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CURSO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA JENIFER BERTO O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL MARINGÁ 2013

O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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Trabalho de Conclusão de Curso

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Page 1: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

CURSO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA

JENIFER BERTO

O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

MARINGÁ 2013

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JENIFER BERTO

O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Famma – Faculdade Metropolitana de Maringá, como parte dos requisitos para obtenção do título de Bacharel em Publicidade e Propaganda. Orientadora: Prof(a).: Elisa Peres Maranho

MARINGÁ 2013

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a minha orientadora, Elisa, pelo conhecimento teórico e os

direcionamentos que tornaram este trabalho possível. Ao Ronaldo, meu namorado

por me auxiliar com paciência e sempre me motivar. Agradeço também aos

professores Bruno Scartozzoni e Daniel Padilha por contribuírem cientificamente

com este trabalho e, finalmente, sou muito grata ao vice-presidente da Panvel

Farmácias, o Sr. Julio Mottin Neto, por viabilizar parte das análises realizadas neste

trabalho ao fornecer informações essenciais, através de uma entrevista.

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BERTO, Jenifer. O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL. 62 f. Graduação – FAMMA. Orientadora: Elisa Peres Maranho. Maringá, 2013.

RESUMO

Em uma era na qual a tecnologia avançou de tal forma que existem diversas

plataformas de comunicação e inúmeras formas de se obter conteúdo, as pessoas

tem sido bombardeadas por informações, que chegam de todos os lados.

Justamente por isso, elas passaram a filtrar melhor as mensagens e estímulos que

recebem. Por conta disso, a publicidade não tem sido considerada mais um

conteúdo tão atrativo, a menos que esteja incorporado dentro de um contexto bem

trabalhado. Dessa forma, inserir ou desenvolver histórias para projetar dentro delas

os produtos ou marcas é uma técnica bastante útil e eficiente, pois promove uma

melhor significação do público com o que está sendo comunicado e, assim, cria-se

uma maior aproximação entre marca e consumidor. Por isso, o intuito desse trabalho

foi analisar o uso da técnica de Storytelling aplicada à propaganda enquanto

ferramenta de criação de valor de marca. Para tanto, este trabalho se volta para o

estudo de caso da campanha que originou o vídeo “A História de Sofia”, cujo

anunciante é a rede de farmácias Panvel.

PALAVRAS-CHAVE: Storytelling, Branding, Panvel.

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BERTO, Jenifer. THE USE OF STORYTELLING AS A WAY OF HELPING THE CREATION OF BRAND VALUE: PANVEL CASE STUDY. 63 f. Graduation – FAMMA. Supervisor: Elisa Peres Maranho. Maringá, 2013.

ABSTRACT

We are living an era in which technology has developed in such way that there

are many communication platforms and loads of different ways of getting content. In

consequence of that, people have been stuffed with information that comes from

everywhere and, because of this, they began to filter all messages and stimulations

that they receive. Hence, advertising has become something that does not attract

people so much anymore, unless it is incorporated into a well-developed context.

This way, it is possible to realize that the insertion or development of stories in order

to project products or brands inside of them is a very useful and efficient technique,

once it provides a better signification of what is being communicated and, by doing it,

brand and consumer develop a closer and stronger relationship. Having that in mind,

the aim of this paper is to analyze the use of the storytelling technique applied to

advertising as a way of help to create brand value. In order to do that, this paper

studies the case of the campaign which originates the video “A História de Sofia”

(“The Story of Sofia”), who responsible is the pharmacy Panvel.

PALAVRAS-CHAVE: Storytelling, Branding, Panvel.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 1

2. REFERENCIAL TEÓRICO.................................................................................... 3

2.1 A ERA DA CONVERGÊNCIA ............................................................................. 3 2.2 STORYTELLING: DEFINIÇÕES E ESTRUTURA DA HISTÓRIA........................ 6 2.3 RECURSOS PARA CONSTRUÇÃO DE HISTÓRIAS ....................................... 14

2.4 BRANDING: GERENCIAMENTO DO VALOR DE MARCA ............................... 16

3. METODOLOGIA ................................................................................................. 25

4. ANÁLISES DO OBJETO DE ESTUDO .............................................................. 27

4.1 O OBJETO DE ESTUDO .................................................................................. 27 4.2 ANÁLISE DE STORYTELLING ......................................................................... 37

4.2.1 ESTRUTURA ............................................................................................. 38 4.2.2 GÊNERO .................................................................................................... 38

4.2.3 SIGNIFICADOS NA NARRATIVA .............................................................. 39 4.2.4 PROTAGONISTA ....................................................................................... 39 4.2.5 O INCIDENTE INCITANTE ........................................................................ 41

4.2.6 COMPLICAÇÕES PROGRESSIVAS ......................................................... 41 4.2.7 CRISE ........................................................................................................ 42

4.2.8 CLÍMAX E RESOLUÇÃO ........................................................................... 43

4.2.9 ESTRUTURA DE SCARTOZZONI ............................................................. 43

4.3 ANÁLISE DE VALOR DE MARCA .................................................................... 44 4.3.1 FIDELIDADE .............................................................................................. 44

4.3.2 QUALIDADE PERCEBIDA/LIDERANÇA .................................................... 46 4.3.3 ASSOCIAÇÕES/DIFERENCIAÇÃO ........................................................... 47 4.3.4 CONSCIENTIZAÇÃO ................................................................................. 50

5. CONCLUSÕES ................................................................................................... 52

6. REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 54

7. APÊNDICES ......................................................................................................... 56

7.1 ENTREVISTA COM JULIO MOTTIN NETO ...................................................... 56

7.2 ENTREVISTA COM BRUNO SCARTOZZONI .................................................. 59 7.3 ENTREVISTA COM DANIEL PADILHA ............................................................ 62

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1. INTRODUÇÃO

Desde muito nova, sempre fui fascinada pela leitura, influenciada por pais que

praticamente colecionavam livros em casa. Mergulhar em uma nova história era o

melhor passatempo possível e, por gostar tanto desses mundos imaginários, decidi

desde então que um dia publicarei um livro. Não um livro qualquer, mas um Best

Seller da literatura contemporânea. Por ter esse gosto por histórias, desde o final do

terceiro ano do curso de Publicidade e Propaganda, tenho me interessado por uma

prática instigante: o uso de histórias aplicado à publicidade como forma de projetar a

marca em um conteúdo que cativa o consumidor, ou seja, o Storytelling.

Pesquisando mais a fundo, pude constatar que essa estratégia, vem a suprir uma

necessidade real que é enfrentada hoje em dia pelos profissionais da área. Na era

atual, existe uma sobrecarga de informação, que gera conteúdo e estímulos por

diversas plataformas, de diversas modalidades. Por isso, as pessoas filtram cada

vez mais as informações que recebem e não prestam atenção em coisas

desinteressantes, mas sim naquilo que permite a elas criar sentido.

Segundo Donation (2007) o ser humano assimila muito mais fatos se eles

estiverem incorporados dentro de histórias. Assim, tendo em vista que hoje em dia a

publicidade já não tem interessado mais as pessoas justamente por terem

consciência de estarem consumindo-a, a técnica de Storytelling aplicada à

publicidade vem como uma solução para as marcas criarem valor, gerarem conteúdo

e informarem, por meio da associação delas com histórias. Essa nova forma de

desenvolver anúncios nada mais é do que o resultado de uma convergência entre as

indústrias do entretenimento (Hollywood) e da publicidade, necessária para que

fosse garantida a sobrevivência mútua de ambas.

Dessa forma, dentro dos inúmeros benefícios e funcionalidades que podem

ser propiciados pelo uso do Storytelling aplicado à publicidade, essa pesquisa tem

como foco analisar como as marcas podem fazer – e fazem – uso dessa ferramenta

para auxiliar na criação de valor. Para tanto, tem-se como ponto de análise

específico a campanha que originou o vídeo “A História de Sofia”, comunicada pela

rede de farmácias Panvel. A partir dessa linha de estudos, então, a pesquisa se

volta para a seguinte questão: como o Storytelling auxilia na criação de valor de

marca?

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Essa pesquisa justifica-se enquanto construção científica acerca de um tema

que é considerado novo na área da publicidade e, mesmo assim, que enquanto

técnica vem ganhando força. Os profissionais de propaganda do Brasil, de um modo

geral, não têm tanta receptividade a inovações na área e, muitas vezes, fecham as

portas para novas estratégias de comunicação. Da mesma forma, os empresários e

anunciantes também evitam desenvolver ações de promoção que não estejam

diretamente de acordo com o que já vem sendo feito e com o que os concorrentes

costumam fazer. Considerando que o Storytelling é bastante inovador dentro da

publicidade e, enquanto forma de atrair e manter a atenção do consumidor é, sem

dúvidas, muito eficiente, essa pesquisa foi desenvolvida com o propósito de

conscientizar o mercado brasileiro a respeito de uma inovação muito pouco

explorada que pode modificar a forma como é feita a publicidade hoje em dia.

Assim, este trabalho tem como objetivo geral identificar e analisar na campanha

publicitária da Panvel como o Storytelling auxilia na criação de valor de marca,

sendo que os objetivos específicos são: traçar uma fundamentação teórica que

estabeleça um estudo acerca da construção de marca e possibilite identificar como o

Storytelling auxilia nesse processo; analisar em qual fase da construção de marca

este contribui ou pode contribuir para a criação de valor; e definir, a partir de

análises, a importância do Storytelling enquanto ferramenta da publicidade com o

papel de auxiliar na construção de marcas. Sendo assim, o presente trabalho se

estrutura em dois capítulos: no primeiro, compreende-se de forma teórica a

construção do Storytelling e do gerenciamento de marcas; e, no segundo,

desenvolve-se o estudo de caso da campanha mencionada, dividido em três tópicos,

sendo o primeiro a exposição do objeto de estudo, o segundo a análise de

Storytelling e o terceiro a análise de valor de marca.

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A ERA DA CONVERGÊNCIA

Para compreender o contexto que propicia o uso mais recorrente do

Storytelling enquanto ferramenta da publicidade, faz-se necessário o estudo de uma

abordagem teórica que explica o porquê de haver um processo de convergência

entre as indústrias do entretenimento e da publicidade. Assim, de acordo com

Donation (2007), a revolução no modo como o produto de ambas as indústrias é

produzido veio com o objetivo de suturar as feridas presentes. No caso de

Hollywood, a pirataria era responsável por minimizar os lucros, enquanto o problema

principal enfrentado pela publicidade era a maior liberdade conquistada pelo

receptor que, diferente de tempos antigos, não é mais passivo perante os conteúdos

publicitários que recebe diariamente. Ele é capaz de ignorá-los com muito mais

eficiência. Um dos grandes responsáveis por essas mudanças de comportamento,

nos dois casos, é avanço da tecnologia. Novos equipamentos, como o TiVo1,

permitem que o espectador grave os programas de televisão e, ao assistir, pule os

comerciais, enquanto que, paralelamente, seja possível que o usuário faça download

gratuito de músicas, programas, livros e filmes pela internet.

Esse cenário propicia, acima de tudo, uma transferência de poder. Agora

quem o detém não é mais aquele que produz e distribui os produtos de

entretenimento, mas sim quem os consome. Dessa forma, vê-se a necessidade de

uma mudança total de mentalidade, que será responsável pela reinvenção completa

do negócio de comunicação e marketing. O resultado disso é a estruturação de um

novo modelo que não se baseia mais na intrusão, mas no convite e na sedução.

Donation (2007) também acredita que essa revolução na forma como se faz

comunicação será responsável tanto por construir marcas, aquelas que souberem se

adequar a esta nova realidade, quanto por destruí-las, as conservadoras que se

negarem a aceitar que a convergência é uma necessidade de sobrevivência.

1 TiVo é uma marca popular de gravador de vídeo digital (DVR - Digital Video Recorder). Trata-se de um

aparelho de vídeo que permite aos usuários capturar a programação televisiva para armazenamento em disco

rígido (HD), para visualização posterior.

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Considerando essa realidade, o autor afirma que algumas empresas

começaram a tomar certas medidas, iniciando esse processo de transformação da

maneira de comunicar suas marcas com os consumidores. Isso se deu por meio da

inserção do produto em reality shows, que vinham ganhando cada vez mais

audiência nos Estados Unidos. As marcas eram incorporadas aos programas de

maneira a ser parte fundamental de sua execução. O sucesso foi claramente notado.

Contudo, havia certa resistência em se realizar esse processo em programas

roteirizados, como novelas e filmes, já que havia o grande receio de que o cunho

artístico se perderia uma vez que se inserissem marcas à trama. Donation (2007)

comenta que Leslie Moonves, presidente e diretor executivo da CBS (canal de

televisão dos Estados Unidos), acreditava que a inserção de marcas em roteiros

fechados poderia sim funcionar com sucesso, desde que fosse feita de forma sutil e

contribuísse para o desenvolvimento da história.

Foi exatamente desta forma que ocorreu uma das mais bem sucedidas

inserções de produto em conteúdo de entretenimento. O autor conta sobre o caso

em que o filme “Uma Saída de Mestre” (2003) fez uma inserção em seu enredo do

carro tipo Mini - que como o nome sugere, tem dimensões bem menores do que os

de tamanho padrão – modelo que ainda não havia se tornado popular nos Estados

Unidos. O filme consistia em uma refilmagem de um clássico italiano da década de

1960, que também possuía um carro com tais especificidades. Na história, o carro

tem papel fundamental, pois é capaz de entrar em lugares aonde outros não chegam

e, por se tratar de perseguições constantes, garantia vantagens aos protagonistas.

O Mini era mais do que uma marca sendo inserida diretamente na trama: ele era um

dos principais personagens do enredo.

Também defendendo a importância da inserção de produto contribuir

logicamente para a construção da trama, Lindstrom (2009) afirma que pôde concluir,

a partir de experimentos neurológicos, que apenas mostrar logomarcas

aleatoriamente ou de forma despropositada dentro de um programa ou filme não

basta para que o receptor se lembre do que viu. O maior exemplo disso, de acordo

com ele, foi a produção do filme 007 – Cassino Royale, no qual marcas como FedEx,

Omega, Sony e Louis Vuitton figuravam as telas em cenas comuns, sem

necessariamente trazer alguma agregação de valor ao enredo. Segundo ele, para

que a inserção de produto seja eficiente, ela deve ser bem mais ardilosa e

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sofisticada e, acima de tudo, fazer sentido dentro da narrativa. “Se a marca em

questão não desempenhar um papel fundamental na trama, não nos lembraremos

dela, ponto final.” (LINDSTROM, 2009, p. 53).

Esta técnica de associar publicidade e entretenimento por meio da inserção

de produtos em enredos de filmes, novelas ou programas é o que caracteriza o

chamado product placement. Essa denominação não é muito conhecida no Brasil.

Utilizamos o termo merchandising para designar esse tipo de estratégia que, de

acordo com teóricos do assunto, é erroneamente empregado. Trindade (2007) usa

uma nomenclatura um pouco diferente, mas se refere ao que chamamos aqui de

product placement. Ele utiliza a denominação tie-in, e, a respeito do uso errado da

palavra merchandising, ele afirma que:

Percebe-se que aquilo que hoje se convencionou a chamar de merchandising televisivo nada tem a ver com o conceito promocional em sua origem. A definição de propaganda tie-in torna-se mais ajustada ao caso em estudo. Contudo, os vícios da aplicação equivocada do primeiro conceito resultaram em utilização indiscriminada, de ampla aceitação, que hoje se torna corrente. (TRINDADE, 2007, p. 343)

Tal confusão de termos que ocorre no Brasil é responsável pela criação de um

conceito equivocado a respeito do que seria de fato a inserção de produto. “O

mercado brasileiro criou uma convenção para chamar essa ação de ‘merchandising’

(...) e todos chamam dessa forma (...). Mas conceitualmente está errado, pois

sabemos que merchandising é promoção no ponto de venda.” (HILLER, 2012).

A convergência entre as indústrias do entretenimento e da publicidade já

gerou também um produto cuja mescla dos dois gêneros aparecia tão indissociável

que, na ocasião, acabou sendo algo difícil de caracterizar de qual formato se tratava,

mas que, contemporaneamente, é tratado como branded content. Seu conceito pode

ser definido como:

O branded content torna tênue as linhas que dividem informação, conteúdo, publicidade e entretenimento. Ferramentas tecnológicas, aplicativos, programas de televisão e eventos se unem em multiplataformas para levar mensagens como questões socioambientais, entretenimento, cultura e serviços em nome das marcas. Para aumentar o engajamento com o consumidor, as verbas destinadas à divulgação convencional são cada vez mais divididas para atender também a produção de conteúdos próprios. (MEDEIROS, 2013)

Donation (2007) conta sobre o caso de branded content da BMW. A empresa

financiou oito filmes entre 2001 e 2002, que formou a série batizada de “The Hire”

(em português significa “A Contratação”). Cada um desses filmes ficou sob a

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responsabilidade de um diretor conceituado de Hollywood e, interpretando os

personagens, atores famosos marcavam presença. Em todos os episódios da trama,

o motorista, protagonista, interpretado por Clive Owen, enfrentava um conflito

diferente, sempre dirigindo uma BMW. Esses filmes não foram passados no cinema

(somente trailers curtos para atrair o público a assisti-los) ou na televisão, apenas

disponibilizados no site da empresa para que fossem feitos downloads pelo próprio

usuário. Essa estratégia de veiculação se deu, também, ao fato de terem sido gastos

90% da verba destinada à propaganda em produção e 10% em mídia, quando o que

era feito e considerado mais adequado até então era investir justamente o contrário.

Como Donation (2007) comenta, algo que aparentemente não funcionaria, acabou

dando certo. Os vídeos se tornaram um grande fenômeno na Internet, a BMW

precisou aumentar a capacidade de seus servidores para atender a quantidade de

downloads. Ao realizar pesquisas com consumidores, foi constatado que a imagem

da empresa foi fortalecida. As visitas nas concessionárias também se intensificaram

e as vendas tiveram aumento recorde no ano, de 12,5%. Na ocasião desse sucesso,

os profissionais de publicidade divergiam em considerar ou não as peças como

anúncio. O festival Cannes Lions, mais conceituado da área, premiou a BMW

apenas na categoria Internet, temeroso em definir do que realmente se tratava

aquele gênero. Esse comportamento é definido como “(...) relutância de alguns na

indústria em aceitar que um conteúdo criativo de marca (branded content) possa ser

um instrumento legítimo de marketing.” (DONATION, 2007. P. 108).

2.2 STORYTELLING: DEFINIÇÕES E ESTRUTURA DA HISTÓRIA

O que ainda estava surgindo enquanto pensamento terminológico à data da

publicação do livro Publicidade + Entretenimento (2007), de Scott Donation, era o

conceito de Storytelling aplicado à publicidade. Tanto a estratégia de product

placement quanto a de branded content se classificam enquanto modalidades

práticas de Storytelling e, sem dúvidas, configuram uma das melhores formas de

trabalhar a publicidade ligada intrinsecamente ao entretenimento. Traduzindo ao pé

da letra, o termo Storytelling significa “ato de contar história”. Dessa maneira, pode-

se compreendê-lo enquanto “a arte e a técnica utilizada para contar qualquer tipo de

história: de um filme ou uma campanha publicitária a uma informação comercial ou a

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apresentação de uma empresa.” (NÚÑEZ, 2009, p. 20). Segundo o professor Bruno

Scartozzoni2, em entrevista para o blog Três Pontos Brasil3 (2012):

Storytelling é a arte de contar histórias, ou um conjunto de técnicas de comunicação usado pelos seres humanos desde o início dos tempos. O quão antigo pode ser isso? Antigo, mas longe de estar ultrapassado. Nesse sentido trata-se de um conceito bastante sólido, usado desde sempre pela indústria do entretenimento, e que agora começa a ser revisitado à luz da indústria da publicidade.

Considerando os pensamentos de Scartozzoni na dada entrevista, compreende-se

que o ato de contar histórias existe desde tempos muito antigos. Brenman (apud

Palacios, 2007) afirma que “os antigos contavam histórias para explicar o

inexplicável e, com isso, acalmar a alma e a ansiedade que nela residia.” e que “as

histórias têm o poder de falar com a alma do homem.”. Com essas considerações

pode-se concluir que, mais do que ensinar e gerar significado, as histórias têm o

poder de gerar empatia nas pessoas, fazendo com que elas, assim, incorporem-nas

como uma projeção de sua vivência pessoal. Essa característica das histórias é

definida por Scartozzoni, no curso Storytelling e Transmídia (2012) da plataforma

Três Pontos Brasil, como “verdade humana”. Sendo assim, pode-se considerar, de

forma mais completa que “uma história é um fato, envolvido numa emoção, que nos

compele a praticar uma ação, que transforma o nosso mundo.” (MAXWELL e

DICKMAN, 2010, p. 10).

Tendo já determinada a importância das histórias para a humanidade e o

quanto o ato de contá-las se faz presente em nossa sociedade desde tempos muito

antigos, é importante compreender como as histórias são feitas, ou seja, qual a

estrutura básica que uma história deve seguir para que seja capaz de cativar a

atenção do receptor e gerar significado a ele. Para isso, de acordo com Olivetti

(2009) pode-se considerar os estudos de Aristóteles em seu livro Poética, que deu

origem a estrutura do roteiro que foi adaptada por muitos escritores e até hoje

permanece como estrutura mais básica para se desenvolver uma história.

2 Bruno Scartozzoni é professor do curso de Storytelling e Transmídia da Escola Superior de

Propaganda e Marketing – ESPM com experiência de mais de dez anos no estudo do tema, sendo também responsável por ministrar palestras e cursos a respeito do assunto por todo o país. 3 O site Três Pontos Brasil (www.trespontosbrasil.com) é uma plataforma que oferece cursos online

de varias modalidades ligadas à publicidade, tendo como professores profissionais conceituados do mercado. O site possui grande relevância e é considerado referência.

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A respeito disso, Olivetti (2009) afirma que “a estrutura de 3 atos é a escalada

de conflitos, cada vez mais perigosos e desafiadores, levando ao confronto final e à

resolução.” A autora explica que a estrutura definida por Aristóteles é constituída por

3 atos, sendo que no primeiro, o protagonista se encontra em uma situação que o

incomoda, chamada de Evento Instigante, e faz algo para que isso mude. Ele chama

de Questão Dramática Maior a dúvida que é criada a respeito do sucesso ou do

insucesso do protagonista em resolver sua situação. O segundo ato é composto por

obstáculos que impedem que o protagonista continue com sua jornada. É

denominado por Aristóteles como Informação Nova. Por fim, Olivetti (2009) explica

que no terceiro ato, o protagonista luta para que seus conflitos sejam resolvidos e,

tanto ele ganhando quanto ele perdendo, a história chega ao fim quando a Questão

Dramática Maior for respondida.

Aplicando alguns dos conceitos de construção de histórias para o Storytelling

aplicado à publicidade, Scartozzoni (apud Pinto, 2012, p. 5) define a estrutura, de

maneira adaptada às necessidades atuais, da seguinte forma: ”a história é feita por

5 elementos: a quebra da rotina, que é protagonizada pelo personagem principal, o

conflito vivido por ele, sua transformação e por fim a verdade humana, que a história

utiliza como a sua moral”. Ao unir esses elementos para constituir uma história, é

necessário o desenvolvimento de algo que é de extrema importância: o Plot (ou

trama). Pinto (2012, p. 9) afirma que “um termo que utiliza bem a ferramenta de

Storytelling é o Plot, que refere-se à trama, a parte mais importante da história, a

parte mais importante do Storytelling, fazendo com que a marca seja permeada pela

história.”. Núñez (2009, p. 91) afirma que:

As histórias são como colares, têm um fio no qual se insere uma série de contas. Cada uma dessas contas ocasiona uma mudança que faz avançar os conflitos expostos. (...) Trata-se de uma unidade mínima de compreensão que coopera para uma mudança na evolução do conflito. Em um bom relato, não se deve incluir nenhum acontecimento que não faça os conflitos evoluírem.

O que o autor deixa bem claro nesse fragmento é que, se faz necessário que a

trama seja construída em cima de conflitos, que são alimentados pelos

acontecimentos. Se o acontecimento não produzir nenhuma progressão do enredo e

se não ocasionar evolução dos conflitos, ele não tem razão de existir.

Na atualidade, um autor conceituado por descrever a técnica da escrita de

histórias, principalmente voltadas para roteiros audiovisuais, desenvolve uma

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espécie de manual da escrita de histórias ficcionais (estórias4). Robert Mckee em

“Story – substância, estrutura, estilo e os princípios da escrita de roteiro” disserta a

respeito dos elementos da estória, dos princípios do design da estória e de outras

técnicas que os escritores podem fazer uso, assim como detalhes aos quais eles

devem se atentar. Logo na introdução, Mackee (2006, p 17) esclarece: “Uma regra

diz ‘você tem que fazer isso dessa maneira’. Um princípio diz ‘isso funciona... e vem

funcionando desde o início dos tempos.’ A diferença é crucial.” Com essa afirmação

o autor pretende desmistificar a ideia de que seu livro é uma receita pronta para ser

aplicada a qualquer contexto, resultando na estória perfeita. Ele explica que Story é

sobre princípios norteadores, e não sobre regras. São formas e não fórmulas.

Considerando que Mckee oferece ótimos subsídios para que uma boa estória seja

construída, o presente trabalho dá enfoque às suas considerações como forma de

compreender como as estórias são formadas. Devido à extensão da obra em

questão, neste trabalho serão utilizados os apontamentos realizados na segunda e

na terceira parte, das quatro partes em que o livro é dividido, sendo estas “Os

Elementos da Estória” e “Os Princípios do Design da Estória”.

Assim, na segunda parte do livro, em que o autor explica os elementos da

estória, Mackee (2006) desenvolve suas considerações a respeito, primeiramente do

que ele chama de Espectro da Estrutura, desenvolvendo considerações sobre cada

um dos itens que compõe esse espectro. Dessa maneira, segundo ele, estrutura é

“uma seleção de eventos da estória da vida das personagens que é composta em

uma sequência estratégica para estimular emoções específicas, e para expressar

um ponto vista específico.”, sendo que o evento da estória “cria uma mudança

significativa na situação de vida de uma personagem que é expressa e

experimentada em termos de valor.” (MCKEE, 2006, p. 45). Dessa forma, ele explica

que um evento é uma mudança e para que uma mudança seja significativa dentro

de uma estória ela precisa ser expressa com valor. Isso porque os eventos da

estória são sempre significativos, devendo jamais ser expressos de maneira a serem

4 Robert Mckee chama de “estória” a história ficcional, assim como no idioma inglês, no qual se tem

history e story. O uso desta palavra no português é aceitável quando se tem a intenção de diferenciar

o ficcional do real.

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triviais. O autor afirma que esses valores da estória podem mudar do positivo para o

negativo e vice-versa, sendo estes qualidades universais da experiência humana.

Sobre os Eventos da Estória, Mckee (2006) afirma que, para serem

considerados como tais, e não apenas como simples eventos, eles devem criar

mudanças que venham a ser significativas na situação em que a personagem está

vivendo. O autor também explica em que se caracteriza uma cena, afirmando que o

ideal é que cada cena seja um evento da estória. Para ele, uma cena é “uma ação

através de conflito em tempo mais ou menos contínuo que transforma a condição de

vida de uma personagem em pelo menos um valor com um grau de significância

perceptível.” (MCKEE, 2006, p. 47). O autor afirma que cada cena é composta por

beats, sendo que um beat consiste na mudança de comportamento que acontece

por meio de ação e reação e que, pouco a pouco, molda o ponto de virada da cena.

Assim como os beats formam as cenas, e estas consistem em Eventos da

Estória, as cenas são o que compõe uma sequência. Mckee (2006) considera que

uma sequência seja caracterizada como uma série de cenas que culminam com um

impacto maior do que das cenas anteriores. Por fim, de acordo com o autor, uma

série de sequências constrói um ato, sendo este definido como “uma série de

sequências que culminam em uma cena climática, causando uma grande reversão

de valores, mais poderosa em seu impacto do que qualquer cena ou sequência

anterior.” (MCKEE, 2006, p. 52). Uma série de atos gera, segundo Mckee (2006), a

maior de todas as estruturas: a estória. Dentro dela, as mudanças construídas

dentro das cenas e sequências podem ser revertidas. Porém, quando essa mudança

é o clímax, isso não é possível de ocorrer. O clímax da estória carrega consigo uma

mudança absoluta e irreversível, que norteia a construção dos atos anteriores. Esta

é basicamente a estrutura que uma estória deve ter, de acordo com Robert Mckee:

uma sequência de beats que formam cenas, que, por sua vez, constroem

sequências e estas constituem os atos, sendo que a estória é permeada por eventos

que modificam os acontecimentos e o clímax do ato final transforma a narrativa de

forma irreversível. A partir dessa organização estrutural, constrói-se uma trama.

De acordo com Mckee (2006), desde tempos muito antigos em que se

constroem narrativas, as estórias são organizadas por vários sistemas diferentes,

sendo que dentre estes está o gênero. Ele descreve um sistema de gêneros e

subgêneros utilizado por roteiristas, sistema este que evolui com a prática e que

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muda de acordo com a diversidade de assuntos, eventos, valores, ambientes e

papeis. Os gêneros listados pelo autor são: estória de amor, filme de terror, épico

moderno, faroeste, filme de guerra, trama de maturação, trama de redenção, trama

de punição, trama de provação, trama de educação, trama de desilusão, comédia,

crime, drama social, ação/aventura, drama histórico, bibliografia, docu-drama,

mocumentário, musical, ficção científica, filmes esportivos, fantasia, animação e

filme de arte. A lista do autor contabiliza 25 gêneros, contudo, ele afirma que tanto

esta quanto qualquer outra lista não pode ser considerada definitiva, já que as

fronteiras entre os gêneros sobrepõem-se frequentemente e se fundem. Cada

gênero tem suas convenções únicas, definidas por Mackee como “ambientes,

papéis, eventos e valores específicos que definem gêneros individuais e seus

subgêneros.” (MCKEE, 2006, p. 93). Os gêneros também podem ser misturados,

formando uma combinação que enriquece a narrativa.

Após contextualizar os tipos de gênero, Mckee (2006) faz considerações a

respeito de personagem. Ele explica que aspectos que compõe a personalidade do

ser humano caracterizam-no, mas não são eles o que forma a personagem. O autor

afirma que “a verdadeira personagem é revelada nas escolhas que um ser humano

faz sob pressão – quanto maior a pressão, maior a revelação e mais verdadeira a

escolha para a natureza essencial da personagem.” (MCKEE, 2006, p.106). De

acordo com o autor, a função da personagem é proporcionar à estória qualidades da

caracterização feita dela necessárias para se fazer escolhas convincentes, sendo,

portanto, uma personagem crível. Além disso, estrutura e personagem estão

intimamente ligados, já que a estrutura de eventos de uma estória é criada a partir

das escolhas feitas por uma personagem sob pressão.

A última sessão da segunda parte do livro, na qual Robert Mckee discute a

respeito dos elementos da estória, é a chamada “Estrutura e Significado”. Um tópico

bastante importante que o autor desenvolve nessa parte é a respeito da emoção

presente na estória. Ele considera que enquanto na vida separa-se o significado da

emoção, a arte os une. Assim, a estória é considerada por ele um instrumento com o

qual o roteirista cria nos espectadores epifanias sobre a vida e experiências

emocionais. Esse fenômeno é chamado por Mckee (2006) de Emoção Estética. O

autor afirma que a fonte de toda arte é a pisque humana primitiva, sendo a estória a

primeira, última e eternamente a experiência da emoção estética, ou seja, o encontro

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entre sentimento e pensamento que ocorre de forma simultânea. Ainda discutindo

esse aspecto das estórias, Mckee afirma:

Quando uma ideia se junta a uma carga emocional, ela se torna o que há de mais poderoso, mais profundo, mais memorável. Você pode esquecer o dia em que viu um corpo morto na rua, mas a morte de Hamlet te assombra pra sempre. A vida por si própria, sem a arte para moldá-la, deixa-o na confusão e no caos, mas a emoção estética harmoniza o que você sabe com o que você sente para dar-lhe uma consciência elevada e uma certeza de seu lugar na realidade. Resumidamente, uma estória bem contada lhe dá o que você não consegue arrancar da vida: experiência emocional significativa. (MCKEE, 2006, p. 115)

No parágrafo acima citado, o autor explica o quanto as estórias têm papel

fundamental na formação de sentido das pessoas, sendo responsáveis por gerar

assimilação rápida por meio da emoção estética. Essa característica citada por

Mckee justifica a afimação de Scartozzoni (apud Pinto, 2012), que afirma que as

estórias precisam ter uma “verdade humana”, algo com o qual o espectador se

identifique enquanto ser humano cheio de sentimentos, medos e inseguranças.

Na terceira parte do livro Story, Robert Mckee discute a respeito dos

princípios do design da estória. Mckee (2006) explica a importância do protagonista

dentro da narrativa: ele encarna todos os aspectos da personagem em termos

absolutos. Ele afirma que pode haver mais de um protagonista, em um sistema de

pluri-protagonista, ou seja, mais de um personagem principal divide os mesmos

objetivos dentro da trama, com motivações que levam ao mesmo desejo; ou,

também, a estória pode ser multiprotagonista, na qual protagonistas distintos

buscam objetivos diferentes com motivações individuais. De acordo com o autor, o

protagonista não precisa ser humano, pode ser um animal, um objeto inanimado ou

qualquer criatura que possua capacidade de desejar, agir e sofrer consequências.

De acordo com Mckee (2006) o protagonista possui algumas características

fundamentais: é um personagem voluntarioso; possui um desejo consciente e pode

também possuir um inconsciente que é auto-contraditório; tem a capacidade de

buscar seu Objeto de Desejo de maneira convincente; deve ter ao menos uma

chance de alcançar seu desejo; e deve ser empático, mas não necessariamente

simpático. O autor explica que esta empatia é fundamental para que o envolvimento

emocional com o público seja sustentado, sendo que esse envolvimento não

significa evocar altruísmo ou compaixão, mas algo muito mais forte: identificação.

“Quando nos identificamos com um protagonista e seus desejos, na vida estamos de

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fato torcendo por nossos próprios desejos na vida. (...) Empatia, portanto, é absoluta,

enquanto simpatia é opcional.” (MCKEE, 2006, p. 141).

Após compreender como o protagonista é formado, é importante conhecer um

fator que dá forma à estrutura da estória: o incidente incitante. Este é definido como

um evento que desarranja de maneira radical o equilíbrio de forças presentes na

vida do protagonista, sendo que na maioria dos casos este é um evento único que

acontece diretamente para o protagonista ou é causado por ele, que, imediatamente,

reconhece que sua vida está fora de equilíbrio para pior ou para melhor. O

protagonista, de acordo com Mckee (2006), sempre reage ao Incidente Incitante, em

busca de restaurar o equilíbrio que sua vida possuía. Essa busca incessante e

profunda por restaurar o equilíbrio é chamada pelo autor de Espinha da Estória.

Conforme Mckee (2006), o segundo elemento do design da estória é

caracterizado pelas Complicações Progressivas, localizado entre o Incidente

Incitante e a Crise/Clímax do último ato. Complicar progressivamente, afirma ele,

significa gerar mais e mais conflito criando uma sucessão de eventos que passe por

pontos sem volta. É nesse momento que impera a Lei do Conflito, definida pelo autor

como fundamental para mover a estória. Para que qualquer coisa na estória se mova

é necessário que haja conflito. Esses conflitos podem ter três níveis de

complexidade, segundo Mckee (2006). Podem ser conflitos internos, conflitos

pessoais ou conflitos extra-pessoais, sendo que o ideal é que eles existam

simultaneamente para agregar qualidade ao enredo.

A terceira parte do design da estória, de acordo com Mckee (2006), é a crise.

Ela significa decisão, onde o protagonista se encontra no fim da linha, com todas as

suas ações para alcançar seu desejo já realizadas. Sendo assim, essa sua próxima

ação é sua última. A crise, afirma o autor, deve ser um verdadeiro dilema, que

coloca o protagonista sob pressão máxima e testa sua força de vontade. A ação

decorrente da decisão tomada na crise culmina no quarto elemento do design da

estória: o clímax. Segundo o autor, ele não precisa necessariamente ser violento ou

cheio de barulho e ação, mas é fundamental que esteja repleto de significado, uma

vez que, em suas palavras, significado produz emoção. Mckee define esse

significado como “uma revolução nos valores, indo do positivo ao negativo, ou do

negativo ao positivo – um valor mudado em sua carga máxima que é absoluto e

irreversível. O significado dessa mudança move o coração do público.” (MCKEE,

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2006, p. 293). Após o Clímax, aquilo que resta é a quinta parte do design da estória,

a Resolução. De acordo com o autor, a resolução é o momento em que o se mostra

o alastramento dos efeitos do clímax, que afetam tanto os personagens principais

quanto os coadjuvantes. Mesmo que ela não se estenda, sua utilidade é,

principalmente, a de criar uma deixa para a finalização da estória, mesmo que esta

dure apenas alguns segundos.

2.3 RECURSOS PARA CONSTRUÇÃO DE HISTÓRIAS

Núñez (2009) discute a respeito de um recurso de construção de trama que

está presente na vida das pessoas desde muito tempo: os mitos. Ele afirma que eles

são responsáveis por “fornecer modelos de conduta e conferir significado à nossa

existência”. Segundo o autor, considerando tal importância desse tipo de narrativa, o

antropólogo Joseph Campbell decidiu estudar mais afundo e, compilando suas

ideias, constatou que em todas as regiões, épocas e crenças, o mito é desenvolvido

seguindo uma estrutura padrão. Ele descreveu a estrutura do mito, em seu livro “O

herói de mil faces”. Assim, Campbell considera que o relato começa retratando o

protagonista em sua vida cotidiana. Em seguida, um sinal mostra ao protagonista

que é necessário que ele abandone seu mundo ordinário. Ele reluta ou fica na

dúvida a respeito de partir nessa aventura, por temer perigos que possa vir a

enfrentar. Surge um personagem, amigo, que o educa e prepara para a jornada. Ele

passa pelo primeiro umbral, que nada mais é do que um incidente que ocorre no

momento em que o protagonista deixa seu ambiente. Depois, ele passa por provas,

encontra aliados e enfrenta inimigos para, então, se aproximar de sua maior crise.

Ele enfrenta sua odisseia/calvário para, em seguida, obter sua recompensa. Assim,

ele volta a sua vida cotidiana, porém, sofreu nessa jornada uma mudança profunda

em seus valores e, por isso, retorna com o “elixir da vida”, que é sua lição aprendida.

Durante o desenvolvimento da trama do Storytelling, Núñez (2009) afirma

existir um segundo recurso bastante útil: o uso dos arquétipos. Ele cita as

considerações do psiquiatra Carl G. Jung, que dizia que estes tratavam-se de

“formas que estavam vivas no inconsciente coletivo das sociedades” e que “qualquer

produto da mente humana está infestado dos mesmos padrões: arquétipos que se

repetem mais de uma vez.” Assim, Núñez (2009) completa dizendo que o arquétipo

é capaz de causar emoções aos receptores e, além disso, evocar uma imagem

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concreta em suas mentes. Ele considera que eles proporcionam à história uma

eficácia sem tamanho, responsável por prender a atenção de uma sociedade já tão

saturada. O autor também esclarece a diferença entre arquétipo e estereótipo: “O

estereótipo é uma convenção superficial, enquanto o arquétipo é uma estrutura mais

rica e profunda, com múltiplos níveis de leitura.” (NÚÑEZ, 2009, p. 103).

Uma vez compreendidas a essência e as definições do que viria a ser o

arquétipo, é possível, então, demonstrar quais sãos as classes de arquétipos mais

comuns presentes na sociedade. Dessa maneira, de acordo com Mark e Pearson

(2001) existem 12 arquétipos principais que permeiam nossa vida. Estes são: o

Inocente, o Explorador, o Herói, o Sábio, o Fora da Lei, o Mago, o Cara Comum, o

Amante, o Bobo da Corte, o Prestativo, o Criador e o Governante. Sendo assim, as

autoras consideram que, tendo conhecimento mais profundo a respeito de cada um

desses arquétipos, deve-se determinar qual deles melhor representa a marca que se

pretende trabalhar a partir desta simbologia.

Quando você entende o poder arquetípico potencial de seu produto, o marketing se torna bem mais simples, mais gratificante e mais digno de respeito. A administração do significado trata da venda de produtos, mas também da venda de significados com integridade. (...) Os arquétipos são o pulso de uma marca, porque transmitem um significado que faz os clientes se relacionarem com um produto como se este fosse realmente vivo. Os clientes tem uma relação por ele. Os clientes se interessam por ele. (MARK e PEARSON, 2001, p. 35).

Pode-se compreender, com tais considerações, que os arquétipos têm papel

fundamental na construção tanto de significado quanto de identidade de marca, caso

tenham como intuito a criação de um conteúdo atrativo que diferencie a empresa das

demais. É justamente neste ponto que as histórias e as marcas se encontram. Com

isso, é possível depreender que o Storytelling, é capaz de influenciar diretamente

nesses processos.

Dessa forma, Batey (2010, p.76) considera que “as marcas que penetram nas

experiências e motivações mais profundas e primitivas estabelecem uma afinidade

emocional e forjam conexões fortemente arraigadas em seus consumidores.” Ele

deixa claro que ao utilizar um arquétipo se lida com anseios humanos, que exercem

uma influencia grande motivadora de atitudes e comportamentos. Justamente por

isso, Batey (2010) afirma que se deve alavancar o significado dos arquétipos. Ou

seja: não apenas fazer uso do simbolismo em uma campanha publicitária, mas

tornar a marca um expressão duradoura e consistente de uma identidade

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arquetípica, que, neste dado momento, já se encontrará em posição intrínseca à

marca. Além disso, a análise do produto e de sua categoria a partir de uma

perspectiva arquetípica, de acordo com o autor, pode trazer insights que podem vir a

ser úteis para que se desvende o significado real e potencial de uma marca.

2.4 BRANDING: GERENCIAMENTO DO VALOR DE MARCA

Tendo em vista que o estudo de branding se relaciona aos usos do

Storytelling uma vez que este ajuda na produção e construção de marcas, é

importante definir de forma conceitual, em um primeiro momento, o que venha a ser

branding. De acordo com Martins (2006, p. 6):

Branding é o conjunto de ações ligadas à administração das marcas. São ações que, tomadas com conhecimento e competência, levam as marcas além de sua natureza econômica, passando a fazer parte da cultura, e influenciar a vida das pessoas. Ações com capacidade de simplificar e enriquecer nossas vidas num mundo cada vez mais confuso e complexo.

Compreende-se que o branding é responsável por determinar como as marcas serão

vistas e significadas pelos consumidores, sendo assim de extrema importância se

atentar à construção das mesmas. Batey (2010, p. 26) complementa essa definição

dizendo que “um nome junto a uma logomarca formam um exemplo clássico de

branding em sua estrutura mais rudimentar: a marca ao mesmo tempo como

garantia de autenticidade e promessa confiável de performance.” De acordo com

Silva (2007), a marca tem sido utilizada no decorrer do tempo com o objetivo de

diferenciar um produto ou serviço de seus concorrentes, sendo que, com sua

evolução, adquiriu-se uma dimensão mais complexa, desempenhando novos papeis.

Por isso, surgiu necessidade de gerenciar as marcas de forma a favorecer o

reconhecimento e a fidelidade dos clientes em relação a elas.

Dessa forma, conforme já explorado anteriormente neste trabalho,

compreende-se que com o constante bombardeio de informações recebidas pelos

consumidores, as marcas passaram a ter uma relação diferente com as pessoas e,

sendo assim, elas agora geram significados mais profundos àqueles que as

consomem ou que entram em contato com elas. Batey (2010) afirma que as

associações entre os produtos e a motivação do consumidor são feitas pelo

significado da marca. Este, “é estabelecido a partir de como ela é percebida pelo

público em nível consciente e de como ela age dentro dele no nível semi ou

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subconsciente” (BATEY, 2010, p. 190). Contudo, a estrutura ou o conceito do

significado de uma marca tem característica multidimensional sendo, assim,

importante que se decodifique e se destrua esses significados nos mais diversos

níveis, para se conhecer todas as maneiras pelas quais a marca se conecta com seu

consumidor. Dessa forma, partindo da premissa de que a atribuição de significado

por parte dos consumidores aos produtos/marcas se dá a partir de uma

consideração que está muito além de meramente seu uso funcional, faz-se

importante compreender que uma escolha por um produto/marca em detrimento de

outro é composta por uma significância profunda das maneiras instintivas de

construção de identidade própria e de formulação do mundo à nossa volta. Em

outras palavras, as nossas interpretações e conceitos são o que motivam nossas

escolhas enquanto consumidores e o que determinam nossas atitudes em relação

às marcas. E, dessa maneira, completa o autor, por unir razão e emoção para a

formulação do significado, as decisões de marca jamais são inteiramente racionais.

Trazendo conceitos que complementam as considerações de Batey (2010),

Lindstrom (2009) explica esse fenômeno de tomada de decisão de compra

envolvendo o consciente e o inconsciente, através da neurociência. Ele considera

que a verdadeira base lógica por trás das escolhas por determinados produtos estão

alicerçadas sobre as associações de toda uma vida, sem que tenhamos percepção

consciente disso. Dessa forma, ele afirma que ao tomarmos uma decisão a respeito

do que comprar, nosso cérebro evoca e rastreia uma enorme quantidade de

lembranças, acontecimentos e emoções e os transforma e uma reação rápida.

Esses atalhos são chamados de marcadores somáticos. Assim, Lindstrom (2009, p.

116) afirma que:

Em suma, essa cadeia de conceitos, partes do corpo e sensações cria o que o cientista Antonio Damasio chama de marcador somático – uma espécie de lembrete, ou atalho, em nosso cérebro. Unidos por experiências anteriores de recompensa e punição, esses marcadores servem para conectar uma experiência ou emoção a uma reação específica necessária. (...) Os marcadores somáticos nos guiam em direção a uma decisão que sabemos que irá gerar o melhor resultado.

O que o autor enfatiza, também, é que todos os marcadores que, aparentemente

não apresentam nenhuma conexão entre si, criam deliberadamente associações.

Considerando essas associações criadas pelos marcadores somáticos, é

possível compreender, de acordo com Batey (2010), que existem tipos diferentes de

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associações de marca. Elas vão do concreto ao abstrato, podendo ser diretas,

quando ocorrem entre dois elementos, sem a necessidade de um terceiro

intermediário, ou indiretas, quando os elementos são ligados por um ou mais

intermediários. Assim, o autor classifica os tipos de associações possíveis através

de: atributos, benefícios e atitudes. Ele afirma que “quanto mais atenção for dada ao

significado da informação de uma marca durante o processo de codificação, mais

forte será a conexão resultante.” (BATEY, 2010, p. 206). Outro fator, também

importante, é o quão sólidas são as associações de marca existentes na memória do

consumidor. Assim, uma marca forte se diferencia, primeiramente, por meio da força

relativa de suas conexões. Em segundo lugar, por meio do grau com que estas são

avaliadas como desejáveis. Por último, através da característica única dessas

associações. Batey (2010, p. 208) conclui afirmando que “não interessa o quanto

uma associação seja favorável, a menos que ela seja única e possa distinguir uma

marca de seus concorrentes.”.

A partir das associações, é formada uma rede e, dentro dela está o núcleo,

que contém as principais conexões primárias da marca. Por meio dele, podem ser

acionados vários outros tipos de outras associações. É desta forma que a estrutura

do significado da marca é constituída. Ela se dá por meio de dois elementos: o

significado principal da marca, que nada mais é do que o resumo das principais

associações feitas pelo consumidor e das percepções dominantes; e o significado

implícito da marca, que diferentemente do anterior, tem um enorme caráter simbólico

e psicossocial, considera o autor, sendo influenciado de forma incisiva por valores

culturais. Este último é o principal responsável por criar valor e estabelecer uma

relação vital entre marca e consumidor, sendo o lugar onde os dois se conectam.

Por esses motivos, Batey (2010, p. 263) conclui que “o significado que as marcas

têm para o consumidor deve se tornar a luz-guia para o desenvolvimento da

estratégia de uma marca”. Sendo assim, tendo noções a respeito de como as

marcas significam para seus consumidores, é importante analisar como elas

constroem sua identidade e formam sua personalidade.

Assim, de acordo com Aaker (1996), a identidade de marca é o que

proporciona sentido, finalidade e significado a esta marca, responsável por

impulsionar as associações de significado. Ela deve ajudar a estabelecer o

relacionamento com o cliente, de modo a oferecer a ele benefícios, sejam eles

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funcionais, emocionais ou de auto-expressão. O autor considera que existem quatro

tipos de armadilhas da identidade que podem ser capazes de tornar a marca limitada

e ineficiente. A primeira é a armadilha da imagem da marca, que consiste em uma

discrepância entre o que a marca busca transmitir e o que o cliente enxerga. O

grande problema dela, segundo o autor, é que ela permite que o consumidor

determine o que a marca deve ser. A segunda é a armadilha de posição de marca,

que ocorre quando a busca por uma identidade se converte em uma busca por um

posicionamento. Ela inibe uma evolução da identidade de marca em forma plena e

desenvolvida. A terceira é a armadilha da perspectiva externa. Esta se dá a partir do

momento em que a empresa deixa de dar a devida importância ao papel que pode

ter a identidade de marca para que a empresa compreenda seus valores e sua

razão de existir. Por último, a quarta armadilha citada por Aaker (1996) é a de

fixação nos atributos dos produtos. Ela se dá através da concepção errônea de que

a única base relevante para as decisões dos clientes e a sobrevivência no meio

corporativo são os atributos do produto.

A partir da definição dessas quatro armadilhas é possível compreender, de

acordo com Aaker (1996), o quanto uma marca pode se tornar limitada e ineficiente.

Sendo assim, ao se atentar a estas armadilhas e evitá-las, é possível se construir

uma marca sólida a partir da ampliação do conceito da marca, com o objetivo de

incluir outras perspectivas e dimensões. Dessa forma, o autor considera que para

garantir que a identidade de marca tenha textura e profundidade, é necessário

considerá-la de quatro maneiras diferentes, sendo:

A marca como produto – buscando associa-la a um segmento específico que

represente valor agregado.

A marca como organização – concentrando-se nos atributos da organização,

que são criados pelas pessoas.

A marca como pessoa – incorporando características humanizadas (por

exemplo: competente, marcante, divertida, casual.).

A marca como símbolo – gerando maior recordação e lembrança por meio de

uma coesão bem elaborada e percebida.

É importante definir também a estrutura da identidade da marca. Assim, de

acordo com Aaker (1996), esta consiste em uma identidade essencial, que contem

associações mais passíveis de continuarem constantes, e em uma identidade

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expandida, que inclui elementos que proporcionam textura e integridade a marca. A

respeito da construção da identidade, Aaker considera, finalmente, que: “a

compreensão e o gerenciamento da identidade da marca são fundamentais para o

desenvolvimento de marcas sólidas e para a consequente criação da equidade da

marca5.” (AAKER, 1996, p. 119).

Depois de construída a identidade de marca, é necessário se trabalhar a

personalidade dessa marca. Neste contexto, Aaker (1996, p. 158) afirma:

A personalidade da marca pode ser definida como um conjunto de características humanas associadas a uma determinada marca. Assim, isso inclui características como gênero, idade e classe socioeconômica, além de traços clássicos da personalidade humana, como carinho, interesse e sentimentalismo.

A personalidade de marca tem caráter duradouro e distinto, já que os consumidores

se relacionam com as marcas como se elas fossem mesmo pessoas. Para tanto,

cinco fatores de personalidade emergiram como mais importantes, sendo batizados

de Cinco Grandes. São constituídos por: sinceridade, emoção, competência,

sofisticação e robustez. Em entrevista à autora, Bruno Scartozzoni (2013) considera

que a personalidade da marca seja o modo como a marca se comporta na vida real.

Desde o tom de voz da comunicação até a forma como o atendimento é feito ao

cliente, devem refletir o que ela é, ou como desejam que ela seja percebida.

A respeito da construção da personalidade de marca, Aaker (1996) considera

que existe uma extensão de fatores que afetam sua percepção, que podem ser tanto

relacionados quanto não relacionados ao produto. Dessa forma, a partir de tais

considerações, o autor se faz claro em demonstrar o quanto é necessário usar uma

personalidade de marca. Aaker (1996) explica de forma ainda mais concisa os

motivos pelos quais ele considera que justificam o uso desse artifício. Para ele, ao

utilizar a personalidade de marca, garante-se um enriquecimento da compreensão,

maiores contribuições para uma identidade diferenciadora, melhor orientação dos

esforços de comunicação e, finalmente, a criação do Brand Equity (também

chamado de Equidade de Marca), que é considerado uma das formas de se

determinar e construir o valor de marca.

5 Equidade de marca é uma possível denominação para Brand Equity, sendo sua tradução direta do

inglês para o português.

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Dessa maneira, considerando que a personalidade é um dos fatores pelos

quais se pode observar a e mensurar o valor de marca, faz-se necessário

compreender o desdobramento desta abordagem e como ela se relaciona com os

usos do Storytelling. Assim, de acordo com Pinho (1996), o conceito de Brand

Equity começou a se formar no final da década de 80, época em que ocorreram

diversas fusões e compras de multinacionais, tendo o envolvimento de grandes

números de investimento e marcas bastante conhecidas. Dessa forma, o Brand

Equity foi pensado inicialmente enquanto uma forma de mensurar o valor

financeiro de marcas, tendo como precursor o empresário australiano Rupert

Murdoch, que comandou a realização do levantamento do valor das marcas dos

títulos de jornais e revistas publicados por sua empresa. Com o crescente

aumento das negociações entre grupos empresariais, sentiu-se cada vez mais a

necessidade de fixar um valor patrimonial para as marcas, já que este era

considerado um de seus principais ativos, ultrapassando a materialidade dos

produtos. Assim, tomando como base os critérios elaborados pela Interbrand

Group, empresa de consultoria especializada em administração de marcas,

desenvolveu-se um método de mensuração do valor das marcas enquanto

patrimônio econômico. Os sete pontos estabelecidos pela empresa para que se

pudesse realizar uma mensuração de força e de valor das marcas foi: liderança,

internacionalidade, estabilidade, mercado, tendências, suporte e proteção.

Uma segunda dimensão de Brand Equity também é explorada por Pinho

(1996), na qual este conceito é visto como uma consequência da administração

de marcas e enfatiza a relação entre a marca e seu consumidor. É a partir desta

dimensão que este trabalho se volta, já que o Brand Equity sob este ponto de

vista e a partir deste uso tem como objetivo agregar de valor à marca. De acordo

com ele, este valor é construído por meio de sentimentos e significados que o

consumidor estabelece quando se relaciona com as marcas. Assim, Pinho (1996)

afirma que para que se construa de fato o Brand Equity é necessário se realizar a

criação de um conjunto de atributos, valores, percepções e sentimentos que se

conectam com a marca, incorporando um sentido de valor que ultrapassa os

benefícios funcionais e o custo percebido do produto ou serviço oferecido pela

empresa. De acordo com o autor, os dois conceitos de Brand Equity não se

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dissociam completamente, já que ao se trabalhar valor agregado da marca pode-

se gerar um aumento de seu valor patrimonial.

Tendo em vista que este trabalho visa identificar de que forma a técnica de

Storytelling associada à propaganda auxilia na criação de valor de marca,

compreende-se que esta seja uma dimensão mais subjetiva do tema e, portanto,

trabalha-se aqui o segundo conceito de Brand Equity apresentado pelo autor, ou

seja, aquele que o considera enquanto agregação de valor à marca. Dessa forma,

faz-se importante conceituar o que vem a ser Brand Equity para autores que se

dispuseram a estuda-lo sob esta linha de pensamento. Vale ressaltar, entretanto,

que não se atingiu um consenso entre os autores a respeito de sua conceituação.

Assim, para Keller (1998), o Brand Equity pode ser definido como o efeito diferencial

que o conhecimento da marca tem sobre a resposta do consumidor ao marketing

dessa marca. Já para Axelrod (1992), ele consiste na quantia adicional que o

consumidor está disposto a pagar para obter um produto com marca, em vez de

um produto fisicamente comparável, mas sem marca. Farquhar (1989) considera

que a marca confere um valor ao produto que vai para além da sua função. Ele

afirma que a marca pode ser portadora de valor acrescentado para a empresa,

para o comércio e para o consumidor. Finalmente, Aaker (1996), define Brand

Equity como um conjunto de recursos que se agregam ao valor proporcionado por

um produto ou serviço em beneficio da empresa ou de seus clientes.

Tendo conceituado a partir de diversas linhas teóricas o que vem a ser Brand

Equity, vale ressaltar que se considera no meio acadêmico os estudos de David

Aaker uns dos mais relevantes na área de branding, já que o autor se dedica ao

tema e, principalmente, aos estudos sobre valor de marca, há muitos anos. Dessa

maneira, tendo em vista que não há consenso tanto na definição do conceito quanto

na determinação dos ativos que compõe o Brand Equity, optou-se por determinar as

considerações deste autor em seu livro “Criando e Administrando Marcas de

Sucesso”, de 1996, como principal linha teórica para as investigações desenvolvidas

no presente trabalho. Assim, Aaker (1996) para demonstrar como se dá a criação do

Brand Equity, divide-o em recursos (também chamados de ativos) de quatro

categorias, que são: conscientização sobre a marca registrada, fidelidade em

relação à marca, qualidade percebida e associações relativas à marca. Ele afirma

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23

que cada um desses ativos cria valor de formas diferentes e, assim, para

compreender melhor esse processo, o autor explica de forma mais detalhada cada

uma das categorias citadas.

Dessa maneira, Aaker (1996) se refere à conscientização de marca como

caracterizada pelas diferentes maneiras de lembrança que a marca possui perante

os consumidores, podendo ser de três níveis diferentes. O primeiro é o

reconhecimento da marca, que se origina na familiaridade causada pela exposição

anterior e consiste no simples reconhecimento de que houve um contato com a

marca. O segundo nível citado pelo autor é a recordação da marca, que pode ser

medido uma vez que sejam, por exemplo, mencionados produtos que fazem parte

da categoria de segmento de mercado que a marca se encaixa e, nesse contexto, a

marca é lembrada. Essa capacidade de ser recordada é o que garante à marca a

chance de estar cogitada entre as opções do consumidor em uma lista de compras.

O último nível consiste no predomínio da marca registrada, no qual a marca é a

única lembrada quando se refere a determinada categoria de produtos. Aaker (1996)

alerta para o fato de que deve-se tomar cuidado com esse nível para que não se

perca o domínio sobre a representação que a marca possui, como ocorreu com a

Aspirina, por exemplo.

Sobre a fidelidade em relação à marca, Aaker (1996) afirma que seja esta

uma consideração fundamental quando se pensa em valor que é atribuído a uma

marca. Para ele, uma marca se torna extremamente vulnerável caso não possua

clientes fiéis e, alem do mais, manter fidelidade é muito menos dispendioso para a

gestão de marketing do que buscar novos clientes. Por isso, erra-se gravemente ao

tentar sempre buscar clientes novos e negligenciar os clientes que já são fiéis. Para

tratar de forma mais eficiente desse assunto, Aaker (1996) sugere que seja feita uma

segmentação da fidelidade, recurso que auxilia no desenvolvimento de uma marca

sólida. A classificação é realizada da seguinte forma: os não-clientes, os

pesquisadores de preços, os clientes passivamente fiéis, os “em cima do muro” e os

comprometidos. Para aumentar a fidelidade dos “em cima do muro”, o autor afirma

que podem ser desenvolvidos programas de comprador frequente e clubes de

cliente, fazendo com que a conscientização, a qualidade percebida e a identidade

eficiente e nítida da marca contribuam para o fortalecimento do relacionamento.

Page 30: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

24

O terceiro ativo de marca, a qualidade percebida, é definido por Aaker (1996)

como “uma associação com a marca que é elevada à condição de recurso por

diversas razões”. Essas razões mencionadas por ele são: impulsiona o desempenho

financeiro, impulsionador estratégico do empreendimento, está vinculada a outros

aspectos da forma como a marca é percebida. Assim, compreende-se o quão

importante para a organização é o recurso da qualidade percebida. Por esse motivo,

Aaker (1996) considera que se deve trabalhar para criar esse ativo, desde que esta

operação se dê de forma cuidadosa, buscando afirmar apenas proposições que

tenham fundamento. Desenvolver um alto padrão de qualidade para os produtos é

uma das tarefas. Deve-se também desenvolver uma cultura de apoio que objetive a

criação de percepções. O autor ressalta, contudo, que a qualidade real e a

percebida podem divergir por diversas razões, que vão desde a busca por uma

qualidade em uma dimensão que os consumidores não consideram importante até a

busca por indicações erradas por parte destes.

Por último, a respeito das associações relativas à marca, Aaker (1996) afirma

que são aquilo que sustenta, em maior parte, o Brand Equity. Elas podem ser feitas

por meio da utilização de um garoto-propaganda, enfatizando atributos do produto

ou fazendo uso de determinado símbolo. Essas associações, considera o autor, são

impulsionadas pela identidade de marca, a qual é definida como “aquilo que a

organização deseja que a marca represente na mente dos clientes.” (AAKER, 1996,

p. 36). E, dessa maneira, as marcas de sucesso são construídas por meio de

elementos fundamentais, que são o desenvolvimento e a implementação da

identidade de marca. Assim, a partir da definição dos ativos de marca, responsáveis

pelo desenvolvimento do Brand Equity, Aaker (1996), observa que não é uma tarefa

fácil desenvolver marcas sólidas no ambiente atual, já que o planejador pode ser

restringido por diversas pressões e barreiras diferentes.

Page 31: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

25

3. METODOLOGIA

Tendo em vista a solução do problema de pesquisa por meio da concretização

dos objetivos, faz-se necessário estabelecer qual o método de abordagem que este

trabalho se utilizou para que a pesquisa fosse desenvolvida e, a partir de então,

definir quais foram os melhores procedimentos metodológicos adotados para que

uma construção científica fosse desenvolvida de forma coerente com a realidade.

Assim, com o objetivo de identificar como o Storytelling pode ser utilizado para

auxiliar na criação de valor de marca, fez-se necessária a análise de caso de uma

campanha publicitária que fez uso dessa técnica. Como recorte, foi selecionada a

rede de farmácias Panvel, que ficou nacionalmente conhecida no fim do ano de

2012 por produzir uma campanha utilizando a técnica de Storytelling.

Dessa maneira, pode-se determinar que foram utilizadas no desenvolvimento

deste trabalho duas formas de pesquisa diferentes. A primeira é uma pesquisa

analítica qualitativa dos casos de uso do Storytelling em uma campanha de

publicidade visando à criação de valor de marca, com o objetivo de identificar os

fatores que contribuem ou determinam o sucesso dessas propagandas e como estas

se relacionam com o Brand Equity. Essa análise se deu por meio de estudos

bibliográficos. A segunda forma de pesquisa foi exploratória qualitativa, na qual

foram realizadas entrevistas em profundidade, via e-mail. De acordo com Hair (et al

2005, p. 85), “uma entrevista em profundidade é uma sessão de discussão

individual entre um entrevistador e um entrevistado. Os entrevistados em geral são

escolhidos com cuidado por terem algum conhecimento especializado.” Tendo,

portanto, escolhido este método como o mais adequado para a realização das

investigações necessárias a esta pesquisa, foram realizadas três entrevistas, sendo

uma delas com o vice-presidente da empresa analisada, cujas informações foram

determinantes para que a análise de branding fosse desenvolvida, e outras duas

com profissionais da área de publicidade, com o objetivo de enriquecer o trabalho

utilizando o conhecimento deles. O critério de seleção desses profissionais foi de

que esses tivessem conhecimentos acadêmicos e/ou científicos tanto na área de

branding quanto a respeito de Storytelling.

Para que o Storytelling seja compreendido como ferramenta utilizada na

publicidade, esse trabalho se embasou no livro de Antonio Núñez, em “É Melhor

Page 32: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

26

Contar Tudo – O poder de sedução das histórias no mundo empresarial e pessoal”,

no livro “Story - substância estrutura estilo e os princípios da escrita de roteiro”, do

conceituado roteirista Robert Mckee e nos estudos de Fernando Palacios, em “A

contextualização criativa de histórias como fator de sucesso no planejamento de

campanhas de comunicação”. Palacios é um dos pioneiros no Brasil no estudo de

histórias associadas à comunicação organizacional, sendo o cofundador da primeira

agência de Storytelling do país e um dos professores do conceituado curso

Storytelling e Transmídia da Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Com o propósito de justificar a importância do estudo do Storytelling na

propaganda, esse trabalho se embasou no conceito de publicidade associada ao

entretenimento. Dessa forma, a linha de estudos seguida para que se compreenda

esse contexto foi a de Scott Donation, em seu livro “Publicidade + Entretenimento”.

Após a contextualização do conceito e dos usos do Storytelling, fez-se necessário o

desenvolvimento de um estudo a respeito de branding, para que se pudesse fazer

um parâmetro e compreender como o Storytelling ajuda na construção de marcas.

Para compreender como os consumidores formam significado e por meio

deles compreendem as marcas, foi realizada uma fundamentação breve de acordo

com as considerações a respeito do significado da marca de Mark Batey e Martin

Lindstrom. Por fim, para analisar como é construída a identidade e a

personalidade de marca para, então, estudar o Brand Equity, foi utilizado

principalmente o livro “Criando e administrando marcas de sucesso” de David A.

Aaker. Em suma, este trabalho se embasou em estudos bibliográficos com o objetivo

de traçar uma linha teórica que analisasse, em um primeiro momento, o uso do

Storytelling enquanto ferramenta da publicidade como um resultado contemporâneo

da convergência entre as indústrias do entretenimento e da propaganda. Depois

disso, foram estudados livros de autores conceituados que tratam do assunto de

branding e, finalmente, foram realizadas entrevistas, tanto com profissionais que

entendem de ambos os assuntos (Bruno Scartozzoni – professor de Storytelling e

Daniel Padilha – professor de branding), quanto com a empresa cuja campanha é o

objeto de estudo deste trabalho para que, a partir de seu conhecimento, associado à

linha teórica desenvolvida, fosse possível analisar o objeto de estudo e determinar

de que forma o Storytelling auxilia na criação de valor de marca.

Page 33: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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4. ANÁLISES DO OBJETO DE ESTUDO

4.1 O OBJETO DE ESTUDO

O objeto de estudo eleito para aplicar o referencial teórico deste trabalho é a

peça em vídeo intitulada “A História de Sofia”, desenvolvida como parte de uma

campanha publicitária institucional cujo anunciante é a rede de farmácias Panvel.

Antes de apresentar a peça em questão e a anterior a ela, que ajudou a compor a

campanha, faz-se necessário conhecer um pouco melhor a empresa responsável

pela comunicação, já que suas características e sua forma de expressar sua cultura

organizacional estão fortemente ligadas ao que foi comunicado. Assim, de acordo

com o website da Panvel, esta é a maior rede de farmácias do sul do país, com

aproximadamente 4,8 mil empregados e 290 lojas localizadas nos estados do Rio

Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Atende cerca de 27 milhões de clientes ao

ano e é considerada uma empresa tradicional principalmente em seu estado sede,

tendo mais de 40 anos de existência. Desde o ano de 1989, a Panvel começou a

comercializar produtos de marca própria, com cerca de 500 produtos divididos em 15

submarcas, sendo a pioneira do ramo a adotar esta prática.

Ainda de acordo com o site da empresa, a Panvel tem como missão

“proporcionar saúde e bem-estar às pessoas", sendo que sua visão é "ser a melhor

provedora de produtos e serviços de saúde e bem-estar nos mercados em que

atua". Seus valores são: trabalho em equipe, excelência no atendimento, ética,

inovação, agilidade e orientação para o resultado. O atual vice-presidente da Panvel,

Julio Mottin Neto, em palestra no 21º Congresso de Marketing ADVB/RS (2012),

disponível no canal oficial do Youtube6 dos responsáveis pelo evento, afirma que a

empresa baseia a construção da sua marca em qualidade e inovação, já que sempre

se investiu bastante em qualidade, tanto dos produtos quanto no atendimento,

procurando inovar em suas ações para se atingir uma diferenciação. Neto enfatiza

que a missão da empresa pode ser traduzida através da frase “Você sempre bem”,

já que a intenção é que se busque o bem-estar do consumidor quando este se

relacionar com a marca. Esta foi a frase utilizada como slogan da campanha

institucional da rede de farmácias cuja peça é objeto de análise deste trabalho.

6 Palestra disponível no endereço www.youtube.com/watch?v=Xs9JjH3CmT0

Page 34: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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A respeito desta campanha, na mesma palestra, Neto (2012) explica as

motivações que levaram a empresa a adotar uma abordagem publicitária que

cativasse a atenção do público. Ele afirma que o consumidor virou mídia, e mídia

precisa de conteúdo. Isso significa que este agora pode expressar sua opinião a

respeito das marcas com as quais se relaciona de maneira muito mais aberta, rápida

e prática com a facilidade proporcionada pela internet e, justamente por isso, essa

nova forma de se relacionar com as marcas pode ser tanto uma ameaça quanto uma

oportunidade, dependendo da forma como se trabalha esse comportamento. No

caso da Panvel, buscou-se entender enquanto oportunidade e, aproveitando que as

pessoas costumam falar a respeito das marcas em suas páginas nas redes sociais

da internet, percebeu-se o quanto a produção de conteúdo de marca seria uma boa

estratégia para gerar buzz positivo.

Assim, o palestrante descreve de onde partiu a ideia de se produzir conteúdo

de marca por meio de vídeos. Ele conta que desde que começou a utilizar a internet,

uma característica que percebia em seus contatos e no comportamento das pessoas

com as quais se relacionava era que todos gostam de compartilhar vídeos

interessantes, engraçados ou polêmicos, fosse via e-mail ou por meio das redes

sociais. Dessa forma, ele afirma, já que as pessoas estão dispostas a compartilhar

coisas, por que não produzir um conteúdo interessante relacionado à marca para

que elas possam dividir com os amigos? A ideia nesse caso não era divulgar a

marca, mas propagar uma ideia ou conceito com o qual o público se identificasse.

Dessa forma, a campanha que deu origem ao vídeo “A História de Sofia”7, de

acordo com Neto (2012), teve três fases de ativação. A primeira foi um teaser, que

consistia no vídeo “O filme do Lilinho”8 e alguns banners na fanpage instigando o

público a assistir ao novo filme da Panvel. A segunda foi uma pré-estreia, na qual se

montava mosaicos com os amigos daqueles que clicavam e aderiam a um aplicativo

e quando completasse a meta de 100 mil amigos o filme seria liberado. Em quatro

horas esse número se completou, ficando o filme disponível na internet por dois dias

apenas para quem curtia a fanpage da farmácia. A terceira fase de ativação foi a

7 Disponível para visualização no endereço www.youtube.com/watch?v=7vQwoywtjTk

8 Disponível para visualização no endereço www.youtube.com/watch?v=Bhoif3IcRuo

Page 35: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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estreia, na qual o filme foi veiculado no horário nobre da rede Globo, canal aberto,

durante a exibição da novela principal do canal. Além disso, foram feitas outras duas

inserções na mesma novela, comprada a capa do YouTube, enviado a jornalistas

formadores de opinião um press kit com um cachorrinho de pelúcia e algumas

informações a respeito da peça “A História de Sofia” e fixado nas lojas cartazes com

imagem da cachorrinha protagonista da peça e um QR Code, para que as pessoas,

assim o que decodificassem, tivessem acesso instantâneo ao vídeo no YouTube.

Com todos esses esforços, Neto (2012) afirma que em uma semana o vídeo

teve um milhão de acessos na internet. Atualmente, mais de um ano após seu

lançamento, o número se aproxima de dois milhões. Foram muitos

compartilhamentos e comentários no Facebook e, enquanto feedback, um dado

interessante citado pelo palestrante é de que 1200 pessoas ligaram no Serviço de

Atendimento ao Consumidor da Panvel, não para fazer uma reclamação ou sugerir

alguma melhoria, mas para elogiar o filme que eles haviam veiculado recentemente.

Com todos esses resultados, Neto afirma que o principal aprendizado adquirido é de

que atualmente a propaganda precisa se adequar a esse novo consumidor, de forma

a causar uma expressão em vez de uma impressão. Ou seja, o público que replica o

comercial não deseja divulgar a marca, mas sim expressar seu próprio

individualismo. Ele finaliza sua palestra afirmando que está na hora das marcas

deixarem de interromper os interesses das pessoas e passarem a ser o que elas

estão interessadas.

Para compreender mais a fundo a campanha responsável pela veiculação do

filme que está sob análise neste trabalho, é importante entender o primeiro filme

veiculado, que serviu como teaser para o vídeo “A História de Sofia”. A peça

publicitária em questão, com o título “O filme do Lilinho” traz uma reflexão a respeito

das relações que mantemos em nossas vidas e se mescla a uma emotividade

proporcionada pelas belíssimas imagens que ilustram toda a narração e a trilha

sonora suave e sensível, que intensificam o envolvimento que o consumidor cria

com a peça e, principalmente, com a mensagem comunicada. No Quadro 1, segue a

apresentação do roteiro do vídeo, para melhor compreensão de como ele se dá.

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NARRAÇÃO IMAGEM

Narrador masculino, voz calma.

Querida filha, eu só estou escrevendo este texto porque você ainda não sabe ler. Do contrário, eu não escreveria.

É que você ia ficar bem chateada em saber que o seu peixe, o Lilinho, morreu. De modo que aquele que está no seu aquário agora é bem parecido, mas não é o Lilinho.

Sua mãe... Ah, as mães são assim. Sem que você soubesse resolveu comprar outro e por no lugar dele. Foi uma coisa bem rápida, filha. Você acordou, contou que o Lilinho estava dormindo de maneira estranha e logo vimos o tamanho do problema.

Foi então que tivemos que decidir entre contar a verdade ou driblar o destino. Deixar que esta fatalidade tomasse conta do seu coraçãozinho em formação ou desafiar as possíveis consequências de uma mentira como essa.

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E se você notasse? E se você viesse a perceber a diferença de tamanho? Ou pior, se descobrisse uma nadadeira a menos?

Ainda bem que nada disso aconteceu. Ainda bem, minha filha. Seus pais conseguiram adiar minimamente esse sentimento terrível que a perda dá. Fatalidades não são algo que crianças tem que saber.

Crianças, aliás, não deveriam saber de nada ruim. Somente que os peixes nadam, que os passarinhos voam e que os avôs “avoam”.

Por isso mesmo é que eu estou aqui, contando essa história. Para que você um dia saiba que a sua mãe e o seu pai interferiram no circuito e deixaram ele menos curto.

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Fica então uma dica pra você. Sempre que possível, interfere. Nada precisa ser como é.

Quadro 1: Roteiro "O Filme do Lilinho”

Um ano após a veiculação deste filme, a Panvel produziu o filme “A História

de Sofia”, que se assemelha com o primeiro vídeo em alguns pontos. O primeiro é o

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fato de se ter como tema um animal de estimação; no primeiro, havia o peixe Lilinho

e, no segundo, a cachorrinha Sofia. O segundo ponto em comum é o narrador em off

que aparece em ambos os vídeos, contanto uma história. A diferença principal é que

no segundo filme conta-se a história da cachorrinha Sofia, em vez de utilizá-la como

pretexto para se iniciar a discussão trazida pela narrativa, que é o recurso utilizado

no filme de Lilinho. Um fato interessante a respeito das duas peças produzidas é de

que os fatos são reais, sendo que o peixe Lilinho e a cachorra Sofia realmente

existiram e pertenciam ao dono da produtora responsável pela campanha para a

Panvel, José Pedro Goulart, sendo que os roteiros dos filmes consistem em

adaptações de crônicas publicadas por ele em seu livro “A voz que se dane”. Isso

configura um fator essencial das histórias de acordo com Scartozzoni (apud Pinto,

2012): a verdade humana.

Assim, o vídeo “A História de Sofia” é produzido igualmente com recursos que

garantem grande envolvimento e identificação com a mensagem comunicada, Para

compreender o filme, no Quadro 2, a seguir, é descrito o roteiro do vídeo.

NARRAÇÃO IMAGEM

Narrador masculino, voz calma.

Se você se chama Sofia ou tem alguém querido com esse nome, por favor, não fique chateado comigo. Mas a Sofia em questão aqui é uma cachorrinha que mora no pátio lá de casa.

Sofia é uma mistura de alguma coisa com coisa nenhuma. Quando ela chegou ela parecia uma bolinha de tênis, amarelinha, assim, felpudinha e foi trazida pra fazer companhia pra Brigitte.

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A Brigitte, uma outra vira-lata que por sua vez havia sido recolhida há mais tempo da rua. Muito doente, raquítica. A cachorra mais magrinha que já vi.

Devo dizer que apesar dos nomes de artistas de cinema nos dois casos só foi coincidência.

Mas eu tenho certeza que a Brigitte Bardot, dado seu interesse pelos animais, ia até ficar feliz de ter uma xará como a Brigitte. Uma cadelinha que sabe ficar na dela como ninguém. Ela se quer late para não incomodar o dono.

Mas eu contava da Sofia. Cadelinha acostumada a afagos diários. Ela, até onde eu sei, é o único cachorro que ronrona feito gato. Basta dar-lhe uma coçadinha na barriga. Pode ser com o pé mesmo, que ela não é exigente.

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Ultimamente, porém, ela tem andado triste. Muito triste, aliás. É que há alguns meses nasceu a minha filha. E a Sofia, eu confesso, ela foi deixada um pouquinho de lado.

A Brigitte não se importa muito, ela se acha no lucro. Casinha, ração, água, um ossinho do churrasco e passarinho pra correr atrás. E tudo isso vem com um bônus extra, uma vez que a vida dela esteve por um fio.

Mas a Sofia... Nesse último fim de semana ela apresentou um olhar cabisbaixo, orelhas no chão, coisa de cortar a alma.

Lembrei de um livro que li quando criança: Coração de Vidro, de José Mauro de Vasconcelos. Nele os bichos sofriam com a indiferença ou a maldade dos donos. Eu recordo do imenso sofrimento que senti e também de algo que me intrigou.

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O coração de vidro do título era a respeito dos bichos e representava como esse coração era frágil, quebrável, ou era a respeito de nós, humanos, e de como podemos ficar impermeáveis a certas emoções?

Olhei pro lado, no chão, e a minha filha de nove meses se divertia colocando a mão na boca da Sofia, puxando-lhe as orelhas, apertando-lhe o nariz. E a Sofia nem pensava numa pequena vingança, um arranhãozinho, uma mordidinha, quem sabe.

Apenas olhava pra mim. Não era um olhar ressentido, muito menos desafiador. Era apenas um olhar de saudade.

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Quadro 2: Roteiro “A História de Sofia”

Neste vídeo, faz-se uso de imagens que ilustram de maneira impecável a narrativa e

de uma trilha sonora que transporta o espectador para o plano da história. Em

entrevista concedida à autora, Bruno Scartozzoni (2013) afirma que esse filme foi

bem sucedido principalmente porque consiste em uma história muito bem contada,

tanto em questão de roteiro, quanto de técnicas de filmagem, e que aposta sem

medo no poder da emoção. Ele afirma que mesmo tendo sido feito por uma

empresa, a peça publicitária não deixou a desejar, conseguindo ser um filme que

gera interesse intrínseco nas pessoas e que não subestima seu público.

4.2 ANÁLISE DE STORYTELLING

Após apresentar o objeto de estudo de maneira detalhada, este trabalho se

volta para a análise de Storytelling da peça publicitária “A História de Sofia”. Para

tanto, utiliza-se as considerações realizadas por Robert Mckee em seu livro Story –

substância, estrutura, estilo e os princípios da escrita de roteiro, para que a partir de

sua teorização possa-se investigar como a narrativa foi construída e de quais

recursos se utilizou para que o filme tivesse todo o prestígio e sucesso que teve.

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4.2.1 ESTRUTURA

Dessa forma, de acordo com Mckee (2010), as estórias são compostas por

atos, que são formados por sequências, feitas por cenas e, estas, por sua vez,

consistem em um conjunto de beats. O autor afirma que um beat é uma mudança de

comportamento em ação e reação, enquanto que uma cena transforma, através de

conflito, a condição humana de uma personagem. Devido ao fato de o filme

analisado ser composto por diversos flashes de imagem que ilustram tempos da

narração feita pelo protagonista, considera-se que não existam cenas propriamente

ditas neste vídeo, apenas beats. Por outro lado, é possível perceber três atos que

dividem a narrativa: o primeiro consiste na descrição dos hábitos e características da

cachorrinha Sofia; o segundo ocorre a partir do momento em que a filha do

protagonista nasce, criando-se o conflito principal; e, por último, o terceiro ato é

marcado pelo clímax, que se dá no momento em que a criança brinca com a Sofia e

ela lança seu olhar de saudade, e pela resolução, que é o breve momento posterior

ao clímax em que se mostra imagens do dono brincando com a cachorrinha.

4.2.2 GÊNERO

A respeito do gênero utilizado para que a estória fosse construída, não foi

possível identificar um qual se adequasse completamente às características do filme

analisado em meio aos vinte e cinco tipos de gêneros descritos por Mckee (2010).

Aquele que mais se aproximou com a temática da narrativa foi o gênero

“mocumentário”, descrito pelo autor como aquele que se enraíza na memória ou na

verdade, comportando-se como documentário ou autobiografia, mas sendo pura

ficção. A diferença, nesse caso, é que a estória contada é, de fato, real. Contudo,

misturar gêneros, de acordo com o autor, é algo possível de se fazer, e, inclusive,

essa prática enriquece a personagem e cria variedades de clima e emoção. Pode-se

constatar que no caso analisado houve uma mistura de drama com mocumentário.

Mckee (2010) explica também um pouco sobre da constituição da personagem. De

acordo com ele, a verdadeira personagem só se revela a partir do momento em que

esta precisa agir sob pressão, já que apenas características de sua personalidade

não fazem com que seu verdadeiro caráter se mostre. Considerando que uma das

principais personagens do vídeo analisado é a cachorrinha Sofia, pode-se

Page 45: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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determinar que o momento em que ela esteve sob maior pressão foi durante o

terceiro ato, no momento em que a filha de seu dono brinca com ela e, de acordo

com o narrador, Sofia não planeja nenhuma vingança contra a responsável por ela

ter sido deixada de lado, nem sequer um arranhãozinho. Ela apenas lança ao dono

um olhar de saudade. Esse comportamento revela a natureza pura e fiel da

personagem que, no caso, tem como função transmitir ao espectador a ideia de que

todos os cães possuem essa relação de amizade verdadeira e desinteressada com

seus donos e, por isso, devemos, sempre que possível, buscar exercer amizades

mais verdadeiras como essa, amizades mais “felpudas”.

4.2.3 SIGNIFICADOS NA NARRATIVA

Sobre significados que permeiam a narrativa, Mckee (2010) descreve o

fenômeno de emoção estética, que se dá a partir do fato de a arte unir a ideia e a

emoção, gerando epifanias e reflexões no espectador. Isso é possível, segundo o

autor, porque a fonte de toda arte é a psique humana primitiva. Assim, a partir do

momento que uma ideia se junta a uma carga emocional, ela se transforma naquilo

que há de mais poderoso, profundo e memorável. Assim, ele afirma, “uma estória

bem contada não expressa os argumentos exatos de uma tese nem desabafa

emoções raivosas ou incompletas. Ela é o triunfo do casamento entre o racional com

o irracional” (MCKEE, 2010, p 115). A partir dessas considerações pode-se

compreender o porquê do filme “A História de Sofia” ter sido tão bem sucedido: ele

une o argumento principal que se deseja transmitir aos espectadores racionalmente,

à emoção transmitida pela estória que é contada, ou seja, diz algo como “viva e

valorize amizades mais verdadeiras, pois a Panvel deseja que você esteja sempre

bem”, mas faz isso de forma que, ao se atingir a mensagem, esta completa o ciclo

criado durante toda a narrativa e envolve o público em uma conclusão emocional e,

ao mesmo tempo, racional. Justamente por isso, o filme é profundo e memorável.

4.2.4 PROTAGONISTA

Prosseguindo com as considerações de Mckee (2010), a respeito da

substância da estória, ele descreve como se dá o uso de alguns recursos. Assim, de

Page 46: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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acordo com o autor, a narrativa pode ter como protagonista uma única personagem,

ou ser multi-protagonista, quando mais de duas personagens são protagonistas que

dividem o mesmo ideal e trabalham para um bem coletivo. A estória também pode

ser pluri-protagonista, ou seja, protagonistas diferentes possuem motivações

distintas. O autor também afirma que o protagonista não precisa necessariamente

ser humano. Ele pode ser um animal, um desenho animado, ou “qualquer coisa que

possa ter vontade própria e que tenha capacidade de desejar, agir e sofrer as

consequências pode ser um protagonista”. (MCKEE, 2010, p. 137).

Assim, no caso do filme analisado, encontram-se dois pontos de vista a

respeito de protagonista. Por um lado, considera-se que a cachorrinha Sofia seja a

protagonista, pois vive os fatos acontecidos na narrativa, que se volta a ela na maior

parte do tempo. Contudo, por outro lado, pode-se considerar o narrador em primeira

pessoa como um protagonista, já que a estória contada é sobre a cachorrinha que

mora em sua casa. Ou seja, corresponde a sua própria vida. Neste trabalho será

considerado tanto a Sofia quanto o narrador como protagonistas, sendo que ora um

se sobressai, ora outro. Dessa maneira, considerando, neste momento, a segunda

possibilidade de análise, a de que o protagonista é, na verdade, o próprio narrador,

pode-se notar aplicada uma das dicas apresentadas por Mckee (2010) a respeito da

composição do protagonista. O autor afirma que de forma a desenvolver um

envolvimento emocional com o público, é necessário que haja uma empatia. Isso

porque, de acordo com ele, quando as pessoas se identificam com um protagonista

e seus desejos na vida, elas estão de fato torcendo por seus próprios desejos.

Dessa forma, compreende-se que a propaganda analisada possui um profundo

impacto nos espectadores justamente por eles se identificarem com o dono da

cachorrinha que acaba sendo deixada de lado algumas vezes. Diferentemente do

“Filme de Lilinho”, que promovia maior identificação com pais e mães, “A História de

Sofia” abrange seu público e trata de um tema muito mais universal: nossas próprias

emoções e atitudes refletidas no comportamento de um animal de estimação. Esse

pode, inclusive, ser um dos fatores que contribuíram para que o segundo filme

lançado pela Panvel tivesse tido maior sucesso do que o primeiro.

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41

4.2.5 O INCIDENTE INCITANTE

A respeito dos princípios do design da estória, Mckee (2010) descreve o

Incidente Incitante. Este consiste em um evento que desarranja o equilíbrio da vida

do personagem, tanto de forma positiva, quanto de forma negativa, tendo sido

causado ao protagonista ou por ele. É o Incidente Incitante que coloca a estória em

movimento, sendo que o protagonista sempre reage a ele, de forma a buscar a

recuperação do equilíbrio que sua vida possuía anteriormente. Dessa forma, na

propaganda analisada, pode-se considerar como Incidente Incitante o nascimento da

filha do narrador, já que este evento quebra a normalidade da rotina dos

personagens. Considerando a cachorrinha Sofia como protagonista, percebe-se sua

busca por retomar o equilíbrio das coisas, já que sua tristeza caracteriza seu desejo

de que sua vida seja como era antes, quando ela recebia atenção de seus donos

com muito mais frequência. Seu olhar de saudade pode ser considerado sua única

possível ação perante o incidente incitante em busca de trazer sua vida de volta, já

que, como visto anteriormente, quando posta sob pressão, é possível conhecer a

natureza pura da personagem, que, por ser fiel ao dono, não tomaria nenhuma

medida que desagradasse a ele (como morder ou arranhar a criança que brinca com

suas orelhas como forma de demonstrar seu descontentamento para que sua vida

tivesse o equilíbrio restaurado). Da mesma maneira, considerando o narrador como

o protagonista da estória, compreende-se como incidente incitante o mesmo evento,

já que ele causa uma quebra na rotina dele, que agora precisa fazer papel de pai e

encontrar tempo para dar atenção aos seus animais de estimação.

4.2.6 COMPLICAÇÕES PROGRESSIVAS

Na ordem do desenvolvimento do design do ato, Mckee (2010) afirma que

após o Incidente Incitante têm-se as Complicações Progressivas, que é o momento

que antecede o clímax e que possui uma grande quantidade de conflitos que o

protagonista precisa enfrentar antes de passar pelo conflito final. No filme “A História

de Sofia” essas complicações acontecem de forma bem breve, caracterizadas pelo

comportamento triste da cachorrinha. O autor também considera que existem três

tipos diferentes de conflito que podem estar presentes na narrativa: conflitos

internos, que se caracterizam como uma narrativa que se volta ao fluxo de

Page 48: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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consciência de uma personagem; conflitos pessoais, que consiste no foco na

relação entre as personagens; e conflitos extra-pessoais, caracterizados por

situações grandiosas que acontecem com o protagonista (geralmente presentes em

filmes de ação e aventura). Na propaganda analisada, é possível constatar a

presença de conflitos pessoais, que se dão ao nível em que os fatos acontecem, ou

seja, nascimento da filha e contato com os animais de estimação. Porém, o maior

tipo de conflito presente na narrativa é o interno. A respeito deste, o autor considera

que “apesar de estarmos dentro da mente de uma única personagem, a mente desta

personagem é povoada por memórias e imaginações sobre todas as pessoas que

ele já encontrou ou espera encontrar.” (MCKEE, 2010, p. 205). Assim, considerando

que toda a estória faz parte de constatações e lembranças presentes na vida do

narrador e que seu ponto de maior profundidade ocorre no momento em que este se

lembra de quando leu a estória a respeito da fragilidade do coração dos animais, é

possível determinar que os conflitos internos sejam o que movem esta narrativa.

4.2.7 CRISE

Após a fase de Complicações Progressivas, Mckee (2010) considera que a

terceira parte da composição do design da estória seja a Crise. Esta significa

decisão. É neste momento que o protagonista toma sua decisão mais suprema e

importante dentro do enredo, ocasionada progressivamente pelas complicações que

surgiram a partir do Incidente Incitante. A crise deve ser um dilema, sendo que a

decisão tomada pelo protagonista irá revelar novamente a natureza mais profunda

de seu caráter. Dessa forma, pode-se analisar que na “História de Sofia”, a crise

maior ocorra no momento em que a filha do narrador brinca com a cachorrinha e,

assim, Sofia sofre um dilema: vingar-se da responsável por sua vida não ser mais

como ela gostaria que fosse; ou manter-se imóvel, permitindo-se a apenas lançar a

seu dono um olhar de saudade. Ao constatar que a protagonista opta pela segunda

opção, pode-se comprovar que, diante da maior crise da estória, ela se mantém fiel

a suas características mais profundas. Esta ação tomada pela cachorrinha culmina

no quarto item da composição do design da estória: o Clímax.

Page 49: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

43

4.2.8 CLÍMAX E RESOLUÇÃO

De acordo com Mckee (2010), o clímax não precisa ser violento ou cheio de

ação. O que é fundamental no Clímax é que ele seja repleto de significado, já que,

para o autor, significado é o que produz emoção e o que move o coração do público.

Dessa maneira, pode-se considerar que o Clímax da estória analisada ocorre no

momento em que o narrador explica que o olhar que Sofia lançava a ele não era

ressentido ou desafiador, mas de saudade. Finalmente, após o Clímax, o último item

que compõe o design da estória, de acordo com Mckee (2010), é a Resolução. Este

consiste naquilo que resta após o Clímax, o resultado ou as consequências que ele

trouxe. Assim, a Resolução da peça analisada consiste em um momento em que o

protagonista narrador e a cachorrinha se recordam dos momentos em que estavam

felizes juntos. Essas cenas também podem ser vistas como a possibilidade que o

narrador contempla de modificar suas ações e passar a dedicar mais atenção à sua

cachorra.

4.2.9 ESTRUTURA DE SCARTOZZONI

Por fim, para finalizar a análise de Storytelling, podemos aplicar o esquema

de construção de estórias descrito por Bruno Scartozzoni em seu curso de

Storytelling e Transmídia da plataforma Três Pontos. O primeiro elemento é a quebra

de rotina, caracterizada na peça analisada pelo nascimento da filha do narrador. O

segundo elemento importante é o protagonista, que, neste caso, pode ser encarado

de duas maneiras diferentes; a primeira é considerando-o como a cachorrinha Sofia

e a segunda como o narrador participante. O terceiro elemento é caracterizado pelos

conflitos que o protagonista enfrenta, que, no caso analisado, pode ser visto como o

comportamento de tristeza adotado pela cachorrinha. O quarto elemento é

transformação. Esta pode ser percebida quando o narrador conta a respeito do livro

que leu quando criança que o fez refletir a respeito de como os humanos podem

ficar impermeáveis a certas emoções e, por isso, quando Sofia lança a ele seu olhar

de saudade, ele agora a percebe e constata que a deixou de lado nos últimos

meses. Por fim, a verdade humana, quinto elemento da construção de estórias,

consiste na mensagem transmitida pelo filme, que incentiva os espectadores a

Page 50: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

44

viverem amizades mais verdadeiras e prestarem mais atenção em suas relações,

pois podem acabar ficando impermeáveis a certas emoções.

4.3 ANÁLISE DE VALOR DE MARCA

Após desenvolver uma análise que busca compreender de que maneira foi

aplicada a técnica de Storytelling na propaganda escolhida como objeto de estudo,

este trabalho se volta agora para uma análise a respeito de como o valor de marca

pode ter sido construído com o auxílio da campanha em questão. Para tanto, utiliza-

se como metodologia de estudo as Dez Medidas de Equidade de Marcas, esquema

de mensuração de Brand Equity desenvolvido por Aaker (1996) com o propósito de

tornar mais palpável a verificação da construção do valor das marcas. Os dados

utilizados para as análises se baseiam tanto em uma palestra dada pelo vice-

presidente da Panvel, Julio Mottin Neto, no 21º Congresso de Marketing ADVB/RS

(2012), disponível no YouTube, quanto em uma entrevista realizada com ele pela

autora deste trabalho em outubro de 2013. Vale ressaltar que, considerando a

impossibilidade de se realizar uma pesquisa quantitativa com os clientes da empresa

para que a mensuração dos ativos de marca fosse mais fiel à realidade, esta análise

se baseia em dados obtidos e em constatações teóricas, sendo, portanto, uma

especulação a respeito do tema.

Assim, para Aaker (1996), a mensuração do Brand Equity deve analisar a

fidelidade, a qualidade percebida, as associações/diferenciação, a conscientização e

o comportamento de mercado. Por falta de recursos para se obter dados suficientes,

este último item não será analisado neste trabalho.

4.3.1 FIDELIDADE

Dessa maneira, de acordo com Aaker (1996), a fidelidade é uma dimensão

essencial do Brand Equity, já que uma base de clientes fiéis garante uma barreira

contra a penetração da concorrência. Segundo ele, a fidelidade tem grande

relevância e pode ser utilizada como um fator variável, já que interferências em

outros ativos do Brand Equity podem afetar a lealdade do consumidor com a marca.

Page 51: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

45

O autor considera que os dois indicadores da fidelidade sejam Preço Premium e

Satisfação/Fidelidade.

4.3.1.1 PREÇO PREMIUM

O Preço Premium demonstra a lealdade do cliente, já que ele está disposto a

pagar um pouco mais por um produto de uma marca em vez de outra. Este indicador

deve ser definido em relação a um concorrente ou a um conjunto de concorrentes.

Contudo, o autor constata alguns problemas e precauções em relação a este

indicador. Em alguns mercados as diferenças de preço não são muito relevantes

devido a restrições legais ou ao fato de as forças do mercado dificultarem essas

diferenças. Questionado a respeito dos preços da Panvel, Julio Mottin Neto afirma

que a empresa não é focada em preços promocionais, mas sim em uma boa

qualidade na prestação de serviços. Ele afirma que há uma grande recorrência de

compra e que, geralmente, seus preços são competitivos com o mercado e os

produtos possuem qualidade.

4.3.1.2 SATISFAÇÃO/FIDELIDADE

A respeito de Satisfação/Fidelidade, segundo indicador de Fidelidade, Aaker

(1996) afirma que a satisfação (ou apreço) indica diretamente a disposição dos

clientes em se relacionarem com uma marca. A melhor maneira de se constatar este

indicador é por meio de pesquisas com os consumidores. Porém, este tipo de

abordagem acaba excluindo a possiblidade de se obter as considerações de não-

clientes, que poderiam, no caso, explicar que não estão satisfeitos com a marca.

Para analisar este item, foi indagado ao vice-presidente da Panvel se houve

aumento de adesões no programa de fidelidade da empresa durante ou após o

período em que o filme “A História de Sofia” esteve no ar. A empresa não compilou

dados que pudessem resultar nesta informação, contudo, um dado interessante

citado por Neto é de que o programa de fidelidade da Panvel corresponde a cerca

de 80% das vendas da empresa, ou seja, pode-se considerar que os clientes que

compram na Panvel costumam se fidelizar e reincidir sua compra na mesma

empresa. Além disso, é possível analisar que os consumidores que já conheciam, ou

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mesmo aqueles que não tinham conhecimento da marca ainda, demonstraram

satisfação com a mesma após terem contato com a propaganda analisada neste

trabalho, já que, na entrevista, Neto confirma que receberam feedback positivo a

respeito da campanha, através de diversos meios. Em sua palestra, inclusive, ele

conta que após a estreia do vídeo “A História de Sofia”, o Serviço de Atendimento ao

Consumidor da Panvel recebeu 1200 ligações que tinham como objetivo elogiar o

filme. Isso demonstra um altíssimo nível de satisfação, visto que essas mil e

duzentas pessoas se sentiram tão satisfeitas com o fato da marca ter produzido um

conteúdo próprio que significasse profundamente a eles, que se sentiram

confortáveis em telefonar para o SAC para demonstrar isso.

4.3.2 QUALIDADE PERCEBIDA/LIDERANÇA

O segundo item da mensuração de Brand Equity descrito por Aaker (1996) é

Qualidade Percebida/Liderança.

4.3.2.1 QUALIDADE PERCEBIDA

O primeiro indicador é a qualidade percebida, descrita pelo autor como uma

das dimensões mais fundamentais do valor de marcas. Ela é responsável por afetar

diretamente o retorno de investimentos e tem grande papel na moldagem e na

percepção da identidade de marca. Assim, Neto afirma em sua palestra que a

Panvel, ao longo de seus quarenta anos de existência sempre buscou oferecer

qualidade em seus produtos e no seu atendimento, tendo sempre retorno positivo

em relação a este item. Em entrevista, ele afirma que por meio de pesquisas com os

consumidores esta informação foi comprovada. Ele também constata que o filme “A

História de Sofia” só foi realmente bem sucedido porque transmitia uma ideia de bem

estar e de preocupação da empresa com a qualidade de vida de seus consumidores

que condiz com a realidade da marca. Ou seja, caso a marca não fosse vista como

de alta qualidade, a ideias não estariam condizentes e, consequentemente, o público

iria criar um repúdio ao vídeo e esse tipo de comunicação teria o efeito oposto ao

desejado.

Page 53: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

47

4.3.2.2 LIDERANÇA

Sobre liderança, Aaker (1996) afirma que este indicador pode ser medido a

partir da popularidade e também por meio da constatação dos itens: é líder na sua

categoria; está se tornando mais popular; e é respeitada como inovadora. Assim, em

entrevista, Julio Mottin Neto afirma que a Panvel é líder em seu segmento por

diversos fatores, já que ela está em um patamar superior ao das demais farmácias.

Alguns desses fatores são: o layout e a arquitetura das lojas; o nível do serviço, que

proporciona ao consumidor uma grande variedade de produtos; sua linha de

produtos de marca própria, já que a empresa foi a primeira do ramo a desenvolver

algo do tipo; o bom atendimento, que conta com profissionais treinados e um serviço

de atendimento ao consumidor; e sua presença multicanal, ou seja, é possível

comprar por meio do telefone, da internet (e-commerce) ou nos próprios pontos de

venda. Todos esses fatores juntos são o que, para Neto, garantem que a Panvel

seja a rede de farmácias líder no sul do Brasil. Pode-se considerar, também, que a

empresa seja vista como inovadora, já que busca comunicar de forma a atingir seu

público com uma propaganda que vai além da divulgação da marca.

4.3.3 ASSOCIAÇÕES/DIFERENCIAÇÃO

O terceiro item da mensuração do valor de marca descrito por Aaker (1996) é

o de associações/diferenciação. Para analisá-lo deve compreender a marca sob três

perspectivas diferentes: a marca como produto (valor), a marca como pessoa

(personalidade) e a marca como organização (associações organizacionais).

4.3.3.1 VALOR

Assim, o autor explica que o primeiro indicador, o valor, consiste na proposta

criada pela identidade de marca, que se relaciona com os benefícios do produto.

Para analisa-lo, deve-se voltar às seguintes investigações: se a marca oferece um

valor adequado pelo dinheiro pago; e se há uma razão para comprar essa marca em

vez de outras. Dessa forma, conforme Neto em entrevista, a Panvel costuma vender

qualidade aliada a preço competitivo, buscando oferecer ao consumidor um produto

condizente com aquilo que ele está pagando. Tendo em vista que o slogan principal

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da campanha analisada neste trabalho é “Você sempre bem.”, pode-se considerar

que uma possível razão para que as pessoas prefiram comprar na Panvel em vez de

em outras farmácias seja pelo fato de realmente acreditarem em um bem estar que

será proporcionado a elas ao consumirem os produtos desta farmácia.

4.3.3.2 PERSONALIDADE

O segundo indicador de associações/diferenciação é a personalidade de

marca, descrita por Aaker (1996) como uma base para os relacionamentos com a

marca, já que envolve dimensões específicas exclusivas da mesma. Ele afirma que

uma possível forma de medi-la a partir da mensuração do Brand Equity seja através

das seguintes constatações: “essa marca possui personalidade?”, “essa marca é

interessante?”, “tenho uma imagem nítida do tipo de pessoa que usaria essa marca”

e “essa marca possui uma história interessante”. Daniel Padilha (2013) em entrevista

afirma que “a personalidade é criada ou resgatada através de exercícios onde

características humanas (comportamento, atitude, ações) são passadas para a

marca, isso pode ser feito com ajuda de arquétipos e personas.” Dentre essas

constatações é possível determinar que a marca Panvel possui sim uma

personalidade. Em entrevista, Neto (2013) a caracteriza como “uma mulher (mãe) de

35 a 40 anos que cuida das pessoas que a cercam”. Essa caracterização se adequa

completamente com o que a empresa procura transmitir em suas comunicações e na

forma como lida com o consumidor, uma vez que sua missão, que é “proporcionar

saúde e bem estar às pessoas”, se traduz em “você sempre bem”, slogan utilizado

na campanha em análise e que condiz com a tentativa de proporcionar o bem estar

de seus consumidores, seja por meio da conveniência de poder consumir os

produtos por diversas plataformas, seja pela qualidade de atendimento e de

produtos ser prioridade ou, ainda, das relações pessoais serem incentivadas por

meio do tipo de comunicação que a Panvel tem trabalhado.

É possível constatar, inclusive, que o vídeo “A História de Sofia” foi

responsável por construir na mente do espectadores a imagem da personalidade

que a marca Panvel já possuía, mas que poderia não ser tão nítida para o público.

Essa personalidade, que se caracteriza como uma pessoa que busca cuidar dos

demais e proporcionar o bem estar, pode ser analisada do ponto de vista dos

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arquétipos. Conforme já descrito neste trabalho, os arquétipos são a principal ligação

entre o Storytelling e o branding, já que por meio deles é possível enriquecer as

associações de marca e fortalecer ou criar a personalidade da mesma. Considera-se

que o arquétipo no qual a Panvel se encaixa é o do Prestativo. Dessa forma, de

acordo com Pearson e Mark (2001), este arquétipo tem como lema “ama teu próximo

como a ti mesmo”, já que é um altruísta movido pela compaixão, pela generosidade

e pelo desejo de ajudar os outros. O Prestativo também é conhecido como o santo, o

pai (ou mãe), o cuidadoso, o ajudante ou o apoiador. As autoras explicam que ao

longo do tempo as representações com significado de zelo foram se modificando,

sendo que na pré-história, costumava-se esculpir figuras de deusas mãe que, muito

provavelmente, eram reverenciadas por sua capacidade de dar a luz e de prestar

apoio à vida por meio de conforto, alimentação e cuidados. Nesse ponto já é

possível perceber forte relação com as características da personalidade da marca

Panvel descritas por Julio Mottin Neto em entrevista.

Ainda a respeito do arquétipo do Prestativo, Pearson e Mark (2001)

consideram que, devida a preocupação dele com seus filhos e dependentes, este

acaba se tornando um arquétipo que se encaixa naturalmente com a identidade de

marcas que prestam serviços às pessoas, como médicos, produtos da área da

saúde, seguradoras e bancos. Este arquétipo, elas consideram, está ligado a todas

as atividades que se relacionam com a prestação de cuidados para as pessoas e

para o mundo físico. Assim, pode-se constatar que, de fato, uma rede de farmácias,

que vende medicamentos e promove a saúde, adequa-se com bastante afinidade a

ao Prestativo. No caso da Panvel, inclusive, além de vender medicamentos,

comercializam-se produtos de cosmética. Ou seja, além de promover a saúde, a

marca incentiva o bem estar das pessoas por meio da produção e da venda de

perfumes, cremes e maquiagens. Dessa maneira, a propaganda “A História de Sofia”

é construída de maneira a externalizar essa identidade arquetípica presente na

personalidade da marca Panvel, pois o filme tem como mensagem principal a ideia

de que o espectador deva prestar mais atenção em suas relações pessoais, de

modo a viver uma vida mais completa e não se tornar, com o passar do tempo,

impermeável a algumas emoções. Por meio da história de uma cachorrinha que se

sente triste com a indiferença de seu dono, a Panvel, como o Prestativo, tenta

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50

incentivar seu consumidor a refletir sobre sua própria felicidade para que, assim,

busque recursos que o possibilitem melhorar sua qualidade de vida.

4.3.3.3 ASSOCIAÇÕES ORGANIZACIONAIS

Após analisar de forma mais profunda o indicador “personalidade”, presente

na mensuração das associações/diferenciação, o item seguinte descrito por Aaker

(1996) é o do indicador “associações organizacionais”. De acordo com ele, a marca

também pode ser vista da perspectiva de associação e, neste caso, ter impulsionada

a sua capacidade de diferenciação. Neste caso, conforme explicado por Julio Mottin

Neto em sua palestra no 21º Congresso de Marketing, a Panvel enquanto

organização procura sempre incentivar a cultura de marca em seus colaboradores,

por meio de treinamentos frequentes. Este é um fator que contribui muito para o

fortalecimento da marca, já que o seu gerenciamento se volta também para o lado

interno, que é responsável por mantê-la sempre condizente com seus valores.

Finalmente, para concluir a mensuração de associações/diferenciação, Aaker (2010)

considera que a diferenciação seja a síntese das associações com a marca, já que

os três itens analisados anteriormente avaliam as diversas dimensões que

diferenciam a marca de seus concorrentes. Ele afirma, em conclusão, que esta é

fundamental para que a marca possa garantir sua estratégia de branding.

4.3.4 CONSCIENTIZAÇÃO

Por fim, o quarto item presente na mensuração do Brand Equity descrita por

Aaker (1996) é a Conscientização. O autor considera que “a conscientização

espelha a presença da marca na mente dos clientes. Ela pode constituir um

impulsionador em algumas categorias e desempenha em geral um papel

fundamental para o Brand Equity.” (AAKER, 1996, p.353). O autor considera que o

conhecimento e a proeminência da marca na mente do consumidor podem ser

medidos em diferentes níveis, como reconhecimento (“você já ouviu falar da

marca?”) e recordação (“de quais marcas do setor você consegue se lembrar?”).

Para analisar este item da melhor maneira que seria possível, em entrevista,

foi perguntado ao vice-presidente da empresa de quais formas foi sentida a

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51

repercussão da peça publicitária em questão. Ele respondeu que houve um aumento

de quase o dobro de curtidas na fanpage da farmácia durante o período em que foi

lançado o filme. Além disso, em palestra, durante o bate-papo com o criador da

campanha, cita-se o fato de pessoas de outros estados do país terem se deparado

com o vídeo “A História de Sofia” e, ao verem a marca Panvel, se questionado do

que se tratava, por nunca terem tido contato com ela antes. Isso demonstra que o

reconhecimento de marca aumentou após a veiculação da propaganda analisada, já

que a rede de farmácias que se concentra no sul do país é agora também lembrada

nos demais estados do Brasil. Contudo, para que uma análise a respeito desse item

pudesse ser traçada de maneira mais condizente com a realidade da marca Panvel,

seria necessária a realização de uma pesquisa quantitativa com moradores da

região sul do país na qual fosse indagado a eles quais marcas de farmácia lhes

vinham à cabeça e, depois, se conheciam a Panvel. A mesma pesquisa deveria ser

realizada antes da produção do filme “A História de Sofia” e após sua repercussão,

para que fosse possível de fato medir como o reconhecimento e a recordação de

marca cresceram em decorrência da campanha.

Page 58: O USO DO STORYTELLING COMO FORMA DE AUXILIAR NA CRIAÇÃO DE VALOR DE MARCA: ESTUDO DE CASO DA PANVEL

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5. CONCLUSÕES

O presente trabalho teve como objetivo a investigação a respeito da maneira

pela qual o uso do Storytelling na propaganda possa vir a auxiliar no processo de

criação de valor de marca. Para tanto, elegeu-se uma peça publicitária em vídeo e

aplicou-se a ela dois tipos de análise: uma de Storytelling, baseando-se nas

considerações de Robert Mckee a respeito da criação de histórias ficcionais e nos

conceitos determinados por Bruno Scartozzoni em seu curso prático; e a outra de

valor de marca, tomando como referencial o modelo de mensuração de Brand Equity

descrito por David Aaker em seu livro “Criando e Administrando Marcas de

Sucesso”. Por meio dessa metodologia, foi possível atingir os objetivos propostos,

que eram: identificar e analisar na campanha publicitária da Panvel como o

Storytelling auxilia na criação de valor de marca; traçar uma fundamentação teórica

que estabelecesse um estudo acerca da construção de marca e possibilitasse

identificar como o Storytelling auxilia nesse processo; analisar em qual fase da

construção de marca este contribui ou poderia contribuir para a criação de valor; e

definir, a partir de análises, a importância do Storytelling enquanto ferramenta da

publicidade com o papel de auxiliar na construção de marcas.

Este trabalho não teve como foco a mensuração do valor de marca em si. Este

item fora utilizado como forma de analisar de qual maneira a campanha envolvendo

Storytelling foi eficiente na construção de valor da marca que a veiculou. Tendo em

vista que não foi possível levantar dados concretos a respeito de números de

lucratividade ou de vendas, concentrou-se em demonstrar de que maneira o

Storytelling aplicado à publicidade pode ser utilizado de maneira bem sucedida com

o intuito de auxiliar no processo de construção e gerenciamento de marca, já que a

peça analisada foi desenvolvida em alinhamento com o Brand Equity da empresa e,

justamente por isso, reflete o que a empresa realmente é.

Dessa forma, pode-se concluir, que o filme “A história de Sofia” foi grande

responsável por auxiliar a Panvel Farmácias a externalizar sua personalidade

cuidadosa e de profunda atenção com o bem estar de seu consumidor, traduzida por

meio do arquétipo do Prestativo, uma vez que a propaganda em questão conta a

história de uma cachorrinha que se entristeceu progressivamente devido à

indiferença de seu dono. Por meio das constatações provenientes de conflitos

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internos vividos pelo narrador-protagonista, a principal mensagem do vídeo foi

transmitida, resumindo-se em um conselho para que os espectadores prestassem

mais atenção em suas relações pessoais e, além disso, dessem mais carinho a seus

animais de estimação. O conselho também consistia em incentivar as pessoas para

que elas vivessem amizades mais “felpudas” e verdadeiras, ou seja, amizades mais

desinteressadas e altruístas, assim como se caracteriza a personalidade dos

cachorros. Por meio de todos esses conselhos possíveis de se absorver da história

contada, a Panvel fortaleceu sua personalidade cuidadosa e externalizou seu

arquétipo Prestativo, uma vez que demonstrou que deseja que seu consumidor

esteja “sempre bem”, tanto fisicamente, por meio do consumo de seus

medicamentos e produtos de higiene e cuidados pessoais; quanto internamente,

estando atentos ao que lhes faz bem enquanto pessoas, ou seja, suas relações de

afeto e a maneira como lidam com seus sentimentos.

É possível concluir, também, que a propaganda em questão auxiliou, mesmo

que em proporções menores, o desenvolvimento ou o aperfeiçoamento dos demais

ativos de marca, sendo Fidelidade, através do incentivo de que seus consumidores

continuem a comprar na Panvel e façam sua adesão ao programa de fidelidade;

Conscientização, por meio da transmissão da propaganda em rede nacional e,

assim, possibilitar que o reconhecimento e a conscientização da marca pudessem se

abranger; e Qualidade Percebida, já que a peça publicitária funcionou como uma

forma de reforçar o cuidado e a qualidade de produtos e do atendimento que a

farmácia proporciona a seus clientes, sendo expressa, também, por meio do retorno

positivo que os consumidores deram à marca em relação ao filme produzido.

Portanto, pôde-se constatar, de uma maneira geral, que o Storytelling aplicado à

publicidade possui uma ligação intrínseca com a construção e o gerenciamento da

marca, uma vez que ao utilizá-lo é possível gerar buzz positivo por meio da

publicação de um conteúdo interessante e, ainda, comunicar ao púbico a verdadeira

essência da empresa, através de uma história que demonstre qual venha a ser a

personalidade da marca.

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6. REFERÊNCIAS

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NÚÑEZ, Antonio. É melhor contar tudo: O poder de sedução das histórias no mundo empresarial e pessoal. São Paulo: Nobel, 2009. OLIVETTI, Valeria. Estrutura. Blog Dicas de Roteiro. Categoria: Roteiro. 18 dez. 2009. Disponível em <http://dicasderoteiro.com/2009/12/18/estrutura/> Acesso em: 25 maio. 2013. PALACIOS, Fernando. Dissertação para Trabalho de Conclusão: “A contextualização criativa de histórias como fator de sucesso no planejamento de campanhas de comunicação”. Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2007. PINHO, José Benedito. O Poder das Marcas. São Paulo: Summus Editorial, 1996. PINTO, Amanda da Silva. Artigo para Trabalho de Conclusão: “Como o storytelling pode atuar no posionamento e na lembrança de marca”. Fundação Instituto de Administração. São Paulo, 2012. SCARTOZZONI, Bruno. Agora você vai entender o que é “Storytelling” – Entrevista com Bruno Scartozzoni. Blog Três Pontos Brasil. Seção: Entrevistas. 30 jul. 2012. Disponível em <http://www.trespontosbrasil.com/blog/agora-voce-vai-entender-o-que-e-storytelling-entrevista-com-bruno-scartozzoni/> Acesso em 25 maio. 2013. SCARTOZZONI, Bruno. Storytelling e Transmídia. Curso Intensivo, 2012, plataforma online. Três Pontos Brasil. SILVA, Giorgio Gilwan da. O Branding: ferramenta estratégica para o gerenciamento de marca. Santa Catarina: Universidade do Vale do Itajaí, 2007. TRINDADE, Eneus. Merchandising televisivo: tie-in. In. Hiperpublicidade: fundamentos e interfaces. São Paulo: Thomson Learning, 2007.

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7. APÊNDICES

7.1 ENTREVISTA COM JULIO MOTTIN NETO

1) A campanha “Você sempre bem” teve primeiro a produção do vídeo “Filme do

Lilinho”, que também utilizava storytelling, mas não ficou tão conhecido quanto o

vídeo “A História de Sofia”. A quais fatores a Panvel atribui essa diferença de

repercussão?

Na verdade o Lilinho foi o mais importante fator de sucesso da Sofia. Pois veio antes

e criou a expectativa para Sofia. Mas claro que o enredo de Sofia é mais universal e

com isso mais pessoas se identificam com aquela estória. Além disso um ano em

termos de internet faz muita diferença. Tenho certeza de que se hoje fizemos Sofia,

a repercussão seria ainda maior. Ano passado praticamente não existia Instagram,

por exemplo.

2) Vocês receberam feedback dos consumidores após a grande repercussão do

vídeo “A História de Sofia”? Através de quais meios vocês tiveram maior retorno?

(telefone, redes sociais, lojas físicas, correio eletrônico)

Sim, muito. Através de todos os canais. E isso se deve não aos filmes mas sim ao

carinho que os consumidores possuem pela empresa. Se Sofia fosse um comercial

de uma empresa telefone celular, as pessoas continuariam a reclamar do sinal do

aparelho.

3) Vocês possuem um programa de fidelidade. Houve aumento no número de

adesões ou de procura no período em que os vídeos “O Filme de Lilinho” e “A

História de Sofia” foram lançados? Em quantos por cento?

Isso não foi apurado. O programa de fidelidade Panvel já possui vida própria.

Representa 80% da nossa venda.

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4) Os clientes costumam comprar frequentemente na Panvel, independentemente

dos preços? Estes costumam estar mais elevados ou mais baixos do que das outras

farmácias? E em relação a marca própria, como se da essa relação de preço e

preferência?

Sim, temos uma forte recorrência de compra. Nossa empresa não é focada em

preço. Somos uma empresa que focada em prestar um ótimo serviço. É isso que nos

motiva e é isso que fideliza nossos clientes. Mas nossos preços também são bem

competitivos. A preferência pela marca própria é um conjunto de qualidade + bom

preço. Não existe mais espaço para produto barato e ruim.

5) Os clientes costumam dar retorno a respeito do grau de satisfação deles com o

atendimento e os produtos? Qual o nível de satisfação deles, geralmente?

Temos sempre retornos muito positivos em todas as pesquisas que realizamos.

6) Como você avalia o papel da marca Panvel em contraste a outras farmácias

concorrentes? Existia, antes da produção da campanha “Você sempre bem” com

lilinho e sofia, uma maior preferência pelas farmácias Panvel ou não? De acordo

com a visão da empresa, como esta está posicionada no mercado gaúcho e no

mercado nacional?

Estamos em outro patamar que as demais farmácias. Somos superiores em todos os

fatores: lay out e arquitetura de lojas, nível serviço (encontrar o que procura), linha

produtos próprios, nível de atendimento, presença multicanal (comprar por telefone,

internet), propaganda etc... Os filmes só deram certo pois o consumidor percebe

essa qualidade. Propaganda é uma promessa que precisa de entrega.

7) Você acredita que a Panvel, através de estratégias de marketing e atualmente o

uso de campanhas com branded content storytelling, tem sido vista como uma

empresa inovadora? Através de quais canais foi possível constatar essa

informação? (telefone, redes sociais, lojas físicas, correio eletrônico). 57

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Não, a Panvel é vista como inovadora por diversos fatores. Esses citados acima.

Sim, somos vistos como uma empresa inovadora.

8) De acordo com seu ponto de vista, a marca Panvel possui uma personalidade?

Como essa se caracteriza?

É uma mulher (mãe) de 35 a 40 anos que cuida das pessoas que a cercam.

9) Há registro de pessoas que passaram a conhecer a marca após o lançamento da

campanha “você sempre bem” com lilinho e sofia?

Não temos esse registro.

10) É possível mensurar em números o resultado que a campanha envolvendo

storytelling alcançou? (porcentagens de aumento de lucratividade, aumento de fãs

na página do facebook, alcance da página, número de compartilhamentos e de

curtidas, de seguidores do twitter, aumento nas vendas, maior procura pela farmácia,

aumento nas vendas do e-commerce, maior consumo da marca própria).

Sim, o aumento nos fãs do Facebook foi diretamente sentido. Praticamente

dobramos o numero de pessoas que curtem a página.

11) É sabido que a Panvel procura investir em qualidade. Esta qualidade é

percebida pelos consumidores? Como se pôde constatar esta informação?

Em pesquisas.

12) De que maneira você acredita que o Storytelling auxilia na construção e no

gerenciamento de marca?

Storytelling é a propaganda do futuro. O mundo aonde as pessoas assistiam novela

ou noticiário e eram interrompidas por um comercial de Tv está com seus dias

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contados. A propaganda cada vez mais precisa ser desejada pelo consumidor que

hoje possui um volume gigante e crescente de alternativas de entretenimento. 58

O consumidor precisa querer ver o ser o seu filme.

7.2 ENTREVISTA COM BRUNO SCARTOZZONI

1) De que maneira você acredita que o uso do storytelling auxilia na construção e no

gerenciamento de marca?

O storytelling, entendido como um conjunto de técnicas que, quando usado na

estruturação e narração de fatos tem a função de entreter ao mesmo tempo que

transmite informações e apresenta uma visão de mundo ao público, pode auxiliar a

construção e gerenciamento de marcas de várias maneiras. Vou listar algumas, sem

a pretensão de encerrar o assunto, já que a criatividade não tem limites:

- O ângulo mais óbvio é apresentar a marca ao público por meio de uma história

pessoal e real (ou, ao menos, baseada em fatos reais). Isso costuma funcionar

bastante quando a empresa possui fundadores ou líderes muito carismáticos,

dispostos e capazes de misturar suas trajetórias pessoais com a trajetória da

empresa. Alguns casos conhecidos são Steve Jobs e Apple, Silvio Santos e SBT,

Abílio Diniz e Grupo Pão de Açúcar. Nesses exemplos as histórias das pessoas são

tão fortes quanto o histórico das empresas e, portanto, se confundem. Em outras

palavras, as empresas acabam funcionando como "product placements" na história

da vida de seus fundadores, inclusive absorvendo seus valores.

- Outra possibilidade, também bastante conhecida, é por meio da personificação da

marca em um personagem fictício, e para isso podemos imaginar desdobramentos

internos e externos. Internamente esse personagem, criado a partir do arquétipo da

marca, pode funcionar como uma interface que, por ser mais humanizada, serve

como um guia de comportamento da marca. Afinal, marcas são um conceito muito

mais abstrato do que pessoas. Por outro lado, externamente, é possível que esse

personagem seja usado como um tipo de ícone (exemplo: Tigre Tony do Sucrilhos),

um personagem que interage com o público, mas não chega a ter um arco narrativo

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(exemplo: Penguim do Ponto Frio) ou até mesmo um personagem que participa de

histórias (exemplo: Variguinho da Varig).

- Quando descemos um nível e falamos do storytelling aplicado diretamente nas

campanhas, independentemente do formato, também é possível entender que cada

história contada pela marca contribui trazendo e somando seus valores e até mesmo

o ponto de vista que ela apresenta ao público.

- De uma forma mais ampla é possível dizer que o uso do storytelling para

contextualizar a marca na vida das pessoas também é uma forma eficiente de

manter a cultura da empresa ancorada no mundo real. Convenhamos, muitas vezes

a realidade corporativa acaba se descolando da realidade dos consumidores e é aí

que vemos decisões absurdas sendo tomadas. Como dizem, "a diferença entre a

realidade é a ficção é que a ficção precisa fazer sentido".

2) Quais são os benefícios em se utilizar storytelling na propaganda alianhado a uma

estratégia de branding?

Histórias são, na essência, pessoas enfrentando desafios e lidando com suas

próprias emoções. Encontramos essa estrutura tanto em um filme romântico quanto

em um livro de ficção científica. Entre outras palavras, quando uma marca utiliza o

storytelling ela está, no fundo, ancorando sua mensagem às emoções humanas, e

as vantagens de se fazer isso é que as pessoas gravam as informações por mais

tempo e de forma mais fácil, percebem mais valor e eventualmente até podem

mudar de opinião, por mais convictas que estejam do contrário. Enquanto o

argumento racional confronta dados com dados, o storytelling é capaz de mostrar

que há vários pontos de vista sobre um mesmo assunto, todos válidos.

3) Como a personalidade da marca se relaciona com o branding?

A personalidade da marca é basicamente o modo como a marca, um conceito

abstrato, se comporta na vida real. Por exemplo, de um tom de voz em um post de

Facebook até o tamanho do sorriso de uma atendente no balcão. Essas coisas de

alguma forma devem refletir o que a marca é (ou como desejam que ela seja

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percebida), mas também há o lado contrário, já que esses elementos também

influenciam a percepção da marca.

Mas, antes de tudo, é preciso ter a consciência de que uma marca pode ter

personalidade, mas não necessariamente constitui-se um personagem. Para ser um

personagem, no contexto do storytelling, as pessoas precisam se importar com ela.

Precisam ter empatia como se ela fosse sua melhor amiga enfrentando desafios.

Para ser personagem uma marca precisa sentir, agir e pensar como uma pessoa, e

é muito difícil fazer isso sem personificá-la em alguém, como nos exemplos que eu

dei na primeira pergunta.

4) A respeito do filme “A História de Sofia”, a quais fatores você atribuiria o sucesso

que a propaganda atingiu?

É uma história muito bem contada, tanto no quesito roteiro quanto na parte técnica

(direção, luz etc.). Mas, fora isso, trata-se de uma peça publicitária que não tem

medo de apostar todas as fichas no poder da emoção. É uma história feita por uma

empresa mas que, nem por isso, fica no meio do caminho. Antes de qualquer coisa

ela tenta (e consegue) ser um filme capaz de gerar o interesse intrínseco das

pessoas. Em outras palavras, "A História de Sofia" não subestima seu público. Eles

sabem que tipo de história é capaz de atrair as pessoas, e foram all the way por

esse caminho.

5) Qual é, para você, a principal relação entre o storytelling presente no filme “A

História de Sofia” e a construção da marca Panvel?

A marca Panvel, como você deve saber, não existe em São Paulo, lugar onde moro

atualmente. Sendo assim, não tenho conhecimento suficiente sobre ela para te

responder isso. Mas, de uma forma geral, dá para falar que o filme transmite seus

valores para a marca. Ainda mais por ter sido uma campanha tão forte. E também,

justamente por causa disso, "A História de Sofia" acabou gerando um efeito

secundário e bastante interessante de tornar a Panvel conhecida em áreas nas

quais ela não atua. Isso pode ser um ativo importante caso a marca tenha planos de

expansão no médio prazo.

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7.3 ENTREVISTA COM DANIEL PADILHA

1) De que maneira você acredita que o uso do storytelling auxilia na construção e no

gerenciamento de marca?

Ajuda na humanização da marca e no envolvimento dos públicos com os valores que

a marca carrega e pretende transmitir através de suas ações de relacionamento

diárias.

2) Quais são os benefícios em se utilizar storytelling na propaganda alinhado a uma

estratégia de branding?

Como você mesmo disse, alinhamento. O Branding é um modelo de gestão que tem

como objetivo criar valor para marcas, gerenciar as estratégias de marca (não

apenas do gerenciamento do negócio, mas comunicação, finanças, gestão de

pessoas etc. Por isso, vejo o storytelling mergulhado no universo de experiência de

marca, uma oportunidade de inserir os públicos nesse ambiente/estórias que

estejam alinhadas com o dia a dia das pessoas, fantasiosas ou não, mas que

inspirem.

3) Como a personalidade da marca se relaciona com o branding?

Na verdade a construção da personalidade de uma marca se dá pelo Branding. Se

pegarmos o processo de construção de uma marca ela será divida em: Estratégia do

negócio, Estratégia da marca, Identidade Verbal, Identidade Visual, Experiência de

Marca e Valor de marca. Quando estamos falando da personalidade de uma marca,

ela surge da construção do que chamamos de “Plataforma de Marca”, uma base

estrutural que é considerada a primeira etapa estratégica da construção e

responsável por inspirar e guiar as decisões estratégicas. Essa plataforma é divida

em: Entendimento do CoreBusiness, definição do “quem somos”, “o que queremos”,

valores da marca, essência/DNA (Personalidade), posicionamento estratégico,

atributos da imagem da marca e promessa. A personalidade é criada ou resgatada

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através de exercícios onde características humanas (comportamento, atitude, ações)

são passadas para a marca, isso pode ser feito com ajuda de arquétipos e personas!

4) A respeito do filme “A História de Sofia”, a quais fatores você atribuiria o sucesso

que a propaganda atingiu?

Vejo 3 pontos importantes aí. Primeiro: a utilização de um animal amado por todos e

com nome de gente! Se compararmos com o primeiro vídeo criado (Lilinho) os laços

emocionais são muito mais fortes. Segundo: o envolvimento emocional que é criado

através da narrativa e do contexto. Tenho certeza que a maioria das pessoas que

compartilharam o vídeo passou por algo parecido, não necessariamente com um

cão, mas com alguém próximo e o “passar adiante” se torna mais natural. Terceiro: a

utilização do ambiente digital para disseminar o vídeo. Se um influenciador X

comenta sobre o vídeo ou convida para assistir, o poder de engajamento aumenta

naturalmente. Não sei se a marca chegou a investir em mídia paga ou como

funcionou o plano nos canais/plataformas, mas também é um ponto para se pensar.

O meu único receio é a nossa interpretação sobre a palavra “sucesso”, é um vídeo

bem feito, uma estória emocionante, que em alguns momentos se conecta com

alguns valores, posicionamento e personalidade da marca Panvel.

5) Qual é, para você, a principal relação entre o storytelling presente no filme “A

História de Sofia” e a construção da marca Panvel?

Eu não acompanho a marca Panvel. A primeira vez que vi este vídeo foi no Festival

Mundial de Publicidade em Gramado e logo de cara imaginei uma campanha

relacionada ao universo pet, muitos que estavam comigo e não conheciam a marca

também pensaram a mesma coisa. Quando esse vídeo foi apresentado e abriram

para perguntas, uma delas foi “Mas qual a relação de um cão com medicamentos?”.

Por mais que ajude na identificação e índice de lembrança de marca, temos que

pensar na criação do relacionamento...comunicar por comunicar não é Branding e

para mim, também não é storytelling.Como esse vídeo ajuda/ajudou para que os

laços de um relacionamento duradouro sejam criados? Lembrando que aumento de

Likes numa página não quer dizer nada