar, menos integrados noscircuitos agroindustriais e comerciais e com menor nível de intensificação tecnológica no processo produtivo, poderãoatribuir distintos valores a determinados bens e serviços proporcionados pela natureza, valores estes que nãonecessariamente estarão em concordância com a racionalidade instrumental que determina formas de uso e exploração dosrecursos naturais e a incorporação tecnológica dominante nos processos produtivos agrícolas.

Efetivamente, o processo de ecologização, quando observado desde a dimensão social, pode ser explicado a partir de umamaior valorização, por parte dos agricultores, de certos benefícios materiais e não materiais, tais como a melhoria da saúdevia produção e consumo de alimentos isentos de contaminantes químicos, assim como a melhoria das condições detrabalho mediante a redução ou eliminação do uso de produtos agrotóxicos no processo produtivo. É um processo que podeoferecer, também, benefícios sociais mais amplos ao conjunto da sociedade, como seria a oferta destes produtos commaior qualidade biológica aos consumidores. É evidente que estas mudanças somente são possíveis com base em umaracionalidade substantiva e não instrumental por parte do agricultor, ao aceitar a utilização de alternativas tecnológicas quenem sempre são capazes de assegurar os mesmos níveis de produção e produtividade alcançados via o modeloagroquímico dominante, o que supõe assumir riscos econômicos na utilização de tais alternativas.

A dimensão social contempla, também, um processo de ação coletiva de caráter identitário. Através deste, os atoresestabelecem relações de interesse comum no sentido de buscar o reconhecimento, a inclusão social e a construção dealternativas orientadas a resolução de seus próprios problemas. Como exemplo disso, estaria a conquista de oportunidadespara expressar seus pontos de vista, desejos, crenças e expectativas em torno ao seu futuro como agricultor e cidadão.Em síntese, a satisfação e a realização pessoal, como ganho derivado da participação cidadã na discussão, planejamentoe experimentação de alternativas (sejam de aplicação individual ou coletiva, sejam de natureza tecnológica ouorganizacional), poderiam representar uma importante razão social para certos tipos de mudanças por parte dosagricultores.

Uma dimensão ambiental, representada pela luta dos atores locais contra a degradação do meio ambiente, assim comocontra a perda da capacidade produtiva dos ecossistemas utilizados para fins agrícolas. É necessário levar em conta que,desde uma perspectiva ambiental, a agricultura familiar _ enquanto atividade de natureza sócioecológica _ supõe também amobilização de uma maior diversidade de recursos naturais e humanos, promovendo e abrindo espaço para um maiorprotagonismo e participação de seus atores locais na geração de alternativas e na busca de soluções tecnológicas eorganizacionais com base nas necessidades, capacidades, potencialidades e limitações humanas, materiais e naturais.

No centro da dimensão ambiental, e sob a perspectiva do processo de ecologização, estaria o objetivo de recuperar emanter a capacidade produtiva dos agroecossistemas, através da adoção de métodos, técnicas e processos de produçãoecologicamente mais prudentes. Seu fundamento seria a opção por um novo estilo de agricultura, no qual sua "baseecológica" destaca-se como suposto inicial e necessário para o alcance de maiores níveis de sustentabilidade. Aartificialização agroecossistêmica, baseada em insumos químicos de origem industrial, passa a ser substituída pela noçãode potencialização do uso de recursos localmente existentes, numa nova conjugação e combinação de insumos e produtosna agricultura. Isto também supõe a necessidade de novos conhecimentos e experiências aplicadas a ecossistemasespecíficos.

Sob a perspectiva do processo de ação coletiva, as ações concertadas pelos atores locais, para o manejo ecológico dosrecursos naturais, poderão ser entendidas como uma estratégia de enfrentar as atuais tendências à homogeneização ecentralização produtiva, buscando, a partir disso, um novo ponto de equilíbrio ambiental mediante a ampliação daspossibilidades de participação nos âmbitos local e regional. Entre as estratégias elegidas, se destacariam as açõescoletivas para fortalecer o processo de intercâmbio de experiências de natureza ecológico-ambiental entre os agricultores eentre estes e os agentes mediadores do processo de câmbio tecnológico e organizacional.

Assim, sob a perspectiva do manejo sustentável dos recursos naturais, os atores sociais estariam envolvidos em umanova dinâmica _ agora de caráter participativo _ orientada para a geração e a construção social de conhecimentos etecnologias, cujo fundamento seria o próprio aperfeiçoamento do processo de produção agrícola com base ecológica. Ditode outro modo, a produção e socialização de informações e conhecimentos se apresentariam como elementos compotencialidade para apoiar o desenvolvimento do processo de ecologização da agricultura, isto é, para a recuperação e

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manutenção da capacidade produtiva do agroecossistema, agora com base em uma orientação de natureza ecológica.

4. A ação coletiva como "motor" da transição agroecológica

As análises do material empírico realizadas em nossa investigação mostram que, antes que um processo autônomo,endógeno ou espontâneo, a transição agroecológica supõe, primeiramente, a adesão dos agricultores às propostas deextensionistas rurais do serviço público ou de outras instituições vinculadas ao meio rural (no caso do Rio Grande do Sul, opapel exercido por algumas ONGs neste sentido tem sido muito importante), gerando expectativas e originandoexperiências dirigidas à colocação em prática de métodos, técnicas ou estilos de produção agrícola que se afastam dopadrão tecnológico dominante. Embora estas manifestações de adesão nem sempre se dêem a partir de estruturasorganizacionais consolidadas, costumam estar acompanhadas de interação social, onde a intervenção de líderes de opiniãotambém sofre um primeiro processo de filtração por parte dos atores sociais submetidos a dita intervenção.

Em um segundo momento, a partir das análises e diagnósticos sobre as possibilidades e limites para o desenvolvimentodas propostas dirigidas às mudanças nas estratégias tecnológicas e produtivas, a dispersão dos agricultores _ enquantoatores sociais envolvidos em uma atividade atomizada, como é a agricultura _ tende a ser substituída pela idéia deagrupação, enquanto estratégia para apoiar atividades e ações fundamentais, porém nem sempre alcançáveis pela atuaçãoindividualizada dos atores sociais.

Nosso argumento é que, se bem o começo da transição agroecológica dependa muito mais de ações isoladas de indivíduoscom atitudes favoráveis ao câmbio, sua consolidação como processo de ecologização gera, paralelamente, novos desafiose incertezas sobre suas conseqüências e resultados futuros, originando, a partir disso, a necessidade e a pertinência deabordar-se de forma coletiva os novos desafios que se estabelecem. A ação coletiva e as estratégias associativas não sãoapenas resultados deste processo, mas incidem e afetam o seu desenvolvimento e evolução. As ações sociais coletivassão, pois, ao mesmo tempo, o resultado e a causa do processo de transição em direção à conformação de estilos deagricultura de base ecológica.

Dito em outras palavras, os agricultores que se aderem às propostas de agricultura com base ecológica se vêem nanecessidade de articular seus interesses particulares mediante estratégias de ação coletiva. Estas ações de tipo coletivoincidem _ dependendo de seu êxito e da capacidade dos empresários políticos _ na própria determinação dos agricultoresde aperfeiçoar seu trabalho e buscar os instrumentos e apoios para seguir em frente com seus projetos de ecologizaçãodas práticas agrícolas. O processo de ação social coletiva se transforma, assim, de "conseqüência" a "motor" do processode transição agroecológica, dependendo de seu êxito o alcance de resultados econômicos, sociais e ambientais queassegurem a continuidade do processo de mudança.

Do exposto até aqui, é preciso reter que, em determinadas circunstâncias socioeconômicas e ambientais, estes doisprocessos _ a ecologização e a ação coletiva _ podem resultar em uma interação positiva e necessária para orientar abusca e a construção de uma alternativa superadora da atual crise socioambiental na agricultura. Esta crise, percebida emdiferentes graus de intensidade e desde diversas perspectivas pelos atores sociais por ela afetados, estaria proporcionandoo fermento para a elaboração de novas estratégias por parte dos agricultores familiares, cujos objetivos estão orientados aassegurar maiores graus de autonomia a respeito do processo produtivo; diversificar e ampliar as rendas agrárias; oferecera possibilidade de participar na geração e socialização de tecnologias e conhecimentos; aumentar a qualidade de vida emelhorar as condições de trabalho; e recuperar e preservar os recursos do meio ambiente, como forma de ampliar seusespaços de produção e reprodução social e econômica desde uma perspectiva de gestão sustentável dosagroecossistemas.

Em qualquer caso, a interação entre os processos de ecologização e de ação social coletiva expressaria a busca e odesejo de construção de uma alternativa tecnológica e organizacional capaz de superar a mencionada crise socioambientalque afeta e põe em risco a continuidade da reprodução socioeconômica daqueles segmentos da agricultura familiar que nãoquerem, ou já não podem, seguir ou ingressar no processo de modernização agrária segundo o padrão convencional deintensificação tecnológica.

Referências Bibliográficas

COSTABEBER, J. A. Acción colectiva y procesos de transición agroecológica en Rio Grande do Sul, Brasil.Córdoba, 1998. 422p. (Tese de Doutorado) Programa de Doctorado en Agroecología, Campesinado e Historia, ISEC-ETSIAN, Universidad de Córdoba, España, 1998.

GONZÁLEZ DE MOLINA, M.; SEVILLA GUZMÁN, E. Ecología, campesinado e historia. Para una reinterpretación deldesarrollo del capitalismo en la agricultura. In: SEVILLA GUZMÁN, E.; GONZÁLEZ DE MOLINA, M. (ed.): Ecología,campesinado e historia. Madrid: La Piqueta, 1993. p. 23-129.

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*Versão simplificada do Capítulo V da Tese de Doutorado do primeiro autor.

**Eng. Agr., MSc., Dr., Extensionista Rural e Assessor Especial da EMATER/RS-ASCAR. RuaBotafogo, n° 1051. Bairro Menino Deus. CEP 90.150-053 - Porto Alegre (RS). [email protected]

*** Eng. Agr., Dr., Pesquisador e Vice-diretor do Instituto de Estudios Sociales Avanzados deAndalucía - Consejo Superior de Investigaciones Científicas (IESAA-CSIC). Campo Santo de losMártires, n° 7, CEP 14004 - Córdoba, España.

E-mail [email protected]

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RESENHAS

A transnacionalização da indústria de sementes no Brasil

Economía ecológica y política ambiental

Estratégias de transição para o século XX

Agricultura sustentável

Acción colectiva y processos de transición agroecológica en Rio Grande do Sul, Brasil

WILKINSON, J. (Coord.) & CASTELLI, P. G.

A transnacionalização da indústria de sementes no Brasil: biotecnologias, patentes e biodiversidade. Rio deJaneiro: ActionAid Brasil, 2000. 138p.

O livro: A Transnacionalização da Indústria de Sementes no Brasil é obra de autoria de dois renomadosespecialistas, o Prof. John Wilkinson e a doutoranda, engenheira agrônoma Pierina German Castelli, ambosvinculados ao Curso de Pós-graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA), da UFRRJ.

Na verdade, trata-se do resultado de uma pesquisa sobre a internacionalização da indústria de sementes noBrasil, coordenada pelo Prof. Wilkinson, e executada pela doutoranda Pierina Castelli, com o apoio financeiro daActionAid, uma organização não-governamental, sem fins lucrativos, com sua matriz instalada na Inglaterra, cujamissão é apoiar esforços para a eliminação da pobreza e injustiça social na África, Ásia, América do Sul eCaribe.

Apresentado de forma didática, em três capítulos distintos, o livro em foco torna-se deveras acessível e prático,pois encerra, além das oportunas definições de termos (glossário e siglas utilizadas), dezenas de quadros egráficos elucidativos do conteúdo desenvolvido, tudo respaldado por um apreciável volume de referênciabibliográficas, que certamente serão úteis aos leitores que desejarem avançar na busca de mais e melhoresinformações relacionadas à temática abordada.

Ao se iniciar a leitura do livro, depara-se com a apresentação feita pela ActionAid Brasil, da qual destacamos oseguinte trecho: "Há algumas décadas o debate sobre a segurança alimentar era dominado pela noção de que afome seria solucionada pelo aumento da produção de alimentos. Hoje, contudo, cada vez mais fica claro que acapacidade de acesso dos povos à alimentação tornou-se o elemento crucial. Segurança alimentar e nutricionalsignifica garantir a todos o acesso a alimentos básicos de qualidade, em quantidade suficiente, de modopermanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, com base em práticas alimentaressaudáveis."

"A compreensão de que o acesso ao alimento está na raiz da problemática da fome nos remete ao debate sobreo controle da produção, (...) ou seja, sobre a unidade básica da produção agrícola - a semente - um dos insumosmais essenciais à produção de alimentos"

Aborda, também, de forma inteligível a relação existente entre o mercado de sementes e a (in)segurançaalimentar, considerando que "cerca de 800 milhões de pessoas passam fome no mundo (...) e no Brasil, cercade 32 milhões se encontram em situação de indigência e fome".

A publicação chancelada pela ActionAid Brasil é parte integrante da "Campanha por um Brasil Livre deTransgênicos", iniciada em 1999, com o objetivo de conscientizar a opinião pública sobre os riscos que issopode causar à saúde humana e ao meio ambiente, além da ameaça que a nefasta concentração do mercado desementes pelas empresas multinacionais representa para a agricultura familiar, à conservação da biodiversidadee à segurança alimentar da população brasileira.

Surge, daí, uma série de questionamentos, por exemplo: qual foi a evolução do mercado de sementes e quaissão as tendências mundiais do setor? Como e por que aconteceram as grandes mudanças estruturais no setor

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de sementes, em várias partes do mundo? Que impactos trouxe, tem trazido e ainda trará o monopólio daindústria de sementes e quais os cenários que buscam captar as implicações das novas tecnologias àpropriedade familiar?

São questões que podem ser feitas, e que nos estudos realizados por Pierina Castelli e John Wilkinson, fazendouma verdadeira radiografia do setor sementeiro, não só respondem, mas mostram preocupação com os impactosda transnacionalização, principalmente sobre a agricultura familiar.

Os autores relatam que ao longo do século XX, a semente tornou-se uma mercadoria no quadro da divisão dotrabalho entre o agricultor e a indústria. O começo de uma verdadeira indústria de semente, se deu quandopesquisadores norte-americanos concluíram pesquisas sobre o milho híbrido.

Com a emergência das novas biotecnologias, a partir da década de 70, a indústria de sementes se reorganizoucom base em um novo paradigma científico, tornando o setor o objeto de outros ramos industriais, como asempresas de insumos químicos e farmacêuticos.

Anteriormente, os métodos de melhoramento genético eram os tradicionais e as firmas líderes eram empresasnacionais ou multinacionais, cujo principal negócio consistia na própria atividade sementeira, no comércio ou natransformação de grãos.

Existia um grupo de empresas emergentes que mantinham estratégias de elevados gastos em pesquisa edesenvolvimento na área de biotecnologia, sem participação significativa no mercado de sementes. A partir de1994, se acentuam as mudanças na indústria de sementes que estavam acontecendo desde a década de 80,quando começaram ocorrer as maiores transformações, mediante fusões e aquisições por parte das grandescompanhias agroquímicas e biotecnológicas. A convergência de interesses aumentou o impacto potencial dasbiotecnologias, onde as firmas de biotecnologia agrícola, de sementes e agroquímicos estão num processo defusão/aquisição, baseado no reconhecimento de que essas tecnologias são complementares. Essascompanhias estão criando relações com a indústria a jusante, para agregar valor nos mercados industriais dealimentos, reportam os autores. As biotecnologias estão se convertendo num componente crítico na evolução eexecução de estratégias das companhias das "ciências da vida".

A partir da comercialização das primeiras plantas transgênicas nos EUA, a indústria sementeira tem-secaracterizado por mudanças estruturais (fusões/aquisições), surgindo algumas megafirmas que combinamcompetências em biotecnologias, agroquímicos e sementes, e estão disputando a área do genoma das plantas.

A reestruturação da indústria de sementes no final da década de 90, mostrada no Quadro 2, mostra-nos aseguinte situação: a Monsanto (EUA) adquire 29 empresas de sementes, sendo que quatro são do Brasil; aDuPont (EUA) cinco, sendo que uma é do Brasil; a Novartis (Suíça) 16; a Aventis (Alemanha/França) nove,sendo quatro do Brasil; a Dow AgroScience (EUA) 13, sendo cinco do Brasil; a Sakata Seed Crop (Japão) eSavia S.A. (México) assumiram o controle de 31 empresas, sendo três do Brasil, de onde se depreende que,pelo menos, 22 firmas brasileiras foram compradas pelas multinacionais.

A propósito, as cinco maiores companhias mundiais no mercado de sementes são: DuPont (mais de US$1,8bilhão); Monsanto (US$1,8 bilhão); Novartis (cerca de US$1 bilhão), seguindo-se a Aventis e Savia.

"Cabe refletir sobre o porquê das compras de empresas de sementes em diversos países por parte dastransnacionais", alertam os autores. As inovações vegetais (cultivares) devem adaptar-se às condiçõesedafoclimáticas e ecológicas nas quais são introduzidas. Portanto, trata-se de um tipo de invenção que não podeser transferida de seu país de origem para o resto do mundo sem modificações e adaptações subseqüentes.Nesse sentido, as empresas transnacionais detinham o know-how e os genes de interesse econômico paraintroduzir na criação dos cultivos transgênicos, "mas não contavam com o germoplasma de cultivares adaptadasaos diferentes ambientes agrícolas dos diversos países". Para poder levar adiante as inovações tecnológicas,as transnacionais precisam adquirir empresas de sementes, "a fim de acessar um banco de germoplasmaadaptado às condições ambientais de cada lugar ou, alternativamente, poder estabelecer convênios comentidades públicas de pesquisa no setor vegetal", acrescentam os autores.

No período de 1997 a 1999, observa-se forte mudança nas empresas presentes no mercado de milho. Até 1997,o número de empresas foi mais diversificado: as quatro maiores empresas (Agroceres, Cargill, Pionner eNovartis) detinham 77% do mercado de sementes. Em 1999, observa-se um aumento na concentração emudanças em posições relativas: as quatro maiores empresas detêm 90% do mercado de sementes de milho,

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todas transnacionais. "A Monsanto, por intermédio de sua filial Monsoy, no Brasil, revelam os autores,abocanham as fatias da Agroceres, da Cargill, da Braskalb, e atualmente, reina absoluta, com 60% do mercado".A segunda maior empresa é a Pioneer, controlada pela DuPont, com 14%, seguidas pela Novartis (11%), e Dow,que comprou a Dinamilho Carol, com 5%. O restante do mercado é dividido entre a Zeneca (3%), Agr-Evo (2%),e a Unimilho - única empresa de capital nacional -, que reúne 17 empresas de produção de híbridos em franquiada Embrapa, detém 5% do mercado.

Segundo os autores, a Monsoy, uma divisão da Monsanto no Brasil, investiu US$100 milhões no mercado demilho. O trabalho desenvolvido com os cooperantes funciona como a integração nas criações de frangos esuínos; ela entrega a semente, o produtor planta, colhe e devolve a semente à empresa, que a beneficia, embalae vende. O franqueado recebe entre 30% e 70% acima do valor do mercado.

Em 1999, na tentativa de atenuar o impacto da entrada das transnacionais, pesquisadores, produtores edirigentes de cooperativas criaram o Grupo Pró-Sementes/RS, integrado pela Embrapa (trigo, clima temperado esementes básicas), Fepagro, Fundacep UPF, Fecoagro e Apassul, cujo principal objetivo é a utilização dasemente para aumentar a produtividade do grão colhido.

A obra apresenta, ainda, uma análise sobre os acordos e legislações básicas que regulam ou interferem com aquestão de sementes no panorama nacional e internacional. Discutem-se as leis: 9.279/96 (Lei de Patentes),9.456/97 (Lei de Proteção de Cultivares), 8.974/95 (CNTBio), e Lei de Acesso aos Recursos Genéticos (Projetosde lei nº 306/95 e 4751/98, em discussão no Congresso Federal).

O terceiro e último capítulo aborda os impactos da transnacionalização, dos transgênicos e do novo quadroregulatório sobre a agricultura familiar. Nele se descortinam cenários sobre: a) organização da indústria desementes, a partir de 1970 e os espaços da agricultura familiar; b) implicações do novo marco jurídico daindústria de sementes para o agricultor familiar; c) a indústria de sementes sob o domínio das transnacionais; d)a luta contra os transgênicos implica maior regulação do setor; e) os aspectos favoráveis do novo marcoregulatório diante da atuação das transnacionais; f) situação mais favorável do agricultor familiar em algumasnovas rubricas dinâmicas da produção em massa; g) mercados artesanais - uma nova oportunidade para aagricultura familiar; h) a Convenção sobre a biodiversidade biológica e os direitos das comunidades locais.

Os autores enriquecem a obra com experiências inovadoras sobre a conservação e uso da biodiversidadeagrícola, quando, a AS-PTA (Assessoria e Serviços a Projetos em Tecnologia Alternativa), no início da décadade 90, implementou trabalho de resgate de variedades crioulas e raças tradicionais de pequenos animaisdomésticos em comunidades de agricultores familiares.

Hoje, este trabalho envolve cerca de 8 mil famílias na região do Centro-Sul do Paraná e no Agreste Paraibano,onde realizam métodos participativos junto à comunidade, para organizar campos de multiplicação de sementes;melhorar variedades crioulas; promover o intercâmbio entre agricultores e conservar o patrimônio genético localpor meio de bancos de sementes comunitários.

Uma das conclusões retirada da análise realizada pelos autores "é de que há tendência de forte concentração nosetor de produção de sementes por parte das transnacionais, devido às estratégias de levar a cabo asabsorções".

MARTÍNEZ Alier, Joan y ROCA Jusmet, Jordi. Economía ecológica y política ambiental. México:PNUMA/FCE, 2000. 487 p.

Temos aí uma leitura indispensável para todos os profissionais e formuladores de políticas públicas que estãoatuando na perspectiva da sustentabilidade.

Como é sabido, a economia ecológica vem se destacando como um novo enfoque científico ou campo doestudo alternativo com respeito à economia neo-clássica e suas vertentes ambientalistas, a economia do meioambiente ou economia ambiental, cujas diferenças e princípios são cotejados nesta obra.

Os autores tratam de demonstrar que, ao contrário das correntes convencionais que estudam a economia comoum sistema fechado, partir da economia ecológica, a economia é entendida como "um subsistema dentro de um

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ecossistema global finito" no qual ocorrem inter-relações entre o uso dos recursos naturais e os impactosambientais. Como destacam, a economia ecológica pode ser entendida como a "ciência e gestão dasustentabilidade".

Já no primeiro capítulo, os autores tratam de explicar o que significa entender a economia como um sistemaaberto. Destacando aspectos importantes e pouco considerados em nossas políticas de desenvolvimento, comoos fluxos e balanços energéticos e os limites ao crescimento determinados pela chamada "segunda contradiçãodo capitalismo".

O segundo capítulo está dedicado a aprofundar o assunto a partir de uma nova perspectiva de análise do PIB edas "contas nacionais". Critica, por exemplo, o tratamento dado pela macroeconomia convencional à noção de"patrimônio ambiental", destacando a diferença-chave que há entre recursos naturais e bens fabricados, quantoaos primeiros não se pode aplicar cálculos de autorização. Assim mesmo, trata sobre a noção de PIB Verde, esobre os conceitos de "Gastos Defensivos ou Compensatórios", concluindo com uma reflexão sobre a idéia debem-estar econômico sustentável, proposto por Daly e Cobb.

A partir do terceiro capítulo, os autores resgatam um pouco da histórica construção teórica da economiaecológica, e aprofundam o debate sobre "instrumentos de política ambiental", abordando temas como a relaçãoentre custos privados e custos sociais, a negociação coasiana, impostos sobre contaminação, destacando aquestão dos "impostos ecológicos ou ambientais", tão em voga nos nossos dias, apontando suas possibilidadese limitações.

Na seqüência, o livro nos leva ao problema crítico do estabelecimento de valor e critérios de decisão, quando oobjeto são os recursos naturais. Partindo de uma reflexão sobre o conceito de eficiência e da análise de custo-benefício.

Os autores alertam, já de saída, para a contradição entre eficiência e distribuição do ingresso, inerente àspolíticas convencionais. A maior parte do capítulo quadro está dedicado ao debate sobre a lógica e as limitaçõesda aplicação da perspectiva de custo-benefício. Depois de uma reflexão crítica, os autores sugerem umaalternativa concreta, afirmando que "é possível decidir de forma racional e bem informada - "multicriterialmente,sem apelar para uma redução de todos os custos e benefícios a uma mesma unidade: o dinheiro".

Os capítulos seis e sete tratam sobre economia dos recursos não-renováveis e sobre exploração dos recursosrenováveis, mas que são esgotáveis. Neles, uma vez mais, fica evidente a diferença de tratamento que pode serdada pela economia neoclássica e pela economia ecológica à análise destes temas. Há, no capítulo sete, umquadro interessante sobre o enfoque convencional da economia florestal e proposições alternativas apresentadaspela economia ecológica. Igualmente interessantes são as reflexões e exemplos sobre a economia pesqueira,um problema presente e que merece estudos no Rio Grande do Sul.

O debate conceitual sobre sustentabilidade, ainda que presente ao longo da obra, é tratado de forma detalhadano capítulo oito. Entretanto, além do debate teórico, os autores partem para a discussão sobre "critérios práticosde sustentabilidade" e os limites e graus de incerteza dos diferentes critérios que podem ser usados. Ademais,abordam temas relevantes como a questão da "capacidade de carga", as "pegadas ecológicas", os impactos daurbanização, entre outros.

Por fim, o capítulo nove se dedica à economia política, ou seja, o "estudo dos conflitos de distribuiçãoecológica" e sua relação com a "sustentabilidade ecológica da economia".

O livro termina com um instigante debate sobre "intercâmbio ecológico desigual", dívida ecológica e dívidaexterna, entretanto também em temas da maior relevância como a institucionalização da biopirataria.Igualmente, são tratados diferentes tipos de conflitos sociais derivados da externalização dos custos,abordados, inclusive, sob a ótica da justiça ambiental ou do "imperialismo tóxico", ficando os últimos parágrafosreservados a uma reflexão sobre "os direitos dos agricultores" sobre a biodiversidade.

Sachs, Ignacy. Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. São Paulo:Estúdio Nobel/ Fundação do Desenvolvimento Administrativo (FUNDAP)

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"Temos fé no futuro da humanidade neste planeta. Acreditamos na possibilidade de modos de vida e sistemasmais justos, menos arrogantes em suas exigências materiais, mais respeitadores do ambiente planetário ..."(UNEP - In Defense of Earth, citado na obra)

A partir da ECO-92, o marco histórico na luta por um mundo com menos desperdício, o debate em torno de umprojeto de "desenvolvimento sustentável" passou a fazer parte da busca por uma sociedade mais justa e queconsiga administrar um processo de segurança ambiental.

Segundo o autor, a união entre desenvolvimento e meio ambiente é o único caminho viável tanto para ricoscomo para pobres, que, apesar de apresentarem-se como "castas" totalmente segregadas, vivem dentro domesmo limite geográfico (o limite da biosfera) e compartilham, as mesmas necessidades quanto à preservaçãodo ar e de todos os outros recursos naturais.

O padrão de consumo existente nos países ditos "desenvolvidos" assume algumas proporções insustentáveis,por exemplo: apenas 16% da população mundial que ocupa cerca de 24% da área do globo é responsável por50% do consumo de energia do planeta e por 60% da emissão de resíduos industriais lançados à atmosfera todoo ano. Foi exatamente esse padrão que gerou o esgotamento ambiental global. Será então que o padrão deconsumo destes 16% da população pode ser incentivado como objetivo para os outros 84%? Certamente não. Épreciso retomar então, a própria noção de desenvolvido/subdesenvolvido; rico/pobre. O crescimento econômiconão pode mais ser considerado um parâmetro confiável para avaliar o desenvolvimento que vem ocorrendo nasnações.

Nesta obra há uma ênfase especial na questão do desenvolvimento agrícola e rural sustentável. O autor citainclusive algumas mudanças fundamentais que precisam ocorrer na estrutura desse setor: aumento daparticipação da população agrícola nas decisões (fortalecendo assim grupos locais); investimento na reabilitaçãoe na conservação dos recursos naturais; esforços científicos em forma de pesquisas que busquem combinar astecnologias tradicionais e as de ponta.

A partir da participação da sociedade nas tomadas de decisão, o autor sugere como o instrumento principaldessa reorganização a chamada Agenda 21. Esse documento é formado por um conjunto de ações práticasestabelecidas localmente e que contribuem de forma decisiva para a nova política de desenvolvimento.

Sachs estabelece alguns fatores-chave que devem ser abordados no momento de qualquer discussão sobredesenvolvimento sustentável:

1) necessidade de conter o consumo excessivo;

2) a concepção de que os sistemas econômicos dependem dos sistemas ecológicos;

3) é preferível subestimar o "poder" do ajuste tecnológico;

4) introdução do conceito de capital natural;

5) ampliação dos critérios para estimar valor.

Toda a discussão em torno do desenvolvimento sustentável tem encontrado um importante arcabouço teórico nachamada economia ecológica. Esse setor da ciência econômica tem feito esforços que buscam conciliar o "eco"das duas ciências que durante muito tempo andaram separadas, a economia e a ecologia.

A ECO-92 reuniu representantes de 180 países. Eles discutiram, durante duas semanas, medidas comuns paraum novo padrão de desenvolvimento.

Muitas pessoas podem ter ficado, de certa forma, decepcionadas com os resultados práticos de tantas reuniões,entretanto, se analisarmos o que vinha sendo feito (absolutamente nada), podemos considerar a ECO-92 comoum marco na história da luta por um mundo mais "ecológico" (a discussão começou efetivamente a ser feita).

O assunto saiu dos bancos acadêmicos. Várias entidades civis reuniram-se paralelamente à reunião dosdirigentes e procuraram também estabelecer metas comuns. Havia simpósios e conferências a todo momentocom os mais diversificados setores sociais. Neste evento é que se pode dizer que a relação entre meioambiente e desenvolvimento foi definitivamente estabelecida.

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Existem ainda muitos problemas que devem ser solucionados para a efetivação de um projeto comum dedesenvolvimento sustentável: a relação entre cientistas e a sociedade civil ainda está sendo construída de umaforma lenta; as declarações assinadas (Declaração sobre as Florestas, Convenção sobre Biodiversidade,...)ainda não saíram do papel para a prática; a Agenda 21 ainda vem sendo estudada e discutida em vários países(o Brasil determinou a sua, na metade do ano 2000, ou seja, 8 anos depois do evento e agora é que devecomeçar a colocá-la em prática).

Além de toda a discussão teórica e a exposição dos resultados da ECO-92, nos apêndices do livro conseguimosvisualizar, através de alguns dados, as situações a que se refere o autor durante a sua argumentação.Indicadores de desenvolvimento humano, dados estatísticos e a Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente eDesenvolvimento enriquecem ainda mais o excelente trabalho.

Ignacy Sachs consegue em poucas páginas descrever o processo de desenvolvimento em que vivemos eexplicar a insustentabilidade desse processo de uma forma clara. Não é necessário ao leitor qualquerespecialização ou curso prévio sobre o assunto para tornar "Estratégia de Transição para o Século XXI -Desenvolvimento e Meio Ambiente" uma leitura agradável e de grande valor para todos aqueles que, de umaforma ou de outra, buscam um mundo mais justo orientado para o desenvolvimento sustentável.

Ehlers, Eduardo. Agricultura sustentável: origens e perspectivas de um novo paradigma. São Paulo: Livros daTerra, 1996.

"Apesar da experiência milenar, o domínio sobre as técnicas... de produção de alimentos sempre foi um dosmaiores desafios da humanidade." (Ehlers)

É relativamente comum a utilização da expressão agricultura sustentável na literatura mais recente sobre osmétodos de produção agrícola. Entretanto, quando surge a necessidade de definir e estabelecer as principaiscaracterísticas desse suposto modo de produção alternativo para a agricultura, não há consenso entre ospesquisadores.

A partir da identificação da necessidade de definir e buscar uma construção teórica para essa nova alternativa,Ehlers desenvolveu sua tese de mestrado na USP sob a orientação de José Eli da Veiga (que dispensa qualquerapresentação no meio da pesquisa de desenvolvimento rural). Dada linguagem acessível da obra e aabrangência do assunto numa área em que a bibliografia brasileira ainda está muito carente, a tese foi publicadapela editora paulista Livros da Terra e está a disposição dos interessados na Biblioteca da EMATER, noescritório central em Porto Alegre.

Ehlers identifica três revoluções no padrão de produção agrícola. Vale a pena analisar melhor quais ascaracterísticas de cada uma. A Primeira Revolução Agrícola caracteriza-se essencialmente pela aproximação daprodução animal e vegetal.

A "agricultura moderna", que surge com a Segunda Revolução Agrícola, é caracterizada pelas descobertascientíficas e o desenvolvimento de vários avanços tecnológicos (fertilizantes químicos, melhoramento genéticodas plantas, motores a combustão interna etc). Durante esse período, que culminou com a divulgação ampla dopacote tecnológico característico da Revolução Verde, havia uma idéia amplamente aceita entre os produtoresagrícolas e cientistas ligados a essa área que o aumento da produção agrícola seria diretamente proporcional àquantidade de substâncias químicas incorporadas ao solo.

Houve um abandono quase que total das práticas "tradicionais" de produção. Conforme cita o autor: ".... emmeados do século XIX, ... muitas indústrias empenharam-se em fazer propaganda contrária aos processos defertilização orgânica (que faziam parte do conhecimento tradicional do produtor), procurando mostrar que setratava de uma prática antiquada". Com a ocorrência das duas grandes guerras, uma nova geração de produtosquímicos foi desenvolvida (já que diversos compostos químicos desenvolvidos como armas químicas acabarampor ser amplamente utilizados na agricultura como agrotóxicos ou inseticidas), o que resultou num abandonocada vez maior das técnicas tradicionais.

Esse padrão teve conseqüências ambientais que começaram a ser notadas ainda na década de 30 ,especialmente após o dust bowl, ("caldeirão de poeira") que ocorre nos EUA. Nessa ocasião milhares detoneladas de solos férteis do Estado de Oklahoma foram carregados pelo processo de erosão e o governo

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toneladas de solos férteis do Estado de Oklahoma foram carregados pelo processo de erosão e o governoamericano admitiu, tempo depois, que a catástrofe poderia ter ocorrido devido ao erro no enfoque dado àmecanização.

No Brasil, além das conseqüências ambientais, a adoção desse pacote tecnológico causou um problema social.As grandes fazendas foram consideradas as mais adequadas para a adoção desse padrão (certamente porquestões políticas, já que outros países centrais optaram claramente pelo padrão de agricultura familiar mesmodurante a Revolução Verde), o que acabou incrementando de uma maneira sem precedentes o êxodo rural.

A constatação dos problemas gerados pelo padrão de produção tradicional aumentou o interesse pelodesenvolvimento de um padrão alternativo. A partir da década de 60, começa a estruturar-se um movimento embusca de uma nova forma de produzir e modelos de sociedade alternativa. São desenvolvidos sistemasalternativos que buscam formar um conjunto de práticas sustentáveis para a produção agrícola: produçãobiodinâmica, produção orgânica, produção biológica e produção natural.

A idéia de agricultura sustentável começa, então, a aparecer na literatura. Entretanto, como no caso daexpressão desenvolvimento sustentável, não existe uma definição clara, única, que possa ser aplicada a esseconceito sem ressalvas. Pode-se considerar que a agricultura sustentável não constitui algum conjunto depráticas especiais (como o "pacote tecnológico" da Revolução Verde), mas um objetivo a ser alcançado. O autornos mostra que existem algumas diretrizes gerais que conseguem reunir grande parte dos interesses em tornode um modo alternativo de produção: incentivo a substituição dos sistemas produtivos simplificados, oumonoculturais, por sistemas rotacionais diversificados; a reorientação da pesquisa agropecuária para umenfoque sistêmico e o fortalecimento da agricultura familiar.

Surge ainda uma outra discussão abordada por Ehlers: a agricultura sustentável é realmente uma "revolução"para as práticas agrícolas ou é uma "evolução" da própria agricultura convencional, como resposta aosproblemas ambientais que gerou?

A discussão está ainda em aberto e tem se constituído como um campo de pesquisa para os cientistas da áreasocial.

Enfim, as práticas de uma agricultura sustentável não significam uma volta ao passado. É fácil constatar que ossistemas alternativos são mais diversificados do que os convencionais. Exigem uma maior capacidade degerenciamento, uma mão-de-obra qualificada (daí considera o autor, a fundamentalidade da educação ambientalpara o desenvolvimento de uma agricultura sustentável) e especialmente o conhecimento técnico sobre asinterações que ocorrem entre os diferentes componentes dos ecossistemas.

O desafio principal de um projeto alternativo para a produção agrícola, não só no Brasil, mas em todo o mundoatualmente é provocar, o que foi chamado por José Eli da Veiga de, uma "revolução super ou duplamenteverde". O caráter duplo decorre da necessidade de atender aos dois problemas básicos da agricultura hoje:promover uma revolução ainda mais produtiva do que a "simplesmente verde" e que ao mesmo tempo consigapreservar os recursos naturais e o meio ambiente.

"Agricultura sustentável: ..." traz uma interessante revisão teórica da história da produção agrícola e, através deuma leitura agradável, mostra ao leitor os principais problemas existentes atualmente na agricultura, que tipo dealternativas tem sido apresentadas e quais são os resultados da aplicação dessas práticas alternativas nomundo.

Costabeber, José Antônio. Acción colectiva y processos de transición agroecológica en Rio Grande doSul, Brasil. Córdoba, 1998. 422 p. (Tese de Doutorado) Programa de Doctorado en Agroecologia, Campesinadoe História, ISEC-ETSIAN, Universidad de Córdoba, España, 1998.

"... el paciente se murió, pero lá operación fue un êxito". (Costabeber)

A busca por um planejamento que contemple bases mais sustentáveis vem sendo assunto cada vez maisfreqüente nas discussões sobre desenvolvimento econômico. O desenvolvimento sustentável, na suaconcepção mais abrangente, é aquele que satisfaz as necessidades das gerações presentes sem comprometer

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a capacidade das gerações futuras para satisfazer suas próprias necessidades.

A agricultura, por suprir grande parte dessas necessidades e por causar ainda uma porção considerável dadegradação ambiental, é parte importante do sistema que busca uma transformação. A produção agrícola foisempre essencial ao sistema de produção como um todo, entretanto ele deixou de ser apenas um setorfornecedor de matéria-prima, para transformar-se também em um grande mercado consumidor. Essatransformação, decorrente da chamada Revolução Verde, foi capaz de mudar o modo de vida dos agricultores,especialmente daqueles responsáveis pelas pequenas produções no meio rural. Os pacotes tecnológicos querevolucionaram os índices de produtividade do setor também foram responsáveis pela exclusão de grande partedos produtores, uma vez que o "mercado consumidor agrícola", como qualquer outro, está submetido a umaaprovação de crédito (geralmente garantido àqueles que conseguem demonstrar maior segurança frente aos"choques" do mercado).

Conhecendo os antecedentes desse processo, Costabeber analisa a mudança do padrão de produção que vemaos poucos ocorrendo no Rio Grande do Sul. A agroecologia tem sido um dos sistemas mais bem sucedidos noEstado, na busca por um padrão alternativo de produção. Foi a partir da experiência dos pequenos agricultoresgaúchos que o autor baseou-se na realização da sua tese. Costabeber desenvolveu o seguinte conjunto dehipóteses para discutir dentro do seu trabalho:

1ª) Os agricultores familiares do Rio Grande do Sul optam por estilos de agricultura ecológica como forma degarantir sua reprodução social como agricultores. A lógica que substancia esta opção é fundamentalmente denatureza econômica e social e responde a uma racionalidade do tipo instrumental.

2ª) Os agricultores familiares gaúchos são os que estão em melhores condições para conscientizar-se dosefeitos negativos sobre o meio ambiente que têm práticas agrícolas baseadas no paradigma produtivista. Porisso suas opções pela agricultura ecológica respondem também a uma racionalidade substantiva orientada emvalores em que está presente o desejo de construir uma nova ética referente à atuação sobre o meio ambiente.

3ª) Os agricultores familiares gaúchos agrupam-se em forma de ações coletivas para superar as dificuldadesdecorrentes da introdução dos novos estilos de agricultura ecológica em um contexto pouco favorável marcadopelo paradigma da modernização produtivista. Este processo de integração baseado em experiênciasassociativistas não é somente um instrumental. Ele tem na sua base a busca por identidade e a construção deinteresses compartilhados, isto converte as associações de agricultores ecológicos em organizações próximas amovimentos sociais.

4ª) As instituições públicas, como a extensão rural, ou privadas, como as ONGs, desempenham um papelfundamental na dinamização dos agricultores familiares na busca da ecologização de suas práticas agrícolas.Os discursos e as concepções destas instituições a respeito dos problemas ecológicos da agricultura estão emsintonia com a realidade que experimentam os agricultores familiares no Rio Grande do Sul.

Consideradas as hipóteses expostas, o objetivo geral da tese é o de identificar as razões que fundamentam asações coletivas orientadas a gerar os processos de transição agroecológica no contexto das associações dosagricultores ecológicos. São estudados os casos específicos de quatro instituições gaúchas, selecionadassegundo critérios estabelecidos pelo autor.

Costabeber leva o leitor a uma revisão teórica dos principais pensadores que analisaram o comportamentocamponês e posteriormente a inserção da agricultura familiar no ambiente econômico. A perspectiva marxistatradicional, representada especialmente por Lênin, Kautsky e Jenry, considera o camponês como um estado detransição do capitalismo. A agricultura familiar é aí um resíduo e será eliminada.

A agricultura tradicional, de acordo com a perspectiva liberal tradicional, busca transformar-se numa agriculturamoderna, baseada em valores urbanos industrial. Schultz e Rogers centram suas análises na difusão dainovação. Ambos consideram que é preciso alterar radicalmente os fatores de produção.

Chayanov, como um dos importantes teóricos da agricultura camponesa, não poderia ficar de fora da revisãoteórica feita pelo autor. O equilíbrio entre trabalho e consumo da unidade de produção familiar determina, deforma subjetiva, a intensidade do trabalho na propriedade.

A perspectiva agroecológica, que assim como as demais formas de pensamento busca constituir um referencialteórico e analítico, considera como uma das características fundamentais da agricultura, a heterogeneidade. Deacordo com essa análise os pacotes tecnológicos homogêneos (estilo Revolução Verde) desrespeitam as

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acordo com essa análise, os pacotes tecnológicos homogêneos (estilo Revolução Verde) desrespeitam asrelações com o meio ambiente. É preciso um esforço pela manutenção da diversidade biológica dosagrossistemas.

Costabeber dedica-se também a analisar os aspectos mais significativos da agricultura e da sociedade rural noestado do Rio Grande do Sul. O processo de modernização da agricultura gaúcha e a atuação dos atores sociaisenvolvidos na transformação da produção agrícola fazem parte de uma ampla análise que mostra como vemocorrendo a inserção/exclusão dos produtores familiares no RS. É importante salientar que ao mesmo tempo emque famílias são expulsas do campo, agravando o problema do êxodo rural, outras unidades produtivas estãocompletamente integradas ao complexo agroindustrial.

É baseado na análise de quatro experiências de associativismo entre pequenos produtores que buscavam umaalternativa ao complexo agroindustrial que o autor desenvolve o estudo referente às hipóteses levantadas. Asassociações são as seguintes: 1) Associação de Fruticultores Ecológicos de Sobradinho; 2) Associação dosAgricultores Ecologistas de Ipê e Antônio Prado; 3) Associação dos Produtores Ecologistas da Linha PereiraLima; 4) Associação dos Citricultores Ecológicos do Vale do Caí. Cada instituição é amplamente analisada notrabalho (base social e organizacional, como foi feita a opção pelo novo padrão de produção etc).

O autor conclui, depois de analisar no trabalho exaustivamente as hipóteses, que o processo de ecologização daagricultura no Rio Grande do Sul não pode ser atribuída somente a concepção ecológica dos agricultores.Razões econômicas e a exclusão social são os fatores principais para essa mudança na forma de produzir.Sendo assim, não causa surpresa a constatação de que nas associações, os protagonistas das experiênciassão agricultores familiares periféricos, ou seja, os mais pobres do campo. Com menos espanto ainda pode-seconsiderar a idéia de que a agricultura agroecológica tem sido a alternativa, que além de viabilizarambientalmente a produção agrícola, torna possível a inclusão social rural.

Há ainda, como bem salienta o autor, um processo amplo de difusão deste trabalho a ser feito para outrascomunidades que também se encontram em processo de exclusão da produção familiar. Antes de ser umtrabalho que encerra alguma discussão teórica, o esforço do autor é um ponto de partida para novos estudos e odesenvolvimento de novas experiências de produção agroecológicas.

A tese escrita por José Antônio Costabeber, e à disposição na Biblioteca da EMATER/RS, abre uma série dediscussões ainda não resolvidas em torno da sustentabilidade da agricultura. Não há como negar que a análisedas experiências apresentadas pelo autor torna o associativismo e o mecanismo de ações coletivas comoalgumas das grandes esperanças para a exclusão ainda hoje existente no meio rural. Mais do que "esperanças",o trabalho indica um caminho concreto de trabalho para os interessados na questão social imposta atualmentepelo modo de produção capitalista.

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NORMAS PARA PUBLICAÇÃO

1. Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável é uma publicação da EMATER/RS,destinada à divulgação de trabalhos de agricultores, extensionistas, professores, pesquisadores eoutros profissionais dedicados aos temas centrais de interesse da Revista.

2. Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável é um periódico de publicação trimestralque tem como público referencial todas aquelas pessoas que estão empenhadas na construção daAgricultura e do Desenvolvimento Rural Sustentáveis.

3. Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável publica artigos científicos, resultados depesquisa, estudos de caso, resenhas de teses e livros, assim como experiências e relatos detrabalhos orientados pelos princípios da Agroecologia. Além disso, aceita artigos com enfoquesteóricos e/ou práticos nos campos do Desenvolvimento Rural Sustentável e da AgriculturaSustentável, esta entendida como toda a forma ou estilo de agricultura de base ecológica,independentemente da orientação teórica sobre a qual se assenta. Como não poderia deixar de ser,a Revista dedica especial interesse à Agricultura Familiar, que constitui o público exclusivo daExtensão Rural gaúcha. Neste sentido, são aceitos para publicação artigos e textos que tratemteoricamente este tema e/ou abordem estratégias e práticas que promovam o fortalecimento daAgricultura Familiar.

4. Os artigos e textos devem ser enviados em papel e em disquete à Biblioteca da EMATER/RS(A/C Mariléa Fabião Borralho, Rua Botafogo, 1051 – Bairro Menino Deus – CEP 90150-053 – PortoAlegre – RS) ou por correio eletrônico (para [email protected]) até o último dia dos mesesde março, junho, setembro e dezembro de cada ano. Ademais, devem ser acompanhados de cartaautorizando sua publicação na Revista Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável,devendo constar o endereço completo do autor.

5. Serão aceitos para publicação textos escritos em Português ou Espanhol, assim como traduçãode textos para estes idiomas. Salienta-se que, no caso das traduções, deve ser mencionado deforma explícita, em pé de página, "Tradução autorizada e revisada pelo autor" ou "Traduçãoautorizada e não revisada pelo autor", conforme for o caso.

6. Terão prioridade na ordem de publicação os textos inéditos, ainda não publicados, assim comoaqueles que estejam centrados em temas da atualidade e contemporâneos ao debate e ao "estadoda arte" do campo de estudo a que se refere. Assim mesmo, terão prioridade os textosencomendados pela Revista.

7. Serão enviados 5 (cinco) exemplares do número da Revista para todos os autores que tiveremseus artigos ou textos publicados. Em qualquer caso, os textos não aceitos para publicação nãoserão devolvidos aos seus autores.

8. As contribuições devem ter no máximo 10 (dez) laudas (usando editor de textos Word) emformato A-4, devendo ser utilizada letra Times New Roman, tamanho 12 e espaço 1,5 entre linhas(dois espaços entre parágrafos). Poderão ser utilizadas notas de pé de página ou notas ao final,devidamente numeradas, devendo ser escritas em letra Times New Roman, tamanho 10 e espaçosimples. Quando for o caso, fotos, mapas, gráficos e figuras devem ser enviados,obrigatoriamente, em formato digital e preparados em softwares compatíveis com a plataformawindows, de preferência em formato JPG ou GIF.

9. Os artigos devem seguir as normas da ABNT (NBR 6022/2000). Recomenda-se que sejaminseridas no corpo do texto todas as citações bibliográficas, destacando, entre parênteses, osobrenome do autor, ano de publicação e, se for o caso, o número da página citada ou letrasminúsculas quando houver mais de uma citação do mesmo autor e ano. Exemplos: Como jámencionou Silva (1999, p.42); como já mencionou Souza (1999 a,b); ou, no final da citação,

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usando (Silva, 1999, p.42).

10. As referências bibliográficas devem ser reunidas no fim do texto, na Bibliografia, seguindo asnormas da ABNT (NBR 6023/2000).

11. Sobre a estrutura dos artigos técnico-científicos:

a) Título do artigo: em negrito e centrado

b) Nome(s) do(s) autor(es): iniciando pelo(s) sobrenome(s), acompanhado(s) de notade rodapé onde conste: profissão, titulação, atividade profissional, local de trabalho,endereço e E-mail.

c) Resumo: no máximo em 10 linhas.

d) Corpo do trabalho: deve contemplar, no mínimo, 4 (quatro) tópicos, a saber:introdução, desenvolvimento, conclusões e bibliografia. Poderão ainda constar listasde quadros, tabelas e figuras, relação de abreviaturas e outros itens julgadosimportantes para o melhor entendimento do texto.