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A D IVERSIDADE DA G EOGRAFIA B RASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 4774 GLOBALIZAÇÃO E O CIRCUITO ESPACIAL DE PRODUÇÃO PETROLÍFERO: AS CIDADES DA INFORMAÇÃO E AS CIDADES DA EXTRAÇÃO 1 SILVANA CRISTINA DA SILVA 2 Resumo O presente artigo apresenta uma discussão sobre o circuito espacial de produção do petróleo, tendo como enfoque as especializações das cidades nas diferentes etapas do circuito. Macaé, denominada “Capital Nacional do Petróleo”, pode ser identificada como uma “cidade da extração”. Entretanto, a produção da informação, que comanda o circuito da valorização do petróleo, encontra- se em outros lugares, nas “cidades da informação”, como as metrópoles e as cidades historicamente especializadas na extração de petróleo, mas que hoje são nódulos da produção da informação que controlam a extração. Essa divisão territorial do trabalho revela-se pelo processo de urbanização e está presente na organização do espaço urbano das cidades, sobretudo na economia urbana. A modernização de Macaé, decorrente a implantação das materialidades da extração do petróleo, não significou a redução das desigualdades, mas sim o seu aprofundamento. Palavras-chave: Globalização, Circuito espacial de produção, Petróleo, circuitos da economia urbana. GLOBALIZATION AND PETROLEUM SPATIAL CIRCUIT OF PRODUCTION: CITIES OF INFORMATION AND CITIES OF EXTRACTION Abstract This article introduces a petroleum spatial circuit of production discussion highlighting the cities specialities in the different steps. Macaé, also known for National Petroleum Capital can be identified with a city of extraction. However, the information production whose commands the petroleum valorization circuit has been placed in “cities of information” like metropolis and historically specialized cities in petroleum extraction nowadays considered points of concentration about information production whose controls the extraction domain. This territorial division of labour is revealed by the urbanization process and this division is inside the urban space organization in the cities particularly in the urban economy. The Macaé modernization due to materiality implantation caused by petroleum extraction didn’t mean inequalities reduction but their deepening. Keywords: Globalization, spatial Circuit of production, Petroleum, Circuits of urban economy 1 Resultado da Pesquisa O circuito inferior e superior da economia urbana no Norte Fluminense”, financiada pela FAPERJ (Processo nº E-26/110.935/2013). 2 Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Departamento de Geografia UFF/Campos dos Goytacazes. E-mail: [email protected]

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GLOBALIZAÇÃO E O CIRCUITO ESPACIAL DE PRODUÇÃO PETROLÍFERO: AS CIDADES DA INFORMAÇÃO E AS CIDADES DA

EXTRAÇÃO1 SILVANA CRISTINA DA SILVA2

Resumo

O presente artigo apresenta uma discussão sobre o circuito espacial de produção do petróleo,

tendo como enfoque as especializações das cidades nas diferentes etapas do circuito. Macaé,

denominada “Capital Nacional do Petróleo”, pode ser identificada como uma “cidade da extração”.

Entretanto, a produção da informação, que comanda o circuito da valorização do petróleo, encontra-

se em outros lugares, nas “cidades da informação”, como as metrópoles e as cidades historicamente

especializadas na extração de petróleo, mas que hoje são nódulos da produção da informação que

controlam a extração. Essa divisão territorial do trabalho revela-se pelo processo de urbanização e

está presente na organização do espaço urbano das cidades, sobretudo na economia urbana. A

modernização de Macaé, decorrente a implantação das materialidades da extração do petróleo, não

significou a redução das desigualdades, mas sim o seu aprofundamento.

Palavras-chave: Globalização, Circuito espacial de produção, Petróleo, circuitos da

economia urbana.

GLOBALIZATION AND PETROLEUM SPATIAL CIRCUIT OF PRODUCTION: CITIES OF INFORMATION AND CITIES OF

EXTRACTION Abstract

This article introduces a petroleum spatial circuit of production discussion highlighting the

cities specialities in the different steps. Macaé, also known for National Petroleum Capital can be

identified with a city of extraction. However, the information production whose commands the

petroleum valorization circuit has been placed in “cities of information” like metropolis and historically

specialized cities in petroleum extraction nowadays considered points of concentration about

information production whose controls the extraction domain. This territorial division of labour is

revealed by the urbanization process and this division is inside the urban space organization in the

cities particularly in the urban economy. The Macaé modernization due to materiality implantation

caused by petroleum extraction didn’t mean inequalities reduction but their deepening.

Keywords: Globalization, spatial Circuit of production, Petroleum, Circuits of urban economy

1 Resultado da Pesquisa “O circuito inferior e superior da economia urbana no Norte Fluminense”,

financiada pela FAPERJ (Processo nº E-26/110.935/2013). 2 Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Departamento de Geografia –

UFF/Campos dos Goytacazes. E-mail: [email protected]

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1 – Introdução

A divisão territorial do trabalho pode gerar novas regiões, entretanto, tais

regiões estão cada vez mais articuladas com as escalas globais. Os circuitos

espaciais de produção indicam as articulações escalares e o papel dos lugares

nesta divisão territorial do trabalho. No período atual, o meio geográfico transforma-

se em função das possibilidades de comunicação e circulação. A denominada

globalização, possibilitou que os circuitos produtivos regionais sejam cada vez mais

amplos, atingindo em escala planetária. O circuito espacial de produção do petróleo,

bem como, o seu respectivo círculo de cooperação, é extremamente globalizado. As

cidades que abrigam as materialidades do circuito produtivo do petróleo são

transformadas. No Brasil, o norte do estado do Rio de Janeiro, especialmente a

cidade de Macaé viu sua economia e estrutura urbanas serem modificadas em

função da extração do petróleo na Bacia de Campos, pois a cidade tornou-se a base

de operação da Petrobrás, que passou a abrigar instalações das grandes

corporações mundiais do ramo petrolífero. Essa extração não reorganizou somente

a economia das cidades do Norte Fluminense, mas a própria cidade do Rio de

Janeiro, que vem alterando a sua centralidade intraurbana em função das

corporações e as atividades técnico-científicas e informacionais demandadas pelas

empresas e pelo Estado.

O artigo divise-se em duas partes: na primeira apontamos as definições do

circuito espacial de produção, situando Macaé no circuito espacial de produção do

petróleo; a segunda parte, foi dedicada ao debate sobre o círculo de cooperação e

as “cidades da informação” e finalizamos com alguns apontamentos que devem ser

aprofundados, sobretudo considerando o avanço do processo de globalização e a

reflexão da urbanização nos países periféricos.

2. O circuito espacial de produção petrolífero: Macaé, uma “cidade da extração”

A divisão social e territorial do trabalho criou lugares especializados, Macaé é

um desses lugares em que uma atividade produtiva tornou-se hegemônica, trata-se

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de uma “cidade da extração” de petróleo. Entretanto, juntamente com a riqueza

gerada por meio da economia do petróleo; há o aprofundamento da pobreza

daqueles que não são inseridos neste circuito ou o são de maneira precária. Os

problemas da população não integrada ao circuito superior (SANTOS, 2004) do

petróleo são agravados com a elevação do custo de vida e especulação imobiliária

decorrentes da existência uma população com altas rendas geradas na economia do

petróleo.

Os circuitos espaciais de produção (BARRIOS, 1980; SANTOS, 1986;

MOARES, 1991), são etapas em que uma matéria passa até ser transformada para

o consumo final. Barrios (1980) propõe que o sistema de acumulação gerado pela

produção –a produção, a distribuição, a troca e o consumo são parte de um mesmo

processo, de uma unidade – corresponde a um circuito espacial de produção, ou

seja, as etapas em que a matéria-prima passa até se transformar o consumo final,

mas que não se resumem a etapas técnicas. Tais etapas envolvem arranjos

territoriais para a sua realização a partir das ações sociais que o estruturam. O que

se coloca como pergunta: como ocorre a acumulação considerando os elementos

espaciais? No caso do circuito do petróleo, como os lugares são mobilizados para

participar da produção e, ao mesmo tempo condicionam essa produção, que no

limite expressam relações sociais.

Neste sentido, a diferenciação social mais elementar do modo de produção

capitalista é aquela dos grupos sociais que serão donos do meio de produção e os

que trabalham para os donos do meio de produção. Entretanto, como assinala

Barrios (1980), hoje os meios de produção constituem-se em grandes corporações

que desenvolvem aparatos sofisticados de gestão e financeirização, exigindo

lugares altamente complexos para o exercício de suas atividades como as

metrópoles e megalópoles. Ao mesmo tempo, o fenômeno da dispersão das

atividades produtivas também ocorre. A relação entre esses agentes e esses lugares

é assimétrica, bem como, a capacidade de organização do território desses agentes

sociais. O controle do conhecimento técnico-científico é outro elemento da

constituição do poder, pois o monopólio do conhecimento é que vai manter o círculo

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de cooperação3 da informação para a produção, a força de trabalho e a hegemonia

da acumulação para determinados agentes.

No caso, do ramo do petróleo, como afirma Alves (2012): a instância da

produção compõe-se pelas etapas da exploração (pesquisa), da extração, do

transporte da matéria-prima e do refino. A extração de petróleo no município de

Macaé trouxe para o seu território uma infinidade de materialidades para a

realização da produção. Dentre essas materialidades descreve-se algumas, das

quais realizam as conexões com outras cidades do país e do mundo por meio do

círculo de cooperação, onde circula a produção de informação, especialmente as

atividades abrigadas em Macaé.

A economia da cana de açúcar, a pecuária e a pesca foram elementos da

formação territorial de Macaé. O pacto transformador da economia de Macaé e

região veio com a comprovação da viabilidade da exploração de petróleo na Bacia

de Campos. A instalação da subsede administrativa da Petrobrás para o

gerenciamento das operações in loco da extração, ocorrida em 1978 instaura a

centralidade da cidade em nível nacional com relação a exploração do petróleo.

Inclusive, Macaé “ganha” de Campos dos Goytacazes no processo de escolha da

implantação dessa base produtiva, conforme aponta Crespo (2010).

Em Macaé, a infraestrutura existente para a extração de petróleo offshore é

constituída pelo Porto de Imbetiba, que existia desde antes da descoberta de

Petróleo na Bacia de Campos e era utilizado pelos pescadores e para o transporte

de passageiros. A escolha da base de operações da Petrobrás em Macaé, ocorreu

devido à existência desse Porto, pois seria possível utilizá-lo como base de

operações. Hoje o Porto de Imbetiba é a principal base de operações, especialmente

das embarcações de apoio às plataformas e há de alguma forma um esgotamento

das possibilidades de uso desse Porto frente as novas demandas do Pré-Sal, pois a

maior parte da extração ocorre na Bacia de Campos e os avanços na exploração

avançam para a Bacia de Santos e se discute o aproveitamento de portos já

existentes e as possibilidades logísticas desses novos portos como o próprio Porto

3 Os círculos de cooperação compõem os circuitos espaciais de produção e representam os fluxos

imateriais como os fluxos de informações (científica, política, técnica, econômica), financeiras e de ordens.

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do Açu localizado no município vizinho, São João da Barra, ou a construção de um

novo porto em Macaé.

Após a reforma da legislação brasileira ocorrida em 19974, houve a quebra de

monopólio da Petrobrás para atividades de extração de petróleo e gás. Outras

empresas entraram no ramo, o que reorganizou as relações de dominação dentro do

circuito produtivo, entretanto a Petrobrás continua produzindo cerca de 90% do

petróleo e 85% do gás natural no Brasil (ANP, 2014). Além disso, destacamos que

85% da extração de Petróleo e 47% de gás natural originam-se da Bacia de

Campos. Dessa forma, destaca-se que Macaé concentra parte das materialidades

para a execução da extração, configurando uma estrutura produtiva cada vez mais

especializada, como vem apontando alguns trabalhos como Terra do ponto de vista

da especialização do trabalho (2007).

A Statoil5 e a BG6 são outras empresas que atuam na Bacia de Campos,

porém com um potencial menor na extração. A concentração da extração em

empresas é outro elemento que transforma a Petrobrás no grande centro das

atividades do petróleo em Macaé e que gera uma infinidade de relações com outras

empresas e serviços que são subcontratados por ela. Os contratos ocorrem com

grandes empresas para atividades que necessitam de alta tecnologia a atividades de

menor grau de sofisticação como empresas que fornecem serviços de limpeza,

alimentação e segurança.

Muitas foram as modificações do papel da Petrobras ao longo dos anos e das

gestões governamentais. Hoje a empresa possui 49 plataformas offshore em

operação na Bacia de Campos, sendo 35 flutuantes, 13 fixas e uma

semissubmersível.

Atualmente, a Petrobrás possui duas sub-sedes administrativas na cidade de

Macaé, a mais antiga em Imbetiba, e a de Imboassica no Parque dos Turbos. Além

disso, possui uma enorme estrutura de armazenamento no Parque dos tubos e

Parque Cabiúnas. Somente no Parque dos Turbos são hoje cerca de 4.000

funcionários da empresa. A Petrobras possui cerca de 50 sondas de perfuração para

4 Lei Federal nº 9.478 de 1997.

5 Empresa norueguesa presente no Brasil desde 2001.

6 Empresa inglesa que está presente no Brasil desde 2006.

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estudos de viabilidade de projetos em Macaé. A cidade de Macaé, abriga o principal

aeroporto de embarque e desembarque de petroleiros (maior número de voos de

helicópteros da América Latina) e barcos de apoio às operações no Porto de

Imbetiba7.

Todas essas informações indicam a importância do circuito espacial produtivo

do petróleo para o município de Macaé. O que provocou na cidade um forte

dinamismo populacional e econômico. A economia urbana da cidade especializada

no petróleo trouxe uma camada de população com altas rendas; ao mesmo tempo,

trouxe uma população que não consegue se inserir no circuito produtivo de forma

estável, assim temos os desdobramentos da produção do petróleo no espaço e na

economia urbana de Macaé.

As mudanças no município não foram apenas com relação à recepção de

parte do circuito produtivo do petróleo. Com ele, veio uma população especializada e

técnica, em parte composta por estrangeiros e que ocupa cargos de gerência ou de

engenharia e que se destaca por receber elevados salários. Esse estrato da

população acabou gerando um circuito de consumo específico na cidade. Além

disso, as altas rendas interferiram, sobretudo na dinâmica da especulação

imobiliária. O surgimento de condomínios de alto padrão e a supervalorização dos

preços dos imóveis e algumas áreas da cidade, expressam parte do processo da

especialização produtiva no petróleo, que adensou um circuito superior de

consumos, com a criação de shoppings, de redes hoteleiras internacionais, bem

como, promoveu a expansão das redes de comércios e serviços destinadas a

atender o consumo produtivo e o consumo consultivo.

Contudo, se por um lado a presença de etapas da extração do circuito

espacial de produção do petróleo trouxe a produção de riqueza para Macaé; por

outro lado, atraída pelas oportunidades empregos, uma população de baixa

qualificação migrou para Macaé, essa população não se inseriu no espaço urbano

de forma a garantir as necessidades básicas e não foi integrada ao circuito superior

da economia urbana do petróleo. Parte dessa população adensou as periferias e as

favelas da cidade, sendo inserida na economia urbana por meio do circuito inferior.

7 Dados fornecidos pelo engenheiro Lincoln Weinhardt em entrevista realizada na sede da empresa

em 16 de abril de 2014.

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O circuito inferior funciona de forma contraditória, solidária, complementar e

concorrente ao circuito superior (SANTOS, 2004). O circuito produtivo do petróleo

gera também a necessidade de trabalhadores não especializados ou que exigem

maiores riscos (atividades insalubres e de alta periculosidade), assim, surge também

um circuito inferior de serviços oferecidos por empresas de menor porte para a

realização dessas tarefas da Petrobras e de grandes empresas vinculadas a ela.

Empresas de limpeza, de segurança e mesmo de comunicação social são

contratadas para serviços específicos para as grandes empresas que se instalaram

no município.

Os grupos sociais que não são inseridas em atividades específicas da

economia do petróleo, se inserem na economia do circuito inferior, como por

exemplo a enorme quantidade de salões de cabelereiros e comércios de cursos

profissionalizantes como verificado em parte da Rodovia Amaral Peixoto, que

atravessa a cidade. Essas atividades não estão conectadas com a extração do

petróleo, mas com a concentração de pessoas e pelo processo de urbanização

intensificado pela economia do petróleo.

3. Os círculos de cooperação e os lugares da produção da informação

A partir da aproximação do funcionamento do circuito espacial de produção

do petróleo, observa-se que se trata de um ramo de atividade que mobiliza capital

intensivo, mão de obra qualificada e especializada, elevados investimentos em

tecnologia, além de desenvolver parte das etapas da produção condicionadas pelos

elementos territoriais. No caso da extração offshore, constata-se que o

desenvolvimento tecnológico é fundamental para a criação das condições de

produção. Macaé, dentre as cidades do Norte Fluminense, aparece como um grande

nó da produção e vem aumentando a sua centralidade regional em função do

petróleo.

As cidades, no entanto, possuem papéis muito distintos na divisão territorial

do trabalho no circuito espacial de produção do petróleo. Ainda que possa haver

elementos que indiquem a produção da informação em Macaé, sobretudo advinda

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do conhecimento do processo produtivo, que ocorre in loco, a produção da

informação vai ocorrer nas metrópoles, nas cidades especializadas no ramo do

petróleo e em poucas cidades, que abrigam Universidades ou centros de pesquisa.

Nesse sentido, duas análises são essenciais: o funcionamento da economia urbana

dessas cidades e a economia urbana do território.

A economia urbana da cidade, conforme Santos (2009), diz respeito a forma

como se organiza a repartição do sistema produtivo em uma cidade, de maneira

simplificada, como os homens e as materialidades são distribuídos para a produção

e o consumo. Dessa forma, surge a economia urbana da cidade, que não se descola

da economia política do território, que por sua vez está cada vez mais globalizada

em função do aumento da disponibilidade de transporte e de comunicação.

As metrópoles são os lugares que condensam materialidades, fixos e fluxos.

São lugares de concentração de população, de mercados e da diversidade. As

grandes cidades, possuem a capacidade de atração de mais atividades, pelo

fenômeno que Pred (1979) denominou à tendenciosidade espacial da informação.

Pred (1979) analisa as cidades nas economias avançadas, como Estados Unidos e

Inglaterra, chegando a algumas conclusões importantes, que com algumas

ressalvas – a distinção do processo de urbanização – também são encontradas no

sistema de cidades dos países periféricos. A localização das atividades econômicas

obedece a decisões explícitas e implícitas. No primeiro caso, trata-se da localização

de órgãos de governo e disponibilidade de informações especializadas, que são

fundamentais para a difusão de inovações por outras empresas; no segundo caso,

as informações implícitas, articula-se com a forma como as empresas ou órgãos de

governo decidem adquirir bens e serviços, rotineiros ou não. Ambas corroboram

para a tendenciosidade espacial que condiciona a escolha dos lugares para a

implantação de unidades empresariais como agências de publicidade, bancos,

sedes administrativas, consultorias, etc. que exigem que parte do tempo gasto seja

com a troca de informações e relações diretas com clientes.

A metrópole do Rio de Janeiro desde cedo foi abrigo da indústria do petróleo.

Embora tenha passado por períodos de certa estagnação na atividade, este ramo

retoma o crescimento recentemente (anos 2000) e remodela o território fluminense.

Dentro da divisão territorial do trabalho, as cidades se especializaram: Macaé tonou-

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se um nó da extração; Niterói é o centro da indústria naval e a cidade do Rio de

Janeiro comanda o círculo de cooperação (escala Nacional), pois é de onde partem

as ordens para o funcionamento da produção e onde se concentram os centros de

pesquisa da do circuito espacial de produção do petróleo no Brasil como as

universidades, centros de pesquisa públicos e privados. É também na cidade do Rio

de Janeiro onde estão instalados os escritórios das empresas de construção naval,

de transporte aéreo offshore, escritórios das grandes corporações, a principal sede

da Petrobras, além das instituições públicas e privadas de financiamento.

Conforme Santos (2002), o período técnico-científico-informacional é

comandado pela variável informação. Os lugares capazes de gerar informação são

aqueles que hierarquicamente agregam poder no período atual. Assim, coloca-se no

centro do debate a importância dos lugares na economia política do território, a

variável informação.

Para Dantas (2003), a reorganização do capitalismo, após a crise fordista,

ocorre no sentido da sofisticação dos produtos, sendo a informação substrato básico

para a criação de novos produtos e novas formas de organização da produção e de

sua gestão. Ganham força as informações produtivas (novas técnicas de produção),

as informações para a circulação e as informações que possibilitam o aumento do

consumo. Assim, a produção, distribuição, comércio e consumo são orientados pela

informação, seja ela informação para dar substrato à produção em si, seja para

racionalizar a circulação ou orientar o consumo.

As cidades compõem os lugares da produção da informação, quanto mais as

cidades abrigam nós dos circuitos produtivos, mais complexas tornam-se essas

cidades, inclusive para a produção da informação.

Bernardes (2001) aponta a capacidade de produzir, organizar, distribuir e

consumir informações foi responsável pela mudança de centralidade econômica do

território brasileiro, que sai do Rio de Janeiro e vai para São Paulo e essa torna-se a

metrópole informacional do território brasileiro. Entretanto, quando se aborda o

circuito espacial do petróleo e seu respectivo círculo de cooperação, o Rio de

Janeiro é a “cidade da produção da informação” e essa conecta-se com outros nós

da produção da informação da produção petrolífera. Essa importância do Rio de

Janeiro, pode ser constatada com a reorganização das instituições técnico e

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científicas em período recente, que vem modificando a economia do centro e da

Zona Sul da cidade, como apontou Binsztok (2012), que indica a formação de “ilhas

de excelência” técnica-científica no Rio de Janeiro, em função da exploração do

petróleo, sendo a Petrobras a empresa central nesse dinamismo. O autor destaca

que essa centralidade técnico-científica é dada pela ampliação do CENPES,

localizado na Ilha do Fundão, cidade universitária da UFRJ, CoppeTEC8 localizada

na Ilha do Bom Jesus, que também vem recebendo as instalações de centros de

P&D das corporações globais como Schulumberger, General Eletric, Backer

Hughes, Siemens, General Electric, Halliburton e o Centro Global de Tecnologia do

BG Group. Acrescenta-se a essa lista a FMC, Tenaris Confab, a EMC2, a Vallorec e

a Georadar9.

Além dessas empresas, o Parque Tecnológico abriga médias e pequenas

empresas e laboratórios de pesquisa, a maioria vinculada à Coppe-UFRJ. O centro e

a Zona Sul são remodelados pela presença do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e

Biocombustível (IBP), que se articula com a FGV (Fundação Getúlio Vargas),

sobretudo pelas áreas de Engenharia e Economia. A PUC e a UFF (Universidade

Federal Fluminense) também compõem as redes de pesquisas vinculadas ao círculo

de cooperação da produção do petróleo e gás. Essa centralidade do Rio de Janeiro

torna-se mais densa com os fixos do sistema financeiro – como o BNDES –,

presentes na cidade do Rio de Janeiro, que se desdobra em fluxos de financiamento

e investimentos em capital imobiliário10.

4. Considerações finais: a produção de informação e as hierarquias do poder no período atual

Considerando o período atual, em que a informação é uma variável que

condiciona a hierarquia do poder. A especialização das cidades na divisão territorial

do trabalho ocorre a partir do abrigo de etapas dos circuitos produtivos, que são

planetários.

8 Vinculado ao Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa em Engenharia (Coppe)

da UFRJ. 9 Informações disponíveis em < http://www.parque.ufrj.br/> Acesso em 10 de janeiro de 2015.

10 Ver Binsztok (2012).

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O circuito espacial de produção do petróleo tem na cidade do Rio de Janeiro a

sua sede de produção e coordenação da informação. A metrópole carioca torna-se

relé da produção de informação desse circuito produtivo global, que estabelece

conexões com cidades importantes da economia do petróleo como Houston (EUA),

Aberdeen (Escócia) e Stavanger (Noruega) entre outras cidades que são

especializadas no ramo.

Por outro lado, Macaé se reafirma como centro de apoio à exploração do

petróleo. Uma parte dessas atividades são vinculadas às grandes empresas, via

subcontratação; outra parte constitui-se em atividades “autônomas” ou de auxílio ao

ramo do petróleo, como por exemplo, as empresas que oferecem serviços de

limpeza ou de alimentação.

Portanto, identifica-se uma especialização das metrópoles em atividades do

circuito superior mais sofisticadas, ligadas a produção da informação, e um circuito

superior conectado à extração propriamente dita em Macaé. O circuito inferior nas

metrópoles apresenta maior diversidade e a especialização produtiva em alguns

ramos não é tão impactante, pois as metrópoles definem-se também como relés de

circuito produtivos diversos.

No caso de Macaé, o circuito inferior aparece com elevado grau de

especialização no ramo petrolífero. Mesmo não atendendo atividades de alta

tecnologia da produção, restaurantes, pousadas, pequenos comércios e

supermercados surgem para atender a população que migrou para o município e

não foi absorvida diretamente pelo circuito superior do petróleo, em função da não

adequação dessa mão de obra às atividades que exigem formação de nível superior,

ou que exigem formação técnica. Assim, a cidade cindida vai se desenhando. A

cidade pobre e a cidade rica se articulam pela economia urbana. Bem como as

hierarquias do poder são construídas com base na urbanização e na divisão

nacional e internacional do trabalho.

5. Referências bibliográficas

ALVES, Sandra Priscila. O circuito espacial de produção petrolífera no Rio

Grande do Norte. Dissertação de mestrado em Geografia do Centro de Ciências

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BERNARDES da Silva, Adriana. A contemporaneidade de São Paulo. Produção

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