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AVALIAÇÃO DO PROCESSO
PRODUTIVO DE CELULOSE
BRANQUEADA COM BASE NOS
PRINCÍPIOS DA ACV - AVALIAÇÃO DO
CICLO DE VIDA
MATHEUS ROBERTO MANARA (FAJ)
Daniel Luis Garrido Monaro (FAJ)
Thiago Silva Machado (FAJ)
Renato Luis Garrido Monaro (FAJ)
A busca da sustentabilidade pelos processos produtivos aumentou nas
últimas décadas, resultado da necessidade de se desenvolver meios
adequados, sob o ponto de vista ambiental e econômico, voltados à
gestão de sua produção, uso e descarte. Tal fato foi motivado por
alguns fatores como o aumento no consumo dos produtos, visando bem
estar e conforto da população o que causou uma evolução no consumo
dos recursos naturais, agravado pela diminuição do ciclo de vida dos
produtos. Deste modo, os mesmos passaram a ter durabilidade menor,
assim como atrativos tecnológicos maiores em suas constituições.
Nesse cenário, tem-se a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) que consiste
em avaliar os impactos ambientais associados a um produto em todas
as fases, “do berço ao túmulo”, ou “da concepção ao descarte”. Nesse
sentido, o presente estudo tem por objetivo a identificação, por meio da
aplicação de conceitos da ACV aliados as restrições ambientais
definidas por legislação, de possíveis interferências no meio ambiente
a partir do processo de produção da celulose branqueada. Foi possível
constatar que o processo de produção possui diversas características
que podem causar significativo impacto ambiental, o que permite
concluir que o processo pode ter grande influência nas alterações
ambientais ao seu redor se não for tomadas medidas preventivas
visando não causar impactos ambientais negativos.
Palavras-chave: Avaliação do Ciclo de Vida, Celulose branqueada,
Sustentabilidade, ACV
XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.
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1. Introdução
Com o passar dos anos, a relação entre o ser humano e a utilização dos recursos naturais foi se
acentuando, fato este marcado pela necessidade e aprimoramentos tecnológicos que
resultaram em buscas constantes visando o bem estar e conforto para a vivência em sociedade.
O crescimento no desenvolvimento de produtos e serviços visando o bem estar e conforto
social teve grande influência com a primeira revolução industrial tanto em relação ao volume
de produção como em relação à variedade de produtos que entram no mercado.
Após a segunda revolução industrial e, consequentemente, a segunda guerra mundial, o
modelo de desenvolvimento econômico se estruturou de vez na busca por um sistema de
produção intensivo que elevou a degradação do meio ambiente por meio da extração, em
constante evolução, dos recursos naturais, além do aumento na geração de resíduos e lixo
urbano por parte da relação empresa e sociedade.
Com o aumento na geração dos aspectos ambientais, assim como, nos impactos ambientais
oriundos dos sistemas de produção, tem-se um aumento na preocupação com o esgotamento
dos recursos naturais, de uma maneira geral, além das formas de se mitigar os impactos
ambientais gerados. Na maioria dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, com o
aumento da população, da prosperidade e urbanização, um dos principais desafios para os
municípios é coletar, reciclar, tratar e dispor de quantidades crescentes de resíduos sólidos e
de águas residuais (CHERUBINI et al., 2009).
Assim, tem-se o desenvolvimento de várias ferramentas na busca da sustentabilidade dos
sistemas de produção, das quais se destaca a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) de produtos.
Segundo CHEHEBE (1998) e GALDIANO (2006), a avaliação do Ciclo de Vida (ACV) é
uma técnica para avaliação dos aspectos ambientais e dos impactos ambientais associados a
um produto, compreendendo etapas que vão desde a retirada da matéria-prima elementar que
entram no sistema produtivo (berço) à disposição do produto final (túmulo).
De acordo com CURRAN (1999), a ACV avalia os efeitos ambientais de qualquer atividade
desde a extração dos recursos materiais da terra (petróleo, minérios, etc.) até o momento em
que todos esses materiais retornam a terra.
Deste modo, tem-se que a ACV é uma ferramenta de gestão ambiental capaz de identificar
todos os recursos naturais e materiais tanto quantos os recursos que são gerados e enviados ao
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meio ambiente (água, solo, atmosfera) ao longo de todo um processo de fabricação de um
produto ou serviços específicos.
A ACV é um instrumento de gestão ambiental que permite às organizações entenderem as
incidências ambientais dos materiais, dos processos e dos produtos, podendo a informação
obtida conduzir ao desenvolvimento de novos produtos e à detecção de melhorias a serem
aplicadas, além de formular estratégias comerciais específicas (CHEHEBE, 1997).
Atualmente, as indústrias encaram rigorosos controles ambientais devido a vários fatores
externos que vem acontecendo na natureza, este fato se agrava com a conscientização da
sociedade que se torna cada vez mais exigente no quesito ambiental. Em virtude dessas
cobranças, as empresas têm encontrado certas dificuldades para a manutenção de certa
estabilidade no mercado, tal que se faz necessária uma busca por soluções visando diminuir o
uso de recursos naturais, assim como a geração de resíduos, que aliem um sistema de
produção baseado nas premissas ambientais que consiga diminuir os custos relacionados ao
CV do produto.
Deste modo, a ferramenta ACV vem demonstrando pode ser destacada e comprovada pela sua
rápida ampliação na indústria em diversos setores, devido a sua aplicabilidade. A utilização da
metodologia da ACV como uma ferramenta é importante para a tomada de decisão quanto à
escolha de sistemas de gestão de resíduos, ou das estratégias relativas à prioridade na
utilização dos recursos naturais, ou ainda para se reduzir os impactos oriundos da cadeia de
produção dos produtos eletrônicos. A ACV é capaz de fornecer uma visão geral dos aspectos
ambientais de diferentes estratégias de gestão de resíduos, e torna possível comparar seus
potenciais impactos ambientais (CHERUBINI et al., 2009).
Dentro deste contexto, a ABNT (1997) apresenta uma estrutura em que uma ACV deve ser
estabelecida, conforme apresentado na Figura 1.
Figura 1 – Fases de uma ACV.
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Definição do Objetivo
e Escopo
ESTRUTURA DA AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA
Análise de Inventário
Avaliação de Impacto
Interpretação
Interpretações Diretas:
- Desenvolvimento e melhoria do produto- Planejamento estratégico- Elaboração de políticas públicas- Marketing- Outras
Fonte: ABNT (1997).
Assim, tem-se, segundo as normas ABNT (1997), ABNT (2006) e ILCD (2012), como
principais etapas da ACV:
Definição do Objetivo e Escopo: devem ser consistentes com a aplicação pretendida
e definidos, identificando o contexto das decisões, assim como os resultados
pretendidos.
Análise de Inventário: envolve a coleta e o processamento dos dados, visando
identificar as entradas e saídas do sistema de produção, podendo incluir os aspectos
ambientais que sejam alterados pelo sistema.
Avaliação do Impacto: esta fase é dirigida para a significância dos impactos
ambientais potenciais, usando como resultados os inventários.
Interpretação do ciclo de vida: é a fase na qual as constatações das fases anteriores
são combinadas, relacionando-as com o objetivo e o escopo do estudo.
A avaliação de impactos ambientais é um importante tema na atualidade, sobretudo na
indústria. Há uma crescente preocupação da sociedade em relação aos impactos ambientais
gerados pela indústria trazendo um reflexo para o mercado consumidor que procuram
produtos que foram feitos ambientalmente correto. O setor de celulose e papel sofre ainda
mais críticas quando se trata de aspecto e impacto ambiental que ele gera.
Além de usar intensivamente os recursos florestais, o processo de fabricação da celulose
branqueada demanda alto consumo de água e gera elevadas quantidades de efluentes líquidos,
resíduos sólidos e emissões atmosféricas. Assim, a avaliação do ciclo de vida é uma
ferramenta que tem por objetivo avaliar as inter-relações entre os sistemas de produção,
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produtos e o meio ambiente, identificando, avaliando e quantificando os fluxos do sistema
(entrada – saída),
Deste modo, o presente artigo tem como objetivo identificar e apontar os aspectos ambientais,
assim como os impactos ambientais, oriundos do processo de produção da celulose
branqueada com base nos princípios da ACV, com foco, de maneira qualitativa, dos recursos
que entram no processo, e os resíduos gerados pelo mesmo.
2. Fases da ACV
2.1 Definição de Objetivo e Escopo da ACV
A definição do objetivo da ACV é a primeira etapa que visa situar a aplicação, a área
pretendida e a razão para a execução do estudo. Após essa fase, é se faz necessária a obtenção
dos dados, quanto mais precisos melhor para responder questões necessárias para a tomada de
decisão. A qualidade dos dados é de suma importância para a eficiência do estudo.
É declarado também no objetivo o público-alvo, ou seja, aquele a quem deseja apresentar e
comunicar a conclusão do estudo e se existe o interesse de ser divulgado publicamente para
futuras conclusões comparativas em uma análise de mercado.
Segundo a ABNT (2009), convém que o escopo seja suficientemente bem definido para
assegurar que a abrangência, profundidade e detalhamento do estudo sejam compatíveis e
suficientes para atender ao objetivo declarado.
Ao se definirem os objetivos e o escopo deve-se levar em conta, os propósitos esperados e os
aspectos considerados relevantes para o direcionamento das ações a serem realizadas. Porém,
observa-se que na prática, não se deve gastar muito tempo com a formulação do escopo, pois,
com o desenvolvimento do trabalho pode ser necessário reformular a definição desses
objetivos e o ajustamento do escopo do estudo. (MIELI, 2007).
Conforme a norma ABNT (2009), o escopo deve conter:
O sistema e o produto a serem estudados;
As funções do sistema do sistema de produto ou, no caso de estudos comparativos, dos
sistemas;
A fronteira do sistema;
Categorias de impacto selecionadas e metodologia para avaliação de impactos bem
como a interpretação subsequente a ser utilizada;
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Requisitos de dados;
Pressupostos;
Limitações;
2.2 Análise de inventário da ACV
O Inventário do Ciclo de Vida de um produto é a fase em que os dados, sejam eles coletados,
medidos, calculados ou estimados, servem para quantificar as entradas e saídas de um
processo, servindo como base para a avaliação de impacto do ciclo de vida do produto
(ABNT, 2009).
Assim, segundo o CONMETRO (2010) um Inventário de Ciclo de Vida – ICV contém
fundamentalmente quatro conjuntos de informações sobre cada processo industrial no escopo
de um estudo de ACV:
Consumos e liberações de energia e substâncias químicas de e para os compartimentos
aquático, terrestre e atmosférico da biosfera (chamados de intervenções);
Saídas e entradas de subprodutos utilizados por cada processo da cadeia produtiva do
produto ou serviço, formando uma rede de interdependências entre processos,
compondo os fluxos intermediários;
Informações complementares de natureza técnica sobre o processo, como métodos
empregados na realização da modelagem, atributos e características diversas do
processo modelado, abstrações físico-químicas empregadas na representação
informacional do processo; além de
Informações de natureza administrativa, sobre a autoria, proprietários das informações
e usos permissíveis destas informações.
Tal que a etapa da Análise do Inventário do ciclo de vida envolve um conjunto de
informações e procedimentos para quantificar a entrada (energéticas e materiais), e também as
saídas (emissões atmosféricas, efluentes líquidos e resíduos sólidos), fundamentais para a
realização de estudos de impactos ambientais, utilizados ao longo de toda a cadeia do produto,
processo ou serviço, e quanto desse material foi descartado no meio ambiente.
Segundo a ABNT (2009) e ILCD (2010), a condução de uma análise de inventário é um
processo iterativo. À medida que dados são coletados e se amplia o conhecimento sobre o
sistema, novos requisitos ou limitações dos dados podem ser identificados, requerendo
mudança nos procedimentos de coleta de dados, de modo que os objetivos do estudo possam
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ainda ser satisfeitos. Às vezes, podem ser identificadas condições que requeiram revisões do
objetivo ou do escopo do estudo.
Deste modo, fica evidente que a realização de uma ACV é muito complexa, apresentando
diversas dificuldades, das quais se pode destacar a coleta de dados, por ser um processo que
demanda muitos recursos, pois essas informações são as principais para a composição do
Inventário do Ciclo de Vida, de modo que caso estejam limitados e restritos estes dados de
coletas devem ser documentados e relatados no estudo, conforme escopo e objetivo.
2.3 Avaliação do Impacto da ACV
O impacto ambiental consiste na interferência, no meio natural, que um determinado produto
ou resíduo de origem antrópica pode causar, sendo ele benéfico ou maléfico para o meio
ambiente e sociedade ao entorno. Deste modo, tem-se que avaliação de impacto do ciclo de
vida define a intensidade que os aspectos ambientais atingem o meio ambiente durante o ciclo
de vida do produto, ou seja, são as consequências provindas do fluxo de entrada e saída do
sistema (NIGRI et. al, 2009).
De acordo com Chehebe (1997) é onde se realiza a identificação das categorias e indicadores
levando-se em conta a preocupação ambiental, o conhecimento científico dos processos e os
mecanismos ambientais. Deste modo, tem-se que esta é uma etapa de grande importância na
utilização da ACV, pois correlaciona o escopo do estudo com o sistema de produção levando
em consideração as características ambientais do meio em que o mesmo está inserido.
2.4. Interpretação da ACV
Nesta fase são diretamente correlacionadas todas as informações coletadas, visando identificar
possíveis fontes poluidoras, áreas em que se pode buscar uma melhor eficiência do processo,
ou seja, onde se correlaciona o ciclo de vida do produto com o meio ambiente em que o
mesmo está inserido, estando de acordo com o objetivo estipulado no início da análise.
Deste modo, segundo a ABNT (2009), esta fase consiste de três etapas:
Identificação das questões ambientais mais significativas de acordo com os resultados
de ICV e AICV da análise;
Avaliação do estudo realizado, que pode incluir elementos como comparação entre
produtos, verificação da integridade, sensibilidade e consistência; e
Conclusões, recomendações, limitações do estudo, além de apresentar relatório sobre
as questões mais significativas.
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3. Metodologia
O objeto que norteou o desenvolvimento da presente pesquisa foi a identificação, por meio da
aplicação de conceitos da ACV aliados as restrições ambientais definidas por legislação, de
possíveis interferências no meio ambiente a partir do processo de produção da celulose
branqueada. Para isso, utilizou-se de um estudo de caso de uma empresa de grande porte do
setor de celulose e papel que está engajada em manter os bioindicadores exigidos pela norma
ISO 14001.
O ciclo de vida da celulose branqueada consiste em uma sequência de estágios, que vão desde
o cultivo da muda de eucalipto até a celulose branqueada, envolvendo várias etapas do
processo que estão diretamente ligadas às interferências com o meio ambiente. Visando
identificar os principais aspectos ambientais da produção de celulose branqueada, a mesma
será classificada em algumas etapas que envolvem os estágios de produção da muda de
eucalipto, extração de celulose da madeira, cozimento da madeira, deslignificação e
branqueamento da polpa de celulose.
Assim, utilizando a ACV como ferramenta de gestão, buscou-se analisar o sistema de gestão
ambiental proposto por Carreiras et al. (2007) que correlacionou a ACV com o intuito de criar
um paralelismo entre o Sistema de Gestão Ambiental (SGA) com as fases da ACV, visando
identificar aspectos e impactos ambientais inerentes ao processo para facilitar a tomada de
decisão.
A Figura 2 apresenta, com base nessa estrutura, a área de abrangência do presente estudo,
destacando que o mesmo busca fazer um apontamento qualitativo para a tomada de decisão,
apontando os possíveis pontos de geração de aspectos ambientais e impactos ambientais
potenciais.
Figura 2 – Fluxograma do processo analisado no presente estudo.
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Sistema de Gestão
Ambiental
Política Ambiental
Planejamento
Levantamento dos Aspectos Ambientais
Identificação das Atividades
Definição dos Indicadores Ambientais
Identificação dos Impactos Ambientais
Definição do Objetivo e
Âmbito
Análise de Inventário
Avaliação dos Impactos
Avaliação do Ciclo de Vida
Fonte: Adaptado de Carreiras et al (2007)
Como observado na figura, o presente estudo usou as premissas da ACV para identificar os
processos chaves na produção da celulose branqueada, assim como as entradas do processo, e
os aspectos ambientais gerados pelo mesmo, para se identificar os impactos ambientais
potenciais do sistema de produção para posterior quantificação na tomada de decisão na
empresa. Dessa forma, pode-se apresentar o objeto de estudo nas fronteiras do sistema
indicadas na Figura 3, a partir de uma visão macro do sistema de produção.
Figura 3 – Processo de produção da celulose branqueada (Visão macro do processo)
Pátio da Madeira
Recursos Naturais
Cozimento Lavagem Deslignificação BranqueamentoCelulose
Branqueada
Para a elaboração da Avaliação qualitativa do ciclo de vida da celulose branqueada, se buscou
conhecer em detalhes todo o processo de produção, assim como as entradas e saídas do
processo, visando identificar todos os recursos naturais que entram e saem do processo,
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respeitando a correlação básica de um sistema de produção Input – Transformação – Output,
conforme mostrado na Figura 4.
Figura 4 – Representação básica de um sistema de produção.
EntradasProcesso de
TransformaçãoSaídas
Ambiente
Ambiente Fonte: Adaptado de Slack (2009)
4. Resultados e Discussões
4.1 Descrição do processo de produção
Para melhor entender os aspectos e impactos gerados no processo de produção, se faz
necessário apresentar e discutir as fases do processo de produção da celulose branqueada,
assim como as características de cada processo. Para isso as etapas serão descritas a seguir.
4.1.1 Processo de picagem
No processo, são recebidas as toras de madeira com tamanhos padrões. Na sequência do
processo, a preparação de cavacos deve garantir um cavaco dentro das especificações de
espessura, comprimento e baixo percentual de resíduos, visando o sucesso da etapa de
cozimento nos digestores e sua transformação em polpa.
Para que isso seja possível, todos os resíduos gerados na colheita, manuseio e picagem do
eucalipto devem ser rigorosamente controlados. Assim, antes do processo de picagem, a
madeira é submetida à retirada dos resíduos, caracterizada pela remoção da casca (biomassa)
por atrito nos tambores descascadores e da lavagem propriamente dita.
No descascamento, a casca da madeira é separada e enviada diretamente para picagem de
biomassa e os toretes que foram lipos por atrito no tambor vão direto para o picador de
celulose, assim que a madeira for picada ela vai por uma esteira na pilha de cavaco, para
posteriormente alimentar a próxima etapa do processo que é o cozimento.
4.1.2 Processo de cozimento
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O objetivo do cozimento é separar as fibras da madeira e dissolver a maior parte da lignina
contida nas paredes das fibras. A separação das fibras é conseguida pela dissolução da lignina
contida na lamela média que mantêm as fibras juntas (unidas).
O álcali (NaOH) também penetra nas paredes das fibras e dissolve a lignina lá contida. Neste
processo, ocorre a maior “perda” ou dissolução de hemicelulose e celulose, influenciando no
rendimento, ou seja, celulose e hemicelulose reagem com soda cáustica (NaOH) durante o
cozimento. Estas reações são indesejáveis, uma vez que a dissolução da celulose e
hemicelulose diminuem o rendimento.
Outra função do cozimento é a extração do licor preto após o processo, ou seja, trata-se de um
processo de lavagem da polpa, onde o licor extraído com concentração de sólidos é
substituído pelo licor vindo do primeiro filtrado da lavagem, no fundo do digestor. Portanto,
ocorre uma lavagem por extração e diluição no fundo do digestor. Caso não houvesse a
extração do digestor, o licor preto na descarga do digestor seria muito concentrado,
necessitando assim, de mais filtros lavadores na lavagem.
4.1.3 Processo de lavagem
A Lavagem com água quente da celulose tem a finalidade de retirar os resíduos de licor preto,
recuperando o máximo possível da soda usada no cozimento e a parcela de madeira que se
transformou em líquido. Esta lavagem da celulose facilitará o próximo estágio do processo
que é o branqueamento, reduzindo o consumo de alvejantes e produtos químicos e,
principalmente, tornando o efluente mais limpo.
4.1.4 Processo de deslignificação
Vários processos químicos podem ser aplicados na remoção da lignina e, consequentemente,
no branqueamento da polpa, como cozimento, deslignificação com oxigênio, com ozônio,
branqueamento com cloro, dióxido de cloro, peróxido de hidrogênio, entre outros. Entretanto,
qualquer processo aplicado para esse fim, traz modificações em várias propriedades da polpa
como número KAPPA, Alvura e Viscosidade.
A viscosidade dita a qualidade do produto nas máquinas de papel. Ganho de alvura e redução
de KAPPA com a menor perda de viscosidade possível é o objetivo de qualquer processo de
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polpação, sendo ditados pela seletividade do processo, ou seja, a habilidade de degradar a
lignina e manter as fibras intactas. Assim, o objetivo consiste em dar continuidade ao
processo de deslignificação iniciado no cozimento, reduzindo o número KAPPA sem
degradar excessivamente a fibra de celulose.
4.1.5 Processo de branqueamento
O processo de branqueamento busca deixar a polpa de celulose com as características
necessárias para o corte do papel. Tendo como principais compostos o dióxido de cloro,
peróxido de hidrogênio e oxigênio. Isto tornou, em função do tempo, o processo de
branqueamento de celulose muito mais amigável ambientalmente. A redução de compostos de
cloro no branqueamento é um objetivo mundialmente procurado, na fabricação de celulose
com isenção de cloro. Essa busca acabou gerando o selo ECF "Elemental Chlorine Free" que
indica a não utilização de cloro elementar no branqueamento da celulose.
Essa redução de compostos clorados no branqueamento se reflete nos indicadores mas não na
qualidade final do papel de maneira direta. O uso de cloro para eliminar a lignina é
muitíssimo danoso, pois do processo são emitidas substâncias nocivas à vida, conhecidas por
dioxinas, que consistem em compostos altamente cancerígenos, além de afetarem o sistema
neurológico. A celulose produzida no processo ECF possui características que a fazem
extremamente versátil, podendo ser utilizada na produção de diversos tipos de papel.
4.2 Entradas e saídas do processo
As entradas e saídas do processo são apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1 – Entradas e saídas do processo.
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Entradas Processo Saídas
Energia Elétrica
Pátio da Madeira
Cavaco Picado Tratado
+
Casca
Madeira Bruta
Soda Cáustica
Condensado
Reaproveitado
Cavaco Picado Tratado
Cozimento
Massa Marrom Cozida
+
Licor Preto
Vapores (53, 132 e 180 LBS)
Licor branco
Rejeito da Depuração
Licor Preto
Energia Elétrica
Massa Marrom Cozida
Lavagem Massa Marrom Lavada
Energia Elétrica
Filtrado do Decker
Filtrado da Lavagem
Água (Fresca e Morna)
Anti-Espumante
Massa Marrom Lavada
Deslignificação
Massa Marrom
+
Deslignificada
Energia Elétrica
Filtrado do Open Washer
Vapor de 53 Lbs
Oxigênio Industrial
Soda Cáustica / Licor Branco
Água (Fresca e Morna)
Filtrado da Deslignificação
Anti-Espumante
Talco
Massa Marrom Deslignificada
Branquamento Massa de Celulose Branqueada
Energia Elétrica
Água (quente, morna e fresca)
Filtrado do Open Washer
Vapor (53 e 180 Lbs)
Oxigênio Industrial
Dióxido de Cloro
Soda Cáustica
Filtrados (Dual D, EOP e Prensa D)
Peróxido de Hidrogênio
Água Branca
A Tabela 1 apresenta a grande diversidade de recursos que entram no processo de produção
da celulose branqueada, o que despertou o interesse de abordar, inicialmente, os aspectos e
impactos ambientais potenciais oriundos do processo base para a produção do papel nas
diversas características que são conhecidas.
A Tabela 2 apresenta os aspectos ambientais gerados pelos processos, assim como os
impactos ambientais potenciais.
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Tabela 2 – Aspectos ambientais e impactos ambientais potenciais do processo de produção analisado.
Processo Aspectos Ambientais Impactos Ambientais
Pátio da Madeira
Ruído Incomodo à população
Uso da água Escassez hídrica
Geração de resíduos químicos Poluição do solo
Cozimento
Emissão de partículas no ar
Poluição do ar Condensado proveniente do vapor
Emissão de vapor
Geração de efluentes líquidos Poluição da água
Geração de efluentes orgânicos
Consumo de água Escassez hídrica
Geração de resíduos sólidos Poluição do solo
Geração de calor Incomodo à população Gerenciamento de riscos
Lavagem
Emissão de partículas no ar Poluição do ar
Emissão de vapor
Geração de efluentes líquidos Poluição da água
Consumo de água Escassez hídrica
Geração de calor Incomodo à população
Gerenciamento de riscos
Emissão de substâncias odoríferas Poluição do ar / Incomodo à
população
Deslignificação
Emissão de vapor Poluição do ar
Geração de efluentes líquidos Poluição da água
Geração de efluentes orgânicos
Consumo de água Escassez hídrica
Ruído
Incomodo à população Geração de calor
Gerenciamento de riscos
Emissão de substâncias odoríferas Poluição do ar / Incomodo à
população
Branqueamento
Evaporação de produtos químicos
Poluição do ar Emissão de partículas na atmosfera
Emissão de vapor
Geração de efluentes líquidos Poluição da água
Geração de efluentes orgânicos
Consumo de água Escassez hídrica
Geração de resíduos sólidos Poluição do solo
Ruído
Incomodo à população Geração de calor
Gerenciamento de riscos
Fonte: Próprio autor
É possível observar que o processo de produção da celulose branqueada apresenta muitos
impactos ambientais potenciais, a partir de diversos aspectos gerados no sistema de produção.
Para cada impacto gerado, se faz necessário um plano de ação visando sua minimização, por
meio de ações locais / pontuais que venham a contribuir com o conforto e bem estar social.
Dos impactos potenciais observados, tem-se os relacionados aos resíduos líquidos com certo
destaque local, devido as alterações no ciclo da água local e a dificuldade de se iniciar
processos de tratamento desses recursos na própria planta, pois, além do alto custo no
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tratamento, são passíveis de impactarem, localmente, uma grande área se forem mal
manuseados.
Assim, tem-se que apesar de a empresa apresentar implementada a ISO 1400, além de
participar de auditorias visando a manutenção do sistema de produção em acordo com a
norma, a mesma possui diversos pontos que podem causar significativo impacto ambiental,
tanto em termos locais como globais, devido a complexidade do processo e a diversidade de
recursos necessários para a produção da celulose branqueada.
5. Conclusão
O presente estudo objetivou a análise dos requisitos organizacionais para a aplicação da
ferramenta da ACV, com base na norma ISO 14040, e sua aplicabilidade nos processos de
produção da celulose branqueada. A ferramenta da ACV tem grande importância no
desenvolvimento da gestão ambiental nas empresas, entretanto sua aplicação ainda não é bem
difundida no âmbito empresarial.
Assim, observaram-se na identificação das características ambientais do estudo de caso que a
mesma apresenta diversos pontos que são passíveis de causar impacto ambiental significativo
que não são monitorados pela gestão ambiental da corporação, devido ao fato de não
ocorrerem ações preventivas no sentido de minimizar os impactos do ciclo de vida da celulose
branqueada.
Assim, esta pesquisa indicou que a empresa necessita de um aprimoramento em relação ao
ciclo de vida da celulose branqueada, assim como estratégias para a mitigação dos diversos
impactos ambientais causados pelo processo de produção. Por fim, visando a implantação da
ACV, são necessárias adequações nos processos e estratégias organizacionais, visando
estabelecer um planejamento estratégico preventivo em relação aos aspectos ambientais
gerados pelo processo, assim como um plano corretivo em relação aos impactos ambientais
potencias.
REFERÊNCIAS
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