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1 DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRECTIVO DA ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde (doravante ERS) conferidas pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio; Considerando os objectivos da actividade reguladora da ERS estabelecidos no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio; Considerando os poderes de supervisão da ERS estabelecidos no artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio; Visto o processo registado sob o n.º ERS/074/10; I DO PROCESSO A. Introdução 1. Na sequência das notícias trazidas a público relativas à ocorrência de uma troca de medicamentos no Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Garcia de Orta, E.P.E, o Conselho Directivo da ERS, determinou a abertura do processo de inquérito registado sob o número ERS_074/10. B. Caracterização do Estabelecimento Prestador de Cuidados de Saúde 2. De acordo com a informação constante do Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados (SRER), o Hospital Garcia de Orta, E.P.E, procedeu ao registo obrigatório, nos termos do disposto no art. 3.º e art. 1.º da Portaria n.º 38/2006, de 6 de Janeiro, tendo-lhe sido atribuído o registo n.º 10931. II DOS FACTOS RELATIVOS AO OBJECTO DO PROCESSO

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DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRECTIVO DA ENTIDADE REGULADORA DA

SAÚDE

Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde (doravante ERS) conferidas

pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio;

Considerando os objectivos da actividade reguladora da ERS estabelecidos no artigo 33.º do

Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio;

Considerando os poderes de supervisão da ERS estabelecidos no artigo 42.º do Decreto-Lei

n.º 127/2009, de 27 de Maio;

Visto o processo registado sob o n.º ERS/074/10;

I

DO PROCESSO

A. Introdução

1. Na sequência das notícias trazidas a público relativas à ocorrência de uma troca de

medicamentos no Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Garcia de Orta, E.P.E, o

Conselho Directivo da ERS, determinou a abertura do processo de inquérito registado sob

o número ERS_074/10.

B. Caracterização do Estabelecimento Prestador de Cuidados de Saúde

2. De acordo com a informação constante do Sistema de Registo de Estabelecimentos

Regulados (SRER), o Hospital Garcia de Orta, E.P.E, procedeu ao registo obrigatório, nos

termos do disposto no art. 3.º e art. 1.º da Portaria n.º 38/2006, de 6 de Janeiro, tendo-lhe

sido atribuído o registo n.º 10931.

II

DOS FACTOS RELATIVOS AO OBJECTO DO PROCESSO

Aqui serão escritos

os despachos.

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3. Teve esta ERS conhecimento, através de notícias divulgadas pela Comunicação Social

Nacional, da situação ocorrida no Hospital Garcia de Orta, E.P.E., que ora se descreve.

4. No dia 17-06-2010 foram admitidos na Unidade de Audiologia do serviço de

otorrinolaringologia do Hospital Garcia de Orta, E.P.E, dois utentes, menores de idade, a

fim de serem submetidos à realização de exame de Potenciais Evocados Auditivos do

Tronco Cerebral (PEATC).

5. Trata-se de um exame electrofisiológico que permite avaliar os limiares auditivos e

despistar patologia retrococlear. Não sendo um exame invasivo, obriga à imobilização do

paciente por forma a ser realizado um electroencefalograma, para cuja realização se torna

necessária a eliminação de estímulos musculares.

6. Tratando-se da realização de tal exame em população infantil, irrequieta por natureza, é

prática corrente do serviço de ORL pedir aos pais que na madrugada e manhã que

antecedem a efectivação do exame mantenham as crianças acordadas de modo a que, na

hora da sua realização, adormeçam “naturalmente”, permitindo assim a sua “colaboração”

na obtenção de resultados fidedignos.

7. Não obstante, apesar dos esforços envidados, situações há em que o adormecimento

“natural” das crianças não é possível, o que conduz à opção da realização do exame com

sedação.

8. A sedação de crianças “não colaborantes” é realizada com recurso a Hidrato Cloral (HC) a

10%, o qual é administrado na proporção de 5ml/Kg, podendo a administração processar-

se por via rectal (em forma de micro-clister) ou por via oral se diluído em sumo, água ou

qualquer outra substância base (ex. iogurte).

9. O (HC) caracteriza-se por ser um sedativo, hipnótico utilizado em crianças que vão ser

submetidas a provas diagnósticas não invasivas. Pode ser adicionado a água, sumo de

fruta, entre outros, para diminuir a irritação gástrica.

10. O utente S., de 3 anos de idade, foi referenciado pelo Hospital de Setúbal, com o objectivo

de determinar os limiares auditivos.

11. O utente J., de 18 meses de idade, é seguido no Serviço de ORL do Hospital Garcia de

Orta, E.P.E., desde 10-02-2010, tendo sido submetido pela primeira vez ao exame de

(PEATC) em 13-08-2009, sob sedação com Hidrato de Cloral (HC). Em face do resultado

obtido nessa data foi agendada reavaliação da criança em causa.

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12. No caso em análise, ambas as crianças objecto do exame de (PEATC), careceram da

administração de sedação por forma a possibilitar a sua realização.

13. Para o efeito, a técnica de audiologia M. procedeu à preparação do tabuleiro de

medicação necessário à efectivação dos procedimentos inerentes à administração da

sedação.

14. Nesse sentido, colheu do interior da câmara frigorífica existente no serviço de ORL o

frasco que reputou ser de (HC), por ser aquele o local próprio para a sua armazenagem.

15. Note-se que a escolha da técnica supra citada sobre o frasco concretamente utilizado foi

suportada pelo facto de ser aquele o seu local normal de armazenagem, conforme prática

semanal de realização de (PEATC), alicerçada em muitos anos de experiência, secundada

pelo facto de no mesmo frigorífico e, contrariamente ao habitual, se encontrar um frasco

de iguais características (vidro castanho escuro) mas de capacidade superior, o que a fez

automaticamente rejeitar tal frasco como sendo de (HC).

16. Cumpre referir que os frascos de (HC) normalmente utilizados no serviço têm capacidade

de 60 ml, mas que naquela data em concreto, o frasco efectivamente armazenado era de

250 ml o que terá “despistado” a técnica de audiologia que não o “escolheu” por não

reconhecer nele as normais características (no que à dimensão diz respeito) do fármaco a

utilizar.

17. Uma vez preparado o tabuleiro de medicação, a médica especialista Dr.ª M., procedeu à

administração de 8 ml de (HC), por via oral (diluídos em iogurte) ao utente S.

18. Decorridos 30 minutos da toma de (HC) mantendo-se a criança desperta e não

colaborante, foi reforçada a dose de (HC), desta vez por via rectal, num total de 5 ml.

Após esta administração a criança não manifestou qualquer reacção considerada

“anormal”, pelo que foi conduzida para uma sala escura a tranquila destinada a potenciar a

sua sonolência e subsequente adormecimento.

19. Seguiu-se a administração de (HC) ao utente J., desta vez numa dosagem de 5,5 ml por

via rectal.

20. Acto contínuo, a criança terá desencadeado um episódio de choro intenso, mostrando

sinais de grande irritabilidade, o que levou a que de imediato a médica interveniente a

transportasse para o Serviço de Urgência Pediátrica, tendo aquela permanecido em

observação.

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21. Perante a reacção adversa manifestada pela criança, a técnica de audiologia responsável

pela preparação do fármaco confirmou a sua rotulagem, tendo concluído que tinha

ocorrido uma troca de medicamentos, o que motivou que de imediato o utente S. fosse

igualmente transportado para o Serviço de Urgência Pediátrica.

22. Em ambos os utentes foram diagnosticas queimaduras ao nível do intestino, tendo o

utente S. sofrido também queimaduras ao nível do esófago e traqueia.

III

DA INSTRUÇÃO DO PROCESSO DE INQUÉRITO

23. Perante a existência de factos que apenas podiam ser comprovados mediante a

realização de uma diligência local, o Departamento de Protecção da Qualidade e dos

Direitos dos Cidadãos (designado DPQ) da ERS, no âmbito das suas atribuições,

promoveu uma acção de fiscalização junto do Hospital Garcia de Orta, EPE, com o

objectivo de averiguar o cumprimento dos requisitos do exercício da actividade,

designadamente no que respeita à segurança e qualidade dos cuidados de saúde, e à

garantia dos direitos e interesses legítimos dos utentes.

24. Com efeito, no dia 28-07-10, uma comissão composta por dois elementos representantes

da ERS, colaboradores directos do Departamento de Protecção da Qualidade e Direitos

dos Cidadãos (DPQ) da Entidade Reguladora da Saúde (Dr.ª S. e Dr.ª I.) um perito médico

afecto a esta entidade, Dr. C., e uma farmacêutica afecta aos Serviços Farmacêuticos do

Hospital S. Francisco Xavier, Dr.ª E., dirigiu-se às instalações do Hospital Garcia de Orta,

E.P.E, promovendo uma acção de fiscalização ao Serviço de Otorrinolaringologia e

Serviços Farmacêuticos

25. Fiscalizadas as instalações dos serviços de Otorrinolaringologia e de Farmácia Hospitalar,

analisados os procedimentos e os circuitos directamente relacionados com a ocorrência

em análise, colhidos os depoimentos do Presidente do Conselho de Administração do

Hospital Garcia de Orta, E.P.E, da Directora Clínica daquela instituição, do Director de

Serviço de Otorrinolaringologia, do Enf.º Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia, e do

Director dos Serviços Farmacêuticos, procedeu-se à elaboração do competente relatório

de fiscalização.

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IV

DO RELATÓRIO DA ACÇÃO DE FISCALIZAÇÃO

A. Esclarecimentos Prévios

26. Em acto prévio à realização da fiscalização, reuniu-se a comissão da ERS com os

interlocutores do Hospital Garcia de Orta, E.P.E, Presidente do Conselho de

Administração e Directora Clínica, respectivamente.

27. Explanada a factualidade subjacente à abertura do presente processo de inquérito,

salientado o espírito de colaboração na melhoria dos níveis de qualidade e segurança na

prestação de cuidados de saúde e de prevenção da ocorrência de situações futuras de

índole idêntica que move a ERS, procurou a comissão de fiscalização indagar junto dos

representantes da instituição hospitalar visada o ponto de situação da investigação interna

em curso.

28. De salientar o comprometimento e total transparência dos responsáveis contactados, no

esclarecimento cabal do ocorrido e fornecimento de toda a informação necessária, tendo

sempre em mente a importância da existência em qualquer instituição de uma cultura de

responsabilização e não de culpabilização.

29. Foi a comissão de fiscalização da ERS informada que, na sequência dos acontecimentos

ocorridos no serviço de ORL na manhã do dia 17 de Junho de 2010, foi constituída uma

comissão de inquérito interna, presidida pelo Dr. O., cirurgião pediátrico, a qual é

igualmente integrada por um jurista, um farmacêutico e uma médica anestesista (directora

da Unidade da Dor), cuja missão consiste no apuramento dos factos respeitantes à troca

de medicação verificada.

30. À data da realização da fiscalização era convicção formada no espírito dos nossos

interlocutores, alicerçada no relatório intercalar elaborado pela referida comissão de

inquérito, que terão sido várias e concorrentes entre si, as circunstâncias que terão

propiciado a troca de medicação.

31. O facto de as circunstâncias subjacentes à troca de medicação ocorrida, estarem

directamente relacionadas com os procedimentos organizacionais do Serviço de

Otorrinolaringologia e Serviços Farmacêuticos do Hospital Garcia de Orta, E.P.E,

determinou que a fiscalização levada a efeito neles se focasse preferencialmente.

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B. Acção de Fiscalização

I. Serviço de Otorrinolaringologia

32. O serviço de ORL está organizado num só piso, sendo composto por uma área reservada

à prestação de cuidados em ambulatório, sala de urgência, sala de exames

complementares, três gabinetes de consulta e uma área de internamento composta por 24

camas, cabendo a sua direcção ao Dr. L.

33. No que concerne à realização do exame de Potenciais Evocados Auditivos do Tronco

Cerebral (PEATC):

33.1 Caracteriza-se por ser um exame electrofisiológico que permite avaliar os limiares

auditivos e despistar patologia retrococlear. Não sendo um exame invasivo, obriga à

imobilização do paciente por forma a ser realizado um electroencefalograma, para cuja

realização se torna necessária a eliminação de estímulos musculares.

33.2 Tratando-se da realização de tal exame em população infantil, irrequieta por natureza, é

prática corrente do serviço de ORL pedir aos pais que na madrugada e manhã que

antecedem a efectivação do exame mantenham as crianças acordadas de modo a que, na

hora da sua realização adormeçam naturalmente, permitindo assim a sua “colaboração”

na obtenção de resultados fidedignos.

33.3 A realização de (PEATC) com sedação (com recurso a Hidrato Cloral), apenas é utilizada

como via alternativa para crianças que não adormecem naturalmente.

33.4 Note-se que o serviço de ORL do Hospital Garcia de Orta, E.P.E possui protocolo de

realização de (PEATC) o qual tem por objectivo informar sobre os procedimentos

hierarquizados da sua realização.

34. No que concerne ao Hidrato de Cloral (HC):

34.1 Trata-se de um sedativo, hipnótico utilizado em crianças que vão ser submetidas a provas

diagnósticas não invasivas. Pode ser adicionado a água, sumo de fruta, entre outros, para

diminuir a irritação gástrica. O seu efeito terapêutico começa aos 10-20 minutos, sendo o

máximo aos 30-60 minutos, com duração de 4 a 8 horas.

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34.2 É composto por Hidrato Cloral Pó, Água purificada e Xarope Comum. O aspecto da

suspensão é incolor, límpido e de odor adocicado. A sua conservação deve ser

processada a temperatura ≤ 30º, protegido da luz em frasco de vidro âmbar.

34.3 A Suspensão de Hidrato Cloral é preparada na farmácia hospitalar.

34.4 Na manhã da ocorrência, encontrava-se devidamente armazenado no frigorífico do serviço

de ORL um frasco de (HC), estando igualmente correcta a respectiva rotulagem.

34.5 Não obstante, ao contrário do que é usual, o frasco de (HC) armazenado era de 250 ml de

capacidade e não dos habituais 60 ml, o que terá induzido em erro a técnica responsável

pela preparação do fármaco, na medida em que terá automaticamente “preterido” a

utilização do frasco de maior dosagem.

34.6 Não reconhecendo a normal configuração do frasco (apresentação de 60 ml), a sua

escolha de produto recaiu sobre o frasco de 60 ml ali existente (o qual se veio a revelar

ser de Ácido Tricloroacético).

35. No que concerne ao Ácido Tricloroacético (ATCA):

35.1 O (ATCA) apresenta uma acção cáustica e adstringente, promovendo uma rápida

desnaturação das proteínas celulares, sendo usado na pele ou mucosas devido às suas

propriedades cáusticas na destruição local de lesões e no tratamento de várias patologias

dermatológicas.

35.2 O (ATCA) tem como efeitos secundários à sua aplicação a sensação de queimadura,

sendo irritante e altamente corrosivo para a pele, pelo que deve ser usado com precaução.

As soluções não deverão contactar com a pele sã ou com os olhos.

35.3 É composto por Ácido Tricloroacético e Água Purificada, sendo o aspecto da solução

incolor, límpido e inodoro. A sua conservação deve ser processada a temperatura

ambiente e protegido da luz em vidro âmbar.

35.4 A Solução de Ácido Tricloroacético é preparada na Farmácia Hospitalar.

35.5 O (ATCA) e respectiva manipulação no âmbito do Serviço de ORL é objecto da Norma de

Procedimento ORL/CCF N. 23/02.

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35.6 O frasco de (ATCA) administrado encontrar-se-ia armazenado em local errado, porquanto

se encontrava em câmara frigorífica, quando deveria estar acondicionado em armário não

refrigerado.

35.7 Na rotulagem do frasco inexistia qualquer menção de “Uso Externo”, apesar do nome do

fármaco estar correctamente identificado.

35.8 O frasco de (ATCA) é em tudo idêntico ao de Hidrato Cloral (HC), i.e., frasco de vidro

castanho-escuro de 60 ml de capacidade, tendo ambos os fármacos propriedades visuais

semelhantes.

36. No que concerne à administração farmacológica:

36.1 As crianças objecto da administração de (ATCA), tinham 3 anos e 18 meses de idade,

respectivamente (atenta a ordem de administração do fármaco).

36.2 O primeiro utente a ser objecto da administração de (ATCA) foi S., numa dosagem de 8 ml,

por via oral (diluída em iogurte).

36.3 Tendo em consideração que, decorridos 30 minutos desta administração, a criança

permanecia desperta e não colaborante, foi reforçada a dose de (ATCA), numa dosagem

de 5 ml, desta vez por via rectal.

36.4 A criança não manifestou qualquer reacção considerada “anormal”, pelo que foi

encaminhada para uma sala de recolhimento onde deveria adormecer para á posteriori ser

realizado o exame.

36.5 Note-se que esta criança tem suspeita de patologia de autismo o que inviabilizou que se

registasse qualquer sintomatologia, perceptivelmente adversa, à administração

farmacológica erradamente realizada.

36.6 Seguiu-se a administração do fármaco ao utente J., o qual já era seguido naquele serviço

de ORL desde 10-02-2009, sendo esta a segunda vez a que era sujeito à realização de

(PEATC) e, outrossim, a segunda vez que era objecto de sedação.

36.7 Uma vez mais, constatado o não adormecimento espontâneo e a insusceptibilidade de

colaboração da criança, foi administrado o (ATCA) numa dosagem de 5,5 ml, por via rectal.

De imediato a criança desencadeou episódio de choro intenso, mostrando sinais de grande

irritabilidade. Face a esta reacção, a Dr.ª H. acompanhou de imediato a criança ao Serviço

de Urgência Pediátrica, onde permaneceu em observação.

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36.8 Enquanto a médica citada acompanhou a criança ao serviço de urgência a técnica de

audiologia responsável pela preparação do fármaco confirmou o rótulo da embalagem

utilizada concluindo tratar-se de (ATCA) e não de (HC).

36.9 Uma vez dado o alerta da troca de medicação foi de imediato transportada para o serviço

de urgência a primeira criança objecto de administração de (ATCA), sendo efectuada a

competente Notificação de Efeito Adverso e comunicado o sucedido à Comissão de Risco.

37. No que concerne à conduta da técnica de audiologia responsável pela preparação do

fármaco:

37.1 Trata-se da técnica de audiologia M. reputada pelos nossos interlocutores como técnica

experiente, a qual terá, após a retirada do frasco de (ATCA) da câmara frigorífica,

preparado o tabuleiro de medicação para os procedimentos referentes ao exame a levar a

efeito (PEATC).

37.2 A retirada do frasco de (ATCA), pretenso (HC) da câmara frigorífica, terá obedecido e um

acto automático, alicerçado numa rotina enraizada, e que terá levado a referida técnica a

não confirmar o rótulo do fármaco em causa, o que terá sido facilitado pela teórica

impossibilidade de ali estar armazenado o (ATCA), por não estar sujeito a refrigeração,

secundado pela presença de um frasco de (HC) em dosagem diferente da habitual.

38. No que concerne à conduta da médica especialista responsável pela administração do

fármaco:

38.1 Trata-se da Assistente Graduada da Carreira Especial Médica, Dr.ª M., igualmente

reputada pelos nossos interlocutores como profissional atenta e conscienciosa, a qual terá,

após confirmação da data de validade aposta no rótulo do frasco de (ATCA), suposto (HC),

efectuado a administração do fármaco.

38.2 É consensual que a profissional visada apenas confirmou a data de validade do fármaco, e

não o nome constante do rótulo do frasco, uma vez que a preocupação principal era a da

curta validade do produto; tudo no pressuposto de se tratar do frasco correcto e, uma vez

mais, apoiada no automatismo do procedimento.

39. No que concerne à informação disponibilizada aos utentes:

39.1 Dos esclarecimentos prestados pelo Director de Serviço de ORL, foi possível concluir ter

sido prestada aos pais dos utentes intervencionados a competente informação sobre a

necessidade de sedação dos menores envolvidos e efeitos expectáveis após

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administração do fármaco proposto, embora o consentimento daí emergente não se

encontre aposto em formulário reduzido a escrito.

39.2 De resto, cumpre enfatizar que o procedimento a levar a efeito era já do conhecimento de

um dos intervenientes, na medida em que era a segunda vez que era submetido à

realização de (PETAC).

40. No que concerne à responsabilidade pelo acondicionamento de fármacos no serviço de

ORL:

40.1 De acordo com o Manual de Políticas e Normas de Procedimento relativas à administração

de terapêutica (N.º D. ENF. – 10/03), são os Serviços Farmacêuticos responsáveis pelo

fornecimento e reposição dos fármacos e solutos nos serviços.

40.2 Não obstante, em termos práticos, é o enfermeiro de serviço (ou quem o substitua) o

responsável pelo acondicionamento de fármacos no serviço de ORL.

40.3 Não foi possível identificar o responsável pelo armazenamento de (ATCA) em local errado

por não existir, até ao momento da ocorrência, qualquer suporte registral desse acto.

40.4 No entanto, é de realçar que na data da ocorrência, apenas tendo como ponto de partida o

prazo de validade inscrito no rótulo do frasco utilizado (rememorado pela médica

interveniente, na medida em que se certificara da sua vigência antes da administração do

fármaco) foi possível através da consulta dos registos dos Serviços Farmacêuticos,

identificar o fármaco administrado e respectivo lote, fazendo a reconstituição do respectivo

processo de preparação.

41. No que concerne à armazenagem de produtos no Serviço de ORL:

41.1 À data da fiscalização verificou-se que, no frigorífico do serviço de ORL as prateleiras não

se encontravam devidamente identificadas, pelo que se sugere que seja efectuada a

identificação das prateleiras de frigorífico, com menção do local de armazenamento de

cada um dos fármacos termolábeis, com respectiva referência à substância activa,

dosagem e forma farmacêutica, à semelhança do que ocorre nos restantes locais de

armazenamento.

II. Serviços Farmacêuticos

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42. Os Serviços Farmacêuticos são integrado por 13 farmacêuticos e 12 técnicos de farmácia,

cabendo a sua direcção ao Dr. A..

43. Sendo manifestos e amplamente diagnosticados os constrangimentos espaciais existentes

nos Serviços Farmacêuticos, encontram-se actualmente em curso as diligências

necessárias para concretizar a mudança do serviço para novas instalações, cuja planta e

infra-estruturas estão já delineadas.

44. Vistoriadas as respectivas instalações, constatou-se que não existe controlo de humidade e

temperatura na sala de preparação de formas farmacêuticas não estéreis (FFNE), embora

nas novas instalações esteja prevista a instalação de dispositivos de controlo de humidade

e temperatura.

45. A mesma sala é utilizada como gabinete de trabalho, sala de preparação e sala de

lavagem. No entanto, da análise da planta das novas instalações dos serviços

farmacêuticos, resulta estar resolvido este constrangimento.

46. A ficha de preparação de (FFNE) não inclui campos para registo de operações e dupla

verificação das operações críticas, contendo apenas a técnica a seguir para efectuar a

preparação. O registo de matérias primas utilizadas é efectuado num impresso à parte. O

registo de pesagens é verificado pela impressão de pesagens efectuadas, mas para a

medição de volumes utilizados não existe registo de dupla verificação. A ficha de

preparação não inclui os ensaios de verificação (caracteres organolépticos, pH, volume,

etc.). A ficha de registo não inclui evidência de realização destes ensaios de verificação. Os

registos efectuados não evidenciam a observação de linha de vazio entre as diferentes

preparações.

47. Sugere-se a adopção dos modelos de ficha de preparação do Formulário Galénico

Nacional, que incluam a técnica a seguir com descriminação não só das matérias primas,

como também do material utilizado, registo do operador e do supervisor para cada uma das

operações efectuadas, ensaios de verificação, modelo de rótulo, listagem do material

utilizado na embalagem, etc..

48. O programa informático CPC, disponível no HGO, tem um módulo de apoio à preparação

de FFNE, que permite responder a estas sugestões e que constitui uma alternativa ao

registo manual de preparação.

49. De acordo com o Decreto-Lei 176/06 de 30 de Agosto, devem ser realizadas auto-

inspecções e auditorias de qualidade, periódicas, que comprovem a eficácia e a aplicação

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do sistema de garantia de qualidade. Sugere-se que seja elaborado um plano de auditorias

com manutenção dos respectivos registos de realização.

50. Deve ainda ser elaborado um plano de formação dos colaboradores nas áreas da

farmacotecnia, prevendo a Portaria n.º 594/2004, de 2 de Junho, no ponto 1.5.2, que o

farmacêutico director técnico deve promover a formação e reciclagem periódicas das

pessoas que intervêm nas operações de preparação e controlo. Os registos de formação

devem ser mantidos.

51. Muitos destes aspectos já foram identificados em inspecção realizada pelo INFARMED

cujo relatório foi prontamente facultado pelo Director dos Serviços Farmacêuticos, bem

como o plano de medidas correctivas a implementar.

C. Medidas de Correcção Implementadas

52. Após a ocorrência da troca de medicamentos (Hidrato Cloral e Ácido Tricloroacético) foi

efectuado a competente Notificação de Efeito Adverso, bem como dado o alerta à

Comissão de Risco.

53. De igual modo, foi constituída uma comissão de inquérito, no seio da qual foi produzido um

relatório intercalar do qual resultou a implementação das seguintes medidas correctivas:

53.1 Alteração das normas relativas ao circuito do medicamento no âmbito do serviço de ORL,

conforme Norma de Procedimento ORL/CCF N.º 80/10, tendo sido efectuada a revisão dos

procedimentos de distribuição e armazenamento dos medicamentos de serviço, os quais

passam a ser processados da seguinte forma:

53.1.1 Os Serviços Farmacêuticos efectuam a entrega dos medicamentos nos Serviços

Clínicos habilitando o enfermeiro chefe com uma lista de tudo o que é fornecido.

53.1.2 O enfermeiro chefe confere a entrega e assina a lista que é devolvida aos Serviços

Farmacêuticos.

53.1.3 O enfermeiro chefe assume o armazenamento dos medicamentos no serviço.

53.1.4 Diariamente o enfermeiro chefe faz duas auditorias ao armazenamento, uma no

período da manhã e outra no período da tarde, sendo efectuado registo das mesmas

em impresso próprio.

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53.1.5 De registar que a identificação clara de responsabilidades e realização de duas

auditorias diárias ao armazenamento constitui uma importante medida de melhoria já

implementada, na medida em que permite reconstituir todo o circuito de determinado

fármaco desde a sua saída dos Serviços Farmacêuticos até à administração do mesmo

ao doente, permitindo responsabilizar deste modo todos os intervenientes neste

processo.

53.2 Criação de uma etiqueta identificadora de medicamentos de uso externo (no caso do

Ácido Tricloroacético). Uma vez que já são utilizadas etiquetas vermelhas para os

medicamentos termolábeis e para os que requerem agitação prévia à utilização, foi

adoptada a formulação «Não Ingerir» constante de etiqueta com fundo amarelo para

que se diferencie das restantes1.

54. Como medida adicional procedeu-se à alteração da sequência de arrumação dos

fármacos, deixando a mesma de obedecer à ordem alfabética para passar a ser

organizada de acordo com a respectiva fórmula farmacêutica, evitando deste modo que

fármacos cujo nome tem uma formulação semelhante mas cujos efeitos terapêuticos são

distintos (e muitas vezes antagónicos) fiquem armazenados proximamente, potenciando a

situação de erro.

55. Note-se que esta medida não abrangeu apenas o serviço concretamente envolvido (ORL),

mas toda a comunidade do Hospital Garcia de Orta, E.P.E que deste modo tomou a

situação ocorrida como uma oportunidade de melhoria e pro-actividade.

D. Informação Complementar

56. Como informação adicional cumpre acrescentar que, à data da fiscalização, se encontrava

suspensa a realização de (PEATC) com sedação, na medida em que o serviço de ORL

será dotado de novo equipamento que permitirá efectuar a despistagem de patologia

retrococlear com recurso a metodologia distinta.

1 De acordo com o Formulário Galénico Português (FGP), o rótulo das soluções de Ácido Tricloroacético deverá conter

as advertências: «Não ingerir», «Uso externo» em fundo vermelho, «Cáustico não manusear directamente com as

mãos», «Corrosivo», «Manter fora do alcance das crianças». Sugere-se que sejam incluídas estas advertências no

rótulo identificativo criado.

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57. De acrescentar ainda que ao relatório intercalar produzido pela comissão de inquérito

interna do Hospital Garcia de Orta, E.P.E, seguir-se-á o correspondente relatório e

conclusões finais assim que se encontrem destrinçadas a título definitivo as seguintes

questões:

57.1 Cabal esclarecimento do grau de responsabilidade dos intervenientes.

57.2 Pronúncia do Grupo de Gestão do Risco Clínico acerca da ocorrência e respectiva

caracterização de acordo com a nomenclatura/taxinomia internacional utilizada;

57.3 Determinação de eventuais sequelas nas crianças envolvidas, as quais embora estáveis e

com prognóstico favorável, devem ainda aguardar a realização de exames endoscópicos

programados.

V

DO DIREITO

A. Atribuições e competências da ERS

58. De acordo com o n.º 1 do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, a ERS tem

por missão a regulação da actividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de

saúde.

59. As atribuições da ERS, de acordo com o art. 3.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27

de Maio, compreendem “a supervisão da actividade e funcionamento dos

estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, no que respeita ao cumprimento dos

requisitos de exercício da actividade e de funcionamento e à garantia dos direitos dos

utentes”.

60. Constitui objectivo da actividade reguladora da ERS, em geral, nos termos da alínea a) e

c) do art. 33.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio:

a) “Velar pelo cumprimento dos requisitos do exercício dos estabelecimentos prestadores

de cuidados de saúde”, nomeadamente no que respeita à segurança e qualidade dos

cuidados de saúde;

b) “Garantir os direitos e interesses legítimos dos utentes”.

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B. Enquadramento legal do Hospital Garcia de Orta, E.P.E

61. O Hospital Garcia de Orta, E.P.E, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 233/2005, de

29 de Dezembro, encontra-se integrado no Sistema Nacional de Saúde1, o qual, de acordo

com o n.º 2 da Base XII da Lei de Bases da Saúde2, “(…) abrange todas as instituições e

serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde dependentes do Ministério da Saúde

que garantem a imposição constitucional de “acesso de todos os cidadãos,

independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva,

curativa ou de reabilitação3”.

62. Pelo que, o Hospital Garcia de Orta, E.P.E desempenha um papel de elevada relevância

na prossecução de tal imposição.

63. Sendo o Hospital Garcia de Orta, E.P.E, em função das suas responsabilidades e

valências4, classificado como hospital central, nos termos da Portaria n.º 567/2006, de 12

de Junho, alterada pela Portaria n.º 110-A/2007, de 23 de Janeiro.

C. Enquadramento fáctico-jurídico do objecto do processo de inquérito

64. Os acontecimentos vivenciados no Hospital Garcia de Orta, E.P.E, na sequência da troca

de medicação ocorrida, são susceptíveis de integrarem responsabilidade civil, disciplinar e

criminal, em função da prova realizada.

65. Não obstante, e porque o âmbito de actuação da ERS tem por missão a regulação da

actividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, as diligências

adoptadas na instrução do presente inquérito não se detiveram com a averiguação de tais

responsabilidades.

66. Com a abertura do presente processo de inquérito, pretendeu a ERS averiguar eventuais

violações no cumprimento dos requisitos do exercício da actividade do estabelecimento

prestador de cuidados de saúde visado, mormente no que respeita à qualidade e

1 O SNS é definido como o “(…) conjunto ordenado e hierarquizado de instituições e serviços oficiais prestadores de

cuidados de saúde, funcionando sob a superintendência ou a tutela do Ministro da Saúde” - cfr. art. 1.º do Estatuto do SNS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro de 1993. 2 Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 27/2002, de 8 de Novembro.

3 Cfr. al. a) do n.º 3 do artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa.

4 Vide n.º 1 do artigo 12.º do Estatuto do SNS.

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16

segurança dos cuidados de saúde, e eventuais violações dos direitos e interesses

legítimos dos utentes.

67. Atente-se que as diligências desencadeadas pela ERS junto dos Serviços Farmacêuticos,

porque não estão sujeitos à sua regulação, tiveram como fim único averiguar se os

procedimentos implementados poderiam ter comprometido, de alguma forma, os factos

sucedidos no Serviço de Otorrinolaringologia, na medida em que o medicamento

administrado foi preparado e entregue por aqueles serviços.

68. Os Serviços Farmacêuticos são os serviços com autonomia técnica e científica que, nos

hospitais, asseguram a terapêutica medicamentosa aos doentes, a qualidade, eficácia e

segurança dos medicamentos, e estão sujeitos à orientação geral dos Órgãos de

Administração dos Hospitais, perante os quais respondem pelos resultados do seu

exercício.

69. De acordo com as responsabilidades e funções que tomam a seu cargo, os Serviços

Farmacêuticos são constituídos pelas seguintes áreas funcionais, no que respeita a

medicamentos, produtos farmacêuticos e dispositivos médicos: selecção e aquisição;

recepção e armazenagem; preparação; controlo; distribuição; informação;

farmacovigilância, farmacocinética e farmácia clínica.

70. Os padrões de qualidade estão enquadrados num sistema de boas práticas a observar

nos diversos circuitos do medicamento, de acordo com normas e requisitos aprovadas

pela Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (INFARMED), entidade

cujas atribuições, entre outras, se circunscrevem nos domínios da avaliação, autorização,

disciplina, inspecção e controlo da produção, distribuição, comercialização e utilização de

medicamentos de uso humano, nos termos da disciplina vertida no Decreto-Lei n.º

269/2007, de 26 de Julho.

71. Recorde-se, ainda, que também a observância da conformidade dos procedimentos

relativos ao medicamento face às legis artis compete à Ordem dos Farmacêuticos.

72. Resta então analisar a questão relativa à eventual violação dos direitos e interesses

legítimos dos utentes, sendo que, nos termos da al. c) do art. 33.º do Decreto-Lei nº

127/2009, de 27 de Maio, a ERS no cumprimento da sua missão de regulação deve

garantir os direitos e interesses legítimos dos cidadãos. Estabelecendo, ainda, o art. 36.º

al. c) do citado diploma legal que na defesa desses direitos incumbe à ERS, entre outros,

“verificar o não cumprimento da Carta dos Direitos dos Utentes dos Serviços de Saúde”.

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73. No que respeita aos direitos dos utentes torna-se necessário clarificar que os mesmos

estão contemplados em diversos diplomas legais, nacionais e internacionais.

74. Na ordem jurídica portuguesa a consagração destes direitos acha-se plasmada, ainda que

de forma indirecta, na Constituição da República Portuguesa (CRP), no art. 64.º, no n.º 2 e

n.º 5 da Base V e no n.º 1 da Base XVI da Lei de Bases da Saúde, no Estatuto do Serviço

Nacional de Saúde1, na Lei da Gestão Hospitalar

2 e na Carta dos Direitos de Acesso aos

Cuidados de Saúde pelos Utentes do SNS3.

75. Refira-se ainda que, embora não tenham consagração legal, a Carta dos Direitos e

Deveres dos Doentes, elaborada pela Direcção-Geral da Saúde (DGS) e pela Comissão

de Humanização para os Cuidados de Saúde e a Carta dos Direitos do Doente Internado,

apresentada pela DGS, em 15-02-2005, fazem menção expressa aos direitos dos utentes

dos cuidados de saúde.

76. Na apreciação da factualidade em análise urge analisar se foram acautelados os

seguintes direitos:

a) Direito à informação;

b) Direito ao consentimento;

c) Direito de livre escolha;

d) Direito à prestação de cuidados de saúde com correcção técnica

(observância/cumprimento das normas de qualidade);

e) Direito à segurança;

f) Direito de indemnização por prejuízos sofridos.

77. O dever de informar está previsto em vários documentos, sendo de destacar, a Base XIV,

n.º 1 al. e), segundo a qual “os utentes têm o direito de ser informados sobre a sua

situação, as alternativas possíveis de tratamento e a evolução provável do seu estado”.

78. Nestes termos, torna-se imperioso que o utente obtenha uma informação prévia, cabal e

completa dos elementos relativos ao diagnóstico, ao prognóstico, dos tratamentos a

realizar e tratamentos alternativos, dos riscos ínsitos das intervenções ou actos, das

eventuais complicações pós-operatórias que poderão ocorrer, em maior ou menor grau de

probabilidade, e dos meios humanos e técnicos existentes e disponíveis para assegurar a

prestação de tais cuidados de saúde.

79. Refira-se que, a informação do utente sobre a sua situação clínica, alternativas possíveis

de tratamento e a evolução provável do seu estado de saúde, deve ter sempre em conta a

1 Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, alterada pelos Decretos-Lei n.º 53/98, de 11 de Março, n.º 401/98, de 17 de

Dezembro, n.º 68/2000, de 26 de Abril, n.º 223/2004, de 3 de Dezembro, n.º 222/2007, de 29 de Maio, e n.º 276-A/2007, de 31 de Julho. 2 Lei n.º 27/2002, de 8 de Novembro.

3 Portaria n.º 1529/2008, de 26 de Dezembro.

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18

sua personalidade, o grau de instrução e as condições clínicas e psíquicas, desde que a

sua situação clínica não o desaconselhe.

80. Tal informação denominada “esclarecimento para a autodeterminação” tem como fim

permitir a livre decisão do utente, assente no princípio da autonomia da pessoa humana,

uma vez que aprioristicamente, teve o conhecimento do objectivo, condicionantes e riscos

do acto que necessita para satisfação da sua necessidade de cuidados de saúde.

81. No seguimento do exposto rege o artigo 157.º do Código Penal que “o consentimento só é

eficaz quando o paciente tiver sido devidamente esclarecido sobre o diagnóstico e a

índole, alcance, envergadura e possíveis consequências da intervenção ou do tratamento

(…).”

82. Considerando que no caso em análise os doentes objecto da administração farmacológica

são menores, cumpre esclarecer que a doutrina do consentimento informado exige que

qualquer terapêutica seja administrada a um doente adulto competente, devidamente

informado, com a sua volição e autorização.

83. Por outro lado a lei considera menor quem ainda não tiver completado 18 anos de idade1 e

portanto, com algumas excepções, as crianças e jovens de idade inferior aos 18 anos não

têm autoridade ou competência legal para prestar consentimento informado, assumindo os

pais ou tutores essa função.

84. Enquanto o doente adulto é considerado competente para prestar consentimento, o

doente pediátrico é, a priori, incompetente para tal, sendo necessário observar

determinados requisitos para suprir a sua incompetência, quer do ponto de vista ético,

quer do ponto de vista legal.

85. Do ponto de vista legal, consistindo a menoridade numa incapacidade geral de exercício

de direitos2, a qual só cessa com a maioridade

3, o seu suprimento é concretizado através

do instituto da representação, in casu, mediante a efectivação do poder paternal4, o qual,

assumindo a natureza de poder-dever, se traduz no poder de representar os filhos.

86. Do ponto de vista exclusivamente ético e na maioria dos casos é suficiente o

consentimento de um dos progenitores desde que seja claro que o sentido da decisão seja

efectuado no melhor interesse da criança.

1 Vide art.º122.º do Código Civil Português.

2 Vide art.º123.º do Código Civil Português.

3 Vide art.º129.º do Código Civil Português.

4 Vide art.º124º do Código Civil Português.

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87. Cumpre referir que em matéria de consentimento médico informado vigora, no

ordenamento jurídico português, o princípio da liberdade de forma.

88. Atente-se por isso no disposto no art. 217.º do Código Civil o qual dispõe que “a validade

da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei

a exigir” e na disciplina do n.º 2 do art. 38.º do Código Penal, segundo a qual “o

consentimento pode ser expresso por qualquer meio que traduza uma vontade séria, livre

e esclarecida do titular do interesse juridicamente protegido, e pode ser livremente

revogado até à execução do facto”.

89. Ora, no caso em apreço, resulta da informação veiculada pelo Director de Serviço de

Otorrinolaringologia do Hospital Garcia de Orta, E.P.E., que o consentimento informado

prestado pelos pais dos menores intervencionados não se revestiu de forma escrita.

Não obstante, da factualidade apurada não resulta qualquer indício de que o

consentimento prestado se encontre enfermado de qualquer vício, aceitando-se a sua

validade.

Acresce que, conforme supra exposto no ponto 11 desta Deliberação, o utente J., já havia

anteriormente sido objecto de realização de (PEATC) com sedação o que ilustra a sua

familiaridade com o procedimento em questão e riscos associados.

90. Do supra exposto, somos a concluir que, no que ao direito à informação diz respeito, não

se poderá concluir pela existência de um comportamento por parte do Hospital de Garcia

de Orta, E.P.E susceptível de se consubstanciar numa lesão dos direitos e interesses

legítimos dos cidadão concretamente afectados, por violação dos direitos dos utentes à

informação clínica e ao consentimento informado livre e esclarecido, consignados na Lei

de Bases da Saúde, na Carta dos Direitos dos Utentes dos Serviços de Saúde e demais

legislação aplicável.

91. Já quanto ao direito dos utentes à prestação de cuidados com correcção técnica

(observância/cumprimento das normas de qualidade), é de referir que, atenta a

factualidade apurada em sede de acção de fiscalização, certos procedimentos apresentam

vulnerabilidades susceptíveis de comprometer os adequados níveis de qualidade dos

serviços de saúde.

92. Assim, verificou-se que direito supra enunciado, in casu, não foi acautelado, na medida em

que os dois utentes objecto da troca de mediação ocorrida (ATCA vs. HC), sofreram

malefícios, ocorridos, provavelmente como consequência da vulnerabilidade dos

procedimentos evidenciados.

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93. No que, no que ao direito de indemnização pelos prejuízos sofridos diz respeito, está o

mesmo consignado na Base XIV da Lei de Bases da Saúde1.

94. O primado da defesa dos direitos dos cidadãos e da responsabilização dos actos

geradores de danos, sempre que praticados com culpa do agente, permite que os utentes

dos serviços de saúde exerçam o direito de compensação, sempre que tiverem sofrido

danos físicos ou morais e psicológicos causados por um tratamento realizado nesse

âmbito.

95. A responsabilidade é aferida perante os deveres / obrigações que os profissionais

assumem no exercício da sua profissão e tem três concretizações: a responsabilidade

disciplinar, a responsabilidade civil e a responsabilidade penal.

96. No que respeita à perspectiva da responsabilidade civil, as questões trazidas ao

conhecimento da ERS são regidas pela Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro2, dado que os

factos se circunscrevem no âmbito do exercício de funções em instituições hospitalares

públicas.

97. Na ordem jurídica portuguesa, a matéria da responsabilidade civil extracontratual da

Administração Pública tem assento constitucional, porquanto a responsabilidade das

entidades públicas está, expressamente, consagrada no artigo 22.º, da CRP, ao estatuir

que “o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma

solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, por acções ou

omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício de que

resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem”.

98. Por sua vez, o artigo 271.º, nº 1, do diploma fundamental citado, determina que “os

funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas são responsáveis civil,

criminal e disciplinarmente pelas acções ou omissões praticadas no exercício das suas

funções e por causa desse exercício de que resulte violação dos direitos ou interesses

legalmente protegidos dos cidadãos...”.

99. Efectivamente, os factos em apreciação assentam em lesões surgidas na sequência de

um erro de administração farmacológica ocorrido no Serviço de Otorrinolaringologia do

Hospital Garcia de Orta, E.P.E, organismo integrado no Serviço Nacional de Saúde (SNS),

à luz do disposto no Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro, estando os seus

profissionais sujeitos às regras próprias da Administração Pública.

1 Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 27/2002, de 8 de Novembro.

2 A Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, aprova o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais

entidades públicas.

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100. A responsabilidade do Estado, no âmbito do SNS, decorre dos normativos fixados em

diversos diplomas legais, contando-se entre outros a CRP, a Lei de Bases da Saúde, o

Estatuto do SNS, e o Regime Jurídico da Gestão Hospitalar.

101. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9-12-08, esclarece que a responsabilidade

civil aquiliana ou extracontratual, por prestação de cuidados de saúde, decorre de uma

obrigação do Estado para com todos os cidadãos que careçam de cuidados de saúde e a

ele recorram, independentemente de um acto de vontade da entidade prestadora de

saúde em querer ou não obrigar-se em prestar esses cuidados, vide art. 397.º e art. 405.º

do Código Civil.

102. Os factos originadores de responsabilidade civil do Estado abrangem, para além dos actos

materiais e omissões que ofendam direitos de terceiros ou disposições legais destinadas a

proteger os seus interesses, os actos ou omissões que ofendam “as regras técnicas e de

prudência comum” ou o dever geral de cuidado, onde se incluirá, nomeadamente, o caso

dos serviços hospitalares que originem uma deficiente prestação dos cuidados dos

serviços de saúde.

103. Com efeito, o processo de responsabilidade civil decorrente da violação de direitos

verificada, encontra-se na dependência dos utentes concretamente lesados, mediante

alegação de que o dano sofrido foi consequência de conduta faltosa, daí inferindo o

competente pedido de reparação ou indemnização.

104. No que respeita à violação dos deveres, princípios e demais disposições ou regulamentos

internos inerentes à actividade profissional, refira-se que tal comportamento poderá

constituir infracção disciplinar1, cujo processo é instruído pelos órgãos disciplinarmente

competentes.

105. Sendo certo que, in casu, assumem particular importância a Ordem dos Médicos e a

Ordem dos Farmacêuticos, sem prejuízo da competência da Inspecção-Geral das

Actividades em Saúde (IGAS) quanto aos profissionais de saúde que exercem a sua

actividade enquanto funcionários e agentes do Estado, e que se encontrem abrangidos

pelo Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e

Local.

1 i.e., Formulação do juízo crítico: Face às circunstâncias concretas do caso era objectivamente exigível ao profissional

medianamente diligente a adopção de uma conduta diferente?

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106. Já a responsabilidade penal, entendida como o recurso extremo, a ultima ratio, do sistema

de protecção dos direitos dos utentes dos cuidados de saúde, implica que a protecção dos

direitos daqueles deva encontrar resposta, num primeiro momento, na responsabilidade

civil e/ou disciplinar. Cabendo, nos termos da lei, o apuramento da responsabilidade penal

aos órgãos de investigação penal, sob a orientação do Ministério Público.

VI

DAS CONCLUSÕES

107. No sector da prestação de cuidados de saúde a necessidade de garantir os requisitos de

qualidade e segurança ao nível dos recursos humanos, do equipamento e das instalações,

está patente de forma especialmente premente, atenta a especificidade dos valores em

causa: direito à vida, direito à integridade física, direito à protecção da saúde, apenas para

nomear alguns dos epítetos constitucionalmente consagrados.

108. Na sequência das ocorrências registadas no Hospital Garcia de Orta, E.P.E, a qualidade e

segurança na prestação dos cuidados de saúde tornou-se questionável.

109. Excluindo-se à partida a averiguação de matéria que se insere no âmbito das atribuições e

competências de outros organismos, tais como a Ordem dos Médicos, a Ordem dos

Farmacêuticos, a Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, a

Inspecção-Geral das Actividades em Saúde, o Departamento de Investigação e Acção

Penal, a Entidade Reguladora da Saúde, no âmbito da sua intervenção, propôs-se analisar

a qualidade e a segurança dos cuidados de saúde do Serviço de Otorrinolaringologia, em

termos gerais, e a garantia dos direitos e interesses legítimos dos utentes, em particular.

110. Após análise dos elementos carreados no âmbito da instrução do presente processo de

inquérito, não existindo outras diligências a adoptar, constatou-se, no que respeita à

qualidade e segurança dos cuidados de saúde, que à data dos factos ocorridos alguns dos

procedimentos técnicos e organizacionais implementados no Serviço de

Otorrinolaringologia, bem como certos procedimentos dos Serviços Farmacêuticos, eram

vulneráveis ao erro e, por isso, susceptíveis de não assegurarem adequados padrões de

qualidade e de segurança dos cuidados de saúde, e, consequentemente, passíveis de

lesar os direitos dos utentes.

111. Não obstante, a lesão da saúde dos doentes ser consequência da vulnerabilidade de

certos procedimentos instituídos nos serviços acabados de referir, em termos globais1, a

1 Ressalvado o frasco de (ATCA) encontrado no gabinete de consulta do Serviço de ORL à data da fiscalização, o qual

não se encontrava rotulado com a etiqueta de “não ingerir”.

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comissão de fiscalização da ERS concluiu que os cuidados de saúde prestados pelo

Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Garcia de Orta, E.P.E garantem os padrões de

qualidade e de segurança indispensáveis ao exercício da actividade.

112. Ressalte-se que, face à ocorrência registada, o Conselho de Administração e demais

elementos directivos, Directora Clínica e o Director do Serviço de Otorrinolaringologia

desta instituição hospitalar, deram uma resposta atempada e adequada, accionando os

mecanismos próprios, nomeadamente procedimentos internos e constituição de comissão

de inquérito interna, com vista ao apuramento integral dos factos e eventuais

responsabilidades.

113. De ressaltar ainda as medidas instituídas tendentes à reorganização do circuito do

medicamento no serviço de ORL, já explanadas supra1.

VII

DA AUDIÊNCIA DE INTERESSADOS

114. A presente decisão foi precedida da necessária audiência de interessados, nos termos do

disposto no art. 101.º, n.º 1 do CPA, tendo sido chamado a pronunciar-se o Conselho de

Administração do Hospital Garcia de Orta, E.P.E, relativamente ao seguinte projecto de

deliberação da ERS:

“O Conselho Directivo da ERS delibera, assim, nos termos e para os efeitos do preceituado

nos art. 41.º, n.º 1 e art. 42.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, emitir uma

instrução ao Hospital Garcia de Orta, E.P.E, nos seguintes termos:

a) Melhoria dos procedimentos inerentes à rotulagem do medicamento de modo a

prevenir a eventual ocorrência de falhas na sua administração2.

b) Revisão de todos os frascos armazenados nos serviços clínicos cuja data de

preparação seja anterior à adopção da etiqueta “Não Ingerir” implementada na

sequência das conclusões produzidas em sede do relatório preliminar produzido pela

comissão de inquérito interna nomeada3.

1 Vide ponto 53 deste Projecto de Deliberação.

2 Ter em especial atenção o disposto no ponto 8, alínea f) da Portaria n.º 594/2004, de 2 de Junho, nos termos do qual

a rotulagem das embalagens deve fornecer instruções especiais indispensáveis para a utilização do medicamento, bem

como o postulado no Formulário Galénico Português (FGP), de acordo com o qual o rótulo das soluções de Ácido

Tricloroacético deverá conter as advertências: «Não ingerir», «Uso externo» em fundo vermelho, «Cáustico não

manusear directamente com as mãos», «Corrosivo», «Manter fora do alcance das crianças».

3 Esta medida reveste-se de particular acuidade na medida em que, à da data da realização da acção de fiscalização,

estando já a ser utilizada a etiqueta de “não ingerir” em fundo amarelo entretanto implementada, foi detectada a

presença de um frasco de (ATCA) não rotulado com tal referência no gabinete de consulta do Serviço de ORL.

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c) Implementação de sistema de identificação de prateleiras do frigorífico do Serviço de

ORL1.

d) Instituição de protocolo de administração de terapêutica com confirmação de rótulos

por toda a equipa.

e) Resolução definitiva dos constrangimentos existentes nos Serviços Farmacêuticos,

mediante efectiva transferência para novo espaço já delineado, permitindo que o

trabalho nele desenvolvido se processe em harmonia com os níveis de segurança e

qualidade desejáveis.

f) Adopção dos modelos de ficha de preparação do Formulário Galénico Nacional, que

incluam a técnica a seguir com descriminação não só das matérias-primas, como do

material utilizado, registo do operador e do supervisor para cada uma das operações

efectuadas, ensaios de verificação, modelo de rótulo, listagem do material utilizado na

embalagem, etc2.

g) Implementação de auditorias internas e externas (ir)regulares, com vista a garantir

adequados padrões de qualidade e segurança na prestação dos cuidados de saúde3.

h) Promoção de acções de formação periódicas, destinadas à consciencialização e

sensibilização dos profissionais para a necessidade de manutenção constante de um

elevado grau de exigência na prossecução das tarefas diárias a que estão adstritos,

mormente alertando para o perigo constituído pela rotina instalada enquanto realidade

potenciadora do erro;

A presente deliberação será precedida de audiência escrita dos interessados, de acordo

com o regime previsto nos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo,

em respeito pelo princípio da participação dos interessados.

A presente deliberação será publicitada, a final, no sítio oficial da ERS, na Internet.”

115. Decorrido o prazo estipulado para exercício do direito de pronúncia relativamente ao

projecto de deliberação, não produziu o Conselho de Administração do Hospital Garcia de

Orta, E.P.E. qualquer tipo de oposição ao mesmo.

116. No decurso da vigência do prazo de resposta supra enunciado foi remetido pelo Conselho

de Administração já indicado, cópia do despacho produzido em sede de inquérito

disciplinar instaurado por aquela administração hospitalar, o qual em nada é avesso às

medidas preconizadas no texto do projecto de deliberação.

1 Identificação das prateleiras de frigorífico, com menção do local de armazenamento de cada um dos fármacos

termolábeis ali acondicionados, com respectiva referência à substância activa, dosagem e forma farmacêutica.

2 O programa informático CPC, disponível no Hospital Garcia de Orta, E.P.E, tem um módulo de apoio à preparação de

FFNE, que permite dar resposta à instrução enunciada, constituindo uma alternativa ao registo manual de preparação.

3 Realização de auto-inspecções e auditorias de qualidade, que comprovem a eficácia e a aplicação do sistema de

garantia de qualidade, procedendo-se à elaboração de um plano de auditorias com manutenção dos respectivos

registos de realização.

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VIII

DA DECISÃO

117. O Conselho Directivo da ERS delibera, assim, nos termos e para os efeitos do preceituado

nos art. 41.º, n.º 1 e art. 42.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, emitir uma

instrução ao Hospital Garcia de Orta, E.P.E, nos seguintes termos:

117.1 Melhoria dos procedimentos inerentes à rotulagem do medicamento de modo a prevenir a

eventual ocorrência de falhas na sua administração1.

117.2 Revisão de todos os frascos armazenados nos serviços clínicos cuja data de preparação

seja anterior à adopção da etiqueta “Não Ingerir” implementada na sequência das

conclusões produzidas em sede do relatório preliminar produzido pela comissão de

inquérito interna nomeada2.

117.3 Implementação de sistema de identificação de prateleiras do frigorífico do Serviço de

ORL3.

117.4 Instituição de protocolo de administração de terapêutica com confirmação de rótulos por

toda a equipa.

117.5 Resolução definitiva dos constrangimentos existentes nos Serviços Farmacêuticos,

mediante efectiva transferência para novo espaço já delineado, permitindo que o trabalho

nele desenvolvido se processe em harmonia com os níveis de segurança e qualidade

desejáveis.

117.6 Adopção dos modelos de ficha de preparação do Formulário Galénico Nacional, que

incluam a técnica a seguir com descriminação não só das matérias-primas, como do

material utilizado, registo do operador e do supervisor para cada uma das operações

1 Ter em especial atenção o disposto no ponto 8, alínea f) da Portaria n.º 594/2004, de 2 de Junho, nos termos do qual

a rotulagem das embalagens deve fornecer instruções especiais indispensáveis para a utilização do medicamento, bem

como o postulado no Formulário Galénico Português (FGP), de acordo com o qual o rótulo das soluções de Ácido

Tricloroacético deverá conter as advertências: «Não ingerir», «Uso externo» em fundo vermelho, «Cáustico não

manusear directamente com as mãos», «Corrosivo», «Manter fora do alcance das crianças».

2 Esta medida reveste-se de particular acuidade na medida em que, à da data da realização da acção de fiscalização,

estando já a ser utilizada a etiqueta de “não ingerir” em fundo amarelo entretanto implementada, foi detectada a

presença de um frasco de (ATCA) não rotulado com tal referência no gabinete de consulta do Serviço de ORL.

3 Identificação das prateleiras de frigorífico, com menção do local de armazenamento de cada um dos fármacos

termolábeis ali acondicionados, com respectiva referência à substância activa, dosagem e forma farmacêutica.

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efectuadas, ensaios de verificação, modelo de rótulo, listagem do material utilizado na

embalagem, etc1.

117.7 Implementação de auditorias internas e externas (ir)regulares, com vista a garantir

adequados padrões de qualidade e segurança na prestação dos cuidados de saúde2.

117.8 Promoção de acções de formação periódicas, destinadas à consciencialização e

sensibilização dos profissionais para a necessidade de manutenção constante de um

elevado grau de exigência na prossecução das tarefas diárias a que estão adstritos,

mormente alertando para o perigo constituído pela rotina instalada enquanto realidade

potenciadora do erro;

118. O Conselho de Administração do Hospital Garcia de Orta, E.P.E., deve dar cumprimento

imediato à presente instrução, dando conhecimento à ERS, no prazo máximo de trinta (30)

dias contados da notificação da mesma, dos procedimentos adoptados para o efeito.

119. A presente deliberação será publicitada, no sítio oficial da ERS, na Internet.

O Conselho Directivo

1 O programa informático CPC, disponível no Hospital Garcia de Orta, E.P.E, tem um módulo de apoio à preparação de

FFNE, que permite dar resposta à instrução enunciada, constituindo uma alternativa ao registo manual de preparação.

2 Realização de auto-inspecções e auditorias de qualidade, que comprovem a eficácia e a aplicação do sistema de

garantia de qualidade, procedendo-se à elaboração de um plano de auditorias com manutenção dos respectivos

registos de realização.