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relatorio sobre planejamento territorial a partir das relações de risco e vulnerabilidade
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Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento -
Uma Abordagem Integrada
FCOMP-01-0124-FEDER-007558
Equipa de investigao:
Jos Manuel Mendes (Investigador responsvel)
Alexandre Tavares
Lcio Cunha
Alexandra Arago
Joo Arriscado Nunes
Lus Neves
Susana Freiria
Eduardo Basto
2011
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
1
Agradecimentos ........................................................................................................................ 5
PARTE I: ................................................................................................................................ 15
Enquadramento terico e metodologia ................................................................................ 15
Captulo 1 - Riscos naturais e tecnolgicos, vulnerabilidade social e os territrios
16
1.1 Perigosidade ................................................................................................................. 22
1.2 Vulnerabilidade social .................................................................................................. 23
1.3 Explorao do conceito de vulnerabilidade social no projecto .................................... 32
1.4 Modelos de avaliao da vulnerabilidade social .......................................................... 33
1.5 ndices de vulnerabilidade social ................................................................................. 38
1.6 A vulnerabilidade social na Europa ............................................................................. 40
1.7 Percepo do risco ........................................................................................................ 46
Captulo 2 - Metodologia ....................................................................................................... 51
2.1 Avaliao da criticidade e capacidade de suporte ........................................................ 51
2.2 Modelo analtico ........................................................................................................... 54
2.2.1 Nveis de criticidade ......................................................................................... 54
2.2.2 Nveis da Capacidade de Suporte ..................................................................... 55
2.3 Aplicao do modelo analtico ..................................................................................... 57
2.3.1 Variveis de avaliao do modelo .................................................................... 57
2.3.2 Metodologia Criticidade escala municipal ................................................. 58
2.3.3 Metodologia Capacidade de suporte escala municipal ............................... 62
2.3.4 Metodologia Criticidade escala da freguesia .............................................. 66
2.3.5 Metodologia Capacidade de suporte escala da freguesia ........................... 70
2.4 Stakeholders e a capacidade de suporte ....................................................................... 73
2.4.1 Aplicao da Metodologia Q ............................................................................ 77
2.4.2 Anlise factorial com base no Mtodo Q ......................................................... 78
2.5 Amostra e aplicao do inqurito nacional percepo do risco ................................ 80
2.5.1 Estrutura do questionrio ................................................................................. 80
2.5.2 Amostra ............................................................................................................ 81
2.6 Amostra e aplicao do inqurito percepo do risco no concelho de Coimbra ....... 82
2.6.1 Estrutura do questionrio ................................................................................. 82
2.6.2 Amostra ............................................................................................................ 84
2.6.3 Aplicao .......................................................................................................... 85
Parte II Uma Nova Proposta de Anlise da Vulnerabilidade Social .............................. 87
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
2
Captulo 3- Contextualizao ................................................................................................ 88
Captulo 4 - Vulnerabilidade social: mensurao e cartografia ........................................ 97
4.1 Avaliao da criticidade escala nacional ................................................................... 97
4.2 Avaliao da capacidade de suporte escala nacional .............................................. 108
4.3 Avaliao da vulnerabilidade social escala nacional .............................................. 116
4.4 Avaliao da criticidade freguesia .......................................................................... 124
4.5 Avaliao da capacidade de Suporte freguesia ....................................................... 131
4.6 Avaliao da Criticidade - Seco Estatstica ........................................................... 137
4.7 Avaliao da Capacidade de Suporte - Seco Estatstica ........................................ 139
4.8 Avaliao vulnerabilidade social a relevncia da escala ......................................... 142
Captulo 5 - Stakeholders e a capacidade de suporte ........................................................ 145
5.1 Padres consensuais e discordantes ........................................................................... 155
5.2 Pontos positivos e negativos ...................................................................................... 158
Anexo I .................................................................................................................................. 162
Anexo II .................................................................................................................................. 168
Anexo III ................................................................................................................................ 171
Anexo IV ............................................................................................................................... 178
PARTE III Percepo do risco e confiana institucional dos Portugueses: resultados de
inquritos populao ......................................................................................................... 200
Captulo 6 - Caracterizao das amostras nacional e local .............................................. 201
6.1 Caracterizao da amostra nacional ........................................................................... 201
6.1.1 Caracterizao dos inquiridos ........................................................................ 201
6.1.2 Habitao ........................................................................................................ 204
6.1.3 Ligao ao local ............................................................................................. 206
6.2 Caracterizao da amostra de Coimbra ...................................................................... 208
6.2.1 Caractersticas dos inquiridos ......................................................................... 208
6.2.2 Habitao ........................................................................................................ 210
6.2.3 Ligao ao local de residncia ....................................................................... 214
Captulo 7 - Percepo do risco, prticas e confiana institucional em Portugal .......... 219
7.1 Percepo do risco e escala ........................................................................................ 219
7.2 Percepo do risco a nvel regional ............................................................................ 221
7.3 Riscos em Portugal Continental ................................................................................. 227
7.4 Percepo ao risco e caractersticas dos inquiridos .................................................... 232
7.5 Prticas e vivncias .................................................................................................... 234
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
3
7.5.1 Prticas, vivncias e caractersticas dos inquiridos ........................................ 238
7.6 Confiana nas Instituies .......................................................................................... 239
7.6.1 Papel do Estado .............................................................................................. 241
7.7 Alertas e avisos ........................................................................................................... 243
Anexo I .................................................................................................................................. 247
Captulo 8 - Percepo do risco, prticas e confiana institucional no concelho de
Coimbra ................................................................................................................................. 247
8.1 Percepo do risco e escala ........................................................................................ 247
8.2 Percepo e caractersticas dos inquiridos ................................................................. 251
8.2.1 Riscos ao nvel do concelho e caractersticas dos inquiridos ......................... 253
8.3 Prticas pessoais e vivncias ...................................................................................... 254
8.3.1 Prticas e caractersticas dos inquiridos ......................................................... 262
8.4 Confiana nas instituies .......................................................................................... 264
8.5 Alertas e avisos ........................................................................................................... 267
Referncias bibliogrficas .................................................................................................... 271
PARTE IV - Modelos normativos e jurdicos e enquadramento internacional da anlise
da vulnerabilidade social ..................................................................................................... 287
Captulo 9 - O dever de tomar em considerao a vulnerabilidade social na preveno de
riscos para uma proteco civil eficaz e justa Alexandra Arago ................................ 288
9.1 A proteco civil na Unio Europeia ......................................................................... 288
9.1.1 Os pilares europeus da proteco civil ........................................................... 290
9.2 As vulnerabilidades sociais e o novo paradigma de proteco civil .......................... 292
9.2.1 O reforo da coeso europeia atravs da proteco civil ............................... 293
9.2.2 O dever geral de considerao das vulnerabilidades ...................................... 295
9.2.3 Riscos: do controlo da origem ao controlo dos efeitos .................................. 300
9.2.4 A crescente intolerncia social ao risco ......................................................... 303
9.3 Um servio de interesse geral sujeito ao princpio da igualdade para uma proteco
civil eficaz e justa ................................................................................................................... 304
9.4 Concluso: rumo a uma proteco civil estratgica e sustentvel ............................. 305
Captulo 10 - Models of Social Vulnerability to Disasters - David Alexander
307
10.1 Introduction ................................................................................................................ 307
10.2 Basic Models of Disaster Risk Reduction (DRR) ...................................................... 308
10.3 Towards a New Theoretical Basis for Disaster Studies ............................................. 310
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
4
10.3.1 The Importance of Culture and Symbolism in Disaster Risk Reduction ....... 311
10.4 Interpretations of the L'Aquila (Central Italy) Earthquake of 6 April 2009............... 314
Conclusion: Social Models of Disaster .................................................................................. 320
References .............................................................................................................................. 322
Captulo 11 - Vulnerability Science: Models, Methods, and Indicators - Susan Cutter
325
11.1 Introduction ................................................................................................................ 325
11.2 What is vulnerability science? .................................................................................... 325
11.3 Mapping exposure ...................................................................................................... 327
11.4 Measuring sensitivity ................................................................................................. 327
11.5 Intersection of exposure and sensitivity ..................................................................... 329
Conclusion .............................................................................................................................. 330
Captulo 12 - The Unperceived Risk to Europes Coasts: Tsunamis and the Vulnerability
of Cadiz, Spain Jrn Birkmann, Korinna von Teichman, Torsten Welle , Mauricio
Gonzlez and Maitane Olabarrieta ......................................................................................... 335
12.1 Introduction ................................................................................................................ 335
12.2 Theoretical background .............................................................................................. 337
12.3 Study site .................................................................................................................... 339
12.3.1 Exposure to Tsunamis .................................................................................... 340
12.4 Assessment data and methodologies to estimate Tsunami vulnerability and risk ..... 341
12.4.1 Tsunami hazard assessment and potential inundation areas .......................... 342
12.4.2 Methods for the estimation of vulnerability ................................................... 343
12.5 Analysis and interpretation ......................................................................................... 345
12.5.1 Social vulnerability ........................................................................................ 345
12.5.2 Economic vulnerability / vulnerability of critical infrastructures .................. 348
12.6 Results and outlook .................................................................................................... 350
Acknowledgements ................................................................................................................ 352
References .............................................................................................................................. 353
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
5
Agradecimentos
O presente projecto no teria sido possvel sem o contributo de um leque alargado de pessoas
e instituies. Comeamos por agradecer a todos os presidentes de Cmara e aos vereadores
ligados s reas da proteco civil das autarquias que celebraram contratos com o Centro de
Estudos Sociais da Universidade de Coimbra no mbito do projecto: Cmara Municipal de
Almeida; Cmara Municipal de Coimbra; Cmara Municipal do Fundo; Cmara Municipal
de Marinha Grande; Cmara Municipal de Nelas; Cmara Municipal de Ovar e Cmara
Municipal de Proena-a-Nova.
Uma palavra especial de agradecimento vai para os tcnicos que nestas autarquias foram
nossos interlocutores directos: Eng. Lnia Fortunato (Cmara Municipal de Almeida), Eng.
Antnio Serra Constantino (Cmara Municipal de Coimbra), Dr. Pedro Ribeiro (Cmara
Municipal do Fundo), Dr. Eunice Marques e Artur Granja (Cmara Municipal da Marinha
Grande), Eng. Ins Mendona e a Dr. Susana Henriques (Cmara Municipal de Nelas), Dr.
Paula Balau e a Eng. Manuela Andrade (Cmara Municipal de Proena-a-Nova).
Agradecemos tambm a todas a cidads e a todos os cidados que acederam responder aos
questionrios aplicados a amostras representativas da populao maior de 18 anos em
Portugal continental e no concelho de Coimbra.
Os tcnicos e representantes das vinte e uma instituies pblicas e privadas que participaram
numa sesso de trabalho para avaliar a capacidade de suporte no concelho de Coimbra deram
um contributo essencial para a aferio das metodologias que procurmos implementar
durante o decorrer do projecto de investigamos. A todas e a todos o nosso agradecimento.
Queramos agradecer, por ltimo, aos nossos colegas da Faculdade de Economia da
Universidade de Coimbra, Jorge Marques e Rui Pascoal que de forma graciosa e entusiasta
que nos ajudaram a desvendar e a operacionalizar matematicamente alguns dos nossos
indicadores sobre a vulnerabilidade social.
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
6
Introduo
O projecto de investigao cujo relatrio final se apresenta teve como objectivo propor uma
abordagem em mltiplos nveis da vulnerabilidade social e dos riscos relacionados com os
perigos naturais e tecnolgicos em Portugal continental, partindo de uma perspectiva
multidisciplinar.
O conceito de vulnerabilidade social emergiu como uma crtica explcita aos paradigmas
dominantes e convencionais de anlise dos desastres. Coube a Hewitt (1983) a formulao
mais cabal dessa crtica. Como salienta Bolin (2006), trata-se de examinar os processos
econmicos e espaciais de marginalizao que constrangem certos grupos sociais a ocuparem
reas e zonas marcadas por perigos naturais e tecnolgicos. Uma abordagem mais abrangente,
que inclui tambm grupos sociais dominantes, foi avanada por Mike Davis (1998).
A vulnerabilidade aos perigos, como referem Wisner et al (2004), um processo constitudo
por trs componentes:
- Causas profundas (factores histricos, polticos, econmicos, ambientais e demogrficos que
produzem desigualdades);
- Presses dinmicas (processos sociais especficos como, por exemplo, uma rpida
urbanizao, conflitos sociais, etc.)
- Condies de vida pouco seguras (exposio desigual ao risco)
Assim, o conceito de vulnerabilidade social est associado ao grau de exposio aos riscos
naturais e tecnolgicos e aos acontecimentos extremos. Este grau de exposio depende
estreitamente da capacidade de resistncia e de resilincia dos indivduos e dos grupos mais
afectados. Para uma correcta avaliao da vulnerabilidade social e da sua integrao como
instrumento eficaz de planeamento, devemos atender aos seguintes aspectos: dimenses
estruturais do territrio; caractersticas biofsicas; estrutura e dinmica demogrficas; capital
social e redes sociais; dimenses socioculturais; polticas pblicas; polticas de
desenvolvimento e de investimento pblico; actividade econmica.
A integrao dos factores biofsicos e socioculturais na anlise da vulnerabilidade social
implica uma perspectiva mais abrangente. Anthony Oliver-Smith (2004) prope que a
vulnerabilidade seja analisada como um conceito de ecologia poltica. Para este autor, a
vulnerabilidade engloba e incorpora a multidimensionalidade dos perigos e dos desastres.
Como consequncia, a ateno dos investigadores deve orientar-se para a totalidade das
relaes num dada situao que constituem as condies que, em combinao com as foras
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
7
ambientais, produzem ou originam um desastre. Por outro lado, os desastres so sempre
sociais e no o produto de condies naturais especficas. Na conjuno dos factores culturais,
societais e naturais devemos atender ao papel das foras, organizaes e crenas que esto na
base da produo do ambiente que origina e facilita os desastres.
Esta viso ecolgica e poltica obriga a uma reflexo quanto aos factores estruturais da
vulnerabilidade social e sua integrao explcita nos planos de ordenamento do territrio.
Um dos especialistas que mais se tem destacado nesta via Charles Perrow (2007, 2006).
Partindo da sua teoria dos acidentes normais e da constatao que as organizaes falham de
forma permanente e constante, Perrow conclui pela necessidade premente de reduo das
vulnerabilidades, contra a simples preveno, mitigao ou limitao dos danos. Para a
concretizao deste objectivo, Perrow prope trs estratgias estruturais: desconcentrao da
produo e do armazenamento de produtos qumicos; desconcentrao da populao e, por
ltimo, desconcentrao das organizaes. A inteno final a de estabelecer redes de
produo e comunicao densas e desconcentradas assentes no princpio da interdependncia
e da autonomizao relativa dos ns de interligao.
Inmeros autores (Cutter, 2003; Davis, 2004; Schmidtlein et al., 2008) e instituies (ONU,
2004) tm trabalhado recentemente na rea da vulnerabilidade social, o que constitui um
indicador da sua importncia. Segundo a UN-ISDR (2009) o termo vulnerabilidade refere-se
propenso da populao exposta ou dos recursos econmicos sofrerem perdas na dependncia
de caractersticas fsicas, sociais, polticas, econmica, culturais e institucionais; Dwyer et al.
(2004) ou a EC-DGE (2008) definem vulnerabilidade social como a capacidade de um
elemento recuperar do impacto de um desastre natural.
Consideramos neste trabalho a acepo de Wisner et al. (2004) ou Hufschimdt et al. (2005)
em que vulnerabilidade social representa o nvel de resilincia e resistncia dos indivduos e
comunidades, quando expostas a processos ou eventos perigosos.
No entanto, consideramos que as metodologias de avaliao da vulnerabilidade social
existentes no avaliam cabalmente a resilincia social dos indivduos, dos grupos e das
comunidades. Neste relatrio apresentamos uma nova metodologia que calcula um ndice de
vulnerabilidade social que integra a capacidade de suporte e a criticidade do sistema territorial
nacional, escala do municpio e da freguesia.
Em Portugal so poucos os trabalhos que incidam sobre os ndices de vulnerabilidade social.
de assinalar o artigo de Ribeiro (1995), no qual so propostas metodologias estatsticas de
avaliao. Para alm deste, evidencia-se Mendes (2009) que desenvolveu um ndice de
Vulnerabilidade Social para a Regio Centro de Portugal.
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
8
A nvel do planeamento de mbito nacional e regional em Portugal, os planos existentes no
incorporam a anlise da vulnerabilidade social como uma ferramenta para implementar
medidas de preveno, e tambm articular o investimento e as actividades econmicas com as
polticas e as infra-estruturas de proteco civil.
O principal objectivo do presente projecto foi proceder a uma integrao de escalas que
permita um conhecimento aprofundado dos territrios em anlise numa ptica abrangente de
planeamento e de proteco civil, bem como a produo de instrumentos jurdicos e de um
quadro normativo e de planeamento que possam contribuir para a definio de estratgias
adequadas preveno e mitigao dos riscos identificados.
A nvel nacional, o principal enfoque foi na percepo dos riscos, nos factores de
amplificao e de atenuao social dos riscos e na confiana dos cidados nas instituies da
proteco civil e nas instituies responsveis pelas polticas de preveno. Estas temticas
foram incorporadas na definio e na avaliao de indicadores de vulnerabilidade social.
Nesse sentido, tambm se revelou importante apreender as experincias das pessoas quanto a
desastres, as estratgias activadas atravs das suas redes familiares e sociais (capital social), a
sua resilincia e capacidade de recuperao, e as suas relaes sociais e polticas com as
autoridades nacionais e com o governo.
A nvel regional, os temas acima referidos tambm foram abordados, mas com a inteno de
testar e de produzir ndices de vulnerabilidade, social e ambiental, de mbito regional,
municipal e local. O objectivo foi, depois de estabelecer os indicadores de vulnerabilidade
social a nvel nacional, valid-los atravs da anlise da vulnerabilidade social a perigos
naturais e tecnolgicos de mbito regional, municipal e local.
A anlise crtica dos ndices de vulnerabilidade social existentes a nvel internacional revelou
a insuficincia dos mesmos na incorporao dos efeitos de escala e na correcta mensurao
das dimenses territoriais associadas vulnerabilidade. Da que a equipa de investigao
tenha procedido construo de um novo ndice de vulnerabilidade social, que comporta duas
dimenses distintas: a criticidade, definida como o conjunto de caractersticas e
comportamentos dos indivduos que podem contribuir para a ruptura do sistema e dos
recursos das comunidades que lhes permitem responder ou lidar com cenrios catastrficos; e
a capacidade de suporte, definida como o conjunto de infra-estruturas territoriais que permite
comunidade reagir em caso de desastre ou catstrofe.
Empiricamente, foi feita a aplicao de um inqurito a uma amostra representativa da
populao residente em Portugal continental e no municpio de Coimbra, de forma a se
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
9
apreender, numa perspectiva comparativa e multi-escalar, a percepo aos riscos naturais e
tecnolgicos, as prticas de preveno e mitigao do risco e a confiana nas instituies.
Os ndices de vulnerabilidade social foram calculados para o total dos municpios portugueses
e para uma sub-amostra de sete municpios da Regio Centro, Almeida, Coimbra, Fundo,
Marinha Grande, Nelas, Ovar e Proena-a-Nova, com os quais foram estabelecidos protocolos
de cooperao com o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.
Breve descrio das partes e captulos do relatrio
O relatrio consta de quatro partes. Na primeira parte procedemos discusso crtica das
abordagens tericas em torno dos conceitos de risco, perigosidade e vulnerabilidade social.
Nesta parte tambm se apresentam as diferentes metodologias utilizadas no presente relatrio.
A segunda parte engloba os estudos empricos que sustentam o presente projecto, tanto da
aplicao do novo modelo analtico da vulnerabilidade social, como da utilizao da
metodologia Q junto dos intervenientes institucionais (stakeholders) sobre a capacidade de
suporte no concelho de Coimbra. A terceira parte, tambm ela de cariz emprico, devolve os
resultados obtidos na aplicao dos questionrios a amostras representativas da populao
maior de 18 anos em Portugal Continental e no concelho de Coimbra.
A quarta parte, alm de apresentar as perspectivas tericas dos consultores internacionais do
projecto sobre as questes relacionadas com a vulnerabilidade social e a sua validade emprica
testada em diversos estudos de caso, tambm prope uma reflexo sobre a incorporao da
vulnerabilidade social no delineamento de estratgias de proteco civil eficazes e justas.
O primeiro captulo aborda de forma sistemtica e crtica o enquadramento terico que
balizou o presente projecto de investigao. Comea pela anlise histrica da emergncia e
consolidao do conceito de risco que, inicialmente associado s questes do comrcio e dos
seguros, se expandiu no sculo XX com a maior visibilidade e incidncia das catstrofes
naturais, originando definies probabilsticas associadas ao desejo de controlo e de
incorporao do futuro no presente.
O conceito sociolgico de sociedade do risco alarga a noo do risco ao conceito de
reflexividade e auto-produo humana das causas subjacentes s situaes extremas e aos
desastres. Intimamente associada ao conceito de risco, embora configurando quadros
analticos especficos, emerge a noo de perigosidade e a forma como esta se torna, nas
verses mais quantitivistas de anlise de risco, um dos seus termos de clculo.
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
10
O captulo centra-se, depois, na descrio exaustiva e crtica do conceito de vulnerabilidade
social, que se substitui ideia generalizada de insegurana das populaes, e acentua as
desigualdades sociais perante acontecimentos extremos e desastres. So apresentados os
vrios modelos de avaliao da vulnerabilidade social e as suas dimenses analticas e
operacionais.
O captulo 1 termina com uma breve incurso pelas propostas mais relevantes na anlise da
percepo do risco e do seu papel nas dinmicas sociais de preveno e mitigao do risco.
O captulo 2 procede apresentao das diferentes metodologias mobilizadas para o trabalho
emprico desenvolvido no presente relatrio. Parte da explicitao do modelo analtico
subjacente nova proposta de avaliao da vulnerabilidade social avanada pela equipa do
presente projecto de investigao, onde a vulnerabilidade social comporta duas dimenses
distintas: a criticidade, definida como o conjunto de caractersticas e comportamentos dos
indivduos que podem contribuir para a ruptura do sistema e dos recursos das comunidades
que lhes permitem responder ou lidar com cenrios catastrficos; e a capacidade de suporte,
definida como o conjunto de infra-estruturas territoriais que permite comunidade reagir em
caso de desastre ou catstrofe.
Para o clculo da vulnerabilidade social so explicitadas as tcnicas utilizadas, nomeadamente
a anlise factorial de componentes principais e a definio dos nveis de criticidade e de
capacidade de suporte retidos para a anlise e representao cartogrfica da vulnerabilidade
social. Para avaliar a capacidade de suporte no concelho de Coimbra, recorreu-se
Metodologia Q, uma tcnica de recolha de dados formulada por William Stephenson, que
combina abordagens quantitativas e qualitativas. A mesma foi aplicada a um vasto leque de
intervenientes institucionais (stakeholders) de mbito nacional, regional e local com rea de
actuao no concelho de Coimbra.
A parte final do captulo discute os procedimentos seguidos, as etapas de definio das
amostras e a estrutura dos questionrios aplicados a amostras representativas da populao
maior de 18 anos em Portugal continental e no concelho de Coimbra. O principal enfoque dos
questionrios foi a percepo dos riscos, os factores de amplificao e de atenuao social dos
riscos e a confiana dos cidados nas instituies da proteco civil e nas instituies
responsveis pelas polticas de preveno. Tambm se revelou importante apreender as
experincias das pessoas quanto a desastres, as estratgias activadas atravs das suas redes
familiares e sociais (capital social), a sua resilincia e capacidade de recuperao, e as suas
relaes sociais e polticas com as autoridades nacionais e com o governo.
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
11
A parte II do relatrio congrega os captulos com os dados empricos recolhidos no projecto
de investigao. O captulo 3 explicita que, para a anlise da vulnerabilidade social, enquanto
nvel de resilincia e resistncia dos indivduos e comunidades quando expostos a processos e
acontecimentos naturais, tecnolgicos ou mistos, potencialmente danosos, foram tido em
conta unidades territoriais que envolveram duas escalas de abordagem; a nacional suportada
pela cartografia do ndice municipal e a municipal suportada pela cartografia do ndice da
freguesia.
No que concerne s unidades geogrficas de base, escala municipal, foram tidos em conta
todos os municpios de Portugal Continental. Na anlise municipal, suportada pela expresso
unidade de freguesia, foram seleccionados como amostra sete concelhos da Regio Centro
(Almeida, Coimbra, Fundo, Marinha Grande, Nelas Ovar e Proena-a-Nova) que apresentam
caractersticas muito contrastadas em termos fsicos e socioeconmicos. Aqui se apresentam
as principais caractersticas sociodemogrficas e socioeconmicas destes 7 concelhos que
integram a nossa amostra regional.
O captulo 4 apresenta, de forma detalhada e sustentada, o clculo da vulnerabilidade social a
partir do novo algoritmo proposto pela equipa de investigao para todos os concelhos do pas
e para as freguesias e seces estatsticas dos 7 concelhos da Regio Centro que constituem a
amostra regional. So apresentados os factores explicativos da variabilidade da
vulnerabilidade social nas diferentes escalas em anlise e a sua representao cartogrfica.
O captulo 5 devolve os resultados obtidos com a aplicao da metodologia Q para avaliar a
percepo dos principais intervenientes institucionais sobre a capacidade de suporte no
concelho de Coimbra. Constatou-se a existncia de um conjunto de recursos alargado que
pode ser mobilizado em caso de desastre ou catstrofe no concelho de Coimbra, e a
sensibilizao das instituies participantes na elaborao de planos de emergncia e de
preveno. Quanto preveno e gesto de um cenrio de crise, um dos aspectos mais
enfatizados pelos participantes relacionou-se com a necessidade de se estabelecer linhas de
articulao mais bem definidas entre as instituies, e a percepo que a populao do
concelho no se encontra preparada para um cenrio de desastre ou catstrofe.
O captulo 6, que inicia a Parte III do relatrio sobre a percepo do risco e a confiana
institucional no espao nacional e no concelho de Coimbra, faz a descrio sociogrfica das
duas amostras de inquiridos, das habitaes e da ligao aos locais de residncia, sobretudo a
densidade das redes familiares e de vizinhana.
O captulo 7, que incide exclusivamente sobre a anlise dos dados do questionrio para a
amostra nacional, comea por abordar a percepo do risco e o papel crucial da escala e da
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
12
geografia como factores estruturantes dessa mesma percepo, sobretudo nas dicotomias
litoral/interior e rural/urbano. Alm destes dois factores, mostraram-se tambm altamente
diferenciadores da percepo ao risco a escolaridade e a idade dos inquiridos.
O captulo tambm aborda a experincia pessoal com acidentes e situaes de risco e as
medidas de auto-preveno e de resposta a situaes de emergncia activadas pelos
inquiridos. A ltima parte do captulo centra-se na anlise da percepo dos inquiridos quanto
actuao e papel do Estado em situaes de desastre ou catstrofe e os nveis de confiana
institucional reportado pelos inquiridos.
O captulo 8 segue a mesma estrutura do captulo 7 e comporta os mesmos contedos s que
apresentando os resultados do inqurito a uma amostra representativa do concelho de
Coimbra.
O captulo 9, da autoria de Alexandra Arago, inicia a Parte IV do relatrio. A autora comea
por caracterizar o modelo de proteco civil na Unio Europeia, propondo de seguida de
forma inovadora, e com base nos resultados obtidos no presente projecto de investigao, uma
mudana de paradigma, fundando uma nova proteco civil, orientada tanto para a eficcia
como para a justia, e baseada num novo pressuposto: o conhecimento das vulnerabilidades
sociais. Da resultar, argumenta Alexandra Arago, uma proteco civil eficaz e justa que
permita o desenvolvimento de capacidades de autoproteco e o reforo da resistncia e da
resilincia dos indivduos, dos grupos e das comunidades.
No captulo 10, David Alexander parte da constatao que a maior parte dos pases e das
instncias internacionais apostaram mais em modelos de reduo dos desastres e de
interveno ps-desastre do que na preveno pr-evento. Aps fazer uma apresentao
crtica dos modelos de reduo dos riscos dos desastres, David Alexander prope-nos uma
nova base terica para o estudo dos desastres. Este novo modelo terico assenta, conforme
argumenta de forma persuasiva e clara David Alexander, no papel crucial e estruturante da
cultura e do simbolismo na reduo dos riscos de desastres. A nova proposta de David
Alexander contextualizada com o exemplo das dinmicas sociais e culturais relacionadas
com o terramoto de LAquilla no centro de Itlia.
Susan Cutter avana no captulo 11 com os pressupostos de uma cincia da vulnerabilidade,
definindo vulnerabilidade como o potencial para a perda. A cincia da vulnerabilidade
procura examinar os padres geogrficos que diferenciam os lugares quanto aos factores que
podem influenciar as capacidades locais para a preparao, resposta e recuperao de
situaes de desastre. De seguida, Susan Cutter apresenta detalhadamente os parmetros
analticos da exposio e da sensibilidade quanto vulnerabilidade social. Empiricamente, a
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
13
proposta substanciada na anlise da vulnerabilidade social aos perigos ambientais nos
condados (counties) dos Estados Unidos.
No ltimo captulo deste relatrio, Jon Birkmann e a sua equipa partem do modelo Bogardi,
Birkmann, Cardona (modelo BBC), que define a vulnerabilidade como sendo composta por
trs factores: exposio, susceptibilidade e capacidade de enfrentamento (coping). A partir
deste modelo, os autores procedem a uma anlise dos perigos de inundao originada por
tsunamis e as respectivas consequncias socioeconmicas em Cdis. A anlise qualitativa
realizada no estudo de caso, que complementa a descrio mais quantitativa baseada nos
modelos de previso do risco de inundao originado por tsunami, permitiu verificar a
ausncia de percepes locais ao risco de tsunami e que as estratgias organizacionais e
institucionais de reduo do risco no incluem os tsunamis. Os autores concluem pela
centralidade da dimenso institucional da vulnerabilidade na produo de estratgias de
preveno e preparao eficazes.
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Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
15
PARTE I:
Enquadramento terico e metodologia
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
16
Captulo 1 . Riscos naturais e tecnolgicos,
vulnerabilidade social e os territrios
O risco pode ser considerada uma questo temporal; de incerteza sobre o futuro e, tambm, de
conhecimento do passado. Seguindo o raciocnio de Douglas e Wildavsky (1983), o risco o
produto do conhecimento acerca do futuro e de acordo com as perspectivas mais desejveis,
uma questo de determinao (Cardona, 2004), sem a qual o conceito de risco no faria
sentido
O risco um conceito que se afirma no Ocidente, a partir do perodo da Renascena e parece
ser indiscutvel que o comrcio, as tragdias e as perdas associadas, bem como o
desenvolvimento dos seguros, impulsionaram o conceito e o uso do mesmo de uma forma
prtica (Almeida, 2006). As viagens dos mercadores por mares tempestuosos implicavam um
grande risco em termos de vidas humanas, assim como tambm implicavam ganhos ou perdas
financeiras e polticas.
A noo de risco foi intervencionada entre os sculos XVII e XIX quando os Europeus ao
explorarem novos territrios e simultaneamente confrontaram-se com costumes, condies,
nomeadamente climticas, diferentes daqueles para os quais estavam habituados, o que deu
origem ao aparecimento de doenas que dizimaram milhares de pessoas.
A Revoluo Industrial, nos sculos XVIII XIX, veio trazer uma nova perspectiva ao
conceito de risco, dado que passou a estar associado com a mquina, smbolo da
industrializao. Alm disso, tambm passou a estar associado a formas de explorao
relacionadas com elevados acidentes de trabalho, como a explorao mineira, mas a
industrializao aparecia como uma necessidade prioritria, tornando qualquer risco aceitvel.
Na segunda metade do sc. XX, no seguimento das duas Grandes Guerras Mundiais, o
conceito de risco era associado a pobreza e fome.
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
17
Tabela 1-1: Definies de risco no discurso ocidental em Bankoff (2004)
Conceito Perodo (sculo) Condio Cura/Tecnologia
Tropicalidade sc. 17-19/princpio do 20 Doena Medicina Ocidental
Desenvolvimento Ps II Guerra Mundial Pobreza Investimento/ajuda ocidental
Desastres Naturais sc. 20 at actualidade hazard Cincia Ocidental
definitivamente no sculo XX que as fatalidades causadas pelos desastres naturais
comearam a suscitar interesse cientfico. Apesar da perspectivao cientfica sobre as causas
e as consequncias do terramoto de 1755 em Lisboa, at ao sculo XIX os desastres naturais
eram associados a vontades divinas, ao destino, a partir do sculo XX a sociedade
contempornea procura racionalizar os desastres, estudar o comportamento dos sistemas
naturais e humanos e, por consequncia, conceber mecanismos de defesa.
Os primeiros trabalhos de investigao sobre perigos e riscos, levados a cabo nos Estados
Unidos no princpio da dcada de 1960, consideravam que os indivduos conseguiam
enfrentar os perigos mediante medidas que conduziam a menor quantidade de perdas
possveis. No entanto, verificou-se que na prtica as pessoas no conseguiam controlar os
perigos, tornando necessria uma investigao para explicar o diferente comportamento dos
indivduos e dos grupos em relao aos riscos de um lugar (Castro, 2006).
Nas ltimas dcadas do sc. XX, o conceito de risco adquiriu um estatuto social relevante,
passando a ser uma referncia de segurana sociedades contemporneas tecnologicamente
mais desenvolvidas, uma das mais emblemticas caractersticas da sociedade actual. Com o
impulso poderoso dos meios de comunicao social1, o pblico passou a reconhecer o risco
como um elemento associado a diferentes situaes de potencial perigo e perda. Note-se que
j no se acredita de forma cega que os avanos da cincia e da engenharia s podero trazer
benefcios, o risco tende a assumir um papel cada vez mais relevante neste mbito.
A partir da dcada de 1970, alguns cientistas comearam a questionar se o maior nmero de
desastres se devia unicamente a processos fsicos de ordem natural (Bankoff, 2004) ou
correspondia a uma realidade mais completa.
Aven e Renn (2009), apresentam uma abordagem do conceito de risco em que este no pode
ser encarado de forma inteiramente subjectiva, caindo no extremo relativismo, mas tambm
1 Sublinhado nosso
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
18
no pode ser quantificado como se tratasse de uma entidade fsica. Assim, o risco enquanto
incerteza acerca da gravidade das consequncias de uma actividade valorizada pelos
indivduos, considera a possibilidade de resultados desejveis e indesejveis, bem como a
existncia de resultados de uma determinada aco ou evento como tratando-se de incertezas
no necessariamente previsveis e quantificveis, mais que como probabilidades associadas as
consequncias concretas e perfeitamente definidas.
Assim, o risco pode ser definido como possibilidade de ocorrncia futura de um dado evento
com consequncias nefastas (Gonalves et al. 2007), ou nas palavras de Luhmann (1993),
eventualidade do infortnio. O risco quando se pode quantificar, probabilisticamente, a
ocorrncia do evento e das suas consequncias, necessariamente nefastas; quando esta
possibilidade no existe, fala-se de incerteza e no de risco (Douglas & Wildavsky, 1983;
Gonalves et. al 2007; Granjo, 2006; Porto, 2008).
No entanto, e precisamente a partir dos trabalhos precursores de Douglas & Wildavksy (1983)
e Beck (1992 [1985]), assistiu-se ao nascimento da concepo que este ltimo autor cunhou
de sociedade de risco. Ao ganhar a percepo de que uma parte considervel dos riscos a
que a sociedade est sujeita produzida pelos seus prprios processos de
modernizao/industrializao, a sociedade adopta uma postura reflexiva acerca desses riscos.
A sociedade que produz esses riscos, no processo de produo social da riqueza, passa
tambm a quantific-los e control-los (Beck, 1992).
A temporalidade aqui presente, mas diversa das concepes anteriores, leva a que os riscos
naturais passem a ser encarados como sendo, pelo menos parcialmente, causados pela aco
humana, e o risco passa a ser detido pelo futuro e pela necessidade de o planear (Beck, 2000;
Gonalves et al. 2007; Luhmann, 1993). Se para Douglas & Wildavsky (1983), os riscos so,
na sua totalidade, uma emanao das estruturas sociais cada cultura define o que ou no
um risco de acordo com o que define ser a sua aceitabilidade , para Beck (2000), os riscos
so, simultaneamente, reais e construdos. Se por um lado resultam de impactos intimamente
ligados aos presentes processos industriais e cientficos a cincia transforma os perigos em
riscos, ao permitir a sua quantificao e o seu controlo , a compreenso destes est associada
histria e aos smbolos de cada cultura, ao seu entendimento da natureza.
Na anlise do risco tornou-se um dos factores chave o conceito de probabilidade, algo que
ainda no aconteceu, mas que pode vir a acontecer. No se sabendo como, quando, qual
exactamente a extenso da rea afectada, quais as consequncias, sendo importante ter
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
19
presente que se est a lidar com cenrios que podero acontecer no futuro. Omar Cardona
(2004) faz questo de definir duas dimenses do risco: realidade e a probabilidade.
O risco constitui assim a probabilidade de, a partir de um determinado estado da realidade,
ocorrer efeitos adversos como resultado de acontecimentos ou actividades humanas
(Luhmann, 1993). Esta definio aponta para a existncia de relaes causais entre aces ou
acontecimentos humanos e efeitos indesejveis e que estes podem ser evitados ou reduzidos
se acontecimentos causais forem evitados ou modificados. importante reconhecer que os
riscos so inerentes ou podem ser criados ou existir no sistema social (ONU2, 2004), ou seja,
no caso de ser feita uma boa Gesto do Risco este no representar uma ameaa para a
sociedade. No colocando a hiptese das catstrofes serem nica e exclusivamente naturais,
Luhmann (1993) afirma que num cenrio de risco as perdas que podem ocorrer no futuro so
atribudas a decises tomadas. No importa o tipo de deciso, nem o tipo de perda, nem o
grau da probabilidade ou improbabilidade das consequncias ocorrerem.
Independentemente do carcter mais ou menos construtivista das vrias abordagens e do papel
preditivo que atribuem ao passado (cf. Hejmans, 2005; Granjo, 2006), h, no entanto, acordo
entre a generalidade dos autores contemporneos das cincias sociais quando ao facto de o
risco ser socialmente construdo.
No s o exerccio de seleco dos riscos definido pelo ambiente social, como o clculo do
risco est limitado (ou previamente editado) pelas instituies sociais. Nesta linha, o que
mais influencia a estimativa de probabilidades a noo de futuro e a forma como as pessoas
percebem esse futuro limitada por condies sociais; o prprio exerccio de atribuio de
probabilidades transporta consigo os valores de quem o faz, a objectividade um logro
(delusion) (Douglas & Wildavsky, 1983).
Para Rodriguez (s.d.), os riscos e desastres so fenmenos socialmente construdos que so
influenciados por normas sociais e culturais, preconceitos e valores, infere-se que alertas,
perigosidades e desastres devem ser estudados e compreendidos no seio do contexto societal
em que ocorrem. Para este ltimo autor, privilegiar o estudo do desenvolvimento das
2 Organizao das Naes Unidas
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
20
tecnologias, ignorando as foras sociais que modelam o comportamento e as respostas dos
indivduos e das comunidades aos perigos em geral e aos alertas em particular, permite apenas
melhorar a tecnologia, mas no compreender as complexidades das dinmicas humanas.
Contudo, alguns investigadores no campo dos desastres tm identificado que para melhorar a
gesto e processos de deciso locais determinante a introduo das inovaes tecnolgicas
(a este propsito, ver Mendes & Tavares, 2009).
Um desses autores Cardona (2004), para quem o conceito de risco representa algo de irreal
na convergncia de trs aspectos diferentes: eventualidade, consequncia e o contexto, a
anlise do risco, o contexto (a capacidade de gesto e actores relacionados com ela) determina
os limites, as razes, o objectivo e as interaces a serem consideradas (no caso de no se ter
em conta o contexto, a anlise do risco revela-se irrelevante e intil).
Mas a dimenso socioespacial dos riscos e da produo dos perigos tambm deve ser tida em
conta. Os riscos ambientais modernos so gerados em locais diferentes daqueles em que esto
os atingidos por esses riscos e esta questo coloca-se no espao e no tempo. Ou seja, os riscos
so gerados em sistemas scio-tcnico-ambientais (STA) diferentes daqueles em que esto os
atingidos (contrariamente ao que se passa com os riscos ocupacionais, em que o risco e a
exposio esto no mesmo STA, embora os elementos expostos nem sempre tenham poder de
influenciar sobre os riscos) (Porto, 2007).
So vrias as definies de risco que apontam o ser humano como a causa de muitas situaes
de catstrofe, do aumento da possibilidade de uma situao de risco se precipitar para uma
situao de catstrofe. Um outro ponto em comum de que existe um processo que produz
um determinado impacto em algo com valor (incluindo seres humanos), com um conjunto de
consequncias incertas (figura 1).
Processo Perigoso
Impacto
Consequncias incertas
Fig. 1:1: A esfera do Risco
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
21
A partir da anlise das definies j enunciadas e das esquematizadas na tabela 1-2, verifica-
se que o risco um conceito composto. Autores como EMA (2002), Cardona (2004), Davis
(2004), Wisner (2004), ONU (2004), Almeida (2005) apresentam o conceito de risco como
sendo o resultado da multiplicao da perigosidade pela vulnerabilidade. Note-se que o facto
de se tratar de uma operao multiplicativa e no, por exemplo, de uma soma, significa que se
um dos elementos da equao for igual a zero o valor final, neste caso, o risco ser tambm
zero. A perigosidade e a vulnerabilidade apresentam-se como condies dependentes uma da
outra, em que uma no pode existir sem a outra.
Neste sentido, por uma questo metodolgica e melhor compreenso do conceito de risco,
perigosidade e vulnerabilidade sero tratados de modo separado. Segundo a ONU (2002) na
Estratgia Internacional para Reduo de Desastres enquanto que a perigosidade determina a
localizao geogrfica, intensidade e probabilidade, o conceito de vulnerabilidade determina a
predisposio.
Tabela 1-2: Conceito de risco
Conceito de Risco Autor
O termo risco usado para descrever a probabilidade de consequncias
negativas fruto da interaco entre perigosidades, comunidade e ambiente EMA (2002)
No que concerne ao risco existe uma concomitncia e condicionamento
mtuo entre perigosidade e vulnerabilidade. Quando uma ou duas das
componentes do risco so alteradas, est-se a interferir com o risco em si
Cardona (2004)
1 Fase (incio da dcada de 90): Desastre = Perigosidade* Vulnerabilidade
Davis (2004)
2 Fase: Desastre = Perigosidade* Vulnerabilidade/Capacidade
Risco ~= Perigosidade * Vulnerabilidade Wisner (2004)
Risco = Perigosidade * Vulnerabilidade ONU (2004)
Risco = Probabilidade * Consequncias Almeida (2005)
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
22
1.1 Perigosidade
Do ponto de vista histrico, o impulso inicial das pesquisas sobre perigosidades remonta aos
trabalhos pioneiros desenvolvidos por Gilbert White, na dcada de 1950, sobre os aspectos
fsicos das perdas provocadas por cheias nos Estados Unidos (Mattedi, 2001).
O conceito de perigosidade tanto pode ser entendido como fenmeno, aco ou processo
perigosos, ou seja, a fonte do risco, como tambm pode ser entendido como a probabilidade
de ocorrncia de fenmeno perigoso.
A EMA3 (2002) define o conceito de perigosidade como uma fonte de potencial dano ou
situao que pode causar perda. Na mesma linha, S. Cutter (2003) define perigosidade como
as ameaas potenciais s pessoas e coisas a que do valor e que surgem da interseco dos
sistemas humanos, processos naturais e sistemas tecnolgicos. Neste sentido, perigosidade
ser sinnimo das condies existentes que do origem a uma situao de risco. No entanto,
P. Slovic (2000) define perigosidade como acontecimento acidental, ou seja, no considera
que seja um conjunto de factores latente, mas algo que tem lugar num determinado tempo e
lugar. Para alm deste autor, tambm a ONU (2002) define perigosidade como acontecimento
fsico potencialmente danoso, processo ou actividade humana que pode causar a perda de vida
ou ferimentos, danos das propriedades, ruptura social e econmica ou degradao ambiental,
distinguindo perigosidade natural, perigosidade biolgica, perigosidade geolgica,
perigosidade hidrometeorolgica, perigosidade tecnolgica.
Tal como acontece em relao ao conceito de perigosidade, tambm no existe consenso no
que concerne s suas vrias tipologias. Pode-se apontar, como exemplo, os autores J. De Lon
(2006) e B. Ayyb (2007). J. De Lon (2006) que consideram como perigosidades sociais,
perigosidades induzidas pelo humano, e as perigosidades scio-naturais, as perigosidades
criadas ou alcanadas como resultado de aces humanas. Enquanto que nas primeiras o ser
humano o nico agente em aco, no caso das segundas o ser humano desempenha o papel
de agente activo, mas no o nico elemento do sistema. B. Ayyub (2007) opta por dividir as
perigosidades em dois grandes grupos: perigosidades naturais e perigosidades causadas pelo
ser humano, discriminando nestas ltimas as que so causadas pela sociedade sem inteno e
que eram causadas pela sociedade com inteno. Enquanto que como perigosidades causadas
pela sociedade sem inteno o autor aponta apenas acidentes industriais, no que concerne a
3 Emergency Management Australia
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
23
perigosidades causadas com inteno aponta um vasto nmero de exemplos, como sejam o
uso de explosivos, incndios, qumicos e produtos biolgicos, bem como a utilizao de
processos radiolgicos, nuclear, radiofrequncia/ frequncia electromagntica.
Determinada perigosidade pode ser medida atravs das suas caractersticas fsicas,
possibilidade de ocorrncia/perodo de retorno e com base nas consequncias causadas.
Segundo K. Smith (2004), o conceito de risco tem implcita a possibilidade de uma
determinada perigosidade realmente ocorrer.
A perigosidade caracterizada pela localizao, intensidade, frequncia e probabilidade
associada ao fenmeno (UN/ISDR, 2004).
No presente contexto, entende-se perigosidade como a probabilidade de ocorrncia de um
processo ou aco (natural, tecnolgico ou misto) com potencial destruidor (ou para provocar
danos) com uma determinada severidade, numa dada rea e num dado perodo de tempo
(ANPC, 2009).
1.2 Vulnerabilidade social
O conceito da vulnerabilidade no um conceito simples, no existindo consenso quanto ao
seu significado (Adger et al, 2004). A vulnerabilidade o resultado de interaces, complexas
e fracamente entendidas, que implicam o envolvimento tanto de processos fsicos como da
dimenso humana (Adger, 2004).
No sistema territorial, o indivduo/ sociedade tanto pode desempenhar o papel de agente
activo, como tambm pode assumir o de agente passivo; como agente activo o
indivduo/sociedade pode estar na origem do acontecimento danoso, integrar a perigosidade,
enquanto agente passivo, o indivduo/ sociedade sofre as consequncias de um
acontecimento danoso. A dimenso do impacto de uma catstrofe no indivduo/ sociedade
depende das suas caractersticas em termos da sua capacidade para antecipar, enfrentar,
resistir e recuperar do impacto de uma perigosidade natural, processo que autores, como
Blaikie (1994), definem como vulnerabilidade. Este conceito ganha maior dimenso no fim da
dcada de 1980 e nos anos 1990, quando a investigao deixa de se centrar apenas nos
perigos naturais, passando a ter em ateno tambm os perigos sociais e tecnolgicos. Alm
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
24
disso, os naturais passam a ser vistos como ambientais, implicando que os perigos s
possam ser compreendidos levando-se em conta o contexto natural e as formas pelas quais a
sociedade se tem apropriado da natureza, produzindo perigos (Jones, 1992).
A ONU (2002) usa o conceito de vulnerabilidade definindo-o como o conjunto de factores ou
processos fsicos, sociais, econmicos e ambientais que vo aumentar a susceptibilidade da
comunidade ao impacto dos perigos. Na perspectiva da ONU (2004), a vulnerabilidade inclui
apenas aspectos negativos, sendo apontado o conceito de capacidade para englobar os
aspectos positivos que contribuem para aumentar as aptides para enfrentar as perigosidades,
reduzir o nvel de risco. No entanto, de assinalar que existem factores que so ambguos e
dependem do tipo do perigo em causa. Pode-se apontar o facto de possuir casa prpria poder
ser considerado um factor positivo, na medida em que pode constituir um indicador de poder
econmico, contudo em caso de um incndio que destrua a casa, menos vulnervel quem
viva numa casa arrendada. Da mesma forma que nem todas as pessoas pobres so vulnerveis
a desastres, nem todos os pobres so vulnerveis do mesmo modo, e alm disso, algumas
pessoas que no so pobres so vulnerveis (Bankoff et al, 2004).
O EMA (2002) define o conceito de vulnerabilidade como o equilbrio entre a
susceptibilidade (o nvel ao qual uma determinada perigosidade poder afectar uma
comunidade ou ambiente) e resilincia (a competncia da comunidade ou ambiente para
recuperar do impacto de catstrofe). Em termos metodolgicos, a definio do EMA
relevante na medida em que divide o momento anterior ao desastre, e o momento aps o
desastre, resilincia. Para alm do EMA, tambm Eakin (2006) coloca a tnica no impacto e
na recuperao, definindo a vulnerabilidade como a funo da exposio do sistema, a
sensibilidade ao stress, e a capacidade para absorver ou enfrentar as consequncias desses
factores de tenso.
Susan Cutter (1994) considera que a vulnerabilidade pode ser vista como a interaco entre a
perigosidade existente num determinado lugar (hazard of place) e as caractersticas e o grau
de exposio da populao l residente, o facto das pessoas viverem num leito de cheia no
deve significar que so mais ou menos vulnerveis, a sua capacidade de enfrentar uma
possvel cheia que vai determinar a sua vulnerabilidade. Para alm de considerar a
componente social, S. Cutter considera tambm a componente espacial e a temporal. Em
termos de avaliao da vulnerabilidade os enfoques principais devero ser para a preparao,
preveno e capacidade de resposta para enfrentar as mais diversas perigosidades.
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
25
Assim, a passagem da utilizao do conceito de insegurana para a utilizao do conceito de
vulnerabilidade social representou a assumpo de que o elemento social um elemento
activo quando se fala de riscos (Bankoff, 2004), uma vez que, quando falamos de
vulnerabilidade social, estamos a falar da predisposio que um dado grupo tem de ser
afectado, isto em termos fsicos, econmicos, polticos ou sociais (Oliver-Smith, 2004), no
caso de ocorrncia de um fenmeno destabilizador de origem natural ou antrpica. Para este
autor, o conceito de vulnerabilidade expressa a multidimensionalidade dos desastres uma vez
que foca a ateno na totalidade das relaes de uma dada situao social, que constitui uma
condio que, numa combinao de foras ambientais, produz um desastre. Por outras
palavras, vulnerabilidade significa a predisposio em termos fsicos, econmicos, polticos
ou sociais de uma comunidade sofrer danos no caso da ocorrncia de um fenmeno
destabilizador de origem natural ou antrpica. O nvel de vulnerabilidade depende do nvel de
desenvolvimento atingido, entendendo-se desenvolvimento como o nvel de harmonia
existente entre a comunidade e o ambiente; a vulnerabilidade em grupos sociais pode ser
entendida como a capacidade destes se adaptarem ou ajustarem, a determinado conjunto de
circunstncias (as pessoas so vulnerveis a algo e a sua resilincia (ou falta dela) tem que ver
com limitaes no que concerne ao acesso e mobilizao de determinados recursos, e na sua
incapacidade em absorver os impactos).
Os conceitos essenciais quando se fala de vulnerabilidade so: exposio, antecipao,
capacidade para enfrentar ou lidar com a situao (coping) e recuperao ou resilincia
(Cutter, 2003; Huffschmidt, 2005; Kasperson, 2003). Estes elementos podem ser entendidos
como trs momentos da vulnerabilidade: um primeiro, que funo da exposio e da
antecipao, que define a possibilidade de serem atingidas e a capacidade das comunidades
evitarem ou tomarem as medidas necessrias reduo do impacto das perigosidades; um
segundo momento que consiste na capacidade que as comunidades tm para enfrentar a
situao de desastre; um terceiro momento, que o do regresso normalidade, a um estilo
de vida comparvel ao que tinham antes do desastre (Dwyer, 2004). No entanto, esta diviso
no estanque, uma vez que a resilincia/recuperao dependem em grande medida da
capacidade para lidar com os desastres. Autores como Manyema (2006) consideram que a
resilincia pode ser encarada como uma entidade distinta da vulnerabilidade, e no apenas
como o plo negativo que vai desde o potencial de perda e que consiste na capacidade de as
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
26
comunidades alterarem caractersticas no essenciais de forma a sobreviverem; para S. Cutter
(2003), ao ser vista como resultado das escolhas acerca do futuro feitas pelas comunidades.
Na tabela 1-3 esto representadas a tipologia das perdas directas ou indirectas, de cariz
humano-social, fsicas, econmicas, culturais e ambientais.
Tabela 1-3: Tipos de perda associados a acontecimentos potencialmente danosos
Fonte: van Westen e Kingma (2009)
Perdas
Humanas Sociais
Fsicas Econmicas Culturais e
ambientais
Perdas
directas
mortes
danos estruturais ou
colapso dos
edifcios
interrupo do negcio
devido a danos nos
edifcios e infraestruturas
sedimentao
ferimentos
danos no
estruturais e danos
no recheio
perda de produtividade
laboral devido a mortes,
ferimentos e esforos de
socorro
poluio
perda de rendimento ou
desemprego
danos estruturais
nas infraestruturas
custos financeiros de
resposta e socorro
espcies ameaadas
de extino
perda da habitao destruio de zonas
ecolgicas
destruio da
herana cultural
Perdas
indirectas
doenas
progressiva
deteriorao dos
edifcios
danificados e infra-
estruturas no
reparadas
enfraquecimento do
mercado das seguradoras
perda da
biodiversidade
incapacidades
permanentes menos investimentos
perda da
diversidade cultural
impacto psicolgico custos financeiros das
reparaes
perda de coeso social
devido interrupo da
comunidade
reduo nos fluxos
tursticos
agitao poltica
Trata-se aqui j no da reduo de algo, ou da simples adaptao a algo, mas da construo de
algo, das formas e estilos de vida, da resilincia enquanto processo e no enquanto resultado
de um processo. Esta perspectiva adopta a questo da vulnerabilidade social das perspectivas
deterministas ecolgicas.
Os desastres podem ser vistos como construes sociais. Steinfher (2009) define o conceito
de vulnerabilidade social como uma forma especfica de desigualdade social no contexto
daquilo que designado como desastre. Para alm deste autor, tambm Adger et al (2004)
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
27
entende a vulnerabilidade social como o potencial de uma sociedade sofrer dano, quando
exposta a um acontecimento potencialmente danoso.
Evidenciam-se, assim, duas formas de entender a vulnerabilidade: como grau de perda, a
vulnerabilidade refere-se ao potencial de um elemento particular para sofrer danos, destruio,
disfuno, ou outras formas de perda (Alexander, 2000), ou como a propenso para a perda,
uma perspectiva adoptada por autores como Steinfher (2009), Adger et al (2004) e Cutter
(2003).
Hejmans (2004) apresenta trs paradigmas como causas da vulnerabilidade. Um primeiro, a
que chama de Natureza como causa, segundo o qual a natureza e os perigos naturais so os
responsveis pela vulnerabilidade das pessoas, que varia segundo a intensidade, magnitude e
durao dos eventos; segundo este paradigma, a vulnerabilidade varia em funo da
exposio/proximidade aos perigos e a sua reduo depende essencialmente de sistemas de
previso e outras tecnologias que habilitem as estruturas humanas a resistir aos impactos
negativos.
Um segundo paradigma, Custo como causa, baseado em questes financeiras; em que
apesar do aumento da capacidade cientfica e tecnolgica, as pessoas continuam a sofrer
porque as tecnologias de previso e mitigao so dispendiosas; segundo este modelo, a
vulnerabilidade reduzida atravs da criao de redes de segurana, seguros, fundos de
calamidade e assistncia financeira.
Um terceiro paradigma, Estruturas sociais como causa, requer solues polticas, j que,
segundo esta perspectiva, os desastres tm um impacto diferenciado de acordo no apenas
com a localizao das zonas mais expostas, mas tambm de acordo com processos
socioeconmicos e polticos que geram a vulnerabilidade, ao criarem condies que afectam
negativamente a capacidade das comunidades e pases para responderam e enfrentarem as
consequncias dos desastres. As solues passam por alterar as estruturas sociais e polticas
que geram a pobreza, assim como as dinmicas que a perpetuam.
Independentemente das perspectivas diferentes adoptadas pelos autores, h consenso quanto
ao facto de a vulnerabilidade (e a resilincia) no ser o simples resultado da exposio aos
perigos, mas sim o resultado de condies de desigualdade social que precedem a ocorrncia
desses processo e que podem estar relacionados com factores como a pobreza,
etnicidade/raa, idade, gnero ou at mesmo orientao sexual (Cutter, 2003; Cutter, 2006;
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
28
Bankoff, 2004; Willisons, 2004; Bolin, 2006; Dwyer, 2004; Langridge, 2006; Enarson, 2006;
Delicado e Gonalves, 2007). Assume-se assim que as componentes da vulnerabilidade social
variam em funo de caractersticas das comunidades que, partida, no tem directamente
que ver com a perigosidade que constitui o lado biofsico dos riscos, mas sim com o seu grau
de desenvolvimento econmico, acesso (efectivo) a recursos, modos de vida, meios de
subsistncia. Como diz S. Cutter (2006), as populaes vulnerveis so aquelas que se
encontram em risco no simplesmente porque esto exposta aos perigos, mas como resultado
da marginalidade que vivem, que faz das suas vidas uma emergncia permanente.
Estes factores potenciam a vulnerabilidade social de vrias formas e em vrios momentos.
A idade, por exemplo, (idosos e crianas) tem que ver no s com a fragilidade fsica,
individual, mas tambm com a dificuldade de acesso aos meios que permitem mitigar as
consequncias dos desastres. Os processos de racializao/etnicizao, concomitantes com a
pobreza, decorrentes em muitos casos de lgicas coloniais, operam muito ao nvel da
segregao espacial, de qualidade da construo das caractersticas do ambiente construdo,
mas tambm ao nvel das aptides lingusticas (capacidade para perceber os alertas) (Bolin,
2006; Cutter, 2006). Mesmo ao nvel do gnero, as mulheres tendem a ser mais vulnerveis
que os homens, devido sua maior dependncia econmica, s suas obrigaes de apoio
famlia e ao facto de terem, mais que os homens, os seus meios de subsistncia ligados
habitao, pelo que a perda desta pode acarretar tambm a perda de toda a capacidade
financeira para recuperar do desastre (Enarson, 2006). O desconhecimento das dinmicas,
redes e modos de vida de certas comunidades (LGBT, imigrantes, residentes recentes, etc.)
tambm pode exclu-las das polticas e medidas de mitigao dos efeitos dos desastres,
tornando-as mais vulnerveis (Enarson, 2006; Wisner, 2004). A pobreza, s por si, factor de
vulnerabilidade por um conjunto muito variado de motivos: as populaes pobres tm menos
capacidade de antecipao (compra de alimentos), menos capacidade de fuga (dependncia
dos transportes pblicos que podem no ser suficientes), ocupam geralmente empregos mais
instveis, passveis de se perderem, ou dedicam-se a actividades informais baseadas na
prpria habitao, ocupam casas arrendadas cujo estado de preparao para enfrentar um
desastre est completamente fora do seu controlo (Morrow, 1999). Estes contextos
vulnerveis, em que os riscos so agravados pelas vulnerabilidades prvias ocorrncia dos
desastres, permitem a reproduo social populaes, sectores produtivos e territrios
vulnerveis (Porto, 2007).
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
29
No entanto, estes grupos sociais e a sua relao com a vulnerabilidade no podem ser vistos
como homogneos. Com efeito, o processo de regionalizao e homogeneizao da
vulnerabilidade, ancorada na descrio quantitativa baseada em informao recolhida de
forma no participada, escamoteia o facto de que nem todas as populaes com determinadas
caractersticas e/ou de uma determinada regio tm a mesma vulnerabilidade e parte de um
processo em que as tenses ideolgicas, econmicas e polticas polarizam as tenses entre
Norte e Sul (Stephen, 2004).
Dois autores, Porto (2007) e Dwyer (2004) dividem a vulnerabilidade social em vrios tipos.
Para Porto esta pode ser dividida em vulnerabilidade populacional (vulnerabilidade de certos
grupos especficos) e vulnerabilidade institucional (incapacidade poltica, legal, etc., para
mitigar os riscos). Por sua vez para Dwyer, a vulnerabilidade divide-se em individual,
relacionada com os atributos pessoais de cada um, da comunidade, relacionada com a forma
como interagimos com os outros, regional/geogrfica, relacionada com a distncia aos
servios e administrativa/institucional, relacionada com os fundos de desastres e com os
estudos de mitigao. Para esta autora, a vulnerabilidade uma questo de capacidade de
recuperao (person ability to recover to various natural hazards impacts), aproximando-se
assim bastante do conceito de resilincia.
Alves (2006) recorre ao conceito vulnerabilidade scioambiental descrevendo-o como a
coexistncia ou sobreposio espacial entre grupos populacionais muito pobres e com alta
privao (vulnerabilidade social) e reas de risco ou degradao ambiental (vulnerabilidade
ambiental). Procura abranger num nico conceito duas realidades, contudo, considera-se
como a melhor estratgia, em termos metodolgicos, o discernimento das vrias vertentes da
vulnerabilidade, a fim de obter resultados os mais claros e objectivos possveis.
O projecto ENSURE analisa a vulnerabilidade como um conceito multifacetado, recorrendo
imagem de um diamante como uma forma de ilustrar as diferentes caractersticas ou
dimenses da vulnerabilidade (Tapsell, 2010). Foram contempladas as seguintes facetas:
fsica, sistmica, social, econmica, territorial, institucional, organizacional e cultural.
Birkmann (2005), considerando que pode ser enganador tentar estabelecer uma definio de
vulnerabilidade universal, criou um conjunto de esferas do conceito de vulnerabilidade: na
primeira esfera a vulnerabilidade vista como um factor intrnseco do risco; na segunda
esfera a vulnerabilidade perspectivada como a possibilidade de sofrer algum dano, como a
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
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morte ou ferimentos; na terceira esfera a vulnerabilidade entendida como uma abordagem
dual entre a susceptibilidade e capacidade de enfrentamento; na quarta esfera a
vulnerabilidade vista como uma estrutura mltipla que abrange a susceptibilidade, a
capacidade de enfrentamento, a exposio, a capacidade de adaptao; na quinta fase a
vulnerabilidade vista como um conceito multidimensional integrando caractersticas fsicas,
sociais, econmicas, ambientais e institucionais.
Para alm do projecto ENSURE, tambm Bohle (2001) perspectiva a vulnerabilidade como
um conceito multifacetado. Segundo este autor a vulnerabilidade pode ser vista como tendo
um lado externo e outro interno. O lado externo envolve as variveis relacionadas com a
exposio aos riscos e aos choques; o lado interno encontra-se relacionado com a capacidade
de antecipar, enfrentar, resistir e recuperar do impacto provocado por um evento
potencialmente danoso.
Tratando-se a vulnerabilidade de um conceito to amplo, surge a necessidade de dividi-lo por
tipologias. Pela anlise da tabela 1-4 possvel observar diferentes tipos de vulnerabilidade
proposto por vrios autores. A multiplicidade de definies de vulnerabilidade importante e
potencialmente til na expanso terica nesse domnio, assim como no exame das
ramificaes de compreenso e desenvolvimento terico do modo como o conceito visto
(Manyena, 2006). possvel analisar separadamente vulnerabilidade ambiental e
vulnerabilidade social, no esquecendo, contudo, que um acesso reduzido a gua potvel e
rede de saneamento, nomeadamente nas reas densamente povoadas e ambientes urbanos
podem aprofundar os nveis de vulnerabilidade scio - econmica (ONU, 2004). Alis,
autores como Birkmann (2010) questionam se possvel caracterizar adequadamente a
vulnerabilidade humana sem considerar a vulnerabilidade do ecossistema.
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
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Tabela 1-4: Tipos de vulnerabilidade
Tipos de vulnerabilidade Autor
Vulnerabilidade Populacional Porto (2007)
Vulnerabilidade Institucional
Vulnerabilidade Individual
Dwyer (2004) Vulnerabilidade Regional/Geogrfica
Vulnerabilidade Administrativa/institucional
Vulnerabilidade Cultural
Wilches - Chaux (1989)
Vulnerabilidade Ecolgica
Vulnerabilidade Econmica
Vulnerabilidade Educacional
Vulnerabilidade Fsica
Vulnerabilidade Ideolgica
Vulnerabilidade Institucional
Vulnerabilidade Natural
Vulnerabilidade Poltica
Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Tcnica
Vulnerabilidade Cultural
Aysan (1993)
Vulnerabilidade Ecolgica
Vulnerabilidade Educacional
Vulnerabilidade em Termos de Atitudes e Motivaes
Vulnerabilidade Fsica
Vulnerabilidade Material e Econmica
Vulnerabilidade Poltica
Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Ambiental
Lavell (1994) Vulnerabilidade Educacional
Vulnerabilidade em termos de Informao
Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Econmica
Davis (2004) Vulnerabilidade Fsica
Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Comercial
Wisner (2004)
Vulnerabilidade da Economia Regional
Vulnerabilidade do Sistema de Comunicaes
Vulnerabilidade em Termos de Engenharia de Estruturas
Vulnerabilidade em termos de Infra-estruturas de Resgate
Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Biofsica Adger (2004)
Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Ambiental
ONU (2004) Vulnerabilidade Fsica
Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Ambiental
Alves (2006) Vulnerabilidade Social
Vulnerabilidade Scio ambiental
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1.3 Explorao do conceito de vulnerabilidade social no projecto
A partir desta anlise e ponderao de vrias hipteses de trabalho, considera-se a
vulnerabilidade social na acepo mais abrangente, nomeadamente em termos de
interveno. Se o estudo enveredasse pela vulnerabilidade econmica, significaria cingir-se
vulnerabilidade dos bens econmicos, da produo industrial, por exemplo, a perda de
pinheiros num incndio florestal, e perdas potenciais directas, como as consequncias
econmicas do tempo necessrio para os pinheiros plantados no ps- desastre, atingirem o
mesmo tamanho (Davis, adapt., 2004). Para alm desta, uma outra hiptese de trabalho
poderia ser enveredar pela vulnerabilidade biofsica, entendida como a funo da frequncia e
severidade (probabilidade de ocorrncia) de um dado tipo de perigosidade (Adger et al, 2004).
Nesse cenrio uma vez que se o sistema humano estiver bem preparado para enfrentar
determinada perigosidade, ou seja, se a vulnerabilidade social for baixa, os danos causados
sero praticamente nulos ou at mesmo nenhum.
No caso da vulnerabilidade social a sociedade no perspectivada como massa homognea,
com o mesmo comportamento, percepes, reaces, mas segundo parmetros como o sexo,
idade, gnero, nacionalidade, algum tipo de deficincia. Em caso de desastre importante
conhecer os recursos humanos disponveis, os cenrios com que se poder contar, os grupos
mais vulnerveis em relao aos diversos perigos, quais as suas principais fraquezas. A
vulnerabilidade social implica a gesto de vrias escalas de anlise, uma vez que integra
factores como os nveis de bem-estar dos indivduos, comunidades e sociedade. Inclui
aspectos como o nvel de alfabetizao e educao, a existncia de paz e segurana, acesso
aos direitos humanos e bsicos, sistemas de boa gesto, igualdade social, valores tradicionais
positivos, costumes e crenas ideolgicas e sistemas de organizao colectiva (ONU, 2004),
ou seja, decorrente de diferentes processos sociais temos diferentes exposies ao Risco.
Ao mesmo tempo que a vulnerabilidade social surge como a vertente mais profcua, tambm
se assume como uma das mais complexas. A vulnerabilidade social no se resume s
caractersticas dos indivduos, mas tambm s suas relaes na sociedade, a natureza dessas
relaes e o ambiente fsico e social onde habitam (Tapsell, 2010).
A este propsito, convm referir a genealogia do conceito de resilincia feita por Manyema
(2006), em que o termo vem do latim resilio, que queria dizer voltar para trs, no havendo
Risco, Vulnerabilidade Social e Estratgias de Planeamento Uma Abordagem Integrada
33
consenso quanto rea em que foi utilizado pela primeira vez. Segundo alguns autores ter
sido na ecologia, campo em que se tornou comum a partir do lanamento, em 1973, do
trabalho de Holling Resilience and Stability of Ecological Systems. Segundo outros, o
conceito DE resilincia evoluiu a partir da psicologia e da psiquiatria, nomeadamente no
desenvolvimento da psicopatologia, nos anos 1940, em que ter surgido associado a estudos
dos efeitos negativos de adversidades em crianas e ao risco que estas correm de sofrer de
perturbaes psicopatolgicas. Langridge (2006) refere que o conceito de resilincia tem, nas
cincias duras, duas definies: 1. A velocidade de recuperao de uma perturbao; 2. A
magnitude de uma perturbao relativa ao limiar em que pode ser absorvida antes de um
sistema mudar a sua estrutura atravs da alterao dos processos e das variveis que
controlam o seu comportamento. Segundo esta autora, cientistas sociais costumam usar
simultaneamente estes dois pontos de vista.
1.4 Modelos de avaliao da vulnerabilidade social
Embora no constitua tarefa fcil medir a vulnerabilidade, pois no algo tangvel, como o
ndice de Massa Corporal, considera-se que resulta de um conjunto de variveis tangveis,
como o ndice de Envelhecimento Populacional. As consequncias da ocorrncia de um
desastre natural numa comunidade com elevados nveis de vulnerabilidade social podem ser
bastante tangveis. Segundo Birkmann (2006), a avaliao da vulnerabilidade deve-se focar
nas caractersticas que determinam a probabilidade de feridos, perdas e outros danos, assim
como a capacidade de resistir e recuperar de impactos negativos.
As metodologias de avaliao da vulnerabilidade dependem do enquadramento conceptual.
Entendendo o conceito de vulnerabilidade como o grau de perda de um elemento ou conjunto
de elementos em risco resultante da ocorrncia de um fenmeno natural de determinada
magnitude (Buckle et al., 20