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Livro reportagem apresentado ao curso de comunicação social – Jornalismo da Faculdade 2 de Julho como requisito a obtenção de grau de bacharel em comunicação social – Jornalismo. Orientação: Prof. Ms. Augusto Souza de Sá Oliveira.
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COMUNICAÇÃO SOCIAL - JORNALISMO
WASHINGTON FAGNER ABREU RAMOS AMORIM
ZILAH MOREIRA:
A correspondente do Estadão na Bahia durante a ditadura militar
SALVADOR
2011
WASHINGTON FAGNER ABREU RAMOS AMORIM
ZILAH MOREIRA:
A correspondente do Estadão na Bahia durante a ditadura militar
Livro reportagem apresentado ao curso de
comunicação social – Jornalismo da Faculdade 2 de
Julho como requisito a obtenção de grau de bacharel
em comunicação social – Jornalismo.
Orientação: Prof. Ms. Augusto Souza de Sá Oliveira.
SALVADOR
2011
Dedico esta obra a todos os estudantes de
jornalismo e a todos aqueles que são apaixonados
por essa profissão.
“Porque o jornalismo é uma paixão insaciável que só
se pode digerir e humanizar mediante a
confrontação descarnada com a realidade. Quem
não sofreu essa servidão que se alimenta dos
imprevistos da vida, não pode imaginá-la. Quem não
viveu a palpitação sobrenatural da notícia, o
orgasmo do furo, a demolição moral do fracasso,
não pode sequer conceber o que são. Ninguém que
não tenha nascido para isso e esteja disposto a viver
só para isso poderia persistir numa profissão tão
incompreensível e voraz, cuja obra termina depois
de cada notícia, como se fora para sempre, mas que
não concede um instante de paz enquanto não torna
a começar com mais ardor do que nunca no minuto
seguinte."
Gabriel Garcia Marquez, escritor e jornalista.
“Não é fácil escrever sobre a vida de outra pessoa.
Querendo ou não alguma fase não será contada,
algo não ficará bem explicado. É impossível
escrever sobre uma vida fielmente. Para escrever
uma biografia é necessário se ter admiração pela
pessoa escolhida e pelo tipo de escrita”
Sérgio Mello, jornalista.
Agradecimentos
A realização deste livro começou a ser pensada em 2009, ainda no quarto semestre
do curso de Comunicação Social, com Bacharelado em Jornalismo, da Faculdade 2
de Julho, graças ao apoio da professora Tania Motta que me estimulou a escrever e
a fazer uma homenagem a esta importante mulher, Zilah Moreira.
Começo os meus agradecimentos primeiramente a Deus depois a minha mãe,
Zuleide Abreu Ramos, que sempre esteve ao meu lado em todas as decisões
tomadas por mim e que é mãe, pai e grande amiga. Agradeço ainda as minhas tias e
tios que tiveram participação ativa no meu crescimento acadêmico, Dora, Zute,
Aderlinda (in memorian), Vilma, Vera, Hermenito e a todos outros que mesmo
estando longe torceram por mim. Eu não posso esquecer os meus primos Cléo e
Zezute, que me acolheram e me apoiaram enquanto completava os meus estudos
em Salvador, e os meus primos que moram na Suiça, Kurth e Renato, que foram os
primeiros responsáveis para que eu pudesse entrar na vida acadêmica. A todos os
quase incontáveis primos que existem em minha família que, direta ou
indiretamente, tem forte participação nesta minha caminhada. Nesta lista não pode
faltar ainda as minhas avós Ligia e Zizi e os meu avô Agnaldo. Tiãozinho (in
memorian) avô materno que, mesmo não vendo a realização deste trabalho sempre
confiou e acreditou em mim. Você, minha irmã Kleisla, por existir em minha vida e
pelo eterno apoio. Aos amigos de São Paulo, Dick, Leila, Keiko, Thiago e Toninho
que me receberam e me acolheram tão bem na capital paulista enquanto estive
fazendo as minhas pesquisas, e também ao meu melhor amigo, Pablo Magalhães,
pelos momentos que passamos juntos. Agradeço ainda a todo o corpo docente da
Faculdade 2 de Julho sem o qual não conseguiria concluir a minha graduação, em
especial os professores: Verbena Córdula, Tania Motta, Derval Gramacho, Daniela
Souza e Cristina Mascarenhas. Agradeço ainda ao meu professor orientador,
Augusto Sá, que aceitou comigo encarar este desafio e que com suas sábias
palavras, paciência e compreensão tornou possível também a realização deste
trabalho. Agradeço ainda a todos os entrevistados que me ajudaram a saber mais
sobre Zilah Moreira; a todos colegas que estiveram comigo nesta empreitada e a
Zilah Moreira, jornalista que sou fã, que teve uma passagem rápida em minha vida,
mas mesmo assim, com bondade e gratidão, me ensinou a arte de fazer jornalismo.
Sumário
1. Apresentação 06
2. De A Província de S. Paulo ao Golpe Civil-Militar de 1964 09
O Estado de S. Paulo e o clã Mesquita 12
A postura do Jornal durante a República Velha 13
O Estadão e a Era Vargas 14
O Estadão e o interlúdio de 1945 17
O Estadão e a sua participação no Golpe Civil-Militar de 1964 19
3. Os primeiros passos de Zilá Moreira no jornalismo 21
O primeiro contato com o jornalismo e a revisora do jornal A Tarde 24
A correspondência cai no colo 25
A convivência no Jornal da Bahia 27
4. Zilah Moreira a frente do Estadão na Bahia 30
Os embates com Antonio Carlos Magalhães 33
A cobertura da morte de Carlos Marighella e Carlos Lamarca 46
A saída das ruas e a chefia administrativa 53
5. Considerações Finais 57
6. Apêndice 58
A: Entrevista com Carlos Navarro 58
B: Entrevista com Cleonfe Martins 63
7. Anexos 66
8. Créditos das Imagens 76
9. Siglas 78
10. Fontes Primárias 79
11. Referências 80
Apresentação
A história que você vai ler agora é um perfil biográfico de uma das baianas mais
corajosas: a correspondente na Bahia de um dos mais importantes jornais
brasileiros, O Estado de S. Paulo. Uma história que fascina e ao mesmo tempo
instiga os que conviveram, e mesmo os que não conviveram, com ela. Estou falando
da jornalista Zilah Laura da Silva Moreira, ou melhor, “Zilah Moreira, a
correspondente do Estadão, na Bahia, durante a Ditadura Militar.”
Quando comecei os trabalhos de pesquisa, em 2009, sobre a trajetória de Zilah
Moreira no jornalismo percebi que a tarefa iria ser árdua e cansativa. As dificuldades
para compor o retrato da jornalista foram inúmeros. Primeiro: só encontrei um
trabalho acadêmico sobre Zilah, seja na internet ou mesmo em livro, que abordasse
a atuação dela no jornalismo. Segundo: Algumas fontes entrevistadas que
conviveram com Zilah Moreira sabiam apenas o que ela contou enquanto esteve à
frente do Estadão na Bahia. Terceiro: não existiam exemplares do Estadão durante
a ditadura militar nas bibliotecas públicas e particulares de Salvador. Assim, eu tive
que me deslocar até o Arquivo Público de São Paulo, na capital paulista, para
conseguir os exemplares digitalizados do periódico. E quarto: as reportagens não
eram assinadas pelos jornalistas.
Mas este trabalho árduo não me impediu de conseguir o meu objetivo de fazer uma
homenagem a esta mulher que deixou um legado importantíssimo para o jornalismo
baiano. Ela, sem sombra de dúvida, foi a primeira repórter da Bahia e abriu portas
para que as mulheres de hoje conseguissem seu espaço na profissão.
Para a produção deste trabalho, foi necessário uma revisão bibliográfica para
compreender o contexto sócio histórico do Brasil, o papel desempenhado pelo
Estadão no período e a contribuição de Zilah Moreira. O trabalho contou também
com entrevistas presenciais e por e-mail com jornalistas e amigos que conviveram
com ela.
No primeiro capítulo, pode-se observar o nascimento do jornal, durante o Segundo
Império, que era denominado A Província de S. Paulo e o apoio do periódico à
Proclamação da República, em 1889. Em seguida, a mudança de nome para O
Estado de S. Paulo e o rompimento com o governo dos marechais. Um breve relato
sobre a participação do jornal na Revolução de 30 e o posicionamento contrário ao
primeiro governo de Getúlio Vargas, que resultou na prisão, exílio e, mais tarde,
anistia dos proprietários do jornal, Júlio de Mesquita Filho e Ruy Mesquita, também
pode ser conferido. O interlúdio de 1945, a posição do jornal no segundo governo
Vargas, a oposição à posse do presidente João Goulart e, em seguida, o apoio a
sua deposição, que resultou no apoio ao Golpe Civil-Militar de 1964 também são
tratados neste capítulo.
No capítulo dois, Zilah Moreira é retratada: a sua família, a infância, o período
escolar, a adolescência, a ida para o Rio de Janeiro, a graduação em direito e os
primeiros contatos com o jornalismo. Este capítulo mostra todo o processo que Zilah
percorreu até assumir o posto de correspondente do O Estado de S. Paulo.
O terceiro capítulo retrata as atuações de Zilah Moreira durante o tempo em que
esteve à frente do Estadão na Bahia. Demonstra-se a versatilidade da jornalista em
fazer reportagens de diversas editorias; a cobertura da morte dos dois principais
líderes da luta armada contra a Ditadura Militar, Carlos Marighella e Carlos Lamarca,
além da morte da esposa de Lamarca, Iara Iavelberg; os inúmeros embates com o
prefeito e mais tarde governador da Bahia, Antonio Carlos Magalhães; a fundação
da sucursal do Estadão na Bahia sob chefia de Zilah Moreira; a aposentadoria e os
seus feitos nessa nova fase da vida; finalmente o seu falecimento.
Nas considerações, o meu ponto de vista sobre a importância da atuação de Zilah
Moreira no jornalismo baiano, ficando sua vida e obra passíveis de outras
interpretações.
Neste trabalho consta ainda os apêndices com entrevistas na íntegra com o
jornalista Carlos Navarro e com a escritora e amiga de Zilah Moreira, Cleonfe
Martins. São entrevistas de grande importância para a compreensão da trajetória de
Zilah Moreira e, consequentemente, para a realização deste trabalho.
Nos anexos podem ser visualizadas as versões digitalizadas com reportagens
realizadas por Zilah Moreira enquanto era correspondente do Estadão; recortes com
reportagens importantes, extraídas do livro de José Maria Mayrink, Mordaça no
Estadão; e a repercussão na imprensa baiana da morte da jornalista.
Assim, esta obra que se apresenta sob o formato de TCC, Trabalho de Conclusão
de Curso, chega ao fim na expectativa de ter alcançado seu objetivo em mostrar aos
estudantes de jornalismo e o público em geral a importância de Zilah Moreira no
cenário jornalístico baiano e nacional.
O autor.
De a Província de S. Paulo ao Golpe Militar de 1964
jornal O Estado de S. Paulo nasceu em 4 de janeiro de 1875, ainda
durante o Segundo Império, com o nome A Província de S. Paulo. Durante
os períodos monárquicos, os atuais Estados eram denominados de
Províncias como, por exemplo, a Província da Baía de Todos os Santos (Bahia),
Província da Guanabara (Rio de Janeiro), Província de São Paulo (São Paulo), etc.
O jornal (Figura 1) foi fundado por 16 pessoas reunidas por Manoel Ferraz de
Campos Salles e Américo Brasiliense durante a Convenção Republicana de Itú
(COSTA, 2007, p. 481). A idéia era construir um diário republicano para combater a
monarquia e a escravidão. Além dos já citados fundadores do jornal, participaram
ainda os fazendeiros de café do Oeste Novo Paulista, Américo Basílio de Campos,
Antônio Carlos de Sales, Antonio Pompeu de Camargo, Bento Augusto de Almeida
Bicudo, Candido Vale, o major Diogo de Barros, Francisco Sales, Francisco Glicério
de Cerqueiro Leite, Francisco Rangel Pestana, João Francisco de Paula Sousa,
João Manuel de Almeida Barbosa, João Tibiriçá Piratininga, João Tobias de Aguiar e
Castro, José Alves de Cerqueira César, José de Vasconcelos de Almeida Prado,
José Pedroso de Morais Sales, Manuel Elpídio Pereira de Queirós, Martinho Prado
Júnior e Rafael Pais de Barros. A redação do Diário foi designada a Francisco
Rangel Pestana e Américo Brasílico de Campos.
De acordo com Boris Fausto (2007, p. 200-209), nesta época a cidade de São
Paulo vivia uma constante prosperidade. O café era o principal produto comercial do
estado. O enriquecimento provocado pelo produto e a chegada de estrangeiros
como italianos, portugueses, espanhóis, japoneses e árabes à província, além do
desenvolvimento de uma grande rede férrea, colocaram São Paulo como um dos
principais centros econômicos do país. A rede férrea promoveu uma maior
aceleração da província. Desde sua fundação, a ferrovia era uma grande
conseqüência do grande avanço da economia cafeeira. Fausto (2007, p. 200) afirma
que “a dificuldade maior consistia em atravessar a escarpa da Serra do Mar e
chegar ao litoral. Ela foi vencida com a construção da estrada de ferro de Santos a
O
Figura 1: Primeira capa do jornal A Província de S. Paulo
Jundiaí por uma companhia concessionária inglesa, a São Paulo Railway Co.
Limited, que começou a funcionar em 1868.” A função era escoar uma produção
crescente voltada para a exportação e conseqüentemente, o amadurecimento das
atividades industriais que alimentava o mercado interno.
Fernando Dannemann (2011) afirma que “o jornal defendeu desde o início os
interesses da elite agrária, combatendo a centralização política e administrativa
imposta pelo Poder Moderador ao longo do Império.” Eleições diretas para o Senado
e para a presidência das províncias, a separação entre a Igreja e o Estado, a
instituição do casamento e dos registros civis e a substituição progressiva da
escravidão pela liberdade, eram as reivindicações defendidas abertamente pelo
jornal. Reportando textos com críticas a política e a escravidão, Francisco Rangel
Pestana e Américo Campos colocam o diário em um patamar de grande jornal com
ideário republicano e abolicionista.
De acordo com João Alfredo Vidigal Pontes, em seu artigo “O Estado de S.
Paulo” (2011), o jornal se instalou inicialmente em um prédio na Rua do Palácio
(atual do Tesouro), número 14, onde permaneceu até abril de 1877. A redação,
administração e oficinas eram em uma mesma sala. A tiragem inicial era de 2.000
exemplares.
As características gráficas eram muito diferentes. Os jornais daquela época
pareciam grandes livros. Quando A Província de S. Paulo começou a circular a sua
diagramação era composta por cinco colunas largas, em quatro páginas. O logotipo
estava situado no topo do jornal, em letra de forma. Os títulos sempre em uma
coluna e o corpo (tamanho das letras) variava entre oito e dez.
Em janeiro de 1890, após a Proclamação da República, o jornal passa a ser
chamado O Estado de S. Paulo e atinge uma tiragem de oito mil exemplares. Em
1896, Euclides da Cunha, republicano, e que havia sido expulso do Exército
Monárquico, colabora com o jornal indo fazer a cobertura da Campanha de Canudos
(DA CUNHA, 2001). A transferência, ou melhor, a passagem do regime monárquico
– centralizador – para o republicano fez com que alguns projetos da sociedade
tomassem algumas projeções. De acordo com Benjamin Abdalla Junior e Isabel
Alexandre (1997), a Bahia foi um dos estados mais prejudicados com todas as
mudanças que aconteciam no país. Um lento desenvolvimento industrial, alto
crescimento populacional e uma estagnada base econômica eram um dos principais
motivos para revoltas. Os autores trazem também outra discussão que levou o
governo da Bahia a declarar guerra a Canudos: foi a força desestabilizadora na
composição de forças produtivas de uma área imensa, que se estendia não apenas
pelo sertão baiano, mas alcançava o sul de Sergipe. A mão-de-obra normalmente
resignada e dócil abandonava as fazendas dos proprietários rurais atraídas pelas
promessas de redenção espiritual emanadas por Antonio Conselheiro. Euclides da
Cunha, que cobriu toda a campanha de Canudos para o Estado de S. Paulo, no livro
Os Sertões faz um relato do final daquela campanha1. O jornal apresenta uma
tiragem neste momento recorde de 18 mil exemplares.
O Estado de S. Paulo e o clã Mesquita
O jovem redator Júlio de Mesquita, genro de José Álvares de Cerqueira
César, em 1902 se torna o único proprietário do impresso. O jornal, que já era o
maior do estado de São Paulo – superando de longe o Correio Paulistano2– passa a
acompanhar o crescimento e a modernização da capital paulista. Nesta época a
cidade atingia a marca de 250 mil habitantes, metade dos quais italianos. Dois anos
antes havia circulado o primeiro bonde elétrico e em 1901 inaugurada à primeira
usina hidrelétrica para fornecimento regular de luz e força para a cidade. Júlio DE
Mesquita rompe laços com o então presidente da República, Manuel Ferraz de
Campos Salles, e com o governador de São Paulo, Rodrigues Alves. Começava a
ser instalada então a primeira Dissidência Republicana. A dissidência, que era
1 Era incrível: numa cava quadrangular, de pouco de pouco mais de metro de fundo, ao lado da igreja nova, uns
vinte lutadores, esfomeados e rotos, medonhos de ver-se, predispunham-se a um suicídio formidável. Chamou-se aquilo o “Hospital de Sangue” dos jagunços. Era um túmulo. De feito, lá estavam, em maior número, os mortos, alguns de muitos dias já, enfileirados ao longo das quatro bordas da escavação e formando o quadrado assombroso dentro do qual uma dúzia de moribundos, vidas concentradas na última contração dos dedos nos gatilhos das espingardas, combatiam contra um exército. (DA CUNHA, Euclides. Os Sertões: Campanha de Canudos. 2. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001, p. 433). 2 O Correio Paulistano foi lançado em 26 de junho de 1854, em São Paulo, tendo como fundador o proprietário
da Tipografia Imparcial, Joaquim Roberto de Azevedo Marques e como primeiro redator Pedro Taques de Almeida Alvim. O jornal que nasceu liberal foi, posteriormente, atrelado ao Partido Conservador, do qual recebeu influências. Entretanto, após a criação do Partido Republicano Paulista (PRP), passou a ser seu órgão oficial. A oligarquia paulista, que dirigia o PRP, transmitia seus ideais através do jornal, que sofreu duramente com o resultado da revolução de 1930, a qual o PRP se opôs, o que fez com que o jornal perdesse espaço na imprensa política. O veículo foi contra o governo de Getúlio Vargas e o regime ditatorial do Estado Novo (1930-1945). O Correio Paulistano deixou de ser editado em meados do segundo semestre de 1963. (INSTITUTO DE ESTUDOS BRASILEIROS. Correio Paulistano. Disponível em: <<http://www.ieb.usp.br/topico.asp?categ=1&subcateg=2&topico=73>> Acessado em: 1 Mai. 2011).
integrada ainda por José Alves de Cerqueira Cesar e por Prudente de Moraes,
alegava que a “Política dos Governadores3” deixava os parlamentos estaduais e o
Congresso Nacional completamente dependente do Poder Executivo.
A postura do jornal durante a República Velha
Polêmico, Júlio de Mesquita começou a articulação para a candidatura do
baiano Rui Barbosa para a presidência da República em 1909, contra o militar,
Marechal Hermes da Fonseca. Iniciava aí a “Campanha Civilista” que O Estado de
S. Paulo vai dar todo apoio até 1930.
Com a morte de José Alves de Cerqueira César (ex – governador de São
Paulo), Júlio de Mesquita é escolhido para assumir a vaga deixada pelo sogro no
parlamento estadual.
Em 1914, com a proximidade da Primeira Guerra Mundial, Júlio de Mesquita
começa a escrever artigos contrários às Potências Centrais que eram integradas
pelos impérios alemão, austro-húngaro e turco-otomano, o que deixa a comunidade
germânica enfurecida retirando-lhe os anúncios do jornal. Mesmo com grandes
problemas financeiros, o proprietário mantém a sua postura, apoiando os aliados, o
que era coerente com a sua política civilista.
O diário, até então matutino, ganha uma versão vespertina em 1915.
Denominado Estadinho. O jornal era dirigido pelo seu filho, Julio de Mesquita Filho,
cuja edição circula até fevereiro de 1921. Neste mesmo ano, o escritor José Bento
de Monteiro Lobato passa a ser um dos articulistas do jornal com o artigo “Velha
Praga” (2007, p. 158), que na verdade era uma carta para seção “Queixas e
Reclamações”.
Com uma política contrária aos governos Federal e Estadual, o jornal de Júlio
Mesquita pela primeira vez, em 1924, é impedido de circular. Começa a primeira de
uma série de censuras que o jornal iria sofrer nos próximos governos. O motivo da
3 A mudança das relações entre o poder estatal e a classe operária é a condição do populismo; a perda do
comando político pelo centro dominante, associada à nova forma de Estado, possibilita, a longo prazo, o desenvolvimento industrial, no marco do compromisso como sustentáculo de um Estado que ganha a maior autonomia, em relação ao conjunto da sociedade. (FAUSTO, Boris. A Revolução de 1930: Historiografia e história. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 104).
censura foi o apoio do jornal ao levante comandado pelo general Isidoro Dias Lopes
que ocupou a capital paulista por 23 dias. Em 29 de julho deste mesmo ano Júlio de
Mesquita é preso. Os revoltosos do levante liderado pelo general Isidoro, mais tarde,
iriam se juntar as forças revolucionárias liderada pelo capitão Luis Carlos Prestes,
dando início a Coluna Prestes.
Em 1926, O Estado de S. Paulo apoiou a fundação, na capital paulista, do
Partido Democrático, de oposição ao Partido Republicano Paulista, então detentor
do governo estadual e federal.
Aos 65 anos falece o jornalista Júlio de Mesquita, em 15 de março de 1927. A
partir de então seus filhos, Júlio de Mesquita Filho e Francisco de Mesquita
assumem a liderança do jornal.
Figura 2: Júlio Mesquita e jornalistas na sede do O Estado de S. Paulo
O Estadão e a Era Vargas
Em 1930, O Estadão ligado ao Partido Democrático, apóia a Aliança Liberal e
conseqüentemente a candidatura do gaúcho Getúlio Vargas à presidência do Brasil,
em oposição ao candidato Júlio Prestes, que tinha apoio do presidente Washington
Luís. O candidato do presidente ganha às eleições. Mas, com a Revolução de 30
(FAUSTO, 1997, p. 34), Washington Luis é deposto da presidência e Getulio Vargas,
mesmo derrotado nas eleições, assume o comando do país.
Mas, vários são os motivos para a eclosão desta revolução que terminou com
a política dos Governadores, que davam aos estados de São Paulo e Minas Gerais
o direito de revezarem na presidência da República. De acordo com Boris Fausto
(1997), muitos foram os motivos para que houvesse a Revolução de 1930. No Brasil
da década de 20 não havia conjuntura revolucionária em que o proletariado tivesse a
iniciativa, não chegando à classe operária organizada a constituir um fator político
relevante (1997).
Fausto afirma ainda que entre 1889 e 1930 houve um surto imigratório para o
Centro-Sul do país devido ao grande desenvolvimento econômico regional, o que fez
com que crescesse também a classe média urbana, ganhando maior força e
conteúdo. Uma opinião pública vinculada a estes setores tomou forma o primeiro
contingente da classe média operária.
Neste mesmo ano, 1930, o jornal consegue uma tiragem recorde no país de
100 mil exemplares e lança aos domingos um suplemento de rotogravuras4, que
moderniza o jornal dando destaques as fotografias.
Em 1932, O Estadão e o Partido Democrático – inconformados com o
autoritarismo do presidente, Getúlio Vargas, e com o tratamento agressivo reservado
a São Paulo pelos tenentes – criam uma aliança que origina a Revolução
Constitucionalista de 32, que estoura em nove de julho. Francisco de Mesquita vai
para frente da batalha enquanto seu irmão, Julio de Mesquita Filho, permanece em
São Paulo, na liderança civil do movimento. A Revolução de 32 não foi exitosa, mas,
dois anos mais tarde, o que foi reinvidicado iria ser posto em prática. A Constituição.
Os dois irmãos, donos do jornal, foram presos e exilados em Lisboa.
No ano seguinte, Getulio Vargas convida Armando de Salles Oliveira, genro
de Julio de Mesquita, para ser o interventor5 federal em São Paulo. Para aceitar o
convite, Armando Salles impôs que os revoltosos de 32 fossem anistiados e
4 A rotogravura é um sistema de impressão direto, atuando geralmente, com máquinas rotativas com suportes
em bombinas. (...) A rotogravura é na opinião de muitos, o melhor meio de reprodução gráfica de originais em tom contínuo, em preto-e-branco e em cores. (BAER, Lorenzo. Produção gráfica. 6 ed. São Paulo: Senac São Paulo, 2005, p. 198-200). 5 Em São Paulo, liquidada a “guerra paulista”, Getúlio fizera um gesto conciliatório nomeando Armando de
Salles Oliveira para a interventoria. Este seria eleito governador pela Assembléia Legislativa, afastando-se do cargo em 1937 para disputar a Presidência da República. (FAUSTO, Bóris. Getúlio Vargas: o poder e o sorriso. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 138).
voltassem ao país, incluindo Júlio de Mesquita Filho e Francisco Mesquita, e a
convocação de uma Assembléia Constituinte.
O jornal ainda foi um dos responsáveis pela criação da USP, Universidade de
São Paulo. No dia 25 de janeiro, ainda como interventor federal, Armando de Salles
Oliveira baixa o decreto 6283/34 criando a USP. Assim, concretiza uma idéia de Júlio
de Mesquita Filho. De acordo com Shozo Motoyama (2006) tanto o Grupo Estado
quanto a ABE, Associação Brasileira de Educação, estavam empenhados em
levantar esta bandeira. Criar uma universidade no seu sentido integral, com a
finalidade de formar uma mística comum para enfrentar de forma articulada os
desafios existentes em benefício de todos. E foi o próprio Júlio de Mesquita Filho
quem se incumbiu de convidar professores franceses, italianos e alemães para a
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, com o auxílio dos professores George
Dumas e Theodoro Ramos.
Com a eclosão do “Estado Novo”, em 10 de novembro de 1937, golpe em que
Vargas permanece no poder e dá início uma ditadura, o jornal mantém oposição ao
regime. Tudo o que havia sido estipulado na Assembléia Constituinte de 1934 foi
completamente ignorado. De acordo com Boris Fausto, Armando Salles, interventor
de São Paulo, era candidato a presidência da república pela União Democrática
Brasileira, partido formado pelos constitucionalistas. Salles havia alertado aos chefes
militares que um golpe de Estado, comandado por Vargas, estava prestes a
acontecer, e já tinha data marcada: 15 de novembro de 1937.
Mas Vargas antecipou o ato, dissolveu o Congresso e uma nova Constituição,
a quarta do país, foi imposta. Nascia assim a “Ditadura Vargas”.
Julio de Mesquita Filho e Armando Salles foram presos e em seguida
expatriados para a França (Figura 3). Mesmo longe, o herdeiro do clã Mesquita
comandava o maior jornal do país. As críticas ao Governo Federal continuaram.
No dia 25 de março de 1940, tropas do DOPS, Departamento de Ordem
Política e Social, invadiram6 a redação do O Estado de S. Paulo. Armas foram
colocadas no forro do prédio pela própria polícia política para forjar as provas. Quem
6 A imprensa censurada promovia também os feitos governamentais. As vozes opositoras foram abafadas, como
aconteceu com o jornal O Estado de S. Paulo, de propriedade da família Mesquita, cuja sede foi invadida pela polícia em março de 1940, permanecendo o jornal sob intervenção até o fim do Estado Novo. (op. cit., p. 125).
estava à frente do jornal era o irmão de Júlio de Mesquita Filho, Francisco Mesquita,
que foi preso por 40 dias no Rio de Janeiro. Sem provas, Francisco é solto, porém,
impedido de reassumir suas funções no jornal.
O Estadão então foi confiscado pela ditadura passando a ser administrado
pelo DIP, Departamento de Imprensa e Propaganda, até 19457. Com a deposição do
presidente Vargas neste mesmo ano, Julio de Mesquita Filho que já havia voltado do
exílio em 1943, assume o jornal novamente.
Figura 3: Júlio de Mesquita Filho embarcando para o segundo exílio
O Estadão e o interlúdio de 1945
Logo após a deposição do presidente Vargas e a volta do jornal O Estado de
S. Paulo aos seus proprietários de fato, o jornal recuperava assim o espírito crítico e
independente que o caracterizava desde a sua fundação (PONTES, 2011).
Pontes afirma em seu artigo que o jornal teve um progresso significativo,
recuperando o prestígio nacional. O Estadão abriu uma editoria internacional
comandada pelo jornalista Giannino Carta (FERREIRA JUNIOR, 2002, p. 69) e por
Ruy Mesquita que passou a ser a mais completa do jornalismo brasileiro. Em março
de 1951 é iniciada a construção da nova sede: na rua Major Quedinho e é
inaugurada em 31 de dezembro do mesmo ano.
Getulio Vargas é eleito presidente do Brasil, como candidato do PTB, Partido
Trabalhista Brasileiro, no dia 3 de outubro de 1950. Ele derrotou o candidato da
7 As tiragens do jornal publicadas durante este período não são conhecidas.
UDN, União Democrática Nacional, Eduardo Gomes, que tinha se candidatado pela
segunda vez.
Vargas administrou o país de 1951 a 1954. Fez modificações importantes
para sociedade e a economia. De acordo com Fausto Saretta (2011) a política
econômica adotada pelo presidente durante os quase quatro anos de mandato,
proporcionou repercussões positivas para o surto de desenvolvimento nos anos
seguintes.
Mas, o presidente Getulio Vargas era um desafeto político do jornal O Estado
de S. Paulo, tendo em vista as inúmeras invasões da redação pelo DOPS, o exílio e
a prisão dos donos do jornal. Assim, a postura do jornal, a linha editorial foi de
oposição ao governo do presidente Vargas.
“O Estado” era a favor de uma política que levasse a industrialização do país,
o liberalismo econômico. Já a política do presidente Vargas era nacionalista, de uma
maior valorização do capital interno. No editorial de 08 de setembro de 1951
(SARETTA, p. 8) é perceptível a visão do jornal em relação à política econômica do
Governo Federal. “(...) nossa política comercial foi até agora prejudicada tanto pela
ausência, em muitos casos, de uma suficiente proteção alfandegária à nossa
crescente indústria, como pelo desconhecimento demonstrado em várias ocasiões
pelos órgãos federais acerca do desenvolvimento do parque industrial paulista.
Mas, ao mesmo tempo em que o jornal atacava os aspectos políticos e
administrativos do governo Vargas, o jornal também defendia os esforços do
governo na diversificação industrial, que começou a ser praticada no início de 1953.
Com a inflação crescente, a queda na exportação de café, os múltiplos
reclames da indústria e as altas taxas de cambio (SARETTA, 2011) o jornal passou a
expor ainda mais a insatisfação com o governo Vargas e propor a renuncia do
presidente.
Após o suicídio do presidente Vargas, o jornal publicou editorial intitulado
“Desfecho Trágico” onde afirmava que, aquele veículo, não poupava críticas ao
governo.
O Estadão e a sua participação no Golpe Civil-Militar de 1964
É importante ressaltar que o jornal O Estado de S. Paulo participou de
embates importantes da vida nacional, como foi relatado aqui. Desde a sua
fundação, no final do século XIX quando lutou pela queda da monarquia; início do
século XX, quando instalou a Dissidência Republicana que era contra o governo dos
marechais; o apoio aos aliados na Primeira Grande Guerra; as constantes críticas
aos coronéis da República Velha; o apoio e logo após oposição a “Era Vargas”; o
embate com o presidente Getúlio Vargas em seu segundo mandato.
Agora mais uma vez, o jornal também participa de mais um embate político.
Desta vez, apoiou a derrubada do governo Goulart e através do Golpe Civil-Militar8,
de 1964, nomenclatura que é defendida pelo general do Exército, Sylvio Frota, em
seu livro, Ideais Traídos.
Como já foi dito antes, O Estado de S. Paulo alinhou-se a UDN e fez oposição
a todos os governos. Mas um foi especial: o governo João Goulart. Vale destacar
alguns aspectos: primeiro a forte ligação com o ex-presidente Getúlio Vargas; a sua
relação com os sindicatos; o crescimento do PTB; e a presença de Jango, como fora
apelidado, nos governos constituídos – como ministro de Vargas, vice-presidente de
Juscelino Kubitschek e vice-presidente eleito de Jânio Quadros (BIROLLI, 2006)
Após a renúncia do presidente Jânio Quadros, em 25 de agosto de 1961, a
imprensa defendeu a posse de João Goulart. Jornais como, Correio da Manhã,
Jornal do Brasil, Última Hora, Correio Braziliense foram os que apoiaram o
presidente na sua ascensão a presidência. Já, O Estado de S. Paulo se opôs a
posse9.
As políticas aplicadas durante o governo Jango eram severamente criticadas
pelo jornal, assim como acontecia com o Governo Vargas. Uma industrialização
tardia, os modelos agrário-exportadores, fortalecimento operário e ampla
8 Sobrevêm, então, o Golpe Militar de 1964, que na verdade jamais foi uma Revolução, podendo ser
considerado, no máximo de condescendência, uma contra-revolução, porquanto revolução era a que, naqueles aflitivos momentos, planejadas solertemente pelos marxistas, pendia sobre a Democracia, como a espada de Dâmocles. (FROTA, Sylvio. Ideais traídos. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006, p. 72-73). 9ABREU, Alzira Alves. A imprensa e seu papel na queda de João Goulart. Disponível em:
<<http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/NaPresidenciaRepublica/A_imprensa_e_seu_papel_na_queda_de_Goulart>> Acessado em: 28. abr. 2011.
mobilização política das massas populares foram algumas das reportagens
enfatizadas pelo jornal10 e que contribui para o que viria acontecer no dia 31 de abril
de 1964.
É a historia da primeira repórter baiana, que foi correspondente deste jornal,
em Salvador, durante a Ditadura Militar, que foi responsável pela abertura da
primeira sucursal do Estadão na Bahia, e abriu as portas para que outras mulheres
ingressassem nesta profissão, Zilah Moreira, que será contada nos próximos
capítulos.
10
Embora fossem os militares os que haviam interferido para salvar o Brasil da “corrupção” e do “comunismo”, civis havia (sic) que acreditaram serem eles os vencedores. Tais eram os jornais antigetulistas civís de idéias neoliberais e eram dirigidos por conservadores como, Bilac Pinto, e homens públicos como Júlio de Mesquita Filho, proprietário de O Estado de S. Paulo. (SKIDMORE, Thomas. Brasil: Getulio Vargas a Castelo Branco. 14. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982, p. 368).
Os primeiros passos de Zilah Moreira no jornalismo
ais que gordinha, cabo verde, cabelos escuros, lisos, de comprimento
médios, pinta no queixo, olhos inteligentes e bondosos. Esta é Zilah
Laura da Silva Moreira (Figura 4), filha do juiz Eitel Moreira e da
professora Laura da Silva Moreira que abandonou a sala de aula para cuidar dela e
dos seus quatro irmãos, Hebert Moreira, Jeferson Moreira, Eitel Moreira Filho e
Roschild Moreira, todos jornalistas, sendo último correspondente do jornal O Estado
de S. Paulo, posto que ela ocuparia com o falecimento de seu irmão.
Era bisneta de Joaquim Castro, negro, comerciante casado com Jovina
Castro, branca, analfabeta, filha de português rico que empobreceu e não permitia
que as filhas aprendessem a ler para não receber e nem escrever cartas para os
namorados.
A jornalista Lídia Silva lembra o que Zilah Moreira disse certa vez a ela: “ela
falou que seu bisavô foi para a Guerra do Paraguai deixando a bisavó grávida e
depois de cinco anos retornou”. Lidia Silva diz ainda que a avó da jornalista não
seguiu os passos da mãe se formando professora porque dona Jovina não queria
que ela fosse analfabeta, como ela. A avó se casou com um professor e com ele
teve cinco filhos, um deles seu pai, “um negro respeitado por todos e que nunca
sofreu discriminação”, disse Zilah Moreira à jornalista. Mais tarde seu pai, Eitel
Moreira, viria a ser um juiz.
Zilah Moreira nasceu em sete de maio de 1922, ano famoso pela Semana de
Arte Moderna11, também chamada de Semana de 22. O episódio representou uma
verdadeira renovação de linguagem, passando da arte de Vanguarda para a arte
Modernista. Neste período, mulheres como Tarsila do Amaral, entre outras,
quebraram paradigmas e suscitaram a independência feminina na arte, no caso
11
Seu objetivo: derrubada de todos os cânones que até então legitimavam entre nós a criação artística. Este objetivo destrutivo, claramente enunciado, traria, como mais tarde Mário de Andrade diria, o direito permanente à pesquisa estética, a atualização da inteligência artística brasileira e a estabilização de uma consciência criadora nacional. (AMARAL, Aracy. Artes Plásticas na Semana de 22. 5. ed. revista e ampliada. São Paulo: Editora 34, 1998. p. 13)
M
Figura 4: Zilah Moreira, arquivo da família
dela, a pintura. Assim, muitas outras mulheres começaram a fazer parte de quadros
profissionais até então dominados por homens.
Pode-se dizer então que não existiu período melhor para o nascimento de
Zilah Moreira que, assim como Tarsila do Amaral revolucionou o país com a sua
arte. Zilah Moreira, na Bahia, iria também mudar uma profissão dominada pelos
homens.
Feliz, livre, debochada, assim era Zilah Moreira, uma mulher a frente do seu
tempo. Uma criatura que “se não existisse teria que ser inventada”. Estudou no
Ginásio da Bahia, atual Colégio Central da Bahia, na Avenida Joana Angélica, bairro
de Nazaré. Ela foi contemporânea, no ginásio, dos ex – governadores Antonio
Carlos Magalhães – figura que transformaria a carreira de Zilah Moreira no
jornalismo – e Waldir Pires e do desembargador Manoel Pereira.
Na escola não era das melhores estudantes. De acordo com a jornalista Lídia
Silva, o que Zilah gostava mesmo era de jogar futebol com os garotos, o que
acarretava, consequentemente, em problemas no ano letivo. Mas todos os garotos a
respeitavam.
Saiu do ginásio para tentar o vestibular no curso de direito da Faculdade de
Direito da Bahia, atual Universidade Federal da Bahia. Ela queria ser advogada igual
ao pai, que mais tarde viria a ser juiz. Mas, ela não conseguiu atingir o índice e
perdeu a vaga.
Logo depois, o jornalista Ernesto Simões Filho, dono do jornal A Tarde12,
convidou a jovem para ir para o Rio de Janeiro e ser revisora de A Tarde na sucursal
de lá. E assim Zilah começou os seus passos para encontrar no jornalismo a sua
verdadeira inspiração. No Rio, ela fez vestibular para direito e foi estudar ficando
cinco anos longe da Bahia.
12
O aparecimento, em 1912, de A Tarde, órgão independente de propriedade e direção de Ernesto Simões Filho, tendo na redação Ranulfo Oliveira, hoje seu diretor, marca, sensacionalmente, a estréia, na Bahia, da imprensa moderna pelo modelo de A Noite, que Irineu Marinho criara, com êxito na capital do país. (DE CARVALHO FILHO, Aloysio. Jornalismo na Bahia: 1875-1960. In: TAVARES, Luis Guilherme Pontes (Org.). Apontamentos para a história da imprensa na Bahia. – 2 ed. revista e ampliada – Salvador: Academia de Letras da Bahia, 2008, p. 93- 94).
O primeiro contato com o jornalismo e a revisora do A Tarde
O irmão de Zilah Moreira, Roschild Moreira, fora por muito tempo repórter do
jornal A Tarde. Foi correspondente também, na Bahia, dos jornais Última Hora,
Gazeta Esportiva, Jornal da Tarde e, por último, de O Estado de S. Paulo. Com a
ajuda de seu irmão, Zilah Moreira foi ser revisora do jornal de Ernesto Simões Filho,
no Rio de Janeiro. Antes da informatização das redações, o revisor13 era visto como
elemento de grande importância. Era dele a responsabilidade pelos erros publicados
e pela uniformização dos textos de um veículo. Assim, os repórteres iam para as
ruas, colhiam as informações, voltavam para redação e faziam o texto. A reportagem
era encaminhada para o revisor, que fazia a correção ortográfica, de concordâncias
e adaptava o texto para uma melhor leitura. Em seguida, o texto era encaminhado
para o editor-chefe que liberava a reportagem. E esta era a função de Zilah Moreira
enquanto esteve no jornalismo de A Tarde.
No Rio de Janeiro, ela se dedicou ao vestibular para o curso de direito, na
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Enquanto esteve no Rio, Zilah conciliava a
profissão de revisora com os estudos. Passados cinco anos, a então advogada Zilah
Moreira, volta para Salvador e continua sendo revisora do jornal A Tarde.
Naquela época, mulheres nas redações eram muito poucas: “Não tinha quase
mulher nenhuma no jornal. Eu fui uma das primeiras a enfrentar o batente. Eles
faziam cara feia. Mas depois me firmei e todos me respeitavam. (...) N’A Tarde tinha
uma página feminina. Eu comecei no A Tarde como revisora. Todo jornalista
começava na revisão, porque na revisão a gente aprende a redigir a matéria, pois
somos obrigados a ler tudo que os outros jornalistas fazem. Eu e Vera Simões
fazíamos a revisão. Depois Vera Simões passou para a página feminina.
Hildegardes Vianna e Juli no A Tarde. No Jornal da Bahia, Isolda Menezes, todas
como colunistas. Não freqüentavam a redação. Somente eu fui para as ruas
(TAVARES, 2005, p. 17-18).
13
O decreto 83.284/79, artigo 11, item quatro, que regulamenta a profissão de jornalista, define o revisor como “aquele que tem o encargo de rever as provas tipográficas de matéria jornalística.” (FENAJ. Legislação sobre a profissão de jornalistas. Disponível em: <<http://www.fenaj.org.br/juridico.php?id=5#docs>>. Acessado em: 4 Jul. 2011)
Apaixonada pelo jornalismo – o jornalismo estava na veia da família Moreira,
pois todos os seus irmãos eram jornalistas – Zilah Moreira advogou por pouco tempo
para se dedicar literalmente ao jornalismo. Mais tarde, ela retornaria ao direito,
apenas como assessora jurídica da Câmara de Vereadores de Salvador, assunto
que será abordado no capítulo três.
O jornalista Florisvaldo Mattos, que por muito tempo foi editor-chefe de A
Tarde, lembra que Zilah Moreira marcou uma época de pioneirismos, de muita
coragem: “Ela foi a decana da imprensa baiana”.
Seu irmão Roschild Moreira, além de ser repórter do jornal A Tarde era
também o correspondente, na Bahia, do Estadão. Amigo de Júlio de Mesquita Filho,
proprietário do jornal, Roschild permaneceu no jornal até a sua morte. O que Zilah
não iria imaginar é que, com a morte de seu irmão ela iria assumir, em Salvador, a
correspondência do jornal. “Quando meu irmão faleceu, ocupei o lugar dele e virei
jornalista, profissão pela qual já estava apaixonada”, disse a jornalista certa vez em
reunião na Associação Baiana de Imprensa, lembra a jornalista Mery Bahia.
E assim Zilah Moreira começou a trilhar seus passos no jornalismo, como
correspondente de um grande jornal e que mais tarde viria a ser personagem de
grandes conflitos com políticos poderosos, coberturas significativas e vários
momentos cômicos.
A correspondência cai no colo
Falar de imprensa feminina e de mulheres jornalistas, na Bahia até 1970, é
tratar de um grupo restrito de profissionais em uma profissão ainda machista.
Imagine agora, uma mulher, cabo verde, advogada, com pouca experiência no
jornalismo e de uma hora para outra ser contratada como correspondente de um dos
mais importantes jornais do país, em uma época de conflitos políticos.
A primeira jornalista baiana, registrada na história, é Violante Bivar,
proprietária do Jornal das Senhoras14, que era feito por mulheres, mas distribuído no
14
(...) a baiana Violante Atabalipa Ximenes de Bivar e Velasco, 1817–1875, que editou no Rio de Janeiro, a primeira revista – Jornal das Senhoras – destinada a assuntos femininos e dirigida por mulher. (DE SOUZA, Antonio Loureiro. Apontamentos para a história da Imprensa na Bahia. In: TAVARES, Luis Guilherme Pontes
estado do Rio de Janeiro de 1852 até 1855. Um periódico que está entre a primeira
fase do jornalismo brasileiro, conhecida como uma fase artesanal do jornalismo no
país.
Mas, o certo é que Zilah Moreira é a primeira repórter baiana. A
correspondência do jornal O Estado de S. Paulo, na Bahia, cai no colo da jornalista.
Isto aconteceu devido à morte de seu irmão em 1964, Roschild Moreira, jornalista de
A Tarde e correspondente do Estadão. De acordo com o jornalista Carlos Navarro,
Roschild tinha deixado esposa e crianças, e como Julio Mesquita Filho era muito
próximo da família, deu o cargo a Zilah Moreira de correspondente do jornal, como
forma de ajudar. E é assim que Zilah Moreira começa a trilhar o caminho do
jornalismo e fazer seu nome neste importante jornal do Brasil.
A função dos correspondentes e das sucursais do periódico no país era fazer
a cobertura de tudo o que acontecesse em suas áreas de atuação e enviar para a
sede em São Paulo.
O quartel general da correspondência do Estadão na Bahia era a redação do
Jornal da Bahia. De lá Zilah Moreira pautava e transmitia as matérias por telefone,
western ou telex, usando o operador da casa, Simão Alves (TALENTO, 2003). E, de
acordo com o jornalista Biaggio Talento, Zilah dava uma graninha.
A correspondência do Estadão ficou instalada no Jornal da Bahia até 1973,
ano este em que o periódico decidiu montar uma sucursal.
Quando assumiu a correspondência do jornal, Zilah Moreira teve que fazer
cobertura de tudo o que acontecia em Salvador e no Estado. Torneios esportivos,
decisões políticas, moda, cultura, saúde, todo o tipo de notícia ela tinha que
investigar, escrever o texto (detalhe: ela não sabia usar a máquina de escrever
então fazia à mão e o teletipista, Simão Alves, que tinha que se virar para
datilografar) e enviar para São Paulo. Estas aventuras podem ser melhor entendidas
nos próximos capítulos.
[Org.]. Apontamentos para a História da Imprensa na Bahia. 2 ed. revista e ampliada. Salvador: Academia de Letras da Bahia, 2008, p. 102)
A convivência no Jornal da Bahia
Fundado em setembro de 1958, por João da Costa Falcão, militante
comunista, o Jornal da Bahia tinha uma linha editorial que juntava as recentes
conquistas da imprensa baiana, com uma diagramação mais arejada dando inclusive
mais espaço às fotografias. Teve como editor-chefe o jornalista João Carlos Teixeira
Gomes15. De acordo com Carlos Navarro16, jovem jornalista do jornal da Bahia entre
1969 e 1970, o jornal tinha um dos mais modernos parques gráficos e apresentando-
se em off-set, como nos melhores jornais do mundo. Seguindo uma linha
independente, o Jornal da Bahia tinha como enfoque a defesa dos interesses do
povo.
João Falcão por muito tempo fez parte do Partido Comunista e, muitos dos
profissionais do seu jornal eram ex-comunistas, que abandonaram o Partido depois
de Kruschev, mas não os ideais políticos. Faziam parte da redação o cineasta
Glauber Rocha, o escritor João Ubaldo Ribeiro, Muniz Sodré, Flavio Costa, João
Batista Lima e Silva, Ariovaldo Matos, entre outros.
Era na redação do periódico de João Falcão que também funcionava a
correspondência do jornal O Estado de S. Paulo. O jornalista Luiz Guilherme afirma
que as duas empresas tinham acordo de cooperação para o uso comum dos
equipamentos de teletipo e radiofoto. De acordo com Carlos Navarro, as matérias
realizadas pela correspondência de Salvador eram enviadas para a sede, em São
Paulo, por western, telefone ou telex e, o Jornal da Bahia tinha estes equipamentos.
Assim, Zilah Moreira se instalou na redação como correspondente em Salvador do
jornal paulista.
Devido à convivência com jornalistas, cineasta e pensadores comunistas,
Zilah Moreira – de família tradicional de Salvador – passou a conhecer outras
ideologias para, assim, registrar seu nome na história do jornalismo baiano, em um
período marcado por uma ditadura repressora que não poupava os jornalistas. Ela
ficou famosa, pelos constantes embates com o prefeito de Salvador e, mais tarde,
15
Conhecido também como Joca, é o autor do livro Memória das Trevas: uma devassa na vida de Antonio Carlos Magalhães. 16
Entrevista com Carlos Navarro realizada pelo autor, conforme anexo na p 58.
governador da Bahia, Antonio Carlos Magalhães. Mas isso vai ser detalhado mais à
frente.
De acordo com João Falcão, em entrevista ao jornalista Bob Fernandes e
Maria Falcão para o Terra Magazine, a aproximação de Antonio Carlos Magalhães
com Jornal da Bahia começou quando o político foi indicado pelos militares, prefeito
de Salvador, em 1967, três anos após o Golpe Civil-Militar. Para ele, o antecessor
de Antonio Carlos Magalhães, Julival Pires Rebouças, vinha fazendo um bom
trabalho na administração de Salvador e por isso deu uma boa cobertura à
Prefeitura. A aproximação com ACM partiu do próprio político. “Não tínhamos
relações pessoais com ele, tivemos uma boa aproximação porque ele, quando tinha
interesse em algo, era uma pessoa agradável, comunicativa”.
Mas, com a promulgação do AI-5, Ato Institucional n° 5, em 1968, tudo
mudou. João Falcão disse que o redator do periódico, Marcelo Duarte, foi preso e,
quando ele procurou o político, para saber como Antonio Carlos Magalhães poderia
ajudá-lo, obteve a seguinte resposta. “Ele disse que o que eu colocava não era
verdade e que os jornais da Bahia eram pouco corajosos. Eu lhe respondi que o
Jornal da Bahia não era pouco corajoso e que ele não perdia por esperar”.
Entre 1969 e 1972 o jornal foi fortemente perseguido por Antonio Carlos
Magalhães que, segundo Navarro, usou meios jurídicos para desmoralizar o
periódico se aproveitando do cenário político promovido pelo AI-5.
E assim começou todo o imbróglio entre Antonio Carlos, João Falcão e os
jornalistas que faziam parte da redação do Jornal da Bahia, até mesmo Zilah Moreira
que, apesar de ser de O Estado de S. Paulo, mas, convivia com todos que ali
trabalhavam.
Para Carlos Navarro, este clima pode ter influenciado a jornalista a assim
começar o conflito pessoal com Antonio Carlos. “Ela fez matérias que não
agradaram a ele, que ameaçou pedir para o Estadão a demissão dela. Mas, naquele
tempo, os Mesquitas tinham pavor de Antonio Carlos, já não estavam bem com a
Ditadura, já que o jornal ajudou a fazer o Golpe de 64, mas logo depois rompeu
devido à censura a imprensa”.
“Façam as reportagens e escrevam, os censores que cortem” (MAYRINK,
2008, p.49) eram as ordens enviadas pela sede do jornal O Estado de S. Paulo,
através de seu diretor, Júlio de Mesquita Filho, e mais tarde Júlio de Mesquita Neto,
a todos os correspondentes e sucursais. Quem trabalhava fora da sede deveria
dizer, se fosse interpelado pela polícia, que a decisão de publicar uma notícia era
sempre da direção do jornal, em São Paulo.
Este período, que se inicia com o AI-5 e o lançamento do Pasquim, irá se
encerrar com a anistia e a greve dos jornalistas. Muitas são as experiências
jornalísticas. É a época que O Estado de S. Paulo publica “Os Lusíadas”, Veja lança
uma edição sobre torturas, surgem os jornais Opinião, Movimento, Em Tempo entre
outros jornais da imprensa alternativa. Uma época em que pessoas inocentes,
acusadas de “subversão”, foram torturadas até a morte em nome de uma ideologia,
a Segurança Nacional. Período de intolerância, no qual não havia espaço para os
direitos humanos e para a dignidade da pessoa humana.
Zilah Moreira a frente do Estadão na Bahia
jornalista Ricardo Kotscho, que ingressou no Estadão em 1967 afirmou
que “na redação havia apenas duas mulheres, tradutoras da editoria
internacional” (KOTSCHO, 2006, p. 40). Jornalistas mulheres na própria
sede não existiam, quanto mais correspondente em uma grande capital do país, sem
muita infra-estrutura tendo que enviar reportagens todos os dias para o jornal. Esta
era a função, ou melhor, obrigação de Zilah Moreira, mas que ela fazia com muito
bom gosto.
Zilah Moreira não tinha uma editoria específica. Ela fazia cobertura de todos
os eventos: esportivo, político, policial, econômico ou de variedades, ela estava
pronta, sempre com uma calça marrom, um blusão folgado estampado com cores
vivíssimas – praticamente o uniforme dela, com seus cabelos curtos e seu velho
Fusca, a caça da notícia.
Na época tudo era muito difícil. Era um período em que a Ditadura Militar
mandava no País, com os vários atos institucionais e a repressão aos movimentos
populares contrários à ditadura. De acordo com o jornalista Carlos Navarro, para
outras mulheres talvez fosse difícil ter esta responsabilidade, mas para Zilah, não.
Ele afirma ainda que, com a desenvoltura dela, a espirituosidade, a jornalista entrava
em qualquer lugar: “Para Zilah, poderia ser um estádio de futebol ou Palácio do
Governo que ela estava pronta para investigar, apurar e noticiar.”
Uma de suas histórias interessantes como a “repórter de todas as editorias”
foi em relação ao esporte. Duas histórias relatadas por ela a amigos chamam
atenção. O jornalista Luiz Guilherme17 lembra um momento do lado esportivo de
Zilah Moreira. No início, ela não sabia nada de esporte, até porque naquela época
mulheres irem a estádio assistir uma partida de futebol era raro. Mas, como
correspondente do Estadão, teve que freqüentar rotineiramente. Durante as partidas,
17
Esta historia pode ser vista também na plaqueta organizada pelo jornalista Luiz Guilherme em que ele redigiu uma palestra de Zilah Moreira em 2002, Faculdade Integrada da Bahia. (TAVARES, Luiz Guilherme (org). Zilah Moreira. Salvador, Núcleo de Estudos da História da Imprensa da Bahia, São Paulo: Rede Alfredo de Carvalho, 2005, p. 10).
O
ela ficava caminhando pelo campo (não se instalava na tribuna de imprensa) sempre
com um rádio – e vale lembrar que os rádios daquela época eram enormes – com a
alça no ombro, acompanhando o jogo. Determinado momento ouviu o locutor dizer:
“tiro de Meta”. Ela olhava para um lado e para o outro e não conseguia entender. O
mais interessante é que este nome já lhe era familiar porque, é claro, toda partida de
futebol tem que ter o tiro de meta. Então ela pensou e perguntou para si mesma
quem era este “Meta” que aparecia em todos os jogos. Para tirar a duvida recorreu
ao amigo e jornalista do A Tarde, Carlos González, para saber quem era este tal de
“Meta”. Ele então sorriu e explicou o que era o “tiro de Meta”.
Outro caso lembrado por Luiz Guilherme foi à relação entre Zilah Moreira e o
técnico do Esporte Clube Bahia, Paulo Amaral. Jornalista nenhum conseguia falar
com ele. Zilah Moreira então decidiu encarar o técnico, e como ela mesma dizia, fez
“uma cara de Santa Beata” e foi entrevistá-lo.
– Senhor Paulo? Disse.
Ele então respondeu:
– Não me chame de senhor.
– Então Paulo. Eu só sei que a bola é redonda e nada de jogo.
– Não posso. Respondeu o técnico.
Com os ânimos enaltecidos, ela disse:
– Como é que não pode. O senhor é o técnico do time, tem que dar
satisfações.
A partir daí ele explicou como ia ser o jogo, ela construiu a matéria, que foi
veiculada no jornal. Desse dia em diante, Paulo Amaral só concedia entrevistas a
jornalista.18 Até que um episódio desconstruiu este privilégio.
De acordo com relatos da jornalista, teve um momento em que ela não tinha
mais o que falar sobre o técnico. Ela procurou o seu irmão que entendia de futebol e
também era jornalista, Eitel Moreira, para fazer uma reportagem com o técnico em
18
op. cit., p. 11
um terreiro de candomblé. Para completar a matéria, o Estadão tinha achado em
seu arquivo uma fotografia de Paulo Amaral em que uma luz emitia alguns raios e
que dava uma impressão de que ele era uma divindade. Com informações de um
filho-de-santo, Camafeu de Oxossi, ela escreveu que o técnico freqüentava um
terreiro de candomblé, as vésperas dos jogos do Bahia, chupava a cabeça de um
galo preto e que por isso o Bahia ganhava as partidas. O fato gerou uma confusão!
O técnico não gostou da história e deixou de conceder entrevistas a Zilah Moreira.
(TAVARES, 2005). A partir daí, a correspondente começou a gostar de noticiar
esporte e tudo foi ficando mais fácil. Cobriu o Vigésimo Campeonato Brasileiro de
Iatismo da classe Snipe19 (anexo, p. 67), a crise do Bahia no campeonato Roberto
Pedrosa, de 1971 (anexo, p. 70), a cobertura do primeiro jogo transmitido, via
satélite pela Embratel, entre Bahia e Grêmio20, entre outros.
Outro caso interessante vivido por Zilah enquanto esteve à frente da
correspondência do Estadão na Bahia foi à vinda do presidente do Banco Mundial,
Robert McNamara, ao Brasil. Na viagem ele passou por Salvador. McNamara veio
acompanhado de sua secretária, Chandras Sing. A secretaria resolveu conhecer a
capital baiana e, nesta época, os estudantes estavam fazendo muitas manifestações
contra o regime. Chandras Sing então chega ao Terreiro de Jesus, no Pelourinho, e
começou a tirar fotografias. Um soldado, que estava de plantão, achou que ela
estava tirando foto dele e então “arrastou” a secretária. Ela sem entender nada
perguntava ao policial em inglês.
– Do you speak english? Do you speak english?
Nada adiantou. Ela foi levada até a delegacia da Misericórdia, onde hoje é a
prefeitura de Salvador, tomaram a máquina, os documentos e a agrediram. Zilah
Moreira então correu para a redação do Jornal da Bahia, escreveu o texto e quando
iria enviar pelo telex para o Estadão ouviu que o secretário de Comunicação do
Governo Luiz Vianna, Prisco Viana, tinha pedido para não publicar. Mesmo assim,
enviou a matéria com a observação de que o Governo da Bahia havia censurado.
Apesar do aviso, o jornal publicou.
19
Entrevista com Carlos Navarro realizada pelo autor. Apêndice p. 58 20
Este caso vai ser melhor explicado os embates com Antonio Carlos Magalhães.
Outra reportagem de Zilah Moreira e que envolvia o ex-governador Luiz
Vianna Filho foi o pedido de impugnação no TRE, Tribunal Regional Eleitoral, do
candidato da Arena ao Senado Luiz Vianna Filho e seu suplente solicitado pelo
candidato do MDB, Movimento Democrático Brasileiro,
Clemens Sampaio. De acordo com Sampaio, em virtude
da desistência do deputado Agostinho Pinheiro, a Arena
deveria fazer uma nova assembléia para escolher o novo
candidato ao Senado (Figura 5).
Outras coberturas foram marcantes na história da
jornalista. Entre as principais, a morte do capitão Carlos
Lamarca e do líder comunista, o baiano Carlos Marighella
além dos inúmeros confrontos com Antonio Carlos
Magalhães. Algumas destas histórias, desta que foi a
repórter de todas as editorias, serão contatadas nos
próximos capítulos.
Os embates com Antonio Carlos Magalhães
O jornalista Clovis Rossi disse certa vez ao também
jornalista Ricardo Kotscho qual era o sentido do
jornalismo: garimpar boas histórias e oferecer informações
confiáveis à sociedade (KOTSCHO, 2006, p. 14). Começo
este capítulo com este trecho para explicar que esta era
uma das principais características defendida pela jornalista
Zilah Moreira: a busca inconstante da notícia com
veracidade.
Mas, para iniciar esta parte, que vai tratar dos inúmeros e inconstantes
embates entre a jornalista e o político Antonio Carlos Magalhães, é importante
remeter ao final do primeiro capítulo (De A Província de S. Paulo ao Golpe Civil-
militar de 1964), que trata do apoio de O Estado de S. Paulo ao Golpe Civil-Militar de
1964, quando o presidente João Goulart é deposto e o Exército assume a liderança
do país.
Figura 5: Em destaque nota de Zilah Moreira sobre o pedido de impugnação da candidatura de Luiz Vianna Filho. Extraída do livro Mordaça no Estadão, p. 204
Os primeiros anos da ditadura militar no Brasil foram marcados, de um modo
geral, pelo confuso movimento de acomodação das forças golpistas, quase sempre
caracterizados pelos antagonismos insuperáveis em seu interior. O que para as
Forças Armadas, em geral, é denominado de Revolução Democrática de 31 de
março de 1964, para o general Sylvio Frota, integrante de primeira hora do
movimento militar, isto nada mais foi que um golpe, quando ele afirma: “Sobrevêm,
então, o Golpe Militar de 1964, que na verdade jamais foi uma Revolução, (...)”
(FROTA, 2006, p. 63).
O que se pode entender, é que não havia ao certo, um projeto claro de poder.
Os militares, até então, se limitavam a intervir no que eles consideravam ser
ameaças às instituições do país, sem pretensões de poder, como defendia o
presidente Castelo Branco, que queria ser um instrumento de transição e, em
seguida, passar o comando do país aos civis. Assim, a grande imprensa – como, por
exemplo, O Estado de S. Paulo – diversas esferas da sociedade civil21, religiões,
dentre outros, apoiaram o Golpe Civil-Militar de 1964 com o intuito de mudar a visão
política até então vigente no país.
O jornalista Mino Carta afirma, na edição de Carta Capital, de seis de abril de
2011, que “o golpe foi armado pelos donos paisanos do poder, invocado
sofregamente por sua mídia, braço impresso e falado, e executado por seus
gendarmes, ou seja, pelas Forças Armadas que se prestaram ao serviço” (p. 25).
Mas a consolidação deste evento de 1964 constrói também uma nova história
que se traduz em um “Golpe dentro do Golpe”, com o decreto dos constantes atos
institucionais que leva o país à censura.
Assim, o poder das forças armadas toma conta do cenário nacional, que vai
indicar prefeitos, governadores, presidentes em eleições indiretas, fechar o
congresso e a censura prévia a imprensa. Uma forma de repressão22, muito bem
21
Conforme a afirmativa de Solange Simões (1985, p.36), essa “mobilização atendia, portanto, a um objetivo principal: viabilizar e justificar o golpe enquanto resposta a um espontâneo e legítimo apelo popular”. Visava, sobretudo, mobilizar os setores médios, posto que a classe trabalhadora encontrava-se mais afeita às propostas lançadas pelo nacional-reformismo de João Goulart. (SANTANA, Ediane Lopes. Campanha de desestabilização de Jango: as ‘donas’ saem às ruas. In: ZACHARIADES, Grimaldo [Org.]. A ditadura militar na Bahia: novos olhares, novos objetos, novos horizontes. Salvador: Edufba, 2009. p. 19) 22
Quando se define os efeitos de poder pela repressão, tem-se uma concepção puramente jurídica, deste mesmo poder; identifica-se o poder a uma lei que diz não. O fundamental seria a força da proibição. (...) O que
explicada por Michel Foucault, onde a lei é fortalecida pela expressão, “não”. E a
Bahia não ficou fora deste período. Foi uma época em que de um lado estavam
prefeitos e governadores indicados pelas forças armadas, e do outro, jornais
censurados, jornalistas, movimentos estudantis, e guerrilheiros: todos perseguidos.
O primeiro prefeito de Salvador nomeado pela Ditadura Militar foi Nelson de
Souza Oliveira (1964-1967) que mais tarde foi substituído pelo jovem médico
Antonio Carlos Magalhães, indicado pela Câmara Estadual e nomeado pelo
governador Lomanto Junior.
Luiz Vianna Filho foi o primeiro governador da Bahia indicado pela ditadura
em 15 de março de 1967 e ficou no poder até 15 de março de 1971, assumindo em
seguida Antonio Carlos Magalhães.
Antonio Carlos Magalhães sempre esteve presente nas pautas de Zilah
Moreira, quando correspondente de O Estado de S. Paulo, na Bahia. Como foi dito
antes, acredita-se que este desafeto entre a jornalista e o político nasceu devido ao
seu convívio com os jornalistas na redação do Jornal da Bahia e consolidado com a
liberdade que o Estadão dava à jornalista, já que a família Mesquita não gostava do
político.
E sem dúvida alguma, a carreira jornalística de Zilah Moreira ganhou
notoriedade e visibilidade devido a sua coragem de enfrentar um grande político
poderoso, em todas esferas de poder.
A decretação do AI-5, em 13 de dezembro de 1968, período este em que o
prefeito de Salvador era Antonio Carlos Magalhães e o governador Luiz Vianna
Filho, colocou no papel aquilo que até então era somente uma intenção. Dava
poderes extraordinários ao presidente da República e suspendia várias garantias
constitucionais, dentre elas, obrigava os jornais a se enquadrar, colaborando na
tarefa de isolar os “impatriotas” e fazer com que o conjunto dos brasileiros se
identificasse com os projetos do governo militar (MAYRINK, 2008, p. 16). Com o AI-5
a situação piorou consideravelmente. O ato veio em represália à decisão da Câmara
dos Deputados, que se negara a conceder licença para que o deputado Marcio
faz com que o pode se mantenha e que seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não, mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso. (FOUCAULT, Michel. A microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979, p. 8)
Moreira Alves23 fosse processado devido a um discurso
onde questionava até quando o Exército abrigaria
torturadores.
Com a decretação do AI-5, políticos e autoridades
baianas, contrárias as Forças Armadas foram ouvidas e
detidas em Salvador. Zilah Moreira, em reportagem
compartilhada com a redação em São Paulo e a sucursal
do Rio de Janeiro, intitulada “Deputado estadual
encontra-se detido” (apêndice p.), ela aponta que
autoridades como os deputados Marcelo Duarte e Mario
Piva e Luiz Henrique Dias, diretor de Ensino Médio e
responsável pela Bienal estavam presas na sede da
Polícia Federal há dias.
Embora tenha sido um entusiasta do Golpe Civil-
Militar de 1964, em seu início, apoiando as medidas de
exceção, a partir de 1966, o jornal muda de posição ao
perceber que o governo brasileiro não voltaria para os
23
"Senhor presidente, senhores deputados,
Todos reconhecem ou dizem reconhecer que a maioria das forças armadas não compactua com a cúpula
militarista que perpetra violências e mantém este país sob regime de opressão. Creio ter chegado, após os
acontecimentos de Brasília, o grande momento da união pela democracia. Este é também o momento do
boicote. As mães brasileiras já se manifestaram. Todas as classes sociais clamam por este repúdio à polícia. No
entanto, isto não basta. É preciso que se estabeleça, sobretudo por parte das mulheres, como já começou a se
estabelecer nesta Casa, por parte das mulheres parlamentares da Arena, o boicote ao militarismo. Vem aí o 7
de setembro. As cúpulas militaristas procuram explorar o sentimento profundo de patriotismo do povo e
pedirão aos colégios que desfilem junto com os algozes dos estudantes. Seria necessário que cada pai, cada
mãe, se compenetrasse de que a presença dos seus filhos nesse desfile é o auxílio aos carrascos que os
espancam e os metralham nas ruas. Portanto, que cada um boicote esse desfile. Esse boicote pode passar
também, sempre falando de mulheres, às moças. Aquelas que dançam com cadetes e namoram jovens oficiais.
Seria preciso fazer hoje, no Brasil, que as mulheres de 1968 repetissem as paulistas da Guerra dos Emboabas e
recusassem a entrada à porta de sua casa àqueles que vilipendiam-nas. Recusassem aceitar aqueles que
silenciam e, portanto, se acumpliciam. Discordar em silêncio pouco adianta. Necessário se torna agir contra os
que abusam das forças armadas, falando e agindo em seu nome. Creia-me senhor presidente, que é possível
resolver esta farsa, esta democratura, este falso impedimento pelo boicote. Enquanto não se pronunciarem os
silenciosos, todo e qualquer contato entre os civis e militares deve cessar, porque só assim conseguiremos fazer
com que este país volte à democracia. Só assim conseguiremos fazer com que os silenciosos que não
compactuam com os desmandos de seus chefes, sigam o magnífico exemplo dos 14 oficiais de Crateús que
tiveram a coragem e a hombridade de, publicamente, se manifestarem contra um ato ilegal e arbitrário dos
seus superiores." (Folha Online. Leia discurso histórico do ex-deputado Marcio Moreira Alves. Folha de S. Paulo,
São Paulo, 12 de junho de 2011).
Figura 6: Recorte do editorial Instituições em Frangalhos
civis e assim começam as críticas às ações deletérias dos agentes do governo. O
principal documento histórico desse momento é o editorial “Instituições em
frangalhos24” (Figura 6), publicado no dia em que o AI-5 é baixado.
A censura prévia no jornal começou a meia noite de 12 de dezembro de 1968,
um dia antes da instituição do AI-5. O general Silvio Correia de Andrade, chefe da
Polícia Federal em São Paulo, telefonou para a redação do Estadão para saber qual
seria a manchete da primeira página. O secretário da redação, Oliveiros S. Ferreira,
respondeu: “Câmara nega; prontidão”25.
De acordo com Oliveiros S. Ferreira, em depoimento no livro Mordaça no
Estadão, a ordem era trabalhar como se não existisse censura. “Façam as
reportagens e escrevam, os censores que cortem” (MAYRINK, p. 49). Zilah Moreira
confirma quando diz que ao longo dos 30 anos sendo correspondente do jornal na
Bahia, fazia tudo o que jornal mandava inclusive reportagens que fosse contra o
prefeito e mais tarde governador Antonio Carlos Magalhães (TAVARES, 2005).
Uma das polêmicas reportagens de Zilah Moreira que envolve Antonio Carlos
Magalhães foi à vinda de Carlos Simas, que fora ministro das Comunicações
durante o governo Castelo Branco, para chefiar a Telebahia, Companhia Telefônica
do Estado da Bahia designado pelo governo do presidente Emilio Garrastazu Médici.
Carlos Simas já era um antigo desafeto do político. Sabendo disso, o Estadão
enviou um repórter a Salvador para auxiliar Zilah Moreira na reportagem.
Quando o repórter chegou, disse a Zilah Moreira para ela ficar calada, que
marcasse apenas as entrevistas. Imagine, Zilah Moreira calada?! Quase impossível.
Mas, a princípio, ela obedeceu. Ela ligou para o prefeito Antonio Carlos Magalhães e
24
E é diante desse quadro todo, ele feito de tonalidades sombrias, que nos achamos. Até aqui as coisas pareciam suscetíveis de sua recomposição. Apesar de tudo, a passividade do Congresso Nacional, aliada a disciplina militar, poderia ainda fazer às vezes do apoio da opinião pública. Agora, porém, que são claros os sinais de desagregação irredutível da maioria parlamentar, como o comprova a estrondosa derrota sofrida ontem pelo governo, quando mais de 70 deputados da Arena votaram contra a concessão de licença para processar o deputado Marcio Moreira Alves, pergunta-se: que é que poderá resultar de um estado de coisas que tanto se assemelha ao desmantelamento total do regime que o Sr. Presidente da República julgava fosse o mais conveniente aquele delicadíssimo e frágil arquipélago de grupos sociais a que se referia ainda ontem, cuja integridade, é a S. Exa. o primeiro a reconhecê-lo. (Editorial. O Estado de S. Paulo. 13 de dezembro de 1968) 25
Era uma seqüencia (suíte, no jargão jornalístico) da manchete da véspera – “Câmara vota hoje a licença” -, referente à licença para o governo processar o deputado Marcio Moreira Alves (MDB pelo antigo Estado da Guanabara), por causa de um discurso, meses antes considerado inofensivo pelas Forças Armadas. (MAYRINK, José Maria. Mordaça no Estadão. São Paulo: O Estado de São Paulo, 2008, p. 24)
marcou a entrevista. O mesmo ela fez com Carlos Simas, que preferiu não atender,
e com vários outros implicados no caso.
O repórter do Estadão então entrevistou o prefeito de Salvador que dizia
absurdos sobre o presidente da Telebahia. Ao chegar na redação do Jornal da Bahia
o repórter chamou Zilah Moreira para juntos compor a matéria. Mas, faltava ter a
entrevista de Carlos Simas. A reportagem só ficaria mais interessante se tivesse um
contraponto. O repórter tinha nas mãos um gravador que continha declarações do
prefeito de Salvador difamando Carlos Simas. Zilah, então, teve a idéia de fazer uma
acareação. Ela ligou para o presidente da Telebahia dizendo que estava com uma
gravação em que Antonio Carlos o arrasava. Simas reuniu seu staff, autorizou Zilah
Moreira ir até o escritório dele e lá ela mostrou todo o conteúdo da fita. Cada
afirmação do prefeito de Salvador, ele parava e rebatia. Terminada a acareação,
Zilah Moreira e o repórter que o Estadão tinha enviado fizeram uma reportagem,
literalmente a quatro mãos, que deixou Antonio Carlos Magalhães bastante furioso.
Sucursais e correspondentes do Grupo Estado sofreram todo tipo de pressão
durante a Ditadura Militar por causa das notícias que apuravam em suas regiões. As
reportagens na maioria das vezes não eram podadas nas fontes (MAYRINK, 2008,
p. 121), mas agentes da Polícia Federal e oficiais do Exército tentavam intimidar os
repórteres para que não enviassem o material escrito para São Paulo.
De acordo com Raul Bastos, chefe dos correspondentes, “as sucursais e
correspondentes sofreram pressões, porque estavam expostos, numa época em que
“O Estado” tinha uma máquina muito grande, fornecendo matérias que irritavam a
censura”.
Certa vez, irritado com as reportagens de Zilah Moreira, Antonio Carlos
Magalhães pediu a cabeça da jornalista ao jornal O Estado de S. Paulo, que o
ignorou.
A ação censória esteve no Estadão26 por mais de seis anos e mesmo
assim, Júlio Mesquita Neto não se curvava perante a ação. Assim, ao depor em um
26
Isso posto, as regras estão claras. Não há nada caótico e perdido na burocracia, como muitas análises tentam apontar. Não há acefalia. Até mesmo os temas censórios estão expostos desde o início, como as notas recebidas no dia do AI-5 comprovam. Mas o jornal, O Estado de S. Paulo continuou expondo o sentimento corrente da época, no artigo “Liberdade em debate na ABI”, de 23/03/1972, (p.6), ao refletir que: “(...) como a legislação é
inquérito policial-militar, o diretor do Estadão causou um constrangimento para os
agentes do governo ao afirmar que não era mais o responsável pelo jornal e sim o
ministro da Justiça, Alfredo Buzaid (KUSHNIR, 2004, p. 51).
E se esta ação censória não intimidava os
donos do jornal, imagine se iria deixar Zilah
Moreira retraída?! Carlos Navarro afirma que a
jornalista era tão espirituosa que ia para as
entrevistas coletivas de Antonio Carlos
Magalhães, enfrentava o político e isso deu
grande notoriedade a ela, já que o Estadão
garantia e divulgava. Ele diz ainda que com a
coragem de encarar um poderoso e ainda mais
em plena ditadura, ela então ganha grande
importância no jornalismo baiano.
A censura era realizada na sede do jornal,
em São Paulo. Correspondentes e sucursais
tinham uma maior liberdade para escrever as
notícias pertinentes as suas áreas de cobertura. E
inúmeras foram estas reportagens realizadas por
Zilah Moreira, como por exemplo, o caso da
secretária do presidente do FMI, Fundo
Monetário Internacional, Robert McNamara,
contada no capítulo anterior, que foi arrastada por policiais do Exército, sofrendo,
inclusive, agressões físicas, e que a correspondente em Salvador enviou a
reportagem com o aviso de censura emitido pela assessoria de comunicação do
governo baiano e mesmo assim foi publicada pelo jornal.
Mas, na maioria das vezes, os censores instalados na redação do jornal, não
permitiam a publicação de matérias que comprometiam o governo militar. Para
contraditória, por força do grande número de portarias e instruções que complementam os diplomas de arrocho fundamentais, os jornais continuam a mercê de decisões subjetivas que variam consoante o critério da autoridade encarregada de interpretar os textos”. (KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda. São Paulo: Boitempo, 2004, p. 118-119)
Figura 7: Em destaque o Canto Décimo, de Luiz de Camões.
driblar a ação, o Estadão então começou a publicar poemas27, principalmente os de
Camões, como um sinal de que naquele espaço uma reportagem havia sido
censurada (Figura 7). Os versos de Camões rechearam as páginas internacionais
em setembro de 1973, quando Clovis Rossi, pelo Estadão, cobriu em Santiago, no
Chile, o golpe militar do general Augusto Pinochet que destituiu do poder o
presidente Salvador Allende (MAYRINK, 2008).
Assim, destemida, Zilah Moreira seguiu fazendo o seu trabalho como
correspondente do Estadão, na Bahia. A briga do Jornal da Bahia com o prefeito
Antonio Carlos Magalhães, relatado no capítulo anterior, foi um dos estímulos para
que Zilah Moreira enfrentasse o político com mais coragem. Fatores que levaram ao
rompimento do jornal de João Falcão com Antonio Carlos Magalhães foram
inúmeros. Um dos últimos foi a reportagem do jornalista Nilton Sobral dizendo que o
prefeito era a causa do rompimento, da desunião dentro da Arena, Aliança
Renovadora Nacional, partido que era a base do governo militar, pois disputava com
o ex – governador Lomanto Junior a liderança do partido, tendo em vista a
sucessão. É evidente que a reportagem não agradou Antonio Carlos Magalhães.
Depois disso, o prefeito não publicou mais nota oficial no jornal de João Falcão.
Zilah Moreira, então, chamou o jornalista João Carlos Teixeira Gomes, o Joca, que
era o editor-chefe do Jornal da Bahia e disse que iria fazer uma reportagem para o
Estadão denunciando o caso. Joca pediu para ela não fazer isso. Ela não ouviu, fez
a reportagem e enviou. No outro dia, Julio Mesquita Neto fez um editorial na terceira
página acabando com Antonio Carlos Magalhães e sua política. Como o dono do
Estadão era o presidente da Associação Interamericana de Imprensa, ele denunciou
as arbitrariedades do regime em reuniões e congressos internacionais e a
Associação protestou contra os desmandos na Bahia.
De acordo com Mayrink (2008), Julio Mesquita Neto se empenhava,
pessoalmente, em acompanhar de perto a situação dos jornalistas perseguidos. Em
seus discursos e relatórios apresentados na Associação Interamericana de Imprensa
27
Como a censura não permitia que saísse espaço em branco, o Estado de S. Paulo e o Jornal da Tarde deram um jeito de substituir o material cortado por alguma coisa que mostrasse aos leitores que algo estranho estava ocorrendo. Começaram publicando carta, depois recorreram a poemas e outros textos literários. (...) Foi ai que se começou a publicar Os Lusíadas, de Luiz de Camões, no espaço das matérias censuradas. A sugestão foi de Antonio de Carvalho Mendes, que escrevia uma coluna sobre cinofilia e já era o responsável pela seção de falecimentos. (MAYRINK, José Maria. Mordaça no Estadão. Op. cit., p. 63-66).
ele sempre denunciou a censura. Um desses relatos28 foi realizado em Acapulco, no
México, em março de 1969, três meses após a edição do AI-5.
A década de 60, no Brasil, foi um período marcado por uma gradual
aproximação dos estudantes com as ideologias e organizações políticas de
esquerda, sobretudo após o Golpe Militar. Em todo o país foram fechadas entidades
estudantis, sindicatos, redações de jornais, dentre outras organizações que eram
consideradas subversivas.
No final de 1967 (SOUZA, apud ZACHARIADES, 2009) vários estudantes que
simpatizavam com o PCB, Partido Comunista Brasileiro, ingressaram neste partido
político. Duas dissidências do PCB de Salvador atuavam organizadamente: uma,
sob a liderança de Juca Ferreira e Sérgio Landulfo Furtado; a outra, coordenada por
Chantal Russi, Marie Hélène Russi, Carlos Sarno e Jurema Valença. A juventude
estudantil protestava contra a autoridade e os desmandos em relação à educação
no país. O brutal assassinato do estudante Edson Luís, no Rio de Janeiro, foi o
estopim para que os estudantes baianos também fossem as ruas protestar29.
Zilah Moreira contou a Luís Guilherme Tavares que ela e alguns jornalistas do
Jornal da Bahia, principalmente, ficavam sentados em baixo dos pés de Oitis (do
lado das bancas de revista de Marreco e de Careca) que ficavam em frente à
Prefeitura de Salvador, onde hoje é a Câmara de Vereadores, para falar mal de
Antonio Carlos Magalhães e como iriam ser as reportagens do dia seguinte. Ela
apelidava o ponto como “Rádio Oiti”. Era o governo Luiz Vianna, a cidade tomada
pelos estudantes, um verdadeiro campo de batalha. Estava ela e o deputado José
28
“No Brasil, não existe, hoje, liberdade de imprensa. O Ato Institucional n° 5, de 13 de dezembro de 1968, representou para a imprensa do Brasil o desfecho de uma situação cujo agravamento tínhamos previsto, havia muito”. (MAYRINK, José Maria. op. cit. p. 96). 29 Em 30 de março, o DCE e a UEB deflagraram greve geral de protesto contra o assassinato do estudante.
Programaram uma concentração na Praça Castro Alves e uma passeata com bandeira de luto pelo centro da cidade. O governador Luis Vianna lamentou a morte do jovem ao mesmo tempo em que fez pronunciamento pela TV pedindo aos estudantes para não irem às ruas “perturbar a vida na cidade”. Além dessa iniciativa, o governo tentaria esvaziar a reação estudantil fechando as escolas públicas. (...) No outro dia, os estudantes realizaram um comício no centro da cidade com direito a farta distribuição de panfletos e manifestos à população sobre as razões do protesto. Organizaram comícios-relâmpagos em pontos de ônibus. Alguns chegaram a entrar nos veículos e proferir discursos buscando angariar o apoio da população. Até pichação foi feita pelas ruas do centro. A passeata continha cartazes com vários dizeres, entre os quais: “Abaixo a violência”, “Abaixo o arrocho”. (BRITO, Antonio Maurício Freitas. Salvador em 1968: um breve repertório de lutas estudantis universitárias. In: ZACHARIADES, Grimaldo [Org.]. Ditadura Militar na Bahia: novos olhares, novos objetos, novos horizontes. Salvador: Edufba, 2009. p. 93-94).
Penedo conversando no ponto da “Rádio Oiti” quando um policial chegou
expulsando todos de lá. Ela disse que só sairia se o deputado José Penedo saísse
também. Como o deputado não saiu, ela continuou no lugar. Os policiais voltaram
com cachorros, um soltou e foi para cima dela, e ainda jogaram bomba de gás
lacrimogênio. Ela então correu em direção a Farmácia Chile – onde hoje é uma loja
de produtos fotográficos – lavou o rosto e teimosa como era, voltou para os pés de
oitis. Dentro de instantes dois tenentes jovens vieram para junto de Zilah e ela
perguntou:
– Vão ajudar a bater nos meninos estudantes como vocês? Vocês são
estudantes não são? (TAVARES, 2005, p. 21)
Um deles respondeu que era estudante de direito, disse o nome para ela, e
que só cumpriam ordens. Eles não fizeram nada contra ela, mas pediu que a
jornalista se retirasse. Ela saiu apenas naquele dia, porque no dia seguinte lá estava
ela de volta.
Certa vez o jornal O Estado de S. Paulo saiu das bancas de Salvador. Carlos
Navarro disse que era comum quando acontecia de, alguma reportagem ser contra o
governador Antonio Carlos Magalhães ou integrantes do seu governo, ele mandar
apreender o jornal ainda no aeroporto ou comprar tudo na mão do distribuidor. Certa
vez Zilah Moreira estava passando pela Praça Municipal, quando Marreco, dono de
uma das bancas na área a chamou, e disse que tinham tirado o Estadão das
bancas. Ela foi conferir na banca vizinha, a de Careca, e confirmou que realmente o
jornal não estava lá. Ela então ligou para Raul Bastos, chefe dos correspondentes,
dizendo o ocorrido. Raul então pediu para ela tomar cuidado. Destemida, a jornalista
então, ligou para o governador Antonio Carlos Magalhães que respondeu
(TAVARES, 2005, p. 24):
– Isso é intriga da senhora.
Zilah replicou:
– Governador, o senhor me respeite, olhe que eu desligo o telefone. Não
quero bater o telefone na cara do governador da Bahia, porque na de Toninho do
Campo da Pólvora, Toninho Malvadeza, eu bato.
Quanto mais ela falava mais ele se irritava com ela.
Ele então pediu para o secretário de Segurança Pública da Bahia, o coronel
Joalbo Figueiredo, marcar um encontro para que ela explicasse o ocorrido, na sede
da Secretaria de Segurança Pública, na Piedade. Sob protesto, ela então contou o
ocorrido: que os exemplares do Estadão não estavam nas bancas de revistas. O
coronel Figueiredo, então, pediu para ela dizer os nomes dos informantes. Ela então
respondeu:
– Você acha que sou maluca? Dar os nomes dos jornaleiros para você dar
porrada neles, para depois eles dizerem que eu estou inventando história, como fez
seu chefe?
Contrariada ela saiu do encontro com o coronel Figueiredo e seguiu para a
Praça Municipal para avisar a Careca e Marreco para fecharem as bancas, pois a
polícia poderia chegar a qualquer momento.
No outro dia, depois de dar queixa na delegacia, Zilah Moreira descobriu o
motivo do boicote ao jornal na Bahia. O diretor de Turismo da Prefeitura de
Salvador, Herval Pereira, tinha ido a São Paulo para um congresso de turismo e de
acordo com a jornalista ele foi “passear” com uma menina. A polícia prendeu o carro
deles. Um jornalista de O Estado de S. Paulo soube do caso e publicou que o
funcionário municipal baiano tinha sido abordado por policiais e que estava
acompanhado. O diretor pediu então para apreender o jornal na Bahia, para a
esposa dele não ler. Todos os jornais foram tirados da banca e foram empilhados no
Belvedere da Sé, onde era a Sutursa. A jornalista ficou em cima do delegado para
que o caso fosse solucionado. O final da história foi que o delegado que conduzia o
inquérito faleceu e ficou tudo por isso mesmo (TAVARES, 2005).
Além de ser correspondente do O Estado de S. Paulo, Zilah Moreira, como
era advogada, também fora assessora jurídica da Câmara de Vereadores de
Salvador. Antonio Carlos Magalhães, que era prefeito de Salvador, era o mais
cotado a ser governador da Bahia por indicação dos militares e referendo da
Assembléia Legislativa. De acordo com a jornalista, era um período de eleições para
deputados federal e estadual e a apuração acontecia no Fórum Ruy Barbosa, sob a
segurança da Aeronáutica. Arrogante, o prefeito desacata os soldados da
Aeronáutica na tentativa de entrar no Fórum e é barrado. Revoltado, ele cria um
tumulto na frente do Fórum. Este tumulto gera um processo onde vários candidatos
vão ser ouvidos, dentre eles o vereador e candidato a deputado estadual, José
Penedo. Na saída do depoimento, Penedo diz que, pelos depoimentos, Antonio
Carlos não seria mais candidato a governador. Imediatamente, Zilah envia uma
matéria para o Estadão intitulada: Antonio Carlos Magalhães, que responde um
processo na Aeronáutica, provavelmente não será o governador da Bahia por
indicação.
Um dos assessores do prefeito pegou o recorte do jornal entregou a ele que
ficou furioso e exigiu que o presidente da Câmara de Vereadores, Paulo Magalhães,
demitisse Zilah Moreira. O presidente imediatamente obedeceu. Quando soube que
havia sido demitida, ela foi ao encontro do governador Luiz Vianna Filho, no Palácio
Rio Branco, que não estava no momento. Então relatou o ocorrido ao chefe da Casa
Militar, Coronel Isidro. Ele pediu para ela ir trabalhar e que iria conversar com o
presidente da Câmara. No dia seguinte, ela encontrou Isidro que disse: “você para o
Antonio Carlos Magalhães, é um perigo. Assim que acabei de falar com Paulinho, o
prefeito subiu as escadas dizendo ‘Isidro, faço uma força danada para demiti-la e
você quer readmiti-la. Para lá ela não voltará jamais’” (TAVARES, 2005, p. 30).
Sorridente, a jornalista foi para a Rua Chile, principal reduto dos jornalistas e
disse: “sou a mulher mais importante da Bahia. Toninho desceu a escada da
prefeitura, subiu a do Palácio Rio Branco para dizer a Isidro que não me queria na
Câmara” (TAVARES, 2005, p. 30).
Os abalos sofridos pela ditadura brasileira a partir de 1974 levaram o estado
maior militar a optar por um processo de abertura política controlada, alavancado
através da grande imprensa (KUCINSKI, 1991, p.95).
Com a ascensão do General Ernesto Geisel à presidência da República, a
censura começou a ficar de uma forma lenta e gradual mais branda. O fim da
censura à imprensa foi um compromisso do presidente em sua posse no dia 15 de
março de 1974 com Júlio de Mesquita Neto. O fato não se concretizou
imediatamente porque a censura continuou até janeiro do ano seguinte no
Estadão30. A censura continua em diversos outros órgãos de comunicação, sendo
particularmente severa contra os jornais alternativos já citados. Ela será
definitivamente abolida somente em 1979, já no governo do general João Batista
Figueiredo.
Durante o governo do presidente Geisel um caso inusitado vivenciado por
Zilah Moreira aconteceu em Salvador. O Estadão mandou Zilah Moreira cobrir o jogo
do Bahia e do Grêmio pelo Campeonato Roberto Pedrosa, que iria ser transmitido
pela Embratel, Empresa Brasileira de Telecomunicações. Como ela era repórter de
tudo o que era editoria, inclusive esporte, Zilah seguiu para o estádio Octavio
Mangabeira com o seu velho rádio de pilha. Ao chegar na arquibancada oficial
encontrou ela cheia de gente e o curioso, a maioria de torcedores do Vitória.
Estavam Antonio Carlos Magalhães, Jujú Vianna (esposa do governador Luis
Vianna), deputados, vereadores, todos torcedores do Vitória. Ela não conseguia
entender o por quê de tanta gente no estádio e esta coincidência do jornal mandar
ela cobrir. Ao conversar com Carlos Navarro, jornalista da sucursal31 do Estadão,
Zilah então percebeu o motivo de tanta gente no local. O presidente Geisel era
torcedor do Grêmio de Porto Alegre e como o jogo seria transmitido ele iria assistir e
é claro que os políticos baianos queriam aparecer na televisão. Mas um problema na
Embratel impediu que houvesse a transmissão do jogo e consequentemente o
presidente não assistiu o jogo. Zilah então escreveu a reportagem, que lhe rendeu
muitos elogios, intitulada: “Eles não foram vistos”.
A cobertura da morte de Carlos Marighella e Carlos Lamarca
Carlos Marighella e Carlos Lamarca, os dois dirigentes revolucionários de
maior expressão na luta armada no Brasil do final da década de 60 e início da
década de 70, tiveram trajetórias diferentes.
30
Na comemoração do centenário de O Estado de S. Paulo, em 4 de janeiro de 1975, a Polícia Federal liberou, sem cortes um suplemento histórico de 40 páginas de texto (mais de 67 cadernos, com seis paginas em média cada um, foram publicados nos meses seguintes), no qual o jornal contava sua trajetória, incluindo a resistência a todas as ditaduras. Carlos Chagas, que era o chefe da Sucursal de Brasília, ligou para os Mesquitas, na véspera da festa dos 100 anos, para dar a informação do ministro da Justiça, Armando Falcão, de que estava tudo liberado. No dia 3 de janeiro, os censores sumiram. Ruy Mesquita elogia a atitude do presidente. (MAYRINK, José Maria. op. cit., p. 116). 31
A sucursal foi instalada em 1973 e será explicada em “A saída das ruas e a chefia administrativa”.
Marighella tornou-se militante do Partido Comunista do Brasil aos 18 anos.
Sua vida política foi marcada pelo confronto do socialismo com o capitalismo,
fascismo e nazismo, a Era Vargas, O Stalinismo, a Segunda Guerra Mundial, a
redemocratização do Brasil no pós 45, a Guerra Fria, o imperialismo norte-
americano, o governo Juscelino Kubitschek, a Revolução Cubana, as lutas pelas
reformas de base no governo de João Goulart, o Golpe Civil-Militar, o AI-5. Assim,
falar de Carlos Marighella é passear por várias eras vivenciadas pelo Brasil e pelo
mundo.
Já a história de Carlos Lamarca segue um curso diferente. Semelhante com a
de tantos outros jovens, de origem pobre, e que buscam nas Forças Armadas, uma
formação, uma carreira. Aos 17 anos de idade, entra para a Escola Preparatória de
Cadetes e aos 29 anos se torna capitão do Exército. Vale lembrar que o capitão era
um exímio atirador, uma de suas principais características (JOSÉ, MIRANDA, 1984).
Mas em uma época marcada pela busca da libertação nos países da América
Latina, da miséria e da pobreza que o capitão conhecia de perto, Lamarca larga sua
carreira bem-sucedida no Exército, para se tornar revolucionário, comunista, o
capitão da guerrilha.
***
Carlos Marighella nasceu em Salvador em cinco de dezembro de 1911. Um
dos sete filhos do operário italiano, Augusto Marighella, e da baiana Maria Rita do
Nascimento, negra e filha de escravos oriundos do Sudão. Conheceu a prisão
durante o governo Vargas, em 1936, acusado de subversão, foi torturado pela
polícia de Filinto Müller. Ao sair da prisão, entra para a clandestinidade, é preso e
torturado novamente em 1939, ficando preso até 1945 quando é beneficiado com a
anistia pelo processo de redemocratização do país. Em maio de 1964 é baleado e
preso por agentes do DOPS em um cinema no Rio de Janeiro. Libertado em 1965
por decisão judicial, no ano seguinte opta pela luta armada contra a ditadura militar
(BETTO, 2006).
O golpe civil-militar de 1964 foi o grande divisor de águas na vida do militante
que já passara por outros momentos difíceis nos vários governos brasileiros.
Socialista e integrante do Partido Comunista sentiu que o caminho para combater o
governo dos militares não seria pacífico. Para ele também, o discurso do seu partido
que substituiu a ação por uma burocratização dos revolucionárias não tinha tanto
embasamento. Para o revolucionário, os comunistas deveriam resistir à repressão,
combater o regime com luta. Ainda de acordo com Marighella era possível fazer a
revolução sem o partido e mais, sem o movimento social. Para Jacob Gorender
(1987, p. 98) o foquismo de Marighella se mantém, na medida em que a guerrilha
começa do zero, dissociada de qualquer movimento de massas e incorpora a função
de vanguarda política.
Nasce então a ALN, Aliança Libertadora Nacional, com base na ideologia de
Marighella, centrada na ação, na não submissão a comandos, as hierarquias, ao
centralismo. Com o lema “A obrigação do revolucionário é fazer a revolução” frase
impressa no cartaz da OLAS, Organização Latino-americana de Solidariedade, a
ALN de fato era a cara do revolucionário.
Diante do aumento da repressão pela Ditadura e no desdobramento do
seqüestro do embaixador americano Charles Burke Elbrick, a busca por Carlos
Marighella tornou-se questão de honra para os militares32.
A morte de Carlos Marighella acontece quando ele, sem saber que os padres
dominicanos, Frei Fernando e Frei Ivo, haviam sido presos pelo delegado do DOPS,
Sergio Fernando Paranhos Fleury, e vai ao encontro deles. O delegado, com um
forte esquema policial, leva os padres para a Alameda Casa Branca, o ponto de
encontro entre os padres e o revolucionário. Disfarçado com uma peruca, Carlos
Marighella se aproxima e é reconhecido. Começa assim o tiroteio que culmina na
morte do revolucionário33.
32
Não dependia exclusivamente do depoimento dos religiosos a descoberta dos pontos de apoio aos que lutavam na capital bandeirante. A pista dessa rede começou a ser levantada pela repressão desde setembro, após o seqüestro de Embaixador Charles Burke Elbrick e a queda de um comando armado na Alameda Campinas, em São Paulo, no dia 24 daquele mês. Acusados de pertencerem à ALN, havia, em fins de outubro, mais de vinte presos políticos. Surpreendido pelas primeiras ações armadas, o aparelho repressivo equiparara-se para enfrentar o novo desafio. Em novembro de 1969, antes do cerco aos dominicanos, ele já detinha considerável soma de informações, inclusive a nosso respeito. Sabia que auxiliávamos refugiados políticos. Sabia que alguns frades tinham contatos com Carlos Marighella. Sabia que o Convento das Perdizes não fechara as suas portas aos perseguidos e às suas famílias. Por isso, na madrugada de 3 para 4 de novembro, a equipe do delegado Fleury invadiu nossa casa à Rua Caiubí (BETTO, Frei. Batismo de Sangue: Guerrilha e Morte de Carlos Marighella – 14 ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: Rocco, 2006, p. 131). 33
De dentro do Volks, Ivo reparou quando Marighella, sozinho, caminhava do outro lado da rua. Conhecia-lhe o porte e o passo. Apesar da peruca que usava, o comandante da ALN foi reconhecido pelos policiais antes de aproximar-se do carro. O tiroteio teve início, enquanto policiais abriam a porta do Volks e retiravam bruscamente os religiosos, pelo lado esquerdo. Ivo foi mordido nas nádegas pelo cão do DOPS. Deitados na
Agentes dos serviços de informação da polícia e das Forças Armadas
reivindicavam, cada um para sua equipe, o sucesso da operação. O Estadão
publicou a versão oficial concedida pelos militares de que frades dominicanos
entregaram Marighella e que ele morreu em um tiroteio e não que teria sido
metralhado em uma emboscada (MAYRINK, 2008, p. 51).
Apesar de a morte do revolucionário baiano Carlos Marighella ter acontecido
em São Paulo, Zilah Moreira teve uma participação também na cobertura. Luiz
Guilherme recorda que Zilah afirmara que O Estadão havia mandado uma
mensagem via western para a correspondente dizendo: “Mataram Marighella” e que
era para ela providenciar uma boa reportagem. Ela lembrou então que o guerrilheiro
tinha um irmão na Bahia, Caetano Marighella, que trabalhava na Petrobrás e que
morava no bairro de Periperi. No outro dia, ela então pegou seu Fusca e foi atrás de
Caetano. Ele estranhou a chegada da jornalista e perguntou o que ela estava
fazendo lá. Zilah então disse que iria dar uma carona para ele e no caminho contou
o ocorrido com o seu irmão. Quando chegaram na sede da Petrobrás, na Jequitaia,
os policiais já estavam a postos e abordaram o carro dela. Um deles disse: “Esquece
o que você viu e esquece o que você ouviu”.
Ela e Caetano ficaram uma hora juntos antes de serem levados pela policia.
O irmão de Marighella disse a ela que o revolucionário tinha um filho em Salvador,
chamado Carlos Marighella Filho. Ela combinou com Caetano para ele levá-la até o
menino. Como ela chegou com o irmão do revolucionário e os agentes do Exército o
abordaram no veículo dela, a jornalista recebeu um telefonema em que um agente calçada, os dois ficaram com o rosto virado para o chão. Não viram Carlos Marighella tombar morto do outro lado da rua. Apenas ouviram o tiroteio intermitente, que não deve ter durado mais de três ou quatro minutos. Cessada a fuzilaria, Fernando viu sair de uma camioneta estacionada perto do Volks um homem moreno, alto, elegantemente vestido, que foi trazido pelos policiais e algemado com os frades. Os três foram embarcados num camburão e conduzidos ao DOPS. Tudo seria simples e confirmaria a versão policial de que pesa sobre dois dominicanos a exclusiva responsabilidade pelo assassinato do famoso combatente comunista, se outros episódios e fatores não viessem comprovar, como veremos, que a "Operação Bata Branca" foi bem mais complexa do que se supõe. O cerco à Alameda Casa Branca só foi levantado uma hora após a morte de Marighella. Por que razões a polícia manteve o local inacessível por esse tempo? Uma delas, para pôr o corpo da vítima dentro do carro, a fim de reforçar a versão de anuência dos religiosos à cilada policial. Ao ser liberada a rua, a imprensa pôde constatar que ali se passara algo mais que o fuzilamento de Marighella: a investigadora Estela Borges Morato fora atingida por um tiro na testa, do mesmo calibre usado pelo delegado Fleury. Veio a falecer três dias depois. O protético alemão Friederich Adolf Rohmann, que se recusara a parar seu Buick (era neurótico de guerra e estivera em campo de concentração), estava morto. O delegado Rubens Cardoso de Mello Tucunduva, um dos responsáveis pela Operação', fora baleado na coxa direita. (Idem, p. 137-138).
dizia que se procurasse o rapaz ela iria se entender com a polícia. Teimosa, ela
desobedeceu e foi ver o menino. Mas já era tarde. Os agentes já haviam levado-o
para São Paulo. Ela então escreveu uma reportagem sobre o que havia acontecido
com o irmão de Marighella e o caminho do filho do revolucionário até São Paulo.
***
Carlos Lamarca foi um dos líderes da oposição armada à Ditadura Militar
brasileira. Capitão do Exército Brasileiro abandonou as Forças Armadas em 1969
tornando-se um dos comandantes da Vanguarda Popular Revolucionária,
organização da guerrilha armada de extrema-esquerda que combatia o regime. Em
Salvador, a VAR-Palmares, Vanguarda Armada Revolucionária Palmares, tinha
como tônica de luta a defesa dos direitos democráticos cerceados pelo poder
ditatorial implantados, sobretudo, após o AI-5·.
Lamarca não era um intelectual, um teórico, à vontade com as discussões da
revolução que tanto impulsionaram as organizações de luta armada. Ingressou na
guerrilha pela indignação com as injustiças do mundo, a miséria.
Mas, ao que se vê ele também não parecia satisfeito ali. Da Vanguarda
Popular Revolucionária ele partiu para o MR-8,34 Movimento Revolucionário Oito de
Outubro, da cidade para o campo, a vida dentro do sertão baiano, lugar que para ele
a sua ideologia iria se concretizar, mas culminou com a sua morte.
O capitão da guerrilha era casado com Iara Iavelberg, psicóloga e professora,
que também era integrante do MR-8. Quando Lamarca deixou o Exército, Iara e os
filhos foram para Cuba, com o intuito de retornar e trazer o socialismo para o Brasil.
Um encontro que jamais aconteceu. Para tentar amenizar a distância o guerrilheiro
escrevia cartas35 para a sua amada.
34
A cidade de Feira de Santana foi a principal base do MR-8, além da capital baiana. Contudo, em virtude de serem iniciantes, não houve nenhum trabalho prático naquela cidade, apenas a realização freqüente de discussões teóricas. Os levantamentos cartográficos e mapas de estradas de cidades como Feira de Santana, Vitória da Conquista, regiões do baixo e médio São Francisco e nordeste do estado indicam um esforço da organização em ampliar suas bases no interior. (DA SILVA SOUZA, Sandra Regina Barbosa. Bandeira Vermelha: aspectos da resistência armada na Bahia. In: ZACHARIADES, Grimaldo [Org.]. Ditadura Militar na Bahia: novos olhares, novos objetos, novos horizontes. Salvador: Edufba, 2009, p. 143). 35
Quando estou longe de você, tudo muda. É outro mundo, falta aquele calor que só emana de você mesma – fico imaginando e me delicio com tua lembrança, tôda viva, junto de mim. Continuo então aguardando ansiosamente a oportunidade de te encontrar, olhar dentro de teus olhos lindos (perguntadores e atentos
Lamarca escondido, na sua solidão no sertão baiano, em Pintadas, foi
encontrado pelo Exército Brasileiro e morto no dia 17 de setembro de 1971, na
chamada Operação Pajussara, comandada pelo major Cerqueira, em que os
militares afirmam que houve o apoio da população na caçada ao guerrilheiro (JOSÉ,
MIRANDA, 1989).
Na sede do Estadão, o secretário de redação Oliveiros Ferreira, recebeu um
telefonema dizendo que estava proibido publicar qualquer coisa referente ao estouro
de um aparelho (esconderijo) em Salvador. No outro dia ele recebe outro
telefonema: “É proibido publicar qualquer coisa referente a operações no sertão da
Bahia” (MAYRINK, 2008).
Raul Bastos então ligou para Zilah Moreira dizendo que queria mais
informações sobre o caso Lamarca e que iria mandar um repórter para a região em
que ele foi morto e que ela ficasse atenta para a chegada do corpo em Salvador. O
repórter José Roberto foi o enviado especial do jornal para a cobertura da morte do
ex-capitão do Exército.
Quando o corpo de Lamarca chegou ao Instituto Médico Legal de Salvador,
Zilah Moreira já estava a espera, de plantão. A jornalista entrou então para ver o
corpo do ex-guerrilheiro. Carlos Navarro, que estava junto da jornalista, conta que
neste momento Zilah enxergou umas marcas estranhas no corpo de Carlos
Lamarca:
– E além das marcas de bala, ele tinha umas marcas em baixo, mas não
eram de balas, parecendo que enfiaram o sabre nele. O famoso Charles Pittex, um
legista que colocava o charuto no dedão do pé do defunto, disse que era para
esquecerem o que estavam vendo e que aquilo era marca de bala. Eu me lembro
que as pessoas que falaram disso fui eu, Zilah e uma menina repórter do jornal O
Globo e falamos que aquilo não era bala, era marca de sabre.
A reportagem de Zilah Moreira, “Cai Lamarca no Sertão Baiano” (Figura 8),
deixou os militares furiosos. O verbo insinuava a queda de um herói. Na reportagem
olhos), te abraçar, te beijar (queridinha) e amar. Já vi que não sei mais passear, só após a guerra poderemos passear – qualquer pedaço de rua, ainda teremos, é visto por mim taticamente como um campo de luta. (STUDART, Hugo. O guerrilheiro apaixonado. Istoé Independente, São Paulo, 28 de fevereiro de 2007. Disponivel em: http://www.istoe.com.br/reportagens/1356_O+GUERRILHEIRO+APAIXONADO. Acessado em: 18 jul. 2011).
Zilah Moreira diz que a imprensa tomou conhecimento da morte do ex-oficial
somente dois dias depois, mas revelaram detalhes da operação36.
A reportagem que foi capa do
jornal, também traz um breve histórico de
toda a operação, intitulada “Caçada
começa em agosto37.”
Em 21 de setembro de 1971, é
publicada outra reportagem de Zilah
Moreira, em parceria com os jornalistas
da sede do Estadão que diz os prováveis
substitutos de Lamarca e o reforço na
busca da esposa do guerrilheiro, Iara
Iavelberg (anexos, p. 73-74).
Em uma ação no bairro da Pituba,
em Salvador, agentes do Exército
invadiram a casa da mulher do
guerrilheiro. Iara para não se entregar,
suicidou-se. Esta foi a versão dada pelos
militares e que mais tarde, em 2003, seria
confirmada após exumação de seu corpo.
Mas, quando soube da morte da esposa
de Lamarca, Zilah foi até o local onde foi
interceptada pelo coronel Arthur Gomes
de Carvalho, superintendente da Policia Federal na Bahia, que disse que ela estava
proibida de noticiar o caso. Como sempre, destemida, Zilah Moreira não obedeceu e
mandou um telex para o Estadão dizendo que a Polícia Federal não autorizou
36
Os cadáveres de Lamarca e de seu companheiro José Campos Barreto, que morreu no mesmo tiroteio, então desde sexta-feira a noite no necrotério do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, em Salvador, onde estiveram, ontem a tarde, o governador da Bahia, Antonio Carlos Magalhães e o secretario de Segurança Publica, Joalbo Figueiredo. Os jornalistas puderam vê-los, às 16 horas, mas não tiveram autorização para fotografá-los. Numa mesa de mármore da sala de necropsia, coberto por um lençol branco, Lamarca apresentava um grande hematoma no olho esquerdo e seu braço esquerdo, caído para fora da mesa, tinha a falange do dedo indicador estraçalhada. “Lamarca levou mais de quatro tiros”, disse o Dr. Charles Pittex, o médico legista. (MOREIRA, Zilah. O Estado de S. Paulo, 19/09/1971, anexos p. 72) 37
idem
Figura 8: Cai Lamarca no sertão baiano. Reportagem de Zilah Moreira sobre a morte de Lamarca.
noticiar o caso, mas estava informando que Iara Iavelberg, esposa de Lamarca,
havia morrido. Ela então preparou uma reportagem em que traz todo o histórico da
guerrilheira e o seu sepultamento.
***
E assim a jornalista marcou história no jornalismo baiano e brasileiro, já que
fez importantes coberturas como a morte de Carlos Marighella, Carlos Lamarca e
Iara Iavelberg em um período conturbado da história política brasileira.
A saída das ruas e a chefia administrativa
A correspondência de Salvador estava vinculada à sucursal do Estadão em
Recife, única no nordeste, e que era chefiada pelo jornalista Carlos Garcia. Com a
promulgação do AI-5, o governo do presidente Emílio Garrastazu Médici, a Bahia
sendo governada por Antônio Carlos Magalhães e com o aumento da demanda por
reportagens, tudo isto, entusiasmou o dono do periódico a criar uma equipe de
jornalistas na Bahia, isto é, a criar uma sucursal na Bahia, o que tornava o jornal
ainda mais poderoso no âmbito nacional.
Assim, Júlio Mesquita Neto, que já tinha uma ótima relação com Zilah
Moreira, inclusive quando esteve na Bahia dispensou hotel, carro particular e ficou
hospedado na casa da jornalista e saia somente com ela em seu Fusca, fato
lembrado por Carlos Navarro e pela escritora Cleonfe Martins, conversou com Zilah
Moreira para que ela selecionasse um jornalista, a princípio, para auxiliá-la e o chefe
da sucursal de Brasília iria contratá-lo.
Como Zilah Moreira estava instalada na redação do Jornal da Bahia e já vinha
analisando o trabalho de dois jovens repórteres do periódico, Carlos Navarro e
Mariluce Moura, resolveu prestigiá-los.
Carlos Navarro lembra que em setembro de 1971, uma sexta-feira, pouco
antes das nove da manhã, ele tinha chegado à redação do Jornal da Bahia, que
estava localizado no antigo prédio da Barroquinha. Como já era de praxe, ele foi
direto a sala do chefe de reportagem pegar a pauta, pois o fotógrafo, Vigota, já o
esperava, até que foi interceptado por Zilah Moreira, que então perguntou:
– Quer vir trabalhar comigo?
– Eu não. Eu tenho juízo. Disse ele.
– Estou falando sério, trabalhar no Estadão. O diretor da sucursal de Recife
está aí e nós vamos almoçar com ele.
Navarro conta que Zilah era muito debochada, então, era difícil de acreditar. E
como ela tinha saído da sala do secretário de redação, Rafael Pastore, e tinha o
deixado rindo muito, ele então não deu muita importância. Foi fazer uma reportagem
sobre o DETRAN -BA na Praça da Piedade. No retorno à redação, Zilah o chamou e
disse que o Estadão tinha interesse em montar uma sucursal em Salvador e que a
havia mandado escolher um jornalista para ajudá-la. Como, no dia, Carlos Navarro
tinha chegado primeiro que Mariluce Moura – outra opção de Zilah Moreira – ela fez
o convite para o jornalista e ambos foram almoçar com Carlos Garcia.
Mas a sucursal não foi criada de imediato. Eles passaram dois anos ainda na
redação do Jornal da Bahia até a criação do escritório do jornal paulista na Bahia.
Assim, em 1973, O Estado de S. Paulo cria o escritório em uma sala que Zilah havia
comprado no Edifício Bráulio Xavier, na esquina da Rua Chile com a Praça Castro
Alves. O Estadão havia mandado o jornalista que era o secretário gráfico, Cleonte
Pereira de Oliveira, para assumir a chefia da correspondência. No início não foi
muito fácil, pois Zilah se desentendeu com ele. Cleonfe Martins, filha do jornalista e
grande amigo de Zilah Moreira, Itaboraí Martins, afirma que a entrada de Cleonte foi
uma puxada de tapete na jornalista já que ela era a correspondente e foi ela a
responsável pela criação da sucursal. “Cleonte era gente boa, mas, não tinha nada a
ver com a Bahia. Era super paulista. Vivia em São Paulo de Piratininga.” Carlos
Navarro diz ainda que Cleonte Pereira veio para Salvador para viver em exílio, local
que abrigaria muitos outros jornalistas38.
38
A princípio, Salvador foi considerada “área de recuo”, no sentido de ser preservada de ações que atraíssem a atenção da ditadura militar. (...) Organizações como a VAR-Palmares e o MR-8 consideravam que Salvador deveria ser resguardada para a possibilidade de refugiar militantes procurados pela repressão em outros estados brasileiros. (DA SILVA SOUZA, Sandra Regina Barbosa. Bandeira Vermelha: aspectos da resistência armada na Bahia. In: ZACHARIADES, Grimaldo [Org]. Ditadura Militar na Bahia: novos olhares, novos objetos, novos horizontes. Salvador: Edufba, 2009, p. 128)
Cleonte Pereira ficou apenas um ano à frente da correspondência e depois
retornou a São Paulo e assim Zilah Moreira assumiu a chefia da Sucursal. Carlos
Navarro então tornou-se chefe de reportagem e responsável por formar a equipe
que iria compor a sucursal. A primeira equipe foi formada pelos jornalistas: Simão
Alves, operador do telex (que conviveu demais com Zilah enquanto esteve instalada
na redação do Jornal da Bahia), Carlos Gonzalez, Fernando Escariz, Pedro Formigli
(que era o chefe de reportagem de Navarro no Jornal da Bahia) e o fotógrafo
Agliberto Lima. Mais tarde chegaram Césio Oliveira, José Barreto de Jesus, Jadson
Oliveira, Luiz Coelho, José Carlos Teixeira, Emiliano José. Nos anos 80 entraram os
jornalistas mais novos, Biaggio Talento, Demóstenes Teixeira, Lenilde Pacheco,
Paulo Leandro.
– Naquela época ainda havia repórteres. O sujeito que recebe a pauta e vai
para a rua apurar, investigar e trazer a informação de volta para a redação. É bem
diferente de hoje porque não havia computador, não havia internet, então você tinha
que ir pessoalmente, as entrevistas eram presenciais, o sistema telefônico era
precário, principalmente se fosse fora de Salvador, interior do estado. Nós tínhamos
pautas discutidas, ou propostas por Salvador ou propostas por São Paulo.
Reuníamo-nos todos os dias sob o comando de Zilah Moreira, chefe da Sucursal.
Zilah ficou responsável pela Sucursal e fazia matérias especiais. Então ela ganhou
uma sala, ficou na área administrativa e fazia as reportagens, mas, no ritmo dela,
uma matéria especial, um pedido de São Paulo (por exemplo, a cobertura da
transmissão do jogo do Bahia contra o Grêmio pela Embratel) e que não precisasse
do corre-corre –, afirma Carlos Navarro.
Ainda de acordo com o jornalista, nos anos 70, a jornada de trabalho na
sucursal só se encerrava às 23 horas, uma hora antes de fechar a sede em São
Paulo. Com o passar do tempo este tempo diminuiu para as 19 horas. Final dos
anos 70, a sucursal mudou do antigo Edifício Bráulio Xavier para o Edifício Martins
Catharino, também na Rua Chile, no conjunto de salas em que funcionou a revista
Veja. Navarro lembra que inúmeras reportagens importantes no cenário nacional
foram realizadas pela sucursal39.
O chefe de reportagem disse que Zilah Moreira ficou na chefia da sucursal até
a sua aposentadoria, em 1985. A partir daí, já com os seus 63 anos de idade,
resolveu dedicar a sua vida aos servidores aposentados, presidindo a Associação
dos Servidores Aposentados da Bahia, saindo da entidade apenas para criar o
Instituto Casa do Jornalista40 com o intuito de acolher os jornalistas desamparados e
de ensinar os novos “focas” a enfrentar os desafios da profissão. Mas, a jornalista
não pôde ver seu desejo se cumprir. Zilah Moreira veio a falecer no dia 25 de
fevereiro de 2007, aos 85 anos de idade, devido a uma infecção hospitalar contraída
no Hospital Jaar Andrade, após a cirurgia para correção de uma fratura no fêmur. A
jornalista foi sepultada no dia 26 de fevereiro de 2007, às 16 horas, no Cemitério da
Ordem Terceira de São Francisco, em Salvador.
39Fizemos alguns trabalhos muito significativos. O maior deles, talvez, a cobertura da primeira viagem do papa,
em 1980. Em um trabalho de base, começamos a publicar matérias um mês antes, mostrando a Bahia política, social, econômica e cultural que João Paulo II iria conhecer. Mapeamos e acompanhamos cada passo de sua santidade em Salvador. Fiz um dos turnos, a primeira madrugada no Palácio Arquiepiscopal, da meia noite até a saída do papa, às seis horas. João Paulo II apareceu na porta principal do palácio, quando o dia amanhecia, cinzento, e, quando se dirigia às grades, que separavam o jardim da calçada da frente, para cumprimentar, a três metros de distancia, os fiéis do outro lado, passou pertinho de mim, aproveitei a falta de guardas por perto e toquei-lhe o braço. Foi o bastante para levar um safanão do cardeal Joseph Ratzinger, que chefiava a segurança, o mesmo que se envolveu nos problemas no Banco Vaticano e agora implica com a comunidade gay internacional. (TALENTO, Biaggio [Org]. A Sucursal: os 30 anos do Estadão na Bahia. Salvador: Bureau, 2003, p. 25).
40Ao tomar posse na presidência, em 28/06/2007, Zilah Moreira fez a seguinte declaração: “A nossa luta é pelos
jornalistas desamparados, no fim de carreira, e ao mesmo tempo pelos novos jornalistas, esses meninos que não viveram ainda a experiência dura da profissão, para que tenham um futuro melhor. Morrerei com muita felicidade se estes objetivos forem concretizados”. (A Tarde Online. Morre a jornalista Zilah Moreira. A Tarde, Salvador, 25 de fevereiro de 2008. Disponível em: <<www.atarde.com.br/cidades/noticia.jsf?id=843926>>. Acessado em: 25 de maio de 2011)
Figura 9: Zilah Moreira e jornalistas em reunião na ABI, Associação Baiana de Imprensa, para a criação do Instituto Casa do Jornalista. Foto: gentilmente cedida pela jornalista Mery Bahia
Considerações finais
azer o perfil biográfico de qualquer pessoa não é fácil. Quanto mais fazer o
de uma pessoa que já não está no nosso meio, que não era jornalista de
formação, mas se tornou correspondente de um importante jornal do Brasil
em uma época conturbada da vida política nacional. Mais difícil ainda é entrar nas
salas de aula de algumas faculdades de comunicação da Bahia e perguntar aos
estudantes que estão conhecendo o curso e os que estão formando quem foi à
jornalista Zilah Moreira e eles não souberem responder.
A realização deste trabalho proporcionou um conhecimento de parte do
jornalismo baiano que ficou guardado no esquecimento do tempo e que traz à tona a
história de Zilah Laura da Silva Moreira, marcada pelo início da ditadura militar,
pelas brilhantes coberturas da morte dos guerrilheiros Carlos Marighella e Carlos
Lamarca, pelos constantes embates com o ex – governador Antonio Carlos
Magalhães e sobretudo, nunca recuar diante das dificuldades, tornando-se a
repórter de todas as editorias do jornal O Estado de S. Paulo, na Bahia.
Zilah Moreira não foi somente uma jornalista competente, ética, íntegra,
combativa e responsável, que usou tão bem a sua profissão pelas causas sociais.
Pode-se dizer que ela também influenciou e até serviu de exemplo para muitos que
escolheram o Jornalismo como atividade profissional. Era o símbolo da resistência,
garra e determinação. Tudo isso fez de Zilah uma pessoa especial, amada pelos
amigos e colegas profissionais e respeitada até pelo mais arrogante de seus
oponentes; uma jornalista que soube entender tão bem a função social do jornalismo
e por ela se empenhou ao longo dos anos de atividade profissional. Uma jornalista
que viu nascer à ditadura e também a viu findar nas manifestações das “Diretas Já”.
Assim foi a trajetória de Zilah Moreira, primeira correspondente do Estadão na Bahia
e pioneira no jornalismo no estado.
F
Apêndices
A: Entrevista com o jornalista Carlos Navarro
1. Como o senhor ingressou no jornalismo? Por que escolheu a profissão? Qual
foi o primeiro veículo?
Eu faço jornalismo desde garoto. Com 13, 14 anos de idade eu tinha um
programa de rádio, “A Voz do Estudante”, lá em Alagoinhas e pouco tempo
depois me engajei em uma turma que editou uma revista local chamada
“Revistinha Cometa”. Eu já fazia política estudantil e me engajei na política
convencional. Eu fiz vestibular para jornalismo, passei e vim estudar em
Salvador. Simultaneamente, quando eu passei no vestibular, um amigo de
Alagoinhas chamado Alan Garcia, que já morreu, trabalhava no Jornal da
Bahia e me levou para trabalhar lá.
2. O jornalismo era muito diferente naquela época?
Era muito diferente. Naquela época ainda havia repórteres. O sujeito que
recebe a pauta e vai para a rua apurar, investigar e trazer a informação de
volta para a redação. É bem diferente de hoje porque não havia computador,
não havia internet. Então você tinha que ir pessoalmente, as entrevistas eram
presenciais, o sistema telefônico era precário, principalmente se fosse fora de
Salvador, interior do estado. Então, naquela época, eu diria que ainda
existiam repórteres, um sujeito que vai para a rua pedir informação. Hoje, em
qualquer redação, o sujeito recebe três, quatro pautas, na sua mesa mesmo
ele levanta, telefona, vai no Google e produz as suas matérias. Eu acho que
essas matérias são tão pasteurizadas, tão iguais em todos os jornais, em
todos os blogs que as fontes são praticamente as mesmas. Naquela época
haviam as agências de notícias internacionais e nacionais.
3. O senhor era do Jornal da Bahia. O que te fez sair do jornal e ingressar no
Estadão?
É. Eu comecei no Jornal da Bahia, quando eu passei no vestibular em 1969 e
um ano e meio depois eu entrei no Estadão justamente pelas mãos de Zilah
Moreira. Haviam alguns repórteres novos no Jornal da Bahia e quem mais se
destacava era eu e Mariluce Moura, uma moça que se mudou para São Paulo
e era uma repórter brilhante também. E tinham pedido a Zilah um repórter
para ajudá-la. Na época ela era correspondente do Estadão. Então, ela me
contou depois que tinha eu e Mariluce e aquele que chegasse primeiro na
redação no dia que ela estava lá, que era um dia de sábado ela escolheria
para fazer a entrevista com o Carlos Garcia que era o diretor da Sucursal de
Recife, isso no final de 1970. A Bahia, politicamente no jornal, pertencia a
Pernambuco que era a única sucursal que tinha no Nordeste. Normalmente
todo moleque faz farra na sexta-feira, especialmente em redação, e era um
dia que eu nunca chegava cedo. Mas, nesse dia quem se atrasou foi Mariluce
e foi ai que Zilah me escolheu. Ela me perguntou se eu queria conversar com
o Garcia e foi assim que eu entrei no Estadão.
4. E como Zilah Moreira ingressou no jornal?
A história de Zilah é curiosa no jornalismo. O irmão dela era jornalista,
chamado Roschild Moreira. Trabalhava no jornal A Tarde e era
correspondente do Estadão. Isso anos 60, não me lembro muito bem. Talvez
início dos anos 60 e, o Roschild morreu. Como tinha filhos pequenos, o jornal
para ajudar a família – porque naquela época as pessoas não eram
contratadas, eu mesmo só fui contratado quatro anos depois de entrar no
Estadão – e mantiveram Zilah até como maneira de ajudar as crianças até
elas atingirem a maioridade. O jornal era um jornal de família, não é como
hoje uma empresa, então as pessoas gostaram da Zilah e ela foi ficando.
Zilah era advogada, não era jornalista. Ela aprendeu na prática, pela
tenacidade dela, ela era muito despachada. Sem nunca ter feito jornalismo,
de repente começou a fazer matéria, cobrir esportes e assim ela virou
jornalista no Estadão. Naquele tempo, o jornal não tinha sucursal, não tinha
base aqui, então ela se instalou no Jornal da Bahia, talvez pela ligação da
família Mesquita com João Falcão, não sei direito. E Zilah ficava lá porque
naquele tempo você passava as matérias ou por telefone, ou por rádio
(western) ou pelo telex. E o Jornal da Bahia tinha o telex.
5. Tinha outras mulheres no jornalismo baiano naquela época? E no Estadão
aqui na Bahia, teve outras ou pode-se dizer que ela foi pioneira?
Foi em 1969 que houve a regulação da profissão, com a nova legislação da
ditadura. Manteve aquelas pessoas que não tinha diploma, até porque aqui
na Bahia os jornalistas eram advogados, ou faziam filosofia. Então, com a
regulamentação, os jornais começaram a procurar estudantes de jornalismo.
Nessa época no Jornal da Bahia de mulher, já estavam todas estudando,
Mariluce Moura, Ana Sampaio, Lúcia Ferreira. Na Tribuna da Bahia haviam
pouquíssimas, uma ou duas mulheres, Evanice e uma morena que não me
lembro o nome. Eram pouquíssimas.
6. É verdade que no início ela fazia reportagens de todas as editorias? Era fácil
para ela?
Olha para outras mulheres talvez era difícil. Não para Zilah. Com a
desenvoltura dela, com a espirituosidade ela entrava em qualquer lugar. Para
ela poderia ser um estádio de futebol, um palácio do governo. Zilah era muito
arisca. Falava muito, procurava e investigava.
7. Até então ela era correspondente. Como e quando o Estadão decidiu
implantar uma sucursal de fato?
Ficamos eu e Zilah até 1973 quando foi criada a sucursal. Criada a sucursal
veio um diretor de São Paulo, o Cleonte Pereira de Oliveira e aí nos
começamos a produzir matérias em um outro nível de trabalho que já não era
mais correspondência. Éramos no início três ou quatro repórteres. Eu passei
a chefiar a reportagem e nos produzíamos cinco, seis matérias por dia.
Começamos primeiro ali no Edifício Bráulio Xavier, na frente da Praça Castro
Alves. Agora com a sucursal já funcionando, nessa época já trabalhava eu,
Pedro Furmile, Gonzáles, Escaris, então a sucursal ganhou um dinamismo de
redação. Nós tínhamos pautas discutidas, ou propostas por Salvador ou
propostas por São Paulo. E não tinha muito sentido estar Zilah neste corre-
corre. E ela já era uma senhora. Então ela ganhou uma sala, ficou na área
administrativa, como chefe da sucursal e fazia as reportagens, mas no ritmo
dela, tipo uma matéria especial, um pedido de São Paulo e que não
precisasse do corre-corre. Eu me lembro que no começo Zilah nem
datilografava. Ela escrevia os textos a mão para Simão Alves, que era o
teletipista, datilografar.
8. E como era a relação do jornal com a sucursal? Como eram enviadas as
reportagens?
O Estadão tinha uma coisa positiva. Ele respeitava o seu trabalho. Ele era
conservador, mas protegia o repórter dele. O jornal podia até não publicar a
matéria, mas também não alterava.
9. Ela participou diretamente ou indiretamente da cobertura das mortes de
Carlos Lamarca e Carlos Marighella?
A morte de Marighella eu não estava no jornal. Mas a morte de Lamarca,
Zilah cobriu também. Eu fui fazer para o Jornal da Bahia e Zilah foi comigo
para o Estadão. A cobertura da morte de Lamarca o Estadão dividiu. Dois
repórteres foram para o local onde ele tinha sido morto. E outro grupo ficou
aqui. Eu estava no Jornal da Bahia nesta época. E eu vi, cheguei a tocar no
corpo de Lamarca no Nina Rodrigues. E, além das marcas de bala, ele tinha
umas marcas em baixo, mas não eram de balas, parecendo que enfiaram o
sabre nele. E ai o famoso Charles Pittex, um legista que colocava o charuto
no dedão do pé do defunto, disse que era bala. Eu me lembro que as pessoas
que falaram disso fui eu, Zilah e uma menina repórter do jornal O Globo e
falamos que aquilo não era bala, era marca de sabre. Charles Pittex
confirmou. Mas, um agente de segurança disse para gente que nós não
tínhamos visto nada e que tudo aquilo ali era marca de bala. E ninguém
publicou nada, nem eu nem a menina do Globo, nem Zilah. E Zilah esteve ao
meu lado o tempo todo. O caso de Iara, mulher de Lamarca, é um caso que
eu acabei assistindo. Zilah chegou e me disse: Aconteceu um tiroteio na
Pituba, vai pra lá. Eu fui. E ai duas coisas: primeiro ninguém sabia quem era
Iara, eles não divulgavam, fomos saber depois. Mas nesse dia teve um caso
interessante, que um cara foi morto com quatro tiros nas costas e o Cel. Luiz
Arthur (chefe da Polícia Federal na Bahia) disse que ele se matou, que
suicidou. Ai disse que o cara se matou com quatro tiros nas costas. E nesse
dia Iara morreu, nós não podíamos entrar porque ela morreu no apartamento
e hoje fica a dúvida se ela se matou ou não, mas me parece que ela
realmente se matou para não se entregar. Nós voltamos para a redação.
Invariavelmente o Cel. Luiz Arthur chegava na redação, com um papelzinho
na mão dizendo assunto tal proibido e ninguém podia dizer nada.
10. Ela é famosa também pelos conflitos com o ex-governador Antônio Carlos
Magalhães? Houve um tempo em que o próprio político pediu a cabeça d
Zilah Moreira no Estadão?
Ela se destacou muito aqui quando ousou na ditadura bater em Antonio
Carlos. Quando falo em bater é publicar matérias que não agradava Antonio
Carlos. Antonio Carlos então começou a persegui-la. Ele ainda prefeito, não
era nem governador. Quando eu entrei no Jornal da Bahia estava no início de
uma briga com Antonio Carlos. Antonio Carlos, prefeito se desentendeu com
João Carlos Teixeira Gomes e começou a perseguir o Jornal da Bahia. Não
chegou a fechar, mas quase que destruiu o jornal. No início, a redação tinha
35, 40 pessoas, ficaram seis ou oito. E Zilah possivelmente influenciada por
esse clima de reação a Antonio Carlos, fez matérias que não agradou a ele,
ameaçou demiti-la, mas naquele tempo os Mesquitas tinha pavor de Antonio
Carlos, já não estavam bem com a ditadura, já que o “ O Estado” ajudou a
fazer o Golpe de 64, mas logo depois rompeu devido a censura a imprensa.
Ela era tão espirituosa que ia para as entrevistas coletivas de Antonio Carlos,
ela peitava Antonio Carlos e isso deu muita notoriedade a Zilah, até porque o
Estadão garantia e divulgava e foi exemplo para todo mundo, com a coragem
de encarar um poderoso e ainda mais na Ditadura.
11. Eu soube que ela simpatizava muito com o ex-governador Roberto Santos.
Mas ele não foi governador indicado pelas Forças Armadas?
Eu acho que Zilah não tinha ideologia política. Se fosse olhar por esse lado
ela seria uma conservadora até porque ela era de uma família tradicional
daqui, pelos costumes, pela cultura dela, ela não tinha nada de
revolucionária. Agora eu mesmo fui amigo de Roberto Santos. O motivo era
porque nós brigávamos com Antonio Carlos.
12. O jornal deixou de circular alguma vez, neste período?
Não, ele nunca deixou de circular. O que acontecia era que se tinha uma
matéria que falava mal de Antonio Carlos, o malote que chegava aqui ou ele
comprava tudo na mão do distribuidor ou ele mandava apreender no
aeroporto.
13. Como era sua relação com Zilah Moreira?
Por muitos anos Zilah foi minha chefe. Ela era a correspondente e eu era uma
espécie de repórter auxiliar, embora eu fosse jornalista e ela não. As coisas
com São Paulo todas eram tratadas com Zilah. Quando instalou a sucursal,
Zilah meio que chefiando a parte administrativa e eu chefiando a redação.
14. Por que ela saiu do jornal?
Eu tenho impressão que Zilah se aposentou no início dos anos 80, porque em
88 nós nos mudamos para o Max Center e Zilah já não estava mais conosco.
Saiu para se aposentar.
15. Para o senhor, qual a importância de Zilah Moreira para o jornalismo baiano?
A vida, o trabalho distancia as pessoas. Quando eu deixei o jornal eu tive que
sair de Salvador porque aqui eu não podia trabalhar porque Antonio Carlos
não deixava. Boa parte dos meus amigos estavam trabalhando no governo,
mas mesmo assim eu não ia conseguir nada. Eu fui para São Paulo fazer
campanha política e só voltei para Salvador em 2004 para a campanha de
Nelson Pelegrino. Eu sou muito amigo do sobrinho dela, Marquinhos Moreira,
nós conversávamos muito por telefone, mas de Zilah eu tinha só notícias,
através de amigos em comum. Mas como Zilah já não andava mais nas
redações e eu vim para cá para fazer uma campanha, depois fui para a
Prefeitura, fiquei lá seis meses e sai para ir para o Tribunal de Justiça. Então
eu fiquei um pouco afastado. Mas claro que eu fui informado da morte dela,
fui para o velório, fui para o enterro e claro que entristeceu todo mundo.
16. Caso interessante:
Isso é um caso importante. Em 1965 Dr. Julio Mesquita veio aqui para
Salvador. Eu não sei se tinham preparado uma recepção para ele, mas foi
Zilah que foi o recebeu no Aeroporto com um Fusquinha todo velho
arrebentado. Ele circulou pela Bahia, dispensou carro oficial que o governo
botou a disposição com batedor e tudo e saia só com Zilah no Fusquinha
dela. Luiz Viana era o governador. Então ele ia com Zilah para as reuniões
com Luiz Viana. Estava recém inaugurado o Hotel da Bahia. E Zilah dirigia
mal pra burro, era barbeira.
B: Entrevista com a escritora Cleonfe Martins
1. Como a senhora conheceu Zilah Moreira?
Conheci Zilah, a Bahia, Silva Filho, J. Luna, Camafeu de Oxóssi e outros
porretas na mesma assentada. Em dois de julho de 1971. No dia do enterro
de Genaro de Carvalho (pintor e tapeceiro brasileiro). Nossa família estava de
férias em Salvador. Meu pai, Itaboraí Martins, até a aposentadoria foi
jornalista e editor do Estadão (editorias Trabalhismo e Sindicalismo). Zilah era
a correspondente do jornal naquela época. Conheci a tia Zilah no meu
primeiro encontro gastronômico com o “mui” amado acarajé (que não era dos
melhores) na Igreja do Bomfim. Ela veio chegando, com os braços abertos,
chamando meu pai: “Itabó”. Ela estava a mais ou menos 20 metros de
distância, acompanhada do Roschildinho, filho do irmão dela Roschild
Moreira, que foi correspondente do Estadão na Bahia.
2. Como era a relação de amizade entre a senhora e Zilah Moreira?
Minha relação com a tia Zilah era a de uma menina de 15 anos com uma
mulher mais velha que meu pai (que hoje tem 77 e eu 54) mas que fala a
língua de todas as idades. Acho que fiquei fascinada pela Zilah e pela Bahia
ao mesmo tempo.
3. A senhora a conheceu quando ela era correspondente do Estadão?
Sim. Ela era a correspondente do Estadão. Caso eu esteja enganada pela
memória, a sucursal ainda estava engatinhando. O primeiro diretor da
sucursal foi Cleonte Pereira de Oliveira. Grande puxada de tapete em Zilah
que jamais se conformou com o golpe baixo, em minha opinião e de muitos
outros amigos dela. Tinha tudo para ser ela. Cleonte, apesar de ser gente
boa, não tinha nada a ver com a Bahia para onde foi destinado. Sujeito
“super-paulista” (assim a Zilah o chamava) que adorava viver em São Paulo
de Piratininga. Recordo-me de Zilah falando a palavra carpete (carrrrpete)
imitando o Cleonte. Mas, em seguida ela assumiu a chefia administrativa.
4. Como era o comportamento dela com o período político da época?
Zilah detestava Antonio Carlos Magalhães mas era apaixonada por Roberto
Santos. Naquela época o jornal também não simpatizava com ele. E a Zilah
“descia a lenha” em ACM sem piedade. O que lhe custou muito caro mais
tarde. A grana ficou mais curta. Mas ela jamais mudou de lado, foi até o fim na
causa, no bloco do eu sozinho.
5. Qual a formação de Zilah Moreira?
Zilah era formada em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Alem de jornalista, advogou e deu aula de Educação Moral e Cívica nos anos
1970. Teve um escritório no Edifício Martins Catharino, onde fora também a
antiga sucursal do Estadão.
6. A senhora, como grande amiga da jornalista, pode dizer o que ela mais
gostava de fazer?
Ela gostava de viver, de participar, de um papo inteligente, de MOVIMENTO,
de rir e fazer rir, de desafios, dos sobrinhos e de fazer amizades. Era uma
casa cheia. Sempre com o mesmo tipo de roupa com blusas folgadissimas,
calça. Não estava nem aí. E todos a respeitava. Era relacionadíssima
conhecendo desde o governador à quituteira Dadá; a viúva de Corisco; o
Diabo Loiro de Lampião.
7. O que vocês faziam quando estavam juntas?
Nunca vi a Zilah sem uma dose de bom humor. Mesmo nos momentos
críticos. Era do bem, corajosa e ética. E era a rainha da impontualidade. O
relógio e o tempo para Zilah não passavam de detalhes. Quando eu estava
com ela eu ria muito. Ela tinha expressões, apelidos para tudo: “ataque de
periquito” (a pessoa se debate e o som que sai parece um periquito); “ataque
de borboleta” (se debate e não tem som). O fusca dela era o “cornovagen”.
Um americano que meu pai apresentou a ela – Alan Silberman, Adido
trabalhista no consulado de São Paulo – era o CAMONIBOY, e assim por
diante.
8. Como a senhora recebeu a notícia da morte da grande amiga?
Recebi a morte de Zilah Moreira em silencio eloqüente. Com reverência e
muita emoção que não reparto. Porque não da para repartir. Resolvi
homenageá-la com um artigo no jornal A Tarde. O texto foi elogiado pelo
jornal e os leitores. Meu pai ficou muito sentido com a morte dela. Zilah
representa para mim o que tem de melhor na nossa Bahia que tanto amo:
encontro soberbo de culturas e procedências. E o supra sumo do que existiu
(e não mais existe) na velha e querida imprensa. Nos velhos tempos de um
jornalismo mais artesanal.
9. Qual a importância de Zilah para o jornalismo?
Ela é pioneira , única, de vanguarda no jornalismo nacional. No tempo em que
a Zilah era correspondente do Estadão era a única mulher na função. E uma
das únicas em todo o jornal. Uma abridora de caminhos.
Anexos
Siglas
ABE Associação Brasileira De Educação
ABI Associação Baiana de Imprensa
ABI Associação Brasileira de Imprensa
ACM Antonio Carlos Magalhães
AI-5 Ato Institucional número 5
ALN Aliança Libertadora Nacional
ARENA Aliança Renovadora Nacional
DCE Diretório Central dos Estudantes
DETRAN–BA Departamento Estadual de Transito da Bahia
DIP Departamento de Imprensa de Propaganda
DOPS Departamento de Ordem Política e Social
EMBRATEL Empresa Brasileira de Telecomunicações
FMI Fundo Monetário Internacional
MR-8 Movimento Revolucionário Oito de Outubro
OLAS Organização Latino-americana de Solidariedade
PCB Partido Comunista Brasileiro
PRP Partido Republicano Paulista
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
UEB União dos Estudantes da Bahia
UDN União Democrática Nacional
VAR–PALMARES Vanguarda Armada Revolucionária Palmares
Créditos das Imagens
Página Figura Descrição
10
1
Primeira capa do jornal A Província de S. Paulo. Acervo: homepage da Escola de Comunicação e Arte da Universidade de São Paulo <<http://www.eca.usp.br/pjbr/arquivos/documento4_b.htm>>
14
2
Júlio Mesquita e jornalistas na sede do jornal. acervo: homepage do O Estado de São Paulo <<http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,trajetoria-de-um-jornalista-liberal-julio-de-mesquita-filho,471570,0.htm>>
17
3
Júlio de Mesquita Filho embarcando para o segundo exílio, no governo Getúlio Vargas. Acervo: homepage do O Estado de S. Paulo <<http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,trajetoria-de-um-jornalista-liberal-julio-de-mesquita-filho,471570,0.htm>>
23 4 Fotografia de Zilah Moreira com 80 anos de idade. Acervo: Arquivo da Família.
34
5
Trecho do jornal O Estado de S. Paulo com reportagem de Zilah Moreira sobre a impugnação do candidato Luiz Vianna Filho ao Senado, 04/09/1974. Acervo: José Maria Mayrink, Mordaça no Estadão, p. 204.
37 6 Recorte do editorial “Instituições em Frangalhos”, 13/12/1968. Acervo: José Maria Mayrink, Mordaça no Estadão, p. 153.
41
7
Recorte do jornal O Estado de S. Paulo com o “Canto Décimo” de Luiz de Camões, no lugar de uma reportagem censurada pelo DOPS, 07/05/1974. Acervo: José Maria Mayrink, Mordaça no Estadão, p. 195.
52
8
Reportagem na capa de Zilah Moreira sobre o assassinato do guerrilheiro Carlos Lamarca, 19/09/1971. Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo.
57
9
Zilah Moreira e amigos jornalistas em reunião para criação do Instituto Caso do Jornalista na Associação Baiana de Imprensa. Acervo: Arquivo da jornalista Mery Bahia
67
10
Relatório interno produzido pelo jornal O Estado de S. Paulo sobre as reportagens que foram censuradas por telefone pela Polícia Federal. Acervo: José Maria Mayrink, Mordaça no Estadão, p. 154
68
11
Em destaque, reportagem de Zilah Moreira na cobertura do XX Campeonato Brasileiro de Snipe, realizado na Baía de Todos os Santos, em Salvador, em 14 de janeiro de 1969. Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo
69
12
Reportagem em conjunto com a Sucursal do Rio de Janeiro, do serviço local e da correspondente em Salvador, Zilah Moreira. Na reportagem, Zilah traz informações de autoridades baianas que foram ouvidas devido à vigência do Ato Institucional nº 5 Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo
70
13
Reportagem sobre a inauguração da avenida Castelo Branco pelo então prefeito de Salvador Antonio Carlos Peixoto Magalhães Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo
71
14
Reportagem sobre a crise do Esporte Clube Bahia no Campeonato Roberto Pedrosa Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo
72
15
Capa do Estadão o sobre o assassinato de Carlos Lamarca. Nela Zilah retrata o que viu no Instituto Médico Legal. Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo
73
16
Na reportagem Zilah Moreira retrata os possíveis substitutos de Carlos Lamarca na luta armada contra a ditadura militar Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo
74
17
Nesta reportagem, Zilah Moreira traz um apanhado histórico sobre a vida de Iara Iavelberg, esposa de Carlos Lamarca Acervo: Arquivo Público do Estado de São Paulo
75
18
Reportagem em que é noticiado a situação de miséria dos baianos Acervo: José Maria Mayrink, Mordaça no Estadão, p. 170
76
19
O A Tarde online foi o primeiro veículo a noticiar o falecimento da jornalista Acervo: site do jornal A Tarde (www.atarde.com.br)
76
20
Itapoan online também foi outro meio de comunicação que noticiou a morte da jornalista Acervo: Portal Itapoan Online (www.itapoanonline.com.br)
Fontes Primárias
1. Arquivos e Bibliotecas Arquivo Público do Estado de São Paulo, seção Júlio de Mesquita Biblioteca Basílio Catalá Castro da Faculdade 2 de Julho Biblioteca Central do Estado da Bahia Biblioteca Central Universitária da Universidade Federal da Bahia
2. Entrevistados Carlos Navarro Filho (jornalista), realizada em 4. Abr. 2011 Cleonfe Martins (escritora), realizada em 6. Abr 2011 Evanice dos Santos – jornalista, realizada em 20/01/2011 Luiz Guilherme Tavares – jornalista, realizada em 08/01/2011 Lídia Silva – Jornalista, realizada em 14/04/2011 Mery Bahia – jornalista, realizada em 08/02/2011 e 20/03/2011 Raul Bastos – Jornalista, realizada em 05/11/2010
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