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1 Patologia (Prof. Maurício Meirelles) Capítulo Hemostasia (pág. 60 a 87)

Hemostasia

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Patologia (Prof. Maurício Meirelles) Capítulo Hemostasia (pág. 60 a 87)

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Conceito de Hemostasia

Hemostasia consiste na interrupção fisiológica de uma hemorragia, evitando perdas de sangue de uma lesão vascular, e também na manutenção da

fluidez do sangue evitando a formação de trombos.

Entende-se, portanto, que em um indivíduo hígido ocorre um equilíbrio entre

a manutenção do sangue na forma líquida e sua capacidade de solidificar-se em

um ponto de lesão da árvore circulatória, um desequilíbrio nos fatores

(anticoagulantes ou pró-coagulantes) da hemostasia poderá provocar doenças

hemorrágicas ou trombofílicas.

São cinco os fatores que participam da hemostasia, os seguintes:

1- Vasos Sangüíneos: participam da hemostasia pela propriedade de

resistência a variações da pressão intravascular e também por sua

contratilidade no local da lesão vascular.

A Parede Vascular também participa da Hemostasia através da secreção

de substâncias anticoagulantes (prostaciclina, óxido nítrico) e substâncias

coagulantes (fator de Von Willebrand).

2- Plaquetas: contribuem para Hemostasia inicialmente pela capacidade de se

aglutinar e aderir às lesões vasculares. Liberam fatores que aumentam a

vasoconstrição (Serotonina, Tromboxane), inicia a reconstituição da parede

vascular (Fator plaquetário de crescimento) e também fornece fosfolipídios

para as reações da coagulação.

Os vasos sanguíneos e as plaquetas são os fatores que promovem a fase

inicial da interrupção de um sangramento, essa fase pode ser denominada

como hemostasia primária: é o processo pelo qual se forma um tampão

plaquetário no local do traumatismo vascular. Esse processo depende de uma

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vasoconstrição fulgaz e aderência plaquetária. A Superfície de toda a árvore

circulatória é revestida por uma monocamada de células endoteliais. Essas

células expressam propriedades anticoagulantes (Prostaciclina, óxido nítrico),

que promovem a fluidez do sangue em condições normais. Entretanto, nos

locais de lesão vascular as células endoteliais passam de um estado de anti-

trombótico para um estado pré-trombótico (perda de substâncias

antiplaquetárias) ou são lesadas expondo o sangue circulante aos

componentes trombogênicos da porção sub-endotelial da parede vascular

(colágeno, fibronectina). A aderência das plaquetas na parede do vaso é

mediada pelo fator de Von Willebrand (FvW), que fixa as plaquetas à parede

vascular através da ligação aos seus receptores plaquetários localizados na

glicoproteína Ib (GPIb) da membrana. A seguir as plaquetas aderidas sofrem

um processo de ativação que consiste na alteração do formato e também

formação e secreção de várias substâncias, tais como, tromboxane e ADP

(Inibição pela AAS) e fosfolipídio aniônico que irão ativar os fatores circulantes

da coagulação; Além disso, ocorre também a exposição de receptores de

fibrinogênio (GPIIb-IIIa), que irão formar pontes entre novas plaquetas

recrutadas. Sendo assim a ativação plaquetária irá promover o acúmulo de

plaquetas aderidas formando o tampão plaquetário.

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Embora a hemostasia primária cesse o sangramento na maioria dos casos,

a força de cisalhamento do fluxo sangüíneo é suficiente para dissolver este

tampão, daí a grande importância da hemostasia secundária que irá

aumentar e solidificar a “rolha” plaquetária mediante a formação de um coágulo

estável de fibrina, denominado tampão Hemostático.

3- Coagulação: consiste na ativação seqüencial em cascata de várias

proteínas plasmáticas que culminam com a formação de fibrina aumentando e

solidificando o tampão plaquetário inicial. Esse processo é também

denominado hemostasia secundária, foi conceitualmente dividida em três vias:

a via extrínseca, intrínseca, e a via comum. Hoje em dia entende-se que

esta subdivisão representa uma simplificação excessiva dos eventos que

ocorrem in vivo. Entretanto para interpretação das provas de triagem “in Vitro”

da coagulação, é conveniente separar as vias. Embora as atividades

fisiológicas da via intrínseca não tenham sido totalmente definidas, é muito

provável que essa via seja ativada após a interação do fator XII com

substâncias de carga elétrica negativa. A ativação do fator XII em Fator XIIa

gera a ativação do Fator XI. O Fator XIa ativa o Fator IX, que ativa o Fator X,

esta última reação da via intrínseca necessita do Fator VIIIa como co-fator.

A via extrínseca caracteriza-se pela ativação direta do Fator X por um

complexo formado entre Fator VIIa e Fator Tecidual (tromboplastina tecidual).

A via final comum corresponde à convergência das vias intrínseca e

extrínseca. Nesta Via, Fator Xa forma complexo com o Va e ativa a

Protrombina para formar trombina que cliva fibrinogênio para formar

monômeros de fibrina que serão vinculados por ligações cruzadas ao Fator

XIIIa formando o coágulo estável de fibrina

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4- Sistema Anticoagulante: ao sistema coagulante contrapõe-se um sistema

anticoagulante, cuja finalidade é evitar coagulação excessiva intravascular e

conseqüente formação de trombos. Assim como o endotélio intacto e normal

promove a fluidez do sangue, ele também é fundamental na anticoagulação

natural do sangue, por impedir o acúmulo de fibrina.

Entre os sistemas antitrombóticos fisiológicos que produzem este efeito

destacam-se: Antitrombina III, Proteínas C e S, o inibidor da via do fator

tecidual (IVFT), e o sistema fibrinolítico. A antitrombina é o principal inibidor

protease do sistema da coagulação; ela inativa a trombina, bem como outros

fatores.

A heparina atua como anticoagulante através da sua ligação à antitrombina,

acelerando, acentuadamente, a sua capacidade de inibir a coagulação.

A Proteína C é convertida em enzima ativa pela trombina ligada à proteína

da membrana das células endoteliais, Trombomodulina. Quando há formação

de trombina, parte liga-se à trombomodulina (proteína expressa pelo endotélio)

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e este complexo ativa a proteína C. A proteína C ativada liga-se à Proteína S e

este complexo inativa o Fator Va e VIIIa suprimindo a produção de trombina.

Indivíduos com deficiência de Proteína C ou S (distúrbios autossômicos

dominantes) estão sujeitos à trombose, visto que são incapazes de suprimir

adequadamente a produção de trombina. O IVFT é outro inibidor da protease

plasmática, que suprime a coagulação induzida pelo fator tecidual. Embora as

deficiências hereditárias da antitrombina III, Proteínas C ou S, estejam

associadas a uma tendência trombótica, a deficiência de IVFT não foi

associada a qualquer problema clínico.

5- Sistema fibrinolítico: Ao lado do Sistema Anticoagulante, existe um

mecanismo fibrinolítico que se destina a destruir o excesso de fibrina formada

e a recanalizar os vasos quando a hemostasia se completa. Existem três

ativadores principais do sistema fibrinolítico: fator XIIa, urocinase e ativador

tecidual do plasminogênio (tPA). O tPA, principal ativador fisiológico, difunde-

se das células endoteliais e converte o plasminogênio, absorvido no coágulo

de fibrina, em plasmina. A plasmina, por sua vez degrada a fibrina em

fragmentos menores (dímeros-D). A plasmina pode degradar também o

fibrinogênio, esta reação permanece localizada, devido: 1) O tPA ativa o

plasminogênio com mais eficácia quando está absorvido no coágulo de fibrina,

2)A plasmina que penetra na circulação sanguínea é neutralizada pelo inibidor

alfa-2 da plasmina e 3) as células endoteliais liberam um inibidor do ativador de

plasminogênio (PAI 1), que bloqueia a ação do tPA.

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Tab.:1 Fatores que participam da hemostasia Sinônimo Local de síntese função Fator I fibrinogênio hepatócito Originar fibrina Fator II Protrombina hepatócito Protease Fator III Tromboplastina Quase todas as células Co-fator Fator IV Cálcio Presente o plasma Co-fator Fator V Pró-acelerina Hepatócito,

megacariócito Co-fator

Fator VII Pró-convertina Hepatócito Protease Fator VIII Fator anti-hemofílico A Hepatócito Co-fator Fator IX Anti-hemofílico B, Fator

Christmas Hepatócito Protease

Fator X Fator Stuart Hepatócito Protease Fator XI Anti-hemofílico C Hepatócito Protease Fator XII Fator Hageman,

superfície Hepatócito Protease

Fator XIII Estabilizador da fibrina Hepatócito Transamidação Fator Von Willebrand Célula endotelial,

megacariócito Adesão plaquetária, co-fator

Proteína C Hepatócito Protease Proteína S Hepatócito Regulador Trombomodulina Célula endotelial Regulador Antitrombina III Hepatócito Regulador Inibidor da via do fator tecidual

Inibidor da via extrínseca

Célula endotelial Regulador

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Provas relacionadas com os fatores vascular e plaquetário.

o Tempo de Sangramento (TS)

O método mais utilizado é a prova de Duke, que consiste em determinar a

duração de um sangramento causado por uma incisão feita no lobo da orelha,

com uma lanceta padronizada que faz ferimento de três milímetros de

profundidade.

O resultado normal varia entre 1 a 3 minutos. Esta prova permite avaliar o

mecanismo de hemostasia nos pequenos vasos, mostrando-se prolongada nas

trombocitopenias, trombopatias e vasculopatias.

o Prova do Laço (fragilidade vascular)

Ao lado do tempo de sangramento é muito utilizado para avaliação de

fragilidade capilar. Comprime-se o braço com o manguito inflado a uma

pressão média entre a sistólica e a diastólica, durante cinco minutos. Em

condições normais, podem surgir algumas petéquias na região da prega do

cotovelo (fenômeno de Rompel-Leed) sem valor clínico. Considera-se que haja

fragilidade capilar quando surgem mais de cinco petéquias num círculo de 25

mm de diâmetro, traçado logo abaixo da prega do cotovelo. Observa-se

positividade desta prova em trombocitopenias, trombopatias, vasculopatias e

deficiência de fibrinogênio.

o Contagem de Plaquetas

O número reduzido de plaquetas (trombocitopenia) é uma importante causa de

hemorragia. O valor referencial é de 150.000 a 400.000/ mm3.

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Quando as plaquetas apresentam-se funcionalmente normais, esperam-se

os seguintes eventos: Quando a contagem plaquetária é maior ou igual a

100.000/mm3, os pacientes não apresentam sangramento anormal (TS

normal), mesmo em cirurgias de grande porte; com uma contagem de 50.000 a

100.000/ mm3, os pacientes podem sangrar por mais tempo do que o normal

após uma cirurgia de traumatismo grave; sendo as contagens entre 20.000 e

50.000/ mm3, ocorre sangramento após traumatismos pequenos, embora o

sangramento espontâneo seja raro; com contagens plaquetárias menores que

20.000/mm3, os pacientes podem apresentar sangramento espontâneo; e

sendo as plaquetas menores que 10.000/mm3, os pacientes correm alto risco

de sangramento grave.

o Agregometria Plaquetária

A resposta das plaquetas a vários agentes de agregação, por exemplo,

ristocetina, pode ser quantificada no plasma rico em plaquetas. A agregação

plaquetária estará alterada principalmente nas trombopatias e doença de Von

Willebrand.

o Retração do coágulo

No laboratório avalia-se a retração do coágulo pela quantidade de soro que

é por ele expelido após 2 horas a 37°C. O resultado normal esta entre 48% a

64%. Encontram-se resultados anormais nas trombocitopenias, trombopatias e

hipofibrinogenemia.

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Provas relacionadas com os fatores plasmáticos da coagulação.

o Tempo de Coagulação (TC) Pelo método do tubo capilar (Sabrazés) esta prova consiste no tempo

decorrido entre a coleta do sangue (preencher um tubo capilar) e a formação

do cilindro de fibrina. Normalmente o tempo de coagulação por este método

varia entre 2 a 8 minutos.

Esta prova representa um estudo global da coagulação não discriminando

qual fator está comprometido. É um método de baixa sensibilidade, podendo

ser normal mesmo em presença de coagulopatias, por exemplo, hemofilia leve.

o Tempo de Tromboplastina Parcial ativado

Constitui a melhor prova para investigar as deficiências dos fatores que

participam da via intrínseca e comum (cininogênio de alto peso molecular, pré-

calicreina; fatores XII, XI, IX, VIII, X e V; protrombina e fibrinogênio)

O plasma citratado normal contém todos os fatores necessários para

promover a coagulação intrínseca, exceto o cálcio (removido pelo citrato de

sódio) e as plaquetas (removidas pela centrifugação).

Esta prova consiste em adicionar, ao plasma, cálcio e cefalina ativada. A

cefalina ativada é um extrato do cérebro de coelho, que contém a cefalina, o

substituto fosfolipídico das plaquetas (Tromboplastina parcial) e celite ou

caulim que promove a ativação do fator XII, reduzindo a influência das

superfícies de contato, como os tubos de vidro, permitindo mais exatidão dos

resultados.

O valor de referência desta prova situa-se entre 35 a 45 segundos, cifras

aumentadas são encontradas nas hemofilias, doença de Von Willebrand, CID

(coagulação intravascular disseminada) e Heparinoterapia.

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o Tempo de Protrombina

O tempo de protrombina é usado para detectar deficiências dos fatores

pertencentes ao sistema extrínseco e comum da coagulação, incluindo os

fatores VII, X, V, II e I. Embora o sistema extrínseco inclua também o fator III

(Tromboplastina tecidual) este fator é retirado durante a coleta sangüínea.

Como os fatores deprimidos pelos anticoagulantes orais pertencem, em sua

maioria, ao sistema extrínseco, o tempo de protrombina é a escolha para o

controle de terapia desta categoria de anticoagulantes.

A técnica consiste em adicionar ao plasma tromboplastina tecidual e cálcio,

a formação do coágulo em um plasma normal ocorrerá em 10 a 14 segundos.

Como as medidas do TP variam de acordo com a potência dos reagentes

de tromboplastina utilizados no teste, a OMS recomenda uma padronização

utilizando-se uma tromboplastina de referencia mundial a partir da qual se

calcula um índice de correção denominado ISI (índice de sensibilidade

internacional), (ISI, International Sensivity Index). Por conseguinte, os valores

do TP são expressos como relação padronizada internacional (International

Normatized Rate, INR). INR = (TP paciente / TP controle) ISI; Isto representa a

relação do TP que deveria ser obtida se fosse utilizada a tromboplastina

padrão. A INR recomendada para evitar tromboembolismo recorrente é de 2.0

a 3.0, e foi recomendada uma INR de 3.0 a 4.0 para evitar a embolização de

válvulas cardíacas mecânicas.

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o Tempo de Trombina (TT)

A determinação do tempo de trombina é feita para investigar alterações na

última fase da coagulação quando ocorre a transformação do fibrinogênio em

fibrina pela ação da Trombina. Esta prova tem valor de referência entre 10 a 15

segundos e o tempo prolongado revela deficiência de fibrinogênio.

Tab.: 2 Causas comuns de elevação do TP e do TTPa

TP TTPA Heparina -/↑ ↑↑↑ Warfarina ↑↑↑ -/↑ Hepatopatias ou def. vit. K ↑↑↑ -/↑ Hemofilia A, B ou C Não altera ↑↑↑ Inibidores (geralmente VIII ou IX ) Não altera ↑↑↑ Anticoagulante lúpico -/↑ ↑↑

Terapias antitrombóticas, trombolíticas e anticoagulantes

o Agentes Plaquetários O ácido acetilsalicílico (AAS) é o principal agente antiplaquetário utilizado;

ao inibir a enzima cicloxigenase impede a formação de prostaglandina e

tromboxane (agregantes plaquetários) importantes na Hemostasia. O AAS é

utilizado na prevenção e tratamento de infarto do miocárdio (IAM) e acidente

vascular cerebral (AVC). Outra substância denominada Ticlopidina reduz AVC

e IAM 10% mais efetivamente do que AAS.

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o Agentes Trombolíticos

Os agentes trombolíticos, como estreptoquinase, uroquinase, ativador de

plasminogênio recombinante (rTPA), catalizam a conversão do plasminogênio

na enzima fibrinolítica plasmina.

Estes agentes são utilizados para desfazer trombos arteriais ou venosos. O

uso de um agente trombolítico nas quatro ou seis horas após o início de um

infarto do miocárdio pode resultar em reperfusão da coronária e reduzir a taxa

de mortalidade em 30 a 50%.

o Heparina

A heparina é um glicosaminoglicano sulfatado presente em tecidos ricos em

mastócito. A heparina comercial é extraída de pulmão bovino ou intestino

suíno. A função anticoagulante da heparina resulta de sua capacidade de ligar-

se à antitrombina III e potencializar sua ação.

A heparina não é absorvida por via oral, portanto deve ser administrada por

via intravenosa ou subcutânea, além disso, a monitorização regular e freqüente

ajuste da posologia determinam que a heparinoterapia seja limitada, em

grande parte, a ambientes hospitalares.

A heparina é principalmente utilizada no tratamento de trombose venosa

aguda e intervenções cirúrgicas, em doses suficientes para prolongar o TTPA

em 1,5 a 2 vezes (50 a 80 segundos). Também é utilizada como profilaxia

contra trombose venosa e embolia pulmonar, geralmente em doses que não

alteram o TTPA.

O principal efeito colateral da heparinoterapia é a hemorragia. Nos casos de

sangramento leve é suficiente interromper o fármaco, caso o sangramento seja

mais grave é necessário administrar o sulfato de protamina, substância que

interrompe a ação da heparina.

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Como o TP é apenas ligeiramente prolongado por altas concentrações de

heparina, trata-se de um meio confiável para avaliar o estado de

anticoagulação oral (warfarin) durante infusões terapêuticas de heparina.

Heparina de baixo peso molecular são fragmentos da heparina padrão que

apresentam maior biodisponibilidade, meia-vida plasmática maior e resposta

anticoagulante mais previsível.

o Anticoagulantes orais Os anticoagulantes são derivados da 4-hidroxicumarina (cumarínicos) ou do

indan-1,3-diona (compostos indandiônicos). Warfarin sódico e os outros

cumarínicos são anticoagulantes orais, lipossolúveis, ativos apenas in vivo, que

exercem sua ação impedindo a ativação da vitamina K pela epoxi-redutase.

Estes compostos não atravessam a barreira hematoencefálica, porém

atravessam a placenta, possuindo efeito teratogênico, além de estar presente

no leite materno. A ação dos anticoagulantes orais é decorrente da inibição da

síntese dos fatores de coagulação vitamina K-dependente (fatores II, VII, IX e

X) além de duas outras proteínas anticoagulantes naturais (proteína C e S). As

concentrações plasmáticas destas proteínas caem de acordo com a meia vida

de cada uma. Das proteínas que dependem da vitamina K, as que apresentam

menor meia vida são a proteína C e o fator VII, o que explica um efeito pró-

coagulante inicial dos anticoagulantes orais devido à deficiência da proteína C.

A intensidade dos efeitos do warfarin na síntese dos fatores de coagulação

difere entre os pacientes, e até mesmo no mesmo indivíduo. Por conta disso

uma monitorização eficaz é necessário quando do tratamento com esta droga.

O teste utilizado para monitorização da terapia é o tempo de protrombina

(TP), que das seis proteínas vitamina K-dependente testa apenas três (fatores

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II, VII e X). Por outro lado o TP também é sensível a alterações no fator V um

fator de coagulação independente da vitamina K.

No início do tratamento o prolongamento do TP ocorre em conseqüência

dos baixos níveis do fator VII, que possui menor meia vida. Conseqüentemente

o paciente pode apresentar um TP prolongado apesar de ainda apresentar a

via intrínseca e a via comum sem alterações. Isso explica porque se deve

trocar a terapia com heparina para a anticoagulação oral após um período de

pelo menos um dia após o INR desejado ter sido obtido. A monitorização da

anticoagulação deve ser feita com regularidade mesmo em pacientes bem

controlados já que muitas drogas e alguns tipos de alimentos podem aumentar

ou diminuir o efeito dos cumarínicos.

Distúrbios Hemorrágicos

Anormalidades da função plaquetária:

o Trombocitopenia: Redução do número de plaquetas, as principais causas

são: Leucemia.

Deficiência de vitamina B12 ou folato.

Púrpura trombocitopênica auto-imune.

Fármacos (aspirina, compostos de Sulfa)

Coagulação vascular disseminada

Uremia

Insuficiência hepática

o

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o Trombastenia de Glanzmann Deficiência das glicoproteínas de membrana (Gp IIb) que se ligam ao

fibrinogênio promovendo a agregação plaquetária.

o Síndrome de Bernard-Soulier Deficiência da GP Ib, dificultando a ligação das plaquetas ao fator Von

Willebrand no tecido subendotelial.

Distúrbios Vasculares

Hemangioma Escorbuto Síndrome de Cushing (perda da elasticidade)

Deficiência hereditária dos fatores da coagulação

o Hemofilia A e B

A deficiência do fator VIII (hemofilia clássica ou hemofilia A) é herdada como

caráter recessivo ligado ao sexo. O gene do fator VIII, assim como o fator IX

(hemofilia B), localiza-se no braço longo do cromossomo X. Os homens com

alelo defeituoso no único cromossomo X não transmitem esse gene aos filhos,

porém todas as suas filhas são portadoras obrigatórias. Já as portadoras, só

transmitem o distúrbio da coagulação à metade de seus filhos, enquanto a

metade das filhas é portadora. As portadoras podem manifestar sintomas

semelhantes à hemofilia; quando o alelo defeituoso é expresso

preferencialmente ao alelo normal (lionização).Pode ocorrer hemofilia em

mulheres em conseqüência do casamento de um homem hemofílico com uma

mulher portadora. Em geral, os pacientes com deficiência de fator VIII ou IX

são identificados pouco depois do nascimento, durante a circuncisão ou

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quando a criança se torna ativa e se observam hematomas e sangramento

articular. Nos casos leves (nível de fator VIII > 5%) a doença pode não ser

reconhecida até que o paciente participe ativamente em esportes ou seja

submetido a procedimento cirúrgico ou sofra traumatismo.O diagnóstico é

estabelecido no laboratório após avaliação dos sintomas clínicos e obtenção

de uma história familiar. Dentre as provas de triagem, apenas o TTPA esta

prolongado. Os testes subseqüentes incluem pesquisa do fator VIII, do fator de

Von Willebrand e também é importante excluir a possibilidade de inibidor do

fator VIII (auto-anticorpo).O tratamento das hemofilias envolve a reposição do

fator deficiente durante os episódios de sangramento e abordagem global do

paciente e sua família, com educação, assistência psicossocial e cuidados

dentários e ortopédicos periódicos.

o Doença de Von Willebrand

Em 1926, Erik Von Willebrand descreveu uma doença hemorrágica de herança

autossômica dominante que afeta ambos os sexos, conhecida hoje, como

deficiência do fator Von Willebrand (DfvW). Esta doença é o distúrbio

hemorrágico mais comum, com prevalência de 2% da população, sem

predomínio étnico.

Os pacientes com esta doença apresentam, em sua maioria, uma doença leve

que pode não ser diagnosticada até a ocorrência de traumatismo, ou de uma

cirurgia. Os indivíduos sintomáticos exibem equimoses e sangramento das

mucosas. A menorragia afeta 65% das mulheres. O FVW desempenha três

papéis importantes na hemostasia: promove a adesão das plaquetas à parede

do vaso lesado; aumenta a interação entre as plaquetas e estabiliza o fator

VIII. Dentre os testes de triagem para a coagulação o TTPA e o Tempo de

sangramento estarão alterados. O TTPA devido à necessidade do FVW como

co-fator do FVIII da via intrínseca, e o tempo de sangramento estará

prolongado devido à deficiência de agregação plaquetária, é importante

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ressaltar que em casos leves da doença de Von Willebrand o TS não se

mostra alterado.

O ensaio de agregação plaquetária induzida pela ristocetina é utilizado para

confirmar e detectar os tipos variantes desta doença.

O tratamento da doença de Von Willebrand é controvertido, porém, o

crioprecipitado constitui a forma preferida de reposição para sangramento ativo

ou profilaxia, tendo como objetivo aumentar a atividade do fator VIII.

Distúrbios adquiridos da coagulação sangüínea o Deficiência de Vitamina K

A Vitamina K é importante na síntese das proteínas de coagulação Vitamina

K-dependentes: os fatores II, VII, IX, e X e também as proteínas C e S.

As duas principais fontes de vitamina K consistem na ingestão da vitamina

e sua síntese pela flora bacteriana intestinal. Por conseguinte, se não houver

malabsorção, a deficiência nutricional isolada raramente provocará deficiência

significativa. Entretanto, essa condição pode surgir quando a erradicação da

flora intestinal é associada à ingestão inadequada. Tal situação é tipicamente

observada em pacientes críticos em UTI, que se encontram em dieta zero e

estão recebendo antibióticos de amplo espectro.

A deficiência de vitamina K pode ser evidenciada pelo prolongamento do TP

e, algumas vezes, pelo TTPA. O TP é mais sensível que o TTPA, visto que o

fator VII, o único dos fatores vitamina K-dependentes que se encontra na via

extrínseca da coagulação, é a mais lábil dessas proteínas.

o Hepatopatias

Os pacientes com doença hepática apresentam inúmeras anormalidades da

coagulação que predispõe ao sangramento. Os hepatócitos sintetizam os

fatores da coagulação I, II, V, VII,VIII, IX, X, XI, XII, e XIII; cininogênio de alto

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peso molecular, pré-calicreína, inibidores da coagulação (Proteína C, S e

antitrombinaIII); o plasminogênio e seu inibidor alfa-2-antiplasmina. Com a

evolução da doença hepática o paciente pode apresentar deficiência de alguns

ou de todos estes fatores, além disto, é comum a trombocitopenia, sobretudo

quando há esplenomegalia. Não é surpreendente que 85% dos pacientes com

hepatopatias tenham um defeito de coagulação, enquanto 15% apresentam

sangramento.

O prolongamento do TP é a primeira anormalidade observada; entretanto à

medida que a doença evolui, o TTPA, o TT, os níveis de fibrinogênio e a

contagem de plaquetas tornam-se anormais.

o Coagulação Intravascular Disseminada (CID)

A CID, também conhecida como coagulopatia de consumo, é causada por

uma ampla variedade de distúrbios graves (Sepse, Embolia do líquido

amniótico, processos malignos, queimaduras, etc.).

A CID consiste na entrada de substâncias procoagulantes na circulação,

que desencadeiam a ativação sistêmica do sistema de coagulação e das

plaquetas, sendo assim, a CID é um processo trombótico, embora a sua

manifestação clínica possa consistir em hemorragia.

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Principais causas de CID Sepse por bactérias gram-negativas

Embolia por líquido amniótico

Retenção de feto morto

Descolamento da placenta

Processos malignos

Envenenamento

Traumatismos

Queimaduras

Embolia gordurosa

Hipóxia

Grandes cirurgias, etc.

o Inibidores adiquiridos

Os inibidores podem resultar em sangramento ou trombose. Geralmente

são auto-anticorpos. Estes inibidores são identificados “in vitro” pela

incapacidade do plasma normal (numa relação 1/1 com plasma do paciente) de

corrigir o defeito de coagulação do plasma do paciente.

A premissa do teste é a de que, mesmo se houver deficiência completa de

determinado fator no plasma do paciente, a sua mistura com plasma normal na

proporção 1/1 deverá fazer com que a concentração do fator alcance 50%, o

que é suficiente para corrigir o prolongamento do TTPA e/ou TP, será provável

que haja algum inibidor no plasma do paciente, interferindo na coagulação

tanto do plasma do paciente quanto do plasma normal. Neste caso, deve-se

verificar se o inibidor não se trata de medicamentos (heparina ou cumarínicos)

ou de verdadeiros auto-anticorpos, por exemplo, anti-fatorVIII ou se o inibidor é

o anticoagulante lúpico (anticorpo anti-fosfolípide).

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Tab.:2 Prevalência das Principais Deficiências das Proteínas da coagulação Fator I (Fibrinogênio) Raro Fator II (Protrombina) Raro Fator V (fator lábil) Um por milhão de nascimentos Fator VII Um em 500.000 nascimentos Fator VIII (hemofilia A) Um em 5.000 Nativivos do sexo masculino Doença de Von Willebrand tipo 1 e 2 1% DvW Tipo 3 Um por milhão de nascimentos Fator IX (hemofilia B) Um em 30.000 Nativivos Fator X Um em 500.000 nascimentos Fator XI (hemofilia C) Um por milhão (4% dos Judeus). Fator XII Não disponível Fator XIII Um em 3 milhões

Fig.: 2 Esquema de possibilidades diagnósticas com anormalidades do TP e/ou TTPa

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Estados de hipercoagubilidade

Os estados hipercoaguláveis abrangem um grupo de distúrbios hereditários

ou adquiridos que causam uma tendência trombótica ou risco de trombose,

denominado trombofilia.

Os estados hipercoaguláveis primários são causados por anormalidades

nas proteínas específicas da coagulação, que resultam em estado

protrombótico. O evento que deflagra uma condição trombótica é

freqüentemente o desenvolvimento de um estado hipercoagulável secundário.

Os principais estados hipercoaguláveis primários são:

o Deficiência da antitrombina.

o Deficiência da Proteína C ou S.

o Resistência à proteína C ativada / fator V Leiden

o Hipoplasminogenemia, etc.

E os principais estados hipercoaguláveis secundários são:

o Hiperviscosidade

o Estase venosa

o Traumatismo

o Câncer

o Vasculite

o Queimaduras, etc.

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Fatores trombofílicos congênitos

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Fatores trombofílicos adquiridos

Referências:

1- Cecil Tratado de Medicina interna 21 edição. 2- Henry Diagnósticos clínico e tratamento por métodos laboratoriais 19 edição. 3- Tratado de medicina interna William Kelley 3 edição. 4- Laboratório para o clínico 8 edição.Otto Miller

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