37651263 Apostila de Processo Penal

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Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani SUMRIO CAPTULO I NOES GERAIS ....................................................... .......................... CAPTULO II PRINCPIOS DO PROCESSO PENAL ................ ............................. 1. Princpio do devido processo legal (art. 5., LIV, CF) .................................................... 2. Princpio da ampla def esa ............................................................................ .................... 3. Princpio do contraditrio ................................. ............................................................... 4. Princpio da pr esuno de inocncia ................................................................. ............... 5. Princpio da verdade real ..................................... ............................................................ 6. Princpio do juiz natural ........................................................................ ........................... 7. Princpio da motivao das decises ..................... .......................................................... 8. Princpio da publici dade ........................................................................... ....................... 9. Princpio da durao razovel do processo ................... ................................................... CAPTULO III APLICAO DA LEI PROC ESSUAL PENAL ............................. 1. A lei processual penal no espao ... ................................................................................ .. 2. A lei processual penal no tempo .......................................... ............................................ 3. Prazo na lei processual penal .. ................................................................................ ......... CAPTULO IV INQURITO POLICIAL ........................................... ........................ 1. Conceito ........................................... ................................................................................ 2. Caractersticas .............................................................. .................................................... 3. Notitia criminis ....... ................................................................................ ......................... 4. Formas de incio .................................... ........................................................................... 5. P rovidncias ...................................................................... ............................................... 6. Concluso ..................... ................................................................................ .................... 7. Prazo .................................................. .............................................................................. C APTULO V AO PENAL ................................................................. ..................... 1. Ao penal pblica .......................................... ................................................................. 2. Ao penal pblic a incondicionada ............................................................... .................. 3. Ao penal pblica condicionada ................................ .................................................... 4. Ao penal privada ......... ................................................................................ ................. 5. Ao penal privada subsidiria da pblica ......................... ............................................. CAPTULO VI DENNCIA E QUEIXA ........ ............................................................. 1. Requisitos .... ................................................................................ ..................................... 2. Prazos ................................ ................................................................................ ............... 3. Causas de rejeio da denncia ou queixa .......................... ............................................. 4. Recursos contra rejeio ou recebim ento ........................................................................ CA PTULO VII AO CIVIL EX DELICTO ..................................................... ...... CAPTULO VIII JURISDIO E COMPETNCIA .......................................... ...... 1. Jurisdio ............................................................... .......................................................... 2. Competncia ........ ................................................................................ ............................ 3. Conexo e continncia .............................. ....................................................................... 5 7 7 7 8 8 8 9 9 9 9 11 11 11 11 13 13 13 15 15 16 17 18 19 19 20 20 22 24 25 25 26 26

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Direito Processual Penal FLVIO CARDOSO DE OLIVEIRA 4. Foro prevalente ............................................................. ................................................... 5. Separao de processos ...... ................................................................................ .............. CAPTULO IX QUESTES E PROCESSOS INCIDENTES ......................... .......... 1. Questes Prejudiciais .............................................. ......................................................... 2. Processos Incidente s .............................................................................. .......................... 3. Conflito de jurisdio ............................... ........................................................................ 4. Rest ituio de coisas apreendidas ...................................................... .............................. 5. Medidas assecuratrias ......................... ........................................................................... CAPTU LO X PROVA ..................................................................... ............................. 1. nus da prova ................................... ............................................................................... 2. Sistemas de apreciao da prova ................................................. .................................... 3. Meios de prova ......................... ................................................................................ ........ CAPTULO XI SUJEITOS PROCESSUAIS ........................................ ....................... 1. Juiz ................................................ ................................................................................ ... 2. Ministrio Pblico .......................................................... .................................................. 3. Acusado .................. ................................................................................ ......................... 4. Defensor .......................................... ................................................................................ . 5. Curador do ru menor ........................................................ .............................................. 6. Assistente de acusao ........... ................................................................................ .......... 7. Auxiliares da Justia .............................................. .......................................................... CAPTULO XII PRISO E LIB ERDADE PROVISRIA ....................................... 1. Priso ................ ................................................................................ ............................... 2. Priso processual ............................. ................................................................................ 3. Liberdade Provisria ......................................................... ............................................... CAPTULO XIII SENTENA ............. ......................................................................... 1. Req uisitos formais da sentena ...................................................... .................................. 2. Princpio da correlao ........................ ............................................................................ CAPT ULO XIV RITOS PROCESSUAIS ...................................................... ............. 1. Rito Ordinrio .................................................. ................................................................ 2. Rito Sumrio . ................................................................................ ................................... 3. Rito sumarssimo .......................... ................................................................................ ... 4. Rito do Jri .............................................................. ......................................................... 5. Rito dos crimes de responsabilidade dos funcionrios pblico ....................................... 6. Rito dos crimes contra a honra ................................................ ........................................ 7. Rito dos crimes contra a propriedade imaterial ............................................................... CAPTUL O XV NULIDADES ................................................................. ..................... 1. Nulidades em espcie .................................... ................................................................... CAPTULO XVI R ECURSOS ........................................................................ .............. 1. Teoria geral dos recursos ....................................

............................................................. 2. Pressupostos re cursais ........................................................................ ............................. 36 37 39 39 40 42 42 43 47 47 47 48 55 55 57 59 59 60 60 62 63 63 64 68 71 71 72 73 73 75 76 77 80 80 81 83 84 87 87 87 -2-

Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani 3. Efeitos dos recursos ........................................................ ................................................. 4. Reformatio in pejus ....... ................................................................................ ................... 5. Recurso de ofcio ......................................... .................................................................... 6. Recursos em espcie ...................................................................... .................................. 88 88 88 88 -3-

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CAPTULO I NOES GERAIS O ser humano socivel por natureza. Sabe-se que desde os prim os da humanidade existem agrupamentos sociais. Para a harmnica convivncia dos inte grantes de determinado grupo necessria a imposio de normas de conduta. Com a evoluo as sociedades, o controle das relaes sociais passou a ser formalmente exercido pel o Direito. As normas jurdicas surgem, ento, para regular a relao entre os componente s de uma sociedade e tambm as relaes entre os indivduos e o prprio Estado. Quem viola uma norma de conduta est sujeito sano estatal, pois se assim no fosse, de nada adia ntaria impor regras, seriam elas incuas. Existem normas, contudo, que dizem respe ito ao interesse de toda a coletividade, ou seja, ordem social. Um homicdio intra nqiliza a sociedade, desestabiliza a ordem pblica. No se cogita, portanto, de deixa r tal ilcito na esfera de interesse do autor do fato e da vtima, ou, no caso, de f amiliares dela. Toda a sociedade tem interesse na represso a tal conduta, ao cont rrio do que acontece com um acidente entre dois automveis, onde um deles sai danif icado, e se impe ao motorista culpado a reparao daquele dano. Neste caso, apenas os dois interesses esto envolvidos. Os bens cuja proteo importam a toda a coletividad e, ento, recebem a tutela penal do Estado. Ser tutelado penalmente significa ter, como reao sua violao, a mais grave das sanes: a pena. Nessa esteira, quando um il penal praticado, surge para o Estado o direito de punir o autor do ilcito, ou sej a, nasce para o Estado o jus puniendi. O jus puniendi pode ser definido como: o poder que tem o Estado de sancionar aquele que violou uma norma tutelada penalme nte. Tal direito, contudo, no pode ser exercido livremente pelo Estado, muito men os arbitrariamente. Para tanto, devem ser observados inmeros princpios que regulam e delimitam o poder estatal, como, por exemplo, o princpio da reserva legal e o princpio do devido processo legal, estampados respectivamente no art. 5., incisos XXXIX e LIV, da Constituio da Repblica. de se lembrar que, como os interesses tutel ados pelas normas penais so de interesse pblico, no se trata somente de um direito do Estado punir o agente criminoso, mas sim um verdadeiro dever, uma vez que, pr aticado um delito, a sociedade exige que seu autor seja punido. Praticado um ilci to penal e surgido o jus puniendi para o Estado, como visto, delineia-se uma rel ao jurdica de direito penal, isto , de um lado, o rgo estatal investido do poder de p nir (Estado-juiz) busca, atravs dos mecanismos legais, efetivar a punio, enquanto d e outro, aquele sobre quem pesa a imputao de haver infringido a lei penal, busca s e defender, busca no se submeter sano. Estabelece-se, dessa forma, um conflito de i nteresses entre o Estado e o indivduo (ou, em casos excepcionais, a pessoa jurdica vide Lei n. 9.605/98): um conflito entre o direito de punir e o direito de libe rdade da pessoa (jus libertatis), pois, via de regra, o direito penal se utiliza da privao de liberdade como sano. pretenso do Estado em impor a sano penal, denom s pretenso punitiva. Havendo oposio de uma parte pretenso de outra, passa a existir a lide. Assim, surgir a lide penal com a prtica do fato criminoso e se dar entre o jus puniendi estatal e o direito de liberdade do autor do fato. Em suma, pratica da uma infrao penal, o Estado procura exercer seu direito de punir e a tal pretenso se ope o titular do direito de liberdade. O conflito de interesses acima mencion ado no pode permanecer sem soluo. De fato, de nada adiantaria o Direito estabelecer regras de conduta para a melhor convivncia entre as -5-

Direito Processual Penal FLVIO CARDOSO DE OLIVEIRA pessoas se um conflito permanecesse sem soluo, a ordem social estaria comprometida do mesmo jeito. preciso, ento, utilizar-se de mecanismo dotado de regras e garan tias destinadas aos sujeitos nele envolvidos. O instrumento estatal destinado a solucionar a lide penal o que denominamos Processo Penal. Numa definio mais comple ta: conjunto de atos organizados entre si, submetido a princpios e regras jurdicas destinadas a solucionar a lide penal. Assim, como dissemos anteriormente, o Est ado o nico detentor do direito de punir. Ele substitui as partes, investindo-se d o poder jurisdicional para solucionar o conflito existente. Nem mesmo quando se trata de ao penal privada o particular ser investido do direito de punir, continua ele pertencendo ao Estado. Ao particular transfere-se apenas a iniciativa de pro por e conduzir a ao. -6-

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CAPTULO II PRINCPIOS DO PROCESSO PENAL Os princpios so enunciados que orientam a com preenso do ordenamento jurdico, quer para sua aplicao e integrao, quer para a elabora e novas normas. Podem ser explcitos, isto , estampados em norma legal, ou implcitos , ou seja, extrados da interpretao que se faz do conjunto de normas. No Brasil, ten do em vista a importncia do bem jurdico em questo na discusso de uma causa penal a l iberdade boa parte dos princpios informadores do processo penal esto dispostos na Constituio da Repblica, dentre os direitos e garantias individuais. A maioria deles , por seu turno, repercusso da adeso do Brasil Conveno Americana de Direitos Humano , conhecida como Pacto de San Jos da Costa Rica, ratificada pelo Pas em 1992. No ba stasse a inspirao, a prpria Conveno pode vir a ganhar status de emenda constitucional se aprovada em cada casa do Congresso, em dois turnos, por 3/5 dos votos (art. 5., 3., CF, acrescido pela EC 45/04). Vejamos quais so os mais importantes princpios informadores de nosso processo penal: 1. Princpio do devido processo legal (art. 5., LIV, CF) Estabelece a Constituio da Repblica que ningum ser privado de sua libe de sem o devido processo legal. a garantia de que s ser considerada legtima a conden ao de algum se o processo for desenvolvido na forma que estabelece a lei. a consagr ao da impossibilidade do Estado impor uma sano a algum diretamente e arbitrariamente, to logo tome conhecimento da prtica de uma infrao penal. Em relao ao Processo Penal, exige-se maior rigor na observncia de formas legais, uma vez que ele informado po r inmeras garantias constitucionais. Observar o devido processo legal assegurar a s garantias constitucionais das partes. 2. Princpio da ampla defesa (art. 5. , LV, CF) Consiste em o Estado proporcionar ao acusado todos os meios lcitos de se defe nder da imputao que lhe dirigida. Em outras palavras, tudo o que no for contrrio le pode ser utilizado, com o amparo estatal, pelo acusado para promoo de sua defesa. Isso envolve assegurar a mais completa defesa, que se desdobra em duas vertente s: autodefesa a pessoal e a defesa tcnica por defensor. No se pode olvidar que faz parte tambm da ampla defesa, assegurar ao acusado hipossuficiente a assistncia ju diciria gratuita (art. 5 , LXXIV, CF). A autodefesa se realiza notadamente no inter rogatrio, ato em que o acusado ouvido a respeito da imputao que lhe dirigida, mas s e perfaz tambm com a participao na colheita da prova, precipuamente na participao em audincia. A defesa tcnica aquela exercida por profissional habilitado, qual seja, o advogado. Pode este ser constitudo, ou seja, escolhido e nomeado pelo acusado, ou dativo, nomeado pelo juiz. A defesa tcnica s atender ao princpio da ampla defesa se for eficiente. A respeito, a Smula 523 do STF: No processo penal, a falta de de fesa consiste em nulidade absoluta, mas a sua deficincia s o anular se houver prejuz o para o ru. Lembre-se que fere o princpio em questo a nomeao de defensor dativo ao a usado antes que ele se manifeste a respeito de constituir um de sua confiana. A n omeao pelo juzo sempre subsidiria. -7-

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Cumpre ressaltar que no jri, nos termos da Constituio da Repblica, art. 5 , XXXVIII, v igora a plenitude de defesa, que alguns entendem ser ainda maior do que a ampla defesa garantida nos processos penais comuns. 3. Princpio do contraditrio (art. 5 , LV, CF) Princpio basilar da sistemtica processual, estabelece que as partes devem ser ouvidas e ter oportunidade de se manifestarem em igualdade de condies. O proce sso s vai atingir seus fins se houver equilbrio entre as partes. conhecida a expre sso paridade de armas, pela qual alguns autores se referem ao contraditrio. Ela cond ensa a idia de que, no processo, as partes devem ter as mesmas oportunidades, no d evendo uma ser mais municiada do que outra. O contraditrio essencial ao processo, p orm dispensado no Inqurito Policial. Por essa razo, no se pode condenar um acusado b aseando-se exclusivamente em provas colhidas unicamente na pea informativa. 4. Pr incpio da presuno de inocncia (art. 5 , LVII, CF) Na redao constitucional: ningum s derado culpado at o trnsito em julgado da sentena condenatria. tambm chamado de pri o da presuno de no culpabilidade, pois a Constituio da Repblica no presume a inocnc as diz que o sujeito no considerado culpado, ou, ainda, de princpio do estado de i nocncia, uma vez que indica o estado jurdico do acusado durante o processo. Diante da presuno de inocncia, deve-se ter em conta que a priso cautelar passou a ser medi da de exceo em nosso sistema, ou seja, ela s deve sobrepujar a liberdade durante o processo em caso de verdadeira necessidade. O STJ, contudo, atravs da Smula 9, man ifesta o entendimento de que a priso processual ou cautelar no fere o princpio do e stado de inocncia. Outro desdobramento do princpio em questo que o ru no tem o dever de provar sua inocncia, o rgo acusador que tem o dever de provar sua culpa. Na mesm a esteira, para condenar o acusado, o juiz deve ter plena convico de sua culpa, ba stando para a absolvio a dvida. Da mesma forma deve ser feita a valorao das provas: n a dvida, decide-se em favor do ru (princpio do favor rei, corolrio da presuno de inoc ia). 5. Princpio da verdade real No processo penal, deve-se buscar recriar os fat os como se passaram na realidade, no devendo o juiz se conformar com eventual ver dade formal criada nos autos. Ainda que se saiba que tal tarefa um tanto quanto difcil no caso concreto, deve-se buscar aproximar-se o quanto possvel da realidade dos fatos. a busca da verdade verdadeira. Difere do processo civil, onde vigora a verdade formal, pois neste, para aplicar o direito, via de regra, basta ao juiz conformar-se com a verdade trazida aos autos, no h necessidade de se buscar a ver dade real. Tal princpio, contudo, comporta algumas excees no processo penal, a sabe r: a) impossibilidade de juntada de documentos nas alegaes finais do jri (art. 406, CPP); b) impossibilidade de apresentar documentos no plenrio do jri, sem ter dado cincia outra parte, no mnimo, 3 dias antes (art. 475, CPP); -8-

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c) impossibilidade de rescindir a coisa julgada em favor da sociedade, na reviso criminal; d) inadmissibilidade de provas ilcitas (art. 5 , LVI, CF). 6. Princpio do juiz natural (art. 5 , LIII) Estabelece o princpio do juiz natural que o autor de u ma infrao penal s poder ser processado e julgado perante o rgo jurisdicional competen e, conforme previso da Constituio Federal, ou seja, juiz natural aquele previamente conhecido, segundo as regra de fixao da competncia. Da decorre que no haver tribunal nem juzo de exceo (art. 5 , XXXVII, CF), isto , aquele criado para julgar fatos exclus ivos, praticados anteriormente. A sua criao se d em virtude exatamente desses fatos . Como exemplo na histria da Humanidade, temos o Tribunal de Nuremberg, na Aleman ha, criado para julgar os crimes cometidos pelos nazistas durante a Segunda Guer ra Mundial. Mais recentemente, tivemos a instalao de tribunais de exceo na Ex-Iugoslv ia e Ruanda. A ttulo de ilustrao, vlido lembrar que o Tribunal Penal Internacional entativa de acabar com os tribunais de exceo pelo mundo, buscando concentrar o jul gamento de determinados crimes, basicamente quando o Pas envolvido no desenvolve o regular processo para sua apurao. Cumpre lembrar, ainda, que o Supremo Tribunal F ederal adota o princpio do promotor natural, atravs do qual se veda a designao casust ica de membro do Ministrio Pblico pela chefia da instituio, devendo valer, no que fo r aplicvel, as mesmas regras concernentes ao juiz natural. 7. Princpio da motivao da s decises (art. 93. IX, CF) As decises judiciais precisam sempre ser motivadas par a garantir as partes contra o arbtrio do julgador, que deve, assim, expor os moti vos pelos quais decidiu de tal forma, ou seja, o porqu decidiu em determinado senti do. Tal princpio encontra grande exceo em nosso sistema processual, no que diz resp eito deciso proferida pelo jurados, integrantes do Conselho de Sentena, no Tribuna l do Jri. Os jurados decidem por ntima convico, sendo impedidos de manifestar as raze s que os levaram a adotar um ou outro caminho na deciso da causa. 8. Princpio da p ublicidade (art. 5 , LX e art. 93, IX. CF) Princpio que determina que os atos judic iais devem ser pblicos, afastando-se, via de regra, o sigilo, que caracteriza os procedimentos inquisitivos. Tal princpio verdadeiro instrumento de controle socia l, pois, com a publicidade dos atos, a sociedade se garante contra eventual arbtr io do julgador. A regra que a publicidade seja ampla, porm, ela comporta excees. El a ser restrita nos casos em que a defesa da intimidade e o interesse social exigi rem. Neste caso, a publicidade se dar somente em relao s partes e seus procuradores ou somente em relao a estes. 9. Princpio da durao razovel do processo (art. 5 , LXXVI CF) Presente na Conveno Americana sobre Direitos Humanos, foi adotado explicitame nte pela Constituio da Repblica aps a edio da Emenda Constitucional n 45/04. Estabel que o Estado deve garantir a celeridade necessria para que o processo termine em prazo -9-

Direito Processual Penal FLVIO CARDOSO DE OLIVEIRA razovel, ou seja, no tempo necessrio para atingir a sua finalidade, sem constrangim entos desnecessrios. Especial ateno deve ser dada ao processo onde o ru esteja preso cautelarmente, para que no perdure por muito tempo, pois, neste caso, alm do natu ral constrangimento de responder a processo criminal por longo perodo, a liberdad e cerceada pode trazer srias conseqncias para o indivduo, mormente se vier a ser abs olvido. - 10 -

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CAPTULO III APLICAO DA LEI PROCESSUAL PENAL 1. A lei processual penal no espao A lei processual penal aplica-se a todas as infraes penais cometidas em territrio brasil eiro, sem prejuzo de convenes, tratados e regras de direito internacional. o princpi o locus regit actum, segundo o qual aos processos e julgamentos realizados no te rritrio nacional, aplica-se a lei processual penal brasileira, em suma, aos proce ssos penais em trmite no Brasil, aplicam-se as regras do CPP (art. 1 , CPP). Nestes termos, a lei processual penal brasileira s vale dentro dos limites territoriais brasileiros. Se o processo tiver tramitao no estrangeiro, ficar sujeito s leis proc essuais de l. Se o crime, apesar de cometido no exterior, desenrola-se no Brasil, a lei processual brasileira que o regula. No se pode esquecer, ainda, que o Bras il aceitou se submeter ao Tribunal Penal Internacional, criado pelo Estatuto de Roma, em 1998. Sua incorporao se deu atravs do Decreto n 4.388/2002, havendo disposio expressa tambm no art. 5 , 4 , da Constituio da Repblica. Embora num primeiro momento ssa parecer haver conflito entre as duas jurisdies, tal conflito se dissolve quand o se observam alguns aspectos da redao do Estatuto. Em primeiro lugar, no se trata de jurisdio estrangeira, mas sim de jurisdio internacional qual todos os signatrios e submetem. Alm disso, o TPI tem carter subsidirio jurisdio interna de um pas, isto os casos dos crimes de sua competncia, s dever agir se o Estado-membro no teve vontad e ou foi incapaz de levar adiante inqurito ou procedimento. So crimes da competncia do TPI: genocdio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crimes de agresso . 2. A lei processual penal no tempo Quanto aplicao no tempo, o processo penal ado tou o princpio da aplicao imediata das normas processuais tempus regit actum - sem efeito retroativo. o que estampa o art. 2 do CPP: A lei processual penal aplicar-s e- desde logo, sem prejuzo dos atos realizados sob a vigncia da lei anterior. Assim, a lei processual penal que entra em vigor passa a reger os atos processuais dal i para a frente. Os atos praticados sob a gide da lei anterior so considerados vlid os. H, porm, uma ressalva, que diz respeito s normas mistas, ou seja, de carter proc essual e material, conjuntamente. Se a norma contiver disposies de ordem material e processual, deve prevalecer a norma de carter material, aplicando-se o art. 2 e pargrafo nico do CP: se beneficiar o acusado, retroage. Se no beneficiar, no retroag e. Se for o caso de retroagir, ento, ela o far por inteiro. 3. Prazo na lei proces sual penal Nos prazos processuais ao contrrio dos prazos penais no se computa o di a do comeo e inclui-se o do final, nos termos do art. 798, CPP. Se o prazo termin ar em domingo ou feriado, ser prorrogado at o dia til imediato. A regra no processo penal iniciar a contagem do prazo da data da intimao e no da juntada aos autos do respectivo mandado certificado pelo oficial de justia. Conta-se tambm da data - 11 -

Direito Processual Penal FLVIO CARDOSO DE OLIVEIRA da audincia, estando presente a parte e da data em que a parte manifestar cincia i nequvoca de deciso ou despacho. - 12 -

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CAPTULO IV INQURITO POLICIAL 1. Conceito Podemos conceituar o inqurito policial com o o procedimento administrativo de carter investigatrio, que tem por fim a colheit a de elementos para subsidiar a propositura da ao penal. Extrai-se do conceito aci ma que o inqurito policial no processo, mas sim procedimento administrativo inform ativo, que visa dar ao titular da ao penal elementos para a propositura da mesma. Por esse motivo no incidem as garantias aplicadas ao processo penal, tais como am pla defesa e contraditrio. Pode-se falar, desta forma, que no h acusao e defesa no in qurito policial, h apenas uma apurao conduzida pelo rgo especializado para tal fim, t ndo em vista a apurao de uma infrao penal e sua autoria. Como o inqurito policial me o procedimento informativo, eventuais vcios em sua elaborao no trazem nulidade ao p l que vier a ser instaurada com base nele. Tais vcios podem macular o prprio ato, trazendo alguma conseqncia, como por exemplo, ter como invlido o reconhecimento de pessoa, realizado fora dos ditames legais, mas no invalidam o todo, muito menos a ao penal. Pela mesma razo o valor probatrio do inqurito policial relativo, ou seja, no possvel amparar condenao em provas colhidas exclusivamente no inqurito policial e no repetidas em Juzo. evidente que determinadas provas, como as percias em geral, v ia de regra, no apresentam a necessidade de serem repetidas na fase judicial, uma vez que so oficiais e possibilitam, alm disso, eventual contestao no processo, caso o acusado queira apontar alguma irregularidade. 2. Caractersticas Para melhor co mpreenso da essncia do inqurito policial, se faz necessria a anlise de suas principai s caractersticas. So elas: 2.1 Dispensabilidade O inqurito policial, como pea inform ativa, importante para o recolhimento de elementos que elucidem o crime, para a apurao do delito, mas isso no significa dizer que ele indispensvel. Caso o titular d a ao penal j conte com elementos suficientes para formar sua opinio delicti, pode d ispensar a instaurao de inqurito e utilizar-se dos mencionados elementos para ampar ar a denncia/queixa, consoante arts. 12, 27, 39, 5 e 46, 1 , CPP. H crimes em que a rova acusatria essencialmente documental, de modo que, de posse desses elementos, tem-se o fumus boni iuris necessrio para a propositura da ao competente, sendo de todo dispensvel a pea investigatria. o que acontece, em muitos casos, nos crimes de apropriao indbita previdenciria (art. 168-A, CP), onde o prprio sistema informatizad o do rgo previdencirio fornece os dados a respeito de eventual no recolhimento da co ntribuio devida. - 13 -

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2.2 Forma escrita (art. 9 , CPP) Como o inqurito policial destinado colheita de ele mentos para amparar a propositura de ao penal, no se pode conceb-lo sob a forma oral . Nos termos do Cdigo, as peas devem ser, portanto, escritas de prprio punho, ou da tilografadas (atualmente leia-se digitadas). Neste caso, impe-se a rubrica da aut oridade. 2.3 Sigilo (art. 20, CPP) Nos termos do art. 20 do CPP, a autoridade as segurar o sigilo necessrio apurao dos fatos ou exigido pelo interesse da sociedade. A publicidade, quando se trata de investigao, pode ser prejudicial ao seu desenvol vimento. O dispositivo no se aplica ao juiz e ao Ministrio Pblico, j que aquele quem analisa a legalidade dos atos em ltima anlise e este, na ao penal pblica, o titular da ao penal, destinatrio das investigaes policiais, alm de exercer o controle externo da atividade policial.. E quanto ao advogado? Est ele submetido regra de sigilo o u no? A Lei n 8.096/94, que institui o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, dispe no art. 7 , XIV, que o advogado poder examinar em qualquer repartio policial, me smo sem procurao, autos de flagrante e de IP, findos ou em andamento, ainda que co nclusos autoridade, podendo copiar peas e tomar apontamentos. Portanto, o advogad o no se sujeita regra do sigilo, mesmo que no esteja na posse de procurao outorgada pelo cliente. Caso seu direito de vista seja obstado, poder impetrar mandado de s egurana. 2.4 Indisponibilidade (art. 17, CPP) Uma vez instaurado o inqurito polici al, a autoridade policial no poder arquiv-lo. Isso quer dizer que mesmo que nada se ja apurado de consistente, no cabe ao Delegado de Polcia promover o arquivamento d a pea; deve ele encerr-lo formalmente, nos termos da lei. Encerradas as investigaes, frutferas ou infrutferas, deve a autoridade policial promover o encaminhamento do s autos ao Juiz competente, que abrir vista ao titular da ao penal para promov-la ou no. atribuio do titular requerer o arquivamento e do juiz determinar. 2.5 Forma in quisitorial O inqurito policial tem natureza inquisitiva. Isso quer dizer que o p rocedimento se concentra nas mos de uma s autoridade e no significa que a autoridad e possa agir arbitrariamente; h apenas concentrao de atos em um nico rgo. Nos termos o art. 4 , CPP, e do art. 144, 4 , CF, compete Polcia Civil, chefiada por delegados d e carreira, a apurao das infraes penais e de sua autoria. No mbito federal, tal incum bncia da Polcia Federal (art. 144, 1 , CF). Assim, como j dito, no h que se falar usao no inqurito policial. Prova disso o dispositivo de que no se poder alegar suspe da autoridade policial art. 107, CPP. Mas nem por isso o delegado de polcia est de sobrigado a pautar-se pela estrita legalidade na conduo das investigaes. A despeito de no haver contraditrio, podem o ofendido e o indiciado requerer diligncias (art. 14, CPP), que, por sua vez, podem ser indeferidas pela autoridade policial, salv o o exame de corpo de delito (art. 184, CPP). - 14 -

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3. Notitia criminis Trata-se do conhecimento, espontneo ou provocado, por parte d a autoridade policial, de fato que aparenta ser criminoso. o que as pessoas, pop ularmente, conhecem como queixa. A doutrina classifica-a em: 3.1. de cognio direta o u imediata: aquela onde a autoridade policial toma conhecimento do fato criminos o por meio do exerccio de suas funes, como por exemplo a descoberta de um cadver. Ne la se insere a denncia annima, tambm denominada apcrifa ou notitia criminis inqualif icada; 3.2. de cognio indireta ou mediata: a autoridade policial toma conhecimento atravs de algum ato jurdico, como comunicao de terceiro (art. 5 , 3 , CPP delatio nis), requisio do juiz ou do Ministrio Pblico (art. 5 , II, CPP), requisio do Ministr a Justia, representao do ofendido (art. 5 , 4 , CPP); 3.3. de cognio coercitiva: oco os casos de priso em flagrante (art. 8 , CPP). 4. Formas de incio O Cdigo de Processo Penal no estabelece um rito para a formalizao do inqurito policial, como o faz para o processo. Contudo, h previso de como deve dar-se o incio, quais providncias devem ser tomadas pela autoridade policial e como se d o encerramento. Comecemos pelas formas pelas quais pode ser iniciado a pea investigativa: 4.1 De ofcio (art. 5 , I, CPP) O inqurito policial, neste caso, instaurado por ato da autoridade, sem que tenha havido pedido de qualquer pessoa. Deve fazer isso quando tomar conheciment o da prtica de alguma infrao penal, seja no desenvolver se duas atividades, seja at ravs da comunicao de algum. O ato pelo qual o delegado de polcia instaura o inqurito olicial chamado de portaria. 4.2 Por requisio do juiz ou do Ministrio Pblico (art. 5 II, CPP) Por requisio deve-se entender ordem. Se for requisitada a instaurao por ju iz ou membro do Ministrio Pblico, est o delegado obrigado a atender. 4.3 Por requer imento do ofendido (art. 5 , II, CPP, e 4 ) a possibilidade que a vtima tem de solici tar formalmente da autoridade a instaurao do inqurito policial. Em crime de ao pblica normalmente ele instaurado de ofcio, mas, se no for, pode a vtima requerer. J em c so de ao privada, a regra s iniciar o inqurito se houver requerimento nesse sentido, pois se trata de ao que fica disposio da vontade da prpria vtima. - 15 -

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O delegado de polcia poder indeferir o pedido, cabendo, neste caso, recurso ao Che fe de Polcia (Secretrio de Segurana Pblica ou Delegado Geral de Polcia). 4.4 Por repr esentao do ofendido (art. 5 , 4 , CPP) Quando se tratar de crime que se apura mediante ao penal condicionada representao do ofendido, somente com o oferecimento desta qu ter incio a pea informativa. 4.5 Pelo auto de priso em flagrante (art. 8 , CPP) a ch mada instaurao compulsria. Quando algum preso em flagrante, lavrado o auto respectiv o, considera-se instaurado o inqurito policial. Nem poderia ser diferente, pois, se h indcios a ensejar a priso de algum, com mais razo h indicativos de crime a ser a urado. 5. Providncias (art. 6. , CPP) Iniciado o inqurito, determina o Cdigo de Proce sso Penal que o delegado de polcia proceda a determinadas providncias para apurao da infrao penal. Tais medidas, como dito anteriormente, no constituem um procedimento ou rito a ser seguido, pois no h verdadeiramente uma ordem para a realizao das prov idncias, mas apenas uma indicao do que deve constar na pea. O delegado deve: 5.1 Dir igir-se ao local dos fatos, providenciando para que no se alterem o estado e cons ervao das coisas, at a chegada dos peritos criminais. a chamada preservao do local d crime. Determina-se tal preservao para que no haja interferncia de ningum, de modo a prejudicar a percia. 5.2 Apreender os objetos que tiverem relao com o fato, aps lib erados pelos peritos criminais. Tais objetos devem acompanhar o inqurito policial enquanto interessarem percia (art. 11, CPP). 5.3 Colher todas as provas que serv irem para o esclarecimento do fato e suas circunstncias. a permisso dada pelo legi slador para a produo de qualquer prova lcita, a fim de apurar o delito, como requis itar documentos e ouvir tantas testemunhas quantas sejam necessrias para a invest igao. 5.4 Ouvir o ofendido. A vtima, muitas vezes, pode trazer elementos importante s para a apurao do fato, por isso deve ser ouvida. 5.5 Ouvir o indiciado. O interr ogatrio do indiciado deve ser realizado nos mesmos moldes do interrogatrio judicia l, no que couber. Por no se tratar de processo, no h necessidade de se observar cer tas regras, que dizem respeito ao contraditrio, como a possibilidade das partes d irigirem perguntas ao indiciado, mas seus direitos constitucionais devem ser gar antidos, como o direito presena de advogado de sua confiana e o direito ao silncio (art. 5 , LXIII, CF). - 16 -

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5.6 Indiciamento. a imputao a algum, da prtica de um ilcito penal, por haver razove indcios de sua autoria. Em outras palavras, a declarao de que o sujeito suspeito de ser o autor da infrao penal. So conseqncias do indiciamento: a) Sujeito passa de sus peito, investigado ou averiguado a indiciado; b) Anotao dos dados do inqurito na fo lha de antecedentes; c) Interrogatrio do indiciado; d) Identificao do indiciado. O Cdigo de Processo no trata, diretamente, do ato do indiciamento, mas estipula regr as para atos que fazem parte dele. Dentre elas, determina que, ao ser indiciado algum, deva ser feita sua identificao criminal, isto , identificao pelo mtodo datilo co. Com o advento da nova Constituio da Repblica, a regra passou a ser a da identif icao civil (CF, 5 , LVIII). A Lei n 10.054/00, porm, regulamenta tal dispositivo e per mite a identificao criminal quando o agente: a) Estiver indiciado pela prtica de ho micdio doloso, crimes contra o patrimnio cometidos com violncia ou grave ameaa, crim e de receptao qualificada, crimes contra a liberdade sexual ou crime de falsificao d e documento pblico; b) Houver fundada suspeita de falsificao ou adulterao do document o de identidade; c) O estado de conservao ou a distncia temporal da expedio de docume nto apresentado impossibilite a completa identificao dos caracteres essenciais; d) Constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificaes; e ) Houver registro de extravio de documento de identidade; f) O indiciado ou acus ado no comprovar, em 48 horas, sua identificao civil. Tais medidas so necessrias para impedir que um inocente tenha seu nome indevidamente envolvido numa prtica delit iva, principalmente quando tem seus documentos subtrados ou extraviados. 5.7 Proc eder reproduo simulada dos fatos (art. 7 , CPP). a chamada reconstituio do crime e lugar quando no contrarie a moralidade e a ordem pblica. 6. Concluso (arts. 10, 1 e 23, CPP) O inqurito policial encerra-se com o relatrio da autoridade policial. Ne le, o delegado deve descrever as providncias adotadas durante o curso do procedim ento, declarando formalmente o fim da fase investigatria. Deve-se levar em conta que o delegado de polcia no deve manifestar-se a respeito do mrito das provas colhi das, nenhuma opinio a respeito do fato deve ser expressa por ele. A Lei n 11.343/0 6 (Lei de Drogas), criou uma exigncia a mais para o relatrio do inqurito policial n os crimes a ela relativos: dever ele conter justificativa do delegado de polcia a respeito dos motivos que o levaram capitulao do crime. Relatado, o inqurito policia l enviado ao Juzo competente, que abrir vistas ao Ministrio Pblico, que pode: a) Ofe recer denncia (no prazo de 5 dias, se o indiciado estiver preso, e 15 dias, se o indiciado estiver solto); b) Requerer o retorno dos autos de inqurito delegacia, para novas diligncias (art. 16, CPP); c) Requerer o arquivamento. - 17 -

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Se o Ministrio Pblico requerer o arquivamento e o juiz determin-lo, o art. 18 do Cdi go estabelece que se a autoridade policial tiver notcias de novas provas, poder re tomar as investigaes. A retomada do inqurito, frise-se, s tem lugar no surgimento de novas provas. o que estabelece a Smula 524 do STF. O despacho de arquivamento ir recorrvel, salvo nos crimes contra a economia popular, onde cabe recurso de ofcio (art. 7 , Lei n 1.521/51). Caso o Ministrio Pblico requeira o arquivamento e o juiz no concorde, determina o art. 28 do Cdigo que este dever enviar os autos ao Procurad or Geral de Justia, que por sua vez: a) Oferecer denncia, ele prprio; b) Designar out ro promotor para oferecer a denncia, caso em que este est obrigado a faz-lo; c) Ins istir no arquivamento, caso em que o juiz est obrigado a aceit-lo. Na esfera federa l, caso ocorra a hiptese do juiz no concordar com o pedido de arquivamento formula do pelo Procurador da Repblica, os autos sero remetido Cmara de Coordenao e Reviso Ministrio Pblico Federal (art. 62, IV, da Lei Complementar n 75/93). 7. Prazo (art. 10, CPP) Se o indiciado estiver em liberdade, o prazo para concluso do inqurito p olicial ser de 30 dias. Se o caso for de difcil elucidao, poder ser prorrogado, sempr e que no estiver concludo dentro do prazo. Antes de conceder o prazo, o juiz deve ouvir o Ministrio Pblico. Se o indiciado estiver preso, o prazo para a concluso do inqurito de 10 dias. Em regra esse prazo improrrogvel, mas na maioria das vezes ac aba sendo superado, em virtude das diligncias indispensveis formao do inqurito polic al. Neste caso, a pea deve ser remetida antes do prazo estabelecido e as diligncia s faltantes conduzidas parte, para posteriormente serem anexadas aos autos. Na J ustia Federal o prazo para concluso de 15 dias para ru preso, podendo ser prorrogad o por igual perodo, conforme disposto no art. 66, Lei n 5.010/66. A legislao especia l traz ainda, alguns prazos diversos dos previstos no Cdigo de Processo: a) Lei n 11.343/06 (Lei de Drogas): 90 dias indiciado solto e 30 dias indicado preso; b) Lei n 1.521/51 (Crimes contra a Economia Popular): 10 dias indicado solto ou pres o. - 18 -

Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani CAPTULO V AO PENAL Quando surge para o Estado a possibilidade de exercer o poder pu nitivo, tal poder no pode ser exercido sem que haja comprovao dos fatos e sem decla rao judicial, autorizando a punio, ou seja, julgado procedente a pretenso estatal. Pa ra isso, exige-se a propositura de uma ao, pois, como sabido, vigora no nosso dire ito a inrcia da jurisdio, ela no pode atuar por si s, exige ser provocada, para se fa zer atuar. Podemos, ento, conceituar ao como o poder de movimentar o aparelho juris dicional estatal, a fim de satisfazer uma pretenso. Ao penal, por sua vez, o direit o de pedir ao Estado-Juiz a aplicao do direito penal objetivo ao caso concreto. No direito brasileiro segue-se o critrio subjetivo para classificao das aes penais, lev andose em conta seu titular, ou seja, classifica-se em razo de quem parte legitim a para exercer o direito de ao. Diante de tal critrio, podemos classificar as aes no processo penal da seguinte forma:

AO PENAL Pblica - incondicionada - condicionada - representao do ofendido - requis Ministro da Justia Privada - propriamente dita (ou exclusiva) - personalssima - s ubsidiria da pblica 1. Ao penal pblica a regra em nosso direito. de titularidade e usiva do Ministrio Pblico por fora de dispositivo constitucional (art. 129, I, CF). proposta sempre atravs de denncia. Alm dos princpios processuais penais gerais, que informam toda e qualquer ao penal, conforme visto anteriormente, alguns princpios so especficos da ao penal pblica. Dentre eles, os mais importantes so: a) Obrigatorie ade Segundo tal princpio, presentes os requisitos legais para a propositura da ao, o membro do Ministrio Pblico deve denunciar, no podendo deixar de faz-lo por critrios pessoais. Em outras palavras, o Ministrio Pblico no tem poder discricionrio, uma ve z presentes as condies para incio da ao; est obrigado a oferecer denncia. Hoje temos a exceo ao princpio da obrigatoriedade, que a transao penal, prevista no art. 76 da ei 9.099/95. Ela aplicvel aos crimes de menor potencial ofensivo (contravenes e cri mes com pena mxima de at 2 anos) e o Ministrio Pblico pode deixar de denunciar se o autor do fato aceitar a imposio imediata de pena no privativa de liberdade. Portant o, aqui no vigora o princpio da obrigatoriedade puro, mas sim o princpio da discric ionariedade regrada. b) Indisponibilidade. Se verificados os requisitos e oferec ida a denncia, o Ministrio Pblico no poder mais desistir da ao penal, nos termos do . 42, CPP. Ao contrrio de outros ramos processuais, - 19 -

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onde, fundamentalmente bens disponveis esto em jogo, e a desistncia da ao fica a crit io da parte, isso no acontece no processo penal. Note-se que tal regra no impede q ue o membro do Ministrio Pblico, no final da ao, pea a absolvio do ru. So momentos tos. No incio, verifica se h os requisitos para a instaurao da ao, que se destina a ao da verdade real. Se no final se convencer que o ru inocente, poder pedir a absolv io, sem que isso implique em desistncia. Exceo a regra disposta no art. 89 da Lei 9. 99/95, que traz a suspenso condicional do processo. Nela, o Ministrio Pblico, aps of erecer a denncia e verificado o preenchimento dos requisitos legais (acusado que no esteja sendo processado; no tenha sido condenado por outro crime e presena dos r equisitos do art. 77, CP), prope a suspenso do processo por um perodo de 2 a 4 anos , mediante a imposio de certas condies a serem cumpridas pelo acusado. c) Intranscen dncia Significa que a ao penal s pode ser proposta contra a pessoa a quem se imputa a prtica do delito. Assim, no se admite venha a responder pela infrao penal o respon svel legal ou herdeiro. 2. Ao penal pblica incondicionada Dentro da ao penal pblica, e j dissemos ser a regra em nosso sistema processual, a regra, por seu turno, ser ela incondicionada. Dessa forma, se a lei silenciar sobre qual modalidade se ap lica a determinada infrao, ela incondicionada, isto , no depende de nenhuma condio a o seu exerccio pelo Ministrio Pblico. Repita-se que, quando a ao for condicionada o u privada, a lei de direito material vai dizer expressamente. Se nada disser, el a pblica incondicionada. 3. Ao penal pblica condicionada aquela cujo exerccio se s rdina a uma condio, qual seja, representao do ofendido ou requisio do Ministro da ia. importante ressaltar que a ao penal continua sendo pblica, exclusiva do Ministri Pblico, apenas o seu exerccio fica subordinado a uma das condies previstas na norma processual. Os casos em que se exige representao ou requisio esto sempre expressos n a lei. 3.1 Condicionada representao Representao a manifestao de vontade do ofendi de seu representante legal, no sentido de ser instaurada a ao penal. Exemplos de crimes que exigem representao no Cdigo Penal: art. 129, caput (este por fora do art. 88 da Lei n 9.099/95); art. 130; art. 147. A natureza jurdica da representao de con dio de procedibilidade, ou seja, condio para que o Ministrio Pblico possa intentar penal, possa proceder ao, caso contrrio, no poder agir. Ela verdadeira autorizao ue o rgo ministerial possa propor a ao penal. Note-se que a representao oferecida pel vtima ou seu representante legal, no vincula o Ministrio Pblico a oferecer denncia. O promotor ou procurador dever analisar se esto presentes os requisitos para propo r a ao. A vontade do ofendido importa apenas para autorizar o Ministrio Pblico a ana lisar as condies da ao. - 20 -

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O prazo para oferecimento da representao de 6 meses, a contar da data em que o ofe ndido vier a saber quem o autor da infrao penal, conforme art. 38, CPP. O no oferec imento da representao dentro do prazo acarreta a extino da punibilidade pela decadnci a (art. 107, IV, CP). Assim, o prazo para representao decadencial: no oferecida no prazo, ter o ofendido decado de seu direito. Quanto forma, no se exige nenhum rigor formal, basta a inequvoca manifestao de vontade do ofendido, no sentido de ver o a utor do fato processado. O art. 39 do CPP, porm, indica que ela deve conter todas as informaes que possam servir apurao do fato e da autoria. Ressalte-se que se o of endido representar apenas um, dos vrios autores, o Ministrio Pblico poder denunciar todos eles. Isso o que se chama de eficcia objetiva da representao. A titularidade do direito de representao : a) do ofendido, em regra; b) do representante legal, se o ofendido tiver menos de 18 anos ou for doente mental; c) do cnjuge, ascendente , descendente ou irmos (CADI), se o ofendido for morto ou declarado ausente; d) d e um curador especial, no caso dos interesses do ofendido e do representante col idirem ou se no houver representante. Na hiptese de nomeao de curador, ele no est obr gado a representar, deve avaliar o interesse do assistido. No caso de ser pessoa jurdica a que deva oferecer representao, esta deve ser feita atravs da pessoa indic ada no respectivo contrato social ou por seus diretores e scios gerentes. A repre sentao poder ser dirigida ao juiz, ao representante do Ministrio Pblico e autoridade policial, nos termos do art. 39, caput. So os destinatrios da representao. Uma vez o ferecida a representao, possvel voltar atrs, ou seja, retratar-se? Sim, desde que a retratao seja realizada antes do oferecimento da denncia, como estampado no art. 25 , CPP. No possvel aps esse momento, pois a partir da o Ministrio Pblico j conta co utorizao de que necessitava e no pode dispor da ao, como visto anteriormente. Nunca emais lembrar que se trata de ao pblica, de titularidade do Ministrio Pblico. Quanto retratao da retratao, isto , a possibilidade do ofendido representar, retratar-se e v oltar atrs novamente, desejando fazer valer a representao anteriormente oferecida, silencia nosso Cdigo de Processo. A jurisprudncia, contudo, tem admitido-a, desde que dentro do prazo decadencial. 3.2 Condicionada requisio do Ministro da Justia Ta mbm se trata aqui de condio de procedibilidade, uma vez que o Ministrio Pblico no pod agir sem tal requisio. O fundamento para a existncia de delitos que exijam a requi sio a de que em determinados casos o Ministro deve ponderar se vale a pena process ar o autos do fato, prevendo no s a repercusso jurdica, mas tambm poltica que pode de e advir. Exemplo: crime contra a honra do Presidente da Repblica (art. 141, I, c. c. art. 145, pargrafo nico do Cdigo Penal). O Cdigo de Processo Penal silencia a res peito do prazo para a requisio. Entende-se, ento, que no h limite temporal para refer ida requisio, desde que, obviamente, ela seja oferecida antes do prazo prescricion al do crime, pois, aps este momento, est extinta a punibilidade do agente, faltand o, assim, condio para o exerccio da ao penal. No que diz respeito retratao da requ erecida, isto , a possibilidade do Ministro da Justia voltar atrs em sua deciso, a m aior parte da doutrina entende no ser possvel, sob o - 21 -

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argumento de que tal conduta seria inadmissvel em agente pblico que ocupa cargo de tamanha relevncia, alm da falta de previso legal. Para a outra parte da doutrina, deve ser ela admitida, pois a conjuntura poltica pode mudar, de modo que seja int eressante voltar atrs na deciso anteriormente tomada, alm do que o Cdigo de Processo admite a interpretao analgica, suprindo-se, assim, a falta de previso legal. Pergun ta interessante : a requisio vincula o Ministrio Pblico? Apesar de utilizar a lei o t ermo requisio, o que poderia supor ordem, ela no vincula a atuao do rgo minister ve observar se esto presentes os requisitos legais para a propositura da ao penal, uma vez que goza de independncia funcional e no est submetido a nenhuma ordem de hi erarquia ao Ministrio da Justia. 4. Ao penal privada aquela iniciada por queixa, ou queixa-crime, em que o Estado, titular exclusivo do direito de punir, transfere a legitimidade para a propositura da ao penal vtima ou a seu representante legal. N ote-se que o jus puniendi no deixa de pertencer ao Estado, apenas a iniciativa da ao foi transferida para o particular. O fundamento de haver previso da ao penal priv ada em nosso ordenamento, uma vez que o Direito Penal lida com bens via de regra indisponveis, evitar que, em alguns casos, o processo cause para o ofendido mal maior que a impunidade do criminoso. o chamado strepitus iudicii, ou seja, o escn dalo do processo. Assim, o interesse da vtima se sobrepe ao interesse pblico. o cas o, em princpio, dos crimes contra a liberdade sexual, como o estupro e o atentado violento ao pudor (art.s 213 e 214 do Cdigo Penal), bem como os crimes contra a honra (arts. 138 a 145 do Cdigo Penal). Na ao penal privada, as partes tm denominao d ferente do que se costuma ter numa ao penal pblica. A nomenclatura autor e ru substi tuda por querelante (ofendido ou seu representante legal) e querelado (autor do c rime). Lembre-se que na ao penal privada o Ministrio Pblico no parte, mas sempre atu r na condio de custos legis, ou seja, fiscal da lei. Assim como na ao penal pblica, c nta a ao penal privada com alguns princpios informadores especficos. So eles: a) Opor tunidade. O ofendido tem a faculdade de propor ou no a ao, de acordo com sua conven incia. Como dito, a lei outorgou ao ofendido a iniciativa da ao penal nos crimes em que a intimidade possa ser de alguma atingida. Portanto, fica a critrio do ofend ido decidir se a ao deve ser intentada ou no. Ele quem deve considerar oportuna tal medida. b) Disponibilidade. decorrncia do princpio da oportunidade. Da mesma form a que o ofendido pode decidir se prope ou no a ao, pode dela tambm desistir depois de intentada. Se pode o mais, que propor a ao, tambm pode o menos, ou seja, desistir de nela prosseguir. Para tanto, como veremos, tem o ofendido os institutos do pe rdo e da perempo a seu dispor. c) Indivisibilidade. O ofendido pode escolher entre propor ou no a ao, mas no pode escolher quem ir processar, no caso de mais de um auto r do delito. Ou ele processa todos ou no processa ningum, j que a queixa contra um se estende aos outros, nos termos do art. 48, CPP. Se escolher um s, o Ministrio Pb lico, segundo entendimento majoritrio, no poder aditar a queixa. Se o ofendido renu nciar a um, a renncia se estende a todos, nos termos do art. 49, CPP. - 22 -

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A titularidade do direito de queixa a mesma para o exerccio do direito de represe ntao. ela: a) do ofendido, em regra; b) do representante legal, se o ofendido tive r menos de 18 anos ou for doente mental; c) do cnjuge, ascendente, descendente ou irmos (CADI), se o ofendido for morto ou declarado ausente; d) de um curador esp ecial, no caso dos interesses do ofendido e do representante colidirem ou se no h ouver representante. Na hiptese de nomeao de curador, ele no est obrigado a represent ar, deve avaliar o interesse do assistido. No caso da queixa ser oferecida por p essoa jurdica, deve ser feita atravs da pessoa indicada no respectivo contrato soc ial ou por seus diretores e scios gerentes. O prazo para oferecimento da queixa d e 6 meses, a contar da data em que o ofendido vier a saber quem o autor da infrao penal. Esto presentes na ao penal privada, alguns institutos que ditam suas regras de convenincia para prop-la ou dela desistir. So eles: a decadncia, a perempo, a ren a e o perdo. Vejamos um a um. A decadncia consiste na perda do direito de ao pelo de curso do prazo sem o oferecimento da queixa (vale tambm para a representao). ela ca usa extintiva da punibilidade do agente e somente opera antes do incio da ao, obvia mente. O prazo decadencial no se interrompe e no se suspende, nem mesmo pela insta urao de inqurito policial. A perempo uma verdadeira sano imposta ao querelante, em de sua inrcia ou negligncia processual. Implica na perda do direito de prosseguir na ao, que extinta, salvo na ao penal privada subsidiria da pblica, em que a titula ade volta para o Ministrio Pblico. Ocorre aps o incio da ao penal, nas seguintes hip es (art. 60, CPP): a) quando o querelante deixar de promover o andamento process ual durante 30 dias seguidos; b) quando falecendo o querelante, ou sobrevindo su a incapacidade, no comparecer em juzo, para prosseguir no processo, dentro de 60 d ias, qualquer pessoa a que, couber faz-lo (CADI), ressalvado o disposto no art. 3 6, CPP; c) quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a q ualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedid o de condenao nas alegaes finais; d) quando, sendo o querelante pessoa jurdica, esta se extinguir sem deixar sucessor. A renncia definida como ato pelo qual o ofendid o abre mo do direito de oferecer queixa. ato unilateral e que ocorre, com resta c laro, somente antes da ao. Pode ser expressa ou tcita, quando se pratica ato incomp atvel com a vontade de propor a ao. Como visto anteriormente, a renncia em relao a um dos autores do crime se estende aos demais (art. 49, CPP). Ressalte-se que na si stemtica dos Juizados Especiais Criminais (Lei n 9.099/95), a composio civil implica em renncia ao direito de queixa e representao. Aqui h exceo indivisibilidade da re a, pois somente quem comps com o autor do fato que renuncia ao exerccio da ao. J o p rdo do ofendido o ato pelo qual o querelante desiste de prosseguir na ao penal, des culpando o querelado pela prtica do delito. Somente pode ocorrer antes do trnsito em julgado da deciso. Trata-se de ato bilateral, isto , que depende da aceitao do qu erelado. O perdo concedido a um dos querelados se estende aos demais, mas s gera e feitos para aqueles que o aceitarem. Pode ser processual ou extraprocessual. Na primeira hiptese, - 23 -

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oferecido o perdo, o querelado intimado para se manifestar em 3 dias a respeito d a aceitao ou no do perdo. No silncio, considerar-se- aceito. 4.1 Ao penal privada p amente dita (ou exclusiva) aquela em que se aplica tudo o quanto foi dito at agor a a respeito da ao penal privada, sem nenhuma particularidade. As especificidades ficam reservadas para as outras espcies de aes privadas, como veremos a seguir. 4.2 Ao penal privada personalssima aquela que s pode ser proposta pelo ofendido, vedada at mesmo a propositura por seu representante legal, inexistindo, tambm, sucesso po r morte ou ausncia. Se o ofendido morre no decorrer do processo, extingue-se a pu nibilidade do agente. Esta a nica particularidade desta modalidade de ao. Se o ofen dido for menor de 18 anos, o prazo decadencial s passar a correr a partir do dia e m que completar 18 anos. Isso porque ele est impedido de exercer seu direito, ass im, o prazo decadencial no corre. Como exemplo, temos o crime de Induzimento a er ro essencial e ocultao de impedimento art. 236, CP. 5. Ao penal privada subsidiria d pblica a proposta pelo ofendido ou por seu representante legal, em crimes de ao pbl ica, quando o Ministrio Pblico deixar de faz-lo no prazo legal (art. 5 , LIX, CF e ar t. 29, CPP). Note-se que esta ao s tem lugar no caso de inrcia do Ministrio Pblico, j mais em caso de arquivamento dos autos de inqurito. Se o rgo ministerial requereu o arquivamento do inqurito policial por entender no existir elementos para proposit ura da ao penal, no h que se falar em ao penal subsidiria. Ele no foi inerte, ele a Nesta modalidade de ao, o Ministrio Pblico apenas atuar como fiscal da lei e no como arte, intervindo em todos os atos do processo, lanando seu parecer. Ele poder, nes sa funo, aditar a queixa, se for o caso de reput-la incompleta, ou, at mesmo, repudi ar a queixa inepta, oferecendo denncia substitutiva. A deciso, em todos os casos, cabe ao magistrado. Como o Ministrio Pblico era o titular do direito de ao e perdeuo para o ofendido, qualquer ato de negligncia processual deste far com que o proce sso seja retomado por aquele. Se o ofendido no comparecer a alguma audincia ou no a tender a algum despacho, por exemplo, ensejar a retomada da ao pelo seu titular ori ginrio. O prazo para intentar essa ao de 6 meses, a contar da data do escoamento do prazo para o Ministrio Pblico oferecer a denncia, nos termos do art. 29, CPP. - 24 -

Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani CAPTULO VI DENNCIA E QUEIXA

So as peas iniciais da ao penal, uma da ao penal pblica, a denncia, e outra da ao ivada, a queixa. Assim como no Cdigo de Processo Civil, o Cdigo de Processo Penal tambm traz o rol dos requisitos da petio inicial de uma ao penal, conforme veremos ab aixo. 1. Requisitos (art. 41, CPP) 1.1 Descrio do fato em todas as suas circunstnci as A descrio na pea inicial deve ser exata, de modo a possibilitar a perfeita ident ificao da acusao para que seja exercido o direito de defesa. Deve-se narrar de foram concisa tudo o que se passou e na forma em que se passou, de modo que o julgado r possa vislumbrar a possibilidade de ter existido crime, bem como a possibilida de de ser o denunciado seu autor. H autores que admitem a denncia alternativa, ist o , narrar 2 condutas e pedir que se o juiz entender que no houve uma, que condene pela outra (por exemplo: se no provar o roubo, que se condene pela receptao), mas a maioria da doutrina e da jurisprudncia entendem que tal no possvel, pois dificult a e at mesmo inviabiliza a defesa do acusado. 1.2 Qualificao ou identificao do acusad o Se no for possvel qualificar o acusado, isto , apontar sua completa individualizao, devese indicar os dados que possibilitem sua identificao. Tratam-se aqui de dados fsicos, que permitam ao menos saber quem o denunciado, muito embora no se saiba s ua qualificao. Isso porque no se pode imputar vagamente a prtica de um crime a algum de quem no se tem a mnima certeza de quem seja. Caso no seja possvel colher o menor elemento identificador, deve-se rejeitar a pea. 1.3 Classificao jurdica do fato nece ssrio apontar qual a previso legal para a conduta que narrada na inicial. Isso por que no se admite o recebimento de denncia ou queixa de fato que no considerado crim e pela lei penal. Assim, ainda que no seja uma classificao imodificvel, o correspond ente abstrato ao fato concreto deve ser trazido na pea inicial. 1.4 Rol de testem unhas A apresentao do rol de testemunhas aparece como requisito, mas bvio que ele s ser exigido se houver testemunha a ser inquirida. Havendo, este o momento de arro lar, sob pena de precluso. Note-se que para a queixa, outros requisitos ainda so e xigidos, no que diz respeito procurao outorgada ao advogado, nos termos do art. 44 do CPP. Deve o instrumento de mandato conter poderes especiais para promover a ao, alm de fazer meno ao fato criminoso e indicar o nome do querelado (h erro de reda o CPP, que traz, erroneamente, a palavra querelante). - 25 -

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2. Prazos O prazo para oferecimento da denncia de 15 dias se o denunciado estiver solto e 5 dias se o denunciado estiver preso. Leis especiais trazem prazos dive rsos, que sero: a) de 2 dias, nos crimes contra a economia popular (Lei n 1.521/51 ); b) de 10 dias, nos crimes eleitorais (Lei n 4.737/65); c) de 48 horas, nos cri mes de abuso de autoridade (Lei n 4.898/65); d) de 10 dias, nos crimes de imprens a (Lei n 5.250/67) e) de 10 dias, nos crimes de trfico de drogas e assemelhados (L ei n 11.343/06). J para a queixa, o prazo de 6 meses, a contar da data do conhecim ento da autoria do delito, ou do trmino do prazo do Ministrio Pblico, dependendo da modalidade de ao, como se ver adiante. 3. Causas de rejeio da denncia ou queixa (art 43) O Cdigo de Processo Penal estampa as causas que devem justificar a rejeio da p ea inicial. Ser rejeitada a denncia ou queixa quando: 3.1 Fato narrado evidentement e no constituir crime Muito embora no se deva fazer exame aprofundado das provas n o momento do recebimento da denncia ou queixa, elas devem ser rejeitadas se o fat o evidentemente no constituir crime. A fase, aqui, de mera admissibilidade da acu sao. 3.2 J estiver extinta a punibilidade pela prescrio ou outra causa Se estiver ext inta a punibilidade do agente, h falta de interesse de agir para a propositura da ao penal, devendo a denncia ou queixa ser rejeitada. 3.3 For manifesta a ilegitimi dade de parte ou quando faltar outra condio da ao Aqui deve se verificar se a parte quem realmente deve figurar no respectivo plo da ao penal. Pode haver ilegitimidade ativa, quando, por exemplo, o Ministrio Pblico oferecer denncia em caso de ao penal privada. Pode haver ilegitimidade passiva, quando, por exemplo, um menor de 18 a nos denunciado. Qualquer outra condio da ao que no seja observada autoriza a rejei mo por exemplo, no caso de oferecimento de denncia pelo Ministrio Pblico sem que te nha havido representao da vtima, quando a lei a exige. Nesses casos, a ao poder ser p oposta novamente, desde que sanada a inobservncia da condio. 4. Recursos contra rej eio ou recebimento Da deciso que rejeita denncia ou queixa cabe recurso em sentido e strito, no prazo de 5 dias (art. 581, CPP). Caso se trate de infrao de menor poten cial ofensivo, sujeita aos Juizados Especiais Criminais (Lei n 9.099/95), o recur so cabvel a apelao, no prazo de 10 dias. J da deciso que recebe a denncia no cabe so. Na hiptese, possvel a impetrao de habeas corpus, caso esteja configurado constra ngimento ilegal. - 26 -

Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani

H exceo, no caso de recebimento, que diz respeito Lei n 5.250/67, art. 44, 2 , segu parte, (Lei de Imprensa), onde se est previsto o recurso em sentido estrito para combater o recebimento da pea inicial. - 27 -

Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani CAPTULO VII AO CIVIL EX DELICTO (arts. 63 a 68)

As responsabilidades civil e criminal so independentes. Um ilcito civil pode ser t ambm ilcito penal e o inverso ocorre na grande maioria das vezes. Porm, para evitar conflitos entre decises das duas esferas, o legislador imps regras buscando a int erao delas. O art. 91, I, do Cdigo Penal dispe que a condenao torna certa a obrigao eparar o dano. O Cdigo Civil, no art. 927, dispe que o ato ilcito ser indenizado. Pa ra harmonizar os dispositivos, prev o art. 63 do CPP que a sentena penal condenatri a transitada em julgado constitui ttulo executivo judicial a ser liquidada e exec utada no juzo cvel. Assim o ofendido pode obter a reparao do prejuzo, sem ter que pro por ao cvel de conhecimento, basta promover a liquidao da sentena. A despeito dessa p eviso, como dito, a responsabilidade civil independe da criminal, de modo que pos svel que corram paralelamente uma ao penal e uma ao civil sobre o mesmo fato (art. 64 , CPP). Assim, o ofendido no precisa esperar, se desejar, a concluso da ao penal, po de ingressar com ao de reparao de dano no juzo cvel. Nesse caso, o juiz, para evitar ecises contraditrias, pode suspender o curso da ao cvel, por at um ano (art. 64, par fo nico, CPP e art. 265, IV, a e 5 , CPC), sendo recomendvel que prorrogue a suspenso , a despeito do prazo estipulado, at a sentena penal. Faz coisa julgada no cvel a s entena penal que reconhecer que o agente praticou o fato acobertado por uma das c ausas excludentes de ilicitude, pois esses atos so penalmente e civilmente lcitos. Tambm a sentena absolutria que reconhea a inexistncia material do fato impede a repa rao civil. Outras decises do juzo penal no tm o condo de impedir a reparao civil: cho de arquivamento do inqurito policial, a absolvio por no estar provada a existncia do fato ou a autoria delitiva, a absolvio por no ser o fato infrao penal, a absolvi or insuficincia de provas e a declarao de extino da punibilidade. Tm a titularidade p ra a propositura da ao cvel o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. Porm, se o titular do direito for pobre, pode requerer ao MP, para que este propo nha, nos termos do art. 68, CPP. Observe-se que esta regra tem sido abrandada pe lo Supremo Tribunal Federal, que tem adotado o entendimento de que o rgo ministeri al s deve assumir a titularidade da ao civil onde no houver Defensoria Pblica, uma ve z que este rgo o destinado a patrocinar os interesses de pessoas financeiramente h ipossuficientes. importante ressaltar que s se pode executar quem foi parte na ao p enal, ou seja, o condenado. H quem sustente, porm, que o responsvel civil pode figu rar no plo passivo da ao. Quanto competncia, o ofendido pode propor a ao no foro de u domiclio, no do local dos fatos (art. 100, CPC) ou no do domiclio do ru (regra ge ral, contida no art. 94, CPC). - 29 -

Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani CAPTULO VIII JURISDIO E COMPETNCIA

1. Jurisdio Antes que possamos falar de competncia, objeto principal deste captulo, se faz necessrio lembrar alguns aspectos relativos jurisdio. Jurisdio o poder-deve o Estado de aplicar a norma em abstrato ao caso concreto. S o Estado, na funo de Es tado-Juiz, detentor do poder jurisdicional, da que, alm de um poder tambm um dever, j que o monoplio obriga-o a agir, quando um conflito lhe apresentado. Em outras p alavras, podemos dizer que a jurisdio o poder de julgar um caso concreto, de acord o com o ordenamento jurdico, por meio do processo. Lembremos que a palavra jurisd io vem do latim juris (direito) e dictio (dizer), significando ento o poder de dizer o direito. So caractersticas do Poder Jurisdicional: 1.1 inrcia: o rgo jurisdicional no atua sem provocao; deve ser provocado atravs de ao; 1.2 substitutividade: o rgo dicional atua em nome das partes, uma vez que monopoliza a jurisdio; 1.3 definitiv idade: com a deciso final no processo, a prestao jurisdicional torna-se, em regra, imutvel. A jurisdio, como poder do Estado, una. Porm, seria absolutamente impossvel ue apenas um juiz julgasse todas as causas levadas ao Estado, buscando soluo. Dian te disso, a lei distribui a jurisdio dentre os diversos rgos do Poder Judicirio. Surg e a, ento, a competncia. 2. Competncia Competncia a medida e o limite da jurisdio. rdadeira delimitao do poder jurisdicional; a medida da extenso do poder de julgar. a poro de jurisdio que cabe a cada rgo do Poder Judicirio, na atividade de aplicar o reito ao caso concreto. 2.1 Espcies de competncia Pode-se estabelecer e fixar as r egras de competncia a partir de 3 aspectos: 1) ratione materiae: estabelecida em razo da natureza do crime; 2) ratione personae: estabelecida de acordo com a funo o u cargo do acusado; 3) ratione loci: estabelecida de acordo com o local em que f oi praticado ou consumou-se o delito, ou do local da residncia do autor. - 31 -

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2.2 Competncia em razo da matria/natureza da infrao Como forma de se chegar fixao mpetncia no processo penal, podemos definir, num primeiro momento, o juzo competen te para julgar o caso concreto em razo da natureza da infrao penal. Determinadas ma trias foram eleitas pelo Constituinte para serem julgadas por jurisdies especializa das, isto , por justia criada para julgar apenas certas modalidades de infrao. As ma trias restantes, cabem jurisdio comum. So jurisdies especiais: 1. Justia Eleitoral s. 118 a 121, CF), competente para julgar infraes penais eleitorais e conexas. Exe mplo: votar em lugar de outrem (art. 309, Lei n 4.737/65) e corrupo ativa (art. 333 , CP). 2. Justia Militar (art. 124, CF), competente para julgar crimes militares, assim definidos em lei. A Justia Militar no julga crimes conexos. Exemplo: recusa de obedincia (art. 6, CPM). importante destacar que o crime de abuso de autorida de (Lei n 4.898/65) no julgado pela Justia Militar; seu julgamento fica a cargo da Justia Comum. Da mesma forma o militar que est em folga ou pratica crime comum, se u julgamento ser perante a Justia Comum. So jurisdies comuns: 1. Justia Federal (art. 109, IV, CF), competente para julgar: a) crimes polticos. So os de motivao poltica e contra a estrutura poltica do Estado. Sustenta-se que esto descritos na Lei de Seg urana Nacional (Lei n 7.170/83); b) infraes penais praticadas em detrimento de bens, servios ou interesse da Unio, suas entidades autrquicas ou empresas pblicas, excluda s as contravenes. Exemplo: crime de descaminho (art. 334, CP), onde se suprime tri buto de competncia federal; crime de apropriao indbita previdenciria (art. 168-A, CP) , onde o agente se apropria indevidamente de verba federal. Alguns apontamentos so necessrios aqui. Se o crime for praticado contra servidor pblico federal no exer ccio da funo, a competncia da Justia Federal. J se for praticado em detrimento de S edade de Economia Mista, a competncia ser da Justia Estadual, pois a Constituio da Re pblica no se referiu a ela. esse o entendimento expresso na Smula 42 do Superior Tr ibunal de Justia. Como principais exemplos desse tipo de sociedade, temos a Petro bras e o Banco do Brasil. Ressalte-se que as contravenes penais tambm no so julgadas pela Justia Federal. A respeito, foi editada a Smula 38 do Superior Tribunal de Ju stia. c) crimes previstos em tratados ou conveno internacional, quando, iniciada a execuo no Pas, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou recipro camente. Exemplo: trfico internacional de entorpecentes (Conveno de Viena Dec. n 1.5 4/91). d) casos de grave violao de direitos humanos, se houver necessidade de asse gurar o cumprimento de obrigaes decorrentes de tratados internacionais sobre direi tos humanos dos quais o Brasil faa parte. Inserido pela Emenda Constitucional n 45 /04. Se o procedimento foi iniciado na Justia Estadual o Procurador Geral da Repbl ica dever suscitar o deslocamento de competncia ao Superior Tribunal de Justia. e) crimes contra a organizao do trabalho. Desde que sejam contra a organizao geral do t rabalho ou os direitos dos trabalhadores coletivamente considerados. - 32 -

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f) crimes contra o sistema financeiro e a ordem econmico-financeira, quando deter minados em lei. No basta que sejam crimes dessa natureza, preciso que exista prev iso legal no sentido de estabelecer a competncia da Justia Federal. g) crimes comet idos a bordo de navios ou aeronaves. Foro competente: o de partida ou chegada, d ependendo de o navio ou avio afasta-se ou aproxima-se do Brasil. h) crimes de ing resso e permanncia irregular de estrangeiro. Esto previstos na Lei n 6.815/80. 2. J ustia Estadual (art. 125, CF), competente para julgar tudo que no for da competncia das jurisdies especial e comum federal. Sua competncia residual. Duas observaes: a) os crimes dolosos contra a vida, so de competncia do Tribunal do Jri, previsto no i nciso XXXVIII, d, do art. 5 da CF. O Jri poder ser da jurisdio comum estadual ou fed l, dependendo do caso. b) Os Juizados Especiais Criminais so competentes para jul gar as infraes de menor potencial ofensivo, ou seja, aquelas que tenham pena mxima no superior a 2 anos. Podem eles tambm ser da esfera federal ou da esfera estadual . Se a infrao de sua competncia for praticada em conexo com da Justia Comum, ser julg do por esta, aplicando-se a transao e a composio civil (alterao efetuada pela Lei n 313/06). 2.3 Competncia em razo da pessoa Fixada a competncia em razo da matria, cump re verificar se a pessoa ocupa cargo ou funo pblica que justifique, em razo de sua r elevncia, o julgamento por tribunal. a chamada competncia por prerrogativa de funo, ou, como muitos denominam, foro privilegiado. Enumeraremos a seguir, a competncia dos cada tribunal do Pas, para o julgamento de infraes penais comuns e os cargos m erecedores do foro especial: a) Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, b e c, CF ): Presidente da Repblica, Vicepresidente, Deputados Federais, Senadores, Procura dor Geral da Repblica, Advogado Geral da Unio, Ministros de Estado, Comandantes da s Foras Armadas, Ministros dos Tribunais Superiores, Membros do Tribunal de Conta s da Unio, Chefes de misso diplomtica de carter permanente; b) Superior Tribunal de Justia (art. 105, I, a, CF): Governadores dos Estados e do Distrito Federal, Dese mbargadores, Membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, do Tribunal regional Federal, do Tribunal Regional Eleitora, do Tribunal regiona l do Trabalho, do Tribunal de Contas do Municpio, Membros do Ministrio Pblico da Un io que oficiem nos Tribunais; c) Tribunal Regional Federal (art. 108, I, CF): Juze s Federais, Juzes do Trabalho, Juzes Auditores, Membros do Ministrio Pblico Federal que oficiem em Primeira Instncia, Prefeitos (para crimes da esfera federal); d) T ribunal de Justia (art. 29, X; art. 96, III, CF; Constituies Estaduais): Juzes Estad uais, Membros do Ministrio Pblico Estadual, Vice-Governador, Secretrios de Estado, Deputados Estaduais, Procurador-Geral de Justia, Procurador-Geral do Estado, Defe nsor Pblico Geral, Prefeitos. - 33 -

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Note-se que em relao aos Prefeitos, eles devem ser julgados sempre em Segunda Instn cia e de acordo com a matria. Se forem acusado da prtica de crimes da esfera feder al, sero julgados pelo TRF, se da esfera estadual, pelo TJ. Se se tratar de crime eleitoral, a competncia desloca-se para o Tribunal Regional Eleitoral. o que est abelece a Smula 702 do Supremo Tribunal Federal. Algumas observaes a respeito da co mpetncia pela prerrogativa de funo: 1) se houver conflito entre os critrios de pesso a e matria, como jri e foro por prerrogativa de funo, resolve-se em favor deste, se ambos estiverem previstos na Constituio Federal. Se a competncia em razo da pessoa e stiver definida em Constituio Estadual (Deputados Estaduais em So Paulo, por exempl o), prevalece aquela definida na Constituio da Repblica. 2) Juiz de Direito e Promo tor de Justia sempre sero julgados pelo Tribunal de Justia do estado ao qual perten cem, independentemente de onde tenham cometido o crime. 3) Em caso de concurso d e agentes, todos sero julgados pelo foro privilegiado (Smula 704, STF). 2.4 Competn cia em razo do lugar Aps verificar as regras de competncia que levam em conta a nat ureza da infrao e a qualidade do cargo que determinadas pessoas ocupam, cumpre est abelecer como se d a competncia, levando-se em considerao o lugar em que se deu o cr ime ou em que reside o acusado. a) Lugar do crime As regras estampadas no art. 7 0 do Cdigo de Processo Penal, estabelecem que a competncia ser fixada: a) pelo luga r em que se consumar a infrao. Alguns crimes, pelas suas peculiaridades, podem sus citar alguma dvida, por isso a jurisprudncia cuidou de estabelecer algumas regras: - no crime de estelionato pela emisso de cheque sem fundos, o foro competente se r o do local onde houve a recusa no pagamento, pois a que se consuma a infrao (Smula 521, STF e Smula 244, STJ); - no crime de estelionato mediante falsificao de cheque , ser competente o foro do local onde houve vantagem, isto , onde o cheque foi tra nsmitido; - no crime de falso testemunho prestado em carta precatria, a competncia ser do juzo deprecado; - no crime de homicdio, na hiptese se ser a vtima alvejada nu ma cidade ser conduzida a outra e ali morrer, deve-se fixar a competncia pelo loc al da ao, ou seja, onde foi atingida. Tal regra se justifica pela facilitao da colhe ita da prova, tendo em vista o julgamento pelo Tribunal do Jri. b) Em caso de cri me iniciado no Brasil e consumado fora dele, ser competente o local onde foi prat icado o ltimo ato de execuo, dentro do territrio nacional. (art. 70, 1 , CPP); c) Cas o ltimo ato de execuo tenha sido realizado fora do Brasil, ser competente o foro do local em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou deveria produzir seu resultado (art. 70, 2 , CPP); d) No caso de tentativa, ser o local onde se prat icou o ltimo ato de execuo (art. 70, caput, CPP). - 34 -

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e) Se o crime ocorrer na divisa entre comarcas ou se for incerto o limite entre elas, a competncia de fixar por preveno (art. 70, 3 , CPP); f) Em caso de crime conti uado ou permanente, atravessando duas ou mais jurisdies, a competncia tambm ser firma da pela preveno (art. 71, CPP). A preveno, nos termos do art. 83, CPP, ocorre toda v ez que, concorrendo dois ou mais juzes igualmente competentes ou com jurisdio cumul ativa, em deles tiver antecedido aos outros na prtica de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denncia ou quei xa. b) Domiclio do acusado No sendo conhecido o lugar da infrao, competente ser o lug ar do domiclio do ru (art. 72, caput, CPP). Note-se que tal regra tem lugar apenas quando no se consegue apurar onde o crime aconteceu. Exemplo: crime de furto que acontece no interior de um nibus que vai de SP ao PR e somente descoberto quando se chega ao destino. Se o ru tiver mais de um domiclio, ser fixada a competncia pel a preveno (art. 72, 1 , CPP). Se no tiver residncia certa ou for ignorado seu paradei o, ser competente o juiz que primeiro tomar conhecimento do fato. (art. 72, 2 , CPP ). No caso de ao exclusiva privada, o querelante pode preferir promover a ao no foro de domiclio do ru, ainda que conhecido o local da infrao (art. 73, CPP). Algumas ob servaes, a respeito da competncia em razo do lugar: 1) No processo dos crimes pratic ados fora do territrio brasileiro, ser competente o juzo da Capital do Estado onde houver por ltimo residido o acusado. Se nunca residiu no Brasil, ser competente a Capital da Repblica (art. 88, CPP). 2) Crimes cometidos a bordo de embarcao em guas territoriais brasileiras, bem como a bordo de embarcao nacional em alto-mar, sero j ulgados pela justia do primeiro porto em que tocar a embarcao aps o crime ou pela do ltimo que tiver tocado, quando se afastar do pas (art. 89, CPP). 3) Crimes cometi dos a bordo de aeronaves em espao areo brasileiro, bem como a bordo de aeronave na cional em alto-mar, sero julgados pela justia da comarca onde se der o pouso aps o crime ou pela da comarca de onde houver partido a aeronave (art. 90, CPP). 4) Se incerta e se no se determinar pelas duas hipteses anteriores, a competncia ser firm ada pela preveno (art. 91, CPP). 3. Conexo e continncia So causas de alterao da comp ia, em virtude da relao existente entre duas condutas, que fazem com que estas sej am reunidas num s processo perante um s juzo, chamado de juzo prevalente. 3.1 Conexo Para haver conexo deve haver um vnculo entre duas ou mais infraes penais. Ocorre qua ndo duas ou mais infraes esto entrelaadas, apresentam nexo entre si. Espcies: 1) Cone xo intersubjetiva (art. 76, I, CPP): as infraes encontram-se unidas pelos sujeitos, isto , por terem sido praticadas por duas ou mais pessoas. Pode ser: - 35 -

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a) por simultaneidade: duas ou mais infraes so praticadas ao mesmo tempo, por vrias pessoas reunidas ocasionalmente. Exemplo: pessoas que saqueiam, ao mesmo tempo, loja de eletrodomsticos (vrios crimes de furto); b) por concurso: duas ou mais inf raes so praticadas por pessoas em concurso (com liame subjetivo), ainda que em temp o e locais diversos. Exemplo: vrios agentes, membros de faco criminosa, planejam e praticam homicdios, roubos, incndios em vrias localidades e tempo diversos; c) por reciprocidade: duas ou mais infraes so praticadas por agentes uns contra os outros. Exemplo: leses corporais recprocas. 2) Conexo Objetiva (art. 76, II, CPP): as infr aes encontram-se unidas objetivamente, ou seja, pela prpria ligao existente entre uma e outra, e no em razo dos sujeitos que as praticam. Pode ser: a) teleolgica: uma i nfrao penal praticada para assegurar a execuo de outra. Exemplo: matar o segurana, p ra seqestrar o empresrio; b) seqencial: uma infrao praticada para assegurar a: - ocu tao de outra. Exemplo: incndio para impedir a descoberta de uma falsificao de documen to; - impunidade de outra. Exemplo: matar testemunha de crime anterior; - vantag em de outra. Exemplo: matar cmplice para ficar com todo o produto do roubo. 3) Co nexo probatria/instrumental (art. 76, III, CPP): ocorre quando a prova de uma infr ao influi na prova de outra. Exemplo: prova do crime de furto em relao ao de receptao 3.2 Continncia (art. 77, CPP) D-se quando uma causa est contida na outra, no sendo possvel a separao. Pode ser: 1) por cumulao subjetiva (art. 77, I, CPP): ocorre quand o duas ou mais pessoas praticam em concurso uma mesma infrao. a co-autoria ou part icipao em um nico crime. Exemplo: 3 pessoas que praticam um roubo em concurso. 2) p or cumulao objetiva (art. 77, II, CPP): ocorre em todas as hipteses de concurso for mal (art. 70, CP), incluindo aberratio ictus (art. 70, CP) e aberratio criminis (art. 74, CP). Exemplo: agente que dirige imprudentemente seu veculo e vem a atro pelar uma pessoa e matar outra. 4. Foro prevalente Quando houver a alterao de comp etncia em razo da conexo ou continncia, como dito, as causas sero reunidas num s proc sso. Ser preciso, ento, saber qual o foro competente para julg-lo. O Cdigo de Proces so Penal traz as regras em seu art. 78: a) no concurso entre jri e outro rgo da jur isdio comum: prevalece a competncia do jri. Exemplo: homicdio e estupro conexos, so j lgados pelo jri; b) no concurso entre jurisdies da mesma categoria, prevalece: - a do lugar da infrao de pena mais grave. Exemplo: furto e estelionato, prevalece o e stelionato, pela pena maior (1 a 5 anos de recluso); - se de igual gravidade, a d o lugar em que houver ocorrido o maior nmero de infraes. Exemplo: um agente furta d e uma loja na cidade de So Paulo, de uma vez, 3 automveis. Estes so distribudos a 3 receptadores na cidade do Rio de Janeiro. O foro prevalente ser o do Rio de Janei ro, em virtude de l ter ocorrido 3 receptaes; - 36 -

Coordenadores: Marcelo T. Cometti Fernando F. Castellani

- a preveno, se penas idnticas e em igual nmero. Exemplo: um nico furto e uma nica re eptao; c) no concurso entre jurisdies de categorias diversas, prevalece a de maior g raduao. Exemplo: prefeito agindo em concurso com outras pessoas, todos sero julgado s pelo tribunal correspondente; d) no concurso entre jurisdio comum e especial, pr evalece a especial. Exemplo: crime eleitoral e corrupo ativa, sero julgados pela Ju stia Eleitoral. Se, todavia, ambas as definies de competncia estiverem previstas na Constituio da Repblica, como acontece com a Justia Eleitoral e o Tribunal do Jri, o e ntendimento majoritrio que deve haver separao de processos. e) no concurso entre Ju stia Federal e Justia Estadual, prevalece a Justia Federal (Smula 122, STJ). Estabel ece o art. 82 do Cdigo de Processo Penal que, se por qualquer motivo estiverem co rrendo 2 processos diferentes, onde deveria haver reunio por conexo ou continncia, o juiz do foro prevalente dever avocar o outro processo (art.82, CPP). 5. Separao d e processos Mesmo sendo hipteses de conexo ou continncia, o Cdigo prev casos em que s e deva dar a separao dos processos. Essa separao pode ser obrigatria ou facultativa. 1) obrigatria (art. 79, CPP): a) no concurso entre as jurisdies comum e militar; b) no concurso entre as jurisdies comum e da infncia e juventude; c) no caso de super venincia de doena mental a um dos co-rus; d) se houver co-ru que no possa ser julgado a revelia. (Exemplo: suspenso do processo, art. 366, CPP); e) se no houver coinci dncia na escolha de jurados, no caso de 2 ou mais rus com defensores diversos, no plenrio do jri (art. 461, CPP). 2) facultativa (art. 80, CPP): a) quando as infraes tiverem sido praticadas em circunstncias de tempo ou de lugar diferentes, desde q ue tal fato possa prejudicar o andamento da ao; b) em razo do nmero excessivo