No Brasil os efectos da Reforma Agraria

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    No Brasil: a REFORMA AGRRIA leva a misria ao campo e cidade TFP: informa, analisa, alerta

    Siglas utilizadas nesta obra

    CEBs Comunidades Eclesiais de Base

    CNBB Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil

    ET Estatuto da Terra

    INCRA Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria

    MIRAD Ministrio da Reforma e do Desenvolvimento Agrrio

    PNRA Plano Nacional de Reforma Agrria da Nova Repblica

    RA-QC Livro Reforma Agrria Questo de Conscincia

    *Os destaques em negrito nas citaes so do autor desta obra.

    Introduo

    A esta altura da presente controvrsia agro-reformista, a TFP sente a necessidade de pr aoalcance do grande pblico um quadro global de suas recentes realizaes em tal matria,consideradas no contexto dos 25 anos de atuao da entidade contra o agro-socialismoconfiscatrio.

    isto tanto mais imperioso quanto ela encontra habitualmente grande dificuldade em obterdos mass media a publicao de qualquer matria que lhe diga respeito, ou a suas atividades(excetuadas, bem entendido, as matrias contrrias, para as quais freqentemente se abrem largosespaos publicitrios). Do que resulta ficar o pblico muito menos informado da atuao dela, doque das atividades, no s de entidades de merecida notoriedade, como at de corpsculos urbanosde importncia mnima.

    Em conseqncia, s resta TFP lanar mo de publicaes como esta. O que ela tem feitocom xito durante dcadas, e espera fazer todas as vezes que as circunstncias o indiquem comooportuno, e seus recursos lhe facultem possibilidades para tal.

    Os novos lances da TFPA exposio do que a TFP tem a ventura de haver realizado especialmente ao longo doatual tufo agro-reformista em benefcio da estrutura agrria do Pas, e da preservao de umrelacionamento cordial entre as categorias rurais harmonicamente desiguais, comportaria tambm aexposio do que ela ainda pretende fazer em tal matria.

    Entretanto, como bvio, os melhores preceitos da estratgia recomendam uma reservasistemtica quanto aos planos para o futuro.

    Assim, a entidade s descreve, na presente exposio, dois lances de grande alcance, queest comeando a desenvolver.

    O primeiro consiste na divulgao da edio em ingls, feita pela TFP norte-americana a

    American Society for Defense of Tradition, Family and Property do livro Is Brazil SlidingToward the Extreme Left? Notes on the Land Reform Program in South Americas Largest andMost Populous Country (O Brasil resvalando para a extrema esquerda? Notas sobre a ReformaAgrria na maior potncia territorial e demogrfica da Amrica do Sul), do Master of Scienceem

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    Economia Agrria, Prof. Carlos Patrcio del Campo. Obra inteiramente altura do nobre fim a quese prope, que a refutao, em nvel internacional, de quantas inverdades circulam pelo mundosobre a pretendida necessidade de realizar reformas de estrutura, como a Reforma Agrria, pararesolver problemas scio-econmicos existentes. O estudo refuta tambm as descries unilaterais eexageradas sobre as condies de vida das classes sociais menos afortunadas, e especialmente dos

    trabalhadores rurais em nosso Pas.A especfica utilidade da obra do Sr. Carlos Patrcio del Campo ser exposta a seguir.

    Boatos difamatrios percorrem o Brasil e todo o Mundo Livre

    Com o testemunho das 14 TFPs, suas coirms autnomas existentes nas trs Amricas, naEuropa, na frica meridional e na Austrlia, e dos bureaux-TFP em funcionamento em doze pases,est a TFP brasileira informada, h tempo, de que notcias difundidas mais ou menos em todo oMundo Livre, apresentam o Brasil de modo tendencioso e injusto: nossas principais cidades seriammares de favelas, dos quais emergiriam, como ilhas de um luxo acintoso, alguns bairros habitados

    por uma plutocracia riqussima; e, analogamente, em nossos campos, dirigidos com incompetncia

    e moleza por uns poucos monopolistas nababescos e faustosos, viveria uma populao faminta edoentia. Cultivo da terra? Escasso e pouco produtivo. Salrios? De fome. Cuidados mdicos,proteo securitria, instruo pblica? Tudo carente em algumas zonas. E inexistente em outras.

    A causa desta situao estaria no descaso das autoridades polticas e scio-econmicaspara com os pobres. Quanto s terras ociosas, estariam em mos de lati fundirios, que as manteriamimprodutivas, com intuitos egosticos de explorao imobiliria.

    notrio que o Estado tem gasto seus recursos, mais em atividades que no lhe competem atuando como empresrio do que em setores como sade pblica, instruo, etc. Isto, osdetratores da atual ordem de coisas silenciam. E os problemas de fato existentes nessas reas, alisartificialmente exagerados por eles, os atribuem atual estrutura scio-econmica do Pas.

    Analogamente no Brasil...Tal quadro (silncio feito, bem entendido, sobre os gastos da socializao...) apresenta

    sensvel analogia com o que certa propaganda agro-reformista vem fazendo circular no Brasil, demodo ora mais, ora menos insistente, desde os anos 50.

    Por ora, talvez, de hbeis fbricas de boato tm curso, em cada regio do Pas, quadrosanlogos ao acima descrito, referentes, porm, no prpria regio (onde a falsidade deles saltariaaos olhos), mas a outras regies distantes, de nosso territrio-continente.

    Assim, mais ou menos esse o quadro que nos sertes tem curso acerca das megalpolis,e, reciprocamente, nas megalpolis acerca dos sertes.

    Ambiente favorvel propaganda da Reforma Agrria, no BrasilNo Brasil, a difuso desse quadro cria ambiente para a propaganda da Reforma Agrria, a

    qual encontraria assim fundamento na funo social da propriedade, posta em especial realce nafamosa encclica Quadragesimo Anno, de Pio XI (15 de maio de 1931). E sobre a qual vminsistindo, com crescente empenho, os Romanos Pontfices.

    Aos olhos dos brasileiros que, desconhecendo a realidade global sobre seu Pas, doingenuamente crdito a esse quadro, quem defende a Reforma Agrria socialista e confiscatriamerece o aplauso das almas crists, pois luta pela justia social. E, ao contrrio, quem luta contra aReforma Agrria socialista e confiscatria, age sob o impulso de princpios obscurantistas eretrgrados, como de mesquinhos interesses pessoais.

    Ora, essa deturpada viso da realidade scio-econmica brasileira desvirtua ospressupostos mais essenciais da controvrsia agro-reformista. Pois as evidncias indicam que tem

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    havido uma melhora substancial na situao de amplas camadas da populao. A pobreza ficadelimitada a bolses remanescentes, especialmente em determinadas regies do Pas. provvelque a recesso sofrida pelo Brasil nos primeiros anos desta dcada tenha agravado a situao scio-econmica dessas parcelas. Esta recesso, porm, nada tem a ver com a estrutura agrria vigente. Ocrescimento econmico contnuo que o Brasil vem alcanando a partir de 1983 permite supor que

    essa situao se tenha aliviado desde ento.Mais ainda, a Reforma Agrria, de si, no representa uma soluo para os problemas

    sociais do Pas. O fracasso das experincias de Reforma Agrria na Amrica Latina, e dosassentamentos at agora realizados no Brasil, confirma essa concluso. o que mostra o novo livrodo Prof. Carlos Patrcio del Campo, que a TFP comea a difundir.

    As detraes internacionais do agro-reformismo, a que servem?

    E, no Exterior, qual o efeito de boatos to difamatrios?

    Neste derradeiro quartel do segundo milnio, a facilidade das viagens e dos contatosinternacionais cresceu consideravelmente. E aumenta cada dia mais. Todo o Ocidente j se tornou

    intensamente intercomunicante. E a opinio verdadeira ou falsa formada no Exterior sobre asituao de um pas, pode repercutir profundamente na escolha de rumos feita pela opinio pblicadeste ltimo. , pois, natural que os aludidos boatos internacionais facilitem, de vrios modos, aimplantao da Reforma Agrria no Brasil.

    E,the last but not the least, essa difamao metdica abre campo para que, em mais de umpas, pessoas generosas, mas tambm crdulas, se disponham a contribuir para a ao de rgos depropulso do agro-reformismo no Brasil.

    Balela marxista: ricos cada vez mais ricos, e pobres cada vez mais pobres

    De tudo isso, a propaganda comunista aufere vantagens.

    Com efeito, tirando partido deste quadro, o PCB e o PC do B preparam os espritos paradar crdito balela marxista de que, no presente regime scio-econmico, fatal que os ricosfiquem cada vez mais ricos, e os pobres cada vez mais pobres . O que leva a desejar atransformao social, por via de violncia, de uma situao que seria to odiosamente injusta.

    Bem entendido, tambm os comunistas e socialistas de todo jaez tanto sentimentaisutpicos quanto cientficos opositores radicais e sistemticos da sociedade cristharmonicamente hierrquica pregada por Pio XII (cfr.Alocues anuais nobreza e ao patriciadode Roma, de 1942, 1944, 1946 e 1947), lucram com a difuso dessa falsa e negra imagem.

    Os perigos a que o Brasil se expe

    E quem perde? Perde o Brasil.O que perde ele? A viso sensata e crist de uma realidade nacional que, sem ser ideal, porcerto no se identifica com esse quadro de pesadelos. Com isso, o Pas corre o risco de perder, porsua vez, e desde logo, a identidade consigo mesmo, pois quando uma nao deixa de ter de si umaviso objetiva, ela se torna irreconhecvel aos prprios olhos. E, mais, tal nao ou seja, no casoconcreto o Brasil se arrisca a ser privada, amanh, de sua prpria independncia. Pois quando umanao se habitua a s se ver atravs da propaganda falsa do adversrio, este ltimo no caso, aRssia sovitica se torna senhor das escolhas de rumo que esse pas tenha de efetuar nas grandesencruzilhadas da Histria.

    E, inegavelmente, o Brasil de hoje est na maior e mais dramtica encruzilhada de suaHistria.

    Entra, pois, em boa hora, a obra do Sr. Carlos Patrcio del Campo, que a TFP no momentooferece ao pblico brasileiro.

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    A TFP se dirige a Joo Paulo II antes da visita do Presidente Sarney

    A atuao deste livro comeou antes mesmo de seu brilhante lanamento em Washingtonno dia 6 de outubro do corrente ano (cfr. Apndice I deste trabalho). Com efeito, foi ele ofertado aS.S. Joo Paulo II, em telex que a TFP enviou ao Sumo Pontfice, em junho p.p., pouco antes davisita do Presidente Sarney ao Vaticano. O referente a este importante assunto constitui o ApndiceII do presente trabalho.

    Outro lance: recente estudo da TFP focaliza os graves prejuzos da ReformaAgrria para o trabalhador rural

    Acaba de ser aberta pela TFP outra frente, no mago de sua grande luta doutrinria contraa Reforma Agrria socialista e confiscatria. Consiste em denunciar ao pblico as deplorveiscondies de existncia e de regime de trabalho em que a aplicao do Estatuto da Terra e doPNRA, tende per se a deixar os trabalhadores manuais beneficiados por ambos os atosgovernamentais.

    O alcance desta iniciativa da TFP dos mais considerveis.

    Com efeito, at o momento, a Reforma Agrria tem sido focalizada com particularinsistncia por admiradores como por opositores enquanto medida restritiva do direito de

    propriedade. Ou seja, a aplicao do ET e a promulgao do PNRA seriam sobretudo lancesdesferidos num contexto de luta de classes: a luta dos trabalhadores rurais contra o capital,representado pela propriedade da terra.

    Estudo recente da TFP lhe proporciona tratar com amplitude e insistncia muito maioresdo que at aqui, dos efeitos nocivos da Reforma Agrria para as condies de vida do trabalhadorrural. O que particularmente til para a informao de nosso pblico, grande parte do qualimagina que, nociva embora para os proprietrios rurais, a Reforma Agrria melhora, entretanto, demodo considervel, as condies de vida dos trabalhadores do campo.

    O atual plano de Reforma Agrria visa fazer da estrutura rural brasileira uma imensa redede unidades de trabalho e produo, os chamados assentamentos. Segundo mostra o estudo daTFP, estes se caracterizam por no tomar como base o indivduo, sua pessoa, sua livre iniciativa.Em tal sistema, os titulares dos assentamentos, submetidos ampla e coercitiva legislao agro-reformista herdada dos governos militares, dificilmente chegaro a ser proprietriosno sentido

    preciso do termo.

    O assentado ser apenas um usurio da terra, pois receber uma simples concesso deusoda mesma, a ttulo precrio, por um perodo experimental mnimo de cinco anos. Se conseguirsatisfazer todas as condies exigidas pelo contrato de assentamento o que parece difcil, como sededuz da sucesso de fracassos dos assentamentos feitos segundo essa sistemtica ele poderreceber, e ainda assim com srias restries, o domnio da parcela.

    Aos assentados permite-se apenas o direito de participao na gesto dos assentamentos.Participao esta, entretanto, de ntido sabor autogestionrio.

    Ademais, superpostas aos assentamentos, ecoarctando gravemente a livre iniciativa dosassentados, estaro as Cooperativas Integrais de Reforma Agrria, de filiao obrigatria,emanadas e subordinadas ao Poder Pblico, que passar a ser, afinal, o grande senhor das terras

    brasileiras, e de todos os que nelas trabalham.

    Mas no s. O estudo deixa claro que o conceito de assentamento est inserido numprocesso, gradual e dinmico, que a Reforma Agrria. Segundo depoimentos de propulsores domovimento agro-reformista, esse dinamismo processivo ruma para a imposio de formas cada vezmais coletivistas de organizao do trabalho, onde os assentados acabam sendo meros

    usufruturios perptuosda terra.

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    Assim, no dia em que os assentamentos autogestionrios e cooperativizados estiveremestabelecidos em todo o territrio nacional, ter cessado de existir no Brasil a propriedadeindividual, bem como seu corolrio, a livre iniciativa.

    Qualifique-se isso em tese como se quiser, em tal caso se estaria em presena de umagigantesca hipertrofia do poder do Estado, investido de amplos poderes, e capaz de intervir com

    redobrada meticulosidade, na vida e na produo de cada nesga do territrio nacional. E a Histriapoder registrar, ento, que a implantao dessa rede de assentamentos ter sido poderoso meio paraempurrar mais ou menos inadvertidamente nossa Ptria no caminho apontado pelas utopiasmarxistas.

    Em conseqncia, a oposio Reforma Agrria j no pode mais ser vista pelogrande pblico, to-s como a justa defesa do direito do proprietrio ao solo que seu. Pois aReforma Agrria , ao mesmo tempo, uma agresso classe dos proprietrios e dostrabalhadores rurais.

    E justo que uns e outros lutem, em nobre e leal frente nica, contra a Reforma Agrria, aqual - intenes parte objetivamenteum ataque global contra a agricultura brasileira.

    Neste sentido, a TFP cogita de publicar esse estudo, o qual mostra detalhadamente oimpacto desfavorvel da Reforma Agrria sobre as condies de existncia do trabalhador que

    passar situao de assentado.

    Infeliz trabalhador rural, do qual tanto se gaba de cuidar a demagogia agro-reformista, masdo qual tanto esta se desinteressa na realidade...

    Confia a TFP brasileira em que, com a graa de Deus, a exposio do que ela desta formatem feito e est fazendo em prol do instituto da propriedade privada e da civilizao crist em nossoPas, atrair sempre mais simpatia de quantos proprietrios e trabalhadores do campo, correntes deopinio, grupos sociais e associaes representativas das classes rurais atuam para anlogos fins.

    I A TFP: um quarto de sculo na controvrsia sobre a Reforma Agrria

    PC, primeiro porta-bandeira da Reforma Agrria

    A Reforma Agrria foi uma das metas proclamadas no Brasil pelo Partido Comunistadesde seus primrdios, nos anos 20. Reivindicao de mero grupo de idelogos, sem razes naopinio pblica, foi ela vivendo de modo latente e incubado, como aspirao do pequeno ncleoinicial, difundida a seguir nas exguas fileiras de ativistas polticos que em torno deste grupolentamente se constituram, ou seja, o PCB, e, mais tarde ao lado deste, o grupo dissidente aindamenor, que o PC do B.

    Enquanto reivindicao de adversrios da sociedade burguesa, extrnsecos a ela e rondando

    fora dos muros dela para a destruir, a Reforma Agrria carecia de garra para constituir perigopondervel em um pas cuja populao boa, cordata e ordeira infensa aos dios, tenses eviolncias que caracterizam a luta de classes.

    Focos de irradiao do agro-reformismo

    Entretanto, pouco depois do fim da II Guerra Mundial, o agro-reformismo comeou apenetrar em crculos ricos e influentes da sociedade burguesa, no a partir dos PCs nacionais, masde focos de influncia formados na sociedade burguesa da Europa, pela ao de causas vrias, quede l se irradiaram sobre as trs Amricas.

    No Brasil, foram especialmente sensveis a tal influncia:

    - antes de tudo, por sua facilidade de radicao em todas as classes sociais, a chamadaesquerda catlica, instalada nas fileiras do Episcopado, no Clero e no laicato;

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    - certos ambientes intelectuais, tanto universitrios quanto de imprensa, rdio e TV;

    - os crculos da alta plutocracia desejosos de se articularem com a fora ideolgica epoltica que assim nascia.

    Reviso Agrria paulista, primeiro grande lance da batalha agro-reformista

    Foi a conjugao destas trs foras, as quais agitavam aos olhos do povo o perigocomunista constitudo pelos magros grupos de partidrios do PC, que deu origem ao primeirolance agro-reformista pondervel.

    Surgiu assim, em 1960, proposto pelo Governo Carvalho Pinto, do Estado de So Paulo, oprojeto de Reviso Agrria, apoiado desde logo por parte da imprensa e rdio, e por quase todo oEpiscopado paulista, bem como pela CNBB.

    Ante a burguesia intimidada, essas correntes apontavam como norma de conduta para osagricultores o velho lema ceder para no perder.

    Ou seja, aceitar uma forma atenuada de Reforma Agrria, para evitar a revolta doscamponeses inconformados com o estado de misria quimrico em que viviam os colonos.

    Na realidade, a fome dos colonos era irreal, como irreal sua indignao. A Reviso Agrriacarecia, pois, de todo em todo, de qualquer fundamento.

    No entanto, os esquerdistas de todos os matizes aderiram sofregamente a ela, bemconscientes de que a Reviso Agrria era, no dizer de seus prprios propugnadores, apenas o passopioneiro em um caminho longo e resvaladio que conduziria forosamente pela demasia inerentes concesses ideolgicas ao comunismo.

    A TFP entra imediatamente na lia

    A TFP entrou imediatamente na lia, sustentando que o lema que a situao recomendavano era ceder para no perder. estribilho de colorido dado derrota, entoado pelos visionrios

    mas no ceder para no perder. assim que, desde 1960, vem a TFP enfrentando animosamente sucessivas investidas do

    agro-reformismo socialista e confiscatrio, desfechadas em um quadro de luta no qual, por vezes,enfrenta a ss a refrega, enquanto outros fecham os olhos e cruzam os braos. Ou ento conclamama lavoura para deprimentes tticas de suicdio, consubstanciadas invariavelmente no slogancederpara no perder.

    Foi o que se deu, logo aps a Reviso Agrria paulista, com a investida agro-reformista deJango, apoiada pela palavra ou pelo mutismo de pondervel nmero de Prelados e de lderes rurais.

    Essa investida encontrou em plena ao a TFP que, em uma campanha pica, difundiu portodo o Brasil obest-sellerReforma Agrria Questo de Conscincia, o qual, lanado em 1960

    (4 edies, 30 mil exemplares), haveria de se constituir no verdadeiro livro-bandeira contra aReforma Agrria, segundo o insuspeito depoimento de Mrcio Moreira Alves (cfr. O Cristo doPovo, Ed. Sabi, Rio de Janeiro, 1968, p. 271). Com o apoio de tantos brasileiros clarividentes, essacampanha renovou as energias abatidas da opinio pblica, e concorreu acentuadamente para barraro caminho Reforma Agrria (1). Assim, a TFP contribuiu para dispor a opinio pblica rumo grande resistncia regeneradora que desfechou no golpe vitorioso de 64.

    Mas, enquanto tantos outros dividiam entre si os frutos da vitria honras, mando,situaes de influncia e de ganho a TFP se recolheu despretenciosamente sua atividadequotidiana, de formao da juventude.

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    Janguismo sem Jango: brado de alerta contra o agro-reformismo renascente

    Quem haveria de dizer? Esquecida, assim, pelos vitoriosos do dia (no porm pelosderrotados, os quais lhe votaram uma hostilidade inextinguvel), pouco depois de deposto Jango,teve a TFP de erguer-se, tambm agora s, para levantar um brado de alerta contra o agro-reformismo renascente.

    Emanava este mais uma vez, quem haveria de diz-lo! da pena do personagem rtilopor excelncia, da Revoluo de 64, isto , do militar que se ilustrou nos campos de batalha daEuropa durante a II Guerra Mundial, o Marechal Castello Branco, o qual fora elevado Presidnciada Repblica pelo prprio golpe anticomunista e antijanguista de 64.

    Alerta com o Janguismo sem Jango, exclamara a TFP, pouco aps a deposio deGoulart. Aproveitando a descompresso psicolgica do momento, os agro-reformistas, em solertemanobra, tentaram fazer aprovar o projeto Aniz Badra-Iv Luz, fortemente dirigista e atentatrio dodireito de propriedade. Depois de ter sido aprovado na Cmara, o projeto foi sustado no Senado.Um estudo dos autores de RA-QC, com o ttulo acima referido, publicado pela imprensa e enviadoaos membros do Congresso Nacional, tivera seu efeito.

    O brado estava, alis, longe de ser intil. Por motivos que a Histria ainda no revelou,assinou o Marechal Castello Branco, em 30 de novembro de 1964, o Estatuto da Terra (lei n.o 4504)que implantava no Brasil uma truculenta Reforma Agrria, no esprito e no estilo de que Jangoideara. E aprovado o Estatuto da Terra, publicou a TFP em 22 jornais de todo o Pas o Manifestoao povo brasileiro sobre a Reforma Agrria, no qual denunciava: Com o apoio das bancadasjanguistas, os representantes das correntes que depuseram Jango fizeram, atravs daaprovao da emenda constitucional e do Estatuto da Terra, a reforma que Jango queria.

    Durante o regime militar, Reforma Agrria a conta-gotas

    O manifesto da TFP, alertando a Nao e especialmente a lavoura, presumivelmente

    concorreu para que o regime militar, marcadamente socialista em outros aspectos, em matriaagrria tenha aplicado o Estatuto da Terra, durante 20 anos, em um sistema de conta-gotas. Porm oresultado de 20 anos de conta-gotas est longe de ser igual a zero.

    Constituiu-se assim, nas reas paulatinamente desapropriadas, uma experincia agro-reformista, fruto direto do Estatuto da Terra. Seria normal que os modernos paladinos da ReformaAgrria se regozijassem em alegar os resultados de tal experincia como argumento decisivo emfavor de seus planos. Porm no o fazem. Por qu? Obviamente porque tal no lhes convm...

    Adormecimento progressivo da classe rural

    Enquanto to discretamente avanava a Reforma Agrria, o adormecimento da classe rural

    se veio tornando cada vez mais profundo. Demonstra-o a atitude, continuamente satisfeita edespreocupada no tocante Reforma Agrria, mantida durante todo esse perodo pelas associaesrepresentativas da lavoura, inclusive as mais ilustres e benemritas.

    Um raio em cu sereno: o documento da CNBB, de 1980

    Durante esse tempo isto , desde a promulgao do Estatuto da Terra em novembro de1964, at a proposta do 1 PNRA da Nova Repblica, em maio de 1985 s perturbou atranqilidade da classe rural um raio em cu sereno. Foi o documento coletivo da Conferncia

    Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) aprovado em Itaici (SP), em fevereiro de 1980. Explosoagro-reformista em nvel ideolgico, qual no se pode recusar o mrito da franqueza, pois longede ocultar, em torcidos circunlquios, seu esprito e seus propsitos radicalmente igualitrios,

    proclamava a determinao de promover, depois da Reforma Agrria, a Reforma Urbana, a qualvisa implantar no solo urbano o mesmo igualitarismo que a Reforma Agrria institui no solo rural.

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    Com o que tornar curto o caminho rumo implantao de uma Reforma Empresarial (industrial ecomercial) igualitria. Igualdade scio-econmica completa, portanto.

    TFP: os catlicos enquanto catlicos, podem se opor respeitosamente aoreformismo agrrio e urbano da CNBB

    Aqui tambm, logo de incio, constituiu voz de alerta a ecoar por todo o Pas o brado daTFP, a qual divulgou o livro Sou Catlico: posso ser contra a Reforma Agrria? (PLINIOCORRA DE OLIVEIRA CARLOS PATRICIO DEL CAMPO, Editora Vera Cruz, So Paulo,1981, 360 pp.). Esta obra reivindicava para os catlicos o direito de discordar respeitosamente do

    programa scio-econmico de seus Pastores, e de se manterem contrrios s Reformas Agrria eUrbana socialistas e confiscatrias.

    A repercusso dessa obra foi considervel: quatro edies, num total de 29 mil exemplares,vendidos em 18 meses. Como Reforma Agrria Questo de Conscincia,Sou catlico... nodeparou em seu caminho com um s livro que conseguisse refut-lo.

    No encontrando embora terreno propcio, a investida da CNBB pouco a pouco prosperou.

    Comeam as invases e ocupaes

    Com efeito, teve incio de 1981 a intrmina seqela das invases e ocupaes de terra, aqual apresentou em fins do regime militar, isto , a partir de abril de 1984, um surto de maiorintensidade.

    Desde logo a TFP teve seus olhos abertos para fenmeno de to funda significao. Edifundiu dois nmeros do mensrio de cultura Catolicismo (n.o 402, junho de 1984, e n.o 406-407,outubro-novembro de 1984), especialmente consagrados a alertar o esprito pblico, impregnadoento do mais obstinado otimismo.

    Assim, as caravanas da TFP percorreram em vrias direes, vastides inteiras do territrio

    nacional, pondo venda aquelas edies de Catolicismo, que alcanaram a tiragem global de 115mil exemplares.

    Contudo, o otimismo geral que acolheu a Nova Repblica abafou a voz de alerta daTFP, que no conseguiu sequer despertar para medidas imediatas e eficazes os clssicos rgosrepresentativos da lavoura.

    Irrompe a tempestade agro-reformista

    Caiu em 15 de maro de 1985 o regime militar. A Abertura esteve prestes a levar ao podero Presidente eleito, Tancredo Neves. A morte deste franqueou a suprema magistratura ao seucompanheiro de chapa, o Vice-Presidente Jos Sarney.

    Pouco depois, a tempestade agro-reformista irrompia e se estendia por todo o Pas.Com efeito, no dia 26 de maio, o Presidente Sarney anunciava, na abertura do 4 Congresso

    Nacional dos Trabalhadores Rurais, em Braslia: Agora estou apresentando para debate aproposta do 1 Plano Nacional de Reforma Agrria (PNRA), inspirado no Estatuto da Terra(Folha de S. Paulo, 27-5-85).

    E, realmente, no dia seguinte, o Ministro Nelson Ribeiro entregava imprensa o texto doPNRA, de responsabilidade do Ministrio a seu cargo, isto , o da Reforma e do DesenvolvimentoAgrrio (Mirad).

    A divulgao desencadeou uma chuva de crticas dos lderes mais em evidncia dasassociaes de produtores rurais, crticas essas que se mantiveram acesas mais ou menos por uma

    quinzena. Porm se notou que, em seguida, elas amainavam, tendendo a pleitear que o Governopusesse de lado o PNRA, ou pelo menos o mitigasse,de forma a ajust-lo ao Estatuto da Terra.

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    Este, sim, deveria ser aplicado, pois se considerava que aReforma Agrria nele estabelecida erajusta e boa .

    Se esta era a posio dos lderes das associaes patronais, tal no era a dos proprietriosem geral, conforme se manifestou no Congresso que reuniu em Braslia, nos dias 27 e 28 de junho,cerca de 4 mil agricultores e pecuaristas. Uma oportuna interveno do Eng. Plinio Vidigal Xavier

    da Silveira, fazendeiro no Estado do Mato Grosso e diretor da TFP, mudou o rumo dos debates, edeu ocasio a que subisse tona o descontentamento latente dos fazendeiros, no apenas com oPNRA, mas em relao ao prprio Estatuto da Terra.

    TFP: mais um livro contra a tempestade agro-reformista

    Mais uma vez, no desconcerto geral do Pas, e especialmente de tantos lavradores que nosabiam para onde voltar-se, a voz de alerta da TFP ecoou por toda a Nao. Publicou ela o livro APropriedade privada e a livre iniciativa, no tufo agro-reformista, (PLINIO CORRA DEOLIVEIRA CARLOS PATRICIO DEL CAMPO, Editora Vera Cruz, So Paulo, 1985, 174 pp.),que faz uma anlise pormenorizada do PNRA, e aponta o seu carter socialista e confiscatrio, bem

    como do Estatuto da Terra.Enquanto a propaganda agro-reformista chegava ao auge, hericas duplas ou entocaravanas (remos Itinerantes) da TFP difundiam largamente esse livro. Duas edies deleforam publicadas, sendo vendidos 16 mil exemplares, alm de 34 mil da edio especial domensrio de cultura Catolicismo contendo excertos da obra.

    Contra as hordas de invasores a TFP difunde Pareceres de eminentes juristas

    Entretanto, todo este esforo no bastava. Agitadores agro-reformistas reunidos porimpulso de numerosos vigrios, religiosas, e muitos ncleos de CEBs, h tempos vinhamconstituindo hordas de invasores, com o manifesto intuito de tornar a Reforma Agrria um fatoconsumado margem da lei.

    Realizavam-se assim, em cerrada cadncia, as invases e as ocupaes de terras, vista deautoridades policiais obedientes a uma inrcia comandada, e de autoridades judicirias locaisimpotentes, na maioria dos casos, ante circunstncias que independiam de seu competente zelo.

    Tudo isto se desenrolou sob os acesos aplausos da CNBB, com o bafejo de quase todos osmeios de comunicao social, e em presena dos sorrisos algum tanto embaraados, masvisivelmente comprazidos, do Poder Executivo.

    Nessa atmosfera difcil, mais uma vez entraram em ao as valorosas duplas e caravanasde TFP, e distriburam at agora, a partir de janeiro do corrente ano, a 85 jornais esparsos em 21unidades da Federao, desde Roraima at o Rio Grande do Sul, e desde Mato Grosso e Gois at olitoral, os Pareceres lmpidos de dois jurisconsultos de fama nacional e internacional, o Prof. SilvioRodrigues, da Faculdade de Direito da Universidade de So Paulo, e o Prof. Orlando Gomes, daUniversidade Federal da Bahia. Esses Pareceres, difundidos pela TFP a pedido de um dosfazendeiros que solicitou aos jurisconsultos a competente elaborao, demonstram que, segundo oCdigo Civil (art. 502), o legtimo proprietrio desassistido da autoridade policial tem o direito dedefender-se, e s suas terras, contra o esbulho dos invasores e ocupantes agro-reformistas o que

    pode fazer inclusive mo armada quando necessrio.

    Em seguida difuso dos Pareceres, decrescem as invases

    A difuso desses Pareceres, acompanhada de exposies ou reunies para fazendeiros etambm para trabalhadores rurais manuais, realizadas por scios ou cooperadores da TFP em 181

    localidades, vem repercutindo amplamente no Pas. E, com expressiva simultaneidade, as invasese ocupaes foram caindo de nmero, a ponto de, em certo momento, parecerem cessadas ! (2).

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    Como sempre, tambm esta propaganda, de to ampla envergadura (3), foi levada a cabopela TFP na maior ordem e na mais estrita conformidade com as leis humanas e divinas. O quevaleu entidade atestados de delegados, prefeitos e outras autoridades municipais, comprobatriosda conduta modelar dos scios, cooperadores e correspondentes da TFP. Atestados estes que vieram

    juntar-se a outros anlogos, gloriosos triunfos de anteriores campanhas, atingindo o total de 4.317

    certificados do gnero.

    Produtores e trabalhadores rurais rejeitam a nova investida agro-reformista

    Embora os meios de comunicao social no o realcem como deveriam, o fato patente:oagerbrasileiro rejeita a nova investida agro-reformista. Rejeitam-na, em maioria compacta enotria, os proprietrios grandes, mdios e pequenos. Rejeitam-na tambm e o fato muitodigno de nota os trabalhadores rurais, que em geral a ignoram, em razo dos habituais silnciosdos meios de comunicao social sobre as conseqncias danosas da aplicao do Estatuto da Terrae do PNRA tambm para os trabalhadores rurais. Prova-o o fracasso das Reformas Agrriasexecutadas em outros pases, e as experincias j realizadas no Brasil.

    As notcias veiculadas pelos mass media (4) tendem a criar no esprito destes a iluso deque a Reforma Agrria acarretar para eles a implantao de condies de vida fartas, seguras eidealmente justas. Mas eles no se deixam embair pela miragem. E, quando objetivamenteinformados sobre o que seja a condio do assentado resultante da aplicao do Estatuto da Terrae do PNRA, a rejeitam categoricamente.

    Esta ltima afirmao, demonstra-a, com irretorquvel eloquncia, a atitude dostrabalhadores rurais face agitao agro-reformista:

    1) osmass media no noticiaram at aqui, que saibamos, um s caso de sublevao detrabalhadores de um imvel rural, voltada a expulsar o proprietrio deste, e a dividir o imvel emreas para assentamentos a ex-colonos sublevados. Os agitadores do campo so sempre invasorese no pessoas radicadas no solo onde a agitao tenta levantar seu pendo;

    2) igualmente, osmass media no mencionaram, que saibamos, um s caso de invaso ede ocupao de um imvel rural por hordas de agitadores agro-reformistas procedentes de alhures,ao ensejo da qual os trabalhadores j radicados no imvel assim invadido, hajam feito causa comumcom os invasores, a fim de se associarem a estes na partilha geral.

    Dado o cunho to freqentemente agro-reformista das notcias divulgadas sobre invases eacampamentos, o carter insuspeito dessas informaes de imprensa patente. assim bvio que,no Brasil, reinam relaes de geral concrdia entre os trabalhadores manuais e os proprietriosrurais.

    A CNBB passa para o silncio. Por quanto tempo?

    de se notar que, enquanto assim declinava a agitao nos campos, outra modificaosubstancial se operava no quadro geral da refrega concernente Reforma Agrria.

    vista do fracionamento dos partidos polticos, e do notrio declnio de sua influnciasobre a opinio pblica, a nica fora realmente propulsora da Reforma Agrria foi a CNBB.

    Por isto, nossos rgos de comunicao social se mostraram infatigveis no colher edifundir declaraes episcopais em favor da Reforma Agrria, bem como em noticiar faanhasdestes ou daqueles Prelados no mesmo sentido.

    Mas o declnio das invases e das ocupaes parece ter feito ver a nosso Episcopado agro-reformista fogoso, desconto feito de raras e nobres excees que o povo no o acompanhava.

    O fato que tem gradualmente diminudo, de tempos a esta parte, o nmero dasdeclaraes e faanhas agro-reformistas aparatosas, e que a CNBB parece calar-se quase porinteiro sobre o grande tema, at h pouco to de sua predileo.

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    Dar-se- isto porque a proximidade das eleies de 15 de novembro teria sugerido CNBBconcentrar-se na orientao do eleitorado acerca da Constituinte?

    A hiptese parece sem sentido, pois a Reforma Agrria naturalmente o maior pomo dediscrdia da eleio. E, ou a CNBB mantm sua insistncia em favor dela, ou vo perdendo votosos candidatos agro-reformistas. Isto , o contrrio do que a CNBB deseja.

    O pronunciado fenecimento do movimento agro-reformista

    O resultado desse pronunciado fenecimento do movimento agro-reformista parece ser ofato de que pelo menos at o momento o nmero de decretos expropriatrios do PresidenteSarney no retomou a fougue dos tempos em que o municpio de Londrina foi declarado rea

    prioritria para efeito de Reforma Agrria (cfr. Cap. II, in fine).

    E, fato talvez de maior monta, as verbas para a Reforma Agrria no oramento de 87diminuram sensivelmente. Di-lo o muito circunspecto ex-membro do movimento terrorista MR-8,Dante de Oliveira, Ministro da Reforma e do Desenvolvimento Agrrio, para o qual a pequenadotao prevista no oramento da Unio para o ano prximo se deve ao fato de que o plano de

    desapropriao em massa, elaborado por seu antecessor, era irrealista (cfr. Folha de S. Paulo,14-9-86, p. 4) (5).

    Mas os impulsos agro-reformistas esto longe de se acharem amortecidos

    Estar assim vitoriosa a luta contra o agro-reformismo socialista e confiscatrio? Seriatemerrio afirm-lo.

    Depois de um perodo de indeciso, tornou-se claro que, nas mais altas esferasgovernamentais do Pas, a meta agro-reformista continua a ser almejada com impulsos contidos, certo, mas que no nimo dos lderes eclesisticos e civis da Reforma Agrria esto longe de seacharem amortecidos (6).

    A controvrsia agrria reflui do campo para as cidades!

    A agitao agro-reformista declinou no campo. Porm continua a se fazer sentir nascidades. Foi episdio tpico disto, em Porto Alegre, a aparatosa ocupao do edifcio da AssembliaLegislativa por hordas agro-reformistas (24 de junho de 1986). Teve ela como antecedente a teatralRomaria Conquistadora da Terra Prometida, iniciada na misteriosa cidadela de ocupantes nafazenda Annoni, a 330 km da capital gacha. Tal Romaria durou 28 dias e terminou diante daCatedral daquela cidade, no dia 23 de junho ltimo. Foi ento a romaria recebida pelo Bispo-Auxiliar de Porto Alegre, D. Edmundo Kunz, e pelo secretrio-geral da Regional-Sul 3 da CNBB,D. Jos Mario Stroeher, num ato pblico com a presena dos estranhos romeiros, mais tudo quantoh de catlicos esquerdistas, e dos correlatos companheiros de viagem e inocentes teis do

    comunismo. E para todos eles foi, no dia seguinte, celebrada Missa na Catedral, pelo mesmo D.Edmundo Kunz e mais seis Padres ligados Comisso Pastoral da Terra e ao movimento dos sem-terra (7).

    Atualmente, os pruridos agro-reformistas, concentrados nas cidades, parecemmetamorfoseados nas greves urbanas mais ou menos generalizadas, de que o Pas inteiro testemunha.

    Que rumos tomar a ofensiva agro-reformista?

    A trajetria da presente narrao histrica se embrenha agora num terreno resvaladio ecoberto de brumas. Estamos, em outros termos, no mago de uma charada.

    A suspenso das invases e ocupaes ocorreu mais ou menos ao mesmo tempo em todo oPas, como se tivesse sido ordenada por uma imaginria vareta mgica.

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    Segundo o depoimento de credenciados entusiastas do agro-reformismo, tal suspenso noconstituiu mero reflexo psicolgico das supostas massas de agitadores rurais, mas resultou demotivos profundos. Pelo que, tiveram o consenso de lderes incontestes.

    E nada tem sido noticiado pela imprensa, que autorize a hiptese de uma alterao nascausas que teriam determinado tal suspenso. Sem embargo, a partir do dia 24 de setembro, se tm

    levantadoin crescendonovas vozes de pregoeiros de invases (8).No dia 26 de setembro, o Movimento dos Sem-Terra anunciou que dali a trs dias iniciaria

    a invaso de imveis desapropriados pelo Governo Sarney em seis Estados, mas cuja imisso deposse fora embargada pelo Poder Judicirio. Efetivamente, em princpios de outubro houveinvases isoladas em So Paulo e Santa Catarina.

    No Rio Grande do Sul, porm, onde o Movimento dos Sem-Terra mais atuante, osocupantes da fazenda Annoni, que haviam anunciado seu intento de invadir outras dez reas, foramimpedidos de faz-lo pela atitude enrgica da Brigada Militar gacha. 700 homens da corporaocercaram o acampamento dos sem-terra e tm conseguido, at o momento no obstante umatentativa malograda de considervel nmero de acampados para varar o cerco impedir a partida

    das colunas invasoras.Se coluna nenhuma partiu, contudo real que certo nmero de acampados na fazenda

    Annoni saiu durante o dia, de dois a dois, com pretextos diversos. E, em lugar de retornar aoacampamento, reuniram-se mais adiante, de maneira a constituir um magote para efetivar as

    planejadas invases.

    Ao destacamento da Brigada Militar incumbido de impedir as invases pareceu acertadoseguir a alguma distncia o magote, disposto a agir caso este tentasse qualquer invaso...

    Sem embargo da linha geral destes acontecimentos, a decifrao das enigmticas causasdeste vaivm da ofensiva agro-reformista promete apresentar especial interesse.

    II As foras em jogo na atual confrontao sobre a Reforma Agrria

    Uma luta pica de 25 anos

    Como acaba de ser narrado, desde incios da dcada de 60 vem a TFP lutando arduamentecontra a implantao do socialismo agrrio em nosso Pas. A tal vem ela sendo movida peladedicao desinteressada que vota civilizao crist, da qual a PROPRIEDADE individual ,como a TRADIOe aFAMLIA, princpio bsico. Luta esta particularmente desinteressada noque diz respeito propriedade rural, pois a quase totalidade dos scios ou cooperadores dela notem investimento agrcola.

    A atuao da TFP ao longo desses 25 anos de luta pica no se cifrou em promover a

    elaborao e a difuso, em nosso territrio-continente, de livros acautelatrios da opinio pblicacontra o agro-reformismo, ao contrrio do que faria crer a narrao j feita (cfr. Cap. I), de cartermais bem sinttico. Ao longo dessas campanhas para a difuso de livros, e tambm nos intervalosentre elas, vrias polmicas e lances congneres, referentes ao agro-reformismo, marcaram acaminhada da TFP. Disto pode recordar-se o leitor eventualmente esquecido, lendo o histrico dasatividades dela, publicado em obra editada sob os auspcios da entidade (cfr. Meio sculo deepopia anticomunista, Editora Vera Cruz, So Paulo, 1981, 4 ed., pp. 68 a 132).

    Passado de lutas pela propriedade agrria, mais longo e rico em esforos to rduos quantodesinteressados, nenhuma entidade nacional classista, poltico-partidria, ideolgica ou de outrandole, o pode apresentar. Ele situa a TFP em um plano mpar na histria desta pugna pr e contra a

    propriedade privada no sculo XX brasileiro. Luta esta que vem crescendo cada vez mais de

    intensidade e de importncia, e que presumivelmente crescer ainda mais medida que nosacercarmos do fim deste sculo. O que atrs foi lembrado fornece largamente material para a

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    histria de uma instituio a TFP ou de um setor bsico da atividade nacional, a lavoura. Diavir em que por tudo isso se interessaro tambm os pesquisadores que, no sculo vindouro,escrevero a Histria do Brasil.

    Hoje em dia...

    Tais antecedentes no podem ser vistos como meras reminiscncias luminosas, pela TFP,por seus scios, cooperadores e correspondentes, pelos numerosos amigos que ela tem entre osfazendeiros e os trabalhadores rurais, e tambm no pelo pblico em geral. E nem por eles assimso vistos. Pois, em continuidade com essas reminiscncias se vai desenvolvendo todo um presenteque borbulha de vitalidade.

    To logo se delineou a atuao agro-reformista do presente Governo, os olhares deincontveis brasileiros se voltaram para a TFP, esperando que, favorecida agora em sua liberdade deao pelo clima da Abertura, haveria de se manter fiel a seu roteiro histrico, que lhe traa o deverde entrar quanto antes na lia em favor do princpio da propriedade privada integrante da trilogiaTradio-Famlia-Propriedade, que as pugnas aqui narradas e muitas outras ainda, haviam feito

    ecoar em todos os rinces do Pas, ao longo das dcadas. O que tornara das mais conhecidas, a siglaTFP.

    E, com efeito, hoje em dia a TFP est na estacada, desenvolvendo, como sempre, seucombate a um tempo altaneiro e respeitoso, escrupulosamente legal mas indomvel, em favor deseus ideais.

    rgos de classe vem no ET uma ambigidade que ele no tem

    O primeiro lance pblico dessa luta no atual perodo presidencial foi a publicao domencionado livroA propriedade privada e a livre iniciativa, no tufo agro-reformista.

    Logo em seguida, deparou-se a TFP com um obstculo difuso e generalizado, implcito

    mas potente, que ameaava invalidar todos os esforos anti-agro-reformista. Era uma tendnciafreqente, mesmo da parte de elementos dos mais representativos da classe dos fazendeiros, a elidira pugna ideolgica e publicitria, procurando apresentar ao patronato rural o problema agrrio sobum aspecto ambguo que de nenhum modo ele tem.

    Se h algo a elogiar no ET, como no PNRA, a franqueza com que anunciam custe oque custar e doa a quem doer o alcance inteiro (que no se pode hesitar em qualificar de brutal) desua reforma. A anloga referncia faz jus a maior fora propulsora do agro-reformismo naatualidade brasileira, ou seja, a CNBB. No h hoje brasileiro que no disponha das informaessuficientes para aquilatar at onde vai o sentido esquerdista da ao dela.

    Em contraste com isso, certo veio de figuras proeminentes da lavoura se manifestoupropenso a ver no ET uma moderao que ele de nenhum modo tem, e a reservar suas increpaesexclusivamente para o primeiro projeto de PNRA e, de outro lado, para a CNBB.

    Desta atitude, inteiramente carente de objetividade no que diz respeito ao ET, que cumpre repetir genuinamente socialista e confiscatrio (cfr. A propriedade privada e a livreiniciativa, no tufo agro-reformista, pp. 33 a 39), decorria um esforo para que a classe dos

    proprietrios rurais aplaudisse o Governo por estar aplicando o ET, e lhe pedisse simplesmentealteraes no projeto de PNRA. Atitude que, conscientemente ou no este pormenor no entraaqui em cogitao teria por efeito levar a classe dos fazendeiros autodemolio.

    Aos que tenham exato conhecimento do ET causa espanto que a tendncia ambigistaacima apontada chegasse ao extremo de propor aos 4 mil fazendeiros reunidos em Braslia, nos dia27 e 28 de junho de 1985, que no s se abstivessem das crticas das quais passvel o diploma

    legal imposto pelo regime militar, mas at pedissem ao Presidente da Repblica sua aplicao.Diploma legal esse, entretanto, to nocivo classe rural que foi necessrio deix-lo dormitar

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    durante vinte anos nas gavetas da administrao pbica, espera de uma boa oportunidade para opr em prtica.

    Tal oportunidade, como bvio, foi proporcionada ao agro-reformismo pelo surtoesquerdista ocorrido ao longo dos ltimos anos no Brasil. No um surto de popularidade real e de

    pujana vital, com razes na opinio pblica. Mas de agressividade e de audacioso poder

    publicitrio. Efeitos que no provm necessariamente de razes na opinio, mas podem resultar deastcia e amplitude de meios de ao: o que a boa estratgia e o ouro podem proporcionar.

    Engaja-se a controvrsia agro-reformista

    Nas grandes confrontaes referentes a temas que tocam at no mais fundo as razes deuma nacionalidade e incontestavelmente a Reforma Agrria um destes, mxime se vista em seuindiscutvel aspecto de passo pioneiro, rumo abolio da propriedade privada e do patronato naagricultura, na indstria e no comrcio, atravs das subsequentes Reformas Urbana e ReformaEmpresarial a primeira etapa consiste na apresentao ao pblico, das teses que esto no limiar dacontrovrsia, e no desdobramento sumrio das respectivas argumentaes.

    No Brasil, onde os debates pblicos so muito mais elementares do que em pases nosquais a vida poltico-partidria tem como fator capital de influncia o descortino, as doutrinas e acultura, esta etapa se desenvolveu muito rapidamente. Foi s o Sr. Presidente da Repblica enunciaros seus at ento insuspeitados propsitos agro-reformistas, que estes produziram confusossintomas de desacordo e protesto em setores majoritrios da opinio pblica, e aplausosestrondejantes em setores minoritrios. Os mass mediase fizeram porta-vozes benvolos, quandono entusisticos, destes ltimos.

    Foi precisamente nesta fase que comearam tambm a sair os pronunciamentos da TFP,dos quais o mais marcante foi o livroA propriedade privada e a livre iniciativa, no tufo agro-reformista, j mencionado.

    De um lado e de outro, as posies estavam tomadas e a polmica engajada.

    Tratava-se ento, para cada lado, de conquistar o maior nmero de aderentes. A certainfluncia da lgica, as correntes antagnicas comearam a acrescentar ento a estratgia.

    O ponto de partida da estratgia agro-reformista

    Que se saiba, o ponto de partida de tal estratgia no foi at agora descrito de pblico coma calma e o mtodo indispensveis. Cabe tentar faz-lo aqui, comeando por apresentar um quadroda situao:

    1) No pinculo do poder estatal, um Presidente da Repblica ainda jovem para o cargo,simptico, e com foros de inteligncia e cultura assegurados pelo prprio fato de sua eleio para a

    Academia Brasileira de Letras. Mas portador do terrvel handicap de suceder a Tancredo Neves,cuja popularidade, elevada aos astros pelo consenso unnime dos mass media, ainda mais seenriquecera com a nota emocional, to inopinada e dramtica, das circunstncias que o impediramde tomar posse. Ademais, natural do Maranho, Estado notvel pela inteligncia de seus filhos e

    pelo grande futuro que o aguarda, mas profundamente dividido (como o demonstraram posterioresacontecimentos) no tocante pessoa do Sr. Jos Sarney.

    Este ltimo no contava, pois, nem no Maranho, nem em qualquer dos grandes Estados,com aquele tipo especial de popularidade reservada exclusivamente ao Presidente da Repblica quenele tivesse nascido.

    2) A despeito dessas circunstncias, o Chefe de Estado chamava a si, logo no incio de seugoverno, a tarefa terrivelmente audaciosa, de encaminhar o Brasil pela via cheia de terremotos e de

    borrascas, de um reformismo social completo, que conduzisse a Nao da economia liberal quetemos (ou imaginamos ter) intacta, para uma ordem scio-econmica que impossvel no chamar

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    de comunista ou comunistizante, uma vez que ela tende a eliminar, como se viu (cfr. Introduo), apropriedade privada, e consequentemente a livre iniciativa, como mais especificamente apropriedade individual e o patronato.

    3) Segundo mito publicitrio bastante difundido, esse programa, temerrio mais do queaudacioso, contaria com o apoio irrestrito e impetuoso das massas trabalhadoras famintas e

    opressas. Estas, protegidas em seu furor pelas liberdades da Abertura, investiriam sempre segundoo mito dia mais dia menos, contra a burguesia pequena, mdia e grande, em cujas fileiras osintelectuais e os tcnicos oprimem os trabalhadores manuais, os burgueses mdios e grandes sugame roubam as camadas inferiores atravs da cobrana de preos exorbitantes pelos produtos docampo e da indstria, e de aluguis no menos exorbitantes. No alto dessa pirmide de malfeitores,ossnobsultrajariam por seu luxo desmesurado, insolente e corrompido, a pobreza dos trabalhadoresmal pagos ou desempregados.

    Desde que contasse com o apoio de lderes adequados para estimular e guiar odescontentamento das imensas massas populares, um Presidente da Repblica poderia encontrarnelas um apoio firme e compacto muito maior do que, segundo as conseqncias de nosso regime

    federativo, ele recebe ordinariamente dos polticos dominantes no Estado em que tenha nascido, enos Estados que se lhe agregaram para obter para ele a suprema magistratura.

    4) Onde encontra o Presidente Sarney esses lderes escolados, to indispensveis?

    No PCB, no PC do B, em cujas fileiras refulgem, para efeitos internos, astros de primeiragrandeza, e em grupos ideolgicos ou partidrios mais ou menos vizinhos, como o PT e outrosmenores conjecturavam os ingnuos. Diante do programa radical desse conglomerado, estourariao descontentamento dos oprimidos, dando incio luta de classes que acabaria forosamentevencedora, segundo garantem os vaticnios de Marx.

    5) Os mais cautos e subtis tinham discretas reservas a respeito dessas esperanas.Provavelmente estaria entre estes o Presidente Sarney. Mas eles depositavam toda a sua confianaem outra fora, de cuja imensa influncia os mais ingnuos no se haviam dado conta. Era aConferncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

    Por razes profundas, que seria excessivamente longo elencar aqui, a Igreja disps semprede imensa influncia sobre nosso povo muito majoritariamente catlico (9). Influncia esta usadamais ou menos at meados do presente sculo, com comedimento e discrio maternais, e que porisso mesmo no se tornava patente aos olhos dos observadores superficiais. Mas influncia quetransparecia de quando em vez com clareza meridiana (10).

    A infiltrao esquerdista na Igreja

    Essa imensa fora, comeou a min-la, por volta dos primrdios dos anos 40, uma lenta einsidiosa campanha esquerdista (11).

    Tal infiltrao se foi acentuando inexoravelmente ao longo dos anos 40, 50 e 60, de sorteque, em 1968, a TFP organizou um abaixo-assinado pedindo a Paulo VI medidas contra ainfiltrao esquerdista na Igreja. Essa infiltrao se tornara j to notria, que esse abaixo-assinadoalcanou o impressionante total de 1.600.368 assinaturas. Foi ele entregue em mos no Vaticano. Eno teve resposta (12).

    De ento para c, segundo alardeou incessantemente a maior parte dos mass media, notm feito seno crescer dois instrumentos de ao da CNBB junto s massas trabalhadoras: asComisses Pastorais da Terra (CPTs), e as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) (13). As

    primeiras, rgos diretivos recrutados preponderantemente no Clero e, portanto, destinados, no arecrutar as massas, mas a agir sobre elas. As segundas, destinadas a abranger as multides.

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    A CNBB, o V Poder

    Carlos de Laet, o brilhante polemista catlico e monrquico das primeiras dcadas destesculo, escreveu certa vez que, no Brasil, h quatro Poderes. Destes, trs so integrantes do aparelhodo Estado: Executivo, Legislativo e Judicirio. E o outro, extra-oficial, deveria ser entretantomencionado ao lados destes, em razo de sua grande influncia. Era portanto um quarto Poder: aImprensa. Poder este to acrescido em nossos dias, com o advento do rdio e da televiso.

    O historiador que algum dia compulse as colees dos jornais contemporneos, no seeximir de afirmar que umquinto Poderemergiu da sombra discreta e digna em que se envolviaoutrora: o Episcopado, hoje em dia rotulado como CNBB.

    O I Poder lana a investida agro-reformista apoiado no IV e no V Poderes

    Era natural que, nos seus primeiros passos, o novo titular do I Poder se apoiasse no IV, esobretudo no V Poder. Foi o que aconteceu.

    Apoiado nos mass mediae na CNBB (muito mais do que nos partidos polticos, que aolongo deste tempo no fizeram seno desbotar e decair gradualmente de seu papel central nocenrio poltico do Pas), o Presidente Sarney lanou a atual investida agro-reformista. Estratgia deamplssimos contornos, e de linhas to claras, que basta descrev-la para torn-la perceptvel paraqualquer observador.

    ... e ento?

    O pacto reformista entre o Governo e a CNBB, selou-o a nomeao para o recm-criadoMinistrio da Reforma e do Desenvolvimento Agrrio (Mirad), de uma figura presumivelmenteconhecida nos meios agro-reformistas, chegada s CPTs e s CEBs mas perfeitamente desconhecidado grande pblico, o Sr. Nelson Ribeiro.

    A este no faltaram operosidade, agilidade e garra. Febrilmente desejoso de efetuar o

    quanto antes a aplicao integral do ET e do PNRA, o novo titular desenvolveu contra a estruturaagrria vigente, toda a fora de impacto de que dispunha. E foi isto to longe que, para coadjuvar oscatlicos esquerdistas em seu mpeto, o Governo no hesitou em prodigalizar prestigiosas cortesiasaos parlamentares do PCB e do PC do B, se bem que as manifestaes pblicas feitas por eles, comapoio de numerosos e influentes polticos burgueses, e recursos econmicos cuja origem sedesconhece, s tivessem conseguido o comparecimento de pfio nmero de partidrios (14).

    Com base nessas foras, o agro-reformismo clrico-publicitrio-poltico arrojou-se a umasrie de empreendimentos que chocaram a tal ponto a classe rural e a opinio pblica em geral que,quando sobreveio em 2 de julho de 1985 o decreto declarando prioritria, para fins de reformaagrria, toda a rea do municpio de Londrina, capital agrcola prspera do Estado do Paran,

    ocorreu um fato sem precedentes na Histria do Brasil. Isto , o Presidente Sarney no s sentiu anecessidade poltica de revogar imediatamente o decreto delirante, como ainda se viu nacontingncia de voar a Londrina com um squito luzidio, do qual faziam parte nada menos quequatro ministros entre eles o Sr. Nelson Ribeiro tudo para recitar o mea culpa do Governoante os fazendeiros justamente agravados (15). E, nas pessoas destes, ante o mundo agrcoladesnorteado e alarmado, habitualmente ordeiro e at bonacho, que j comeara a se pr em marcharumo confrontao ideolgico-poltica.

    Os dias do Sr. Nelson Ribeiro estavam contados; sua demisso era questo de tempo. Elecometera o erro de correr demais, e revelara os desgnios do agro-reformismo.

    A verdadeira soluo: coleta, anlise e divulgao de dados estatsticos

    A verdadeira soluo para a controvrsia agrria em curso no Pas j foi proposta peloautor destas linhas mais de uma vez pela imprensa diria (16). Teria ela consistido em que o

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    Governo tivesse acompanhado de h muito nosso incontestvel desenvolvimento econmico,mediante a coleta cientfica, imparcial e largamente divulgada em todo o Pas, para controle dosinteressados de dados estatsticos inteiramente elucidativos de toda a nossa realidade ruralcontempornea. De posse de tais dados, teria sido possvel saber de h muito, e com certeza inteira,se uma Reforma Agrria (como tambm uma Reforma Urbana e uma Reforma Empresarial)

    necessria, e em que medida o . A partir desta realidade assim elucidada, seria possvel s vriascorrentes de opinio discordantes, travar de modo objetivo, substancioso e fraterno, uma polmicaou um dilogo aberto e capaz de preservar a paz social, e operar na paz os progressos e qui asmodificaes que a justia e a caridade eventualmente sugerissem.

    Mais ainda, para contribuir quanto possvel para que a Nao tomasse esse rumo,promoveu a TFP a publicao de trs obras que, apesar de nossa penria estatstica, chegam aresultados cientficos de uma incontestvel seriedade (17). E, mais recentemente, a obra Is BrazilSliding Toward the Extreme Left? Notes on the Land Reform Program in South AmericasLargest and Most Populous Country, do Prof. Carlos Patrcio del Campo (The AmericanSociety for the Defense of Tradition, Family and Property , Pleansantville, Nova York, 1986,163 pp.).

    Essas vrias obras conduzem concluso de que ilegtimo, segundo a Moral catlica, egravemente improfcuo, do ponto de vista econmico, que o Pas enverede tambm em matriaagrria no dirigismo estatal (o qual, no campo da indstria, j lhe vem custando catadupas de

    prejuzos e desastres). E que para isto golpeie ou suprima a propriedade individual e a livreiniciativa (18).

    Mas os fatos demonstram que nossos meios de comunicao social (exceo feita, em certamedida, da Folha de S. Paulo e da ltima Hora do Rio de Janeiro) so fechados e quoradicalmente! para toda publicao referente TFP. Exceto, bem entendido, quando se trata dedescomp-la, e de dar a pblico toda espcie de inverdades ou de anlises infundadas a seu respeito.Ao que ela s consegue redargir uma ou outra vez em espaos jornalsticos nos quais lhe imposto

    o uso de letra to diminuta, que s adolescentes ou jovens conseguem l-la bem. Ou ento a TFP sev reduzida a responder pagando altas tarifas publicitrias, que suas exguas finanas muitas vezesno lhe consentem dispender.

    Assim que as trs obras da TFP j referidas, se tiveram uma repercusso muito maior doque a que tantas obras do gnero conseguem obter em nosso Pas, deve-se ao fato da ao abnegadada pujante juventude de seus cooperadores, aos quais, nas vias pblicas das grandes cidades, comoao longo dos mares e at os ltimos rinces sertanejos de nossa Ptria, tm procedido com garbo exito venda delas.

    Sobretudo o que a TFP no pode deixar passar sem os protestos que sua conscincia lheimpe e a lei lhe faculta, que, com base em dados que no conduzem a tal, se preconize para

    nosso Pas a efetivao de uma Reforma Agrria cuja aplicao em pequenas parcelas de seuterritrio j conduziu a desastres. A anlogos desastres em escala imensamente maior arrastou aReforma Agrria outros pases, nos quais foi imposta mediante a promessa de que saciaria a fome eaquietaria a indignao social (exageradas at o folhetinesco pela demagogia), e que os conduziu escravido miserabilista reinante na Rssia, ou quase tanto.

    III Ceder para no perder: velho slogan que serve de base paranova estratgia

    Como h pouco se mostrou, a conduta do Governo em matria agro-reformista trazia paraeste, como conseqncia, a necessidade de mudar de estratgia.

    Tal necessidade, imposta pela atitude tanto dos proprietrios como dos trabalhadores docampo, teria obviamente por meta a reconquista, pelo Governo, da popularidade que seu agro-reformismo lhe fizera perder em largos setores rurais, lhe abalara seriamente em outros, e lhe valera

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    a desconfiana generalizada em todos os setores do Pas, quer no tocante eficcia da reformaplanejada, quer no concernente aos pendores socialistas na melhor das hipteses do ministroNelson Ribeiro.

    Para compreender as remodelaes que a estratgia governamental iria receber dentro embreve, necessrio descrever rapidamente a transmudada situao da opinio pblica.

    1) Segundo a imagem do Pas at ento apresentada pelo IV e V Poderes conjugados imagem esta bastante gratuita, pois no se baseava em estatsticas de qualquer espcie (ou se

    baseava em estatsticas fragmentrias s vezes, inidneas quase sempre) as cidades e os camposde nosso territrio-continente estavam sempre mais imersos na misria, os ricos cada vez maisricos e os pobres cada vez mais pobres, segundo os princpios da crtica marxista. Emconseqncia, uma geral exploso de inconformidade estaria para estourar no Pas.

    2) Essa exploso traria derramamentos de sangue generalizados, cujas principais vtimasseriam os proprietrios, menos numerosos que os proletrios, e portanto necessariamente inferiores fora bruta da imensa massa dos trabalhadores manuais.

    3) Em conseqncia, quatro dos cinco Poderes (o Judicirio excludo, pois) apresentavam-

    se particularmente zelosos pelo resguardo da vida dos ricos e pela proteo dos pobres contra amisria.

    Todos recomendavam aos fazendeiros uma poltica de concesses: ceder para noperder fora o velho slogan agro-reformista da dcada de 60. Slogans tm vida efmera. Este jno est em moda. Mas a essncia dessa poltica concessiva e moderantista, ele a exprime porinteiro.

    4) De outro lado, as massas famintas e furibundas, esses moderantistas esperavam conterpor meio de um conselho paralelo, que bem poderia se exprimir pelo provrbio italiano piano,piano se va lontano e se va sano (devagar se vai longe, e sem prejuzo da integridade fsica).

    Em outros termos, fossem os produtores rurais cedendo lentamente, e conservariam por

    mais algum tempo a posse sempre mais reduzida dos respectivos bens. Pois estariam matando,aos poucos, a fome da fera que seria o povo deste fim de sculo. De outro lado, fossem ostrabalhadores manuais esperando, que acabariam por lhes vir, pacificamente s mos, todas asriquezas que esperavam.

    Com o insucesso da estratgia acelerada, o agroreformismo mais do que nunca tinha quedeitar suas esperanas em que prevalecesse no esprito dos produtores agrcolas a estratgia doceder para no perder. E na dos reformistas a de para obter, no correr nem impor.

    Ceder para no perder: slogan da predileo dos comunistas, que conduz destruio do patronato

    Essa circunstncia leva a que se passe, no momento, da descriodos princpios essenciaisda nova estratgia, para a anlise desta. E, para que esta ltima seja sinttica, cumpre considerarapenas seu ponto essencial.

    Segundo os preconizadores do ceder para no perder, a que conduziria esse sistemasimultneo e gradual de reivindicaes sempre maiores do proletariado, e de concesses incessantesdo patronato?

    Em tese, se o primeiro avana sempre, e o segundo cede sempre, chegar um dia em que oprimeiro ter ganho tudo, e o segundo ter perdido tudo. Em outros termos, o proletariado terdestrudo o patronato, e estar implantada no Brasil uma organizao scio-econmica sem classes:

    precisamente a meta comunista.

    Isto posto, o ceder para no perder umslogan tpico da estratgia comunista.

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    Objeo: a estratgia do ceder para no perder conduz a um ponto deequilbrio

    Mas, dir algum, esta uma interpretao unilateral doslogan. Pois ele tambm pode serinterpretado em sentido distinto. Ou seja, pode-se imaginar que, nesse caminho de avanos

    proletrios e recuos patronais, se chegue a um ponto de equilbrio ideal, no qual as massas terotodas as suas necessidades satisfeitas, e os proprietrios ainda no tenham sido levados a ceder tudo.

    O ceder para no perder seria ento umsloganinstaurador de um como que jogo decordas. Num extremo da corda estaria o proletariado, aglutinado, estimulado e dirigido pelossindicatos e grupos partidrios ou ideolgicos de esquerda. Do outro lado, estaria o patronato,analogamente aglutinado, estimulado e organizado por associaes conservadoras (conversadorasdiz um malicioso jogo de palavras popular).

    Este jogo de cordas no poderia ser necessariamente comparado com uma luta fratricida,nem com um esbulho total dos que tm em favor dos que no tm.

    Com efeito, se a fartura do Pas o permitir, e o proletariado sempre mais acentuadamentevencedor tiver bom senso, chegar-se- a um ponto de equilbrio.

    Por que, ento, entre duas interpretaes desse slogan, ambas vlidas, preferir ainterpretao pessimista otimista?

    Antes de responder, importa fazer aqui uma ponderao. que esse slogan (e portantotambm a poltica de concesses que explcita ou implicitamente nele se inspira) perfeitamenteambguo. Pois admite duas interpretaes igualmente vlidas... rumando para plos opostos.

    Em outros termos, tais plos, tal poltica, tal ambigidade, conduzem de imediatopara a confuso. E da confuso resulta que a parte enganada jamais a comunista.

    Outra objeo: a lgica cerrada desses argumentos conduz o Pas luta entredois radicalismos

    Objetar qui algum leitor que a lgica cerrada desses argumentos conduz a opiniopblica, por via de conseqncia, a uma terrvel opo. Pois se de um lado esto os que tudoquerem conservar para si, e de outro lado esto os que tudo querem conquistar para si, a luta inevitvel e pode desdobrar-se em lances sinistros. Pois a luta entre dois radicalismos, entre doisextremismos. Ora continuaria o objetante a verdade est sempre no meio termo. E, reduzido aoptar entre um ou outro radicalismo, o povo brasileiro fica sujeito a cair em um dos despenhadeirosopostos.

    Esta objeo no resolve o problema. Pois, se a opo inevitvel entre dois exageroscertamente no aceitvel, menos aceitvel ainda admitir que o caminho para evitar qualquer dosdespenhadeiros , para a opinio pblica, embrenhar-se na ambigidade, prenhe de sobressaltos,

    fraudes, decepes, vinganas e crimes.Por outro lado, se o jogo da corda realiza-se tendo, de um lado os comunistas, e de

    outro os burgueses conservadores, h pouca esperana de que venam estes. Pois o desideratocomunista no o equilbrio, mas a runa total do opositor. O equilbrio, s o desejam os burguesesque o risco tenha tornado compactamente moderados.

    E a garra dos que querem tudo, vence normalmente os esforos timoratos dos que secontentam com pouco.

    o que demonstra a histria do avano inflexvel do comunismo contra o moderantismoburgus, nas mais variadas situaes.

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    No jogo da corda, de um lado a longa manus de Moscou; de outro lado, osfazendeiros do Brasil

    Tudo isso, por mais concludente que seja, ainda no abarca a realidade inteira. Do ladoagro-reformista no esto apenas pessoas de esprito utpico, propensas a sonhos sociais mais oumenos romnticos, ou demagogos desejosos de carreira poltica, ou gananciosos de lucros

    publicitrios. Esto ostensivamente, com o estandarte da foice e do martelo em punho, o PCB, oPC do B e os corpsculos ideolgicos conexos (terroristas, inclusive). Nos seus estandartes sopra ovento de certa Teologia da Libertao, a que devem o apoio de to grande parcela da CNBB.

    E, por detrs dos PCs, seus companheiros de viagem e seus inocentes teis, impossvel no entrever a longa manus de Moscou, a qual vai estendendo por toda a terra aimpostura, a demagogia, a violncia e, por fim, o colonialismo comunista mais ou menos explcito.

    Atitude da classe rural

    No jogo da corda, de um lado est, pois, essa longa manus de ao, fazendo uso detodos os ardis, como de todas as brutalidades, para ganhar terreno e dominar. Do outro lado esto os

    fazendeiros do Brasil, alguns to embrenhados em suas fainas que nem sequer se deram conta, at omomento, do que o agro-reformismo. Outros que, abrindo estremunhadamente os olhos para o quese passa, e habituados ao trabalho produtivo, no porm luta, so propensos a dar ouvidos aos quelhes propem qualquer forma de concesso, e a dar crdito a qualquerslogan ou sofisma que nessesentido se lhes oferea. Outros enfim, inteligentes, geis, despertos, e prontos a qualquer sacrifcio

    para a defesa do patrimnio que herdaram legitimamente ou acumularam arduamente para seusfilhos, j vo dizendo no ao canto da sereia da demagogia reformista. entre estes diga-se de

    passagem que a TFP encontra as compreenses mais profundas, os entusiasmos mais calorosos epatriticos, as colaboraes mais generosas.

    No momento, o ncleo da batalha agro-reformista se trava entre os prprios produtoresrurais. Sero estes sensveis voz de seus vanguardeiros de escol, amigos da lei, e da paz dentro dalei? Ou, pelo contrrio, deixar-se-o iludir pelos pregoeiros de concesses inteis e suicidas, doceder para no perder? No primeiro caso, ainda h para o Brasil salvao. Pois a classe dos

    proprietrios to numerosa e influente que, mediante eleies srias, ou por plebiscito probo,ningum conseguir vence-la.

    Se, pelo contrrio, ela se entregar s moles solicitaes de um imediatismo preguioso ecego, com isto mesmo ela dar ouvidos s vozes que lhe partem, em ltima anlise (atravs deinocentes teis, companheiros de viagem etc.), dos arraiais da esquerda, no extremo dos quais est...Moscou. Neste caso, e dando ouvidos a essas vozes, ela estaripso factovendendo ao comunismo acorda com que este a enforque. E com ela ao Brasil (19).

    IV As invases, essas desconhecidas

    Os com-terra: classe annima que ignora o prprio poder

    Vistas as coisas da perspectiva h pouco delineada, o futuro do Brasil se patenteiadependente, de modo capital, da classe dos que tm terras. O que, a muitos espritos, parecer umaafronta realidade, j que esto habituados a aceitar sem tergiversao quanto lhes dizem os meiosde comunicao social. Segundo estes, a grande fora no dos que tm terra, mas dossem-terra.

    Uma anlise fria dos fatos mostra, entretanto, que o poder dos sem-terra no seno ummito publicitrio, baseado unicamente no fenmeno das invases.

    Ora, estas, como se passar a ver, nada provam. Ou provam o contrrio do que esse mito

    visa inculcar. Sem embargo do que os com-terraso os primeiros a ignorar quanto podem (20).

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    O que se pode concluir do fato das invases?

    Para que as invases servissem de apoio a uma concluso to grave quanto a de que, dadasas condies de existncia do operariado rural, o Pas estaria necessitando de uma Reforma Agrriaurgente e completa, que alterasse radicalmente a estrutura fundiria do setor agropecurio, seria

    preciso que se tivesse certeza cientificamente fundada em estatsticas de probidade e de poderconclusivo incontestveis acerca de numerosos aspectos dessas invases.

    Para iniciar tal demonstrao seriam necessrios estudos ainda no feitos, ou s feitossuperficialmente.

    O caso da Annoni, um fato caracterstico

    Tomando como exemplo o caso caracterstico da Fazenda Annoni, no Rio Grande doSul, invadida em outubro de 1985, e que permanece ocupada at o momento, caberiam as seguintes

    perguntas:

    1. Quantos so precisamente os invasores hoje fixados no acampamento da Annoni?

    2. Quais so com a mesma preciso as condies internas de vida, os liames desubmisso, voluntria ou no, que vinculam os atuais habitantes da Annoni aos chefesdo acampamento?

    3. Como so escolhidos esses chefes? Por quanto tempo? Quais seus poderes? Como sedistribuem entre eles tais poderes?

    4. Que cdigo de infraes e que sistema de punies aplicam os chefes a seussubordinados?

    5. Qual o grau de liberdade com que ali interferem os Poderes Pblicos, quer parainspecionar, quer para mandar ou proibir, dentro do mbito das respectivas esferaslegais?

    6. Se, no que talvez se possa chamar de campo de trabalhos forados da Annoni, os que aliresidem exercem alguma atividade para seu prprio sustento, o fruto dessa atividade vaidiretamente para o trabalhador, segundo o regime da propriedade privada, ou vai parauma caixa comum que importe a vigncia, no acampamento, de um regime socialistaautogestionrio?

    7. Tm os habitantes da Annoni liberdade de optar (sem sofrer qualquer presso moral oude outra natureza) entre trabalhar fora do acampamento ou dentro dele?

    8. Na Annoni, cada qual livre de escolher o tipo de trabalho que prefere, ou est adstrito execuo do trabalho escolhido pelos chefes?

    9. Caso a produo do acampamento esteja sendo insuficiente para o sustento dos

    habitantes, de onde e de quem, e em que porcentagem, procedem os recursos necessriospara completar o oramento dos acampados? (21)

    10. Bem entendido, o aspecto ideolgico das invases, bafejadas por apoios episcopaisimportantes e que continuam presentemente, no pode ser passado em silncio neste rolde questes. Quais, por exemplo, os eclesisticos e as organizaes de catlicosconstitudas por leigos, que ajudam o acampamento da Annoni, e o estimulam?

    Quais as formas espirituais e materiais do apoio e do estmulo que do?

    Quais so as formas de ao que mais estimulam?

    Cumpre saber se na Annoni existe ensino religioso para as crianas em idade escolar, quem

    o ministra, e qual seu contedo. E no se argumente que tal matria no pode ser investigada sem

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    transgresso da liberdade de pensamento e de religio, to fortemente enraizadas na ConstituioFederal.

    Com efeito, a partir do momento em que a CNBB, alegando justificao doutrinria, tomaa dianteira na maior transformao scio-econmica at hoje ocorrida no Brasil e, de outro lado, umdocumento da Sagrada Congregao para a Doutrina da F afirma taxativamente a existncia de

    veios ideolgicos marxistas no famigerado movimento da Teologia da Libertao (documentoassinado pelo Cardeal Ratzinger em 6 de agosto de 1984), ao mesmo tempo que o PCB, o PC do B,e corpsculos conexos apoiam francamente esta conduta da CNBB: nesse momento toca ao PoderPblico tomar conhecimento tambm dos aspectos ideolgico-religiosos de quanto na Annoni se

    passa. Entre outras razes, porque cabe ao Estado defender a soberania nacional, sempre ameaada como analogamente o esto as das demais naes do continente sul-americano peloimperialismo ideolgico-poltico de Moscou.

    Como fica implicada a soberania nacional, na agitao agro-reformista

    A soberania nacional? O que tem ela a ver com a Reforma Agrria?

    No faltar quem levante essa pergunta, inspirado em uma candura desconcertante, parano dizer suspeita.

    Por certo, uma vez que, em virtude da abertura poltica e da democratizao do Pas, setornou permitida, nos termos da lei, a propaganda comunista, no h argumento que justifique umainculpao da propaganda ideolgica ou poltica do comunismo entre ns.

    Mas tal no obsta a que continuem de p, como inquestionveis, os seguintes fatos, cujageneralizao em todo o mundo absolutamente notria:

    1) Em conformidade com o prprio carter expansionista do comunismo, onde quer queexista um partido, uma simples corrente ideolgica, ou um mero corpsculo comunista, seuscorreligionrios do mundo inteiro devem voltar-se para lhe prestar toda a ajuda necessria para que

    cresa, se consolide e conquiste o poder, dele expulsando os burgueses.Obviamente, qualquer partido, corrente ou corpsculo comunista, no tem, em sua

    doutrina, seno motivos para aceitar tal ajuda.

    2) O principal fornecedor dessa ajuda o partido comunista russo, o qual dispe comoentende dos imensos recursos do Estado sovitico (22).

    E como, de outro lado, toca ao mesmo partido comunista russo a coordenao e direo detodos os partidos comunistas no mundo, todas as ajudas que o movimento comunista receba dequalquer parte so reguladas pelo Kremlin.

    3) Isto conduz, por sua vez, a que todos os governos comunistas declarada ouveladamente tais pressionados pelos pases do Mundo Livre, no tenham condies para subsistir

    se no tiverem o apoio do governo russo. Ou seja, inautntica a independncia de todos os pasessujeitos a governos comunistas.

    Cair sob um governo comunista , pois, perder a soberania nacional

    4) Assim, o fato de que o Poder Pblico, em um pas no comunista, assegure aos partidose correntes marxistas toda liberdade de ao, no constitui impedimento a que o governo os vigie.Pelo contrrio, quanto mais eles so livres, tanto mais devem ser vigiados, dentro dos limites da lei,

    para garantia da soberania nacional contra os desgnios de agitao, seguida de luta de classes erevoluo social, que constituem um caminho foroso para que o comunismo tome conta do poder,e a independncia nacional soobre.

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    Ocupaes, invases, acampamentos e revoluo social

    Todas as consideraes acima foram feitas a propsito do acampamento da Annoni. Pois inteiramente cabvel perguntar o que se passa nas pequenas comunidades cuja formao as hordasde invasores tm levado a cabo aqui e acol.

    A comunidade da Annoni, como as demais, faz um s todo com o movimento dasocupaes. As invases so a causa das ocupaes. As instalaes de grupos contestatrios em

    prdios como os da Assemblia legislativa e do Incra gachos, e outras tropelias praticadas emcidades como nos campos, so mtodos de ao dessa luta de classes marxista, que tocou s raiasda revoluo social.

    As hordas de invasores agro-reformistas

    Examinado, pois, o movimento das invases agro-reformistas no que diz respeito aosacampamentos, cumpre ainda considerar o mesmo movimento em outro aspecto, que o das hordasinvasoras.

    A tal respeito, caberia aos Poderes Pblicos fazer estas e outras perguntas:1. Quantas hordas de invasores chegou a haver no Pas, no auge da ao delas, isto , de

    julho do ano passado a fevereiro do corrente ano?

    2. Quantos so os componentes dessas hordas, ainda existentes? Onde esto concentrados?Em regime anlogo ao da Annoni?

    3. De que ponto ou pontos do territrio nacional procedem as hordas eufemicamentechamadas colunas de invasores que nele perambulam (e das quais se destacaram oscomponentes do acampamento da fazenda Annoni, e de outros locais ainda)?

    4. So brasileiros, todos os que compem tais hordas? Se no, quantos so os estrangeiros?Em que data entrou no Pas cada membro estrangeiro?

    5. Esto identificados na Polcia?6. Dos dados colhidos por ocasio dessas identificaes, que quadros estatsticos foramelaborados no tocante idade, estado civil, profisso, salrio e bens de cada pessoa?

    7. Acompanham-nos as respectivas famlias? Ou deixaram-nas no lugar de partida?

    8. Nesta ltima hiptese, como se sustentam os familiares? Os invasores enviam algumaajuda financeira aos familiares distantes? Com que periodicidade? Com base emsalrios? Em contribuies etc.?

    9. Se no recebem salrios, de quem lhes vm os recursos para manter esses envios?

    10. Os envios de recursos financeiros dos invasores aos respectivos familiares so feitos porvia postal? Bancria? Outra via? So documentados?

    11. Estes e outros gastos de uma coluna de invasores, so contabilizados?12. Quem os contabiliza? Os dirigentes de cada coluna?

    13. Onde costuma ficar essa contabilidade?

    14. Obedece ela aos preceitos contbeis que so de rigor?

    15. Qual a vida de cada invasor, antes de se entregar sua presente ocupao?16. Teve passagens por delegacias criminais, ou de ordem poltica e social? Foi processado?

    Condenado? Cumpriu integralmente a pena imposta?

    17. Tambm antes de sua presente atividade, o invasor participou de movimentosideolgicos pacficos?

    18. De que ndole, esses movimentos: poltica? Scio-econmica? Religiosa? Filosfica?19. Salientou-se o invasor em algum desses movimentos? A que ttulo?

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    precisamente o contrrio. Isto , que elas no tm nenhum esprito de revolta contra osproprietrios, reconhecem-lhe placidamente a influncia, e lhes acatam os direitos patrimoniais. to geral este ponto, que pode ser tido quase como um plebiscito.

    Uma invaso caracterstica

    Para entender bem o alcance desta afirmao, imagine-se uma invaso caracterstica:1) No conglomerado urbano prximo, o vigrio vem fazendo, h meses, uma campanha

    agro-reformista, ao longo da qual comea por falar em termos dramticos, da misria reinante nosmais diversos pontos do territrio nacional ( mais vantajoso para a demagogia agrria referir-seassim s misrias que existiriam em pontos indeterminados e distantes, do que misria prxima,

    pois esta raras vezes existe, e as tiradas sentimentais sobre ela ficam carentes de base aos olhos dapopulao, que conhece a realidade).

    2) Aos poucos, o vigrio passa a justificar, em termos inflamados, as invases que colunasde famintos vm fazendo l ou acol. De quando em vez, aparecem referncias possibilidade deque essas colunas de famintos tambm enveredem pelas estradas da circunvizinhana da igreja.

    Essas referncias se vo tornando sempre mais freqentes.3) Ao longo dessa escalada de pregao agitadora, o vigrio mobiliza (ou comea a

    aglutinar) um primeiro ncleo de CEBs, entre cujos primeiros integrantes esto, em geral,elementos de sacristia cegamente solidrios com ele, ou indivduos de feitio psicolgiconaturalmente agitado etc. A esse ncleo vai sendo inculcado o dever em que se encontram seuscomponentes de fazer proselitismo para engrossar a clula nascente. E esta vai sendo preparada paraapoiar logisticamente qualquer coluna de invasores, que eventualmente venha de longe.

    4) Segundo a mecnica do movimento geral das invases, ao longe se ter ao mesmotempo constitudo e vem caminhando por etapas uma coluna de invasores adestrados cujo itinerrio

    passar pelo lugarejo.

    Oh coincidncia! Os jornais da capital vm ao mesmo tempo dando notcias sobre acoluna, a qual cada vez mais se acerca do lugarejo. Em determinado momento, a coluna est toprxima que a prpria folha local a noticia. O que ela far naturalmente (se for bem trabalhada)de modo sensacionalista.

    5) Chegada as coisas a este ponto, o vigrio muda o alvo de suas investidas. Essas j novisam apenas os proprietrios em geral, mas dois ou trs fazendeiros em particular. Aponta-os comocapitalistas implacveis, sanguessugas dos pobres, tiranos etc. Esto implicitamente designadasassim as vtimas das invases.

    6) Chega a coluna. No lugarejo, festivamente recebida pelos elementos das CEBs e pelasdemais pessoas que o vigrio tenha conseguido aglutinar. Os componentes da coluna recebemdiversos recursos logsticos: alimentao, cobertas, alguma roupa, sapatos etc. Quando for o caso,tambm assistncia mdica.

    7) Depois de acampada por alguns dias em praa pblica, a coluna se pe em marcha rumo fazenda j pr-determinada. E, se no encontra obstculos, a invade, nela instalando seuacampamento, cercando uma rea que lhe convenha ocupar, e ali comeando a levantar tendas, e adispor as coisas para uma permanncia durvel.

    8) O proprietrio? Muitas vezes ausente, e dando por telefone diretrizes ao administrador...Trabalhador, este ltimo, se bem que no trabalhador manual. Mas que sistematicamente se mantmfiel ao proprietrio.

    A Polcia? Na grande maioria dos casos no age. E at se mantm distante.

    O juiz? Em geral atende o pedido de reintegrao de posse, apresentado pelo advogado doproprietrio. Mas esse atendimento, na maior parte dos casos ineficaz, em razo da inrcia dasautoridades policiais.

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    9) Se assim se desenrolam os fatos, o que acaba por acontecer? A esta altura da narrao,todos os olhares se voltam para o proprietrio. O que far ele?

    No raras vezes, sua conscincia de catlico (e as de seus familiares) j ter sofrido tal ouqual abalo em conseqncia das pregaes esquerdistas que de h muito vem fazendo o padre.Ademais, sente-se inseguro quanto aos limites e aos modos de reao que possa desenvolver

    segundo a lei para se opor viva fora aos invasores. Diante do desinteresse das autoridades nadefesa dos direitos dele, no sabe se realmente a lei permite opor-se bala invaso. Se reagirassim, ou se utilizar homens armados, para evitar ou para fazer cessar a invaso, no acabar indoele para o banco dos rus, e finalmente para o crcere?

    Ademais, teme ele por sua esposa, por suas filhas e filhos, com ele residentes na fazenda.E, para poup-los, todos, se sente propenso a ceder.

    Psicologicamente debilitado, abandonado por todos, o mais das vezes a vontade de lutarvai desaparecendo nele, pois, como observa Clausewitz, o maior terico da guerra, para derrotar umadversrio, nem sempre necessrio venc-lo; basta tirar-lhe a vontade de lutar (cfr. CARL VONCLAUSEWITZ,De la guerre, Les ditions de Minuit, Paris, 1955, cap. II, pp. 70 a 83).

    10) O eplogo dessas tristes histrias costuma ser pouco conhecido.Se sobrevm um acordo, o fazendeiro cede suas terras, em parte ou no todo. Se de suas

    terras restarem alguns farrapos, talvez passe a morar e a trabalhar nestas. Mas o faz humilhado eapreensivo. Apreensivo, sim. E por vezes at agoniado pela insegurana. Pois que garantia tem elede que a concesso feita hoje no seno um resultado inglrio e intil, e estmulo de uma srie deoutras invases, ante as quais ter de curvar a cabea de cada vez, em virtude de novas imposiesfeitas na marra e na lei por esta ou outras hordas de invasores? O que o aguarda ento, seno aderrota final, em que nada mais lhe reste da antiga fazenda?

    Outras vezes, o fazendeiro prefere praticar uma espcie de eutansia, e eclipsar-sequando menos o imaginam os ocupantes. Levando a famlia e uns poucos trastes, vai iniciar vida

    obscura e humilhada em qualquer recanto do Brasil, onde nenhuma reportagem o alcance paradesvendar ao pblico seu triste fim. Pois este triste demais!

    Os trabalhadores rurais em face dos patres: tudo os une, nada os separa

    Pode-se supor que a narrao desta triste histria acabe aqui. Na realidade, todo umaspecto dela alis da maior importncia ficou faltando. E desse aspecto ningum fala.

    Alm do proprietrio e dos seus, de um lado; do vigrio revolucionrio, de seus agentesurbanos e da coluna dos invasores, de outro lado; das autoridades policiais inertes e das autoridades

    judicirias reduzidas impotncia, de outro lado ainda, falta descrio do quadro e conseqentenarrao do drama, o atinente a mais outro grupo de personagens. So os trabalhadores manuais -

    bias-frias em geral, e mais raramente assalariados, parceiros ou meeiros que trabalham nafazenda.

    Se eles fossem, todos, os famintos e os revoltados cuja figura a campanha agro-reformistavisa impingir ao pblico, seria justo, seria plausvel, que eles tomassem uma atitude antipatronaldesde o incio da invaso. Que fossem ouvintes entusiasmados do vigrio justiceiro e indignado.Que se antecipassem horda dos invasores, declarando ocupada em prprio proveito a fazenda emque trabalham. Que, pelo menos, esperassem como libertadores, os companheiros de fome e demisria aglutinados nas colunas de invasores que viriam se aproximando. Que, vendo se acamparemem frente fazenda, a fim de negociar com o patro, dspota sob cujo jugo avaro h tanto tempogemiam, eles precipitassem o curso da invaso libertadora, indo de encontro aos invasores, paraajud-los na derrubada de porteiras e cercas, atra-los para dentro da fazenda, e a procederem a uma

    partilha total das terras em que todos juntos, invasores, bias-frias e outros assalariados,executassem pelas prprias mos a Reforma Agrria socialista e confiscatria.

  • 7/23/2019 No Brasil