10
do Conhecimento, Teor'. do 5/9 da seleçáo natural teve uma importancia decisiva neste processo: com ela (B doutrina -se a opiniáo de que o progresso se realiza automaticamente. Ademais, ela favoreceu fortaleceu do conceito de progresso a todos os domínios da atividade humana.) Em Turgot, a conceito de progresso ainda tinha funções críticas. Isso permitiu sobretudo charnar a das pessoas para os movimentos regressivos da história. É significativo que Turgot considerava o progresso garantido sobretudo no domínio das pesquisas matemáticas. (N 11a. 11 "Que espetáculo é a sucessão das opiniões dos homens! Procuro nela o progresso do espírito humano, e praticamente desde não os primeiros encontro nada passos além no estudo da história das matemáticas, de seus erros. é Por tão que vacilante a sua marcha, tão segura quanto ao resto, tão sujeita ao extravio? ... Nessa progressão lenta de opiniões e de erros ... creio ver as primeiras folhas esses invólucros que a natureza deu ao caule nascente das plantas saírem da terra antes delas, fanarem-se sucessivamente com o nascimento de outros invólucros, até que, enfim, esse caule apareça e se coroe de flores e de frutos, imagem da verdade tardia." Turgot, CEuvres, vol. II, Paris, 1844, pp. 600-601 ("Second discours sur les progrès successifs de l'esprit humain"). [N 11a, 21 Existe ainda um limes [limite] do progresso em Turgot: "Nos últimos tempos ... era preciso retornar, pela reflexão, ao ponto onde os primeiros homens haviam sido conduzidos por um instinto cego; e quem sabe não seria este o supremo esforço da razão?" Turgot, op. cit., p. 610.18 Em Marx ainda existe este Itmes; mais tarde ele se perde. (N 11a. 31 é evidente em Turgot que o conceito de progresso se orienta pela ciência, mas tem seu corretivo na arte (no fundo, a arte tampouco pode ser considerada exclusivamente sob a categoria do retrocesso; e de fato, o ensaio de Jochmann não desenvolve este aspecto sem restrição). Obviamente, Turgot exime a arte do progresso de modo diferente de como o faríamos hoje: "O conhecimento da natureza e da verdade é infinito igual a elas. As artes, cujo objetivo é de nos proporcionar prazer, são limitadas como nós. O tempo faz eclodir sem cessar novas descobertas nas ciências, mas a poesia, a pintura, a música têm um ponto fixo, determinado pelo gênio das línguas, pela imitação da natureza, pela sensibilidade limitada de nossos órgãos... Os grandes homens do século de Augusto o alcançaram e são ainda nossos modelos." Turgot, (Euvres, vol. II, Paris, 1844, pp. 605-606 ("Second discours sur les progrès successifs de l'esprit humain"). Portanto, uma renúncia programática à originalidade na arte! (N 12, 11 elementos na arte do gosto que puderam se aperfeiçoar com o tempo; testemunha disso é a perspectiva, que depende da ótica. Mas a cor local, a imitação da natureza e a Própria expressão das paixões pertencem a todos os tempos." Turgot, CEuvres, vol. II, Paris, 1844, p. 658 ("Plan du second discours sur I'histoire universelle"). IN 12, 21 con cepçäo militante do progresso: "Não é o erro que se opõe ao progresso da verdade, mas a Indolência, a teimosia, 0 espírito de rotina, tudo 0 que leva inatividade. O progresso 18 Os tradutores americanos corrigiram a transcriçåo de Benjamin, verificando o texto de Turgot. Em lugar "era preciso retornar, pela perfeiçåo", eles colocam "era preciso retornar. pela reflexåo•. De fato. esta versåo é mais plausível e foi aqui adotada. (w.b.; grifos meus)

Walter Benjamin. Passagens Arquivo N 2

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Walter Benjamin, N2, Passagens

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do Conhecimento, Teor'. do 5/9

da seleçáo natural teve uma importancia decisiva neste processo: com ela(B

doutrina-se a opiniáo de que o progresso se realiza automaticamente. Ademais, ela favoreceu

fortaleceudo conceito de progresso a todos os domínios da atividade humana.) Em Turgot,

aconceito de progresso ainda tinha funções críticas. Isso permitiu sobretudo charnar a

das pessoas para os movimentos regressivos da história. É significativo que Turgot

considerava o progresso garantido sobretudo no domínio das pesquisas matemáticas.(N 11a. 11

"Que espetáculo é a sucessão das opiniões dos homens! Procuro nela o progresso do espírito

humano, e praticamente desde

não

os primeiros

encontro nada

passos

além

no estudo

da história

das matemáticas,

de seus erros.

é Por

tão que

vacilantea sua

marcha, tão segura

quanto ao resto, tão sujeita ao extravio? ... Nessa progressão lenta de opiniões e de erros ...

creio ver as primeiras folhas — esses invólucros que a natureza deu ao caule nascente das

plantas — saírem da terra antes delas, fanarem-se sucessivamente com o nascimento de

outros invólucros, até que, enfim, esse caule apareça e se coroe de flores e de frutos, imagem

da verdade tardia." Turgot, CEuvres, vol. II, Paris, 1844, pp. 600-601 ("Second discours

sur les progrès successifs de l'esprit humain").[N 11a, 21

Existe ainda um limes [limite] do progresso em Turgot: "Nos últimos tempos ... era preciso

retornar, pela reflexão, ao ponto onde os primeiros homens haviam sido conduzidos por

um instinto cego; e quem sabe não seria este o supremo esforço da razão?" Turgot, op. cit.,

p. 610.18 Em Marx ainda existe este Itmes; mais tarde ele se perde.(N 11a. 31

Já é evidente em Turgot que o conceito de progresso se orienta pela ciência, mas tem seu

corretivo na arte (no fundo, a arte tampouco pode ser considerada exclusivamente sob acategoria do retrocesso; e de fato, o ensaio de Jochmann não desenvolve este aspecto sem

restrição). Obviamente, Turgot exime a arte do progresso de modo diferente de comoo faríamos hoje: "O conhecimento da natureza e da verdade é infinito igual a elas. As artes,cujo objetivo é de nos proporcionar prazer, são limitadas como nós. O tempo faz eclodirsem cessar novas descobertas nas ciências, mas a poesia, a pintura, a música têm um pontofixo, determinado pelo gênio das línguas, pela imitação da natureza, pela sensibilidadelimitada de nossos órgãos... Os grandes homens do século de Augusto o alcançaram e sãoainda nossos modelos." Turgot, (Euvres, vol. II, Paris, 1844, pp. 605-606 ("Second discourssur les progrès successifs de l'esprit humain"). Portanto, uma renúncia programática àoriginalidade na arte!

(N 12, 11

Há elementos na arte do gosto que puderam se aperfeiçoar com o tempo; testemunhadisso é a perspectiva, que depende da ótica. Mas a cor local, a imitação da natureza e aPrópria expressão das paixões pertencem a todos os tempos." Turgot, CEuvres, vol. II, Paris,1844, p. 658 ("Plan du second discours sur I'histoire universelle").IN 12, 21

concepçäo militante do progresso: "Não é o erro que se opõe ao progresso da verdade, masa Indolência, a teimosia, 0 espírito de rotina, tudo 0 que leva inatividade. O progresso

18

Os tradutores americanos corrigiram a transcriçåo de Benjamin, verificando o texto de Turgot. Em lugar

"era preciso retornar, pela perfeiçåo", eles colocam "era preciso retornar. pela reflexåo•. De fato.esta versåo é mais plausível e foi aqui adotada. (w.b.; grifos meus)

520 • Passagens

das artes mais pacíficas entre os povos antigos da Grécia e suas repúblicas

entremeado de guerras contínuas. Estavam ali como os judeus, construindo os muros de

Jerusalém com uma mão e combatendo com a outra. Os espíritos estavam sempre em

atividade, a coragem sempre excitada; as luzes do pensamento cresciam a cada dia." Turgot,

(Euvrs, vol. 11, Paris, 1844, p. 672 ("Pensées et fragments").

[N 12, 31

A presença de espírito como categoria política encontra uma expressão magnífica nestas

palavras de Turgot: "Antes de compreendermos que as coisas se encontram em uma

determinada situação, elas já mudaram várias vezes. Assim, sempre percebemos os

acontecimentos tarde demais, e a política tem sempre necessidade de prever, por assim

dizer, o presente." Turgot, CEuvres, vol. II, Paris, 1844, p. 673 ("Pensées et fragments").[N 12a, 11

"A ... paisagem profundamente transformada do século XIX permanece visível até hoje,

o menos em seus rastros. Ela foi formada pela estrada de ferro... Os lugares onde se

concentra essa paisagem histórica são aqueles em que montanha e túnel, desfiladeiro e

viaduto, torrente e teleférico, rio e ponte de ferro .. revelam seu parentesco... Em sua

singularidade, atestam que a natureza não se degradou, diante do triunfo da civilização

técnica, em algo que não tem nome nem imagem, que a mera construção da ponte ou do

túnel em si mesma ... não se tornou a característica da paisagem, e sim que o rio ou a

montanha tomaram imediatamente um lugar a seu lado, não como um derrotado aos pés

do vencedor, mas como uma potência amiga... O trem de ferro que desaparece em um

túnel dentro das montanhas ... parece ... retornar à sua própria origem, onde repousa a

matéria da qual ele próprio foi feito." Dolf Sternberger, Panorama Oder Ansichten vom 19.

Jahrhundert, Hamburgo, 1938, pp. 34-35.

O conceito de progresso precisou opor-se à teoria crítica da história a partir do momentoem que deixou de ser usado como medida de determinadas transformações históricas paraservir como medida da tensão entre um lendário início e um lendário fim da história. Emoutras palavras: tão logo o progresso se torna a assinatura do curso da história em suatotalidade, o seu conceito aparece associado a uma hipóstase acrítica, e não a umquestionamento crítico. Este último se reconhece, no estudo concreto da história, pelo fatode conferir ao retrocesso contornos tão nítidos quanto a qualquer progresso. (Assim emTurgot e em Jochmann.)

[N 13, 11

Lotze, como crítico do conceito de progresso: "Diante da afirmação bem aceita de umprogresso retilíneo da humanidade... , uma reflexão mais prudente viu-se há muito obrigadaa constatar que a história avança em espirais; outros preferem falar em epiciclóides. Emsuma, nunca faltaram, mesmo sob a forma de obscuros travestimentos, testemunhos deque a impressão geral da história não é puramente edificante, mas predominantementemelancólica. Um observador isento nunca deixará de se espantar e se lamentar de quantosbens culturais e quanta beleza singular da vida desapareceram, para nunca mais voltar.Hermann

Mikrokosmos, vol. 111, IRipzig, 1864, p. 21.

(Teoria do Conhecimento, Teoria do Progressol 521

como crítico do conceito de progresso: "Não é um pensamento ... claro imaginar queL,orß seja repartida sobre a seqüência das gerações humanas, deixando às últimasa os frutos que nasceram do esforço não recompensado e, muitas ve7£s, da miséria

por nobres que sejam os sentimentos que inspiraram tal entusiasmo, é leviano

as reivindicações das diferentes épocas e dos diferentes seres humanos, e desviar

de seus infortúnios, contanto que a humanidade progrida em geral... Nao pod

haver progresso que não represente um acréscimo de felicidade e de perfeição nos mesmos

espíritos

III, Leipzig,

que antes 1864,

sofreram

p. 23.

sob

Se a

condições

concepção

imperfeitas."

de progresso Hermann

extensivo à

Lotze,

totalidade Mikrokosmos,

do cursovol.

da história é própria de uma burguesia saturada, percebem-se em as reservas da

esia colocada na defensiva. CE ao contrário, Hölderlin: "Amo as gerações dos séculosburgu

vindouros. (N 13, 31

Uma frase que faz pensar: "Pertence às mais notáveis particularidades do espírito humano

ao lado de tanto egoísmo nos indivíduos, a ausência geral de inveja de cada presente em

relação ao seu futuro." Esta ausência de inveja indica que a nossa idéia de felicidade está

profundamente tingida pelo tempo, que é o de nossa vida. Nós só podemos imaginar a

felicidade no ar que respiramos, entre pessoas que viveram conosco. Em outras palavras,

na idéia de felicidade — é isso o que nos ensina aquele fato singular — vibra conjuntamente

a idéia de redenção. Esta felicidade se funda justamente no desconsolo e no abandono que

eram nossos. Nossa vida é, em outras palavras, um músculo que possui força suficiente para

contrair todo o tempo histórico. Ou ainda, a autêntica concepção do tempo histórico

baseia-se inteiramente na imagem da redensâo.20 (A citação encontra-se em Lotze,

Mikrokosmos, vol. III, Leipzig, 1864, p. 49).(N 13a, 11

Rejeição da idéia de progresso na concepção religiosa da história: "Não obstante todos os

seus movimentos, a história jamais poderia alcançar um objetivo que não se situasse em seu

próprio plano, e podemos nos poupar do esforço de procurar em seu desenvolvimentolinear um progresso que ela está destinada a fazer, não neste plano, mas num movimentoascendente, em cada um de seus momentos singulares." Hermann Lotze, Mikrokosmos,vol. III, Leipzig, 1864, p. 49.

(N 13a, 21

Relação entre a idéia de progresso e a idéia de redenção em Lotze: "O sentido do mundotomar-se-ia um contra-senso se não rejeitássemos a idéia de que o trabalho das gerações quePassam seja irremediavelmente perdido para elas, beneficiando somente aquelas que lhesSUcedem." (p. 50) Isto é inadmissível, "a não ser que o próprio mundo, com toda a amplidãode seu desenvolvimento histórico, queira aparecer como um ruído incompreensível e vão...

a convicção de que, de algum modo misterioso, o progresso da história alcança de fatotambém as gerações que passam, que nos permite falar de uma humanidade do modocomo o fazemos." (p. 51) Lorze define este pensamento como "idéia de uma conservaçãoe de uma

restituição" (p. 52).IN 13a, 31

19

Hölderlin, Såmtliche Werke, vol. VI, tomo 1, Briefe, ed. org. por Adolf Beck, Stuttgart. 1954. p. 92 (carta

de setembro de 1793, a seu irmåo). (R.T.)20

Cf a tese II de W. Benjamin, "Uber den Begriff der Geschtchte". GS l, 693; Teses. 48.

522 Passagens

A história cultural, segundo Bernheim, surgiu do positivismo de Comte; a Griechi$che

Geschichte, de <Karl Julius> Beloch (vol. 1, 2a ed., 1912), é, para ele, um exemplo

. o Estado

típico

e

da

osinfluência de Comte. A historiografia positivista "negligenciou

acontecimentos políticos, e via, ao contrário, no conjunto do desenvolvimento intelectual

da sociedade o único conteúdo da história... A elevação ... da história cultural à posição de

único objeto digno de pesquisa histórica!" Ernst Bernheim, Mittelalterliche Zeitanschauungen

in ihrem Einfluß aufPolitik und Geschichtschreibung, Tübingen, 1918, p. 8.

'"A categoria lógica do tempo não domina o verbo tanto quanto poderíamos crer.' por

estranho que pareça, a expressão do futuro não parece estar situada no mesmo plano do

espírito humano que as do passado e do presente... 'O futuro muitas vezes não tem expressão

própria, ou se a tem, esta é complicada, sem paralelo com as do presente e do passado...'

'Não temos razão nenhuma para pensar que o indo-europeu pré-histórico tenha em algum

momento possuído um verdadeiro futuro...' (Meillet)." Jean-Richard Bloch, "Langage

d'utilité, langage poétique", in: Encyclopédie Française, vol. XVI, 16-50, IO.[N 14, 2]

Simmel toca em uma questão muito importante ao falar da antinomia entre o conceito de

cultura e os domínios autônomos do Idealismo clássico. A distinção recíproca dos três

domínios autónomos evitou que o Idealismo clássico concebesse aquele conceito de cultura

que tanto favoreceu a barbárie. Simmel diz sobre o ideal de cultura: "O essencial ... é queele supera o valor autónomo da realização estética, científica, ética, até mesmo da realizaçãoreligiosa, a fim de integrá-las todas como elementos ou componentes na construção dodesenvolvimento do ser humano para além de seu estado natural." Georg Simmel, Philosophiedes Geldes, Leipzig, 1900, pp. 467-477.

[N 14, 31

"Nunca existiu um período da história no qual a cultura [Bildung] própria dessa épocativesse se difundido por toda a humanidade, ou pela totalidade daquele povo que foi seurepresentante mais exponencial. Todos os graus ou nuances de crueza moral, estupidezespiritual e miséria física sempre coexistiram com o refinamento cultivado da vida ... e alivre fruição das vantagens da ordem burguesa." Hermann Lotze, Mikrokosmos, vol. III,Leipzig, 1864, pp. 23-24.

[N 14a, 11

concepção segundo a qual "há progresso suficiente quando ... a cultura [Bildung] de umapequena minoria procura se sofisticar cada vez mais, enquanto a grande maioria permaneceem uma condição de perene incultura [Unbildung] Lotze contrapõe a pergunta: "comoseria possível falar em tais condições de uma história da humanidade como um todo?

wLotze, Mikrokosmos, vol. III, p. 25.

[N 14a, 21

"A maneira como a educação da Antigüidade é quase que exclusivamente transmitida ,leva, como diz Lotze, "diretamente de volta a algo que é o contrário daquilo que deveria sero objetivo do trabalho histórico; quero dizer, ela leva à formação de um instinto de culturaque abrange cada vez mais elementos da vida moral e os subtrai da açáo autònoma, paratransformá-los em uma propriedade já sem vida." (p. 28) De maneira análoga: "O

(Teoria do

do Progru•ol 523

é de imediato um progresso da humanidade; ele 0 seria se, com 0da

ciência náo

cresam humanos nestes conhecimentos, e a clara compreensão do que ente

significa

a participação

para elesdos " Lotze, op. cit., p. 29.

conjunto.o seu

sobre a humanidade: "Não se pode dizer que a humanidade se torna aquilo que elaa consciência de seu devir, e com a lembrança de seus estados anteriores." op.31.

(N 41

de história de parece ter afinidade com a de stifter. "A vontade desregradados indivíduos é sempre limitada em sua realização por condições gerais subtraídasarbítrio, situadas nas leis da vida espiritual em geral, na ordem estabelecida da natureza"Loae, op. cit., p. 34.

[N 14a, 51

comparar ao prefácio de Stifter em Bunte Steine (Pedras Coloridas): "Para começar, tenhamoscomo certo que um grande efeito deve-se sempre a uma grande causa, jamais a uma pequena."Napoleão III, Histoire de Jules César, vol. I, Paris, 1865.

[N 14a, 61

Uma fórmula que Baudelaire cria para a consciência do tempo própria de quem se encontrasob o efeito do haxixe pode ser aplicada à definição de uma consciência históricaraucionária; ele fala de uma noite na qual estava tomado pelos efeitos do haxixe: "Pormais longa que ela tenha parecido ... eu tinha a impressão, entretanto, de que ela não havia

durado mais que alguns segundos, ou mesmo de que ela não havia tomado um lugar naeternidade." Baudelaire, CEuvres, ed. Le Dantec, Paris, 1931, vol. I, pp. 298-299 21

(N 15,11

Em qualquer época, os vivos descobrem-se no meio-dia da história. Espera-se deles que

preparem um banquete para o passado. O historiador é o arauto que convida os defuntos

à mesa.[N 15, 21

Sobre a dietética dos livros de história. O contemporâneo que reconhece por meio deles há

quanto tempo a miséria que se abate sobre ele vem sendo preparada — e mostrar-lhe isto

dare ser o desejo caro ao historiador — adquire uma alta opinião a respeito de suas próprias

forças. Uma história que assim o instrui não o entristece; ao contrário, ela lhe fornece

armas. E tampouco ela provém da tristeza, ao contrário daquela que Flaubert tinha em

mente quando escreveu a seguinte confissão: "Poucos suspeitarão o quanto foi preciso estar

triste para empreender a ressureição de Cartago." A pura "curiosidade" nasce da tristeza, e

a aprofunda [N 15,

Exemplo de uma observação de "história cultural" no pior sentido. Huizinga fala como

Considerada a vida do povo humilde nas pastorais do fim da Idade Média. "Disso faz

aquele interesse pelos indigentes que já ... começa a se manifestar. As minia

Baudelaire, OC l, p, 424.0.1.)

524 • Passagens

dos calendários enfatizam, com satisfação, os joelhos rotos dos ceifadores de trigo, ou a

pintura, a roupa maltrapilha dos mendigos... Começa aqui a linha que, passando pelas

gravuras de Rembrandt e pelos meninos mendicantes de Murillo, conduz aos tipos de

de Steinlen." J. Huizinga, Herbst des Mittelalters, Munique, 1928, p. 448. Naturalmentg

trata-se de fato de um fenômeno muito es

"O passado deixou nos textos literários imagens de si mesmo, comparáveis Imagens •

que

a luz imprime sobre uma chapa sensível. Só o futuro possui reveladores SUfiCientemente

ativos para examinar perfeitamente tais clichês. Várias páginas de Marivaux ou de Rousseau

contêm um sentido misterioso que os primeiros leitores não podiam decifrar Plenamente"

André Monglond, Le Préromantisme Français, vol. I, Le Héros Préromantique, Grenoble,

1930, p. XII.[N 15a, 11

Uma visão reveladora do progresso em Hugo: "Paris incendié" (L'Année Terrible):

"O quê! Sacrificar tudo! O quê! O celeiro do pão!

O quê! A Biblioteca, arco onde se levanta a aurora,

Insondável A-B-C do ideal, onde sonha,

apoiado nos braços, o progresso, este leitor eterno..."22

[N 21

Sobre o estilo a que se deve aspirar: "É através das palavras comuns que o estilo morde e

invade o leitor. É através delas que circulam e são considerados genuínos os grandes

pensamentos, como o ouro e a prata marcados com um selo conhecido. Elas inspiram a

confiança naquele que se serve delas para tornar seus pensamentos mais inteligíveis, pois

reconhecemos no emprego da língua comum um homem que sabe da vida e das coisas, e

que se mantém em contato com elas. Além do mais, essas palavras tornam o estilo franco.

Elas mostram que o autor por muito tempo remoeu o pensamento ou o sentimento expresso,

que se apropriou deles e os tornou de tal forma familiares, que as expressões mais comuns

lhe são suficientes para exprimir idéias que, para ele, se tornaram banais, graças a uma

longa meditação. Enfim, o que se diz parece mais verdadeiro, porque nada é tão claro, no

domínio das palavras, quanto aquelas que chamamos de familiares; e a clareza é um elemento

tão distintivo da verdade que, muitas vezes, tomamos uma pela outra." Nada mais sutil

que o conselho de ser claro para, pelo menos, parecer verdadeiro. O conselho de escrever

com simplicidade, na maioria das vezes fruto do ressentimento, quando dado desta maneira,

adquire a máxima autoridade. J. Joubert, CEuvres, vol. II, Paris, 1883, p. 293 ("Du style",

XCIX).[N 31

Aquele que pudesse desenvolver a dialética dos preceitos de Joubert obteria uma estilístia

digna de nota. Assim, Joubert aconselha o uso das "palavras familiares", mas adverte contra

a "língua particular" que "só exprime coisas relativas a nossos costumes presentes". Op. cit.,

p. 286 ("Du style", LXVII). (N 16, 11

22 Victor Hugo, Œuvres Complètes, Poésie, vol. XII, L'Année Terrible, Paris, 1880. p. 268. (R.t)

do Conhecimento, Teoria do 525

alastras sáo suscetíveis de mais de uma significação. Quando uma belaum é Preciso adotá-lo." J. Joubert,

[N 16, 21

do a economia política, Marx caracteriza magnificamente como "seu elemento

„o elementO

em Korsch,

que nela

Karl

é Marx

mera

(manuscrito),

reprodução da

vol. aparência

II, p. 22.23

como

Este representação

elemento vulgar

da

. „ Cit. ente denunciado nas outras ciências.

(N 16, 31

de natureza em Marx: "Se em Hegel 'também a natureza física intervém na

onfuniversal', Marx concebe a natureza desde 0 início segundo categorias sociais.

bistó física não intervém de maneira imediata na história universal, e sim de maneira

diata, como um processo de produção material que se desenvolve desde a sua origem

111

náosó entre

linguagem

o homem compreensível

e a natureza, também

mas também

para os

entre

filósofos:

o homem

a natureza

e o homem.

pura, pressuposto

Ou, para

satividade humana (a natura naturans económica), é substituída, em toda parte —

humana social, e, com isso, ao mesmo tempo, suscetível de ser modificada e transformada

no presente e no futuro." Korsch, op. cit., vol. III, p. 3.24

(N 16, 41

Korsch menciona as seguintes reformulações da tríade de Hegel nos termos de Marx:

"A 'contradição' hegeliana é substituída pela luta das classes sociais, a 'negação' dialética pelo

proletariado e a 'síntese' dialética pela revolução proletária." Korsch, op. cit., vol. III,

P• 45.25

IN 16, 51

Restrições à concepção materialista da história por parte de Korsch: .Com as transformações

do modo de produção material, transforma-se também o sistema de mediações existente

entre a base material e sua superestrutura política e jurídica, com suas correspondentes

formas socias de consciência. Por isso, as proposições gerais da teoria social materialista,

concernentes às relações entre economia e política ou economia e ideologia, ou conceitos

gerais como classes e luta de classes, ... têm um significado diferente para cada época específica,

e, na forma específica em que foram enunciadas por Marx em relação à atual sociedadeburguesa, estas proposições são válidas a rigor somente para esta sociedade... Apenas para aaul sociedade burguesa, na qual as esferas da economia e da política estão formalmente etotalmente separadas uma da outra e onde os trabalhadores, na qualidade de cidadãos, são

e iguais quanto a seus direitos, a demonstração científica de sua efetiva e contínua

23Paralelamente às referências à versåo manuscrita do livro de Korsch — que foi o texto utilizado por

Benjamin indicam-se aqui as citaçóes da ediçåo em livro: Karl Korsch, Karl Marx. ed. org. por GOtz

Langkau, Frankfurt a. M. - Viena, 1967, p. 74. (R.T.)24

Korsch, 1967, pp. 128-129. A obra de Hegel citada por Korsch é Vorlesungen Ober Philosophe

Geschichte (Introduçåo geral, 2, 1, a). (R.T.; UM)25op. cit.. p. 160. (R.T.)

526 Passagens

falta de liberdade na esfera 26

económica tem 0 caráter de uma descoberta teórica"

op. cit., vol. III, p. 21-22.

Korsch faz a "constatação aparentemente paradoxal, mas pertinente para a última e mais

madura forma da ciência marxista, de que na teoria social materialista de Marx aquele todo

das relações sociais, que é tratado pelos sociólogos burgueses como um domínio de pesquisas

independente, ... já é tratado pela ciência histórica e social da economia segundo seu

conteúdo objetivo... Nesse sentido, a ciência social materialista de Marx não é sociologi4 e sim

economia." Korsch, op. cit., vol. III, p. 103 27

Uma citação de Marx sobre a mutabilidade da natureza (em Korsch, op. cit., vol. III, p. 9):

"Mesmo as diferenças naturais das espécies, "28

como as diferenças de raça etc., ... podem e

devem ser abolidas no processo histórico.[N 16a, 31

Teoria da superestrutura segundo Korsch: "Para a determinação do tipo particular de conexões

e relações que existem entre a 'base' económica e a 'superestrutura' jurídica e política, com

as 'correspondentes' formas de consciência, não bastam, nesta forma geral, nem a definição

filosófica de causalidade 'dialética', nem a 'causalidade' científica completada por 'interaçóes'.

A ciência natural do século XX aprendeu que as relações 'causais' a serem definidas por um

pesquisador em sua área específica, não podem absolutamente ser definidas na forma de

um conceito geral ou de uma lei geral de causalidade, mas devem ser determinadas

especificamente' para cada área particular. * [* Cf. Philipp Frank, Das Kausalgesez und seine

Grenzen, Viena, 19321... A maior parte dos resultados a que chegaram Marx e Engels não

consiste nas formulações teóricas do novo princípio, e sim em sua utilização específica em

uma série de questões, ora de importância prática fundamental, ora de natureza teóricaextremamente difícil. * [* Situam-se aqui as questões levantadas ao final da 'Introdução'<para os de 1857, pp. 779 et seq., relativas ao 'desenvolvimento desigual' dosdiferentes âmbitos da vida social: desenvolvimento desigual da produção material em relaçãoà produção artística (e das diversas formas de arte entre si), diferença entre as condiçõesculturais nos Estados Unidos e na Europa, desenvolvimento desigual das relações de produçãoenquanto relações de direito etc.] A determinação científica exata das conexões aqui citadasé ainda hoje uma tarefa para o futuro..., tarefa cujo centro de gravidade não deve se situarna formulação teórica, e sim na constante aplicação e experimentação dos princípios implícitosna obra de Marx. Nisso, não se deve, de forma alguma, tomar ao pé da letra as expressõesmuitas vezes empregadas em sentido figurado, com as quais Marx descreveu as conexõesespeciais aqui existentes como uma relação de 'base' e 'superestrutura', como'correspondências' etc. ... Em todos estes casos, os conceitos de Marx, tal como, entre osmarxistas posteriores, o entenderam de maneira mais clara Sorel e Lenin, não são tomadoscomo novos entraves dogmáticos: não como condições estabelecidas a priori para seremaplicadas por uma pesquisa verdadeiramente materialista, segundo uma ordem determinada'

26op. cit., p. 139. (R.T.)27 op. cit., pp. 128-129. (R.T.)28Op. cit., p. 133. Korsch cita de Marx e Engels, Gesamtausgabe (Berlim, 1927-1930), vol. l. parte

p. 403. (R.T.; UM)

(Teoria do Conhecirnento, Teoria do Progres•ol 527

inteiramente náo-dogmático para a pesquisa e para a açáo." Korsch,

como %ito), vol. III, pp. 93-96.29

e sio n (man 171M

-o materialista da história e filosofia materialista: "As fórmulas da concepção

da história aplicadas por Marx e Engels ... apenas ... à análise da sociedade

Úanspostas para outras épocas históricas apenas com a devida modificação —

e. culadas pelos epígonos de Marx desta aplicação específica, e aliás, de qualquer

foo histórica,

ge

e

ral.

o assim

A partir

chamado

deste ...

'materialismo

nivelamento

histórico'

... da teoria

foi transformado

social materialista

em uma

eraaplicaçaosociológica teoriaum para se chegar à idéia - defendida ainda hoje ou justamente hoje - de que

apenas .o alicerçar a ciência histórica e económica de Marx não apenas com uma filosofia

é necessán mas até mesmO com uma visão de mundo universal materialista que abrange a

da natureza e da sociedade. ou, retomando uma expressão de Marx, de reduzir

formas científicas nas quais se havia desenvolvido 0 conteúdo verdadeiro do materialismo

do século XVIII, novamente 'às frases filosóficas dos materialistas sobre a matéria'.

A ciênciasocial materialista

. alcançado

... não

por Marx

necessita

escapou

... de

em

tal fundamento

seguida também

filosófico.

a seus

Este

intérpretes

progresso

...

mais importante

Com isso, reintroduziram seu próprio atraso filosófico na teoria de Marx, que'ortodoxos'...

•ra, transformando-se conscientemente de filosofia em ciência. O destino histórico

da ortodoxia marxista aparece assim, de forma quase grotesca: ao defender-se dos ataques

revisionistas, ela acaba por chegar, em todas as questões capitais, ao mesmo ponto de vista

dos adversários... Quando, por exemplo, Plekhanov, o principal representante desta

tendência, ..., em sua obstinada da 'filosofia' que subjaz ao marxismo, acaboubusca

apresentando o marxismo como 'uma forma de spinozismo, libertado por Feuerbach de

seus componentes teológicos'." Korsch, op. cit., vol. III, pp. 29-31.30[N 17a)

Korsch cita o Novum Organum de Bacon: "'Recte enim veritas temporis filia dicitur non

auctoritas.' Ele Rindou sobre esta autoridade de todas as autoridades, o tempo, a superioridade

da nova ciência empírica burguesa face à ciência dogmática da Idade Média." Korsch, op.

cit., vol. I, p. 72. 31

IN 18, 1)

"Para o uso positivo, Marx substitui o postulado exagerado de Hegel, segundo o qual averdade deve ser concreta, pelo princípio racional da especificação... O verdadeiro interesseencontra-se ... nos traços específicos através dos quais cada sociedade histórica determinadadiferencia-se das características comuns a cada sociedade em geral, e nos quais, portanto,consiste o seu desenvolvimento... Assim, uma ciência social rigorosa não pode

forma

formar

histórica

seusconceitos gerais pela simples abstraçäo de algumas características de uma dada da sociedade burguesa e a conservação de outras, escolhidas de modo mais ou menosarbitrário. Ela pode atingir o conhecimento do universal contido nesta forma social particular

29

OP• cit.. pp. 199-202. Korsch refere-se ao prefácio de Marx à Kritik der politischen Ôkonomie (1859).

Op. cit., pp. 145-146. Korsch cita frases de Marx e Engels, Die deutsche Ideologie (1845-1846) e deGeorge Plekhanov, Fundamental Problems of Marxism (1908). (R.T.; EM)

Op• cit. P. 54. Traduçåo da citaçåo de Bacon: "Pois é correto dizer que a verdade é filha do tempo. nåoda autoridade." (R.T.; w.b.)

528 • Pø•s.gen•

apenas por meio do estudo minucioso de todas as condições históricas de seu surgimentoa partir de um outro estágio da sociedade, e das modificações de sua forma presente sobcondições rigorosamente estabelecidas... As únicas leis autênticas na ciência social sãoportanto, as leis do desenvolvimento." Korsch, op. cit., pp. 49-52.32

(N 18,21

O conceito autêntico da história universal é um conceito messiânico, A história universal,como compreendida hoje, é um assunto de obscurantistas.

[N 18,31

O agora da cognoscibilidade é o momento do despertar. (Jung quer manter o despertarlonge do sonho.)

(N 18, 41

Sainte-Beuve, em sua caracterização de Leopardi, declara-se "persuadido de ... que a críticaliterária só alcança todo o seu valor e originalidade quando se dedica a temas dos quaisdominamos, há muito tempo, o contexto e todas as circunstâncias". C. A. Sainte-Beuve,Portraits Contemporains, vol. IV, Paris, 1882, p. 365. Em contrapartida, é preciso reconhecer

que a ausência de certas condições exigidas por ele pode ter seu valor. A incapacidade desentir as nuances mais sutis do texto pode levar o observador a pesquisar com maior atençãoos mínimos detalhes nas relações sociais, que subjazem à obra de arte. Ademais, aquele que

não tem uma sensibilidade para as gradações mais sutis pode adquirir, através de umapercepção mais clara dos contornos do poema, uma certa superioridade em relação a outros

críticos, uma vez que o sentido para nuances nem sempre acompanha o dom da análise.[N 18a, 11

Observações críticas sobre o progresso técnico aparecem bem cedo. O autor do tratado Da

Arte (Hipócrates?): "Penso que o desejo ... da inteligência é descobrir algumas das coisasque são ainda desconhecidas, sefor melhor descobri-las do que mio tê-las descoberto." Leonardo

da Vinci: "Como e por que não escrevo sobre meu método de permanecer embaixo d'água

por tanto tempo quanto é possível ficar sem comer: se não o publico nem o divulgo, é em

razão da maldade dos homens que se serviriam dele para assassinar no fundo dos mares,abrindo os navios e submergindo-os com sua tripulação." Bacon: "Na ... Nova Atlântida,

. ele confia a uma comissão especialmente escolhida o cuidado de decidir quais das novas

invenções serão divulgadas e quais serão mantidas em segredo". Pierre-Maxime Schuhl,

Machinisme et Philosophie, Paris, 1938, pp. 7 e 35. — "Os aviões bombardeiros nos lembram

o que Leonardo da Vinci esperava do homem em vôo: que se elevasse 'para buscar a neve no

cume das montanhas e retornar espalhando-a sobre o pavimento escaldante da cidade, no

verão'. " Op. cit., p. 95.[N 18a, 21

Pode ser que a continuidade da tradição seja uma aparência. Mas então é a permanência

desta aparência de permanência que cria nela a continuidade.19, 11[N

Proust, a propósito de uma citação (de uma carta de Balzac a M. de Forgues) que

provavelmente tomara de empréstimo a Montesquiou, numa carta que ele lhe endereçou.

(A passagem parece conter um erro de sentido, devido à grafia ou à impressão.) "Já faz

32 op. cit., pp. 48-51 e 252. (R.T.)