Sociologia Política e Processos Macro-históricos

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    DOSSI

    Sociologia poltica e processos macro-histricos

    ELISA P. REIS*

    * Universidade Federal do Rio de Janeiro (Brasil)

    Resumo

    Neste artigo, parto de uma breve exposio sobre algumas das muitas ma-neiras de se fazer sociologia poltica, para ilustrar a diversidade da rea. Em se-guida, comento uma dessas vrias abordagens - aquela que privilegia as anlisesmacro-histricas, salientando a preferncia dessa perspectiva pela observao de

    grandes processos de transformao. Por fim, adotando essa mesma opo, dis-cuto algumas das transformaes em curso para sugerir que elas colocam desafiostericos e metodolgicos considerveis para a sociologia poltica. Reconhecendoque os desafios em questo se colocam para alm dela e, efetivamente, interpe-lam todas as cincias sociais, argumento que a justificativa para meu exerccio aconvico de que a sociologia poltica macro histrica especializao vocacio-nada a refletir sobre tais transformaes e a lanar luz sobre a obsolescncia decertos esquemas analticos consagrados pela tradio sociolgica.

    Palavras-chave: Era global. Solidariedade social. Igualdade e diferena. Transfor-maes ideolgico-culturais.

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    C

    Political Sociology and Macro-historical processes

    Abstract

    The article offers, initially, a brief comment on the many definitions of politicalsociology and their diverse approaches. Next, it focuses on one of such perspecti-ves, the one that confers priority to macro-historical analysis, calling attention to itspreference for long term processes of transformation. Finally, adopting this sameanalytical preference, it discusses some of the ongoing great changes, suggestingthat they pose big theoretical and methodological challenges to political sociology.The author explicitly recognizes that, actually, the challenges in question address allsocial sciences, but argues that macro-historical political sociology is the branch ofsociology that is perfectly tailored to reflect upon such transformations and to throwlights onto the obsolescence of certain long established analytical models.

    Keywords: Global era. Social solidarity. Equality and difference. Cultural-ideologi-cal transformations.

    1. Introduo

    ircunscrever o universo da sociologia poltica no ta-refa fcil. Como recortar uma subrea to vasta e diver-sificada? O simples exerccio de identificar os diferentesentendimentos do que esse ramo da sociologia, almde sua iniludvel superposio com especializaes da

    cincia poltica, constituiria matria para um longo artigo. Poderamosfalar de uma especialidade no singular, ou seria mais pertinente falar dasdistintas concepes do que fazer sociologia poltica como especializa-

    es paralelas? Nesse artigo opto por privilegiar a reflexo sobre uma dasconcepes de sociologia poltica, aquela que privilegia a anlise macrohistrica. Essa vertente tem longa tradio nas cincias sociais e, comocomento mais frente, na obra de nossos clssicos ela quase se confunde

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    com a prpria sociologia. Antes, porm, apenas para ilustrar a diversidadeda rea e deixar clara minha opo por explorar apenas uma de suas va-riantes, menciono brevemente nessa introduo algumas das concepesmais difundidas de sociologia poltica.

    Na segunda parte do texto, procedo a uma discusso sobre a socio-

    logia poltica de orientao macro histrica, salientando sua prefernciapor observar grandes processos de transformao. Finalmente, praticandoum pouco da tradio que escolhi abordar, discuto algumas das trans-formaes em curso para sugerir que elas colocam desafios tericos emetodolgicos considerveis para a sociologia poltica. Na verdade, osdesafios em questo se colocam para alm dela, j que interpelam todasas cincias sociais. Minha justificativa para esse exerccio a convicode que a sociologia poltica macro histrica especializao vocacionadaa refletir sobre tais transformaes e a lanar luz sobre a obsolescncia decertos esquemas analticos consagrados pela tradio sociolgica.

    Partindo de uma situao hipottica, suponhamos que uma pessoaalheia ao ambiente acadmico, ao ler um jornal tivesse ocasionalmente des-pertada a curiosidade de saber o que sociologia poltica. Como buscariase informar? razovel supor que ela consultaria a Wikipedia. Se o fizesse,encontraria a seguintes observaes: !Sociologia poltica o ramo da socio-logia que reflete sobre o poder, o Estado e o dever (sic) poltico. o estudodas bases sociais da poltica. A Sociologia ajuda a entender a poltica em si".

    Se insatisfeita diante das vagas indicaes, a leitora hipottica insis-tisse em sua busca consultando na web outras fontes, poderia descobrirento em stios de universidades, um grande nmero de programas de dis-

    ciplinas designadas como sociologia poltica. Ao fazer esse exerccio ela sedepararia com uma grande variedade de temas e linhas de pesquisa quecertamente se prestam anlise da sociologia poltica, mas que igualmen-te servem prtica de diversas outras especializaes da sociologia ou da

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    cincia poltica. Nada de errado nisso, pois afinal o que define uma reade especializao o ngulo adotado, ou em outras palavras as perguntasque ela formula sobre temas e problemas que podem ser compartilhadoscom reas concorrentes ou complementares. Mesmo se nos limitarmos aouniverso de diversas maneiras de se recortar a sociologia poltica, embora

    as relaes de poder estejam no centro das atenes de todas elas, formasmuito distintas de analisar essas relaes so privilegiadas.

    Assim, por exemplo, a anlise do comportamento poltico, uma dasgrandes linhas da cincia poltica, constitui tambm uma das principais ver-tentes da sociologia poltica. Se ambas podem, por exemplo, se dedicar anlise de aspectos polticos da cultura de uma populao, compartilhandoalguns interesses de pesquisa, tambm verdade que cada uma delas man-tm sua especificidade quanto ao foco de anlise escolhido. tambm ro-tineiro encontrar socilogos e cientistas polticos buscando identificar as ba-ses sociais do eleitorado de partidos polticos, mantendo uns e outros suas

    respectivas referncias tericas, e respondendo a questes distintas. Emresumo, tanto cientistas polticos como socilogos podem estar interessadosem identificar que variveis explicam preferncias eleitorais, mas em geralas perguntas bsicas por trs dessa preocupao so bastante diferentes.

    Outra variante da sociologia poltica bastante difundida no Brasile em outros pases da Amrica Latina envolve a anlise de conjunturaspassadas ou presentes. Nesse caso, os pesquisadores conjugam anlisesde variveis econmicas, polticas e sociais para interpretar momentos es-pecficos e muitas vezes tambm explorar cenrios futuros. Nem sempre fcil distinguir aqui entre o socilogo e o cientista poltico, mas, sim-plesmente para tipificar, podemos salientar que as anlises dos cientistas

    polticos tendem a privilegiar atores e instituies, enquanto os socilogosda poltica tendem a enfatizar estruturas e processos estruturais.

    A diferenciao entre abordagens torna-se ainda mais difcil se ob-servarmos que um mesmo objeto de anlise pode ser enquadrado tanto

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    na perspectiva do comportamento poltico como naquela da interpreta-o de uma dada conjuntura. Assim, por exemplo, anlises sobre mo-vimentos sociais e outras formas de participao poltica podem tantoprivilegiar o comportamento poltico dos atores envolvidos, como centrarateno no papel dos movimentos sociais em uma dada conjuntura.

    Tambm constitui recorte legtimo como sociologia poltica a anli-se de polticas sociais. A formulao, implementao e resultados dessaspolticas constituem um campo no qual anlises de processos decisrios,determinantes polticos, e implicaes sociais atraem igualmente prati-cantes da sociologia poltica e da cincia poltica.

    Distinta das perspectivas de anlise poltico sociolgica, que privi-legiam comportamento poltico e anlises de conjuntura acima mencio-nadas, a abordagem que privilegia a anlise de processos histricos,cujo propsito ltimo explicar ou interpretar transformaes de longadurao. Tambm essa sociologia poltica de vis macro histrico mantm

    fronteiras hbridas com a cincia poltica, particularmente com a subreadessa ltima conhecida como economia poltica. Entre os que escolhemessa perspectiva, frequente a preocupao explcita em se situar nos de-bates tericos, reiterando a interdependncia entre a anlise de processoshistrico-concretos e a elaborao terica. Lembro, por exemplo, o tra-balho de Theda Skocpol (1979) que usa a induo histrica para proporuma teoria da revoluo, ou Michael Mann (1986) quando se debruasobre a histria da humanidade para explicar as origens do poder.

    Nessa terceira perspectiva, poderamos mencionar, no caso do Brasil,anlises como as empreendidas em Cardoso (1962) sobre o capitalismo no

    sul do pas, Fernandes (1975) sobre nossa revoluo burguesa, WerneckVianna (1976) sobre a formao do mercado de trabalho, Schwartzman(1982) sobre os obstculos que a democracia liberal enfrentava no pas, etantos outros. Certamente tnhamos, anteriormente a essas anlises, uma

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    tradio de grandes interpretaes histricas que nos inspiravam em maiorou menor grau. Lembro aqui obras que se tornaram clssicas entre nscomo as de Buarque de Hollanda (1936), Prado Jr. (1943), Faoro (1958),entre outros. Os trabalhos desses precursores se distinguem por um fortevis histrico, mas no constituem uma sociologia poltica no sentido mais

    cannico que falamos hoje de uma especializao sociolgica. De qualquerforma, entre eles e os primeiros trabalhos de sociologia poltica macro his-trica no Brasil h uma clara afinidade temtica qual seja a complexa inte-rao entre o Estado e os interesses sociais em disputa. Tambm possvelobservar nessa tradio de anlise a tendncia a tomar o Estado nacionalcomo um ator estratgico, diferentemente de perspectivas tericas que otomam primariamente como resultado das disputas sociais.

    No resta dvida de que, como qualquer outra especializao dis-ciplinar ou subdisciplinar, a especificidade da sociologia poltica ou a desuas diferentes concepes reflete o grau e o contexto do processo de ins-

    titucionalizao das cincias sociais. Bastaria tomar em conta a produobrasileira de meados do sculo passado para concluir que, na maioria doscasos, a distino entre sociologia poltica e cincia poltica era pratica-mente impossvel.

    Naturalmente os exemplos poderiam ser muitos no caso de qual-quer das grandes vertentes acima mencionadas, assim como de outrastantas que poderiam ser mencionadas. Aqui, porm, conforme salienta-do, busco apenas ilustrar as superposies e diferenciaes mais recorren-tes no mbito da sociologia poltica para deixar claro o carter limitado earbitrrio do recorte empreendido nas pginas seguintes.

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    2. Histria e reflexo sociolgica

    Os processos histricos em curso fornecem sempre matria-primapara a reflexo sociolgica. No caso em particular da sociologia poltica,o esforo de captar o sentido geral das grandes transformaes sociais e,

    em alguns casos, at mesmo a pretenso de influenciar o rumo da histriaso caractersticas distintivas. De fato, como plenamente reconhecido,a sociologia surgiu como reflexo crtica sobre a sociedade afetada pelasgrandes transformaes que marcaram a afirmao da era moderna. Nes-se sentido, podemos dizer que ela era uma sociologia poltica. Refletindosobre a vida coletiva ela identificava os problemas do presente, apontavatendncias, e conferia grande relevncia dimenso poder que est sem-pre presente nas relaes sociais.

    Assim, no ambiente acadmico, h consenso em que existe, de certaforma, uma sociologia poltica em Marx, em Tocqueville, em Weber. Em

    todos eles, tanto a anlise das caractersticas positivas e negativas das trans-formaes sociais em curso como a identificao das perspectivas para ofuturo conferem papel de destaque poltica para explicar seja a manuten-o ou a transformao dostatus quo. Mesmo Durkheim, com frequnciacaracterizado como socilogo que reduz o poder poltico a uma engenha-ria social, no nega essa vocao da sociologia clssica, pois, se levarmosa frente seu raciocnio, os profissionais que desenhariam as tcnicas paraorganizar a sociedade, com vistas a minimizar a anomia e preservar a so-lidariedade, seriam portadores de uma forma especfica de poder, j quecompetiria a eles planejar e intervir para corrigir erros e aperfeioar acertos.

    tambm amplamente observado que os clssicos de nossa disci-

    plina compartilhavam uma percepo generalizante, pois viam as trans-formaes em curso na Europa Ocidental como expresses de processosuniversais os quais, em longo prazo, afetariam toda a humanidade. Capita-lismo para Marx, igualdade para de Tocqueville, racionalizao para Weber,

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    diferenciao de funes para Durkheim - cada um desses fenmenos ,naturalmente, observado no contexto europeu, mas todos so identificadoscomo tendncias mais gerais. Esse vis de generalizao a partir da expe-rincia da Europa Ocidental tem sido objeto de debates e crticas, essasmesmas quase sempre exerccios de sociologia poltica. Na verdade, no se

    nega que as transformaes discutidas pelos clssicos tenham efetivamenteimpactado outras sociedades. O que, sim, se debate o uso feito desses ede outros processos que tiveram lugar na Europa, e mais tarde nos EstadosUnidos, para se construir modelos de etapas e sequencias que se repetiriamem outras sociedades. Lembro, nesse sentido, a crescente literatura sobremodernidades mltiplas (Eisenstadt, 1966; 2000), processos civilizacionais(Arjomand e Tiryakian, 2004; Arnason, Eisenstadt e Wittrock, 2005), estu-dos ps-coloniais e teorias do Sul Global (Arjomand e Reis, 2013).

    tambm digno de nota que, por um lado, os analistas clssicos ten-dem a perceber a fuso ideolgica entre o Estado e a nao como um pro-

    cesso evolutivo quase natural, da a suposio explcita ou implcita de queo que ocorria na Europa antecipava o desenvolvimento de outros pases.Por outro lado, muitos deles estavam preocupados em contribuir com esseprocesso, sugerindo, portanto, que a atuao humana podia influenci-lo.No contexto europeu, os clssicos aqui lembrados refletiam sobre a socie-dade tendo como referncia imediata os estados nacionais em processo deconsolidao. Em certo sentido, essa reflexo fazia parte do prprio pro-cesso de construo do Estado-nao. Ao proceder sua interpretao, oanalista elaborava um repertrio que dava sentido experincia em curso.

    Assim, a sociologia poltica de Tocqueville exercita a comparao en-

    tre Frana e Estados Unidos (Tocqueville, 1998 e 2000) e entre Frana eInglaterra (Tocqueville, 2009) tendo sempre em mira os prognsticos pol-ticos franceses. Tambm fcil detectar a preocupao de Weber com asperspectivas do jovem Estado nacional alemo. Embora ele se aplique em

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    manter parte da anlise sociolgica seu ideal nacionalista, Weber explicitaclaramente a preocupao em preservar a nao ao manifestar preocupa-o com a crescente incorporao de trabalhadores poloneses na agricultu-ra da Alemanha oriental (Weber, 1967). Situada no contexto original ondese consolida o amlgama cultural entre o Estado e a nao que d origem

    aos estados nacionais, a sociologia Europeia , ela mesma, expresso e re-flexo intelectual em torno desse fenmeno histrico (Reis, 1998).

    O exemplo de um clssico contemporneo, Raymond Aron, que sedefiniu como um espectador engajado, ilustrativo de que tende a per-sistir um compromisso poltico-moral explicito na tradio da sociologiapoltica de orientao histrica (Aron, 1982). Mesmo no caso da aca-demia norte-americana, geralmente refratria politizao, no difcilcaptar essa caracterstica da sociologia poltica. Exemplar nesse sentido a anlise de Margaret Somers que invoca a tragdia social desencadeadapelo furaco Katrina para refletir criticamente sobre a cidadania (Somers,

    2008). De formas variadas, praticantes da sociologia poltica com frequn-cia tornam explcito seu vis normativo.

    No caso dos pases perifricos, esse compromisso por parte dosanalistas torna-se ainda mais visvel. Na esteira do processo de descolo-nizao que tem lugar depois da segunda guerra, a sociologia se perce-bia comprometida com o processo de construo dos estados nacionaisemergentes. A sociologia do desenvolvimento, que ganhou tanto espaono ento chamado Terceiro Mundo, era de fato uma sociologia poltica,preocupada em entender as razes do atraso e propor estratgias parasuperar o subdesenvolvimento. Simplesmente para exemplificar, lembro

    aqui Eisenstadt(1966), Cardoso e Faletto (1969); e Gunder Frank (1967).No Brasil, como tambm em outros pases Latino Americanos, essavocao poltica da sociologia mais precoce, dado que o desafio deconstruir o Estado nacional tem lugar mais cedo e obedece a uma din-

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    mica diversa. Assim, entre ns, a perspectiva poltica na interpretaodos processos sociais transparece com muita clareza nos ensaios pioneirosdos autores clssicos acima mencionados. Cada um deles, sua moda,identifica problemas e pensa em alternativas para superar entraves a umaorganizao mais satisfatria da sociedade. Mais ainda, a possibilidade de

    alterar tendncias e aperfeioar nossa sociedade se configura em cada umdesses autores como uma proposta poltica. Mais tarde, com a institucio-nalizao inicial da sociologia, a produo se torna menos ensasta, mas amarca da sociologia poltica permanece claramente em obras que, duran-te muito tempo, constituram referencia cannica na literatura brasileira.

    Como bem o observou Peirano (1991) ao analisar a obra de alguns no-tveis cientistas sociais brasileiros ativos j na segunda metade do sculo XX,ao mesmo tempo em que esses autores buscavam compreender aspectosdiversos de nossa sociedade, eles se tornavam participantes do projeto deconstruo nacional no pas. verdade que o prprio avano desse projeto

    viria colocar novas questes para a sociologia poltica, mas tambm outrosfatores redefiniriam o escopo e as questes-chave da sociologia poltica. Porum lado, internamente, a progressiva institucionalizao das cincias sociaisbrasileiras estabelecia fragmentaes disciplinares, novas especializaes, enovos protocolos de pesquisa. Por outro, a acelerao dos processos globaisintroduziu novos desafios tericos e epistemolgicos.

    O processo de institucionalizao tornou cada vez mais ntida a fron-teira anteriormente porosa entre a sociologia e a cincia poltica. Almdisso, no interior da sociologia, ele propiciou as condies para o surgi-mento de novas especializaes que, em certa medida, dividiram entre

    si temas e questes de pesquisa anteriormente englobadas na agenda dasociologia poltica. Para completar o quadro, o volume de informaeshoje disponveis, os avanos no rigor metodolgico e a prpria valorizaoda especializao na cultura acadmica tornaram mais rarefeita a produo

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    de interpretaes poltico sociolgicas de carter macro nacional com queestvamos acostumados. Contudo, com caractersticas distintas, persiste abusca de interpretaes mais abrangentes sobre mudanas em curso.

    3. Sociologia poltica e processos globaisAs profundas transformaes em curso, frequentemente sintetizadas

    no linguajar comum como !globalizao", envolvem processos mltiplose, algumas vezes, at mesmo contraditrios. De qualquer forma, mesmoaqueles para quem os processos globais no constituem algo novo, e sim acontinuidade de uma dinmica multissecular, tendem a concordar que oescopo e o ritmo das mudanas em curso implicam rupturas e incertezas.Para a sociologia poltica de cunho macro-histrico, o desafio oferecergrandes interpretaes sobre os processos em curso. Esforos para captaro sentido e as implicaes das transformaes correntes revolvem, em

    grande parte, em torno da relao entre elas e a dinmica moderna quedeu origem inclusive s cincias sociais como forma especfica de co-nhecimento. Sintomaticamente, essas discusses se referem hoje !mo-dernidade" e no mais modernizao, sugerindo, talvez, que o carterexpansivo incorporado pelo conceito teria se esgotado. Na verdade, esse um dos pontos polmicos que alimentam a discusso sociolgica sobreo sentido e as implicaes das mudanas correntes. Para alguns, no setrata efetivamente de um esgotamento, mas de uma nova forma de dina-mismo: fala-se de segunda modernidade, modernidade tardia, alta mo-dernidade e outras expresses sugestivas de inovaes sem ruptura com

    a era moderna que se tornaram moeda corrente do lxico da sociologia(Beck, 2001; Giddens, 1991; Robertson, 2002).Para outros, porm, a modernizao teria esgotado suas potenciali-

    dades, dando lugar a uma nova viso de mundo e novas dinmicas sociais.

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    Mas, interessante ressaltar, os autores afinados com a sociologia polticatendem a recusar um alinhamento com as correntes filosficas ps-moder-nas. Martin Albrow (1977), por exemplo, insiste em que a era modernachegou ao fim e vivemos agora algo completamente novo, designado porele como a era global. Deixa claro, porm, que no h razo para ver nisso

    o esgotamento do dinamismo da histria. Possibilidades e potencialidadessociais devem ser consideradas fora da moldura do moderno, donde a ne-cessidade de descartar, inclusive, qualquer associao com o ps-moderno.

    O debate em questo est longe de ser encerrado e certamentemerece, ele prprio, anlise cuidadosa que identifique os principais argu-mentos em disputa e examine tambm o poder crtico e interpretativo dasposies em disputa. Entretanto, essa no a tarefa que me proponho.Nas pginas que se seguem, concentro-me na discusso de trs grandestransformaes culturais em curso, mudanas essas que introduzem gran-des desafios para as cincias sociais em geral e para a sociologia poltica

    em particular. Tais mudanas repercutem, em maior ou menor grau, emmuitas interpretaes em disputa que acabo de comentar, mas elas noso o foco dessa discusso. Tratam-se de mudanas que dizem respeito maneira como percebemos o mundo e, nesse sentido, podemos nosreferir a elas como mudanas ideolgico-culturais. Elas dizem respeito concepo das relaes dos humanos com a natureza, percepo dosrecursos de organizao social existentes, e maneira como igualdade,desigualdade e diferena se relacionam.

    Em conjunto, essas trs mudanas ideolgico-culturais corroboram aideia de uma ruptura radical com a viso de mundo anteriormente vigente

    e devem ser vistas tanto como produto da transformao histrica em pro-cesso, como elas prprias agentes de transformao. Em outras palavras, taismudanas de percepo constituem causa e efeito de transformaes nasprticas dos atores. A justificativa para fazer delas objeto de uma discusso

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    sobre sociologia poltica a constatao de que elas tm impacto diretosobre a maneira como o poder poltico e os interesses sociais se articulam.

    Se for verdade que o foco nas mudanas culturais no suficientepara elaborar uma interpretao satisfatria sobre o presente e as pers-pectivas do futuro, ignorar essa dimenso de anlise certamente torna

    mais opaco o cenrio. Nesse sentido, as observaes que se seguem tma pretenso de oferecer elementos preliminares para uma reflexo sobrenossas prprias lentes de trabalho.

    Talvez a transformao cultural que impacta mais decisivamente aperspectiva analtica macro histrica seja aquela que diz respeito manei-ra como gradualmente vem se expandindo uma conscincia da naturezacomo algo a ser preservado. Essa percepo substitui a viso da naturezacomo algo a ser conquistado, que no passado tinha substitudo a visotradicional do meio ambiente como algo a ser temido. De fato, olhandoa histria da humanidade, vemos que no mundo pr-moderno as foras

    da natureza eram percebidas como foras indomveis, ou mesmo hostis,frente s quais a humanidade lutava para se proteger buscando abrigo,praticando magia, invocando proteo divina. A institucionalizao deuma nova crena segundo a qual a natureza devia ser objeto de conquistae dominao graas ao uso da tcnica e da cincia marca o advento daera moderna. O novo ambiente cultural instaura a f na razo e a crenano poder inesgotvel da inveno tecnolgica. A ideia de desenvolvi-mento contnuo, ou seja, a convico de que o mundo pode avanarcontinuamente substituiu a noo de que ele estava condenado a ciclosnaturais de prosperidade e decadncia.

    Essa crena na possibilidade de constante progresso se tornou com otempo uma segunda natureza. Ante o imenso progresso material baseadona tecnologia, a ideia do desenvolvimento como o resultado natural dainterveno humana sobre recursos naturais ilimitados tornou-se soberana.

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    No apenas na Europa Ocidental que se tornara hegemnica, mas tam-bm na periferia, difundiu-se a crena de que o progresso, ou desenvolvi-mento, o curso natural da histria, enquanto a decadncia ou a estagna-o constituiriam anomalias, distores que deveriam ser corrigidas comrecurso cincia, a tecnologia, e a determinao poltica.

    Com salientei acima, o que observamos agora a substituio gradu-al dessa postura !conquistadora" frente natureza, por outra !protetora"que v os recursos naturais como um bem a ser cuidado. Sem abrir mointeiramente da crena otimista de que o desenvolvimento pode e devepersistir, os humanos passam mais e mais a perceber que ser necessriocuidar da natureza e no mais conquist-la, sob pena de estancamentodas possibilidades de crescimento, e mesmo ameaa sobrevivncia. Apreocupao com a exausto dos recursos e a busca de solues que as-segurem crescimento com sustentabilidade constituem a expresso maisdifundida dessa nova viso de mundo. Entretanto, embora a passagem de

    uma postura agressiva para outra de carter protecionista tenha avanadosignificativamente nas ltimas dcadas, certamente essa ltima encontrafortes resistncias estando longe de ser dominante.

    Os conflitos entre a viso exploradora e a protecionista se manifes-tam em diferentes contextos, de vrias maneiras, e com consequncias di-versas. Os interesses competitivos que se defrontam nessa disputa, assimcomo as transformaes objetivas nas condies e processos produtivos semultiplicam nos planos dos atores, das instituies, dos governos. Tensese contradies incidem de forma inexorvel sobre a sociedade, trazendograndes incertezas e colocando novas questes para as cincias sociais. Paraa sociologia poltica em particular, as novas equaes culturais e materiais

    colocam o desafio de interpretar as configuraes de poder que emergemno novo cenrio mundial e explorar suas possveis evolues.

    A segunda mudana ideolgico-cultural que assistimos no presenteenvolve a incluso da prpria sociedade como repositrio de um tipo de

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    recurso de organizao especfico. Tal incluso necessariamente substituia percepo dicotmica, at h pouco vigente, quanto aos recursos b-sicos de organizao social existentes, por uma tricotomia. Discutindo aconformao dos modernos estados nacionais, estvamos acostumados apensar que as sociedades se estruturam atravs de combinaes variveis

    de autoridade e interesses. Nessa viso, a solidariedade era percebidacomo diluda na autoridade atravs do pertencimento a uma comunidadenacional, e no mercado atravs do compartilhamento de interesses entrevendedores e compradores. Assim, a partir da afirmao do processo deformao e consolidao dos estados,nacionais, as premissas que orien-taram a reflexo social viam na articulao varivel entre autoridade einteresse os dois princpios dinmicos de coordenao da vida em socie-dade (Reis, 1998). Empiricamente, sociedades nacionais passaram as serdistinguidas com base em seus usos variveis de recursos de autoridade(Estado) e recursos de mercado (interesse).

    Nas ltimas dcadas do sculo XX, mais e mais vimos aparecer refe-rncias solidariedade como um terceiro tipo de recurso. No mais dilu-da na identificao nacional ou nos interesses materiais, a solidariedadeaparece agora nas anlises da sociologia poltica como uma dimensoanaltica prpria, como algo que tem caractersticas distintivas. Uma dasprimeiras indicaes de que nossa percepo mudava aparece no res-gate do conceito de sociedade civil. Como diversos autores observaram,o conceito, que tinha praticamente cado em desuso, volta a ser ampla-mente usado. No mbito emprico, foi exemplo claro disso o movimentopolons Solidariedade que clamava por uma alternativa aos recursos deautoridade. Tambm na Amrica Latina os movimentos sociais ativos no

    processo de democratizao clamavam por antdotos tanto ao Estado au-toritrio quanto ao capitalismo selvagem.

    No ambiente acadmico, o livro de Cohen e Arato (1994) que res-gata o conceito gramsciano de sociedade civil exerceu enorme influncia.

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    Mas, talvez, quem de forma mais clara tenha sinalizado que a solidarie-dade passa a ser percebida como um recurso de anlise especfico tenhasido Wolfe (1991). Analisando a organizao social nos Estados Unidos,no Japo e na Escandinvia, ele concluiu que nem o predomnio do Es-tado, nem o do mercado respondiam adequadamente s necessidades

    sociais, sugerindo ento que um terceiro tipo de recurso, a solidariedadesocial, poderia suprir as deficincias dos outros dois. Wolfe no ignoraque esses trs princpios de organizao sempre se combinam, mas, parafins heursticos, aponta os Estados Unidos e o Japo como tipos ideais desociedades que conferem prioridade respectivamente ao mercado e aoEstado. E v as iniciativas voluntrias que observou nos pases escandina-vos como indicativas da necessidade de suprir as crescentes deficinciasde ambos, Estado e mercado, para responder s necessidades sociais.

    Finalmente, a terceira das grandes mudanas culturais que mencioneidiz respeito percepo social relativa igualdade, desigualdade e dife-

    rena. amplamente reconhecido que o valor da igualdade constitui umdos pilares da modernidade ocidental. No processo de consolidao doEstado-nao como um amlgama ideolgico de autoridade e lealdade, aigualdade constituiu elemento central subjacente institucionalizao domoderno status de cidadania. Rejeitando a crena na existncia de dife-renas naturais entre as pessoas, que no mundo feudal justificava as rgidashierarquias sociais, a cultura individualista moderna redefiniu o oposto de!igual" como !desigual" e no mais como !diferente" (Dumont, 1977).

    No h como negar o impacto revolucionrio da ideologia igualit-ria que substitui a viso da sociedade como naturalmente estratificada.

    Em um movimento crescente, o valor da igualdade ganhou o mundo.Ele inspirou movimentos nacionalistas por independncia, demandas porcidadania, e polticas redistributivas nos mais variados contextos. Tambmno se pode negar que a ideologia igualitria continua desempenhando

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    um papel crucial na promoo da justia social. Entretanto, essa defini-o ideolgica da igualdade como o contrrio de desigual teve custos aoofuscar a noo de diferena e suas consequncias sociais. No processode construo dos estados nacionais, a igualdade dos co-nacionais vis---vis o Estado suprimiu identidades estabelecidas de longa data. Para

    serem reconhecidas como iguais, as pessoas no podiam ser pensadascomo diferentes entre si. O compartilhamento da cidadania os tornavaiguais entre si e diferentes dos no cidados. O processo de moderniza-o Europeu que ensejou essa mudana de percepo foi lento e gradual,embora raramente nos lembremos disso. Na histria mais recente, quan-do olhamos, por exemplo, para o processo de descolonizao na frica,a artificialidade da igualdade que ignora a diferena se torna flagrante esuas consequncias muitas vezes trgicas.

    A supresso da noo de diferena como dimenso relevante, e porvezes at a confuso entre diferena e desigualdade, teve srias consequ-

    ncias tericas e empricas. Hoje, contudo, a ideia do reconhecimento dadiferena como parte dos processos globais crescentemente tida comoum argumento legtimo e como condio necessria para se afirmar a igual-dade. Para a anlise que me interessa aqui, o ponto importante a salientar a novidade histrica compreendida na coexistncia possvel da igualdadee da diferena como opostos de desigualdade. As mudanas culturais queexperimentamos hoje sugerem que, em vez de reprimir a igualdade, o re-conhecimento da diferena pode ser uma condio necessria, emborano suficiente, para afirm-la (Benhabib, 2002; Fraser, 1995).

    Retirando do armrio as diferenas que contriburam de longa datapara manter desigualdades profundas e persistentes, ns nos confron-

    tamos com questes e controvrsias polticas, mas igualmente questesque merecem anlise cuidadosa das cincias sociais. nesse sentido quequestes de gnero, etnia, cor, religio e outros tantos marcadores de di-ferenas constituem temas legtimos de anlise para a sociologia poltica.

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    No se pode negar que o ressurgimento da diferena como umacaracterstica social positiva uma das profundas transformaes obser-vadas no mundo contemporneo. A importncia adquirida por questesrelativas identidade no deixa margem a dvidas: a noo moderna deigualdade agora compartilha espao com o reconhecimento de diferen-

    as coletivas escolhidas pelos indivduos como foco legtimo de lealdade.Ao invs das diferenas atribudas, que no mundo pr-moderno justifica-vam a rgida hierarquizao da sociedade, agora com base na prpriacrena na igualdade dos indivduos que as pessoas expressam sua subje-tividade e reclamam o direito de escolherem livremente identidades queas diferenciam de outros.

    Quando levamos em conta o desenvolvimento do ideal da igualda-de e seu ofuscamento das diferenas, torna-se claro porque a demandapor reconhecimento, que se expandiu nas ltimas dcadas, tornou-se vi-tal para grupos que eram, ou ainda so, privados de incorporao plena

    a seus contextos sociais. Em outras palavras, o reconhecimento se tornoucomponente indispensvel nas lutas por igualdade. Minorias e grupos ex-cludos mobilizam precisamente sua especificidade para demandar inclu-so e reparao por parte de comunidades nacionais.

    A noo segundo a qual as identidades podem ser escolhidas e con-tingentes ganha aceitao crescente no com uma negao, mas, sim,com a plena afirmao da individualidade. A ideia que, incorporando ovalor da diferena, ou da diversidade, torna-se mais fcil lutar pela igual-dade, pela tolerncia, por um mundo mais plural e, por isso, mais rico.Essa , portanto, mais uma grande transformao que vem se processan-

    do em nossa viso de mundo. Na prtica, articular igualdade e diferenano tarefa fcil. As tenses e contradies introduzida nas disputas pol-ticas concretas por esse novo enquadramento simultneo da igualdade eda diferena constituem rico material de anlise para a sociologia poltica.

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    Por sua vez, a relevncia das anlises reside em sua capacidade de lanarluz sobre as implicaes de possveis resolues empricas de tais tensese contradies (Silva e Reis, 2012).

    As trs inovaes culturais que ressaltei so processos dinmicose certamente tm abrangncia e impacto diferenciado. Mas, certamen-

    te, elas colocam para as cincias sociais em geral grandes desafios. Parailustrar isso no caso particular da sociologia poltica, examinemos breve-mente algumas implicaes das trs mudanas em curso para os estadosnacionais. impossvel ignorar que eles tm sido profundamente afetadospelas transformaes em curso (Axtmann, 2004). Sem subscrever a tesesustentada por alguns, de que o Estado-nao est em vias de desapare-cer sob o impacto das mudanas globais, meu argumento que ele perdealgumas de suas caractersticas, mas vem adquirindo outras, cuja compre-enso e teorizao competem sociologia poltica.

    Assim, a nova percepo da relao entre os humanos e a natureza,

    ao reconhecer a preservao do meio ambiente como condio funda-mental para a sobrevivncia, introduz necessariamente uma perspectivadiferente no tratamento da natureza como um bem pblico. Problemascomo o aquecimento global e a reduo da camada de oznio tornaminadequadas decises de poltica ambiental limitadas ao mbito dos esta-dos nacionais. Como todos os terrqueos so afetados por tais problemas,a coletivizao das decises de poltica pblica para mitig-los exige deci-ses globais. Evidentemente estamos longe de chegar a um consenso quecoletivize as decises em nvel global, e os obstculos existentes aparecemprimariamente como resistncias por parte de governos nacionais. Algunsveem na crescente necessidade de decises globalmente articuladas um

    sinal de que os estados nacionais esto perdendo fora e sua soberaniaencontra-se em processo de eroso (Van Creveld, 1999).

    Contudo, contrariando aqueles que veem o Estado-nao comoperdendo terreno no espao global, preciso ter em conta que os atores

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    mais relevantes para se lograr estabelecer acordos globais so precisamen-te os estados nacionais. Eles so os interlocutores mais adequados nessescasos, quando se trata de discutir externalidades positivas e negativas. tambm a eles que se dirigem as demandas de movimentos sociais emdefesa do meio ambiente, dos direitos humanos, e outras causas baseadas

    em valores universais. Se, por um lado, os estados nacionais precisamceder autonomia quando aceitam acordos coletivos, por outro, eles soos atores que tm voz no processo, i.e., os quais podem legitimamenteacordar, o que lhes confere papel estratgico. Em outras palavras, se porum lado se reduz a autonomia decisria dos estados nacionais, por outro,eles se tornam atores mais requisitados no mbito global.

    Tambm no que diz respeito percepo de que seriam trs, e nodois, os recursos bsicos de organizao social, o impacto sobre o Estado--nao digno de nota. Se, no passado, o Estado e a nao eram vistoscomo o amlgama estruturado em torno de combinaes tpicas de au-

    toridade e interesses, agora, com a ideia de que a solidariedade podeser vista como um princpio autnomo de organizao, expandem-se aspossibilidades de combinao de recursos. Para o Estado-nao, a con-sequncia mais imediata a emergncia de identidades que desafiam aprimazia da lealdade nacional. Na verdade, a introduo desse terceiroelemento, a solidariedade, parece corresponder a uma mudana cujo im-pacto altera a prpria a viso convencional sobre os dois princpios delonga data culturalmente estabelecidos.

    No momento, podemos observar um processo de diluio dos cri-trios tradicionais de distino entre o Estado e o mercado. Do Estado,

    espera-se agora que adote critrios de gesto tradicionalmente associadosao mercado. A ideologia do new managementganha espao como frmu-la virtuosa para assegurar a eficincia no exerccio de poder pblico (Bar-

    zelay, 1992; 2001). Por sua vez, no mundo empresarial, ganha espao o

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    ideal da !responsabilidade social corporativa", sugerindo que tambm domercado se espera um ethoscoletivo (Carroll, 1999). No contexto brasi-leiro, chegamos mesmo curiosa adjetivao !indstria cidad". Aindaque o lean governmente a !empresa cidad" possam constituir, sobretu-do, esforos de melhorar a imagem de ambos, i.e., do Estado e do mer-

    cado, podemos ver tal empenho como sugestivo de um rearranjo culturalquanto ao que se espera de um e de outro. Por sua vez, o princpio dasolidariedade invocado como fundante do que passamos a conhecercomo !terceiro setor", !organizaes no governamentais", !organiza-es da sociedade civil". Como bem sabemos, a heterogeneidade desseuniverso extrema, mas, se algo d unidade a ele, precisamente o fatode as variadas organizaes que o integram definirem sua identidade porcontraste com o Estado e com o mercado.

    Os debates quanto a esse !terceiro setor" expem claramente al-gumas das novas questes colocadas no terreno dos estados nacionais.

    Assim, por exemplo, para alguns, a aceitao das ONGs como parceirasna conduo de polticas sociais sinaliza que a autoridade est se omitin-do, abrindo mo do que deveria ser legtima obrigao governamental.Mais ainda, salienta-se que os interesses de mercado, vidos para cortarimpostos, que estariam impondo o encolhimento do estado de bem--estar. Para eles, o novo dinamismo da sociedade civil seria fruto da ondaneoliberal. Para outros, ao contrrio, a efervescncia da sociedade civil,a importncia crescente das organizaes no governamentais seriamindicaes de que a democracia estaria fazendo progressos nos estadosnacionais. Na viso deles, a expanso dessas novas organizaes indicaria

    que o componente cvico da cidadania est se expandindo.Quer optemos por um ou outro dos lados do debate quanto s no-vas organizaes da sociedade civil, foroso reconhecer que elas tmconsequncias para os estados nacionais. nova percepo cultural da

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    solidariedade que informa a noo de um terceiro setor, correspondemnovas formas de participao poltica, novos espaos de discusses, novostipos de demanda ao Estado nacional. mister observar que, a exemplodo que ocorre com a nova percepo de nossa relao com a natureza,com a emergncia de um terceiro princpio de organizao social os esta-

    dos nacionais enfrentam novos desafios. Mas, tambm nesse caso, novaspossibilidades de renovao e articulao com a sociedade se abrem parareestruturar a autoridade.

    No caso da terceira transformao que mencionei - a postulao dadiferena como compatvel com a igualdade - as implicaes mais ime-diatas dizem respeito a como conciliar o individualismo que fundamentaa noo moderna de cidadania com as demandas crescentes por direitosde minorias, ou direitos coletivos. Alguns analistas temem que a busca dereconhecimento de diferenas coletivas avance em detrimento da igual-dade (Barry, 2001; Benhabib, 2002). Tambm veem com desconfiana

    as reivindicaes por reconhecimento de identidades coletivas, os quechamam ateno para o risco dessas acabarem por favorecer a criao decomunidades segmentadas que debilitem a solidariedade nacional.

    J para outros, as demandas por reconhecimento de identidadesparticulares no necessariamente conflitam com identidades nacionais.Na viso desses, levar em conta diferenas coletivas permite avanar oprincpio da igualdade. Em certo sentido, tais demandas evocam as de-mandas pelo direito de combinao pelo qual lutaram com sucesso ostrabalhadores europeus no passado. Como bem lembra Bendix (1964), aluta dos operrios pelo direito de se unirem em sindicatos teve que ven-

    cer a resistncia moderna s representaes coletivas ou corporativas. Nocaso dos trabalhadores, a reivindicao do direito de combinao no ti-nha como base caractersticas adscritas. Pode-se argumentar, porm, que,ao basearem as reivindicaes em suas caractersticas distintivas, minorias

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    estejam efetivamente convertendo tais caractersticas em recurso de com-binao que torne possvel afirmar sua igualdade/individualidade comoseres humanos (Reis, 2011).

    No h respostas definitivas para as dvidas e polmicas que en-volvem as tenses emergentes nas relaes entre igualdade, desigualda-

    de e diferena. Da mesma forma, os estados nacionais que enfrentamhoje reivindicaes aparentemente contraditrias no tm solues ex-clusivamente tcnicas para elas. So mobilizaes de foras e disputascontingentes de poder que vo construindo gradualmente novos arranjosinstitucionais.

    4. Consideraes Finais

    A viso de mundo emergente envolve transformaes culturais asquais fazem lembrar outra grande transformao, aquela a que se referia

    Polanyi (1944). Conforme ele argumentou, uma grande revoluo cul-tural ocorreu concomitante transformao material que, ao viabilizaro capitalismo, tambm colocou em risco a solidariedade social. Comose sabe, ele argumentava que a converso da atividade humana naturalem !trabalho" e da terra (ou natureza) em capital correspondeu a umatransformao to radical que, ao ameaar o tecido social, colocou emao a !mo invisvel da sociedade". Fao essa observao, porque Po-lanyi reverte Adam Smith para postular a existncia de mecanismos auto--protetores que automaticamente restauram o equilbrio social ameaadopelas foras destrutivas do mercado. Sem subscrever a viso sistmica

    funcional de Polanyi, sugiro que estamos assistindo a uma redefiniobastante profunda em alguns dos postulados bsicos sobre a sociedade.s cincias sociais, cabe incorporar os novos supostos culturais como

    objetos de anlise e dar sentido aos processos em curso. Se, de um lado,

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    as exigncias metodolgicas atuais impem a necessidade de recortes maise mais especficos, por outro, as incertezas do presente clamam por inter-pretaes macro como as que emergiram com o advento da modernidade.No contexto atual, a diversidade de fontes de informao disponveis e acomplexidade crescente da sociedade, concorrem para tornar mais rdua

    a agenda de pesquisa. Porm, na medida em que as dificuldades e oportu-nidades so compartilhadas em escala global, vemos emergir um estmulopoderoso ao dilogo transnacional que poder concorrer para renovar asociologia e contribuir para uma produo efetivamente cosmopolita. Paraa sociologia poltica macro-histrica o desafio renovar-se sem perder devista sua vocao para combinar histria e teoria.

    Elisa P. Reis - Professora Titular de sociologia poltica da UFRJ, coordenadora do N-cleo Interdisciplinar de Estudos sobre Desigualdade Social (NIED), e vice-presidentapara cincia do International Social Science Council (ISSC). [email protected]

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    Recebido em: 22/06/2014

    Aceite Final: 18/07/2014.