Direito Penal II 2014.docx

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    Direito Penal II

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    2013/2014

    Definio de crime: aco tpica, ilcita, culposa e punvel:1. Aco (objectivamente censurvel):em primeiro lugar, tem de haver umaaco humana (deixa-se de fora o mundo das coisas e dos animais irracionais)isto , tem de haver da parte de uma pessoa uma aco, um comportamentoque seja dominado pela vontade ou que possa ser dominado pela vontade.Se o direito penal serve para retribuir um mal com outro mal para prevenir queum certo tipo de actos acontea ou se repita, s faz sentido que o direito penalse dirija a situaes em que actuar dependa da vontade das pessoas. Noscasos de sonambulismo ou hipnose diz-se que no chega a haver um factovoluntrio, no chega a haver uma aco no sentido prprio, no fazendosentido considerar que praticou um crime, mesmo que externamente aquilo quefez correspondesse a um tipo de crime existente no CP.Da que o primeiro elemento da definio de crime signifique que tem de haverum comportamento humano dominado pela vontade; e isto porque o direitopenal se dirige a pessoas, no sentido de tentar que elas se decidam pelaobedincia e no pela desobedincia, pelo que a vontade tem de estarpresente na deciso.O acto tem de ser dominado ou dominvel pela vontade. Pode dar-se aseguinte situao: um individuo que guarda agulheiro dos caminhos de ferro

    deixa-se adormecer, sabendo que da a algum tempo vem um comboio quedescarrilar caso ele no mude a agulha. No foi dominado pela vontade nomomento em que o guarda agulheiro est a dormir, simplesmente ele no deviter-se deixado adormecer. Nessa situao no h facto dominado pela vontadeno sentido imediato anterior, mas h dominao no facto que deu causa aoadormecer (aco livre na causa).No art. 154/1 CP diz-nos que o facto justificado quando praticado numasituao de coaco fsica; por outras palavras, no tem responsabilidadecriminal. A pessoa no tem capacidade de aco, isto , nessas situaes a

    pessoa no pratica uma aco, no pratica um facto voluntrio e portanto nofaz sentido discutir em relao a ela a eventual responsabilidade criminal. Aquise enquadram os exemplos do sonambulismo, da hipnose e da pessoa que foiatirada contra a vitrine.Por outro lado, quando se diz que o crime uma aco, para alm de issoimplicar que tudo o que no sejam factos voluntrios fica de fora, tambm seabre a discusso infindvel de saber o que quer dizer aco e o que quer dizeromisso. O termo aco est-se a referir no s situao do individuo quepuxa de uma pistola e d um tiro e mata o outro, mas tambm se est a visar asituao do individuo que, sendo obrigado nos termos do cdigo da estrada a

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    socorrer o ferido, o no faz. Isto , uma pessoa omite um comportamento a queest obrigado.O art. 131 CP ao definir homicdio, utiliza termos que na linguagem vulgarcorrespondem a uma aco. Quando que se poder dizer, por exemplo, queo pai que no salvou o filho o matou para efeitos do 131? O problema que selevanta a este preceito o de saber quando que um comportamentoomissivo, que provoque um certo resultado deve ser considerado equiparvel,para efeitos de gravidade e punio criminal ao comportamento que estdefinido tipicamente na lei como se se tratasse de um comportamento activo,ou seja, de uma aco.

    2. Tipicidade (objectivamente censurvel): ser uma aco tpica significa queela tem de corresponder a um dos tipos da parte especial do cdigo.Tpica significa que uma certa aco concreta corresponde, nos seus traosessenciais, a um tipo legal de crime. Esse tipo deve ser dividido em duas

    partes para clareza de anlise: tipo objectivo e tipo subjectivo.Tipo objectivo: quando o art. 131 do CP diz aquele que matar outrem, queristo significar que objectivamente tem de existir uma situao em que umapessoa tenha morto outra (se no fosse uma pessoa j no seria crime dehomicdio, mas possivelmente um crime de dano). Quando se diz matar, pe-se todo o problema da causalidade, ou seja, saber em que situaes se podeconsiderar que a morte de uma pessoa objectivamente imputvel acoque uma outra pessoa praticou.Trata-se de saber, por exemplo, se uma pessoa que dispara um tiro contra

    outra e essa morre imediatamente porque a bala lhe perfura o corao, cometeum crime de homicdio; objectivamente parece que sim.Mas se, por exemplo, uma pessoa com um tiro fere outra levemente num p, eessa pessoa no caminho para o hospital tem um desastre na ambulncia emorre, faz sentido dizer-se aqui que, para efeitos do 131, na parte objectiva dotipo, esta pessoa apenas lhe causou ofensas.Tipo subjectivo: a parte subjectiva do tipo corresponde representao dessasituao objectiva na mente do agente, saber se o agente tinha conscincia econhecimento da situao objectiva tal como ela se verificava e saber se tinha,no caso do 131, a inteno de matar.No necessrio que o facto seja apenas voluntrio, mas sim doloso. Ento,para verificar se aquela pessoa que objectivamente provocou a morte da outrao fez dolosamente, preciso saber: por um lado se ela tinha conhecimento dasituao de facto, isto , se sabia que havia uma pessoa no sitio para ondedisparou. J por exemplo, se estivesse convencida que se tratava de umanimal e no de uma pessoa, se pode dizer que faltaria esse elementoconhecimento que exigvel para que se possa afirmar que houve dolo. Epara alm deste elemento conhecimento, preciso haver o chamado elementovolitivo, ou seja, preciso que a pessoa tenha a inteno de provocar um certo

    resultado.

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    3. Ilicitude (objectivamente censurvel): embora se tenha verificado que, porhiptese, esta pessoa preenche o tipo de homicdio voluntrio, pode teracontecido que quando matou a outra, ela estivesse a agir em legitima defesa.Isto , uma pessoa matou a outra e com vontade de matar, s que fez issoporque a outra pessoa, por sua vez a tinha ameaado de morte, e portantopara se defender dessa agresso. Essa pessoa, no entanto no era punidaporque tinha agido em legitima defesa (arts. 32 e 31 CP). Isto quer dizer queuma aco, embora tpica pode no entanto no ser ilcita na medida em que alei naquela situao concreta d pessoa o direito de se defender. Essa acoque em principio era um caso de homicdio voluntrio v a sua ilicitudeafastada por uma causa de justificao que justamente a legitima defesa.H que ver o desvalor da aco e o desvalor do resultado.

    4. Culpa (subjectivamente censurvel): poderia acontecer um individuo ter

    efectivamente causado objectivamente e intencionalmente a morte de umapessoa, no estando aqui em legitima defesa nem em uso de qualquer causade justificao. Simplesmente, esse individuo , por hiptese inimputvel elegalmente no tido como responsvel pelos seus actos. Isso quer dizer queesse individuo apesar de ter cometido uma aco que era tpica e ilcita, noentanto no tinha culpa porque ele no tinha capacidade de culpa (Art. 19,20, 295).H que existir uma conscincia de censurabilidade do facto e capacidade demotivao pela norma (a pessoa estava em condies para decidir de forma

    diferente?)- Liberdade;- Responsabilidade;- Conhecimento;- Conscincia da ilicitude;- Poder agir de outra maneira;- Exigibilidade;- Imputabilidade;- Falta de conscincia da ilicitude : desconhecimento da proibio (31 CP) e

    as decises de conscincia.- A inexigibilidade do art. 37 CP.

    5. Punibilidade: quando se utiliza a expresso punvel est-se a referir apenasaquilo a que vulgarmente se chama meras condies de punibilidade de que exemplo o facto de o delinquente se encontrar em Portugal para poder serobjecto de um certo processo-crime ou at o facto de no ter sido julgado nopas em que praticou o crime.

    Uma pessoa preenche com a sua actuao o tipo de homicdio voluntrio, que

    na sua parte objectiva, quer na sua parte subjectiva, em principio ela responsvel criminalmente. S deixa de o ser se concorrer alguma

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    circunstncia dirimente dessa responsabilidade, ou seja, se naquele casoconcreto, apesar de estar preenchido o tipo legal, tinha havido uma causa deexcluso da ilicitude ou da culpa. Assim, aquilo que primeira vista pareciaefectivamente um caso de crime, deixa de o ser porque por hiptese a pessoaagiu em legitima defesa ou inimputvel.

    Tentativa, frustrao, consumao: por exemplo, a situao de um individuoque quer matar outro, que lhe d efectivamente um tiro, s que a pessoa novem a morrer. Aqui j no podemos partir pura e simplesmente da aplicao do131 porque no se verifica um elemento essencial da parte objectiva do seutipo, que algum ter efectivamente morrido. Mas podemos estar perante ocrime de homicdio voluntrio tentado ou frustrado. E nessa altura j nopodemos utilizar apenas o 131 para incriminar esta pessoa: teremos de juntarao art. 131 o art. 22, consoante se trate de frustrao ou tentativa. Este artigo

    22 funciona portanto em relao ao art. 131 como um alargamento do tipo dehomicdio.Ento pegamos, por exemplo, no art.22 que define a tentativa e vamos junta-loa cada um dos crimes da parte especial e assim teremos a figura de homicdiotentado, de roubo tentado, da violao tentada e assim sucessivamente.Em relao a cada um dos crimes da parte especial que esto desenhadoscomo se se tratasse de uma situao de crime consumado, para ns termosessas figuras no como crimes consumados mas como crimes tentados oufrustrados, temos de juntar s vrias disposies da parte especial do cdigo

    os artigos da parte geral.

    Autoria e participao: h uma srie de situaes na vida real em que no uma pessoa sozinha que pratica certo tipo de crime, mas so vrias pessoasque combinam entre si fazer qualquer coisa e, dentro dessa combinao, aspessoas podem desempenhar um papel diferente.Isto , quando no estamos perante uma situao que nitidamente desingularidade do agente, ns temos o problema terico da chamadaparticipao criminosa.Assim, como problemas fundamentais, temos de distinguir a autoria daparticipao; dentro da autoria, distinguir a autoria mediata da imediata; dentroda participao, tratar dos instigadores e dos cmplices, que so osparticipantes em crime alheio.

    Concurso de crimes: a hiptese em que uma pessoa tenha praticado vrioscrimes, ou naturalmente, vrios indivduos tenham praticado vrios crimes.Pensando na situao em que um individuo aparece em tribunal acusado de terpraticado trs crimes de homicdio, ou de ter praticado um homicdio, um rouboe uma violao. A, por imposio do art. 30 do CP, esse facto de a pessoa ter

    praticado vrios crimes tem implicaes para efeitos da pena a aplicar.

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    Em situaes deste gnero, em vez de se somarem simplesmente as penasdos crimes em causa, faz-se, nos termos do 30, um cmulo jurdico, isto ,parte-se de vrias penas que correspondem a vrios crimes e depois, segundoas regras do 77 chega-se a uma pena unitria que aplicada a esse caso. oque se chama teoria do concurso de infraces.

    Teoria da infraco

    Sistema clssico: este sistema clssico deriva sobretudo das construes deLiszt e Beling.O crime uma aco tpica, ilcita e culposa.Aco um movimento corporal, dentro da viso mecanicista. Quando dizemosque o crime consiste, antes de mais, numa aco, o que se est a dizer queh um movimento corpreo, eventualmente um resultado no mundo objectivo

    que est ligado a esse movimento corporal por um nexo de causalidade.Ento e o que se passa na omisso? Se a aco que est na base da definiode um crime um movimento corpreo, como possvel responsabilizarcriminalmente uma pessoa que no fez movimento corpreo nenhum, mas quepelo contrrio ficou muito quieta e deixou de fazer algo que deveria fazer?Liszt admite esta lacuna e a partir do momento em que o faz, est naturalmentecravada a sepultura do conceito naturalista de aco.Aco tpica quer dizer que corresponde a um tipo legal de crime. Por exemplo,uma aco tpica para o 131 esse tal movimento externo que pode ser o

    disparar de uma arma que provoca objectivamente um certo resultado tpicoque a morte de uma pessoa. A qualidade de tpica significava apenas queexteriormente, uma aco entendida naturalisticamente correspondia a certocrime.A aco ilcita queria dizer que, considerando tambm apenas o aspectoexterno da actuao, ainda sem qualquer relevncia quanto ao contedo davontade, essa aco ia formalmente contra a ordem jurdica. Seria ilcita se,para alm de corresponder a certo tipo, esse indicio de ilicitude no tivessesido afastado pela existncia de uma causa de justificao.A culpa quer dizer uma ligao psicolgica entre uma pessoa e a sua actuao,o seu comportamento. E essa ligao pode ser uma inteno directa ou maisou menos indirecta de alcanar um certo resultado ou pode ser apenas umaligao de no se ter pretendido um certo resultado mas no se ter tido ocuidado de o evitar, prevendo-o ou podendo-o prever.Isto significa, por um lado, que o dolo e a negligncia so, nesta verso, formasde culpa, isto , a culpa pode ser dolo ou negligncia.Ora, nos crimes chamados de negligencia inconsciente falta totalmentequalquer ligao psicolgica entre a pessoa e a sua actuao, e da que umdos principais problemas que se pem na concepo de negligencia como

    forma de culpa, entendida neste sentido psicolgico de ligao entre o autor e

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    o seu acto, justamente o que se passa na negligencia inconsciente em queessa ligao falta totalmente.Em suma, as principais criticas a esta concepo so:- A prpria concepo de aco, que afasta a possibilidade de considerarnesse conceito genrico de aco a categoria da omisso.- O facto de se considerar a ilicitude de um ponto de vista puramente formal, oque significa que uma aco ou ilcita ou no , no h possibilidade degraduar essa prpria noo de ilicitude,- A concepo de culpa, nestes termos puramente psicolgicos no s dificultao entendimento dessa figura de negligncia inconsciente como tambmimpossibilita o entendimento de situaes em que, embora a pessoa tenhaagido com dolo ou negligncia, no entanto no punvel porque, por exemplo, inimputvel.

    Sistema neoclssico: este sistema no totalmente autnomo nem separado(da que se lhe chame neoclssico no sentido de que ainda uma continuaodo sistema anterior).Dizem os autores neoclssicos que isto no tem sentido nenhum, evidenteque o que interessa ao direito penal no uma realidade puramente objectiva,puramente factual, puramente externa, o que interessa o sentido normativo, o valor de certa actuao.Normalmente omisso significa, do ponto de vista fsico e material, a completaquietude. Donde, um conceito normativo, valorativo de aco, como o da

    escola neoclssica j permitiria abranger a omisso na medida em que umapessoa pode ter um comportamento omissivo que negue certos valores.A ideia de aco como fundamentalmente uma negao de valores atravs deum comportamento.Roxin diz que o que interessa para o direito penal considerar apenas oscomportamentos voluntrios, isto , os comportamentos que so dominadospela vontade, ou que podem s-lo. E , alis, neste sentido que aparece aexpresso do art. 10 CP. A, facto voluntrio corresponde exactamente aestes factos que so dominados pela vontade. Os actos estranhos ao domnioda vontade, ou seja, reflexos, os praticados em estado no consciente, etc.,esto automaticamente fora do direito penal, ningum pode serresponsabilizado por este tipo de actos.Para se considerar se h ou no aco para efeitos do direito penal o queinteressa saber se h qualquer coisa que socialmente corresponda ideia deaco, se h um comportamento socialmente relevante. Isto , se ocomportamento que certa pessoa teve ou deixou de ter socialmente conotadocom essa ideia de aco.Por outro lado, em relao quele velho problema que o abranger ou no aomisso, o conceito social de aco pode resolver o problema. Pensemos por

    exemplo no pai que vai praia com a criana e no a salva quando ela seafoga, podendo faz-lo; socialmente, na linguagem comum, qualquer pessoa

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    diria aquele pai matou o filho, isso seria socialmente considerado uma aco

    de matar.A tipicidade, por seu turno, teria uma correspondncia totalmente externa deum comportamento a uma descrio legal, os tipos legais de crime, para almde elementos objectivos, puramente descritivos contm elementos normativos.Por exemplo, para interpretar o que quer dizer coisa alheia impossvel faz-lode acordo com conhecimentos naturais. A prpria noo de coisa alheia juma noo dada pelo direito. Para ns sabermos se uma coisa concreta que foiretirada de uma pessoa ou no uma coisa alheia, temos de ir ver todas asregras relativas ao direito de propriedade no sistema jurdico em causa. O tipolegal de crime, a tipicidade, no so definveis em termos puramente objectivose descritivos, como coisa real, objectiva e factual, contm em si desde logoelementos que j pressupem uma certa normatizao, uma certa valorao.Por outro lado, chegou-se tambm concluso de que no era correcto ver na

    tipicidade realidades puramente objectivas, porque h tipos de crime quecontm elementos subjectivos. A tipicidade no um elemento valorativamenteneutro. Isto , o caracter tpico da aco no apenas uma correspondnciaexterna e objectiva de uma conduta ou comportamento a um certo tipo decrime, o prprio tipo de crime j tem de si elementos valorativos. A prpriatipicidade a concentrao de um juzo de ilicitude e, portanto, a verificar atipicidade de um facto no a verificao puramente objectiva externa, jimplica um juzo de valor sobre se a pessoa que preenche o tipo.As causa de justificao so entendidas como elementos negativos do tipo, ou

    seja, no so apenas qualquer coisa que vem a seguir tipicidade, so elasprprias elementos negativos do tipo de crime. Quando dizemos que um crime uma aco tpica, ilcita e culposa dizemos: tpica porque corresponde a umtipo, ilcita porque no h causas que excluam a ilicitude (faz-se um raciocniopor via negativa). Se a ilicitude quer dizer a violao de um bem jurdico, essaviolao pode realmente ser de maior ou menor gravidade, consoante aofensa, consoante a prpria importncia do bem jurdico. E da que se tenhatambm tomado conscincia de que a prpria noo, ou a prpria gravidade dailicitude era uma coisa susceptvel de graduao.Se a ilicitude consiste na violao material de bens jurdicos, isto quer dizerque, para alem do que formalmente a lei diga sobre o assunto, se numa certasituao um bem jurdico sacrificado para salvar outro que lhe idntico ousuperior, ento o prprio epteto de ilicitude tem de ser afastado.O que quer dizer culposo, ou culpa? Quer dizer censurabilidade. Se se aceitaque uma pessoa pode agir voluntariamente, mas no o fez porque, porexemplo, est ameaada por outra pessoa, esta pessoa no deve sercensurada. Isto , no se deve dizer que ela agiu com culpa.Se no faz sentido dizer que a sua actuao lcita, porque em principio irbuscar livros de outrem ilcito, no entanto no faz sentido censurar esta

    pessoa porque agiu sob ameaa grave para a sua vida, e portanto desculpvel, admissvel, que ela tenha agido assim. Isto quer dizer que a

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    essncia da culpa no est na ligao psicolgica entre a pessoa e o facto,est na censurabilidade do seu acto; isto , a ligao psicolgica entre umapessoa e o seu facto, e um resultado que pretende atingir, apenas umelemento do juzo de culpa, que pode nem existir como no caso de neglignciaconsciente.O juzo de culpa implica uma srie de elementos, implica por um lado verificarse houve dolo ou negligencia, implica por outro ado verificar se a pessoa imputvel, isto , se tem em termos de idade ou sade mental as condiespara poder ser responsabilizada pelos seus actos, e para alm disso, saber se,no processo de motivao que levou a pessoa a uma certa deciso, no houvea interveno de elementos estranhos que lhe retirassem a liberdade dedeciso. Ser justamente essa tal situao em que uma pessoa age sobcoaco moral e que portanto se pode dizer que a pessoa no censurvel.

    O finalismo: (TEORIA ADOPTADA) as trs correntes partem desta definiode carcter geral de que o crime a aco tpica, ilcita e culposa. Chama-sefinalismo porque todo esse pensamento parte da ideia de aco final.Diz welzel que quando as pessoas agem, se comportam de certa maneira, elasagem sempre com uma certa finalidade, isto , a aco humana sempre umaaco final, sempre uma aco que as pessoas desenvolvem com um certoobjectivo. E, para alm disso, no deve ser considerada apenas como umanegao de valores; a aco no direito penal deve ser entendida como existena realidade, isto , as pessoas, com o conhecimento que tm do mundo

    objectivo e das leis causais do mundo objectivo comportam-se de certamaneira para atingir determinados fins.Como ultima consequncia esta concepo vai dar ao seguinte: o dolo, ou seja,a inteno que a pessoa tem quando pratica certa aco que corresponde aum crime no j uma forma ou elemento da culpa; o dolo um elementoessencial da prpria aco.Se uma enfermeira injecta um doente num hospital com um veneno e essedoente morre, ns s podemos dizer que esta enfermeira praticou uma acode matar, se ela sabia, se tinha conscincia de o que estava naquela seringaera efectivamente um veneno. Se ela pensava que aquilo era um remdio, sno aspecto exterior e causal que houve um processo, um comportamento quelevou morte, mas no houve uma aco humana de matar.O dolo, a inteno de provocar certo resultado no deve ser apenasconsiderado como um elemento de culpa, ele deve ser considerado desde logointegrante da prpria aco tpica.No fundo, o legislador penal quando probe comportamentos probe semprecomportamentos com uma certa finalidade. Da que faa mais sentido entenderque o dolo desde logo um elemento da aco tpica e no qualquer coisa quese vem juntar quando se estuda a culpa.

    A acoquer dizer um comportamento humana no qual a pessoa se serve doconhecimento do mundo objectivo e causal para atingir uma certa finalidade.

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    Aco tpica vista quer no aspecto objectivo, quer no subjectivo.Para se poder dizer que ficou preenchido o tipo de homicdio voluntario do 131 preciso no s verificar se houve uma actuao humana que levou mortede outra, preciso tambm saber se essa pessoa que provocou a morte deoutrem tinha a inteno de o fazer, conhecia que isto se ia passar e tinhainteno de provocar essa morte.Ilcito, para o finalismo, j uma ilicitude considerada num sentido pessoal. Oque est em causa dizer-se que a pessoa que age ilicitamente pratica umafalta social, isto , h aqui um forte peso de uma concepo tico-social dodireito penal. O juzo de ilicitude j um juzo valorativo sobre a falta depreparao de uma pessoa para se comportar de acordo com os valoresdefendidos numa certa ordem jurdica.Aquilo em que consiste a culpa realmente em juzo de censura, mas fundadoem elementos puramente normativos; isto , preciso verificar para se poder

    dizer se uma pessoa agiu ou no culposamente, se uma pessoa conhecia outinha possibilidade de conhecer a ilicitude dos seus actos e por outro lado, setinha liberdade de se motivar segundo esse conhecimento. Na culpa saparecem elementos puramente normativos.Isto , a culpa estar excluda quando, por um lado a pessoa no conhea nemtenha obrigao de conhecer que o acto que est a praticar ilcito; ou poroutro lado, no tenha liberdade de se motivar segundo esse conhecimento.A imputabilidade deixa de certa forma de ser um pressuposto da culpa e passaa ser um elemento da prpria culpa, ou seja, a possibilidade de uma pessoa se

    motivar de certa maneira um elemento da culpa; e por outro lado, o finalismoleva ao desenvolvimento pormenorizado da teoria do chamado erro sobre aproibio. Isto , uma das causas fundamentais de excluso da culpa a faltade conhecimento da ilicitude de certo acto. Se o desconhecimento inevitvel,a pessoa no tem culpa em no conhecer a lei, isto , o prpriodesconhecimento no , nas circunstncias concretas, censurvel, ento apessoa no culpada e no deve ser punida.Se a pessoa no conhecia concretamente que aquele acto era ilcito, noentanto tinha a obrigao de o conhecer, isto , se o erro era evitvel, nessaaltura mantem-se o juzo de culpa sobre essa pessoa, no h afastamento daculpa, embora possa eventualmente haver atenuao.Concluso:A aco necessariamente uma aco final, o tipo deve ser analisado emelementos objectivos e subjectivos (ou, fundamentalmente, o dolo faz parte dotipo e j no parte da culpa), a ilicitude no fundo uma ilicitude pessoal (nosentido de que a pessoa demonstra o desvalor da aco quando age de umamaneira que viola o direito penal), e por outro lado, a culpa um juzo baseadoem elementos puramente normativos e desligados dos elementos psicolgicos.

    A ACO

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    Conceito:segundo a teoria finalista, aco seria o comportamento de umapessoa que utiliza o saber causal para conseguir determinado objectivo. Almde aceitarmos que a aco deve ser entendida no sentido social, o queinteressa no fundo tentar excluir da aco qualquer comportamento que noseja dominvel pela vontade. Por exemplo, A e B que andam a visitar umaexposio, a certa altura um deles d um murro no outro e esse outro caidesamparado sobre objectos de loia, partindo-os. Aqui pode levantar-se oproblema da responsabilidade por um crime de dano. Simplesmente, nestecaso, esta pessoa que caiu sobre a loia no levou a cabo uma aco nosentido de comportamento humano. No faz sentido, do ponto de vista dos finsdo direito penal, discutir sequer a responsabilidade dessa pessoa porque elaaqui funciona como uma fora inanimada.Justificam o facto os que praticam o facto violentados por qualquer fora

    estranha, fsica e irresistvel.

    Ora bem, este tipo de situao, isto , a situao em que uma pessoa nopratica sequer um acto dominado pela vontade, a no se pode dizer sequerque a pessoa tenha praticado uma aco.Pode-se dizer, do ponto de vista social, que aquilo foi um acidente. O que dirnaturalmente que quem partiu a loia no foi ele, mas foi o outro que oempurrou.Portanto, quem praticou ali uma aco e, eventualmente, quem ter cometidoum crime de dano doloso ou negligente foi a pessoa que o empurrou.

    O TIPORecapitulao:a teoria da infraco, embora geral, deve ser feita na base deuma diviso sistemtica entre, por um lado, os crimes dolosos por aco, poroutro lado, os crimes omissivos e, por outro lado, ainda, os crimes negligentes.Isto , tipos dolosos e tipos negligentes.O crime comissivo doloso, isto , por exemplo, a pessoa que pega numa pistolae mata outra porque quer mata-la. Isto , crime por aco e crime doloso.A maioria dos tipos de crime no CP est desenhada como crimes dolosos poraco e os crimes, por exemplo, negligentes e os crimes, por exemplo,omissivos serem normalmente de certa forma derivaes deste tipo ou destaespcie fundamental de crime.

    TIPO OBJECTIVO

    Tipo objectivo: em primeiro lugar, um crime tem sempre um agente. S queesse agente tanto pode ser qualquer pessoa, como pode restringir o mbitopossvel de agentes. Se virmos por exemplo o art. 131 que define o crime dehomicdio, por exemplo o crime de castrao, todos eles comeam pelaexpresso aquele que. Isto quer dizer que em principio qualquer pessoa pode

    ser agente de um destes crimes.

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    Para alm deste tipo de crimes, h alguns crimes que pressupem pela prpriadefinio do comportamento, delimitam os possveis agentes do crime.Mas para alm destes casos, h certos crimes em relao aos quais osagentes so definidos fundamentalmente atravs da titularidade de uma certasituao juridicamente definida.Por exemplo, o crime de prevaricao dizendo : todo o juiz que proferirsentena definitiva , aqui o agente do crime s pode ser um juiz. costume chamar em geral aos crimes especficos de certas pessoas numacerta situao jurdica, crimes especficos.Dentro destes crimes especficos vulgar tambm fazer uma distino entrecrimes especficos prprios, no sentido de propriamente ditos, que ser porexemplo o caso da prevaricao; e por outro lado, falar-se nos crimesespecficos imprprios, ou impropriamente ditos, que so crimes que existemcomo um tipo geral para qualquer pessoa, e que depois, se forem praticados

    por pessoas com um certa qualidade especial, passam a ser punidos de formadiferente. Por exemplo os crimes de peculato e concusso, isto estes crimess podem ser praticados por funcionrios pblicos, simplesmente, se umapessoa que no funcionrio publico praticar actos idnticos, no condenada, mas pode ser condenada por extorso e abuso de confiana. Noprimeiro caso, h um crime dito de extorso, que um crime no especifico edepois h a autonomizao da extorso com o outro crime chamadoconcusso para os empregados pblicos. Da que se diga que estes crimes(peculato e concusso) so crimes especficos imprprios.

    Crime de violao de um dever: Para Roxin, poder-se-ia fazer uma bipartiosistemtica de toda a teoria da infraco, estudando por um lado os crimes queconsistem em levar a cabo certa actividade e por outro lado, outros tipos decrime em que o que fundamental no tanto uma actividade, mas que apessoa viole certos deveres jurdicos normalmente profissionais ou deveresfuncionais aos quais est adstrita.Por exemplo, o crime de evaso de detidos em cadeias praticado pelo guardada cadeia. No se chama tanto a a ateno para o facto de o guarda nofechar a porta ou abrir a porta, mas para o seguinte: o guarda tem o dever deguarda dos presos e, na medida em que viola esse dever de guarda, ele podeincorrer num crime de evaso.Nos crimes que consistem na violao de um dever no haveria problemas deequiparao da omisso aco. Isto , em relao ao guarda indiferente doponto de vista da tipificao legal que o guarda deixe fugir o preso porque nofechou a porta ou porque abriu a porta, porque o que estava em causa tipicamente ter violado o dever de guarda em causa.Concluindo, em relao aos crimes que consistem na violao de um deverjurdico, um aspecto importante seria a total equiparao da aco omisso.

    No que respeita autoria e participao, aqui, nos crimes de violao de devero critrio fundamental da definio da autoria passaria de ser o critrio do

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    domnio do facto, para ser o critrio da titularidade do dever jurdico. Isto , oautor de prevaricao seria necessariamente um juiz mesmo que ascircunstancias se tivessem passado de modo a afastar das suas mos oprprio domnio do facto.

    Pessoas colectivas: ainda hoje se entende que a responsabilidade criminal estritamente individual, isto , s as pessoas singulares podem ser agentes decrimes. E isso ter que ver com a ideia de que o direito penal pressupenecessariamente a culpa e que s as pessoas singulares so capazes deculpa.O art. 11 admite que, excepcionalmente a lei venha a considerar que aspessoas colectivas possam ser efectivamente agentes de crimes.

    Crimes por aco e crimes por omisso: dizem-se crimes por aco crimes

    que so levados a cabo atravs de uma actuao positiva, crimes por omissoaqueles que consistem em no ter um certo comportamento que a ordemjurdica impe que se tenha no caso concreto.Dentro dos crimes por omisso vulgar distinguir-se entre crime de omissoimpura e pura. Por exemplo, o art. 60 C estrada diz que o condutor que causarum acidente obrigado a socorrer a vitima sob pena de ()independentemente do resultado dessa falta de socorro (omisso pura); aomisso impura no ser j a violao directa de um comando legal, mas olevar a cabo por omisso um resultado previsto num tipo que est desenhado

    em termos de aco. Por exemplo, se no art. 131 ns incluirmos o pai que vai praia com o filho e o deixa morrer afogado, porque o no socorre, o artigono diz que o pai tem a obrigao de socorrer o filho, mas por razoes vriasequipara-se para efeitos de responsabilidade penal esta omisso actuaode matar. E a se fala em omisso impura, porque aqui h uma violaoindirecta do comando legal.Omisses purasencontram-se expressamente previstas como conduta tpica,a omisso a conduta tpica (ex: 138, 200 e 284). Trata-se de crimes deperigo cuja violao compreende apenas a no execuo da aco devida ouum eventual resultado de perigo sem que ao agente seja imputado o resultadodanoso mesmo que este venha a ocorrer.As omisses puras bastam-se com a demonstrao de omisso da acodevida e imposta por lei; capacidade de aco por parte do agente; relaoentre omisso e a criao ou manuteno de um perigo.Omisses impuras - resultam da regra geral de equiparao da aco omisso (10/2). A construo do crime obriga conjugao com um tipo daparte especial (ex: 131 mais 10).Fundam-se na existncia de um dever que pessoalmente obrigue o agente aevitar o resultadodever de garante.

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    O agente tem posio de garante, isto , o dever de evitar o resultado danoso.A omisso da aco devida e possvel implica a imputao do resultado aoagente.Trata-se de crimes especficos prprios, s podem ser praticados por quemtenha posio de garante face ao bem jurdico em questo.As omisses impuras exigem a omisso da aco devida e imposta por lei;capacidade de aco por parte do agente; existncia de uma posio degarante; existncia de uma aco devida susceptvel de evitar o resultadodanoso; imputao objectiva do resultado omisso, isto , demonstrao deque o resultado poderia ter sido eficazmente evitado pela pratica de uma acopelo agente e que esta aco podia ter sido levada a cabo pelo agente.

    Crimes materiais e crimes formais: crimes materiais so crimes que segundoo tipo desenhado na lei pressupem a verificao de um certo resultado para

    se poder dizer que se consumou aquele crime. Por exemplo, o crime dehomicdio tal como est definido no 131 pressupe um resultado do mundonatural que a morte de uma pessoa (crime material).Crime formal ser, o caso do crime de envenenamento, punidoindependentemente do resultado. Desde que uma pessoa administresubstancias mortais a outra e independentemente de essa outra pessoa morrerou no, o crime de envenenamento est consumado, da que se diga ser umcrime formal ou de mera actividade.A estes crimes de mera actividade, do ponto de vista dos crimes praticados por

    aco, corresponde nos crimes praticados por omisso, o crime de omissopura, isto , o cdigo da estrada diz que se o condutor no socorrer a vitima deum acidente que ele prprio provocou ou que outra pessoa causou, desdelogo punida por no prestar auxilio. O crime de omisso pura consiste em omitirum comportamento devido e a pessoa punida independentemente doresultado. Quer o sinistrado morra ou no, ou seja socorrido por outra pessoa,o crime esta consumado.Mas independentemente de ter havido esse resultado morte, j estconsumado o crime de omisso de auxilio a partir do momento em que apessoa verifica que h sinistrado e passa adiante sem o socorrer. Assim, oscrimes de mera actividade e os crimes de omisso pura so os dois casos decrimes formais que se opem aos crimes materiais que pressupem certoresultado.

    Crimes de perigo e crimes de dano: por exemplo o crime de homicdio umcrime de dano (131) e pressupe que tenha havido um dano efectivo vida deuma pessoa que consiste na prpria morte, para se poder dizer que houvecrime de homicdio.Mas, por exemplo, o cdigo pune quem vender substancias abortivas ou

    venenosas e pune apenas porque se criou uma situao de perigo. No preciso efectivamente que algum tenha utilizado as substancias, que tenha

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    jurdicos essa actuao causa desse resultado e portanto essa pessoa deveser responsabilizada, por exemplo, por aquela morte.Para efeitos do direito penal s se pode dizer que o evento consequncia deuma certa actividade quando essa consequncia quando essa consequncia tpica, normal, previsvel segundo as regras gerais da vida.O que faz sentido aqui no fundo dizer que ele causou uma ofensa corporal,partiu-lhe o p. Portanto responsvel por ter partido o p. Tudo o que vemalm disso, tudo o que normalmente imprevisvel no faz sentido entenderque o direito penal o probe.Um juiz que tenha de decidir, por exemplo, se um individuo acusado dehomicdio causou, no sentido jurdico-penal, a morte de outro, o que ele vaifazer para saber se esta pessoa responsvel pela morte fazer aquilo a quese chama deprognose pstuma. Uma pessoa, antes de uma coisa acontecerprev certa coisa. Bom, como fico jurdica que , o juiz imagina uma pessoa

    media colocada nas circunstancias concretas em que aquele determinadoagente praticou o acto e pergunta se para uma pessoa colocada nestascircunstancias, era previsvel que da sua conduta derivasse aquele resultado.O juiz vai tentar averiguar se para uma pessoa media colocada nascircunstancias concretas era ou no previsvel o desenrolar dosacontecimentos.No normal, segundo as regras gerais da experiencia da vida que de umpontap que leva a partir o p derive a morte de outrem. Qualquer pessoamdia que faa um arranho a outrem no prev, nem exigvel que preveja

    que essa pessoa morra porque, por hiptese, ela hemoflica e portanto osangue no coagula e ela tem uma hemorragia at morte.Mas para uma pessoa que saiba que a outra sofre dessa doena, perfeitamente previsvel que ela venha a falecer. Assim a teoria reformula-se,dizendo que um evento consequncia de um certo acto quando uma pessoamedia colocada na posio concreta daquele agente, tendo em consideraoos conhecimentos concretos que aquele agente tinha, se para essa pessoamdia naquelas circunstancias e com aqueles conhecimentos era ou noprevisvel que do seu comportamento resultasse determinado evento.

    Princpios da teoria da imputao objectiva:1. S faz sentido considerar um evento consequncia de certo comportamento

    quando esse comportamento criou um risco juridicamente relevante no sentidode fazer esse evento acontecer.Por exemplo, a historia de um individuo que tem um tio muito rico que nuncamais morre; ele quer herdar do tio e como ele nunca mais morre ele vai-lheoferecendo sucessivos bilhetes de avio para ver se um dia o avio cai e o tiomorre. Um dia o avio cai mesmo e o tio morre. No se pode punir o sobrinhoporque a sua actuao cai dentro de um r isco permi t ido.O conhecimento daquela pessoa concreta no era afinal um conhecimentoverdadeiro, era apenas um desejo. No fundo, a pessoa esperava que o raio

    casse, esperava que o cogumelo estivesse envenenado, portanto isso no eraum verdadeiro conhecimento, mas uma superstio. Pode-se dizer que neste

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    caso no h criao de risco em termos juridicamente relevantes pois os riscosexistem e fazem parte da vida normal. Portanto, o facto de a pessoa pedir queoutra saia durante a trovoada ou tentar causar a morte por exemplo atravs deoferecer bilhetes de avio a outra , por muita vontade que a pessoa tenha quea morte se d, andar de avio uma actividade perfeitamente licita e oferecer

    bilhetes s outras pessoas para andarem de avio tambm , um risconormal e admitido da circulao area, donde em principio parece que aqui nose poder dizer que h realmente uma criao de um perigo, h apenas umatentativa quase supersticiosa do aproveitamento de uma circunstancia normalda vida.Isto seria um dos princpios: para se pod er imp utar jur idicamen te um eventoao com por tamento de um a pessoa preciso q ue esse compo rtamentotenha criado um risco ju r idicamen te relevante.2. Isto quer dizer, por exemplo, que se com um comportamento em vez decriar ou aumentar um certo risco a pessoa provoca a diminuio do risco, issopode querer dizer que ento no faz sentido fazer-se a imputao. Por

    exemplo, uma pessoa que assiste a uma outra pessoa atirar uma pedra cabea de um terceiro e se intromete, desviando essa pedra da cabea paraum p, por exemplo; logo a nvel da imputao no faz sentido dizer que eleprovocou ofensas corporais, porque nesse caso o comportamento dele noconsistiu na criao de um risco juridicamente condenvel, pelo contrarioconsistiu em diminuir um risco que naquele momento j existia.3. Mas a este propsito h um celebre caso que foi decidido pelo supremotribunal alemo que a historia de um industrial que fabricava pinceis depintura com pelo de cabra. Esse plo tinha de ser tratado com um certodesinfectante seno poderia causar doenas ou at a morte nas pessoas que omanejavam. E assim sucedeu, morreram quatro operarias porque no tinhasido utilizado esse desinfectante. O tribunal decidiu que essa falta de utilizaodo desinfectante deveria ser considerada causa da morte das operarias a noser que se provasse que mesmo utilizando o desinfectante o risco era igual.Portanto, h sempre um risco que pode ir at morte mesmo utilizando odesinfectante. Isso acontece como sabem nas instalaes industriais, h certasregras de segurana que tentam diminuir um certo perigo de exploso e noentanto, mesmo obedecendo lei h sempre um risco de que essas coisasaconteam.Por exemplo, um medico que faz um interveno cirrgica. Suponhamos queele no desinfecta as mos, como normal. Pode-se defender em tribunal

    dizendo que mesmo que tivesse desinfectado as mos havia srios riscos deinfeco porque j havia, por exemplo, uma peritonite e portanto havia gravesriscos de infeco mesmo que ele tivesse desinfectado as mos.Haveria em principio responsabilidade desse mdico na medida em que eleaumentou o riscode infeco. Isto quer dizer que o medico ultrapassou olimite do risco permitido e portanto a partir do momento em que vai alm dorisco permitido, ele pode tornar-se juridicamente responsvel pela produo doevento.4. S faz sentido responsabilizar, em termos de imputao objectiva umapessoa por um resultado quando existe uma relao directa entre o deverviolado e o resultado. Por exemplo, um condutor atropela, por ir em excesso de

    velocidade, um peo matando-o. A me deste tem um acidente cardaco mortalao receber a noticia. Neste caso, a negao de imputao objectiva do

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    resultado s pessoas que assim actuaram pode fundar-se em que ( apesar deos comportamentos em causa terem sido condio do resultado por um lado, epor outro terem criado ou aumentado o risco de os acidentes se darem) oalcance, o sentido, a esfera de proteco da norma( que impe que osautomobilistas no excedam o limite de velocidade) no abarcam para efeitos

    de aplicao do 137 (homicdio negligente) esses danos indirectos mediatos.Esses casos so exemplos de situaes em que uma pessoa provoca umdesenrolar de acontecimentos que vai provocar uma certa consequncia massempre com a caracterstica de tudo se passar por um processo anormal,atpico e portanto em principio usando a ideia de adequao no eranormalmente previsvel que as coisas assim acontecessem; por exemplo,nestes dois casos, a mae do atropelado que morre com o choque da noticia.Pode-se dizer que o conduto responsvel pela morte da me? No.Mas o condutor, em relao morte desse terceiro pode ter actuadodolosamente, isto , eles podem ter consciente e voluntariamente provocadoum desenrolar causal de acontecimentos atpico, ou seja, eles utilizaram esse

    prprio processo anormal atpico de uma forma consciente e voluntaria.Quer dizer no fundo que a questo da causalidade no uma questototalmente separada dos outros problemas de ilicitude como , por exemplo, aavaliao da existncia ou no existncia de dolo.Por exemplo, que o condutor que conscientemente e voluntariamente atropelae mata uma pessoa para provocar me a morte porque sabe que ela cardaca e com certeza ter essa reaco mortal, que essa pessoa no fundotenha usado um processo um pouco estranho, esta pessoa no fundo matou nosentido do 131.Portanto, nestas situaes parece ainda correcto dizer que o 131 foipreenchido. O facto de uma pessoa ter utilizado um processo causal que no normal nem tpico, se o faz com conscincia e com vontade que isso se passe,no exclui a sua responsabilidade.Nestes processos ou tipo de crimes dolosos com processos causaisirregulares, a alternativa possvel seria considerar que apesar de ter havidomorte, tinha havido apenas uma tentativa de homicdio, porque o resultado jultrapassava em termos objectivos a sua actuao.

    Desvios irrelevantes do processo causal: uma pessoa que atira outra deuma ponte abaixo para que ela morra afogada na agua, s que antes de elachegar agua bate com a cabea no pilar da ponte e morre da pancada. Bom,

    em termos puramente de imputao da causalidade sempre se pode dizer que normal e previsvel que quem cai de uma ponte abaixo, antes de chegar agua e morrer afogado, morra por hiptese porque bate ou no pilar da ponte oucai na margem do rio. Em principio, este desvio relativo do processo causal irrelevante porque o desvio ocorrido ainda cai dentro da previsibilidade normale do perigo criado.Causa virtual: de uma causa que aconteceria se isso ou aquilo no sepassasse. So situaes como, por exemplo, o individuo que pe uma bombano avio para este explodir, s que por hiptese, no momento da bombaexplodir, o motor explode por outra razo qualquer que no tem nada a vercom a bomba.

    Se a exploso do avio se deveu bomba ento, mesmo que o avio cassemomentos depois por outro motivo qualquer, a questo no se pe. A questo

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    pode-se por se o avio por hiptese explode antes da hora de a bombaexplodir e por hiptese depois se vem a descobrir que a bomba estava l. Aqui,embora tenha havido morte, possvel dizer que a morte no aconteceu porcausa da bomba e portanto seria eventualmente um homicdio frustrado.A propsito de uma situao deste gnero, isto , de morrer dias, horas ou

    segundos antes, Jescheck d um exemplo que uma situao em que esttudo preparado para haver uma execuo de morte, o condenado morte estposto na guilhotina e imediatamente antes de o carrasco fazer descer a lamina,o pai da criana que o criminoso matou faz ele prprio baixar a lamina. Adianta-se minutos os segundos ao carrasco. Aqui h mesmo um crime de homicdiovoluntario, mesmo que da a segundos o carrasco fizesse descer a lamina oudeixasse de o fazer.Outro exemplo a situao de A e B, sem se conhecerem, decidem matar c atiro e fazem-no simultaneamente sem conhecimento um do outro. Apenas umabala atinge C. Temos aqui uma causalidade alternativa e ambos devem serpunidos por tentativa de homicdio de C.

    TIPO SUBJECTIVO

    O tipo subjectivo: isto , para se preencher o tipo de homicdio voluntario,para alm de ser preciso haver uma pessoa que mate outra, com tudo o queisso implica, preciso matar voluntariamente. Aqui, voluntariamente quer dizerdolosamente, isto , quer dizer matar outra pessoa sabendo que se est amatar e querendo matar.No direito portugus, a regra de que as pessoas s so responsveiscriminalmente quando agem com dolo, excepto nos casos em que a leiexpressamente preveja que a pessoa possa ser responsabilizada a titulo denegligncia (13).

    Dolo: segundo o art. 13, a regra o crime doloso e a excepo o crimenegligente. S em alguns casos em que o cdigo expressamente imputa atitulo de negligencia que se pode punir penalmente uma pessoa por teractuado com negligencia. Em regra, s punido em termos criminais quemactua dolosamente, ou seja, que preencha o elemento subjectivo do tipo decrime que consiste no conhecimento dos elementos objectivos desse tipo e navontade de praticar certo acto ou atingir certo resultado.Elemento intelectual: para se poder dizer que h dolo em relao a certo crime

    necessrio, em primeiro lugar, que o agente tenha conhecimento doselementos desse mesmo crime. Por exemplo, para se poder dizer que umhomem praticou uma violao, preciso que esse homem tenha conscinciade que tem relaes sexuais com uma mulher contra a vontade desta, ele temde saber que aquilo contra o que dispara uma pessoa, e no por hiptese umanimal ou uma arvore; para se poder dizer que algum tem dolo de passagemde moeda falsa, esse algum tem de saber que a moeda que lhe entregarampara passar falsa.Todos os elementos essenciais do facto tpico, da parte objectiva do tipo decrime tm de ser reconhecidos pelo agente para se poder dizer que ele actuoudolosamente.

    Esse conhecimento tem de ser um conhecimento actual. Por exemplo,suponhamos que um mdico a dada altura da sua carreira receitou a um

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    doente um certo remdio e esse doente teve uma reaco alrgica que lhe eradesconhecida e que por pouco no foi mortal. Vinte anos depois, a mesmasituao acontece, ele volta a receitar o mesmo remdio ao mesmo doente epor hiptese o doente dessa vez morre. Ele tivera conhecimento 20 anos deque aquela pessoa era alrgica ao remdio, mas vinte anos depois j no se

    lembra disso, no tem conhecimento actual dessa circunstancia.Pode ter havido negligencia da sua parte, eventualmente pode ter cometidohomicdio negligente, mas no cometeu um homicdio doloso, pois no tinhanaquele momento conhecimento de que aquele doente em concreto eraalrgico ao remdio.Mas o conhecimento actual no tem de ser propriamente um conhecimento ounoo viva e exacta de todos os pormenores. Por exemplo, um homem quecometa um crime de estupro numa rapariga entre 12 e 18 anos muitoprovavelmente no est a pensar de uma forma consciente, ntida e viva se apessoa tem 13, 14 ou 15 anos, etc.. No preciso que um individuo que praticao crime esteja a pensar, no momento concreto que o faz, nos elementos do

    crime. preciso que ele tenha conscincia, embora seja uma conscinciaperturbada por uma certa emoo no momento de praticar o crime.Este elemento intelectual, ou seja, o conhecimento diz respeito a uma serie deelementos, entre eles elementos descritivos. Por exemplo, necessrio aexistncia de uma pessoa vitima para o crime de homicdio. Uma pessoa elemento descritivo, neste sentido.Mas para alm desses elementos descritivos (coisa, pessoa, animal) ounormativos (coisa alheia, documento, documento falso), por vezes o dolo noseu aspecto intelectual exige tambm o conhecimento de um certo processocausal. Isto , para alm de saber que uma pessoa, por hiptese, est suafrente contra a qual utiliza alguma forma de agresso (disparo, por ex.) prevejaque aquela actuao levar morte. Se uma pessoa est convencida de queaquela agresso que est a praticar no leva morte, mas apenas fere, emprincipio no se poder dizer que aquela pessoa tenha conscincia de quehaver ali um processo causal que leva morte e que, como tal, tenha dolo dehomicdio. Portanto, em ultima analise, o que est em causa saber se umapessoa matou voluntariamente outra para efeitos do 131.

    Teoria do erro: O art. 16/1 dispe que o erro sobre elementos de facto ou dedireito de um tipo de crime exclui o dolo. Entenda-se aqui elementos de direitoda descrio do tipo, uma referncia, por exemplo, a documentos ou coisa

    alheia. Depois no 16/3 diz-se que fica ressalvada a hiptese de punir pornegligencia. O 16/2 faz referencia ao erro sobre os pressupostos de facto deuma causa de justificao em relao ao qual se opta por dizer que tambmexclui o dolo.

    1. Erro sobre o tipo: o que se trata de uma representao errada, ou de umafalta de representao, de elementos do facto tpico. Por exemplo, a pessoaque no sabe que ali no sitio para onde dispara est uma pessoa; a pessoaque no sabe que a moeda que lhe passada falsa. Todas estas situaesso situaes de erro sobre o tipo.

    2. Erro na execuo: Vulgarmente conhecido como aberratio ictus. Quer dizer queuma pessoa pretende atingir um certo objectivo, mas atinge outro. Por

    exemplo, eu aponto uma arma a A e por erro de pontaria, acerto em B. No haqui problema de identificao errada da realidade objectiva, o que h um

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    desvio do processo. Se o objecto for idntico, isto em vez de acertar em A,acerta em B, h um crime de homicdio doloso consumado. Se por hiptese,em vez de se acertar no co, se acerta numa pessoa, h um concurso entreuma tentativa de crime de dano (co) e uma consumao de homicdionegligente.

    Ou ainda, por exemplo, uma pessoa ter fabricado comida com veneno, t-ladeixado num sitio onde pensa que uma outra vai encontrar e comer e portantoser envenenada e acontece que por motivos estranhos outra pessoa quecome a comida.Ou ainda, por hiptese, uma pessoa encarrega outra de matar uma terceira edeu-lhe uma fotografia e pagou dinheiro. O killer pega na fotografia e troca aidentidade de uma outra pessoa com a pessoa visada. O matador profissionalest ele prprio em erro sobre a pessoa, porque identifica erradamente umafotografia com uma pessoa que no dona daquela cara. Mas para quemencomendou a morte (instigador), o que h uma situao de aberratio ictus.Dentro do prprio erro podemos falar de erro sobre a pessoa ou o bjec to docr imeou sobre outras circunstancias. Esta situao corresponde a umainterpretao errada da identidade de uma pessoa ou objecto. Uma pessoaquer matar outra e por erro de identificao mata antes uma terceira (A quermatar B e mata C pensando que B). Isto um acto que corresponde a umcrime de homicdio praticado com erro sobre a pessoa. Aqui houve pura esimplesmente um homicdio doloso consumado na pessoa que foiefectivamente morta porque o tipo de crime doloso de homicdio como estdefinido consiste em matar voluntariamente. E senha o senhor B ou C, osenhor A matou voluntariamente outra pessoa e portanto h um homicdioconsumado na pessoa de B ou na pessoa de C, tanto faz para efeitos de direitopenal.Como pode acontecer que por hiptese ele queria matar um animal de caa e

    aquilo que ele identifica objectivamente como tal afinal uma mulher a apanharlenha. A tambm h uma falsa representao da realidade que acaba emtermos objectivos por preencher um tipo de crime. No primeiro caso ele em vezde matar uma pessoa matou outra, isto , os objectos do crime era tipicamenteiguais e no segundo caso os objectos no so tipicamente idnticos. Aqui, ele,identificando de uma forma errada determinado objecto que pensa que umanimal, e afinal uma pessoa, acaba por praticar um acto completamentediferente daquele que era a sua inteno. Aqui no houve homicdio doloso, sque houve efectivamente uma morte e poder ter havido crime de homicdio

    que quanto muito seria negligente. Em relao ao co do vizinho, trata-se davontade de matar o co, que em principio crime de dano. Neste caso, asoluo correcta entender que h uma tentativa de um crime de dano doloso(tentar matar o co) e um crime de homicdio consumado negligente. H umconcurso de crimes entre uma tentativa dolosa e uma consumao negligentede um crime de dano e de um crime de homicdio.Uma terceira hiptese ser uma pessoa querer matar outra com a qual no temqualquer ligao e por erro de identificao vir a matar o prprio pai ou me. Adiferena nesse caso em relao aos outros dois que, embora aqui se tratede duas pessoas e portanto de dois possveis objectos idnticos no sentidojurdico, eles no so tipicamente idnticos porque matar uma pessoa um

    crime de homicdio e matar o pai ou me um crime de parricdio. Isto , aquios objectos fazem alterar a valorao ou a censura jurdico-penal.

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    Aqui pareceria que a soluo mais razovel seria entender que haveriaconcurso de crimes entre uma tentativa dolosa de homicdio e umaconsumao de parricdio negligente, se se admitisse (coisa que o cdigo nofaz) que o parricdio fosse punido a titulo de negligencia. Isto , a pessoa serpunida por homicdio doloso consumado.

    Outra figura o erro sobre as c i rcunstanc ias, por exemplo, a caractersticada falsidade de uma moeda, a qualidade de alheia de uma coisa, todas estascircunstancias so elementos essenciais dos crimes de passagem de moedafalsa, de furto, mas podem ainda ser circunstancias agravantes deresponsabilidade.

    3. Erro sobre o processo causal: o erro em relao a crimes de forma livre irrelevante. Mas h certos crimes que no so de forma livre, mas de formavinculada. o caso tpico do envenenamento. Para haver envenenamento,com morte ou sem ela (porque um crime formal, no necessrio havermorte) preciso que o processo de possvel conduo morte seja umprocesso de envenenamento no sentido jurdico e no rigorosamente apenas

    no sentido mdico, porque por exemplo, o vidro modo juridicamente umveneno.Por exemplo, se uma pessoa resolver atirar cabea de outra uma pedra paraa matar e por hiptese esta pedra contiver uma substancia venenosa e apessoa atingida morrer do envenenamento, se a pessoa no sabe daexistncia do veneno e a morte ocorre por aquele processo, a pessoa s podeser acusada de homicdio e no de envenenamento. Porque lhe falta oelemento de conhecimento dos elementos essenciais do crime deenvenenamento que uma substancia adequada a causar a morte. No seudolo, no seu conhecimento, s abarcou uma situao de homicdio, noabarcou a situao de envenenamento que punida de forma mais grave.Por exemplo, dois indivduos resolvem matar um terceiro, fazem-lhe umaespera, ferem-no e ele perde a conscincia. Convencidos que ele est morto,atiram-no a um poo e ele acaba por morrer afogado. As pessoas que oagrediram at tinham a inteno de o matar, mas erraram no processo causalque se ia desenrolar. Isto , no tinham conscincia de que o que estava afazer era matar a pessoa por afogamento e no por pancadas. Nesta situao,se h uma deciso de matar, h a agresso, depois a tentativa de ocultar ocadver aqui a soluo correcta dizer que h um homicdio dolosoconsumado.J mais difcil resolver a hiptese se estas mesmas pessoas agridem um

    terceiro e deixam-no, pensando que est morto e da a 24h se lembram de iresconder o cadver. A situao aqui j pode ser outra na medida em que aquih dois actos separados no tempo. Ou mantemos que h de qualquer maneiraum homicdio doloso consumado ou em alternativa, na sua primeira actuaoh um homicdio doloso frustrado e no segundo momento h consumao deum homicdio negligente. Haver portanto, concurso de crimes.

    O elemento volitivo: o dolo pode ainda ser visto numa perspectiva de vontade.Esse elemento de vontade consiste exactamente no desejo, no facto de sequerer um certo resultado ou um certo acto. Por exemplo: obter a morte dealgum, fabricar um documento falso, violar uma mulher.

    As trs espcies de dolo: directo, necessrio, eventual.

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    Para alm desta ideia de que para haver dolo, alm de ter que haver um certoconhecimento tem de haver uma certa vontade, o problema saber at queponto se deve entender que essa vontade se encontra presente. Por exemplo,se uma pessoa dispara contra outra, directamente para a matar, no h duvidade que ela quer matar e portanto h dolo de homicdio. Simplesmente, tambm

    se poder dizer que essa pessoa quer matar a outra se por hiptese pega fogoa uma casa, no para matar algum mas porque quer obter o dinheiro doseguro, mas tendo no entanto conscincia de que est algum dentro dessacasa e que portanto como consequncia necessria do seu acto essa pessoaencontrara morte no incndio. Parece que do ponto de vista de perigosidade oucensurabilidade, esta situao praticamente idntica situao na qual apessoa tem como seu objectivo directo matar algum. Em ultima analise, hdolo de homicdio neste aspecto volitivo, pressupondo naturalmente que severifica o aspecto do conhecimento.Voltando ainda ao exemplo da pessoa que incendeia ma casa para porhiptese receber o dinheiro do seguro, essa pessoa admite que existe algum

    dentro dessa casa, isto , no tem a certeza de que algum v morrernecessariamente mas admite a possibilidade de que esteja algum dentro decasa. Portanto, pode ser que esteja e pode ser que no esteja, se estivermorre. Uma pessoa que age admitindo a possibilidade de certo resultado severifique e, admitindo essa possibilidade, no entanto poe fogo casaadmitindo que algum venha a morrer poder dizer-se que ela agiu comvontade de matar.Este tipo de situaes em que a pessoa no tem como objectivo final uma certaconsequncia, nem a v como consequncia necessria do seu acto, masadmite que ela acontea, corresponde fundamentalmente ao que se chama afigura do dolo eventual.Dolo directoser a situao em que uma pessoa mata outra porque exactamente isso que quer fazer. Directamente, a sua inteno mataralgum.Dolo necessrioser aquela situao em que uma pessoa tem comoobjectivo incendiar uma casa para obter o dinheiro do seguro, mas temconscincia de que esto l pessoas dentro que vo necessariamente morrerem consequncia desse incndio.Apesar de o problema se definir at onde vai o dolo, isto no quer dizer queseja indiferente para uma pessoa ser julgada e punida que ela tenha cometidohomicdio com dolo directo ou com dolo eventual. Embora nos trs casos

    estejamos perante um homicdio doloso, o juiz obrigado a tomar em conta, naindividualizao da pena, a intensidade do dolo.

    Distino entre dolo eventual e negligncia consciente: por exemplonaquela situao da pessoa que pega fogo casa, ns tanto poderamos dizerque se algum vier efectivamente a morrer em consequncia do incndio, quea haveria um homicdio doloso ou que por hiptese haveria um crime de fogodoloso, mas apenas um homicdio negligente. Seria sem duvida assim, se apessoa ao colocar o fogo no lhe tivesse pura e simplesmente passado pelacabea que l poderia estar algum. E no entanto, ela deveria ter tido ocuidado de verificar, e portanto isso seria um homicdio negligente.

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    Mas nessas situaes, frequentemente, no muito fcil distinguir as duasqualificaes. E o problema que isto tem uma importncia fundamental. Apunio do homicdio doloso ou negligente completamente diferente.Por outro lado, pode haver situaes em que pura e simplesmente essescrimes no so punidos a ttulo de negligncia. Isto quer dizer que em relao

    grande maioria de crimes, qualificar uma certa situao como dolosa ounegligente significa normalmente escolher entre a punibilidade e a impunidade. preciso distinguir entre uma situao de dolo eventual que correspondefundamentalmente ideia de que uma pessoa prev um certo resultado comopossvel e age dentro dessa aceitao. E por outro lado, a situao denegligencia consciente. Negligencia porque h uma falta de cuidado econsciente porque a pessoa tem conscincia do perigo. Isto , age comnegligencia consciente quem tem conscincia de um certo perigo mas seconvence de que ele no se verificar. Portanto, em ultima analise, o quedistingue essas duas figuras que na negligencia consciente uma pessoadesconfia descuidadamente que um certo resultado se no produz e age tendo

    previsto um risco mas convencida de que ele no se vai verificar, ao passo queno dolo eventual a pessoa age admitindo que qualquer coisa vai acontecer,qualquer coisa de ilcito, contrario ao direito.Segundo a frmula positiva de Frank poder-se- dizer que uma pessoa agiucom dolo eventual se, tendo previsto uma certa consequncia como possvel, asua atitude foi aconteao que acontecer, eu actuo.

    Os crimes preterintencionais: situaes em que as pessoas eram punidasno tanto por actuarem com dolo de uma certa consequncia, ou comnegligencia em relao a ele, mas por terem provocado certo resultado, isto ,aquilo a que hoje em dia se chama os crimes preterintencionais, crimes quevo alm da inteno do agente.Suponhamos que uma pessoa atira outra agua, s para aborrec-la umbocado, e essa pessoa morre afogada. Isto , uma pessoa age com intenode no limite ofender corporalmente e at de uma forma no grave mas asituao desenrola-se de tal maneira que, sem o agente ter tido essa inteno,a vitima vem a morrer dessa actuao.So exemplos, por exemplo, o homicdio preterintencional que advm deofensas corporais. Nos termos do 147 CP,o crime de ofensas integridadefsica agravadas pelo resultado um crime preterintencional em que oresultado excede a inteno do agente, ou seja, em que para alm de um crime

    de ofensas corporais doloso, o resultado imputado a ttulo de negligncia.Para o agente ser responsabilizado pela morte, ainda que alm da suainteno, entre a actuao e a morte tem de haver um nexo de adequao, oucausalidade adequada (40,70, 71,143E 147 do CP).O 147 vem dizer que a agravao no se d se tiver havido uma causaacidental entre as ofensas e a morte. Isto quer dizer que se houver um desviono processo causal, isto , uma causa acidental que se intrometeu no caminho(ser o caso do desastre da ambulncia) o nexo quebra-se e no h qualquerpossibilidade de, ainda em termos objectivos, se imputar a morte ao agente dasofensas corporais.

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    A ilicitudeA unidade da ordem jurdica e a multiplicidade das fontes legais dascausas de justificao:a ilicitude uma qualidade de um comportamento quetem de ser vista face ao conjunto da ordem jurdica e no apenas em relao lei penal. H disposies do CC respeitantes ao estado de necessidade,

    aco directa e legitima defesa que tm relevncia em sede de direito penal.A este respeito costuma-se falar no principio da unidade da ordem jurdica.Isto , um comportamento em si licito ou ilcito, o que no quer dizer que aprpria gravidade da ilicitude no varie em termos de haver comportamentosilcitos a que corresponde uma sano civil e outros comportamentos a quecorresponde uma sano penal, e eventualmente casos em que as duassanes se acumulam.

    A enumerao legal das causas de justificao no taxativa:tambm sepode pr a questo de saber se s as causas expressamente referidas na leipodem funcionar como excluindo a ilicitude em relao a certos factos, ou se

    pelo contrrio um juiz poder por exemplo encontrar causas de justificao poranalogia, em relao s que esto expressas na lei. evidente que aquelas razes que se opem interpretao extensiva e analogia em relao aos tipos incriminadores no se pem em relao snormas que contm causas de justificao na medida em que as causas dejustificao tm como efeito afastar incriminaes e portanto aqui no h oproblema de garantir os direitos individuais contra um abuso legislativo oujudicial.

    As causas de justificao (art. 31 CP e 336 e seguintes do CC):o art. 31CP tem uma enumerao meramente exemplificativa. Diz o art. 31 CP, o

    facto no criminalmente punvel quando a sua ilicitude for excluda pelaordem jurdica considerada na sua totalidade - aqui h justamente aquelareferencia unidade jurdica, isto , quando ns discutimos a licitude e ailicitude de um comportamento temos de considerar todos os diplomas legaisexistentes para verificar se em algum deles h uma autorizao para se poderactuar de uma certa maneira.E ento, os casos que aparecem referidos no art. 31 CP so: a legitimadefesa, o exerccio de um direito, o cumprimento de um dever ou de umaordem da autoridade, o consentimento do lesado.Poder-se- estranhar por exemplo que no aparea aqui a referencia ao estado

    de necessidade ou aco directa que so duas situaes caractersticas decausas de justificao; simplesmente acontece que quer o estado denecessidade ou o direito de agir em aco directa so (exerccio) de direitos.Obedincia hierrquica (271/3 CRP; 31 CP): a constituio, no 271/3 diz,depois de se referir responsabilidade dos funcionrios e agentes do estado,cessa o dever de obedincia sempre que o cumprimento das ordens ouinstrues implique a prtica de qualquer crime nunca poder haver a prticade um crime por um inferior por ordem de um superior numa situao em queele lhe deva obedincia. A referencia no CP nem obedincia hierrquica esim legalmente devida. E a constituio expressamente diz que no devidaobedincia sempre que o cumprimento da ordem leva pratica de um crime. O

    que quer dizer que pelo menos no mbito da funo publica a obedinciadevida deixa de poder funcionar como causa de excluso da ilicitude. Uma vez

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    que a obedincia nunca devida, a situao nunca se pode dar.; o que poderacontecer que uma situao de relao hierrquica possa diminuir aliberdade do inferior em se recusar a cumprir a ordem, e nessa situaopoderia eventualmente funcionar uma causa de excluso de culpa.Mas o art. 36/2 CP repete o preceito constitucional. O art. 31 CP refere-se

    possibilidade de excluso da ilicitude por cumprimento de ordem legitima daautoridade. Parece que aqui j no estamos dentro do mbito dessa outraquesto que a da obedincia hierrquica, isto , obedincia devida por umfuncionrio ao seu superior, mas que esto em causa situaes em quequalquer pessoa comum deva obedecer a uma ordem legitima de autoridade.Se um agente da policia me entregar uma pistola e disser mate aquelesenhor, isto ser naturalmente uma ordem ilegtima.Mas se, por exemplo, numa situao de emergncia um agente da autoridademe mandar entrar por uma rua em sentido proibido, naturalmente que eu noestou a cometer uma contraveno. Mas, se em vez disso me mandar, porexemplo, passar por um campo e estragar qualquer coisa que l esteja, por

    uma necessidade imperiosa de resolver uma situao de emergncia, que emprincipio corresponderiam a tipos legais de crime, se essa ordem for legitima eno for apenas abuso de funes, nesse caso eu poderei estar a cumprir umaordem legitima da autoridade. E nesses casos tambm a ilicitude que estavaindicada pela verificao do tipo de crime afastada por essa causa dejustificao.O exerccio de um direito:esta causa de justificao eminentementeresidual, uma srie de causas e justificao se podem reduzir a ela; a legitimadefesa consiste no exerccio de um direito, que o direito de defesa e portantoo interesse em principio dessa disposio ser eventualmente permitir umalargamento da enumerao das causas de justificao para alm, daquelasque esto enunciadas pormenorizadamente na lei, penal ou outra.A legitima defesa (art. 20 CRP e 337 CC):a ideia bsica da legitima defesa, se uma pessoa agredida e no pode utilizar os meios normais derepresso dessa agresso, em tempo til, em principio ela pode agir por suasprprias mos.O art. 20 CRP inclui esta figura nos direitos fundamentais. No 20 que trata dadefesa de direitos se diz, para alm da garantia do acesso aos tribunais no n1,se diz no n2 que todos tm o direito de resistir a qualquer ordem que ofendaos seus direitos e depois se diz e de repelir pela fora qualquer agressoquando no seja possvel recorrer autoridade pblica. O art. 20/2, 2 parte

    contm a definio da situao a que tradicionalmente se chama legitimadefesa.Pressupostos:Agresso ilegal e actual, no provocadaa primeira exigncia que haja umaagresso; e em principio s faz sentido falar nela quando se trate de agressohumana, isto , se por hiptese se tratar de uma agresso de um animal, noestaremos no campo da legitima defesa, mas eventualmente no campo doestado de necessidade. A no ser que o animal esteja a ser utilizado comoinstrumento por uma pessoa, e nesse caso j se tratar de uma agressohumana.Por outro lado essa agresso pode ser, quer uma agresso activa ou passiva,

    isto , quer uma agresso por aco ou por omisso.

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    Suponhamos a situao do individuo que est na praia quando outro se est aafogar, que tem boia e no a d, que a nica que existia naquele sitio e nosprximos, e que algum tira a bia fora. A utilizao forada dessa biapoderia ser uma situao de necessidade. Mas se, para lhe tirar a boia forafor preciso utilizar a violncia sobre a prpria pessoa, aqui poder levantar-se

    uma questo de legitima defesa de terceiros. A pessoa que magoa uma outraque no quer deixar utilizar uma bia para salvar uma pessoa que est amorrer afogada, aquela pessoa comete uma agresso sobre o possuidor dabia, portanto em principio haveria um crime de ofensas corporais; s que esseacto de ofensas corporais pode estar justificado por legitima defesa. Porquenaquele momento a pessoa que no empresta a bia est a cometer pela suaomisso, uma agresso sobre a pessoa que est a afogar.Por outro lado, essa agresso pode ser uma agresso a bens pessoais oubens patrimoniais, isto , tanto admissvel legitima defesa para defender bensestritamente pessoais como a integridade fsica, como quaisquer benspatrimoniais.

    Por outro lado essa agresso pode ser feita no prprio que se defende ou numterceiro. Isto , tanto permitida a legitima defesa prpria como a legitimadefesa alheia. Por vezes a legitima defesa alheia aparece sob o nome deauxilio necessrio.Esta agresso tem de ser ilegal. Agresso ilegal ou ilcita quer dizer umaagresso que pode at eventualmente no ser criminosa (por exemplo,agresso praticada por inimputvel) em relao qual a pessoa agredida no obrigada a suport-la.Se A agride B, e B se defende contra A em legitima defesa, esta defesa de Bque em si uma agresso que est justificada pela prpria situao de legitimadefesa. E da que em relao a A no se verifique por sua vez um dospressupostos da legitima defesa que haver por parte de B uma agressoilegal. Portanto, a agresso de B e A no era uma agresso ilegal.A propsito dessa qualificao de agresso como ilegal, ou como licita, Roxinchama ateno para o facto de aqui aparecer de uma forma clara a distinoentre ilicitude e culpa. Isto porque se um doente mental, ou seja, uminimputvel agredir outra pessoa de forma, por exemplo, a causar-lhe ofensascorporais, ele est objectivamente a cometer um ilcito, s que ele no condenado por ofensas corporais porque como inimputvel, consideradoinsusceptvel de sobre ele ser formulado um juzo de culpa. E portanto, no sepode rigorosamente dizer que ele cometeu um crime de ofensas corporais. No

    entanto, a sua aco objectivamente no pode deixar de se considerar ilcita ea pessoa que sofre essa agresso no tem a obrigao de a suportar pelofacto de o doente mental no ter liberdade de deciso.Isto quer dizer que uma pessoa se pode defender de uma agresso de umdoente mental, sendo embora esse doente insusceptvel de um juzo de culpa,e portanto em ultima analise a sua actuao no criminosa. Mas no criminosa porque falta o elemento culpa. O elemento ilicitude j l est.Porque a legitima defesa permitida apenas para, em termos prticos, tentarimpedir que uma agresso seja consumada, v at ao fim, s faz sentidopermitir a legitima defesa em relao a uma agresso que est iminente,portanto para evitar que ela se d mesmo, ou que ainda est em execuo. Isto

    , uma agresso que j tenha cessado, cujos efeitos j estejam finalizados, nopode ter como resposta uma legitima defesa.

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    Por exemplo: suponhamos que uma pessoa a quem furtado um objecto, eque no momento em que o agente do furto est a fugir com o dito objecto, ageem legitima defesa contra ele, o agride fisicamente para conservar o objectoque ele acaba de furtar. Em principio parece-me de admitir que nesta situaoainda possvel a legitima defesa.

    Mas j, por exemplo, se por hiptese esta pessoa que tinha furtado o objectotivesse tomado posse pacifica dele e tivesse ficado com o objecto em casadurante um ms e a certa altura o proprietrio viesse a descobrir esse objectoem caso do agente do furto, nessa altura, se este individuo se apoderasse dacoisa, j no poderia pr-se a uma questo de legitima defesa como tal, maspoderia eventualmente ser aco directa.Isto , se para assegurar o seu direito de propriedade fosse a nica coisa queele pudesse fazer nesse momento, porque por hiptese o autor do furto seapercebeu que a pessoa reconheceu o seu objecto, e se o proprietrio fossefazer queixa policia na pratica provavelmente perderia a possibilidade dereaver o dito objecto, ento isso poderia ser uma situao de aco directa.

    Uma pessoa que provoque uma agresso de outra no pode em principioresponder-lhe em legitima defesa. Qualquer provocao insignificante, comopor exemplo, uma injuria de pequena gravidade, em relao a ela no fazsentido dizer que a reaco do injuriado por hiptese tentar matar a pessoaque o injuriou, no faz sentido dizer que a pessoa que o injuriou no tem odireito de se defender.Parece correcto que a provocao, para excluir a possibilidade de legitimadefesa, deve ser uma provocao pr-ordenada. Isto , estar excluda alegitima defesa num caso em que uma pessoa provoque uma situao deagresso para depois, sob a capa de uma legitima defesa conseguir o seuintuito, que era desde o inicio uma agresso. E da que se fale em provocaopr-ordenada, isto , pr ordenada a criar uma situao em que a pessoareagisse de tal maneira que o provocante pudesse ento fazer aquilo quequeria desde o inicio que era cometer o crime de agresso.E a a situao de legitima defesa estar excluda no s por carncia deelementos objectivos, mas tambm porque essencial figura da legitimadefesa uma inteno de defesa (animus defendi).Impossibilidade de recurso fora pblica - se a legitima defesa um direitoconcedido excepcionalmente s pessoas de fazer justia pelas prprias mos,ela s faz sentido quando no for possvel em tempo til utilizar os processosnormais de coaco, por exemplo, chamar a policia.

    Por exemplo, no caso do capito Andrade e Silva em que ele era acusado deum crime de homicdio e a defesa arguia que ele tinha agido em legitimadefesa. O STM veio a entender que no se verificava naquele caso concreto opressuposto da impossibilidade de recorrer fora pblica porque quando oru tinha disparado sobre a vitima, estava um agente da PSP presente.Simplesmente, a defesa entendeu como provado o facto de que, emboraestivesse um agente da PSP presente no local, o agente no actuou em defesado ru.A impossibilidade de recorrer fora pblica, tem de ser vista em relao scircunstancias concretas: por exemplo, o facto de o agente da autoridade estarpresente pode no significar que seja possvel recorrer fora pblica, pois at

    se pode recorrer fora pblica e ela no fazer nada. Isto quer dizer que nessecaso a legitima defesa seria permitida.

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    O problema do excesso de legitima defesaainda necessrio que o meioempregado seja racional para prevenir ou suster a agresso. Essa necessidadetem como contrapartida, na sua falta, a figura do excesso de legitima defesa.Este surge quando, verificados embora os pressupostos de legitima defesa;isto , uma agresso ilegal, actual, a impossibilidade de recorrer fora pblica

    e a falta de provocao, no entanto a pessoa se excede quando se defende.No verdade que uma pessoa s se possa defender at ao ponto degravidade da agresso de que est a ser vitima. O limite da legitima defesa temmais que ver com o seguinte: aquele que age em legitima defesa s deve usardos meios disponveis naquelas circunstancias concretas, o menos violento, ouaquele que tenha consequncias menos graves. Se uma pessoa vitima deuma agresso em circunstancias tais que a nica hiptese de defesa que tem utilizar a arma, ele pode faz-lo ainda que a ofensa de que ela iria ser vitimano fosse uma ofensa com uma arma de fogo, por exemplo.Isto , agindo em legitima defesa, o defendente deve utilizar o meio menosgrave que seja suficiente para suspender ou para evitar uma certa agresso. E

    portanto, em ultima analise saber se uma pessoa agiu correctamente emlegitima defesa, ou se excedeu, tem mais que ver com as possibilidadesprticas de defesa que a pessoa tinha do que propriamente com umacomparao de gravidade entre a ofensa de que ia ser vitima, e a ofensa que,por sua vez, cometeu em legitima defesa.Mas dever-se- entender que um individuo proprietrio de um pomar se visseuma criana a furtar cerejas de uma arvore, e no tivesse hiptese de evitarque ela continuasse a furtar cerejas, que no fosse disparar a caadeira quetinha consigo, ele o poderia fazer? Seria naturalmente absurdo admitir queesse proprietrio poderia legalmente matar essa criana. H um ponto quetemos de ter ateno que a figura do abuso de direito (334 CC) e portanto,numa situao destas, necessariamente se deveria dizer que o uso desse seudireito de defesa j no era legitimo, uma vez que ele estava a excedermanifestamente qualquer razoabilidade da utilizao desse direito de defesa.E, portanto, se poderia dizer que, estando ele em abuso de direito, a defesadeixaria por assim dizer, de ser legitima.Suponhamos um individuo que agride outro com as mos, so de estatura efora idntica, a pessoa agredida pode perfeitamente defender-se com asmos, mas pega numa faca que traz e mata o agressor. Isto ser um casocaracterstico de excesso de legitima defesa. Se uma pessoa se podiadefender com as mos e matou utilizando uma arma, a cometeu um crime de

    homicdio e o seu acto no ser justificado porque agiu em excesso.O medo desculpvel como causa de excluso de culpano entanto, aindaagindo em excesso, possvel que a pessoa no seja punida, mas porfuncionar uma causa de excluso de culpa.Se uma pessoa agir em excesso de legitima defesa por medo desculpvel,nessa altura ela no punida. J no se trata de dizer que essa actuao foilicita, que estava justificada, trata-se de dizer que a pessoa desculpada porter agido dessa maneira na medida em que ele se excedeu na legitima defesaporque entrou numa situao de pnico.O animus defendiisto , a inteno de se defender ou o nimo da defesa.Uma pessoa que reage a uma agresso sem ter inteno de se defender, e

    mesmo sem saber que essa agresso existe, poder dizer-se que est emlegitima defesa?

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    Suponhamos que duas pessoas se encontram, as duas vo com inteno dese agredir, uma delas agride o outro, sem saber que por sua vez esse outro oia agredir a ele.Objectivamente a situao existe, o que falta, mas parece que no estexigido, realmente uma inteno de defesa. Falta at o prprio conhecimento

    da situao de agresso, e portanto da possibilidade de defesa.A doutrina tem entendido tradicionalmente que realmente necessria a talinteno de defesa para se poder dizer que a pessoa age em legitima defesa.No h uma referencia expressa na lei necessidade do tal animus defendi.No entanto, sempre se poder dizer que a prpria expresso legitima defesaimplica necessariamente uma direco da actividade para o sentido de umadefesa. Isto , embora o CP no diga expressamente, a prpria utilizao dapalavra defesa ligada ao entendimento tradicional do que a defesa em termosde legitima defesa, se poder dizer que implica que a pessoa tenha pelo menosconscincia de que h uma agresso. Saber se a pessoa rigorosamenteresponde porque se quer apenas defender ou porque aproveita a ocasio para

    bater numa pessoa em quem tinha vontade de bater h muito tempo, a partirdo momento em que a pessoa no se exceda em termos de consideraoobjectiva da situao, isto parece-me irrelevante.Portanto, parece que a exigncia que h a fazer no tanto o animus defendi,no sentido de uma inteno completamente inocente e pura, mas pelo menos anecessidade do conhecimento por parte de quem age em legitima defesa deque efectivamente a situao de responder a uma agresso e portanto umasituao de defesa.Mas no s a legitima defesa que exige, para existir, que a pessoa que ageem legitima defesa tenha conhecimento dessa situao; tambm para se dizerque uma pessoa age em estado de necessidade, em aco directa ou com oconsentimento do ofendido, ou em qualquer outra causa de justificao sernecessrio que essa pessoa tenha conhecimento da situao objectiva.A aco directa:outra causa de justificao que no esta expressamentereferido no CP aparece apenas no CC, a aco directa.Na aco directa no se trata tanto de responder imediatamente a umaagresso que ainda est em curso, ou que est iminente, trata-se de tentarassegurar um direito que est em tal situao que, se a pessoa no fizerqualquer coisa, fica sem efeito prtico. Falamos no caso de uma pessoa quepor exemplo descobre o prprio carro que lhe foi furtado e evidentemente, emvez de deixar a pessoa fugir com o carro, e ir fazer queixa ao tribunal ou

    policia, por hiptese agarra no carro e no ladro at eventualmente ver apolicia.Esta utilizao da fora fsica para assegurar que naquele caso o carro nodesaparea, e portanto o seu direito de propriedade fique sem efeito pratico, o que corresponde ideia de aco directa tal como est definida no 336 CC.O CC diz que a aco directa pode consistir na apropriao, destruio oudeteriorao de uma coisa ou na eliminao de uma resistncia irregularmenteoposta.O prprio CC no art. 336 exige que interesse sacrificado pela aco directano seja superior ao interesse defendido.O poder de detenouma situao que no fundo tambm uma situao de

    aco directa o poder de deteno que permite a qualquer pessoa prender

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    um infractor em flagrante delito, se se tratar de um crime a que correspondepena de priso.Isto , um agente da autoridade obrigado a prender uma pessoa em flagrantedelito. Qualquer pessoa comum tem apenas a faculdade de o fazer.Simplesmente, tendo uma disposio legal que os autoriza a fazer, a deixa de

    ser ilcito esse acto, porque elas esto no exerccio de um direito.O estado de necessidade desculpanteuma pessoa assiste a um acidente deviao e h um ferido em estado grave, esta pessoa que quer socorrer o feridono tem automvel e resolve utilizar um automvel que ali esta parado sempedir licena ao dono que no estava l, e utiliza-o para levar de emergncia oferido ao hospital. Estaria a cometer um crime de furto? No rigorosamente.Simplesmente h legislao especial que prev o chamado furto de uso deautomvel. Isto , a pessoa que age com inteno apenas de utilizar o carro edepois de o devolver no comete crime de furto de uso. E neste caso,utilizando o automvel, embora para ir levar o ferido estaria primeira vista, apreencher o tipo de crime de furto de uso.

    Simplesmente, o CC directamente e expressamente permite dizer que apessoa est a agir licitamente na medida em que est a agir em estado denecessidade. Isto , para salvar um bem manifestamente superior ao prejuzoque o proprietrio tem da utilizao contra a sua vontade do automvel duranteuma horas; a lei permite que as pessoas ajam desde que o bem salvo ouassegurado seja manifestamente superior ao bem sacrificado.Um outro exemplo referido como contraposio legitima defesa umasituao em que haja uma agresso de um animal (mas no utilizado por umapessoa) se o animal estiver a agredir uma criana, eu posso matar o animal. Oproblema seria que matando o animal eu estava a cometer um crime de dano,mas estando eu a defender a criana (no estou aqui em legitima defesaporque, se a legitima defesa exige uma agresso ilegal, ela s se aplica aagresses humanas) estou a agir em estado de necessidade.Por exemplo a velha hiptese dos dois nufragos, s h uma tbua, umnaufrago tira a tabua ao outro que morre afogadosaber se uma situao deestado de necessidade objecto ou desculpante. que a vida de uma pessoano um bem manifestamente superior vida de outra pessoa; podereventualmente haver aqui uma outra situao que o tal estado denecessidade subjectivo? A pessoa age assim com medo de um mal igual -uma morte em principio ser igual outra morte. E portanto a, poder haveruma causa de excluso da culpa, mas no propriamente uma causa de

    justificao.Isto , seria perdovel ou desculpvel ou no censurvel que as pessoastivessem agido naquela situao de desespero, mas no se poderia dizer queera licito fazer aquilo.O conflito de deveres (art. 36 CP):por exemplo, a hiptese de um agulheirodos comboios que numa situao de emergncia em que a nica alternativaque tem fazer descarrilar ou um outro comboio para evitar que batam numoutro que est em linha. Ele por hiptese sabe que vai provocar a morte deuma serie de pessoas, porque no pode salvar dois comboios, s pode salvarum.Ao contrario do que se passa no estado de necessidade, em que a pessoa age

    dentro de um direito de necessidade e portanto pode fazer uma opo entreagir ou no agir. No conflito de deveres a situao diferente: este agulheiro

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    tinha tanto o dever de salvar um comboio do desastre como o de salvar o outro.Ele no livre de agir ou no agir, ele obrigado a agir, e ento basta que elesalve um bem igual ao outro. Basta que uma pessoa em conflito de deverescumpra um dever dentro de uma igualdade de importncia.Ser apenas necessrio cumprir um dever de igual valor; e j no haver a

    mesma proporo do estado de necessidade em que seria preciso um bem sermanifestamente superior ao outro.O consentimento do ofendido (340 CC)No exime de responsabilidadecriminal o consentimento do ofendido salvo nos casos especificados na lei. Emprincipio, o consentimento do ofendido no afasta a ilicitude de qualquer facto,a no ser que em certos casos a lei venha dizer que o consentimento doofendido naquele caso funciona como causa de justificao, isto , afasta ailicitude de uma certa ofensa.Simplesmente o CC tem uma disposio genrica em sentido diverso. Diz o340 CC que o consentimento do ofendido afasta a ilicitude de uma ofensa.Por exemplo, no crime de violao a falta de consentimento da mulher um

    elemento essencial da prpria definio legal do crime. que, uma coisa dizer: verifica-se este tipo de crime, s que neste casofunciona como causa de justificao e portanto a aco que parecia criminosaafinal no , porque h uma causa de excluso da ilicitude. Outra coisa dizer:a partir do momento em que h o consentimento, o prprio tipo de furto, deviolao de correspondncia ou violao propriamente dita no se pode dizerpreenchido. Isto , para a prpria verificao do tipo de crime necessrioverificar que no h consentimento.O consentimento do ofendido tem algumas exigncias. Em que tipos de leso que uma pessoa pode consentir ou no?Embora o auxilio ao suicdio seja punido, ele no punido como homicdio. Decerta forma, o consentimento do ofendido no crime de auxilio prestado por e