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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PEDAGOGIA DIURNO
THAÍS HELENA RIBEIRO SILVA
A CONSTITUIÇÃO DA DOCÊNCIA POR PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR: UM ESTUDO SOBRE AS PLURALIDADES DA FACULDADE DE
EDUCAÇÃO-UFJF
JUIZ DE FORA – MG
2014
THAÍS HELENA RIBEIRO SILVA
A CONSTITUIÇÃO DA DOCÊNCIA POR PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR: UM ESTUDO SOBRE AS PLURALIDADES DA FACULDADE DE
EDUCAÇÃO-UFJF
Monografia apresentada ao curso de Pedagogia da Universidade Federal de Juiz de Fora como requisito parcial à obtenção de graduação em Pedagogia.
Orientadora: Profª. Drª. Adriana Rocha bruno
JUIZ DE FORA – MG
2014
THAÍS HELENA RIBEIRO SILVA
A CONSTITUIÇÃO DA DOCÊNCIA POR PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR: UM ESTUDO SOBRE AS PLURALIDADES DA FACULDADE DE
EDUCAÇÃO-UFJF
Monografia apresentada ao curso de Pedagogia da Universidade Federal de Juiz de Fora como requisito parcial à obtenção de gruaduação em Pedagogia.
Aprovada em: ____/____/______.
BANCA EXAMINADORA:
___________________________________________________
Profª. Drª. Adriana Rocha Bruno – Orientadora
___________________________________________________
- Avaliadora
Juiz de Fora – MG
2014
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar a constituição da docência
universitária dos professores que atuam na Faculdade de Educação da
Universidade Federal de Juiz de Fora/UFJF. Para a sua concretização foram
utilizados os dados obtidos a partir de um questionário semiaberto
desenvolvido para essa pesquisa. O estudo discute o processo de constituição
da docência no Ensino Superior, mediante a ausência de uma formação
pedagógica específica para esse professor. Os dados revelam que o tornar-se
professor na universidade se dá em meio a uma trajetória complexa, que
envolve principalmente a prática pedagógica, a experiência em sala de aula na
Educação Básica e/ou no Ensino Superior e, sobretudo, a relação professor-
aluno. Além disso, o trabalho expõe também uma breve pesquisa realizada a
respeito da disciplina de Didática e as implicações de sua inexistência no Curso
de Pedagogia da UFJF e na própria formação do docente do ES.
Palavras-chave: Docência no Ensino Superior – Processos Formativos – Didática – Prática Pedagógica.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO................................................................................................1
2. COMO ESTA PESQUISA FOI PENSADA?....................................................4
3. PERCURSO METODOLÓGICO.....................................................................5
4. DIDÁTICA.......................................................................................................8
4.1. Trajeto histórico.....................................................................................................8
4.2. Concepções e perspectivas................................................................................11
4. 3. Alguns dados levantados...................................................................................20
5. DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR...........................................................26
5.1. Políticas e a carência delas para formação do professor universitário...............26
5.2. A constituição da docência no Ensino Superior..................................................31
5.2.1. Ensinagem...................................................................................................34
5.2.2. Competência pedagógica do docente no ensino superior...........................35
5.2.3. Saberes que compõem a docência: específico, pedagógico geral e pedagógico do conteúdo........................................................................................37
6. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS.............................................39
6.1. As disciplinas de didática do ensino superior contribuem para a constituição da docência do professor universitário?.........................................................................39
6.2. Elementos constitutivos da docência, ou seja, aspectos que contribuem para a constituição da prática pedagógica do professor.......................................................44
6.2.1. Prática docente: experiência do professor, atuação na Educação Básica e no Ensino Superior.................................................................................................47
6.2.2. Retorno dos Alunos......................................................................................49
6.2.3. Estudos pessoais e Diálogos formais e informais com colegas professores...............................................................................................................................50
6.2.4. Formações institucionalizadas.....................................................................51
6.2.5. Minha experiência enquanto aluno da EB e/ou ES......................................53
6.2.6. Disciplinas e/ou estudos afeitos à didática..................................................53
6.3. Atuação docente.................................................................................................54
6.3.1. Prática pedagógica.......................................................................................55
6.3.2. O papel das singularidades de cada sujeito na atuação docente................59
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................63
8. REFERÊNCIAS.............................................................................................64
ANEXOS .......................................................................................................... 68
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CIAPES Coordenação de Inovação Acadêmica e Pedagógica no Ensino Superior
EB Educação Básica
ES Ensino Superior
Faced Faculdade de Educação
GRUPAR Grupo de Pesquisa “Aprendizagem em Rede”
IF Instituição Fedaral
PROGRAD Pró-reitoria de graduação
UFJF Universidade Federal de Juiz de Fora
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 01: Graduação cursada pelos respondentes ....................................... 06
GRÁFICO 02: Cursos de graduação em que os docentes atuam ............................ 07
GRÁFICO 03: Número de cursos de graduação em que os sujeitos atuam/atuaram ..................................................................................................................................... 07
GRÁFICO 04: Quantidade de disciplinas voltadas para a docência no ES cursadas na graduação e/ou pós graduação ............................................................................. 40
GRÁFICO 05: Ter cursado essa(s) disciplina(s) trouxe(ram) contribuições para a sua prática docente? .......................................................................................................... 43
GRÁFICO 06: Elementos fundamentais para a constituição da docência na visão dos sujeitos da pesquisa .................................................................................................... 46
GRÁFICO 07: Atuação dos professores universitários na Educação Básica ........... 48
1. INTRODUÇÃO
[...] A experiência e não a verdade é o que dá sentido a educação. Educamos para transformar o que sabemos, não para transmitir o já sabido.
Se alguma coisa nos anima a educar é a possibilidade de que esse ato de educação, essa
experiência em gestos, nos permita liberar-nos de certas verdades, de modo a deixarmos de ser o
que somos, para ser outra coisa para além do que vimos sendo.
Jorge Larrosa e Walter Kohan
A prática e a formação docente foram alvos de minhas1 inquietações e estudos
pessoais, durante a graduação no curso de Pedagogia da UFJF. Sempre tive em mente o
potencial que o trabalho do professor possui de transformar o modo como o seu aluno
percebe a vida e o mundo ao seu redor. Lembro-me de educadores que tive, desde a
minha mais tenra idade, algumas de suas falas e atitudes jamais serão apagadas da
minha memória.
Ao pensar as implicações do trabalho docente na vida do aluno e na do próprio
professor, que ao se constituir assim, passa a enxergar o mundo de maneira distinta,
penso que o seu processo de formação, inicial e continuado, possui um papel central
para um satisfatório desempenho de sua prática pedagógica.
Sendo assim, debrucei-me pelos estudos que subsidiavam a formação de
professores, tendo destaque a minha inserção no Grupo de Pesquisa “Aprendizagem em
Rede” - GRUPAR2. Tanto o grupo como o curso de Pedagogia, como um todo, 1 Para fins deste trabalho utilizarei como opção de escrita, tanto o discurso na primeira pessoa do plural como na primeira pessoa do singular. Essa adoção se faz necessária devido a impossibilidade separar as experiências e construtos por mim desenvolvidos, de forma individual, de tantas concepções, discursos e reflexões tecidas coletivamente, ao longo de estudos, interações e diálogos produzidos em minha trajetória acadêmica e de vida como um todo. 2 O GRUPAR é coordenado pela Profª. Drª. Adriana Rocha Bruno (FACED-PPGE-UFJF) e também faz parte do Núcleo de Estudos de Ensino e Linguagem – NEEL . Compõem o grupo professores da UFJF, mestrandos e bolsistas de Iniciação Científica e professores de outras instituições. Seu objetivo principal consiste em desenvolver pesquisas e estudos em torno da aprendizagem humana, da didática da formação de professores, levando em consideração as teorias acerca da Educação online e das Tecnologias da informação e comunicação (TIC). Atualmente, o projeto encontra-se subdividido em quatro “braços”. Sendo os dois principais: 1) Projeto “Formação Docente No Ensino Superior Em Tempos De Cibercultura: Multiplicidade, Coaprendizagem E Educação Online”, financiado pela FAPEMIG; 2) CIAPES - Coordenação de Inovação Acadêmica e Pedagógica no Ensino Superior.
1
apresentaram-me um leque de possibilidades para pesquisa nessa temática, ganhando
destaque nesse processo a formação docente no Ensino Superior.
Defini esse assunto como central para construir este trabalho de conclusão de
curso de graduação por perceber que embora o GRUPAR tivesse uma orientação clara a
esse respeito, o curso de Pedagogia da UFJF não tratava a questão da educação para o
nível superior, e tão pouco pensava em processos formativos para o seu corpo docente,
devido a Educação Básica constituir-se o maior campo de atuação do pedagogo.
Num cenário em que a formação do docente universitário ainda se apresenta
como pouco discutida, no sentido da proposição de políticas que a assegure, a
curiosidade e a inquietação sobre o processo de tornar-se professor universitário me
mobilizou, fazendo com que eu construísse a seguinte pergunta de partida: Como se
constitui a docência dos professores da Faculdade de Educação da Universidade Federal
de Juiz de Fora - UFJF?
Compreendo, dessa forma, que a aprendizagem da docência no ensino superior
se processa em meio a um movimento, não linear, das possibilidades e das necessidades
internas e externas. Tendo em vista que o professor é sujeito de sua formação, considero
que esse processo se dá a partir das suas potencialidades e das exigências da profissão,
no qual a interação com alunos, colegas e a própria prática possuem papel fundamental
(BOLZAN e POWACZUK, 2009), instigando a realização desse estudo.
Com isso, proponho os seguintes objetivos a serem pensados:
Identificar como se constitui a docência no ensino superior, por meio das
pluralidades existentes na Faculdade de Educação da UFJF;
Discutir políticas e possibilidades para a formação continuada desses
professores;
Identificar as possíveis contribuições de disciplinas afeitas à didática do ensino
superior, nos cursos de pós-graduação stricto sensu.
Acredito que tais objetivos serão alcançados tendo em vista os estudos
desenvolvidos acerca da docência no ensino superior, o que irá auxiliar na
compreenssão dos dados que serão analisados ao longo do estudo.
Cabe situar ao leitor que essa pesquisa se deu a partir dos dados obtidos por
meio de um questionário semiaberto desenvolvido para esse estudo, que foi enviado aos
cinquenta e nove professores da Faculdade de Educação da UFJF. A partir desse envio,
2
tive retorno de dezessete professores, oriundos das diversas áreas que compõem a
licenciatura nessa faculdade, esses, então, se constituíram como os sujeitos dessa
pesquisa.
Além disso, exponho também, de forma mais sucinta, já que esse não é o
objetivo central da pesquisa, alguns dados acerca da disciplina de didática e da sua
ausência no Curso de Pedagogia da UFJF, como um campo que estuda o ensino em sua
totalidade.
Para apresentar os pontos levantados até então, este trabalho foi dividido nas
seguintes partes: a primeira composta pela introdução que situará o leitor sobre o
presente estudo; a segunda parte traz um relato, em que é exposto o motivo que instigou
a pesquisa; a terceira parte explicita a metodologia utilizada para desenvolver o
estudo, descrevendo o trajeto que este percorrerá; a quarta parte se refere a um
levantamento teórico a respeito da didática, composto pelos assertos de estudiosos,
como Martins e Romanowiski (2010), Libâneo (2002), Bruno (2007), entre outros e a
exposição dos dados obtidos sobre a retirada dessa disciplina do curso de
Pedagogia/UFJF; a quinta parte trás uma discussão teórica a partir de estudiosos como
Pimenta e Anastasiou (2008), Masetto (2003), Bolzan e Powaczuk (2009), Isaia (2005)
etc. que expõem suas visões acerca da constituição da docência e apresentam o que
está sendo discutido atualmente dentro desse campo; a sexta parte apresenta a
análise e a interpretação dos dados coletados; e, por fim, as considerações finais
trazem as contribuições desta investigação relacionadas ao percurso de formação do
professor universitário e as reflexões que o mesmo propiciou.
2. COMO ESTA PESQUISA FOI PENSADA?
Durante toda a minha inserção na vida acadêmica a formação de
professores sempre se mostrou uma questão cara para mim. Nessa
perspectiva, fui percebendo que ela sempre era um aspecto tratado ainda que
de forma transversal em todas as disciplinas do curso. No entanto, ela não era
discutida no que se refere à formação docente para o Ensino Superior,
3
provavelmente pelo foco da graduação inicial estar voltado a formar o professor
da Educação Básica, conforme determina o artigo 4º das Diretrizes
Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia (BRASIL, 2006).
Dessa forma, comecei a desenvolver estudos pessoais sobre o assunto
e no 6º período do curso entrei em contato com a professora Adriana Rocha
Bruno, para que a mesma pudesse me direcionar nessa pesquisa. Assim, em
fevereiro de 2013, com o intuito de aprofundar ainda mais a respeito da
aprendizagem e da formação de professores ingressei no Grupo de Pesquisa
Aprendizagem em Rede - GRUPAR.
No início de maio desse mesmo ano, a referida professora fez um
convite aos seus bolsistas para participarem, como ouvintes, de uma disciplina
que ela daria no Programa de pós-graduação em educação – PPGE: Docência
no Ensino Superior. A temática muito me interessava. Então, comecei a
frequentar as aulas, que contribuíram extremamente com meu processo
formativo, além de delinear contornos mais expressivos para esse trabalho.
Nesse processo, entre as falas da professora Adriana, os diálogos e
discussões feitas na sala, além dos textos lidos, muitas indagações surgiram,
mas uma questão estava muito presente: a insuficiência de espaços
institucionais acadêmicos para a formação pedagógica do professor
universitário.
No entanto, eu percebia que ao longo do meu curso de graduação, eu
havia tido contato com diferentes práticas e diferentes professores: docentes
que dominavam sua área específica de saber, mas que utilizavam poucas
estratégias didáticas para a efetivação de seu ensino; docentes que tinham
competência pedagógica e competência em sua área de ensino; docentes que
exaltavam as relações interpessoais; outros que as restringiam etc. Enfim, eu
identifiquei que mesmo com a ausência de políticas formativas para esse nível
de ensino, esses sujeitos haviam constituído a sua docência, mas que eu
desconhecia como isso tinha ocorrido ou como ainda ocorre. Seria em meio as
singularidades de cada um? Ao percurso formativo que eles trilharam? A
própria prática em sala de aula? Essas eram algumas hipóteses que eu tinha
que foram confirmadas e tiveram ainda outros elementos adicionados, no
decorrer do trabalho.
4
Dessa forma, esse estudo surgiu a partir do meu interesse em perceber
sobre como se dá esse processo de constituição da docência dos professores
universitários, por meio da pluralidade das falas dos docentes da Faculdade de
Educação da UFJF.
3. PERCURSO METODOLÓGICO
Para concretização dessa pesquisa, que possui como objetivo investigar
sobre como se constitui a docência no Ensino Superior, desenvolvemos um
questionário semi-aberto e online enviado aos cinquenta e nove professores da
Faculdade de Educação (modelo em anexo).
Esse questionário foi elaborado de forma extremamente recursiva, em
meio a escritas e reescritas, visando integrar questões que melhor atendessem
aos nossos intentos investigativos.
Sendo assim, após muitas discussões e análises, obtivemos uma
primeira versão, que foi enviada como teste para dois docentes que já atuaram
na Faculdade de Educação: uma professora substituta e um professor que
durante a conclusão de seu mestrado realizou o Estágio Docente da CAPES.
Ambos ministraram aulas no Curso de Pedagogia. Após o retorno do teste,
resolvemos incorporar novas perguntas a pesquisa, passando de oito para
quatorze questões: 10 discursivas e 04 de múltipla-escolha.
O teste realizado revelou, por exemplo, que para além de uma questão
perguntando sobre como se desenvolvia o fazer docente do professor,
precisávamos também identificar quais eram os recursos – estratégicos,
didáticos e/ou afetivos – mais utilizados por ele em sua prática.
A versão final do questionário foi veiculada por meio de uma plataforma
online, denominada Google Docs3. Esse recurso possibilitou que enviássemos
a pesquisa e/ou seu link por email para cada respondente, fazendo com que
esse obtivesse maior praticidade ao responder, além de facilitar também a
tabulação posterior dos dados. É importante ressaltar que o questionário não
foi publicado na web, isso quer dizer que, ele não estava acessível a todo e
3 Link de acesso do questionário na web: https://docs.google.com/forms/d/1dfKyPyF05C_naX4o6ZDsFGxmu7U0uzPYjgfPqmKyeMs/viewform
5
qualquer internauta, sendo possível a visualização apenas daquele que
recebeu o “convite” por correio eletrônico.
Tais questionários foram enviados para os cinquenta e nove professores
da Faculdade de Educação (FACED) da UFJF. Tratam-se de docentes efetivos
de todas as licenciaturas, incluindo aqueles do curso de Pedagogia. Dentre
esse total obtivemos o retorno de 17 sujeitos, correspondendo, assim, a 28,8%
do total de professores existentes na FACED.
Com o intuito de preservar o anonimato dos respondentes, os
denominamos por meio das letras do alfabeto, indo de A a Q, de acordo com
classificação de horários em que cada sujeito participou da pesquisa. Dessa
forma, o primeiro respondente foi identificado pela letra A, o segundo pela letra
B e assim por diante.
Os sujeitos pesquisados são oriundos das mais diversas áreas, Letras,
Pedagogia, Ciências Biológicas, Direito, Geografia, entre outros. Como é
possível observar no seguinte gráfico, que descreve os dados aferidos na
pergunta aberta de número 01:
A Faculdade de Educação, tendo como finalidade formar professores de
todas as licenciaturas, incorpora docentes de variadas áreas. Esses, por sua
vez, acabam atuando em diferentes cursos, devido à proximidade de ementas
entre um curso e outro e a associação da temática de estudo de cada
professor, que, muitas vezes, pode ser associada a cursos diversificados. Pois
embora a FACED/UFJF forme para graduações diferentes, todas se associam
a docência.
6
Gráfico 01
Essa pluralidade existente na Faculdade de Educação pode ser
confirmada a partir da identificação dos cursos em que os sujeitos lecionam ou
já lecionaram (questão 02):
Observamos, assim, que 64,8% desses entrevistados
(B,C,D,E,F,G,H,K,O,P,Q,R) trabalharam ou trabalham em dois ou mais cursos
de graduação. Os dados revelam que 17,6% atuam/atuaram em um único
curso (I,J,L), assim como 17,6% (A,M,N) informaram lecionar ou já terem
lecionado em todas as Licenciaturas, ou seja, dezoito cursos diferentes. O
gráfico abaixo descreve a situação:
4.
DIDÁTICA
4.1. Trajeto históricoO campo da Didática é comumente associado a muitos mitos e vem
sendo pouco explorado no que tange às suas possibilidades para a formação
7
Gráfico 02
Gráfico 03
Gráfico 03
docente. Ao serem questionados sobre o objeto dessa área da educação
muitos alunos e até mesmo muitos professores respondem, restringindo-a, que
trata-se de uma disciplina preocupada em estudar métodos, técnicas, receitas,
que sirvam como um suporte aplicável a toda e qualquer aula.
Com o intuito de identificar as possíveis causas desses equívocos bem
como explicitar o real papel da Didática, irei, nesse momento, recuperar a sua
trajetória histórica.
De acordo com Pimenta e Anastasiou (2008), o termo “didática”,
utilizado como adjetivo, foi empregado desde a Grécia Antiga, para definir a
ação de ensinar exercida nas relações entre os mais velhos, as crianças, os
adolescentes e os adultos, seja em contexto familiar ou público. Entretanto, ela
só começa a adquirir contornos mais específicos a partir do século XVII com a
teoria formulada por Comênio (1562-1670), em sua obra denominada
DIDÁTICA MAGNA: Tratado da arte universal de ensinar tudo a todos, escrita
entre os anos de 1627 e 1657.
Em meio a Reforma Protestante, Jan Amos Komenský - Comênio
começou a difundir na Europa Central o método único, visando principalmente
à leitura e a escrita da língua materna. Sendo ele um monge da igreja fundada
por Lutero, sua principal expectativa era que toda a população tivesse acesso
às passagens bíblicas, até então monopolizadas pelo clero católico.
As contribuições de Comênio para a didática não se dão somente na
defesa da democratização do aprendizado, mas também por ser a base do
ensino que conhecemos hoje. Como exemplo disso podemos citar: a divisão do
conteúdo por etapas, o ensino do simples para o complexo e a inclusão de
algumas disciplinas no currículo escolar - matemática, línguas, ciências,
filosofia.
A segunda revolução da didática se originou com a obra Emílio ou Da
Educação, escrita em 1762, pelo filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau. Esse
livro apresenta um novo conceito de infância e propõe um método de ensino
natural que forme o cidadão ideal.
Em contraposição a teoria de Rousseau, no séc. XIX, Herbart (1776-
1841) propõe uma didática voltada para a prática do professor, ou seja, para o
seu desempenho como ingrediente fundamental para o aprendizado do aluno.
8
Pimenta e Anastasiou (2008) interpretam a formulação desse autor como uma
retomada ao método único de Comênio.
Já no século XX, autores como Pestalozzi (1749-1827), Kerschensteiner
(1854-1932), Decroly (1871-1932), Montessori (1870-1952), Dewey (1859-
1952) e, no Brasil, Teixeira (1900-1972), recuperam os escritos de Rousseau e
propagam o movimento “Escola Nova”, que situa no sujeito aprendente o
protagonismo do processo educativo.
Impregnada pelo modelo econômico liberal, a didática decorrente desse
movimento, equivocadamente, começa a ser usada para respaldar o chamado
“fracasso escolar”, como sendo algo próprio da natureza individual do aluno.
Assim, a valorização da criança como sujeito da aprendizagem – que, à primeira vista, teria significado uma revolução democrática nos métodos de ensinar, em oposição ao método tradicional característico da escola das classes dominantes – contraditoriamente se impõe como justificativa da desigualdade escolar e social (PIMENTA e ANASTASIOU, 2008, p. 45).
Um dos mitos referidos anteriormente se traduz nessa análise, que fez
com que muitas correntes apelassem para a eliminação da didática dos
currículos das Licenciaturas e a substituíssem por disciplinas outras que, “não
representassem os interesses das classes dominantes”.
Dando continuidade aos fatos históricos, percebe-se que o movimento
escolanovista, fortemente influenciado pela psicologia experimental, foca-se no
desenvolvimento biológico do indivíduo, averiguado por meio da objetividade.
“Nesta fase, coexiste o positivismo tradicional, a psicologia funcional e a
genética piagetiana; o enfoque cognitivo, a tecnologia e a teoria de sistemas e
o enfoque social” (BRUNO, 2007, p. 64).
Nos anos 60, com o advento tecnológico acirra-se o entendimento da
didática como métodos e técnicas de ensino, com destaque no planejamento
racional das práticas educativas.
Corroborando com essa fase, o Brasil da década de 70, em plena
atividade da ditadura militar, elege a educação como prioridade dentro do
Plano Nacional de Desenvolvimento e, para isso, desenvolve programas de
formação de professores por meio de treinamentos, cujo objetivo situa-se em
transmitir instrumentos técnicos próprios para a aplicação do conhecimento 9
científico, propagando a eficiência e a eficácia como princípios da atividade
docente.
A década seguinte foi marcada como um período de “intenso movimento
de revisão crítica e reconstrução da Didática no Brasil” (MARTINS e
ROMANOWISKI, 2010, p. 206). Refletindo o momento político ao qual o país
se encontrava, inaugurou-se uma discussão em prol de um professor mais
crítico e reflexivo, que imprimisse suas impressões políticas em seu fazer
docente, sem que houvesse espaço para a neutralidade.
Desta forma, o movimento que inicialmente incluiu uma crítica e uma denúncia ao caráter meramente instrumental da Didática avançou em seguida para a busca de alternativas e reconstrução do conhecimento da área. E, em oposição ao modelo pedagógico centrado no campo da instrumentalidade, grupos de educadores passam a discutir a importância de formar uma consciência crítica nos professores para que estes coloquem em prática as formas mais críticas de ensino, articuladas aos interesses e necessidades práticas das camadas populares, tendo em vista garantir sua permanência na escola pública (ibidem).
A partir disso, surgem propostas para uma Pedagogia mais crítica
expressas por Saviani (1983) e Libâneo (1985). Tais encaminhamentos
referem-se à didática como um trabalho de ensino para a transmissão e
assimilação. Predominando assim, o pensamento e a teoria sobre a ação e a
prática propriamente dita.
Segundo as autoras Martins e Romanoviski (2010), Oder José Santos
define, em 1992, um novo momento para os conhecimentos pedagógicos. Para
esse estudioso era preciso romper com o binômio transmissão-assimilação,
desvencilhar-se de normas prescritivas sobre a prática docente e trabalhar,
refletir e teorizar junto ao professor.
De 1990 para 2000 há uma alteração na organização escolar e no
próprio modo de identificação do professor, enquanto trabalhador, assalariado
e sindicalizado. Acompanhada a essa fase surge também a concepção de
aluno como sujeito de direitos e produtor de cultura. Dessa forma, o período é
propício, devido a todo encaminhamento histórico e político, a uma
compreensão da didática realizada pela prática, mediada pelo pensamento e,
também pela realidade (ibidem).
10
4.2. Concepções e perspectivas
De acordo com Charlot (2000), o homem ao nascer não é nada, trata-se
de um ser inacabado e imperfeito, que por meio da educação supre sua
fraqueza inicial e se apropria dos conhecimentos necessários para se tornar o
que é. Para esse autor, a humanização do homem, esse processo de se tornar
um sujeito somente ocorre devido a sua inserção em um mundo previamente
estruturado.
[...] É verdade que a criança está mal equipada ao nascer, mas ela beneficia-se da “fabulosa riqueza de seu ‘equipamento’ social excentrado. “Em outras palavras, a essência originária do indivíduo humano não está dentro dele mesmo, mas, sim, fora, em uma posição excêntrica, no mundo das relações sociais”. “A humanidade (no sentido de ser homem), em oposição à animalidade (o ser ‘animal’) não é um dado presente por natureza em cada indivíduo isolado, é o mundo social humano; e cada indivíduo natural torna-se humano ao ‘hominizar-se’ através de seu processo de vida real no amago das relações sociais.” Ou seja, a condição humana não é apenas a ausência do ser na criança que nasce; é também o ingresso em um mundo onde o humano existe sobre a forma de outros homens de tudo o que a espécie humana construiu anteriormente.
Estando o sujeito em sociedade, a educação, como apropriação de si
mesmo e das ferramentas necessárias para sua sobrevivência e convívio,
ocorre de maneira natural, sendo com o decorrer da história da humanidade
institucionalizada. Essa estruturação e sistematização tornou-se
responsabilidade dos sistemas de ensino, das escolas, das universidades e,
muitas vezes, centradas apenas na figura do professor. No entanto, ela está
presente em todas as instancias da sociedade – família, mídia, empresas,
hospitais etc. – havendo, portanto, educação para além dos espaços formais,
constituindo o que as autoras Pimenta e Anastasiou (2008) denominam de uma
sociedade pedagógica.
Nessa perspectiva, cabe à didática, enquanto ciência do ensino, isso é,
como a sistematização teórica da prática de ensinar, a “atividade de
transformar a educação difusa que ocorre na sociedade em conteúdos
formativos” (ibidem, p. 66).
11
Essa didática que está presente em todas as relações sociais é também
uma das áreas da Pedagogia. Ela consiste em uma atividade historicamente
situada, que tem como objetivo a construção do aprendizado, por meio de uma
investigação dos fundamentos e das metodologias de ensino.
Dessa forma, a didática faz parte dos saberes que incorporam à
docência. Assim, dentre os conhecimentos dos quais o professor se apropria
para subsidiar a sua prática, a didática é um componente fundamental. Pois ela
possibilita que os educadores convertam os conhecimentos presentes no
mundo e sistematizados nas ciências específicas, como artes, filosofia,
matemática, entre outras, em matérias de ensino. Essa articulação constitui a
didática, ela se forma essencialmente na junção dos elementos de cada campo
específico com as teorias pedagógicas, visando unicamente à aprendizagem
do aluno.
A atividade de ensinar é complexa e por se tratar de uma atividade
social única, fundada nas relações entre os sujeitos – aluno e professor – se
modifica ao mesmo tempo em que modifica também aqueles que estão nela
envolvidos. Logo, apresentá-la e explorar a didática como instrumentos
estáticos orientados por regularidades, regras, técnicas e operações na
condução da aprendizagem não faz sentido. Pensando, então, o ensino como
uma prática social, nas palavras de Pimenta e Anastasiou (2008), o papel da
didática consiste em
[...] compreender o funcionamento do ensino em situação, suas funções sociais, suas implicações estruturais; realizar uma ação auto-reflexiva como componente do fenômeno que estuda, porque é parte integrante da trama do ensinar (e não uma perspectiva externa que analisa e propõe práticas de ensinar); pôr-se em relação e diálogo com outros campos de conhecimentos construídos e em construção, numa perspectiva múlti e interdisciplinar, porque o ensino não se resolve com um único olhar; proceder a constantes balanços críticos do conhecimento produzido no seu campo (as técnicas, os métodos as teorias), para dele se apropriar, e criar novos diante das novas necessidades que as situações de ensinar produzem (p. 48-49).
Consoante, Libâneo (2002), defende que
A Didática é uma disciplina que estuda o processo de ensino no seu conjunto, no qual os objetivos, conteúdos, métodos e formas organizativas da aula se relacionam entre si de modo a criar as condições e os modos de garantir aos alunos uma
12
aprendizagem significativa. Ela ajuda o professor na direção e orientação das tarefas do ensino e da aprendizagem, fornecendo-lhe segurança profissional (p. 05).
Um elemento marcante na teoria desse autor, a respeito da implicação
da didática, consiste na importância da conscientização do professor a respeito
da finalidade da educação. Para Libâneo, a principal perspectiva dessa
disciplina é relacionar os processos pedagógicos aos objetivos sócio-políticos
da ação educativa. A razão para isso se dá no potencial que a educação possui
para a eliminação das desigualdades econômicas e sociais. Em outras
palavras, a prática de ensino, o conteúdo que o professor leva para a sala de
aula, e os objetivos propostos para aquisição do conhecimento pelo aluno,
deve visar a apreensão do conteúdo por todos os estudantes, além de
contribuir para uma formação mais crítica, que os façam questionar a sua
realidade.
A didática é uma área que possui como prerrogativa investigar a prática
de ensino, além disso, ela é também uma disciplina institucionalizada para a
realização de discussões e análises da mesma enquanto teoria, mas que só se
materializa na prática pedagógica (Luckesi, 1993). Por esse motivo, pode
acontecer que alunos inscritos na disciplina de didática identifiquem seus
professores, que estudam a temática, como educadores que não possuem
didática. Pois, estudar e desenvolver teorias sobre didática não faz com que o
sujeito seja didático.
De acordo com Bruno (2007), a didática pode ser analisada a partir de
quatro significados: coloquial, artístico, tecnológico e teórico-científico,
propostos por Torre e Mallart, em 1993 e 2001, respectivamente.
Segundo a autora, a didática, em uma definição coloquial, possui
enfoque na metodologia de ensino, na forma como o educador explica, em
detrimento do conteúdo por ele exposto. Essa denominação é comumente
utilizada por aqueles que não são estudiosos da área, que acabam
identificando a didática como a própria aquisição de uma habilidade para uma
satisfatória explicação da matéria.
A definição artística da didática, para esses autores, traz um enfoque
nas contribuições das questões pessoais para a prática docente. Ela pressupõe
13
que o professor, ao dar aula, realiza uma relação entre os conceitos por ele
estudados e a sua própria experiência pessoal, que vai se constituindo à
medida que ele também se constitui, seja como docente, seja como sujeito.
Já a definição tecnológica, preocupa-se com a didática enquanto
técnica, como conhecimentos científicos que auxiliam a atividade didática do
professor, visando, portanto, uma adequação ao contexto educacional.
Por fim, a didática, em uma definição teórico-cientifica, possui um
significado complementar a acepção anterior, dando lhe um enfoque mais
científico. “Amplia os aspectos instrumentais e especulativos, agregando-os
aos explicativos e aplicativos. Assim, integra os critérios de racionalidade e
subjetividade cientifica, por meio de conhecimentos sistemáticos” (BRUNO,
2007, p. 71).
Para a autora, todas essas definições expostas por Torre e Mallart,
traduzem concepções de didática que permanecem na sociedade atual.
Entendo que seu objetivo ao trabalhar com esses significados não seja
classificá-los ou hierarquizá-los, mas identificar uma concepção de didática que
os integre.
Dessa forma conceituamos a didática a partir das asserções de alguns
autores.
De acordo com Libâneo (2002), a concepção de didática se fundamenta
por meio de três tópicos fundamentais. Primeiro, como uma disciplina
pedagógica, que possui uma intencionalidade bem definida, a partir de
objetivos explícitos. Pressupõe a interação entre aluno e professor, visando à
aprendizagem com uma finalidade social. Segundo, por meio da relação entre
o ensino e a aprendizagem, como o foco central da didática, que leva em
consideração o ensino com uma atividade intencional para “assegurar” que o
educando aprenda, tendo em vista a mediação do professor, no sentido de
conduzir o aluno para que ele mesmo amplie sua capacidade de apropriação
do conhecimento. E o terceiro tópico refere-se ao próprio processo de
aprendizagem, que fará com que o aluno construa, elabore e reelabore os
conhecimentos e, por consequência, sua ação.
Em suma, Libâneo (idem) defende como foco da didática o processo de
ensino, em sua totalidade, levando em consideração o seu fim pedagógico e
14
social. Para ele, o ato de ensinar, pressupõe uma finalidade instrutiva,
formativa e o uso de recursos direcionados à aprendizagem. Isso quer dizer
que, a teoria e a prática, para o autor, são pólos indissociáveis na prática do
docente.
Podemos pensar a didática também como uma “disciplina reflexivo-
aplicativa que se ocupa dos processos de formação e desenvolvimento pessoal
em contextos intencionalmente organizados” (TORRE, 1993 apud BRUNO,
2007, p. 88).
Nessa perspectiva, Bruno (idem) afirma que a didática “propõe ação
fundamentada que reúna conhecimentos de diversas áreas, integrando-as
segundo uma intencionalidade político-ideológica voltada para o processo de
aprendizagem” (p. 89).
Dessa forma, compreendo a didática como a teoria responsável por
investigar o ensino enquanto um fenômeno único e complexo. Ela se encarrega
de perceber essa prática em sua totalidade, propondo reflexões e análises
teóricas acerca da atividade docente, expressando um intento sócio-político,
que se traduz nos recursos pedagógicos utilizados. Portanto, a didática é um
campo que se fundamenta cientificamente, e à medida que se compromete
com a prática, ela é uma disciplina que envolve questões técnico-
metodológicas, como todo processo científico.
A didática é uma prática humana que, nesse sentido, adquire então
características próprias da ação do homem. Geralmente, definimos objetivos,
estipulamos meios para alcançá-los, realizamos as ações estabelecidas, e
analisamos os efeitos obtidos. Tal percurso não necessariamente deve
respeitar essa linearidade, mas deve ser identificado como pontos para
referência do processo didático, como elementos que podem nortear o trabalho
docente. De acordo com Luckesi (1993), estes tópicos, o planejamento, a
própria execução da ação e a avaliação do processo se constituem como
algumas das temáticas básicas que incorporam a chamada “Didática Geral”.
Traremos esses tópicos, desenvolvidos pelo autor, não com o objetivo de
esgotá-los, nem tampouco de fazer a defesa deles como técnicas a serem
utilizados a rigor na prática de ensino, e, sim, como elementos inerentes ao
fazer docente. No entanto, temos a consciência que eles podem ocorrer ou
15
não, variando conforme o contexto, a experiência pessoal do professor e o
próprio momento da aula em questão.
Planejamento: se constitui como uma ação política, pressupõe a tomada de
decisões, é um momento de seleção, de escolhas, que não se dão de forma
neutra. Pode ou não fazer parte de um registro escrito, mas impreterivelmente
só fará sentido se for uma memória viva, contribuindo com a prática. É uma
elaboração dinâmica que pode/deve sofrer modificações ao longo de sua
concretização. Planejar didaticamente envolve escolhas filosóficas, teóricas,
políticas e, também, metodológicas. A ação de planejar para Luckesi (idem)
não deve ser reduzida ao preenchimento de formulários, nem ser vista, por
outro lado, como algo que enclausure a prática. O planejamento é um dos
elementos fundamentais, pois é um momento singular para reflexão e decisão
em prol da atividade de ensino.
Ação: para a execução da ação planejada é necessário ter consciência da
finalidade do ato que se vai realizar. Luckesi defende que quando o professor
possui clareza sobre os fins que se quer atingir com o ato educacional, ele
consegue realizar uma interação reflexiva com os acontecimentos,
identificando, portanto, os meios de ação coerentes e necessários para que a
aprendizagem do aluno ocorra naquele momento. Cada situação de ensino é
única, pois está situada em um dado momento histórico e social. Além disso,
cada educando possui suas idiossincrasias, assim como o professor também,
logo é preciso que o educador construa o seu próprio caminho, que conduzirão
sempre a estradas distintas a cada situação didática. A ação pedagógica,
dessa forma, deve se configurar em uma práxis, que direcione teoria e prática
num mesmo objetivo. Essa práxis “garantirá assim, ao educador, uma forma
metodológica, racional e dinâmica, para a criação de um corpo de
conhecimentos próprios e originais, independentes e inovadores, situados e
não-restritivos” (ibidem, p. 170).
Avaliação: refere-se a um momento que pode ocorrer durante ou após a
realização da atividade. Para o autor utilizado, ela deve se orientar levando em
16
consideração a tríade ação-reflexão-ação, ou seja, o julgamento qualitativo
sobre a atividade desempenhada deve estar em função de um aprimoramento
sobre essa mesma ação. Ela é um instrumento sobre o qual se realiza um
julgamento de valor sobre as manifestações da realidade, para que seja feita
uma tomada de decisão.
Identificar e destacar esses três tópicos é importante à medida que se
pretende com a didática promover uma prática de ensino transformadora da
realidade social em questão. A didática, vista a partir dessa formulação, se
compromete substancialmente com a aprendizagem do aluno, com todo o seu
processo formativo, educacional, psicológico e emocional. Importa para ela,
como um ato político, romper com os sistemas reprodutivos das camadas
sociais e garantir oportunidades igualitárias para todos os sujeitos.
Mas nem sempre o ato de planejar, executar e avaliar foram orientados
por esses objetivos. Antigamente, antes da Revolução Industrial e da expansão
capitalista essas práticas ocorriam de maneira mais espontânea, sem
rigorosidade ou exigência por parte dos órgãos educacionais. Com a
associação entre a educação e o desenvolvimento econômico, o trabalho
escolar passou a ser regido por padrões tecnicistas de eficiência e eficácia,
combatendo a ausência de objetivos precisos para os atos educativos:
Um sistema de ensino, cujos objetivos são imprecisos, é como um barco que navega sem destino: não podendo fixar sua rota, acaba geralmente por se locomover em círculos. Refletindo o conceito que a sociedade faz do próprio futuro, os objetivos educacionais de um país devem evidentemente, ser fixados pelo conjunto desta sociedade e pelos dirigentes que a escolheu. (UNESCO, 1971, p. 14 apud DAMIS, 1997, p. 178).
A exposição dessa proposta foi recebida por meio de duas posições
diferentes. A primeira destacou a importância do planejamento como meio
racional para garantir o cumprimento de metas estabelecidas, sendo essa uma
concepção mais tecnicista desenvolvida em meados dos anos 60. E a
segunda, introduzida nos anos 70, era taxativamente contra essa proposição,
tendo uma base mais sociológica, histórica e filosófica, descartava
enfaticamente essa abordagem técnica.
De acordo com Damis (1997), o planejamento, a execução e a avaliação
são tópicos que devem fazer parte do currículo dos profissionais da educação. 17
Assim, a preparação e a adequação de estratégias para o cumprimento de
objetivos devem a ser vistas não como elementos rígidos e fechados que visam
atender às demandas do capital, mas, precisam a ser utilizadas como “meios
que contribuem para compreender, repensar e redefinir a função social
desempenhada pela instituição escolar” (idem, p. 173).
Nesse cenário, podemos perceber que há conteúdos que são comuns e
essenciais para a formação do professor, independente da sua área de
atuação, o que sugere, portanto, uma “Didática Geral”, além daquelas ditas
específicas.
Cabe ressaltar que identificamos a importância destas didáticas
específicas para cada área do conhecimento, por acreditarmos que o
embasamento teórico-metodológico é fundamental para a constituição da
docência, porém não as vemos como excludentes de uma didática que vise
incorporar fundamentos para a totalidade do ensino compartilhado com o
educando. Vale destacar que também compreendemos que tratar a didática
específica como exclusiva e suficiente na formação docente, tida como método
e como prática de ensino de determinadas áreas é um equívoco. Focalizar a
didática como um procedimento da área específica é desconsiderar sua
amplitude, abrangência, e seus desdobramentos. Pois esse campo é
fundamental para a formação docente para além de métodos e técnicas de um
campo especifico.
Em uma pesquisa realizada com cinco universidades brasileiras,
contemplando todos os cursos de licenciatura, as autoras Martin e
Romanowiski (2010) observaram que a didática, como campo de investigação
de todo o complexo fenômeno do ensino, vem perdendo espaço para uma
didática que prioriza os aspectos específicos do fazer pedagógico.
Os dados coletados nos projetos pedagógicos dos cursos de licenciaturas das universidades investigadas mostram que a maioria dos cursos deixa de oferecer a disciplina Didática Geral e volta a trabalhar o processo de ensino – seu objeto de estudo – em disciplinas específicas voltadas para as metodologias das áreas de conhecimento. Essa tendência também se manifesta na produção acadêmica da última década, conforme estudo realizado sobre o estado do conhecimento (MARTIN e ROMANOWSKI, 2010, p. 211).
18
Para essas autoras, a didática com essa dimensão da totalidade, muito
enaltecida principalmente na década de oitenta, fragmenta-se nas
metodologias de ensino específicas devido a uma valorização da prática, como
um campo para a demonstração de habilidades e competências técnicas para
o exercício profissional. A prática deixa de ser vista como uma área fecunda
para a percepção, problematização e compreensão dos processos de ensinar e
de aprender. Isso implica uma focalização nos procedimentos e recursos
didáticos específicos centrados nas disciplinas especializadas.
Martin e Romanowski (idem) defendem ainda, e refletem as concepções
pretendidas na presente investigação, que essa opção dos currículos
universitários pelas didáticas específicas traduz a influência dos processos
produtivos capitalistas na formação de professores. Para elas, essa ênfase na
metodologia reflete o interesse em formar empregados mais dinâmicos e
flexíveis compatíveis com a nova formulação de trabalho e de exploração do
trabalhador.
Nesse cenário, nossa discussão se torna extremamente importante e
atual, já que os valores que se pretende atribuir ao professor durante o seu
momento formativo não podem se confundir com aqueles propagados pelos
interesses do capital. Logo, não interessa para a didática formar sujeitos
polivalentes, dinâmicos, produtivos e participativos. Esses adjetivos podem ser
incorporados em sua formação sim, mas por consequência, pois o objetivo
maior da disciplina de didática é formar educadores autônomos, conscientes da
repercussão de suas ações, críticos e reflexivos quanto à função social que
eles possuem.
4. 3. Alguns dados levantadosA carência de políticas que instituam a formação pedagógica dos
professores universitários é frequente nos discursos dos estudiosos da área,
como por exemplo, Anastasiou (2005), Veiga (2005), Isaia (2005), Bazzo
(2005), Pimenta e Anastasiou (2008) e Masetto (2003).
Esse descaso não é corrente apenas no Ensino Superior, como foi
mostrado nos dois capítulos anteriores, a didática vem sofrendo um
19
desprestígio generalizado, que vem corroendo também os espaços de
formação para a Educação Básica, ou seja os cursos de graduação que
formam as licenciaturas.
Um exemplo concreto disso é a exclusão da disciplina de “Didática
Geral” do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UFJF, a partir da
matriz curricular do ano de 2007.
Por compreender a importância dessa disciplina para a formação do
professor da educação básica, e também por considerar que a ausência e a
desvalorização dessa área trazem severas consequências para o processo
formativo do docente do ensino superior, que passa a enxergá-la como uma
ciência de menor valor ou até mesmo a não vê-la como uma ciência,
introduzimos nesse trabalho uma investigação a respeito da exclusão de tal
disciplina no curso de Pedagogia da UFJF.
Dessa forma irei relatar de forma sucinta o percurso realizado para
compreender como se deu esse processo e, por fim, mostrarei os dados
encontrados em uma pesquisa que abrangeu todos os cursos presenciais de
Pedagogia das Universidades Federais brasileiras, que tinha por objetivo
identificar a existência ou não das disciplinas de didática (geral e específica)
nessas instituições.
O trajeto percorrido em busca da compreensão sobre como se deu a
retirada da disciplina de didática do curso de pedagogia da UFJF iniciou com a
proposição da orientadora, Adriana Rocha Bruno, em desenvolver duas
entrevistas semi-estruturadas com as professoras Diva Chaves Sarmento4 e
Regina Coeli Barbosa Pereira5, por atuarem na faculdade desde 1980 e 1989, 4 Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1972), mestrado em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1978) e doutorado em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1986). Texto disponibilizado pela plataforma Lattes, por meio do link: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4780067Z6. Com acesso em: 24/01/2014.
5 Possui graduação em Licenciatura Plena em Filosofia. pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1984), graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1973), mestrado em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988), doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2002) e Pós-Doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro(2004). Texto disponibilizado pela plataforma Lattes, por meio do link: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4736383Y. Com acesso em: 24/01/2014.
20
respectivamente, estando presentes e participando ativamente, portanto, em
diversos momentos históricos vividos pela unidade acadêmica, incluindo a
reestruturação curricular do curso de Pedagogia de 2007.
Ao conversar com a professora Diva, em uma entrevista que durou
aproximadamente trinta minutos, no dia 04 de novembro de 2013, observei que
embora ela se posicione contra a retirada da disciplina de didática da matriz
curricular do presente curso, ela não foi específica ao relatar como isso havia
ocorrido, afirmando apenas que a faculdade estava seguindo as orientações da
Resolução CNE/CP Nº 1, de 15 de maio de 2006, que institui as Diretrizes
Curriculares para o curso de licenciatura em Pedagogia.
Não foi possível agendar com a professora Regina uma entrevista,
devido à incompatibilidade de horários, mas a educadora enviou suas
impressões a esse respeito por email, no dia 08 de novembro de 2013. O seu
discurso foi bastante semelhante ao da professora Diva, para ela a disciplina
de Didática Geral deve oferecer a aquisição de posicionamentos filosóficos e
ideológicos, para que o professor atue com segurança e tenha, com a
educação, objetivos políticos. Segundo essa professora, o desfavorecimento
dessa disciplina se iniciou nos anos 80, em virtude de um pensamento
preconceituoso, que criticava a dimensão técnica da prática docente. Ela
esclarece:
Na década de 1990, aconteceram muitos debates aqui na FACED, a qual formava, no Curso de Pedagogia os especialistas: Orientador Educacional (OE), o Supervisor Pedagógico, o Administrador Escolar (ADE), o Inspetor Escolar (IE) e o professor o Curso de Magistério. Como resultado desses debates, o Curso de Pedagogia mudou sua especificidade; hoje forma o professor da Escola Básica, ou seja, o Licenciado em Pedagogia, cuja formação anterior acontecia no Curso de Magistério de 2º Grau (extinto). Mas nesse período também se discutiu a formação dos alunos dos curso de Licenciatura (futuro professor do Ensino Fundamental e Médio), e a Didática foi alvo de muitas criticas que desmereciam, e negavam seu valor como disciplina de formação pedagógica. Os renomados educadores brasileiros faziam críticas aos Cursos de Formação de Professores dizendo que estes formavam o professor “técnico” que desconhecia a dimensão política de seu fazer. Negavam o tecnicismo; chamavam o professor de “tecnoburocrata”, mas não negavam especificamente a Didática (PREREIRA, 2013, entrevista concedida à autora.
21
Em um diálogo informal, Regina, propôs ainda que eu conversasse com
a professora Sônia Maria Clareto6, pois ela poderia contribuir também com a
investigação.
Dessa forma, entrevistei a professora Sonia, no dia 19 de novembro de
2013, em um diálogo que durou aproximadamente dez minutos. Sônia é
professora da UFJF, no departamento de Educação, desde o ano de 1996. Ela
relatou que não fez parte das discussões na época sobre reestruturação
curricular do curso de Pedagogia, e, portanto, não opinou sobre a permanência
ou exclusão da disciplina de didática. No entanto, com um posicionamento
distinto das duas primeiras professoras entrevistadas, Sônia declara que não
houve uma retirada da disciplina de didática, pois a mesma encontra-se
inserida nas disciplinas de didáticas específicas.
Ao refletir sobre as falas dessas três renomadas professoras, percebi
que ainda era necessário buscar mais elementos para compreender esse
processo. Nessa perspectiva, analisei as “Atas de reunião da congregação da
Faculdade de Educação da UFJF” do período compreendido entre os anos de
2005 a 2007.
Trata-se de quatorze atas, porém apenas duas tinham alguma relação
com o objetivo da investigação proposta. A primeira datada em 13 de
dezembro de 2006, com um dos itens da pauta para votação referindo-se a
“Definição da situação das disciplinas (obrigatórias – eletivas – opcionais)”. E a
segunda, datada em 16 de maio de 2007, com um dos itens da pauta para
votação referindo-se a “Nova proposta curricular para o Curso de Pedagogia –
versão abril/2007.”
Na primeira ata a então Coordenadora do Curso de Pedagogia, a
professora Maria Assunção Calderano, apresentou um quadro com as
disciplinas obrigatórias, eletivas e opcionais que iriam compor o curso de
Pedagogia. De acordo com o documento, vários professores proferiram a sua
opinião a respeito, entre eles a professora Regina Coeli Barbosa Pereira, que 6 Possui graduação em Matemática pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1987), mestrado em Educação Matemática pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1993) e doutorado em Educação Matemática pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2003). Texto disponibilizado pela plataforma Lattes, por meio do link: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4760090H3. Com acesso em: 24/01/2014.
22
prestou esclarecimento sobre a disciplina de Didática e falou sobre os
equívocos que permeiam tal disciplina. Como a ata não descreve quais eram
as disciplinas presentes no “quadro”, ou seja, aquelas que permaneceriam, em
detrimento daquelas que seriam retiradas, o depoimento da professora Regina
sugere, ao meu entender, uma tentativa em prol de manter a disciplina de
Didática no currículo. Porém a reestruturação da pedagogia foi aprovada com
27 votos a favor e uma única abstenção.
Na segunda ata, ocorre a votação para a implementação da proposta
curricular para o curso de pedagogia, com 24 votos a favor, 01 contra e 03
abstenções. O documento fala ainda que no quarto momento da reunião foram
feitos encaminhamentos no sentido de concluir o processo de retirada,
mudança de nome e alteração no caráter de determinadas disciplinas. Mas
também não é específico quanto expor quais disciplinas eram essas.
Assim, para tentar agregar maiores informações sobre como se deu o
processo de exclusão da disciplina de didática no curso de Pedagogia/UFJF,
visto que as atas não evidenciaram essa questão, recorri à comparação entre a
PROPOSTA DE REFORMULAÇÃO DO CURSO DE PEDAGOGIA ABRIL/2006
e o INFORMATIVO REESTRUTURAÇÃO CURRICULAR PEDAGOGIA
NOVEMBRO/2007, fornecidos pela coordenação do Curso de Pedagogia, na
pessoa do assistente administrativo Ronaldo Teles Pereira, no dia 22 de
novembro de 2013.
O primeiro documento consiste em uma proposta desenvolvida por uma
comissão presidida pela professora Hilda Lea Rabello Dall’Orto. Segundo
consta registrado, essa comissão reunia-se semanalmente desde setembro de
2005, primeiramente com o objetivo de discutir o parecer (versão 18) do CNE –
Diretrizes para o Curso de Pedagogia – de 12/09/05 e, posteriormente, para
definir questões sobre o curso a partir da promulgação da RESOLUÇÃO
CNE/CP Nº 1, DE 15 DE MAIO DE 2006, que institui as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o curso de Pedagogia. Além de trazer à tona temáticas como o
estágio obrigatório e a necessidade de atender às expectativas dos alunos em
relação a algumas disciplinas, como por exemplo, a Educação Infantil, o
documento propõe uma matriz curricular para o curso. Nessa matriz, a
23
disciplina de didática é trazida no segundo período do curso de Pedagogia com
a seguinte nomenclatura e ementa:
Didática e Formação Docente (OBRIGATÓRIA)
Tendências pedagógicas. Multidimensionalidade do trabalho docente. O trabalho interativo e as novas abordagens da comunicação em sala de aula. Planejamento, desenvolvimento e avaliação da ação pedagógica em sala de aula. A importância do trabalho interdisciplinar. A educação continuada do professor: processo individual e coletivo.
O segundo documento: INFORMATIVO REESTRUTURAÇÃO
CURRICULAR PEDAGOGIA NOVEMBRO/2007, que foi efetivamente
implementado, trata sobre o perfil do aluno, informações gerais, organização
dos núcleos previstos, prática escolar e estágio supervisionado, pesquisa,
formação para a docência e para a gestão e traz ainda a estrutura curricular,
que vigora ainda nos dias atuais.
Essa matriz já não apresenta a disciplina de Didática, tendo apenas as
disciplinas vinculadas ao núcleo denominado “Saberes Escolares”, como as
disciplinas de “Fundamentos Teóricos e Metodológicos em: Português,
Matemática, Ciências, Geografia, História, Artes, Educação Infantil,
Alfabetização e EJA”.
Entendo que a retirada dessa disciplina representa uma lacuna no
processo formativo do aluno de graduação de Pedagogia, pois a didática é uma
área do conhecimento que tem como ponto de partida a reflexão sobre a
prática educativa, em específico, sobre o processo de ensino e de
aprendizagem (PIMENTA e ANASTASIOU, 2008). Tais saberes que são
necessários à prática de todos os professores, são analisados na disciplina de
Didática, de forma mais abrangente e não estratificada, como ocorre (e deve
ocorrer) nas disciplinas de saberes específicos.
Como dito anteriormente, não pretendo com isso desmerecer ou eliminar
as disciplinas de didáticas específicas, quero somente reiterar que inclusão
delas na matriz curricular não deve servir para eliminar a disciplina chamada de
“Didática Geral”, “Didática e Formação docente” ou apenas “Didática”, já que
elas (geral e específica) não possuem a mesma finalidade e tão pouco se
referem ao mesmo assunto.
24
Dessa forma, em pesquisa realizada com todas as Universidades
Federais brasileiras que possuem o Curso de Pedagogia presencial, podemos
observar que 96% dessas instituições têm esse mesmo entendimento. Pois das
quarenta e seis IF que possuem o curso de Pedagogia presencial, apenas duas
não apresentam a disciplina de Didática, a UFJF e a UNIPAMPA, conforme
mostra a tabela em anexo. Sendo assim, das 64 Universidades Federais,
encontramos 13 que não possuem o curso presencial de Pedagogia, além de 4
matrizes curriculares que não foram encontradas e de um site, o da UFOB que
estava fora do ar.
É importante ressaltar que esses quarenta e seis cursos de Pedagogia,
96% to total, após a instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
licenciatura nesse curso, em 2006, não só mantiveram a disciplina de didática
“geral”, mas também incluíram as chamadas didáticas “específicas”, como
mostra a tabela em anexo, que traz, inclusive, o link de acesso para cada
matriz curricular analisada.
Sendo assim, seria interessante que o curso de Pedagogia da UFJF,
alunos, professores, coordenador e diretor, se propusessem a repensar a sua
matriz curricular, não somente com objetivo de integra-se aos padrões das
demais matrizes desse curso no Brasil, mas, sobretudo para discutir se essa
retirada da disciplina de didática do currículo não está afetando o modo como o
futuro professor está sendo formado.
5. DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR
5.1. Políticas e a carência delas para formação do professor universitário
A educação superior sofreu uma expansão significativa; no período de
1950 a 1992, o número de professores aumentou de 25 mil para um milhão, de
acordo com Pimenta e Anastasiou (2008). Acompanhando esse número
expressivo de docentes em exercício, observa-se também um salto na
quantidade de pesquisas, seminários, reuniões, simpósios e colóquios
relacionados à temática de formação dos professores universitários.
Nessa perspectiva, algumas indagações começam a ecoar sobre os
estudiosos da área: Formar o docente do Ensino Superior é incumbência de
quem? O que este docente precisa saber para ministrar suas aulas? Como se 25
constitui o seu fazer docente? Estas e outras questões são alvos deste estudo
e de muitos outros, como, Anastasiou, Pimenta (2008), Veiga (2005), Isaia
(2005), Pachane (2005), Ferenec e Mizukami (2005). Tais escritos deflagram a
importância de uma formação específica para o exercício da atividade de
professor, neste nível de ensino, bem como uma definição legal que a
estruture.
Nesse sentido, entendo a formação docente conforme descrito por Isaia
(2005):“processo complexo que necessita da construção de estratégias
sistematicamente organizadas, que envolva esforços pessoais e institucionais
concretamente desenvolvidos” (p. 66).
Hoje, segundo a Lei de Diretrizes e Bases 9394/96, para se tornar um
professor universitário exige-se que o sujeito possua o título de mestre e/ou
doutor, conforme se observa na leitura do presente artigo:
Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.
Parágrafo único. O notório saber, reconhecido por universidade com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título acadêmico.
Isso quer dizer que os docentes do ensino superior serão preparados (e
não formados) por esses programas, que são especificamente voltados para a
atividade sistemática de pesquisa em campos específicos do saber.
No entanto, segundo Anastasiou e Pimenta (2008), um pesquisador
amplamente reconhecido por suas investigações, que muito contribui para o
avanço científico, não necessariamente será um exímio professor. Isso se deve
ao fato de que ensino e pesquisa possuem elementos distintos. Ou seja, os
sujeitos, o tempo e o método, por exemplo, não serão os mesmos nas duas
atividades. O ensino, por se tratar de um fenômeno complexo, envolvendo
diversos atores educacionais, em uma temporalidade específica, exige,
portanto, um processo de reflexão sistemático, voltado para as questões
pedagógicas e distintas das atividades de investigação.
Tal formação pedagógica se justifica, pois, de acordo com Veiga (2005),
ao se deparar com a carreira docente o educador estará incumbido de exercer
26
papeis para além do ser pesquisador, mas também de administrador de alguns
setores da instituição, especialista em instâncias científicas, assessor de
projetos, orientador acadêmico, e, principalmente, professor da graduação e
pós-graduação.
Sendo assim, desenvolver pesquisa é um dos atributos importantes para
a docência, já que o professor-pesquisador poderá mostrar aos seus alunos os
conhecimentos construídos por ele, bem como poderá fomentar nesse
estudante o interesse pela descoberta e pelo novo. No entanto, ainda que a
atividade de pesquisar seja essencial para a atuação do bom professor, ela
possui natureza distinta da prática de ensinar, logo a formação para o exercício
dessas duas fundamentais funções para a sociedade, não podem se confundir.
Tendo em vista o caráter complexo da profissão docente, bem como a
formação incipiente para essa função, a Resolução 3/99 do CNE prevê a oferta
para a pós-graduação lato senso de apenas uma disciplina de metodologia que
abranja a problemática do ensino e da aprendizagem. Já nos cursos stricto
sensu, a situação é ainda mais grave, já que formação desse professor fica a
cargo de iniciativas individuais, que quando ocorrem, tratam-se também de
disciplinas de 60 horas, com ementas bem variadas, mas que geralmente tem
se proposto a contribuir com o crescimento pedagógico do docente no ensino
superior.
Ainda segundo Veiga (ibidem), o governo, por meio do MEC, SESu,
Capes e Inep, propõe os parâmetros de qualidade institucional, e algumas
instituições da educação superior desenvolvem seus próprios programas de
formação para seus educadores.
Um exemplo de iniciativa independente de uma IF se constitui como a
CIAPES - Coordenação de Inovação Acadêmica e Pedagógica no Ensino
Superior - da Universidade Federal de Juiz de Fora, vinculada à PROGRAD -
Pró-reitoria de Graduação e coordenada pela professora Adriana Rocha Bruno,
construída com a finalidade de trabalhar e refletir sobre a docência no Ensino
Superior com os próprios professores da universidade. Inicialmente, o percurso
formativo oferecido pela CIAPES tem se comprometido a atender aos docentes
em estágio probatório. De acordo com a coordenadora Adriana, em uma
entrevista concedida a revista A3 da UFJF, “o projeto também vai ao encontro
27
da lei 12.772/2012, que torna obrigatória a realização de ações formativas na
recepção de docentes nas universidades federais” (BRUNO, 2013 apud
LOPES 2013, p. 18).
Mediante ao exposto, podemos perceber que as políticas públicas não
definem diretamente orientações para a formação do magistério universitário.
Cabe à sociedade acadêmica, então, discutir e problematizar sobre a sua
importância. Pois nos cursos de Pedagogia e demais Licenciaturas os alunos
participam de disciplinas criadas com o objetivo de desenvolver as questões do
ensino e da aprendizagem, ainda que para a Educação Básica. Porém, os
profissionais de outros cursos como, Direito, Medicina, Engenharia, entre
outros, ao se tornarem docentes, geralmente, levam para suas práticas
elementos da sua experiência enquanto aluno ou mesmo os exemplos de seus
professores, apenas.
Pimenta e Anastasiou (2008) desenvolveram um relato sobre algumas
experiências internacionais, vistas por elas como satisfatórias. De acordo com
as autoras, países como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Suécia, França e
Austrália têm sido referências no que tange a formação docente no ensino
superior. Existem experiências que abrangem tanto o professor recém chegado
a casa, como iniciativas voltadas para uma formação contínua.
Iniciativas de formação inicial: são propostas destinadas àqueles que acabaram
de ingressar no magistério superior. As autoras mostram como exemplo a
iniciativa da Universidade do Zaire, que exige formação pedagógica de todos
os doutorandos. No Brasil, podemos perceber certa similaridade, por meio do
Programa Estágio Docência, realizado pela Capes. Voltando as práticas
existentes no exterior, percebe-se que tais ações têm ocorrido em formatos
distintos: de longa duração, um ano; com menor carga horária, mais flexível,
variável; e, por fim, opcional e com práticas docentes tuteladas, ou seja,
atividades docentes realizadas sob a tutela de outro professor mais experiente.
Iniciativas de formação contínua: se constituem como propostas voltadas aos
professores experientes. Essas ações são propostas, geralmente, levando em
consideração três modalidades: formação espontânea, tendo em vista as
28
demandas originadas na própria prática docente ou no departamento; formação
voltada a atualizações ou inovações externas; e, também, no âmbito de uma
chamada Pedagogia universitária, que pode ser interna ou externa.
Preparação, formação e desenvolvimento profissional de professores
universitários: ações propostas visando contemplar algumas temáticas, como
por exemplo, desenvolvimento de habilidades e estratégias de comunicação;
processos avaliativos; elaboração de planos, programas, ementas, organização
curricular, entre outros.
As iniciativas apresentadas expõem como as ações formativas para e
com o ensino superior vem sendo desenvolvidas ao redor do globo, por meio
dos escritos das autoras apresentadas. Em seu livro, o educador Masetto
(2003) aborda algumas possibilidades para que a formação docente no ES
aconteça. Para esse autor, a pós-graduação consiste em um momento
privilegiado para que a formação pedagógica ocorra, sendo que ela poderá se
dá em vários formatos.
Masetto (idem) defende que durante os processos de mestrado e de
doutorado sejam formadas turmas com alunos oriundos de cursos diferentes,
constituindo um grupo heterogêneo, com o objetivo de organizar seminários,
workshops, relatos de experiências e a proposição de pesquisas sobre o
ensino na universidade, identificado por diversas áreas.
O autor propõe também a implementação de projetos, formados por
grupos pequenos de professores de disciplinas diversas, construção de oficinas
com temas sugeridos pelos docentes, convidar especialistas externos a
universidade com o intuito de desenvolver uma interlocução com o que está
ocorrendo em outros espaços, grupos de estudos.
Os exemplos trazidos acima não são abordados pelo autor com a
finalidade de esgotar as possibilidades, ao contrário, Masetto afirma que à
medida que tais ações forem se constituindo outras demandas, ideias e
necessidades aparecerão. Além disso, ele não trata a questão da utilização da
tecnologia, das redes sociais e dos ambientes online como um todo, que têm
se mostrado como recursos profícuos para trocas de experiências e
aprendizados. A utilização desses instrumentos podem acontecer tanto como
29
espaços institucionalizados, em cursos propostos pela universidade, sendo
semi-presenciais ou totalmente virtuais, ou, ainda, para iniciativas pessoais dos
próprios docentes.
Embora tais propostas tenham sido lembradas e também defendidas por
esse trabalho, de acordo com Isaia (2005), os professores ainda tendem a não
considerar importantes os momentos institucionalizados previstos para a
formação para/com o docente.
Chama atenção a ausência de compreensão de professores e de instituições sobre a necessidade de preparação específica para exercer a docência. Assim, os docentes, mesmo estando cientes de sua função formativa, não consideram a necessidade de uma preparação específica para exercê-la. Como se o conhecimento específico desenvolvido nos anos de formação inicial e/ou ao longo da carreira e também o exercício profissional bastassem para assegurar um bom desempenho docente (ISAIA, 2005, p. 65).
Cabe salientar aqui a fragilidade do meu argumento vista apenas pela
minha posição como aluna de graduação. Por esse motivo, acredito que
realmente me parece no mínimo complicado realizar proposições para o
docente do ensino superior. No entanto, unanimemente, todos os meus
professores, do curso de Pedagogia/UFJF, ressaltaram a importância da
formação inicial e continuada para a construção e prática da docência7. Além
disso, recupero os escritos de Freire (1996), em Pedagogia da Autonomia, em
que um dos capítulos é intitulado com os dizeres: “Ensinar exige consciência
do inacabamento”. Com isso, o autor queria nos lembrar que todo ser humano,
por sua própria natureza, é inacabado, ou seja, nenhum sujeito, por mais
esclarecido que seja, poderá se dizer completo, conhecedor de tudo. Esse
conceito de inacabamento, por fazer parte do indivíduo, por consequência
também faz parte da docência, que pressupõe uma ininterrupta formação, seja
ela de natureza específica ou pedagógica.
5.2. A constituição da docência no Ensino Superior
O trabalho é uma das formas de atuação humana que possibilita
distinguir o homem do animal. Por meio dele, o sujeito é capaz de, utilizando 7 Estes dados são parte da pesquisa realizada para esta pesquisa com os docentes da Faculdade de Educação da UFJF.
30
suas propriedades racionais e emocionais, projetar e executar determinada
ação, diferentemente das demais espécies que vivem em nosso planeta.
O trabalho é, portanto, uma atividade libertadora da humanidade, pois tem como característica propiciar a transcendência da condição natural. Ao superar a natureza por meio do trabalho e por ser ético, ser de vontade, o homem constrói sua história. Não sendo indiferente ao mundo que o rodeia, torna-se sujeito, agente da história (ASBAHR, SANCHES; 2006; p. 59).
Esse movimento de construir a sua história, indo além, de construir a
sua identidade, por meio do trabalho, se torna especialmente evidente na área
de conhecimento denominada Humana, já que a formação que o sujeito recebe
para se profissionalizar, bem como a sua própria atuação, por vezes o auxilia a
se compreender e o permite a se colocar diante das situações. Logo, o
trabalho, por excelência, na área das ciências humanas possibilita a formação
não só do profissional, mas também do próprio sujeito em questão.
Nessa perspectiva, a educação, como pertencente a essa categoria e
por tabela o trabalho do professor, inclusive no ensino superior, contribui na
constituição do ser, assim como o que o sujeito é em sua vida privada, também
se faz presente em sua profissão. Tal asserção se confirma por meio das
palavras da autora Isaia (2005), ao afirmar que a docência de constitui por
meio dos dois elementos citados acima, bem como a experiência adquirida nos
espaços institucionais habitados pelo docente.
[...] a docência superior é um processo complexo que se constrói ao longo da trajetória docente e que esta envolve, de forma intrinsecamente relacionada, a dimensão pessoal, a profissional e a institucional. Na tessitura das três, dá-se a constituição do ser professor. [...] o professor é um ser unitário, entretecido pelo percurso pessoal (ciclo vital), pelo profissional (os vários caminhos construídos pela profissão) e pelo institucional (os diversos contextos em que atua ou atuou) (p. 63).
Sobre esse assunto Bolzan e Powaczuk (2009), estabelecem, levando
em consideração a teoria sócio-histórico-cultural, elaborada por Vygotski (1989)
e Leontiev (1984), que a constituição da docência se dá por meio da relação
entre as potencialidades do sujeito e as necessidades da profissão, nesse
processo ganha importância, ainda, as interações estabelecidas entre os
31
colegas de trabalho e os alunos, como elementos essenciais para a
aprendizagem docente.
As autoras supracitadas denominam esse processo de construção da
docência, que se constitui em meio ao movimento formado pelas ações
internas e as exigências externas, como “professoralidade”. “Trata-se de uma
produção particular, não solitária que se constitui a partir das redes de relações
tecidas nos diferentes contextos profissionais de atuação docente” (BOLZAN e
POWACZUK, 2009, p. 94).
Assim, torna-se evidente que a docência, enquanto uma atividade
plenamente ligada à própria existência do sujeito, se constitua a partir de
componentes afetivos, políticos, sociais, culturais, históricos, filosóficos e
ideológicos apreendidos ao longo do percurso formativo e humano percorrido
pelo indivíduo. Certamente, esses elementos influenciam o modo como o
professor irá constituir o seu sabe/fazer didático, a sua docência.
Dessa forma, compreendemos que a constituição da docência não se dá
de forma linear e nem mesmo em um momento único ou específico, o que nos
direciona ao conceito de “trajetórias de formação” proposto por Isaia (2005).
Segundo ela, as trajetórias formativas consistem no
[...] percurso construído na inter-relação das dimensões pessoal e profissional, em que a pessoa do professor se reconhece ao longo dele, formando-se e transformando-se em interação com grupos com os quais interage, sejam estes formados por colegas, por alunos ou pelos demais integrantes da comunidade educativa (ISAIA, 2005, p. 72).
É bastante interessante essa proposição da autora à medida que esse
conceito não pressupõe um momento específico de formação, nem tão pouco
um único caminho a ser seguido. Com isso ela identifica que o trajeto de cada
sujeito será sempre singular, determinado pelas interações as quais ele tiver
estabelecido, em determinado momento histórico, cultural e social. Devemos
assegurar, porém, que essa constatação não isenta a necessidade de uma
política institucional de formação pedagógica, mas legitima os conhecimentos
informais produzidos e apreendidos pelo sujeito ao longo de sua história de
vida e profissional.
Esses aspectos nos remetem ao professor como sujeito de sua formação, constituindo-se como condições para a produção de novas transformações em seu desenvolvimento intelectual, a
32
capacidade de operações de separação de aspectos de sua atividade, percebida a relação entre elas; pela habilidade de modificar um componente da atividade e, finalmente, pela capacidade de diferenciação dos meios e procedimentos das atividades e a seleção orientada a um fim durante a realização da atividade, ou seja, a capacidade de auto-regulação da atividade realizada (BOLZAN e POWACZUK, 2009, p. 98).
Nesse sentido, é preciso incluir a prática docente, que também consiste
em um ingrediente importante para a dinâmica de constituição da docência,
entretanto ela não pode ser confundida com a própria atividade de formação.
Enquanto o professor ministra suas aulas, ele cria estratégias que visam
proporcionar ao aluno um melhor aprendizado, isso implica que o produto de
seu trabalho trará repercussões no outro. Por outro lado, durante o momento
de formação o sujeito direciona o seu trabalho sobre si mesmo, em uma ação
reflexiva, nas dimensões: pessoal e profissional.
Para Isaia (2005), quando o docente não se propõe a refletir sobre sua
prática, ele acaba perpetuando as práticas daqueles que foram seus
professores, na dinâmica da instituição em que atua ou se espelhando nas
práticas dos colegas. Utilizar boas práticas como exemplo de forma alguma
será um prejuízo para a formação da própria docência, o problema salientado
pela autora somente existe quando a incorporação de determinado modelo é
feita sem uma devida análise pelo professor em exercício.
Dessa forma, a identificação e a utilização de propostas feitas por outros
profissionais podem ser traduzidos como elementos formativos para o
aprendizado da docência, uma vez que nenhuma aula será idêntica a outra,
pois os alunos, o tempo, o espaço serão sempre diferentes, sobretudo, a forma
com que o sujeito irá se apropriar dessas práticas será distinta, devido ao seu
ponto de vista, suas experiências, que são únicas.
Assim sendo, o professor, ao se tornar autônomo na construção de sua
trajetória formativa, poderá também contribuir, por meio do ensino e da
mediação feita por ele, para que o seu aluno se torne, por si mesmo, um sujeito
autônomo, durante o seu momento de formação. Ainda por esse viés, que
assegura que ninguém poderá promover a autonomia no outro, e nem mesmo
aprender pelo outro, identificamos a participação do professor e do aluno nos
processo de ensino e aprendizagem.
33
Isso nos remete ao que Isaia (2005) descreve como aprendizagem
compartilhada. Como falado anteriormente, a constituição da docência envolve
a interação entre o educador e os seus alunos, os colegas de trabalho, a
academia e a comunidade.
Aprender a ser professor ocorre na relação com seus pares, nas mediações e nas interações decorrentes desse processo. Portanto, a docência superior ocorre no espaço de articulação entre modos de ensinar e aprender, em que professores e alunos permutam as funções de ensinantes e de aprendentes (p. 76-77).
Dessa forma, podemos falar em aprendizagem colaborativa, em que o
docente e o discente constroem, em uma mesma situação, conhecimentos
profissionais. Essa participação de quem ensina e de quem aprende na
construção da docência, bem como a participação do aluno e do professor na
consolidação do processo de ensino e de aprendizagem, remete ao que
Pimenta e Anastasiou (2008) denominaram como “ensinagem”, que será
abordada no sub-tópico seguinte.
5.2.1. Ensinagem
O ensino é uma prática complexa que, portanto, não pode ser vista por
um único olhar. Faz parte de sua projeção e execução a análise crítica de
alguns conhecimentos como metodologias, técnicas e teorias.
Nesse cenário, a atividade de ensinar não se resume ao momento da
aula, ela pressupõe uma relação entre o ensinar docente e o aprender
discente. Dessa forma, tomemos como função do professor para que o ensino
ocorra a proposição de objetivos, a seleção dos conteúdos programáticos, a
identificação do nível cognitivo do educando, entre outros. No entanto, ainda
que todas essas ações sejam realizadas pelo professor, seu trabalho somente
alcançará êxito por meio da disposição do aluno em aprender.
Sendo assim, o ensino e a aprendizagem são processos que se
complementam, se associam, mas não se confundem. São processos
dialéticos, constituídos pela participação imprescindível do professor e do
aluno. Enfim, não existe ensino sem aprendizagem. Essas afirmações foram o
combustível para que as autoras Pimenta e Anastasiou (2008) propusessem o
34
conceito de ensinagem, que está descrito abaixo com as palavras das próprias
autoras:
Na ensinagem, a ação de ensinar é definida pela ação de aprender, pois, para além da meta que revela a intencionalidade, o ensino desencadeia necessariamente a ação de aprender. Essa perspectiva possibilita o desenvolvimento do método dialético de ensinar (PIMENTA e ANASTASIOU, 2008, p. 205)
Em antagonismo a essa proposta, está àquela da aula expositiva,
semelhante a uma palestra, em que a apreensão do conteúdo é importante,
mas não é necessariamente indispensável, até porque, nela não há aluno, e,
sim, ouvinte. “Nessa superação, a aula – como momento e espaço privilegiado
de encontro e de ações – não deve ser dada nem assistida, mas construída,
feita pela ação conjunta de professores e alunos” (idem, p. 207).
5.2.2. Competência pedagógica do docente no ensino superior
Masetto (2003), Pimenta e Anastasiou (2008) vêm mostrando em seus
livros, que a corrente crença de que “quem sabe, automaticamente sabe
ensinar”, tem estado muito presente em nossa sociedade e principalmente na
academia. Essa afirmação veio acompanhada do desprestígio da didática e do
entendimento errôneo de que dar aula se constitui como transmitir,
unilateralmente, um conhecimento, como é feito por conferencistas e
palestrantes.
De acordo com Masetto (idem), recentemente, essa crença tem sido
colocada de lado em virtude da facilidade de acesso ao conhecimento que o
aluno possui, não havendo espaço, portanto, para um professor “repassador de
conhecimentos”, já que as mais variadas mídias, bem como a imensidão de
sites, jogos, vídeos, entre outros recursos online, já cumprem esse papel.
Dessa forma, os docentes do ensino superior, por vezes se veem
buscando métodos, estratégias e condições que auxiliem a aprendizagem do
aluno e até mesmo que eles passem a se interessar pelo conteúdo ministrado.
Essas questões perpassam o que o autor determina de “competência
pedagógica”. Para ele, em posse dessa competência, o docente deixa de ser
especialista e passa a ser mediador.
35
Com o intuito de definir competência, Masetto (idem) se utiliza dos
escritos desenvolvidos por Perrenout e Thuler. Segundo esses autores
[...] atualmente define-se uma competência como a aptidão para enfrentar um conjunto de situações análogas, mobilizando de uma forma correta, rápida, pertinente e criativa, múltiplos recursos cognitivos: saberes, capacidades, microcompetencias, informações, valores, atitudes, esquemas de percepção, de avaliação e de raciocínio (PERRENOUT e THULER, 2002 apud MASETTO, 2003, p. 25).
Para complementar, Masetto descreve as competências necessárias ao
exercício da docência no ensino superior. De acordo com ele, para ser
professor universitário é imprescindível que o sujeito seja:
Competente em determinada área do conhecimento: isso significa que o
educador precisará ter o domínio em determinada área do saber científico.
Esse domínio deve considerar a volatilidade dos conhecimentos, sendo
necessária a constante atualização, por parte do educador. É preciso também
que ele produza conhecimentos, por meio de pesquisas, que podem ser
expostas para a sociedade, beneficiária desta, por meio de livros, artigos,
conferencias etc.
Competente na área pedagógica: para isso é preciso que o professor leve em
consideração os quatro grandes eixos do processo pedagógico: a relação entre
o ensino e a aprendizagem; a função do educador como gestor e conceptor do
currículo; a compreensão da mediação professor-aluno e aluno-aluno; e os
impactos da tecnologia educacional, em sua teoria e em sua prática.
Consciente de sua função política: para o saber/fazer docente é imprescindível
que o professor, que é também um cidadão, com suas ideologias e princípios
políticos, tenha ciência de seu papel formativo. Já que na sala de aula não há
espaço para a neutralidade, se faz necessário que o educador insira durante a
sua prática os temas da atualidade, fomentando a reflexão e o debate. O autor
ainda salienta que para ser professor é preciso conciliar o técnico com o ético.
Sobretudo, Masetto (2003) pensa a competência pedagógica como um
saber que constitui a docência no ensino superior, pois ela assegura que o
36
educador se preocupe em ensinar aos seus estudantes a aprender, ao invés de
ser ele o único recurso do aluno para o acesso ao conhecimento.
Pimenta e Anastasiou (2008), também corroboram dessa concepção,
indo além, apostando na parceria entre o aluno e o professor, como
identificamos no fragmento a seguir:
Ao apreender um conteúdo, aprende-se também determinada forma de pensá-lo e de elaborá-lo, motivo pelo qual cada área exige formas de ensinar e de apreender específicas, que explicitem as respectivas lógicas. Esse dado aponta para a necessidade de uma competência docente na definição de ações a serem efetivadas pelos alunos sob a sua supervisão, visando aos objetivos pretendidos, ou seja, estabelecer um processo de apreensão e construção do conhecimento. Para que tal processo se efetive com a parceria e colaboração do aluno, é importante o estabelecimento de uma relação contratual na qual ambos, professor e aluno, terão responsabilidades na conquista do conhecimento (p. 214).
5.2.3. Saberes que compõem a docência: específico, pedagógico geral e pedagógico do conteúdo
A prática docente é constituída pela integração entre o saber/fazer
próprio de uma profissão específica e a capacidade de auxiliar ao aluno a
construir seus próprios conhecimentos, mediados pelas teorias já existentes.
Nesse sentido, é imprescindível a ação do professor para a realização da tão
falada “transposição didática” do conhecimento científico para o conhecimento
acadêmico, agregando, assim, à formação profissional do aluno.
Nesse cenário, a prática docente
envolve tanto os procedimentos gerais da ação, os quais se voltam para as ações e operações inerentes à atividade educativa, quanto as estratégias mentais necessárias a incorporação e recombinação das experiências e conhecimentos próprios a essa área de atuação. Os procedimentos e as estratégias estão vinculados ao domínio específico de formação de cada professor e ao campo para o qual se formam (ISAIA, 2006 apud BOLZAN e POWACZUK, 2009, p. 95).
Sendo assim, compreendemos como elementos mobilizadores e
constitutivos da docência no ensino superior os três seguintes tipos de saberes
abordados por Isaia (2005): conteúdo específico, pedagógico geral e
pedagógico do conteúdo.
37
Lembramos, ainda, que embora estes conceitos se assemelhem
àqueles propostos por Masetto (2003), eles não são idênticos. Pois enquanto a
teoria de Isaia não toca a questão da consciência política, as competências
definidas por Masetto não descrevem precisamente os processos pedagógicos,
e o distinguem como é feito por esta autora. Vamos aos saberes:
Conteúdo específico: diz respeito aos conteúdos básicos de cada área. Esse
saber é produzido por meio de estudos metodológicos e empíricos dos
processos ocorridos na natureza e na sociedade, em prol de um maior
conhecimento sobre o mundo em que vivemos. Desde o século XIX, esse
saber vem sendo organizado em disciplinas, que se constituem na subdivisão
dos conhecimentos específicos, possibilitando a especialização e o domínio,
cada vez mais profundo de cada área da ciência (D’ÁVILA, 2011).
Pedagógico geral: se constitui na inclusão de objetivos, metas e propósitos
educacionais; requer ainda o cuidado com a classe e a interação com os
educandos; preocupa-se com o modo que os alunos aprendem; produz a
relação com os outros conteúdos; e, por fim, propõe o conhecimento que fará
parte do currículo.
Pedagógico do conteúdo: é responsabilidade deste integrar o conteúdo
específico com o conteúdo pedagógico geral, visando orientar o professor na
proposição do ensino em cada matéria.
Para Isaia (idem), ter consciência de que esses três conhecimentos são
partes da docência e que eles estão imbricados no fazer docente é
fundamental. Sendo assim, a prática sem o conteúdo específico não existe, é
uma ação vazia. No entanto, o conteúdo sem o saber pedagógico – geral e/ou
do conteúdo – não se constitui como educação, e, sim, como uma exposição
de ideias ou de informações.
6. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
O processo de análise e interpretação dos dados foi desenvolvido
levando em consideração a ordem e a temática disposta nas questões 38
propostas aos professores. Sendo assim, algumas questões foram agrupadas
tendo em vista a aproximação de seus assuntos e a melhor maneira para
responder aos objetivos destacados nesse estudo, e outras foram
apresentadas separadamente pelo mesmo motivo.
É importante destacar que a análise que segue abaixo se refere a todas
as perguntas do questionário aplicado, com exceção da questão de número
treze (O que você faz, como prática pedagógica em suas aulas, que ajuda o
estudante a aprender mais e melhor?), que fará parte do corpo de análise de
um trabalho posterior. Essa opção justifica-se pela pretensão que possuo em
associar os dados obtidos com ela em uma pesquisa empírica voltada para a
observação de práticas pedagógicas e da utilização de estratégias didáticas
desenvolvidas no interior da Faculdade de Educação.
Tendo esses tópicos esclarecidos, passemos, então, às análises.
6.1. As disciplinas de didática do ensino superior contribuem para a constituição da docência do professor universitário?
No que tange à formação específica para a docência, os dados obtidos
(por meio da questão de número 07 do questionário) revelam que 65% dos
sujeitos respondentes ao questionário afirmam ter realizado duas ou mais
disciplinas afeitas à didática do Ensino Superior. Enquanto 12% afirmam ter
realizado apenas uma disciplina e 23% que não cursaram nenhuma matéria
relacionada a essa temática em seu curso de graduação e/ou pós-graduação,
como é possível perceber por meio do gráfico a seguir:
39
Gráfico 04
No entanto, ao explicitarem os nomes das disciplinas cursadas
percebemos que seis sujeitos (35%) estavam referindo-se a matérias voltadas
a didática para o professor da Educação Básica e/ou as chamadas didáticas
específicas. Isso fica evidente nas falas:
Didática V - FACED (didática geral do curso de graduação em letras, voltada para ensino básico) (Sujeito G)
Eram disciplinas das áreas teóricas associadas a metodologia (LPortuguesa, Matemática, História....) (Sujeito F)
Nem todos os sujeitos situaram a disciplina de Didática para formação
na Educação Básica (EB) ou Ensino Superior (ES), e estes seis sujeitos
deixaram este dado explícito, o que significa que podemos ter entre os demais
sujeitos dados semelhantes, mas que não foram declarados.
Entretanto, tais dados ratificam a importância dessas disciplinas para a
composição do processo formativo de todo o professor, conforme foi abordado
no capítulo 04 deste trabalho, referente à didática.
Acreditamos que discutir a didática e/ou a docência no/do Ensino
Superior em situações específicas, como apresentado por Masetto (2003) e
Pimenta e Anastasiou (2008) é oportuno. Além disso, embora alguns temas a
serem abordados nas disciplinas para a formação docentes para a EB se
assemelhem aqueles para o ES, devemos lembrar que a finalidade e o público-
alvo não são os mesmos. Enquanto a didática para EB forma os futuros
professores desse nível de ensino para o trabalho com a criança e o
adolescente, a didática ou docência para o ES visa formar o adulto, para
trabalhar com outro adulto e considerando o campo profissional.
Ao perguntarmos aos professores sobre as contribuições que as
disciplinas de didática e/ou docência no Ensino Superior trouxeram para a sua
prática docente, na questão de número 08, observamos que a maioria (62%)
dos professores asseguraram ter sido uma experiência proveitosa, trazendo
contribuições para a sua formação e para a sua prática, como pode ser
observado nas falas a seguir:
O estudo de teorias, dos métodos, das técnicas, da organização, da avaliação e do planejamento da aula, o respeito e a compreensão da condição de cada discente, a preocupação com a formação do cidadão, o compromisso ético e político com o ensino democrático e de qualidade são
40
características que aprendi nas disciplinas que apontei acima, me proporcionando ser um professor, apesar das deficiências, que se preocupa com o discente, com o seu desempenho e seu crescimento. (Sujeito L)
Cada espaço-tempo da aprendizagem requer tratamento diferente daquilo que precisa ser trabalhado. O uso de linguagem adequada, recursos, espaços formativos, demandas de aprendizagens, todas essas questões foram discutidas nas disciplinas. (Sujeito B)
Torna o sujeito muito capaz e sensível para perceber e compreender o complexo processo de formação de pessoas. (Sujeito A)
Dentre os três sujeitos (G, J, N) que responderam negativamente,
afirmando não ter identificado contribuições ao cursar tais disciplinas, dois (G,
N) deles referiam-se a disciplinas voltadas a EB e um (J) não especificou qual
foi a disciplina por ele cursada.
Não, ela tinha pouca relação com a prática e não havia nenhuma inserção real na escola, apenas idealização. O estágio era posterior a essa disciplina. (Sujeito G)
Não. A didática que eu cursei tinha base tecnicista e eu nunca fiz uso dela. (Sujeito J)
Não, nenhuma. Estas disciplinas sempre estiveram à margem da realidade. Foram todas teóricas. (Sujeito N)
As críticas feitas por eles falam de uma não correspondência com a
prática e de uma possível base tecnicista da didática. Isso se deve ao que
Martin e Romanowski (2010) relataram sobre o caráter instrumental que a
didática se apropriou nos anos setenta, período em que o país, e por
consequência a educação, sofria os impactos da ditadura militar.
Embora, esse tecnicismo tenha assolado a didática há tanto tempo,
muitas vezes, ainda nos dias atuais, é comum que ela seja referida como
técnicas ou métodos, unicamente.
Partimos do princípio de que a didática versa sobre as finalidades do
ensinar a partir de pontos de vista político-ideológicos (relações entre o
conhecimento com o poder e a formação da sociedade), éticos (relação entre o
conhecimento e a formação humana: direitos, igualdade, felicidade e
41
cidadania), psicopedagógicos (relação entre o conhecimento e as formas de
pensar, agir e sentir, hábitos, atitudes e valores) e os conhecimentos
propriamente intitulados didáticos (organização dos sistemas de ensino, de
formação, das instituições, das seleções de conteúdos, de currículos e
organização dos percursos formativos, das aulas, dos modos de ensinar, da
avaliação, da construção do conhecimento) (PIMENTA e ANASTASIOU, 2008).
Dessa forma, identificamos a necessidade da criação ou da
permanência nos cursos de graduação e/ou pós-graduação strictu senso de
disciplinas que possuam como foco central a didática ou a docência no ES,
como queira denominar, pois consideramos que todos os aspectos
supracitados são importantes e complexos, merecendo um espaço e um tempo
específico na matriz curricular dos cursos de pós-graduação.
Assim também pensam os 94% dos entrevistados, sendo que destes
12% acreditam que essas disciplinas devem ser ofertadas como opcional,
conforme indicaram as respostas obtidas com o questionário, especificamente
com a questão 09.
Considero que devem oferecer essas disciplinas porque além de pesquisador o futuro profissional terá como principal função a docência no ensino superior. (Sujeito C)
Considero importante sim, justamente porque os cursos de graduação são voltados para a formação do professor de educação básica. Infelizmente, no entanto, essa discussão parece não ter chegado ainda na pós-graduação. (Sujeito E)
Acredito que é uma opção interessante aos alunos de pós-graduação. No entanto, não entendo que deva ser uma disciplina obrigatória, pois não acredito que todos os alunos que cursam a pós-graduação atuarão como docentes no ensino superior. (Sujeito D)
42
É interessante observar que mesmo aqueles sujeitos que não
identificaram contribuições nas disciplinas de didática que cursaram são a favor
da inserção de uma ou mais disciplinas que abordem essa temática voltada ao
Ensino Superior, com exceção do sujeito N, que se posiciona negativamente a
proposta:
Não. A prática docente é inalcançável fora dela mesma. (Sujeito N)
Sendo assim, nos posicionamos a favor do oferecimento de disciplinas
com a temática da didática no Ensino Superior, visando superar a ideia de que
a formação para a docente que atua na graduação não requer uma formação
específica para o campo do ensinar, sendo suficiente apenas o domínio de
conhecimentos específicos da sua área, voltados para a pesquisa e/ou a
atuação no campo profissional. Apartado dessa formação
[...] o professor aprende a sê-lo mediante um processo de socialização em parte intuitiva, autodidata ou seguindo a rotina dos “outros”. Isso se explica sem dúvida, devido à inexistência de uma formação específica como professor universitário. Nesse processo, joga um papel mais ou menos importante sua própria experiência como aluno, o modelo de ensino que predomina no sistema universitário e as relações de seus alunos, embora não há que se descartar a capacidade autodidata do professorado. Mas ela é insuficiente (BENEDITO, 1995 apud PIMENTA E ANASTASIOU, 2008, p. 36).
Assim, não desconsideramos a importância dos elementos destacados
acima para a constituição da docência no Ensino Superior, pelo contrário,
acreditamos que a experiência do professor em sala, a sua relação com o
aluno, com seus colegas, a sua vivência enquanto estudante e enquanto
sujeito que convive em sociedade, são essenciais à formação docente,
podendo, inclusive, ser foco de análise em diversos momentos da disciplina
institucionalizada.
43
Gráfico 05
Consoante diz Freire (1996) que se tem na formação contínua o espaço
e o tempo propício para se refletir criticamente sobre a prática, com o objetivo
de se realizar um trabalho melhor do que aquele feito anteriormente. “O próprio
discurso teórico, necessário a reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto
que quase se confunda com a prática” (idem, p. 39).
6.2. Elementos constitutivos da docência, ou seja, aspectos que contribuem para a constituição da prática pedagógica do professor
O trabalho docente possui especificidades em relação às demais
profissões. Trarei, a título de exemplo, algumas das singularidades dessa
função a fim de refletirmos sobre a sua complexidade e pensarmos,
posteriormente, em sua constituição.
Nesse cenário, ser docente implica em não poder acessar o produto do
seu trabalho na medida em que ele vai sendo construído, tão pouco isso é
possível ao seu término. Isso ocorre por que o trabalho docente tem como
objetivo fazer com que o aluno se aproprie e se relacione com os saberes
historicamente acumulados pela sociedade, além de desenvolverem uma
consciência crítica acerca dos fenômenos que nela ocorrem. Não se trata de
uma tarefa simples, já que o professor jamais será capaz de ter certeza se o
conteúdo por ele ofertado foi assimilado integralmente pelo seu educando.
Além disso, estudos desenvolvidos por Bruno (2010), integrando as
áreas de Educação e Neurociência, apontam que os seres humanos possuem
sistemas cerebrais distintos, fazendo com que haja também diversas formas de
se aprender. A autora esclarece que os sistemas cerebrais são
“multicomponentes e plásticos” e que essa plasticidade deve ser levada em
consideração pelos educadores, pois esses processos se estendem aos
contextos sociais.
A ideia de plasticidade humana transcende o próprio organismo enquanto máquina biológica. Para a educação, a plasticidade que é social e cultural, além de biológica, sinaliza que quanto mais rico for o ambiente, de modo a estimular atividades mentais e sociais, maior o impacto sobre as capacidades cognitivas e da memória (BRUNO, 2010, p. 46. grifo nosso).
Isso implica dizer que ao preparar as suas aulas o professor deverá
pensar em possibilidades metodológicas diversas de modo a tentar atingir e a 44
interessar a cada um de seus alunos, tentando criar uma sintonia harmônica
entre o ensino e a aprendizagem.
Essas duas ações estão completamente relacionadas, pois ainda que o
professor utilize infinitos recursos pedagógicos, e esteja empenhado em fazer
seu aluno aprender, isso somente ocorrerá se esse estudante se propuser e
quiser também aprender. O ensino e a aprendizagem são fenômenos
complementares e dialéticos, formando o que as autoras PIMENTA e
Anastasiou (2008) compreendem como Ensinagem. A dependência da
participação do discente nesse processo torna o ensino ainda mais complexo.
No entanto, mesmo atentando-se para essas questões o trabalho do
educador é formado em meio à construção de relações interpessoais, entre o
professor e o aluno, o professor e seus companheiros de trabalho. Tais
relações, sejam mais largas ou mais estreitas, sempre aparecerão. Elas irão
definir o modo como o professor percebe o aluno, se ele é sensível às suas
singularidades e/ou contexto, afetando, por consequência o modo como o
mesmo ensina e o modo como o educando aprende.
As questões acima foram levantadas visando demonstrar como a
atividade docente envolve diversos fatores que vão além do domínio da ciência
específica de determinada área. Por isso, o aprender a se constituir enquanto
professor não é simples e nem tão pouco se realiza como uma receita, em que
os ingredientes são acrescentados linearmente. O tornar-se docente consiste
em
Um movimento que se realiza a partir das possibilidades internas e das necessidades externas. Estabelecendo-se um processo entre as potencialidades do sujeito e as exigências da profissão, no qual as interações com os colegas e alunos assumem uma importância fundamental, na medida em que se constituem como elementos fomentadores da aprendizagem docente (BOLZAN E POWACZUK, 2009, p. 93).
Nessa perspectiva, questionamos aos professores da FACED/UFJF o
que contribuiu e ainda contribui para a constituição da sua prática pedagógica,
ou seja, os elementos que foram e/ou são decisórios na construção do docente
que ele se tornou.
45
A análise dessa questão nos permitiu construir o presente gráfico, que
demonstra, em ordem decrescente, aqueles fatores que os professores
consideraram como mais importantes nesse processo, tendo destaque as
experiências práticas que os sujeitos tiveram, em relação a atividades ditas
mais teóricas.
Trata-se da pergunta número 10 do questionário, ela foi estruturada de
forma fechada, ou seja, com alternativas previamente estipuladas, em que
cada professor deveria classificar entre MUITO INPORTANTE, IMPORTANTE
e POUCO IMPORTANTE cada um dos tópicos apresentados no gráfico.
6.2.1. Prática docente: experiência do professor, atuação na Educação Básica e no Ensino Superior
Dessa forma, percebemos que as três primeiras posições deste, sendo
consideradas por quinze, quatorze e treze professores, respectivamente, como
46
Gráfico 06
elementos muito importantes foram relativos à prática: “Minha experiência
como professor”, “Minha atuação como docente na sala de aula no ES” e
“Minha atuação docente na sala de aula na EB”.
Esse dado é interessante, pois demonstra o potencial que a prática
docente possui na visão desses professores acerca do seu próprio percurso
formativo. Mas não é surpreendente, já que as políticas para o ensino superior
não vem demarcando um espaço sólido para a institucionalização de uma
formação pedagógica continuada para os educadores universitários.
Revelando, assim, que o maior fator contribuinte para aprendizado da docência
no ES ainda se constitui como a própria prática.
A asserção colocada acima não deve levar a interpretações de que
desconsideramos o valor da atuação e da experiência do professor para a
constituição da docência, e, tão pouco deve sugerir que com a implantação de
disciplinas e/ou cursos de formação continuada, a prática deixaria de ser
considerada como um elemento preponderante nesse processo. Ao contrário,
acreditamos que a teoria formula orientações e reflexões sobre a prática com
base na própria prática, em meio aos seus contextos, situações e agentes.
Dessa forma, compreendemos a prática docente conforme defendida em
estudos contemporâneos sobre a formação de professores, como “uma prática
socioistórica que se organiza e se desenvolve mediante saberes próprios que a
qualificam como uma capacidade que pode ser cientificamente desenvolvida e
transformada” (FRANCO, LIBANÊO e PIMENTA; 2007; p. 68).
Os autores supracitados complementam:
A especificidade concreta da prática educativa se faz pelas ações artesanais, espontâneas, intuitivas, criativas, que se amalgamam, em cada momento de decisão, em ações refletidas, apoiadas em teorias pedagógicas, organizadas mediante críticas, autocríticas, expectativas de papel. Nesse sentido, no exercício da prática educativa, convivem dimensões artísticas e científicas, expressas pela dinâmica entre o ser e o fazer; entre o pensar e o realizar; entre o poder e o querer realizar (idem, 68-69).
Segundo esses pesquisadores, a o campo de análise da Pedagogia é a
prática. Sem esse olhar científico a prática seria um fazer repetitivo e sem
significado. Para eles, as transformações da prática somente ocorreram a partir
47
da compreensão dos pressupostos teóricos que as organizam e das condições
históricas que as rodeiam.
Outro dado essencial obtido em relação à prática docente para a
composição da docência no ensino superior consiste em termos identificado,
por meio da questão 04, que dentre os dezessete respondentes da nossa
pesquisa dezesseis (94%) já atuaram na educação básica.
Apenas um sujeito da pesquisa (Q) não atuou na educação básica.
Sobre isso é interessante observar que esse mesmo sujeito elegeu como
“pouco importante”, nessa questão, não somente a sua atuação nesse nível de
ensino (já que não atuou), mas também a sua atuação no ensino superior e a
sua própria experiência como professor.
Como educadores dos cursos de licenciatura, ou seja, como formadores
dos futuros professores da EB, ter essa experiência é fundamental. Formar
graduandos é ensiná-los sobre uma escola em que eles estiveram em um lugar
diferente daquele em que se situarão ao voltarem para ela. Isso quer dizer que
será necessário auxiliar a construir uma nova identidade, a identidade de
professor. Esse processo de construção da docência é muito conflituoso, e traz
muitas inseguranças ao aluno. Sendo assim, quando o professor universitário
traz ao seu aluno elementos da sua própria prática, ele não está trazendo
modelos e receitas, mas está oferecendo o conforto e a segurança de que é
48
Gráfico 07
possível se concretizar uma boa prática, assim como uma ação considerada
“errada” pode ser construtiva. Nesse sentido, “[...] os saberes da experiência
são tomados como ponto de partida e, intermediados pela teoria, se voltam
para a prática” (PIMENTA e ANASTASIOU; 2008; p. 58).
6.2.2. Retorno dos Alunos
Como bem situa as autoras Bolzan e Powaczuk (2009) o tornar-se
professor é uma trajetória construída pela pluralidade de vozes que ecoam ao
seu redor: família, amigos, sociedade, alunos, coordenadores, colegas de
trabalho, em “uma rede composta por múltiplas relações a partir de
espaços/tempos em que cada docente produz sua maneira de ser professor”
(idem, p. 96).
Nessa teia formada pelas relações entre os agentes que fazem parte da
construção da docência, o aluno tem papel fundamental. Essa assertiva se
confirma por meio dos dados da pesquisa, que revelam que treze professores
(A,B,C,E,F,G,I,J,K,M,N,P,R), ou seja, 76%, classificaram o retorno dos
educandos como um elemento “muito importante” para a constituição de sua
docência.
Pimenta e Anastasiou (2008), também destacaram a essencialidade da
participação do aluno: “É importante destacar a contribuição dos alunos ao
processo de desenvolvimento profissional de seus professores, pois nos (as
autoras) fazem ouvir sua voz [...]” (p. 111). O modo como o aluno recebe e
responde aos enunciados dos educadores são indicadores para a atividade
docente, não no sentido de qualificá-la como boa ou ruim, mas como
referências sobre o que efetivamente contribui para uma melhor e maior
aprendizagem.
Consoante, Freire (1996), ao falar sobre os processos de aprendizagem
que permeia a relação professor e aluno, estabelece que “quem forma se forma
e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado” (p.
23).
49
6.2.3. Estudos pessoais e Diálogos formais e informais com colegas professores
Esses dois elementos constituintes da docência no ensino superior
foram agrupados com o intuito de demonstrar que os dois fatores, embora
distintos, pela própria natureza dos atos (individual e coletivo), não são
opostos, sendo ambos componentes fundamentais para a constituição da
docência.
As citadas autoras Bolzan e Powaczuk (2009) defendem que o professor
é sujeito da sua própria formação. Isso por que ele, enquanto ser humano,
possui a capacidade de perceber, analisar e transformar a sua atividade, ou
seja, ele é capaz de realizar a auto-regulação de sua prática pedagógica. Essa
exposição está em acordo com as respostas presentes na pesquisa em relação
aos estudos pessoais, ou seja na busca pessoal do professor para encontrar
soluções e novos conhecimentos que irão agregar em sua prática docente, já
que onze (A,B,E,F,I,J,K,L,N,O,Q), 64%, dos sujeitos entrevistados elegeram
esse componente (estudos pessoais) como “MUITO IMPORTANTE”.
Embora estejamos classificando a busca individual por conhecimentos
como algo extremamente valoroso para a constituição da docência, muitas
vezes, o professor é acometido de um sentimento de “solidão pedagógica”
(ISAIA, 2005), em que ele se vê desamparado frente à falta de interlocução e
compartilhamento sobre conhecimentos pedagógicos requeridos para o
enfrentamento do ato educacional.
Os diálogos formais e informais com colegas professores também foram
indicados por 64% dos sujeitos da nossa pesquisa (A,B,C,D,E,F,G,I,K,N,O)
como um elemento “MUITO IMPORTANTE”.
Assim também pensa Masetto (2003), que propõe a criação de
pequenos grupos de professores universitários para produzir momentos de
formação pedagógica com leituras, estudos, diálogos, na tentativa de
compartilharem, em um espaço formal, experiências vividas. No entanto ele
assegura já ter encontrado grupos de docentes que se formaram
espontaneamente, sem uma ação institucional e que se mostraram bastante
eficazes.
50
O potencial do diálogo estabelecido entre colegas professores também é
confirmado por Bolzan e Powaczuk (2009):
Acreditamos que o processo de reflexão compartilhada alicerçada sobre o fazer pedagógico é fundamental, na medida em que possibilita a ativação do pensamento docente. Essa possibilidade de reflexão permite a tessitura de ideários que vão se redesenhando de forma compartilhada, criando-se uma rede de interações que vai sendo produzida, à medida que os participantes desse processo têm a oportunidade de confrontarem seus saberes e seus fazeres, favorecendo assim, o processo de aprender a ser professor (p. 98).
6.2.4. Formações institucionalizadas
Essa denominação foi criada com o intuito de agrupar os espaços
institucionais de formação de professores utilizados nessa questão, quais
sejam: especialização, mestrado e/ou doutorado; cursos de graduação;
participação em grupo de pesquisa; palestras, cursos e debates; com dois
motivos, a aproximação conceitual entre eles, por se tratarem de espaços mais
teóricos, e pela aproximação entre a quantidade de professores que os
consideraram como fatores “MUITO IMPORTANTES”.
Conforme já exposto nesse trabalho, o art. 66 da nossa LDB Nº 9394/96
define que a preparação para o exercício do magistério nas instituições de
ensino superior se dará em meio aos programas de mestrado e doutorado,
sendo exigido, portanto, não um processo de formação pedagógica, na medida
em que tais programas formam para a pesquisa, mas a aquisição de uma
titulação. Essa situação é vista pelos seguintes autores, referências na área,
Anastasiou (2005), Veiga (2005), Isaia (2005), Bazzo (2005), Pimenta e
Anastasiou (2008) e Masetto (2003), como um problema, defendendo a
institucionalização de uma formação continuada para o professor universitário.
Dessa forma, os dados sobre essa questão revelam uma posição
dividida, já que nove sujeitos (A,D,E,H,I,J,K,M,O), 53%, consideram que os
cursos de pós-graduação, stricto e lato sensu, contribuíram ou contribuem para
a constituição de sua docência. Esse dado revela que a despeito dos cursos de
pós-graduação cursados pelos nossos respondentes possuírem ou não
disciplinas relativas à docência no ensino superior, pouco mais da metade
51
desse grupo os consideraram como “muito importante”, isso se deve ao fato de
que o ensino é um ato complexo, capaz de envolver muitas áreas, além disso,
para ser um bom professor é preciso também ser um bom pesquisador:
O primeiro pesquisador, na sala de aula, é o professor que investiga seus próprios alunos. Essa concepção exige que a pesquisa deixe de ser um mito para ser uma prática acessível, em suas proporções, a todo o professor e a todo o aluno. [...] O estudo do professor no seu cotidiano, tendo-o como ser histórico e socialmente contextualizado, pode auxiliar na definição de uma nova ordem pedagógica e na intervenção da realidade no que se refere à sua prática e à sua formação (CUNHA, 1992, p. 32-33).
Os cursos de graduação foram definidos como “muito importante” para a
construção da docência no ensino superior para sete sujeitos apenas, ou seja,
41%. Segundo Pimenta e Anastasiou (2008), isso pode estar associado ao
objetivo que os cursos de graduação possuem, quando licenciatura de formar
os professores para atuarem na EB, e, quando bacharelado em outras áreas
como direito, serviço social, que não possui o seu foco na docência.
A participação em grupos de pesquisa foi classificada como “muito
importante” somente para 35%, seis sujeitos (D,E,I,J,N,O), do grupo de
professores respondentes. Isso pode ter ocorrido devido a uma interpretação
desse elemento como a vivencia enquanto bolsista de iniciação científica, como
muitos não participaram de programas assim, por não existirem em sua fase de
graduação, esse pode ter sido o motivo da menor classificação desse fator.
Criamos tal conjectura, pois constatamos com a pesquisa, por meio das
questões de número 03, 05 e 06, que 100% dos sujeitos lecionam disciplinas
relacionadas às suas temáticas de estudo, compartilhadas em grupos de
pesquisa, muitas vezes, por eles coordenados.
A participação em palestras, cursos e debates foi defendida como “muito
importante” para a constituição da docência no ensino superior também para
seis sujeitos (A,E,H,J,K,O), 35% dos pesquisados. Esse baixo índice pode
estar associado ao caráter muitas vezes apenas expositivo desses eventos,
havendo um espaço mais restrito para interações, trocas e diálogos, entre os
professores da EB, professores do ES e alunos de graduação, que na maioria
das vezes, ocupam esses espaços simultaneamente, mas acabam se
52
relacionando pouco. Acreditamos que havendo maiores momentos para o
compartilhamento de ideias e concepções por esses agentes, tais eventos
poderiam ser considerados como ambientes mais ricos para a formação
docente.
6.2.5. Minha experiência enquanto aluno da EB e/ou ES
Embora o professor do ensino superior tenha passado muito tempo em
instituições escolares como aluno, uma vez que minimamente na educação
básica ele estudou durante onze anos, somente 47% dos sujeitos
(B,D,E,J,K,M,N,O), consideram essa vivência como “muito importante” para a
constituição do docente que ele é atualmente. Essa questão provavelmente
está relacionada a práticas pedagógicas tradicionais utilizadas por seus
professores, práticas essas que eles não possuem o interesse em reproduzir
(ANASTASIOU e PIMENTA; 2008). Mas além da identificação ou não com a
atuação de seus professores
É preciso considerar, como princípio norteador, que o profissional que atua como docente já possui uma experiência de sala de aula, em vários anos como aluno, para além do tempo que atua como professor. Por isso, sua voz é essencial na definição da caminhada a ser construída (idem, 2008, p. 11).
6.2.6. Disciplinas e/ou estudos afeitos à didática
Os dados aferidos nessa questão estão em concordância com aqueles
mostrados anteriormente (capítulo 6, tópico 1) a respeito das disciplinas de
didática, já que 62% dos sujeitos que fizeram disciplinas afeitas a essa
temática, oito entrevistados (A,B,I,K,L,M,O,Q), afirmam que elas os trouxeram
contribuições para sua prática, e sete sujeitos (A,B,C,F,I,L,O) as consideraram
como “muito importantes” para a constituição de sua docência.
Como essa questão já foi amplamente discutida no presente trabalho,
deter-me-ei apenas em dizer que em virtude da disciplina de didática dos anos
70 e meados dos anos 80 terem se configurado em bases tecnicistas, muitas
pessoas, ainda na atualidade, as reconhecem assim (MARTINS e
ROMANOWISKI, 2010). Essa situação, provavelmente, pode ser a razão para
53
que o restante dos professores, dez sujeitos as identifiquem como,
“importante”: quatro (H,MP,Q, ) e “pouco importante”: seis (D,E,G,J,K,N), além
da existência de professores que não cursaram a disciplina, que por
consequência não identificaram esse elemento como muito importante para a
constituição da docência .
6.3. Atuação docente
Essa temática será abordada a partir das respostas dos sujeitos às
questões 11 e 12, respectivamente: Escreva como você desenvolve sua
docência no dia a dia. Como se constitui o seu fazer didático para ministrar
suas aulas na Graduação? e Qual seria a marca da sua docência, ou seja,
qual a principal característica que o diferencia como professor?
Ambas as questões eram abertas, e isso abriu espaço para que os
sujeitos compusessem seus discursos de forma singular e diferenciada. Não
havendo, dessa forma, elementos previamente estruturados. Sendo assim,
concluímos que as respostas sugeriam valores, pois ao enfatizarem certos
aspectos e ao restringirem-se em outros, podemos entender que há
significados próprios inerentes ao modo de pensar, agir e sentir de cada um.
Não delimitamos categorias previamente para o desenvolvimento da
análise, assim agrupamos os dados a partir da semelhança entre as falas, em
cada questão.
Tal agrupamento foi realizado para viabilizar a análise e a interpretação
dos dados. No entanto, é importante ressaltar que os discursos proferidos
pelos docentes referem-se a um todo, sendo, portanto, difícil estabelecer um
limite ou uma separação sobre eles, já que essas delimitações nem sempre
estão explícitas. Dessa forma, não identificamos nas falas dos professores um
comportamento único, fechado, estratificado. Essa categorização foi feita
somente com o intuito de tornar o estudo mais claro. Assim, é possível
encontrar uma mesma resposta em mais de uma categoria, à medida que ela
refere-se ao mesmo tempo sobre duas ou mais temáticas.
54
6.3.1. Prática pedagógica
Esse tópico será tratado a partir da questão 11. Após a leitura e
interpretação das respostas, tendo em vista o conteúdo manifesto pelos
professores, os dados foram organizados por meio das seguintes categorias:
Relação que o docente constitui com o seu fazer didático: planejamento,
métodos, recursos utilizados, avaliações;
Relação que o docente constitui com os seus alunos;
Relação que o docente constitui com os seus saberes: estudos, teorias,
pesquisas e suas atualizações.
Vale situar que assumimos a concepção de prática pedagógica, tal como
descreve Cunha (1992) como sendo a descrição do cotidiano do professor na
preparação e realização de seu ensino.
Dessa forma, acreditamos que essa prática se dá por meio da
Competência Pedagógica (MASETTO, 2003) que o docente possui. Tal
competência consiste na capacidade do educador em enfrentar situações, de
forma criativa e efetiva, tendo em vista a mobilização de diferentes recursos
cognitivos, tais como valores, atitudes, saberes, percepções, visando que seu
aluno possa atingir um maior e melhor aprendizado daquilo que ele lhe ensina.
O primeiro agrupamento trata da relação que o docente constitui com o seu fazer didático: planejamento, métodos, recursos utilizados, avaliações. Em seus discursos, 47% dos professores citaram essa questão,
descrevendo variadas atividades que desenvolvem em seu cotidiano
pedagógico para facilitar a aprendizagem de seus educandos. Essas
estratégias são descritas por Masetto (2003), como a
Arte de decidir sobre um conjunto de disposições, que favoreçam o alcance dos objetivos educacionais pelo aprendiz, desde a organização do espaço sala de aula com suas carteiras até a preparação do material a se usado, por exemplo, recursos audiovisuais, visitas técnicas, internet etc., ou uso de dinâmicas de grupo, ou outras atividades individuais (p. 86).
Reuni abaixo depoimentos que indicam essa posição:
Vou apontar elementos que acho importante, mas sem intenção de fazer uma descrição completa do que faço.
55
Atividades: produção de diferentes gêneros textuais não comuns aos gêneros acadêmicos; produção da memória da disciplina; possibilidade do aluno expressar o que é sensível a ele. (Sujeito D)
[...] trago leituras diversas, grupos de discussão, elaboração de materiais didáticos, aplicação de exercícios nas escolas, análise das aplicações, entrevistas com professores, bem como atividades com vídeos, filmes (documentários), provas, seminários, produção de textos diversos, etc. (Sujeito G)
Incentivo o diálogo, a troca e a diversidade dos pontos de vista. Apresento variadas temáticas relacionada s às questões da arte escolar; exploro estratégias diversificadas (filmes e documentários, musicas, textos e poesias, fotografias, obras artísticas); analiso os documentos oficiais; estabeleço relações do conteúdo com o cotidiano da escola e a vida cultural da cidade; ofereço visitas à exposições e incentivo a agenda cultural. Proponho a elaboração de um diário de bordo, para anotações de aula e reflexões outras e a apresentação individual de sínteses estéticas como forma de resgatar conteúdos das aulas anteriores. Produção de pequenos textos e autoavaliação. (Sujeito P)
Nessa mesma categoria, existem falas que demonstram a opção dos
professores por escolherem determinadas metodologias em detrimentos de
outras. Algumas se associam à percepções, àquilo que acreditam:
Busco articular diferentes contextos formativos, ou seja, encaro os espaços de aprendizagem como múltiplos, dessa forma, valorizo a participação em eventos científicos, culturais, artísticos; os trabalhos de campo ou visitas técnicas; o uso de diferentes linguagens ( video, imagens, sons, etc). (Sujeito B)
Bem, tenho como base o pensamento de que não precisamos ensinar os conteúdos, mas sim fazer pensar e ter curiosidade sobre eles. Numa época em que a informação tem um acesso muito fácil (pelo menos em alguns contextos, onde o acesso à internet é possível), listar conteúdos é perder seu tempo e o dos estudantes. Trabalho no sentido de despertar a curiosidade, o debate e o engajamento com a disciplina que leciono. Sempre buscando desenvolver p prazer pela leitura e escrita. (Sujeito K)
E outras referem-se ao modo como o estudante relaciona-se com tal
metodologia, como ilustra a presente fala:
Minhas aulas são expositivas com participação ativa doa alunos. Sempre mudo o que levo como proposta de acordo com o perfil da turma. Há turmas que não suportam aulas
56
expositivas e outras que a pedem. Há aquelas turmas que que não se adaptam aos trabalhos em grupo. (Sujeito N)
O segundo agrupamento refere-se à relação que o docente constitui com os seus alunos. Nessa categoria procuramos incluir depoimentos que
elegiam como foco de sua prática pedagógica os anseios, impressões e
conhecimentos de seus educandos. Notamos, com isso, que 41% dos
docentes responderam essa questão elegendo essa relação com o estudante
como a característica principal de sua prática pedagógica. Como demonstra as
seguintes falas:
Procuro conhecer o que os alunos sabem sobre a temática da disciplina e o que eles gostariam de saber. A partir dai montamos o planejamento do semestre, que nunca é o mesmo de uma turma para outra. Diversifico a forma de organização dos grupos e as formas de avaliar, promovendo uma integração entre os alunos. Busco trazer questões do dia a dia da escola (trabalho de campo). (Sujeito F)
Procuro aliar o rigor e o conteúdo com a composição didática, buscando criar oportunidades para que os alunos possam estudar com comprometimento, relacionar o que estudam com o que vivem e se sentir à vontade para participar da aula numa perspectiva dialógica e de aprofundamento, valorizando as diferentes contribuições. (Sujeito M)
Observo como os alunos lidam com o conteúdo que estou ministrando e tento,, na medida, do possível adequar minha prática à demanda de cada turma. (Sujeito Q)
O destaque adquirido pelo aluno nas falas dos professores universitários
a respeito de sua prática pedagógica se deve em muito a concepção de
educação que eles possuem, que determina que a docência existe para que o
educando aprenda. Assim, a ênfase do ensino superior deve ser estar nas
ações dos estudantes, nas análises e reflexões que fazem, nas habilidades e
competências que constroem, para que o conteúdo seja de fato internalizado. E
essas aprendizagens só são ocorrem por meio da parceria entre os
professores e com os próprios aprendizes.
Nessa perspectiva, “o aluno começa a ver no professor um aliado para a
sua formação, e não um obstáculo, e sente-se igualmente responsável por
aprender. Ele passa a se considerar sujeito do processo” (MASETTO, 2003, p
23).
57
No ensino superior essa parceria e co-responsabilidade pelo ensino
também pode ser colocada por tratar-se de uma relação criada entre adultos,
isso, muitas vezes, favorece a proposição de diálogos e até mesmo de um
sistema de feedback, pois o aluno, poderá, em tese, ter maior maturidade e
capacidade para verbalizar o que sente e deseja em relação ao seu processo
de aprendizagem.
Por fim, o terceiro agrupamento para essa questão trata da relação que o docente constitui com os seus saberes: estudos, teorias, pesquisas e suas atualizações. Essa categoria foi criada com o intuito de unir as respostas
que privilegiaram o próprio aprimoramento dos saberes do professor, no
entanto é interessante observar que, com exceção de um único sujeito que
tratou apenas do trabalho com uma específica teoria8, todas as outras
respostas podem ser associadas às outras categorias. Como ilustra a presente
fala:
Construo minha didática, buscando atualizar-me nos novos estudos na minha área de interesse e procurando estabelecer a relação entre os novos achados e sua aplicação na prática de sala de aula. O diálogo com meus alunos, muitos deles já atuando na educação básica, e com professores desse nível que frequentam nosso grupo de estudos fortalecem esses achados ou os relativizam. Enfim, o estudo e a reflexão constantes é que enriquecem minha prática. (Sujeito E)
Nessa resposta o sujeito não só evoca a importância da realização de
seus estudos para o desenvolvimento de sua prática, mas relata também a
contribuição de seus alunos e outros professores nesse processo, podendo,
portanto, fazer parte de duas categorias, simultaneamente.
Outras respostas compõem, ainda, essa categoria:
- Atualização, através de estudo e pesquisa; - Preparação das aulas à partir do material estudado e pesquisado; (Sujeito L)
Meu fazer didático se faz pelo preparar as aulas e pelo preparar-se para as aulas. Além das pesquisas, leituras e produção de materiais para as aulas, minha docência está ligada ao fazer cotidiano e as experiências construídas na relação com as/os estudantes, o que se produz nessas
8 Desenvolvo uma prática com base na perspectiva da complexidade. (Sujeito J)
58
experiências me possibilita construir o planejamento e minhas ações. (Sujeito H)
A constante busca e produção de conhecimentos são aqui entendidas
como atividades do professor que o leva “à ação, à reflexão, crítica, à
curiosidade, ao questionamento exigente à inquietação e à incerteza” (CUNHA,
1992, p. 111). Além do mais, assim como estipula Freire (1996) não
acreditamos que os conteúdos estejam prontos e acabados, e, sim, estão
sempre sujeitos a modificação.
Igualmente, identificamos que a profissão docente sugere a integração
entre os saberes específico, pedagógico geral e pedagógico do conteúdo
propostos por ISAIA (2005). Isso significa que “é necessário que os professores
tenham domínio em sua área de conhecimento, em como seus alunos
aprendem e em como eles podem ser auxiliados nesse processo” (idem, p. 69).
Sendo imprescindível, portanto, que o professor estude sobre sua área de
ensino específica, esteja interado a respeito do que os pesquisadores da área
de didática propõem e ainda que tenham em mente a transposição didática.
Deste modo, a questão da pesquisa, estudo e atualização não se trata
de uma opção da carreira docente, mas de um imperativo para que ela se
cumpra.
6.3.2. O papel das singularidades de cada sujeito na atuação docente
Conforme explicitado em outros momentos deste trabalho, a constituição
da docência superior se dá em um processo complexo, construído ao longo de
uma trajetória que envolve a dimensão pessoal, profissional e institucional
(ISAIA, 2005) do professor. Sendo que a noção de trajetória é entendida de,
um modo geral, como
Porções de tempo que vão se sucedendo ao longo da vida dos professores e simboliza uma explicitação temporal. Ela envolve um intricado processo que engloba fases da vida e da profissão. Compreende não apenas o percurso individual de um professor ou de grupo, mas uma rede formada por uma multiplicidade de gerações entrelaçadas em uma mesma duração histórica (idem, p. 71)
59
Nessa perspectiva, até o momento discutimos sobre a constituição da
docência por meio de muitos elementos, como as contribuições dos alunos e
dos colegas professores, dos estudos sobre a didática, dos cursos de
graduação e pós-graduação, da prática e da experiência docente etc.
Entretanto, o processo de constituição da docência universitária não se dá
somente em meio a esses fatores. Conforme apontado por Isaia, a dimensão
pessoal também é essencial para a construção dessa profissão.
De acordo com essa autora, a identidade docente é formada por um
processo que vai desde a escolha da profissão, passando pela formação inicial
até os diferentes espaços institucionais em que a profissão se desenvolve.
Nesse contínuo, cada docente constrói a sua maneira de ser professor.
Assim, compreendo que há formas distintas de atuar na carreira
docente, pois a maneira como o sujeito age, pensa, sente, em sua vida
pessoal; além de seus valores políticos, ideológicos; e de seu contexto social,
cultural e econômico; influencia no modo como ele se porta enquanto docente
e altera/compõe suas trajetórias formativas, que são sempre singulares.
Por esse motivo, ao questionarmos os professores da FACED/UFJF
sobre qual seria a marca de sua docência percebemos a pluralidade de suas
respostas.
Em muitos discursos (41% das respostas), a maior característica que
diferencia o sujeito dos outros professores consiste na relação que o docente
estabelece com seu aluno.
Ter o aluno sempre como centro , sujeito, na construção do conhecimento, atentando sempre para situações e contextos sociais, atuais e reais. (Sujeito A)
Não sei se o que faço me diferencia dos outros professores, mas o que alimenta e sustenta meu entusiasmo pela docência é, sem dúvida, a interação com os alunos. (Sujeito E)
Acho que abertura para o diálogo e afetividade na relação professor-aluno. (Sujeito Q)
Procuro sempre ouvir o aluno e tentar deixar que eles participem mais das aulas do que eu, sempre fazendo questionamentos e direcionando para alcançar os objetivos propostos. (Sujeito C)
Envolvimento efetivo com a docência, no sentido de buscar fazer diferentemente o que vem sendo feito, tendo em vista a
60
relação com as/os estudantes e a preocupação com a sua formação profissional e pessoal. Além disso, uma implicação política com os temas e discussões realizadas nas atividades de docência. (Sujeito H)
Foram apontadas também como marca singular da docência de dois
professores algumas ou uma característica pessoal que os mesmos possuem:
Creio que possa ser a flexibilidade. Muitas vezes sofro resistência e incompreensão dos próprios estudantes, que não compreendem o que proponho como experiência de formação docente, mas creio que a flexibilidade seja uma das características fortes da minha prática. (Sujeito B)
Leveza e potencialização de sensibilidades. (Sujeito D)As falas desses docentes vão ao encontro da teoria exposta
anteriormente a partir de Isaia (2005) e também sobre o que postulam as
estudiosas Bolzan e Powaczuk (2009), ao discorrerem sobre as contribuições
particulares do sujeito na constituição da docência. Mas, sobretudo, os
discursos dos professores B e D revelam que não é possível separar o ser
humano que habita em diversos espaços sociais, daquele docente que atua na
Universidade.
Há ainda professores que identificam a marca de sua docência por meio
de concepções educacionais específicas, como revelam esses dois sujeitos:
Creio em saberes que se constitui em redes e não de forma hierárquica, assim, não sei se isso me diferencia como professor, mas tem sido essa perspectiva que trabalho com os alunos e que tento trabalhar na formação de professores que serão, reconheço com isso que diferentes saberes , ocupam lugares diferenciados na sociedade, por isso devem ser dialogados nessa perspectiva, de somar, de múltiplos. (Sujeito O)
Penso ser importante a construção de uma compreensão crítica do mundo. A aula de arte na escola ou na universidade, pode ser um espaço de reflexão sobre temas diversos, para fomentar a discussão, o exercício e o intercambio de ideias num espaço de livre transito e acesso. Esse ‘olhar crítico’ é o olhar diferenciado que foge ao conforto e estabilidade das rotinas visuais – em oposição ao modo como a educação visual tem sido trabalhada nas instituições de ensino, uma estratégia para instituir, homogeneizar e, por vezes, restringir e padronizar os modos de ver. Acredito que tais reflexões contribuam para que os futuros professores tenham disposição para aprender do emergente e reconheçam a escola como lugar de produção de sentidos. (Sujeito P)
61
Outro aspecto levantado pelos professores como uma marca de sua
docência consiste na utilização em suas aulas de sua experiência adquirida na
Educação Básica. A seguinte resposta exemplifica essa questão tratada por
dois professores:
Conhecimento da docência dos anos iniciais do ensino fundamental e consequente interlocução entre essa prática e os assuntos a serem abordados nas disciplinas. (Sujeito F)
A possibilidade que alguns professores possuem de trazer para as suas
aulas da licenciatura exemplos retirados de sua própria vivencia na escola e/ou
na universidade se traduz como um elemento potente para o aprendizado do
aluno, enquanto futuro professor. Pois além de transmitir a confiança em
determinadas práticas, quando essas foram positivas, demonstra que erros e
inseguranças também fazem parte da carreira, quando elas não são.
Há também outros professores que instituíram como marca de sua
docência o sentimento e a afetividade que nutrem pela profissão:
Meu gosto pela própria docência e minha paixão pela linguagem. (Sujeito G)
Acredito que seja o fato de que gosto do que faço e o faço com empenho, o que transparece nas aulas e na relação com os estudantes. (Sujeito K)
A motivação e amor pelo trabalho. (Sujeito L)
Sobre esse assunto Cunha (1992) conclui, com sua pesquisa, que
geralmente, os bons professores gostam muito do que fazem e que repetiriam
sua opção profissional se lhes fosse dada essa oportunidade. Tal autora afirma
que os motivos que influenciaram essa afirmação são variados. Para Isaia
(2005) isso pode estar associado ao potencial que a profissão docente tem de
conferir realização profissional e pessoal: “A inter-relação da orientação afetiva
com a pessoal possibilita que os professores encontrem, na docência, uma
instância significativa para sua trajetória profissional, com possibilidade de
realização pessoal” (p. 75).
Por fim, houve ainda, um professor que não identificou nenhuma
singularidade em sua atuação pedagógica:
Minha prática docente não é muito diferente da de meus colegas. (Sujeito N)
62
Sendo, assim, concluímos que embora tenhamos observado certa
aproximação nos discursos dos professores, que permitiu certo agrupamento
entre as falas, o que sobressaiu no conjunto das respostas à esta questão foi a
multiplicidade de formas como a docência é percebida a partir da
individualidade de cada sujeito.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo realizado me permitiu concluir que a constituição da docência
dos professores da FACED/UFJF configura-se como um processo, ao mesmo
tempo, singular e coletivo, construído principalmente na própria prática
pedagógica do professor, por meio de sua experiência na sala de aula, tanto da
EB como no ES, e das relações constituídas com seus alunos, com seus
colegas professores e com o contexto acadêmico como um todo.
Para esses professores, espaços formativos como o curso de
graduação, participação em grupo de pesquisa, palestras, debates e outros
cursos se constituem como importantes, mas não são determinantes para a
construção desse processo. Sendo assim, identifiquei que os contextos tidos
como mais “práticos” foram evidenciados pelos professores em detrimento
daqueles vistos como mais “teóricos”, embora toda atividade prática esteja
subsidiada por uma teoria.
Os dados sinalizam também que a prática pedagógica desses
professores universitários, que se constrói em meio aos seus percursos de
formação para a docência, está associada genuinamente a relação que esses
educadores estabelecem com seus alunos, com seus saberes e com os
recursos e estratégias utilizados para que os educandos aprendam mais e
melhor.
Além disso, na maioria dos discursos dos professores analisados
percebemos a positividade de incluir em cursos de pós-graduação stricto sensu
disciplinas afeitas à docência ou didática do ensino superior. Nessa
perspectiva, defendo também a importância da institucionalização de espaços
63
de formação continuada para a docência universitária nas instituições que
oferecem educação nesse nível de ensino.
Desse modo, concluo que a realização do presente trabalho foi
plenamente produtiva. Pois possibilitou uma modificação na percepção de
elementos constitutivos da docência, que antes não eram, por mim,
considerados, ou pelo menos não com a ênfase atual.
Identifico ainda que esse estudo pode contribuir para a comunidade
cientifica da área com a proposição de caminhos para novos percursos
formativos para/com o docente do ensino superior, a partir dos aspectos
levantados pelos próprios professores em atuação na FACED/UFJF.
8. REFERÊNCIAS
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UNIVERSIDADE FEDREAL DE JUIZ DE FORA. Informativo Reestruturação curricular pedagogia 2007. Juiz de Fora. 2006.
UNIVERSIDADE FEDREAL DE JUIZ DE FORA. Informativo Reestruturação curricular pedagogia 2011. Juiz de Fora. 2010. Disponível em: < http://www.ufjf.br/deptoeducacao/files/2008/07/Reestrutura%C3%A7%C3%A3o-Curricular-Pedagogia.pdf>. Acesso em 11 de novembro de 2013.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Docência Universitária Na Educação Superior.
2005.
67
ANEXO 1 – INSTRUMENTO DE PESQUISA:
Caro(a) professor(a)
O presente questionário, semiaberto, é parte da pesquisa de TCC
realizada pela estudante Thaís Helena Ribeiro, do Curso de Pedagogia da
UFJF, que tem como foco buscar pistas para compreender como se dá o
processo de constituição do ser docente e da docência no Ensino Superior. Por
meio do diálogo com professores que atuam na formação docente na FACED-
UFJF, estima-se encontrar elementos que potencializem a compreensão deste
processo.
Contamos com sua colaboração e antecipadamente agradecemos sua
disponibilidade.
Thaís H. Ribeiro e Adriana R. Bruno
QUESTIONÁRIO
Identificação (Apenas se desejar): ____________________________________
1) Qual(is) o(s) curso de graduação que você cursou?
_______________________________________________________________
2) Em que curso(s) de licenciatura você atua como professor?
____________________________________________________________
3) Quais as disciplinas você leciona e/ou lecionou nos últimos anos na
FACED?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
04) Você lecionou na Educação Básica?
( ) Sim, nas séries iniciais
( ) Sim, nas séries finais e/ou Ensino Médio
( ) Não, nunca lecionei na Educação Básica.
05) Quais são as suas principais temáticas de estudo e pesquisa?
_______________________________________________________________
06) As temáticas pesquisadas por você estão relacionadas às disciplinas que
você leciona?
a. ( ) sim.
b. ( ) não.
Comentários: ____________________________________________________
07) Durante a realização do seu curso de graduação e/ou pós-graduação você
cursou alguma disciplina voltada para a didática ou relacionada com a docência
no ensino superior?
a. ( ) uma.
b. ( ) duas ou mais.
c. ( ) nenhuma.
Nome(s) da(s) disciplina(s) cursada(s): ________________________________
_______________________________________________________________
08) Ter cursado essa(s) disciplina(s) trouxe(ram) contribuições para a sua
prática docente? Por quê?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
09) Você considera que os cursos de pós-graduação devam oferecer disciplinas específicas que formem para docência no Ensino Superior? Por quê? _______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
10) O que contribui ou contribuiu para a composição de sua prática
pedagógica? Dito de outro modo, liste os elementos que foram fundamentais
para a constituição do professor que você é hoje. Leve em consideração a
seguinte escala de atribuição:
→ 1 para o que considera MUITO IMPORTANTE;→ 2 para o que considera IMPORTANTE;→ 3 para o que considera MENOS IMPORTANTE.
a. ( ) Curso de Graduação.
b. ( ) Especialização, Mestrado e/ou Doutorado.
c. ( ) Disciplinas e/ou estudos afeitos à didática
d. ( ) Retorno de seus alunos.
e. ( ) Diálogos formais e informais com colegas professores.
f. ( ) Palestras, cursos, debates.
g. ( ) Sua experiência enquanto aluno da educação básica e/ou superior.
h. ( ) Estudos pessoais.
i. ( ) Minha experiência como professor.
j. ( ) Minha atuação como docente na sala de aula no Ensino Superior.
k. ( ) Minha atuação como docente na sala de aula na Educação Básica.
l. ( ) Participação em grupos de pesquisa.
m. ( ) Outros. ________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
11) Em complemento à questão anterior, escreva como você desenvolve sua
docência no dia a dia. Como se constitui o seu fazer didático para ministrar
suas aulas na Graduação?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
12) Qual seria a marca da sua docência, ou seja, qual a principal característica
que o diferencia como professor?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
13) O que você faz, como prática pedagógica em suas aulas, que ajuda o
estudante a aprender mais e melhor? Leve em consideração a seguinte escala
de atribuição:
1 para o que você FAZ COM FREQUÊNCIA; 2 para o que FAZ ESPORADICAMENTE; 3 para o que NUNCA FAZ.
a. ( ) Atividades de tribunal/júri simulado.
b. ( ) Atividades em Studio.
c. ( ) Atividades envolvendo jogos, entretenimento e música.
d. ( ) Atividades orientadas em grupo.
e. ( ) Atividades orientadas em laboratório.
f. ( ) Atividades orientadas individuais.
g. ( ) Atividades que evidenciem a relação entre a teoria e a prática.
h. ( ) Atividades que visem uma aplicação social.
i. ( ) Aula expositiva.
j. ( ) Aula expositiva dialogada com a interação com os alunos.
k. ( ) Auto avaliações.
l. ( ) Avaliações objetivas.
m. ( ) Avaliações subjetivas.
n. ( ) Uso de filmes e/ou documentários.
o. ( ) Distanciamento das questões pessoais do aluno.
p. ( )Disponibilização de momentos para que os alunos expressem suas
impressões.
q. ( ) Fomento à mediação aluno-aluno.
r. ( ) Fórum de debates em sala de aula.
s. ( ) Investimento nas relações interpessoais.
t. ( ) Leitura de textos em aula.
u. ( ) Oficinas de trabalho.
v. ( ) Participação dos alunos no processo de criação/seleção do
programa da disciplina e das práticas avaliativas.
w. ( ) Pesquisas orientadas.
x. ( ) Produção de mídias - filmes, áudio/podcast.
y. ( ) Resolução de cases.
z. ( ) Seminários em que os alunos apresentam.
a’. ( ) Trabalhos/dinâmica em grupos em sala de aula.
b’. ( ) Trabalhos/dinâmica em grupos fora de sala de aula.
c’. ( ) Uso de memoriais.
d’. ( ) Uso e produção de Mapas conceituais.
e’. ( ) Visitas monitoradas.
f’. ( ) Outros. _________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
14) Outros aspectos da docência no Ensino Superior que considere relevantes.
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
Muito gratas pela sua contribuição!
Thais e Adriana