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A nova era da estratØgia Michael Porter Ø professor da Escola de Negócios de Harvard e assessor do governo dos Estados Unidos sobre temas de estratØgia. Entre seus principais livros figuram "Vantagem Competitiva", "EstratØgia Competitiva" e "A vantagem competitiva das naçıes". Por Michael Porter A nova era da estratØgia 1/10 Um delicado convite aos empresÆrios: chegou a hora de serem estadistas. Os países latino-americanos tŒm procurado melhorar a eficiŒncia e a produtividade de suas empresas, a situaçªo atual em alguns deles prossegue sendo frÆgil. Ainda con- seguiram relativo grau de Œxito em torno dos negócios, muitas empresas ainda pos- suem grandes dificuldades para lidarem com a globalizaçªo, contudo, se encontram obrigadas a mudar sua mentalidade por completo, no que diz respeito a concorrŒncia. M as, talvez, a debilidade crítica seja que a maioria delas, na verdade, ainda nªo corre- sponderam segundo os princípios da estratØgia. Basicamente porque as empresas estªo acostumadas a atuar com o instÆvel, preocu- padas com as conquistas diÆrias, sem possuirem um sentido de direçªo real. Para que estas empresas -e os países nos quais operam- possam obter Œxito no futuro, Ø necessÆrio que haja um salto muito importante, em direçªo ao centro estratØgico dos negócios com os quais lidam. A experiŒncia de muitos anos em todo mundo demonstra que, alØm dos contornos econômicos, grande parte do Œxito de uma empresa estÆ nas mªos da mesma empresa. E isso exige que se saiba prestar atençªo aos sinais do meio no qual se compete : Ø nele onde as naçıes e regiıes entram em jogo. A estratØgia correta O que sabemos sobre estratØgia? O que sabemos sobre a capacidade que as empresas possuem para alcançar um desempenho superior ou competir em escala internacional? Em primeiro lugar, sabemos que para possuir uma boa estratØgia, o ponto de partida Ø possuir uma meta adequada,, que nªo Ø outra coisa a nªo ser um excelente retorno do investimentos ao longo do prazo.Tªo fÆcil como parece, o certo Ø que muitas empresas em todo o mundo realmente nªo conseguem interiorizar esse objetivo central da com- panhia. Em geral, se contentam com um objetivo de curto prazo, mais fÆcil de se obter, porØm que nªo os permite ver alØm do amanhª. O ponto seguinte que se deve levar em conta para alcançar uma boa estratØgia Ø anal- isar qual Ø o negócio na indœstria na qual opera a companhia, e em seguida tratar de determinar qual Ø a posiçªo da empresa dentro deste quadro. O desempenho de qual- quer empresa estÆ motivado pela rentabilidade derivada do negócio e pela rentabili- dade originÆria da posiçªo na qual a companhia ocupa dentro do âmbito de sua com- petiçªo principal. É muito importante separar estes dois conceitos e nªo confundi-los. Porque a lógica econômica de entender as indœstrias Ø muito diferente da lógica de entender qual Ø a posiçªo da empresa. Se estes dois aspectos se mesclam na hora da anÆlise estratØgica, a eleiçªo serÆ induvidavelmente equivocada. Em Havard, durante 18 anos, se reuniram dados sobre o grande nœmero de empresas norte-americanas, para avaliar sua rentabilidade ao longo do prazo. Tomemos como exemplo a Eli Lilly, empresa farmacŒutica muito conhecida, e a Arnold Industry, uma empresa de fretes. Em ambas empresas medimos os retornos sobre o capital, tomando o desempenho e o retorno sobre o investimento a longo prazo. Ambas alcançaram um retorno sobre o capital, depois de pagar impostos superior a 20%. Se trata de formas com um excelentes registro, jÆ que as empresas da faixa mØdia na economia dos Estados Unidos, nªo superam, em condiçıes semelhantes, um retorno de 12,5 %. Contudo, ao dividir essa rentabilidade entre o que Ø a mØdia da indœstria e a rentabili- dade própria de cada empresa, se verifica que o desempenho da empresa farmacŒutica Em símtese É certo que a estratØgia e a efi- ciŒncia sªo os dois pilares da construçªo de valor. Mas nunca no vazio. A macroeconomia real- iza um papel importante, sobre tudo na geraçªo de um ambiente propício. Um ponto relevante para uma regiªo como a AmØrica Latina, onde as regras do jogo ainda nªo param de mudar, e a dependŒn- cia das decisıes dos governos ainda pesam mais. Ainda que nªo se concentre em desinteriorizar o impacto da Internet, indica que as empresas exclusivamente virtuais nascer- am porque as "físicas" nªo sou- beram ocupar seu espaço a

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A nova erada estratégiaMichael Porter é professor da Escola de Negócios de Harvard e assessor do governo dosEstados Unidos sobre temas de estratégia. Entre seus principais livros figuram"Vantagem Competitiva", "Estratégia Competitiva" e "A vantagem competitiva dasnações".

Por Michael Porter

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Um delicado convite aos empresários: chegou a hora de serem estadistas.Os países latino-americanos têm procurado melhorar a eficiência e a produtividade desuas empresas, a situação atual em alguns deles prossegue sendo frágil. Ainda con-seguiram relativo grau de êxito em torno dos negócios, muitas empresas ainda pos-suem grandes dificuldades para lidarem com a globalização, contudo, se encontramobrigadas a mudar sua mentalidade por completo, no que diz respeito a concorrência.Mas, talvez, a debilidade crítica seja que a maioria delas, na verdade, ainda não corre-sponderam segundo os princípios da estratégia.Basicamente porque as empresas estão acostumadas a atuar com o instável, preocu-padas com as conquistas diárias, sem possuirem um sentido de direção real. Para queestas empresas -e os países nos quais operam- possam obter êxito no futuro, énecessário que haja um salto muito importante, em direção ao centro estratégico dosnegócios com os quais lidam. A experiência de muitos anos em todo mundo demonstraque, além dos contornos econômicos, grande parte do êxito de uma empresa está nasmãos da mesma empresa. E isso exige que se saiba prestar atenção aos sinais do meiono qual se compete : é nele onde as nações e regiões entram em jogo.

A estratégia correta O que sabemos sobre estratégia? O que sabemos sobre a capacidade que as empresaspossuem para alcançar um desempenho superior ou competir em escala internacional?Em primeiro lugar, sabemos que para possuir uma boa estratégia, o ponto de partida épossuir uma meta adequada,, que não é outra coisa a não ser um excelente retorno doinvestimentos ao longo do prazo.Tão fácil como parece, o certo é que muitas empresasem todo o mundo realmente não conseguem interiorizar esse objetivo central da com-panhia. Em geral, se contentam com um objetivo de curto prazo, mais fácil de se obter,porém que não os permite ver além do amanhã.O ponto seguinte que se deve levar em conta para alcançar uma boa estratégia é anal-isar qual é o negócio na indústria na qual opera a companhia, e em seguida tratar dedeterminar qual é a posição da empresa dentro deste quadro. O desempenho de qual-quer empresa está motivado pela rentabilidade derivada do negócio e pela rentabili-dade originária da posição na qual a companhia ocupa dentro do âmbito de sua com-petição principal. É muito importante separar estes dois conceitos e não confundi-los.Porque a lógica econômica de entender as indústrias é muito diferente da lógica deentender qual é a posição da empresa. Se estes dois aspectos se mesclam na hora daanálise estratégica, a eleição será induvidavelmente equivocada. Em Havard, durante 18 anos, se reuniram dados sobre o grande número de empresasnorte-americanas, para avaliar sua rentabilidade ao longo do prazo. Tomemos comoexemplo a Eli Lilly, empresa farmacêutica muito conhecida, e a Arnold Industry, umaempresa de fretes. Em ambas empresas medimos os retornos sobre o capital, tomandoo desempenho e o retorno sobre o investimento a longo prazo. Ambas alcançaram umretorno sobre o capital, depois de pagar impostos superior a 20%. Se trata de formascom um excelentes registro, já que as empresas da faixa média na economia dosEstados Unidos, não superam, em condições semelhantes, um retorno de 12,5 %.Contudo, ao dividir essa rentabilidade entre o que é a média da indústria e a rentabili-dade própria de cada empresa, se verifica que o desempenho da empresa farmacêutica

Em símtese

É certo que a estratégia e a efi-ciência são os dois pilares daconstrução de valor. Mas nuncano vazio. A macroeconomia real-iza um papel importante, sobretudo na geração de um ambientepropício.

Um ponto relevante para umaregião como a América Latina,onde as regras do jogo ainda nãoparam de mudar, e a dependên-cia das decisões dos governosainda pesam mais.

Ainda que não se concentre emdesinteriorizar o impacto daInternet, indica que as empresasexclusivamente virtuais nascer-am porque as "físicas" não sou-beram ocupar seu espaço a

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não havia sido tão positivo. Em sua indústria, a média de rentabilidade quase alcançaos 28%, o que salta à vista que a posição estratégica da Eli Lilly de nenhuma forma éaceitável, mais adiante dos bons resultados aparentes. Em troca, se for analisado osetor dos fretes, a rentabilidade média da indústria não supera os 11%, o que pode-seconcluir que a Arnold Industry possui uma estratégia impressionante e uma atitudecompetitiva muito clara, que lhe dá uma importante vantagem comparada a da com-petição. Portanto, para avaliar a estratégia é necessário dividir a própria empresa em duaspartes. Em primeiro lugar, há que se entender a qual setor a empresa pertence, edepois a posição que ela ocupa dentro da indústria. De outro modo, nunca se chegará acompreender como competir, tão pouco a melhor maneira de fazê-lo. Com o objetivo de esclarecer esta relação entre a indústria e sua rentabilidade, resul-tou de extrema utilidade a teoria da estrutura da indústria, um esquema proposto háalguns anos. O motivo pelo qual as empresas farmacêuticas são tão rentáveis é porqueas forças do mercado lhes são muito favoráveis. As barreiras de ingresso são latas, opoder do consumidor é baixo, a rivalidade se baseia na inovação, e não no preço. Emcontrapartida, na indústria do frete a rentabilidade é reduzida porque o poder do con-sumidor é alto, é fácil ingressar na indústria, a competição não se baseia na inovaçãosim no preço e, além do mais, a pressão com respeito a queda dos valores de mercadoé constante e poderosa.Parte da função do estrategista é entender os motivos que levam a rentabilidade ou afalta dela para uma indústria. Sem entendê-los, é impossível tomar qualquer tipo deação, nem pensar como mudar. Como conseqüência, a função de um estrategista ét ratar de influir a estrutura da indústria na qual se compete, e não somente aceitar asregras que impõe ou a configuração que adota. Na atualidade, uma das principais car-acterísticas das grandes empresas é, precisamente, liderar as mudanças em sua ativi-dade e fixar as pautasda indústria.

Conhecer as concorrências Para ser mais rentável que os competidores somente há duas alternativas: ter preçosmais altos que o concorrência, ter custos mais baixos que o rival, e entregar um produ-to de qualidade e valor compatível. Isto é uma questão matemática simples, mas aomesmo tempo é algo que muitas empresas não consideram. A maioria das indústriassabem qual é a sua rentabilidade comparada, mas não conseguem entender bem porque a rentabilidade que possuem é maior ou menor. É fundamental avaliar se a empre-sa está acima ou abaixo da média da indústria, se é uma questão de preços ou de cus-tos, ou se há disponível formas mais eficientes de trabalhar para abaixá-la. É de vita limportância tomar uma decisão a respeito, porque as ações a se realizarem em um ououtro caso são absolutamente diferentes. Por exemplo, não é o mesmo conseguir queuma empresa venda a preços mais altos, que arbitre a melhor forma de conseguirmaquinas a custos mais baixos. Se tratamos de avaliar ambas coisas, somente con-seguiremos uma grande confusão. Entretanto, há uma grande maioria de empresas que se dão por satisfeitas em redigira lista de seus pontos fortes e fracos. Mesmo este enfoque sendo obsoleto, e não fun-cionar, o competir já não é o mesmo de antes. Obviamente, as empresas são cada vezmais sofisticadas no momento da competição. A melhor maneira de gerar no clientepredisposição a aceitar um maior preço é garantindo ao comprador um valor que o jus-tifique. Este valor pode apresentar-se de duas formas . De um lado, uma das formasmais diretas de proporcionar esse valor "premium", é reduzir o custo de trabalhar parao cliente. Se o produto ou o serviço que oferece a empresa permite que o cliente sejamais eficiente em nossa empresa, pagará um preço mais alto, sempre que o entendacomo benefício. Alternativamente, se o produto ou serviço permite ao cliente conseguirpreços mais altos, tão pouco duvidará em pagar um pouco mais.Portanto, se conseguirá subir o nível de preços se a empresa, por meio de sua ofertaconseguir que o cliente modifique sua predisposição ao preço e ao custo. Para analisaralgo mais em profundidade à relação entre custo e preço, há uma ferramenta básica,

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chamada cadeia de valor, que cobre a equação de seus distintos aspectos.A cadeia de valor é um conceito que reflete o que a empresa está fazendo, qualquer queseja a indústria na qual se articule. Por exemplo, há uma força de vendas que visitas osclientes, uma equipe que desenha os produtos, e também a logística necessária paraentregá-los ao cliente. Qualquer empresa é simplesmente uma coleção de atividades,de modo que, para avaliar questões de custo e preço, devemos passar do conceito"empresa" para "atividades que formam a empresa".

Do que estamos falando Sabemos que a unidade fundamental da vantagem competitiva é a atividade. Se umaempresa tem um preço superior ou custos mais baixos, a forma a qual se chega a um eoutros pode ser rastreada por meio das atividades que realiza essa empresa. Ao invésde pensar na tradicional classificação contabil dos custos em toda a empresa, paradepois somá-los, há que se verificar o custo sobre a base de cada uma das atividades.Se alguém revisa o que vem ocorrendo na empresa durante os dez últimos anos, poderádefinir a década como a era da eficiência operativa. Conseguir eficiência operativaimplica fazer o mesmo que está tratando de fazer a concorrência, porém melhor. A con-corrência também possui uma força de vendas, que procura vender seus produtos aosclientes, tratando de convencê-los de seus méritos. A empresa faz exatamente omesmo: dispõe de vendedores que também levam aos clientes seus produtos, comigual entusiasmo para defender suas qualidades.Mesmo sendo a empresas a que possui melhor vendas, ou incorporou novos sistemasde capacitação para os vendedores, não resulta determinante. A efetividade operativaé basicamente tratar de fazer o mesmo, porém melhor. Em tal sentido, a maioria das empresas aceitaram o esforço de assimilar as melhorespráticas. O processo de "benchmarking" é uma necessidade compartilhada por todos.É procedimento que se deve aprender , e ensinar. Há que fazê-lo, pois não há alter-nativa. Entretanto, ainda que esclarecedor, não é suficiente. De fato, a falha funda-mental do "management" em nossos tempos está em reter-se quase exclusivamentena melhora operativa e esquecer a estratégia. Qual é a limitação resultante de concentrar-se somente na melhora operativa? O quealém do mais ocorre, se alguém aprende ou assimila as mudanças de forma rápida? Aprimeira conclusão é óbvia : todos os demais estarão fazendo o mesmo. Por outro lado,resultará muito difícil permanecer na vanguarda se a base sobre a qual se procuraalcançar a vantagem diferencial é exclusivamente a assimilação das melhores práticas. Por outra lado, existe outro problema, muito mais sutil, que praticamente todas asindústrias enfrentam hoje em dia. É o que chamamos de convergência competitiva. Estefenômeno se dá quando todas as empresas de uma indústria começam a competir damesma maneira. Por exemplo, cinco bancos brasileiros, cada um deles com o mesmotipo de sistemas informatizados e sites na Web, oferecem talões de cheques e cartõesde crédito, em sucursais muito vistosas e caixas automáticas espalhados por toda acidade. Rapidamente, o resto dos bancos fazem o mesmo.Finalmente, todos terminaram oferecendo o mesmo produto ou serviço, e a única vari-ante na competição será o preço. Um resultado previsível : se todos oferecem o mesmoserviço e as mesmas prestações, o clientes facilmente buscarão o preço mais baixo.Depois de usá-las pela primeira vez, as melhores práticas, de imediato, passam a ser aúnica agenda. O que não se deram conta, fora as conseqüências que isso produzirá narentabilidade a longo prazo, o que não é positiva. Devemos ir mais adiante, eprosseguir com a melhora da eficiência operativa, porque a empresa não deveria limi-tar o esforço neste ponto. Caso o faça, ficará em desvantagem.Tudo isso sem esquecer-se de adotar uma posição estratégica clara, porque é dela quesurgirá a vantagem competitiva. O mais real é que as empresas que não podem mantersuas altas utilidades, não recorrem às melhorias práticas para aprimorar as questõesoperativas, sim por terem uma estratégia clara. A eficiência operativa é fazer o mesmo,melhor. Logo, a estratégia está diretamente relacionada à seleção dos fatores quediferenciam a empresa da concorrência, da visão que os competidores têm do negócio.Essa forma em particular de ver e fazer é a que deve somar valor ao negócio.

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Precisamente, é nesta etapa quando se arma a curva do valor. O objetivo da eficiênciaoperativa é procurar percorrer o mesmo caminho mais rápido. Esse mesmo caminho, decem metros rasos é o desafio de quem participa, tanto empresa como a concorrência.Todos possuem a mesma visão, a linha de chegada. A eficiência operativa implica tratarde chegar primeiro. A estratégia, em contrapartida, é a que define em qual modalidadea companhia decide participar, e nesse aspecto, goza da mais absoluta liberdade paraescolher, inclusive, um caminho completamente diferente do escolhido pelo concor-rente. O problema que a maior parte das empresas enfrenta é a obsessão em querer ser amelhor em termos absolutos, e que possuem a idéia de que há somente uma forma decompetição. Quem quer ganhar a corrida de ponta a ponta, deve mudar a mentalidade,buscar de forma permanente, qual modo "especial" se espera agregar valor para ocliente. A Neutrogena, uma marca de sabonetes, propriedade da Johnson & Johnson,possui uma estratégia muito clara. De fato, responde a duas provas vitais que põem emevidência o nível de desempenho estratégico. De um lado, é possível observar que aempresa selecionou um tipo de valor, específico e singular.Na realidade, havia muitos tipos de sabonetes, desde o tipo para suavizar a pele até oque desodoriza, passando pelo especialmente formulado para a limpeza de sujeirasdifíceis de serem removidas. Para a Neutrogena, todas essas opções eram possibili-dades reais e positivas, que agregavam inegavelmente valor, mas, não obstante,preferiu enfocar uma só e eleger um tipo de sabonete específico cuja produção, comer-cialização e entrega seria única e irreiterável. É um sabonete muito suave, que limpa apela sem deixar resíduos. É um produto para peles muito sensíveis, que se irritam facil-mente, caso seja utilizado outro tipo de detergente. É o melhor sabonete? Não neces-sariamente. Há outros sabonetes bons, mas é o tipo de sabonete que a empresa sele-cionou, a categoria que deseja ser singular. Claramente, Neutrogena tem uma estraté-gia. Uma vez verificada a estratégia, o segundo passo para corroborar se a empresa estáfazendo o que deve, é analisar como leva adiante essa estratégia. Quer dizer, se estáfabricando o produto da mesma forma que o concorrente, e vendendo-o de forma semel-hante, ou se possui filosofia própria. Voltando ao caso da análise, a Neutrogena possuiuma estratégia personalizada, e adapta as atividades de cada elo da cadeia de valor aesse posicionamento singular que elegeu. Inclusive utiliza ingredientes diferentes naelaboração de seus produtos, o que faz com que todo o processo de fabricação tãopouco seja o mesmo que a concorrência utiliza.Por suas características particulares, para poder desenvolver-se facilmente, osabonete deve ser o mais diferente possível em comparação a um tradicional. O queimplica, por exemplo, que não possa manter-se sob a mesma pressão e calor durante oprocesso de produção. De fato, se alguém comprar um sabonete Neutrogena compro-vará que vem apresentado em um invólucro de celofane : caso fique exposto ao ambi-ente, começará a dissolver-se. Se tomamos algum ponto de referência da indústria,Procter & Gamble, no "benchmarking", os processos de fabricação que utilizam aNeutrogena demonstram não ser eficientes. Porém, é um bom exemplo para a obser-vação de como funciona o exercício da |comparação com as melhores práticas. A estratégia indica que as atividades se desenham segundo o valor singular que temcada uma. Um fator interessante da cadeia para ser analisado é a distribuição.Os pro-dutos da Neutrogena somente são distribuídos pelas farmácias, ou nas seções de far-mácia do supermercado.O objetivo é ocupar um lugar nesse setor, não nos de produtos de consumo geral, poisa estratégia assinala que não devem ser associados aos artigos de limpeza. Nem amarca, tão pouco o produto devem aparecer em uma gôndola paralela a dos desinfe-tantes ou produtos para banho: na companhia desejam que o consumidor "pense" noproduto como se fosse um produto para saúde.Caso fosse exibido juntamente com o resto dos artigos da loja, poderiam vender mil-hões e milhões de sabonetes. Porém, tomaram a decisão estratégica de manter ereforçar seu valor singular. Além do mais, vendem a um preço superior, pois, precisa-mente é um produto que está desenhado para gerar alto valor.A Neutrogema realizou uma clara eleição do tipo de valor que quer criar. Isso não impli-

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ca que os produtos das demais empresas não sejam da mesma qualidade, somenteassinala que, simplesmente, são diferentes. A Neutrogena adaptou as atividades nacadeia de valor à configuração que deu a sua proposta particular. Os limites da estratégia A estratégia é uma forma diferente de fixar limites. Quer dizer que um não vai oferecertudo a todos, sim que buscará e encontrará, ou inventará uma proposta diferente, espe-cial. A Neutrogena decidiu restringir a variedade de produtos que se dedicaria a fab-ricar, e se propôs a adotar um processo de fabricação, distribuição e marketing distin-to. Seguramente, a primeira reação diante da idéia de fixar limites é pensar que, dessaforma, se condiciona o crescimento. Grave erro.A conclusão deveria ser inversa. Fixar limites acelera o crescimento. Uma breve pas-sagem pela história corporativa mundial demonstrará que as empresas que realmentepossuem êxito são aquelas que fixam claros limites, sem se esquecer, obviamente, dedominar seu "território" , não somente seu país de origem, sim também a escala inter-nacional. Se a proposta de valor é singular , o potencial do mercado é enorme. Sealguém simplesmente vaga sem rumo e oferece um pouco de tudo, em troca, as possi-bilidades que oferece se reduzem. Quando um banco ou empresa é praticamente umacópia fiel de qualquer outro banco ou empresa, talvez, consiga capturar uma pequenaporcentagem do mercado, mas nunca crescerá mais rápido que aquela empresa quetenha uma posição singular e clara. É justamente o reverso, é uma armadilha mental naqual muitos executivos desprevenidos ou mal avisados caem. Definir a estratégia éuma questão de criar uma proposta única com atividades ajustadas no marketing, pro-dução, logística e distribuição. Tudo alinhado nesta proposta de valor singular. Para competir desta maneira é necessário sacrificar outras possibilidades? As con-cessões permitem que uma posição singular seja sustentável, caso sua forma de com-petir seja diferente a forma de fazê-lo que a concorrência elegeu, que não tratará deimitá-la. Por outro lado, se não se fazem concessões, a empresa não fará mais do queoferecer um novo produto, que seus concorrentes também o podem ; uma vez não sendoincompatível com o que já realizam, será susceptível de cópia sem comparações. Comoresultado, a empresa não terá uma vantagem sustentável. Também é certo que, paramuitos, não existem as vantagem sustentáveis. Pode ser que não existam no que dizrespeito a eficiência operativa, mas, do ponto de vista estratégico, há inumeráveis van-tagens sustentáveis, se alguém estiver disposto a fazer concessões. O problema é queas empresas acreditam que não se devem fazer concessões , que a única coisa que sedeve conseguir é o custo mais baixo, a qualidade mais alta, a variedade mais grande, otempo mais rápido do mercado. Em síntese, tudo deve ser feito juntamente. No caso da Neutrogena, se vê claramente as concessões que fizeram ao definir suaestratégia. Deixaram de utilizar suavizantes e desodorantes no produto. Abandonarama possibilidade de garantirem um grande poder de limpeza. Fizeram porque sabiam queeram incoerentes com a proposta de valor.Se o objetivo da empresa era que o sabonete não deixasse nenhum tipo de resíduo napele, então não poderia conter nenhum tipo de desodorante ou suavizante para a pele.Ambas coisas são impossíveis de se fazer ao mesmo tempo, há que escolher um bene-fício ou outro. Essa atitude é claramente uma concessão. De outro ponto de vista, a Neutrogena fez concessões. Aumentou os custos para ter umprocesso de fabricação mais efetivo, investiu milhões de dólares em pesquisas. Essescustos adicionais foram investimentos para ampliar e reforçar a posição singulardefinida como meta. A Neutrogena aumentou os custos para proporcionar um determi-nado tipo de valor e, por sua vez, comunicar ao mercado o referido. As concessões sãofundamentais para a estratégia.

Satisfação, privilégio para poucos Uma das melhores formas de se saber se a empresa possui estratégia, é verificar setomaram as decisões claras com respeito ao que não se realizará. Mesmo que o gerentepossua inúmeras listas do que fazer, do ponto de vista estratégico, é mais importantea lista das coisas que não se realizarão. A estratégia consiste em não satisfazer todas

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as necessidades do cliente. Estratégia é sinônimo de eleição, há que se eleger quaisnecessidades, e de quais clientes , as mesmas serão satisfeitas.É uma forma fundamentalmente diferente de ver a empresa. Todos aprendemos quetemos que responder ao cliente, obter a maior quantidade de informações sobre ele, econsiderar seus comentários. Uma das conseqüências não intencionais desta forma depensar é que as empresas perdem perspectiva e tendem a ver todos os clientes comigual valor, assim, qualquer pedido é de igual importância. E atende-se aos mesmoscom igual dedicação e entusiasmo. Atuar estrategicamente é questão de deixar algunsclientes insatisfeitos para que outros possam estar de verdade "contentes". Um dadoirônico : a maioria das empresas nas quais se desenvolvem produtos dedicam grandeparte do tempo em convencer os consumidores relutantes. Devem ocupar-se com aprocura de razões para que comprem o produto, ao invés de concentrarem-se em pro-dutos os quais desejam aqueles clientes que se enquadram na estratégia. Ter estaidéia claramente é fundamental. Diante de um futuro imprescindível, contar com umaestratégia permitirá à empresa responder de forma mais agressiva.

Uma companhia aérea rentável Vale a pena analisar o caso da SouthWest Airlines, uma empresa realmente de suces-so que, além do mais, é a única companhia aérea norte-americana rentável. A falta derentabilidade é fruto dos problemas estruturais da indústria da navegação aérea com-ercial. Há uma enorme pressão para o corte de preços, porque o cliente é cada vez maissensível a estes, e passar de uma companhia para outra é muito fácil, sem fidelidadeàs marcas o que é tão difícil de evitar. Só há uma companhia aérea com rentabilidadepermanente, a SouthWest. Como foi possível? Como pode uma companhia aérea, em ummercado tão voraz, encontrar uma vantagem sustentável? Em uma companhia aérea se pode copiar tudo : os uniformes, o desenho dos aviões, osaeroportos. A SouthWest não imita ninguém. Tentaram, porém sempre infrutuosa-mente. Todos tiveram que admitir a derrota. A empresa definiu um posicionamentomuito singular: a companhia aérea de baixo custo, que oferece baixas tarifas e saídasmuito freqüentes, mas que proporciona muito pouco o serviço. Basicamente, a únicacoisa que oferecem é o assento. Não se servem bebidas nem comidas, não há classesdiferenciadas de serviços, nem assentos reservados. Tão pouco se despacham as baga-gens. Conseguiram ser tão eficientes que, inclusive, são capazes de ganhar enormessomas de dinheiro cobrando um preço inferior em comparação a concorrência. Para ter esse modelo de serviço, tiveram que fazer concessões, fica claro. Facilmenteporque decidiu-se voar somente em certas rotas. Todas as rotas que a SoutWestAirlines demandam não mais do que duas horas de viagem. Para nenhum viajante é umincomodo não comer durante esse período. Um serviço como esse seria impossível emuma companhia que cubrisse trajetos de costa a costa dos Estados Unidos. Tão poucoestranharia um assento de primeira classe ou executiva em um vôo tão curto. Voam acidades de porte médio e, nas poucas cidades grandes a que chegam, utilizam aero-portos secundários. De forma que todo seu modelo de serviço está pensado em funçãode sua estratégia de base. Qual é a competência central da SouthWest Airlines, sua maior fortaleza? A respostacorreta é "tudo o que fazem". As empresas de sucesso não ganham por uma atividadeexclusivamente, não ganham por ser os melhores em um detalhe. Ganham porque pos-suem um sistema de competição central, um sistema de atividades no qual todas estãointegradas. Para poder igualar-se a eles, há que copiar tudo. Não alcança ao copiar umou dois detalhes, porque nas empresas desse tipo se adaptou e reforçou tudo.

Definições estratégicas Tal como se indicará, uma estratégia é uma posição única, desde a qual as empresasfazem as coisas de modo diferente, uma vez que adaptaram suas atividades - market-ing, produção, serviço, logística - a sua proposta específica de valor. A reestruturação em si não é uma estratégia, é uma maneira de resolver problemas eineficiências. As fusões tão pouco são uma estratégia, são uma forma de agregar vol-

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ume que não define, por si mesma, uma posição singular e uma vantagem sustentável.O fato de ter comprado três empresas não significa que o conglomerado resultantetenha uma estratégia. Além do mais, talvez se faça mais complicado que a tivesse. Aconsolidação de uma indústria não significa uma estratégia, é um sinal de derrota. Seuma empresa tem que comprar a seu competidor é porque não tem nenhuma outraidéia, não pode ganhar de nenhuma maneira, exceto por meio da limitação da concor-rência. Não são nem se quer as alianças, ainda que possam ser boas ferramentas paraajudar as empresas a defini-las.A Internet não é uma estratégia, é um meio poderosode reestruturar informação. Um deve decidir como utilizar a Internet para reforçar suaprópria maneira de competir. Os princípios da estratégia não se limitam a encontrar umnicho, sim a fixar limites. Em geral,as fusões, as consolidações e a falta de pensamen-to estratégico, não obstante gerou muitas oportunidades. Pensemos nos refrigerantes.Como pode alguém no setor da refrigerantes competir com a Coca-Cola e a Pepsi?Contudo, há dezenas de pequenas empresas que estão crescendo com muita rentabili-dade no setor de bebidas não-alcoólicas engarrafadas.A falta de estratégia cria oportunidade para o empreendedor, para tomar uma posiçãosingular, e, simplesmente, apontar ao centro do grande. Nesse sentido, o grande tãopouco pode esquecer da estratégia. Tem que dizer como fará de seu tamanho algo sin-gular, no lugar de contentar-se com ser simplesmente grande. Por que os líderes esta-belecidos possuem tanta dificuldade para capturar as novas idéias? É parte de seuesquema mental. Procuram reforçar o que já fazem, estão segundo sua posição, etemem por em perigo o que já conseguiram. Até chegam a duvidar das novas tecnolo-gias. Por exemplo, em plena era da Internet, ainda não está claro seu fundamento racionalem termos econômicos. No futuro, a Internet será um lugar no qual poucos poderãoconseguir fazer uma diferença, pois todos poderão competir. É muito difícil demonstrarser independente e diferenciar-se na Internet. A medida que os clientes mais sofistica-dos podem navegar melhor e encontrar o que estão buscando, perderão o temor e afidelidade aos primitivos preceitos da tecnologia. Creio que a maioria das empresasque só existem na Internet possuem esse lugar privilegiado porque as companhiasestabelecidas foram demasiadamente lentas ao incorporar tecnologia a suas oper-ações. O certo é que, na maioria dos casos, a integração entre Internet e as atividadest radicionais é a que levará a estratégia ganhadora .

Os recursos naturaisCada um dos países do Mercosul enfrenta problemas reais de competitividade. Acreditoque hoje o tema também afeta as empresas, pois é muito difícil competir, inclusive comuma boa estratégia, quando o meio em que se encontra é inadequado. As políticas degoverno e as estratégias das companhias, em geral, se analisam como coisas distintas.E separadas. Na realidade os países são competitivos por meio das empresas que exis-tem em seu território. Agora, o que leva uma nação a ser competitiva? A resposta éfácil, a mudança. O antigo modelo afirmava que se podia prosperar sobre a o funda-mento dos recursos naturais, baseando-se no que se herdava do passado. Contudo, osrecursos naturais, os minerais, os espaços físicos são cada vez menos valiosos naeconomia moderna. Também a mão-de-obra vale menos. E se somam, progressiva-mente, à economia mundial mais e mais países cujas "riquezas" são essas.Há bilhões de trabalhadores, dezenas de países que possuem minerais e solos férteispara a agricultura. Talvez não sejam tão grandes como a Argentina e o Brasil, porémtêm que competir de igual com outras centenas de países. Os recursos não são tãoimportantes como o nível de produtividade que um país ou empresa pode alcançar aoutilizá-los. Os recursos são mais ou menos fáceis de se obter, estão por toda parte. Oque é singular, escasso é um ambiente propenso à uma produtividade incomum, noqual as empresas podem trabalhar não somente com uma maior eficiência em contra-posição a outros lugares, bem como no que podem produzir bens de maior valor, demelhor qualidade e com maior funcionalidade. Um ambiente no qual as empresaspodem ter melhor marketing, marcas mais destacadas, excelente distribuição, e umasoberba atenção ao cliente. Se uma empresa ou país consegue tornar-se extraordinar-

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iamente produtivo em um setor, não será pelos recursos , sim pela forma na qual asociedade e a economia estão organizadas. A América Latina tem essa desvantagem : a maioria dos países possuem recursos nat-urais. Em Singapura ou no Japão não os tinham, e, contudo, nunca ficaram presos nestaarmadilha. A América Latina está, por sua vez, abençoada e amaldiçoada pelos recur-sos. É necessário mudar a mentalidade. Os recursos não garantem a propriedade, o queo faz possível é um ambiente propício para competir. A América Latina utiliza a políti-ca macroeconômica para criar uma economia produtiva. É certo que, caso não se possuacerto grau de estabilidade macroeconômica básica torna-se impossível alcançar a esta-bilidade legal e jurídica , contar com empresas produtivas. Tão pouco haverá forma deque haja investimentos, se tomem mais riscos, que se converta em pesquisa e desen-volvimento. É importante assinalar que um pacote político macroeconômico implica que seja prati-camente impossível pensar em forma estratégica. Mesmo depois de se haver observa-do o processo de vários países latino americanos, pode-se afirmar com certeza que aocorrigir os pacotes, decisões de matéria político-econômica não é o suficiente. A políti-ca macroeconômica não gera riqueza, talvez a facilite ou dificulte. A riqueza se cria namicroeconomia. A riqueza é criada pelas empresas que são capazes de gerar produtose serviços valiosos, e vendê-los em mercados mundiais.As pessoas que possuem atitudes ou habilidades incomuns nas áreas específicas tam-bém a produzem. Por tanto, o raciocínio a respeito da competitividade e a políticaeconômica deve modificar-se. Sem dúvida, há que prosseguir avançando na macro-economia, pois a tarefa não está completa, mas com maior intensidade o problema seráa macroeconomia. O Reino Unido tem uma política macroeconômica fantástica, éestável como uma rocha, possui um bom sistema jurídico e instituições políticas con-solidadas e, mesmo assim, não conseguem ser mais prósperos. De fato, essa é umacurva descendente derivada dos problemas microeconômicos.

Diamante econômico No Informe sobre Competitividade Mundial publicado pelo Fórum Econômico Mundial(WEF), a grande reunião que se celebra anualmente em Davos, Suíça, se vê claramente,a partir de informação tomada junto a mais de cinquenta países, a importância da mel-horia microeconômica no investimento per capita.O meio microeconômico de um país é um quadro que, freqüentemente, costuma-sechamar o "diamante", com traços particulares :

1. Para se ter uma economia produtiva deve-se contar com insumos de altíssima altaqualidade que, além do mais, devem ser cada vez melhores. Também recursos humanosde alta qualidade. Não se alcança obter, simplesmente, operários não-qualificados,pois estes não podem ser altamente produtivos, não importa quanto arduamente tra-balhem. É imprescindível dispor de uma infra-estrutura física de altíssima qualidade,para poder transladar bens e serviços sem a perda de tempo e/ou dinheiro. Os sis-temas de comunicação devem ser excelentes.Deve-se deve ter uma boa base científica para que as empresas possam dispor de infra-estrutura técnica para melhorar seus processos. Também resulta vital a disponibili-dade de capital em prazos razoáveis. Parte da competitividade se ganha com a quali-dade dos insumos que se usam diariamente. É um fato que para serem realmente com-petitivos, não deve-se tomar por base somente os insumos gerais, bons caminhos, tra-balhadores formados em educação secundária, pois tudo isso é demasiado amplo. Cadavez e com mais intensidade se percebe que, para alcançar uma produção extraordinária,há que possuir especialização nos insumos Não é demais, porém não é determinante,ter somente graduados universitários ou graduados de escola secundária. É necessáriocontar com gente capacitada nas distintas áreas específicas. No lugar de falar, sim-plesmente, de bons caminhos, haveria que se estabelecer a necessidade de se contarcom uma boa infra-estrutura adaptada para uma indústria ou setor comercial específi-co, e conhecimento científico e experiência específica em cada rumo.

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2. Também fazem falta bons clientes. Na economia moderna para ser produtivo, serequerem clientes exigentes. Se o cliente demandante é inteligente e tem necessi-dades dífíceis de serem cumprir, a empresa estará motivada, preocupada em satisfazê-lo. Assim aprenderá a ser muito produtiva. Se o cliente é tolerante, se não discriminaem excesso, se adotarão todos os maus hábitos, assim a empresa nunca poderá sercompetitiva. Na América Latina, se pode mencionar a eficiência dos bancos brasileiros.Aprenderam a ser eficientes porque tiveram que lutar contra a hiper-inflação., e seusclientes não toleravam que o dinheiro depositado não aparecesse em suas contas nãotardar que dois dias, pois isso significava perder a metade do dinheiro. De modo que osclientes insistiam que os depósitos aparecessem nos registros do banco no prazo deuma hora. Essa pressão da demanda os fizeram produtivos.

A mais abarcadora das pressões é a da competição, que desenvolve um papel funda-mental na inovação. Também é certo que para haver um ambiente produtivo é impor-tante desenvolver o que se chama de "grupos". De nada serve uma empresa isolada emsua indústria, deve-se construir um meio conjunto. Nos "grupos" as empresas con-vivem com provedores, companhias relacionadas entre si, serviços especializados, einstituições como os departamentos universitários. Um exemplo é a Noruega, que pagasalários muito altos, e é um país muito pequeno que controla 10% do transporte marí-timo mundial. Há muitas companhias de transporte marítimo norueguês que com-petem ferozmente, e também existem os construtores de barcos com alta tecnologia,os advogados especializados em questões marítimas, as sociedades de classificação,o financiamento especializado. Se pode chamar essa conjunção, a massa crítica daexperiência prática, conhecimento, e habilidades em um setor específico.São extraordinariamente produtivos. Por isso, podem manter o salário mais alto domundo na indústria marítima, e prosseguir com a manutenção de uma parte substan-cial do mercado. Isso é um grupo. É imperativo deixar de lado os antigos debates sobrea propriedade local ou estrangeira, sobre as indústrias boas ou más. Na economiamundial, a dinâmica da prosperidade tem haver com as idéias, o conhecimento e as for-mas de se fazer coisas, todos subprodutos do meio empresarial e, especificamente, dacapacidade de construir neste âmbito. A economia mundial moderna é praticamente ofator inverso do que a maioria das pessoas haviam antecipado.A primeira impressão é que em uma economia mundial na qual a Internet cresce, ondeé importante comunicar e transladar-se bens, faria da localização geográfica um detal-he sem importância. Uma empresa poderia estar em qualquer lugar e seguir sendopróspera. Mas na economia moderna mundial, ocorre o contrário, qualquer coisa quealguém possa conseguir de um lugar distante, já deixou de ser a diferença, não é umavantagem, competitiva, porque alguém pode comprar uma máquina da Alemanha,igualmente a qualquer outro que o deseje fazer. Se alguém pode encontrar uma infor-mação na World Wide Web, já não há vantagem, pois outros podem buscar a mesmainformação ali. A ironia çabe no fato de quanto mais mundial é a economia, mais locaissão as vantagens competitivas.Quanto maior a massa crítica única da Wall Street, ou do Silicon Valley , passam a servantagem as relações, as eficiências,e trabalhar ou não fazê-lo por meio de fronteiras.Da maneira que vemos, a economia está torna-se mais especializada geograficamente.Dentro dos Estados Unidos, cada um dos estados possui uma economia diferente. Aeconomia de Massachusetts não necessariamente se parece com a de Connecticut. Omesmo ocorre com a Alemanha, Portugal e em todos os países que possuem umaeconomia realmente avançada. Na Argentina ou Brasil, onde tudo se concentra ao redorde uma ou duas grandes cidades, ainda estão muito longe de trabalharem em umaeconomia moderna. Estes países operam sob a forma de economia na qual o governo édominante. Esta realidade é muito ineficiente. O governo deve assegurar que as empresas tenham insumos de alta qualidade, quecapacitem seu pessoal, que tenham uma boa infra-estrutura e capital disponível. Porisso são enormes os desafios na região, o Brasil e a Argentina são os países que maisconheço. Sei que ambos estão diante de uma crise no sistema educativo. Não hámaneira deste países serem mais prósperos, ou muito mais prósperos, até que não seresolvam estes problemas.

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Outro inconveniente da região é que os mercados de capital não oferecem fundos a pra-zos razoáveis para empresas que querem investir e crescer. É uma crise que deve sercontrolada. Outro ponto pendente é a falta de infra-estrutura científica e técnica.Cresceram acostumados a tomar a tecnologia do estrangeiro e perderam a confiança noque podem fazer seus próprios desenvolvimentos nesta área. Provavelmente seja cor-reto que a região não estará na vanguarda da física, da tecnologia e da informação,mas, no campo relacionado a sua base empresarial, não há motivos pelos quais aregião não possa passar a ser uma fonte de novidades tecnológicas, e não somente umreceptor delas.

3. Há que se produzir, assim mesmo, as regras corretas para o jogo. A velha regra dacompetição na região era conhecer o ministro do mandato, com isso se solucionavatudo. Alguém podia conseguir uma concessão, o preço correto para o produto, o subsí-dio necessário para a matéria-prima , somente conhecendo o ministro. As novas regrasdevem ser totalmente diferentes. A única forma de ganhar é competindo A única formade alcançar participação no mercado é ganhá-la. A proteção da propriedade intelectu-al, os incentivos para o investimento e a estrutura impositiva necessária também sãoelementos que determinam como jogar na economia madura. O governo deve dar-seconta de que a economia vive dos "grupos", tal como fora descrito, e que, para queesses conjuntos cresçam, é imprescindível que se solucionem os aspectos mais especí-ficos que os cabe . Não os grandes lineamentos, sim os desenvolvimentos especiais. É certo que também as empresas do setor privado têm muito a fazer por si mesmas. Umgrupo de empresas que fabricam instrumentos médicos em Minnesota alcançougrandes avances. O governo havia tomado medidas importantes para melhorar o meiodo setor, mas as mesmas empresas também tomaram a iniciativa quando houveescassez de mão-de-obra capacitada. Desenvolveram seu próprio sistema de capaci-tação, junto às faculdades e universidades locais. Se organizaram para resolver as lim-i tações que haviam no setor. Não esperaram o governo. Outro caso excelente é o de Costa Rica. Na área da informática pensaram com clarezadurante cinco anos e se asseguraram de que até o menor de todos saberia utilizar umcomputador, se ensinara inglês como matéria opcional, e se desenvolvera organiza-ções de pesquisa de informática nas universidades. A Costa Rica soube desenvolver ummeio no qual as empresas de tecnologia de informação viram que era um bom lugarpara se instalarem, na América Latina. Há dois anos, a Intel decidiu que a Costa Ricaera o lugar mais produtivo para montar a sua fábrica de produção de chips na região.Superou o Brasil, Chile, México e a Argentina. Não ganharam devido aos subsídios, ao mercado interno, nem por seus recursos natu-rais. Ganharam porque tinham um meio mais produtivo, no qual a Intel poderia con-seguir empregados qualificados. Os costariquenhos são muito bons em tecnologia dacomputação. Também asseguraram que o ambiente de competição fosse produtivo, eagora sabem que, uma vez a Intel seduzida, outras empresas seguirão , até que se dêforma a um novo grupo e uma nova indústria de alta tecnologia interessante. Talvez aArgentina não possa ser o outro Silicon Valley, mas consiga se converter em outro póloregional de uma tecnologia ou de um negócio, se reflete adequadamente sobe as basespara a prosperidade. Não se pode esperar que os líderes políticos das regiões façam tudo. Nenhum presi-dente pode fazer. Uma grande limitação que enfrenta a América Latina é a falta de von-tade da comunidade empresarial para liderar as políticas econômicas de sua nação.Nesta região as empresas estão acostumadas a pedir subsídios fazendo lobby. Todosse queixam da moeda, das taxas de juros, reclamam ao presidente que resolve todos osproblemas, políticos e individuais. Até agora vejo pouca evidência de que exista umaliderança organizada sistematicamente e exercida pela comunidade empresarial. A prosperidade econômica não é responsabilidade de um só ator. Está determinada portodos os setores da sociedade civil. Os educadores, as universidades, os trabal-hadores, todos têm que participar da solução . É o momento dos empresários nãosomente se concentrarem na estratégia de sua própria empresa. É tempo de cadahomem de negócios se transformar em um estadista