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ARPq13 Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XXV, nº 100, pág. 13-19, Out.-Dez., 2013 Recebido a 21/11/2013 Aceite a 10/03/2014 Avaliação Tomodensitométrica em Candidatos a Transplante Hepático CT Evaluation in Possible Liver Transplant Recipients R. Castro, I. Oliveira, T. Fernandes, B. Araújo, A. J. Madureira Serviço de Radiologia do Hospital de São João – Faculdade de Medicina do Porto Directora de Serviço: Prof. Doutora Isabel Ramos Introdução O transplante hepático ortotópico é o tratamento de escolha para uma ampla gama de patologias que cursam com doença hepática terminal aguda ou crónica, bem como para doenças caracterizadas por defeitos genéticos que perturbam a síntese hepática de uma ou mais proteínas. O transplante também deve ser considerado como tratamento de primeira linha num grupo seleccionado de pacientes que têm neoplasias hepáticas[1]. O número de candidatos a transplante é muito superior à disponibilidade de fígados cadavéricos. Neste contexto, desenvolveram-se técnicas como doação de fígado dividido (“split liver” ) e transplantação de dador vivo. [2,3]. O sucesso do transplante depende da avaliação detalhada das características do candidato a recepção de transplante Resumo O transplante hepático é o tratamento de escolha na doença hepática terminal, incluindo casos de hepatite aguda fulminante, cirrose descompensada ou carcinoma hepatocelular que cumpra critérios definidos. Para o sucesso é necessária adequada avaliação pré-operatória do candidato a transplante. O estudo imagiológico deve incluir a avaliação do parênquima, detecção de neoplasias intra e extra-hepáticas e caracterização de anomalias e variantes da árvore biliar e vascular. Neste contexto a TC é um método com alta acuidade. Os objectivos doeste trabalho são rever e ilustrar os achados tomodensitométricos relevantes na avaliação pré- operatória dos candidatos a transplante hepático. Palavras-chave Transplante Hepático; Cirrose; Derivação Porto-Sistémica Intra-Hepática Transjugular. Abstract Liver transplantation is the treatment of choice for patients suffering from end-stage liver disease, including acute fulminant hepatic failure, decompensated cirrhosis, or hepatocellular carcinoma within defined criteria. Successful transplantation requires pre-operative evaluation of the transplantation candidate. The imaging study should include liver parenchyma assessment, detection of intrahepatic and extrahepatic neoplasms and characterizations of biliary tree and vascular anomalies and anatomic variants. For these purposes, CT is a reliable modality. The objectives of this study are to review and illustrate clinically relevant CT findings in the pre-operative evaluation of possible liver transplant recipients. Key-words Liver Transplantation; Cirrhosis; Transjugular Portosystemic Shunt. bem como do potencial dador vivo. A avaliação não- invasiva através de TC tem um papel bem estabelecido na avaliação de ambos. Neste artigo, será revista a utilidade da TC na avaliação pré-operatória do candidato a receber um transplante hepático. Serão abordadas questões específicas que devem ser respondidas pela TC bem como a influência dos dados imagiológicos na orientação terapêutica. Protocolo Técnico É recomendável que os estudos sejam efectuados com TC multidetectores, recorrendo a injector automático. Um protocolo técnico sugerido para TC de 64 cortes inclui ingestão de 750ml de água como agente de contraste oral negativo; aquisição de imagens sem contraste seguidas da injecção endovenosa de contraste iodado não iónico, a uma taxa de infusão de 3ml/seg num volume total máximo de 180ml; aquisição de imagens na fase arterial tardia, venosa

Avaliação Tomodensitométrica em Candidatos a Transplante … · ARPq15 Em até 40% dos casos existe trombose de ramos venosos portais, frequentemente causada por invasão tumoral

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ARPq13

Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XXV, nº 100, pág. 13-19, Out.-Dez., 2013

Recebido a 21/11/2013Aceite a 10/03/2014

Avaliação Tomodensitométrica em Candidatos aTransplante Hepático

CT Evaluation in Possible Liver Transplant Recipients

R. Castro, I. Oliveira, T. Fernandes, B. Araújo, A. J. Madureira

Serviço de Radiologia do Hospital de São João – Faculdade de Medicina do PortoDirectora de Serviço: Prof. Doutora Isabel Ramos

Introdução

O transplante hepático ortotópico é o tratamento de escolhapara uma ampla gama de patologias que cursam comdoença hepática terminal aguda ou crónica, bem como paradoenças caracterizadas por defeitos genéticos queperturbam a síntese hepática de uma ou mais proteínas. Otransplante também deve ser considerado como tratamentode primeira linha num grupo seleccionado de pacientesque têm neoplasias hepáticas[1]. O número de candidatosa transplante é muito superior à disponibilidade de fígadoscadavéricos. Neste contexto, desenvolveram-se técnicascomo doação de fígado dividido (“split liver”) etransplantação de dador vivo. [2,3].O sucesso do transplante depende da avaliação detalhadadas características do candidato a recepção de transplante

Resumo

O transplante hepático é o tratamento de escolha na doença hepática terminal, incluindo casos de hepatite aguda fulminante,cirrose descompensada ou carcinoma hepatocelular que cumpra critérios definidos. Para o sucesso é necessária adequada avaliaçãopré-operatória do candidato a transplante. O estudo imagiológico deve incluir a avaliação do parênquima, detecção de neoplasiasintra e extra-hepáticas e caracterização de anomalias e variantes da árvore biliar e vascular. Neste contexto a TC é um métodocom alta acuidade. Os objectivos doeste trabalho são rever e ilustrar os achados tomodensitométricos relevantes na avaliação pré-operatória dos candidatos a transplante hepático.

Palavras-chave

Transplante Hepático; Cirrose; Derivação Porto-Sistémica Intra-Hepática Transjugular.

Abstract

Liver transplantation is the treatment of choice for patients suffering from end-stage liver disease, including acute fulminanthepatic failure, decompensated cirrhosis, or hepatocellular carcinoma within defined criteria.Successful transplantation requires pre-operative evaluation of the transplantation candidate. The imaging study should includeliver parenchyma assessment, detection of intrahepatic and extrahepatic neoplasms and characterizations of biliary tree andvascular anomalies and anatomic variants. For these purposes, CT is a reliable modality. The objectives of this study are to reviewand illustrate clinically relevant CT findings in the pre-operative evaluation of possible liver transplant recipients.

Key-words

Liver Transplantation; Cirrhosis; Transjugular Portosystemic Shunt.

bem como do potencial dador vivo. A avaliação não-invasiva através de TC tem um papel bem estabelecido naavaliação de ambos. Neste artigo, será revista a utilidadeda TC na avaliação pré-operatória do candidato a receberum transplante hepático. Serão abordadas questõesespecíficas que devem ser respondidas pela TC bem comoa influência dos dados imagiológicos na orientaçãoterapêutica.

Protocolo Técnico

É recomendável que os estudos sejam efectuados com TCmultidetectores, recorrendo a injector automático. Umprotocolo técnico sugerido para TC de 64 cortes incluiingestão de 750ml de água como agente de contraste oralnegativo; aquisição de imagens sem contraste seguidas dainjecção endovenosa de contraste iodado não iónico, a umataxa de infusão de 3ml/seg num volume total máximo de180ml; aquisição de imagens na fase arterial tardia, venosa

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e tardia, obtidas com 30, 55-65 e 180 segundos de atraso,respectivamente; colimação de detector de 0,6mm,espessura de reconstrução de 3mm; obtenção dereconstruções multiplanares e angiográficas.

Resumo da Técnica Cirúrgica

O transplante de fígado envolve anastomoses biliares evasculares. A anastomose biliar é uma anastomose termino-terminal do ducto biliar comum do dador ao ducto biliarcomum do receptor. Em alternativa, pode-se efectuar umacoledocojejunostomia nos casos em que exista patologia,encurtamento ou ausência do ducto biliar comum doreceptor. Por rotina efectua-se colecistectomia de todosos implantes. As artérias hepáticas do receptor e dadorsão anastomosadas. A anastomose da veia porta é umaanastomose termino-terminal. Se a veia porta do receptorestiver trombosada pode ser necessário utilizar um enxertovenoso [4]. A veia cava inferior (VCI) intra-hepática éhabitualmente ressecada no transplante cadavérico maspode ficar intacta nos casos em que se realiza umaanastomose termino-lateral entre as VCIs dos receptor edador. A VCI do receptor é conservada nos casos de dadorvivo [5,6].

Avaliação Tomodensitométrica dosCandidatos a Transplante

A avaliação por TC de potenciais receptores de transplantehepático deve incluir a avaliação do parênquima hepáticoe a detecção de anomalias vasculares, tais como trombosesvenosas, varizes peri-hepáticas, estenose do tronco celíaco,variantes anatómicas vasculares e da árvore biliar e posiçãodas derivações portossistémicas intra-hepáticastransjugulares (TIPS). Deve também incluir a exclusão decontra-indicações ao transplante, tais como neoplasiasmalignas extra-hepáticas, carcinoma hepatocelularavançado e colangiocarcinoma.

Avaliação do parênquima hepáticoNa cirrose em fase inicial o fígado tem aspecto normal oualargamento do espaço hilar periportal localizadoanteriormente ao ramo direito da veia porta [7]. Estaalteração associa-se a atrofia do segmento medial do loboesquerdo (segmento IV). Com a progressão da doença, asalterações morfológicas incluem contorno nodular e atrofiado lobo direito e segmento medial do lobo esquerdo bemcomo aumento do lobo caudado (figura 1). É importantedescrever a hipertrofia do lobo caudado, já que podeenvolver a VCI, causando dificuldades na cirurgia durantea exposição da VCI e separação desta do fígado removido.Esta situação é mais relevante nos casos de dador vivo emque a VCI é preservada [8,9].

Presença e extensão de carcinoma hepatocelularNo carcinoma hepatocelular, o transplante hepático é otratamento com sobrevida mais prolongada. Contudo,apenas pacientes seleccionados são candidatos a estaterapêutica.Os critérios de Milão são aplicados de forma a seleccionaros doentes com cirrose e CHC para transplante hepático

[10]. Estes critérios afirmam que um paciente é candidatose tiver:

• Lesão única com dimensão inferior a 5cm.• Até 3 lesões com dimensões inferiores a 3cm.• Sem evidência de metástases extra-hepáticas• Ausência de invasão vascular.

Alguns autores consideram os critérios de Milão muitorestritivos e advogam que se podem obter resultadosaceitáveis com a utilização de critérios menosconservadores, como por exemplo nos casos de lesão únicacom menos de 6,5cm ou três ou menos lesões, desde que amaior não exceda os 4,5cm [11].Vários estudos de larga escala demonstraram que doentesque se encontrem inicialmente fora dos critérios de Milanpodem fazer terapêutica (cirúrgica ou locorregional) como intuito de “downstaging”. Nos casos em que existasucesso mantido após um período de seguimento adequado,são obtidos bons resultados após a realização de transplantehepático. [12,13,14]Em doentes seleccionadas, a ablação através de técnicasminimamente invasivas por ter intuito curativo[15].O aspecto do carcinoma hepatocelular têm uma aparênciavariável em TC. Nas imagens obtidas sem administraçãode contraste os tumores são habitualmente hipodensos [16].A maioria dos pequenos carcinomas hepatocelularesdemonstram captação intensa na fase arterial (figura 2) e“wash-out” na fase portal ou tardia. Uma minoria dos HCCsão hipovasculares, sendo mais facilmente identificáveisna fase portal ou de equilíbrio, evidenciando-se pelapresença de “wash-out” ou de pseudo-cápsula comcaptação progressiva [17,18]As lesões de maiores dimensões geralmente sãoheterogéneas (figura 3). Outros achados possíveis incluemcaptação tardia capsular, áreas hipodensas devido a focosde gordura intra-tumoral e áreas de hemorragia. Estãopresentes calcificações em 5-10% dos casos [9].Por vezes os HCC podem-se apresentar como lesõesdifusas infiltrativas. Estas, na TC, aparecem como lesõesde limites mal definidos dispersas pelo parênquimahepático[19]. Este tipo de envolvimento exclui otransplante como alternativa terapêutica.

Fig. 1 - Alterações morfológicas na cirrose avançada. Imagem de TCcom contraste EV demonstra atrofia do lobo hepático direito. O contornohepático é lobulado. O lobo caudado hipertrofiado envolve a veia cavainferior (seta).

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Em até 40% dos casos existe trombose de ramos venososportais, frequentemente causada por invasão tumoral [20].A invasão de veias hepáticas é menos comum. Os sinaisde invasão vascular consistem em defeitos depreenchimento intra-luminais, captação do produto decontraste pelo trombo maligno e alargamento do lúmenvenoso. As metastastes extra-hepáticas são mais comunsno pulmão, gânglios linfáticos abdominais (habitualmenteno hilo hepático e pericelíacos) e osso. Salienta-se que apresença de adenomegalias no hilo hepático nos pacientescom cirrose (particularmente nos casos de hepatite vírica)é um achado comum, o que limita acuidade da TC nodiagnóstico de metástases ganglionares [21, 22].

ColangiocarcinomaNos casos de colangiocarcinoma tratado com transplantehepáticos os resultados obtidos geralmente sãodesapontadores. Mesmo lesões pequenas, sem sinais deinvasão local, geralmente demonstram recorrência numperíodo de poucos anos após o transplante [23]. Apesarde habitualmente ser considerada uma contra-indicaçãoabsoluta, alguns pacientes com colangiocarcinomasirressecáveis (mas sem envolvimento intra-hepático,metástases hepáticas ou extra-hepáticas), são submetidos

a transplante, em alguns centros, no âmbito de ensaiosclínicos [24].Os padrões de crescimento incluem formação de “massa”,infiltração periductal e crescimento polipóide intraductal.O colangiocarcinoma periférico (10%) apresenta-se comouma lesão intra-hepática hipodensa, com dilatação biliarperiférica em metade dos casos. Por vezes existe retracçãocapsular [25]. Na TC nota-se captação periférica precoce,com captação tardia central devido a difusão do contrastepara o espaço extra-vascular do tecido fibroso tumoral.Os colangiocarcinomas em fígados cirróticos tendem aapresentar-se como lesões hipervasculares, sendodiferenciados dos HCC pela maior prevalência de retracçãocapsular [26] e ausência de “wash-out” nas fases maistardias [27].Também em fígados não cirroticos é relativamentefrequente que os colangiocarcinomas com formação de“massa” intrahepática se apresentem como lesõeshipervasculares, podendo o prognóstico ser mais favorávelnestes casos [28].O colangiocarcinoma hilar (tumor de Klatskin) (60%),ocorre próximo da junção dos ductos biliares direito eesquerdo (figura 4). A lesão é geralmente pequena, maldiferenciada, agressiva e causa obstrução das vias biliares[26]. Num número significativo de casos o tumor deKlatskin não é visível na TC, sendo de realçar a importânciasemiológica da dilatação biliar intra-hepática acentuadasem causa aparente, já que pode ser o único indício paraum diagnóstico correcto.A ecoendoscopia com ou sem biópsia é útil na avaliaçãoda extensão ductal e envolvimento ganglionar [29]. O colangiocarcinoma extra-hepático (30%) condicionaestenose ou obstrução do colédoco na maioria dos casos.Pode apresentar-se como uma lesão polipóide endoluminalou como uma lesão infiltrativa com espessamento daparede do ducto.

Fig. 2 - Carcinoma hepatocelular em fígado cirrótico. TC em fase arterialdemonstra um nódulo hipercaptante. Como é uma lesão única, com2,5cm, o paciente é candidato a transplante.

Fig. 3 - Múltiplos focos de carcinoma hepatocelular. Imagens de TC nafase arterial demonstram lesões hipervasculares (setas). Como ambasas lesões medem mais de 3cm, este paciente não é candidato a transplantehepático, segundo os critérios de Milão. Nota-se ainda a extremidadeinferior de um TIPS (cabeça de seta).

Fig. 4 - Colangiocarcinoma de Klatskin – contraindicação paratransplante hepático. Imagem coronal de TC demonstra dilatação dasvias biliares intra-hepáticas, condicionada por uma lesão hilarhipovascular (seta).

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Presença de lesões malignas extra-hepáticasOs pacientes com antecedentes de neoplasia maligna extra-hepática estão em risco para recidiva, atendendo àterapêutica imunossupressora necessária após otransplante. Assim, considera-se prudente adiar a realizaçãode transplante durante um período razoável após a cura[23]. A detecção de um tumor primário activo extra-hepático (figura 5), com ou sem metástases é uma contra-indicação absoluta para a realização de transplante.

Se o trombo venoso for recente, pode ser identificado nasimagens sem contraste como um trombo espontaneamentehiperdenso. A trombose crónica é hipodensa, por vezesdemonstrando calcificações. As imagens obtidas após aadministração de contraste demonstram ausência deopacificação do segmento trombosado ou um defeito depreenchimento endoluminal. Pode existir densificação dagordura envolvente nos casos de flebite.Os trombos tumorais demonstram captação moderada oumarcada, mais evidentes na fase arterial. Se existirtransformação cavernomatosa, (figura 6), identifica-se um“novelo” de estruturas vasculares na área do segmentoocluído (geralmente na porta hepática).

Trombose de veia portaA contra-indicação cirúrgica mais comum para a realizaçãode transplante hepático é a ausência de um sistema venosoportal viável, quer seja devido a presença de trombose daveia porta (que está presente em 15% dos pacientes comdoença hepática crónica) ou transformação cavernomatosada veia porta [9]. Em alguns casos a trombose da veiaporta pode ser ultrapassada: se existir um trombo portalagudo, pode-se realizar trombectomia manual; se existirtrombose crónica ou atrofia da veia porta, a veia porta dodoador é anastomosada à confluência espleno-portal, à veiamesentérica superior ou a uma variz esplénica. Se a veiaportal do enxerto não tiver extensão suficiente para atingira confluência espleno-portal, pode-se recorrer a um enxertoda veia ilíaca do doador. Contudo, a trombose ou atrofiadifusa da veia mesentérica superior e veia porta permanececomo uma contra-indicação ao transplante hepático devidoà presença de alto risco de perda do enxerto e elevadadamortalidade peri-operatória [4,5,30]

Presença de varizesDeve-se referir a presença de varizes peri-hepáticas e peri-cava, já que estas condicionam aumento do risco dehemorragia durante a excisão do fígado nativo. As varizesem outras regiões abdominais podem condicionarhipoperfusão do enxerto, devido a fuga através de “shunts”persistentes. Assim, é importante descrever a localizaçãoe características destes colaterais [4,9].Nas imagens em fase portal as varizes são facilmentevisualizadas como estruturas captantes e serpiginosas(figura 7).

Estenose do tronco celíacoA estenose do tronco celíaco é um achado comum. Ocorredevido a aterosclerose ou compressão pelo ligamentoarqueado mediano. Os receptores de transplante hepáticocom estenose do tronco celíaco estão em risco paradiminuição do fluxo sanguíneo para o fígado transplantado[9,31]. A TC é uma técnica fiável para o diagnóstico destaentidade, permitindo a reparação intra-operatória. A origemdo tronco celíaco pode ser identificada nas imagens axiais.Contudo, devido ao seu trajecto proximal oblíquo, asimagens sagitais e reconstruções angiográficastridimensionais têm acuidade superior (figura 8).

Fig. 5 - Carcinoma do cólon sigmóide (seta), em candidato a transplantehepático.

Fig. 6 - Transformação cavernomatosa da veia porta: Imagem axial deTC com contraste demonstra uma rede de colaterais venosos na regiãoda porta hepática.

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Variantes anatómicas vasculares e biliaresEm pacientes com um afluxo arterial hepático duplo (figura9) (como por exemplo, uma artéria hepática direitasubstituída a partir da artéria mesentérica superior e umaartéria hepática comum a partir do tronco celíaco), éimportante verificar se o calibre da artéria hepática comumé suficiente para uma anastomose arterial única [30]. Asvariantes anatómicas da árvore venosa portal não têmimpacto no procedimento cirúrgico. As variantes da VCIou das veias supra-hepática podem influenciar oprocedimento cirúrgico dependendo da necessidade depreservar a VCI [4,6,30]. As variantes anatómicas da árvorebiliar podem ter impacto no procedimento cirúrgico, se

existir envolvimento do ducto hepático comum. Se este,no receptor, for curto, estreito ou estiver ausente (como naatrésia biliar, colangite esclerosante ou cirrose biliarprimária), uma coledocojejunostomia é a melhoralternativa em relação à anastomose bilio-biliar termino-teriminal clássica [5,30]

Localização das extremidades do TIPSEm doentes com hipertensão portal complicada comhemorragia digestiva e ascite refractárias, a inserção deum TIPS demonstrou ser um método terapêutico valioso,que funciona como “ponte” até à realização de transplante.Nestes doentes, geralmente as extremidades do “shunt”são intra-hepáticas, com a extremidade superior na veia

Fig. 7 - Imagens axiais de TC com contraste em diferentes pacientes demonstram varizes peri-vesiculares (a) e peri-esplénicas (b).

Fig. 8 - Estenose do tronco celíaco por compressão do ligamento arqueado mediano. Imagens de TC na fase arterial, no planos sagital (a) e axial (b),demonstram tortuosidade do tronco celíaco proximal (seta), associada a dilatação pós-estenótica. Na imagem axial define-se o ligamento arqueadomediano hipertrofiado (cabeça de seta).

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hepática direita e a extremidade inferior na veia portadireita, não colocando dificuldades durante a cirurgia. Amigração ou estenose do “shunt” são complicações quedevem ser descritas, porque podem influenciar oprocedimento cirúrgico [9]. Se a extremidade superior do“shunt” se estender à VCI ou aurícula direita (figura 10),podem causar cicatrização e estenose das paredes venosas,

Fig. 9 - Artéria hepática direita substituída, com origem na artéria mesentérica superior. Imagem MIP (maximum intensity projection) de TCdemonstra a origem da artéria hepática direita a partir da mesentérica superior. Trata-se de paciente submetido a quimioembolização de HCC,confirmando-se na angiografia esta variante anatómica.

alterando o procedimento cirúrgico, e eventualmenteimpossibilitando a realização de transplante com dador vivo.Se a extremidade inferior do shunt se estender à veia portaextra-hepática, obriga a ressecção ou endarterectomia dessaporção da veia. Estes procedimentos aumentam a taxa decomplicações intra-operatórias.

Fig. 10 - (a) TIPS adequadamente colocado. As imagens (b) e (c) demonstram, em pacientes diferentes, TIPS com extremidades em topografiademasiado superior e inferior, respectivamente. Em (b) o topo superior estende-se à veia cava inferior. Em (c), a extremidade inferior está na veiaporta extra-hepática.

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Conclusão

O conhecimento dos achados tomodensitométricosclinicamente mais relevantes é crucial para a adequadaorientação terapêutco e planeamento cirúrgico nospacientes candidatos a transplante hepático.

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Correspondência

Ricardo CastroServiço de RadiologiaCentro Hospitalar de São JoãoAlameda Prof. Hernâni Monteiro4200-219 Portoemail: [email protected]