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CONSTRUÇÃO DA CLASSE MÉDIA NO BRASIL E SUAS RELAÇÕES COM AS FORMAS DE CONSUMO E DA FECUNDIDADE Camila Silva Bezerra* Moises Alberto Calle Aguirre** Wendella Sara Costa da Silva*** Ana Maria Ribeiro Lucas**** Palavras-chave: Classe social; Classe Média; Consumo; Fecundidade. *mestranda do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte **docente do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte ***mestranda do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte ****mestranda do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte Trabalho apresentado no VII Congreso de la Asociación LatinoAmericana de Población e XX Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Foz do Iguaçu/PR Brasil, de 17 a 22 de outubro de 2016.

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CONSTRUÇÃO DA CLASSE MÉDIA NO BRASIL E SUAS RELAÇÕES COM

AS FORMAS DE CONSUMO E DA FECUNDIDADE

Camila Silva Bezerra*

Moises Alberto Calle Aguirre**

Wendella Sara Costa da Silva***

Ana Maria Ribeiro Lucas****

Palavras-chave: Classe social; Classe Média; Consumo; Fecundidade.

*mestranda do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte

**docente do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte

***mestranda do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte

****mestranda do Programa de Pós-gradução em Demografia da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte

Trabalho apresentado no VII Congreso de la Asociación LatinoAmericana de Población e XX Encontro

Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Foz do Iguaçu/PR – Brasil, de 17 a 22 de outubro de 2016.

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CONSTRUÇÃO DA CLASSE MÉDIA NO BRASIL E SUAS RELAÇÕES COM

AS FORMAS DE CONSUMO E DA FECUNDIDADE

1. INTRODUÇÃO

Nos últimos anos no Brasil houve projetos sociais que buscaram a erradicação

das condições de miséria das classes inferiorizadas sócio e economicamente. Com um

impulso maior, as tentativas da economia política nacional de tirar pessoas que estavam

abaixo da linha da pobreza e dar condições melhores para que houvesse maior

emancipação social foram ficando cada vez mais fortes. Dessa forma, era importante

que a população, por meio de políticas de estímulo de consumo, garantisse uma melhor

qualidade de vida, o que teve o apoio do Estado.

O programa Bolsa Família foi uma das estratégias do governo brasileiro dos

últimos anos para dinamizar a economia no que diz respeito às classes vulneráveis,

tendo em vista que é um programa de transferência de renda.De modo que primeiro se

propiciasse à população meios de então sair das situações econômicas vulneráveis e

auxiliar os indivíduos a se projetarem para classes sociais mais estruturadas

economicamente.

O consumo de bens duráveis funciona também como o precursor de uma

mobilidade de classes, e vem aumentando principalmente o número de pessoas nas

chamadas classes "C" e "B". E numa articulação entre mercado interno de bens duráveis

e financiamentos, dando acesso ao crédito por juros menores, o governo brasileiro então

conseguiu seus momentos de estímulo ao consumo e ampliação das condições de renda

que sustentassem as antigas condições de classe. Isso passou a ser a principal manobra

tanto do poder de consumo das classes média tradicional e da chamada "Nova Classe

Média", que pelos grifos dos sociólogos Jessé de Souza e Amaury Souza (2010), surgiu

há mais ou menos dez anos, justamente por esse acordo da economia política nacional

de estímulo ao consumo.

O que aconteceu no Brasil referente ao desenvolvimento econômico foi também

uma relação das políticas públicas sociais para atingir os objetivos de bem-estar da

sociedade. Programas como “Bolsa Família”, ajudaram a aumentar principalmente o

acesso dos seus beneficiários aos sistemas de saúde e educação, além da redução dos

índices de pobreza e miséria. Tudo isso seguiu para uma espécie de emancipação social,

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onde as mulheres passaram a ter mais acesso as políticas de saúde reprodutiva,

colaborando para que houvesse uma redução nas taxas de fecundidade e ampliando,

principalmente, sua introdução ao mercado de trabalho.

A mensuração de dados que transportem as estimativas sobre a redução da

pobreza no Brasil indicam que, em 2001, 52,5% da população estava abaixo do patamar

dos rendimentos mínimos. Em 2011, essa proporção foi reduzida para 25,8%. Desse

modo, alguns autores relacionam que sistemas financeiros e crescimento econômico da

população estejam diretamente correlacionados:

"Avaliações empíricas diversas indicam que o desenvolvimento

do sistema financeiro - entendido, de forma genérica, como a

melhoria na qualidade, quantidade e eficiência dos produtos do

setor - exerce um efeito positivo sobre a trajetória das taxas de

crescimento econômico, especialmente pela capacidade de

estimular os níveis de produto e emprego dos diversos países.

Ademais, crescente ênfase tem sido depositada no acesso aos

serviços financeiros, como elemento essencial à promoção do

desenvolvimento, especialmente por sua capacidade de afetar o

comportamento da economia, da pobreza e da equalização da

renda." (FIALHO; JAYME JR; HERMETO, 2013).

Considera-se então que uma das políticas mais bem aproveitadas no Brasil nos

últimos dez anos foi à ampliação de crédito para a inclusão da população de menor

renda no sistema financeiro. Acredita-se que um sistema financeiro pouco desenvolvido

concorre para a persistência da pobreza, e restringe a população à equalização da renda

(FIALHO; JAYME JR; HERMETO, 2013), e a renda é um dos fatores diretos que

condicionam a situação da classe social.

O que praticamente acontece é que não existe apenas uma forma de organizar a

fecundidade de acordo com as posses ou consumos. Um fator que será importante de

observar é como as estruturas das classes sociais, e os indivíduos distribuídos em

classes, influenciam nos padrões de reprodução de forma mais social do que apenas

observar sobre a vertente econômica. Ou seja, de que forma a influência se consolida até

que se criem a cultura de famílias cada vez menores com poucos ou nenhum filho.

Com o envolvimento dos estudos da Sociologia, Política, Demografia e

Economia, ficará mais colaborativo o quadro analítico do retrato demográfico da

sociedade brasileira nessa mobilidade de classes.

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2. REVISÃO DA LITERATURA

Ao dissertar sobre os conceitos de classe social e fecundidade, de modo que

estejam relacionados não apenas a compreensão econômica da dimensão dessa

abordagem, mas o que se procura compreender são as formas estruturantes da

fecundidade a partir das abordagens sócio-culturais, como uma nova perspectiva sobre a

concepção sobre os aportes sociais e econômicos que engendram a cultura de que “cada

vez ter menos filhos”.

2.1. Classe social e consumo

Ao abordar primeiramente os casos e fatos determinantes das classes sociais,

primeiramente devemos entender os determinantes que tipificam as distinções de

classes, principalmente no que concerne a classe média. A fração de classe média no

Brasil é elencada por dois momentos: no primeiro temos a estabilidade econômica que é

própria de uma classe média tradicional. A segunda fração é a de nova classe média,

esta vem do curso do efeito das políticas de transferência de renda e acesso ao

microcrédito. Essas tentativas de tipificar os quadros da classe média são do trabalho do

sociólogo Jessé de Souza que elenca vertentes weberianas para um tipo ideal de classe

média, pautada na relação de valores comuns. Além dessa contribuição, Bourdieu

(2005) também é um autor importante para essas medidas de classe do trabalho de

Souza (2010), enquadrando princípios diretos de classe social e suas relativas posições.

A estratificação das classes sociais é dada primeiramente por condições sociais

baseadas na posição econômica. Tais condicionantes podem influenciar a mobilidade

social de estratos hierarquicamente definidos desde inferiores a superiores. Nas

distinções Weberianas de classe, status e poder, a classe social se caracteriza como

sendo a forma de estratificação social onde os indivíduos apresentam um agrupamento

com características similares, ou seja, uma identidade de classe.

Weber também julgava a "situação de classe" como resultante de divisões

econômicas alicerçadas em relações de propriedade e de mercado (SCOTT, 1996).

Porém, essa visão é bem menos metódica economicamente, quando as situações de

classe apontadas por Weber são usadas para gerar renda e capacidade de garantir

oportunidades de vida apenas mediadas pelo mercado. Nessa situação, se pensa em

como as pessoas ocupam as posições sociais onde o sentido econômico é visto como um

"componente causal" que molda as condições de vida até a produção do capital social.

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Nas teorias weberianas, classes sociais partiam da ordem da relação dos

indivíduos com as condições materiais diferenciando de outros fenômenos sociais. No

modelo weberiano, além da propriedade, os indivíduos se distribuem e se distinguem

em classes através também de suas qualificações e habilidades dispostos no mercado.

Ou seja, não apenas o proprietário e o trabalhador se estruturam nas classes, mas,

reconhece-se nesse ponto, a forma como outros trabalhadores se distribuem no mercado:

o grupo que vende seu trabalho qualificado e habilitado em condições formais.

Desse modo, as classes sociais podem ser demograficamente formadas sempre

que os padrões de mobilidade, interação e associação estão ligados aos indivíduos

distribuídos em classes. No método de Goldthorpe, a taxa e o padrão da mobilidade são

o que determinam o grau em que as classes podem ser reconhecidas como coletividades

de indivíduos ou famílias que ocupam posições semelhantes dentro da divisão social do

trabalho ao longo do tempo. Até aqui temos explicações nas abordagens de classes

econômicas distribuídas socialmente, mas observaremos no sentido social como se faz a

distinção dessas classes.

A situação de classe ainda é medida de acordo com alguns princípios definidos

por Bourdieu (2005). A distinção das classes sociais, que ocupam posições sociais

estruturalmente diferentes, é feita pelo que o autor chama de "propriedades de posição",

que são basicamente características econômicas, sociais e culturais que trazem os

aspectos de identidade das classes sociais:

"colocados em posições sociais estruturalmente

diferentes, eles se distinguem por inúmeras condutas e atitudes

dos indivíduos com os quais podem partilhar certas

características econômicas sociais e culturais." (BOURDIEU,

2005).

As classes sociais altas (ricas ou elite), em termos mais genéricos é tido como o

grupo poderoso, favorecido, qualificado, privilegiado ou superior. As elites se

distinguem das demais classes por ser o grupo que detém o poder, os colocando numa

hierarquia de comando. Os membros da elite se associam entre si e criam uma rede de

interação social onde constituem influência não apenas social, mas política também, e

nesse sentido, além de possuírem os meios de produção, influenciam em determinantes

políticos que recaem sobre todas as demais classes.

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No outro sentido, em oposição às classes ricas, estão as classes baixas, pobres ou

ralés. Sendo caracterizadas mais pela falta de recursos para aquisição de bens e serviços,

ou para atingir o padrão de vida institucionalmente aceitável pelas classes altas e

médias, as classes pobres e baixas ainda sofrem com outros fatores da desigualdade

social como nos acessos a saúde e educação e nas oportunidades de mercado. Dessa

forma, a ralé é a classe vítima por excelência do abandono social e político (SOUZA,

2010). A pobreza ainda possui formas de mensuração através do que é chamado "linha

da pobreza", ou seja, o calculo que distingue a pobreza absoluta e a relativa. Alguns

autores abordam que a pobreza absoluta é fixa, enquanto que a relativa se move de

acordo com as alterações na distribuição geral de renda, implicando que a pobreza é

vinculada à realização de necessidades mínimas nos orçamentos familiares em

alimentação, por exemplo.

Para trabalhar as proposições das classes médias, além da distinção da posse de

bens materiais, as condições de comparabilidade entre as classes altas e baixas também

de refere a conduta social das mesmas. Menos determinadas que os fatores materiais, as

condutas é parte importante da dinâmica estrutural da condição de classe. É um dos

elementos de posição social e cultural que distinguem entre as classes, e que se faz

reconhecer entre os grupos. O que podemos ainda explorar sobre a abordagem que

Bourdieu faz nesse sentido, é que as classes não se distinguem apenas no sentido

estaticamente econômico, estilo de vida, valores para ascensão social são elementos

socioculturais que traçam as linhas entre as classes sociais.

Ainda de acordo com os princípios de Bourdieu, é preciso entender não apenas

as características que as diferentes classes sociais elencam, sendo necessária a

compreensão sobre o "peso funcional" que as classes exercem na estrutura social e suas

contribuições. No caso do nosso estudo, as classes médias são entendidas no contexto

atual como fundamentais nas sustentações econômicas e políticas, e no caso do Brasil,

as classes médias já podem ser entendidas como uma classe dominante tanto pela

influência no mercado e para o Estado quanto no contexto numérico.

Toda essa abordagem acerca das distinções de classe se dão também a partir da

perspectiva weberiana da ordem propriamente social. A hierarquia social formulada em

questão se define porque os indivíduos compartilham a mesma situação de classe por

compartilharem da mesma condição econômica, onde estariam disposto nas mesmas

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condição de consumo de bens e distribuídos nas mesmas condições de trabalho, de

forma a construírem o status social. É nessa distribuição social de ordem econômica de

consumo e trabalho que os indivíduos criam suas relações de interdependência segundo

suas sociedades. Com isso a construção de classes e de redes sociais organizam as

relações de interdependência em volta da distribuição e utilização das prestações

econômicas.

Ainda sobre as perspectivas weberianas de representação das classes sociais,

John H. Goldthorpe, juntamente com outros pesquisadores de Oxford, desenvolveram,

na década de 1970, um esquema teórico de reconhecimento de classes sociais, mais

detalhado do que o plano macroestrutural weberiano. Para isso, Goldthorpe desenvolve

o seguinte esquema de classes:

Fonte: GOLDTHORPE, John. Social Mobility and Class Structure in Modern Britain. – Oxford University Press, 1987.

Da forma como Goldthorpe distribui suas classes sociais pelas classes de

trabalhos, representa que o enquadramento profissional pode ser um elemento de

medida para o reconhecimento de classes. E sobre esse aspecto que podemos observar

como as influências weberianas persistem também na abordagem de Goldthorpe, pois o

autor compartilha do sentido de pertencimento de classe sobre a posição do indivíduo

nas ocupações profissionais.

O esquema de Goldthorpe não apenas desenha a estrutura de uma classe social

distribuída em posições de trabalho, mas se faz também sobre a posição na estrutura

econômica e nas relações de mercado. Ocorre que no plano social, as classes nesse

sentido não devem ser compreendidas como estruturas hierarquicamente sólidas, mas o

que Goldthorpe trás é uma função de identidade de classe pelo mercado e trabalho, e

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distribuído dessa forma podemos compreender como os indivíduos podem fazer suas

mobilidades entre classes de modo que avancem ou declinem na estrutura.

Existe certa dificuldade de se trabalhar com as problemáticas que envolvem a

constituição e o funcionamento da "nova classe média", por essa ser um fenômeno

socioeconômico não muito nítido, e que está emergindo, principalmente, a partir da

instrumentalização política dos governos dos presidentes do Partido dos Trabalhadores.

Para o sociólogo Jessé de Souza (2010), a classe média também é considerada uma

classe dominante pela apropriação privilegiada do capital e indispensável para o

funcionamento do mercado e do Estado.

O que foi observado no Brasil nos últimos anos foi a institucionalização de

programas sociais de combate e erradicação da miséria do país. Tais programas, além de

combater a extrema pobreza, acabaram dando oportunidade de mobilidade de classes

sociais, o que acaba se desenvolvendo num projeto revolucionário da política

econômica do país, elevando as condições de renda e consumo, que conseqüentemente,

fez com que houvesse uma migração populacional das classes mais baixas para

situações de equidade com a classe média.

Com tudo isso, é por meio do consumo, que os estratos mais baixos e

vulneráveis da população, conseguem ser incluídos nos estratos considerados mais

altos. O que muito se especulou nos últimos anos é que as pessoas puderam ascender

socialmente para a classe média devido ao aumento da renda, e aproveitando uma

situação política de juros mais baixos e facilidade nos processos de financiamento. Tudo

isso deu ao grupo de pessoas para a nova classe média, a possibilidade de migrar de

uma situação de classe para outra.

Essa classe média brasileira é responsável pelo desenvolvimento econômico nos

últimos anos, principalmente no que se relaciona ao mercado interno. Esse estrato social

dinamizou a economia principalmente através do consumo de bens duráveis e a

implantação de pequenos empreendimentos. A variável mais utilizada para a distinção

de classe social é a renda per capita, porém, essa não deva ser a única variável a ser

considerada, e a renda é uma, entre as outras variáveis, que são relativas causas

definidoras para haver a distinção da classe média de acordo com o Amaury de Souza

(2010), que nas palavras do autor:

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"As fronteiras da classe média, no entanto, serão diferentes caso

se focalize a renda em termos relativos, com base na

comparação ao longo de um gradiente, ou em termos absolutos,

fundamentando-se em parâmetros fixos." (SOUZA, 2010).

O que ele busca explicar é que a variação da distribuição de renda pode

modificar toda a concepção de mensuração da classe média. O autor ainda explica que:

"O critério de valor absoluto evitaria este problema, mas

também excluiria pessoas que, mesmo sendo reconhecidas

como de classe média, ganham abaixo de determinada faixa de

renda." (SOUZA, 2010).

Com isso, temos que considerar outras variáveis respectivas as condições de

classificação de um indivíduo de classe média, características do habitus que os

personagens sociais possuem para serem inseridos numa classe média. Entre essas

abordagens, por exemplo, considerar a compreensão da população na busca por

melhores condições de saúde e acesso à educação que permitisse maior qualificação.

Aqui, a nova classe média aparece como aquela movida pelo assistencialismo do

governo federal, e elevou seus níveis de qualificação profissional.

Entre as séries de atividades das classes sociais frente as suas colaborações em

relação ao trabalho e mercado, está a relação direta com o consumo. É observado que o

consumo é um dos elementos que condicionam os indivíduos dentro de determinadas

classes sociais, ou seja, não apenas as formas comuns de consumo, mas o que

chamaremos aqui de "padrões de consumo" que norteam a vida política, econômica e

social.

Sobre as abordagens weberianas ainda, a estratificação social dada pela riqueza e

prestígio é que temos Veblen (1965) que converge em tirar o consumo do ponto em que

o indivíduo não consome apenas para a satisfação de suas necessidades básicas, mas que

busca atingir um status de pertencimento a determinada classe social.Nos termos mais

recentes de mobilidade de classes através das condições de consumo, as periferias

brasileiras apresentaram um movimento cultural bastante peculiares, onde se fazem

práticas populares de consumo que buscam acesso ao que é reconhecido como "luxo".

Só com a construção de equipamentos de consumo é que os espaços periféricos podem

corporificar a riqueza de forma a criar uma nova identidade de classe, mas está apenas

dentro dos parâmetros do consumo (SCIRÉ, 2010).

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Porém, apontar apenas essas condições econômicas é quase que delimitar,

numericamente, o perfil de um indivíduo dentro da classe média. Mas um dos fatores a

partir da condição social e econômica se forma no status que o indivíduo assume na

representação de classe. O consumo de bens materiais e duráveis, como automóveis, por

exemplo, trazem essa sensação simbólica de que o indivíduo precisa para assumir um

status dentro de determinada classe social. Quando essa proporção consumista aumenta,

de forma que se possa assumir uma nova condição de vida, então o individuo já pode

assumir a classificação de classe média. A mobilidade da classe baixa para a classe

média, da ao indivíduo a condição de ser pertencente a “nova classe média”.

2.2. Classe social e fecundidade

Não apenas as classes sociais são elementos da construção das sociedades

urbanas e industriais. As transições demográficas participam de todo o molde que

estrutura as sociedades modernas. No caso de uma "transição da fecundidade",

configurada como uma "transição autônoma" da Demografia, se constitui num aspecto

fundamental, tendo em vista que sua configuração molda o padrão de gerações dentro

de uma sociedade ou população.

Por essa teoria, os novos padrões procriação e estruturação das famílias não

depende apenas das organizações sexuais e das uniões conjugais, e saem das

constituições de proles para moldes mais controlados de reprodução, que são

internalizados socialmente. Dada a regulação social é que se configura um padrão de

reprodução:

“A precedência que se dá aos controles de tipo expansivo ou de

tipo restritivo sobre a procriação depende do teor pró-natalista

ou anti-natalista das ideologias dominantes." (SOUZA, 2003).

Geralmente, as forças dominantes são constituídas do poder econômico,

podendo ser institucionalizado através dos padrões de consumo, que além de criarem

um padrão de vida a ser atingido e propagado, difundem os padrões de reprodução e

criação de filhos.

Mais ainda na lógica de como as transições demográficas se relacionam com o

crescimento e desenvolvimento econômico, as proporções das pesquisas econômicas

que inferem diretamente na população, Paiva e Wajnman (2005) elencam uma série de

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estudos que abordam diretamente o crescimento populacional ligado ao crescimento

econômico, e assim, considerando a distribuição de renda como um dos fatores de

desenvolvimento. Esse ponto se concentra mais no fato de que o aumento da População

em Idade Ativa (PIA) é que está “positivamente relacionado com o aumento da

poupança e da produtividade” (PAIVA; WAJNMAN, 2005).

Ainda com análises empíricas, podemos observar estimativas acerca dos

parâmetros que refletem a imagem de uma crescente população em idade ativa, e estas

podem estruturar as condições e classificações de classe social, procurando observar

principalmente como o aumento da PIA e a redução dos índices de fecundidade podem

ser responsáveis, juntamente com políticas sociais e econômicas, pela mobilidade das

situações de classe.

Pochmann (2012) aprofunda mais essas questões sobre a nova classe média

analisando a estrutura da pirâmide social brasileira. Para o autor, os resgatados da

pobreza, mesmo com baixos níveis de escolaridade, de uma classe trabalhadora se

configuram numa então nova classe média. A distribuição de renda e o acesso mais

facilitado do consumo por essas massas talvez intensifiquem mais o crescimento que foi

dado à nova classe média nos últimos anos.

Esse movimento de criação da nova classe média trouxe também dados

interessantes nas projeções populacionais que muito se relacionam com as questões

econômicas. Isso decorre da busca pelo desenvolvimento econômico com princípios

malthusianos de controle da população para o controle dos gastos econômicos. No

Brasil, isso veio através da Lei nº 9.263/96 no governo do presidente Fernando

Henrique Cardoso, que tinha como pauta principal a propagação do planejamento

familiar gratuito para procurar aumentar o desenvolvimento.

Segundo esses princípios, regular a fecundidade dos pobres seria um combate à

pobreza, e tendo o desenvolvimento como o melhor método contraceptivo. De fato, o

plano continuou em 2005 com a "Política Nacional de Direitos Sexuais e Direitos

Reprodutivos", e com o aumento da inserção da mulher no mercado de trabalho, a

composição da renda familiar foi sendo alterada até que fosse buscada a redução da

pobreza.

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Ainda assim, os diferenciais por classe social no comportamento reprodutivo e

na prática reprodutiva no Brasil sofrem com algumas disparidades. A produção dos

indivíduos em classes sociais já é um fenômeno que ocorre antes das disparidades

econômicas. De fato, a ausência de políticas públicas no Brasil sobre o efetivo

planejamento familiar para as mulheres pobres é nítido, o que causa o chamado "efeito

perverso" no aumento na demanda por meios de regulação da fecundidade (FARIA,

1989). O que acontece é que entre as mulheres pobres faltam alternativas para o

controle da fecundidade justamente pela falta de poder econômico e a pouca

participação do Estado, e cria uma porcentagem muito alta de "mães solteiras com

filhos" - nas classes alta/média dominante e nova classe trabalhadora, temos 14,1% e

18,9% respectivamente - enquanto que nas ralés são 23,8% o número de mães com

filhos.

Os padrões reprodutivos são diferenciados por classes, tendo muito mais

enfoque para famílias nucleares (com pai, mãe e filhos) nas classes alta e média do que

nas pobres ou baixas, onde também se conhece que se tem taxas de fecundidade mais

elevadas e entre as idades das mães mais jovens do que nas classes mais altas. Dessa

forma é muito mais difícil para mulheres pobres conseguirem implementar suas

preferências reprodutivas, pois mesmo com alguns serviços públicos de planejamento

familiar, os métodos ainda são bastante escassos.

Alguns autores elencam que as condições socioeconômicas são a principal força

que provoca a transição da fecundidade. John Bongaarts (1996), ao trabalhar a

fecundidade em redes sociais, observa que a interação social é considerada elemento

importante para além do desenvolvimento econômico apenas. As relações sociais têm

poder de inibir a mudança da fecundidade o que é transmitido socialmente por meio de

influências institucionalizadas, ou o que podemos chamar de “padrões” ou “estilo de

vida”, e o comportamento da fecundidade nessa concepção acaba tomando forma graças

a essas influências. Assim, o poder econômico não é determinante nas relações da

fecundidade, é o fator social que influencia com mais ênfase nesse cenário.

Praticamente no mesmo ponto, Laura Bernardi (2003) enfatiza a relação das

mulheres e as relações maritais sobre a geração de filhos. O planejamento familiar

continua sendo uma idéia difundida muito mais socialmente do que economicamente, e

as interações sociais que contribuem para a mudança das representações

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comportamentais de reprodução, ou seja, o meio social que influencia na decisão do

casal sobre ter ou não filhos.

A abordagem do trabalho de Coleman (1988) faz uma referência mais direta

com o que propomos investigar sem tirar a atenção das relações sociais, mas com o um

elemento considerável sobre o “capital social” ao qual o autor o apresenta sobre o tripé

dos capitais econômicos, cultural e humano. O capital social é dependente da

confiabilidade social, e da capacidade de informações de fluxo da estrutura social, o que

ajuda na formação do capital humano e cultural com relação ao aumento da

escolaridade.

O aumento da escolaridade, principalmente entre as mulheres, é um fator

indireto de redução dos níveis da fecundidade (BONGAARTS, 1978) assim como o

fator renda. Outras variáveis são observadas pelo autor para medir o impacto

socioeconômico sobre a fecundidade, e que acabam servindo para formulação de

políticas. Bongaarts (1978) observa como variáveis diretas de medidas dos níveis da

fecundidade os casamentos tardios e os usos de contraceptivos.

Mas quando Coleman (1988) trabalha sobre os efeitos do capital social, já

podemos ter uma idéia de que os investimentos nesse tipo de capital não é algo

expandido, seus agentes investem em benefício próprio, seja família, ou seja,

individualmente. Esse pensamento de investimento pessoal por conquistas profissionais

como vemos em Bongaarts (1978) e Coleman (1988), é um dos principais elementos

que são institucionalizados socialmente pelas e para as mulheres como um fator que

afeta as quedas nos níveis da fecundidade.

Aos poucos se consegue entender como a geração e criação de filhos é pensada

de forma a se enquadrar nas possibilidades de investimentos pessoais, ou seja, aos

poucos o planejamento familiar vai tomando base e estrutura. Mas, o que pode ser

preocupante para alguns estudiosos sobre as quedas cada vez mais freqüentes dos níveis

da fecundidade, pode não assustar outros como John Caldwell (1976) que em seu

trabalho busca compreender essas quedas sem fazer preconceitos sobre os programas de

planejamento familiar afetarem o tamanho das populações.

As classes médias e altas foram às pioneiras nos processo de queda dos níveis de

fecundidade na America Latina a partir dos anos 60, e nos anos 70 deu-se inicio ao

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processo de transição da fecundidade na região. Um dos fatores que colaboraram para

esse processo foi às tendências de urbanização onde se encontram as classes sociais.

A queda da fecundidade no Brasil a partir dos anos 70, fez com que o país

entrasse no século XXI com níveis de fecundidade dentro da medida de reposição (2,1

filhos por mulher), segundo Perpétuo e Wong (2003). Considera-se um perfil bastante

homogêneo para o país com tantas diferenças socioeconômicas, desse modo, o Brasil

passou a aderir um modelo reduzido de família, alcançado por meios disseminados de

controle da fecundidade. O Estado brasileiro, no entanto, não contribuiu com políticas

diretas de planejamento familiar, mas, políticas e programas que acabaram propagando

uma cultura da preferência por famílias pequenas, e a política econômica se torna o

maior impacto na institucionalização da fecundidade a níveis reduzidos no país.

A menor incidência de filhos também não foi o único fator para a construção da

nova classe média, elevar os índices de qualificação profissional e educacional da

população é uma das condições propostas pelo programa Bolsa Família, o que facilitaria

também a inserção de mulheres no mercado de trabalho. Além disso, a constituição das

famílias foi sendo modificada, menos filhos passou a significar menos dispêndio

financeiro, menos gastos com consumo doméstico e a quase erradicação da produção de

proles, que era necessário que os filhos trabalhassem para ajudar no sustento familiar.

Á nível de Nordeste, uma das regiões consideradas mais pobres do país, esse

declínio dos níveis de fecundidade foram ainda mais significativos, principalmente nas

parcelas mais pobres da população (PERPÉTUO, 1998). Esse movimento foi suficiente

para desaparecer alguns diferenciais socioeconômicos de esterilização, porém, há de se

observar que mesmo com a redução dos níveis, a região nordeste ainda concentra uma

fecundidade entre as idades mais jovens da mãe, diferente do que ocorre em outras

regiões além da Norte. O que mais teve impacto para difusão da idéia de ter menos

filhos no Brasil, não foram políticas de planejamento familiar como visto anteriormente,

até porque a transição da fecundidade no Brasil recebia muito mais impacto de

movimentos feministas que propagavam os direitos da saúde da mulher (CARVALHO,

2005).

Teorias pessimistas quanto aos programas sociais de assistência e distribuição de

renda no Brasil acabam sendo revisadas. Especulava-se que quanto mais uma mulher

recebesse auxílio como do Bolsa Família, mais filhos essa mulher teria. Ter mais filhos

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significa consumir muito mais do que produz, e que recai sobre as condições de

pobreza. Porém, não foi isso que aconteceu no Brasil. Com mais acessos aos sistemas

de saúde, inserção no sistema educacional, a realidade foi se reformulando, podendo até

observar que atualmente no Brasil existe um crescimento da população que mais produz

do que consome, ou seja, uma população economicamente ativa.

Em 2000, apenas 6% das mulheres tinham um regime alto de fecundidade, de 5

ou mais filhos por mulher, o que contrasta com os dados de 1991 que esse número

correspondia à 11% das mulheres (CAVENAGHI; BERQUÓ, 2004). Os níveis de

fecundidade são divergentes entre mulheres de grupos sociais distintos, e com os

impactos das variáveis socioeconômicas, que afetam os movimentos comportamentais,

culturais e institucionais, as tendências da fecundidade variam de acordo com os fatores.

Em 2000, mais de 50% das mulheres já atingiam níveis baixos de fecundidade no Brasil

(CAVENAGHI; BERQUÓ, 2004).

Os padrões de criação e geração dos filhos se alteram através do tempo por

fatores macro-econômicos e sociopolíticos e se consolidam nas carreiras reprodutivas

(SOUZA, 2005) entre grupos sociais distintos e sobre diferentes aspectos. Grupos de

mulheres mais pobres, com poucos anos de escolaridade (3 anos ou menos) possuem

índices de fecundidade mais elevados, e se apresentando ainda semelhante ao quadro de

mulher com 4 a 7 anos de escolaridade (SOUZA, 2005). Dentro desse cenário, a

hipótese é clara de que pouca ou escolaridade básica não constitui novos padrões de

qualificação pessoal e profissional, deixando ainda as mulheres disposta as piores

situações de trabalho e remuneração.

Em contrapartida, mulheres com mais anos de escolaridade, principalmente as

que detêm o 3º grau de escolaridade, tendem a iniciar sua carreira reprodutiva mais

tardiamente (aos 30 a 34 anos de idade), e dessa forma produzirem menos ou nenhum

filho (quase 50% das mulheres desse grupo não possuem filhos, de acordo com o Censo

de 2000 no estado da Bahia). Os padrões de procriação não são apenas distintos em

números de filhos tidos, mas também se diferenciam nas práticas sexuais, onde as

mulheres jovens (15 a 19 de idade) dos estratos sociais mais altos, não iniciaram ainda

suas carreiras reprodutivas, em detrimentos das mulheres de mesma faixa etária de

classes sociais mais baixas. Mas ainda deve haver certo cuidado nessa abordagem, pois

mesmo com as distinções dos padrões de reprodução, não é prudente cair no senso

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comum de afirmar que as taxas de fecundidade das mulheres pobres permanecem

constantemente altas (SOUZA, 2005).

Mesmo com tais distinções, os grupos sociais em questão vêm assumindo novos

padrões de como organizar a vida cotidiana em concomitância com os padrões

reprodutivos. Redes de sociabilidade auxiliam bastante as interações culturais que

influenciam as formas de se estruturar as preferências reprodutivas ainda muito sendo

pensada pelas articulações socioeconômicas. O que aparece aqui é pensar que a forma

como alguns padrões de reprodução agem, podem sim estarem ligadas as formas de

amenizar gastos familiares e eventuais custos domésticos para o consumo de outros

bens que favoreçam o indivíduo a identidade de se pertencer à determinada classe

social.

Mudanças nos fatores culturais da população acabam sendo institucionalizadas e

propagadas pelos meios de comunicação. Faria (2002) explica que a televisão, por

exemplo, acaba por institucionalizar e difundir novos valores e regras de

comportamento. Essas tendências propagadas e difundidas socialmente colaboram para

criar certa cultura que busca cada vez mais a identidade de ter menos filhos. Ainda

assim, não existem afirmações diretas que digam que a televisão influencia os níveis

menores de fecundidade, e acaba que voltamos ao ponto onde bens de consumo, crédito

e serviços médicos avançados são os fatores que mais auxiliam o novo padrão de

fecundidade reduzida.

Alguns autores apontam que os arranjos familiares são os que constituem os

padrões de consumo engendrados pelo bem-estar social.Pensando em atingir os modelos

de consumo esperados, as famílias tendem a se organizarem de forma a maximizar o

bem-estar mesmo que tenha que recorrer as dívidas de crédito, mas além disso há uma

plataforma onde "a demanda por bens e serviços depende apenas da restrição

orçamentária da família e dos preços, ou seja, é a interação entre os indivíduos que

determinará o perfil econômico de consumo das famílias." (REMY, 2012).

Assim, o número reduzido de membros da família engendra um padrão de

consumo muito mais elevado de bens e serviços, além de aumentar a capacidade de

endividamento ao que é induzida a nova classe média (SANTOS; COSTA; TELES,

2013). Ainda dessa forma, o crescimento da renda familiar atrelada a ampliação do

consumo de crédito e a redução das taxas de juros, auxiliaram a ascensão das demandas

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da população que antes ficavam à margem das outras condições de classe. Foi também

através desse processo de endividamento que a nova classe média pôde se configurar

nos últimos anos.

Valendo-me da interdisciplinaridade de estudos da Economia, Sociologia, e as

estimativas populacionais da Demografia, podem criar um contexto de um tema que é

bastante recorrente dos debates políticos e econômicos do Brasil nos últimos anos.

Representantes políticos tem se preocupado bastante com relação à demanda da "nova

classe média" brasileira, isso tendo em vista anova configuração social do Brasil

completa na transição demográfica.

No contexto analisado, envolvendo as ciências distintas com relação ao consumo

e as distinções de classes sociais, e observando a construção dessa nova classe média

dentro do contexto da transição demográfica, é que podemos ter condições de

proporcionar um trabalho que tenha peso e relevância, tendo em vista a importância das

decisões econômicas e políticas que afetam diretamente a sociedade nos últimos anos.

3. METODOLOGIA

Ascensão da nova classe média decorrente da superação da pobreza dentro dos

termos econômicos das classes D e E para a C, foi um fator observado por vários

centros de pesquisa no Brasil. No nosso contexto nacional, ir para a classe C significa

melhorar em aspectos econômicos, educacionais e ainda conseguir mudar o padrão de

reprodução e a nova configuração das famílias.

Com micro-dados de amostras censitárias podemos captar as variações

temporais das diferenças que os estratos sociais tem sobre os consumos domésticos bem

como a relação com a criação de filhos.

3.1. Dados

Serão usados os Censos Demográficos de 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010

dispostos pelo IBGE pela amplidão da imagem demográfica que se possa fazer uma

comparação com dados da região Nordeste. Nesse ponto, os dados dos Censos são

fundamentais para observar a mudança das estruturas familiares no decorrer das

distintas gerações.

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Mais sensível a dinâmica financeira da população, a POF (Pesquisa de

Orçamentos Familiares) é abordada para observar onde os rendimentos familiares tem

mais influencia e sobre quais aspectos. Numa tentativa de se fazer uma análise mais

detalhada sobre os gastos familiares, a POF serve como instrumento elementar para

identificar onde os gastos e consumo estão sendo mais apontados: sem para

investimentos pessoais ou para despesas familiares.

Para observar as mudanças no padrão de vida da população, a PNAD (Pesquisa

Nacional por Amostra de Domicílios) também pode fazer parte do processo, sendo

importante principalmente para observar aspectos educacionais da população, e

enquadrar nesse aspecto dados referentes a escolaridade e qualificação das mulheres.

Com esse arcabouço, são três instrumentos que se fazem presentes e capazes de

engendrar uma forte elaboração da pesquisa que requer o trabalho sobre domicílios, nos

dando ampla visão sobre os aspectos funcionais do consumo doméstico e sua relação

causa e efeito na fecundidade dentro do cenário que se pretende explorar.

3.2. Operacionalização dos conceitos

No questionário do Censo, podemos observar duas variáveis que se relacionam

diretamente com as abordagens de Weber e Goldthorpe que estruturam a pesquisa:

educação e, trabalho e rendimentos.

As variáveis eleitas para essa pesquisa se referem para as distinções das classes

sociais por meio dos elementos que distinguem suas estruturas em diferentes aspectos.

Considerando todo capital social, principal elemento de distinção das classes sobre

aspectos comportamentais, a distribuição de indivíduos dentro de quadros de

escolarização pode nos apontar para a participação em classes determinadas.

A discrepância da estrutura está na observação do aspecto da classe social em

conjunto com os ganhos mensais e a distribuição dos rendimentos dentro das famílias, é

o principal elemento que se pode condicionar com as abordagens weberianas de status

de classe e também através das formas de consumo.

O esquema de Goldthorpe também pode ser operacionalizado na pesquisa

através do questionário do censo demográfico. Classificar de forma subjetiva os

indivíduos em classe social pode ser um trabalho bastante difícil, tendo em vista que as

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declarações sobre a disposição do indivíduo em classe e a identidade que este

compreende podem apresentar divergências.

Com o questionário do Censo, podemos classificar a partir da declaração dos

indivíduos em posições de trabalho suas classificações no mercado e conseqüentemente

em classes sociais, isso porque há espaço para a declaração do enquadramento

profissional que possui extrema semelhança com o modelo apresentado por John H.

Goldthorpe.

3.3. Método Grade of Membership

Os procedimentos estatísticos serão elaborados através do Grade of Membership

(GoM), de forma a constituir o instrumento capaz de criar os perfis dos indivíduos

dispostos em classes sociais distintas e a relação com as formas de consumo e os

padrões que os mesmos geram em fecundidade.

Como os elementos condicionados na presente pesquisa não apresentam

condicionantes que os determinem numa mesma situação, o GoM funciona como

parâmetro para observar os diferente escores de pertencimento. Para a

operacionalização, é preciso que os perfis estejam primeiramente organizados em

bancos de dados para posteriores efeitos de análise.

3.4. Método para estimar a fecundidade (W. BRASS)

Para se trabalhar com a variável da fecundidade, o método P/F de Brass dá

condição para estimar as funções de fecundidade com base nas informações do número

de mulheres; número de crianças nascidas vivas nos últimos 12 meses; e na totalidade

do número de crianças nascidas vivas até a data do censo.

Como o trabalho investiga a região Nordeste, o método se faz mais eficiente

para estimar a fecundidade tendo em vista a má qualidade na fonte de dados

reconhecida pela região. Isso só ocorre por meio dos erros por tipo de informação, que

fornecem a parturição por idade da mulher, observando assim o erro de período de

referência e o erro de memória, sendo essas as condições básicas para o

desenvolvimento do método.

Devem ser feitos ajustes na relação de parturição e da fecundidade acumulada

pela razão 𝑃2/𝐹2, por ser o grupo etário mais confiável (20 a 24 anos de idade). A razão

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𝑃1 /𝐹1 ocorre mais nas idades mais jovens (15 a 19 anos de idade), não sendo o mais

aconselhável pois há muita ocorrência de subdeclaração por erro de período.

O referido método ainda conta com alguns pressupostos na sua abordagem que

são levados em consideração, como:

1) Taxas específicas de fecundidade por idade das mulheres expostas ao risco de

contrair filhos não deveriam apresentar uma acentuada mudança no tempo;

2) A mortalidade não difere entre aquelas que tiveram mais ou poucos filhos;

3) A fecundidade não diferenciada pela migração;

4) O erro de período de período de referência não é seletivo em relação à idade das

mulheres;

4. CONCLUSÃO

Dando ênfase à construção da nova classe média, e como ela se relaciona com o

acesso aos instrumentos de controle de fecundidade, observam-se mais como os novos

padrões de consumo, o trabalho e a renda per capita, influenciam a menor incidência de

filhos por mulher por diversos fatores (inserção da mulher no mercado de trabalho, uso

dos métodos contraceptivos e autonomia reprodutiva da mulher). Mas além dos fatores

econômicos, a identidade de classe e as redes de influências comportamentais que

exercem nos indivíduos as decisões reprodutivas.

Ainda com a proposta de observar essas relações entre o consumo de classe e o

controle da fecundidade dentro dos orçamentos familiares, é pensar como as idéias de

ter menos filhos, ou ter de acordo com os gastos e orçamentos, se generalizam. A

difusão desse modelo de família se legitima também pelas interações sociais, e pela

generalização desses comportamentos pessoais que são estabelecidos por interação das

redes pessoais. Ou seja, a idéia de pensar a família de acordo com as posses e os

investimentos pessoais acaba sendo um fator econômico que se difunde socialmente.

5. REFERÊNCIAS

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