Em seu livro Criminologia Radical, Juarez Cirino dos Santos prope a construo de uma nova base terica para a criminologia, que, atravs de um mtodo dialtico, consiga superar o vis de classe tpico das teorias conservadoras. Desse modo, Cirino procura, simultaneamente, demonstrar as fraquezas e debilidades das teorias criminolgicas tradicionais, indicando seu carter classista, e propor uma moldura terica moderna para os estudos criminalsticos, que leve em considerao os conflitos intestinos s sociedades modernas. Como o autor persegue uma linha de raciocnio marxista, suas reflexes no permanecem meramente em nvel terico, mas tambm constituem, efetivamente, propostas reformistas/revolucionrias para mudana da realidade. Com base na ideia de prxis, a criminologia radical de Cirino dos Santos no apenas quer repensar o mundo, mas mud-lo, em termos concretos. De acordo com Cirino dos Santos, a criminologia tradicional uma criminologia conservadora e burguesa. Seu esqueleto terico reflete, em maior ou menor grau, os interesses da classe dominante a burguesia. So teorias que descrevem a realidade de acordo com as categorias socioeconmicas cristalizadas. Sob a capa do cientificismo neutro, no tem como fim mudar a realidade, mas apenas descrev-la. Seu positivismo conservador, pois leva estagnao dos fatores sociais. Logo, as teorias burguesas, pretensamente neutras, servem ao interesse de classe e levam ao congelamento do status quo. Em outras palavras, apesar de se proclamarem neutras, levam tanto ao arrefecimento das possibilidades revolucionrias contidas na luta de classes, como perpetuao das desigualdades sociais resultantes da explorao classista. Em resumo, a teoria conservadora duplamente danosa pois (i) suas consequncias tericas so incorretas e (ii) suas consequncias prticas so conservadoras, isto , procuram manter o status quo capitalista. Por exemplo, a criminologia tradicional procura explicar o crime sem levar em considerao devida que a prpria estrutura socioeconmica capitalista que produz o crime. A criminologia radical, nesse sentido, reformula o objeto da disciplina, afirmando que no estuda o criminoso (como agente social anmalo) ou o crime (como realidade ontolgica), mas os fatores que produzem o criminoso, isto , o conjunto relevante de relaes socioeconmicas estruturais e superestruturais que geram excluso e como, atravs dos mecanismos de criminalizao e de controle social, as contradies do sistema burgus so reproduzidas pela poltica criminal.Alm disso, a teoria radical de criminologia comprometida com a transformao social, o que expressa a ideia marxista de prxis. Cirino dos Santos acredita que apenas com a transio de uma sociedade capitalista a uma socialista se erguero as bases para que uma efetiva reforma penal possa ocorrer. Dentro da lgica de funcionamento do capital, a criminalizao forma de controle social pois atinge os excludos do processo de acumulao e os que contra ele se revoltam; por outro lado, protege e imuniza a elite econmica e poltica.Ao contrrio das teorias tradicionais, de matriz burguesa, a criminologia radical tem como base social o proletariado, especificamente, e, em termos mais gerais, toda a massa marginalizada formada pela sociedade de classes. A criminologia tradicional, para Cirino dos Santos, no mais que um dos ramos do pensamento jurdico conservador, cujo fim primordial, consciente ou inconscientemente, preservar as bases do sistema capitalista. Ao contrrio da criminologia radical, que distingue objetivos ideolgicos aparentes do sistema punitivo e objetivos reais ocultos, a criminologia tradicional se reduz ao estudo dos primeiros. Logo, todos os esforos tericos da criminologia tradicional so baldados ao fracasso, e mesmo as propostas mais radicais nessa linha levam a reformas contraproducentes.J a criminologia radical atua na contramo, distinguindo que o sistema penal no serve para controlar a criminalidade, mas, antes, para manter o sistema capitalista atravs da ideologia da criminalidade. Nisso, ela se distingue de outras teorias criminolgicas da esquerda, pois , como diz seu prprio nome, radical. As demais teorias de vis esquerdista permanecem ou idealistas ou apenas reformistas, pois no percebem que o problema do crime um problema estrutural, nos termos que o conceito de estrutura adquire na obra de Marx. a prpria estrutura socioeconmica que determina a existncia do crime e do criminoso na sociedade burguesa. Nesse sentido, apenas com um deslocamento estrutural radical, na viso de Cirino dos Santos, poder ser resolvido o problema da criminalidade de forma concreta. Um dos principais objetivos da criminologia radical a crtica do conceito de crime. Segundo Cirino dos Santos, a definio jurdica de crime, que constitui o principal objeto da cincia criminolgica, relaciona-se, dentro da moldura terica conservadora, ideologia de neutralidade do direito. O sistema jurdica apresentando, de acordo com essa ideologia, como instrumento legtimo para criar uma sociedade justa, sendo o criminoso o elemento que deve ser isolado e reeducado. Na verdade, porm, o conceito de crime, assim como o resto do sistema jurdico, atua como instrumento de controle daqueles que so explorados e vitimados pelo sistema socioeconmico estabelecido os trabalhadores e os marginalizados sociais. Assim, em contraposio a um conceito burgus de crime, a criminologia radical formula um conceito proletrio de crime, tentando purificar este termo das deformaes ideolgicas a que submetido pelo pensamento conservador. De acordo com Cirino dos Santos, uma definio proletria de crime deve se alicerar nos direitos humanos tomados em perspectiva socialista, isto , uma perspectiva comprometida com a concreta emancipao social de todas os componentes do grupo social. Isso equivale abolio das desigualdades materiais e polticas existentes no atual quadro histrico capitalista, pois, ao tomar o sistema prisional como superestrutura material e ideolgica do modo de produo capitalista, se faz necessria a superao do prprio sistema para uma revoluo concreta, que v alm das medidas liberalizantes costumeiras, que montam perpetuao do velho sistema em novas roupagens. Nesse sentido, tambm papel da teoria criminolgica radical consolidar uma conscincia de classe, mostrando aos excludos e explorados que o crime uma categoria intrnseca ao sistema capitalista e que sua superao depende da ao coletiva, mirando a constituio de uma comunidade amparada na frmula poltica socialista. Central criminologia radical , tambm, a anlise e desconstruo do sistema carcerrio. Este, segundo Cirino dos Santos, reproduz duplamente as ambiguidades do capital: (i) reproduz as relaes desiguais capitalistas, pois separa trabalhador dos meios produtivos e (ii) reproduz os excludos. Na verdade, a priso, para Cirino dos Santos, apenas contraparte da fbrica, consequncia lgica desta. A inverso da equao tambm vlida, sendo a fbrica espelho do sistema prisional. A classe explorada permaneceria, assim, trancafiada nesses dois polos e sua libertao implica, necessariamente, a dissoluo de ambos mecanismos de excluso econmica e opresso social.