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ÁREA JURÍDICA O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO Decorridos vinte e um anos da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, há muito ainda a ser debatido. O entendimento de suas normativas circulam no imaginário social entre o senso comum e o radicalismo de interpretações que julgam ser mais benéficas a alguns atores sociais do que a outros. Neste encontro serão debatidas as temáticas relativas a sua atualização, envolvendo o Direito à Educação e as Medidas Preventivas e Socioeducativas aplicáveis nos casos em que este direito não é atendido nas escolas de educação básica. www.portalpositivo.com.br/spe/areajuridica 0800 725 3536 Sílvia Fráguas [email protected] 30

CAPA FINAL AREA JURIDICA - Educacional...6 2. Regra ou Princípio da Prioridade Absoluta O atendimento prioritário aos direitos da criança e do adolescente foi regulamentado pelo

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ÁREA JURÍDICA

O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO

Decorridos vinte e um anos da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, há muito ainda a ser debatido. O entendimento de suas normativas circulam no imaginário social entre o senso comum e o radicalismo de interpretações que julgam ser mais benéficas a alguns atores sociais do que a outros. Neste encontro serão debatidas as temáticas relativas a sua atualização, envolvendo o Direito à Educação e as Medidas Preventivas e Socioeducativas aplicáveis nos casos em que este direito não é atendido nas escolas de educação básica.

www.portalpositivo.com.br/spe/areajuridica

0800 725 3536

Sílvia Frá[email protected]

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Caro (a) Educador (a)

O espaço escolar é um lugar onde se compartilham saberes e se manifestam expressões, um lugar de múltiplas determinações culturais, constituindo-se num universo particular em que há um patrimônio imaterial cultural e histórico que se manifesta nas:

§ Práticas sociais, cerimoniais e atos festivos escolares;

§ Conhecimentos e práticas relacionados às práticas pedagógicas;

§ Técnicas de ensino e de aprendizagem.

Olhar para o Patrimônio Imaterial da escola é permitir aos educadores uma incursão a um universo que lhes confere uma identidade. Esse patrimônio imaterial é o que permite a cada um identificar o professor ou aluno dessa ou daquela instituição escolar, dizer que há um modo de ser aluno ou professor de uma escola em especial.

Por meio da preservação e da salvaguarda do patrimônio cultural escolar material e imaterial alimenta-se essa memória que torna cada escola um espaço singular em toda sua multiplicidade de saberes, fazeres, expressões e lugares, tanto na sua variedade como na sua complexidade.

Esse é o convite do Programa de Cursos “Patrimônio Imaterial, CONTEXTOS escola singular.

Acedriana Vicente SandiDiretora Pedagógica

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Este texto compõe o material do Programa de Cursos Positivo 2012. Este Programa destina‐se às Escolas

Conveniadas ao Sistema Positivo de Ensino (SPE). O texto apresenta aprofundamento

didático‐metodológico da Proposta Pedagógica dos Livros Didáticos Integrados Positivo e do Portal Positivo. A

seguir, conheça a equipe de assessoria da área Jurídica:

Conheça a equipe!

Assessora de Área

Sílvia Fráguas

[email protected]

Assessora da Área Jurídica

http://www.portalpositivo.com.br/spe/areajuridica

Gerência de Área

Patrícia Romagnani

[email protected]

Gerente da Área Pedagógica

http://www.portalpositivo.com.br/spe/areapedagogica

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FALE CONOSCO0800 725 3536

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“Quando a sociedade deixa matar as crianças é porque começou seu suicídio como sociedade. Quando não

as ama é porque deixou de se reconhecer como humanidade.” (Herbert de Souza)

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO

Apresentação

Em 2012, nosso foco é a equipe diretiva! A área jurídica quer colaborar com a gestão de sua escola,

auxiliando-a a entender alguns temas importantes para a condução das atividades escolares. Esta será uma

ótima oportunidade para discutirmos assuntos relacionados ao Estatuto da Criança e do Adolescente, com

destaque para os seguintes temas:

Visão geral do Estatuto da Criança e do Adolescente

Direito fundamental à educação

Crianças e adolescentes com direitos ameaçados ou violados

O papel da escola na Rede de Proteção

Nossos encontros terão como objetivo demonstrar de que forma a escola pode e deve atuar no

atendimento integral aos educandos, tal como determinado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e,

ainda, como deve interagir com os órgãos da Rede de Proteção, na defesa dos interesses de crianças e

adolescentes.

1. Visão Geral. Da Doutrina da Situação Irregular à Doutrina da Proteção Integral

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei n.º 8.069/90 (13 de julho de 1990), surgiu para

regulamentar o disposto nos artigos 227 e 228 da Constituição Federal de 1988 (CF/88). Fortemente

influenciado pela Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959 (Declaração) e pela Convenção dos

Direitos da Criança de 1989 (Convenção), rompeu com o consolidado modelo da “Situação Irregular” que se

ocupava, apenas, dos “menores” em situação de abandono ou estado de delinquência, para adotar a

“Doutrina da Proteção Integral” como diretriz.

A “Doutrina da Situação Irregular”, oficializada pelo Código de Menores de 1979, mas implícita

desde o Código de Mello Matos (1927), limitava-se a tratar daquele menor privado de condições essenciais

à sua subsistência. Na prática, tratava-se de uma política segregatória, pois os menores eram lançados em

entidades de internação, sem nenhuma preocupação em se manterem os laços familiares, mesmo porque a

família era considerada como uma das causas da situação irregular.

A Declaração Universal dos Direitos da Criança, adotada pela ONU em 1959, foi o grande marco no

reconhecimento de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. Estabeleceu, entre outros princípios,

a proteção especial para o desenvolvimento físico, mental, moral e espiritual; a educação garantida e

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compulsória; a prioridade em proteção e socorro; a proteção contra negligência, crueldade e exploração e

contra atos de discriminação.

Em 1979, teve início a atualização deste documento, fato consolidado pela Convenção dos Direitos

da Criança, aprovada no mês de novembro de 1989 pela Resolução ONU n.º 44. Esta Convenção foi

subscrita pelo governo brasileiro, em 26 de janeiro de 1990, aprovada pelo Congresso Nacional por meio do

Decreto n.º 28/90 e promulgada pelo Decreto Executivo n.º 99.710/90.

A “Doutrina da Proteção Integral” adotada, pela primeira vez, na Convenção é a base estrutural de

toda legislação, cuja temática seja a criança e o adolescente e se funda em três pilares: 1) Reconhecimento

da peculiar condição da criança e do adolescente como pessoa em desenvolvimento, titular de proteção

especial; 2) Crianças e adolescentes têm direito à convivência familiar; e 3) As Nações subscritoras obrigam-

se a assegurar os direitos insculpidos na Convenção, com absoluta prioridade.

Regulamentada pelo artigo 3.º do ECA, a “Doutrina da Proteção Integral” está baseada no

reconhecimento de direitos especiais e específicos a todas as crianças e os adolescentes. Esta Doutrina

rompeu com o padrão preestabelecido pela “Doutrina da Situação Irregular” e absorveu os valores

insculpidos na Convenção dos Direitos da Criança.

A “Doutrina da Situação Irregular” era restritiva, limitando-se a tratar, apenas, dos menores

abandonados e daqueles considerados “delinquentes”. O Juiz de Menores atuava com base no binômio

carência x delinquência, centralizando as funções jurisdicional e administrativa. Com a “Doutrina da

Proteção Integral”, o ECA previu um conjunto de medidas governamentais, distribuídas entre os três entes

da Federação, adotando o princípio da descentralização político-administrativa, materializando-o na esfera

municipal pela participação direta da comunidade, pela atuação do Conselho Municipal dos Direitos da

Criança e do Conselho Tutelar, que revelam a participação da sociedade civil na proteção das crianças e dos

adolescentes.

Foi com a adoção da “Doutrina da Proteção Integral” pela CF/88 e pelo ECA que crianças e

adolescentes passaram a ser considerados como sujeitos de direitos, assim como qualquer ser humano.

Vejamos as comparações1:

ASPECTO ANTERIOR ATUAL Doutrinário Situação Irregular Proteção Integral Caráter Filantrópico Política Pública Fundamento Assistencialista Direito Subjetivo Centralidade Local Judiciário Município Competência Executória União / Estados Município Decisório Centralizador Participativo Institucional Estatal Cogestão da Sociedade Civil Organização Piramidal / Hierárquica Rede Gestão Monocrática Democrática

1 MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade (Coord.). Curso de Direito da Criança e do Adolescente: aspectos teóricos e práticos. 4. Ed. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 15.

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2. Regra ou Princípio da Prioridade Absoluta

O atendimento prioritário aos direitos da criança e do adolescente foi regulamentado pelo artigo

3.º da Convenção dos Direitos da Criança, que assim estabelece:

Art. 3.º Todas as ações relativas às crianças levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente (com prevalência), o interesse maior da criança.

Traduzindo o preceito constitucional exarado no artigo 227 da CF/88, bem como respeitando o

disposto na Convenção acima citada, o ECA definiu e materializou o conceito de prioridade absoluta no

parágrafo único do artigo 4.º, a seguir transcrito:

Art. 4.º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público, assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

A “Regra da Prioridade Absoluta” estabelece a primazia em favor das crianças e dos adolescentes

de todas as esferas de interesses. O interesse infanto-juvenil deve preponderar, com intuito de facilitar a

concretização dos direitos fundamentais elencados pela Constituição Federal e pelo ECA.2

3. Dos Direitos Fundamentais das Crianças e Adolescentes

Seguindo os ensinamentos de J. J. CANOTILHO (1998), direitos fundamentais são os direitos do

homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados no espaço e no tempo. São os direitos

objetivamente vigentes em uma ordem jurídica concreta e que se opõem ao Estado, limitando e

condicionando sua atuação.

No tocante a crianças e adolescentes, o legislador constituinte particularizou, entre os direitos

fundamentais, aqueles que se mostram indispensáveis à formação do indivíduo, ainda em

desenvolvimento, elencando-os nos artigos 227 da CF/88 e 4.º do ECA.

2 AMIN, Andréa Rodrigues. Princípios Orientadores do Direito da Criança e do Adolescente. In: MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade (coord.).

Curso de Direito da Criança e do Adolescente: aspectos teóricos e práticos. 4. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 19/30.

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São eles: o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à

cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a

salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

4. Direito Fundamental à Educação

Partindo do conceito extraído do DICIONÁRIO AURÉLIO (2004), temos que educação é um processo

de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança, do adolescente e do ser humano

em geral, visando à sua melhor integração individual e social. O processo educacional visa à integral

formação da criança e do adolescente, buscando seu preparo para o exercício da cidadania e, também,

para o ingresso no mercado de trabalho. É um direito social, garantido pelo artigo 205 da CF/88. É,

também, um direito fundamental, que permite a instrumentalização de todos os demais, pois, sem

conhecimento, não há o implemento universal dos direitos fundamentais.

4.1 Política Educacional

A política educacional é determinada pela CF/88, em seu artigo 206.

As medidas disciplinares deverão ser aplicadas sem ofertar prejuízo irreparável para a criança ou o adolescente. Assim, o aluno não poderá ser suspenso no período de provas escolares, bem como não poderá sofrer expulsão em período do ano escolar no qual se mostra inviável a transferência ou matrícula em outro estabelecimento de ensino.3

Os principais aspectos dessa política educacional são: a igualdade, o acesso à escola a e

permanência nela e a garantia do padrão de qualidade.

De acordo com as disposições do ECA, temos que a igualdade se traduz na garantia de educação a

todas as crianças e a todos os adolescentes, sem distinção. Assegurar esse direito é dever dos pais,

matriculando seus filhos na rede de ensino (público ou particular). É dever da sociedade fiscalizar os casos

de evasão ou não ingresso na rede escolar, por meio do Conselho Tutelar e dos profissionais da educação.

Cabe ao Poder Público manter a oferta de vagas, permitindo o livre e irrestrito acesso à educação.

É importante pontuar que aos portadores de necessidades especiais devem ser garantidos o

número de vagas e o atendimento por profissionais capacitados. É dever do Estado ofertar vagas para

educação especial, sem prejuízo da inclusão, que deve ser adequada, tendo em vista que a escola deve

prover serviços especializados para atender às peculiaridades da demanda (acessibilidade, adaptação do

mobiliário, cuidadores, profissionais treinados).

3 AMIN, Andréa Rodrigues. Dos Direitos Fundamentais. In: MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade (coord.). Curso de Direito da Criança e do

Adolescente: aspectos teóricos e práticos. 4. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 31/65.

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Ainda no que tange à igualdade, a oferta de educação aos adolescentes infratores é parte

integrante do processo de ressocialização daqueles que estão em cumprimento de medida socioeducativa.

Ao pontuar o aspecto do acesso e da permanência, o ECA estabelece que não basta a oferta de

vagas, tanto pelo Poder Público quanto pela iniciativa privada. Não há país no mundo que não preveja em

suas normas essa garantia, já que a educação pode ser considerada um dos pilares da cidadania. É

necessário que se garanta a permanência na escola, considerando este “direito à permanência” como um

direito público subjetivo, que deve ser garantido e assegurado pelo Estado, que tem obrigação de fornecer

todos os meios necessários a esta permanência na escola.

Por fim, é importante destacar o aspecto “qualidade no ensino”, disciplinado pela Política

Educacional, no art. 206 da CF/88. Este aspecto se traduz na necessidade de constante capacitação e

qualificação de todos os profissionais que atuam na educação, na implementação de políticas públicas de

ensino, de cargos e carreiras e progressão salarial – políticas essas que, também, devem ser observadas

pelas instituições privadas de ensino – na elaboração e na revisão de material didático atrativo e coerente

e, ainda, na valorização do estudo pela família, ponto crucial para que o aluno perceba a importância de

sua formação.

4.2 Níveis e Modalidades da Educação

A estrutura do sistema educacional brasileiro foi determinado e regulamentado pela LDB, que

classifica a educação em dois níveis: educação básica e educação superior4.

A educação básica compreende:

a) Educação Infantil5;

b) Ensino Fundamental6;

c) Ensino Médio7.

Por fim, temos a educação superior8, cujos objetivos básicos são a formação profissional e a

produção científica.

5. Crianças e Adolescentes com Direitos Violados

Partindo do pressuposto exposto na CF/88 e no ECA, para o Estado Brasileiro, crianças e

adolescentes são prioridades absolutas no que se refere à salvaguarda de seus direitos. Cabe ao Estado, à

sociedade, à família e à comunidade assegurar o respeito aos direitos garantidos em lei.

4 Artigo 21 da LDB.

5 Artigos 29 e 30 da LDB.

6 Artigo 32 da LDB.

7 Artigo 35 da LDB.

8 Artigo 43 da LDB.

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Todavia, a realidade encontrada nos Estados Brasileiros é totalmente distante do que dispõe o ECA.

Não é raro ler, ver e ouvir notícias que chocam, apavoram, impressionam. Os problemas enfrentados pela

infância e pela adolescência, no Brasil, são muitos e não estão limitados a determinada faixa etária, a uma

classe social específica ou a um grupo cultural. Ameaças e dificuldades provêm de qualquer lugar. Ameaças

e violações ocorrem a todo momento e atingem crianças e adolescentes com os mais diferentes perfis e

níveis de desenvolvimento.

Entre as ameaças e violações mais comuns estão a mortalidade, a exploração do trabalho infantil, a

evasão escolar, a exploração sexual e a violência, formas de violação de direitos combatidas pela

Declaração dos Direitos Humanos9. Todas essas violações têm, em comum, um mesmo fundamento: são

causadas, na sua grande maioria, por fatores socioeconômicos e de exclusão. Vale lembrar que a violência

aqui indicada pode ser entendida tanto no campo físico como no emotivo.

GONÇALVES (2008) afirma que a vivência da violência contra crianças e adolescentes é usual e

cotidiana. Todavia, para entender sua lógica, determinar sua extensão e avaliar o real perigo que a violência

representa, fazem-se necessárias tanto a busca de um mínimo de informação quanto a reunião de

recursos. A imprensa e a literatura especializada discutem, à exaustão, a temática, suscitando diversas

hipóteses acerca das suas causas e consequências. Conselhos e comissões debatem as causas e tentam

estabelecer planos de metas para o combate à violência e à violação de direitos.

Talvez, em razão de toda informação, bem como da presença inevitável da violência na sociedade

brasileira, esta tenha sido banalizada. E, esta banalização da violência, no entendimento de ARENDT, apud

GONÇALVES (2008), pode ser entendida como a corrupção da consciência que se sedimenta em pequenos

hábitos do cotidiano e condiciona a forma pela qual os indivíduos, suprimindo a capacidade de pensar

criticamente, se acostumam e se acomodam ao arbítrio, à covardia e ao cinismo.

Nos últimos 40 anos, a violência contra a criança tem sido incansavelmente estudada. Cumpre

ressaltar que grande parte dos trabalhos produzidos nesta área provém de estudos de perfil

epidemiológico, especialmente dos ferimentos encontrados nos corpos de crianças, que tinham origem em

agressões praticadas pelos genitores. Esses estudos acabaram por romper com a visão da família como

centro e núcleo da proteção à criança, conforme nos ensina GONÇALVES (2008).

O diagnóstico precoce da violência familiar permite a tomada de ações de caráter preventivo. É

justamente neste diagnóstico precoce que se encontra um importante papel da escola, já que as

consequências acarretadas pela violência para a criança e o adolescente variam de físicas a psíquicas. Um

acompanhamento diário realizado pelos profissionais da educação que têm contato próximo com a criança

e o adolescente vitimizados pode auxiliar na identificação dos sinais, das causas e dos efeitos gerados pela

violência.

9

Adotada pela Organização das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, como um ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações.

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O ECA prevê, em seus artigos 5.º e 13, que nenhuma criança e nenhum adolescente poderão ser

expostos a qualquer tipo de violência e que, casos suspeitos ou confirmados, deverão ser imediatamente

comunicados à autoridade competente (Conselho Tutelar local ou Autoridade Judiciária competente), para

que sejam tomadas as providências e penalidades cabíveis ao caso.

É evidente que a decisão de notificar pressupõe toda uma coleta de informações pelo profissional,

com o intuito de contextualizar a situação que examina e, assim, poder encerrar sua avaliação, decidindo,

ou não, pela notificação ao Conselho Tutelar, órgão encarregado de zelar pelos direitos da criança e do

adolescente, sempre que estes forem ameaçados ou violados. É o Conselho Tutelar quem recebe a

notificação e procede a uma primeira avaliação dos fatos relatados. Se verificada sua procedência, decide

pelo encaminhamento do relato ao Ministério Público.

Além de apurar os fatos, o Conselho Tutelar também pode aplicar as medidas de proteção previstas

no artigo 101, I a VII do ECA ou as medidas de atendimento aos pais ou responsáveis previstas no artigo

129, I a VII, também do Estatuto.

O ECA privilegia o convívio familiar, determinando, ainda, que sempre que possível, sejam aplicadas

medidas que visem ao fortalecimento do vínculo familiar. O respeito aos valores familiares deve ser a regra.

Para isso, afirma GONÇALVES (2008), antes de apartar pais e filhos, cabe suprir as necessidades mais

permanentes da família, inclusive aquelas que dizem respeito a recursos pessoais e sociais que

instrumentalizam sua tarefa de construir, na próxima geração, um ambiente menos contaminado pela

violência.

5.1 Medidas Protetivas e Medidas Socioeducativas. O Papel da Escola

Disseminar o ECA nas escolas, fazendo com que os envolvidos no processo educacional possam

refletir e problematizar questões relacionadas aos direitos das crianças e dos adolescentes é tão

importante que uma das últimas alterações10 introduzidas na LDB trouxe como conteúdo obrigatório para o

currículo do Ensino Fundamental a temática dos direitos fundamentais, das medidas protetivas e

socioeducativas, bem como de todo sistema disciplinado pelo ECA11.

As medidas protetivas, ou medidas de proteção,12 são aquelas efetivadas por meio de ações ou

programas assistenciais, podendo ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa, quando a criança ou o

adolescente estiver em situação de risco13 ou, ainda, quando praticar ato infracional14.

Entre as medidas aplicáveis, temos a matrícula e a frequência obrigatória em estabelecimento

oficial de Ensino Fundamental. Essa medida está diretamente ligada à evasão, normalmente relacionada ao

trabalho infantil e à omissão dos pais, e à infrequência escolar, constatadas pelos serviços de assistência

10

Lei n.º 11.525/2007. 11

Art. 32, § 5.º da LDB. 12

Artigo 101 do ECA. 13

Artigo 98 do ECA. 14

Artigo 105 do ECA.

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social e pelo Conselho Tutelar, órgãos que precisam da atuação conjunta dos agentes de ensino, que,

verificando a impossibilidade de resolução do problema com diálogo e conscientização, têm o dever de

comunicar isso ao Conselho Tutelar.

É importante ressaltar que a aplicação das medidas protetivas não se faz, necessariamente, pela via

judicial. De todas as medidas elencadas pelo artigo 101, somente a inclusão em programa de acolhimento

familiar e a colocação em família substituta não podem ser realizadas pelo Conselho Tutelar.

Por sua vez, as medidas socioeducativas, que não deixam de ser medidas protetivas, são aplicáveis

somente aos adolescentes, cujo comportamento está identificado como crime ou contravenção penal (ato

infracional)15, sem, todavia, ter natureza de pena, isso porque a imputabilidade penal só se inicia aos 18

(dezoito) anos.

A medida socieducativa é a manifestação do Estado, em resposta ao ato infracional, praticado por menores de 18 anos, de natureza jurídica impositiva, sancionatória e retributiva, cuja aplicação objetiva inibir a reincidência, desenvolvida com finalidade pedagógica-educativa. Tem caráter impositivo, porque a medida é aplicada independente da vontade do infrator – com exceção daquelas aplicadas em sede de remissão, que têm finalidade transacional. Além de impositiva, as medidas socioeducativas têm cunho sancionatório, porque com sua ação ou omissão, o infrator quebrou a regra de convivência dirigida a todos. E, por fim, ela pode ser considerada uma medida de natureza retributiva, na medida em que é uma resposta do Estado à prática do ato infracional praticado. (LIBERATTI, 2006, p. 102).

De acordo com o ECA16, as medidas socioeducativas são: advertência, obrigação de reparar o dano,

prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade, internação

em estabelecimento educacional e qualquer uma das medidas protetivas previstas no artigo 101, I a VI do

ECA.

Tendo em vista a opção do legislador em manter e fortalecer os vínculos familiares e comunitários,

prefere-se a aplicação das medidas em meio aberto, sempre que possível. Nesse sentido, a atuação da

escola se mostra extremamente importante, tendo em vista que a oferta de educação aos adolescentes em

conflito com a lei faz parte do processo de ressocialização.

Geralmente, o histórico escolar dos adolescentes em conflito com a lei é uma história de fracasso; a

grande maioria deles abandonou os estudos, sob as mais diversas alegações. Por vezes, esse abandono se

deu em razão da falta de estrutura da escola em atendê-lo.

Lidar com o adolescente em conflito com a lei tem sido um dos grandes desafios do sistema

educacional; de conselhos de classe a seminários e congressos nacionais, todos têm tratado com afinco do

tema. Como reflexo dessas discussões, as quais vêm de longa data, o ECA disciplinou uma política baseada

em mecanismos pedagógicos, cuja proposta é a de uma atuação socioassistencial. Nesse sentido, as

medidas socioeducativas visam educar o adolescente em conflito com a lei para o convívio social e o

15

Artigo 103 do ECA. 16

Artigo 112 do ECA.

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12

exercício da cidadania, evidenciando, assim, a relação direta entre as medidas e o direito fundamental à

educação.

Todavia, não é raro perceber na escola as mesmas representações da sociedade sobre o

adolescente em conflito com a lei: medo, indiferença, pena, dó e piedade, além da compaixão e da

hostilidade, que são os sentimentos mais comuns. O adolescente estigmatizado se apresenta à escola como

um problema, sendo aceito, em algumas instituições, somente sob ordem judicial. Assim, não é raro

perceber o adolescente, que se encontra em situação de vulnerabilidade social entediado com o cotidiano

escolar, apresentando respostas agressivas e intolerantes à forma como é recebido – o marginal, o

problema – e acolhido pela escola – sob olhares que traduzem medo e intolerância.

Segundo TEIXEIRA (2008), compreender as questões relacionadas com a entrada e a permanência

do adolescente em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto na escola implica na

compreensão de que a educação escolar é construída por processos históricos, culturais, econômicos,

sociais, políticos, éticos e psicológicos, pois é na escola que identificamos todas as tensões, todos os

conflitos e antagonismos presentes na convivência coletiva.

Para que a escola possa atuar dentro dos parâmetros estabelecidos pela CF/88, pelo ECA e pela

LDB, o primeiro passo é conhecer o aluno, distanciando-o do ato infracional que cometeu e não

relacionando esse ato a uma patologia do adolescente. Conhecendo o adolescente, fica mais fácil para o

professor estabelecer uma relação de confiança e um diálogo com o aluno. Outro aspecto importante diz

respeito à formação continuada dos profissionais da educação: conhecer as normativas e diretrizes do ECA

deve ser tão importante quanto dominar conteúdos escolares. É imprescindível que o profissional conheça

a natureza das medidas socioeducativas para que o ECA não seja entendido como um instrumento que, tão

somente, defende o adolescente infrator, deixando de lado responsabilidades e deveres.

As escolas devem ser espaços para formação continuada, debate e diálogo que tenham como pauta

temas relacionados com a política de garantia dos direitos da criança e do adolescente. Deve, ainda,

conhecer a realidade local e os órgãos, governamentais e não governamentais, que trabalham na

promoção e na defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes: entidades e associações da sociedade

civil, órgãos públicos, Ministério Público e, principalmente, o Conselho Tutelar. A partir desta proximidade,

poderão, então, trabalhar juntos na promoção e no acompanhamento das medidas impostas ao

adolescente em conflito com a lei.

O adolescente deve ser alvo de um conjunto de ações socioeducativas que contribua na sua formação, de modo que venha a ser um cidadão autônomo e solidário, capaz de se relacionar melhor consigo mesmo, com os outros e com tudo o que integra a sua circunstância e sem reincidir na prática de atos infracionais. Ele deve desenvolver a capacidade de tomar decisões fundamentadas, com critérios para avaliar situações relacionadas ao interesse próprio e ao bem comum, aprendendo com a experiência acumulada individual e social, potencializando sua competência pessoal, relacional, cognitiva e produtiva. (SINASE, 2006, p. 46).

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Segundo PEREIRA E SUDBRACK (2009, p. 259 e 260), com a publicação e a implementação de

normativas nacionais sobre o direito à educação, exigiu-se das escolas públicas a abertura das matrículas

para toda e qualquer criança e adolescente, o que significou a inclusão escolar de uma população infanto-

juvenil com perfil pessoal, social, cultural e econômico diversificado. Parte desse público era constituída por

crianças e adolescentes que costumavam abandonar precocemente a escola, que apresentavam biografia

escolar instável ou eram rejeitados pela escola por indisciplina ou por problemas de aprendizagem. Dentro

desse universo, os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, ou aqueles

egressos das unidades de internação, têm maior dificuldade em aceitação e interesse pela escola, porque

uma interpretação equivocada das disposições do ECA levou ao entendimento da palavra “direito” como

ausência de responsabilidades e deveres, fazendo com que os profissionais da educação acabassem por

culpar o direito da criança e do adolescente pela diminuição da autoridade do professor em sala de aula, a

indisciplina e a violência nas escolas.

Sendo inevitável à escola impedir o acesso dessa classe de alunos, ainda que por ordem judicial, a

ausência do adolescente às aulas, somada ao desconhecimento da rede de proteção, é considerada um

alívio para a comunidade escolar. Assim, aqueles que deveriam auxiliar no processo de ressocialização,

acompanhando o adolescente em cumprimento de medida e procedendo ao preenchimento dos

documentos que visam à reinserção do adolescente na escola e na comunidade, deixam de fazê-lo, não

sendo possível aos Conselhos, Ministério Público e demais órgãos envolvidos na rede de proteção atuar no

combate à evasão escolar e à marginalização do adolescente em conflito com a lei, que passa a carregar o

estigma de infrator. E, uma vez estigmatizado, esse adolescente passa a não ser bem-vindo na escola,

mesmo sendo a educação um direito estabelecido pelas normativas nacionais e internacionais, como, por

exemplo, a Convenção dos Direitos da Criança (ONU, 1989).

Para que a escola possa atuar de forma eficaz no atendimento aos adolescentes em conflito com a

lei, é importante que a política de atendimento traga, em sua concepção, um projeto pedagógico que

organize uma proposta de escolarização, que leve em conta as especificidades que envolvem o tratamento

desses adolescentes, sem esquecer que a grande maioria deles possui defasagem idade-série, dificuldades

de aprendizagem e uma relação difícil de violação de direitos com a escola.

É importante ressaltar que todas as medidas socioeducativas têm natureza pedagógica e, dessa

forma, é de extrema importância que as instituições escolares, seus dirigentes e professores tenham um

entendimento do ECA e relacionem suas normativas às do regimento interno e do projeto pedagógico da

escola.

Como práxis pedagógica, a socioeducação compartilha objetivos e critérios metodológicos próprios de um trabalho social reflexivo, crítico e construtivo, mediante processos educativos orientados à transformação das circunstâncias que limitam a integração social, uma melhora significativa do bem-estar coletivo e, por extensão, a sua legítima aspiração a uma maior qualidade de vida. Como forma de atuar particularmente com o adolescente, a socioeducação se especializa, incorporando elementos convergentes e complementares para o trabalho a ser

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desenvolvido. Assim, deve-se ter claro que é a partir dessa compreensão que se torna possível a construção de uma nova realidade nas escolas. (ZANELLA, 2010, p. 19/20)

Assim, fazem-se necessárias a formação legalista básica e o conhecimento das garantias e direitos

fundamentais das crianças e dos adolescentes para que os profissionais da educação auxiliem no processo

de ressocialização daqueles que, muito cedo, sofreram os impactos da marginalização.

5.2 Política de Atendimento. Rede de Proteção. O Conselho Tutelar.

As políticas públicas, que dizem respeito à criança e ao adolescente, são de responsabilidade de

todos os entes da Federação: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. A política de atendimento vem

disciplinada a partir do artigo 86 do ECA e baseia-se, precipuamente, em políticas sociais, tendo como

objetivo primordial assegurar que os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes sejam

resguardados.

Observa-se aqui a responsabilidade da União para a criação de normas gerais e de coordenação da política de atendimento. A efetivação direta compete ao município. Por exemplo, obrigação do Poder Executivo Municipal em providenciar creches, vagas no ensino fundamental a partir dos seis anos de idade; tratamento de saúde ao menor impossibilitado de por si só bancar o mesmo etc. (ISHIDA, 2010, p. 161).

Assim, visando ao atendimento pleno dessa parcela da população, temos a seguinte divisão de

atuação:

ESFERA ÓRGÃO ATUAÇÃO

Federal Conselho Nacional dos Direitos

da Criança e do Adolescente

Elaborar diretrizes da política

de atendimento

Fundo Nacional para a Criança

e o Adolescente

Administração de recursos

Subsecretaria de Promoção dos

Direitos da Criança e do

Adolescente

Assessoramento da Presidência

Estadual Conselhos Estaduais dos

Direitos da Criança e do

Adolescente

Implementar diretrizes da

política de atendimento

Municipal Conselhos Municipais dos

Direitos da Criança e do

Adolescente

Efetivação das diretrizes da

política de atendimento

Conselhos Tutelares Atuação junto à comunidade

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Todos os órgãos anteriormente identificados são de participação popular e, como órgãos

colegiados, são compostos por uma ala governamental e outra formada por representantes da sociedade

civil. A eles incumbe estabelecer prioridades e definir as políticas de atendimento, bem como a gerência e a

administração de fundos vinculados aos procedimentos menoristas.

Dentro dessa política de atendimento, é importante destacar a atuação das entidades de

atendimento, governamentais e não governamentais, voltadas aos adolescentes e crianças cujos direitos

foram ameaçados ou violados e, também, àqueles em cumprimento de medidas protetivas e

socioeducativas. Os Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente são responsáveis pelo

cadastramento dessas instituições.

A política de atendimento engloba, ainda, a tutela dos adolescentes em conflito com a lei, a guarda

de crianças e adolescentes que, ainda que temporariamente, necessitem ser afastados do convívio familiar

para sua proteção e a internação em clínica de tratamento a dependentes químicos.

A fiscalização das entendidas de atendimento fica a cargo do Ministério Público, do Juízo da

Infância e da Juventude e do Conselho Tutelar, aferindo-se as condições de atendimento estipuladas pelo

artigo 94 do ECA.

Próximo às escolas está o Conselho Tutelar. Criado pelo artigo 131 do ECA, reflete a importância da

participação da sociedade no que diz respeito aos direitos das crianças e dos adolescentes17. A esse

Conselho cabe, precipuamente, a apreciação de questões que envolvem problemas de justiça social, cuja

intervenção judicial não se faz necessária. O Conselho Tutelar possui poder para tomar decisões, mas não é

órgão jurisdicional e, por essa razão, tem sua atuação limitada. É órgão de execução das medidas de

efetivação dos direitos da criança e do adolescente18 e, como órgão de proteção dos interesses das crianças

e dos adolescentes, cumpre ao Conselho Tutelar a aplicação das medidas de proteção nas situações

previstas pelos artigos 98 e 105 do ECA.

Também cabe ao Conselho Tutelar a aplicação das medidas aos pais ou responsáveis e a requisição

de vaga em escolas do Ensino Fundamental. Em caso de negativa à deliberação pelo diretor da escola ou

delegado de ensino, os membros do Conselho Tutelar deverão comunicar o Ministério Público mediante

envio de documentos comprobatórios, para averiguação dos fatos e aplicação da pena prevista no artigo

236 do ECA.

O Conselho Tutelar pode, ainda, requisitar certidão de nascimento e de óbito de crianças e

adolescentes junto aos Cartórios de Registro Civil; realizar abrigamento de menor, em caso de urgência e

emergência, comunicando o fato, imediatamente, ao Juízo da Infância e da Juventude; realizar a

representação ao órgão ministerial ou, diretamente, ao Poder Judiciário de programas ou programações

que contrariem os princípios do artigo 221 da CF/88, bem como daqueles produtos ou serviços que possam

17

Art. 132. Em cada Município haverá, no mínimo, um Conselho Tutelar composto de cinco membros, escolhidos pela Comunidade local para mandato de três anos, permitida uma reeleição. 18

Todas as atribuições dos Conselhos Tutelares estão dispostos no artigo 136 do ECA.

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ser nocivos à saúde e ao meio ambiente; e, por fim, podem, em caso de abuso ou violência sexual,

representar ao Ministério Público, visando à providência adequada.

Tem singular relevância a atenção do Conselho Tutelar para com o Direito à Educação da criança e do adolescente, especialmente o direito à educação escolar e, ainda mais precisamente, o direito ao ensino fundamental. Criança ou adolescente sem matrícula ou excluída da escola, criança ou adolescente sem freqüência regular ou sem aproveitamento adequado, criança ou adolescente com condutas inadequadas no estabelecimento de ensino, criança ou adolescente com sintomas de maus-tratos, são crianças e adolescentes em situação de proteção especial, causa justificadora da pronta atuação do agente tutelar, sempre com vistas à permanência e ao sucesso na Escola. (KONZEN, 2000, p. {s.p.}).

Nesse mesmo contexto, temos a atuação da escola, que, por qualquer um dos profissionais

envolvidos no processo educacional, pode perceber qualquer anomalia no desenvolvimento do aluno, no

que tange às relações familiares e sociais, de aprendizado e desenvolvimento. Assim, ao lado do Conselho

Tutelar, possui o condão de desencadear os processos de providências que visam à proteção de crianças e

adolescentes cujos direitos foram ameaçados ou violados e, ainda, participar do processo de

ressocialização daqueles em conflito com a lei.

O Conselho Tutelar não possui capacidade legal de interferência em assuntos internos da Escola. No entanto, tem plena legitimidade para verificar, por exemplo, o aproveitamento escolar de determinada criança ou adolescente, não com o propósito de interferir na Escola, mas para determinar aos pais ou ao responsável as medidas para a correção das insuficiências, inclusive se as causas do aproveitamento inadequado residirem na Escola, com a possibilidade concreta de determinar aos pais ou ao responsável o acompanhamento da frequência e do aproveitamento escolar (artigo 129, inciso V). Na prática, simples orientação aos pais, chamando-os para o exercício de suas obrigações, não raras vezes já contribui positivamente para a reversão da ambiência de exclusão da Escola. Outras tantas vezes a causa do abandono escolar não está nos pais, mas na atuação da Escola. O Conselho Tutelar pode servir como o agente impulsionador capaz de retirar a instituição escolar do seu isolamento. Para tanto, não é necessário afrontar a Escola, em busca de expiatórios de nenhuma ou de quase nenhuma valia. Impõe-se, no caminho inverso, aliar ao que há de melhor nas escolas, e muito há de exemplar e de aproveitável em metodologia, esforço, criatividade e dedicação em escolas de todo País. (KONZEN, 2000 {s.p.}).

A integração entre escola e Conselho Tutelar está disposta no ECA, que confere aos dirigentes

escolares e aos professores o dever de comunicar aos Conselheiros Tutelares quaisquer casos de maus-

tratos, envolvendo seus alunos, bem como situações de reiteradas e injustificadas ausências e de evasão

escolar. Nas palavras de Konzen (2000), a legislação cercou o direito à educação de inúmeros mecanismos

protetivos. Aos pais ou ao responsável impôs o dever da matrícula, sob pena de abandono intelectual e o

dever de zelar pela frequência à escola, sujeitando-os a medidas, inclusive à possibilidade da perda ou

suspensão do poder familiar. À escola conferiu o dever da chamada e do zelo pela frequência, com as

comunicações e implicações já referidas e aos Conselhos Tutelares, impôs o dever da determinação das

providências destinadas a manter o educando na escola.

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Em síntese, o Direito à Educação, notadamente o direito ao ensino fundamental, enquanto direito público subjetivo e, portanto, direito indisponível, está cercado de um conjunto de atores e de providências, todos destinados a impedir qualquer possibilidade de frustração. O sistema de garantia do Direito à Educação escolar pressupõe a integração desses diversos atores. Na falta ou na falha de um, deve agir o outro. Em auxílio ao esforço de um, deve atuar o outro. Entretanto, não há como visualizar sucesso na atuação desses atores sem a atuação integrada e parceira, especialmente entre os dirigentes do sistema e da instituição escolar e os agentes tutelares. (KONZEN, 2000, p. {s.p.})

Com essa necessidade de atuação, tem-se a concepção de uma nova escola: a escola desafiada a

assumir um papel social, comprometida com a comunidade na qual está inserida e aberta à participação

comunitária. A escola deve ser um agente formador de cidadãos, tendo em vista ter como público-alvo

crianças e adolescentes, pessoas em desenvolvimento.

6. Referências Bibliográficas

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998.

Nesta obra, o autor, diante da evidência de que o direito constitucional se confrontaria com os desafios do

direito constitucional europeu, entendeu pela concretização dos princípios jurídico-constitucionais de suma

importância na teoria dos direitos fundamentais.

CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da Criança e do

Adolescente Anotado. 2. Ed. São Paulo: RT, 1999.

Coordenado por um Procurador de Justiça aposentado (Munir Cury), este trabalho foi idealizado com o

propósito de fornecer aos profissionais e estudantes de Direito e da área social um meio rápido de consulta

à legislação atinente às crianças e aos adolescentes. Durante todo o texto, foram feitas remissões aos

dispositivos legais inter-relacionados com a disciplina.

ELIAS, Roberto João. Direitos Fundamentais da Criança e do Adolescente. São Paulo: Saraiva, 2005.

Este trabalho, elaborado pelo Procurador de Justiça do Estado de São Paulo e professor da Faculdade de

Direito da USP, tem por objeto de estudo a essência do subsistema de normas que protegem a criança e o

adolescente, que corresponde aos direitos fundamentais descritos nos artigos 1.º a 69 do ECA.

_________________. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n.º 8.069/90, de 13 de

Julho de 1990. 4 Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

Observando as evoluções e principais modificações promovidas pelas Leis n.º 11.829/2008, 12.010/2009,

12.015/2009 e 12.038/2009 no ECA, o autor apresenta comentários aos artigos da Lei.

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FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Míni Aurélio. 6.ª Edição Revista e Atualizada. Curitiba, Posigraf,

2004.

GONÇALVES, Hebe Signorini; BRANDÃO, Eduardo Ponte. Psicologia Jurídica no Brasil. 2 Ed. Rio de Janeiro:

Nau Editora, 2008.

A obra apresenta didaticamente, e de forma ampla, um ramo da psicologia que está em franca expansão e

em franco desenvolvimento: a psicologia jurídica. Dividida em capítulos de acordo com as práticas que

envolvem as instituições jurídicas – Varas de Justiça, Conselhos Tutelares, prisões, abrigos, unidades de

internação, entre outras – o livro aborda os muitos e diversos setores e questões de que trata o mundo

jurídico. Psicologia jurídica no Brasil é um livro didático que tem como público-alvo os estudantes de

psicologia, direito e demais interessados no tema.

ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: Doutrina e Jurisprudência. 12 Ed. São Paulo:

Atlas, 2010.

Esta obra contém um resumo de doutrina, indicações legais e a resenha jurisprudencial atualizada referente

a cada um dos artigos do vigente Estatuto da Criança e do Adolescente. Faz menções e inclui comentários às

principais legislações que alteraram dispositivos do ECA e às que têm interferência sobre sua normatização.

KONZEN, Afonso Armando. Conselho Tutelar, escola e família: parcerias em defesa do direito à educação.

Porto Alegre, 2000. Disponível em http://www.mp.rs.gov.br/infancia/doutrina/id194.htm. Acesso em

23/12/2011.

De acordo com o próprio autor, Procurador de Justiça do Rio Grande do Sul, o texto analisa os papéis do

Conselho Tutelar, da Escola e da Família com a educação escolar da criança e do adolescente. Traz à

discussão a ruptura orgânica e cultural introduzida pelo Estatuto, realça a função do Município e reflete

sobre algumas das dificuldades técnico-jurídicas derivadas da concepção, da organização e do

funcionamento do Conselho Tutelar. Por fim, sinaliza para o exercício compartilhado, por todos os

segmentos diretamente envolvidos, da educação escolar da criança e do adolescente.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12 Ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

Esta obra tem enfoque nas perspectivas do neoconstitucionalismo e nas principais decisões do Supremo

Tribunal Federal.

MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade (Coord.). Curso de Direito da Criança e do Adolescente:

Aspectos Teóricos e Práticos. 4 Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

Elaborado por Promotores e Procuradores de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, todos com vivência na

área da infância e da juventude, o Curso não constitui apenas manual prático, posto que realiza estudos

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19

dogmáticos, revelando a formação acadêmica de vários dos autores, o que lhe confere também viés

didático. A coordenação dos trabalhos teve o cuidado de preservar os entendimentos individuais, sem

prejuízo da harmonia do conjunto. Nessa percepção, o Curso, após contextualizar o nascimento do Estatuto

da Criança e do Adolescente, examina a doutrina da proteção integral e seus princípios orientadores,

dedicando capítulo especial aos direitos fundamentais da criança e do adolescente. Segue-se análise

minuciosa das disposições estatutárias, que não perde de vista o papel essencial dessas normas: o de

mediadoras das relações entre a criança, o adolescente e a sociedade em que vivem atentas à sua condição

especial de pessoa em desenvolvimento. O estudo levado a efeito tem natureza interdisciplinar, incluindo

temas muitas vezes preteridos, como a rede e a política de atendimento, as infrações administrativas e as

medidas judiciais e extrajudiciais que dão efetividade ao Estatuto. Examinam-se o ato infracional e os

crimes em espécie.

PAULA, Paulo Affonso Garrido de. Educação. Direito e Cidadania. In: Cadernos de direito da criança e do

adolescente. Vol. I. São Paulo: Malheiros, 1995.

Esta coleção traz diversos artigos cuja temática da infância e da juventude é abordada por vários autores

especialistas na matéria, como Luiz Carlos de Barros Figueiredo, Wilson Donizeti Liberati, Paulo Afonso

Garrido de Paula. Traz, ainda, jurisprudência especializada sobre a matéria.

PEREIRA, Sandra Eni; SUDBRACK, M. Fátima. A formação dos grupos na adolescência: A escola que exclui.

In: Cadernos de Resumos. XIII Colóquio Internacional de Psicossociologia e Sociologia Clínica. Belo

Horizonte, 2009. p. 259 e 260.

Este artigo é o resultado das pesquisas de doutorado realizadas pela primeira autora, com a orientação da

segunda. O objetivo foi buscar compreender o processo de construção das relações do adolescente nos seus

espaços de socialização e as implicações deste nos riscos de envolvimento com o contexto do tráfico de

drogas e da violência.

SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo. Secretaria Especial dos Direitos Humanos.

Brasília: Conanda, 2006.

Em comemoração aos 16 anos da edição do Estatuto da Criança e do Adolescente, a Secretaria Especial dos

Direitos Humanos da Presidência da República e o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do

Adolescente apresentaram o “Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE”, fruto de uma

construção coletiva que envolveu diversas áreas de governo, representantes de entidades e especialistas na

área. O resultado desses estudos foi publicado em 2006 e serve de parâmetro para todos os estudos que

envolvam as temáticas do Estatuto da Criança e do Adolescente.

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TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi. Uma relação delicada: a escola e o adolescente. São Paulo, 2008.

Disponível em http://www.promenino.org.br/Ferramentas/Conteudo/tabid/77/ConteudoId/88cc0cd9-

2ae1-42a2-bc8f-31b2f9f1f6d9/Default.aspx. Acesso em 23 de dezembro de 2011.

Estudando a tendência mundial à universalização da escolarização, a autora se deparou com os inúmeros

desafios éticos, políticos, técnicos e de orçamento a serem pensados por todos os setores da sociedade.

Conclui, então, que esses desafios se revelam nas escolas dos bairros pobres na falta de pessoal para

atender os alunos, na superlotação das salas, na falta de espaço físico adequado, no número excessivo de

períodos escolares, na diversidade de níveis de ensino, na ausência de integração com a comunidade, na

questão salarial dos professores. Em síntese, com este artigo, a autora busca entender e superar o desafio

da precariedade da qualidade do ensino que é oferecido a todos os adolescentes, educandos do sistema

público de ensino.

ZANELLA, Maria Nilvane. Adolescente em conflito com a lei e escola: uma relação possível? In: Revista

Brasileira Adolescência e Conflitualidade n.º 03. São Paulo: Uniban, 20140.

Este artigo trata dos desafios e contradições que envolvem a inclusão escolar dos adolescentes, focalizando

especialmente aqueles que estão em situação de conflito com a lei, cuja trajetória escolar tem sido a de

abandono, evasão ou desinteresse pela escola. Veremos ainda algumas tentativas de resposta institucional

diante das dificuldades do processo de escolarização desses adolescentes em diferentes momentos do

cumprimento da medida socioeducativa.