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RFAD - MÉTODO DE CÁLCULO DE REPOSIÇÃO DE FADIGA BASEADO NA APROPRIAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA ERGONOMIA DA ATIVIDADE Marcello Silva e Santos (UNIFOA ) [email protected] Mario Cesar Rodriguez Vidal (UFRJ ) [email protected] Daniela Franco Guimaraes (Lab GENTE ) [email protected] O presente artigo apresenta o método RFAD para cálculo do tempo de reposição de fadiga, que é um dos componentes dos chamados tempos suplementares, utilizados como parâmetros para a programação e no planejamento industrial. A construção desste método decorreu de uma demanda formulada ao Laboratório GENTE/COPPE para atualização dos procedimentos de Planejamento Industrial numa empresa do ramo automotivo. A inovação decorre do fato de ter se partido dos conceitos e princípios de Ergonomia como justificativa técnica e efeito de maior credibilidade para aceitação do processo. Os resultados preliminares apontam para uma alternativa que não desconsidera as necessidades de produtividade e racionalização da produção. Porém, apresenta-se coerente com a tendência de valorização do trabalhador e da qualidade de vida no trabalho. Palavras-chaves: Ergonomia, PCP, Gestão da Produção XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.

RFAD - MÉTODO DE CÁLCULO DE REPOSIÇÃO DE … · Mario Cesar Rodriguez Vidal (UFRJ ) [email protected] Daniela Franco Guimaraes (Lab GENTE ) [email protected]

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RFAD - MÉTODO DE CÁLCULO DE

REPOSIÇÃO DE FADIGA BASEADO NA

APROPRIAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA

ERGONOMIA DA ATIVIDADE

Marcello Silva e Santos (UNIFOA )

[email protected]

Mario Cesar Rodriguez Vidal (UFRJ )

[email protected]

Daniela Franco Guimaraes (Lab GENTE )

[email protected]

O presente artigo apresenta o método RFAD para cálculo do tempo de

reposição de fadiga, que é um dos componentes dos chamados tempos

suplementares, utilizados como parâmetros para a programação e no

planejamento industrial. A construção desste método decorreu de uma

demanda formulada ao Laboratório GENTE/COPPE para atualização dos

procedimentos de Planejamento Industrial numa empresa do ramo

automotivo. A inovação decorre do fato de ter se partido dos conceitos e

princípios de Ergonomia como justificativa técnica e efeito de maior

credibilidade para aceitação do processo. Os resultados preliminares

apontam para uma alternativa que não desconsidera as necessidades de

produtividade e racionalização da produção. Porém, apresenta-se

coerente com a tendência de valorização do trabalhador e da qualidade de

vida no trabalho.

Palavras-chaves: Ergonomia, PCP, Gestão da Produção

XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos

Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.

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1. Introdução

Esse artigo apresenta um método para determinação do tempo de reposição de fadiga (RFad), componente do cálculo

dos tempos-padrão de fabricação, utilizados como parâmetros para a programação e no planejamento industrial. A

construção deste método decorreu de uma demanda formulada ao Laboratório GENTE/COPPE para atualização dos

procedimentos de Planejamento Industrial num dos sites brasileiros de uma empresa de atuação mundial do ramo

automotivo. O desenvolvimento seguiu as etapas da metodologia de Ergonomia de Concepção desenvolvida e

praticada pelo GENTE/COPPE (Figura 1).

Figura 1. Metodologia de Ergonomia de Concepção aplicada ao estudo em tela.

O texto deste artigo seguira a seqüência de etapas acima estabelecida, para atender a uma exposição didática de um

processo de concepção e, assim fazendo, buscando maior utilidade para os profissionais de Engenharia de produção,

na especialidade de Ergonomia. Seu teor abrange as etapas 01 a 05, já que os itens VI, VII e VIII requerem de cinco

a dez anos para sua plena efetivação. A seqüência metodológica apropria-se dos princípios da Ergonomia da

Atividade, que se constrói pela análise ergonômica do trabalho (AET), conforme metodologia proposta por Wisner

(1977).

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2. Analise da demanda

O desenvolvimento do método foi provocado pela demanda de uma organização produtiva, uma das maiores do seu

segmento no mundo. Sua forma de gestão estratégica se faz mediante o desenvolvimento de projetos de classe

mundial que são localizados em algum dos sites da corporação, que apresente – e reivindique – as condições

corporativas para sediá-lo. Num desses movimentos, houve um questionamento referente à metodologia de alocação

de tempos suplementares entre os sites em concorrência corporativa por estes projetos: O site que solicitou o

desenvolvimento em tela estaria estabelecendo tempos suplementares mediante acordos trabalhistas e sem uma base

técnico-científica convincente. Aos olhos dos centos de decisão corporativa. È importante assinalar que a ausência

de tecnicidade numa corporação desta natureza significa instabilidade nos elementos de formação de custos, o que

aumenta o risco de investimento.

Os tempos suplementares são tolerâncias adicionais às que integram o cálculo do tempo padrão que buscam

compensar eventuais variações das condições de trabalho. Entenda-se que o calculo do TP se faz na métrica

estabelecida por um operador treinado, executando o método preconizado e numa situação estabilizada. Como esta

condição nominal é verificada de forma apenas episódica, foi estabelecida uma sistemática de alocação de tempos

suplementares, representadas por um percentual sobre o tempo total. E é exatamente esta sistemática, expressada em

termos porcentuais que sugeria uma forma de acordo trabalhista e que sob esta argumentação estava sendo criticada,

transformando-se numa vulnerabilidade competitiva na busca de captar a localizações de projetos de classe mundial

no site demandante.

Bem, a sistemática nos remete a mais de 20 anos, em pleno momento da estruturação produtiva no Brasil, placo de

muitas disputas e acordos, que efetivamente mudaram vários conceitos de relações industriais. Nestas últimas duas

décadas houve significativa modernização das instalações industriais e em equipamentos, com utilização de ligas e

materiais mais leves, inclusive em ferramentas. Muitas operações consideradas de grande risco do ponto de vista da

saúde ocupacional tiveram sua severidade ocupacional reduzida em função dessa evolução tecnológica. Nesse novo

cenário, houve, por um lado, temos a redução dos esforços físicos presentes nas atividades de trabalho e do outro, e o

ganho de importância das questões relacionadas às relações industriais – legislação, normatização, sindicatos, etc.

Transformado em conteúdo da metodologia de Planejamento Industrial, a sistemática de alocação de tempos

suplementares abre uma série de oportunidades para novas aplicações em ergonomia, dado que estão implícitos o

reconhecimento do tema da variabilidade industrial assim como o da amplitude do conceito de fadiga. O que, no caso

em tela, oferece sua contribuição na reformulação da sistemática de estudo de tempos e movimentos fazendo uma

relação direta com a presença ou ausência de ergonomia: se as condições gerais melhoram, conseqüentemente os

fatores que provocam a flutuação dos tempos de ciclo tenderão a serem reduzidos, nisso se conjugando com os

demais fatores de competitividade do site.

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O assunto, entretanto, é que a base e os critérios de estabelecimento de tempos suplementares haviam perdido seu

rigor cientifico e é essa a demanda a que o método buscou atender.

3. Apreciação ergonômica

A apreciação ergonômica compreendeu 45 postos de trabalho previamente definidos pelo setor responsável como

“críticos” do ponto de vista dos riscos associados. Ela foi realizada mediante o uso do método SPM, desenvolvido

pelo Laboratório GENTE/COPPE/UFRJ, combinado com a Tabulação SIC (Somatório dos Indicadores de

Criticidade Ocupacional), ferramenta de priorização de providencias decorrentes da apreciação. O método SPM

opera uma avaliação macroergonômica do setor. Combinada com avaliações localizadas de impactos, assim

entendidos os efeitos evidenciados da ausência de ergonomia mediante observação e ação conversacional com o

trabalhador, sem o recurso a uma exploração sistematizada da situação de trabalho. A apreciação ergonômica se

consubstanciou em dados de impactos registráveis, aspectos causais, e seus respectivos itens de enquadramento

normativo. A organização destes dados em matrizes de observação possibilitou o tratamento agregado e estruturado

ao conjunto das observações, conversações e exame de registros, bem como das validações e restituições efetuadas.

4. Pré-diagnóstico

O pré-diagnóstico consistiu na avaliação dos resultados da apreciação ergonômica em termos das necessidades de um

cálculo de reposição de fadiga. A apreciação ergonômica forneceu os insumos necessários a identificação das

variáveis de controle utilizadas na Tabulação SIC, que neste caso, não foi usada apenas como ferramenta de

priorização mas também como variável de atenuação, aplicada no cálculo de reposição de fadiga que será abordado

ao longo do texto.

Trataremos aqui da avaliação GUT (Gravidade, Urgência e Tendência) e da tabulação SIC (Somatório de

Indicadores de Criticidade)

4.1 – Avaliação de GUT (Gravidade, Urgência e Tendência)

Quando se trata de ordenação por premência de atuação nas situações, a ferramenta mais freqüente é a chamada

Matriz de GUT. É uma matriz de priorização que possibilita, de forma consensual, classificar em ordem de

prioridade os processos / problemas da situação examinada. É igualmente uma ferramenta construída para ordenar

uma lista de itens que serão priorizados com base em critérios definidos por pesos. A ferramenta é composta por

formulário, contendo uma escala de 1 a 5 para os fatores de Gravidade, Urgência e Tendência, quantificando os

processos de forma sistemática. A Tabela 1 ilustra os processos / problemas da equipe e os valores que podem ser

atribuídos.

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Tabela 1: Matriz de GUT

Grau Gravidade Urgência Tendência

5 Extremamente grave Necessita de ação imediata Piora rapidamente se nada fazer

4 Muito grave Necessita ação com alguma urgência Piora em pouco tempo

3 Grave Necessita ação o mais cedo possível Piora em médio prazo

2 Pouco grave Pode esperar um pouco Piora em longo prazo

1 Não tem gravidade Não há pressa Não piora

Para o caso em tela foi feita uma adaptação da ferramenta GUT, na qual foram elencados e avaliados, a partir do

mapeamento SPM, as variáveis de risco mais prevalentes. Em seguida, se adicionaram apreciações de sobrecarga de

forma compartilhada entre analista e a situação observada. Cada linha representa a avaliação GUT quantificando a

variável de estabelecimento (ambiente, equipamento e organização do trabalho) e as variáveis de julgamento

(sobrecarga física e mental). A avaliação final é dada pela fórmula que se segue:

( eq. 1 )

4.2 – Avaliação SIC (Somatório dos Indicadores de Criticidade Ocupacional)

A Tabulação SIC combina os critérios de exame da auditoria fiscal (GUT) com o risco fiscal (caracterizado pelo

numero e diversidade de desconformidades normativas).

A combinação da apreciação SPM com a avaliação GUT nos ajuda a determinar o grau de gravidade ocupacional de

cada posto de trabalho, nos fornecendo uma tabulação SIC. Na empresa em foco, o SIC entrou na composição das

variáveis a serem empregadas na fórmula de cálculo do tempo de reposição de fadiga, uma vez que uma situação

ergonomicamente bem agenciada é suscetível de reduzir a fadiga de forma contundente. A tabulação SIC determina

o grau de risco ergonômico de cada posto de trabalho, portanto a partir da combinação de variáveis de diferentes

matrizes (Matriz Observacional, Enquadramento Normativo e demais ferramentas de apreciação e de avaliação

global das situações de trabalho). Em sua forma simplificada, o índice SIC ® nos é dado por:

SIC = 0,015 * [ Apuração GUT] * [Numero de desconformidades ] (eq. 2)

A tabela 2 mostra o cálculo de um sistema de indexadores SIC no site demandante. De acordo com esta indicação,

medidas de reformulação e treinamento, à luz da avaliação realizada devem ser encetadas sob indicativo de urgência.

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Tabela 2. Exemplo de Aplicação da Tabulação SIC

Posto Constrangimentos Ação Enquadramento Desconformidades GUT SIC

C.C.135.4

Deslocamento constante do

operador, pois são utilizadas 0,0090

NR 17.1.2.; NR

17.6.1. ; NR

17.6.2.a;b;c;d;e;f

;NR 17.6.3. a;b;c.

11 933

Grande distancia entre as

máquinas utilizadas no 0,0050

O operador sente cansaço nos

membros inferiores ao final do

turno de trabalho.

0,0050 194,997

5. Avaliação técnica

A fórmula de cálculo do tempo de reposição de fadiga somente deverá ser empregada para os postos ou atividades de

trabalho envolvendo potenciais de desgaste físico maior que o estabelecido pelos critérios fisiológicos de capacidade.

A fórmula irá combinar dados de estimativas de gasto energético laboral extraídos de tabelas da NR-15, com

estimativas da média de consumo máximo de oxigênio (VO2 max) dos funcionários, além de outras variáveis como

Índice de massa corporal, IMC), temperatura e umidade relativa do ar no local de trabalho (reunidos na mensuração

IBUTG). Ao associar as tabelas à condição física aeróbica dos trabalhadores (a ser estimada) deveremos encontrar

valores máximos recomendáveis para o trabalho contínuo em função, também, da duração da jornada típica da

fábrica. Os percentuais de VO2max admissíveis serão estipulados com base em estudos de Ästrand & Rodhal (1984),

Monod(1994) e Moreira (2010), correspondendo aos valores da tabela 3.

Tabela 3 : Referenciais de definição do consumo máximo de oxigênio na jornada (%VO2 max lim.)

Duração (horas) %VO2max

1 75

2 70

3 65

4 60

5 55

6 50

7 45

8 40

9 35

Existem várias formas de se determinar o nível de condicionamento físico, porém, em virtude do contexto do estudo,

decidimos pela utilização de uma estimativa baseada em uma tabela de hábitos (JACKSON, A.S. e col, 1992). Esta

tabela nos fornece parâmetros de condicionamento físico de uma determinada população de trabalho (média) que

deve então ser combinada com algumas variáveis definidas por consenso. A princípio, uma vez aprovado o valor

desta fatoração, e não satisfeita a condição básica CE= 0,40 VO2max, torna-se necessária a definição do chamado

“Work Rest Cycle”, ou o tempo de descanso por ciclo de trabalho (MURREL, 1965, adaptado), que pode ser

calculado pela fórmula:

R = T {W-S(Fn)} K

(eq. 32)

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Onde

R= Tempo de Descanso (pausa) em minutos.

T= Tempo total de trabalho em minutos entre paradas (almoço, café, saída).

W= Consumo médio de energia no trabalho em Kcal/min (tabelas sem os fatores de ajuste).

S = Consumo médio de energia recomendado em Kcal/min (de acordo com as tabelas escolhidas e dos

fatores de atenuação aplicados às mesmas).

Fn = Fatores de Atenuação da condição ideal

K = Constante de proporcionalidade. No caso K= 1,5 Kcal/min

Nota: A variável “S” é um valor atenuado de consumo médio de energia no trabalho em Kcal/min, onde os

fatores de atenuação (F) são multiplicados entre si, e corrigidos em sua intervariabilidade pelo divisor K.

6. Definição do método para Apropriação dos Limites de Fadiga

A construção de uma metodologia deve partir, como o nome diz, de um ou mais conjunto de métodos, que define a

lógica do encaminhamento. O Método RFad não possui estrutura autônoma de funcionamento, dependendo,

portanto, de uma conjunto de técnicas ou métodos analíticos que permitem sua apropriação. O encadeamento das

etapas ou dos diferentes métodos e técnicas envolvidas compõem então a lógica do processo, ou a metodologia geral.

No nosso caso, partimos da definição de oito etapas:

1. Escolha consensual das tabelas, fórmulas e parâmetros;

2. Incorporação dos fatores redutores para consumo de energia, a partir da análise ergonômica e Índices SIC;

3. Definição dos índices e parâmetros de ajuste do VO2max;

4. Cálculo dos limites máximos de metabolização a partir do VO2max;

5. Aplicação dos índices das tabelas na fórmula (Se o CE>x% VO2 Max, conforme tempo de atividade);

6. Incorporação de um Plano de Ação para as oportunidades de melhoria (trade offs);

7. Avaliação do processo a partir do monitoramento dos indicadores de epidemiologia e gestão operacional;

8. Promoção das alterações resultantes de Avaliação Periódica das tabelas.

6.1. Definição das Tabelas e Fórmulas

As tabelas existentes de consumo energético, como a Tabela 4 a seguir, possuem restrições de ordem sintática e

semântica. As restrições sintáticas se devem a sua aplicabilidade. Em particular, os índices são apresentados em

kcal/hora, o que dificulta sua utilização no planejamento, que utiliza tempos fracionados e operações por ciclos, por

isso os dados foram convertidos em kcal/min. É importante também assinalar que a tabela da NR 15 omite dois

índices importantes: o índice de metabolismo basal e o consumo metabólico para posição estática (sem movimento).

Esses dados servem de parâmetro para a comparação em relação a atividades de trabalho que, apesar de sua natureza

operacional, assemelham-se a processos de trabalho estático de natureza administrativa devido a existência de longos

períodos de atenção e controle.

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Tabela 4. Tabela de dispêndio energético em Kcal/min

Atividade Postura básica Kcal/min

Repouso Sentado 1,67

Leve Sentado, movimentos moderados com braço e tronco 2,08

Sentado, movimentos moderados com braço e pernas 2,50

De pé, trabalho leve, em máquina ou bancada. Envolvendo principalmente os braços 2,50

Moderado De pé, trabalho leve, em máquina ou bancada. com alguma movimentação 2,92

Sentado, movimentos vigorosos com braços e pernas 3,00

De pé, trabalho moderado, em máquina ou bancada. com alguma movimentação 3,67

Trabalho moderado de puxar ou empurrar 5,00

Pesado Trabalho intermitente de movimentação de cargas médias 7,33

Trabalho fatigante 9.17

6.2. Incorporação das Variáveis de Conforto e Condicionamento

De acordo com Ästrand & Rodhal (1984), Monod(1994) e McArdle, Katch e Katch (2007), o ser humano tem seu

nível de desempenho numa jornada de trabalho de oito horas limitado a 40% do seu consumo máximo de oxigênio

(VO2max). Assim sendo, não se justifica aplicar as tabelas “puras” sem a devida compensação de fatores

individuais. Na impossibilidade de se tratar essa questão individualmente, trabalhou-se de acordo com o escopo

possível, baseado em uma amostra dos postos de trabalho da fábrica. O VO2max arbitrado foi a média dos valores

estimados para os trabalhadores da fábrica, calculados a partir do questionário de Jackson, A.S. e col (1992),

respondidos pelos funcionários, considerados valores médios para a massa corporal total, a estatura e o IMC.

Portanto, em decorrência desse entendimento, utilizou-se a média de condição aeróbica do grupo avaliado, extraindo-

se o fator de redução caso a caso.

6.3. Aplicação no modelo

A aplicação do modelo segue os passos acima mencionados, quais sejam, o estabelecimento das correspondências

com as tabelas legais, a definição dos índices e parâmetros a partir do VO2 MAX, a definição dos limites máximos

de metabolização e a aplicação na fórmula de Murrel ajustada (Santos & Vidal, 2010). Os postos analisados

relacionam-se às tabelas da NR. 15, para que sejam aplicados os cálculos de VO2 Max e, conseqüentemente, permitir

a aplicação da tabulação SIC e, caso necessário, utilizar a fórmula de cálculo de reposição de fadiga. Os 45 postos

analisados localizaram-se então nas faixas de índices de consumo energético de 2,5 a 3,67 kcal/min, sendo a maioria

de 2,92 kcal/min.

6.3.1. Definição dos índices e parâmetros do VO2 Max

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Para dar seqüência a determinação dos índices de VO2 Máx, foram feitas simulações utilizando-se dados extraídos

do questionário de estimativa de VO2 Máx e aplicando-os sobre a planilha de consumo metabólico (Moreira). Esses

dados definiram então os postos que deveriam passar pela fórmula de Murrell para determinação do Tempo de

reposição de fadiga. Assim sendo, os dados passantes na condição, a princípio, não entrariam na fórmula e não

necessitariam de pausa para um ciclo completo de trabalho (8 horas), como pode ser visto na Tabela 5.

Nesse extrato da planilha de consumo energético foram considerados dados médios dos indivíduos, a partir de uma

faixa etária de maior comprometimento do ponto de vista fisiológico. A utilização de uma classe de operações com

maior esforço (5,0 kcal/min) foi um artifício de cálculo para possibilitar uma situação não-passante para homens, já

que em situações reais tais circunstâncias não existem. Devemos ressalvar que a utilização de dados médios para

definição dos limites tende à obtenção de resultados contraditórios. Como o cálculo emprega médias ponderadas para

as diferentes variáveis da fórmula de cálculo, isso acaba refletindo nos resultados, já que a progressão dos valores

não se mantém linear ao se fazer variar somente alguns fatores.

Tabela 5. Extrato de Resultados de Aplicação do VO2 Max.

Legendas: IMC = Indice de Massa Corporal MCT = Massa Corporal Total (Kg)

IAF = Índice de Atividade Física VO2Max: Volume Maximo de Oxigênio PAM: Potência Aeróbica Máxima

Os resultados do questionário do IAF, aplicado pela equipe de ergonomia, apresentaram o valor médio de 3, tanto

para os homens quanto para as mulheres. Esta média foi o índice considerado para os trabalhadores. A idade média

de 45 anos serviu de referencial para os cálculos. Foram feitas estimativas para homens e mulheres separadamente.

Como a norma NR-15, utilizada no Brasil para efeito de determinação de níveis de salubridade, trabalha com

quilocalorias, os resultados das equações de Jackson (1992) para o VO2max, originalmente em ml.kg-1.min-1, foram

convertidos para kcal.kg-1.min-1, expressando a Potência Aeróbica Máxima (PAM) dos funcionários.

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Depois, em função da duração média da jornada (nove horas), foi identificado, por meio da equação de Moreira

(2010), o percentual máximo que pode ser suportado em trabalho contínuo nessa jornada. Assim, ficaram

estabelecidos os referenciais para selecionar os casos em que deveria haver, ou não, pausas no trabalho. A partir daí,

as estimativas de gasto energético médio em cada posto foram baseadas na NR-15, e os resultados foram divididos

pela massa corporal para a obtenção de valores em kcal.kg-1.min-1 e comparação com os referenciais já

estabelecidos.

6.3.2. Considerações Adicionais quanto aos limites máximos do VO2 Max

O referencial utilizado para a massa corporal é um valor médio encontrado na população de trabalhadores, calculado

a partir do banco de dados do setor médico. A título de exemplo, pode-se supor que fosse encontrada uma média de

80,1kg. Como conseqüência da estimação do gasto energético, será calculado o intervalo de 95% de confiança e o

raciocínio será desenvolvido considerando este referencial. O intervalo de 95% de confiança do custo energético

laboral médio estimado entre 0,4111 e 0,4319 kj.kg-1.min-1 (aproximadamente 0,098 e 0,1kcal.kg-1.min-1) para

uma massa corporal de 80,1kg equivale a um consumo de oxigênio entre 1,6 e 1,7 litros por minuto, ou uma potência

aeróbica entre 7 e 7,4W/kg.

Durante uma jornada de oito horas, a solicitação não deveria representar mais de 40% do VO2max dos trabalhadores.

Isto significa que para suportar rotineiramente um trabalho nessa duração e com essa carga, o ideal seria que os

funcionários possuíssem uma potência aeróbica máxima (PAM) entre 17,5 e 18,5W/kg, o que corresponde a um

consumo máximo de oxigênio entre 50 e 53ml. kg-1.min-1. Assim, tendo em vista a realidade constatada no

presente estudo, em 2010, o tempo máximo recomendado de trabalho contínuo durante as jornadas seria de 463

minutos, com um repouso de 17 minutos de duração. Portanto, para garantir a manutenção do nível de desempenho

esperado, os trabalhadores deveriam, a cada 7,7 horas de trabalho contínuo, descansar por 0,3 horas, o que ocorreria

ao longo da jornada (pausas concedidas, micropausas, etc.).

6.3.3. Aplicação dos índices das diferentes tabelas na fórmula de Murrell

Se o índice VO2 Max encontrado for maior que percentual recomendado por tempo na atividade conforme a tabela,

utilizamos, na seqüência de aplicação do método RFad, a fórmula de compensação, que retorna o tempo mínimo de

descanso ou repouso (rest) para cada ciclo de trabalho. É importante enfatizar que devemos descontar os tempos de

máquina dos valores encontrados, pausas concedidas e almoço. Da mesma forma, o ciclo final do turno – quando o

trabalho se encerra para cada dia – deve ser desprezado para efeito de compensação, já que não haverá outro ciclo

após o tempo de repouso. Para exemplificar tomemos um ciclo contínuo de 240 minutos, imediatamente antes da

parada de almoço. A atividade em questão consiste das seguintes características:

Atividade: Trabalho em pé, bancada, moderado, pouca movimentação: 3,67 Kcal/min

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Temperatura Efetiva: 26 IBUTG: Fator: 1,0.

Condição Aeróbica (Constante Populacional Média): 4 : Fator: 0,97.

Condição Física Média: Nível 0,25 a 0,30: Fator: 0,98.

Condição Ergonômica: SIC: Moderado: Fator: 1,0.

Aplicando na fórmula de Murrell (1965), ajustada (MOREIRA et al., 2010), temos:

A unidade de medida kcal/min do numerador anula-se com o denominador e, portanto, continuando o processo,

obtemos:

O índice SIC, que constitui-se em um fator em si, também irá influir nos resultados. Isso pode ser explicado não

somente pelo fato do mesmo constituir-se em um fator de atenuação – ou um multiplicador da fórmula – como

também por estar diretamente relacionado às condições de trabalho em cada centro de custo.

Conclusão

O modelo de avaliação de fadiga envolve a necessidade de aplicação de um conjunto de formulas e cálculos. Como

todo e qualquer construto matemático o modelo é uma aproximação da realidade com um nível de precisão suficiente

para auxiliar decisões. No caso do modelo, há uma orientação assumida para parâmetros de centralidade (medias,

equilíbrios e outros pontos de convergência clássica). Uma recomendação é a de evoluir de uma referência central

para uma compleição mais customizada, adequada a parâmetros individuais. Porém, deve-se avaliar a relação entre o

custo desta precisão e o impacto da mesma. Em nosso entender este custo atual não é interessante, até porque

constatamos os tempos normais de repouso mais que suficientes para a recuperação fisiológica.

No entanto cabe ressaltar que a pronta aplicabilidade do método com uso de seus resultados em varias ações de

planejamento, sem a produção de distorções que teriam resultado em iminente conflito trabalhista pode ser

considerado como uma validação em primeira ordem. O calculo de reposição de fadiga, mediante o uso da fórmula

RFad teve até um efeito interessante por produzir resultados bastante próximos aos valores estabelecidos de forma

R = T {W-S(Fn)}

K

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puramente estimativa, com base na experiência dos participante. Com isso tais parâmetros aumentaram seu grau de

aderência ao planejamento industrial, e vice-versa.

Ressalvamos a natureza resiliente das ferramentas utilizadas, sobretudo o SIC, nos permite inferir impactos

cognitivos e organizacionais presentes nas diversas operações. Isso só é possível pela apropriação dos princípios da

Ergonomia da Atividade e da aplicação da metodologia de Análise Ergonômica do Trabalho, adaptada naturalmente

às circunstâncias. Outrossim, a estrutura fatorial possibilita a introdução de novos atenuadores capazes de

movimentar a avaliação num sentido ou em outro. Ficou patente que a questão de gênero pode ser um diferencial, já

que a maioria das situações não passantes ocorreu com mulheres. Neste sentido, e com o previsível aumento da

proporção de mulheres nos postos de trabalho industriais, questões da cidadania tendem a criar obrigações de

adaptações de postos a populações de gêneros, como já acontece atualmente com os portadores de necessidades

especiais.

REFERÊNCIAS

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