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MARCIO IORIO ARANHA

 

Manual de Direito Regulatório(Fundamentos de Direito Regulatório) 

2ª edição ampliada e atualizada

 

Laccademia Publishing2014

 

Copyright © 2014 Marcio Iorio AranhaAll rights reserved.

 

Publicado por Laccademia Publishing LimitedSuite 12 New Dunn Business Park, GL 16 8JD

Coleford, Gloucestershire, United Kingdom

 1ª edição (2013)

 

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

 A662m Aranha, Marcio Iorio, 1974-

  Manual de Direito Regulatório: Fundamentos de Direito Regulatório /Márcio Iorio Aranha. 2. ed. rev. ampl. – Coleford, UK: Laccademia Publishing,2014.  viii, 152 p. ; 22 cm.

 ISBN 978-14-947-0383-7

 

1. Direito regulatório 2. Manual de direito regulatório. 3. Fundamentos. I.Título.

  CDD: 341.3782CDU: 346.5:65

 Índice para catálogo sistemático:

 

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Brasil : Direito Regulatório 341.3782 

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio.

 

Impresso nos Estados Unidos/ Printed in the United States 

Dedicatória  

O interesse pelo estudo do Direito Regulatório nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito daUniversidade de Brasília brotou a partir de semeadura de projetos de pesquisa e de ensino implementados em iniciativasconjuntas com o saudoso professor Carlos Eduardo Vieira de Carvalho. Passada uma década de tais iniciativas, dedico este

estudo à memória do Professor que tão profundamente marcou a cátedra de Direito Administrativo da Faculdade de Direitoda Universidade de Brasília e que dá nome ao Núcleo de Direito Setorial e Regulatório que hoje coordeno.

 

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Agradecimentos 

Aos alunos e professores dos cursos de pós-graduação em regulação de telecomunicações, integrantes do Centro de Políticas, Direito,Economia e Tecnologias das Comunicações da Universidade de Brasília (CCOM/UnB), onde surgiu o interesse pelo aprofundamento

da temática de direito regulatório.

 Aos integrantes da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, que incentivaram o aprofundamento da pesquisa em Direito

Regulatório, mediante institucionalização da disciplina de graduação de Direito Administrativo 3 e da disciplina de Mestrado eDoutorado em Direito, Estado e Constituição intitulada Estado e Regulação.

 Aos professores e alunos do Centro de Estudos em Regulação de Mercados da Universidade de Brasília (CERME/UnB), que

 propiciaram o espaço institucional de desenvolvimento e teorização do Direito Regulatório frente a um público especializado emdiversos setores regulados

 OBRAS DO AUTOR 

 Livros e capítulos de livros selecionados:1.  Direito das Telecomunicações: Histórico Normativo e Conceitos Fundamentais. 2ª ed., Coleford, UK: Laccademia Publishing,

2014.2.  Comentários aos artigos 221 a 224 da Constituição Federal brasileira de 1988: CANOTILHO, J. J. Gomes [et al.] (org.).

Comentários à Constituição do Brasil. Coimbra/São Paulo: Almedina/Saraiva, 2013, p. 2051-2077.3.  Coletânea de Normas e Julgados de Telecomunicações. Brasília: Getel/UnB, 2006 a 2013.

(http://www.getel.org/GETELcbdt.html)4.  Glossário Brasileiro de Direito das Telecomunicações. Brasília: Getel/UnB, 2006 a 20135.  Temas de Telecomunicações Referenciados. Brasília: Getel/UnB, 2011 a 2013.6.   Normas e Julgados do Setor de Telecomunicações. Brasília: Getel/UnB, 2011 a 2013.7.  Direito das Telecomunicações: estrutura institucional regulatório e infraestrutura de telecomunicações no Brasil. Brasília:

Universidade de Brasília, 2005.8.  Política de Patentes em Saúde Humana. São Paulo: Atlas, 2001.

9.  Interpretação constitucional e as garantias institucionais dos direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 1999 e 2000. (3ª edição de2014).

 Artigos selecionados:1.  The Institutional Indicator of Federalism from the Perspective of the TLICS Model: Juridical Variables for the ICT Comparative

Studies. Comparative Law eJournal, Vol. 12, No. 52, June 25, 2012, p. 1-13, ISSN 1556-5068.2.  Telecommunications Law Indicators for Comparative Studies (TLICS) Model: A Hermeneutical Approach. Americas Information

and Communications Network Conference 2011, p. 283-294.3.  Diálogos Políticos-Jurídicos na Comparação de Modelos Regulatórios de Comunicação. RBPC 1, 2011.4.  Restricted mobility and fixed-mobile convergence in Brazil. Info (Cambridge. Print) 13:32-42, 2011.5.  Direito, Estado e Telecomunicações: a força gravitacional da banda larga. RDET 3(1): 1-42, 2011.6.  Digital TV in Brazil and its Interactive Possibilities through Mobile Networks. Cátedra Europa 2009. Ediciones Uninorte, 2009,

 p. 185-194.

7.  Direito, Estado e Telecomunicações: o ano em que o espectro novamente encolheu. RDET 2(1): 1-44, 2010.8.  Direito, Estado e Telecomunicações: dos primórdios ao novo modelo regulatório. RDET 1(1): 1-76, 2009.9.  Democracia participativa e a agência reguladora de telecomunicações brasileira. In: Anais do I Seminário Internacional de

Regulação de Serviços Públicos: Direito Comparado da Energia Elétrica e das Telecomunicações. Santa Cruz do Sul: EDUNISC,2008.

10.  Renovação dos contratos de concessão da Telefonia Fixa no Brasil. Notícia do Direito Brasileiro 13:225-238, 2006.11.  Mundialización informativa, informacional y cultural. Política y Cultura 26:71-91, 2006.12.  Ambiente normativo brasileiro de prestação de serviços em setores regulados: o caso da desestatização do Sistema Telebrás

como arquétipo do direito administrativo de conjuntura. Revista Notícia do Direito Brasileiro 12: 103-128, 2006.13.  Poder normativo do Executivo e teoria da regulação. Revista Notícia do Direito Brasileiro 9: 135-154, 2002.14.  Conteúdo essencial das cláusulas pétreas. Revista Notícia do Direito Brasileiro 7: 389-402, 2000.15.  As dimensões objetivas dos direitos e sua posição de relevo na interpretação constitucional como conquista contemporânea da

democracia substancial. Revista de Informação Legislativa 35: 217-230, 1998.

16.  Jurisdição constitucional e política: interpretativismo, não-interpretativismo e suas alternativas políticas e jurídicas - Teoriaestética - Estudo da obra “Contemporary constitutional lawmaking” de Lief H. Carter. Revista de Informação Legislativa33(132): 297-311, 199.

17.  O método apropriado à interpretação da parte dogmática das constituições. Revista da Fundação Escola Superior do MinistérioPúblico do Distrito Federal e Territórios 5: 143-155, 1997.

18.  Intervencionismo social e neoliberalismo, ou liberalismo construtor: a precisão de seus conceitos mediante a análise da

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gradação do controle estatal e de sua política de prioridades. Revista de Informação Legislativa 135(34): 237-251, 1997.19.  Segurança jurídica stricto sensu e legalidade dos atos administrativos: convalidação do ato nulo pela imputação do valor de

segurança jurídica em concreto à junção da boa-fé e do lapso temporal. Revista de Informação Legislativa 134: 59-73, 1997.

 

SUMÁRIO

 Introdução ao Direito Regulatório

Estado, Poder e Direito público

Pressupostos teóricos do Estado Regulador 

2.1. Cerne da regulação: o mercado de direito2.2 Direitos fundamentais objetivados e Estado Regulador 

2.3 O Estado Administrativo e a separação de poderes

2.4 Legitimidade no Estado Regulador 

2.5 Poder regulamentar na tradição francesa

2.6 Situando o conceito de Estado Subsidiário

2.7 O fenômeno da regulação e seu significado

Teoria jurídica da regulação

3.1 Public Choice theory versus teoria processual administrativa da regulação

3.2 Situação jurídica do cidadão co-partícipe no Estado Regulador 

Ordenamento jurídico dinâmico

4.1 Velocidade da inovação tecnológica, linguagem setorial e especialização regulatória

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4.2 Globalização, conhecimento e política pública setorial

Modernização do direito administrativo

5.1 Regimes jurídicos de prestação de serviços

5.2 Regimes jurídicos de prestação de serviços regulados: divisão constitucional de titularidade

5.2 Autorização de serviços

 

Fundamentos de Direito Regulatório

Direito Regulatório e Estado regulador 

Regulação: objeto de estudo do direito regulatório

2.1 Formas de regulação

2.2 Efeitos das opções regulatórias

2.3 Função normativa conjuntural do Executivo

2.4 Conceito de regulação

2.5 Regulação versus desregulação

Regulação no brasil

3.1 Fases da regulação no Brasil

3.2 Espécies de regulação

3.3 Estruturas de Regulação Setorial

Bibliografia

 

Parte I 

INTRODUÇÃO AODIREITO REGULATÓRIO 

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ESTADO, PODER E DIREITO PÚBLICO 

Pressuposto à compreensão do direito regulatório, o conceito de direito público e sua posição relativafrente aos de Estado e poder político permitem situar didaticamente o direito regulatório como ramo partícipe datradição de direito público, embora tributária dos ramos de direito setorial.

Afora a discussão histórica sobre a relação entre Direito e Estado, partindo-se de um dualismo quevisualizava no Estado uma força política primordial distinta do seu sistema jurídico, seguido por uma teoria pura

do direito que identificava Estado e sistema jurídico[1]

, para finalmente repousar nas teorias constitucionalistas de

mediação entre Estado e Sociedade[2], o Estado, sob o enfoque jurídico, nada mais é do que um centro deimputação normativa dotado do especial qualificativo do exercício de poder político como uma relação de

autoridade.[3]

Em termos jurídicos, poder   significa a possibilidade de interferência unilateral na esfera jurídica

alheia.[4]

  O Estado, enquanto produto constitucional, encarna as medidas de poder – competências – delegadas pelo documento constitucional nos limites das finalidades para as quais foram criadas – funções. Desse batimentoentre suas competências e funções, têm-se sua identidade jurídica: o Estado é um centro de atributos jurídicosqualificado pela intensa incidência do direito público via manifestação de aspectos sobreviventes da soberania,tais como a possibilidade jurídica do uso da força física e sua exclusividade, bem como a não-oponibilidade

interna e externa para afirmação do ordenamento jurídico vigente.

Como tal, ao Estado é reservada a definição de pessoa jurídica de direito público , que se apresentacomo uma unidade, no direito internacional público, mas como um conjunto de pessoas jurídicas de direito público para o direito interno – União, Estados-membros, Municípios e suas autarquias. O Estado, portanto, édefinido a partir do direito público; não o inverso .

Elevado à categoria de elemento distintivo do Estado, embora não restrito a ele, o direito públicodepende da categoria de poder político para ser aquilatado. Como tal, o direito público é o regramento jurídico do poder político entendido como uma posição diferenciada no ordenamento jurídico, segundo a qual um centro deimputação normativa encontra-se em posição de interferir unilateralmente na esfera jurídica de outrem. Em termosmais analíticos, o direito público é o regramento jurídico do poder político caracterizado pela estruturação do

 poder, pela conformação dos direitos, pelo estudo das relações envolvendo o Estado e seus delegatários e pelaautolimitação do poder.

Em outras palavras, ao direito público cabe a função não só de disciplinar a estrutura de poder comoa de expressar a dimensão jurídica de influência sobre esferas jurídicas alheias. A regulação de atividadesrelevantes é manifestação preponderantemente pública, embora não exclusivamente pública. Daí dizer-se que odireito regulatório manifesta-se como um ramo de direito público, em especial quando os aspectos de interferênciaunilateral em determinado campo de atividades socialmente relevantes tomam a forma de órgãos ou entidadesestatais com poderes específicos de redirecionamento de tais atividades. O direito regulatório, portanto, é umramo de direito público.

Ao se concluir pelo posicionamento didático do direito regulatório como ramo de direito público,

entretanto, não se quer dizer que o estudo jurídico da regulação se resuma à disciplina de estruturas regulatórias ecomandos regulatórios. Em grande medida, as disciplinas jurídicas setoriais abarcam a disciplina regulatória,ampliando o escopo de análise para tratar de toda a disciplina regulatória a partir de um recorte transversal. Ouseja, o direito das telecomunicações, dos recursos naturais, da saúde, do desporto, dos portos, aeroportos efronteiras, dos transportes, dos recursos hídricos, dentre outros, afiguram-se como disciplinas jurídicas que

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mesclam ramos tradicionais de conhecimento jurídico – direito constitucional, administrativo, tributário, civil,comercial, consumidor, ambiental, dentre outros – com a disciplina jurídica regulatória específica de cada setor,compondo um quadro mais completo do regramento jurídico incidente sobre um setor de atividades reguladas.

O diferencial do direito regulatório, enquanto direito de caráter amplo abrangente de diversossetores de atividades relevantes encontra-se fora das atividades mesmas que regula. Este livro preocupa-se como que é onipresente às abordagens regulatórias. As disciplinas de direito setorial, por outro lado, trazem outrorecorte didático ao aglutinarem características próprias de cada setor relevante da economia – saúde, educação,energia, telecomunicações, petróleo, águas, transportes –, a partir de um poutporri de abordagens

interdisciplinares – exemplificativamente do direito constitutional, administrativo, civil, comercial, do consumidor,ambiental e ainda do direito regulatório. Assim, a identidade do direito regulatório repousa sobre pressupostosindiferentes às peculiaridades de cada setor de atividades reguladas, tais como sobre os conceitos de direitosfundamentais objetivados, Estado Regulador, Estado Administrativo, legitimidade regulatória, poder regulamentar e regulação, que serão analisados no próximo capítulo.

 

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DO ESTADO REGULADOR  

2.1. CERNE DA REGULAÇÃO: O MERCADO DE DIREITO

A objetivação dos direitos a partir da categoria dos dirietos sociais do século XX explica a preocupação com a concretização de direitos, mas não responde à questão básica do porquê da regulação, ou seja, por que dita concretização necessitaria advir de um método especial de intervenção estatal capaz de se readequar conjunturalmente de acordo com as respostas originadas do sistema controlado.

Dentre os fundamentos da regulação, encontram-se, de fato, a natureza objetiva dos direitos, osconceitos de Estado Administrativo, separação de poderes, Estado Regulador, poder regulamentar, EstadoSubsidiário, que serão tratados em seguida, mas todos eles são pressupostos insuficientes para justificarem por sisós o atual quadro regulatório.

O fundamento da regulação e, por consequência, do direito regulatório, encontra-se na necessidade de proteção de um determinado objeto errático. Não se pode negar que a competição tem sido identificada como talobjeto e opera um efeito decisivo no modelo regulatório atual. Ela é, portanto, um dos fundamentos da regulação,todavia, não se apresenta como seu fundamento central. O cerne da regulação reside em outra seara qualificadorado mercado: o direito à igualdade.

Trata-se do mesmo direito que, segundo leituras históricas mais aprofundadas[5]

, teria dado origem àRevolução Americana, quando os protestos dos colonos em Boston em 1773 dirigiam-se menos à tributação dochá holandês em benefício do inglês então transportado pela Companhia das Índias Orientais, do que à isenção

tributária do chá inglês em flagrante benefício anti-isonômico ao monopólio exercido por dita empresa. Aigualdade entre os atores econômicos foi a razão pela qual as corporações empresariais foram vistas com muitasressalvas após a independência dos Estados Unidos da América. Elas somente podiam ser constituídas para

 propósito específico e por duração em geral limitada a vinte anos.[6]

 Somente mais tarde, via jurisprudência daSuprema Corte estadunidense, é que a personalidade jurídica das corporações empresariais passou a ser reconhecida para fins de exercício de direitos à igualdade de exação obtida quando da negativa de oitiva do casoSanta Clara County v . Southern Pacific Railroad   (118 U.S. 394), de 1886, e, recentemente, a afirmação daigualdade de pessoas jurídicas e físicas para fins de direitos políticos de financiamento de campanhas no casoCitizens United  v.  Federal Election Commission (558 U.S. 310), de 2010.

Por detrás das limitações à atuação das corporações empresariais encontrava-se a compreensão de que

a progressiva atribuição de personalidade jurídica a elas desequilibraria o esquema de forças dos atoreseconômicos em prol de pessoas jurídicas com vantagens competitivas não usufruíveis por seres humanos, por definição finitos no tempo e com capacidade de investimento limitada.

Assim, o controle regulatório sobre pessoas jurídicas não surgiu, em sua origem, por razões de preservação do mercado, dos preços, ou mesmo para defesa dos consumidores, mas por um fundamento inerente

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à igualdade, pois a mera existência das pessoas jurídicas empresariais constitui um fator desequalizador dasrelações econômicas ao introduzirem seres desumanizados em um ambiente de acumulação de capital e técnicaimpossível de ser alcançado por suas contrapartes humanas, dotadas de tempo finito de vida e fadados àresponsabilização pessoal por seus atos.

O mercado existe como instituição protegida nos dias de hoje desde que referido por elementosconstitutivos básicos, dentre eles, a concepção de se afigurar como espaço regrado de atores econômicos emigualdade de condições. O mercado é um bem jurídico a ser protegido porque decorre do direito à igualdade, maso inverso – o de se proteger a igualdade em virtude do mercado – não é verdadeiro. O original dessa relação

repousa no lado do direito à igualdade enquanto declaração constitucional inaugural da vida política em umEstado de Direito. Nessa relação, o mercado é um produto derivado do direito .Assim, é inquestionável que o mercado deva ser protegido, mas ao se dizer isso permanece oculto o

verdadeiro protagonista do cenário regulatório: o direito à igualdade de condições concorrenciais. Quando dasimplificação do significado da regulação, o direito à igualdade foi encoberto pelas areias do tempo, sobrevivendosomente seu corolário: a competição e sua personificação, o mercado. Por isso, a regulação não é um método dealcance da competição onde ela não exista, mas uma demanda inafastável derivada da constatação de que o próprio Direito criou seres imortais que desequilibram as relações humanas de acumulação de capital, técnica evantagens competitivas, exigindo, portanto, a regulação por princípio; não por consequência de deficiência domeio concorrencial. Deficiente ele já o é por sua natureza.

Para além dessa constatação de centralidade do direito à igualdade para a regulação, o ser humano

somente será livre para o exercício de sua criatividade e uso de atributos de relacionamento humano quando omeio de campo inicialmente desvirtuado – ou instrumentalizado pela própria existência das regras jurídicas – for conjunturalmente ajustado perante a mutação normativa natural à qualquer sociedade política. Sem oacompanhamento conjuntural da realidade operado pelo direito regulatório, o Direito trasnforma-se em umainstituição indomada capaz de servir a fins não previstos em sua conformação teleológica: a sua finalidade de processo de preservação da convivência social.

A regulação moderna, que será definida mais adiante, é o elemento de civilização da instituiçãourídica na disciplina das condições do jogo dos atores econômicos, quando dita instituição jurídica passou a ser 

dirigida por forças germinadas na placa de Petri do próprio mundo jurídico: a empresa; a corporação; aassociação; a fundação, enfim, a pessoa jurídica com pretensão de atuação econômica. A regulação é oacompanhamento do crescimento das culturas  lá germinadas. Nessa placa de Petri, que fornece o ambiente

artificial de incubação de novos seres imortais, as regras competitivas são definidas por fronteiras que necessitamda dinâmica regulatória para que não estrangulem os seres que justificarem as novas criaturas: seus criadores, ostitulares dos direitos fundamentais humanos, que continuam figurando como norte valorativo de todo o sistemaurídico-político. A regulação é uma necessidade decorrente do sistema jurídico moderno para preservação de sua

finalidade: o criador – o ser humano; e somente mediatamente sua criatura – o ser jurídico e o mercado. 

2.2 DIREITOS FUNDAMENTAIS OBJETIVADOS E ESTADO REGULADOR 

O século XX significou a afirmação dos direitos individuais como instituições jurídicas dependentesdo contexto socioeconômico; significou, em outras palavras, a tentativa de solução do conflito entre a percepçãodos direitos, de um lado, como entidades ideais e impalpáveis – liberdades abstratas  – e, de outro lado, como

configurações tangíveis resultantes de atuação direta estatal conformadora dos direitos – liberdades concretas . Oséculo XX representou o momento teórico de afirmação das  garantias constitucionais dos direitos fundamentais,desde que se vulgarizou o entendimento da insuficiência de enumeração de direitos para proteção dos seus

titulares por intermédio da teoria das garantias institucionais.[7]

  Fala-se, portanto, do século de apresentação doEstado como um componente essencial na definição do conteúdo dos direitos fundamentais medianteenraizamento do conceito de serviço público e da ampliação concreta do rol de direitos dos cidadãos.

Em que medida tais conjecturas se relacionam com o conceito de regulação? Na medida em que oEstado Regulador se apropria, como seu pressuposto, da ideia de que o papel interventor estatal, inscrito naregulação de setores assumidos como de interesse público, legitima-se por sua essencialidade (do Estado) naconcretização dos direitos a eles relacionados (aos setores regulados); apropria-se da indissociabilidade entre o

enunciado abstrato de um direito subjetivo e o contexto socioeconômico e político, enfim, cultural, de sua fruição.O pressuposto do Estado Regulador, portanto, é a compreensão da intervenção estatal como garantia depreservação das prestações materiais essenciais à fruição dos direitos fundamentais , sejam elas prestações deserviços públicos ou privados, sobre as quais se aplica a insígnia da regulação, ou sejam elas outros tipos deatividades, tais como o exercício do poder de polícia, atividades de fomento e prestações positivas tradicionais de

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índole concreta e normativa.

O direito subjetivo somente pode ser compreendido atualmente se encarado em comunhão com suafaceta objetiva, que repousa na determinação de conteúdo a partir da dinâmica do ordenamento jurídico em meioàs potencialidades concretas criadas por políticas públicas, por ordens normativas, por investimento empresarial,enfim, por acompanhamento conjuntural do desenvolvimento de um setor de atividades de interesse públicocomo, por exemplo, os setores de saúde, educação, recursos hídricos, energia, telecomunicações e transporte. A plena fruição do direito à saúde em suas diversas dimensões de devido diagnóstico, prognóstico e tratamentomédico encontra-se intrinsecamente relacionada com as disposições concretas de financiamento da educação

universitária médica e de áreas afins, de financiamento das pesquisas universitárias relativas ao desenvolvimentode equipamentos e métodos laboratoriais, de construção de uma rede de energia elétrica confiável para preservação dos equipamentos auxiliares, de edificação de redes nacionais e internacionais de banda larga paratelemedicina, do devido equacionamento e acompanhamento da liquidez de sistemas de saúde suplementar,enfim, de uma lista abrangente de atuação estatal e não-estatal concertada segundo uma batuta unificada na figurainterventora, mesmo que indireta, do Estado (não do governo) como espaço público de construção de soluções.

A complexidade alcançada na determinação de conteúdo jurídico dos direitos fundamentais revela quea precisão de dito conteúdo exige a análise do dispositivo normativo, como cristalização cultural que é, associadoaos influxos de transformações das ideias legislativas, jurisprudenciais, sociais, enfim, da realidade culturalcircundante. A determinação de sentido normativo deixou de ser remetida ao ambiente puramente estrutural   do

fenômeno jurídico[8]

; deixou de procurar extrair de um dispositivo escrito ou doutro elemento cultural cristalizado – jurisprudência, doutrina, costumes – todo o significado regrador da realidade; deixou de crer na possibilidade dealcance de um único  significado estático  frente a uma realidade dinâmica e multifacetada. Em outras palavras, oconteúdo normativo encontra-se claramente remetido a decisões de normatização secundária, significando que oadensamento do conteúdo dos direitos fundamentais depende, hoje, em grande medida, de decisões estataisinfluentes sobre os setores tidos como essenciais ao desenvolvimento socioeconômico do país e o fenômeno daregulação ocupa posição privilegiada em tal espaço decisório.

 

2.3 O ESTADO ADMINISTRATIVO E A SEPARAÇÃO DE PODERES 

Mas não basta referir-se à causa que justificou o Estado Regulador, pois ela poderia ter resultado emdiversas consequências, que não a de valorização da regulação, mediante reforço, por exemplo, da atividadeurisdicional, ao invés de se enfatizar a normatização e administração conjuntural de atividades de relevância

social. Daí decorre que outro pressuposto do Estado Regulador encontra-se na identificação mesma do EstadoAdministrativo, em que as noções de profissionalismo e expertise tradicionalmente aplicadas aos negócios privados são adaptadas ao conceito de expertise na atividade de governar com a conotação de permanência,treinamento e especialização de funções.

O início do século XX, mais precisamente a partir da Primeira Guerra Mundial, presenciou a

transformação da Administração Pública em um  substantivo , deixando de ser percebida como uma atividade periférica para se apresentar como uma ciência que combina e se utiliza de muitas especialidades, apresentando-se

como o “negócio mestre de todos os outros”[9]

 ao subsumir e sintetizar os demais.

A teoria da separação de poderes constituiu terra fértil à formação da teoria do Estado Administrativo.Inicialmente assentada em afirmações que rechaçavam o poder absoluto do monarca, mediante a ideia de uma

“monarquia limitada”[10]

 e funcional, no sentido de que “reis são feitos para o reino, não reinos para o rei”[11]

, aideia da separação, desde os escritos de Bolingbroke de 1748, vem amenizada na literatura clássica pela referênciaao equilíbrio de poderes – equilibrium of powers, reciprocal restrictions, reciprocal control, reciprocal delay and detention  –, exigindo, com isso, a interpenetração entre os poderes. Nem mesmo é necessário remeter-se aclássicos da literatura utópica – A República, de Platão; Utopia, de Thomas Morus; Oceana, de James Harrington –  para que se afirme a interpenetração de funções na divisão dos poderes. A própria classificação de Montesquieudas atividades conjunturais como próprias ao Poder Executivo demonstra como a divisão tripartite de poderes e

funções não conseguia abranger toda as dimensões de atividades estatais.[12]

  Igualmente perplexo pelainsuficiência da referência aos três poderes como abrangentes de todas as atividades estatais, mas preocupado com

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a manifestação jurídica da normatização infralegal, Eros Grau[13]

  diferencia normas primárias e secundárias, procurando enquadrar em um conceito mais amplo de atividade normativa as atividades conjunturais de

administração das leis.[14]

A noção de Estado Administrativo nasce em meio à constatação de insuficiência do modelo tripartitede separação de poderes para afirmar que a Administração Pública, aí incluída a jurisdição sob o viés tradicionalde separação de poderes, situa-se em um espaço de íntima relação e harmonia entre a administração e a política;uma teoria que se nutre da assertiva já de Montesquieu de que os poderes contêm várias funções para que se

impeça o domínio de uns pelos outros. Da mesma forma que a atividade executiva, nos idos da institucionalizaçãoda separação de poderes pelos framers da Constituição dos Estados Unidos da América, era vista como inscritatanto no Executivo quanto no Judiciário, quando se esperava que os juízes servissem como “brotos nascidos do

terreno executivo”[15]

, formando uma aliança defensiva com o Executivo contra o Congresso e participando

ativamente da execução das leis[16]

, a teoria administrativista do século XX voltou seus olhos para inscrever aolado da jurisdição uma atividade essencialmente distinta da atividade executiva: a atividade de administração dasleis, que teve sua aparição institucional a partir de 1883, nos Estados Unidos da América, com o surgimento dasagências independentes – independent establishments  – e, no Brasil, tanto com a absorção da concepçãoautárquica de origem italiana da primeira metade do século XX, quanto pelo movimento mais visível de criaçãodos órgãos reguladores da segunda metade da década de 1990. É bem verdade que a concepção do EstadoAdministrativo foi fomentada em meio ao movimento reformista estadunidense de fortalecimento do Poder Executivo em detrimento da então considerada invasão das atividades administrativas por parte do Legislativo edo Judiciário, mas isso não afasta a consideração de que o Estado Administrativo consistiu em um movimentocrítico quanto à imprecisão institucional da administração das leis.

Sob o enfoque do Estado Administrativo, a percepção de alastramento das funções entre os poderesestatais implica também a compreensão da função administrativa como uma realidade equidistante das clássicasfunções estatais. Trata-se, portanto, da progressiva institucionalização da administração como algo ligeiramentedistinto das funções executivas, legislativas e jurisdicionais. A grande novidade da teoria administrativista doséculo XX está justamente na identificação da administração estatal como algo distinto das funções executivas presidenciais de comando supremo das forças armadas e aplicação das leis. O Estado Administrativo expressa

uma função separada das demais – a administração das leis – como uma atividade intermediária entre as funçõesclássicas executivas, legislativas e jurisdicionais: um “reino de expertise” imune à influência política direta.

[17]

A identidade da atividade propriamente administrativa como distinta da executiva, judicial e legislativaexplica, por exemplo, a presença inafastável dos termos “poderes quase legislativos e quase jurisdicionais” (quasi-legislative  e quasi-judicial   power ) na literatura estadunidense sobre as agências reguladoras, bem como ainstitucionalização das agências como órgãos independentes do Executivo e a consideração da administraçãocomo espécie da atividade de execução da vontade do Estado, ao lado da atividade executiva e da jurisdicional,mas em oposição à atividade de decisão da política – a legislativa. As agências reguladoras encarnam, na tradiçãodo Estado Administrativo estadunidense, a afirmação de uma estrutura estatal responsável pela administração dasleis como algo essencialmente distinto da formulação das leis e, por isso, definida por exclusão, ou seja, trata-se

da  regulação entendida como a administração das leis que não se confunde com a formulação da políticapública correspondente, o que não significa dizer que a administração das leis seria despida de conteúdonormativo.

A teoria administrativista que cunhou o conceito de Estado Administrativo, no entanto, não vê umadiferença essencial entre política e administração. Pelo contrário, são fases de um mesmo processo administrativo,que define um Estado em que a separação entre política e administração obedece a uma finalidade utilitária de preservação de espaço para a especialização funcional. O Estado Administrativo é assim definido como um Estadodotado de um processo administrativo único, que permeia todas as funções governamentais, abarcando a política ea administração propriamente dita. Trata-se, portanto, de um Estado que encarna como função primeira oplanejamento mestre de toda a economia , presentes duas funções primordiais: a de planejamento e execução

administrativa, de um lado; e a de veto político, de outro.[18]

  Não é difícil de se ver a íntima conexão dessaconcepção de Estado com a valorização dos órgãos reguladores de hoje, quando, em virtude da amplitude,dimensão e importância do poder regulamentar das agências reguladoras, estas são percebidas como um quarto

 poder, que sintetiza o governo moderno como um governo administrativo.[19]

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2.4 LEGITIMIDADE NO ESTADO REGULADOR 

 O Estado burocrático, planejador, eminentemente administrativo, enquanto subversão da clássica

separação dos poderes, embora sofra com a indignação política produto do aparente menosprezo da funçãolegislativa, detém muito maior aderência à realidade de produção do poder regulatório do que o ideal de separaçãotripartite de poderes, que é útil enquanto permite a preservação de uma estrutura representativa de índole formal.

Teóricos do direito constitucional e administrativo têm se debatido com o tema e com a diferenciação entre política pública e regulação.

Dito Estado Administrativo – mais precisamente, sua teoria – não se restringe, todavia, aoquestionamento das bases filosóficas da estrutura do poder instituído, ou seja, à reestruturação dos poderes emduas funções, em que a função administrativa resta agigantada; ele também questiona as bases filosóficas dalegitimidade do poder, ou seja, como ocorre a interação entre a estrutura burocrática estatal e sua justificaçãodemocrática perante o titular do poder político. Nesse aspecto, já não opera efeitos ter-se em conta a aderênciaentre a prática do poder político e sua teoria embasadora, pois a questão do fundamento de legitimidade precede àinstitucionalização do poder político no Estado. Pode-se sustentar, portanto, o Estado Administrativo como umEstado estruturado em duas funções primordiais de planejamento/execução administrativa e delimitação política,

e, ao mesmo tempo, questioná-lo quanto ao seu pressuposto de exaltação da figura do administrador como seucerne de legitimidade política.

Assim, outro pressuposto do Estado Regulador está na questão do modus operandi de manifestação dalegitimidade política. É certo que o Estado Regulador, ao beber da estruturação administrativa do EstadoAdministrativo, do engrandecimento da figura burocrática, da expertise técnica e da concentração da funçõesestatais na etapa de planejamento e execução das leis, amesquinha a antes dominante função legislativa decanalização da legitimidade política e, com isso, lança a questão fundamental sobre como a agora predominantefunção administrativa do Estado, indiferenciada da função política – ou, sob outro enfoque, tendo avançado sobreela –, angaria legitimidade política.

A resposta a essa questão foi alvo de preocupação dos clássicos e se alastra por toda a história das

ideias políticas inscrita na questão de quem deve governar. Se para Bakunin[20]

 e Kropotkin[21]

, a resposta aessa pergunta é a de que ninguém  deve governar, para uma tradição muito mais abrangente e recorrente nafilosofia política, os governantes legítimos são os mais variados: para Platão, são os  guardiães  dotados de

inteligência, capacidade e prestatividade[22]

; para Francis Bacon, são os filósofos[23]

; para Augusto Comte, são

os homens de ciência[24]

; para Bossuet, são os monarcas dotados de autoridade hereditária, sagrada e

absoluta[25]

; para Filmer, são os monarcas, cujo poder é justificado por seus direitos patriarcais[26]

; para Locke,são aqueles responsáveis pela proteção dos direitos naturais à vida – inclusive à saúde –, liberdade e propriedade,mediante o alcance da paz e prosperidade via supremacia de um poder legislativo limitado pelo bem comum da

sociedade

[27]

; para Burke, são aqueles cujo juízo e indústria estão dedicados à discussão política

[28]

; paraMaquiavel, são aqueles que conseguem ascender ao poder e reformar as instituições para engrandecimento do

 poder estatal[29]

; para Marx, o proletariado[30]

; para Schmitt, a figura institucional da unidade simbólica do

 povo[31]

; para Kelsen, a Corte de Constitucionalidade é a responsável pela parcela de decisão política sobre o

significado das decisões fundamentais inscritas na constituição de um país[32]

; para os teóricos da democracia

representativa liberal, é o parlamento[33]

; para Hannah Arendt, é o homem criativo livre das necessidades da vida,

mas preso à necessidade de ação política[34]

.

Os teóricos do Estado Administrativo também têm sua fórmula: a legitimidade de governar recai

sobre o administrador.[35]  Nesse aspecto, os caminhos do Estado Administrativo e do Estado Regulador se bifurcam, à medida que se pode cogitar do Estado Regulador com base nas mais diversas explicações delegitimidade, muito embora o reforço da relação entre legitimidade e expertise técnica seja bem-vinda a pensadores daquela tradição do Estado Administrativo. Não é incomum, entretanto, relacionar-se o Estado

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Regulador às tradições de participação política da virtude política[36]

 e do republicanismo[37]

 em um movimentode despersonalização da legitimidade, que deixa de ser referida ao guardião, ao filósofoso, ao estrategista, aocientista, ao monarca, ao proletariado, ao  Führer , para ser referida à institucionalização da dimensão política doser.

Assim, os pressupostos do Estado Regulador gravitam entre as percepções da regulação como o reinoda expertise, passando pela concepção do administrador como síntese de legitimidade de uma distribuição de poderes estatais dividida entre a administração das leis e o poder de veto político e, finalmente, a compreensão da

regulação como espaço público ou como institucionalização de virtude política e republicanismo. 

2.5 PODER REGULAMENTAR NA TRADIÇÃO FRANCESA

 O agigantamento da função administrativa não foi, todavia, um acontecimento isolado da tradição

anglo-americana; ele granjeou espaço significativo na doutrina administrativista francesa, que tanto influenciouo direito administrativo brasileiro. Foram dois os momentos de afirmação do direito administrativo francês comoum direito especial da administração pública: a afirmação da justiça administrativa como uma jurisdição com peculiaridades tais de celeridade e amplitude que exigiam dela não só um método próprio, como também que se

situasse no ceio da própria administração como algo distinto da justiça comum; e a ampliação do poder regulamentar.

O primeiro momento de afirmação do direito administrativo clássico na França concentrou-se naidentidade institucional da justiça administrativa, que dominou a Restauração francesa, em especial após a Carta

Constitucional de 1814 e que se apoiava nos fundadores do direito administrativo clássico francês – Gérando[38]

,

Macarel[39]

  e Cormenin[40]

. A diferença entre o sistema então inaugurado do contencioso administrativo  naFrança em oposição à opção brasileira pelo sistema de  jurisdição una   impede, em grande medida, que asdistinções doutrinárias e jurisprudenciais de então operem efeitos na prática jurídica brasileira. Influentes foram,nesse período, as considerações doutrinárias que não dissessem respeito à divisão de poderes.

O segundo momento pode ser didaticamente situado, embora não restrito à instauração do 2º Império,com Napoleão III, no bojo da Constituição francesa de 1852, que implicou o declínio do primado da teoria daseparação dos poderes, questionando-se a onipotência do Legislativo, mediante exaltação da autoridade do

Executivo.[41]

  Ambientada na Constituição de 1852 e na criação do Tribunal de Conflitos, em 1849, paraulgamento de conflitos de competência entre a justiça administrativa e a comum, a doutrina administrativista

 passou a evidenciar a expansão de fato do poder regulamentar tanto devido a mandatos constitucionais, quantoem virtude de delegação legislativa, impondo o reconhecimento de que as disposições regulamentares decorreriamda mesma fonte das disposições legislativas, ambas apoiadas no poder regulador da sociedade , fazendo-se dos

“regulamentos administrativos (...) em essência assemelhados às obras legislativas”[42]

.

 No final do século XIX e início do XX, parcela da doutrina administrativista francesa reconhecia ainafastável constatação de que, mesmo com a crescente disciplina constitucional limitadora do poder regulamentar, este, na prática, bebia do mesmo material   das leis formais. Confrontado-se com essa constatação,

Laferrière[43]

 dividiu o poder regulamentar entre regulamentos destinados à execução das leis – executórios –, deum lado, e regulamentos de administração pública, de outro, estes últimos voltados ao exercício de mandatoentregue expressamente pelo Legislativo ao Executivo para, mediante o uso do poder regulamentar, complementar e desenvolver disposições pertinentes a determinadas matérias.

Os regulamentos em número crescente na prática institucional francesa e independentemente da formade governo, fosse ela o império, a monarquia ou a república, seriam manifestações cada vez menos enquadráveis

na definição de meras execuções de leis. Divergindo de Hauriou[44]

, que diferenciava materialmente leis e

regulamentos, Duguit entendia que tais regulamentos com força de lei obrigam, com a mesma força das leis

formais, “os particulares, os administradores e os juízes”[45]

, concluindo que os fatos são mais fortes que asconstituições. Contra a concepção de que as leis formais trariam princípios gerais a serem detalhados pelosregulamentos, Moreau define os regulamentos como regras, só que “impostas por uma autoridade distinta do

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Legislativo”[46]

.

Tais concepções ampliativas do poder regulamentar sofreram críticas de autores que aderiam a uma

separação rígida entre leis e regulamentos, como Jèze[47]

, Barthélemy e o já citado Hauriou, mas o corpo dedoutrina favorável ao reconhecimento do poder regulamentar como algo mais do que a simples execução edetalhamento de leis tinha a seu favor a prática institucional francesa: o argumento de que a prática institucionaldo poder regulamentar nunca teria, de fato, respeitado uma pretensa separação entre a lei e o regulamento.

É nessa linha de avaliação das condições concretas de normatização que parcela da doutrinaadministrativista brasileira questiona a viabilidade do Legislativo exercer o gerenciamento normativo darealidade apoiada na insuficiência de um modelo tradicional de separação de poderes. A partir dessa nova visãomuito influenciada por demandas políticas concretas de reestruturação do Estado brasileiro, nutrindo-se e nutrindoconsultorias internacionais de privatizações setoriais da segunda metade da década de 1990, um novo direitoadministrativo passou a encarar de frente a realidade de maior intervencionismo estatal sob a forma de

planejamento e gerenciamento, mediante “contínua edição e substituição de normas”[48]

  decorrente não só dodireito, quanto das condições concretas do setor regulado: foi-se o tempo das sínteses de direito administrativodescoladas da realidade setorial.

 

2.6 SITUANDO O CONCEITO DE ESTADO SUBSIDIÁRIO

 Até o momento, foram identificados os principais pressupostos do Estado Regulador inscritos, agora

de trás para frente, na afirmação de um Estado eminentemente interventor sobre realidades setoriais complexas, deum Estado em que a administração das leis, como planejamento e gerenciamento contínuo, engrandece a funçãoadministrativa, de um Estado cuja expressão de legitimidade se desloca para a figura do administrador ou,alternativamente, para o processo ou para o espaço público regulador, de um Estado cujo conteúdo normativo dosdireitos depende de sua conformação objetiva em ambientes regulados, de um Estado que internaliza o mercadoem sua apresentação como produto do direito fundamental à igualdade de condições competitivas.

Dado esse cenário teórico, onde se situa a noção de Estado Subsidiário?Entendido o Estado Subsidiário como uma opção societária sobre o nível de interferência estatal na

esfera privada, ele se apresenta resumido na máxima: o governo deve fazer pelos cidadãos somente aquilo queeles não puderem fazer por si próprios, e nada mais. Trata-se, portanto, de noção que engloba ditames deorientação política de predomínio da iniciativa privada sobre a pública, de consequente limitação da atuaçãoestatal, mas, ao mesmo tempo, de atribuição ao Estado da função de fomento, coordenação e fiscalização dainiciativa privada para potencialização dos negócios dos particulares, ou mesmo o incremento de parcerias

 público-privadas para o fim de subsídio à iniciativa privada[49]

.

Enquanto mera orientação política de dosagem cuidadosa do nível de interferência estatal naeconomia, o princípio da subsidiariedade não afirma, nem infirma o Estado Regulador. Dito princípio pode reger odiscurso de um chefe de governo com pretensões de expansão da regulação estatal, sem que isso afete o nível deinterferência na economia, desde que dita interferência se justifique para o fim de preservação das regrasequânimes de interação negocial privada em determinado setor regulado, ou seja, desde que se justifique para ofim de preservação do ambiente mercadológico pertinente.

A desconexão entre o princípio da subsidiariedade e o Estado Regulador exsurge, contudo, quando aoconceito de Estado Subsidiário agrega-se a ideia de que os direitos fundamentais individuais são melhor garantidos pela ausência do Estado, o que contraria o pressuposto regulador de que a atuação estatal reguladora éessencial à conexão entre os riscos da atividade econômica e a sociedade política, que pretende ter sua voz presente na constante reorientação política para preservação dos direitos fundamentais de todos os envolvidosameaçados por distorções produzidas por um mercado livre. Assim, quando o Estado Subsidiário deixa de servir 

como guia político de dosagem da interferência estatal, mediante o princípio da subsidiariedade, para se apresentar com formatos totalizantes de ideal de eliminação da atuação estatal, somente aí dito Estado Subsidiário deixa decontribuir para a noção de Estado Regulador e passa a miná-la.

Assim entendido o princípio da subsidiariedade, pode-se acrescentá-lo à listagem de pressupostos doEstado Regulador, que sinteticamente são: a) o Estado garante da igualdade de condições competitivas; b) o

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Estado interventor; c) o Estado Administrativo, por sua apresentação de agigantamento da função de planejamentoe gerenciamento das leis; d) o Estado legitimado na figura do administrador, do processo de gerenciamentonormativo da realidade ou do espaço público regulador; e) o Estado de direitos dependentes de sua conformaçãoobjetiva em ambientes regulados; f) o Estado Subsidiário, em sua apresentação de potencialização da iniciativa privada via funções de fomento, coordenação e fiscalização de setores relevantes.

 

2.7 O FENÔMENO DA REGULAÇÃO E SEU SIGNIFICADO

 A maior dificuldade na definição de pressupostos ao Estado Regulador encontra-se na definição do

seu qualificativo central: a regulação. Afinal, se a regulação, em sua acepção mais fundamental[50]

, significa um processo de realimentação contínua da decisão pelos efeitos dessa decisão, reconformando a atitude do regulador em uma cadeia infinita caracterizada pelo planejamento e gerenciamento conjuntural da realidade, há diversoselementos conceituais da regulação que especificam essa noção fundamental. São eles: a) a manifestação daatuação reguladora como uma atuação de poder político, caracterizando-a como um projeto de direito público; b)a consciência de que se regula algo que tem suas próprias leis, e que, portanto, a regulação potencializa as forçasda iniciativa privada em um ambiente parcialmente preexistente e parcialmente criado pela própria atividadereguladora; c) a finalidade da regulação como o alcance de um equilíbrio dinâmico das interações dos atores

setoriais em conformidade com um objetivo de interesse geral e não o de mera potencialização de um mercadoregulado pretensamente indiferente ao contexto dos direitos políticos e sociais circundantes.

A regulação, portanto, é uma força de coerência sistêmica – de resgate da ordem – quando ascontradições internas em determinado sistema social revelam uma disfuncionalidade. Em ciências sociais, todavia,a referência ao resgate de um estado de coisas do passado é frágil à medida que a história da vida social apresenta-se como um fenômeno sempre inédito, mas o aspecto da regulação enquanto força de coerência sistêmica frente amovimentos de estruturação social considerados disfuncionais em determinado momento histórico não deixa deser um conceito tentador.

A definição da regulação como um resultado da disfuncionalidade de um sistema explica o fenômeno

d e auto-proclamação

 [51] 

  do caráter regulador de órgãos e entes estatais e paraestatais. Ela também explica oalastramento do uso do termo regulação sobre diversas realidades que, há pouco tempo atrás, sequer se cogitariaqualificá-las como regulatórias. Hoje, fala-se em regulação para cada vez mais temas antes alheios à terminologia

regulatória[52]

, tais como pesticidas agrícolas, pesquisas com embriões, mercado financeiro, ordenamentoterritorial, uso do espectro, posições orbitais, profissões, comercialização de hemoderivados, exploração petrolífera, infraestrutura aeroportuária, comércio eletrônico, enfim, de uma miríade de tópicos que se apropriamda linguagem regulatória para o exercício de uma função que se justifica no paradigma do Estado Regulador.

A regulação de mercados como uma “forma jurídica de engenharia social”[53]

 não é novidade comolembra Ogus ao analisar o período Tudor e Stuart na Inglaterra, bem como na alegação de Geoffrey Elton, em seu

clássico livro de 1953[54]

, de que Thomas Cromwell (séc. XVI) teria sido o inaugurador do governo burocráticomoderno. Na mesma linha de pensamento, o uso de contratos, termos, planejamento e acompanhamentoadministrativo remonta, na tradição brasileira, à valorização do serviço público dos clássicos do serviço públicofrancês. O norte de planejamento e gerenciamento, contudo, assim encarado como característica central daatuação de poder, é o que faz da regulação, hoje, um termo onipresente. A regulação não se contenta com o governo pelas leis; ela exige o compromisso público pela administração das leis pari passu. O diferencial daregulação de hoje está nos seus pressupostos, que ampliaram sua amplitude, alcançando mais do que os comandosurídicos destinados a evidenciar quando uma atividade regulada tornou-se disfuncional – a metáfora da regulação

como um sinal vermelho – para encarnar o conjunto interdisciplinar de planejamento e gerenciamento conjunturalde atividades de interesse geral – o poder público como partícipe do setor regulado – ambientadas nos pressupostos do Estado Regulador, ou seja, na era do Estado Regulador .

É bem verdade que os conceitos muitas vezes se misturam, quando, por exemplo, a crítica ao EstadoDirigista, Socialista ou proprietário dos meios de produção toma o termo ‘planejamento’ como próprio desseformato estatal em que a resposta às demandas sociais adquire o formato da estatização. Essa identificação entre planejamento econômico e estatização dos meios de produção foi ambientada na memória ainda recente dos anos1990, que identificava a planificação econômica com o regime comunista do bloco soviético e resultou na

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 percepção maniqueista entre Estado e mercado, em que o mercado passava a ser visto como uma entidade

desligada do Estado, ao invés de um seu produto.[55]

 Estudos inaugurais do Estado Regulador com esse viés deidentificação do qualificativo do ‘planejamento’ com aquele Estado apoiado na estatização dos setores produtivos

não são incomuns.[56]

 Afora a apropriação indevida do conceito de planejamento ao de Estado Socialista, algonegado pela extensa literatura do Estado Social e Democrático de Direito, o qualificativo ‘planejador’ é hojeinafastável do Estado Regulador.

A regulação assimila a qualidade do ‘planejamento’ estatal não como ideologia, mas como método, ou

melhor ainda, como tecnologia; como forma de expressão humana criativa oriunda da relação do ser humano com

a natureza.[57]

 Enquanto tecnologia, a regulação é uma forma de produção da existência social dependente de um projeto humano de acompanhamento conjuntural dos sistemas sociais. Assim entendida, a regulação seria melhor definida como uma tecnologia social de sanção aflitiva ou premial orientadora de setores relevantes viaatividade contratual, ordenadora, gerencial ou fomentadora.

A literatura apontada como inauguradora do olhar estatal regulador é vasta e multifacetada.[58]

  Emseu núcleo de significado, a regulação não exige, nem dispensa a ideia de agências reguladoras e menos ainda ade agências reguladoras independentes. A identidade entre a regulação e tais estruturas estatais das agênciasreguladoras ocorreu mediante a interdependência construída pela literatura do século XX e início do século XXI

entre regulação e Estado Regulador, em que foi acoplado à definição de regulação o meio ou veículo de mediaçãoentre o ser político e o setor regulado

[59]  inaugurado pela prática institucional estadunidense. A íntima relação

entre a construção conceitual da regulação e a história institucional do Estado Regulador dos modelosestadunidense e europeu permite falar-se de momentos regulatórios.

Em síntese, o termo regulação, inaugurado como um processo de administração de sistemas sociaismediante retroalimentação contínua, foi transparecido, incialmente, em comandos estatais de controle sobre aconformação e os resultados da iniciativa privada para, a partir do processo de desregulação das décadas de 1970a 1990, expressar, hoje, modos de regulação mais efetivos, mediante instrumentos de planejamento racional daatividade reguladora por vários canais, tais como a aplicação de métodos de controle menos restritivos e baseadosem incentivos, a aplicação de administração de riscos às questões regulatórias, a aplicação de técnicas de análise

de custo-benefício e de impacto regulatório, ou mesmo a aplicação de uma perspectiva minimalista de auditagemde controles regulatórios internos às empresas, de auto-regulação ou mesmo de exclusiva homenagem aincentivos de mercado.

A regulação, portanto, parte de sua configuração original de ideia programática inscrita em um sistemaautomático de retroalimentação e controle para se apresentar hoje como uma tecnologia de governo de sistemas sociais, que pode estar sediada em órgãos estatais – a regulação por excelência do Estado Regulador –, emmecanismos internos de controle empresarial – a meta-regulação, em que o Estado audita os regimes de controleinterno das empresas –, em mecanismos institucionais privados – auto-regulação –, no vencedor do jogo políticoentre os atores setoriais – o livre mercado – ou, finalmente, em uma composição de tais opções.

 

TEORIA JURÍDICA DA REGULAÇÃO 

3.1 PUBLIC CHOICE THEORY  VERSUS TEORIA PROCESSUAL ADMINISTRATIVA DA REGULAÇÃO

 O fenômeno regulatório detém diversas faces visíveis ou invisíveis segundo a teoria que procure

explicá-lo. A ciência econômica, embora não tenha sido a primeira a se debruçar sobre aspectos da regulação,desenvolveu todo um ramo de estudos dedicados exclusivamente à regulação e à sua precisão conceitual,enquanto a análise jurídica, precedendo em mais de um século as novas análises regulatórias econômicas, tratou

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da regulação como um subproduto de uma disciplina maior da teoria do serviço público. Não se trata aqui de seestabelecer precedência ou grau de importância entre as abordagens econômicas e jurídicas, mas de se identificar a teoria jurídica da regulação para além de olhos leigos como uma teoria muito mais influente e fundamental paraa compreensão do fenômeno regulatório.

Desnecessário frisar que há teorias jurídicas da regulação, à medida que o direito lida diretamente comuma manifestação proeminente da regulação, ou seja, a regulamentação normativa. Sob o enfoque geral de queregular significa, para a ciência jurídica, regulamentar por intermédio de preceitos normativos, todas as teoriasurídicas destinadas à disciplina da técnica legislativa, da técnica regulamentar e da estrutura administrativa e seus

limites constitucionais explicam a regulação, como de fato o fazem para fins de definição do que pode ou não ser disciplinado pelo poder regulamentar, de como os poderes instituídos devem se manifestar sobre determinadamatéria regulada, de quais são os limites desses mesmos poderes frente às garantias constitucionais dos direitosfundamentais, de quais são as áreas e serviços passíveis de regulação, enfim, de uma miríade de temas que sãotratados pela ciência jurídica desde que se cogita do regramento normativo de condutas humanas.

A regulação moderna, ao ser elevada ao patamar de categoria conceitual definidora do ethos  estatal,não se contenta, todavia, com tais abordagens gerais que a encaram apenas como um subproduto jurídico. Imersano meio regulatório, a ciência jurídica reagiu antes de envidar esforços no sentido de destacar a categoriaregulatória de seus estudos tradicionais, mas ao fim e ao cabo, encontrou o caminho de tratamento científico daregulação via direito administrativo especial de cunho setorial: o direito setorial e regulatório.

Ao contrário do preceituado pelos expoentes da teoria econômica da public choice, a teoria jurídico-institucional da regulação vê na estrutura regulatória uma consequência necessária da divisão funcional de poderes e uma garantia institucional da preservação do interesse público em setores regulados: trata-se, portanto,da preeminência dos controles substantivos e procedimentais de legitimidade da instituição reguladora. A teoria

 processual administrativa da regulação[60]

  afasta os pressupostos da teoria da  public choice, de que haveriainafastáveis incentivos à cooptação dos reguladores rumo a uma regulação de grupos de interesse ou  special 

interest regulation.[61]

 Aquela teoria jurídica, pelo contrário, revela a dimensão jurídico-processual da regulaçãocomo uma regulação de interesse público ou  public-interest regulation . Em outras palavras, a teoria jurídica daregulação enfoca um aspecto pouco aprofundado pela teoria econômica: o processo jurídico-institucional de preservação da dicção funcional do direito.

Ao se opor, de um lado, a regulação de grupos de interesse e, de outro, a regulação de interesse público, o que se quer dizer com isso é que, de um lado – do lado da regulação de grupos de interesse –, os benefícios regulatórios são atribuídos a parcelas da sociedade em detrimento desproporcional a toda a sociedade,ou seja, o custo dos benefícios de poucos excedem o retorno eficiente e competitivo usufruído pelos beneficiários.Pelo contrário, a regulação de interesse público é visível quando os benefícios regulatórios à sociedade como umtodo excedem o, ou empatam com os benefícios alcançados por poucos na linha do critério econômico da curvade eficiência de Kaldor-Hicks. A tradução jurídica desse critério econômico apoiado na eficiência de Paretoencontra-se inscrita em princípios constitucionais da eficiência administrativa, da preeminência do interesse público e da proporcionalidade de medidas restritivas de direitos. Ambos os enfoques – econômico e jurídico –  portanto detêm categorias conceituais para aquilatarem a regulação como prejudicial à sociedade em benefício de

grupos de interesse, ou como virtuosa ao interesse público. A seguir, são identificadas as principais característicasdessas duas teorias representativas das análises econômicas e jurídicas.

A teoria econômica da  public choice  afirma, em síntese apertada, que o processo decisório daregulação é um produto necessário da troca de vantagens políticas entre representantes eleitos, grupos de interessee agências reguladoras. Para tanto, ela parte de estudos econômicos sobre a democracia e decisão política,concluindo pela ínsita inadequação da regulação ou intervenção estatal sobre a economia como meio de alcance

do interesse público.[62]

Por outro lado, a teoria jurídico-institucional da regulação parte da própria natureza e razão de ser do processo decisório das agências reguladoras ou órgãos reguladores: trata-se, portanto, do estudo processual damanifestação do poder administrativo, algo, aliás central para a análise do fenômeno regulatório. Daí poder-se

dizer que se trata de uma teoria processual administrativa da regulação   ou teoria do processo administrativoregulatório. Ela se preocupa com a dimensão processual do fenômeno regulatório em sua justificativa funcionalde autonomia do processo de tomada de decisões regulatórias. Exatamente ao defender a consequência jurídica deautonomia decisória das estruturas regulatórias via disciplina jurídica do processo administrativo pertinente, ateoria processual administrativa da regulação nega o fundamento básico da teoria da  public choice, qual seja, a

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dependência da tríade congressistas - grupos de interesse - regulador .

As categorias conceituais que compõem a base da teoria processual administrativa da regulação são,sinteticamente, as seguintes: a) procedimento administrativo; b) neutralidade do processo administrativo; c)ambiente jurídico-institucional administrativo. Cada um desses elementos fornece um conjunto de pressupostostradicionais à teoria geral do direito público, que dirigem, constrangem ou afastam os incentivos que fariam doregulador uma peça inerte no jogo de trocas políticas.

Exemplificativamente, a neutralidade do processo administrativo apoia-se na natureza jurídico-funcional da decisão administrativa, enquanto a exteriorização do processo via procedimento administrativoapoia-se na transparência, visibilidade, obtenção de apoio social, melhoria do conteúdo de regulamentações propostas, antecipação de críticas dos atores setoriais e oportunidades de ajuste da proposta. Finalmente, no quediz respeito ao ambiente institucional regulatório, este abre espaço à construção de propostas regulatórios viaestabilidade profissional do regulador, via contatos perenes com comitês acadêmico-científicos, via incentivos àdefesa do interesse público por parte do servidor-regulador, via apoio de outras estruturas de poder à preservaçãoda competência das agências reguladoras, ou mesmo via controle externo e interno da atividade reguladora.

 Não é por acaso que a literatura do novo direito administrativo dedique tanto tempo e esforço aodesenvolvimento de conceitos de autonomia dos órgãos reguladores, independência administrativa, transparência

 processual, e processo decisório administrativo.[63]

  Esses temas se apresentam invariavelmente como os temas

inaugurais da teoria jurídica da regulação via especialização do direito administrativo e são indispensáveis àcompreensão da autonomia do fenômeno regulatório.

Da mesma forma que a teoria processual da regulação reage à concepção da regulação como um produto da composição de interesses dos atores regulados, enfatizando o aspecto processual da formação dedecisão regulatória, outra vertente de análise jurídica da regulação reage àquela concepção ao considerar aregulação como um fenômeno jurídico-institucional de proteção de bens jurídicos maiores externos à estritarelação entre os atores regulados e seus interesses. Fala-se aqui da corrente representada por dois expoentes daanálise jurídica da regulação, nomeadamente dois publicistas: Stewart e Sunstein. Ela é conhecida como a teoriasocial da regulação, em oposição à teoria econômica da regulação.

A teoria social da regulação foi ambientada na crise do Estado Regulador estadunidense da década de1960, em que as pretensões regulatórias deixaram de se circunscrever ao bom funcionamento de um setor específico da economia para atingir atividades que se alastram por diversos setores, tais como defesa doconsumidor, meio ambiente e saúde do trabalhador. A regulação social acrescentou preocupações de direitossociais às decisões regulatórias, qualificando, na literatura estadunidense, o chamado Estado Social Regulador.

Segundo Stewart[64]

, esse tipo estatal se caracteriza pela apresentação da regulação não mais como uma solução pontual de conflitos entre os atores econômicos, mas como produção de estratégias jurídicas de comando desetores regulados. Em outras palavras, Stewart defende a compreensão da regulação como a juridicização dosconflitos setoriais econômicos. Sunstein parte do mesmo princípio de que a regulação dos anos 1960 e 1970 nosEstados Unidos sofreu mudanças profundas ao deixar de se preocupar exclusivamente com a estabilização daeconomia ou com controle de preços e de entrada no mercado regulado para passar a representar a defesa dasaúde e segurança pública contra riscos, bem como para compensar , apoiada em enunciados de direitos

fundamentais, a “subordinação social de grupos em posição de desvantagem”[65]. A diferença de fundo entre ateoria processual administrativa da regulação e a teoria social da regulação está em que, embora ambas advoguema insuficiência da análise econômica centrada na potencialização dos interesses dos atores privados envolvidos emum mercado regulado, a primeira delas preocupa-se com a dimensão processual de tomada de decisão regulatória,afirmando a possibilidade de decisões regulatórias em prol do interesse público via constrições procedimentais,enquanto a segunda delas concentra-se na dimensão substantiva da regulação, ou seja, no conteúdo da disciplinaregulatória voltada à concretização de direitos.

Tais correntes de pensamento são representativas das dimensões jurídicas processual e substantiva daregulação, mas não esgotam as descrições e explicações jurídicas da regulação. Nem todas as teorias jurídicas deregulação são facilmente enquadráveis como exclusivamente substantivas ou processuais, mas elas são

identificáveis por suas características prevalecentes.Um expoente da criminologia, John Braithwaite, ao analisar crimes de colarinho branco, crimes

corporativos e justiça restaurativa, por exemplo, propõe que a regulação seja compreendida como um esforço de

criação de incentivos morais para o cumprimento da lei.[66]

 Na tentativa de ultrapassar o debate entre regular e

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desregular, Braithwaite propõe a chamada regulação responsiva ( responsive regulation )[67]

, segundo a qual aefetividade da regulação depende da criação de regras que incentivem o regulado a voluntariamente cumpri-las,mediante um ambiente regulatório de constante diálogo entre regulador e regulado. A regulação, para Braithwaite,consiste em um conjunto de atividades distribuídas em uma pirâmide em que, na base, encontram-se atividades persuasivas da conduta do regulado, enquanto, no topo, um conjunto de penas draconianas de condutasindesejadas. Portanto, à primeira vista, trata-se de uma análise processual da regulação em que o autor propõe aconstante interação entre regulador e regulado na construção do ótimo regulatório de incentivos os mais efetivos para persuasão dos regulados via reavaliação de sucessos e fracassos da políticas regulatórias implementadas sem

definir, a priori, quais seriam os elementos substantivos que guiariam a atuação regulatória. Ocorre, todavia, que aanálise mais detida da proposta de Braithwaite pode divisar uma dimensão substantiva da regulação quando seidentifica como objetivo da regulação o alcance da persuasão do regulado, apelando para o valor daresponsividade como norte e razão da regulação.

 Outro exemplo de estratégia regulatória processual que tenta se afastar de abordagens ordenadoras decomando e controle (command and control ) encontra-se na proposta de uma regulação inteligente ( smart 

regulation) de Gunningham[68]

, segundo o qual o momento de se abandonar a regulação ordenadora em prol demétodos regulatórios mais sutis estaria na detecção de uma ‘comunidade de destino partilhado’ (community o shared fate), quando a performance negativa de um de seus membros prejudica a todos, o que promoveria umincentivo processual a que todos os atores setoriais, inclusive competidores, se apoiassem para evitarem efeitos

 perniciosos do mau desempenho de um sobre todos

  Os exemplos de propostas de abordagem regulatória apoiadas em concepções jurídicas processuaisou substantivas são inúmeros, restringindo-se aqui a enumerar os mais significativos. Cumpre finalmente ressaltar que os dois exemplos enumerados se enquadram em uma tradição jurídico-filosófica que caminha nos passosdados por Habermas e Luhmann e sintetizados em Gunther Teubner de tentativa de solução da compreensão do

direito como sistema autopoiético[69]

, fechado em si mesmo, ampliando seus horizontes via processo

reflexivo[70]

 com o meio regulado.

Em síntese, a análise jurídica da regulação contempla duas vertentes. Enquanto a regulação socialafirma o conteúdo substantivo da regulação em direitos sociais, as teorias processuais de regulação, em suavariedade de abordagens, apresenta técnicas de regulação voltadas ao alcance do interesse público via regulaçãoreflexiva, responsiva, ou simplesmente de direito público administrativo.

 

3.2 SITUAÇÃO JURÍDICA DO CIDADÃO CO-PARTÍCIPE NO ESTADO REGULADOR 

 Um dos efeitos da análise jurídica da regulação está na compreensão do Estado Regulador a partir da

situação jurídica do particular frente à produção de poder estatal. Enquanto no Estado-Polícia, ao particular éreservada a função jurídica de súdito; no Estado Liberal, a de bourgeois dotado de atributos oponíveis ao Estado;no Estado Social, a função de beneficiário utente de serviços públicos estatais definidores da esfera concreta dosdireitos fundamentais; no Estado Regulador, o particular é um ator do ambiente regulador, partilhando com oEstado a responsabilidade pelo alcance do interesse público.

O cidadão do Estado Regulador é uma engrenagem essencial e uma força motriz necessária àimplementação do interesse público, mediante co-participação na prestação de atividades socialmente relevantes.

 3.2.1 ARBITRAMENTO E ARBITRAGEM NA REGULAÇÃO

 No paradigma do Estado Regulador, as fronteiras de atributos de direito público e privado continuam bem definidas, mas sua atribuição não se encontra reservada ao poder público. Pelo contrário, é na figura do

Estado Regulador que se avolumam as manifestações jurídicas de entidades privadas com poderes públicos.[71]

Também encontra-se inserido na principiologia jurídica do Estado Regulador o ambiente propício àexpansão de mecanismos autocompositivos e heterecompositivos de conflitos por meio de compromissosvinculantes privados, que têm sido absorvidos à prática regulatória setorial como instrumentos de partilhamento deresponsabilidades na condução do interesse público. Trata-se aqui, em especial, da arbitragem e de sua distinçãoconceitual do arbitramento administrativo.

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A arbitragem se configura em um método alternativo de resolução de disputas de caráter heterocompositivo voltado à abertura de alternativas de decisão para além dos jogos de soma zero da teoria dosogos, em que o sucesso de uma parte implica, necessariamente, a derrota da outra parte. O âmbito de aplicação da

arbitragem resume-se a litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1º, da Lei 9.307/96), podendo,

segundo entendimento doutrinário, decorrer de acordo entre partes ou de imposição regulatória ou legal.[72]

De outra parte, o arbitramento comum na prática regulatória é um processo administrativo deresolução de disputas, que, enquanto tal, caracteriza-se como o modo normal de atuação estatal via manifestação

 processual administrativa no uso de competência administrativa expressa em lei, constituindo-se em requisito à produção de atos administrativos pertinentes à solução de litígios perante a Administração Pública.

Enquanto o arbitramento administrativo admite, como regra, pedido de reconsideração administrativae, em qualquer caso, recurso amplo ao Judiciário sobre forma e mérito do ato administrativo, que deve respeitar ocontraditório e a ampla defesa devido a seu enquadramento na hipótese de situações de litígio do art. 5º, LV daConstituição Federal de 1988, a arbitragem está apoiada em características próprias, umas mais ou menos distantesdos requisitos funcionais de um processo administrativo de resolução de disputas, quais sejam: a) ampla participação das partes no procedimento arbitral; b) maior autonomia na definição do procedimento do juízoarbitral; c) exigência de prévia aquiescência das partes para constituição de cláusula compromissória; d) definiçãodos árbitros por indicação das partes, exceto no caso de compromisso arbitral fixado por sentença judicial; e)

sigilo das informações trazidas ao juízo arbitral; f) limitação da matéria passível de arbitragem a direitos patrimoniais disponíveis; g) imposição de tentativa de conciliação prévia; e finalmente h) o caráter mais distintivode todos, a inadmissibilidade de recurso revisional de mérito à esfera administrativa ou judicial.

Fartas são as hipóteses de arbitramento administrativo na prática regulatória. Basta citar, por exemplo,o caso de arbitramento inter-setorial decorrente de normatização conjunta da ANATEL, ANEEL e ANP. ORegulamento Conjunto de Resolução de Conflitos das Agências Reguladoras dos Setores de Energia Elétrica,Telecomunicações e Petróleo, aprovado pela Resolução Conjunta nº 2, de 27 de março de 2001, prevê a criaçãode Comissão Permanente de Resolução de Conflitos das Agências Reguladoras, disciplinando o  processo deresolução administrativa de conflitos   sobre compartilhamento de infraestrutura dos setores envolvidos. Adistinção entre o processo administrativo de resolução de disputas e a arbitragem foi expressamente fixada naterminologia utilizada quando da consulta pública referente ao Regulamento em questão, que se utilizou da

distinção entre arbitragem civil   e processo administrativo de resolução de disputas  para especificar o escopo daregulamentação submetida à consulta pública, qual seja, exclusivamente o processo administrativo, excluída aarbitragem civil. Um exemplo internacional serve para esclarecer que a distinção não se restrinje ao direito brasileiro. A diretiva europeia 2002/21/EC, no seu art. 20, parágrafo 2º, define que o dever das autoridadesreguladoras de redes e serviços de comunicação eletrônica de decidirem sobre disputas do setor  via arbitramentoadministrativo pode ser afastado pela normatização dos Estados-partes se for detectada a possibilidade dearbitragem ou mediação da questão ao alcance das partes. Se, todavia, a mediação ou arbitragem nãosolucionarem a disputa em até quatro meses , a autoridade reguladora local deve se comprometer a decidir aquestão, fazendo uso de seu poder de arbitramento administrativo.

 Não tão fartas na regulamentação, embora presentes em nível de cláusulas de contratos de concessõesde diversos setores, estão as previsões de instalação de juízos arbitrais em dois formatos bem distintos: a) o juízoarbitral em que o poder público figura como árbitro, por meio do órgão regulador correspondente; b) o juízoarbitral em que o poder público figura como parte, por meio do compromisso arbitral firmado entre órgãoregulador e entidade regulada.

A previsão normativa de incorporação de agência reguladora na função de árbitra não é incomum evisa, basicamente, introduzir um método de resolução de disputas mais aberto e participativo para questões atéentão exclusivamente definidas pelo método tradicional de processo administrativo de solução de disputas entre prestadores de serviços regulados ou entre eles e os usuários dos serviços.

Muito mais delicada é, entretanto, a inserção de um órgão regulador como parte em juízo arbitralenvolvendo disputas entre o próprio órgão regulador e prestadores de serviços por ele regulados. De imediato, os princípios de direito público de indisponibilidade do interesse público, irrenunciabilidade de competênciaadministrativa (art. 11, da Lei 9.784/99) e indelegabilidade de edição de atos de caráter normativo, de decisão derecursos administrativos   e de matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade   (art. 13, da Lei9.784/99), surgem como obstáculos à definição da matéria que pode ser atingida por cláusula compromissóriaarbitral.

 Não obstante tais limitações de ponto de partida, tanto a prática de cláusulas compromissórias em

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contratos de concessão, quanto a avialiação doutrinária e jurisprudencial favorável à arbitragem dentro de certoslimites é inquestionável na experiência jurídica brasileira. Para justificar a presença de cláusulas compromissóriasarbitrais em contratos de concessão para prestação de serviços públicos, parte-se da distinção do direitoadministrativo clássico entre atividades administrativas de autoridade versus atividades administrativas de gestão patrimonial. Enquanto para as atividades de autoridade na prestação de serviços públicos não cabe qualquer tipode negociação para composição de conflitos via juízo arbitral, para as consequências ou repercussões patrimoniaisdos atos administrativos manifestantes do poder de autoridade estatal, o juízo arbitral tem sido aceito. Assim, o primeiro requisito para a introdução de cláusula compromissória arbitral em contratos de concessão está na

delimitação de seu escopo para repercussões patrimoniais abarcadas pelas cláusulas econômico-financeiras docontrato. Há quem, inclusive, argumente pela exigência de cláusula compromissória arbitral em contratos de

concessão[73]

, mediante aplicação do art. 25, XV, da Lei 8.987/95, que prevê, dentre as cláusulas essenciais docontrato de concessão, o foro e modo amigável de solução das divergências contratuais.

O entendimento jurisprudencial em tribunais recursais estaduais de validade das cláusulascompromissórias e compromissos arbitrais em contratos de concessão, tendo como parte, o órgão regulador titular do poder concedente, não é recente, mas somente em 2011, o STJ, por sua 3ª Turma, decidiu, para além dereconhecer a legalidade de cláusula compromissória arbitral em contratos de concessão para disputas entre oconcessionário e o próprio poder concedente, também firmar o entendimento de que a ausência de previsão dearbitragem no edital de licitação ou no contrato de concessão consequente não invalida compromisso arbitral

 posteriormente firmado entre a concessionária e o poder concedente.[74]

Pinçando-se um exemplo do setor de telecomunicações que evidencia a aderência entre anormatização setorial e a possibilidade jurídica de arbitragem entre concessionária e órgão regulador, a ResoluçãoANATEL nº 341/2003, que aprova modelos de contrato de concessão do Serviço Telefônico Fixo Comutado,criou capítulos próprios à arbitragem, detalhando os limites materiais e formais de sua aplicação. No modelo decontrato de concessão do STFC na modalidade local, a Cláusula 16.2, IV, dispõe sobre o direito da concessionáriade solicitar a instauração de procedimento de arbitragem em hipóteses do Capítulo XXXIII do contrato. ACláusula 16.12, parágrafo único, por sua vez, possibilita lançar-se mão de pedido de arbitragem para cumprimentode dever de interconexão da rede da concessionária por parte de serviço de interesse coletivo. Finalmente, oCapítulo XXXIII do contrato detalha o requisito de que tenha havido prévia decisão em processo administrativo

 próprio com a qual a concessionária quedou inconformada. O mesmo capítulo impõe a instalação de TribunalArbitral, exceto se comprovado não se tratar de matéria autorizada para esse fim, ou seja (Cláusula 33.1): violaçãodo direito da concessionária à proteção de sua situação econômica; revisão das tarifas; ou indenizações devidasquando da extinção do contrato de concessão, inclusive quanto aos bens revertidos . Ainda, o Capítulo XXXIII,em sua Cláusula 33.3, define a composição do Tribunal Arbitral com dois membros efetivos e suplentes indicados pelo Conselho Diretor da ANATEL, desde que não pertencentes aos quadros da Agência, dois membros efetivos esuplentes indicados pela concessionária dentre pessoas não empregadas por ela e um membro efetivo e suplenteindicado pelos próprios membros acima. Finalmente, a Cláusula XXXIII, em diversos momentos, refere-se,expressamente, à aplicação da Lei 9.307/96, a Lei da Arbitragem.

Com isso, mesmo no campo tradicional da decisão administrativa, parcela das questões antesexclusivamente tratadas em processo administrativo de resolução de disputas, têm colhido a contribuição dos

 próprios interessados na composição do litígio ou concordância na sua heterocomposição via arbitragem.

 

ORDENAMENTO JURÍDICO DINÂMICO 

4.1 VELOCIDADE DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA, LINGUAGEM SETORIAL E ESPECIALIZAÇÃOREGULATÓRIA

 O componente inovador de transformação constante  do sentido das disposições normativas para

atualização do sistema jurídico à realidade existencial   foi sobremaneira incrementado nas últimas décadas em

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razão do fator velocidade. A transformação, antes tida como antípoda do regramento, passou a compor suaessência. Há cada vez menos espaço para a cogitação de regramentos estanques, quando se trata de normatizar setores complexos de atividades ou subsistemas jurídicos, cuja característica central é a constante atualização dosfatores influentes sobre os rumos do setor, dentre eles, o tecnológico.

A velocidade de transformação tecnológica é um dos fatores de desestabilização  do sistemanormativo. Não se quer dizer, com isso, que se exija do regramento respostas às necessidades dos atores setoriais – governo, empresas, usuários/consumidores – para  facilitar-lhes a consecução de seus objetivos. O ordenamento

urídico, pelo contrário, traduz em preceitos a  política pública setorial   segundo filtros normativos de nível

constitucional e infraconstitucional, direcionando[75], portanto, a realidade.

Dada a especificidade de cada setor regulado, a eficácia da influência pretendida pelos preceitosnormativos é diretamente proporcional a sua sintonia com a linguagem falada no setor, ou seja, com aconformação e dinâmica setorial. A indução de comportamento na direção do interesse público em um complexosetor de atividades depende de visão abrangente sobre o passado do setor e sobre a sua forma específica de ser,algo somente possível de se exercitar por estruturas especializadas e estruturadas para a função deacompanhamento pari passu das alterações conjunturais.

A política pública setorial depende, portanto, do conhecimento setorial  para produzir regramentosviáveis. Ela depende de acompanhamento do desenvolvimento tecnológico para orientar eventuais desígnios

utilitaristas de mercado (ou dos atores do mercado) na direção do interesse público. 4.2 GLOBALIZAÇÃO, CONHECIMENTO E POLÍTICA PÚBLICA SETORIAL

  Não é somente o desenvolvimento tecnológico que impõe valorização da perspectiva dinâmica do

ordenamento jurídico. O termo globalização, por intermédio de seus inúmeros significados[76]

, exige a adaptaçãodo ordenamento jurídico mediante uniformização internacional , cujo efeito intensificador   da superação das

fronteiras nacionais gera a cogitação de um direito global [77]

.

Em poucas palavras, a globalização é um processo

[78]

, que se apresenta com significadoscomplementares nos ramos do conhecimento científico. Comumente, aponta-se a liberdade de mercadointernacional   como a síntese econômica da globalização orientada por discursos de deificação das economias

modernas.[79]

 Aliás, a terminologia adotada para designar o processo de aproximação mundial denota a posição

central do aspecto econômico de abertura comercial.[80]

  Para sua instrumentalização, idealizou-se auniformização normativa, a estandardização social   em padrões culturais e a padronização técnica , reflexotecnológico do movimento de globalização. Neste último item, evidencia-se melhor a importância da linguagem setorial . Ao lado dessas características, costumam-se enumerar também outros fatores como a crescente influênciadas multinacionais, da tecnologia da informação, do consumismo, da integração regional , da internacionalização

dos direitos humanos, das redes temáticas de pessoas

[81]

. A rede de influência social sobre a política públicaampliou-se em complexidade e extensão, gerando novas exigências de estruturação do Estado e da sociedade.Com a aproximação dos interesses internacionais das fronteiras estatais, o foro de discussão da legislação setorialfoi, em parte, deslocado para organismos internacionais e acordos bilaterais. Os países periféricos deixaram dedeter as rédeas de opção política e passaram a ter de negociar  suas legislações nacionais, gerando o fenômeno do

realinhamento constitucional [82]

.

A partir de então, o conhecimento  detém peso decisivo na determinação da política pública setorial, pois dele depende o convencimento  dos demais partícipes da comunidade internacional quanto à necessidade ouirrelevância de cada opção política interna. Somente o conhecimento setorial  habilita os países a fazerem frente

à crítica de mera recepção dos padrões internacionais[83]

. Isso ocorre porque a globalização carrega consigo auniformização jurídica. As políticas públicas nacionais não mais podem destacar-se das ponderaçõesinternacionais. Ampliado o rol de partícipes na formulação da política pública, também foi potencializada a

inovação. No plano privado, a referência à tecnoestrutura  de Galbraith[84]

  esclarece o movimento detransformação do mercado, que deixa de ser o mecanismo de alocação eficiente de recursos viabilizado pelo

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5

Estado[85]

, e passa a ser dirigido pela inteligência organizada da empresa   e, portanto, pelo investimento nacriação de necessidades por via de estratégias de marketing.

Disso tudo resulta a constatação de valorização do momento dinâmico presente na implementação das políticas públicas. Não é mais suficiente tratar a realidade com previsões abstratas petrificadas eminstrumentos normativos perenes, que teoricamente absorveriam a maior parte da carga de litigiosidade.Hoje, é necessário que o Estado trabalhe com a realidade mediante estabelecimento de metas variáveis de acordo

com as situações que se põem.[86]

  A política pública encontra-se espelhada na evolução de cada setor de

atividades relevantes, constituindo um dos elementos necessários para qualificação de tais atividades em direção à produção de bem-estar.

Tais considerações situam-se no âmbito do chamado governo por políticas ( government by policies)como qualificativo representativo do século XX. Como consequência, a intervenção estatal nos setores relevantesde atividades é um pressuposto para se relacionar a evolução setorial com o adensamento dos direitosfundamentais em sua dimensão concreta. Por tudo isso o conhecimento é tão relevante: conhecimento setorial para ponderação das fronteiras de regulação  no gerenciamento normativo da realidade voltado à otimização

d a eficiência[87]

  dos setores representativos da economia nacional dentro de patamares éticos  dedesenvolvimento. A introdução de entes de direito público tematicamente especializados – as agênciasreguladoras –, principalmente a partir da segunda metade da década de 1990, no Brasil, responde, em parte, àreferida demanda por um conhecimento setorial capaz de produzir regulação em ambientes complexos e emconstate transformação.

 

MODERNIZAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO 

5.1 REGIMES JURÍDICOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

 Alterada a perspectiva no tratamento da política pública setorial, velhos temas de direito

administrativo, que passaram despercebidos enquanto o estudo jurídico não se via ameaçado por novas demandas

de otimização e de dinamização[88]

, exigiram maior aprofundamento.

O fenômeno da publicatio[89]

, predominante na história administrativa brasileira dos três primeirosquartéis do século XX e de nítida tradição francesa, evidenciou tratamentos jurídicos estanques  entre o serviçoconsiderado público e o privado. Esgotadas as forças de divisão precisa entre papel estatal e liberdade individual,o serviço reservado  ao Estado deixou de carregar o caráter de exclusividade ao mesmo tempo que a atividade privada passou a comportar interferências públicas, ambos cedendo espaço para a apropriação de um conceito

anglo-saxão mais abrangente: o de atividade regulamentada.[90]

 No campo do tratamento jurídico dos direitos fundamentais, a passagem do Estado Liberal para oEstado Social produziu claras transformações de pontos de vista, que obrigaram o mundo jurídico a contemplar aface objetiva de concretização dos direitos ao lado da face subjetiva de sua pura titularidade. Enquanto isso, noque diz respeito à postura estatal frente aos setores da economia, o efeito do mesmo período histórico foiexatamente o inverso, na medida em que ocorreu o fortalecimento do movimento liberal de separação entre o público e privado, agora sob o enfoque da prestação estatal de serviços. O diferencial do Estado Social nesse

 particular não foi, portanto, o de se alterar a percepção jurídica de segmentação entre prestações públicas e privadas, mas o de ampliar, consideravelmente, o rol de atividades reservadas ao Estado, como ocorreu com asinversões estatais dos setores de energia e telecomunicações de meados do século XX no Brasil como forma dearrogar a si as necessidades da coletividade para promoção de bem-estar.

O fenômeno de prestação de serviços e sua normatização não foi enfraquecido pelo pensamento social

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como ocorreu com a visão individualista dos direitos fundamentais. Nestes, a evolução concreta das tensõessociais da segunda metade do século XIX exigiu participação ativa estatal para reequilibrar as situações jurídicasindividuais, facultando a todos usufruírem das previsões abstratas de direitos mediante fornecimento, pelo Estado,das condições concretas de acesso aos direitos de liberdade. Os direitos à vida, à propriedade, à liberdade e àigualdade formal, dentre outros, foram melhor concretizados com o incremento de direitos a prestações positivasestatais, tais como a previdência social, a tutela do hipossuficiente no direito do trabalho, a atividade de fomento auros baixos para aquisição da casa própria, o acesso gratuito ao Judiciário, dentre outros. Para consecução desses

objetivos, embasado na tradição francesa de segregação dos serviços, o Estado assumiu setores de atividades

econômicas, buscando compensar o déficit de acesso da população a serviços básicos ou mesmo viabilizar a padronização de atividades produzidas em larga escala.

A tradição liberal de separação entre Estado e sociedade deu origem à segregação entre serviços públicos e privados como compartimentos estanques do sistema normativo brasileiro. Não se quer dizer, com isso,que a distinção entre serviços públicos e privados esteja em decadência, pois o que caracteriza o direito brasileiro

é exatamente a submissão da Administração a um direito especial destacado do direito comum[91]

, mas acompreensão de que a característica pública ou privada não está eternamente amarrada a um determinado serviço,que pode perder sua essencialidade com o tempo ou mesmo ganhá-la. Além disso, a compreensão de que ummesmo rol de serviços pode conter âmbitos de prestação em regime público, convivendo com formas de prestaçãoem regime privado revela a complexidade da dinâmica regulatória. Um fenômeno muito próximo se fez presente

na história jurídico-constitucional brasileira desde a Constituição Federal de 1934[92], em que os chamadosdoutrinariamente de serviços sociais  submeteram-se, e se submetem até hoje, a regimes jurídicos público ou privado conforme a pessoa que os presta.

Enquanto os serviços forem definidos, a priori e ad eternum, como públicos ou privados, a realidadede aplicação do direito continuará destoando muito da previsão normativa. Para fugir da decisão casuística enão-programada, mas pressionada pela realidade, o Direito brasileiro absorveu a maleabilidade na percepçãoda realidade de um serviço, ou seja, na percepção de seu caráter concreto de essencialidade . Os serviçosmudam e as necessidades da coletividade também. De que adianta fincar-se a bandeira do serviço público emserviços que sofrem defasagem de interesse social em curto espaço de tempo. É o direito tramando contra sua própria função de orientador de condutas. Um serviço hoje tido por essencial – portanto público –, como a

telefonia fixa, pode perder seu status  ou ombrear com outros serviços mais abrangentes, como promete ofenômeno da convergência tecnológica   no âmbito das telecomunicações. O ordenamento jurídico petrificadoostentaria um serviço morto como palavra de ordem publicista e o restante dos serviços restaria abandonado a sua própria fortuna pelo simples fato de que a imprecisão terminológica entre serviços públicos e privados decorreexatamente da procura exagerada por uma definição eterna e universal do que é público, acorrentando-o em

dispositivos exclusivistas.[93]

 Atente-se, por fim, para o fato de que não se está aqui defendendo a extinção dadistinção entre regimes público e privado, mas a simples possibilidade de que seus objetos – serviços públicos e privados – sejam melhor ponderados e atualizados às transformações ínsitas à regulação setorial e que não se

rendam a definições simplistas[94]

, que substituem a maleabilidade jurídica pela imprecisão terminológica apta àsnegociações privadas do interesse público.

O que se apresenta hoje é mais uma etapa de reaproximação, que demanda correspondência noordenamento jurídico mediante modernização do direito administrativo. Se por um lado, a prestação exclusiva dosserviços públicos pelas mãos do Estado sofreu críticas de eficiência, universalização e modicidade de tarifas, por outro lado, a complexidade dos setores de atividades e suas inter-relações levaram o Estado a repensar o benefíciodo sistema exclusivista e segregado entre serviços públicos e privados. A partir daí, a transformação do modelodispôs-se à coexistência  de regimes jurídicos no mesmo rol de serviços para congregar a dinâmica, eficiência e

concorrência de preços (não necessariamente a livre concorrência e a livre iniciativa[95]

) com o desígnio públicode universalização e continuidade. A etapa atual da regulação foi o caminho aberto para compatibilizar   doissistemas, cuja convivência parecia inaceitável no modelo anterior de absoluto antagonismo entre público e

 privado.

[96]

  A partir de então, à sociedade, por suas instituições, foram abertos espaços de atuação nodesenvolvimento setorial, principalmente por meio das figuras da audiência pública e da consulta pública.Presente, diretamente, na prestação dos serviços, o Estado não pôde, isolado da sociedade, responder às demandasde rápida evolução social. A modernização do direito administrativo desloca o Estado para o intervencionismoindireto, resultando na entrega de maior poder normativo as instituições reguladoras coerentemente com onovo modelo de prestação de serviços públicos.

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 5 . 2 REGIMES JURÍDICOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS REGULADOS: DIVISÃOCONSTITUCIONAL DE TITULARIDADE

 As mudanças introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro rumo à modernização do direito

administrativo, entretanto, precisam ser justificadas em meio às críticas de carência de sintonia entre as mudançasidealizadas e as assimiladas pelo direito, que remontam à discussão de fundo sobre a natureza e o regime jurídicode prestação de um serviço regulado.

As emendas constitucionais setoriais  de 1995 enfatizaram a imperfeição da tradicional classificaçãode direito administrativo, que gravava um rol de atividades, em seu conjunto, pelo caráter público ou privado. A pergunta aprofundada após as emendas setoriais encontra-se na cogitação do regime jurídico aplicável aosserviços regulados. Estariam eles, agora, submetidos, ao regime público ou ao privado? Tais serviços regulados,enfim, estariam submetidos, integralmente ao regime público ou a um duplo regime, público e privado?

Para compreensão destas indagações, dois conceitos devem ser esclarecidos: regime jurídico; etitularidade constitucional das atividades econômicas em sentido amplo.

 Regime é o sistema de uma disciplina jurídica. Assim, é o conjunto de regras jurídicas integradas paraconsecução de uma finalidade comum. Quando esta finalidade é de interesse público   em meio a uma relação

vertical [97]

 caracterizada pela manifestação de poder extroverso  estatal, chama-se dito sistema de regime público .Poder extroverso, por sua vez, é a possibilidade de imposição de deveres ao outro sujeito da relação jurídica semsua concordância. Decorre do poder público, da prevalência do interesse público e da possibilidade do uso daforça física e sua exclusividade pelo Estado. Trata-se da manifestação do poder político assim entendido quandoum centro de imputação normativa interfere unilateralmente na esfera jurídica de outrem. Poder extroverso é, portanto, a possibilidade de obrigar unilateralmente a terceiros. Opõe-se, portanto, ao chamado poder interno , queé o poder próprio das relações privadas consubstanciado na possibilidade do sujeito de direitos constranger sua própria esfera jurídica.

Um dos elementos fundamentais para determinação do regime a ser aplicado a uma relação jurídicaqualquer é a natureza da atividade em jogo. Se a atividade for considerada exclusiva  do Estado, ou mesmo

rivativa do Estado, o regime jurídico aplicável será o público, em maior ou menor extensão conforme o caso. Sea atividade for considerada um serviço social , o regime variará conforme a pessoa prestadora. Finalmente, se aatividade estiver caracterizada como atividade econômica, o regime a ela aplicável será, em regra, o privado, àexceção de atividade monopolista.

Embora a distinção acima apresentada seja relativamente clara, a definição da natureza das atividadesnão o é. O índice mais seguro para se estabelecer a distinção provém do texto constitucional, embora ele não sejauma fonte autoexplicativa e didática. É dele, portanto, que se extrai a titularidade das atividades em geral.

Há atividades que são atribuídas ao Estado de forma exclusiva, tais como as atividades de tratosoberano, como jurisdição, normatização, poder de polícia, tributação e orçamento. São de titularidade do Estadoe são impassíveis de transferência aos particulares.

Próximas às atividades exclusivas  encontram-se as atividades privativas  do Estado. Elas são detitularidade estatal, mas a própria constituição permite a transferência de sua prestação ao particular. Como a prestação de ditas atividades somente pode ser transferida aos particulares por intermédio de contratosadministrativos de concessão ou de permissão (art.175 da Constituição Federal de 1988), o Estado continuaresponsável subsidiariamente por sua prestação.

Dentre as atividades privativas, encontra-se a parcela de serviços regulados essenciais à sociedade emseu conjunto e que abrangem, a depender do autor, todos ou parcela dos serviços de telecomunicações, energiaelétrica, mineração, transportes, dentre outros.

Há uma categoria especial de serviços, que são de titularidade integralmente tanto do Estado como dos particulares, como os serviços de saúde e de educação. Quando prestados pelo Estado diretamente, ou por 

intermédio de terceiros, submetem-se a regime público. Se, entretanto, forem prestados por conta e risco dos particulares, submetem-se a regime privado.

Finalmente, o campo das atividades econômicas  é residual. Enquadram-se nessa categoria todas asatividades não expressamente definidas como atividades exclusivas,  privativas  ou sociais  pela ConstituiçãoFederal de 1988.

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O conceito de serviço público surge assim como um elemento aglutinador das atividades detitularidade do Estado, e por consequência, tidas como essenciais à sociedade.

Tradicionalmente, os serviços regulados, no Brasil, foram considerados  serviços públicos e, portanto,submetidos, via de regra, a regime especial administrativo (regime público). Com a modificação implementada pelas emendas setoriais de 1995, o tratamento dos serviços exprimiu uma cisão dos setores em atividadessubmetidas a regime público e atividades submetidas a regime privado, mediante a expurgação do termo serviço

úblico  do texto correspondente a cada setor e a introdução de competência da União para autorização   deserviços regulados. Ao lado, portanto, dos contratos administrativos de concessão e de permissão de serviços

 públicos regulados, surgiu a possibilidade de mera liberação de amarras administrativas ao exercício de atividadeseconômicas reguladas. É sobre essa novidade constitucional que se apoia o modelo brasileiro atual de regulaçãode atividades essenciais.

Em resposta à questão formulada mais acima sobre que regime jurídico deveria ser aplicado aossetores regulados, a prática das instituições reguladoras tomou a frente dos administrativistas brasileiros pararevelar o que já se praticava em diversos setores muito antes de ditas emendas constitucionais: a atribuição deregime jurídico público ou privado, não a um setor em seu conjunto, mas a segmentos de atuação concretaintestinos a um setor essencial de atividades. O serviço universal obrigatório passou a se dirigir a um

subconjunto de atividades de um setor regulado[98]

: à cobertura de determinadas linhas regulares, no setor detransportes; ao serviço postal de cartas, nos correios; ao atendimento médico patrocinado pelo Estado, no setor de

saúde; aos serviços básicos de telefonia, a um serviço universal de TV por assinatura, e à eventual extensão à banda larga, nas telecomunicações; ao gerador em regime de serviço público, no setor elétrico.

 

5.2 AUTORIZAÇÃO DE SERVIÇOS

 A discussão existente na doutrina brasileira sobre o conceito de autorização de serviços  na

Constituição Federal de 1988 decorre de acusada incongruência constitucional no emprego do termo. Enquanto oart. 175 trata da prestação dos serviços públicos por concessão ou  permissão, os arts. 21, XI e XII e 223 prevêemserviços inscritos na competência da União, mas passíveis de prestação indireta mediante concessão,  permissão

ou autorização .As hipóteses interpretativas podem ser resumidas em duas: (i) a autorização prevista nas emendas

setoriais de 1995 nada mais seria do que uma terceira forma de delegação da prestação de serviços públicos e, portanto, o art. 175 teria estabelecido requisitos específicos para prestação de serviços públicos em regimes deconcessão e de permissão, remetendo, implicitamente, o tratamento dos serviços públicos prestados por meio deautorização às regras gerais do regime público; (ii) a autorização prevista nas emendas setoriais de 1995, por outrolado, indicaria o reconhecimento constitucional de que subconjuntos dos serviços regulados são, na verdade,atividades econômicas em sentido estrito, dependentes do cumprimento de normas administrativas para seuexercício por particulares, resultando na compreensão da coexistência entre serviços públicos (concessão e

 permissão) e atividades econômicas stricto sensu (autorização) no mesmo rol de serviços regulados[99]

.

A par dessas considerações, há ainda a crítica à aplicação prática do instituto da autorização, que,embora qualificado pela doutrina tradicional como ato unilateral, discricionário e precário, apresenta, por exemplo, na Lei Geral de Telecomunicações brasileira (Lei nº 9.472/97), característica de vinculação, que seria

 própria da licença.[100]

 Não se deve esquecer, todavia, que a base argumentativa contra o uso do instituto da autorização paraatividades econômicas stricto sensu  assenta-se na defesa da discricionariedade  como elemento essencial de suadefinição e na insistência de que aquele instituto teria significado unívoco. Ou seja, o fundamento teórico que vemsendo utilizado por parcela da doutrina administrativista brasileira para justificar a exclusividade de serviços públicos no rol de atividades reguladas decorre de uma posição intransigente sobre o conceito jurídico de

autorização. Essa intransigência não tem sido confirmada, em quase duas décadas de vigência do atual modeloregulatório brasileiro, pelas agências reguladoras, pela legislação setorial ou mesmo pelo Poder Judiciário.

[101] A

Constituição não esgota o sentido, nem limita de forma apriorística e precisa, a autorização. Ela dificilmente dará asolução didática e unívoca para satisfação do intérprete. Ela muito menos se arvora na condição de carrasco daevolução do direito. Isso não quer dizer que a norma infraconstitucional esteja livre para criar, mas não se pode

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utilizar da Constituição para embasamento de argumentos totalizantes, que retirem da discussão jurídica o ensaiode soluções melhoradas e desviem a atenção dos aplicadores do direito.

A autorização, portanto, tem sido aceita, na prática brasileira, embora questionada em teoria, comoinstrumento de reconhecimento administrativo do cumprimento dos requisitos impostos aos administrados paraexercício de atividades já previamente inscritas em sua esfera jurídica privada.

 

Parte II 

FUNDAMENTOS DEDIREITO REGULATÓRIO 

DIREITO REGULATÓRIO E ESTADO REGULADOR  

O posicionamento jurisprudencial e doutrinário que vem se cristalizando no ordenamento jurídico

 brasileiro acerca de novas formas de tratamento jurídico-administrativo de setores de atividades relevantestransparece especialização suficiente para a cogitação de um ramo de estudos direcionado às especificidades daregulação, à semelhança do ocorrido, em outros tempos, com o direito do trabalho, o direito financeiro, o direitotributário, o direito do consumidor, o direito ambiental.

Em busca de elementos comuns que viabilizem uma visão mais ampla e construtiva do fenômenosetorial, o direito da regulação, ou direito regulatório, encontra-se nesse estágio já vivenciado por outrasdisciplinas e caracterizado pela sedimentação de índices distintivos de seu estudo, cujo ponto de partida é o deformulação de princípios intersetoriais comuns  aptos a retratarem um ramo de conhecimento útil à compreensão e

solução de questões alinhadas à regulação.[102]

Algumas considerações já podem ser encontradas sobre o tema.

[103]

  Enumera-se, como princípiointersetorial do modelo brasileiro  atual   de regulação a desintegração vertical 

[104]  entre infraestruturas de uso

comum e serviços singularizados, viabilizando a chamada transparência informativa, veículo necessário aocontrole das subvenções cruzadas. A este, pode-se acrescentar a conexão de infraestruturas, como determinaçãonormativa de manutenção ou edificação de uma infraestrutura essencial para um determinado setor de atividades,

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e a compatibilização de regimes jurídicos , em que, a partir da tradicional distinção entre os serviços públicos (ouserviços submetidos ao regime público) – essenciais, universais, contínuos e subsidiados por fundos – e osserviços privados (ou serviços submetidos ao regime privado) sujeitos a efetivos dissabores de riscos de

mercado[105]

, inserem-se, nos arcabouços normativos setoriais, disposições que viabilizem a convivência deserviços prestados nos dois regimes jurídicos.

Revela-se mais adequado, todavia, assentar-se o direito regulatório na procura por princípios ouinstituições verdadeiramente gerais norteadores da regulação como um todo, ou ainda, distintivos da regulação

enquanto tal frente a conceitos próximos, como o de intervenção, de controle e de poder de polícia, e que não pactuem com ideologias ocasionais de escolha do melhor direcionamento econômico da atividade, pois, se sequisesse detalhar o rol de princípios intersetoriais enunciados no parágrafo anterior, dever-se-ia começar pela própria orientação à concorrência  como requisito do modelo atual de regulação inscrito na compatibilização deregimes jurídicos, algo que não se afigura essencial para a cogitação da regulação.

O esforço de identificação desses índices de regulação setorial dos nossos tempos  em detrimento deíndices gerais é, certamente, meritório para o desenvolvimento do pensamento setorial, mas não pode macular aregulação com o estigma – certo ou errado segundo cada ideologia que o analisa – da competição e orientação pelo mercado. As instituições de regulação são neutras quanto à aplicação isenta das estações de humor político,embora conscientes de sua presença no jogo político e de seus reflexos no ordenamento jurídico. Em outras palavras, dizer que a ‘convivência de regimes jurídicos em um mesmo rol de atividades’ ou a ‘desagregação

vertical’ são instituições intersetoriais hoje predominantes não significa dizer que a regulação somente seja objetode estudo do direito regulatório se qualificada por tais índices. Esses índices – desagregação vertical,compatibilização de regimes jurídicos, conexão de infraestruturas – são qualificativos específicos da regulação,mas não são características inerentes a ela, pois orientações regulatórias distintas podem exigir, por exemplo,ordens normativas que privilegiem a duplicação de infraestruturas ao invés do trânsito de serviços por umainfraestrutura única, bem como a horizontalização de uma cadeia produtiva, ou mesmo a segmentação de serviçosem determinado setor de atividades em silos isolados de regimes públicos e privados.

 No Brasil, a conformação regulatória predominante na segunda metade da década de 1990 até os diasde hoje revela a opção por uma forma de regulação com características específicas. Ela não resume o significadoda regulação enquanto objeto de estudo de um direito regulatório que pretenda transcender as configurações presentes no ordenamento jurídico nacional, em que sequer há a previsão de órgãos reguladores para todos ossetores regulados. Embora, sob o ponto de vista estritamente constitucional, somente exista a previsão deestruturas reguladoras especializadas para dois setores (serviços de telecomunicações, no art. 21, XI, e pesquisa,lavra, refinação, importação, exportação e transporte de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos eseus derivados, no art. 177, §2º, III), pode-se afirmar que arcabouço normativo infraconstitucional expandiuconsideravelmente esse modelo de regulação assentado em órgãos reguladores para o conjunto dos setoresregulados, como se verá mais a frente, com o detalhamento das estruturas regulatórias brasileiras. Apenas a títuloexemplificativo, no país tido como fonte do modelo regulatório das agências independentes, vale dizer, nosEstados Unidos da América, não há previsão constitucional de nenhuma autoridade administrativa

independente.[106]

 O importante, assim, é ter-se em mente que a presença de tais estruturas se insere dentre asformas teóricas possíveis de regulação, quais sejam: a regulação pelo mercado, em que se confia na densidade da

concorrência para corrigir distorções; a regulação por órgãos reguladores, em que se criam superestruturas estataistécnicas para acompanhamento setorial; a regulação endógena, alcançada via estatização dos prestadores dos

serviços regulados[107]

; a regulação por contrato, que se satisfaz com regras contratuais acordadas caso a caso e, portanto, em termos jurídico-administrativos, resume-se às normas firmadas em contratos administrativos(concessão e permissão). Segundo essa classificação, o modelo regulatório brasileiro pré-1995 pode ser  perfeitamente compreendido como um modelo misto de regulação tradicional via contratos administrativos e deregulação endógena via estatização da prestação dos serviços. Assim, a opção por um modelo de regulação

dependerá das peculiaridades de cada modelo regulatório[108]

, dentro das possibilidades abertas pelo texto

constitucional[109]

  e, por isso, o conceito geral de direito da regulação não se restringe ao modelo regulatório

 brasileiro vigente, muito embora suas instituições – desagregação vertical, conexão e compartilhamento deinfraestruturas, compatibilização de regimes jurídicos, competição – sejam importantes objetos de estudo. Nenhumdeles, entretanto, se apresenta como característica intrínseca à regulação em si mesma.

Deve-se, portanto, entender a regulação por suas instituições básicas para, a partir deste núcleo designificado, expandir o conhecimento geral, regional ou setorial a princípios comuns, como os dirigidos à

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regulação setorial vigente.

Assim, a identidade do direito regulatório depende do enunciado do significado da regulação propriamente dita.

Em uma primeira abordagem do significado de regulação, é esclarecedor que se faça um exercíciocomparativo que, embora simplificador de momentos históricos, divisa o aspecto regulador de outras opções deatuação estatal. Como oposição à opção histórica de proeminência da função reguladora estatal, tem-se, de umlado, o papel empreendedor ou prestador de serviços do Estado, ou também chamado Estado provedor de bem-estar, interventor direto e executor. Trata-se, em outras palavras, do papel complementar ou substitutivo do Estadoao mercado como Estado concentrado na atuação social e empresarial, sem que isso signifique inexistência deregulação. Esse tipo estatal é representado pelos termos Estado do Bem-Estar Social (welfare state) , Estado

Providência ( État-providence)[110]

  ou Estado Desenvolvimentista. Inteiramente distinto do Estado Providência,mas ainda oposto à proeminência da função reguladora estatal, tem-se, de outro lado, a centralidade do mercadocomo mecanismo de alocação eficiente de recursos por excelência . Em tal configuração estatal, ao mercado édado o papel de coordenador das atividades econômicas e ao Estado, o papel de garantidor unicamente da propriedade e dos contratos essenciais ao bom funcionamento do mercado excluídas funções de intervenção no plano econômico e social. Fala-se, nesse último caso, do Estado mínimo ou abstencionista, cujas funçõesreguladoras também presentes se ocupam da preservação da fronteira entre a atuação estatal e as atividadeseconômicas.

Como diferencial dos dois modelos ideais de Estado liberal e de Estado social, encontra-se o chamadoEstado regulador, que se define pela proeminência não da interferência direta para promoção do desenvolvimentoeconômico social, nem mesmo da não-intervenção para dinamização do mercado, mas pelo papel de

coordenação, de gerenciamento, de controle, de intervenção indireta[111]

, ou sinteticamente, de regulação estatal,entendendo-se esta última como resultado da compreensão do Estado e do mercado não mais como entesestanques ou antípodas, mas como fenômenos interdependentes e essenciais à consolidação dos direitosfundamentais.

Assim, a regulação não é, em si mesma, uma característica diferencial do modelo atual de Estado

regulador, pois a presença de competências regulatórias no Estado brasileiro não é recente.[112]

  O diferencial

moderno inscrito no significado de Estado regulador está na proeminência de uma espécie de regulação estatal presente na conformação atual dada ao Estado. Da mesma forma, o Estado regulador não se consubstanciou emoposição somente a um Estado Social-Burocrático empregador de prestadores de serviços essenciais à sociedade,mas também como opositor a um Estado caracterizado pela inexistência ou aversão à interferência no âmbitoeconômico e social, ou seja, à crença no mercado autorregulado. O Estado regulador, portanto, não é um Estadointervencionista, nem mesmo abstencionista, no sentido que se costuma atribuir às expressões, mas um Estadoque, embora não promova diretamente o desenvolvimento econômico e social (Estado do Bem-Estar Social) nemopte pela entrega dessa função a um terceiro mediante desregulação do mercado (Estado mínimo), atua como

“regulador e facilitador ou financiador a fundo perdido desse desenvolvimento”[113]

. O Estado regulador, portanto, é definido pelo caráter dirigente e gerencial de que se reveste a Administração Pública para conformação

das atividades essenciais segundo ordens de promoção dos direitos fundamentais delas dependentes.Fala-se, no Estado regulador, de uma  Administração Pública gerencial   no lugar de uma

 Administração Pública burocrática. Enquanto, na Administração Pública burocrática, a garantia dos direitossociais é remetida à contratação direta de servidores públicos atuantes nos diversos ramos das atividadeseconômicas, na Administração Pública gerencial, o mercado é tomado como instrumento para consecução dosdireitos fundamentais mediante acompanhamento conjuntural e ponderado de custos, infraestrutura, serviços, bens públicos, tarifas, áreas de cobertura, dentre outros componentes das opções de investimento de um setor regulado.Em outras palavras, no Estado regulador, há um acompanhamento gerencial da concretização dos direitosfundamentais mediante opções regulatórias de encaminhamento do setor. Nesse sentido, o Estado regulador é umfenômeno recente caracterizado por transcender a visão maniqueísta de oposição entre Estado e mercado, ou entreEstado e sociedade, de conflito entre forças ilusórias que, ao final de contas, são um único substrato utilizado para

consecução dos direitos fundamentais. O Estado regulador é um Estado reconciliado com o mercado, entendendo-o não como um ser autônomo e independente, mas como produto de regulação estatal. Da mesma forma, ainserção do mercado na equação regulatória não se presta à extinção da equação em prol da atuação autônoma domercado. O mercado se justifica enquanto dirigido pela regulação rumo ao interesse público. O pressuposto doEstado regulador é a persistência de ambos.

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O Estado regulador, portanto, é um modelo estatal assentado na atuação concertada de intervençãoestatal frente aos reflexos verificados pari passu  no setor regulado. Por isso, dizer-se que o Estado regulador envolve atuação administrativa conjuntural, pois dependente de acompanhamento pari passu do desenvolvimentode um setor de atividades essenciais. Assim, tanto o mercado, quanto a intervenção estatal, são colocados, para oEstado regulador, como variáveis, cujo comportamento interfere nos rumos tomados por uma AdministraçãoPública gerencial em prol da consecução dos direitos fundamentais.

 No Estado regulador, há a substituição da parcela de desenvolvimento econômico e social antesabsorvida na estrutura burocrática estatal do Estado Social por um controle indireto regulatório sobre os mercados.

A posição do Estado regulador como meio termo entre dois modelos ideais ideologicamente bem definidos – Estado Liberal e Estado Social – explica o porquê do surgimento dessa figura de Estado regulador em conjuntocom propostas de desregulação  ou desregulamentação, assim entendidas como a diminuição do papel estatal

regulamentador das atividades econômicas.[114]

  Dita desregulação nunca foi, entretanto, projetada como umaode contra a regulação. Pelo contrário, o alvo da desregulação dirigiu-se aos excessos da regulação. Exemploesclarecedor dessa postura está no fato de que a atividade reguladora foi reforçada pelo inaugurador das privatizações européias, o Reino Unido, onde “os monopólios naturais privatizados exigiam agora redobrada

regulação”[115]

.

 Não é difícil, em meio a todas essas considerações, confundir-se Estado regulador com a regulação

que lhe é peculiar, já que esse tipo de Estado se preocupou em encastelar a regulação em sua própria designação.A regulação, em si mesma, não foi erigida como bastião do Estado regulador brasileiro, mas o foi uma  forma deregulação: a regulação por intervenção estatal indireta de atividades essenciais e presumivelmente

competitivas.[116]

 

REGULAÇÃO: OBJETO DE ESTUDO DO DIREITO REGULATÓRIO 

Tendo em vista o posicionamento teórico do Estado regulador, já se pode antecipar a conclusão deque o Estado regulador não é o objeto de estudo do direito regulatório, mesmo porque, se assim o fosse, adisciplina jurídica dependeria de um fenômeno político-jurídico situado e datado no tempo e, portanto, fadado aser superado. O ramo de estudo de direito preocupado com a regulação certamente não se presta ao estudo de ummomento histórico somente, mas de um fenômeno jurídico que teve uma de suas manifestações – a intervençãoestatal indireta sobre a atividade econômica em sentido amplo – erigida a qualificativo identificador do Estadocontemporâneo: a regulação propriamente dita.

O objeto de estudo do Direito regulatório é, portanto, a regulação em si mesma, que detém diversas

dimensões. É, portanto, relevante, para o entendimento do objeto do direito regulatório, o estudo das espécies deregulação. Por esse meio, restará mais claro o fato da regulação, enquanto fenômeno abrangente, transitar entretipos distintos de intervenção, resguardando-se a concepção mais ampla de regulação como acompanhamento dodestino de atividades essenciais à sociedade.

 

2.1 FORMAS DE REGULAÇÃO

 O grau de centralização regulatória de serviços transparece a maior ou menor confiança do Estado no

alcance do interesse público, mediante outorga de sua prestação à iniciativa privada.

[117]

 Há dois conceitos queevidenciam como a regulação dos serviços públicos opera ao longo da história: controle pela descentralização e

controle pela centralização.[118]

 Controle pela descentralização   implica a aceitação, pelo Estado, de que suasfinalidades possam ser plenamente alcançadas pela ação dos particulares. Fala-se, então, em “regulação

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desconcentrada”[119]

 como sinônimo de desregulamentação, esta comumente utilizada em diversos significados.Por outro lado, o controle pela centralização   denota falta de confiança na iniciativa privada para o alcanceespontâneo dos fins patrocinados pelo Estado independentemente de sua intromissão. Fala-se então em “regulação

concentrada”[120]

, ou impropriamente, em regulamentação .

A par dos conceitos de centralização regulatória ou descentralização regulatória, existe o esforço dedistinção quanto às formas de manifestação da regulação, apresentando-se basicamente como: regulaçãooperacional; e regulação normativa.

 Regulação operacional   ou diz respeito a afetar atividades  à iniciativa privada ou ao Estado. É areferência ao plano físico-estrutural da regulação dos serviços. Pergunta-se: quem irá exercê-los? Responde-se pela opção quanto à regulação operacional dos serviços. Regulação operacional, portanto, é a intensidade com

que o Estado avoca a si e a suas entidades a tarefa de desempenhar  certas atividades.[121]

Por outro lado, a regulação normativa diz respeito à ampliação ou à restrição das atividades

alcançadas por regramento estatal direto.[122]

Tal distinção entre regulação operacional e regulação normativa permite analisar com maior precisão aforma de concentração regulatória dos serviços públicos e das atividades econômicas. A concentração regulatória

 pode ocorrer somente no âmbito operacional ou somente no âmbito normativo. A tendência [123] mais recente é ade regulação descentralizada operacionalmente e de normatividade complexa, ou seja, de regulação normativacentralizada, mas remetida a autoridades administrativas.

 

2.2 EFEITOS DAS OPÇÕES REGULATÓRIAS

 Em síntese, de um lado tem-se a pergunta sobre quem prestará o serviço e então se trata de falar em

regulação operacional centralizada   – intervencionismo direto[124]

  – ou descentralizada. Por outro lado,

questiona-se se há regramento específico da atividade, remetendo-se agora aos conceitos de regulação normativacentralizada – intervencionismo indireto – ou descentralizada.

A regulação normativa centralizada permite que sejam identificadas, no Estado, atividades de  fomento,

regulamentação , monitoramento, mediação,  fiscalização,  planejamento  e ordenação da economia[125]

 sem queele assuma a prestação direta dos serviços. Assim, a opção pela regulação operacional descentralizada não esgotaas opções estatais regulatórias. O fato do Estado não mais intervir sob o ponto de vista operacional – de nãomais prestar diretamente uma utilidade à população – não significa que ele esteja intervindo menos. Tanto éassim, que o que caracteriza o conceito de agência reguladora, analisado mais a frente, é a estrutura normativa demaior intervencionismo estatal, pois a política de baixo intervencionismo estatal é abraçada pela forma tradicionalde regramento jurídico geral, abstrato e totalizante, que transfere ao Judiciário a solução das peculiaridades

geradas pela dinâmica social; é a crença de que a mão invisível do mercado solucionará percentual elevado de

transgressões normativas e que o Poder Judiciário lidará com o ilícito remanescente[126]

. Na regulaçãooperacional descentralizada, para a qual o Brasil tem se inclinado, o Estado continua detendo uma margem demanobra normativa, que não se resume a simples opção entre exarar ou não regramento sobre o serviço. Ao optar  pela regulação normativa centralizada, o Estado, agora, enfrenta outra questão, tão antiga quanto o conceito deinteresse público: a de se definir a forma de controle da prestação dos serviços pelos particulares; a de se saber  para onde estará orientada a política estatal de regulação dos serviços descentralizados; enfim, a de se escolher acorrente de pensamento que orientará a regulação.

Duas correntes clássicas de pensamento se opõem, sabendo-se que a divisão é didática e imprecisa,comportando diversas subdivisões: uma delas voltada a colocar em primeiro plano a remuneração do capital

empregado no serviço para atração de investimentos estrangeiros; a outra, voltada a valorizar os conceitos deinteresse público, de adequação do serviço e do bem-estar do consumidor, condicionando o retorno do

investimento aos níveis de satisfação e à continuidade do serviço.[127]

 

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2.3 FUNÇÃO NORMATIVA CONJUNTURAL DO EXECUTIVO

 A função regulamentar representa a parte normativa  da regulação que cabe ao Executivo, sem,

todavia, esgotá-la, pois ela é uma normatividade condicionada à legalidade da medida e, portanto, submissa àsdiretivas de políticas públicas de regulação exaradas pelo Legislativo. A prescrição de comportamentos paraorientação de condutas por intermédio de previsões de situações de fato, ao lado das determinações de diretrizes emetas de desempenho, representam uma margem de manobra normativa em um modelo que exige a coexistênciade regimes distintos no mesmo rol de atividades, gerando, com isso uma normatividade complexa.

Exatamente no que diz respeito à citada margem de manobra normativa   é que dito modelo denormatividade complexa encontra críticas. Elas estão centradas na alegação de que o Executivo estaria invadindo prerrogativas legislativas ao se utilizar da regulamentação de setores para implementação de políticas públicas. Ofenômeno se avolumou com a descentralização operacional dos serviços públicos, desviando o foco de preocupação do Estado Social, que era definido pela intervenção direta, para o incremento da produçãonormativa. O Estado deixou de prestar ele mesmo o serviço, passando-o às mãos dos particulares, mas, para tanto,ultimou um projeto normativo mais elaborado voltado às especificidades de cada setor econômico. Este projetoevidencia mais nitidamente o papel do Poder Legislativo como formulador de políticas públicas gerais e deestruturação dos setores de interesse público, enquanto o Poder Executivo assume, com clareza, a funçãonormativa conjuntural destinada a acompanhar o setor no seu dinamismo, mas dentro da legalidade.

A substituição que o Estado Social determinou na política pública liberal do  government by law  pela política pública social do  government by policies perpetuou-se como exigência de acompanhamento da realidade por produção normativa voltada à política de orientação da conjuntura econômica não mais sob a forma deintervenção direta, mas mediante regulação normativa centralizada em entes estatais autônomos. A questão quesurge, neste ponto, está em saber se, de fato, o ocorrido evidenciaria migração de funções do Poder Legislativo para o Poder Executivo, por intermédio das agências criadas para o fim de produção normativa complementar ou

se refletiria um aclaramento da sempre existente especialização funcional dos poderes.[128]

 2.3.1 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO E O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES 

A hipótese de que teria havido transferência de poderes normativos do Legislativo para o Executivo,ferindo, assim, a cláusula pétrea constitucional brasileira da separação de poderes despreza a evolução de seu

sentido histórico sintetizada em Montesquieu[129]

  e fundamentada nas abordagens dadas por Aristóteles[130]

,

Bolingbroke[131]

 e Locke[132]

.

Dentre as atividades entregues ao Executivo por Montesquieu, estão as ações momentâneas  ou

instantâneas[133]

, que são, portanto, conjunturais, dinâmicas, instáveis. A capacidade normativa de conjuntura

de que fala Eros Roberto Grau[134]

  está inserida no contexto de produção normativa por órgãos e entes daAdministração para o fim de acompanhamento setorial, exercendo, com isso, função própria – não delegada –, pois inerente à condição dinâmica e flexível do Poder Executivo. Assim, o Executivo exerce  função normativa ,

que difere da função legislativa. Esta última é definida a partir de critério  subjetivo – orgânico ou institucional –,em que vale mais para sua definição o conjunto dos atores do Poder Legislativo que propriamente sua

função[135]

. Já a função normativa  é divisada não a partir dos Poderes estatais – Legislativo, Executivo,Judiciário –, mas das matérias neles inseridas sem caráter de exclusividade. Tanto é assim, que a ConstituiçãoFederal de 1988 enuncia, em diversos dispositivos, os atos normativos dos três poderes (CF/88: art. 49, V; art. 97,

caput ; art. 102, I, a; art. 102, §2o; art. 103, §3o; art. 125, §2o; art. 169, §4o). Não se olvida o fato de que as açõesabstratas de análise da constitucionalidade de atos normativos não podem ser suscitadas contra regulamentos em

geral do Poder Executivo[136]

, mas a razão deste posicionamento do STF está na questão estrutural em jogo: ouízo destas ações é de constitucionalidade, enquanto a análise dos regulamentos é de legalidade. Dessa forma, o

termo ato normativo  dos artigos correspondentes ao controle abstrato de constitucionalidade inscritos naConstituição Federal de 1988 não exclui os regulamentos por não serem prescrições normativas, mas em razão do

requisito do juízo de constitucionalidade da medida.[137]

 Além disso, se há atos normativos com força de lei para

os fins de questionamento de constitucionalidade e de competência do STF[138]

, é porque há ato normativo sem

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força de lei no sistema jurídico brasileiro. Não há, portanto, delegação de poderes, em sentido próprio, masutilização de função normativa originariamente atribuída ao Executivo. Isso não significa que ele possa exercê-laquando quiser e independentemente de prévia atuação legislativa. O sistema constitucional brasileiro, em razãodas vinculações estruturais da separação de poderes, impõe que o espaço normativo do Executivo esteja

 previamente aberto por dispositivo de lei e daí a característica de fonte secundária a seguir esmiuçada.[139]

 Esseraciocínio evita a perplexidade comumente verificada na análise da jurisprudência norte-americana ao constatar que o princípio básico de proibição de delegação funcional entre os poderes (non-delegation) somente é aplicado

e m casos extremos .

[140]

  São extremos  porque excepcionais, já que os demais casos tidos como de aplicaçãotímida do princípio, na verdade são de utilização de competência própria do Executivo.

A função normativa está assentada na  primariedade do enunciado normativo: ela se impõe por forçarópria, podendo existir em decorrência do exercício de poder originário – Legislativo (em sentido subjetivo) – 

ou em decorrência de poder derivado – Executivo (em sentido subjetivo).[141]

 O conceito de função normativa,

 portanto, abarca a função legislativa, a função regulamentar   e a função regimental .[142]

  Estas funções não seconfundem com a possibilidade de controle dos demais poderes pelo Legislativo, que Montesquieu chamou de

oder regulador .[143]

O art. 25, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, da Constituição Federal de 1988,suscita certas considerações que, aparentemente, indicariam a proibição constitucional da presença de atosnormativos do Executivo no novo ordenamento jurídico instaurado. Segundo o dispositivo:

 Constituição Federal brasileira de 1988

Art. 25. Ficam revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição,sujeito este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem aórgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional,especialmente no que tange a:I - ação normativa;II - alocação ou transferência de recursos de qualquer espécie.

 Da leitura do art. 25 do ADCT, poder-se-ia extrair a conclusão de que a partir de cento e oitenta dias

da promulgação da Constituição, não poderia mais existir lei que atribuísse competência legislativa ao Executivoexceto em caso de sua prorrogação mediante decisão do próprio Legislativo, que, por ser exceção, não se poderiaestender ao infinito. É exatamente isso que o dispositivo diz e deve ser precisamente isso o aplicado. O desejo doconstituinte de extirpar do ordenamento jurídico dispositivos legais que ferissem o princípio da não-delegação de poderes está evidente no art. 25 do ADCT. Ele significa a proibição de delegação de poder legislativo por lei aoExecutivo à exceção, é claro, da previsão expressa constitucional de lei delegada, com as respectivas limitaçõescontidas no art. 68 da Constituição Federal de 1988. Não há nada a ser reparado no enunciado constitucional. Elenão diz respeito ao tema ora analisado do exercício de poder normativo próprio do Executivo mediante aberturalegal exigida pela separação de poderes vista sob o enfoque estrutural. Não há delegação de poder normativo, masreconhecimento e autorização de seu exercício dentro da sistemática de distribuição de funções normativas para oExecutivo. Ele – Poder Executivo – não pode exercer competências normativas reservadas ao Congresso Nacionalnem que estas lhe sejam entregues por lei, mas não se pode furtar, e portanto deve exercer suas competênciasnormativas abertas por dispositivos legais que definam parâmetros de atuação normativa regulamentar.

 2.3.2 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE 

 No contexto da regulação, o respeito à legalidade apresenta dois sentidos: a) submissão do órgão ouente da Administração responsável pela emissão de regulamentos setoriais à correspondente lei definidora decompetências; b) respeito aos dispositivos emanados de normas legais  ou regulamentares. Este últimoentendimento ameniza a enraizada polêmica da existência de conflito entre a legalidade e o poder regulamentar,

viabilizando o modelo atual de escala industrial de produção de regulamentos por órgãos reguladores.

 Note-se que não há aqui apologia à  produção em escala de regulamentos , mas justificação do modelo

de regulação instaurado no Brasil perante o art. 5o, II, da Constituição Federal de 1988[144]

: “ninguém seráobrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. O termo lei aqui referido não pode ser 

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compreendido no seu sentido mais estrito e isso não é nenhuma novidade ou argumentação puramentedoutrinária: é a própria prática do sistema constitucional brasileiro aplicada pelo Supremo Tribunal Federal. Écediço que um dos argumentos proibitivos de tratamento de matéria penal substantiva por medida provisória é o

de que o art.5o, XXXIX, da Constituição Federal de 1988, ao prescrever que “não há crime sem lei anterior que o

defina” exprimiu lei  em seu sentido “exclusivamente formal”[145]

. Por isso, mesmo a medida provisória – atonormativo com força de lei – não pode tratar de disposições que definam crimes e cominem penas. Se o termo lei

do art.5o, XXXIX, da Constituição Federal de 1988 é tão restrito a ponto de inviabilizar o uso da medida

 provisória, mesmo antes das limitações expressas advindas da Emenda Constitucional n. 32, de 2001 (art. 62, §1º,I, b  da CF/88), isso significa que a previsão de lei do art.5o, II, da Constituição Federal de 1988 é, no mínimo,menos restritiva, pois não se pode sustentar que ele não se refira a disposições veiculadas por medidas provisórias.Se assim o é, o argumento comumente utilizado contra a existência de poder normativo do Executivo de que o

termo lei  do art.5o, II, ou do restante da Constituição Federal de 1988, deve ser interpretado restritivamente éfalho, pois, ao menos há níveis de sua extensão: lei  estritamente formal do Legislativo; lei, como instrumentonormativo com força de lei formal; e – porque não – lei como ato normativo.

Ainda, poder-se-ia acenar com argumentos periféricos, como o que se assenta na redação do art. 5o,II, da Constituição Federal de 1988, que proíbe o constrangimento de direitos exceto em virtude de lei. Segundoeste argumento, o texto constitucional não resumiria o condicionamento de direitos a comando legal . Todalimitação decorrente de prévia abertura legal, inclusive por ato normativo da Administração, seria, assim,condizente com o texto constitucional, desde que não ultrapassasse o âmbito de atuação permitido por lei. Maseste argumento não se sustenta se não estiver clara a questão da delegação inconstitucional de funções

legislativas, ou seja, da distinção entre  função legislativa e função normativa.[146]

Sob o ponto de vista estrutural, a legalidade exige lei que atribua[147]

  competência executiva

 secundária[148]

, pois pressupõe prévia abertura legal, e não simplesmente  subordinada, para produção deregulamentos setoriais. A mesma legalidade também justifica a vinculação dos atores setoriais (prestadoras eusuários/consumidores) à orientação emanada da função normativa conjuntural do Executivo (em geral, por meiode superestruturas administrativas autônomas) pela produção de disposições regulamentares – parte da função

normativa que foi distribuída entre os poderes estatais no diploma constitucional. A regulamentação emanada doExecutivo, neste caso, não desrespeitará a hierarquia normativa, pois mesmo que seja independente de atribuiçãoexplícita e pontual de função normativa, afigura-se como atribuição implícita  decorrente da destinação decompetências de certos setores ao Executivo. A lei em sentido formal – decorrente de processo legislativo – é, portanto, o único caminho constitucionalmente autorizado a abrir espaço à interferência do Executivo na precisão

dos direitos, como historicamente ocorre em questões como as de posturas urbanas e regras de trânsito.[149]

O reconhecimento da existência destes regulamentos problematiza a questão, que deixa de ser analisada e discutida quando simplesmente se nega constitucionalidade aos inúmeros atos normativos do

Executivo, que, por serem indesejados, não são menos reais.[150]

  Não menos real também é a constatação da presença de função administrativa no Legislativo quando da implementação de políticas concretas de governo por via de leis formais no auge do Estado Social, resultando nas chamadas leis-medida  ( Massnahmegesetze). Adistinção existente entre lei e regulamento, submetendo este àquela não significa eliminar a função normativa do

Executivo, mas parametrizá-la segundo uma hierarquia[151]

  prevista no sistema constitucional sem olvidar adivisão material dos conteúdos normativos entre os poderes estruturais do Estado.

Superados os obstáculos à possibilidade de atividade normativa regulamentar – função normativa doExecutivo –, enfatiza-se a compreensão de que o Poder Executivo desvia a finalidade desta atividade se substituimanifestações propriamente legislativas.

 2.3.3 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO E ENTES ADMINISTRATIVOS AUTÔNOMOS 

A discussão sobre a plausibilidade jurídica da regulação como ela se apresenta hoje no ordenamentourídico brasileiro não se esgota na discussão da plausibilidade jurídica da produção normativa do executivo. Há

uma questão subsequente: como aceitar a presença de entes administrativos ditos independentes  para odesempenho desta função normativa natural ao Executivo se a Constituição Federal de 1988 atribuiu competênciaexclusiva ao Chefe do Executivo para expedir decretos e regulamentos para fiel execução da lei   (art. 84, IV e

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 parágrafo único) e para a direção superior da Administração Pública (art. 84, II)?

A primeira parte da questão é dirigida aos chamados regulamentos executivos , que tiveram seusignificado restrito doutrinariamente à orientação de atuação da Administração Pública, com fundamento no poder hierárquico do Chefe do Executivo, para instrumentalizá-la ao cumprimento das disposições legais. O enunciadoconstitucional de competência exclusiva do Chefe do Executivo para expedição de decretos e regulamentos parafiel execução de lei não esgota, portanto, o sentido da função normativa do Executivo. Esta se apresenta incólumeno âmbito de preenchimento normativo do ordenamento jurídico que não se resuma a ordens estruturadoras daAdministração para viabilização da lei. Persiste a possibilidade de utilização da função normativa do Executivo

 para regulamentar  atividades expressamente atribuídas por lei, em que implicitamente se destina função normativaao órgão ou ente competente para fazer funcionar o setor mediante preenchimento regulamentar submisso àlegalidade, esta sim, fonte definidora da política pública setorial. O art.84, IV, da Constituição Federal de 1988,explicita a condição infralegal, mas não despida de normatividade, do Chefe do Executivo quando da orientaçãoestrutural da Administração Pública a partir da hierarquia inerente ao Poder Executivo.

 Não há, portanto, proibição ao exercício de função regulamentar por intermédio de entesadministrativos com competência atribuída à gestão de um conjunto de atividades, muito embora isto nãosignifique alienação do Executivo frente à lei em sentido formal. Esse raciocínio evita a perplexidade que seapresenta nas exposições doutrinárias brasileiras sobre o tema, que, cientes da realidade constitucional do país,vêem-se obrigadas a encerrar sua argumentação com o reconhecimento do fracasso histórico do esforço deefetividade das disposições constitucionais do art.84, IV, e parágrafo único, apontando para a “antiga, difundida e

tolerada (...) prática de que órgãos autárquicos regulamentem as leis”[152]

. O que falta, portanto, é oaprofundamento dogmático da questão para que fique bem definida a fronteira além da qual o poder normativo doExecutivo deixa de ser secundário, transformando-se em inconstitucional. A acusação de inconstitucionalidadetotal e apriorística de qualquer normatização de entes autárquicos do Executivo levou à ridicularização doargumento jurídico frente à imposição prática da natureza das relações funcionais do Estado.

A análise do art. 84, II, da Constituição Federal de 1988, assenta-se em argumentos semelhantes. Aose dizer que o Chefe do Executivo desempenha a direção superior da Administração Pública, isso não significasubserviência de consciência, nem muito menos disponibilidade de cargos segundo a vontade do Presidente soberano da República: a maior parte da carreira administrativa está fora do alcance do juízo de oportunidade doChefe do Executivo, pois garantida pela burocracia que a protege. Logo, não há nada de excepcional em permitir-se a presença de conselheiros ou diretores de entes da Administração indireta que não estejam envergados aogosto e desgosto do Chefe do Executivo. Aspecto inteiramente distinto encontra-se na consideração dificilmenteencontrada nos críticos do modelo regulatório atual e pertinente à impossibilidade de análise final de decisão daAdministração por ausência de recursos administrativos que cheguem ao Chefe do Executivo, tolhendo o juízofinal de oportunidade que lhe teria sido outorgado pelo art. 84, II, da Constituição Federal de 1988. Essaargumentação poderia levar a certa perplexidade se já não se convivesse com modelos de tribunais administrativosafastados da revisão de suas decisões pelo Ministério a que estão vinculados, pois, de fato, o que o art.84, II, diz éque a estrutura  da Administração Pública encontra-se submetida às orientações hierarquicamente superiores doChefe do Executivo. Contudo, o dispositivo constitucional não torna a matéria  normativa exclusiva do últimoescalão da estrutura administrativa, remetendo esta consideração à produção legislativa, de cujo processo, não sedeve esquecer, o Chefe do Executivo faz parte.

Tais considerações não desconhecem a possibilidade de superação da discussão sobre aconstitucionalidade de entidades administrativas regulatórias mediante a referência à previsão constitucional de

dois dos atuais órgãos reguladores – ANATEL e ANP[153]

. Previstos na Constituição Federal de 1988, elesencarnariam exceções aos dispositivos de competência reservada ao Chefe do Executivo (art. 84, II e IV, daConstituição Federal de 1988). Esse ponto de vista, que apoia a constitucionalidade de regulamentação infralegalde atividades essenciais na presença de referência expressa a órgãos reguladores revela, contudo, dois problemas:a) somente duas das atuais agências reguladoras seriam regulares  e estariam aptas a cumprir suas funçõesregulamentares; b) mesmo estas duas agências poderiam ter sua autonomia questionada por violação da separaçãodos poderes por via transversa ao implementarem exceção a incisos do art. 84, que funciona como divisor de

águas entre o Legislativo e o Executivo. Desta forma, a explicação da autonomia regulatória das agências por meio de normas constitucionais excepcionais peca por privilegiar soluções pontuais, quando a presença de taisentidades já decorre naturalmente da harmonia preconizada entre os poderes por meio de distribuição nãoexclusiva de funções. O argumento da previsão constitucional ‘excepcionadora’ obedece ao pressuposto, acimaquestionado, de exclusividade de tratamento normativo pelo Poder Legislativo e que não condiz com acomplexidade institucional atual.

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E qual seria, portanto, o efeito jurídico da previsão constitucional de ditos órgãos reguladores? Comonão existem termos inúteis no ordenamento jurídico, as previsões concernentes à regulação do petróleo e dastelecomunicações devem operar algum efeito. Este efeito está na distinção entre poder normativo secundário esubordinado explicitada linhas acima. Por estarem expressamente previstos na Constituição Federal de 1988 comoórgãos reguladores, eles não tem somente a tradicional competência secundária, mas também subordinada, pois adicção constitucional exige que o tratamento legal de tais órgãos lhes defina com os elementos característicos daregulação setorial.

 

2.3.4 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO E REVISÃO JUDICIAL

Finalmente, a atividade normativa do Executivo, no âmbito da regulação de atividades essenciais,suscita também questões referentes à extensão de sua revisão pelo Poder Judiciário. Sob o enfoque estritamenteurídico-formal, a Constituição Federal de 1988 estipula expressamente a inafastabilidade da jurisdição quanto a

qualquer lesão ou ameaça a direito (art. 5o, XXXV). Entretanto, não se pode furtar à discussão do grau de atuaçãourisdicional daí decorrente. Em outras palavras, até onde irá, de fato, a revisão, pelo Judiciário, da produção

normativa conjuntural do Executivo, que é, por natureza, técnica e, às vezes, fundada em prognósticos daAdministração sobre a evolução futura de um setor de atividades?

O termo comumente utilizado para descrever o fenômeno de abertura de opções administrativas por meio da definição técnica como argumento de autoridade é o da discricionariedade técnica da Administração

Pública. Esse termo transparece a afirmação de que certas decisões, por sua elevada complexidade de ordemtécnica, somente poderiam ser tomadas por quem nelas é especializado, deixando ao Judiciário a possibilidade dese pronunciar somente quanto aos erros manifestos.

O próprio conceito de discricionariedade técnica é atacado como uma contradição em si, pois reuniriaem sua postulação termos que se anulariam, já que a discricionariedade pressupõe espaço decisório aberto por lei,enquanto a tecnicidade carregaria, em si, uma determinação precisa de critérios a serem seguidos, estrangulandoaquele espaço que se pretendia previsto na lei, transformando, assim, o ato cogitado em ato vinculado, ou seja, emato no qual não há margem de opções possíveis a serem tomadas, mas somente um comportamento previamenteestabelecido a ser implementado pela Administração Pública.

Para compreensão da questão da discricionariedade técnica, é necessário primar por precisão

terminológica. Há um grande salto entre os conceitos de discricionariedade externa e discricionariedade interna.A discricionariedade externa, impropriamente inserida em casos de discricionariedade técnica,

significa a margem de opções possíveis do administrador prevista em formulação jurídica que contém, dentreoutros, dados técnicos. Neste caso, o administrador deve partir dos elementos técnicos já esclarecidos nafundamentação de sua decisão e lançar mão da clássica discricionariedade administrativa aberta expressamente pelo texto legal. Seria o caso de uma norma que estabelecesse opções para o administrador destruir ou apreender uma substância tóxica. A determinação da natureza da substância é um juízo técnico prévio à opção doadministrador entre destruir   ou apreender  o produto. Logo, a discricionariedade externa pressupõe a solução dosignificado dos dados técnicos contidos na previsão normativa.

Já a discricionariedade interna revela a verdadeira temática da discricionariedade técnica e se define

 pela cogitação de um espaço discricionário aberto pela dificuldade de se determinar o sentido do termo técnicoinscrito na lei. A discricionariedade técnica está na entranha dos juízos técnicos.

[154]

Quem conhece tecnicamente, é verdade, tem condições de decidir melhor sobre o significado

objetivo[155]

 de um termo técnico, mas não necessariamente de forma mais adequada ao ordenamento jurídico,que agrega caráter teleológico aos dados técnicos, vinculando-os a uma finalidade específica normativa, cuja prerrogativa de proteção última situa-se no Poder Judiciário. A tecnicidade do tema afasta, na prática, a ponderação científica do juiz sobre os prós e contras da opção por uma ou outra tecnologia (esta é umaconstatação fática); ela reserva a órgãos formados por especialistas de cada área a definição da extensão de certosconceitos, como os de substância tóxica, de margem de segurança , de medicamento, de bioequivalência, deinterferência prejudicial eletromagnética , mas não inviabiliza – antes indica em face da presença de  standards

 precisos[156]

 –, a necessidade de, a partir de laudos técnicos, verificar a pertinência da decisão tomada frente àsdeterminações legais. Finalmente, deve-se levantar a questão de que tais  standards  precisos não são assimentendidos por serem predeterminados, mas por estarem remetidos à motivação da decisão administrativa,analisada no controle judicial do ato, que confirmará ou não a determinação concreta dos parâmetros técnicos

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razoáveis  frente ao contato da norma com o plano fático.[157]

  Ditos parâmetros técnicos são esculpidos namotivação  da decisão administrativa, o que gera a possibilidade e exigência de revisão judicial dos critériostécnicos utilizados para tomada de posição do administrador.

O juízo de legalidade é prerrogativa inafastável do Poder Judiciário, que, por outro lado, deve cingir-se, quanto ao juízo de oportunidade  do administrador, à verificação da proporcionalidade da medida. Neste caso,as valorações do administrador, desde que legais, vinculam a atuação estatal mesmo que em detrimento da melhor solução segundo novos parâmetros de quem enxerga, do futuro, o fenômeno completo, muito embora se possa

exigir a melhor solução possível segundo o nível de dados disponíveis e assimiláveis no momento da decisão. A par do juízo de oportunidade do administrador, há a opção por critérios técnicos, que carregam consigo certo graude hermetismo. Por isso, exige-se consciência setorial do julgador para compreensão das implicações menosóbvias das opções do administrador, bem como se exige ampla motivação da decisão administrativa para permitir o controle judicial. O conhecimento, por parte do julgador, dos meandros técnicos dos setores de atividadesrelevantes para o Estado é condição para o necessário controle judicial da assim chamada discricionariedadetécnica. Em outras palavras, a tecnicidade pode encobrir, no juízo de oportunidade, o juízo de legalidade; podetomar decisões, no juízo de oportunidade do especialista, que diminuam as opções de legalidade do julgador semque ele perceba tais decisões, fechando as soluções antes abertas pela legislação. Tais características afloradas nomodelo regulatório estatal evidenciam a necessidade do Judiciário, bem como das estruturas postulatórias peranteo Judiciário, de se empenharem em tomar consciência das perspectivas abertas pela tecnicidade das questões

setoriais, que obscurece a nitidez das fronteiras limitadoras dos juízos de oportunidade, que, por natureza estãovinculados aos parâmetros dos juízos de legalidade.

Além da ampla discussão gerada pela discricionariedade técnica, a atividade normativa do Executivodepara-se com a influência de políticas orientadoras de decisões setoriais. O modelo de regulação desloca paraórgãos e entes administrativos específicos decisões de intenso caráter  prognóstico  carregadas de orientações políticas de planificação administrativa. Essa é, por exemplo, a opção pela forma de se implementar a competiçãoem determinado setor. Os casos de implementação de orientações planificadas na esfera do Executivo, aocontrário do que ocorre com a discricionariedade técnica, não se submetem à interferência do Judiciário no cernedas opções políticas, pois disso resultaria restrição, por parte do Judiciário, das funções naturais ao Executivo. Nãoé, no entanto, o Executivo somente que delimita o cerne de seu poder de orientação política por planificaçãoadministrativa. Cabe ao Legislativo estabelecer os standards  dentro dos quais o Executivo produz suas políticas

 próprias, tanto no tocante à sua estruturação[158], quanto para normatização de setores relevantes de atividades. A pertinência entre os prognósticos legislativos e executivos inscritos em suas correspondentes produçõesnormativas, por óbvio, encontra-se no campo do juízo jurisdicional.

 

2.4 CONCEITO DE REGULAÇÃO

 Ao se tratar da produção normativa do Poder Executivo, abordou-se apenas uma manifestação

regulatória, que é parte do seu significado e, embora seja um dos significados mais característicos da regulação,

não a representa em sua integralidade. A regulação é um fenômeno mais abrangente de interferência estatal naatividade econômica em sentido amplo, envolvendo os serviços públicos e as atividades econômicas em sentidoestrito. Mas a definição de regulação como um fenômeno fático é insuficiente ao estudo do direito. O objeto deestudo do direito regulatório, por princípio, é algo jurídico e, portanto, para os fins do direito regulatório, aregulação, como objeto de estudo, encontra-se vertida no termo regime jurídico regulatório.

O uso do termo regime jurídico regulatório   responde à busca de um significado mais palpável àimprecisão terminológica trazida pelo enunciado da regulação.

Como explica Sueli Dallari, a regulação foi definida, no século XVIII, como um mecanismo técnicovoltado à preservação de uma constante em meio a perturbações exteriores para alcance de estabilidade, por exemplo, um termostato. No século XIX, foi definida como um conjunto de ajustamentos biológicos capazes de

 preservar o equilíbrio dinâmico de um corpo. O século XX trouxe para o termo o significado de mecanismo promotor de correções da atuação de um sistema qualquer por intermédio da avaliação dinâmica das informaçõesrecebidas do ambiente regulado. Como teoria dos sistemas, introduziu-se na economia, na sociologia, na ciência

 política e no direito.[159]

 Na economia, o conceito de regulação tomou matiz próprio ao encobrir a característica sistêmica

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 propriamente reguladora sob o significado projetado a partir do final do século XIX de atividade estatal voltada a

suprir as falhas de mercado.[160]

  Já, na tradição anglo-saxã, o significado de regulação foi apropriado como oconjunto de atos de controle e direção , assim entendidos como normas legais e outras medidas de comando e

controle de intervenção pública sobre o mercado.[161]

 Em âmbito internacional, o Bando Mundial assimilou esseúltimo significado da regulação como controles impostos pelo governo sobre aspectos de negócios , distinguindo-

os da propriedade estatal dos meios de produção e da atividade de fomento por incentivos fiscais.[162]

  Aregulação, portanto, internaliza em seus enunciados jurídico-administrativos, direta ou indiretamente, acaracterística de atuação gerencial da administração, que se torna visível no direcionamento do setor por interferências estatais ponderadas pari passu e por constante reavaliação da pertinência entre o caminho seguido pelo ambiente regulado e os direitos afetados. O mercado e os seus senhores jurídicos – a livre iniciativa e a livreconcorrência – podem ser itens diretores de parcela da atuação regulatória, mas não se apresentam como

 princípios jurídicos exigíveis para o conjunto das atividades reguladas.[163]

A regulação, portanto, enquanto regime jurídico regulatório, apresenta-se como um conjunto de

disposições normativas e administrativas caracterizadas por seu caráter conjuntural de influência ou controle[164]

sobre o ambiente regulado mediante batimento entre resultados esperados e resultados efetivamente alcançados. Omecanismo regulador  presente na origem terminológica da regulação apresenta-se como um diferencial do regime

urídico regulatório, revelando-o como um conjunto de atuações normativas e administrativas capazes de interagir ari passu  com os rumos efetivamente detectados no ambiente regulado para redirecioná-lo aos deveres

normativos de concretização dos direitos fundamentais.

O regime jurídico regulatório transparece, portanto, o conjunto de produções não só normativas[165]

,mas administrativas de diuturna reconfiguração   do ambiente regulado, como também do formato estatal deataque aos problemas nele detectados, entendida a indispensabilidade de atuação estatal no que se refere à preservação dos princípios do serviço público, mediante políticas regulatórias ínsitas aos princípios jurídicos

inscritos na ideologia constitucionalmente adotada.[166]

  Dita diuturna reconfiguração é voltado tanto para oambiente regulado quanto para a própria conformação estatal interventora, na medida em que a projeção da

atuação estatal regulatória parte do pressuposto de atuação dinâmica e proativa governamental, ou seja, daconsciência, por parte do governo de plantão, de que sua atuação é necessária à concretização dos direitosfundamentais. O depoimento de George Soros sobre a crise financeira iniciada em 2007 e resultante do déficitregulatório do sistema financeiro norte-americano dirige-se ao cerne da questão ao defender a necessidade de um

 governo que acredite no governo[167]

, vale dizer, de um governo que acredite no seu papel decisivo eimprescindível para aperfeiçoamento do sistema democrático e das relações econômicas a ele subjacentes. Emoutras palavras, a regulação integra o modo de ser da liberdade democrática ao representar a convicção de quenão existe uma região de atividades econômicas livre de leis; não há um setor desregulado no sentido preciso da palavra. Uma sociedade pautada na liberdade não significa uma sociedade avessa à regulação. Mesmo Friedrich

Hayek confirma a onipresença da regulação em qualquer modelo estatal.[168]

Dentre as categorias de atuação estatal reveladas no estudo do regime jurídico regulatório, encontram-

se: fomento, regulamentação, monitoramento, mediação, fiscalização, planejamento[169]

  e ordenação da

economia;[170]

 gerenciamento normativo de conflitos;[171]

 regulamentação de atividades inseridas em âmbito de

competência estatal;[172]

  ordenação da atividade econômica[173]

, inclusive da atividade monopolista[174]

;outorga de serviços e autorização de uso de meios para universalização ou expansão geográfica, enfim, atividadesde índole normativa e administrativa úteis, sob o ponto de vista individual, e necessárias, se vistas em conjunto, aoacompanhamento e redirecionamento de atividades econômicas em sentido amplo. A composição das funçõesnormativa e administrativa em um ambiente de acompanhamento e controle é, em síntese, o diferencial deautonomia do ramo de estudos do direito regulatório.

A regulação, em síntese, é a presença de regras e atuação administrativa ( law and 

overnment )[175]

 de caráter conjuntural pautadas no pressuposto de diuturna reconfiguração das normas deconduta e dos atos administrativos pertinentes para a finalidade de redirecionamento constante docomportamento das atividades submetidas a escrutínio, tendo-se por norte orientador parâmetros

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regulatórios definidos a partir dos enunciados de atos normativos e administrativos de garantia dos direitosfundamentais.

Traduzindo-se o enunciado da regulação em termos práticos, a regulação, por exemplo, do ServiçoTelefônico Fixo Comutado – atividade submetida a exame e acompanhamento estatal minucioso – faz-se por intermédio de disciplina normativa infralegal da Agência Nacional de Telecomunicações (resoluções), e por atosadministrativos pertinentes, tais como autorizações, concessões, atos de fiscalização, monitoramento e mediaçãode disputas, segundo parâmetros de comportamento das atividades reguladas derivados do enunciadoconstitucional dos direitos fundamentais à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,

minudenciados nas políticas públicas setoriais emanadas da normatização secundária do Ministério dasComunicações (portarias ministeriais) e da Presidência da República (decretos presidenciais), em prol do objetivode maior aproximação possível entre a prestação efetiva do serviço e a prestação do serviço esperada da integralaplicação de regras e princípios jurídicos. A regulação apresenta-se como o rol de atividades de reorientaçãodiuturna dos atores setoriais – governo, empresas, usuários/consumidores, cidadãos e estrutura regulatória – rumoà maior sintonia possível entre o modelo ideal de funcionamento do ambiente regulado ordenado pelo Direito e oefetivo comportamento das atividades reguladas. Regulação é a reconfiguração conjuntural do ambienteregulado voltada à consecução de um modelo ideal de funcionamento do sistema e dirigida por regras eprincípios inscritos e espelhados nos direitos fundamentais.

 No presente contexto regulatório brasileiro inaugurado em meados da década de 1990, o rol deinstituições jurídicas características da regulação resume-se aos conceitos de  gerenciamento normativo darealidade, outorgas de serviços, controle de meios, assimetria regulatória   e fiscalização. Todos eles sãocompatíveis com a dinâmica vislumbrada na evolução do direito administrativo para o acompanhamento cotidianodas transformações nas atividades de interesse público. Eles, todavia, não esgotam o substrato de estudo do direitoregulatório, que se projeta para além de atividades de intervenção indireta no mercado e alcança, como se viu,atividades de fomento, de planejamento, de intervenção direta, enfim, a interferência estatal em atividadeseconômicas lato sensu. Regulação, enfim, é intenção de direcionamento conjuntural da atividade econômica no Estado.

Tais instituições regulatórias – regulamentação, monitoramento, fiscalização, planejamento,ordenação, fomento, outorgas, alocação de meios – abrem espaço para políticas públicas que não estejamintegralmente entregues, por exemplo, ao ideal de otimização funcional por intermédio da concorrência. Uma

teoria jurídica de caráter generalizante não serviria a seus propósitos se inviabilizasse sua adequação a tipos deregulação fundados em pressupostos de política pública distintos. Em outras palavras, não se pode propor umateoria jurídica da regulação  que esteja comprometida com ideais, sejam eles de competição ou de monopólio, demercado ou de planificação estatal, mas como instrumento de reunião dos sucessos e fracassos das políticas públicas de fontes ideológicas distintas. A teoria jurídica da regulação serve como seara de discussão e deorientação a quem não se rende a argumentos unificadores e destruidores da diversidade de pontos de vista, que écaracterística do estudo científico.

Para compreensão dos princípios e das instituições regulatórias, é essencial a pesquisa sobre ohistórico regulatório brasileiro em geral.

 

2.5 REGULAÇÃO VERSUS  DESREGULAÇÃO

 O estudo da regulação nos obriga a cogitar dos nossos pressupostos jurídicos. Enquanto juristas,

temos a consciência de que o esquema de forças sociopolíticas detém um componente normativo subjacente, ouseja, de que a realidade de forças sociais, como a vemos hoje, assenta-se em pressupostos de convivência social eem pressupostos estritamente jurídicos, como os conceitos de propriedade, de igualdade, de liberdade.

Quando a regulação é lançada para discussão como a presença organizada do Estado em setoresrelevantes, há o natural questionamento originado de concepções de eficiência econômica, de que a interferênciaestatal deveria se restringir ao mínimo necessário para preservação da esfera de atuação livre do particular no

mercado. A vulgarização dessa concepção econômica leva, indevidamente, à conclusão de que uma opção de política pública setorial poderia ser a desregulação do setor para que o mercado caminhe livre, mas essa não éuma proposta que se sustente quando se parte do pressuposto de que o que se considera como mercado, hoje, não passa de um produto normativo, protegido por direitos de propriedade, de igualdade, de liberdade. Em outras palavras, o substrato dos modelos de negócio, da eficiência e da possibilidade de sucesso do próprio mercado, é

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um conjunto complexo de disposições normativas que garantem, às expensas dos tributos de toda a sociedade, alucratividade e a própria viabilidade de um setor de atividades.

 No setor de atividades mais festejado como a forma de organização social do século XXI – a chamada

sociedade da informação, do conhecimento ou de rede[176]

  – é ainda mais evidente que a lucratividade dosnegócios do setor depende primordiamente dos pilares jurídicos de proteção dos direitos de propriedade afirmadosna normatização setorial e garantidos por caras estruturas executivas e judiciárias de fiscalização e aplicação dodireito.

A desregulação eventualmente proposta em um determinado setor de atividades relevantes significa, portanto, não a extinção da regulação, mas a diminuição de apenas uma dimensão da regulação estatal, que é aque procura dirigir o mercado ou impor compensações pelos benefícios garantidos pelo Estado para quem neleopera negócios. O primeiro pressuposto, portanto, quando se trata de discutir a regulação é o de que ao se propor a desregulação de um setor, o argumento por detrás da desregulação nunca poderá ser o de que o setor funcionaria melhor sem intervenção estatal. O fundamento para a chamada desregulação resulta, pelo contrário, deuma ponderação sobre os ganhos sociais oriundos da atitude de diminuição da regulação estatal voltada àcompensação social ou à orientação do mercado. O afastamento do Estado dessas espécies de regulação somentese justifica se comprovada que a abstenção estatal no direcionamento do setor regulado rumo à compensaçãosocial e à eficiência do mercado resultaria em maior eficácia dos direitos fundamentais envolvidos. Não faz parte, portanto, do discurso jurídico, a cogitação da desregulação como um fenômeno apoiado no argumento de que um

setor de atividades relevantes tem seu valor e eficiência diminuídos pela simples existência da regulação: um setor de atividades relevantes é um produto da regulação jurídica.

O exemplo da internet é marcante quando se trata de evidenciar a insuficiência da afirmação domercado como um ente vivo inteligente e eficiente, ao invés de entendê-lo como um produto da atuaçãoregulatória, ou seja, de atuação concertada e inteligente do ambiente político-jurídico capaz de formatá-lo em benefício dos direitos fundamentais. Se não fosse uma atuação governamental ativa, o mercado teria enterrado o

 projeto que deu vida à internet, deixando o mundo preso na idade do papel .[177]

 Por diversas vezes, o governonorte-americano e um centro de pesquisa europeu tentaram convencer a iniciativa privada a encampar o projeto darede mundial de computadores, mas a resposta foi unânime de que, na década de 1970, o projeto não diriarespeito aos negócios de interesse de uma grande empresa de telecomunicações, a AT&T, e, mais tarde, na década

de 1980, já com a World Wide Web, seria um sistema “muito complicado”. Em outras palavras, a lógica dainiciativa privada expressou sua visão da internet como um negócio não correlato ao das telecomunicações. Senão fosse o investimento governamental em estudos universitários e a necessidade de uma rede eletrônica deinformações para o desenvolvimento de tais estudos, o mundo não teria a feição marcante da idade da internet  edo seu substrato econômico: a sociedade-rede.

 

REGULAÇÃO NO BRASIL 

3.1 FASES DA REGULAÇÃO NO BRASIL

 Uma visão histórica das fases de regulação dos serviços públicos no Brasil sofre estudo aprofundado e

responsável em Aguillar [178]

 e compõe passo fundamental à compreensão do período atual de conformação daregulação operacional e normativa brasileira.

Do Brasil Colônia ao Primeiro Império, vigorou um modelo regulador de serviços públicoscomprometido com a concepção patrimonialista de Estado. Daí se identificar com a fase da regulação

patrimonialista, “sinônimo de apropriação do Estado por seus governantes”[179]

, cuja legitimidade  esteve

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apoiada na probabilidade  de reconhecimento  de uma estrutura de autoridade[180]

  representada, no Brasil, pelocaráter tradicional  de legitimidade advinda da pessoa do governante assentada na devoção aos costumes. Issotudo transparecia, nessa fase, um momento em que se entendia o próprio Estado como propriedade privada dosoberano e, portanto, remetia a extensão da regulação à vontade subjetiva do detentor do poder político. A prestação dos serviços públicos, nessa fase, é pequena e sua evolução aponta para a correlação entre o fenômenoda prestação de serviços públicos  e o da urbanização do país: construção de edifícios públicos civis e militares;medidas de saneamento básico; serviço de iluminação pública; serviço de correios e telégrafos; serviços bancários,com o Banco do Brasil, em 1808. Em grande parte, as atividades eram puramente controladas por regulação

normativa sem intervenção direta estatal portuguesa. A única atividade oficial era a chamada  feitoria, que visavaexploração da madeira para a indústria têxtil européia. O pau-brasil estava submetido a regime de monopólio português, utilizando-se dos mecanismos jurídicos da concessão e do arrendamento para a sua exploração. OBrasil Colônia, portanto, é caracterizado como período de regulação por descentralização operacional – prestaçãode serviços afastada do Estado – e por centralização normativa – concentração de normatização sobre atividadesreguladas –, reforçando-se a idéia de privilégio  e monopólio  estatal de todas as atividades relevantes. Amanifestação de descentralização da regulação operacional somente se justificava, então, pelo desinteresse do

governo português em viabilizar, com recursos próprios, a colonização do Brasil.[181]

A fase de regulação desconcentrada  sucedeu a de regulação patrimonialista e está situada doSegundo Império até os anos 30 do século XX. O liberalismo econômico desempenhou seu papel, imprimindo a

idéia de regulação normativa descentralizada, ou, em outras palavras, de desregulamentação da atividade

econômica[182]

. Da mesma forma, esse movimento também surtiu efeitos na regulação operacional, que passou aser descentralizada com intensa participação de capital estrangeiro. A idéia do liberalismo econômico extremadode que tudo que o Estado faz, faz mal, e mesmo que fizesse bem, mal faz, serviu de fator de contenção da

interferência estatal tanto normativa quanto operacional à exceção das ferrovias e da infraestrutura portuária.[183]

Da década de 30 ao final da década de 80 do século XX, o advento progressivo do Estado Sociallegitimou o controle estatal dos serviços de interesse público em face da derrocada do modelo de economia demercado abstencionista e abriu espaço para a fase de regulação concentrada, cujos postulados também estavamafinados com a irrupção do nacionalismo, que, por sua vez, desempenhou relevante papel na concentração de

setores como o de energia elétrica e o de telecomunicações. Em termos jurídico-positivos, foi a primeira referênciaconstitucional ao regime das concessões expressa no art. 137 da Constituição Federal brasileira de 1934

[184]. A

legislação federal genérica sobre o regime jurídico da concessão, no entanto, teve de aguardar a Lei 8.987, de1995, muito embora regulamentações específicas já fossem implementadas desde então. Na década de 30, oregime da concessão foi transformado, tolhendo-se a garantia de juros mínimos ao concessionário mediante o art.

142 da Constituição Federal brasileira de 1934[185]

. Outras referências históricas evidenciam a mudança de perspectiva regulatória como evidencia a edição do Código das Águas (Decreto 24.643/34) e a criação das primeiras ‘agências’ estatais no Período Vargas, como órgãos de implementação de planejamento e fiscalizaçãodas políticas setoriais: Conselho Nacional do Petróleo; Conselho Nacional de Águas e Energia Elétrica;Departamento Nacional da Produção Mineral; Departamento Administrativo do Serviço Público; Coordenação de

Mobilização Econômica; Departamento Nacional de Estradas de Rodagem; Departamento Nacional dos Portos;Comissão Administrativa de Defesa Econômica, embrião remoto do atual Conselho Administrativo de DefesaEconômica; Inspetoria de Obras Contra as Secas. A  fase de regulação concentrada , enfim, foi caracterizada comode regulação centralizada operacional e normativa. Já com a volta de Getúlio Vargas, em 1951, ocorreu o que seconvencionou chamar de inversões estatais  em energia elétrica com a paulatina estatização do setor mediante a

criação da Eletrobrás. Os setores de telecomunicações[186]

, energia, transportes, correios e saneamento básicoforam intensamente regulados já durante o Governo Militar tanto normativa como operacionalmente.

A fase seguinte é a do Estado Regulador, em que as posturas clássicas do Estado Mínimo  (liberal) e

do Estado Provedor  (intervencionista) abrem espaço para o ideal contemporâneo[187]

 de menor intervencionismo

direto e maior intervencionismo indireto, ou, em outras palavras, regulação operacional descentralizada eregulação normativa centralizada e qualificada pela delegação de poderes ao ente regulador, separando-se as

figuras do controlador  e do prestador .[188]

 Nesta fase, tomou força o princípio da subsidiariedade, gerando outro termo designador daquele

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momento histórico: o Estado Subsidiário, cujas diretrizes apontam para a revalorização da autonomia individualem detrimento do controle social, para a abertura de espaços nas instituições públicas de participação direta dasociedade, para fomento e regulamentação das atividades privadas, visando otimizar seu sucesso, e para a promoção de parcerias entre o público e o privado como auxílio à viabilização de atividades antes fora do alcance

deste último.[189]

O marco normativo dessa transição para o Estado Regulador encontra-se no início do processo

descentralizador [190]

, no Programa Nacional de Desburocratização do final da década de 1970, objetivando

dinamizar e simplificar o funcionamento da Administração Pública Federal [191]. Na década seguinte, o Decreto95.886, de 29 de março de 1988, deu novo impulso, transferindo “para a iniciativa privada determinadas

atividades econômicas exploradas pelo Poder Público”[192]

. O preceito ditado pelo art. 173, da ConstituiçãoFederal de 1988, de limitação da interferência do Estado na atividade econômica, exceto se presentes imperativosde segurança nacional   ou relevante interesse coletivo,   forneceu o arcabouço normativo para a introdução doPrograma Nacional de Desestatização por intermédio da Medida Provisória 155/90 convertida na Lei 8.031, de 12de abril de 1990. As forças políticas favoráveis ao novo modelo de política de descentralização encontraramambiente favorável para aprovação das Emendas Constitucionais números 6, 8 e 9, de 1995, que possibilitaram aabertura dos setores de petróleo e telecomunicações ao capital estrangeiro e à iniciativa privada nacional mediante

 privatização de empresas estatais com a venda dos ativos públicos em telecomunicações.[193]

A partir de então, a assimetria regulatória foi eleita a palavra de ordem para viabilizar a convivência

dos conceitos de competição  (ou mais propriamente, ambiente concorrencial [194]

) e da universalização. Talassimetria, em termos gerais, significa a distinção de tratamento regulatório entre os participantes operacionais dosserviços públicos e das atividades a eles conexas. De um lado encontram-se os prestadores de serviços públicossujeitos ao regime de direito público e, por isso, carregando ônus maiores para implementação dos seus objetivos;de outro lado, os prestadores de serviços em regime privado. Na relação entre eles, a assimetria regulatóriadesenha um parâmetro de competição, que exige diferença de tratamento normativo para possibilitar isonomiaentre prestadores de serviços em regime público e privado. Essa nova estrutura regulatória ampliou a viabilidadedo controle social da prestação de serviços públicos em virtude da abertura inserida nas estruturas das atuais

agências reguladoras. Todas estas modificações na concepção de prestação de serviços e controle de atividadesainda foram acrescidas das inovações da Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998 – a conhecidaReforma Administrativa –, em que os conceitos de eficiência ,  produtividade,  participação popular   e autonomiaviabilizaram novas formas de relação do Estado com órgãos, com entidades da administração direta e indireta, oumesmo, com pessoas de direito privado, mediante contratos de gestão e fixação de metas de desempenho.

 

3.2 ESPÉCIES DE REGULAÇÃO

 A regulação, assim entendida como atuação normativa e administrativa diuturna para reconfiguração

do ambiente regulado, pode se apresentar em três categorias, a depender do critério de segmentação do que se pretende regular. Fala-se, assim, em regulação regional, geral ou setorial.

Entende-se como regulação regional  aquela voltada ao controle de atividades econômicas lato sensu,tendo em conta a divisão espacial federativa de poder político. Dita regulação regional pode ser identificada, no

sistema brasileiro, nos regimes especiais de tributação .[195]

  Neles, a intervenção por indução  reflete uma

regulação que leva em conta a disposição espacial de poder político.[196]

 Trata-se também de regulação regionalo chamado federalismo fiscal   direcionado às regiões menos desenvolvidas com base na distribuição de

 percentuais do valor de certos impostos a fundos de desenvolvimento dessas regiões.[197]

Já, a regulação geral   destina-se a implementar o controle estatal sobre a totalidade da economiaindependentemente da consideração de regiões ou setores

[198]. A regulação geral está desconectada de setores da

economia, desligando-se de um rol de prestações   setoriais específicas, devendo, portanto, ser encarada comoregulação de áreas de interesse estatal, como é o caso das opções políticas geradoras do regime jurídico doconsumidor, da concorrência e do meio ambiente. Podem ser visualizadas, no Brasil: em certos entes reguladores

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estaduais e municipais[199]

; nos mecanismos de controle da concorrência direcionados a todos os setores da

economia[200]

; nos mecanismos de proteção do consumidor; nas propostas sobre agência reguladora do meio

ambiente[201]

; e nos demais instrumentos fixadores de pautas em subsistemas jurídicos[202]

.

Finalmente, a regulação setorial  diferencia-se das demais por operar em determinados segmentos deatividades definidas convencionalmente como afins. Temas como educação, saúde, telecomunicações, energia, petróleo, transportes, recursos hídricos, sistema financeiro, dentre outros, justificam a referência setorial. A

regulação setorial é, sem dúvida, a mais representativa dos estudos de direito regulatório muito em virtude dacoincidência de sua projeção em conjunto com as reformas estruturais do Estado brasileiro de meados dadécada de 1990.

Exemplos históricos de entes estatais voltados à regulação de setores, ou à regulação de atividadesespecíficas de setores, todos de interesse público, demonstram que este tipo de regulação não é recente no Brasil:Comissariado de Alimentação Pública, criado em 1918, de funções emergenciais voltadas a racionalizar asdificuldades de abastecimento advindas da primeira guerra mundial; Instituto de Defesa Permanente do Café,criado em 1923 e sucedido primeiramente pelo Conselho Nacional do Café, de 1931, e em seguida, pelo

 Departamento Nacional do Café, de 1933, até o aparecimento da autarquia de regulação econômica[203]

denominada  Instituto Brasileiro do Café – IBC , em 1952

[204]

;  Instituto do Açúcar e do Álcool – IAA, tambémuma autarquia de regulação econômica, criada em 1933

[205];  Instituto Nacional do Mate, de 1938; Instituto

 Nacional do Sal , de 1940; Instituto Nacional do Pinho, de 1941; Departamento Nacional de Energia Elétrica – 

 DNAEE , de 1968[206]

, cujas funções foram assimiladas pela ANEEL; Conselho Nacional do Petróleo – 

CNP [207]

. A eles, são acrescidas as atuais agências reguladoras federais[208]

: AEB[209]

; ANATEL[210]

;

ANEEL[211]

; ANP[212]

; ANVISA[213]

; ANS[214]

; ANA[215]

; ANTT[216]

; ANTAQ[217]

; ANCINE[218]

. Omodelo brasileiro tem semelhança com modelos de regulação setorial implantados em outros países. No Reino

Unido: OFWAT[219]

; OFCOM[220]

; OFGEM[221]

. Nos Estados Unidos da América: ICC[222]

; FCC[223]

;

FERC[224]. Na Alemanha: Bundesnetzagentur [225]; entre vários outros. O modelo também encontra sintonia no

ambiente internacional: UIT[226]

; OMS[227]

; FAO[228]

; UNESCO[229]

; UPU[230]

; IAEA[231]

, e está apoiadona divisão funcional ligada a conjuntos de temas unidos por um conhecimento técnico-científico específico.

Das espécies de regulação anteriormente apresentadas, a que maior presença institucional obteve nadécada de 1990, em âmbito federal, no Brasil, foi a setorial, revelando a preocupação de reestruturação estatal einvestimento em instituições capazes de promover o preenchimento normativo de diretrizes regulatóriasatualizáveis no ritmo de alteração da própria atividade regulada, ou seja, em instituições capazes de promover àregulação, atuando retroalimentada pelas reconfigurações diuturnas do setor. Visualizado o campo de atividades

que demanda intromissão estatal, seja pela natureza da atividade, seja pela finitude[232]

  do meio de sua

manifestação, ou mesmo pelo dever estatal de otimização do potencial uso de um bem público, as instituiçõesreguladoras passaram a desempenhar papel nuclear na dinâmica organizacional daquelas atividades.

Por força da novidade terminológica das agências reguladoras, o resgate de estruturas administrativasdo passado revelará aspectos mais precisos do formato de regulação setorial adotada no Brasil.

 

3.3 ESTRUTURAS DE REGULAÇÃO SETORIAL

 3.3.1 CONSELHOS ECONÔMICOS 

A partir da década de 1930, surgiram, no Brasil, os assim chamados conselhos econômicos resultantesda ampliação e da especialização das atividades estatais. A origem

[233] da preocupação de criação de conselhos

consultivos para fornecimento de bagagem técnica às decisões políticas foi evidenciada na Constituição Federal brasileira de 1934, que facultou a criação, por lei ordinária, de Conselhos Technicos   e Conselhos Geraes  para

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assistirem os Ministérios, chegando mesmo a vincular a deliberação do Ministro de Estado correspondente.[234]

Embora a Constituição de 1934 previsse expressamente o Conselho Superior de Segurança Nacional  (art. 159) eo Conselho Nacional de Educação (art. 152), a repercussão prática da novidade foi tímida, resumindo-se à criaçãodo Conselho Nacional de Educação pela Lei 174, de 1936, e à previsão, na Constituição de 1937 (arts. 57 a 63)do Conselho da Economia Nacional , que não se repetiu nas constituições de 1946 (art. 148, caput ) e 1967 (art.57, VI), inclusive Emenda Constitucional n.1, de 1969 (art. 160, V).

Da imprecisão semântica dos conselhos, podem-se extrair, todavia, certos elementos conceituais como

o da colegialidade de funções, cuja definição weberiana se dá por sua oposição à autoridade monocrática[235]. O plural, o corpo, o coletivo, a reunião, enfim, a assembléia decisória fazem parte do significado histórico dosconselhos. Tais características incrementam o caráter institucional de convencimento e discussão, chegando, no

direito espanhol, a ser erigido à condição de princípio definidor da natureza dos órgãos consultivos[236]

. Acolegialidade permite, assim, maior profundidade  das decisões, que é obtida às custas de maior grau de

imprecisão  e morosidade.[237]

  Ela divide a responsabilidade   da decisão, atomizando-a em manifestações

 parciais.[238]

Pode-se dizer, portanto, que isenção,  profundidade  e morosidade  identificam a forma colegial de

decisão. Entretanto, não depõem, a priori, contra ou a favor do modelo de decisão colegial, mas indicam oslimites para sua manifestação. A presença dos conselhos pode ser vista como uma resposta estatal ao desequilíbriogerado pela especialização do ambiente privado sobre determinados setores tidos por relevantes para o Estado. Oconhecimento especial superior dos interessados atores de um determinado setor da economia, que, por serem partes, são naturalmente facciosos, somente pode ser contrastado mediante a presença de conselhos econômicosno ambiente estrutural do Estado para nortearem a regulação estatal. A existência dos conselhos  segue umaconstatação de Max Weber, de que o conhecimento técnico dos privados é superior ao da burocracia pública. Daía importância de uma estrutura poderosa, especializada e independente para o exercício da atividade regulatória,que tenha acesso ao conhecimento técnico produzido em nível dos conselhos, ou mesmo, em nível acadêmico-

institucional.[239]

Opõe-se a tal constatação de imprescindibilidade dos conselhos, sua imprecisão terminológica econsequente aplicação casuísta.

 No que tange à imprecisão terminológica, tem-se a divisão entre conselhos de especialização,conselhos consultivos e instâncias colegiais controladoras. De um lado, há as corporações de especialização, quesão formadas dentro da estrutura burocrática estatal por técnicos habilitados em razão de seus conhecimentosespeciais. Ditas corporações ombreiam com as corporações consultivas, que, na classificação de Weber, sãoformadas por interessados privados no setor em pauta. Por outro lado, as instâncias colegiais controladoras estão

 presentes nas conformações burocráticas da economia privada, como o conselho fiscal de uma empresa.[240]

Dita classificação, no entanto, não foi absorvida pela prática institucional brasileira, o que não impedea conclusão de que há ao menos duas formas essencialmente distintas de manifestação dos conselhos: os de

 produção de massa crítica para outros atores do processo decisório estatal; e os de influência no processodecisório por parte do diálogo estabelecido entre o Estado e o setor regulado, diálogo este inserido na instituiçãoestatal dos conselhos, ou seja, na possibilidade da interferência dos interessados na escolha dos temas e na soluçãodos problemas referentes ao setor de atividades visado. Seguindo esta classificação, os conselhos integrantes daestrutura estatal diferenciam-se das instâncias colegiais controladoras presentes na economia privada pelo critérioda força das decisões. Os conselhos presentes na economia privada fornecem a própria deliberação perseguida,enquanto os da esfera estatal refletem funções basicamente técnicas e opinativas.

Emerge destas constatações, que o conceito de conselho, embora tenha hoje perdido sua dimensãoinicial, tem sua contribuição de conceito geral do qual derivaram outros atualmente festejados, como o decomissão e o de agência. Antes, os conselhos exerciam função meramente consultiva, mas, com o tempo, algunsdeles foram além em face de sua especialização e de sua condição de complexos perenes  frente a autoridades

efêmeras.[241]

A abertura conceitual do termo conselho  gerou o surgimento de outros termos que denotamvinculação decisória para se contraporem ao aspecto consultivo agregado aos conselhos hoje existentes. Isso nãoquer dizer que todos os conselhos  do Estado brasileiro estejam maculados com a função meramente

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consultiva[242]

, mas esta é, sem dúvida, a característica mais difundida.[243]

O aspecto consultivo dos conselhos inseriu neles a demanda de composição plural para formação de

consenso.[244]

  A participação de diversas tendências e interesses erigiu-os a colaboradores e principaisenriquecedores da discussão implementada em outras instituições decisórias. Isso é melhor visualizado na recente

criação de conselhos no âmbito das agências administrativas reguladoras.[245]

 3.3.2 CONSELHOS VERSUS AGÊNCIAS 

A procura por índices de diferenciação entre os conselhos e as agências esbarra na consciência de queos critérios daí extraídos são muito mais apanhados de aspectos formais reincidentes do que propriamentedistinções de essência entre as duas instituições. Não se pode esquecer a paulatina evolução conceitual dosconselhos, desembocando na imprecisão dos termos que hoje designam as instituições estatais de controle. Masesta constatação não chega ao ponto de desmerecer divisões didáticas, que existem para possibilitar a melhor visualização do contexto conceitual de conselhos e agências.

Desse modo, no tocante ao seu funcionamento, os conselhos estão voltados à solução de questõesespecíficas em razão das quais houver sido suscitada sua reunião, enquanto as agências possuem um quadro permanente destinado a funcionamento ostensivo. Por isso, em geral, os membros de conselhos não se afastam de

outras funções na esfera pública ou privada, ao passo que se exige, dos membros de agências, especial dedicação

à atividade que lá desempenham.[246]

  A personalidade jurídica de direito público interno é da essência dasagências administrativas, enquanto os conselhos, em geral, consubstanciam-se em órgãos, portanto, centros decompetências despersonalizados do Estado. Enfim, a agência, enquanto terminologia, surgiu, no Brasil, na décadade 1990, respondendo a uma demanda de precisão terminológica das colegialidades funcionais de caráter regulatório, que eram relegadas a adotarem os conceitos de conselhos ou comitês e que, assim, não transpareciam,

de imediato, suas referidas peculiaridades, sofrendo, como sofriam, ingerência política acentuada.[247]

 O caso doConselho Nacional de Telecomunicações (CONTEL) é exemplo de conselho criado com características autônomas

d e comissão interministerial [248]

, ou mesmo, de órgão similar à Federal Communications Commission   (FCC)

norte-americana[249], que foi sendo progressivamente esvaziado e suplantado pela Administração direta doEstado.

Com isso, pode-se definir agência administrativa como uma autarquia[250]

 especial identificada comoinstituição estatal de regulação operacional ou normativa, que passou a integrar os aspectos estruturais eorganizacionais do Estado para fins de especialização, celeridade e maior autonomia decisória. Tais característicasdas agências administrativas vêm mensuradas para que sua atuação, embora protegida da influência variável da política de governo, permaneça vinculada à política de Estado, pois os aspectos de segregação da agência frenteao Estado somente se justificam para o alcance da finalidade de sua existência, qual seja, a desobstrução do

ormalismo burocratizante de seus procedimentos[251]

, desde que instrumental ao cumprimento dos fins públicos

que qualificam uma autarquia.

As agências administrativas dividem-se em duas modalidades no Brasil: agências executivas; eagências reguladoras. Destas, as agências reguladoras alcançaram  status  evidente na organização (aspectodinâmico) e estruturação (aspecto estático) do Estado brasileiro de finais do século XX.

 3.3.3 AGÊNCIAS EXECUTIVAS VERSUS AGÊNCIAS REGULADORAS 

Previstas na segunda metade da década de 1990[252]

, as agências executivas  significam um signo,sinal, insígnia, rótulo, enfim, um símbolo identificador da regulação operacional descentralizada. O nome‘executiva’   indica que suas atribuições não são normativas, mas operacionais. Sua criação busca administrar 

 políticas públicas em matéria de serviços públicos, diferenciando-as das agências reguladoras, que se preocupamtambém com o preenchimento normativo secundário a partir das políticas públicas oriundas do processolegislativo primário. O foco das agências reguladoras, portanto, é a regulação normativa. A diferença entreagências executivas e reguladoras é, portanto, funcional.

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Agências executivas são autarquias e fundações públicas federais[253]

 que se candidatam a receber ainsígnia de agência executiva, mediante submissão a um contrato de gestão, onde se estabelecem metas a seremalcançadas mediante apresentação de um plano estratégico de reestruturação e desenvolvimento e níveis dequalidade na prestação de serviços a usuários. A formação da agência executiva implica  processo interno de

autonomia[254]

. O rótulo de agência executiva, no entanto, não transforma a natureza da pessoa jurídica de

direito público interno, que continua como autarquia ou fundação pública[255]

. O que ocorre é que estasautarquias ou fundações públicas com status de agências executivas são destinatárias de mais um rol de normasque estabelecem prerrogativas especiais derivadas da lei e que não derrogam o regime público – e nem poderiam –, mas amenizam as limitações intestinas à própria estrutura hierárquica da Administração Pública, refletindo-se, por exemplo, na maior autonomia para abrir concursos, desde que haja vagas e recursos disponíveis, podendoeditar regras próprias de avaliação dos servidores para progressão funcional, além da impossibilidade, por parte doExecutivo, de contingenciamento de recursos. Em troca desses benefícios, surgem deveres específicos daautarquia para com o poder central, deveres estes derivados do contrato de gestão firmado. Por isso, a agênciaexecutiva, em si mesma, não é exceção ao regime público, desde que compreendida a extensão do que pode vir a

ser tratado no contrato de gestão. As críticas[256]

  dirigidas às agências executivas, portanto, não revelamincoerência de concepção, mas evidenciam o risco da utilização de seu conceito para ultrapassagem de fronteirasimpostas pelo regime público.

A novidade no sistema das agências executivas está na sua íntima conexão com as propostas recentesde compromisso  da própria entidade da administração indireta com o poder central e de aferição de resultados

como requisito de sua sobrevivência[257]

, algo caro à proposta, cuja tramitação se iniciou no Congresso Nacionalem 2004, para aplicação do contrato de gestão também a todas as agências reguladoras brasileiras. A criação deuma agência executiva, enfim, por se tratar tão-somente de signo aposto a uma entidade de direito público preexistente, depende de Decreto do Presidente da República, após o processo previsto na Lei 9.649/98, cuja primeira concretização ocorreu na qualificação do Instituto Nacional de Metrologia, Normatização e QualidadeIndustrial (INMETRO) como agência executiva, por meio do Decreto sem número de 29 de julho de 1998.

Por outro lado, como instituições de regulação, em regra, setorial, as agências reguladoras  ou agências

reguladoras e fiscalizadoras brasileiras[258]

  surgiram como mecanismos reguladores normativos, que operam

com poderes de supervisão, fiscalização e normatização[259]

 de atividades, sendo dotadas de maior agilidade naimplementação de políticas públicas em razão de sua estrutura especializada. Foram um novo passo no  processo

descentralizador [260]

 da Administração Pública, que se diferenciou dos anteriores pela visível postura de maior desvinculação de suas decisões frente a pressões políticas, como também à tentativa de redirecionamento da política regulatória para os interesses dos usuários dos serviços concedidos, permitidos ou simplesmentefiscalizados.

A inserção dos serviços em um regime especial, que partilha a competição com os desígnios sociais,fez com que as agências reguladoras brasileiras desempenhassem três tipos de regulação: regulação dos serviços

úblicos, que são de titularidade do Estado; regulação das atividades econômicas stricto sensu , que são detitularidade dos particulares; e regulação social , mediante vinculação do setor ao dever de generalidade dosserviços, de cumprimento da função social da propriedade afeta ao serviço, ou mesmo, de potencialização do usode bens públicos essenciais ao serviço regulado. Como se pode notar, as categorias regulatórias variam, mormentesegundo critérios de escopo da atividade reguladora: regional, geral, setorial, sobre serviços públicos, sobreatividades econômicas em sentido estrito, rumo à princípios de regulação social, dentre outros.

A singularidade das agências reguladoras na estrutura administrativa do Estado brasileiro não estáisolada como política pública, mas inserida no flanco de um movimento de objetivos mais abrangentes, cujacompreensão é exigida para formação de visão multifacetada sobre este fenômeno estatal.

Por detrás da criação das agências reguladoras, há política pública voltada à consecução de medidas

que aumentem a atratividade do mercado brasileiro para o financiamento de infraestrutura. Em outras palavras, aintrodução do modelo de agências reguladoras na Administração Pública brasileira resultou da identificação de um

déficit de regulamentação traduzido nos seguintes aspectos[261]

, cuja concretização persegue: política tarifáriadefinida e estável; marcos regulatórios mais claros, que detalhem as relações entre os diversos atores de cadasetor, seus direitos e obrigações; mecanismo ágil e eficiente para a solução de divergências e conflitos entre o

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 poder concedente e a concessionária; garantias contra os riscos econômicos e políticos dos investimentos emsetores econômicos. Ditos aspectos contribuíram para a criação de entes reguladores setoriais dotados de atributosde especialidade, imparcialidade e autonomia decisória. As novas características de maior autonomia e promoçãodos interesses dos usuários são, portanto, comumente esclarecidos por sua motivação de aproximação ao mercado

e de incentivo à competição, argumentos estes que fugiriam à tradição jurídico-institucional brasileira.[262]

O modelo adotado na década de 1990, no Brasil, entretanto, não se rende a dita simplificação. Nem

mesmo a afirmação de semelhança entre dito modelo e o praticado nas commissions[263]

 norte-americanas[264]

,

inicialmente esboçadas nas chamadas railroad commissions[265], é convincente, já que o pressuposto existenteno modelo brasileiro de titularidade de grande gama de atividades prestacionais pelo próprio Estado não encontra,segundo uma abordagem jurídico-formal, similar no modelo norte-americano.

Pode-se, entretanto, afirmar que as agências reguladoras servem como modelo regulador alternativo àregulação pelo próprio mercado   ou à regulação por intermédio de contratos administrativos . As agênciasreguladoras vieram nesse contexto de satisfação da demanda por prestação de serviços públicos e fiscalização deserviços privados mediante regulação. Enfim, o modelo brasileiro de agências reguladoras assimila, em umamesma estrutura administrativa, duas formas de regulação de setores, quais sejam: controle de andamento dasatividades setoriais pelas agências; transferência da prestação dos serviços públicos de um determinado setor paraempresas privadas e sua consequente regulação por intermédio de contratos administrativos acompanhados  pari

assu por estruturas dotadas de conhecimento técnico.

O ano de 1995 foi decisivo para introdução do modelo de agências reguladoras no Brasil e a Lei Geralde Concessões e Permissões (Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995) foi um marco fundamental, que, coerentecom o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado  proposto pelo Executivo em 1995, determinou, no seuart.29, I, ser incumbência do poder concedente regular e fiscalizar o serviço concedido e, no art.30, previu que afiscalização do serviço seria feita por órgão técnico do poder concedente ou por entidade com ele conveniada e, periodicamente, por comissão  composta por representantes do poder concedente, da concessionária e dosusuários. Um parêntese para retomada do tema das comissões, que em nada se aproximam das commissions norte-americanas, para que se evidencie que, no Brasil, elas têm caráter de ajuste periódico dos interesses em jogo, possibilitando um ambiente interativo de construção de soluções e de levantamento de problemas. Afiguram-se,

 portanto, em meio de sensibilização da agência reguladora para questões relevantes na óptica dos partícipes do processo, como também em meio para alcance de consenso na diversidade.

 Não foi somente a Lei Geral de Concessões e Permissões que marcou o ano de 1995. As modificaçõesconstitucionais foram decisivas e transpareceram, basicamente, não-discriminação entre capital nacional einternacional aliado à abertura para o controle privado de atividades antes reservadas ao Estado, como a possibilidade de concessão dos serviços locais de gás canalizado (Emenda Constitucional n. 5, de 15/08/95), aextinção do tratamento diferenciado dado às antes consideradas empresas brasileiras de capital nacional  (EmendaConstitucional n. 6, de 15/08/95), a retirada da referência constitucional à predominância de armadores nacionaise navios de bandeira e registros brasileiros e à reserva da navegação de cabotagem e da navegação interior àsembarcações nacionais (Emenda Constitucional n. 7, de 15/08/95), a possibilidade de concessão, permissão eautorização de serviços de telecomunicações não mais taxados, a priori, de públicos, juntamente com a previsão

de criação de um órgão regulador do setor (Emenda Constitucional n. 8, de 15/08/95) e a retirada da proibiçãodirigida à União de conceder qualquer tipo de participação na exploração de jazidas de petróleo ou gás naturalsimultaneamente à introdução da previsão de órgão regulador do monopólio de pesquisa e lavra de jazidas de petróleo e gás natural, de refinação do petróleo, sua importação, exportação e transporte (Emenda Constitucionaln. 9, de 09/11/95).

Todas essas modificações implementadas pela política pública setorial fizeram com que o sistema brasileiro de regulação migrasse do modelo de estruturas integrantes dos respectivos Ministérios ou da Presidênciada República, com dependência orçamentária e decisória, para um modelo pautado progressivamente natitularidade de instrumentos de regulação e fiscalização setorial por parte de autarquias especiais, com orçamentos

 próprios e relativa autonomia financeira do Poder Executivo.[266]

Dessas considerações preliminares resulta a identificação das agências reguladoras brasileiras comoformas de regulação setorial com personalidade de direito público interno, e função normativa secundária, queexcepcionalmente exteriorizam caráter operacional, como no caso do mecanismo da intervenção, revelando afinalidade de fiscalização da prestação dos serviços públicos concedidos ou permitidos, dos bens escassoscorrespondentes e das atividades privadas afins.

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As agências reguladoras brasileiras passaram por um processo de especialização.[267]

  Elastranspareceram a especialização funcional   exigida por seu objeto de análise e, assim, compõem a equação de

edificação do correspondente subsistema jurídico.[268]

Existem, no Brasil, agências federais, estaduais ou municipais, de acordo com a competência político-administrativa do poder concedente. Visualizando-as a partir da especialização funcional, as agências federaisapresentam-se, hoje, como setoriais, remetendo-se aos setores de telecomunicações, energia elétrica,  petróleo e gás natural , vigilância sanitária, saúde suplementar, recursos hídricos, transportes terrestres, transportes

aquaviários, dentre outros. No campo estadual e municipal, inaugurou-se uma maior presença de agências de

regulação geral , como a ADM[269]

, embora convivendo com agências setoriais, como a AMSS[270]

  e a

CSPE[271]

, ou mesmo, multissetoriais[272]

, tais como ASEP[273]

, AGERGS[274]

, ARCE[275]

, ARCON[276]

,

ARSEP[277]

 e AGERBA[278]

. O modelo estadual tende a formar núcleos de competência setorial específicas emrazão de sua potencial relação de fomento com a União, já que, no modelo brasileiro, a atividade reguladoravinculada à gestão dos serviços públicos pode ser transferida da União para os Estados-Membros da Federação

 por intermédio de convênio[279]

, em face no disposto no art. 241 da Constituição Federal brasileira de 1988, comredação dada pela Emenda Constitucional nº19/98, que autoriza a  gestão associada de serviços públicos, bem

como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. A possibilidade de convênio, no entanto, depende da existência de lei, autorizando a gestão

associada dos serviços pretendidos, como ocorre com o setor de energia elétrica, em que a lei regente[280]

 permite a execução das atividades complementares de regulação, controle e fiscalização dos serviços e instalaçõesde energia elétrica pelos Estados e pelo Distrito Federal, mediante convênio de cooperação. O convênio, por suanatureza, não transfere a titularidade do serviço do ente regulador, que pode retomá-lo a qualquer momento,exigíveis as devidas compensações.

A partir do momento em que foram introduzidas no modelo regulatório brasileiro, as agênciasreguladoras fizeram aflorar o conceito de otimização funcional , que vem exigir dois requisitos para sua

implementação[281]

: autonomia da agência reguladora; e escolha de instrumentos que incentivem a eficiência produtiva e alocativa. Fala-se muito em independência  da agência reguladora, cuja origem tem como referêncianatural a distinção da doutrina norte-americana entre as regular   ou oldline agencies  e as independent 

agencies[282]

, mas para maior precisão terminológica, o ideal seria a utilização do conceito de autonomia, mais

condizente com a necessária interpenetração estrutural do Estado.[283]

  Tal autonomia não deve ser entendidacomo arbítrio do colegiado decisório – autonomia sem vínculo finalístico. Ela é exatamente definida pelo seu fimde promoção do interesse público visualizado preponderantemente, quanto aos serviços, no interesse do usuário eda sociedade  e, quanto à política industrial, de um lado, na eficiência  da atividade regulada e de outro, navinculação da atividade ao fim de incremento do espaço público. Estes fatores, sob um ponto de vista jurídico, prevalecem sobre outros objetivos de maximização do lucro e   concentração de empresas em setores mais

rentáveis do mercado, do ponto de vista das prestadoras, e maximização das receitas fiscais , do ponto de vista doEstado.

[284]

A autonomia característica das agências reguladoras não se restringe à idéia abstrata de menor vinculação política. Ela demanda conformações estruturais e organizações concretas, que se manifestam na

ersonalidade de direito público interno , na autonomia de objetivos, de instrumentos, orçamentária, financeira  en a autonomia decisória, que engloba o processo de indicação e inamovibilidade de seus membros eirrecorribilidade das suas decisões.

O primeiro passo para visualização de um grau de independência das agências está na sua naturezaurídica de pessoa de direito público interno , revelando, assim, seu destaque da Administração direta como

autarquia federal, estadual ou municipal, conforme o ente político – União, Estados-Membros, Distrito Federal ou

Municípios – a que estiver ligada.Argumentos como o descrédito do dirigismo estatal absoluto, a ineficiência e comprometimento

 político das atividades desempenhadas pelas empresas estatais e as pressões internacionais de abertura dos setoreseconômicos são carregados de preconcepções de mundo que valorizam um dos inúmeros aspectos exaltados nomomento histórico da opção pela introdução das agências reguladoras na década de 1990 no Brasil. Eles teriam

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feito com que uma das características apontadas ou desejadas para as agências reguladoras fosse a sua autonomiado poder público central.

Pode-se enunciar, ainda, como outra causa da autonomia das agências frente ao poder público central,a busca por um espaço público, cuja presença somente pode ser sentida quando este não se confunde com osinteresses de governo. Ao controlar o órgão regulador, a Administração Direta do Estado faz prevalecer ointeresse político sobre a eficiência e qualidade da prestação do serviço, sobre o próprio interesse público demodicidade das tarifas e sobre o interesse público no equilíbrio da relação. Apesar da fluidez das análisesesboçadas, sob quaisquer dos pontos de vista citados, a questão da autonomia de gestão da agência reguladora

apresenta-se como a pedra de toque do modelo idealizado no Brasil.Independentemente do acerto ou equívoco das afirmações anteriores, o fato é que a estrutura

desenhada para regulação setorial, no Brasil, permitiu a fixação de um esquema de forças quadripartite: a)rodutor da utilidade pública; b) usuário/consumidor ; c) Poder Público detentor da rede essencial à prestação do

serviço ou titular do monopólio de exploração e, finalmente; d) o próprio ente regulador . O modelo brasileiroosicionou a agência reguladora em local equidistante dos outros três atores do esquema de relativa autonomia. O

ente regulador pode sobrevalorizar um dos outros três componentes, mas o fará sob pena de perder sua condiçãode espaço público de discussão e contato entre os atores setoriais e, portanto, em detrimento da credibilidade perante os demais atores preteridos. O próprio esquema de forças vem simplificado ao extremo, pois nãocontempla a distinção intestina de interesses, por exemplo, aos próprios usuários/consumidores, já que há usuáriose consumidores efetivos e potenciais; há usuários e consumidores assinantes e eventuais. Por exemplo, os usuáriose consumidores efetivos detêm o interesse natural de diminuição tarifária, que poderá levar a diminuir o ritmo deexpansão do serviço para aqueles que ainda não o alcançaram, contrastando, assim, com o interesse dos usuários

e consumidores potenciais.[285]

A complexidade do esquema de forças e, em certos setores, como o de telecomunicações, energia, petróleo e saúde, do expressivo peso do poder econômico, aumenta a preocupação com o conhecido risco decaptura da agência  pelo setor regulado. O esforço em se evitar que as agências passassem a fazer às vezes demeras promotoras do sucesso econômico do setor regulado em detrimento dos valores públicos que as justificaramnão necessariamente resultou na conformação dos mecanismos de controle social visualizados nas agências dadécada de 1990, mas serve como aceno de composição do modelo de regulação setorial para um viés de

 publicização das discussões. Aqui, a valorização do controle social [286]

  previsto nas estruturas centrais de

decisão das agências reguladoras.[287]

 3.3.4 AUTONOMIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS 

 No tocante à relação entre a agência reguladora e o poder público, existem aspectos reveladores doseu grau de autonomia, que auxiliam na compreensão do modelo regulador brasileiro. São eles: o processo deindicação dos membros da agência e de seu afastamento; autonomia orçamentária e financeira; garantia deinamovibilidade de seus membros; irrecorribilidade das decisões de sua competência na esfera administrativa;reserva de poderes normativos suficientes à adequação das metas setoriais à dinâmica de cada atividade.

Iniciando por esse último índice de autonomia, o  poder normativo  das agências reguladoras tratadoacima costuma ser acusado de usurpar função reservada ao Poder Legislativo.  Poder normativo da AdministraçãoPública somente pode existir sob a égide da submissão das atividades das agências reguladoras à lei, ou seja, ànormatização primária. Assim, o poder normativo da agência reguladora não pode ser convertido em criaçãonormativa independente da norma primária sobre a qual se apoia. Por outro lado, a constitucionalidade da leiatributiva de poder normativo à agência reguladora correspondente dependerá da previsão simultânea de“ standards  suficientes” capazes de afastarem a acusação de “delegação pura e simples de função

legislativa”[288]

.

Ao lado da reserva de poderes normativos suficientes à otimização dos interesses envolvidos naregulação setorial, existem outros índices úteis a evitar que a agência seja sufocada pela exiguidade de espaço

 para promoção de estratégias setoriais.Os títulos de independência de uma agência reguladora que a qualificam como tal são: independência

decisória, independência de objetivos, independência de instrumentos e independência financeira . Destacando-sedas nuanças cotidianas das políticas de governo, o Estado implementa políticas públicas por intermédio das

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agências, mas estas não se podem tornar instrumentos do  jogo político em particular .[289]

A independência decisória  consiste em dar condições para que a agência reguladora resista às pressões de grupos de interesse, mediante procedimento compartilhado de nomeação dos dirigentes com participação necessária do Executivo e Legislativo e fixação de mandatos de longo prazo escalonados e nãocoincidentes com o período eleitoral. Associado a isso, encontram-se regras legais definidoras das formas de perdados cargos de direção da agência, visando afastá-la, ao máximo, de interferências indesejáveis  por parte do

governo ou da indústria regulada.[290]

  Esse quadro de proteção expressa dos cargos decisórios das agências

reguladoras podia ser visto na legislação de telecomunicações, em que, para proteção do mandato de seusdirigentes, estipulava, até sua alteração pela Lei 9.986, de 18 de julho de 2000, que somente podiam perdê-lo em

razão de renúncia, condenação judicial transitada em julgado ou processo administrativo disciplinar.[291]

A decisão colegiada produz, em tese, os efeitos já mencionados da colegialidade de funções,atomizando a responsabilidade e impondo maior discussão e oportunidade de participação dos interessados naquestão mediante mecanismos de consulta pública. As decisões do colegiado não estão sujeitas à revisão na esferaadministrativa, submetendo-se, entretanto, à cláusula pétrea brasileira de inafastabilidade da jurisdição.

Para o fechamento do modelo, as regras de preenchimento dos cargos de direção das agências prevêem mecanismos de isenção dos seus ocupantes frente aos interesses privados tutelados, tais como regras

 proibitivas de vínculos dos diretores das agências com os setores regulados[292] e regras de incompatibilidades de

mandatos, que imponham exclusividade na função dirigente da agência[293]

. Um dos mecanismos de proteçãodas agências reguladoras contra a confusão entre interesses privados e os desígnios públicos reguladores encontra-se na quarentena, que visa impedir o recrutamento imediato de dirigentes das agências pelo setor reguladomediante custeio indenizatório do período em que os ex-dirigentes das agências permanecem tolhidos do pleno

desempenho de suas atividades.[294]

Quanto à possibilidade de exoneração  dos diretores das agências reguladoras, o Supremo TribunalFederal brasileiro pronunciou-se liminarmente sobre a questão, posicionando-se pela impossibilidade de

interferência unilateral legislativa na exoneração de dirigentes de agência reguladora

[295]

, exigindo-se, noentanto, justo motivo para afastamento de dirigente de agência pelo Chefe do Executivo em virtude da fixação demandato por lei e da forma complexa de nomeação com participação dos poderes Executivo e Legislativo.

 Independência de objetivos significa a determinação das finalidades da agência em lei, afastando-a dahierarquia administrativa quanto à identificação de pautas de conduta. Eventualmente, essa autonomia pode vir a

ser ampliada mediante um contrato de gestão.[296]

Ainda, a independência de instrumentos  implica o fornecimento de um rol de meios para que aagência reguladora possa dosar a aplicação de sanções com os objetivos perseguidos. A presença da hipótese defixação de multas, de tarifas, extinção da concessão, permissão ou autorização e intervenção na prestadora deserviço público evidencia a preocupação normativa com a disponibilidade de instrumentos eficazes para atuação

direcionada às peculiaridades de cada caso.Finalmente, a independência financeira  manifesta-se na presença de recursos materiais e humanos

compatíveis com as finalidades a serem atingidas pela agência reguladora. Ela é alcançada, em geral, com afixação de taxas de fiscalização, preços de utilização de bens escassos e percentuais de tarifas para formação defundos geridos pelas agências. Mesmo presentes tais entradas de recursos, tem-se verificado a fragilidade de talindependência, tendo-se em vista que, na dinâmica brasileira de orçamento indicativo, há possibilidade decontingenciamento de recursos pelo Executivo.

Há, ainda, dois conceitos que devem ser levados em conta para análise da progressiva autonomia dasagências reguladoras e seus limites. Diferencia-se doutrinariamente autonomia  de autorregulação. A

autorregulação é caracterizada pela gestão de uma atividade pelos próprios regulados.

[297]

 Dar autonomia a umente de direito público interno autárquico para que regule um âmbito de atividades de sua competência ésensivelmente diferente de se prever a gestão de atividades pelos próprios regulados. No Brasil, o setor decomunicação de massa e o setor postal resistem à regulação normativa centralizada acenando com os benefíciosda autorregulação. A substituição da exorregulação – regulação pelo Estado – pela autorregulação sofre críticas

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doutrinárias por levarem à “institucionalização de autênticas corporações de ofício”[298]

, o que afastaria dasinstituições de autorregulação o aspecto de espaços públicos.

O limite da autonomia de setores regulados apresenta-se no conceito de autorregulação, que não

condiz com o poder de polícia exercido pelas agências reguladoras.[299]

Estas exercem regulação de caráter público[300]

, mas inseridas em ambiente autônomo.

O fato de um ente público ter autonomia não desvirtua seu caráter público, pelo contrário, o enfatizamediante sua isenção de interesses políticos momentâneos em nome de interesses políticos permanentes plasmados no texto constitucional e reproduzidos na legislação infraconstitucional. A crítica à progressivaautonomia das agências reguladoras seria pertinente se a independência fosse total. Por isso, embora a legislaçãosetorial brasileira, em geral, fale em independência, o termo jurídico mais apropriado será sempre autonomiaregulatória.

 

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 Revolution. Tübingen: J. C. B. Mohr/Paul Siebeck, 1909. 

SOBRE O AUTOR  

Marcio Iorio Aranha é professor efetivo de Direito Constitucional e Administrativo da Faculdade de Direito da Universidade deBrasília e Visiting Fellow na Annenberg Research Network on International Communication da University of Southern California

(ARNIC/USC). Ele é v ice-presidente da Americas Information and Communications Research Network (ACORN-REDECOM),diretor do Núcleo de Direito Setorial e Regulatório (www.ndsr.org) e coordenador de área jurídica do Centro de Polí ticas, Direito,

Economia e Tecnologias das Comunicações da Universidade de Brasília, onde edita a Revista de Direito, Estado eTelecomunicações (http://www.getel.org/GETELSEER/index.php/rdet). Email: [email protected] . Personal website:

www.marcioaranha.com.

 

ABOUT THE AUTHOR  Marcio Iorio Aranha is tenured Professor of Constitutional and Administrative Law in the School of Law at the University of Brasiliaand Visiting Fellow at the Annenberg Research Network on International Communication at the University of Southern California

(ARNIC/USC). He is vice-president of the Americas Information and Communications Research Network (ACORN-REDECOM). Hecoordinates the Center for Sectorial and Regulatory Law (www.ndsr.org) and is the principal law researcher at the Center for 

Communication Policy, Law, Economics, and Technology (CCOM/UnB), where he is the editor of Law, State andTelecommunications Review (http://www.getel.org/GETELSEER/index.php/rdet). Email: [email protected] . Personal website:

www.marcioaranha.com.

 

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[1]Vide KELSEN, Hans.  Reine Rechtslehre. Einleitung in die rechtswissenschaftliche Problematik . Viena: Franz

Deuticke, 1934.[2]

Evidenciando o conceito de poder constituinte francês como aquele que introduzira o Estado como fenômenoda ordem jurídica, vide: ZWEIG, Egon.  Die Lehre vom “Pouvoir Constituant”: Ein Beitrag zum Staatsrecht desranzösischen Revolution. Tübingen: J. C. B. Mohr/Paul Siebeck, 1909. Sob o enfoque institucionalista,

entendendo o Estado como ente ou instituição jurídica, vide: ROMANO, Santi. Princípios de direitoconstitucional geral. Trad. Maria Helena Diniz, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, p. 61. No âmbito dateoria da constituição, afirmando que o Estado só se concebe hoje como  Estado Constitucional , vide:CANOTILHO, J. J. Gomes Canotilho. Direito constitucional e teoria da constituição. 7ª ed., Coimbra: Almedina,2003, p. 92.[3]

“O poder no sentido social ou político implica autoridade e uma relação entre o superior e o inferior (...) O poder do Estado é o poder organizado pelo direito positivo – é o poder da lei, ou seja, a eficácia do direito positivo.” (KELSEN, Hans. General Theory of Law and State. Trad. Anders Wedberg. Cambridge: HarvardUniversity Press, 1945, p. 190).[4]

Vide OLIVEIRA, Régis Fernandes de. Delegação administrativa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986, p.17.[5]

Vide LABAREE, Benjamin Woods. The Boston Tea Party. Boston: Northeastern Classics, 1979.[6]

Vide JONHSTON, David Cay. The Fine Print . New York: Penguin, 2012, p. 23.[7]

Vide ARANHA, M. I. Interpretação constitucional e as garantias institucionais dos direitos fundamentais.São Paulo: Atlas, 1999.

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[8]O direito não mais se restringe a ordenar  situações estruturais, voltando sua atenção para a “regulação de

situações conjunturais, o que impõe sejam as normas dotadas de flexibilidade e estejam sujeitas a contínua

revisibilidade” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3a ed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 23. Conferir também: p. 86; 88-89; 136-139).[9]

WALDO, Dwight. The Administrative State: A Study of the Political Theory of American Public Administration. New Brunswick (USA): Transaction Publishers, 2007, p. 93.[10]

BOLINGBROKE, Henry St John, Visconde de. The Idea of a Patriot King . p. 381. In: The Works of Lord  Bolingbroke. Philadelphia: Carey and Hart, 1841, p. 372-429.[11]

Idem, p. 380.[12]

MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat, baron de la Brède et de. O espírito das leis. 2a ed., Brasília:Editora Universidade de Brasília, 1995.[13]

Vide GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3ª ed., São Paulo: Malheiros, 2000.[14]

A noção de expressão primária e secundária da função política fora aprofundada por Goodnow, em 1900,quando ele identificou a presença da função política em dois graus: o primário, de decisão sobre a vontade doEstado; e secundário, de execução da vontade do Estado. Vide: GOODNOW, F. J.  Politics and Administration.

 New York: The Macmillan Co., 1900.[15]

MADISON, James; HAMILTON, Alexander; JAY, John. The Federalist Papers. New York: New AmericanLibrary, 1961 (1787-1788, Federalist nº 47), p. 303.[16]

Vide SCIGLIANO, Robert. The Two Executives: The President and the Supreme Court . p. 277-293. In:LAWLER, Peter A.; SCHAEFER, Robert M. (org.). The American Experiment: Essays on the Theory and  Practice of Liberty. Lanham, MD: Rowman and Littlefield, 1994, p. 285-286.[17]

Vide SCIGLIANO, Robert. The Two Executives: The President and the Supreme Court . p. 277-293. In:LAWLER, Peter A.; SCHAEFER, Robert M. (org.). The American Experiment: Essays on the Theory and  Practice of Liberty. Lanham, MD: Rowman and Littlefield, 1994, p. 111-117.

[18]Vide GULICK, Luther; LYNDALL, Urwick (coord.).  Papers on the Science of Administration. New York:Institute of Public Administration, 1937.[19]

Vide CROLEY, Steven P.  Regulation and Public Interests: The Possibility of Good Regulatory Government .Princeton: Princeton University Press, 2008, p. 14.[20]

Vide BAKUNIN, Mikhail Aleksandrovich.  Statism and Anarchy . Trad. Marshall Sharon Shatz, Cambridge:Cambridge University Press, 2002.[21]

Vide KROPOTKIN, Peter Alekseevich.  Anarchism: a collection of revolutionary writings. Mineola (N.Y.):Dover Publications, 2002.[22]

“Devemos selecionar dentre aqueles homens [guardiães e auxiliares] uns poucos para serem governantes (...)”(GROTE, George (org.). Plato and the other companions of Socrates. Vol. III, London: John Murray, 1865, p.56).[23]

Vide ANDERSON, Fulton H. (org.). Francis Bacon: The New Organon and Related Writings . Indianapolis:The Boobs-Merrill Company, 1960.[24]

“(...) o poder arbitrário, sendo exercido pela própria sociedade, geraria as maiores inconveniências (...) [A leisuprema da razão] exclui igualmente a arbitrariedade da teologia, os direitos divinos dos reis, a arbitrariedade dametafísica e a soberania do povo.” (LENZER, Gertrud (org.). Auguste Comte and Positivism: The Essential Writings. 5ª ed., New Brunswick (N.J.): Transaction, 2009, p. 49-50).[25]

Vide RILEY, Patrick (org.).  Bossuet: Politics Drawn from Holy Scripture. Cambridge: University of Cambridge Press, 1999.[26]

Vide SOMMERVILLE, Jóhann P. (org.). Filmer: Patriarcha and Other Writings . Cambridge: University of Cambridge Press, 2000.

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[27]Vide LOCKE, John. Two Treatises of Government . London: Whitmore and Fenn, 1821.

[28]Vide BROWNE, Stephen H. Speech to the Electors of Bristol: The Space of Rethorical Virtue , p. 67-81. In:

dmund Burke and the Discourse of Virtue. Tuscaloosa: The University of Alabama Press, 1993.[29]

MACHIAVELLI, Niccolò. Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio: Discorsi . Trad. Sérgio Bath,3ª ed., Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1994.[30]

O uso da expressão Estado Trabalhador – workers’ state   – é significativa para a presente análise, quando

Marx responde à crítica de Bakunin a um governo do proletariado: “Ele [Bakunin] deveria ter se perguntado: queforma podem assumir as funções administrativas em um Estado trabalhador, se lhe agrada chamá-lo assim?”(McLELLAN, David. Karl Marx: Selected Writings. Oxford: Oxford University Press, 1982, p. 563).[31]

Vide SCHMITT, Carl. Sobre el parlamentarismo. Trad. Thies Nelsson e Rosa Grueso, 2ª ed., Madrid: EditorialTECNOS, 1996.[32]

Vide KELSEN, Hans. ¿Quién debe ser el defensor de la Constitución? Trad. Roberto J. Brie, 2ª ed., Madrid:Editorial TECNOS, 1999.[33]

Vide GUIZOT, M.  Histoire des origines de gouvernement représentatif en Europe. Tomo I. Bruxelles:Wouters, 1851.

[34]Vide ARENDT, Hannah. Sobre a Revolução. Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2001.[35]

Vide WALDO, Dwight. Op. cit., p. 89-103.[36]

Vide ARANHA, M. I. Políticas públicas comparadas de telecomunicações (Brasil-EUA). Tese deDoutorado: CEPPAC (UnB), 2005.[37]

Vide OLIVEIRA, Artur Coimbra de. Republicanismo, instituições e a ingestão de normas internacionais porsetores regulados brasileiros. Dissertação de Mestrado: Faculdade de Direito (UnB), 2011.[38]

Vide GÉRANDO, Joseph-Marie de.  Institutions de Droit Administratif . Paris: Librairie de la Cour deCassation, 1829.

[39]Vide MACAREL, Louis Antoine. Éléments de Droit Politique. Paris: Librairie de la Cour de Cassation, 1833.[40]

Vide CORMENIN, Barão de. Questions de Droit Administratif . Paris: Chez M. Ridler, 1822.[41]

Vide CASTRO, Marcus Faro de. Violência, medo e confiança: do governo misto à separação dos poderes . In:Revista Forense 382: 157-180, novembro/dezembro de 2005.[42]

TEIXEIRA, Victor Cravo. A trajetória do poder regulamentar no pensamento político francês e seusreflexos no Brasil: um olhar para além dos manuais jurídicos. Dissertação de Mestrado: Faculdade de Direito(UnB), 2012, p. 102.[43]

Vide LAFERRIÈRE, Édouard. Traité de la Jurisdiction Administrative et des Recours Contentieux . Tomo I.

Paris: Berger-Levrault et Cie, 1896.[44]

Vide HAURIOU, Maurice. Précis de Droit Administratif et de Droit Public Général . Paris: L. Larose, 1900.[45]

DUGUIT, Léon. Les transformations du Droit Public. Paris: Librairie Armand Colin, 1913, p. 88.[46]

MOREAU, Félix. Le Règlement Administratif. Étude Théorique et Pratique de Droit Public Français . Paris:Albert Fontemoing, 1902, p. 2.[47]

Vide JÈZE, Gaston. Le Réglement Administratif . In: Revue Générale d’Administration, p. 6-22, maio de 1902.[48]

SUNDFELD, Carlos Ari. Serviços públicos e regulação estatal , p. 17-38. In: Idem (org.). DireitoAdministrativo Econômico. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 30.

[49]Vide DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão,franquia, terceirização e outras formas. 3ª ed., São Paulo: Atlas, p. 25.[50]

Sueli Dallari sintetiza os usos do termo a partir do século XVIII: “O conceito de regulação, no século XVIII,está ligado à técnica, expressando um sistema de comando destinado a manter constante o valor de uma grandeza,

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quaisquer que sejam as perturbações que a possam fazer variar, como, por exemplo, o termostato. No século XIX,ele se difunde pela fisiologia, significando os equilíbrios dinâmicos do corpo, e, assim, definem-se seus traçosessenciais: ‘manter um ambiente equilibrado; apesar das perturbações exteriores, graças a um conjunto deajustamentos’. Seu uso só se dissemina nas ciências sociais, entretanto, durante o século XX, sob influência dodesenvolvimento da cibernética, que implica sempre um mecanismo de auto-regulação, permitindo aos sistemasorganizados corrigir suas ações por meio das informações sobre seus resultados recebidas do ambiente. É, então, ateoria dos sistemas que irá se introduzir na teoria das organizações, na economia, na sociologia, na ciência políticae no direito.” (DALLARI, Sueli. Direito Sanitário. p. 57-58. In: ARANHA, M. I. (org.). Direito Sanitário e Saúde

Pública. Vol. I, Brasília: Ministério da Saúde, 2003, p. 39-64).[51]Vide AUTIN, J. L.  Refléxions sur l’usage de la régulation en droit publique.  In: MIAILLE, M. La régulation

entre droit et politique. Paris: L’Harmattan, 1995.[52]

Afirmando que “a linguagem e a prática da regulação têm ingressado, nas últimas três décadas [1980, 1990 e2000], na linguagem da política pública, do direito e da economia” (BALDWIN, Robert; CAVE, Martin; LODGE,Martin. (org.). Regulation: The Field and the Developing Area , p. 3-16. In: The Oxford Handbook of Regulation.Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 4).[53]

OGUS, Anthony I.  Regulatory Law: Some Lessons from the Past . In: Legal Studies  (London) 12(1): 1-19,1983, p. 1.[54]

Vide ELTON, Geoffrey Rudolph. The Tudor Revolution in Government: Administrative Changes in the Reignof Henry VIII . Cambridge: Cambridge University Press, 1953.[55]

Vide BEVIR, Mark; TRENTMANN, Frank (org.).  Markets in Historical Contexts: Ideas and Politics in theodern World . Cambridge: Cambridge University Press, 2004.

[56]A afirmação transcrita a seguir é um exemplo desse uso indevido do termo ‘planejamento’ como sinômino de

um formato estatal superado pelo Estado Regulador: “ Privatization and deregulation have created the conditionsor the rise of the regulatory state to replace the dirigiste state of the past. Reliance on regulation – rather thanublic ownership, planning or centralized administration – characterises the methods of the regulatory state .”

(MAJONE, Giandomenico. The Rise of the Regulatory State in Europe . In: West European Politics  17(3): 77-101,Julho de 1994, p. 77.)

[57]Vide PINTO, Álvaro Vieira. O conceito de tecnologia. Vol. I, Rio de Janeiro: Contraponto Editora, 2005.[58]

Moran elenca os principais autores e obras inaugurais do Estado Regulador que utilizam o linguajar da ciência política. Em seu estudo, a regulação, em sua dimensão de história institucional, é definida como uma “tecnologiaadministrativa de controle de negócios por intermédio de agências especializadas e apoiadas em leis específicasem oposição ao controle via técnica de propriedade estatal” (MORAN, Michael. Review Article: Understanding the Regulatory State. In: British Journal of Political Science 32: 391-413, 2002, p. 392).[59]

As agências são um “bem de produção de ordem superior”, na terminologia de Vieira Pinto (PINTO, A. V.,op. cit., p. 112). Elas produzem bens de produção de ordem elementar de controle e incentivo de setores daeconomia. Ao se identificar a agência reguladora como um bem vital a setores da economia, opta-se, na lógica

regulatória, por uma das manifestações da libertação humana à medida que o processo histórico de constituiçãodas agências reguladoras lhes imprime com o esforço material e mental necessário à sua institucionalização. Asagências são mediações entre o ser humano e sua contradição natural para alteração da realidade via esse engenhohumano. Assim, as agências são essenciais para a regulação moderna pois se constituem na configuraçãohistórico-institucional de como, no Estado Regulador, a sociedade optou por mediar sua relação com setores daeconomia.[60]

Vide CROLEY, Steven P.  Regulation and Public Interests: The Possibility of Good Regulatory Government .Princeton: Princeton University Press, 2008.[61]

De acordo com a teoria da public choice, grupos de interesse competiriam por bens regulatórios, ou maisfriamente, pela compra de legislação de políticos e burocratas, bem como outras medidas regulatórias para o benefício de seus interesses privados.[62]

Sobre os clássicos da teoria da public choice, vide: BLACK, Duncan. The Theory of Committees and lections. Cambridge: Cambridge University Press, 1958; DOWNS, Anthony. Uma Teoria Econômica da

Democracia. Trad. Sandra Guardini Teixeira Vasconcelos, São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,

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1999 (Original de 1957); OLSON, Mancur. The Logic of Collective Action: Public Goods and the Theory oGroups. Harvard, 2002 (Original de 1965); ARROW, Kenneth J.  Social Choice and Individual Values . 2ª ed., New Haven: Yale University Press, 1963; BUCHANAN, James M.; TULLOCK, Gordon. The Calculus oConsent: Logical Foundations of Constitutional Democracy. Ann Arbor: University of Michigan Press, 1965.[63]

Vide ROSE-ACKERMAN, Susan; LINDSETH, Peter L. (org.). Comparative Administrative Law. Cheltenham,UK: Edward Elgar, 2010.[64]

Vide STEWART, Richard B.  Regulation and the Crisis of Legalisation in the United States. In: DAINTITH,

Terence (org.).  Law as an Instrument of Economic Policy: Comparative and Critical Approaches. Berlin:Gruyter, 1988, p. 97-133; STEWART, Richard B.  Regulation in a Liberal State: The Role of Non-CommodityValues. In: Yale Law Journal  92 (1983), 1537-1590.[65]

SUNSTEIN, Cass R. After the Rights Revolution: Reconceiving the Regulatory State. Cambridge, MA:Harvard University Press, 1990, p. 13.[66]

Vide BRAITHWAITE, John. Crime, Shame and Reintegration. Cambridge: Cambridge University Press,1989.[67]

Vide AYRES, Ian; BRAITHWAITE, John.  Responsive Regulation: Transcending the Deregulation Debate.Oxford: Oxford University Press, 1992.

[68]GUNNINGHAM, Neil; GRABOSKY, Peter.  Smart Regulation: Designing Environmental Policy. Oxford:Clarendon Press, 1998.[69]

Vide TEUBNER, Gunther. O direito como sistema autopoiético. Trad. José Engrácia Antunes. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.[70]

Sobre o significado de modernização reflexiva, vide: BECK, Ulrich; GIDDENS, Anthony; LASH, Scott. Modernizaçãoreflexiva. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Editora Unesp, 1995.[71]

Vide GONÇALVES, Pedro. Entidades privadas com poderes públicos. Coimbra: Almedina, 2005.[72]

Vide COIMBRA, Artur. O papel do órgão regulador na resolução de disputas entre operadoras detelecomunicações: a arbitragem e a mediação à luz das experiências japonesa, inglesa e americana . In: Revistade Direito, Estado e Telecomunicações 1(1): 111-159, 2009.[73]

Vide LEMES, Selma Maria Ferreira.  Arbitragem na Concessão de Serviços Públicos – ArbitrabilidadeObjetiva. Confidencialidade ou Publicidade Processual? RDM 134: 148-163, abr./jun., 2004.[74]

BRASIL. STJ. Resp 904.813/PR. Relatora Min. Nancy Andrighi. 3ª Turma. Julgado em 20/10/2011. DJe28/02/2012.[75]

 Não se fala em direção  no sentido absoluto de crença moderna no devir   em detrimento do ser , masexatamente na constatação de que o estudo da normatização de condutas é um processo próprio ao  ser social   enão simplesmente de predefinição de condutas individuais  capazes de, por si só, esgotarem a realidade. A propósito da persistência do  ser , no século inaugurador moderno (séc. XVII), como categoria maior do

 pensamento a conviver com a proposta racionalista do devir , vide: BAUMER, Franklin Le Van. O pensamentoeuropeu moderno: séculos XVII e XVIII. Vol. I, Lisboa: Edições 70, 1990, p. 47. Não se pode fugir, aqui,entretanto, à crítica de subserviência ao pensamento moderno de substituição da meta contemplativa dos Antigos(de estabilidade) por um fim utilitário e ativista (de movimento) dos Modernos, embora temperado, nestaexposição, pela compreensão de que a previsibilidade não é o único fundamento para o esforço de se influenciar arealidade.[76]

Vide BECK, Ulrich. O que é globalização? Equívocos do globalismo, respostas da globalização. Trad. AndréCarone, São Paulo: Paz e Terra, 1999.[77]

Sundfeld define o ‘direito global’ como o que se opõe ao direito doméstico. “O direito global extrapolalargamente as fronteiras do Estado Nacional para buscar suas fontes também fora dele [mas] a simples existênciade órgãos e de fontes normativas internacionais nem constitui novidade nem basta para caracterizar uma “novaera”. Esta é derivada, portanto, não do surgimento, mas da intensificação do fenômeno” (SUNDFELD, Carlos Ari.

  Administração Pública na era do direito global . p. 157-158. In: SUNDFELD, Carlos Ari e VIEIRA, Oscar Vilhena. Direito global. São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 157-168).

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[78]A globalização não é um acontecimento estanque, é uma “onda que traduz uma nova cultura (...) é o produto

inevitável do chamado ‘efeito demonstração’ derivado dos extraordinários avanços da tecnologia” (CHACEL,Julian (org.). A globalização em debate. p. 5. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro, v. 46, n. 546, p. 3-14, set. de2000). Pode-se identificar a globalização como “um processo e não como um fato consumado” (CALDAS,Ricardo W. O Brasil e o mito da globalização . São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999, p. 18).[79]

O comentário de Eros Roberto Grau é revelador: “Modernas são a economia japonesa e os regimes de protecionismo econômico interno norte-americano e europeu, que não fazem nenhum exemplo de mercado livre.

De modo que ser moderno, hoje, é no mínimo já ter consciência de que o mercado é impossível sem umalegislação que o proteja e uma vigorosamente racional intervenção, destinada a assegurar sua existência e

 preservação” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 92). Ser verdadeiramente moderno é intervir com vigor, força, conhecimento, prospecção, enfim, é desenhar eimplementar política pública.[80]

“O termo de origem francesa ‘mundialização’ (mondialisation) encontrou dificuldades para se impor, nãoapenas em organizações internacionais, mesmo que supostamente bilíngues, como a OCDE, mas também nodiscurso econômico e político francês. Isso se deve (...) ao fato de que o termo ‘mundialização’ tem o defeito dediminuir, pelo menos um pouco, a falta de nitidez conceitual dos termos ‘global’ e ‘globalização’.” (CHESNAIS,François. A mundialização do capital . São Paulo: Xamã Editora, 1996, p. 24 – Original: La mondialisation du

capital . Paris: Syros, 1994).[81]A mundialização  significa “que as decisões já não são nacionais ou locais, pertencendo a alguma

congregação supranacional de caráter mundial. Mas para a Comissão Internacional de Juristas, o sentido talvezmais importante [da globalização] é que ela evoca as novas redes que os cidadãos estão formando e as relaçõescada vez mais estreitas, que matêm o movimento de direitos humanos” (CLAPHAM, Andrew.  La mundialización  el imperio del Derecho . p. 17. In: La Revista de la Comisión Internacional de Juristas  – mundialización,

derechos humanos e imperio del derecho. n. 61, 1999, p. 17-37).[82]

O termo ‘realinhamento constitucional’ é utilizado por Oscar Vieira para designar a influência dos  fatores deressão  internacionais sobre os sistemas constitucionais nacionais. Conferir: VIEIRA, Oscar Vilhena.

 Realinhamento constitucional . In: SUNDFELD, Carlos Ari e VIEIRA, Oscar Vilhena (coord.). Direito global. São

Paulo: Max Limonad, 1999, p. 15-48.[83]Ao analisar a globalização sob o tríplice enfoque de regionalização , direitos humanos   e economia, Oscar 

Vieira identifica um realinhamento bidirecional  nos movimentos de regionalização (VIERIA, Oscar. op.cit., p. 28)e direitos humanos (VIERIA, Oscar. op.cit., p. 29). Haveria, nestes, uma influência recíproca entre os movimentoscitados e as posições políticas dos países da comunidade internacional. Já no que diz respeito à globalizaçãoeconômica como “liberdade total ao capital internacional” (VIERIA, Oscar. op.cit., p. 17), o autor não consegueidentificar o movimento de influência dos países neste fenômeno uniformizador: “Diferentemente dos demaisfenômenos da globalização, não temos neste caso [da globalização econômica] a já mencionada via de duas mãos.Há apenas uma assimilação dos padrões internacionais, sob a perspectiva de que são essenciais para se participar do processo de globalização” (VIERIA, Oscar. op.cit., p. 46-47).[84]

Vide GALBRAITH, John Kenneth. O novo Estado Industrial. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1997. ParaGalbraith, a substituição do sistema de mercado   pelo sistema de planejamento  teria modificado a estrutura de poder nas empresas e na sociedade em razão do aumento da escala de produção , do avanço da tecnologia e doconhecimento interdisciplinar , que exigem elevado tempo de maturação dos empreendimentos cada vez maiscomplexos. A decisão teria migrado da  propriedade do capital   para sua gestão. O controle, agora, estaria nasmãos do administrador qualificado pelo conjunto de informações necessárias à gestão do negócio mediante acriação de novas necessidades moldadas pelo aparato propagandístico, derrubando por terra a  soberania doconsumidor . Tal inteligência organizada da empresa   constituiria sua tecnoestrutura, cujas decisões técnicas eimpessoais – tecnocracia – acabariam por suplantar a liberdade individual de direcionar o desenvolvimento.[85]

Bresser Pereira, ao definir o mercado como o mecanismo de alocação eficiente de recursos por excelência,

afirma a precedência do Estado moderno ao mercado capitalista na medida em que é o Estado que garante osdireitos de propriedade e a execução dos contratos. Vide PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reforma do Estadodos anos 90: lógica e mecanismos de controle . Brasília: Ministério da Administração Federal e Reforma doEstado, 1997, p. 9-10.[86]

“Não basta editar uma lei abstrata, genérica e distante, dizendo que nenhuma exploração da atividade

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industrial pode ultrapassar certo limite de poluição, causando dano à saúde do vizinho. É preciso que o Estado vátrabalhando com a realidade todo o tempo, para definir, nas situações que se põem, o que é ou não uma emissãode poluentes aceitável; assim obter-se-á a paulatina diminuição da emissão de poluentes. É preciso impor grauscrescentes de restrições à emissão de poluentes, e para isso a lei é insuficiente. Ninguém imagina que o legislador vá cuidar de regular o nível de emissão de poluentes do bairro do Maracanã no ano de 1998; e, em janeiro de 99,editar outra lei para estabelecer que já é hora de diminuir ainda mais o nível de emissão de poluentes; e, no meiodo ano, considerando que aquele nível eleito foi otimista demais, editar nova lei para voltar atrás. Alguém imaginaque o legislador   possa fazer isso, dedicando-se, ele próprio, a um verdadeiro gerenciamento normativo da

realidade?” (SUNDFELD, Carlos Ari.  Agências reguladoras e os novos valores e conflitos . p. 1293-1294. In:Anais da XVII Conferência Nacional dos Advogados.  Justiça: realidade e utopia. Vol. II, Rio de Janeiro:Ordem dos Advogados do Brasil, 1999, p. 1291-1297).[87]

Eficiência esta que foi elevada à categoria constitucional com a Emenda Constitucional nº 19/98, que alterou oart.37, caput  da Constituição Federal brasileira de 1988.[88]

O direito administrativo sempre sofreu os influxos da evolução tecnológica, como bem demonstram asregulamentações municipais do direito de construir, que acompanham a evolução das técnicas de construção e docrescimento correspondente dos riscos. A novidade de hoje está na ampliação sensível deste fenômeno deregulamentação conjuntural para setores da economia, no Brasil, submetidos a escassa regulamentação estataldireta devido à suficiência da autorregulamentação das então empresas estatais.

[89]O termo publicatio  é utilizado para denotar a transferência da titularidade de atividades das mãos privadas para o Estado.[90]

Vide GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Teoria dos serviços públicos e sua transformação , p. 64. In:SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 39-71.[91]

Sobre as características e distinções entre o Direito Administrativo anglo-americano e o Direito Administrativode matriz francesa, vide: PESSOA, Robertônio. Curso de direito administrativo. Brasília: Editora Consulex,2000, p. 51-58.[92]

O art.149 da Constituição Federal de 1934 estabelecia o dever do Estado e da família de prestar educação. Oanteprojeto da Carta Constitucional de 1934 era mais claro, pois previa, no título XI ( Da Cultura e do Ensino), no

art.112: “O ensino será público ou particular, cabendo àquele, concorrentemente à União, aos Estados e aosMunicípios. O regime do ensino, porém, obedecerá a um plano geral traçado pela União, que estabelecerá os princípios normativos da organização escolar e fiscalizará, por funcionários técnicos privativos, a sua execução”.A Constituição Federal de 1937 foi mais clara: “Art.129. À infância e à juventude, a que faltarem os recursosnecessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educaçãoadequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais”. A Constituição de 1946, por sua vez, assimdisciplinou: “Art.167. O ensino dos diferentes ramos será ministrado pelos podêres públicos e é livre à iniciativa particular, respeitadas as leis que o regulem”. A Constituição Federal de 1967 e Emenda nº1 de 1969 seguiram a

mesma linha: “Art.168. (...) §2o Respeitadas as disposições legais, o ensino é livre à iniciativa particular, a qualmerecerá o amparo técnico e financeiro dos Podêres Públicos, inclusive bôlsas de estudo”. Finalmente, aConstituição Federal de 1988 disciplina: “Art.205. A educação, direito de todos e dever do Estado (...); Art.209. Oensino é livre à iniciativa privada (...)”. Históricos normativos semelhantes podem ser desenhados para os setoresde saúde, abastecimento alimentar e sistema financeiro.[93]

“A frustação com estas categorias ubíquas [de público e privado] surge parcialmente porque elas são posicionadas para descreverem oposições em nosso pensamento. No cerne de muitas de suas aplicações aparecemas duas idéias de que o  público está para o privado tal como aberto está para fechado e como o todo está para a

arte.” – tradução livre do original (STARR, Paul. The meaning of privatization. p. 16. In: KAMERMAN, SheilaB. & KAHN, Alfred J. Privatization and the Welfare State. Princeton: Princeton University Press, 1989).[94]

O conceito de serviço público  como o “serviço disponível ao público” serviu à justificação da  provisão

rivada de serviços públicos  sob a óptica econômica de estratégias de fomento do mercado, mas não se adequanem satisfaz as exigências jurídicas de orientação da prestação de serviços públicos e privados. Conferir: ROTH,Gabriel. The private provision of public services in developing countries. Washington: Economic DevelopmentInstitute, 1987, p. 1.[95]

Argumentando pela caracterização do modelo regulatório, segundo a ideologia constitucionalmente adotada

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 pela Constituição Federal de 1988 no Brasil, como afeto um ambiente concorrencial, mas avesso ao jogo dosmercados, assim entendido aquele caracterizado pela livre iniciativa e a livre concorrência, vide: CARVALHO,Carlos Eduardo Vieira de. Regulação de Serviços Públicos na Perspectiva da Constituição EconômicaBrasileira. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.[96]

Daí a afirmação de Eros Roberto Grau de que “a privatização  dos serviços públicos instala um autêntico caosem suas teorizações [do direito administrativo], abalando a própria noção de serviço público , que lhe tem servido

de sustentáculo” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto . 3aed., São Paulo: Malheiros,2000, p. 125).[97]

Diz-se da relação em que o Estado detém uma posição privilegiada, gerando efeitos de subordinação.Conferir: SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. São Paulo: Malheiros Editores, 1992, p. 68. [98]

Vide GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Teoria dos serviços públicos e sua transformação , p. 63-64. In:SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 39-71.[99]

Autorização seria, neste caso, o “ato do Poder Público que libera o desempenho de atividade econômica, aqual continua sujeita ao seu regime próprio, de direito privado” (NETO, Benedicto Porto. Concessão de serviçopúblico no regime da Lei n. 8.987/95: conceitos e princípios . São Paulo: Malheiros, 1998, p. 140). Os arts.126 e131 da Lei Geral de Telecomunicações são exemplos característicos desta concepção: “Art.126. A exploração de

serviço de telecomunicações no regime privado será baseada nos princípios constitucionais da atividadeeconômica”. “Art.131. A exploração de serviço no regime privado dependerá de prévia autorização da Agência,que acarretará direito de uso das radiofrequências necessárias”.[100]

Vide DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização e outras formas. 3a ed., São Paulo: Atlas, 1999, p. 122-129.[101]

Em sede da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1668, julgada em 20 de agosto de1998, e referente a diversos dispositivos da Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/97), o Supremo TribunalFederal pronunciou-se pela constitucionalidade do disposto no art. 65, III e §2º, que trata expressamente daconcomitância de prestação dos serviços de telecomunicações em regime público e privado. No âmbito dos

transportes, o Recurso Extraordinário nº 220.999-7 resultou no posicionamento da Corte no sentido de não seconsiderar como serviço público a atividade de transporte aquaviário exclusivamente de mercadorias de empresas privadas.[102]

Vide ORTIZ, Gaspar Ariño; MARTINEZ, J. M. De La Cuétera; LÓPEZ-MUNIZ, J.L.  El nuevo servicioúblico. Madri: Marcial Pons, 1997.

[103]Vide GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Teoria dos serviços públicos e sua transformação , p. 62. In:

SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 39-71.[104]

Exemplo esclarecedor da desintegração vertical   consta em Grotti: “É o que já ocorre, no Brasil, com osserviços de navegação aérea ou de transporte rodoviário: os aeroportos e rodovias são objeto de monopólionatural, atividade não-competitiva de infraestrutura; essa infraestrutura é utilizada, com liberdade e igualdade deacesso, pelos inúmeros prestadores de serviço individuais” (GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Teoria dos serviços públicos e sua transformação, p. 63. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativoeconômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 39-71).[105]

Fala-se, aqui, em riscos do serviço privado em si: se o serviço deixar de ser prestado, o Estado não intervem para prestá-lo ele próprio. Não se está comentando o risco dirigido ao prestador do serviço, pois, neste caso,mesmo o prestador de serviços públicos está sujeito ao risco  natural do negócio. A propósito, as definições deconcessão e permissão na Lei Geral de Concessões determinam que o concessionário e permissionário de serviços

 públicos os prestarão por “sua conta e risco” (art. 2o, II, III e IV da Lei 8.987/95).[106]

Vide BURNHAM, William.  Introduction to the Law and Legal System of the United States. 4ª ed., St. Paul:

Thomson/West, 2006.[107]Em revisão da literatura sobre política regulatória, estudo da Revista Brasileira de Informação Bibliográfica

em Ciências Sociais salienta a insuficiência da tradicional divisão binomial entre dois tipos de regulação pública:regulação por agência regulatória; e regulação pela estatização. Conferir: MELO, Marcus André.  Políticaregulatória: uma revisão da literatura . p. 8-9. In: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências

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Sociais, nº 50, 2o semestre de 2000, p. 7-43. A distinção tradicional entre regulação via  propriedade pública e viaagência ou comissão independente é imprecisa sob o enfoque jurídico, pois pressupõe que a existência de bens públicos afasta a técnica de regulação via agência, o que, de fato, pode ser verdade nos modelos de tradiçãoanglo-americana, mas não no modelo brasileiro, que comporta um rol mais elaborado de espécies de regulação.[108]

Vide STRAUBHAAR, Joseph. Tendências mundiais , p. 47. In: SIQUEIRA, Ethevaldo (et al.).Telecomunicações: privatização ou caos . São Paulo: TelePress Editora, 1993, p. 42-47. Relatando as esperadasdiferenças entre modelos regulatórios no mundo, cita, em 1993, a experiência da Jamaica, que optara por contratos detalhados ao invés da criação de órgãos reguladores.[109]

Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vieira de. Regulação de Serviços Públicos na Perspectiva daConstituição Econômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.[110]

Vide ROSANVALLON, Pierre. A crise do Estado-providência . Trad. Joel Pimentel de Ulhôa, Goiânia:Editora Universidade Federal de Goiás e Editora da Universidade de Brasília, 1997.[111]

Costuma-se apontar a alteração de postura de intervenção direta para a de intervenção indireta comoresultado da crise fiscal do Estado dos anos 80 e 90. Conferir: PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reforma doEstado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle. Brasília: Ministério da Administração Federal e Reformado Estado, 1997, p. 11-13.[112]

Vide SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação da Atividade Econômica: Princípios e Fundamentos Jurídicos.São Paulo: Malheiros, 2001.[113]

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reforma do Estado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle .Brasília: Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1997, p. 17.[114]

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reforma do Estado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle .Brasília: Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1997, p. 32 e seguintes.[115]

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reforma do Estado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle .Brasília: Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1997, p. 33. “Para a agenda liberal tornava-se,agora, necessário, ao mesmo tempo desregular e regular: desregular para reduzir a intervenção do Estado; regular,

 para viabilizar a privatização”.[116]Há proposta de terminologia específica para os serviços submetidos ao tratamento dito competitivo, em que

coexistem regimes jurídicos distintos na prestação da mesma atividade, como ocorre com as telecomunicações,energia elétrica, vigilância sanitária dentre outros. A proposta de Sundfeld segue orientação européia, que passoua chamá-los serviços de interesse econômico geral . Conferir, a respeito: SUNDFELD, Carlos Ari.  A Administração Pública na era do direito global . p. 161: nota 6. In: SUNDFELD, Carlos Ari & VIEIRA, Oscar Vilhena. Direitoglobal. São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 157-168. Persiste, todavia, a questão de se saber se a adoção destaterminologia esclarecerá ou confundirá ainda mais o esforço de divisão do regime aplicado a cada tipo de serviçorelativo a setores econômicos.[117]

Vide AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999,

 p.164.[118]Preferiu-se a utilização do conceito de centralização  e descentralização   por revelar, na sua ancianidade, a

ligação de subordinação à Administração Pública, que é o sentido visado na diferenciação entre controle pelacentralização e controle pela descentralização. Para uma análise da centralização como subordinação, vide:URUGUAI, Paulino José Soares de Souza, Visconde de. Ensaio sobre o direito administrativo. Fac-símile daedição de 1960, Brasília: Imprensa Nacional, 1997, p. 346. Para uma análise da centralização como unidade, vide:DEBBASCH, Charles. Droit administratif . Paris: Éditions Cujas, 1972, p. 87-88. Themistocles Cavalcanti, por suavez, deriva a descentralização da necessidade de especialização em face da complexidade   funcional do Estado:CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Tratado de direito administrativo. Vol. II, 5ªed., Rio de Janeiro: LivrariaFreitas Bastos, 1964, p. 83-84. Finalmente, esmiuçando a evolução dos significados dos termos centralização  edescentralização  (descentralização política versus  administrativa; descentralização da decisão versus  da gestão;territorial versus  por serviços ou institucional – p. 17 e seguintes) e criticando a concepção unívoca dedescentralização como transferência de competências a pessoas jurídicas (p. 59), ressaltando a independênciacomo essencial ao conceito de descentralização (p. 69), vide: ORTIZ, Gaspar Ariño. Descentralización yplanificación. Madri: Instituto de Estudios de Administracion Local, 1972. (Colección Estudios de AdministraciónLocal).

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[119]AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p.

165 e seguintes; 181 e seguintes. “Observamos que a preferência pela expressão “regulação desconcentrada” emdetrimento da expressão consagrada “desregulamentação” se prende a que entendemos que a ausência deregulamentação é uma forma de regulação imposta pelo Estado” (p. 165). Aguillar defende a adoção da primeiranomenclatura, pois entende que a liberdade desfrutada pela iniciativa privada nas atividades econômicasdesregulamentadas é “consequência de uma política regulatória estatal , uma política de regulação peladesconcentração” (p. 211). O autor não utiliza o termo desconcentração no sentido técnico-jurídico de oposição àdescentralização – diferença já sedimentada na doutrina de direito administrativo. Conferir: DEBBASCH, Charles.

roit administratif . Paris: Éditions Cujas, 1972, p. 88-89; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direitoadministrativo. São Paulo: Atlas; GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva;MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais; MELLO, CelsoAntônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros; MUKAI, Toshio. Direitoadministrativo. São Paulo: Saraiva.[120]

AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p.191 e seguintes.[121]

Vide AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 212. A regulação operacional “é manifestada pela preferência outorgada à iniciativa privada ou às empresas eórgãos estatais para o desempenho de certas atividades de interesse público” (p. 164).[122]

A regulação normativa “diz respeito ao poder de regulamentar efetivamente o setor que interessa ao Estado”(AGUILLAR, Fernando Herren. op.cit., p. 164).[123]

Fala-se em tendência, pois a opção regulatória estatal não está entre dois pólos, mas em um continuum  decentralização e descentralização, como ressalta um pequeno estudo dirigido à Administração Pública Federal:MARCELINO, Gileno Fernandes. Descentralização: um modelo conceitual. Brasília: Fundação Centro deFormação do Servidor Público – FUNCEP, 1988, p. 28.[124]

A terminologia intervencionismo direto e intervencionismo indireto   também é utilizada, mas não permitetodas as combinações possíveis como ocorre com os termos regulação operacional   e normativa, centralizada  edescentralizada. Adotando os conceitos de intervencionismo direto e indireto, vide: MARQUES NETO, Floriano

Azevedo.  A nova regulação estatal e as agências independentes . p. 74. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.).Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 72-98.[125]

Para Floriano Marques, o intervencionismo indireto   é caracterizado pela concreta  atuação do Estado “nofomento, na regulamentação, no monitoramento, na mediação, na fiscalização, no planejamento, na ordenação daeconomia” (MARQUES NETO, Floriano Azevedo.  A nova regulação estatal e as agências independentes . p. 74.In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 72-98).[126]

“O Estado tem que se organizar para fazer mais do que editar uma lei geral para vigorar por tempoindeterminado e depois cuidar dos conflitos individuais. E, para isso ele tem de intervir mais. Aqui está a questão.O modelo que conhecemos – a separação de poderes tradicional e as funções que competiam aos PoderesJudiciário e Legislativo – era perfeitamente coerente com o baixo intervencionismo estatal. Se o Estado não estámuito preocupado em gerenciar a realidade ambiental de modo a ir apertando paulatinamente as exigências paramelhorar o meio ambiente; se quer deixar os membros da sociedade acertarem suas diferenças independentementeda ordem jurídica, aí pode realmente editar uma norma geral que vigore por sessenta ou mais anos, como oCódigo Civil, e depois solucionar os conflitos pelo Poder Judiciário. Mas, se o Estado quer perseguir concretamente o valor ambiental, vair ter que intervir mais, editando normas seguidamente, dando-lhes conteúdoscada vez menos gerais, tratando de temas cada vez mais particulares. Assim, poderá realizar o gerenciamentonormativo dos conflitos  (...) Como o Estado é obrigado a intervir [normativamente, em princípio], ele criou asagências reguladoras” – grifos nossos (SUNDFELD, Carlos Ari.  Agências reguladoras e os novos valores econflitos, p. 1294 e 1296. In: Anais da XVII Conferência Nacional dos Advogados.  Justiça: realidade e utopia.Vol. II, Rio de Janeiro: Ordem dos Advogados do Brasil, 1999, p. 1291-1297). Tal  gerenciamento normativo dosconflitos somente pode ser alcançado por mecanismos institucionais de organização dinâmica e de contato diretosetorial, como as agências reguladoras. Planejar e replanejar constantemente: estes são os conceitos basilares da política regulatória normativa centralizada.[127]

Themistocles Cavalcanti posiciona-se nitidamente a favor da segunda corrente: “No primeiro grupoencontram-se as empresas, alguns contabilistas incapazes de adaptarem os seus conhecimentos ao problema mais

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geral, e finalmente alguns economistas e financistas clássicos, temerosos de uma intervenção do Estado, no pressuposto de sua incapacidade para administrar (....). Do segundo grupo, são os que se colocam na posição deequilíbrio entre os interesses das empresas e dos consumidores, mas consideram, em primeiro plano, os interessesdesses últimos para quem os serviços foram criados e a cujos interesses, portanto, devem atender precipuamente”(CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Tratado de direito administrativo . Vol. II, 5ªed., Rio de Janeiro:Livraria Freitas Bastos, 1964, p. 500-501).[128]

Analisando a posição institucional   dos poderes políticos adotada pela Constituição Federal de 1988 doBrasil, vide: FERRAZ, Anna Cândida da Cunha. Conflito entre poderes: o poder congressual de sustar atos

normativos do Poder Executivo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1994.[129]

MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat, baron de la Brède et de. O espírito das leis. 2aed., Brasília:Editora Universidade de Brasília, 1995, p. 118-119.[130]

Aristóteles divide em três partes as que devem compor as formas de constituição encarregadas de:deliberação sobre assuntos públicos; funções públicas (executivas); e do poder judiciário. Conferir:

ARISTÓTELES. Política. Trad. Mário da Gama Kury, 3 aed., Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1997, p.151-160.[131]

Apontado como o inaugurador da doutrina teorético-constitucional do equilíbrio dos poderes , Bolingbrokea enunciou em escritos exparsos. Conferir: SCHMITT, Carl. Teoría de la constitución. Trad. Francisco Ayala,

Madri: Alianza Editorial, 1992, p. 187.[132]

Locke ultima a divisão de funções em divisão de poderes legislativo de um lado e executivo e federativo deoutro. Conferir: LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. Trad. E. Jacy Monteiro, São Paulo: InstitutoBrasileiro de Difusão Cultural, 1963, p. 91-93 (Coleção Clássicos da Democracia 11).[133]

Vide MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat, baron de la Brède et de. O espírito das leis. 2a ed.,Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1995, p. 121.[134]

Quando o direito passou a funcionar como instrumento de implementação de políticas públicas (regulaçãonão exclusivamente de situações estruturais mas conjunturais), “o direito torna-se contingente e variável. A ‘lei’,texto normativo produzido pelo Legislativo, não pode mais ser tomada como categoria absoluta: é necessário,

mais do que nunca, distinguir entre lei em sentido formal e lei em sentido material . Interpenetram-se os campos deatuação do Executivo e do Legislativo: aquele a exercitar, amplamente,  função normativa; este, a produzir leis-medida. A leitura tradicionalmente desenvolvida da ‘separação dos poderes’ perde todo o seu sentido” (GRAU,

Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3a ed., São Paulo: Malheiros, p. 136). E continua em outrocapítulo: “a instabilidade de determinadas situações e estados econômicos, sujeitos a permanentes flutuações – flutuações que definem o seu caráter conjuntural –, impõe sejam extremamente flexíveis e dinâmicos osinstrumentos normativos de que deve lançar mão o Estado para dar correção a desvios ocorridos no desenrolar do processo econômico e no curso das políticas públicas que esteja a implementar. Aí, precisamente, o emergir dacapacidade normativa de conjuntura, via da qual se pretende conferir respota à exigência de produção imediatade textos normativos, que as flutuações da conjuntura econômica estão a todo o tempo, a impor (...) [Ditacapacidade normativa] somente estará ungida de legalidade quando e se ativada nos quadrantes da lei (...) O

exercício da capacidade normativa de conjuntura  estaria, desde a visualização superficial dos arautos da“separação” de poderes, atribuído ao Poder Legislativo, não ao Poder Executivo. A doutrina brasileira tradicionaldo direito administrativo, isolando-se da realidade, olimpicamente ignora que um conjunto de elementos de índoletécnica, aliado a motivações de premência e celeridade na conformação do regime a que se subordina a atividadede intermediação financeira, tornam o procedimento legislativo, com seus prazos e debates prolongados,inadequado à ordenação de matérias essencialmente conjunturais. Por isso não estão habilitados, os seus adeptos,a compreender o particular regime de direito a que se submete [um] segmento da atividade econômica” (GRAU,Eros Roberto. op.cit., p. 172-173). Não se pode olvidar, no entanto, que essa argumentação implica oreposicionamento do Legislativo à semelhança da desregulamentação exigida na proposta neoliberal: “substituiçãode regras rígidas, dotadas de sanção jurídica, por regras flexíveis, meramente indutoras de comportamentos”,gerando “ampliação do conteúdo dos regulamentos (atos do Poder Executivo em geral), instalando uma nova

contradição” (GRAU, Eros Roberto. op.cit., p. 98).[135]

“A classificação das funções estatais em legislativa, executiva e jurisdicional  é corolário da consideração do poder estatal desde o seu aspecto subjetivo: desde tal consideração, identificamos, nele, centros ativos que sãotitulares, precipuamente, de determinadas funções. Estas são assim classificadas em razão das finalidades a que se

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voltam seus agentes – isto é, finalidades legislativas, executivas  e jurisdicionais. Tal classificação, como vimos,

tem caráter orgânico ou institucional .” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3aed., SãoPaulo: Malheiros, 2000, p. 176).[136]

Vide CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro . 2a

ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 211.[137]

Críticas são levantadas contra a ausência de um controle efetivo de constitucionalidade dos atos normativosdo Executivo, propondo-se, até mesmo, a criação de uma ação direta de ilegalidade . Conferir: A fiscalização

abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2a ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p.215. No entanto, a discussão deveria, primeiramente, internalizar a compreensão da submissão estrutural doExecutivo à lei ao lado da inovação normativa funcional que lhe é própria.[138]

Tratando da Medida Provisória como ato normativo com força de lei  e extraindo desta característica aimpossibilidade de sua retirada do Congresso Nacional, pelo Executivo, conferir: Ação Direta deInconstitucionalidade 221/DF, relatoria do Ministro Moreira Alves, j.29.03.1990, DJ 22.10.1993, p. 22.251 e RTJ151/331-355.[139]

Vide texto correspondente à nota 148, p. 24 deste estudo.[140]

Vide MASHAW, Jerry L. Gli atti sub-legislativi di indirizzo della pubblica amministrazione nell’esperienza

degli USA. p. 117-123. In: CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potere regolamentare e strumenti di direzionedell’amministrazione: profili comparatistici. Bolonha: Il Mulino, 1991, p. 111-140.[141]

“Entende-se como função normativa a de emanar estatuições primárias, seja em decorrência do exercício do poder originário   para tanto, seja em decorrência de poder derivado, contendo preceitos abstratos e genéricos”

(GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 180).[142]

Partindo de definição de Alessi de que os regulamentos são estatuições primárias impostas por força própria,mas emanadas de poder derivado, “em uma tentativa de conciliação de critérios, teremos que a função normativa(material ) compreende a função legislativa  e a função regulamentar   (institucionais) – mais a função regimental ,se considerarmos a normatividade emanada do Poder Judiciário” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o

direito pressuposto. 3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 181). Assim, “quando o Executivo expede

regulamentos – ou, o Judiciário, regimentos –, não o faz no exercício de delegação legislativa (...) Logo, quandoo Executivo e o Judiciário emanam atos normativos de caráter não legislativo – regulamentos e regimentos,respectivamente –, não o fazem no exercício de função legislativa, mas sim no desenvolvimento de  funçãonormativa.” (GRAU, Eros Roberto. op.cit., p. 184).[143]

Vide MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat, baron de la Brède et de. O espírito das leis. 2a ed.,Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1995, p. 121.[144]

Para a exposição completa deste argumento com fundamentação exaustiva, conferir: GRAU, Eros Roberto.

O direito posto e o direito pressuposto. 3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 182-189.[145]

Ação Direta de Inconstitucionalidade 221/DF, Relator Min. Moreira Alves, j.29.03.1990, DJ 22.10.1993, p.22.251 e RTJ 151/331-355.[146]

O trecho a seguir, que parece propositalmente inconclusivo, representa bem a inutilidade do argumentogramatical em face da questão maior de proibição de delegação de funções constitucionais: “Poder-se-ia

argumentar, em contrário, que o art. 5 o, II, da Constituição não exige tanto [tamanha restrição à atividadenormativa da Administração]. Não dispõe ele que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão

or comando legal ; quer apenas que ninguém seja constrangido senão em virtude de lei. Bastaria assim a leiconferir genericamente o poder ao administrador, para que as normas que este viesse a editar encontrassemconforto constitucional. Mas o problema se reconduz aqui ao da impossibilidade de delegação de funções entre

Legislativo e Executivo. Em outras palavras, a interpretação do art. 5o, II, requer necessariamente a consideraçãodo limite a partir do qual se incidiria em inconstitucionalidade por delegação indevida do poder de legislar.”

(SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo ordenador. 1aed., 2atir., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 35).[147]

Sobre os regulamentos de atribuição, vide: DELPÉRÉE, Francis. Le fonti normative secondarie nel diritto belga. p. 51-52. In: CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potere regolamentare e strumenti di direzionedell’amministrazione: profili comparatistici. Bolonha: Il Mulino, 1991, p. 47-67.

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[148] Norma secundária é considerada a “norma cujo titular não possa nunca agir de iniciativa própria ou

autonomamente”. Subordinadas são as normas que “encontram seu fundamento na própria Constituição” – tradução livre do original: DELPÉRÉE, Francis. Le fonti normative secondarie nel diritto belga. p. 49-50. In:CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potere regolamentare e strumenti di direzione dell’amministrazione: profili comparatistici . Bolonha: Il Mulino, 1991, p. 47-67. A competência subordinada existiria se se aceitasse, no Brasil,a presença de poderes implícitos   (inherent powers) no Executivo para produzir normas regulamentares emespaços não atingidos por dispositivos legais: sua competência seria subordinada, pois restringível por lei, masnão secundária, pois não necessitaria de prévia abertura legal. A característica subordinada da competência do

Executivo brasileiro depende, no Brasil, segundo a teoria hoje predominante, de prévia abertura legal: deve ser, portanto, secundária. A jurisprudência norte-americana se afina com a doutrina brasileira neste ponto: “aatribuição de poder à burocracia, tal como ao Presidente, deve ter fundamento normativo em uma lei” (MASHAW,Jerry L. Gli atti sub-legislativi di indirizzo della pubblica amministrazione nell’esperienza degli USA. p. 138. In:CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potere regolamentare e strumenti di direzione dell’amministrazione: profili comparatistici . Bolonha: Il Mulino, 1991, p. 111-140: tradução livre do italiano).[149]

Ao analisar o conceito de administração ordenadora  como sucedâneo do termo poder de polícia, Sundfeldsalienta seu caráter derivado (secundário) capaz de interferir nos contornos da vida privada: “Cada vez mais a leise ocupa em disciplinar diretamente as variadas facetas da vida privada. A lei pode prever ou não a interferênciado Executivo em sua aplicação. Em caso positivo, estaremos diante de normas de direito administrativo (ex.: leis

municipais sobre construções urbanas, regras de trânsito, disciplina dos preços na economia). (...) A administraçãoordenadora surge apenas na primeira hipótese. Assim, inexiste setor que lhe pertença, por natureza. Só existiráadministração ordenadora se, quando, como e na medida em que o legislador, ao regulamentar a vida dosindivíduos, houver cominado à Administração um papel ativo em seu cumprimento.” (SUNDFELD, Carlos Ari.

Direito administrativo ordenador. 1a ed., 2a tir., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 21).[150]

“Evidentemente não estou a propor a liberação do Executivo para “legislar”. Pelo contrário, reconhecer odesenho correto do princípio, tal como contemplado pelo direito brasileiro, significa possibilitarmos o controle doexercício da função regulamentar  pelo Executivo, ao que se recusam nossos publicistas, sob o argumento de que

os regulamentos são inconstitucionais...” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3a ed.,São Paulo: Malheiros, 2000, p. 189).

[151]A característica hierárquica atribuída à distinção entre lei e regulamento é “de tipo orgânico” como ocorre norelato de Delpérée sobre o poder regulamentar na Bélgica, em que os poderes legislativo e executivo estãoinseridos em uma relação “entre poder soberano e poder subordinado” (DELPÉRÉE, Francis.  Le fonti normative secondarie nel diritto belga. p. 47-48. In: CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potere regolamentare e strumenti di direzione dell’amministrazione: profili comparatistici . Bolonha: Il Mulino, 1991, p. 47-67).[152]

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.  Reforma do Estado: o papel das agências reguladoras eiscalizadoras. p. 256. In: Fórum Administrativo , ano 1, nº 3, maio de 2001, p. 253-257. Continua, na mesma

 página: “igualmente se pode dizer que a prática é antiga, difundida e tolerada. Todos têm presente as circulares e portarias de que certos órgãos da Administração Pública usam e abusam, fazendo “leis” que não raro maisinterferem na vida do cidadão que as leis propriamente ditas.”

[153]Floriano Marques divide o problema de acordo com o tipo de órgão regulador: a) órgãos reguladores denatureza constitucional (ANATEL e ANP); b)órgãos reguladores criados exclusivamente por lei (ANEEL, ANVS,Câmara de Saúde Suplementar); c)órgãos reguladores de natureza constitucional imprópria, que encontramreferência no texto constitucional só que sem designação expressa da sua constituição como órgão regulador emsentido próprio (Banco Central – art.192, IV e Superintendência de Seguros Privados – art.192, II da CF/88).Conferir, a respeito: MARQUES NETO, Floriano Azevedo.  A nova regulação estatal e as agências independentes. p. 93-94: nota 49. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros,2000, p. 72-98.[154]

Salaverría esclarece a distinção entre discricionariedade interna e externa: “há que se furtar ao perigo de seconfundirem duas maneiras distintas em que comparece esta mistura de ‘técnica’ e ‘discricionariedade’ (pois

somente a uma delas cabe conceber como genuína ‘discricionariedade técnica’). Com efeito, uma coisa é entregar-se ao exercício da discricionariedade sobre a base de – entre outros – dados técnicos (econômicos, demográficosetc), e outra coisa distinta é que o espaço discricional irrompa na  entranha dos juízos técnicos mesmos”(SALAVERRÍA, Juan Igartua.  Discrecionalidad técnica, motivación y control jurisdicional . Madri: EditorialCivitas, 1998, p. 26).

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[155]A própria objetividade dos dados técnicos é questionável. A “realidade ensina que a técnica não é sempre e

necessariamente fonte de regras objetivamente válidas” (SALAVERRÍA, Juan Igartua.  Discrecionalidad técnica,motivación y control jurisdicional . Madri: Editorial Civitas, 1998, p. 27).[156]

Esta postura é criticável em face da já comentada ausência de objetividade nos critérios técnicos, no entanto,é adotada por juristas de peso. “Se a decisão é técnica, evidentemente há standards, e muito precisos, a seremestrita e rigorosamente atendidos por quem toma a decisão!” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito

pressuposto. 3a ed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 159).

[157]Vide SALAVERRÍA, Juan Igartua.  Discrecionalidad técnica, motivación y control jurisdicional . Madri:Editorial Civitas, 1998, p. 13. O pensamento do autor pode ser resumido assim: a determinação dadiscricionariedade somente é evidenciada definitivamente in concreto  (p. 38) e frente a uma decisão razoável  doadministrador, que assim afastaria a crítica do arbítrio, cuja garantia para controle está na motivação  essencial à ponderação da discricionariedade (p. 44 e seguintes).[158]

Vide MASHAW, Jerry L. Gli atti sub-legislativi di indirizzo della pubblica amministrazione nell’esperienzadegli USA. p. 119. In: CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potere regolamentare e strumenti di direzionedell’amministrazione: profili comparatistici. Bolonha: Il Mulino, 1991, p. 111-140.[159]

Vide DALLARI, Sueli Gandolfi.  Direito Sanitário . p. 55 e seguintes. In: ARANHA, Márcio Iorio (org.).

Direito sanitário e saúde pública: coletânea de textos. Vol. I, Brasília: Ministério da Saúde, 2003. (Série E.Legislação de Saúde)[160]

JUSTEN FILHO, Marçal. O Direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002, p.31.[161]

Vide PROSSER, Tony. Law and the Regulators. Oxford: Claredon Press, 1997.[162]

“Regulation means government-imposed controls on particular aspects of business activity.  Note: This doesnot mean that each and every business decision requires prior government approval. Instead, control will usually be exercised through a mix of prior approvals (for example, a request for a tariff increase) or after-the-fact reviewsof performance (for example, connection of a specified number of new customers). Regulation is only one form of 

government control. Governments can also control enterprises through ownership and fiscal incentives).”(BROWN, Ashley C.; STERN, Jon; TENENBAUM, Bernard. World Bank Handbook for Evaluating nfrastructure Regulatory Systems. Washington: World Bank, 2006, p. 16).

[163]Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vieira de. Regulação de Serviços Públicos na Perspectiva da

Constituição Econômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.[164]

Definindo regulação como forma de controle estatal, vide: GARNER, Bryan A. (org.).  Black’s Lawdictionary. 8ª ed., St. Paul: West Publishing Co., 2004, p. 1311.[165]

“Embora a etimologia sugira a associação da função reguladora com o desempenho de competênciasnormativas, seu conteúdo [da regulação] é mais amplo e variado (...) a regulação contempla uma gama maisampla de atribuições, relacionadas ao desempenho de atividades econômicas e à prestação de serviços públicos,incluindo sua disciplina, fiscalização, composição de conflitos e aplicação eventual de sanções” (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Direito regulatório: a alternativa participativa flexível para a administraçãopública de relações setoriais complexas no Estado Democrático. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 45).[166]

Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vieira de. Regulação de Serviços Públicos na Perspectiva daConstituição Econômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.[167]

Entrevista dada por George Soros na CNN, Fareed Zakaria GPS, em 12 de outubro de 2008.[168]

“In no system that could be rationally defended would the state just do nothing” (HAYEK, Friedrich. The Road to Serfdom. Chicago: University of Chicago Press, 1944, p. 38-39).[169]

As funções de fiscalização, incentivo e planejamento constam das raras passagens constitucionais (art. 174,caput  da Constituição Federal de 1988) expressamente atinentes à atividade reguladora do Estado.[170]

Vide MARQUES NETO, Floriano Azevedo.  A nova regulação estatal e as agências independentes . p. 74.In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 72-98).

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[171]Para uma concepção de regulação como  gerenciamento normativo de conflitos, vide: SUNDFELD, Carlos

Ari. Agências reguladoras e os novos valores e conflitos , p. 1294. In: Anais da XVII Conferência Nacional dosAdvogados. Justiça: realidade e utopia. Vol. II, Rio de Janeiro: Ordem dos Advogados do Brasil, 1999, p. 1291-1297. “O que é regular? É fazer este ‘gerenciamento’ que referi. Não limitar-se à distante edição de normasabstratas capazes de cuidar da sociedade durante oitenta anos sem transformação mais profunda (...)”(SUNDFELD, Carlos Ari. op. cit., p. 1295).[172]

Observe-se que, aqui, regulamentação está sendo tratada como meio de regulação estatal. Outra concepção

dos termos regulação e regulamentação , guardando sintonia com a terminologia – deregulation x regulation – e a preocupação atual norte-americana de oposição entre regulação estatal   (exo-regulação) e regulação social   (auto-

regulação), encontra-se em: GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto . 3a ed., São Paulo:Malheiros, 2000, p. 93.[173]

Eros Grau define a regulação como a atividade de “dar ordenação à atividade econômica” e aregulamentação como uma sua espécie voltada a dar ordenação à atividade econômica “através de preceitos de

autoridade, ou seja, jurídicos” (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3a ed., São Paulo:Malheiros, 2000, p. 96).[174]

A relação da regulação com monopólios da União vem inscrita no art. 177, §2º, III, da Constituição Federalde 1988, referente ao petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos.[175]

Cass Sunstein utiliza, indiferentemente, os termos regulation, law and government ,  government regulation  elegal regulation , no sentido de intervenção em atividades de interesse público. Conferir: SUNSTEIN, Cass R. Republic.com 2.0 . Princeton and Oxford: Princeton University Press, 2007.[176]

Sobre o conceito de sociedade-rede, vide: CASTELLS, Manuel. The Network Society: From Knowledge to Policy. In CASTELLS, Manuel; CARDOSO, Gustavo. The Network Society: From Knowledge to Policy.Washington: Johns Hopkins Center for Transatlantic Relations, 2006, p. 3-21.[177]

“We are used to hearing tales of the unintended bad consequences of government action. The Internet is anunintended good consequence of government action, by the Department of Defense no less.” (SUNSTEIN, CassR. Republic.com 2.0. Princeton and Oxford: Princeton University Press, 2007, p. 157).

[178]Vide AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 163-209.[179]

AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p.165.[180]

Vide WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991, p. 140.[181]

Vide AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 165-181.[182]

Verificou-se a tendência de passagem do “poder de gerir a coisa pública das mãos privadas do Imperador 

 para inúmeros novos centros de poder” (AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. SãoPaulo: Max Limonad, 1999, p.181).[183]

Este fenômeno não foi uniforme, como nada na história o é. Daí Aguillar ressaltar uma manifestação deregulação normativa concentrada nas concessões de construção e exploração de ferrovias a partir da primeirametade do século XIX e na regulamentação da infraestrutura portuária. Conferir: AGUILLAR, Fernando Herren.Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 184.[184]

Art.137.A lei federal regulará a fiscalização e a revisão das tarifas dos serviços explorados por concessão, oudelegação, para que, no interesse collectivo, os lucros dos concessionarios, ou delegados, não excedam a justaretribuição do capital, que lhes permitta attender normalmente ás necessidades publicas de expansão emelhoramento desses serviços. (CAMPANHOLE, Adriano; CAMPANHOLE, Hilton Lobo. Constituições doBrasil. 13ªed., São Paulo: Atlas, 1999. p. 722) – mantida a redação original da época.[185]

O art. 142 da CF/34 proibiu a garantia de juros aos concessionários. Constituição Federal brasileira de 1934:“Art. 142. A União, os Estados e os Municípios não poderão dar garantia de juros a empresas concessionarias deserviços publicos”.

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[186]Esse período presenciou a criação do Conselho Nacional de Telecomunicações com o Decreto 50.666/61 e a

instituição do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/62) revogado em sua maior parte pela Lei9.472/97.[187]

Um dos objetivos fundamentais da Reforma Estrutural do Setor de Telecomunicações proposta e jáimplementada pelo Governo brasileiro desde 1995 foi “fortalecer o papel regulador do Estado e eliminar seu papelde empresário” mediante a privatização e a criação do órgão regulador. Conferir: BRASIL, Ministério dasComunicações. Diretrizes Gerais para a Abertura do Mercado de Telecomunicações . Título II (Os

fundamentos da proposta), Capítulo 2 (Os objetivos da reforma), Figura 6. Esclarecedora a posição exarada peloBanco Mundial na Americas Telecom 2000 , realizada entre 10 e 15 de abril de 2000, no Rio de Janeiro, quandoseu representante, Carlos Braga, foi questionado pelo Governo de Porto Rico sobre a ausência de linhas de crédito para empresas estatais prestadoras de serviços de telecomunicações. A resposta revelou a decisão do BancoMundial em somente fomentar o desenvolvimento de empresas privadas de telecomunicações em mercados livres, pois partiu do pressuposto de que a concentração do serviço de telecomunicações nas mãos do Estado nãosatisfaria as exigências de tecnologia e dinamização em um mundo globalizado.[188]

As transformações implementadas ocorreram porque o controle da regulação pelo próprio gestor do serviço(DNAEE, DNER, TELEBRÁS, ELETROBRÁS) fazia prevalecer o interesse da burocracia (interesse secundário)sobre o interesse do consumidor (interesse primário). Conferir: MARQUES NETO, Floriano Azevedo.  A novaregulação estatal e as agências independentes . p. 77. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direitoadministrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 72-98.[189]

Esmiuçando o conceito de Estado Subsidiário, vide: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parceriais na

Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas . 3a ed., São Paulo:Atlas, 1999, p. 24-31.[190]

Vide TÁCITO, Caio.  Novas agências administrativas. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro 45(529): 33-44,abril 1999, p. 34.[191]

O Decreto 83.740/79 estebeleceu um Ministro Extraordinário do Programa Nacional de Desburocratização.Dentre os objetivos do Programa, estava o de “impedir o crescimento desnecessário da máquina administrativafederal, mediante o estímulo à execução indireta, utilizando-se, sempre que praticável, o contrato com empresas

 privadas capacitadas e o convênio com órgãos estaduais e municipais” (art.3o, g , do Decreto 83.740/79). Visava,também, o incentivo de uma “política de contenção da criação indiscriminada de empresas públicas, promovendoo equacionamento dos casos em que for possível e recomendável a transferência do controle para o setor privado”

(art.3o, h, do Decreto 83.740/79).[192]

Art.1o, I do Decreto 95.886, de 29 de março de 1988.[193]

Para a análise do histórico dos dispositivos normativos da desestatização no Brasil, vide: MEDAUAR, Odete.

Direito administrativo moderno. 5a ed., São Paulo: RT, 2001, p. 106 e seguintes.[194]

Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vieira de. Regulação de Serviços Públicos na Perspectiva da

Constituição Econômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.[195]CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA DE 1988, art.151, I.

[196]Da mesma forma, as chamadas sanções premiais   são intervenção por indução, mas não se caracterizam

como regulação regional e sim geral ou setorial dependendo do caso. Incentivos fiscais à indústria, em geral, parainvestimento em meio ambiente não se configuram regulação regional, mas geral sobre o subsistemaordenamental ambiental. Se tais incentivos fiscais fossem dirigidos à determinado setor, eles se apresentariamtambém gravados do caráter de regulação setorial.[197]

CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA DE 1988, art.159, I, c.[198]

AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p.

214.[199]

Como exemplo, vide, mais adiante, nota 269.[200]

 No Brasil, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). No Reino Unido, a Monopolies and  Merger Commission  (MMC). Nos EUA, a Federal Trade Commission (FTC).

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[201]Proposta de Carlos Ari Sundfeld na XVII Conferência Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil. “Talvez

á seja a hora de pensar, também, na criação de agências reguladoras do meio ambiente independentes em relaçãoao Poder Executivo, para substituir os atuais órgãos incumbidos do assunto” (SUNDFELD, Carlos Ari. Op. cit., p.1291).[202]

É o caso do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central do Brasil.[203]

À época de criação destas autarquias, costumava-se distinguir, por inspiração do direito italiano, entreautarquias econômicas, voltadas a regular a produção e o comércio, autarquias industriais, autarquias de crédito,autarquias de previdência, autarquias corporativas, autarquias educacionais. FERREIRA FILHO, ManoelGonçalves.  Reforma do Estado: o papel das agências reguladoras e fiscalizadoras . p. 254. In: FórumAdministrativo, ano 1, nº 3, maio de 2001, p. 253-257.[204]

O Instituto Brasileiro do Café (IBC) apresentava-se como entidade autárquica criada pela Lei 1.779, de 22 de

dezembro de 1952. O art.1o, I, e da Lei 8.029, de 12 de abril de 1990, autorizou o Poder Executivo a extinguir oIBC, o que se concretizou com o Decreto 99.240, de 7 de maio de 1990. Atualmente, o Departamento do Café(DECAF) é responsável pelo planejamento, coordenação e supervisão das políticas públicas concernentes ao setor cafeeiro e integra a Secretaria de Produção e Comercialização na estrutura do Ministério da Agricultura e doAbastecimento.[205]

O Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) foi criado pelo Decreto 22.789, de 1o

 de junho de 1933. O art.1o

, I,d  da Lei 8.029, de 12 de abril de 1990 autorizou o Poder Executivo a extinguir o IAA, o que se concretizou com o

art.1o, I, d do Decreto 99.240, de 7 de maio de 1990. O Decreto 99.288, de 6 de junho de 1990, transferiu asatribuições do extinto IAA para a Secretaria de Desenvolvimento Regional da Presidência da República (SDR/PR),que foi transformada em Secretaria do Ministério da Integração Regional (MIR) pela Lei 8.490, de 19 denovembro de 1992. Com a Medida Provisória 987, de 28 de abril de 1995, o Ministério da Indústria, do Comércio

e do Turismo (MICT) assumiu os encargos do MIR. Em 22 de dezembro de 1995, o art.2 o, III, b do Anexo I doDecreto 1.757 criou o Departamento de Açúcar e do Álcool integrante da estrutura do então MICT. Finalmente, aMedida Provisória 1.911-8, de 29 de julho de 1999 transferiu para o Ministério da Agricultura e do Abastecimentoa competência sobre a matéria de política sucroalcooleira, onde funciona o Departamento do Açúcar e do Álcoolintegrante da Secretaria de Produção e Comercialização na estrutura do Ministério da Agricultura e do

Abastecimento. Atualmente, a política pública sucroalcooleira concentra-se no Programa de Equalização deCustos de Produção nos Estados do Nordeste em detrimento de programas de incentivo específico de plantadoresde cana. Tal programa foi instituído pela Resolução nº 5, de 10/12/1998, do Conselho Interministerial do Açúcar edo Álcool (CIMA), criado pelo Decreto sem número de 21/08/1997 revogado pelo Decreto atual de regência doCIMA: Decreto 3.546, de 17/07/2000.[206]

O DNAEE originou-se da Divisão de Águas (criada pelo Decreto 6.402, de 28/10/1940) do Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM – (criado na Reforma Juarez Távora, em agosto de 1934) então pertencente ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio. Com a criação do Ministério das Minas e Energia,em 1961, o DNPM foi vinculado a este ministério. Sua Divisão de Águas foi transformada no Departamento Nacional de Águas e Energia – DNAE (Lei 4.904, de 17/12/1965) e teve sua denominação alterada para

Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE pelo Decreto 63.951, de 31/12/1968.[207]O Conselho Nacional do Petróleo (CNP) foi criado pelo Decreto nº395/38 e teve suas atribuições definidas

 pela Lei 2.004, de 03 de outubro de 1953.[208]

Deste rol de agências reguladoras está excluída a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), que assimilou aterminologia aplicada às autarquias autônomas de regulação setorial, mas não detém suas característicasdistintivas. A ABIN não tem personalidade jurídica própria. É um órgão integrante do Subsistema de Inteligência

de Segurança Pública (art. 2o  do Decreto 3.448/2000), criado no âmbito do Sistema Brasileiro de Inteligência

(SISBIN) da Presidência da República (arts. 1o  e 3o  da Lei 9.883/99), sob supervisão interna da Câmara de

Relações Exteriores e Defesa Nacional do Conselho de Governo (art. 5o da Lei 9.883/99) e sob controle externo

do Congresso Nacional (art. 6o

 da Lei 9.883/99). Está sob a direção monocrática de um Diretor-Geral (art. 8o

 daLei 9.883/99), ao contrário do modelo das agências reguladoras pautado em colegiados. Assemelha-se, contudo,às agências reguladoras no procedimento de nomeação de seu Diretor-Geral, mediante indicação e nomeação peloPresidente da República após sabatina no Senado Federal (art. 11, parágrafo único da Lei 9.883/99). O ConselhoEspecial do Subsistema de Inteligência de Segurança Pública, sob administração da ABIN, é vinculado ao

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Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (art. 3o  do Decreto 3.448/2000) e tem o seuRegimento Interno aprovado pelo Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, queé a via de interação da Agência com os interessados no exercício de seu direito a autodeterminação dasinformações pessoais.[209]

Agência Espacial Brasileira (AEB) foi instituída pela Lei 8.854, de 10 de fevereiro de 1994, comcompetência, dentre outras, de estabelecer normas e expedir licenças e autorizações relativas às atividadesespaciais (art.3º,XIII) bem como aplicar as normas de qualidade e produtividade em tais atividades (art.3º,XIV).[210]

Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) foi instituída pela Lei 9.472, de 16 de julho de 1997,regulamentada pelo Decreto 2.338, de 7 de outubro de 1997, com função de disciplinamento e fiscalização daexecução, comercialização e uso dos serviços de telecomunicações e da implantação e funcionamento de redes detelecomunicações, bem como da utilização dos recursos de órbita e espectro de radiofrequências. Tem fundo próprio submetido a sua exclusiva administração (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações – FISTEL), criado pela Lei 5.070, de 7 de julho de 1966.[211]

Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) foi instituída pela Lei 9.427, de 26 de dezembro de 1996com a finalidade de regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica,em conformidade com diretrizes do Governo Federal e com poderes regulamentados pelo Decreto 2.335, de 6 deoutubro de 1997. Sucedeu ao Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE). Tem atribuição de

celebrar e gerir contratos de concessão e de permissão no setor e de dirimir, no âmbito administrativo,divergências entre concessionárias e consumidores.[212]

Agência Nacional do Petróleo (ANP), instituída pela Lei 9.478, de 6 de agosto de 1997, teve suas atividadesregulamentadas pelo Decreto 2.455, de 14 de janeiro de 1998. Como autarquia reguladora da indústria do petróleo, tem funções de normatização, contratação e fiscalização das atividades econômicas integrantes daindústria do petróleo.[213]

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) foi instituída pela Lei 9.782, de 26 de janeiro de 1999 eteve suas atividades regulamentadas pelo Decreto 3.029, de 16 de abril de 1999. Sua sigla foi mudada de ANVS para ANVISA pela Medida Provisória 2.134-25, de 28/12/2000, produto de modificação das prorrogações daMedida Provisória originária de número 1.814, de 26/02/1999. Autarquia especial vinculada ao Ministério da

Saúde, tem por objetivos, dentre outros, promover  a proteção da saúde da população, por intermédio do controlesanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dosambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem como o controle de portos,aeroportos e de fronteiras.[214]

Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) foi criada pela Lei 9.961, de 28 de janeiro de 2000, tambémvinculada ao Ministério da Saúde e com a finalidade de promover a defesa do interesse público na assistênciasuplementar à saúde, normatizando a atuação das operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento de ações em âmbito nacional.[215]

Agência Nacional das Águas (ANA) foi instituída pela Lei 9.984, de 17 de julho de 2000, vinculada aoMinistério do Meio Ambiente, integrante do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recurso Hídricos.

[216]Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), instituída pela Lei 10.233, de 5 de junho de 2001,autarquia especial supervisionada pelo Ministério dos Transportes com independência administrativa, autonomiafinanceira e funcional e mandato fixo de seus dirigentes (art.21,§2º) e competência para regulação do transporteferroviário de passageiros e cargas ao longo do Sistema Nacional de Viação (art.22,I), de exploração dainfraestrutura ferroviária e arrendamento dos ativos operacionais correspondentes (art.22,II), do transporterodoviário interestadual e internacional de passageiros (art.22,III), do transporte rodoviário de cargas (art.22,IV),da exploração da infraestrutura rodoviária federal (art.22,V), do transporte multimodal (art.22,VI) e do transporteda cargas especiais e perigosas em rodovias e ferrovias (art.22,VII).[217]

Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), instituída pela Lei 10.233, de 5 de junho de 2001,autarquia especial supervisionada pelo Ministério dos Transportes com independência administrativa, autonomia

financeira e funcional e mandato fixo de seus dirigentes (art.21,§2º) e competência para regular a navegaçãofluvial, lacustre, de travessia, de apoio marítimo, de apoio portuário, de cabotagem, de longo curso (art.23,I), os portos organizados (art.23,II), os terminais portuários privativos (art.23,III), o transporte aquaviário de cargasespeciais e perigosas (art.23,IV) e a exploração da infraestrutura aquaviária federal (art.23,V).

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[218]Agência Nacional do Cinema (ANCINE), instituída pela Medida Provisória 2.228, de 6 de setembro de 2001,

autarquia especial supervisionada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior comautonomia administrativa e financeira (art.5º,caput ) e mandato fixo de seus dirigentes (art.8º,caput ) e competência para regular as atividades cinematográficas e videofonográficas (art.7º), com detalhamento do audiovisualadvindo da Lei 12.485, de 12 de setembro de 2011.[219]

Office of Water Services (OFWAT), cujo Diretor (Director General of Water Services) vem definido como oregulador econômico da indústria de água e esgoto da Inglaterra e do País de Gales na Parte I, Artigo 1º, Parágrafo

1º, do Water Industry Act 1991 (WIA91), fixando preços pelos serviços de fornecimento de água e de esgoto,fiscalizando a qualidade dos serviços, fiscalizando a saúde das empresas do setor, incentivando a eficiência e acompetição.[220]

Precedida pela OFTEL (Office of Telecommunications), que fora criada pelo Telecommunications Act   de1984, a Office of Communications (OFCOM), com formato definido pelo Communications Act de 2003, assimilou,dentre outras, as competências da OFTEL e hoje se apresenta como reguladora da indústria de comunicações do Reino Unido , envolvendo serviços de televisão, rádio, telecomunicação e comunicação sem fio.[221]

The Office of Gas and Electricity Markets (OFGEM) surgiu da reunião do OFFER (Office of ElectricityRegulation) com o OFGAS (Office of Gas Suply), cujas bases normativas remontam ao Gas Act de 1986. Trata-sedo regulador da indústria britânica de gás e eletricidade.

[222] Interstate Commerce Commission   (ICC), festejada como a primeira agência reguladora federal norte-americana, foi instituída pelo Interstate Commerce Act  de 1887 destinada a regular transportes em geral, à exceçãodo transporte aéreo, tendo sido extinta em 1995.[223]

 Federal Communications Commission   (FCC), instituída pelo Communications Act de 1934 e qualificadacomo agência independente, responde pela regulação da comunicação interestadual e internacional por rádio,televisão, par de cobre, satélite ou cabo.[224]

 Federal Energy Regulatory Commission   (FERC), foi a sucessora da antiga Federal Power Commission(FPC), que, embora existente desde 1920, adquiriu as características de uma agência governamental independentea partir de 1930. Criada em 1977, a FERC é citada oficialmente como agência governamental independente que

regula a transmissão interestadual de gás natural, petróleo e eletricidade dos Estados Unidos da América.[225] Regulierungsbehörde für Telekommunikation und Post   (RegTP), trata-se da Autoridade Reguladora para

Telecomunicações e Correios da Alemanha, entidade reguladora dos setores de telecomunicações e correiosinstituída a partir de 1996 com a correspondente Lei Geral de Telecomunicações ( Regelungen desTelekommunikationsgesetzes – TKG). Em 13 de julho de 2005, foi renomeada para  Bundesnetzagentur . Conferir:FARIA, Patrick.  A Agência Federal de Redes na República Federal da Alemanha. In: Anais do I Seminário deRegulação de Serviços Públicos - Direito Comparado da Energia Elétrica e das Telecomunicações . Brasília,2007.[226]

União Internacional de Telecomunicações ( International Telecommunication Union  – ITU).[227]

World Health Organization (WHO) – Organização Mundial da Saúde (OMS).[228]Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO).

[229]United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO).

[230]Universal Postal Union International (UPU).

[231] International Atomic Energy Agency (IAEA) – Organismo Internacional de Energia Atômica (OIEA).

[232] No setor de telecomunicações, o espectro de radiofrequência  e os recursos de órbita são exemplos de bens

finitos ou escassos.[233]

Já na primeira metade do século XIX, os conselhos administrativos  eram tidos como auxiliares dos agentes políticos “para que a deliberação e a ação que [deles] resulta seja ilustrada e acertada; para que esta melhor possaser fiscalizada; para que a responsabilidade seja mais patente e justa” (URUGUAI, Paulino José Soares de Souza,Visconde de. Ensaio sobre o direito administrativo. Fac-símile da edição de 1960, Brasília: Imprensa Nacional,1997, p. 126).

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[234]CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA DE 1934: “Art. 103. Cada Ministerio será assistido por um ou

mais Conselhos Technicos, coordenados, segundo a natureza dos seus trabalhos, em Conselhos Geraes, como

órgãos consultivos da Camara dos Deputados e do Senado Federal. §1o A lei ordinaria regulará a composição, o

funccionamento e a competencia dos Conselhos Technicos e dos Conselhos Geraes. §2 o Metade, pelo menos, decada Conselho será composta de pessoas especializadas, estranhas aos quadros do funccionalismo do respectivo

Ministerio. §3o Os membros dos Conselhos Technicos não perceberão vencimentos pelo desempenho do cargo,

 podendo, porém, vencer uma diaria pelas sessões, a que comparecerem. §4o É vedado a qualquer Ministro tomar 

deliberação, em materia da sua competencia exclusiva, contra o parecer unanime do respectivo Conselho.”(CAMPANHOLE, Hilton Lobo; CAMPANHOLE, Adriano. Constituições do Brasil. 13aed., São Paulo: Atlas,1999, p. 712).[235]

Max Weber utiliza o conceito de colegialidade  como meio específico de mitigação da dominação. Acolegialidade de funções  diferencia-se, no pensamento de Weber, da colegialidade de cassação. Nesta última, persiste a decisão monocrática em meio a outras instâncias monocráticas de adiamento ou cassação da decisão. Nacolegialidade de funções, a autoridade monocrática é substituída pela autoridade institucional , em que a vontadede um é substituída pela cooperação de alguns. Conferir, a respeito: WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol.I,Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991, p. 178-188.[236]

Sobre o princípio da colegialidade, García-Trevijano Fos esclarece que “constitui (....) o último dos que

integram as bases fundamentais de toda organização administrativa. Dividíamos os órgãos em ativos, deliberantes,consultivos e de controle. Teoricamente, todos eles podem ser unipessoais ou colegiados com uma única exceção:a dos órgãos consultivos, que têm sempre natureza colegial (....). Os órgãos ativos costumam ser – naadministração geral do Estado – unipessoais. Os de controle costumam ser, ao contrário, colegiados.” – traduçãolivre do original: FOS, Jose Antonio Garcia-Trevijano. Tratado de derecho administrativo. Tomo II, Vol. I, 2ªed.,Madri: Editorial Revista de Derecho Privado, 1971, p. 480.[237]

Ao analisar os progressos do princípio burocrático monocrático, Weber aponta defeitos e virtudes da formacolegial de decisão: “O trabalho organizado em forma colegial (...) condiciona atritos e retardações, compromissosentre opiniões e interesses contraditórios, realizando-se, portanto, com menos precisão e menos dependência deautoridades superiores e, por isso, de maneira menos uniforme e mais lenta” (WEBER, Max. Economia e

sociedade. Vol. II, Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999, p. 212).[238]Vide WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol. I, Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991, p. 183.

[239]“Superior ao conhecimento especial da burocracia é apenas o conhecimento especial dos interessados da

economia privada, na área ‘econômica’. Isto porque, para eles, o conhecimento exato dos fatos de sua área édiretamente uma questão de sua existência econômica: erros numa estatística oficial não trazem consequênciasdiretamente econômicas para o funcionário responsável, mas erros nos cálculos de uma empresa capitalistacausam-lhe perdas, ameaçando, talvez, sua existência. E também o ‘segredo’, como meio de poder, está maisseguramente guardado no livro comercial de um empresário do que na documentação das autoridades. Já por isso,a influência oficial sobre a vida econômica, na era capitalista, tem limites muito estreitos, e as medidas do Estadonesta área desembocam tão frequentemente em caminhos imprevistos e despropositados ou tornam-se ilusórias

devido ao conhecimento especial superior dos interessados” (WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol. II,Brasília. Editora Universidade de Brasília, 1999, p. 227).[240]

Vide WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol. II, Brasília. Editora Universidade de Brasília, 1999, p. 228-229.[241]

O trecho a seguir é esclarecedor da abertura conceitual sofrida pelo conceito de conselho: “Enquanto oconhecimento especial em assuntos administrativos era exclusivamente produto de longa prática empírica  e asnormas administrativas não eram regulamentos, mas componentes da tradição, o conselho dos anciãos, muitasvezes com participação dos sacerdotes, dos “velhos estadistas” e dos honoratiores, era tipicamente a formaadequada de tais instâncias, que inicialmente apenas aconselhavam o senhor, porém, mais tarde, por seremcomplexos perenes diante dos soberanos alternantes, frequentemente usurpavam o poder efetivo. Assim, o senadoromano e o conselho veneziano, bem como o areópago ateniense até sua derrubada em favor do domínio dos‘demagogos’.” (WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol. II, Brasília. Editora Universidade de Brasília, 1999, p.228).[242]

São exemplos conhecidos de “conselhos” com função decisória, no Brasil, o Conselho Administrativo de

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Defesa Econômica (CADE) e os Conselhos de Contribuintes. O Conselho Nacional de Desestatização – CND,criado pela Lei 8.031/90 e integrado por cinco ministros de estado tem amplos poderes sobre todo o processo de privatização, desde a escolha das atividades ou empresas a serem privatizadas até a forma de privatização e odestino dos recursos. Eventualmente deliberam nas sessões, o presidente do Banco Central e outros ministros deEstado. O presidente do Conselho é o Ministro do Planejamento e Orçamento. Mesmo o Conselho Nacional dePolítica Energética (CNPE), com atribuição de propor medidas relativas aos recursos energéticos ao Presidente da

República (art.2o  da Lei 9.478/97), transpareceu vinculação das suas emanações por força do Decreto 2.455/98,que, ao estabelecer as finalidades da Agência Nacional do Petróleo, vinculou-a às diretrizes emanadas do

Conselho Nacional de Política Energética   (art.2o  do Decreto 2.455/98), que foge à característica meramenteconsultiva em razão de seu funcionamento periódico e função específica de propostas políticas energéticas. Nãose quer dizer com isso que suas decisões vinculam sem a necessária aprovação do Presidente da República.[243]

A presença, na Constituição Federal brasileira de 1988, do Conselho da República e do Conselho de Defesa Nacional como órgãos meramente opinativos é significativa.[244]

 Nem todos os exemplos são tão lúcidos assim. O Conselho Monetário Nacional (CMN) tem sua composiçãorestrita a 3 membros do Executivo exclusivamente, quais sejam: Ministro de Estado da Fazenda; Ministro deEstado do Planejamento e Orçamento; Presidente do Banco Central. Funcionam junto ao Conselho Monetário Nacional comissões consultivas estritamente técnicas (Normas e Organização do Sistema Financeiro, Mercado deValores Mobiliários e de Futuros, Crédito Rural, Crédito Industrial, dentre outros).

[245]Como exemplo, a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) comporta um Conselho Consultivodefinido como órgão de “participação institucionalizada da sociedade na Agência” (art.33 da Lei 9.472/97).[246]

AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 1999, p.226.[247]

Sobre os conselhos, “continuava a operar, de direito ou de fato, o controle político, pela via de supervisãoministerial e a competência do Congresso, definindo metas e a atribuição de recursos” (TÁCITO, Caio.  Novasagências administrativas. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro 45(529): 33-44, abril 1999, p. 36).[248]

Considerando o CONTEL como comissão interministerial , vide: BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL

FEDERAL. Mandado de Segurança n. 19.227/DF, relator Min. Themístocles Cavalcanti, Tribunal Pleno, unânime,. 09/04/1969.[249]

Murilo César Ramos analisa a semelhança entre o CONTEL brasileiro e a FCC norte-americana e atesta o processo de centralização ministerial como o fator de extinção do órgão regulador das telecomunicações no Brasilao falar do “órgão colegiado criado pelo Código Brasileiro de Telecomunicações, emulado, ainda quefrouxamente, na Federal Communications Commission  (FCC) norte-americana. CONTEL que iria ser esvaziado progressivamente até sua extinção total nos anos 70, substituído de fato e de direito por um Ministério altamentecentralizador e concentrador de poder.” (RAMOS, Murilo César. Saúde, novas tecnologias e políticas públicas decomunicações. In: PITTA, Áurea Maria da Rocha (org). Saúde & Comunicação: visibilidades e silêncios.  SãoPaulo: Hucitec, 1995. p. 69-70).[250]

Expressão originária do italiano autarchia. O termo “foi usado pela primeira vez pelo publicista italiano SantiRomano, em 1897, para identificar a situação de entes territoriais e institucionais do Estado unitário italiano”

(MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 5a ed., São Paulo: RT, 2001, p. 77). O conceito basilar deautarquia está na personalidade jurídica dotada de auto-administração e autosuficiência, conforme enuncia adoutrina italiana em face de sua etimologia: “A palavra italiana ‘autarquia’ traduz duas expressões gregas distintase tem dois significados em virtude desta origem distinta: em um primeiro significado, indica a condição de umsujeito que é capaz de bastar a si próprio, de prover suas próprias necessidades (autosuficiência); no segundo,serve para indicar a posição de um ente a quem é reconhecida a capacidade de se governar, de administrar os próprios interesses (auto-administração)” (ZANOBINI, Guido. Corso di diritto amministrativo. Vol. I, 8ª ed.,Milão: Dott. A. Giuffrè Editore, 1958, p. 124). Tradução livre do original: “ La parola italiana ‘autarchia’ traducedue diverse parole greche e ha due significati, secondo che deriva dall’una o dall’altra di esse: in um primo

 significato, indica la condizione di un soggetto che è capace di bastare a se stesso, di provvedere da sè ai propribisogni (autosufficienza); nel secondo, vale a indicare la posizione di un ente cui è riconosciuta la capacità di governarsi da sè, di amministrare da sè i propri interessi (autoamministrazione)”.[251]

TÁCITO, Caio. Novas agências administrativas. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro 45(529): 33-44, abril1999, p. 37.

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[252]Lei 9.649, de 27 de maio de 1998, produto da Medida Provisória 1.549-28, regulada pelos Decretos 2.487 e

2.488, ambos de 2 de fevereiro de 1998.[253]

Fala-se em autarquias e fundações públicas federais, pois a lei criadora das agências executivas é federal.Isso não impede a criação de agências executivas semelhantes às federais no âmbito estadual e municipal, desdeque existam leis destes entes para embasarem o ato da Administração.[254]

TÁCITO, Caio. Novas agências administrativas. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro 45(529): 33-44, abril1999, p. 36.[255]

Em razão de sua natureza jurídica de direito público interno, a ela se aplica o rol de características publicistas, tais como: responsabilidade objetiva do poder; controle dos atos estatais; fundamentação dos atos do poder; discricionariedade; publicidade; transparência; supremacia do interesse público; legalidade estrita; processode produção de atos do poder; dever de prestar contas; licitação etc. A respeito da caracterização do regime dedireito público, conferir a obra precisa, embora sintética e introdutória: SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos dedireito público. São Paulo: Malheiros, 1992.[256]

Quanto aos efeitos do decreto, qualificando autarquias ou fundações como agências executivas, Di Pietrodefende que “dificilmente se poderá ampliar a autonomia dessas entidades, por meio de decreto ou de contrato de

gestão [embora deixando em aberto à lei prevista no art.37, §8o  da CF/88 a possibilidade de ampliação de dita

autonomia], porque esbarrarão os mesmos em normas legais e constitucionais” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.Direito administrativo. 11a ed., São Paulo: Atlas, 1999, p. 388).[257]

 Nas agências executivas, predomina “o sentido de prévio compromisso e a aferição de resultados comorequisito de sobrevivência” (TÁCITO, Caio. Novas agências administrativas. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro45(529): 33-44, abril 1999, p. 39).[258]

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.  Reforma do Estado: o papel das agências reguladoras eiscalizadoras. In: Fórum Administrativo, ano 1, nº 3, maio de 2001, p. 253-257.

[259] No Brasil, as agências reguladoras manifestam-se por diversos atos (súmula, aresto, ato, portaria, consulta,

resolução). Destes, somente a resolução  tem propriamente caráter normativo qualificado como um poder não-

delegado e “temperado” (CUÉLLAR, Leila. As agências reguladoras e seu poder normativo. São Paulo:Dialética, 2001, 142) ou mesmo como uma espécie de alargamento do poder normativo do Executivo por intermédio de lei-quadro (loi-cadre) correspondente (BRUNA, Sérgio Varella. Agências reguladoras: podernormativo, consulta pública e revisão judicial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 73). Nos EUA,têm-se como exemplos da diversidade de atos produzidos no âmbito das agencies  norte-americanas dotadas de poder normativo: rules, adjudicatory orders, licenses, policy statements, manuals, circulars, memoranda,advisory opinions, waivers, recommendations, regulations  (MASHAW, Jerry L. Gli atti sub-legislativi di indirizzodella pubblica amministrazione nell’esperienza degli USA. p. 117. In: CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potere regolamentare e strumenti di direzione dell’amministrazione: profili comparatistici . Bolonha: Il Mulino,1991, p. 111-140).[260]

TÁCITO, Caio. Novas agências administrativas. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro 45(529): 33-44, abril1999, p. 34.[261]

MORAES, Luiza Rangel de. A reestruturação dos setores de infra-estrutura e a definição dos marcosregulatórios. In: PAULA, Tomás Bruginski de; REZENDE, Fernando (coordenadores). Infra-estrutura:perspectivas de reorganização (Caderno de Regulação). Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(IPEA), 1997, p. 12.[262]

Fala-se, então, da dificuldade de assimilação do novo modelo de “instituições independentes e com grandeautonomia de ação” (Ibid., p. 5).[263]

Parker assimila o conceito de commission  ao de independent agency. Também registra a qualificação dequarto poder  atribuída às independent agencies norte-americanas pelos órgãos de cúpula dos poderes Legislativo

e Executivo. Conferir: PARKER, Reginald.  Administrative Law. Indianápolis: The Bobbs-Merrill Company, 1952, p. 94: nota 62.[264]

Deve-se atentar para a consideração de Caio Tácito sobre a impropriedade da aproximação exagerada entreos conceitos de agências reguladoras do Brasil e as commissions dos EUA, pois ela seria “antes terminológica do

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que real” (TÁCITO, Caio. Novas agências administrativas. In: Carta Mensal, Rio de Janeiro 45(529): 33-44, abril1999, p. 37). Há, entretanto, aproximações úteis à compreensão das agências reguladoras: a) o interesse no estudodo conceito de public utility commission regulation está na discussão e fixação do grau de interferência do Poder Judiciário nas suas decisões. A análise dos limites dos clássicos cases  envolvendo as commissions  norte-americanas pode ser conferida em: CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Tratado de direito administrativo .Vol. II, 5ª ed., Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1964, p. 496-499. Desta discussão surge a extensão do poder revisório judicial frente à discricionariedade do ato administrativo regulatório estatal; b) a origem dacogitação das commissions aproxima-se muito do objetivo das agências reguladoras brasileiras, pois aquelas foram

introduzidas com intuito de otimizar o controle das atividades estatais delegadas, outorgando-se poderes deregular   e de controlar   de forma contínua  as concessões públicas por órgãos com conhecimento técniconecessário ao direcionamento de determinados setores de atividade econômica; c) as commissions  também partilharam o momento histórico de retirada do Estado da interferência operacional na economia, remetendo àfunção legislativa a definição de standards, cuja regulamentação ficaria a cargo de órgão técnico especializado.[265]

Estas primeiras comissões estaduais norte-americanas ainda não detinham caráter imperativo, massimplesmente de estudos e consultas. Tais comissões podiam ser vistas nos estados de Rhode Island (1836), NewHampshire (1844), Connecticut (1853), Vermont (1855) e Maine (1858). Comissões de caráter mandatório foraminauguradas em 1855, no estado de Minnesota e Massachussets. Somente em 1871, o estado de Illinois instituiu a primeira comissão com poderes de fixação de preços de serviços. Conferir, a respeito: MELO, José Luis deAnhaia. Problemas de urbanismo: o problema econômico dos serviços de utilidade pública . São Paulo: s/e,

1940, p. 101.[266]

Caio Tácito enumera as características comuns às agências reguladoras: “constituídas como autarquiasespeciais, destacam-se da estrutura hierárquica dos Ministérios e da direta influência da conduta política dogoverno; gozam de autonomia financeira, administrativa e especialmente de poderes normativos complementaresà legislação; dotados de poderes amplos de fiscalização, operam como instância administrativa final em litígiossobre matéria de sua competência; e respondem, fundamentalmente, pelo cumprimento de metas fixadas e pelodesempenho das atividades dos prestadores de serviço, segundo as diretrizes do Governo e em defesa do interesseda comunidade” (TÁCITO, Caio. Op. cit., p. 42).[267]

Sobre o fenômeno de especialização das agências reguladoras , conferir: MORAES, Luiza Rangel de;WALD, Arnoldo.  Agências reguladoras . In: Revista de Informação Legislativa, Brasília 36(141): p. 143-171,aneiro/março 1999, p. 151.

[268]O  subsistema jurídico   apresenta-se como um “conjunto de regras, normas, princípios, finalidades e

 pressupostos adstritos a um dado setor da vida humana” (MARQUES NETO, Floriano Azevedo. A nova regulaçãoestatal e as agências independentes. p. 84. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativoeconômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 72-98).[269]

Agência Municipal de Desenvolvimento, criada pela Lei Municipal nº 1.565, de 30/12/1996, de Niterói, como intuito de formulação de políticas de desenvolvimento econômico-social do Município.[270]

Agência Municipal de Serviços de Saneamento de Cuiabá (AMSS), criada pela Lei Complementar nº41, de23/12/1997. Embora tivesse caráter operacional, por ter reassumido os serviços de água e esgoto de Cuiabá antes

exercidos pela Companhia de Saneamento do Estado, o fim que motivou sua criação como agência, substituindo aanterior Secretaria de Saneamento, foi o de regular e controlar as delegações para prestação dos serviços públicosde saneamento no município de Cuiabá.[271]

Comissão de Serviços Públicos de Energia, criada pela Lei Complementar nº 833, de 17 de outubro de 1997,do Estado de São Paulo, e inaugurada em 14 de abril de 1998 para exercer funções de regulação dos serviçosconcedidos pelo poder concedente estadual com funções delegadas da Agência Nacional do Petróleo ou daAgência Nacional de Energia Elétrica, mediante convênios.[272]

Para uma exposição sobre as vantagens do modelo multissetorial das agências estaduais, vide: CONFORTO,Gloria. Descentralização e regulação de gestão dos serviços públicos. Revista de Administração Pública. Rio deJaneiro, FGV, 32(1):27-40, jan/fev 1998.[273]

Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos do Estado do Rio de Janeiro (ASEP-RJ), criada pelaLei Estadual nº 2.686, de 12/02/1997, cabendo-lhe o exercício do Poder Regulador sobre as concessões e permissões de serviços públicos nas quais o Estado do Rio de Janeiro figure, por disposição legal ou pactual,como Poder Concedente ou Permitente.

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[274]Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs), criada pela

Lei Estadual nº 10.931, de 09/01/1997, alterada pela Lei 11.292, de 23/12/1998, onde consta expressacomunicação à Assembléia Legislativa do teor de audiência pública sobre avaliação dos indicadores de qualidade

dos serviços e de pesquisa de opinião (art.14, §1o).[275]

Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará (ARCE), criada pela Lei nº 12.786,

de 30/12/1997, destina-se à direção, regulação e fiscalização dos serviços públicos delegados no Estado (art. 3 o daLei estadual nº12.786).

[276]Agência Estadual de Regulação e Controle de Serviços Públicos (ARCON), criada pela Lei estadual nº 6.099,de 30/12/1997, cuja função é de regular e controlar a prestação dos serviços públicos cuja exploração tenha sido

delegada a terceiros (art. 1o da Lei 6.099/97).[277]

Agência Reguladora de Serviços Públicos do Rio Grande do Norte (ARSEP), criada pela Lei estadual nº7.758, de 09/12/1999, mediante transformação da Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado do RioGrande do Norte (ASEP-RN), criada pela Lei nº 7.463, de 02/03/1999, com finalidade de regular, controlar e

fiscalizar os serviços públicos delegados (art. 2o da Lei 7.758/99).[278]

Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transporte e Comunicações da Bahia(AGERBA), criada pela Lei estadual nº 7.314, de 19/05/1998.[279]

Os convênios são acordos entre entes públicos ou entre estes e privados para consecução de objetivoscomuns  dentro de competências institucionais comuns  para o alcance de resultado comum  em um ambiente demútua colaboração entre os partícipes. Conferir: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração

Pública. Concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 3a ed., São Paulo: Atlas, 1999, p. 177-179. Assim, os convênios diferenciam-se dos contratos pelos aspectos: a)estrutural, que se refere ao conteúdo davontade expressa pelas partes. Nos contratos, as partes visam a objetivo diverso, no acordo, ambas pretendealcançar o mesmo fim; b) funcional, pois ligado ao interesse que se pretende satisfazer. No contrato, as partescompõem seus interesses; no acordo, elas os unificam por serem comuns; c) teleológico, que diz respeito àsatisfação específica do interesse público. O contrato é finalístico. A Administração Pública é uma das partes, queobtém a satisfação do interesse público mediante a prestação da outra parte. O acordo é instrumental, pois o

atingimento do interesse público se dá pela via da cooperação entre entidades públicas; d) patrimonial, referente àtransferência econômica, que está presente nos contratos e é estranha ao acordo de natureza pública. Nestesúltimos, os recursos continuam afetados ao interesse público que os motivou.[280]

Lei 9.427, de 26/12/1996, art. 20, caput . O mesmo ocorre com o setor do petróleo, em que a Lei 9.478, de

06/08/1997 prevê, no seu art. 8o, VII e XV a possibilidade de fiscalização das atividades integrantes e a aplicaçãode sanções por Estados ou pelo Distrito Federal mediante convênio. De fato, a Comissão de Serviços Públicos deEnergia – CSPE, criada pela Lei Complementar 833/97, no Estado de São Paulo, tem competências no setor deeletricidade, por delegação da ANEEL, no setor de petróleo e gás, por delegação da ANP, e no setor de gás

canalizado, como longa manus  estadual, que é o poder concedente deste serviço (art. 25, §2o da CF/88). A lei brasileira de telecomunicações não abre tal possibilidade.

[281]MORAES, Luiza Rangel de; WALD, Arnoldo.  Agências reguladoras. In: Revista de InformaçãoLegislativa, Brasília 36(141): p. 143-171, janeiro/março 1999, p. 145.[282]

PARKER, Reginald. Administrative Law. Indianápolis: The Bobbs-Merrill Company, 1952, p. 95.[283]

“Independência é uma expressão certamente exagerada. No mundo jurídico, preferimos falar em autonomia.Mas garantir a independência é fazer uma afirmação retórica com o objetivo de acumular o desejo de que aagência seja ente autônomo em relação à Administração Pública, que atue de maneira imparcial e não flutue suaorientação de acordo com as oscilações próprias do Poder Executivo, por força até do sistema democrático.”(SUNDFELD, Carlos Ari.  Agências reguladoras e os novos valores e conflitos , p. 1296. In: Anais da XVIIConferência Nacional dos Advogados.  Justiça: realidade e utopia. Vol. II, Rio de Janeiro: Ordem dos

Advogados do Brasil, 1999, p. 1291-1297).[284]MORAES, Luiza Rangel de; WALD, Arnoldo.  Agências reguladoras. In: Revista de Informação

Legislativa, Brasília 36(141): p. 143-171, janeiro/março 1999, p. 146.[285]

Prezando pela modicidade das tarifas como a necessária ponderação entre todos os interesses em jogo,

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inclusive o dos consumidores potenciais na ampliação da área de prestação do serviço e contra o que chama deopulismo regulatório , vide: MARQUES NETO, Floriano Azevedo.  A nova regulação estatal e as agências

independentes. p. 86: nota 38. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direito administrativo econômico. SãoPaulo: Malheiros, 2000, p. 72-98.[286]

A radicalização da transparência e da publicidade da atividade regulatória   é a forma existente de fazer frente à tendência de captura da agência pelos regulados. Vide: Ibid., p. 89.[287]

Entendendo a estrutura organizacional das agências como fortes indicadores da autonomia do órgão

regulador, vide: PECI, Alketa; CAVALCANTI, Bianor Scelza. Reflexões sobre a autonomia do órgão regulador:análise das agências reguladoras estaduais. p. 106. In: Revista de Administração Pública, vol. 34, nº 5, set/out de2000, p. 99-118.[288]

“Quando reconheço ser constitucionalmente viável que elas [as agências reguladoras] desfrutem de um tal poder [poder normativo], de modo algum estou sugerindo que elas produzam “regulamentos autônomos” ou coisa parecida, pois todas as suas competências devem ter base legal – mesmo porque só a lei pode criá-las, conferindo-lhes (ou não) poder normativo [§] A constitucionalidade da lei atributiva depende de o legislador haver estabelecido standards  suficientes, pois do contrário haveria delegação pura e simples de função legislativa”(SUNDFELD, Carlos Ari.  Introdução às agências reguladoras , p. 27. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.).Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 17-38).[289]

A independência proposta “deve servir para que o órgão regulador seja um instrumento de políticagovernamental, e não um instrumento de política de um governo” (MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Op. cit., p. 87).[290]

MORAES, Luiza Rangel de; WALD, Arnoldo.  Agências reguladoras. In: Revista de InformaçãoLegislativa, Brasília 36(141): p. 143-171, janeiro/março 1999, p. 146.[291]

A previsão expressa da referida proteção estava contida no art. 26, caput , da Lei Geral de Telecomunicações(Lei 9.472/97), mas foi revogado pela Lei 9.986, de 18 de julho de 2000. Para o caso da ANEEL, a Lei 9.427/96 prevê a nomeação compartilhada dos diretores para mandatos não coincidentes, não os protejendo expressamenteda demissão ad nutum. Sobre a fragilidade, no Brasil, da proteção do mandato com base em decisões do SupremoTribunal Federal, vide: SILVA, Fernando Quadros da. Agências reguladoras: a sua independência e o princípio

do Estado Democrático de Direito. Curitiba: Juruá, 2003, p. 130-134.[292]

A Lei Geral de Telecomunicações proíbe, no seu art.29, que o conselheiro tenha interesse significativo,direto ou indireto, em empresa relacionada com telecomunicações. Além disso, o conselheiro da ANATEL não pode representar qualquer pessoa ou interesse perante a Agência no prazo de um ano após ter ocupado o cargo(art.30).[293]

Os diretores das agências não devem ocupar outras funções públicas ou privadas. O caso da Asep (AgênciaReguladora dos Serviços Públicos Concedidos) do Rio de Janeiro exemplifica o comprometimento que o modelode autonomia das agências procura evitar. Cf. PECI, Alketa; CAVALCANTI, Bianor Scelza.  Reflexões sobre aautonomia do órgão regulador: análise das agências reguladoras estaduais . p. 112. In: Revista deAdministração Pública, vol.34, nº.5, set/out de 2000, p. 99-118.[294]

Defendendo a tese de pagamento aos ex-dirigentes das agências por período mínimo de 12 meses após o fimdo mandato para indenizá-los da restrição do direito individual de trabalhar , vide: MARQUES NETO, FlorianoAzevedo. Op. cit., p. 85-86: nota 37.[295]

ADIn1949-0/RS, relator Ministro Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, por maioria suspendeu liminarmente a

eficácia do art.8o, da Lei 10.931, de 09/01/1997: “Art. 8o O Conselheiro só poderá ser destituído, no curso do seumandato, por decisão da Assembléia Legislativa”.[296]

A independência de objetivos da ANEEL é ampliada mediante um contrato de gestão negociado e celebrado

entre a Diretoria e o Poder Executivo, como instrumento de controle e avaliação de desempenho. (art. 7 o, da Lei

9.427/96). Tal previsão não existe para o setor de telecomunicações brasileiro.[297]O Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária é um exemplo vivo de auto-regulação. Apresenta-se como

organização não-governamental – sociedade civil sem fins lucrativos –, fundada em 5 de maio de 1980,constituída por entidades representativas das agências de publicidade, dos veículos de comunicação, deanunciantes e de todas as demais entidades que aderirem ao Código Brasileiro de Auto-Regulamentação

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7/24/2019 Manual de Direito Regulatorio - Iorio

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 Publicitária e se comprometerem a seguir as decisões do Conselho de Ética e do Conselho Superior do Conar 

(art.9o do Estatuto Social do Conar), tendo por objetivos sociais, dentre outros,  zelar pela comunicação comercial,romover a liberdade de expressão publicitária e a defesa das prerrogativas constitucionais da propaganda

comercial   (art. 5º, I e VI do Estatuto Social do Conar). O desrespeito de suas recomendações  dá ensejo aadvertências, censuras públicas, suspensão ou eliminação do quadro social  (art.15 do Estatuto Social do Conar).[298]

GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 95.[299]

A escassa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal brasileiro sobre o tema aponta a exigência de

natureza jurídica de direito público para o exercício de poder de polícia. A Representação nº 1.169/DF – relator Min. Soares Muñoz, j.08/08/1984 (RTJ 111/87) – apresenta os conselhos federais de fiscalização de profissionaisliberais como autarquias corporativas. O Mandado de Segurança nº 22.643-9/SC – relator Min. Moreira Alves, DJ04.12.1998, Ementário nº1934-01 – determina a submissão dos Conselhos Regionais de Medicina, comoautarquias, à prestação de contas ao TCU.[300]

Floriano Marques utiliza o termo regulação de caráter público  para diferenciar da autorregulação. Conferir:MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Op. cit., p. 83.