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Gilmar Laignier de Souza Junior

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Belo HorizonteCentro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH)

2010

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Gilmar Laignier de Souza Junior

BOLA NA REDE E NO PAPEL:análise comparativa de notícias esportivas na web e nos jornais impressos

Monografia apresentada ao curso de Jornalismo do CentroUniversitário de Belo Horizonte (UNI-BH) como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Jornalismo.Orientadora: Lorena Tárcia

Belo HorizonteCentro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH)

2010

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................... 5 1 O DISCURSO DAS MÍDIAS E A CONSTRUÇÃO DA NOTÍCIAJORNALÍSTICA ON-LINE E IMPRESSA................................................................. 7 1.1 Contrato de comunicação midiático ........................................................................... 7 1.2 Abordagem polifônica de comunicação...................................................................... 9 1.3 Tecnologias, produção e distribuição da notícia ....................................................... 12 1.4 Hipermídia e o jornalismo no século XXI ................................................................ 13

1.5 Linguagens do jornalismo on-line e impresso .......................................................... 16 1.6 Rotinas do jornalismo impresso e on-line ................................................................. 21 1.7 Mídias sociais e suas possibilidades ......................................................................... 24 2 O JORNALISMO ESPORTIVO E SUAS PECULIARIDADES.......................... 28 2.1 Jornalismo especializado e sua função ..................................................................... 28 2.2 História do jornalismo esportivo no Brasil ............................................................... 29 2.3 A construção do futebol no imaginário popular através da mídia ............................ 31

2.4 O perfil do profissional do esporte ........................................................................... 34 2.5 O dilema da imparcialidade ...................................................................................... 36 2.6 O jornalismo esportivo nas mídias contemporâneas ................................................. 38 3 ANÁLISE DO CONTEÚDO ESPORTIVO ON-LINE E IMPRESSO................ 40 3.1 Metodologia .............................................................................................................. 40 3.2 Apresentação do objeto ............................................................................................. 41 3.2.1 Portal Uai - Superesportes.................................................................................... 41 3.2.2 Jornal Estado de Minas......................................................................................... 44 3.2.3 Rotinas do Superesportes e do Estado de Minas................................................... 45 3.3 Análise de material empírico .................................................................................... 48 3.3.1 Dia seguinte a um jogo de Campeonato Brasileiro............................................... 48 3.3.2 Fim de semana sem jogo de futebol de um dos clubes.......................................... 51 3.3.3 Cobertura do esporte especializado...................................................................... 55 CONCLUSÃO............................................................................................................... 60 REFERÊNCIAS............................................................................................................ 62

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INTRODUÇÃO

O jornalismo passou, desde os primeiros tipos móveis de Gutenberg, por diversastransformações. A adaptação à era digital talvez seja a maior delas. A internet já faz parte da sociedade no século XX e a imprensa busca se ajustar a essa nova realidade.Diante desse cenário, o jornalismo esportivo também procura seu espaço.

O presente estudo permite abrir a discussão em torno de um jeito próprio de se fazer jornalismo esportivo, principalmente na internet. Não existem regras prontas. Com aanálise, foi possível fazer um levantamento dos elementos jornalísticos mais eficazes notratamento da notícia on-line. Atrelado a isso está o redescobrimento do papel do jornalimpresso na informação esportiva.

O projeto possui relevância para a prática do profissional da comunicação social namedida em que mapeia os recursos utilizados por jornalistas esportivos para captar seusleitores em diferentes suportes: internet e jornal impresso.

Qual o diferencial da internet na veiculação do noticiário esportivo? Qual o papel da

hipermídia na editoria de esportes? Qual a função do jornal impresso na era dainformação em tempo real devorada pelos torcedores de futebol apaixonados pelos seusclubes? Esses são apenas alguns questionamentos levantados pelo presente estudo e quenos permitem lançar um olhar analítico acerca dos paradigmas em que estão envolvidosos jornais e os sites de esporte no Brasil.

Longe de encontrar fórmulas e manuais próprios para se fazer jornalismo esportivo na

atualidade, a internet e o impresso vivem um momento de ebulição e constantetransformação. Se o aumento sistemático do número de usuários de internet no Brasilfazem o webjornalismo esportivo passar por dilemas como o da “competição” com asredes sociais na veiculação das notícias, o jornal impresso vive a pressão por buscar abordagens diferenciadas dos fatos e não perder seu espaço na sociedade.

O primeiro capítulo do estudo abrange as teorias de análise do discurso das mídias, bem

como os paradigmas do jornalismo no século XXI. A hipermídia, as rotinas do jornalistada internet e do impresso, as novas linguagens da comunicação, as ferramentas da web

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no tratamento da notícia e o redescobrimento do jornal impresso na era da informaçãodigital.

A segunda parte da monografia trabalha os dilemas e características principais do jornalismo esportivo, editoria que ganhou espaço nos jornais do Brasil na segundametade do século passado e tem sido, cada vez mais, alvo de discussões, investimentose críticas por parte das empresas jornalísticas e do público leitor.

Os objetos de pesquisa escolhidos para análise foram o jornal Estado de Minas e o portal Superesportes. A escolha foi feita por ambos fazerem parte do maior grupo decomunicação de Minas Gerais, os Diários Associados, e serem tradicionais em suasáreas de atuação. Sendo produtos da mesma empresa, os veículos puderam ser analisados isentos de restrições editoriais que pudessem modificar o olhar da nossaanálise.

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1 O DISCURSO DAS MÍDIAS E A CONSTRUÇÃO DA NOTÍCIAJORNALÍSTICA ON-LINE E IMPRESSA

1.1 Contrato de comunicação midiático

Não há como entender qualquer tipo de construção de notícias jornalísticas, sejam elasde jornal impresso, televisão, internet ou rádio, sem antes burilarmos seus objetivos. E oestudo do escopo desses veículos passa pela noção de discurso. Para conceber os alvosdo jornalismo, é preciso compreender primeiro seus processos de construção lingüística.

Segundo Patrick Charaudeau (2007), há um modelo ultrapassado de visão tecnicista domundo social que coincide com as primeiras teorias da informação. Nesse modelo, tudoacontece como se houvesse, entre uma fonte de informação e um receptor, umainstância de transmissão encarregada de fazer circular um certo saber da fonte aoreceptor (CHARAUDEAU, 2007, p.35). De acordo com essa visão, a comunicação seriaum circuito fechado entre emissão e recepção, com uma relação simétrica entre aatividade do emissor, cuja única função seria “codificar” a mensagem, e a do receptor,cuja função seria “decodificar” essa mesma mensagem.

Charaudeau (2007) coloca em xeque esse modelo e propõe uma nova discussão acercado discurso das mídias. O autor disseca a linguagem midiática de maneira complexa, a partir dos conceitos modernos de análise do discurso. O analista então mostra ascondições de uma comunicação de massa, pautadas por contratos, identidades dasinstâncias, finalidades dos contratos e dispositivos de encenação.

Charaudeau (2007) descreve as características da linguagem da comunicação jornalística. Todo ato comunicativo exige um contrato. O contrato é um conjunto decondições pelas quais se realiza qualquer ato de comunicação (CHARAUDEAU, 2007, p. 67). No espaço contratual, encontramos estratégias e restrições.

Em resumo, o contrato de comunicação é o conjunto de coerções estabelecidas pelointerlocutor e pelo receptor na transmissão de uma mensagem. As estratégias de

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credibilidade do discurso, o projeto de fala (objetivo) e as estratégias de captaçãocumprem um contrato de comunicação.

Toda comunicação é pautada por diversos atos, que definem o contrato. Charaudeau(2007) define essa situação com base em quatro termos: a finalidade das trocas, aidentidade dos parceiros, o propósito e o dispositivo.

A finalidade das trocas, ou do contrato, está relacionada ao objetivo, que se traduz emtermos de uma seleção de meta – ou visada – uma vez que um gênero de discurso pode possuir mais de uma visada. “A visada de informação consiste em fazer saber aocidadão o que aconteceu ou o que está acontecendo no mundo da vida social”(CHARAUDEAU, 2007, p. 87).

A identidade dos parceiros (“quem se endereça a quem?”) está ligada às identidadessociais e discursivas dos envolvidos na troca. No caso da comunicação midiática, há um paradigma. O público não coincide totalmente com as representações construídas pelos produtores da informação, e pode não se deixar atrair nem seduzir com facilidade, nãosendo apreendidos facilmente. (CHARAUDEAU, 2007, p. 72).

O propósito do discurso está atrelado à questão “falar do quê?”. Em uma noção vaga,Charaudeau (2007, p.94) define o conceito como “[...] aquilo de que se fala, o que estáem questão num ato de comunicação”. A noção é vaga porque uma notícia pode ser recebida de maneiras diferentes por diversas pessoas e sob várias circunstâncias. Essanotícia representa “aquilo de que se fala”, e é, portanto, o propósito do discurso. Diantedesse dilema, Charaudeau (2007) passa a definir a noção como relacionada a um

“universo de discurso”, que se refere a um certo movimento da linguagem reconstruídoem categorias de sentido, como fragmentos semânticos, de acordo com o léxico de cada pessoa envolvida no ato de comunicação.

O dispositivo está relacionado à circunstância da informação. Ele é um componente docontrato de comunicação sem o qual não há interpretação possível das mensagens.(CHARAUDEAU, 2007, p. 105).

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Ainda dentro do contrato de comunicação, Charaudeau (2007) discute as estratégiascomunicativas da informação. Segundo o autor, a estratégia consiste em operacionalizar os meios de persuadir ou seduzir o outro. Charaudeau agrupa as estratégias discursivasem três planos: legitimidade, credibilidade e captação.

A legitimidade, segundo o autor, é externa ao sujeito falante e se origina do estatutomais ou menos institucional do locutor. É a legitimidade que dá o poder de dizer. Elaresulta da constatação de uma adequação entre um ato de fala e a posição social do seuautor. (CHARAUDEAU, 2007, p. 129).

A legitimidade, porém, não é suficiente para assegurar o direito à fala. É aí que entra acredibilidade. É necessário que o locutor se mostre capaz de provar a sua capacidade emlidar com as restrições impostas pelo contrato. Nesse quesito entram as estratégias quetendem a comprovar a habilidade do locutor em “saber dizer”. Já a captação é a atitudeque consiste em provocar um certo estado emocional que seja favorável a uma visada deinfluência do sujeito falante.

Por fim, Charaudeau (2007) estabelece que, quando os termos que definem o contrato

de comunicação – finalidade das trocas, identidade dos parceiros, propósito edispositivo – não são reconhecidos, a comunicação tende a fracassar. É o caso dos mal-entendidos. Quando eles são reconhecidos, porém, permitem a identificação dastipologias discursivas: discurso publicitário, discurso jornalístico de reportagem, jornalístico de entrevista, entre outros.

Sob essa égide, podem-se reconhecer os termos dos contratos de comunicação que

identificam o discurso jornalístico de reportagem para jornal impresso e para on-line,objetos deste estudo.

1.2 Abordagem polifônica de comunicação

A noção de polifonia na comunicação designa, de maneira geral, a presença em um

enunciado de vozes distintas daquela do seu autor. Todo enunciado consiste em uma

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encenação de instâncias enunciativas distintas, com as quais o locutor pode se associar ou não (SILVA, 2004, p. 68). No caso de uma reportagem jornalística, por exemplo, orepórter nunca terá a chancela completa de seu texto, uma vez que sua escrita carregaráum conjunto de significados não planejados por ele, enunciador, mas impregnados nas palavras do seu discurso.

Rosilene Silva (2004) versa sobre a noção de ato de linguagem apresentado por Charaudeau (1983) em Linguagem e discurso,onde o analista desvincula o ato delinguagem de uma concepção puramente formal. Silva (2004) argumenta que o objetotexto, como manifestação do discurso, representa tanto um objeto de significaçãolinguística, já que se organiza em torno de uma materialidade, como um objeto psicossocial, pertencente a uma cultura, e seu sentido só pode ser estabelecido emcondições particulares de ocorrência. (SILVA, 2004, p.63).

Dessa forma, como o texto depende do contexto histórico-social para se transformar emobjeto de comunicação, Silva (2004) afirma que sua construção não está acopladaunicamente a um sujeito que se pretenda dono de seu discurso, pois ele é constituído dediferentes vozes sociais, que interagem entre si tanto no momento da produção do

discurso quanto na recepção. Nas palavras de Silva (2004, p.63), “[...] sujeito não estásozinho, ele ‘busca’ outras fontes para seu texto, ainda que inconscientemente, fazendocom que sua produção seja uma representação de outras vozes”. Além disso, o texto busca interagir com seu próprio enunciatário, já que todo texto tem em vista umreceptor.

A partir dessa noção, Silva (2004) apresenta uma visão do fenômeno da polifonia,

presente em todos os discursos, partindo do conceito de interdiscurso. Segundo a autora,todos os discursos são heterogêneos; ainda que o sujeito tenha a ilusão de ser a fonte eorigem de sua fala, ele situa o seu discurso em relação aos discursos do outro. Esseoutro diz respeito não só ao destinatário da mensagem, mas aos discursoshistoricamente já constituídos e emergentes de sua fala. Em um discurso jornalístico, por exemplo, a reportagem de um jornal está situada em relação a seu público alvo e aoseu histórico editorial e de legitimidades jornalísticas.

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Silva (2004) apropria-se do conceito de interdiscurso de Maingueneau (1993), e sugereque essa noção está ligada ao pensamento de que o dialogismo é a base de todadiscursividade, ou seja, não há discurso sem uma relação com o outro. E é por isso queum discurso sempre reflete outros, podendo manter entre si uma relação de assimilação,dependência ou até negação e contradição.

Uma abordagem atual sobre o assunto passa pelas noções de heterogeneidadeconstitutiva e heterogeneidade mostrada. A heterogeneidade que ocorre através demanifestações explícitas, recuperáveis pelos próprios enunciados, recebe o nome demostrada e se refere aos processos de representação num discurso. Já a constitutiva estámais relacionada aos processos de constituição de um discurso e remete aos processosreais de formação desse discurso, bases que estão em outras falas, das quais a pessoaque escreve se apropria (SILVA, 2004, p. 67). Esses dois planos não são independentes.

Silva (2004) se utiliza dos conceitos de Ducrot (1987) para analisar a condição dolocutor. De acordo com Ducrot (1987), a enunciação não precisa conter nenhumareferência a um autor, já que a origem dela não é uma constante das indicaçõessemânticas, mas uma das características que podem ser atribuídas ou não à enunciação.

Dessa forma, Ducrot (1987) trabalha sua teoria no campo lingüístico e semântico,desconsiderando a presença de um sujeito empírico em sua análise.

Para concluir a análise de que todo discurso é polifônico, Silva (2004) retomaCharaudeau (1983), em um esquema para os lugares de pertinência da máquinamidiática, que constitui, segundo o autor, um modelo de discurso que se aplica a todoato de comunicação linguageira. Charaudeau (1983) determina três lugares de

pertinência em um esquema polifônico: lugar das condições de produção, lugar daconstrução do discurso e lugar das condições de interpretação.

Silva (2004) relata todos eles. O lugar das condições de produção compreende ascondições socioeconômicas da máquina midiática, uma empresa cujos participantes(atores organizados e programadores da máquina midiática) buscam produzir umdiscurso de representação voltado para os efeitos econômicos que ele possa garantir.

Assim, as condições de produção buscam colocar o produtor de informação diante do

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maior número possível de consumidores, por meio de um processo de sedução constante(SILVA, 2004, p. 72).

No lugar da construção do discurso, são produzidos os efeitos possíveis, que estão emsintonia com os efeitos visados pela instância de enunciação e representam possibilidades interpretativas na instância de recepção.

Por fim, no lugar das condições de interpretação encontram-se o sujeito destinatárioideal (público alvo) e o sujeito interpretante real (público). O sujeito ideal é imaginado pela instância midiática como suscetível de perceber os efeitos visados por ela.

Dessa forma, o sujeito, ao construir seu discurso, não pode ser considerado o únicoenvolvido no processo de linguagem, uma vez que há um desdobramento polifônico,tanto no momento da produção, como no momento da recepção (SILVA, 2004, p. 75).

Produção, recepção e públicos, principalmente no Jornalismo, nosso objeto de estudo,estão hoje profundamente marcados pelas tecnologias e pelas relações no ciberespaço.

1.3 Tecnologias, produção e distribuição da notícia

Mesmo que o jornalismo ainda não tenha alcançado a condição de ciência, por assimdizer, seus conhecimentos práticos evoluíram através do tempo tal como a física, ou amedicina. Desde os primeiros tipos móveis de Gutenberg, a atividade foi ganhandocorpo e se profissionalizando até alcançar a forma atual, atrelada a interesses deempresas e norteada por tecnologias.

Marcondes Filho (2000) sistematiza tal ‘evolução’ em quatro fases. A Primeir a etapaabrange a propagação da informação por meio dos primeiros sistemas de imprensa – de1789 a meados do século XIX – e trata de profissionalizar o que chamamos hoje de jornalismo.

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A Segundafase colhe frutos do “poder” já estabelecido pelo Jornalismo. A imprensa passa a ser disputada por partidos políticos em busca de novos seguidores às suasideologias. Aqui começa a haver uma mudança nos jornais. A necessidade de auto-sustentação obriga à venda de espaços publicitários entrecortados às notícias.

O alto número de tiragens transforma empreendimentos jornalísticos em grandesmonopólios noTerceiromomento. Com as guerras e os governos ditatoriais do séculoXX, o foco dos jornais é alterado. Surge o jornal de massa, que passa a angariar maisinvestimentos para aprimorar sua estética e, consequentemente, aumentar suavendagem.

Por fim, Marcondes Filho (2000) chega àQuarta e atual fase do jornalismo,caracterizada pela incorporação de tecnologias digitais, não só em sua divulgação, masem todas as suas etapas de produção da notícia. O jornal impresso perde o caráter de“trazer novidades” e torna-se mais opinativo e interpretativo. As velhas redações sãoinformatizadas e as máquinas de escrever são aposentadas. Quem passa a ditar asmanchetes é a internet, mais rápida e instantânea, e a TV.

1.4 Hipermídia e o jornalismo no século XXI

A transformação pela qual o jornalismo atravessa no século XXI diz respeito também àsmudanças da cultura contemporânea e suas implicações sociopolíticas e filosóficas. A“evolução” não é apenas do jornalista, mas do comportamento do seu público, que passaa incorporar os meios digitais como parte da vida, deixando no ar a questão: os meios deleitura no futuro serão apenas eletrônicos?

Villaça (2002) questiona a passagem do impresso ao eletrônico, que não se efetua sem adiscussão do que seja povo ou cultura, termos em torno dos quais girafundamentalmente a temática no que diz respeito à passividade ou atuação do receptor.

A visão de que o leitor do impresso é “passivo” é muito radical e, por outro lado, a

própria atividade do internauta interativo pode apenas ser decorrência do capitalismo

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desorganizado, da instabilidade do mercado e das novas tendências à mobilidade,elasticidade e fluxo (VILLAÇA, 2002, p. 39).

Segundo Villaça (2002), as noções de passividade ou atividade não são simples. Deve-se distinguir o fato de que assistir à televisão possa conduzir à passividade, por exemplo, da idéia de que a assistência à televisão possa ser em si um ato passivo. Para aautora, os veículos de comunicação não determinam interatividade ou passividadeefetivas, mas conduzem a cada situação.

A partir daí, Villaça (2002) salienta que alguns suportes oferecidos pela internet, naverdade, já existiam na comunicação humana, mas dependiam do léxico de cadaleitor/receptor. A autora recorre a Roland Barthes para mostrar que o hipertexto,ferramenta usada com frequência na internet para ligar um conceito a outro, sempreexistiu na remissão constante de um livro a outro através do repertório dos leitores(BARTHES1, 1970, citado por VILLAÇA, 2002, p. 61).

Por outro lado, Villaça (2002) destaca que os meios eletrônicos trouxeram alguns benefícios até mesmo para os jornais impressos. Um deles é a relação com os leitores.

Atualmente, o repórter do jornal impresso encontra no monitor de seu computador, emsua caixa de e-mail, a opinião do leitor sobre o que foi publicado naquele dia.Teoricamente, o jornal passou a conhecer melhor o seu leitor, mas é preciso saber queeste é apenas um tipo de leitor do jornal impresso: o que tem acesso irrestrito aocomputador.

Portanto, se os jornais impressos estão conhecendo melhor o seu leitor, os portais de

notícias os têm mapeados em programas de contagem de acessos a cada reportagem.Essas ferramentas não só apuram o número de acessos a cada matéria como mostram otempo de permanência na página, e, consequentemente, o grau de rejeição e deaceitação – aquelas pessoas que leem a matéria até o fim são as que gastam um tempo

1 BARTHES, Roland.S/Z . Paris, Seuil, 1970. Sur I’hypertexte et l’évolution de la littérature voir aussi. P. GeorgLondow, Hypertex. The convergence of contemporary critical theory and technology.Éd. The Johns Hopkins

University Press, Baltimore, USA, 1992.

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mínimo de dois a três minutos na página. Os que gastam poucos segundos são tidoscomo leitores que rejeitaram a reportagem visitada.

Villaça (2002) recorre a Umberto Eco para versar sobre as novas possibilidades que ainternet possibilita ao leitor. Segundo a autora, os suportes dos textos on-line podemtrazer dinamismo ao texto, mas jamais substituirão as palavras impressas.

Com o hipertexto, tem-se uma rede multidimensional na qual cada ponto pode ser potencialmente conectado a qualquer outro. Eco (citado por VILLAÇA, 2002, p.103)discorda da visão simplista de que a internet acabará com os livros e outros meios deescrita impressos, já que os modos de adquirir conhecimentos foram apenas semultiplicando. Segundo o autor, pode-se hoje aprender muito sobre o Império Romanoatravés do cinema. Um programa educacional em CD-Rom pode explicar genéticamelhor do que um livro. Na atualidade, o conceito de aprendizagem engloba diversasmídias e depende do público visado e dos objetivos a serem alcançados.

Canavilhas (2001) salienta que a grande vantagem que a internet oferece ao usuário naleitura de uma notícia jornalística é a hipermídia. Através dos hiperlinks, o leitor pode

ter um universo de informações em poucos cliques. Além disso, a utilização de áudionas reportagens, segundo o autor, acrescenta credibilidade e objetividade à notícia, alémde dialogar com o universo do rádio.

O jornalismo radiofônico só ganha características próprias quando osenunciados assumem um sentido intertextual e polifônico: a notícia tema voz do jornalista, mas também a de eventuais intervenientes noconteúdo da notícia que, desta forma, confirmam o texto.(CANAVILHAS, 2001, p. 4)

Além de incorporar características do jornal impresso e do rádio com uma possibilidadequase infinita de navegação, a internet ainda pode contar com o auxílio dos vídeos paraenriquecer suas reportagens.

Canavilhas (2001) salienta que há diferenças entre o papel do vídeo no jornal televisivoe no webjornal. Na TV, texto e imagem são um só produto e não têm significadoquando separados. Não se deve verificar, portanto, nenhuma concorrência semântica

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entre esses elementos. No webjornal, a redundância (imagem e texto deoff casados) dálugar a um caráter legitimador da informação veiculada no texto. Os vídeos devem ser mais objetivos e desprender-se do aspecto televisivo de ser um vetor de emoção eafetividade (CANAVILHAS, 2001, p. 5).

Canavilhas (2001) ainda ressalta que a internet tem a seu favor muito mais do que asnovas ferramentas de interatividade com o leitor. Não bastassem os hiperlinks, vídeos,áudios e animações em três dimensões, o jornalismo on-line ainda conta com recursosimportantes para a distribuição da notícia. “O webjornal pode enviar para os assinantesmensagens (de e-mail ou celular) com os títulos e leads das notícias nas áreas escolhidas pelo utilizador”, sugere Canavilhas (2001, p. 6).

Outra vantagem da internet é a personalização da notícia jornalística. Canavilhas (2001)mostra que, através decookiesou escolhas feitas pelo usuário no ato da assinatura doserviço, o jornalismo on-line pode transformar-se num informativo pessoal,disponibilizando em destaque ao leitor as matérias das áreas de seu interesse.

1.5 Linguagens do jornalismo on-line e impresso

Diante de todas as discussões sobre as mudanças dos hábitos da sociedade no séculoXXI, o investimento em pesquisas sobre o comportamento desse novo leitor tambémcresceu. O motivo é simples. Com o seu público totalmente mapeado, o jornalismo écapaz de desenvolver um produto muito mais eficaz, no sentido de captar o seu receptor.

Franco (2008) analisa essas pesquisas sobre o comportamento do leitor de internet. Paraisso, o autor busca dados de estudos realizados pelo Poynter Institute,com sede nosEstados Unidos. O Eyetrack realizado pelo Instituto, que em tradução livre significa“rastro”, ou “caminho do olho”, pôde levantar dados curiosos. Os parágrafos maiscurtos, por exemplo, tiveram melhor desempenho que os maiores. Alguns dadosrevelaram que os textos com parágrafos pequenos recebem o dobro de atenção visualque aqueles com parágrafos longos (FRANCO, 2008, p.29).

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Franco (2008) propõe um manual de como se escrever para a web, baseado nasconstatações das pesquisa sobre o leitor. Na internet, a estrutura da pirâmide invertidadeve ser sempre explorada. Na definição tradicional, significa começar o texto com ainformação mais importante e depois prosseguir na ordem decrescente de importância.“A internet não apenas resgatou a importância da pirâmide invertida como a melhor estrutura para apresentar textos, como também abriu a possibilidade de que o própriousuário a construa.” (FRANCO, 2008, p.52).

São apresentados por Franco (2008), três tipos de utilização da pirâmide invertida naweb. A primeira delas, mais primitiva, consiste em reproduzir o texto na página dainternet com a estrutura tradicional da notícia. Esse nível de utilização pressupõe umaleitura linear, como no impresso. O leitor move sua leitura em uma ordem predeterminada e nada pode fazer para mudar essa ordem.

O segundo nível de utilização representa uma leitura não linear, mas com o texto todona mesma página da web. Dessa maneira, o jornalista hierarquiza os temas da matériacom intertítulos dentro da mesma página, levando o usuário diretamente ao subtema deseu interesse ao passar os olhos sobre o texto. Cada intertítulo apresentaria um novo

assunto, com chamadas complementares no decorrer da matéria. (FRANCO, 2008, p.58)

O terceiro tipo de pirâmide invertida proposto por Franco (2008) utiliza o potencial deentrelaçamento oferecido pela web. Nesse caso, o repórter faz uma introdução ao tema eaproveita os hiperlinks para hierarquizar as informações e jogar para outras matérias eoutras páginas, cabendo ao internauta clicar no subtema de seu interesse. "No terceiro

nível é o usuário quem determina a hierarquia da informação e, em última análise, quemconstrói sua própria pirâmide”. (FRANCO, 2008, p. 60).

Franco (2008) justifica o uso da pirâmide invertida nawebfazendo uma analogia com aorigem desse modelo, que está ligada à invenção do telégrafo e à preocupação de que atransmissão pudesse ser cortada a qualquer momento. Assim, entregava-se a mensagem principal o quanto antes. A lógica do webjornalismo é a mesma. No instante em que um

título capta a atenção do internauta, ele deve ser atrativo o suficiente para dizer de quese trata a matéria, para ver se vale a pena lê-la até o final, assistir aos seus vídeos ou ver

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suas galerias de fotos. Isso tudo pode ocorrer em menos de um segundo, de acordo comas pesquisas do Eyetrack.(FRANCO, 2008, p.55).

A estrutura de textos de pirâmide invertida utilizada pelos jornais impressos há algunsanos pode ser facilmente adaptada para a internet. É desejável que o texto da internetcaiba em uma página da web, evitando que o leitor role a página verticalmente por umalonga extensão, afirma Franco (2008). No entanto, com o dispositivo de rolagemdisponível hoje nos mouses, o leitor também se sente confortável com textos maislongos, apesar de modificar a leitura, passando ao que a pesquisa chama de scanning .Por este método, o usuário não se atenta aos detalhes e corre o texto diante dos olhos,captando as ideias principais.

Além de linear, como o texto de jornal impresso, a pirâmide invertida da web conta comrecursos próprios, que obrigam o autor/editor a fazer um exercício de hierarquizaçãoligando os sub-temas ao texto através de hiperlinks. “O resultado final deste trabalho éuma introdução ao assunto, seguida por links que levam aos subtemas.” (FRANCO,2008, p. 60).

Dessa forma, a ordem em que são apresentados os assuntos no texto da web podesugerir uma rota de navegação, mas o próprio internauta pode optar por outras rotas deleitura. Na prática, então, o leitor é quem determina a hierarquia da informação emalgumas situações, de acordo com seu próprio interesse, construindo sua própria pirâmide (FRANCO, 2008).

Os critérios para o tamanho do texto on-line formam uma antiga discussão, afirma

Franco (2008). Desde as primeiras pesquisas, especialistas sugerem textos curtos para astelas do computador, dado o cansaço que essas provocam nos usuários. Hárecomendações de alguns autores de que o texto da web não seja mais do que 50% doque seria usado para dizer o mesmo no jornal impresso.

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Jakob Nielsen2 (2007), citado por Franco (2008), mostra que um texto longo poderiaconter mais informação, mas poderia levar muito tempo para ser lido, o que levaria osinternautas a abandonar a página. O interessante, então, seria a relação “custo- benefício”. Nesse artigo, Nielsen (2007) cria modelos em que atribui valores emunidades de benefício e conclui que “as pessoas preferem ler artigos curtos”. O ideal éque haja uma mescla de textos curtos e longos, para que usuários diferentes cumpramsuas expectativas.

Nesse contexto, o jornalista pode utilizar de diversos recursos textuais em suas matérias para atrair a atenção do internauta. Um desses recursos éos dois pontos(:) que detém odiscurso para chamar a atenção sobre o que vem a seguir. Outra sugestão é nuncacomeçar frases ou títulos com artigos e racionalizar o número de idéias que coloca emcada frase (FRANCO, 2008, p. 103).

Curiosamente, as normas de redação do jornalismo on-line seguem mais ou menos osmesmos padrões estabelecidos pelo impresso. A diferença é que, agora que a internetestá ganhando seu espaço em definitivo no cotidiano do leitor e do jornalista, o jornalestá se redescobrindo e mudando suas regras.

Antes mesmo da virada do século, Lage (1999) definiu bem essa situação. Para o autor,a linguagem jornalística é aquela que procura conter informação conceitual. Suadescrição não se limita ao fornecimento de fórmulas rígidas, porque elas não dão contada variedade de situações encontradas no mundo objetivo e tendem a envelhecer rapidamente (LAGE, 1999, p. 36).

A partir de então, Lage (1999) traça normas de redação em veículos impressos, mesmoexplicitando que uma fórmula rígida não supre as necessidades do texto jornalístico. Oautor explica que os manuais de redação surgiram no Brasil, em meados da década de1950, para atender à necessidade de generalizar procedimentos de técnica de redaçãoque estavam sendo adaptados de modelos estrangeiros.

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Long Vs. Short Articles as Content Strategy, (http://useit.com/alertbox/content-strategy.html). 12 denovembro de 2007

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1.6 Rotinas do jornalismo impresso e on-line

O estudo das diferenças entre a produção e veiculação de notícias na web e no jornalimpresso passa pela rotina dos repórteres em cada um dos veículos. O surgimento dainternet como novo veículo de jornalismo produziu um profissional mais distante desuas fontes, passando a apurar as notícias de dentro da redação – ou simplesmentecoletando de agências – para publicá-las em tempo real.

Neveu4 (2001, citado por PEREIRA, 2004) exemplifica essa situação com o termo‘jornalista sentado’, utilizado para designar “[...] um jornalismo mais orientado ao

tratamento (formatação dos textos de outros jornalistas, gênero editorial ou comentário)de uma informação que não é coletada pelo próprio jornalista”.5

O conceito de Neveu (2001) se contrapõe à noção do ‘jornalista de pé’, profissional quecoleta suas informações através do contato direto com as fontes. Pereira (2004) explicaque mesmo antes do surgimento da internet, algumas funções dentro das redaçõesconvencionais de jornais impressos já se valiam das informações provenientes de fontes

externas.

Pereira (2004) sugere que a adoção da prática do ‘jornalismo sentado’ na maioria dos portais de internet tenha ocorrido por causa de logística. “Essa foi a maneira que asempresas jornalísticas encontraram para manter um sistema de alimentação on-line emfluxo contínuo com quadro de profissionais reduzido” (PEREIRA, 2004, p. 96).

O surgimento do ‘jornalista sentado’ diminuiu o trabalho investigativo dos profissionaise criou um repórter ágil e compromissado com a veiculação das notícias em tempo real.

Jornalismo tornou-se um disciplinamento técnico, antes que umaatividade investigativa ou lingüística. Bom jornalista passou a ser aquele que consegue, em tempo hábil, dar conta das exigências de produção de notícias do que aquele que mais sabe ou melhor escreve(MARCONDES FILHO, 2000, p. 36).

4 Néveu, Erik. Sociologie du Journalisme. Paris: La Découverte, 20015 No original: “[ . . . ] une journalisme plus orienté vers le traitment (mise en forme des texts d’autrui,genre éditorial ou commentaire) d’une information qu’il n’a pas collecté lui-même”.

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Pereira (2004) salienta que o resultado desse tipo de jornalismo é a publicação de“notícias a conta-gotas”, com informações ainda sem confirmação e notas praticamenteirrelevantes.

Schiaretta6 (2006, citado por JORGE e PEREIRA, 2009, p.59) discorda da visão deMarcondes Filho (2000) e destaca que a essência da prática jornalística não mudou.

O bom jornalista continua sendo aquele capaz de apurar uma boamatéria, escrever um bom texto fazer um bom título. Aquele que dá ainformação rápida, objetiva, crítica, pluralista e independente. O papeldo jornalista multimídia se expande, ele se torna mais flexível ecompleto, exige novas habilidades. Para trabalhar na internet, ele precisa ousar e tentar novas formas de comunicar, conhecer asespecificidades do meio, entender e aprender a usar as ferramentas(SCHIARETTA, citado por JORGE e PEREIRA, 2009, p.59)

Ferrari (2004, p. 44) atenta para o fato de que, apesar de a maioria dos sites jornalísticosoferecerem ao repórter a condição de “jornalista sentado”, o jornalismo digital não se

resume a reproduzir reportagens na internet. Embora o caminho mais prático e baratoseja mesmo o de “empacotar” textos prontos, é também função do jornalista de web pensar no tema do chat, da enquete, dos vídeos e áudios. A autora explica que algunsespecialistas defendem a importância do conteúdo original na internet, emcontraposição aos textos de agências.

A internet ainda está em gestação, a caminho de uma linguagem própria. Não podemos encará-la apenas como uma mídia que surgiu

para viabilizar a convergência entre rádio, jornal e televisão. A interneté outra coisa, uma outra verdade [...] muito ligada à tecnologia e com particularidades únicas. Ainda estamos, metaforicamente, saindo dacaverna (FERRARI, 2004, p. 45).

Diante desse debate sobre as rotinas do jornalista multimídia, em um aspecto os teóricossão unânimes: atualmente, o jornalista tem que fazer de tudo um pouco. De acordo com

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SCHIARETTA, T. Qualidade editorial em um mercado multimídia. In: Seminário InternacionalImprensa Multimídia / as redações da terceira geração, 2006, Brasília.

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Jorge (2007), o repórter precisa entender de tudo, saber editar uma foto, um vídeo, um podcast. Melhor para as empresas, que, em vez de deslocar uma equipe de quatro pessoas para cobrir um evento, passam a enviar somente uma.

Marcelo Tas (2009) salienta que o jornalista que não se adaptar a esse universorapidamente, terá dificuldades na profissão nos próximos anos. “O jornalista atual nãotem de escolher ser multimídia. Essa escolha já foi feita. Quem não estiver atento estáfora da brincadeira”7.

Marco Chiaretti (2009), porém, alerta para o perigo da utilização desse novo profissional como um multifuncional. “Fazer tudo ao mesmo tempo não contribui para aqualidade de nada. Saber fazer tudo amplia a qualidade”8.

Jorge e Pereira (2009) fomentam a discussão sobre a formação desse novo jornalista.Para os autores, o profissional do jornalismo deve ganhar nova dimensão com o fim daobrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão.

Uma pesquisa realizada em Portugal, em 2006, apontou que 53,7% dos jornalistas que

trabalhavam em redações on-line foram treinados pelas próprias empresas; 26%adquiriram suas competências em faculdades e 33,3% não receberam qualquer tipo deaprendizado sobre jornalismo on-line ou multimídia (JORGE e PEREIRA, 2009, p.60).Para os autores, a pequena participação das escolas na formação dos profissionaisexplica-se pela falta de docentes especializados em jornalismo digital.

Ainda que essa situação aponte para um cenário no qual ainda não exista um método

consolidado de formação do profissional multimídia, Jorge e Pereira (2009) salientamque a preocupação das universidades tem crescido. Além disso, dizem os autores, éigualmente importante para uma boa formação não desprezar o conhecimento adquiridono empirismo profissional, buscando aliar as duas concepções - a teórica e a prática – nas rotinas de produção.

7 Em entrevista à revista Plug Especial Digital,Curso Abril de jornalismo. Editora Abril, 2009, p. 40.

8 Em entrevista à revista Plug Especial Digital,Curso Abril de jornalismo. Editora Abril, 2009, p. 40.

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1.7 Mídias sociais e suas possibilidades

Com tantos paradigmas a serem rompidos e tantos dilemas a serem discutidos, o jornalismo do século XXI ainda tem de lidar com um de seus maiores desafios: oavanço das mídias sociais – aquelas dotadas de plataformas que permitem ao públicodivulgar seus próprios conteúdos de texto, foto, áudio e vídeo.

Cabe ao jornalista estabelecer friamente um processo de parceria com o seu leitor e secolocar em um patamar igual de discussão de temas e reportagens ou o repórter precisaimpor sua notícia como “a mais confiável” da internet? A questão é mais complicada do

que se imagina. Trata-se de colocar em xeque a credibilidade e a legitimidade do jornalista para dar uma notícia.

Assis (2009, p. 13) aponta para o perigo da massificação das mídias sociais. “As pessoas passam a exigir tratamento equivalente dos jornalistas, querem contribuir,criticar, recombinar reportagens e redistribuí-las”. Tudo isso em blogs, Twitter, Orkut,Youtube, Flickr e outras redes. Para o autor, em breve as mídias sociais guiarão a

atuação de toda a mídia e não se fará distinção entre as duas. Assis (2009) ressalta que,atualmente, os meios de comunicação já não sobrevivem sem a interferência doespectador.

A mídia social permite a todos consumir, distribuir e manipular notícias à deriva. Alémdisso, a periodicidade da imprensa está diretamente atrelada aos interesses do público.Se há grande repercussão de um assunto em redes sociais, o jornalista terá,

automaticamente, que dar atenção maior a essa pauta. Além disso, cabe ao repórter “competir” sistematicamente com os usuários das mídias sociais.

Obviamente, há um abismo entre uma frase de um usuário do Twitter e uma páginainteira de cobertura de uma situação em um jornal, salienta Assis (2009). O autor alerta, porém, para o fato de que o leitor é quem decide, na era da internet, quando deve ser informado. A ele não interessa se o jornal só será entregue no dia seguinte, se não estána hora do telejornal ou se está passando futebol no rádio. “Para ele, a mídia é um bancode dados pronto a atendê-lo”, resume Assis (2009, p.20).

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Por outro lado, esses “devoradores da notícia” podem contribuir para os jornalistas seinformarem melhor a respeito de um assunto. Para Assis (2009), a colaboração é umadas principais características das mídias sociais. A lógica é simples. Quanto mais gentese comunica a respeito de um assunto, mais bem informados todos estarão.

É o que acontece recorrentemente nos noticiários esportivos. Especulações emcomunidades de clubes de futebol no Orkut acabam despertando o faro dos repórteres.Se um internauta compartilha com os colegas que viu um jogador estrangeiro e seuempresário jantando em um restaurante da cidade com o presidente do clube, o jornalista não titubeia em apurar a informação de alguma maneira.

As infinitas possibilidades das mídias sociais trazem ainda mais uma dor de cabeça aos jornalistas. Se a partir de agora qualquer pessoa tem condições de fazer o que antessomente o repórter podia, o espaço do profissional está ficando cada vez mais estreito. EAssis (2009) ratifica isso com dados de uma pesquisa realizada nos Estados Unidos em junho de 2008. Somente na última semana do mês, mil jornalistas perderam o emprego,especialmente em jornais de papel.

No Brasil, porém, a realidade é diferente. Pelo menos por enquanto. De acordo comdados da reportagemO futuro dos jornais, publicada na Folha de S. Paulo de 8 de junhode 2008, a publicidade em jornais brasileiros aumentou 24%. “Esse vigor mostra ointeresse e a confiança de leitores e anunciantes nos diários impressos e coloca emxeque previsões pessimistas”, analisa a matéria. Entretanto, a própria AssociaçãoBrasileira de Jornais publica o aumento representativo do número de leitores on-line.

Saltou de 4.238.000 em 2005, para 12.782.000, em 20099.

A reportagem explica que a televisão ainda reina absoluta como maior fonte de receitade empresas de jornalismo no Brasil. A fatia dos jornais impressos no bolo publicitáriofoi de 19,4% em março de 2008, contra apenas 3,2% da internet.

9

Pesquisa IBOPE Nielsen On Line, disponível emhttp://www.anj.org.br/a-industria-jornalistica/jornais-no-brasil/leitura-online-dos-jornais. Acesso em 18 de março de 2010.

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Fato é que, se o jornalismo evoluiu e foi reinventado ao longo dos séculos, nos últimos30 anos isso ocorreu com mais intensidade do que nos séculos anteriores inteiros. Assis(2009), porém, destaca que a saída para o dilema está na própria internet. O veículo permite ao jornalista ter um volume de informações jamais coletado na história do jornalismo. Em resumo, a função do repórter continua sendo a de apurar com detalhes anotícia de interesse do público, formatá-la de forma atrativa e distribuí-la – inclusive para o mesmo público que o ajudou a construí-la através das mídias sociais. Sob essaégide, pode-se concluir que a atividade jornalística nunca vai desaparecer.

O perigo, entretanto, está em ver o crescimento das mídias sociais como algo distantealheio ao jornalismo. Keen (2009) alerta para o fato de que “hoje em dia, as criançasnão sabem distinguir entre notícias críveis escritas por jornalistas profissionais objetivose o que leem em joeshmoe.blogspot.com” (KEEN, 2009, p. 9). Se do ponto de vista dasimples informação as mídias sociais formam uma miríade de notícias úteis a repórteres,da perspectiva profissional elas podem colocar em xeque a credibilidade da atividade jornalística e destruir seus valores.

No Brasil, essa possibilidade é ainda mais perigosa em se tratando de jornalismo

esportivo. As mídias sociais invadiram o cotidiano dos apaixonados por esporte,especialmente futebol, e, cada dia mais, competem com os veículos de imprensa.Atualmente, o dirigente do clube informa o torcedor por meio do seu próprio Twitter eos leitores procuram informações sobre seu clube do coração através de comunidades doOrkut. Por outro lado, o crescimento das mídias sociais no meio esportivo tem tambémaumentado a popularidade dos portais de jornalismo sobre o assunto. Pior para os jornais impressos, que perdem em velocidade de informação e precisam se reinventar

para conseguir chamar a atenção do fã de esportes.

Pode-se afirmar, portanto, que, se o jornalismo on-line tem surgido como uma áreaidiossincrática da comunicação, seu estudo torna-se ainda mais complexo em setratando da editoria de esportes. Segundo Coelho (2003), o primeiro motivo estáatrelado ao fato de que o jornalismo esportivo é uma área peculiar do jornalismo, tida por muitos como uma editoria “menor” em relação às demais, por ser mais popular, e

que conta com um corpo de profissionais diferenciados, no sentido de serem“apaixonados” com os assuntos com que lidam diariamente.

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Outro motivo é o grande número de acessos que os sites esportivos recebem diariamenteem relação aos portais de notícias gerais. No caso das mídias sociais, o fato também éevidente em discussões calorosas no Orkut em comunidades sobre futebol com centenasde milhares de adeptos.

Isso se deve, principalmente, ao fato de o público do jornalismo esportivo ser igualmente apaixonado por futebol, no caso do Brasil. Jovens que muitas vezes não seinteressam pelo noticiário de outras editorias devoram sites em busca das notícias atuaise instantâneas do seu clube do coração (COELHO, 2003). Diante dessa situação, é plausível o alto número de acessos aos portais esportivos e às mídias sociais, pois, paraesse público, a internet transmite a imagem de um meio de comunicação democrático erápido, que sacia perfeitamente a fome de informação do fã de esporte. Eis a discussãoda próxima unidade deste estudo.

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Os profissionais que trabalham para uma única editoria nãonecessariamente são especializados nos assuntos que cobrem. [...]Em jornalismo, especialidade deveria significar “compreensãoaguda de questões-chave relativas a macrotemas do conhecimentohumano, entendidos em sentido amplo”.(VILAS BOAS, 2005, p.7).

Vilas Boas (2005) alerta para o fato de que o jornalismo esportivo, por sua granderelevância para a formação cultural do brasileiro, deveria ser tratado mais como umagrande especialidade jornalística do que como somente uma função a mais dentro deuma repartição nas redações. Isso porque o esporte consegue representar, atualmente, nasociedade, comportamento, ciência, história, política, saúde, tecnologia e economia(VILAS BOAS, 2005, p. 8).

O esporte é talvez o mais democrático dos temas. Atrai pessoas detodas as idades, de todas as camadas sociais, de todos os cantos.Tornou-se um fenômeno lucrativo considerável, negócio de proporções mundiais, motivo para tendências e modismos (VILASBOAS, 2005, p. 9).

A discussão sobre o lugar do jornalismo esportivo é apenas um dos dilemas dos debatessobre jornalismo especializado. A função do profissional do esporte vai além dessaquerela. Passa pela história do futebol no Brasil, pelo crescimento dos esportesespecializados e seu espaço na mídia e, principalmente, pela formação desse profissional que, curiosamente, quase não recebe formação específica na faculdadesobre seu objeto de trabalho, mas mesmo assim é cobrado pela população e peloscompanheiros de profissão como um especialista no assunto.

2.2 História do jornalismo esportivo no Brasil

Se na segunda década do século XXI ainda discute-se o lugar do jornalismo esportivono Brasil, no início do século passado a sociedade sequer tinha a remota ideia de queessa discussão poderia existir algum dia. Naquela época, os esportes ainda tinham

pouco apelo popular – talvez justamente pela falta de visibilidade na imprensa – esofreram muito preconceito até se firmarem como uma editoria fixa nos jornais do país.

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Nos primeiros anos de cobertura esportiva no Brasil, no início do século XX, poucas pessoas acreditavam que o futebol fosse assunto para estampar manchetes. Imaginava-se que até mesmo o remo, o esporte mais popular do país na época, jamais ocuparia as primeiras páginas de jornal (COELHO, 2003). O jornal paulistano Fanfulla,que atingia prioritariamente os habitantes italianos de São Paulo, foi o primeiro a trazer relatos de página inteira em tempos em que o futebol ainda não cativava multidões. Não existia oque se chama hoje de jornalismo esportivo.

No Rio de Janeiro, então capital do Brasil, os jornais começavam a dedicar mais espaçoao futebol em suas páginas no início do século. O Flamengo só iniciou suas atividadesno esporte praticado com os pés em 1911, embora o clube tenha sido fundado para a prática do Remo 16 anos antes. Em 1923, o Vasco da Gama venceu a Segunda DivisãoEstadual apostando na presença dos negros em seus quadros. Essa foi a popularizaçãoque faltava para o futebol ganhar cada vez mais espaço no interesse do povo e,consequentemente, nas páginas dos jornais. Tanto que, nos anos 1930, nasceu no Rio deJaneiro o primeiro diário exclusivamente dedicado aos esportes no país: o Jornal dosSports(COELHO, 2003).

Em Minas Gerais, mesmo no fim dos anos 1920, o noticiário esportivo ainda ocupavatimidamente as páginas dos jornais. O Diário de Minaspublicava, quando muito, pequenas e escondidas notas, no interior do jornal, sobre os principais eventos econquistas (PEREIRA, 1998). Prova maior do caráter amador do esporte e da coberturada imprensa na época é o caso do título mineiro de 1926, conquistado pelo Cruzeiro.Por falta de provas e documentos históricos, a conquista só foi reconhecida 72 anos

depois, em 1998, quando foram encontradas edições dos extintos Diário de MinaseCorreio Mineiroque documentavam oficialmente em pequenas notas a glória do clube,que na época ainda se chamava Palestra Itália.

“A Assossiação Mineira de Esportes Terrestres, em bôa hora fundadanesta capital, terminou ante-hontem o seu primeiro campeonato.Conquistou o título de campeão de 1926 a forte esquadra daSociedade Esportiva Palestra Itália, que não se descuidou um sómomento do preparo das suas esquadras, possuindo um ‘team’

homogêneo, forte e adestrado, contando com bons elementos, taiscomo: Nino, Porfírio, Rizzo, Armandinho e outros”. (“O Palestra

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vencendo o Grêmio conquista brilhantemente o campeonato de1926”. Jornal Diário de Minas, 11 de janeiro de 1927, seção “DeEsporte”).

Em reportagem publicada pela revista oficial do Cruzeiro Esporte Clube na edição demarço de 1998, o jornalista e historiador Carlos Henrique Pereira, contratado peloCruzeiro para pesquisar referências sobre o clube em jornais antigos, salienta a falta dereportagens e documentos históricos sobre o esporte mineiro, em geral, nas primeirasdécadas do século passado (PEREIRA, 1998, p. 14).

Em âmbito nacional, foi no fim dos anos 1940 e início dos anos 1950 que o futebol

ganhou, de vez, força na imprensa e impacto na população. As crônicas de NelsonRodrigues e Mário Filho sobre o esporte ajudaram a construir o imaginário coletivo deamor pelo futebol. No fim da década de 1960, os grandes cadernos de esportes tomaramconta dos jornais. A essa altura, a paixão pelo futebol no Brasil já era mais quesuficiente para garantir emprego aos então jornalistas esportivos, afirma Coelho (2003).

Em 1970, foi criada a Revista Placar, que até hoje circula pelas bancas do país. Em

1998, o diário Lance foi inaugurado e hoje é o único jornal esportivo em âmbitonacional ainda em circulação. (COELHO, 2003, p. 105).

Atualmente, o esporte, principalmente o futebol, faz parte da vida do brasileiro. Oscadernos esportivos dos maiores jornais do país trazem informações detalhadas sobre arotina dos clubes, programas de rádio e TV exclusivos sobre futebol são sucesso deaudiência e, da última década para cá, portais esportivos recebem centenas de milhares

de acessos diariamente.

2.3 A construção do futebol no imaginário popular através da mídia

Se o futebol consegue ocupar, atualmente, lugar de destaque na imprensa brasileira, boa parte desse feito deve ser creditado a Nelson Rodrigues. O escritor ajudou a construir,

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com suas crônicas esportivas, o imaginário popular de paixão do brasileiro por esseesporte.

Foi, porém, o antropólogo e escritor Gilberto Freyre quem atrelou pela primeira vez ascaracterísticas da escola brasileira de futebol aos traços sociais da nossa sociedade,começando a formar, através da mídia, uma relação de intimidade do brasileiro com oesporte (BARRETO, 2006, p. 32). Em 17 de julho de 1938, o escritor publicou umartigo no Diário de Pernambuco, intitulado “Foot-ball mulato”.

O nosso estilo parece contrastar com o dos europeus por um conjuntode qualidades de surpresa, de manha, de astúcia, de ligeireza e aomesmo tempo de espontaneidade individual. Os nosso passes, os nossos pitus, os nossos despistamentos, os nossos floreios com a bola, háalguma coisa de dança ou capoeiragem que marca o estilo brasileiro de jogar futebol, que arredenda e adoça o jogo inventado pelos ingleses.(FREIRE, 1938, citado por BARRETO, 2006, p. 33).

O pontapé inicial dado por Gilberto Freire foi alavancado por Nelson Rodrigues, principalmente em suas crônicas para a Revista Manchete. Segundo Vogel (2009), ocronista fez do futebol um formador de identidade do brasileiro, transformando as partidas em espetáculos, por meio das crônicas, fazendo a sociedade identificar-se comaquelas dramatizações e mobilizar-se para frequentar ainda mais os estádios.

Em sua narrativa sobre o jogo, Nelson re-elabora a relação deempatia existente entre o futebol e o imaginário coletivo,relacionando intimamente o esporte com a formação de umaidentidade, individual, coletiva e até mesmo nacional, quando o timeem jogo é a seleção do país. Ou seja, Nelson inscreve em suascrônicas esportivas o drama do indivíduo diante de si mesmo e diantedos outros, estilizando o futebol como agente simbólico, formador deidentidade (VOGEL, 2009, p. 21).

Para Da Matta, (1993, p. 17), Nelson Rodrigues enxergou o verdadeiro papel que ofutebol desempenha para a definição da idéia de “ser brasileiro”, pois seria o esporte pelo qual teríamos conseguido, no Brasil, “somar Estado Nacional e Sociedade”. DaMatta (1993) explica que, nas crônicas esportivas, Nelson Rodrigues sintetiza a noçãoda alma brasileira representada no futebol. Seus textos são palcos de tensões estéticas,

históricas e sociais.

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Segundo Vogel (2007), Nelson Rodrigues começou a trabalhar no jornalismo nos anos1930, e, nas décadas que se seguiram, chegou a escrever sobre futebol, mas foi narevistaManchete Esportiva, em 1955, que se consolidou como cronista esportivo. Maisque ajudar a construir o imaginário brasileiro de paixão pelo esporte, o escritor conseguiu atrelar o futebol, então tido como um assunto essencialmente pobre para asletras, ao universo da literatura e do jornalismo.

Nelson exercita um estilo ágil e oralizado, em que descrições de cena,associações de imagens, figuras de linguagem e mesmo a ênfase dasrepetições permitem entrever uma maneira sofisticada de perceber ofutebol e de escrever crônicas. (VOGEL, 2007, p. 148).

Quem, no entanto, percebeu que o futebol poderia ser filão para temas jornalísticos foi oirmão de Nelson Rodrigues, Mário Filho. Foi ele quem idealizou a revistaManchete Esportivae chamou os irmãos Augusto, Paulo e Nelson para participar da publicação.(VOGEL, 2007, p. 149)

Augusto Rodrigues (citado por Vogel, 2007, p. 149) explica que a ideia, na época, era

fazer uma revista moderna sobre esportes.

O esporte era um assunto desprezado pelos jornais. Foi Mário Filhoquem viu [...] a importância social do esporte. Ele achava que o jornalista não devia apenas reportar a realidade, devia também criar arealidade.

Já em 1957, o futebol era o assunto que prevalecia emManchete Esportiva, segundo

Augusto Rodrigues (citado por Vogel, 2007, p. 151) “porque era o esporte que maistinha público. Era o esporte nacional. Eram as vitórias brasileiras no futebol queestimulavam o orgulho nacional”.

De lá para cá, a paixão do brasileiro pelo futebol foi crescendo na mesma proporção quea imprensa esportiva deu ares de tragédia às derrotas e de supervalorização às vitórias,até cravar, de vez, o apelido “país do futebol” para se referir ao Brasil.

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A sociedade incutiu a alcunha e, atualmente, a indústria do futebol move milhões emdinheiro e milhões em torcedores apaixonados pelo país. Tanto que o músico ChicoBuarque de Hollanda, às vésperas da final da Copa do Mundo de 1998, poetizou asituação em uma crônica, ironizando a circunstância de que o Brasil só é respeitado nomundo quando o assunto é futebol.

Segunda feira, seja quem for o campeão do mundo, as mulheresacordarão meio enjoadas. Terça-feira, nos bares, os franceses dirão“uff” e “bof”. E o Brasil? Na quarta-feira, querida, o Brasildesaparecerá do mapa-múndi, e durante quatro anos quedarásubmerso, para ressurgir glorioso na Copa do Japão. Não é um paíssério, teria dito o general francês. Houve desmentidos, houveindignação, não sei por que. O Brasil talvez seja isso mesmo, um paísque impõe respeito, quando brinca. (HOLLANDA, Chico Buarquede.O Globo, 12/07/1998).

Por todo imaginário cultural de paixão pelo futebol do brasileiro, o jornalista esportivocarrega sobre os ombros a responsabilidade de atender à demanda de informação do seu público sedento por notícias, sem perder a qualidade do conteúdo e sem ser tendenciosoa algum clube. Por conta disso, o profissional do esporte acaba tendo um perfil peculiar

em relação aos repórteres de outras editorias. Não obstante dever ser imparcial, ele precisa, também, ser um apaixonado pelos assuntos com que lida diariamente.

2.4 O perfil do profissional do esporte

Apesar da expansão do esporte dentro das redações de jornais na segunda metade doséculo passado, atualmente o mercado do jornalismo esportivo é analisado por Coelho(2003) como uma carreira difícil, por causa da pequena quantidade de vagas nasredações e grande demanda de profissionais.

Em 2000, sites dos mais variados assuntos surgiram e tiraram gente dos jornais maisimportantes do país, abrindo vaga para jornalistas recém-formados. Profissionaisqualificados e com anos de experiência no mercado de trabalho começaram a migrar

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para o universo on-line. Em 2001, porém, a situação já era outra, pois vários sitesestavam anunciando falência, relata Coelho (2003).

Sobre o perfil do profissional do esporte, Coelho (2003) acredita que o bom jornalistaesportivo começa a sua formação muitos anos antes de ingressar na faculdade. Osconhecimentos adquiridos na infância e adolescência, como apaixonado por esporte, éque fazem o diferencial do bom repórter esportivo. Engana-se, porém, quem pensa quesomente a paixão é o suficiente para construir um bom profissional.

No Brasil, jornalismo esportivo é quase sinônimo de futebol. Por isso, Coelho (2003)salienta que aquele jornalista que quer ingressar na editoria de esportes pensando emespecificar-se em alguma modalidade especializada terá extrema dificuldade para obter sucesso.

Ai de quem tiver loucura por outro esporte. Quem for louco por vôlei, por basquete, quem tiver paixão por tênis e sonhar ser especialista noesporte de que gosta. Não, tal possibilidade não está excluída. Mas,se já dá trabalho conquistar reconhecimento na profissão trabalhandocom futebol, é muito mais feroz a luta para chegar ao topo com outroesporte. (COELHO, 2003, p. 36).

Para Coelho (2003), a falta de espaço para esportes especializados explica, em partes, oaparecimento de atletas e ex-atletas como comentaristas em TVs e rádios sempre que é preciso aprofundar-se em grande competição, seja ela de natação, vôlei, tênis ouqualquer outra modalidade.

Barbeiro e Rangel (2006) salientam que o jornalista esportivo, em qualquer modalidadede esporte, inclusive o futebol, sempre tem um objeto a mais para estudar antes decomeçar a cobrir determinado evento: o regulamento daquela competição sobre a qualele escreverá. “Estudar as regras do esporte que cobre e manter-se sempre atualizadocom os outros esportes é rotina para um bom repórter” (BARBEIRO e RANGEL, 2006, p.21).

Por conta disso, toda redação deve ter um glossário com nomes técnicos, históricos eregras das diversas modalidades esportivas. Para Barbeiro e Rangel (2006), é preciso ter

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também uma pequena biblioteca de papel ou virtual para consulta, além do tradicionaldicionário de português.

Desde o século passado, quando o esporte passou a fazer parte da rotina do brasileiro,existe a preocupação com o aprimoramento do conhecimento dos profissionais da área.Erbolato (1981) salienta que o jornalista esportivo deve ter sempre atualizadas todas asclassificações obtidas por clubes em diversos campeonatos, ligeira biografia de cadaatleta em evidência, além de marcas e recordes que o jogador atingiu. Se o profissionalnão tiver esses dados sempre acessíveis, pode acabar perdendo credibilidade perante oleitor fanático que tem decorado todos esses números na memória.

É a paixão pelo futebol, portanto, que faz com que o bom jornalista esportivo tenha umdiferencial em relação aos jornalistas das demais editorias. Um diferencial saudável,reforça Coelho (2003). Essa paixão, no entanto, coloca o repórter na berlinda quando oassunto é a imparcialidade.

2.5 O dilema da imparcialidade

Por produzir noticiário destinado a um público completamente apaixonado por aqueleassunto, o setorista do esporte deve ter alguns cuidados com relação a seu texto. Oconteúdo deve chamar a atenção do torcedor dos ‘dois lados’ (de diferentes clubes), massem ser tendencioso a nenhum deles. Tarefa difícil para o jornalista esportivo, quetambém é um apaixonado pelo esporte e pode às vezes dissimular, em seu trabalho,

certo favorecimento ao seu clube de coração.

Souza e Mota (2009) chamam a atenção para o fato de que esse dilema acaba trazendoao jornalismo esportivo textos previsíveis e padronizados, por temer interpretaçõesequivocadas do público sobre uma possível parcialidade.

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O jornalismo esportivo, especialmente no futebol, promove umexercício diário de confrontação do factual objetivo e da opiniãosubjetiva. De certa forma, o leitor-torcedor espera algo mais que asimples resenha de um jogo, mas também não suporta, limitado por sua paixão clubística, uma adjetivação mais ousada ou incomum. Este tipode situação no meio sempre gera alusões de que o jornalista escreveuisso porque torce pelo rival, ou porque tem implicância com aqueletime. (SOUZA e MOTA, 2009, p. 8).

Para Souza e Mota (2009), o esporte é a editoria mais propensa e esse tipo de situação,dentro do jornalismo. O torcedor quer sempre saber para que time o repórter torce, eeste, por sua vez, tenta esconder sua paixão, como se a dúvida do leitor fosse prova de bom jornalismo esportivo.

Coelho (2003), porém, salienta que nem sempre é necessário esconder o time decoração para fazer um bom trabalho jornalístico no esporte. O faro de reportagem, o bom enfoque dos temas, a isenção no tratamento das matérias, o bom senso nasinvestigações e o conhecimento enciclopédico sobre o esporte é que fazem a diferençano produto final.

Apesar disso, salienta Coelho (2003), é desejável que o repórter se exponha pouco comrelação às suas preferências, para que seu trabalho não seja constantemente posto emxeque pelo público por causa de sua afeição por determinado clube.

Diante desse dilema, curiosamente, a regra geral que se adota atualmente nas redações enos manuais de jornalismo esportivo é a do texto objetivo, ainda que previsível e pobreesteticamente. Aquele texto poético que ajudou a construir a paixão do brasileiro pelo

futebol e dava caráter mitológico ao esporte está praticamente extinto dos jornais. “Aemoção deve passar por meio da atmosfera narrativa sem apelar para adjetivosromânticos” (BARBEIRO e RANGEL, 2006, p. 52).

No caso do jornalismo on-line, a escrita deve ser ainda mais objetiva, para chamar aatenção do público e informar de maneira prática e dinâmica. Essa é apenas uma particularidade da web na editoria de esportes, setor que cresce a cada dia e cria, aos

poucos, seus próprios paradigmas.

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2.6 O jornalismo esportivo nas mídias contemporâneas

A reinvenção das maneiras de fazer jornalismo após o surgimento da internet passamtambém pelo jornalismo esportivo. Se os debates e especulações a respeito do possívelfim do jornal impresso invadem as mesas de discussões acadêmicas e preocupam asgrandes empresas jornalísticas, na editoria de esportes essa preocupação pode ser considerada ainda maior.

Isso porque, segundo Coelho (2003), o público-alvo do jornalismo esportivo édiferenciado por “devorar” o noticiário, diariamente, em busca de informaçõesinstantâneas sobre o clube de coração.

Para Coelho (2003), esse é um dos motivos do enorme número de acessos dos portaisesportivos no país. Com oboomdos sites esportivos, nos anos 1990 e início dos anos2000, o mercado do esporte on-line é cada dia maior. Torcedores sedentos deinformações instantâneas de seus clubes acessam diariamente as páginas esportivas na

web. Problemas para os jornais impressos, que acabam estampando, posteriormente,manchetes que já foram divulgadas pelos sites, “[...] informações que sempre causam ao jornal do dia seguinte o sabor de pão amanhecido” (COELHO, 2003, p. 62).

Se o público do esporte exige um banco de dados pronto a atendê-lo a qualquer momento e a noticiar em tempo real tudo que ocorre no Centro de Treinamento doclube, nenhum veículo oferece melhores condições para suprir tais exigências como a

internet (COELHO, 2003).

Uma pesquisa feita pelo Ibope em outubro de 2008 apontou que 44% dos internautasresidenciais ativos no Brasil (cerca de 25 milhões à época) navegaram em sitesesportivos durante o mês de agosto daquele ano. A editoria de esportes registrou, nessa pesquisa, o maior crescimento de acessos em números absolutos, ao ganhar 1,9 milhãode novos usuários em um mês10.

10 Disponível em: http://e-educador.com.br/index.php/mundo-high-tech-mainmenu-99/3044-internet06

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A principal particularidade do webjornalismo esportivo atualmente é a superproduçãode notas informativas. Coelho (2003) explica que às vezes a mesma notícia, divulgadaem uma única reportagem no jornal impresso, é dividida em oito notas nos sites. Issocomeçou no ano 2000, quando a quantidade de notícias era usada como diferencial dos portais esportivos para passar aos investidores a sensação de que eles estavam à frentedo concorrente.

Ainda hoje o volume de notícias é utilizado como critério de bom jornalismo nos sitesde esporte brasileiros, talvez pela necessidade de atender à demanda de público sedento por informação. Outra possibilidade é a simples adequação à dinâmica da internet:agilidade e textos curtos, como mandam os principais manuais de redação dewebjornalismo.

Coelho (2003), porém, acredita que há um perigo nesse pensamento, o de se valorizar mais a velocidade do que a informação checada criteriosamente antes de ser publicada.Se por um lado essa ideia coloca em xeque a credibilidade das notícias veiculadas emtempo real nos sites, por outro pressiona ainda mais os jornais impressos a publicarem

reportagens sem erros.

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3 ANÁLISE DO CONTEÚDO ESPORTIVO ON-LINE E IMPRESSO

3.1 Metodologia

Esta pesquisa discute as principais diferenças da notícia esportiva no jornal impresso ena internet. Foram analisados alguns aspectos que interferem no tratamento donoticiário nos dois veículos, tais como as rotinas de produção de cada um e as possibilidades de veiculação (espaço, suportes e hipermídia, no caso da internet). Nocampo da análise do discurso, observamos as estratégias comunicativas e as atrelamosaos conceitos de credibilidade, legitimidade e público-alvo. Dessa forma, foi possívelelucidar algumas diferenças cruciais entre o jornalismo esportivo na web e no jornalimpresso e entender as principais diferenças de conteúdo e linguagem.

O material empírico utilizado para a nossa análise foram as notícias esportivas de doisveículos de comunicação pertencentes ao mesmo grupo: o jornal Estado de Minas e o portal Superesportes. Elas foram separadas de acordo com coberturas específicas,detalhadas abaixo, escolhidas por se tratarem de dois filões jornalísticos da área: ofutebol, esporte que mais movimenta a sociedade no Brasil, e o vôlei, esporteespecializado mais popular do país. Esse conteúdo foi coletado durante o período deoutubro de 2009 a abril de 2010 e separado por situações. O espaço de coleta é longo, pois só assim foi possível analisar a cobertura dos clubes de futebol no CampeonatoBrasileiro, no fim de 2009, e nos torneios disputados no primeiro semestre: CampeonatoMineiro, Copa Libertadores e Copa do Brasil 2010.

A primeira situação trabalhada foi analisar o dia seguinte a um jogo de futebol de umdos clubes da capital. Nesse caso, foi estudada a repercussão de um jogo do Cruzeiro noCampeonato Brasileiro de 2009, contra o Avaí, em Santa Catarina, tanto no jornalimpresso do dia seguinte, quanto na internet (no dia do jogo e no dia seguinte).

Outra situação foi observar a cobertura dos principais clubes de Minas quando há partida somente de um deles. Nesse caso, foi analisado o dia da final do Campeonato

Mineiro de 2010, entre Atlético e Ipatinga, quando o Cruzeiro ficou apenas treinando,

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sem compromisso de jogos. Estudamos como ficou o espaço do Cruzeiro no jornalimpresso e como foi feita a cobertura no portal de internet.

Por fim, foi analisado o espaço dedicado aos esportes especializados nos dois veículos. Nesse caso, foi importante perceber, através das técnicas já citadas, se o Estado deMinas ou o Superesportes deu mais ênfase aos especializados e entender o motivo disso.

3.2 Apresentação do objeto

Escolhemos como objeto de pesquisa os dois principais veículos de informaçãoesportiva de Minas Gerais, em suas respectivas áreas: o Estado de Minas, no jornalismoimpresso, e o Superesportes, no jornalismo on-line. A escolha se justifica por seremmídias pertencentes ao mesmo grupo de comunicação, os Diários Associados. Dessaforma, isentos de distinções editoriais entre os dois veículos, foi possívelcompreendermos melhor as diferenças de uma cobertura esportiva no jornalismo on-linee no impresso. O fato de serem os dois veículos mais tradicionais em Minas Gerais, em

seus segmentos, na editoria de esporte, também pesou na escolha do objeto.

3.2.1 Portal Uai - Superesportes

O Superesportes é o site de esportes do Portal Uai. O portal publica as notícias do jornalEstado de Minas desde 1996 e conta ainda com produção de conteúdo próprio, emtempo real, do que acontece em Minas Gerais e no mundo. As notícias nacionais einternacionais são geradas no site através de agências. Já a cobertura local é feita pelos próprios jornalistas do Uai. O mesmo acontece com o Superesportes. O site é referêncianacional em assuntos de futebol em Minas Gerais.

O Superesportes foi ao ar pela primeira vez quatro anos depois do Portal Uai, em 14 desetembro de 2000. Desde então, tornou-se o líder do segmento em Minas Gerais, por

não ter concorrentes diretos no estado – os demais portais esportivos que já existiam

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nessa época eram nacionais e faziam uma cobertura muito tímida dos clubes mineiros. Na ocasião, o site tinha uma diagramação simples, mas já destacava em seubox principal somente as notícias de Atlético e Cruzeiro, como é possível observar na Figura1. Toda a manutenção do portal era feita por três jornalistas.

Figura 1: Layout do Superesportes de 2000 a 2004

Em 2004, o Superesportes sofreu sua primeira mudança. Olayout foi modificado,deixando o site mais moderno e com uma miríade maior de informações na capa, comomostra a Figura 2. A essa altura, o portal já contava com estagiários em seu quadro e

mais jornalistas, para a cobertura eficaz dos clubes de Belo Horizonte.

De 2004 a 2010, o Superesportes manteve seulayout.Já em 2008, alguns internautasreclamavam do design do portal, alegando estar ultrapassado. Apesar disso, o sitemanteve a liderança do segmento em Belo Horizonte, alcançando quase 1 milhão deacessos por dia em momentos de pico – como a semana da final da Libertadores de2009, com o Cruzeiro.

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Figura 2: Layout do Superesportes de 2004 a 2010

Em maio de 2010, o Superesportes sofreu sua maior reformulação em dez anos. Osucesso do portal em Minas Gerais fez a empresa estender o site ao estado dePernambuco e ao Distrito Federal, locais onde também há grande atuação dos DiáriosAssociados.

O portal ganhou mais capas (gerando mais trabalho para os jornalistas) e cara nova.Ficou mais moderno e passou a utilizar ferramentas menos ultrapassadas. As galerias defotos ficaram mais dinâmicas e cada clube ganhou uma capa própria, com o objetivo desaciar o desejo de informação do torcedor específico daquele time.

“Se antes a gente tinha como responsabilidade do esporte a atualização de um box nacapa do Uai e a própria capa do Superesportes, a partir de agora nós temos várias capas.Temos a capa do Uai para atualizar, a capa do Superesportes Minas Gerais, a capa doSuperesportes nacional, que em breve será remodelada novamente, e temos as capas dosclubes. Como é um elevado número de chamadas, todas com fotos de tamanhosdistintos, isso realmente toma um tempo maior. Ao mesmo tempo que a gente tenta

priorizar Cruzeiro e Atlético, que é o conteúdo maciço do site, a gente tem um cuidado

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com a atualização das capas, para que as chamadas não fiquem velhas”11, explica o jornalista Bruno Furtado, repórter do Superesportes desde a sua criação, em 2000.

No site novo, o repórter, após publicar a matéria, tem que trabalhar fotos para destacar anotícia na capa do próprio clube, na capa de Minas Gerais do Superesportes (poisDistrito Federal e Pernambuco também possuem capas próprias), na capa Nacional eainda na capa do Portal Uai. Por conta do aumento do trabalho, foram contratados doisnovos jornalistas e mais dois estagiários (somando quatro aprendizes, no total) e o portal passou a ter Rodrigo Gini como editor geral.

Os três últimos meses do Superesportes com o layout antigo registraram uma média de15 a 16 milhões de acessos por mês. Vale ressaltar que os meses de fevereiro, março eabril são considerados frios, para efeito de audiência, por não ter finais de campeonatosnem janela de transferência de atletas para a Europa. Com o novo site, lançado nasemana do título estadual do Atlético e das fases decisivas da Copa do Brasil e daLibertadores, estima-se que a audiência suba para pelo menos 20 milhões de acesso nomês.

3.2.2 Jornal Estado de Minas

O jornal Estado de Minas foi fundado em 7 de março de 1928 e é o mais antigo jornalimpresso de Belo Horizonte em circulação. A editoria de esportes do jornal éigualmente tradicional, comandada atualmente pelo editor Cláudio Arreguy. O principal

setorista do Cruzeiro é o jornalista Antônio Melane, enquanto o repórter do Atlético éPaulo Galvão.

Os demais jornalistas revezam (cinco repórteres e três subeditores, no total) na produçãode outros conteúdos, que são tratados como secundários pela linha editorial do jornal,tais como os esportes especializados e a cobertura de outros clubes de futebol de MinasGerais e do Brasil.11

FURTADO, Bruno: depoimento [maio 2010]. Entrevistador: Gilmar Laignier Junior. Entrevistaconcedida para elaboração de Monografia de conclusão de curso do Uni-BH.

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Atualmente, o Estado de Minas conta com uma tiragem de cerca de 95 mil exemplaresaos fins de semana. Desses, cerca de 80 mil são assinantes. Em dias de semana, a vendaavulsa em bancas de jornais é muito pequena, com exceção das quintas-feiras, quandohá triunfo de algum time grande da capital em algum campeonato importante de futebolna noite anterior. O mesmo ocorre às sextas-feiras, quando o jogo decisivo aconteceu naquinta.

O caderno de esportes surgiu com espaço fixo diário no jornal em 2003. Antes disso, eralançado somente em alguns dias da semana. Em abril de 2010, o caderno ganhou umnovo selo em sua capa, passando a chamar-se “Superesportes”, em vez de somente“Esportes”. A medida tenta fazer o jornal dialogar com o portal da internet, de mesmonome. As rotinas de produção, porém, são completamente distintas. A grande uniãoficou por conta somente da exploração da marca “Superesportes”. A ideia surgiu comoforma de fortalecimento do produto da internet, que seria remodelado semanas maistarde, ganhando novo layout e ficando mais moderno.

Nem mesmo as redações dos dois veículos ocupam o mesmo espaço físico. Os jornalistas do caderno de esportes do Estado de Minas trabalham no prédio da empresa

situado à Avenida Getúlio Vargas, no Bairro Funcionários, em Belo Horizonte. Já osrepórteres do portal Superesportes têm redação fixa em outro prédio dos Associados, naAvenida Assis Chateaubriant, no bairro Floresta.

3.2.3 Rotinas do Superesportes e do Estado de Minas

Curiosamente, a prática do ‘jornalista sentado’, apontada como a mais adotada no jornalismo on-line, nem sempre é utilizada na rotina do Superesportes. O termo, criado por Neveu12 (2001, citado por PEREIRA, 2004), exemplifica “[...] um jornalismo maisorientado ao tratamento (formatação dos textos de outros jornalistas, gênero editorial oucomentário) de uma informação que não é coletada pelo próprio jornalista”.13

12 Néveu, Erik. Sociologie du Journalisme. Paris: La Découverte, 200113 No original: “[ . . . ] une journalisme plus orienté vers le traitment (mise en forme des texts d’autrui,genre éditorial ou commentaire) d’une information qu’il n’a pas collecté lui-même”.

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Para Pereira (2004), esse modelo seria adotado pela maioria das redações de internet por questão de logística, pois é a maneira mais fácil de alimentar um portal com númeroreduzido de profissionais.

No Superesportes, entretanto, os repórteres vão a campo para acompanhar os treinos deAtlético e Cruzeiro em seus respectivos centros de treinamentos. Diariamente, umrepórter desloca-se para a Cidade do Galo e outro para a Toca da Raposa II. De lá, passam informações por telefone para o setorista do clube que ficou na redação. Dessaforma, as informações são publicadas praticamente em tempo real.

O repórter que fica no centro de treinamento às vezes leva um lap top da empresa paraescrever outras notas (além das passadas para a redação). Ele também conta com umafilmadora para web, para gravar as entrevistas coletivas e publicar no site. As fotos do portal são feitas pelos mesmos fotógrafos do jornal Estado de Minas. Até areformulação do site, este ano, o Superesportes contava apenas com um lap top paracampo e uma câmera filmadora. Com a nova equipe, chegaram novos equipamentos,totalizando três “kits multimídia” para os repórteres, com lap top, câmeras filmadoras e

máquinas fotográficas digitais.

Em dia de jogo, porém, adota-se a prática do jornalismo sentado. Os repórteres do siteficam na redação, assistem à partida pela TV, gravam as entrevistas coletivas pelo rádio,e ao término da partida, escrevem as matérias. Vai a campo somente o fotógrafo (que éo mesmo do jornal impresso). As imagens de vídeo publicadas no site são coletadas daTV Alterosa, emissora do grupo Diários Associados. Em ocasiões especiais, como os

jogos decisivos da Libertadores de 2009, há aumento da equipe e, neste caso, algumrepórter do Superesportes também vai para o estádio. O mesmo ocorre em viagens para jogos internacionais importantes.

As demais notícias do site são advindas prioritariamente de agências, cabendo ao jornalista selecionar as melhores fotos, destacar na capa, e, quando muito, editar umtrecho do texto que vai ser publicado.

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Nota-se, portanto, que a prática do jornalismo sentado está, de fato, atrelada ao tamanhoda equipe e do investimento da empresa. Se o foco do Superesportes na cobertura dosclubes de futebol da capital é maior, seu retorno também é maior. “Cruzeiro e Atléticocompõem o conteúdo maciço do site, embora ele tenha conteúdo de outros clubes,futebol internacional e todas as modalidades esportivos, mas Cruzeiro e Atlético ainda éo que mais chama leitores para o site, o principal conteúdo”14, explica o repórter BrunoFurtado.

Já no Estado de Minas, a rotina é um pouco diferente. Os repórteres vão a campo paracobertura de modalidades além do futebol. Para o jornalista Rodrigo Gini, ex-repórter do caderno de Esportes do jornal e atual editor do portal Superesportes (assumiu emabril de 2010), a principal diferença nas rotinas dos veículos está atrelada aocompromisso com o tempo.

“No impresso você faz a matéria, relê, passa de volta, o chefe cobra, pergunta, diz queestá no horário, mas na internet não tem isso. Na internet você joga a matéria no ar, acalma que você tem para preparar o produto é muito menor, a cobrança é muito maior.Você tem uma concorrência que está jogando matéria toda hora e se você não

acompanhar você é atropelado e seu leitor não espera, corre para o outro site. Acima detudo, a principal diferença é o tempo”15, explica Rodrigo Gini.

Curiosamente, apesar de deslocar repórteres para cobrir diversas modalidadesesportivas, o jornal Estado de Minas também não consegue fugir da prática do jornalismo sentado, em ocasiões específicas. Os jogos internacionais de rotina, por exemplo, que precisam entrar no noticiário, mas que não há repórter especial cobrindo,

são feitos da redação. “A Liga dos Campeões da Europa a gente divide. A gente brincaque tem a ‘pauta de redação’. Essa é a pauta que é de todo mundo. Quem sobra, não ésetorista, não é escalado para ir para a rua, a gente tira par ou ímpar para ver quem vaifazer”, explica Rodrigo Gini.

14 FURTADO, Bruno: depoimento [maio 2010]. Entrevistador: Gilmar Laignier Junior. Entrevista

concedida para elaboração de Monografia de conclusão de curso do Uni-BH.

15

GINI, Rodrigo: depoimento [maio 2010]. Entrevistador: Gilmar Laignier Junior. Entrevista concedida para elaboração de Monografia de conclusão de curso do Uni-BH.

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A reunião de pauta do caderno de Esportes no Estado de Minas é feita por volta das10h30 da manhã todos os dias. Participam dela todos os repórteres, subeditores e editor.Passadas as pautas, tarefas e pensada a boneca do jornal naquele dia, os jornalistascomeçam a rotina. A primeira edição do jornal é liberada às 20h30. A segunda tem umdead linemais flexível. Em dias sem jogos de futebol à noite, esta edição é fechada às23h30. A quarta-feira é livre, por causa das partidas, que às vezes ocorrem às quintas-feiras, sendo, portanto, utilizado o mesmo critério.

3.3 Análise de material empírico

A primeira análise dos objetos de pesquisa foi feita ainda no segundo semestre de 2009,nos estudos preliminares e na etapa de coleta de dados. Na ocasião, o único torneio queos times mineiros disputavam era o Campeonato Brasileiro. Foi possível, portanto,verificar o espaço dado aos clubes no Estado de Minas e no portal Superesportes narepercussão de uma partida. Para efeito de análise, foram coletadas informações de

somente um dos clubes da capital, o Cruzeiro, escolhido aleatoriamente após a partidacontra o Avaí (SC), em Florianópolis, em 04 de outubro. Vale ressaltar que, nessaépoca, o Superesportes ainda contava com sua diagramação antiga, com menos capasinternas e suportes para vídeos e fotos pouco modernos.

3.3.1 Dia seguinte a um jogo de Campeonato Brasileiro

A reportagem “Cruzeiro se reapresenta nesta terça de olho em Kléber”16, publicada no portalSuperesportesem 05 de outubro de 2009 apresenta um texto curto, de quatro parágrafos e mil caracteres e versa sobre um assunto factual. Esse modelo atende às pesquisas mais primárias do jornalismo on-line, quando especialistas já sugeriam textoscurtos para as telas do computador, dado o cansaço que essas provocam nos usuários.

16 http://www.superesportes.com.br/ed_esportes/003/template_esportes_003_136174.shtml

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“Há recomendações de alguns autores de que o texto da web não seja mais do que 50%do que seria usado para dizer o mesmo no jornal impresso” (FRANCO, 2008).

A segunda-feira, dia de publicação da matéria, foi de folga para os jogadorescruzeirenses. Folga noticiada pelosite ainda no domingo, depois da partida entreCruzeiro e Avaí. Na segunda-feira então, mesmo sem treinos na Toca da Raposa, oSuperesportes publicou oito conteúdos diferentes na seçãoCruzeiro, incluindo a matériacitada: dois vídeos, um scout 17 de estatísticas da partida do dia anterior e cincoreportagens.

Das cinco notas, duas delas foram frias, de números e matemática - probabilidades de pontuação do clube no campeonato depois da última rodada e aproveitamento da equipena competição. Duas foram de situação de treinos da equipe (volta aos trabalhos edesfalques para o próximo jogo) e uma sobre oranking mundial divulgado naquele dia pela Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol, que mostrou oCruzeiro na 10ª colocação.

As repercussões e reportagens sobre o jogo do dia anterior foram todas publicadas ainda

no domingo, após a partida, com entrevistas com os jogadores e técnicos, distribuídasem algumas notas.

Já o jornal Estado de Minas publicou, na mesma segunda-feira, uma única reportagemsobre o Cruzeiro. A matéria versou sobre a partida do dia anterior e contou com umgrande relato do jogo. A grande diferença para as notícias da internet é notada logo notítulo da reportagem do jornal: “Quem renuncia ao ataque entrega o ouro”,

relacionando-se ao modo como o treinador do Cruzeiro, Adílson Batista, escalou aequipe enquanto estava à frente no placar. O técnico usou uma formação defensiva,“chamando” o adversário para o ataque, e o Cruzeiro, de fato, acabou não aguentando a pressão do Avaí e sofreu o empate no fim do jogo.

17

Quadro de estatísticas de uma partida esportiva, que contabiliza número de escanteios, faltas, passescertos e errados etc.

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De acordo com Lage (1999), as redações de jornal impresso não se limitam aofornecimento de fórmulas rígidas para a execução do produto, pois elas tendem aenvelhecer rapidamente. É exatamente o que ocorre na situação analisada. O jornal buscou uma análise mais elaborada em seu texto e foi além da simples notícia,apresentando um título mais reflexivo e pouco factual.

Percebe-se nitidamente essa diferença nos títulos do jornal Estado de Minaspara osite Superesportes. Enquanto o jornal usou de certa carga opinativa em “Quem renuncia aoataque entrega o ouro” e não foi diretamente ao assunto (o empate do Cruzeiro contra oAvaí), o site da internet usou das técnicas factuais para falar sobre o mesmo assunto,com o título: “Cruzeiro vacila no fim e cede empate ao Avaí”18.

Além disso, o portal procurou utilizar suas “vantagens” em relação ao impresso paratratar do assunto. O Superesportes disponibilizou ao internauta sete fotos da partida, emuma galeria de imagens, um vídeo com os melhores momentos do jogo e oslinksparaas demais matérias relacionadas ao tema: repercussão do resultado com o treinador doclube e com os jogadores. Canavilhas (2001) salienta que a grande vantagem da internetsobre o impresso é justamente a hipermídia, através de hiperlinks, vídeos, áudios e

galerias de fotos.

Ou seja, o conceito de convergência de mídias é explorado com certa intensidade no site observado, enquanto o jornal procura se adequar às novidades do jornalismo, priorizando a análise longa e subjetiva ao noticiário curto e verdadeiramente factual eobjetivo.

É importante perceber a rotina do portal em um dia como esse. O mesmo jornalista queescreveu as notas, foi o que editou as fotos, publicou os vídeos e montou as galerias,ratificando a teoria de Jorge (2007) das rotinas de produção do repórter multimídia,sempre ágil e detentor de inúmeras habilidades. Já no jornal impresso, o repórter dedicou-se exclusivamente ao seu texto, já que a diagramação da página ficou a cargodo diagramador e a fotografia foi feita pelo fotógrafo do jornal.

18 http://www.superesportes.com.br/ed_esportes/003/template_esportes_003_136076.shtml

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Aqui percebemos não só o limite de espaço e caracteres do jornal impresso, comotambém outra teoria recorrente sobre o jornalismo on-line. A da superprodução de notasinformativas, ou notícias publicadas a conta-gotas nos portais de internet, defendida por Pereira (2004). Na Figura 3, é possível observar a capa do Cruzeiro recheada deinformações e ainda a lista de notícias produzidas no dia, na parte debaixo da página.

Outra curiosidade é a mescla, por parte do Superesportes, de textos curtos e longos entreas 14 reportagens publicadas, adotando a fórmula defendida por Nielsen (2007, citado por Franco, 2008), que mostra que o texto longo pode conter mais informações, mastambém pode cansar o internauta. O ideal, portanto, para Nielsen (2007), é que haja umamescla de textos curtos e longos, para seja cumprida a expectativa de diferentesusuários.

O jornalista do Superesportes, Bruno Furtado, confirma que o site realmente segue essalinha editorial. “Na internet, temos as notícias frescas, que podem ser pílulas oumatérias, embora nós façamos grandes reportagens também. Acho que é um preconceitofalar que a internet é só um local de textos curtos”19.

Já o jornal Estado de Minas busca uma liberdade maior com a linguagem, como formade atrair o leitor. “Existe sim a diferença de linguagem. O jornal tem outra prioridade,fica com um personagem, fica responsável por fazer matérias específicas. O conteúdofactual, que o torcedor gosta de ver durante o dia, quando está trabalhando ou em casadando uma espiada no site, é feito pela internet. O jornal tenta fazer um resumo e dar um enfoque diferente, para que não se repita o conteúdo da internet”, explica BrunoFurtado.

Dessa forma, o Estado de Minas foge do problema apontado por Coelho (2003) sobre asmanchetes esportivas dos jornais impressos, quando estes tentam dar a notícia demaneira factual, “[...] informações que sempre causam ao jornal do dia seguinte o sabor de pão amanhecido” (COELHO, 2003, p. 62).

19

FURTADO, Bruno: depoimento [maio 2010]. Entrevistador: Gilmar Laignier Junior. Entrevistaconcedida para elaboração de Monografia de conclusão de curso do Uni-BH.

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Em contraposição à superprodução de notas informativas no site, nota-se o aspectoreflexivo do jornal impresso (Fig. 4) no sábado, 1º de maio de 2010, ao fazer uso de umtítulo pouco noticioso e muito mais puxado para o lado da vida pessoal do jogador (personagem), buscando nisso um diferencial para o leitor, fugindo do dilema dofactual, apontado por Coelho (2003). Ao ler a manchete “Curtir sem perder aconcentração” e uma foto de Thiago Ribeiro descontraído, sem uniformes do Cruzeiro,o leitor se sente próximo ao atleta, como se estivesse em um bate papo informal com o jogador, no quintal de sua casa.

Figura 4: Matéria do Cruzeiro no Estado de Minas de sábado, 1º de maio de 2010

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3.3.3 Cobertura do esporte especializado

O dia 1º de maio de 2010, sábado, foi diferenciado para o esporte especializado mineiro.Pela primeira vez, o Montes Claros chegou à final da Superliga Masculina de Vôlei,maior torneio do Brasil na modalidade. O clube acabou derrotado pelo Santa Catarina,que conquistou o título nacional pela quarta vez consecutiva. Mesmo assim, o MontesClaros ganhou ampla repercussão na imprensa mineira.

Nesse caso, notou-se maior espaço para o esporte especializado no jornal Estado de

Minas do que no portal Superesportes. Ainda que o site contasse com ferramentasdiferenciadas para trabalhar o noticiário (como vídeos, áudios, galerias de fotos etc), o jornal impresso cedeu espaço de maior destaque ao Montes Claros em capa.

A final da Superliga ocorreu no sábado, véspera da decisão do Campeonato Mineiro,que foi no domingo. Mesmo assim, o Estado de Minas dedicou toda a parte de cima desua capa de esportes para o vôlei. Mais uma vez, o jornal brincou com as palavras,fazendo disso um diferencial, ao usar um título com trocadilhos: “A bola sobe hoje... erola amanhã” (Fig. 5).

No sábado, logo após o jogo (que ocorreu pela manhã), o portal Superesportes jáestampava a manchete da derrota do Montes Claros: “Florianópolis faz 3 a 0 no MontesClaros e é tetra” (Fig. 6). A chamada na capa do Superesportes, sem foto, conduziu àmatéria do jogo e, dentro da reportagem, além do texto informativo, havia apenas umagaleria de fotos (Fig. 7). Não houve repercussões maiores, vídeos com lances do jogo oumuito menos entrevistas em áudio.

Já o jornal quis fazer uma cobertura maior da derrota. Com tempo de sobra (o dia inteirode sábado), o Estado de Minas publicou, no domingo, dia da final do CampeonatoMineiro de futebol, uma página inteira colorida com repercussões da derrota do MontesClaros. Mais uma vez, o título principal foi reflexivo e pouco noticioso: “Triunfo daexperiência” (Fig. 8). A manchete carrega certo tom opinativo ao analisar que o time do

Florianópolis venceu o campeonato por ser mais experiente que o Montes Claros.

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Figura 5: Capa de esportes do Estado de Minas de 1º de maio de 2010

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Figura 8: Caderno de esportes do Estado de Minas de 2 de maio de 2010

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No caso do esporte especializado, portanto, notou-se maior cobertura do jornalimpresso, em vez da internet. Um dos motivos pode estar atrelado aos conceitos deanálise do discurso, de Charaudeau.

Sob a égide da legitimidade de cobrir com eficiência Atlético e Cruzeiro em qualquer situação, o Superesportes preferiu dar ênfase à final do Campeonato Mineiro, ao invésda final da Superliga de vôlei. Segundo Charaudeau (2007), é a legitimidade que dá àmídia o poder de dizer. Dessa forma, o portal abriu mão da possibilidade de coberturaampla do esporte especializado (visto que na internet não há limites para publicação dematérias e outros conteúdos), para manter seus repórteres focados em seu filão maior: ofutebol.

Nesse caso, a estratégia comunicativa adotada pelo site conferiu credibilidade paracaptar o seu leitor fiel, que, nesse caso, é aquele que busca todas as notícias do Atléticona final do Campeonato Estadual. Charaudeau (2007) explica que credibilidade estáatrelada à capacidade do locutor (Superesportes) em se mostrar capaz de provar suacompetência em lidar com as restrições do contrato de comunicação, que é o conjuntode condições pelas quais se realiza qualquer ato de comunicação (CHARAUDEAU,

2007, p. 67).

Já o público-alvo do Estado de Minas é diferente. De acordo com Silva (2004), o público alvo é o sujeito destinatário ideal da comunicação, imaginado pela instânciamidiática como suscetível de perceber os efeitos visados por ela, no lugar das condiçõesde interpretação.

Os 95 mil leitores do Estado de Minas de domingo compram o jornal não somenteinteressados em esporte, tampouco em futebol exclusivamente. Eles leem também sobre política, economia, cidades, cultura, veículos etc. O contingente de receptores do jornaltem gostos pessoais variados. Pensando nesse sujeito destinatário ideal, o Estado deMinas buscou atender à parcela da população que é apaixonada por futebol, bem comoaquele leitor que não gosta dessa modalidade, mas pode correr o olho pelo caderno deesportes e encontrar outras manchetes de seu interesse. No caso analisado, o vôlei seria

uma delas.

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CONCLUSÃO

Diante de situações conflitantes e desafiadoras vividas pelos jornais impressos e portaisde internet no século XXI, pudemos perceber a importância da editoria de esportesnesse paradigma. Curiosamente, essa seara do jornalismo é pouco estudada nasuniversidades, mas carrega, atualmente, uma parcela muito grande de consumidoresfiéis e interessados no assunto. Por conta dessa falta de empenho acadêmico, houvecerta dificuldade, no presente estudo, de se encontrar bibliografia técnica específicasobre os dilemas do jornalismo esportivo.

Com base nas análises, foi apurada a linguagem utilizada na internet e no jornalimpresso para captar o leitor, levando em conta os suportes específicos de cada veículo. Na internet, através de galeria de fotos, arquivos de vídeo, áudio, hiperlinks para outrostextos, volume elevado de notícias, mesclas de notas curtas e longas reportagens, entreoutros recursos. No caso do jornal impresso, o emprego chamativo do título, adiagramação da página e a possibilidade do texto longo, como uma espécie dedocumento da informação, que pode ser “guardado” pelo leitor para futuras leituras,além da relação intimista com o receptor, através de personagens e pautas diferenciadas.

Entre as observações, uma delas ficou nítida. Trata-se da preocupação do jornalismoimpresso em se redescobrir e buscar meios alternativos de sobrevivência na era dainformação em tempo real divulgada pelos portais de internet.

O jornalismo on-line, em contrapartida, já se vê como uma realidade na sociedadecontemporânea e já é não mais “o futuro” do jornalismo. Esse crescimento faz os sites

esportivos conviverem com uma pressão enorme todos os dias, de publicar as notíciasfactuais em tempo real, para não ficar atrás da concorrência e ainda buscar diferenciais para ser líder de audiência. Desde que surgiram no Brasil, no fim dos anos 1990, esses portais atrelam esse diferencial, principalmente, ao volume de notícias publicado.

O Superesportes, por exemplo, publica um número elevado de conteúdos sobre Atléticoe Cruzeiro todos os dias. De fato, o maior número de acessos do site é direcionado a

esses dois clubes.

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Por outro lado, ficou nítido que a adesão da prática do “jornalismo sentado” nemsempre é a mais lucrativa para as empresas, principalmente na internet. O maior investimento do Superesportes é a cobertura de Atlético e Cruzeiro, que conta comrepórteres cobrindo o dia-a-dia dos clubes nos centros de treinamento, diariamente. Omaior retorno do site, consequentemente, é justamente o acesso de internautas nasseções dos dois clubes da capital.

Ao mover o presente estudo baseado na questão principal das diferenças de tratamentoda notícia e do discurso do jornalismo esportivo na internet e na web, encontramos, naverdade, diversas respostas e possibilidades de discussão, que vão desde os objetivoscomerciais de cada veículo até suas armas de captação do público. Outra possibilidaderica de estudo do tema, aliás, seria justamente a análise desse consumidor da notíciaesportiva, provavelmente o mais fiel entre todos os seguidores de quaisquer editorias jornalísticas no Brasil.

Os paradigmas do jornalismo esportivo na atualidade, portanto, vão além dos manuaisde jornalismo on-line e impresso. Trata-se de perceber a editoria como parte importanteda prática jornalística e observá-la com olhar acadêmico apurado, a fim de compreendê-

la como uma área em expansão no jornalismo, principalmente na internet. Do ponto devista empresarial, tal percepção pode render maior exposição do esporte e angariar receitas majoradas ao grupo. Sob a perspectiva teórica, faz crescer a miríade de pesquisas acadêmicas sobre o jornalismo no século XXI, além de pormenorizar as peculiaridades de uma das editorias mais populares do país.

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