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José Antonio Santos de Oliveira. TODOROV, Tzvetan. A beleza salvará o mundo: Wilde, Rilke e Tsvetaeva: os aventureiros do absoluto. Rio de Janeiro: DIFEL, 2011, p. 7 – 24. “A perfeição da execução abriu as portas para uma experiência rara, porém familiar; ela nos conduziu a um lugar que ainda não sabemos nomear, mas que, de saída, sentimos que nos é essencial. É um local de plenitude. (...) uma ação e uma reação contêm em si sua justificação, uma e outra surgem para levar a um resultado, um sentido situado para além delas. Em momentos abençoados como este que falo, não aspiramos mais a um além – já estamos nele. Ignoramos estar à procura desse estado; porém, quando chegamos a ele, reconhecemos sua importância vital. (...) A beleza, seja a de uma paisagem, a de um encontro ou a de uma obra de arte, não remete a algo para além dessas coisas, mas nos faz apreciá-las enquanto tais. É precisamente essa sensação de habitar pela e exclusivamente o presente.” (TODOROV, 2011. p. 8-9). Palavras-chave: Perfeição. Plenitude. Realização. “A música não é o único meio de conhecer essa experiência, nem a beleza a única maneira de nomear o que encontramos nesse lugar. Mesmo não sendo frequente, todos nós a encontramos na vida cotidiana. (...). É mais que um prazer ou mesmo uma felicidade, pois esses atos me fazem pressentir de forma fugidia um estado de perfeição, ausente em outro estado qualquer. A satisfação que retiramos desse momentos não depende diretamente da sociedade que nos cerca, não se trata nem de uma recompensa material nem de um reconhecimento

Sessao 4 - Ficha 1

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Literatura e religiosidades

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Page 1: Sessao 4 - Ficha 1

José Antonio Santos de Oliveira. TODOROV, Tzvetan. A beleza salvará o mundo: Wilde,

Rilke e Tsvetaeva: os aventureiros do absoluto. Rio de Janeiro: DIFEL, 2011, p. 7 – 24.

“A perfeição da execução abriu as portas para uma experiência rara, porém familiar; ela nos

conduziu a um lugar que ainda não sabemos nomear, mas que, de saída, sentimos que nos é

essencial. É um local de plenitude. (...) uma ação e uma reação contêm em si sua justificação,

uma e outra surgem para levar a um resultado, um sentido situado para além delas. Em

momentos abençoados como este que falo, não aspiramos mais a um além – já estamos nele.

Ignoramos estar à procura desse estado; porém, quando chegamos a ele, reconhecemos sua

importância vital. (...) A beleza, seja a de uma paisagem, a de um encontro ou a de uma obra

de arte, não remete a algo para além dessas coisas, mas nos faz apreciá-las enquanto tais. É

precisamente essa sensação de habitar pela e exclusivamente o presente.” (TODOROV, 2011.

p. 8-9).

Palavras-chave: Perfeição. Plenitude. Realização.

“A música não é o único meio de conhecer essa experiência, nem a beleza a única maneira de

nomear o que encontramos nesse lugar. Mesmo não sendo frequente, todos nós a encontramos

na vida cotidiana. (...). É mais que um prazer ou mesmo uma felicidade, pois esses atos me

fazem pressentir de forma fugidia um estado de perfeição, ausente em outro estado qualquer.

A satisfação que retiramos desse momentos não depende diretamente da sociedade que nos

cerca, não se trata nem de uma recompensa material nem de um reconhecimento público que

afagaria nossa vaidade: ambos podem coroar essas ações, mas não fazem parte delas.”

(TODOROV, 2011. p. 9).

Palavras-chave: Experiência. Perfeição. Cotidiano.

“Essas experiências não se confundem entre si, porém todas conduzem a um estado de

plenitude, nos dão um sentimento de realização interior. Sensação fugaz e ao mesmo tempo

infinitamente desejável, pois graças a ela nossa existência não decorre em vão; graças a esses

momentos preciosos, ela se torna mais bela e mais rica de sentidos. (...). Sabemos bem que

não podemos viver permanentemente nesse estado de realização e de plenitude do ser, que se

trata mais de um horizonte do que de um território; sem ele toda vida, a vida não tem o

mesmo valor.” (TODOROV, 2011. p. 9-10).

Palavras-chave: Realização. Sentido. Interior.

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“A aspiração à plenitude e à realização interior se encontra no espírito de todo ser humano, e

isso desde os tempos mais remotos; se temos dificuldade para nomeá-la, é porque ela assume

as formas mais extraordinariamente diversas. (...). (...), a necessidade da plenitude foi

interpretada e orientada para o contexto da experiência religiosa. (...). A religiõe foi e ainda é

com frequência uma cosmologia, uma moral, um cimento comunitário, um fundamento do

Estado e da Política. (...), evoca, entretanto, uma relação com uma instância material, situada

acima de nós, á qual foi possível fazer referência com os termos de absoluto ou infinito, de

sagrado ou graça. As religiões certamente são múltiplas, mas todas encarnam e canalizam essa

relação ao além; elas fizeram por milênios, e por toda a Terra.” (TODOROV, 2011. p. 10).

Palavras-chave: Espírito. Religião. Absoluto.

“(...) absoluto ou (...) sagrado, (...) ambos deixaram o céu e desceram à Terra. ( A religião)

(...) não está morta na medida em que, forma principal, senão única, da aspiração ao absoluto

durante séculos, ela deixou sua marca nesse próprio traço humano (...). (...), a religião não

fornece o contexto obrigatório, estruturante tanto da sociedade em seu conjunto quanto da

experiência dos indivíduos; as crenças religiosas, no sentido estrito, são hoje uma forma entre

outras dessa busca, e sua escolha tornou-se uma questão pessoal.” (TODOROV, 2011. p. 11).

Palavras-chave: Humano. Aspiração. Absoluto.

“Falar de absoluto individual tem algo de paradoxal, e mesmo de francamente contraditório,

já que o absoluto deveria valer para todos; se é bom para apenas um indivíduo, ele permanece

relativo. (...). Não queremos renunciar à relação com o sagrado (ou o infinito, ou o sublime),

mas não aceitamos que ele nos seja imposto por nossa sociedade; preferimos procura-lo então

no próprio interior de nossa experiência em vez de buscá-lo num código coletivo. (...). Nossa

escolha é subjetiva e, porém temos a íntima convicção de que ela não é de modo algum

arbitrária e que os outros que nos cercam poderiam reconhecer seu valor; é nossa

“descoberta”, não nossa invenção. (...) a experiência religiosa não é uma característica

irredutível da espécie humana, mas somente a forma mais comum tomada por uma disposição

que é mais propriamente antropológica (...), isto é, ela não poderia desaparecer sem provocar

uma mutação na espécie. (...) outras formas de aspiração ao absoluto existem desde há muito

tempo, mas foi recentemente que acenderam a consciência individual e ao reconhecimento

público, no decorrer dos processos chamados de “desencantamento do mundo”. ”

(TODOROV, 2011. p. 12-13).

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Palavras-chave: Individual. Coletivo. Paradoxal.

“(...) as tentativas de pensar e viver o absoluto de maneira individual, para fora tanto das

religiões tradicionais quanto das religiões seculares políticas, gostaria de me ater (...), a que

interpreta essa experiência como busca da beleza. (...). (...) “beleza” recebe aqui um sentido

amplo que nem sempre é admitido no uso comum. (...). Trata-se mais da tentativa de ordenar

a vida de maneira que a consciência individual a julgue harmoniosa, de modo que os

diferentes ingredientes, vida social, profissional, íntima e material formem um todo

inteligível. (...), a experiência de êxito interior e de plenitude do ser.” (TODOROV, 2011. p.

13-14).

Palavras-chave: Absoluto. Beleza. Harmonia.

“(...) a arte de viver é uma arte entre outras e que se pode perfazer a vida como uma obra de

arte. (...). (...) a arte é percebida como um local por excelência em que os seres humanos

produzem o belo. Para muitos de nós, a plenitude que procuramos se encontra – notadamente

– na experiência artística. (...). (...) a obra de arte, (...), nos dá em si uma sensação de

plenitude, de realização e de perfeição que, por outro lado, pedimos à nossa vida.”

(TODOROV, 2011. p. 14).

Palavras-chave: Arte. Belo. Plenitude.

“Não é, portanto, a contemplação de obras que será dado como exemplo de uma bela vida

nem de sua criação, é a própria obra de arte.” (TODOROV, 2011. p. 14).

Palavras-chave: Obra. Arte. Vida.

“Na vida, nem sempre temos de escolher livremente nossa via. Primeiro nos submetemos às

decisões dos adultos que nos cercam, depois sofremos as pressões exercidas por nossos

amigos, em Seguida nos conformamos com modelos de comportamento ofertados pela

sociedade, nos curvando às exigências do mundo do trabalho. (...), cada um de nós é

animando por um projeto de vida, possuindo em nosso interior uma configuração ideal que

nos guia a partir da qual julgamos nossa existência em dado momento. Sei que a aspiração à

plenitude, à realização interior e a uma qualidade de vida superior, faz parte dessa

configuração (...).” (TODOROV, 2011. p. 16-17).

Palavras-chave: Escolha. Projeto. Vida.

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O belo na filosofia platônica é entendido como aquilo que é verdadeiro, pleno. O

ser humano busca no decorrer de sua existência a realização pessoal, buscando sempre a

completude da existência no cotidiano da vida. A experiência do dia a dia deve trazer

satisfação ao ser humano, independente do meio, pois não se trata nem de uma recompensa

material nem de um reconhecimento público, mas apenas de realização pessoal encontrada

nas coisas da vida.

Muitas são as experiências, cada uma com sua peculiaridade, que levam o homem

a um estado de plenitude, dando um sentimento de realização interior, sensação infinitamente

desejável. Dessa forma nossa existência não decorre em vão, se torna mais bela e com

sentido, embora saibamos que não vivemos em permanente estado de realização e de

plenitude. A plenitude e realização interior são uma aspiração humana, e a sua necessidade foi

interpretada e orientada para o contexto das experiências religiosas, que certamente são

múltiplas, mas todas canalizam a busca do ser humano pela plenitude e o fazem por milênios

e por toda a Terra. A religião estrutura tanto a sociedade em seu conjunto quanto a

experiência dos indivíduos; e as crenças religiosas são formas entre outras dessa busca, e sua

escolha tornou-se uma questão pessoal.

Falar de plenitude é também falar de absoluto. A busca pela realização individual

tem algo de paradoxal, pois realização e plenitude são absolutas, deveria valer para todos.

Faz-se mister não aceitar que tal realização pessoal seja imposta por nossa sociedade; é

preferível procurá-la então no próprio interior de nossa experiência. A experiência religiosa é

um dos caminhos que traçam a busca pela realização humana, da busca pela plenitude, mas há

outras formas de aspiração ao absoluto.

Dentre as tentativas de pensar e viver o absoluto de maneira individual, seja

dentro da religião ou não, a mais, digamos, que me atina o ser, é a que interpreta essa

experiência como busca da beleza: a tentativa de ordenar a existência de maneira que a minha

consciência a diga harmoniosa, de modo que os variados meios em que me apercebo - a vida

social, profissional, íntima e material formem um todo inteligível - me trazendo uma

experiência de realização interior e de plenitude.

Viver é uma arte entre outras, e de fato se pode cursar a vida como uma obra de

arte. Ela é percebida, para os seres humanos, como um local por excelência de produzir o

belo. A plenitude que procuramos se encontra na experiência artística, ela nos dá uma

sensação de completude, de realização e de perfeição, que é o que desejamos para a nossa

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vida. Nem sempre podemos escolher livremente o nosso caminho, somos a todo o momento

submetidos à influência de outros, sofremos as pressões sociais, e facilmente nos

conformamos com modelos de comportamento ofertados pela sociedade, nos curvando às

exigências do mundo do trabalho.

Cada indivíduo é animando por um projeto de vida, trazendo consigo uma

configuração ideal: a aspiração à plenitude, à realização interior e uma qualidade de vida

superior como guia, a partir da qual orienta a existência a cada momento.