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Jornal da ABI Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa 341 MAIO 2009 Rubens Ewald Filho: É ele quem mais conhece filmes no Brasil Chamado de “O Homem do Oscar”, tantas vezes transmitiu a festa de premiação de Hollywood, Rubens já viu quase 32 mil filmes. DOIS AUTORES DE OBRAS INVEJÁVEIS: BOAL E EDGAR RODRIGUES COM O TEATRO DO OPRIMIDO, AUGUSTO BOAL REINVENTOU ESSA ARTE. RODRIGUES, O ANARQUISTA, PUBLICOU 60 LIVROS. PÁGINAS 44, 45, 46 E 47 Páginas 32, 33, 34, 35, 36, 37 e 38 Responsável pelo novo Vocabulário da língua, mestre Evanildo Bechara dissecou o Acordo diante do Conselho da ABI. AULA MAGNA DE BECHARA ACORDO ORTOGRÁFICO Compromisso da TV Brasil é com a isenção e com a pluralidade Sem a imprensa o futebol seria nossa paixão nacional? OS JORNALÕES QUEREM NOVA LEI DE IMPRENSA Em conferência-debate na ABI, Tereza Cruvinel diz qual é a da TV Pública. Páginas 10 e 11 Em nome do direito de resposta, os grandes jornais defendem uma lei em lugar da que foi revogada. Páginas 27, 28 e 29 e Editorial na página 2 Renato Maurício Prado e outros ases da cobertura esportiva debatem essa e outras questões. Páginas 14 e 15 MEDALHA DA CÂMARA DO RIO PARA VILLAS-BÔAS SEUS 60 ANOS DE JORNALISMO SÃO FESTEJADOS PELOS VEREADORES. PÁGINAS 18 E 19 MENDEZ, O ARTISTA DO TRAÇO QUE VIA A ALMA HERMAN LIMA, HISTORIADOR DA CARICATURA, DEFINIU-O ASSIM. PÁGINAS 42 E 43 O petróleo é nosso de novo nas ruas CPI da oposição gera mobilização dos setores populares, como nos anos 40-50. Páginas 22 e 23 Páginas 12 e 13

Jornal da ABI 341

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Jornal da ABI volta ao Acordo Ortográfico com aula magna de Evanildo Bechara e ao assunto da Lei de Imprensa. A entrevista do mês é com o jornalista, diretor, produtor e crítico de cinema Rubens Ewald Filho. Lembramos também do caricaturista Mendez, de Augusto Boal, que reinventou o teatro, e Edgar Rodrigues, anarquista português.

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Jornal da ABIÓrgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

341MAIO2009

Rubens Ewald Filho: É ele quem mais conhece filmes no BrasilChamado de “O Homem do Oscar”, tantas vezes transmitiu a festa de premiação de Hollywood, Rubens já viu quase 32 mil filmes.

DOIS AUTORES DEOBRAS INVEJÁVEIS: BOAL

E EDGAR RODRIGUESCOM O TEATRO DO OPRIMIDO,

AUGUSTO BOAL REINVENTOU ESSA ARTE.RODRIGUES, O ANARQUISTA,

PUBLICOU 60 LIVROS.PÁGINAS 44, 45, 46 E 47

Páginas 32, 33, 34, 35, 36, 37 e 38

Responsável pelo novo Vocabulário dalíngua, mestre Evanildo Bechara dissecou

o Acordo diante do Conselho da ABI.

AULA MAGNADE BECHARA

A C O R D O O R T O G R Á F I C O

Compromisso daTV Brasil é com aisenção e com a

pluralidade

Sem a imprensa ofutebol seria nossapaixão nacional?

OS JORNALÕESQUEREM NOVA

LEI DE IMPRENSA

Em conferência-debate na ABI,Tereza Cruvinel diz qual é a da

TV Pública. Páginas 10 e 11

Em nome do direito de resposta,os grandes jornais defendem umalei em lugar da que foi revogada.

Páginas 27, 28 e 29 eEditorial na página 2

Renato Maurício Prado e outrosases da cobertura esportiva

debatem essa e outras questões.Páginas 14 e 15

MEDALHA DA CÂMARA DORIO PARA VILLAS-BÔASSEUS 60 ANOS DE JORNALISMO SÃO

FESTEJADOS PELOS VEREADORES.PÁGINAS 18 E 19

MENDEZ, O ARTISTA DOTRAÇO QUE VIA A ALMA

HERMAN LIMA, HISTORIADOR DA CARICATURA,DEFINIU-O ASSIM. PÁGINAS 42 E 43

O petróleo énosso de novo

nas ruasCPI da oposição gera mobilizaçãodos setores populares, como nos

anos 40-50. Páginas 22 e 23

Páginas 12 e 13

2 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

UMA NOVA LEIPARA QUEM?

NÃO É ESTRANHO QUE UMA PARTE DOS MAISimportantes veículos impressos do País te-nha decidido reclamar a edição de uma novaLei de Imprensa, em substituição àquele éditooriginário da ditadura militar que o Supre-mo Tribunal Federal houve por bem revo-gar, condenar ao lixo da História, no memo-rável julgamento realizado em 30 de setem-bro passado.

APARENTEMENTE, A POSTULAÇÃO É inspi-rada por boas intenções, não se sabe se comoaquelas que pavimentam o caminho do in-ferno, porquanto uma das bandeiras desfral-dadas para justificar a aprovação de novotexto legal seria a regulação do direito de res-posta, que é, porém, um bem jurídico de statusconstitucional que a rigor não demanda de-talhamento ou esclarecimento através da cha-mada legislação infraconstitucional. Esta sóteria sentido se fosse para restringir essedireito, o que a Constituição não admite.

COMO O JORNAL DA ABI REGISTRA NES-TA edição, ao se ocupar mais uma vez detão relevante tema, há propostas que pre-vêem uma espécie de escalonamento do re-conhecimento e da concessão de seu exer-cício pelos meios de comunicação, atravésdo cumprimento de uma série de etapas,como a solicitação do pedido de explicaçõesou de retratação, se por hipótese não ocor-

rer antes a retificação espontânea. Em al-guns desses casos, o direito de resposta dar-se-ia não em favor de quem fundada e legi-timamente reclama acerca do noticiário oude textos de opinião a reparação que con-sidera necessária, mas em benefício do ve-ículo que divulgou a informação ou o con-ceito inexato, injusto ou ofensivo. Teríamosentão não o direito de resposta, mas suacontrafação, sua sonegação.

DIANTE DE QUESTÃO DE TAL magnitude,como o é a relacionada com a liberdade deexpressão, essencial no Estado Democráti-co de Direito que a Constituição de 1988declarou instituir, é necessário que se traveamplo debate em torno do tema, abrindo-sea possibilidade de intervenção de outros se-tores da vida social, pois a existência ou nãode uma legislação abrangente sobre a maté-ria não pode ficar adstrita ao clube fechadoda comunidade jornalística e dos donos dosmeios de comunicação no País.

SOMENTE ASSIM AFASTAREMOS O RISCO DEse oferecer à indagação que encima estas con-siderações uma satisfação que correspondaao interesse social, e não ao benefício de seg-mentos restritos, acostumados a imaginare reclamar a elaboração de leis que consa-grem e eternizem o seu poder sobre o con-junto da sociedade.

Jornal da ABI DIRETORIA – MANDATO 2007/2010Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Tarcísio HolandaDiretor Administrativo: Estanislau Alves de OliveiraDiretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Sousa (Pajê)Diretor de Jornalismo: Benício Medeiros

CONSELHO CONSULTIVO 2007-2010Chico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira (in memoriam), MiroTeixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura.

CONSELHO FISCAL 2009-2010Geraldo Pereira dos Santos, Presidente, Adail José de Paula, Adriano Barbosado Nascimento, Jorge Saldanha de Araújo, Luiz Carlos de Oliveira Chesther,Manolo Epelbaum e Romildo Guerrante.

MESA DO CONSELHO DELIBERATIVO 2009-2010Presidente: Pery Cotta1º Secretário: Lênin Novaes de Araújo2º Secretário: Zilmar Borges Basílio

Conselheiros efetivos 2009-2012Adolfo Martins, Afonso Faria, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos Meirelles,Fernando Segismundo, Glória Suely Álvarez Campos, Jorge Miranda Jordão, JoséÂngelo da Silva Fernandes, Lênin Novaes de Araújo, Luís Erlanger, MárciaGuimarães, Nacif Elias Hidd Sobrinho, Pery de Araújo Cotta e Wilson Fadul Filho.

Conselheiros efetivos 2008-2011Alberto Dines, Antônio Carlos Austregesylo de Athayde, Arthur José Poerner,Carlos Arthur Pitombeira, Dácio Malta, Ely Moreira, Fernando Barbosa Lima (inmemoriam), Leda Acquarone, Maurício Azêdo, Mílton Coelho da Graça, PinheiroJúnior, Ricardo Kotscho, Rodolfo Konder, Tarcísio Holanda e Villas-Bôas Corrêa.

Conselheiros efetivos 2007-2010Artur da Távola (in memoriam), Carlos Rodrigues, Estanislau Alves de Oliveiora,Fernando Foch, Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Jesus Chediak, José Gomes Talarico,

Editores: Maurício Azêdo e Francisco UchaProjeto gráfico, diagramação e editoração eletrônica:Francisco UchaEdição de textos: Maurício Azêdo, Marcos Stefano e Paulo Chico

Fotos: Acervo Biblioteca da ABI (Biblioteca Bastos Tigre),Agência Brasil, Agência O Globo, Diário de S.Paulo,Folha Dirigida, Folhapress, O Dia

Apoio à produção editorial: Alice Barbosa Diniz, Ana PaulaAguiar, Fernando Luiz Baptista Martins, Guilherme PovillVianna, Maria Ilka Azêdo, Mário Luiz de Freitas Borges.

Publicidade e Marketing: Francisco Paula Freitas (Coordenador),Queli Cristina Delgado da Silva, Paulo Roberto de Paula Freitas.

Diretor Responsável: Maurício Azêdo

Associação Brasileira de ImprensaRua Araújo Porto Alegre, 71Rio de Janeiro, RJ - Cep 20.030-012Telefone (21) 2240-8669/[email protected]

Impressão: Taiga Gráfica Editora Ltda.Avenida Dr. Alberto Jackson Byington, 1.808 - Osasco, SPEsta edição foi finalizada, impressa e entrou em circulação emjunho de 2009.

José Rezende Neto, Marcelo Tognozzi, Mário Augusto Jakobskind, Orpheu SantosSalles, Paulo Jerônimo de Sousa (Pajê), Sérgio Cabral e Terezinha Santos.

Conselheiros suplentes 2009-2012Antônio Calegari, Antônio Henrique Lago, Argemiro Lopes do Nascimento(Miro Lopes), Arnaldo César Ricci Jacob, Ernesto Vianna, Hildeberto LopesAleluia, Jordan Amora, Jorge Nunes de Freitas, Lima de Amorim, Luiz CarlosBittencourt, Marcus Antônio Mendes de Miranda, Mário Jorge Guimarães,Múcio Aguiar Neto, Raimundo Coelho Neto e Rogério Marques Gomes.

Conselheiros suplentes 2008-2011Alcyr Cavalcânti, Edgar Catoira, Francisco Paula Freitas, Francisco Pedro do Coutto,Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz, José Pereira da Silva (Pereirinha),Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Ponce de Leon, Ruy Bello, Salete Liusboa,Sidney Rezende,Sílvia Moretzsohn, Sílvio Paixão e Wilson S. J. de Magalhães.

Conselheiros suplentes 2007-2010Adalberto Diniz, Aluízio Maranhão, Ancelmo Góes, André Moreau Louzeiro,Arcírio Gouvêa Neto, Benício Medeiros, Germando de Oliveira Gonçalves, IlmaMartins da Silva, José Silvestre Gorgulho, Luarlindo Ernesto, Luiz Sérgio Caldieri,Marceu Vieira, Maurílio Cândido Ferreira, Yacy Nunes e Zilmar Borges Basílio.

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAJarbas Domingos Vaz, Presidente, Carlos Di Paola, José Carlos Machado, LuizSérgio Caldieri, Marcus Antônio Mendes de Miranda, Maria Ignez DuqueEstrada Bastos e Toni Marins.

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Arthur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan Alves Filho e Paulo Totti.

COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSWilson Fadul Filho, Presidente; Arcírio Gouvêa Neto, Daniel de Castro, Germandode Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy Mary Carneiro, Maria CecíliaRibas Carneiro, Mário Augusto Jakobskind, Martha Arruda de Paiva, OrpheuSantos Salles, Wilson de Carvalho, Wilson Nunes de Carvalho e Yacy Nunes.

COMISSÃO DIRETORA DE ASSISTÊNCIA SOCIALPaulo Jerônimo de Sousa, Presidente, Ilma Martins da Silva, Jorge Nunes deFreitas, José Rezende Neto, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Moacyr Lacerdae Wilson Nunes de Carvalho.

Número 341 - Maio de 2009

EditorialEditorial DESTAQUES DESTA EDIÇÃO

03 MercadoMercadoMercadoMercadoMercado - Neste tempo de crise, o emprego

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vira manchete

17 HomenagemHomenagemHomenagemHomenagemHomenagem - A ABI, a primeira no Prêmio

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Barbosa Lima

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18 Medalha Pedro Ernesto para Villas-Bôas

20 PremiaçãoPremiaçãoPremiaçãoPremiaçãoPremiação - Niemeyer e mais nove, as

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Personalidades Cidadania

22 Mobil izaçãoMobil izaçãoMobil izaçãoMobil izaçãoMobil ização - Nas ruas, de novo, com o

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petróleo é nosso

26 MercadMercadMercadMercadMercadooooo - A crise bate à porta dos jornais.

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E entra

30 Novidade Novidade Novidade Novidade Novidade - Na telinha, um museu para a

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corrupção

32 Depoimento - Depoimento - Depoimento - Depoimento - Depoimento - Rubens Ewald Filho, o

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homem que mais entende de filmes no Brasil

39 ContestaçãoContestaçãoContestaçãoContestaçãoContestação - Ministro Juca Ferreira:

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Ninguém quis salvar a coleção Jorge Amado

42 EvocaçãoEvocaçãoEvocaçãoEvocaçãoEvocação - Mário Mendez, artista do traço e

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leitor de almas

ARTIGO08 Stalingrado, o funeral do nazismo

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por Paulo Ramos Derengoski

SEÇÕES10 AAAAACCCCCONTEONTEONTEONTEONTECEUCEUCEUCEUCEU NANANANANA AB AB AB AB ABI

Os compromissos da tv pública: isenção,

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

pluralidade, diversidade

O Acordo Ortográfico numa aula magna de

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Evanildo Bechara

27 LLLLLIIIIIBBBBBERERERERERDDDDDADEADEADEADEADE DEDEDEDEDE I I I I IMMMMMPPPPPRRRRRENENENENENSASASASASAA Lei de Imprensa já era, mas continua em

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

discussão

40 LLLLLIVROSIVROSIVROSIVROSIVROS

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Numa coleção, o Brasil que tem memória

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Duas paixões em perfeita harmonia

44 VVVVVIIIIIDDDDDASASASASAS

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Boal, o reinventor do teatro

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Edgar Rodrigues, o último anarquista

3Jornal da ABI 341 Maio de 2009

MERCADO

Neste tempo de crise,

A crise econômica mundial eseus reflexos no Brasil, emborasubavaliados pelas autoridadesgovernamentais, geraram umanovidade no mercado depublicações: ganham forçaaquelas voltadas para adivulgação de oportunidades detrabalho. Há desde jornaisespecializados em concursos,como a Folha Dirigida, atéveículos como o Emprego Já,lançado pelo Diário de S.Paulocom foco na oferta de vagas emempregos de baixa e médiaqualificação. Uma diversidadeque busca atender àsnecessidades dos leitores, quepodem estar em busca deascensão profissional ou darecolocação no mercado.

MANCHETEO E M P R E G O V I R A

ILUSTR

AÇÃO

: RITA BR

AGA

4 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

MERCADO NESTE TEMPO DE CRISE, O EMPREGO VIRA MANCHETE

comum ouvir por aí reclamaçõessobre o conteúdo dos jornais. De-núncias de corrupção e a violên-cia cotidiana, com destaque para

assaltos e assassinatos, dominam asmanchetes das publicações. Mas há umacrescente fatia de leitores que folheiampáginas e páginas não atraídos pelas tra-gédias humanas. Eles estão atrás é deuma notícia específica. Mais precisamen-te, de uma boa notícia. Buscam umaoportunidade de ingresso ou recolocaçãono mercado de trabalho. Uma tendêncianatural, sobretudo no cenário de criseque, em março, fez o Brasil registrar oíndice de 9% de desempregados.

Os grandes jornais, talvez com basenos dados estatísticos sobre a recessãopublicados por suas próprias editoriasde economia, apressam-se em atenderàs necessidades dos leitores. De olhoneste nicho, e sob a chancela do Diá-rio de S. Paulo, do grupo Infoglobo, foilançado em maio o Emprego Já. A pu-blicação semanal desembarcou em ummercado altamente lucrativo e compe-titivo, que não pára de crescer dianteda elevada procura por empregos e con-cursos públicos. Com 24 páginas, emformato tablóide e todo colorido, onovo jornal leva aos leitores, sobretu-do, informações sobre as vagas abertasem atividades profissionais de baixa emédia qualificação, como pedreiros,eletricistas, balconistas, auxiliares deenfermagem, técnicos de informáticae vendedores.

À frente do projeto estão o EditorLuiz André Alzer e o Gerente ComercialJosé Pereira Guabiraba, que também co-mandam o outro jornal da empresa emSão Paulo, o Diário de S. Paulo.

“O Emprego Já é voltado para quemestá buscando emprego e não qualifica-ção profissional. E isso é o que faz quenão concorra com os cadernos semanaisdos grandes jornais paulistas. Acima detudo, é uma publicação de prestação deserviços e que busca trazer o maiornúmero de vagas de trabalho e concur-sos abertos. Para tanto, valoriza a infor-mação visual, como quadros de resumoao final de cada matéria, tabelas e agen-das sobre o que vem por aí”, explica.

Voltado para as classes B e, sobretu-do, C, o Emprego Já, apesar de ser pro-duzido de forma independente, está su-bordinado à Editoria de Economia doDiário de S. Paulo. Há dois repórteresque trabalham exclusivamente para ojornal. Mas a equipe que produz oscadernos que tratam da área econômicaquando vai fazer pautas para o Diáriotambém escreve a versão específicapara o jornal popular, com a diferençade imprimirem nela maior carga deprestação de serviço.

“A estrutura comercial nos dá condi-ções de oferecer uma publicação maior,com mais vagas. Podemos adotar umapolítica mais agressiva. Oferecemos aosanunciantes pacotes com base na cre-dibilidade do Diário”, conta Alzer.

Um dos atrativos do Emprego Já éexatamente seu preço, que, fixado emR$ 0,50, não pesa no bolso dos leito-

res, incluídos aqueles que, eventual-mente, estão desempregados. Provadisso é que, logo na edição de estréia,a tiragem de 75 mil exemplares se es-gotou rapidamente nas bancas e umareimpressão de outros 8 mil teve queser feita às pressas. Depois foram 102mil exemplares; na terceira semana,110 mil. Outro trunfo para o sucessodo jornal está exatamente na estraté-gia de distribuição.

“Contamos com toda a estrutura dedistribuição em São Paulo, nos Muni-cípios da Grande São Paulo, e tambémno interior, o que atrai anunciantes. Portermos nosso próprio parque gráfico,oferecemos um jornal que, além devisualmente bonito, é mais barato queos concorrentes”, afirma Alzer.

Do total da publicação, 70% do espa-ço são ocupados por inserções comer-ciais e 30% pela parte editorial. Nestafatia, entram não apenas a oferta de va-gas. Há pequenas reportagens sobrevagas em variados níveis educacionais,com maior ênfase nos postos de nívelfundamental e médio, seções sobre con-cursos, estágios, trainees, cursos e co-lunas fixas, nas quais consultores deRecursos Humanos orientam sobrecomo fazer o currículo e personagenscontam suas experiências profissionais.

“Queremos ser o jornal mais com-pleto, com os melhores serviços. Afi-nal, estamos concorrendo pela atençãode um leitor que é sazonal e não fide-lizado”, finaliza Alzer, lembrando que,por tratar-se de iniciativa inédita parao Infoglobo, o formato do jornal aindaestá sendo ajustado conforme o apren-dizado e a repercussão de cada edição.

A chegada do Emprego Já às bancasmexeu com o mercado editorial de SãoPaulo, onde grandes jornais já dedicamespaço fixo para as pautas ligadas aouniverso do trabalho.

“É possível ver que há nas bancasvários produtos voltados para esse tema.Os focos diferem bastante, no entanto.Alguns falam com quem procura empre-go e compra o jornal para ver as vagas.Outros, com o executivo que quer ler so-bre a utilidade de um MBA ou as ten-dências de gerenciamento de pessoas.Não tenho informações para falar sobreo êxito comercial de cada publicação,mas acho que o momento de crise eco-nômica faz que muitos profissionais sepreocupem com as suas carreiras e quei-ram ler sobre isso”, avalia a editoraMariana Iwakura, da Folha de S.Paulo.

O caderno Empregos e Carreiras, pu-blicado pelo jornal, sai aos domingos emconjunto com o Negócios e tem 24 pági-nas, formato tablóide e conta com maisde 600 anúncios, e seções como Educa-ção, Estágios e Trainees e Carreiras.

“Ele é publicado desde 1991. As nos-sas pautas vêm de conversas com fontes,números oficiais, pesquisas, idéias quea Redação tem a partir de temas corren-tes e acesso a personagens com boas his-tórias. Elas são discutidas entre repórte-res e editores e com a Secretaria de Re-dação. Assim como no resto do jornal,evitamos textos muito longos e investi-mos em fotos e artes. O caderno tem umforte componente de serviço, de orien-tação do leitor, mas busca sempre o furode reportagem, o inédito. Focamos o de-senvolvimento da carreira, a formaçãoprofissional, as tendências de RecursosHumanos e a saúde no trabalho, entreoutros temas”, conta Mariana Iwakura.

Com tamanha diversidade de veícu-los que divulgam as oportunidades deemprego, quem sai ganhando é o leitor.Ou melhor, os leitores em geral, de tãodiferentes classes sociais, cada um comas suas necessidades específicas.

“Cada publicação tem seu foco e pú-blico. Aqui, nós valorizamos as repor-tagens mais aprofundadas, com o mai-or número possível de dados exclusi-vos, com personagens expressivos, tex-tos e artes didáticos. Buscamos direci-onar o caderno editorialmente para as-suntos que interessem ao nosso lei-

Os jornais de SP trabalhamtema com foco diferenciado

É

tor médio, que tem curso superior eestá inserido no mercado de trabalhoe no mundo virtual. Em geral, o que elequer é desenvolver a sua carreira”, ex-plica Mariana Iwakura, que, antes dese fixar no Negócios e Empregos e Car-reiras, passou por outros cadernos e su-plementos especiais da Folha de S.Paulo.

Em reportagens curtas, o Empregos eCarreiras aponta tendências do mundodo trabalho. Em fevereiro, por exemplo,foi publicada matéria dizendo que a novalegislação e a crise mundial derrubarama oferta de estágios no País de 1,1 milhãopara 900 mil em apenas quatro meses.

“Apesar de nossas reportagens acom-panharem os classificados, temos totalindependência do departamento comer-cial. Dessa forma, nosso caderno traznão somente o serviço ligado à busca deempregos mas, principalmente, textosinéditos associados ao desenvolvimentodo lado profissional, mesmo em temposde crise”, diz Mariana Iwakura.

Em sintonia com o caderno da con-corrente Folha de S.Paulo, e distante daproposta da oferta de vagas imediatasque orienta o Emprego Já, o suplemen-to Empregos, encartado aos domingosem O Estado de S. Paulo, prioriza a qua-lificação e aponta as tendências nomercado. Feito em formato standardcom oito páginas, também traz o seutradicional classificados de empregos.O Estadão mantém um núcleo de pro-dução de suplementos — três repórte-res que produzem para Imóveis, Empre-gos, Negócios & Oportunidades e Constru-

Luiz AndréAlzer: Jornalesgotou emsua ediçãode estréia.

Tânia Rabello: Caderno do Estadão servede bússola para leitores e dita tendências.

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AÇÃO

5Jornal da ABI 341 Maio de 2009

ção. Na coordenação desse trabalho estáa editora Tânia Rabello, que tambémedita o suplemento Agrícola do jornal.

“No Empregos, que como caderno épublicado há cerca de 15 anos, as pau-tas surgem no cotidiano, por meio de re-leases. Há reportagens extensas e entre-vistas com especialistas. Atualmente,não temos um setorista. Todos os repór-teres se revezam na produção do con-teúdo. As reuniões para discussão depauta são realizadas às sextas ou segun-das. O fechamento acontece sempre àssextas-feiras. Cursos, MBAs e, eventu-almente, concursos ganham destaquenas nossas edições”, conta Tânia, há 17anos no Estadão.

“Justamente por se dirigir ao públi-co do jornal, com cerca de um milhãode leitores das classes A e B, o Empre-gos costuma trazer matérias sobre trai-nees, estágios, mercado de trabalhopara executivos e profissionais liberais,cuidados com a carreira e qualificação.Recentemente nós publicamos maté-ria de página inteira sobre recolocaçãoe técnicas de motivação para quem jápassou dos 40 anos, discutindo comoprolongar a vida útil na profissão. Aproposta é nos mantermos antenadoscom o que acontece e servir de bússo-la, orientando os leitores”, diz a coor-denadora de suplementos do Estadão.

Diz Tânia Rabello que os constan-tes altos e baixos da economia provo-cam reações distintas nos leitores, mas

No Rio, publicação especializadatornou-se referência nacional

Um caso de sucesso, que acabou porservir de inspiração e referência para amaioria das publicações surgidas nasáreas de concursos e empregos em vá-rios pontos do País: jornal com circu-lação bissemanal no Rio de Janeiro ecom edições semanais em quase todosos Estados do Brasil, a Folha Dirigidasurgiu em 1985, então como veículoquinzenal e com a tiragem de 3 milexemplares. Hoje, passados 24 anos,com todas as suas publicações, queincluem cadernos de testes e ediçõesextras, o grupo consolida uma tiragemmensal na casa dos 1,5 milhão de exem-plares. Além dos impressos, investepesado na internet – seu site tem3.270.754 de internautas cadastrados.

“A implantação do jornal foi frutodireto da experiência de nosso Diretor-Geral, jornalista Adolfo Martins, quefoi responsável pela formulação e ma-nutenção de uma editoria de Educaçãoe Empregos no Jornal dos Sports durantequase 20 anos. Ele tinha a percepção deque havia um vácuo no mercado edi-torial segmentado, que devia ser ocu-pado. E fez essa tentativa bem-sucedi-da com o jornal, que hoje circula emnível nacional”, conta Rogério Rangel,Diretor de Redação da Folha Dirigida.

Em que medida o momento de cri-se provoca reflexos na confecção deum jornal exatamente voltado para aoferta de empregos e oportunidadesde trabalho?

“Eu não diria que esse cenário for-talece ou fragiliza os jornais ou as edi-torias setoriais desse segmento. Diria,sim, que aumenta a nossa responsa-bilidade, pois os leitores ficam maisávidos por matérias com esse viés.Contudo, o noticiário, naturalmente,estreita-se junto com o estreitamen-to das atividades econômicas”, explicaRogério Rangel, que revela como se dáo processo de escolha das manchetesdas edições.

“O jornal tem procurado prospectarboas oportunidades e antecipá-las paraos leitores, sobretudo na carreira pú-blica. As manchetes mantêm-se den-tro da nossa diretriz editorial. Emmuitos casos, elas são produzidas emcima de apuração de oportunidadesfuturas anunciadas com alguma ante-cedência. O objetivo é permitir que osleitores não sejam apanhados de sur-presa. Muitas vezes os concursos só sãoanunciados em cima da hora, quandoo edital já está no Diário Oficial. E issodificulta a vida dos candidatos, estreitaas chances de obter a aprovação. Enten-demos que o papel do jornal especi-alizado, nesse segmento, é continuardando sua contribuição para que atransparência seja adotada por todosos órgãos públicos, em todas as fasesde um concurso”, diz.

A dificuldade de acesso a informa-ções de interesse público, que tantomarca a gestão de alguns desses órgãos,é realmente a maior desafio na elabo-ração do jornal especializado.

“Falta a cultura, tanto na iniciati-va privada como no setor público, dedar transparência a seus processos se-letivos. A reportagem luta para furarmuitas barreiras, nessa busca de infor-mações de interesse dos leitores, comoas oportunidades no mercado”, reve-la Rogério Rangel, que destaca comopositiva a política de transparênciaadotada por órgãos como a Receita Fe-deral, a Polícia Rodoviária Federal eo Banco Central.

Com uma estratégia de grande ex-posição nas bancas, a Folha Dirigida,que dedica um caderno exclusivo à co-bertura educacional, tem os seus nú-meros de venda diretamente ligados aopoder de fogo de suas manchetes.

“Nossas maiores vendas acontecemquando as manchetes atingem um es-pectro mais amplo de leitores – porexemplo, nos concursos de nível bási-co ou médio. E quando há significati-vo número de vagas, com remuneraçãoatraente. Nem sempre uma oportuni-dade de trabalho, seja na carreira pú-blica ou no setor privado, conseguereunir esses três elementos a um sótempo”, revela.

Diz o Diretor de Redação da FolhaDirigida que, há um interesse crescentedas pessoas por boas oportunidades detrabalho – e não somente neste mo-mento de crise. O que ajuda a explicaro incremento de suplementos especí-ficos e até o lançamento de novos pro-dutos no mercado editorial.

“É natural que seja assim. Este é umserviço complementar que os jornaisde interesse geral prestam aos seus lei-tores. Acredito que o jornalismo deserviço, que é o que fazemos basica-mente, não nos isenta do esforço deproduzir um jornalismo de debate so-bre os grandes temas ligados ao mer-cado de trabalho. E também procura-mos fazer um jornalismo fiscalizadorem relação à transparência e serieda-de dos concursos”, conclui.

pouco alteram o rumo da edição.“Há dois momentos distintos. Quan-

do a economia está em ascensão e quan-do ela está em crise. Na boa fase da eco-nomia, temos naturalmente o cresci-mento do emprego. Então, o perfil docaderno se encaixa bem, já que é foca-do na prestação de serviços, sobretudoem dar subsídios para o leitor construirsua carreira. Em épocas de crise, estasinformações são mais úteis ainda; afi-nal, o leitor procura formas de aumen-tar a sua empregabilidade. E é exata-mente neste foco que o caderno traba-lha”, diz ela, que arremata:

“Creio que o Empregos do Estadão émais inspirador do que inspirado emoutras publicações. É um caderno quedita tendências”.

Rogério Rangel: O nosso papel é cobrarmais transparência dos órgãos públicos.

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6 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

O GLOBO E SUAS MUDANÇAS

Faz tempo que O Globo resolveu cri-ar um caderno específico para a publi-cação de ofertas de emprego, bemcomo de matérias relacionadas às atu-ais tendências do comportamentoprofissional, como a necessidade deconstante qualificação profissional. Ocaderno Boa Chance foi editado pelaprimeira vez em 12 de setembro de1993. Daquela época para cá, muitosaspectos da economia mudaram noPaís, é verdade. Outros, não, comoaponta Léa Cristina, editora do suple-mento dominical.

“Na verdade, não conheci o mun-do em que, no Brasil, sobrasse empre-go. Portanto, dentro ou fora desta criseatual, as editorias de emprego têm umpapel social fundamental: as reporta-gens que mostram em quais setores hávagas de trabalho acabam sendo essen-ciais. Agora, o contexto de crise for-talece, sim, essas editorias, no senti-do de que mais gente passa a procu-rar trabalho. A força desse serviço ficaevidente, por exemplo, no caso doDiário de S. Paulo, que lançou recen-temente um jornal popular neste seg-mento”, afirma Cristina, numa refe-rência ao Emprego Já.

Léa Cristina, no entanto, defendemaior abrangência editorial nos cader-nos de concursos e empregos. “É bomlembrar que um caderno como esse nãopode se limitar só a publicar reporta-gens para quem está desempregado nomomento. Não podemos esquecer quea maioria das pessoas que compramjornal está empregada. Assim, nósdevemos discutir aspectos como o de-senvolvimento de carreira, as relaçõescorporativas e a importância do empre-endedorismo. A gente quer ser lido,regularmente, pelo maior número depessoas possível”, explica.

A editora do Boa Chance reconheceque o atual contexto de crise provocoumudanças no foco das matérias traba-lhadas na capa do suplemento.

“Alguns concursos ganharam statuseditorial. Por exemplo: podemos pas-sar para a capa do caderno o processoseletivo de um órgão federal de 200 va-gas, com salários iniciais de R$ 4 mil evalendo para todos os que tenham for-mação superior. Antes da crise, prova-velmente esse concurso ficaria numapágina interna”, aponta Cristina, quevê outras mudanças em curso nos prin-cipais jornais.

“A internet nos joga rapidamentenuma nova realidade. O jeito de fazerjornal está mudando substancialmen-te. O jornalismo, seja ele de serviço ounão, não é mais aquele que nós fazía-mos há apenas três anos. Tenho a im-

MERCADO NESTE TEMPO DE CRISE, O EMPREGO VIRA MANCHETE

Estes tambémcorrem atrás

pressão de que a pauta de serviço ten-de a se fazer mais presente no on line– ficando a análise para o jornal depapel. De qualquer forma, o on lineainda é um espaço a ser mais explora-do e entendido”, acredita Léa Cristina.

Repórter da editoria de Economia etitular da coluna Concursos & Empre-gos de O Dia, Andréa Machado expli-ca quais critérios são necessários paraque uma oportunidade de empregoganhe espaço na capa do jornal.

“Sempre que um grande concursoacontece é possível, sim, entrar na pri-meira página. Notícias de abertura deinscrições, suspeitas de fraudes e pro-blemas ocorridos durante a aplicaçãodas provas também disputam espaçonas chamadas. Se o concurso é bom,com expressivo número de vagas ou

outros dados de forte apelo para nos-sos leitores, as chances de a matéria vi-rar manchete são grandes. E quandoisso acontece, os retornos são ótimos.Há um grande interesse em conquistaruma estabilidade e ter melhores empre-gos e condição de vida”.

Conta Andréa Machado que o atu-al cenário de recessão não trouxe mu-danças na forma como o jornal divul-ga as oportunidades no mercado.

“Alteração de foco não houve. O Diacontinuou priorizando as boas oportu-nidades de empregos, estágios e con-cursos. Em relação a estes últimos, ali-ás, eles continuaram acontecendo,apesar das declarações do Governo Fe-deral de que sofreriam cortes. Do fimde 2008 até agora, várias autorizaçõesem âmbito federal foram publicadas eeditais foram divulgados. No Estado doRio e em Municípios fluminenses o rit-mo continua o mesmo de antes do iní-cio da crise financeira mundial. Emrelação às empresas, foi possível sen-tir redução. Por cautela, as contrataçõesficaram mais lentas, mas em momen-to algum elas deixaram de existir. Asoportunidades continuaram chegando.E o jornal continuou a cumprir seupapel de divulgá-las”.

E a repercussão da coluna junto aosleitores do jornal, voltado especialmentepara o público de classe C, é evidente.

“Currículos chegam quase que dia-riamente. Então, tomo o cuidado deresponder. Peço aos leitores que os en-

caminhem diretamente para a empresaresponsável pelo recrutamento. Rece-bo até currículos que nem têm a vercom as vagas divulgadas pela coluna.As pessoas acham que os recebemosassim... Mas a demanda maior é emrelação aos concursos. São leitores comdúvidas sobre inscrições, exigênciasdos editais, ou querendo saber sobreprevisão da convocação, da lista deaprovados... Ainda há muita falta de in-formação. Como não há lei federal quediga o que é certo ou não nessas sele-ções, há coisas que ficam sem respos-tas. Mas o retorno dos leitores é inte-ressante, pois eles nos pautam comsuas dúvidas”, resume a jornalista.

Também o Jornal do Brasil voltou assuas baterias para o jornalismo de ser-viço, com um caderno dedicado àsoportunidades no setor público e nainiciativa privada. Lançado em 17 desetembro de 2008, com previsão inicialde oito edições, o suplemento semanal,veiculado nas edições de quarta-feira,superou as expectativas e ganhou es-paço cativo no jornal. O encarte, emmédia com oito páginas, presta auxí-lio aos leitores que buscam orientaçãopara ingressar no funcionalismo, ounas vagas abertas na iniciativa priva-da, para a recolocação no mercado.

“O JB Concursos surpreendeu. É umverdadeiro sucesso, tanto que o Jornaldo Brasil recebeu vários elogios de lei-tores, que aproveitam também para dardicas e sugestões, que sempre são bemaceitas. A repercussão é muito boa, dasmelhores. Logo na segunda edição nósjá conseguimos aumentar as vendas em20%”, avalia Ângelo Chaves, Diretor deMercado Leitor do JB na época do lan-çamento da publicação, lembrando queo caderno traz dicas para o candidatopassar em concursos, depoimentos deaprovados em seleções anteriores etestes simulados de provas, além de re-portagens especiais.

Em algumas bancas do Rio de Janei-ro os exemplares do Jornal do Brasilchegaram a vender 12 vezes mais doque o normal até então registrado nasquartas-feiras.

“Além dos leitores fiéis, nós conse-guimos atrair outros novos com esse in-cremento. O suplemento veio para so-lidificar a credibilidade da nossa publi-cação. O mercado de concursos e em-pregos é aquecido e promissor”, afir-ma Ângelo Chaves.Andréa Machado: Os leitores nos pautam com suas dúvidas.

MARC

ELO RÉG

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EM O DIA, CHUVA DE CURRÍCULOS

O SALTO DE 20% DO JB

7Jornal da ABI 341 Maio de 2009

“Caro Maurício Azêdo,É de justiça termos tacitamente como

ponto de partida que todos lamentamosessa dispersão do acervo cultural de JorgeAmado. Haveria, com um mínimo delucidez, outra posição admissível quenão essa? Obviamente, não. Não haven-do, o pressuposto seguinte na lista deitens fundamentais desta discussão é aresponsabilidade ao assumir e publicizarposições. Porque é igualmente óbvio quea participação na esfera pública exige res-ponsabilidade –e, ao apresentar esta exi-gência, a participação automaticamen-te confere ao item responsabilidade amesmíssima gravidade dos demais te-mas componentes da discussão.

E exige responsabilidade inclusive emrelação a fundamentos de imprensa,item em que a carta do Presidente da ABIfalha inapelavelmente.

O primeiro fundamento de impren-sa: fatos. A carta usa expressões (“alhe-amento”, “omissão”, “crime”, “cumpli-cidade”, “imperdoável ofensa”) que opudor veta a qualquer um –quanto maisa jornalistas e quanto mais a um Presi-dente da ABI– quando as expressões nãomostram liga com os fatos. Expressõesque, ao desrespeitar a economia do pu-dor que os fatos ancoram, imediatamen-te murcham e se reduzem a meros toquesvazios de um texto.

Fatos: o histórico do Ministério regis-tra um total de 21 projetos que de algu-ma maneira envolvem a memória des-se escritor símbolo. Desses 21 projetos,quatro (ou seja, apenas um, de cada cin-co) são de iniciativa da Fundação Casade Jorge Amado. Dos quatro projetos daFCJA, três foram aprovados pelo Minis-tério. Dos três projetos aprovados, emdois a FCJA nada captou junto às empre-

sas em condição de contribuir com acultura por meio da Lei Rouanet.

É possível a olhos honestos veremnisso algum “alheamento”, “omissão”,“crime”, “cumplicidade” ou “imperdoá-vel ofensa” por parte do Ministério?

Desses três projetos da FCJA aprova-dos, dois o foram pelo Fundo Nacional deCultura, ou seja, com repasse direto doMinistério (circunstância em que o pro-ponente não precisa produzir argumen-tos resistentes ao crivo de empresas).Esses dois projetos com FNC se referiama acervo: “Inventário analítico do acervodocumental” (0610416) e “Digitalizaçãodo acervo fotográfico” (078722).

Do total geral de 21 projetos, propos-tos tanto pela FCJA quanto por outrasinstituições e empresas, 16, ou pratica-mente quatro em cada cinco foram apro-vados pelo Ministério. Mas, desses 16aprovados, 10 simplesmente não conse-guiram convencer mercado e sociedade:tiveram captação zero. Atenção a esteponto: dos 16 projetos aprovados, 10 nãoconvenceram nem mercado, nem sociedade.Temos aí, portanto, uma infeliz propor-ção de praticamente dois em cada trêsprojetos rejeitados pelo mercado e/ou so-ciedade. A coerência pede a repetição dapergunta fundamental: algum indício de“alheamento”, “omissão”, “crime”,“cumplicidade” ou “imperdoável ofen-sa” por parte do Ministério?

Ainda como fundamento de impren-sa, cabe repor a verdade em relação tam-bém a outro acusado nessa mensagemdo Presidente da ABI, o Governo do Es-tado da Bahia. O Governo do Estado daBahia é proponente, segundo o históri-co, em pelo menos três projetos. Todosos três em regime de Fundo Nacional deCultura, ou seja, com repasse direto do

Ministério. Um deles (987616), voltadoà “preservação e divulgação do acervosobre a vida e obra de Jorge Amado”.Dois foram aprovados. Onde, portanto,o “alheamento” do Governo do Estadoda Bahia?

Mais. Os registros disponíveis noportal do Ministério para consulta pú-blica listam um projeto capital para oabrigo, preservação e manutenção doacervo. Trata-se do 055653, voltado àcriação do Memorial Jorge Amado/Casado Rio Vermelho –tema central, portan-to, nessa discussão. No valor de R$2.995.865,00, foi aprovado pelo Minis-tério, com a legal, legítima e razoáveladequação para R$ 2.350.000,00. Esteprojeto teve captação zero. Atenção aodestino do projeto: foi alvo de um pedi-do de arquivamento proposto por... seupróprio proponente, a Fundação RobertoMarinho. Novamente: algum indício de“alheamento” por parte do Ministério?

Cabe ainda lembrar que até hoje nãofomos procurados diretamente pela fa-mília/instituição Casa de Jorge Amadoespecificamente para este fim.

Um último fundamento de impren-sa: o perguntar. Pergunte-se: onde este-ve o Presidente da ABI, todos estes anosem que um Ministério da Cultura ener-gizado pela legitimidade nacional e in-ternacional de um Gilberto Gil clamoupelo 1% do orçamento nacional preco-nizado pela Unesco, minimamente ne-cessário para dar conta de tantas e tan-tas demandas fundamentais para a iden-tidade cultural do País? Onde esteve oPresidente da ABI, que nem um bilhete,que dirá uma carta, se dignou a rabiscarpara mostrar-se presente, seja de queforma legítima fosse, inclusive a da crí-tica lúcida?

Pois o ato mesmo de sair do anonima-to para questionar supõe e exige a res-ponsabilidade no pensar e pensar no quefalar. Onde esteve e onde estava? Quan-do, ao longo dos anos, artistas, jornalis-tas e instituições sérias, sem abrir mãojamais de sua autonomia, independên-cia e crítica, manifestaram seu apoio esua reivindicação por mais verbas, emuníssono com o ministério?

Cabe perguntar: não se tratou, portan-to, este sim, de um caso de “alheamento”,“omissão”, “crime”, “cumplicidade” ou“imperdoável ofensa”?

Cordialmente (a) Juca Ferreira, Minis-tro de Estado da Cultura.”

A resposta do Presidente da ABI, di-rigida ao Assessor de Imprensa NeiBomfim em 14 de abril passado, foi va-zada nos seguintes termos:

“Prezado Nei Bomfim,Pedindo-lhe desculpas pelo atraso

com que o faço, inferior, porém, ao tem-po decorrido entre a resposta do Minis-tro Juca Ferreira e a chegada desta àsnossas mãos, acuso o recebimento do e-mail com que Você nos encaminhou acontestação dele àquilo que considera-mos alheamento, omissão, crime, cum-plicidade e imperdoável ofensa no queconcerne ao acervo de Jorge Amado.

A esta altura, é ocioso discutir aquestão, já que a Coleção Jorge Ama-do foi esfarinhada entre os que pude-ram arrematar suas peças, mas nãocusta dizer que a preservação desseacervo não deveria depender do inte-resse do mercado. Pela sua importân-cia, a Coleção Jorge Amado exigia umaintervenção do Estado Nacional, quepoderia sensibilizar suas empresas (Pe-trobras, Eletrobrás, Furnas, Caixa Eco-nômica, Banco do Brasil, etc, etc.) paraaplicar recursos na salvação de bens de-masiado importantes para a culturanacional e para a nossa memória afe-tiva (durante largo tempo Jorge foi omaior, o mais lido e o mais queridoescritor brasileiro). O Banco do Brasil,por exemplo, fez um derrame de dinhei-ro, comprando a primeira página dosprincipais diários do País, numa ediçãodominical para tecer loas aos seus 200anos, em maio passado. Um décimodesse desembolso perdulário e desne-cessário salvaria a Coleção Jorge Amadoe a Fundação Casa de Jorge Amado dasagruras que vivem, com grave prejuí-zo para a cultura do País e da Bahia.

Agora, Inês é morta. A Coleção foiretalhada e nem o Ministério Públicoda União, cuja intervenção a ABI re-quereu formalmente, produzirá ago-ra o milagre de recompô-la.

Por fim, o Ministro Juca Ferreira per-guntou onde eu estava quando o Minis-tro Gilberto Gil defendia a destinação àcultura de 1% do orçamento federal.

Respondo, sem me sentir ofendido:estava onde estou desde os 16 anos, háquase 60 anos portanto: na linha defrente da defesa dos interesses do povoe do País, ainda que isso me custasseprisões, torturas e desempregos. Estoue estava onde as obras de Jorge Ama-do indicaram que deveriam estar to-dos aqueles preocupados com a digni-dade da espécie humana.

Cordialmente (a) Maurício Azêdo,Presidente da ABI.”

CONTESTAÇÃO

MINISTRO JUCA FERREIRA:NINGUÉM QUIS SALVAR

A COLEÇÃO JORGE AMADOO Ministério da Cultura registrou um total de 21 projetos relacionados direta

ou indiretamente com a preservação da memória do escritor. Mesmo com o estimuloda Lei Rouanet, não houve quem quisesse patrocinar algum desses projetos.

Através de seu Assessor de Imprensa, jornalista Nei Bomfim, o Ministroda Cultura Juca Ferreira cobrou da ABI a publicação do e-mail que dirigiu àCasa acerca do desfazimento da Coleção Jorge Amado, em leilão realizadoem novembro passado. Diz Ferreira que o Ministério registrou a apresenta-ção de 21 projetos relacionados direta ou indiretamente com a memória deJorge, quatro deles propostos pela Fundação Casa de Jorge Amado. Três des-tes foram aprovados pelo Ministério, mas não houve quem se dispusesse afinanciá-los, com o estímulo da Lei Rouanet.

O Jornal da ABI publica a manifestação do Ministro, bem como a respos-ta que o Presidente da ABI lhe dirigiu diante das indagações que Ferreira fez:onde ele, Maurício, estava quando artistas e jornalistas clamavam por maisverbas para o Ministério da Cultura.

É este o e-mail do Ministro:

“O acervo nãodeveria

dependerdo interessedo mercado”

8 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

HISTÓRIA

Stalingrado,o funeral do

nazismo

Paulo Ramos Derengoski, jornalista e associado da ABI, é radicado emLages, Santa Catarina.

Stalingrado – nas noites estreladas de minhainfância, nas coxilhas grandes, toda a família àvolta de um rádio Phillips ligado em baterias,lembro-me de alguém repetindo aquela estranhapalavra: Stalingrado!

Foi exatamente há 66 anos que a Humanida-de, perplexa, assistia ao início da maior batalhaterrestre de todos os tempos.

Depois do grave erro estratégico, contrarian-do o conselho do Estado-Maior prussiano quefoi a invasão da União Soviética em três fren-tes – a máquina de guerra de Hitler era detida...O avanço sobre Leningrado, Moscou e Cáuca-so havia emperrado. As tropas de elite da Wer-macht tinham sido obstaculizadas em seu avan-ço fulminante.

Foi então que o anão de Viena resolveu con-centrar forças no Sul, visando os campos petro-líferos caucasianos, pretendendo sangrar o pe-tróleo que corre pelas veias de todas as guerrase – talvez – retomando os sonhos de conquistasdo grande Napoleão.

POR PAULO RAMOS DERENGOSKI

O avanço inicial foi irresistível. Os blindadosse lançaram nos banhados entre o Don e o Do-netz. Mas as ordens de Berlim exigiram que elese dividisse entre o Cáucaso e uma cidade nasmargens do Volga: Stalingrado. O erro foi fatal.

Obcecado em conquistar a cidade que levavao nome de seu maior inimigo, Hitler voltou a ig-norar o conselho do Estado-Maior de que “se-ria impossível manter um extenso flanco duranteo rigoroso inverno na linha de Don”, enquantoo resto da tropa mergulhava para o Sul. De ondenão voltaria...

O contra-ataque russo, com tropas frescasvindas da Sibéria, que combatiam sem camisanas nevascas para mostrar coragem, somadasaos veteranos das estepes, se avolumou. Os ale-mães – diga-se – foram corajosos. Eram guer-reiros ousados. Fulminantes no ataque. Orga-nizados na retirada.

O General Von Paulus, Comandante do VIExército, depois promovido a marechal, únicooficial dessa patente na Wermacht a se deixarprender –, mostrava suas discordâncias como astáticas nazistas. A partir de dezembro de 1942,seus 300 mil soldados estavam cercados pelaslegiões russas que, em ondas humanas, vinhamda esteira do Volga.

Ao relembrar Stalingrado é necessário dizerque na Rússia, como na Polônia, a ausência demontanhas facilitava muito o avanço dos blin-dados e as barreiras eram constituídas pela im-portância dos rios: o Don silencioso, o Dvinaempedrado, o Dniester e seus tributários. Nasmargens deles se travou o complexo de batalhasque definiu o rumo da última guerra.

No início de 1943, Moscou e Leningrado ha-viam levantado o cerco. A artilharia soviética –a força com maior poder de fogo que já se mo-veu na face da Terra – clareava as noites com aexplosão simultânea de milhares de bocas, lem-brando as alvoradas.

9Jornal da ABI 341 Maio de 2009

10 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Aconteceu na ABIAconteceu na ABIAconteceu na ABIAconteceu na ABI

CONFERÊNCIA

Os compromissos da tv pública:isenção, pluralidade, diversidade

Em conferência na ABI, a Presidente da TV Brasil, jornalista Tereza Cruvinel,fala das origens da emissora e de seu compromisso com a liberdade de informação.

POR CLÁUDIA SOUZA

Jornalistas, cineastas, produtoresculturais, estudantes, sócios e conse-lheiros da ABI, além de pessoas co-muns, lotaram a Sala Belisário de Souzana noite de 11 de maio para assistir aodebate A importância da TV Pública paraa democratização dos meios de comunica-ção, que teve como expositora a jorna-lista Tereza Cruvinel, Presidente daEmpresa Brasil de Comunicação-EBC.

O encontro foi aberto com a sauda-ção de Maurício Azêdo aos presentese, em especial, à Presidente da EBC.

– Tereza Cruvinel como profissionalde imprensa é merecedora da nossa ad-miração pela competência e pelo altosentido ético com que tem feito jorna-lismo. Gostaria de agradecer a sua dis-posição de comparecer à ABI, a Casa doJornalista, para um debate franco emrelação a questões tão importantescomo aquelas relacionadas com a tvpública, que pode se constituir, com odecorrer do tempo, em forte instru-mento de democratização da informa-ção e da opinião no Brasil.

Agradecendo a oportunidade de dis-cutir temas relevantes à imprensa na-cional, Tereza destacou a importânciade participar do evento na ABI:

– Mais do que como Presidente daEBC, é como jornalista que eu tenhomuita alegria e especial emoção de es-tar aqui na Casa do Jornalista, comodisse Azêdo. Casa de Barbosa LimaSobrinho, Casa que eu freqüentei najuventude, como estudante, comomilitante pela redemocratização.Muito antes de ser jornalista eu já fre-qüentava a ABI. Ao longo dos meus 25anos de jornalismo político, o tempotodo estivemos juntos, não só comojornalistas, mas acompanhando a pre-sença da ABI nas lutas democráticas,como em 1976, no episódio da explo-são da bomba, que eu cobri. Lembrotambém perfeitamente da tarde emque Barbosa Lima Sobrinho, juntamen-te com o então Presidente da OAB,Marcelo Lavenère, entrou no SalãoVerde da Câmara dos Deputados como pedido de impeachment do Presiden-te Fernando Collor.

Um pouco de HistóriaTereza iniciou a palestra recordan-

do a história da radiodifusão na Euro-pa e no Brasil:

– Nos anos 50, os governos dos Es-tados nacionais europeus criaram asprimeiras emissoras de rádio e televi-são, que ganharam natureza pública nosentido do controle social. No Brasil,embora o Presidente Getúlio Vargastenha tido a iniciativa de criar a RádioNacional, a primeira emissora de gran-de projeção, e também um projeto paraa tv nacional, foi Assis Chateaubriandquem ganhou a primeira concessão detv. Portanto, no Brasil, começamostendo apenas uma tv comercial nomodelo americano, no qual a publici-dade financia e a audiência está subor-dinada a essa lógica. Em 21 de abril de1960, com a inauguração de Brasília,Juscelino desengavetou o projeto deGetúlio Vargas e criou a TV Nacionalde Brasília, hoje canal da TV Brasil.

O projeto para a criação de uma redede tv pública ganhou força no País, lem-brou Tereza, na década de 80, durantea Constituinte, com o apoio de parla-mentares, jornalistas e instituições:

– Entre aqueles que abraçaram estaluta, aproveito para homenagear a me-mória da Deputada e jornalista CristinaTavares, da qual sou biógrafa. Citotambém o jornalista e Deputado MiroTeixeira, a ABI, o Sindicato dos Jorna-listas e outras dezenas de entidades eacadêmicos que participaram do mo-vimento pela criação de uma tv públi-ca e de uma dimensão democrática parao sistema de radiodifusão. Nós quecobrimos a Constituinte sabemos queela é avançada em alguns pontos, massofreu o impacto das forças conserva-doras do chamado Centrão, que impe-dia que a esquerda, liderada por MárioCovas, conquistasse muitas mudanças.Não conseguimos naquele momentocriar o sistema público de tv, mas apro-vamos o artigo 223, que assegura aoPoder Legislativo conceder, designar oscanais de rádio e televisão, observan-do a complementaridade entre o siste-ma privado, e o estatal, público. Des-de então, muitas televisões estatais

foram criadas. Vinte anos se passaramsem que este artigo promovesse mu-danças no sistema de radiodifusão bra-sileira, que continuava sendo exclusi-vamente privado, concentrado nasmãos de poucos grupos, o que umademocracia não permite nesse grauregistrado no Brasil.

“Compromissos inalienáveis”Em 2007, destacou a Presidente da

EBC, foi retomada a luta pela democra-tização do sistema de radiodifusão,com o Fórum da TV Pública, que reu-niu um conjunto de entidades e pesso-as, sob a liderança do Ministro Gilber-to Gil. O encontro resultou na Carta deBrasília, que pedia a implantação dosistema público de radiodifusão:

– O Presidente Luiz Inácio Lula daSilva implantou a Carta de Brasília,através do Ministro Franklin Martins.Eu recebi o convite para dirigir a EBC.Abri mão de uma trajetória profissio-nal consolidada para construir algo ine-xistente, um projeto duradouro, de in-teresse público, de contribuição à de-mocracia. Me afastei daquilo que maisme mobiliza na vida que é a relação co-tidiana com a notícia, mas para fazera TV Brasil.

Disse Tereza que até abril de 2008 aluta pela construção da TV Brasil foitravada no Congresso e junto à socie-dade, para conquistar o debate políti-co. As questões burocráticas, como aincorporação da Radiobrás e a estrutu-ração da EBC, foram tratadas adiante,até o mês de junho. Em seguida, teveinício o projeto de construção da novaprogramação da emissora:

– Em 2 de dezembro de 2007, a TVBrasil entrou no ar com o novo nome.No dia seguinte, estreamos a edição no-turna do telejornal Repórter Brasil, e,pouco depois, a edição da manhã. Sem-pre entendemos que o direito à infor-mação é um dos compromissos inali-enáveis de uma tv pública. O nosso ob-jetivo é fazer um jornal que revele a di-versidade do Brasil, deixando de ex-pressá-lo apenas com imagens de Riode Janeiro, São Paulo e Brasília e carac-terizando na tv pública as noções deisenção, pluralidade, diversidade.

Na programação, sublinhou, a metaé alcançar a função educativa no sen-tido amplo, contribuir para a formaçãocrítica do cidadão e evitar o que é fei-to na tv comercial.

— Nosso objetivo é fazer um jornalismo que revele a diversidade do Brasil, deixando deexpressá-lo com imagens apenas do Rio, São Paulo e Brasília, disse Tereza Cruvinel.

JOSÉC

RU

Z/ABR

11Jornal da ABI 341 Maio de 2009

– No ano passado, pela primeira vezuma televisão cobriu as festas juninasdo Nordeste, expressão forte de nos-sa diversidade cultural. A programa-ção da TV Brasil vai expressar etnias,ecologia. Também temos grande pre-ocupação com a América Latina. A TVBrasil é aberta, generalista e tem ape-nas quatro canais próprios. Ela teminovado no sentido de dar destino às24 tvs educativas que estão perdidas,abandonadas, sem projetos. É um pa-trimônio do povo brasileiro, com oqual estamos constituindo a redepública de televisão.

Atraindo os independentesPara equipar todo o sistema, nos

últimos meses foram destinados R$110 milhões a licitações. Vencer o pre-conceito, obter o reconhecimento dojornalismo de qualidade, renovar agrade de programação e expandir econsolidar a rede própria e a associadasão as prioridades:

– Vamos instalar os canais digitaisO próximo será o do Rio de Janeiro.O futuro da tv pública não está nosistema analógico, que vai terminarem 2016. Apesar da crise econômi-ca, continuaremos investindo e cum-priremos uma série de agendas rela-tivas à democratização, como o Fó-rum das TVs Públicas, a ser realiza-do no fim deste mês, e a ConferênciaNacional de Comunicação, onde es-taremos lutando, junto com a ABI eoutras entidades do campo democrá-tico, por um marco regulatório da ra-diodifusão brasileira que respondaaos novos desafios tecnológicos. Nofinal deste ano, sob o patrocínio daEBC, realizaremos o Seminário deMídias Públicas da América Latina,buscando o fortalecimento deste se-tor e do campo público. Na Argenti-na, o debate do momento é a nova leide radiodifusão. O Paraguai está pe-dindo a nossa ajuda para a implanta-ção da tv pública paraguaia. O Uru-guai também.

Ainda sobre a programação da TVBrasil, Tereza Cruvinel destacou asações de apoio à produção indepen-dente:

– Queremos fortalecer as formasmais republicanas de construir esta te-levisão. Na semana passada, por exem-plo, lançamos um regulamento paraa contratação de programas feitos porprodutores independentes. Precisa-mos construir esta programação coma participação dos atores excluídos,que estão fora das grandes estruturas.Em relação aos conteúdos regionais,estamos construindo formas de asso-ciação para co-produções com as tvsestaduais, comunitárias e universitá-rias. Vamos lançar o Pitching TV Bra-sil, com base na Lei nº 8.666 (Lei de Li-citações), para dar oportunidade atodos. Lançaremos também uma for-ma republicana de licenciar conteúdosjá existentes. E estamos envolvidos noprojeto denominado Operador Naci-onal da Rede Pública Digital.

Tereza ressaltou que a EBC operatambém com oito emissoras de rádio,que prestam importantes serviços, es-pecialmente em áreas distantes e iso-ladas do País, com a Agência Brasil, ea EBC Serviços, braço paralelo queopera sob contrato com o Governo Fe-deral para realizar o canal NBR, o pro-grama Café com o Presidente, viagens doPresidente da República e outros atosoficiais.

Jornalismo com isençãoEm resposta a pergunta do Conse-

lheiro Mário Augusto Jakobskind so-bre o apoio da TV Brasil a jornalistasque estão fora da chamada grandemídia, Tereza Cruvinel lembrou o com-promisso da emissora com o jornalis-mo isento, não-governista, que exige,disse, sacrifício da opinião em detri-mento da informação.

– Jornalistas das mais diversas opi-niões deverão participar dos nossosdebates, como no programa Três aUm, ancorado pelo jornalista LuizCarlos Azêdo, sobrinho de MaurícioAzêdo. Estamos empenhados em con-solidar o espaço da credibilidade e dainformação.

Questionada pela cineasta Tetê Mo-raes, Presidente da Associação Brasilei-ra de Cineastas do Rio de Janeiro, so-bre o incentivo ao setor audiovisual eàs produções independentes, Terezareforçou as ações vinculadas à políti-ca de parceria com este setor, em espe-cial os editais de pitching.

Os participantes do evento sugeri-ram debates na TV Brasil em torno detemas como a Conferência Nacional daComunicação, a exigência do diplomapara o exercício do jornalismo e a im-plantação de programas sobre susten-tabilidade, educação ambiental, músi-ca, esporte, entre outros.

Ao final do encontro, o Presiden-te da ABI agradeceu a presença de Te-reza Crivinel e da platéia e o empe-nho do Presidente da Comissão de Li-berdade de Imprensa e Direitos Hu-manos, Wilson Fadul Filho; do Con-selheiro Mário Augusto Jakobskind,membro dessa Comissão, e do Primei-ro-Secretário do Conselho Delibera-tivo da ABI, Lênin Novaes, na orga-nização do debate:

– Desejamos que Tereza prossiganesta senda que abriu, marcada porêxitos conquistados com extrema di-ficuldade, inclusive arrostando incom-preensões inadmissíveis e inoportunas,por se tratar de empresa de criaçãorecente. Agradecemos por esta de-monstração de seu espírito democrá-tico dialogando em torno de uma ques-tão tão relevante com a comunicaçãoe a tv pública no Pais.

Os Sertões, em sambaNo encerramento do ato, o compo-

sitor Edeor de Paula, acompanhadopelos presentes, entoou o samba OsSertões, de sua autoria, enredo da Escolade Samba Em Cima da Hora no Carna-val de 1976.

Turma de ensino médio de escola estadual visita o Edifício Herbert Moses.

A ABI recebeu na tarde de 27 demaio cerca de 40 alunos do ensinomédio da Escola Estadual MariaZulmira Torres, localizada no Mu-nicípio fluminense de Cachoeirasde Macacu, os quais vieram conhe-cer um pouco da História do jorna-lismo brasileiro.

A professora de Português e Lite-ratura Cláudia Nascimento explicouque a visita faz parte de um progra-ma do Governo do Estado, que, atra-vés do Plano de Desenvolvimento daEducação-PDE, incentiva o desen-volvimento de projetos direciona-dos aos alunos do ensino médio darede estadual de ensino:

– Para a nossa escola está previs-ta a criação de um jornal. Então, tivea idéia de convidar o jornalista Eras-mo Trielli Júnior para ministrar pa-lestras para os alunos. O programatambém inclui a visita a uma insti-tuição de comunicação e o Trielliescolheu a ABI.

Disse a Professora Cláudia que aidéia de criar um jornal feito pelosalunos surgiu a partir da constataçãode que os jovens têm recebido um vo-lume grande de informação, mas nãosabem bem como utilizá-lo:

– Eles têm tido muito acesso aosmeios de comunicação, mas nãoconseguem filtrar o que interessa,o que de fato é importante para aformação. Acredito que, ao produ-zirem um jornal, eles entenderão aimportância da informação e o quefazer com ela.

Guiados pelo jornalista ErasmoTrielli, os estudantes iniciaram a vi-sita no 7º andar do Edifício HerbertMoses, mais precisamente pela SalaBelisário de Souza, onde se realizamatos da ABI e de outras entidades. Tri-elli detalhou as trajetórias de HerbertMoses e Barbosa Lima Sobrinho.

– Eles estiveram à frente da As-sociação nos períodos mais durospara o exercício da profissão, que fo-ram as ditaduras de 1937 a 1945 ede 1964 a 1985. Os jornalistas eramcensurados, não podiam se expres-sar livremente. Muitos perseguidosrecorriam à ABI. Em cada jornalhavia um censor, que só permitia apublicação dos assuntos que interes-savam ao regime. Como forma dedenunciar a censura, alguns veícu-los publicavam receitas de bolos eversos de Camões nos espaços dasreportagens vetadas.

Sócio da ABI desde 1999, Triellitrabalhou nas Redações da Tribuna daImprensa, Estado do Rio e O Macacu-ano. Atualmente, assina uma coluna

na revista 3T e escreve para o jornalCachoeiras, onde publicou uma ma-téria que resultou em agressão pra-ticada pelo então Prefeito de Cacho-eiras de Macacu César de Almeida.

– Assinei uma reportagem que de-sagradou o Prefeito. Então, ele medeu um soco. Fiz exame de corpo dedelito e comuniquei o fato à ABI, queimediatamente divulgou o assuntoem toda a imprensa. Além disso, aAssociação colocou um advogado àminha disposição.

Ao narrar o episódio aos alunos,Trielli enfatizou que se algum delesoptar pela carreira de jornalista po-derá contar sempre com a ABI:

– Em todas as Redações pelas quaispassei os colegas sempre aplaudirama ABI como uma entidade de vitalimportância. Um dos principais ob-jetivos desta visita é justamente des-pertar o interesse para a profissão dejornalista.

Os alunos conheceram em segui-da o Auditório Oscar Guanabarino,no 9º andar.

– Aqui foram realizadas as pri-meiras projeções dos cineastas quecriaram o Cinema Novo, movimen-to que revolucionou o cinema naci-onal, dando ênfase aos problemasbrasileiros. Até então, predomina-vam as chanchadas, que eram filmesfeitos para divertir o povo e não pro-vocavam nenhuma reflexão, expli-cou Trielli.

No Salão de Estar, localizado no11º andar, ele destacou a figura domaestro e compositor Heitor Villa-Lobos:

– O espaço foi batizado com onome do maestro, que era freqüen-tador assíduo da Casa e aqui exerci-tava o seu passatempo predileto: obilhar-francês.

Uma das alunas se interessou emsaber mais sobre a vida e a obra domaestro e informou que vai baixarsuas composições pela internet.

Na Biblioteca Bastos Tigre, no 12ºandar, os jovens entraram em con-tato com diversas coleções impor-tantes, como as das revistas Manche-te, O Cruzeiro, Fatos & Fotos e Reali-dade, e dos jornais O Pasquim e Mo-vimento, entre outros.

Os estudantes Mirelly Siqueira,Raquel da Silva Menezes e MarlonCustódio formaram um grupo en-tusiasmado com a descoberta da ro-tina de reportagem. Com bloco e ca-neta nas mãos, entrevistaram fun-cionários e associados da Casa, paraa produção do jornal escolar, que cir-culará até 15 de junho.

Cachoeiras manda alunospara saber como fazer jornal

12 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Aconteceu na ABIAconteceu na ABI

O Acordo Ortográfico numaaula magna de Evanildo Bechara

Em sessão especial do Conselho Deliberativo, o responsável pelo novo Vocabulário Ortográfico deu um show de domínio da língua e erudição.

O Conselho Deliberativo da ABI re-alizou em 26 de maio uma sessão espe-cial com a presença do professor, filólogoe acadêmico Evanildo Bechara, convi-dado a fazer uma exposição sobre o novoAcordo Ortográfico da Comunidade dosPaíses da Língua Portuguesa, que entrouem vigor no Brasil em 1º de janeiro pas-sado, nos termos de decreto presidenci-al firmado em 29 de setembro passado.

Ao abrir a reunião, o Presidente daABI, Maurício Azêdo, falou sobre asatisfação da Casa em receber o Profes-sor Bechara, para discorrer sobre umtema muito importante para a ativida-de jornalística: – Para nós é uma hon-ra tê-lo como convidado para esta es-pecial conferência, em um momentoem que o idioma sofre uma mudançaradical em função do Acordo firmadoentre os países de língua portuguesa.

Afirmou Maurício que a presençade Evanildo Bechara significava umarara oportunidade que todos teriam“de beber a sabedoria” do acadêmico,que ele apontou como uma das mai-ores autoridades em língua portugue-sa, no Brasil e no exterior, além de umadas grandes personalidades do País naárea de educação.

A iniciativa do convite a Becharapara falar sobre o Acordo Ortográficopartiu do Assessor de Imprensa daAcademia Brasileira de Letras, AntônioCarlos Austregésilo de Athayde, quetambém é membro do Conselho Deli-berativo da ABI. Athayde considerouo interesse que o debate com um mes-tre em língua portuguesa poderia terpara a Casa, tendo em conta que o idi-oma é um dos principais instrumentosde trabalho dos jornalistas.

Outra fonte de provocação para a re-alização da conferência foi o editorialDitadura no idioma, publicado no Jor-nal da ABI, edição nº 338, de fevereirode 2009. No texto a ABI comunica quedeixaria de cumprir nos veículos queedita as normas estabelecidas pelonovo Acordo Ortográfico.

Ao justificar a decisão, consideroua ABI que o Acordo “não se originou deuma necessidade social nem de umapostulação coletiva que dessem à suaelaboração e aplicação um caráter de-mocrático”, como afirma no editorial.

Um sonho, desde 1885No início de sua exposição, o Profes-

sor Evanildo Bechara destacou a parce-ria da ABI com a ABL para a realizaçãodo encontro, que ele classificou como

“oportuna união de duas Casas quehonram a cultura e a educação destePaís”. Em seguida afirmou que ficou sa-tisfeito com o teor do editorial, porquenele a ABI demonstra estar preocupa-da com o instrumento de trabalho e deexpressão da classe jornalística que éa língua portuguesa.

Em seguida, lembrou que o novoAcordo Ortográfico é de 1990, foi san-cionado somente no ano passado e le-vou quase 20 anos para que fosse dis-cutido pela sociedade. Sobre este aspec-to, ressaltou que nem sempre aparecempessoas habilitadas para intervir nes-se debate, apesar da boa vontade. Poressa razão, disse, nem sempre se esta-belecem “critérios que honram as co-munidades lingüísticas”.

É neste estágio, acrescentou, que sepercebe a importância da função dosgramáticos, que de maneira criteriosasão convocados como autoridades parafalar sobre o destino, funcionamentoe a situação em que se encontra o ins-trumento de comunicação que é a lín-gua portuguesa:

– Esse assunto na verdade requer umapreparação, porque o técnico tem um

panorama mais largo deste fenômeno,como também mais profundo, e é capazde estabelecer relações que passam des-percebidas pelo falante nativo.

Em um breve relato histórico, Evanil-do Bechara contou que o idioma portu-guês vem tentando chegar a uma unifi-cação ortográfica baseada em critérioscientíficos desde 1885, quando os filólo-gos portugueses Gonçalves Vianna eVasconcelos Abreu apresentaram pelaprimeira vez um texto em que se esta-belecia a base da língua portuguesa.

Na seqüência, fez uma exposiçãosobre os princípios científicos da orto-grafia, no contexto da etimologia e dagramática, a qual, a partir daí, transfor-mou-se em uma aula magna sobre ahistória da língua portuguesa, devidoà erudição e ao conhecimento apresen-tados por ele, com numerosas citaçõessobre a origem dos idiomas românicos,aos quais o português está ligado.

Diante de uma atenta platéia deconselheiros, Bechara explicou que nocaso da ortografia fonética, ou seja, nassituações em que uma palavra é escri-ta da forma como ela é pronunciada, aortografia ideal não existe, a não ser que

para cada letra existisse um som cor-respondente:

– Se nós tivéssemos no Brasil umaortografia fonética, teríamos no País,miseravelmente, uns seis sistemas or-tográficos. Isto porque o Norte nãopronuncia como o Nordeste, da mes-ma forma que este não se comunicaoralmente como o Sudeste, que nãofala como o Sul, que por sua vez não seexpressa como o Centro-Oeste.

Disse Bechara que as variedadesfonéticas não servem como modelopara uma ortografia ideal. Como exem-plo, citou a letra x, que se pronunciacom som de z na palavra exercício:

– A ortografia perfeita não existe emlíngua nenhuma. Não há língua de cul-tura com um sistema ortográfico ideal.

A necessidade de unificarNo século XX ocorreram as primei-

ras reformas ortográficas. A primeiraaconteceu em 1911, organizada peloGoverno de Portugal. O Brasil não foiconsultado, apesar de na época já seconfigurar como um país de prestígiointernacional, com uma população su-perior à portuguesa.

Em 1931, houve uma reunião entrea Academia de Ciências de Lisboa e aAcademia Brasileira de Letras, que pre-tendiam trabalhar para uma unificaçãodo idioma. O resultado desse processoficou estabelecido no Vocabulário Or-tográfico de 1943, mas o assunto gerouuma polêmica entre Brasil e Portugal:

– O Acordo de 1943 atendia às ne-cessidades lingüísticas do Brasil, masnão contemplava as de Portugal, que seviu obrigado a estabelecer um novoacordo com o Brasil. Foi daí que saiu areforma ortográfica de 1945, explicouEvanildo Bechara.

A reforma de 1945 beneficiava maisa tradição ortográfica portuguesa doque a brasileira. Para resolver o proble-ma, os brasileiros passaram a adotar oAcordo de 1943 e os portugueses, o de1945. Em 1970, filólogos brasileiros e por-tugueses se reuniram em um colóquioem Portugal, para tentar chegar a umconsenso sobre a unificação idiomática.

Explicou Bechara que o português éa única língua que até hoje não chegoua um sistema unificado da sua grafia,como é o caso do espanhol. Neste con-texto, o ponto positivo do Acordo Or-tográfico de 1990 – ressaltou – é queeste oferece aos países lusófonos umsistema ortográfico coerente, eliminan-do as diferenças:

– O nosso pleito é que a partir des-sa unificação os futuros alunos escre-

O idioma português é o único que ainda não chegou a um sistema unificadode sua grafia, como é o caso do espanhol, disse o Professor Evanildo Bechara.

FOTOS: HENRIQUE HUBER/FOLHA DIRIGIDA

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

13Jornal da ABI 341 Maio de 2009

vam a língua portuguesa com maiscoerência. O mais recente Acordo temcomo mérito a tentativa de desbarataras minudências que atrapalham o ho-mem comum.

A unificação do idioma portuguêsfoi classificada por ele como um gran-de passo diplomático e político, poissete dos oito países lusófonos escrevemda maneira lusitana e somente o Bra-sil faz uso da escrita à sua moda: “É porisso que essa reforma vem resolver asnossas agruras em matéria de sistema”,afirmou.

A visão de PessoaPara destacar o papel do idioma para

as sociedades, Bechara citou um textode Fernando Pessoa, escrito após a re-forma de 1911, no qual o poeta fala quea ortografia deve ser vista pelo ladocultural, mas que não se deve ignorara sua face social:

– A ortografia tem um aspecto cul-tural, mas junto desse fator existe olado social. Por isso, na opinião de Fer-nando Pessoa, no tocante à ortografia,o Estado não pode promover a indis-ciplina no campo social. Todos os sis-temas ortográficos são sancionados

pelo Governo, o que não impede quecada escritor escreva como quiser.

Apesar de o Professor Bechara terdestacado o apoio que a imprensa tantono Brasil quanto em Portugal tem dadoao Acordo Ortográfico, o assunto aindagera discussões nos dois países. Em Por-tugal, o tema ainda não é consenso nosjornais, como afirma o jornalista NunoAraújo, redator da Papel de Carta, Agên-cia de Comunicação e Publicidade:

“Quanto ao Acordo Ortográfico, adiscussão tem existido, mas sem gran-

des conclusões. A maior parte é contra,pelo que suponho que todos nós iremoscontinuar a escrever da mesma forma.Para já, está tudo igual.”

No mesmo dia 26 de maio, a Assem-bléia da República de Portugal anunciouque promoveria em 3 de junho um de-bate sobre o Relatório da Comissão Par-lamentar de Ética, Sociedade e Cultu-

ra sobre o abaixo-assinadopúblico contra o Acordo Or-tográfico.

Aprovado no mês de abril,por unanimidade, o Relató-rio final da Comissão ressaltaque o Acordo Ortográficocontém “vícios susceptíveisde gerarem a sua patente in-constitucionalidade”.

Excesso de reformas?Após sua exposição, o

Professor Evanildo Becharase dispôs a responder às per-guntas dos Conselheiros daABI sobre o novo Acordo Or-tográfico. O ConselheiroMilton Coelho da Graça dis-

se que a língua portuguesa sofre de ex-cesso de reformas. Segundo ele, o julga-mento final que vai apontar se o Acor-do foi favorável ao desenvolvimento dalíngua portuguesa fica por conta da His-tória.

Na opinião de Milton Coelho, a idéiafundamental da reforma ortográficaatual foi fazer que os livros editados noBrasil e em Portugal conquistassemrapidamente o mercado, unindo osidiomas dos países africanos de línguaportuguesa. Ele assinalou também que

não vê sentido algum nessa mudançaimediata:

– Nós perdemos a singularidade vo-cabular. É muito difícil para mim expli-car aos meus alunos do curso de Jorna-lismo por que eu devo abandonar a di-versidade ortográfica que tínhamos an-tes. Quando eu escrevo para jornais sigoo Acordo, mas se eu tiver a petulância deescrever um livro vou fazê-lo da formadas reformas ortográficas anteriores,porque espero que seja mais facilmenteidentificável para os meus leitores.

O Conselheiro Mário Augusto Jaco-bskind indagou se os Acordos anteri-ores foram discutidos amplamente pelasociedade. Já o Vice-Presidente da ABI,Tarcísio Holanda, levantou a questãodo descontentamento dos portuguesesem relação ao processo de unificaçãodo idioma, que segundo ele tem sidomuito mais intenso em Portugal do queno Brasil.

Também fizeram perguntas os Con-selheiros Ângelo Fernandes e PereiraFilho (Pereirinha), a associada MariaIgnez Duque Estrada, membro daComissão de Sindicância, e Wilson deCarvalho, da Comissão de Liberdade deImprensa e Direitos Humanos.

“Não somos futurólogos”Bem-humorado, o Professor Evanil-

do Bechara decidiu responder a todasas perguntas em um só bloco. Pediu àplatéia que imaginasse se os ortógra-fos fossem pedir a opinião do povobrasileiro ou do português para provi-denciar as reformas ortográficas. Emseguida, voltou a afirmar que os assun-tos técnicos têm que ser tratados porespecialistas:

– É claro que não somos futurólo-gos. Não podemos afirmar que a edu-cação brasileira vai melhorar com a re-forma, porque o objetivo dela não épromover melhorias na educação na-cional, que é um problema que se re-solve por outras vias.

Ele admitiu a degradação do ensi-no, para a qual a ortografia vai trazerum subsídio muito pequeno, mas vaiqualificar a difusão da língua. Em re-lação às críticas, disse discordar daque-las que classificam o Acordo como au-tocrático:

– Não é verdade, porque ele permi-te diferenças lingüísticas, não as orto-gráficas. Escrever Antônio com acen-to circunflexo ou agudo é uma questãolingüística. Há neste caso uma varie-dade lingüística lusitana que aí difereda brasileira.

Quanto aos protestos em Portugal,disse que essa reação decorre de o povoportuguês se colocar na condição de“dono da língua”.

Um sábio, simNo encerramento do encontro,

Maurício Azêdo agradeceu a presençado convidado e enalteceu o alto nívelde conhecimentos do conferencista.

– Outro aspecto que desejo subli-nhar é que na apresentação do perfil doProfessor Bechara eu disse que nós ía-mos beber da sua sabedoria e íamosouvir um sábio. Realmente a exposiçãodele confirmou as afirmações que fiz,que não eram desprovidas de funda-mento, como ele confirmou com sobe-jas demonstrações de erudição ao longode sua magnífica conferência - disse oPresidente da ABI.

Lênin Novaes (à esquerda), Secretário do Conselho, e Maurício Azêdo (à direita) aplaudem Bechara após a sua exposição na sessãodo Conselho Deliberativo presidida por Pery Cotta (2º à esquerda). Bechara impressionou pelo domínio do idioma e pela erudição.

Bechara doou à Biblioteca da ABI exemplar donovo Vocabulário, cuja edição ele coordenou.

14 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

O futebol bem além das quatro li-nhas. Em campo, a arte da paixão na-cional e sua estreita relação com ou-tras faces da cultura, como o samba,a dança, a literatura e o cinema. Essaé a temática do ciclo de palestras Fu-tebol-arte: A Arte do Futebol, promovi-do pelo Grupo de Literatura e Memó-ria do Futebol-MemoFut e a ABI, como apoio do Laboratório de História doEsporte e do Lazer (Sport), ligado àUniversidade Federal do Rio de Janei-ro, e das editoras LivrosdeFutebol.come Apicuri.

O primeiro encontro da série foi re-alizado na noite no dia 5 de maio, naSala Belisário de Souza, no 7º andar doEdifício Herbert Moses, sede da ABI,e contou com a participação de Mau-rício Murad, especialista em Sociolo-gia do Esporte e professor da Univer-sidade do Estado do Rio de Janeiro-Uerj; Renato Maurício Prado, colunistade O Globo e do canal pago SporTV; eVanessa Riche, narradora de esportesolímpicos e apresentadora do progra-ma SporTV News

Na abertura do evento, o Presiden-te da ABI, Maurício Azêdo, lembrou avinculação da Casa com o jornalismoesportivo. “Antes da fundação de enti-dades dos jornalistas esportivos, comoa Associação dos Cronistas Esportivosdo Rio de Janeiro-Acerj – disse –, a ABIsediou durante anos o antigo Departa-mento de Imprensa Esportiva-DIE, queera dirigido por uma das figuras queliderava a cobertura esportiva da épo-ca, Canor Simões Coelho. Durante dé-cadas, a ABI acolheu esses companhei-ros, permitindo que se cristalizasseentre nós uma doutrina da coberturaesportiva, com a valorização daquiloque é importante no futebol, o espíri-to de competição.”

O jornalismo esportivode ontem e de hoje

Renato Maurício Prado traçou bre-ve histórico da relação entre jornalis-mo e futebol, lembrando que a impren-sa foi responsável pela transformaçãodesse esporte em paixão nacional. “Jor-nalismo e futebol sempre estiveram

juntos. Sempre houve um interesse deambos os lados. No início, o futebolprecisava de divulgação e a imprensade algo que atraísse a atenção do pú-blico. Ao longo dos anos essa relaçãofoi mudando. Antigamente, nós, repór-teres, assistíamos aos treinos do grama-do e entrevistávamos os jogadores. Arelação era muito mais próxima, maisleve. Hoje em dia, esta relação é maisfria, mais profissional. Os assessores deimprensa praticamente dão as entre-vistas no lugar dos jogadores”, obser-vou o colunista de O Globo.

Vanessa Riche criticou a atuação dosjornalistas durante as entrevistas co-letivas com os jogadores e técnicos defutebol. “Os repórteres fazem umaanálise imensa do jogo e depois formu-lam a pergunta a partir da opinião de-les sobre a partida. Muitas vezes oentrevistado se limita a dizer sim ounão ou, ainda, a dizer que o repórter járespondeu à própria pergunta. Já tra-balhei em diversas editorias, e quandofui para o futebol isso me assustou umpouco”, disse ela, que também questi-onou o fato de a mídia transformar avida particular do jogador em notícia.Vanessa considera que há um exageropor parte dos meios de comunicaçãoem dar destaque ao cotidiano do atle-ta fora de campo.

Essa opinião foi perfilhada por Re-nato Maurício Prado, mas com umaressalva. Para ele, a privacidade do atle-ta deve mesmo ser preservada, masdesde que não atrapalhe o seu desem-penho em campo: “Se o cara vai parauma noitada um dia antes do jogo, oudurante uma competição importante,como um boêmio qualquer, claro queisso vai atrapalhar sua atuação, já queseu instrumento vital de trabalho é o

corpo. Quando isso acontece, nós de-vemos noticiar, sim. Agora, se o joga-dor comete algum excesso durante asférias, que interesse isso tem?”

O drama da violêncianos estádios de futebol

Autor do livro Violência e Futebol: DosEstudos Clássicos Aos Dias de Hoje, pu-blicado pela Fundação Getulio Vargas-FGV, Maurício Murad disse que o Brasilé o campeão de mortes nos estádios eacrescentou que grande parte dessesóbitos é, de fato, registrada entre ostorcedores desvinculados das torcidasorganizadas. A relação entre a práticaesportiva e a violência que cada vezmais assusta a sociedade foi assim ana-lisada por ele:

“Existem ações da mídia que ajudama minimizar a violência e outras queincentivam e valorizam a violência naprimeira página, não dando crédito aossetores das torcidas organizadas quedefendem a pacificação. Esses setoressempre solicitam espaço na mídia, masnão conseguem. Isto é conseqüência dacultura de uma sociedade que acredi-ta que o que vende é a violência. Aque-les que lutam para contê-la não têmmérito. Estas questões dependem mui-to da consciência dos jornalistas.”

Murad entende que a imprensaprecisa refletir sobre seu papel, bemcomo sobre abordagens que poderiamcontribuir para a redução da violêncianos estádios de futebol do Brasil: “Osmeios de comunicação devem denun-ciar a impunidade e a inércia da pró-pria Polícia. É preciso divulgar bonsprojetos como o de ingressos a preçospromocionais para mulheres, crianças,idosos e deficientes; gravar depoimen-tos de grandes ídolos dos clubes, pois

Aconteceu na ABIAconteceu na ABI

O futebol entra em campoCiclo de palestras começa a mostrar a relação do futebol com diferentes

aspectos da sociedade brasileira, além de lançar luz sobre o jornalismo esportivo.

a palavra de um grande ídolo vale maispara a torcida do que mil policiais.Acho que a imprensa deve contribuircom tudo isso”.

Futebol é mais que esporteAs sessões do ciclo, todas com entra-

da gratuita, prosseguem até dezembroe são realizadas sempre na primeiraterça-feira de cada mês, com convida-dos e temas instigantes. O Coordena-dor do Centro Histórico-Esportivo daABI, José Rezende, que é membro doConselho Deliberativo da Casa, consi-dera que o futebol não pode ser resu-mido apenas a mero evento esportivo.

“Ele está muito inserido no nossosistema político, econômico, culturale social e pode ser analisado em dife-rentes aspectos. Nosso objetivo é mos-trar a relação de todas as outras ma-nifestações artísticas e culturais como futebol.”

César Oliveira, editor da LivrosdeFutebol.com e um dos coordenadoresdo ciclo, diz que o futebol alcançougrande popularidade no Brasil graçasao jornalismo. “A divulgação da im-prensa foi fundamental para a difusãodo esporte no País. Basta lembrar aimportância de profissionais comoMário Cardim, um dos pioneiros danossa imprensa futebolística. Vamosdebater, entre outras coisas, a paixãodo jornalista por determinado time defutebol e a influência disto na hora emque se produz uma matéria”, disse.

Contou César que a idéia da série deencontros surgiu em uma conversacom o Professor Vítor Andrade deMelo, responsável pelo Laboratório deHistória do Esporte e do Lazer da UFRJ:“Nós estávamos conversando no dia dolançamento do livro Quarentinha – O

Maurício Murad(à esquerda)considera que aimprensa joga umpapel importantena questão daviolência nosestádios. VanessaRiche, da SportTVNews, e RenatoMaurício Prado(à esquerda), deO Globo, tambémcomentaram arelação imprensa-esporte.

BERNARDO COSTA

15Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Artilheiro Que Não Sorria, de RafaelCasé, quando o Vítor comentou quetinha visto no meu site que eu tinhavontade de publicar trabalhos acadê-micos sobre futebol. Ele deu então aidéia de reunirmos diversos acadêmi-cos e realizadores, como jornalistas oucineastas, para debater o assunto”.

César contou que vê nessas rodas debate-papo uma possibilidade de resgatedo esporte: “Nosso futebol se perdeuum pouco na História, devido a diver-sos fatores, sendo o mais preponderan-te deles a má qualidade dos dirigentesdos clubes. As mesas deste ciclo dedebates se ocuparão do tema para ten-tarmos entender as razões que levaramo futebol-arte a ser deixado de lado”.

JUNHO Dia 2Tema: FUTEBOL E SAMBA

Convidados: Guinga (músico); Celso Branco(UFRJ); Eraldo Leite (Rádio Globo).

JULHO Dia 7Tema: FUTEBOL E CINEMA

Convidados: José Carlos Asbeg (cineasta); VítorMelo (UFRJ); Guilherme Roseguini (TV Globo).

AGOSTO Dia 4Tema: FUTEBOL E RÁDIO

Convidados: Luiz Mendes (Rádio Globo);Ronaldo Helal (UFRJ); Álvaro de OliveiraFilho (CBN).

SETEMBRO Dia 8Tema: FUTEBOL E ARTES PLÁSTICAS

Convidados: Cláudio Tozzi (artista plástico);Luiz Camilo Osório (Unirio); BiancaRamoneda (Globo News).

OUTUBRO Dia 6Tema: FUTEBOL E HISTÓRIA

Convidados: Max Gehringer (CBN); RicardoPinto (Sport UFRJ); Cléber Machado (TVGlobo/Sportv).

NOVEMBRO Dia 3Tema: FUTEBOL E DANÇA

Convidados: João Saldanha Filho(coreógrafo); Nízia Villaça (UFRJ); SandraMoreyra (TV Globo).

DEZEMBRO Dia 1Tema: FUTEBOL E LITERATURA

Convidados: José Miguel Wisnik (Usp); VítorAdler (Uerj); Marcelo Barreto (Sportv).

A programação do cicloFutebol-arte:

A Arte do Futebol

CINE ABI

A América Latina sem cortesCom clássicos como Estado de Sítio, de Costa Gravas, e série de documentários, como Bolívia –

A Guerra do Gás, de Carlos Pronzato, o Cine ABI promove mostra sobre a realidade latino-americana.

POR BERNARDO COSTA

Em outubro de 2003, em meio a umadas mais graves crises econômicas esociais de sua História, a Bolívia assis-tiu estarrecida a um conflito que deixoupelo menos 80 mortos e 400 feridos. Naocasião, diversos movimentos sociais semobilizaram contra o então Presiden-te Gonzalo Sanches, o Goni, protestan-do contra a entrega do monopólio dogás boliviano a empresas estrangeiras.

Com a decisão do Governo de expor-tar gás para os Estados Unidos, por umporto chileno, enquanto internamentehavia falta do produto, uma grandemanifestação foi programada para a ci-dade de El Alto, na periferia de La Paz.Enquanto os manifestantes circulavampelas ruas exibindo cartazes com pala-vras de ordem como Fuzil! Metralha! Opovo não se cala!, Fora Goni! e Goni assas-sino!, forças militares investiram contraos civis. Esses dolorosos momentos sãocontados de forma realista em Bolívia –A Guerra do Gás, documentário queabriu no final da maio a mostra temáti-ca sobre a América Latina no Cine ABI.

Em parceria com o Cineclube da Casada América Latina, a ABI deve exibir se-manalmente, até dezembro, clássicos docinema latino-americano, que mostrema realidade social, política e cultural doContinente. Assim, ainda em maio, hou-ve a exibição de Estado de Sítio, de CostaGravas, e em breve será a vez de Memó-ria do Subdesenvolvimento, de Tomás Gu-tierrez Alea, um dos principais registrosdo cinema cubano sobre a revolução so-cialista liderada por Fidel Castro.

- O contexto histórico pelo qual pas-sa a América Latina hoje é propício pararefletirmos sobre a realidade do Conti-nente por meio do cinema. A utopia so-cialista ressurge na busca pelo desenvol-vimento e pela justiça social com a es-querda ascendendo ao poder. O docu-mentário que abriu a mostra é um exem-plo, ao mostrar a luta boliviana para selibertar da pobreza e prosseguir em buscada prosperidade para o povo, que temuma das heranças culturais mais antigas,que é a indígena. – afirma o Diretor deCultura e Lazer da ABI Jesus Chediak.

Bolívia – A Guerra do Gás, dirigido porCarlos Pronzato, não se resume aomassacre de El Alto. O documentárioanalisa ainda a reviravolta política nopaís, com a renúncia do PresidenteGonzalo Sanches, que atualmente vivenos Estados Unidos, abrindo caminhopara a eleição de Evo Morales, indíge-na pertencente à etnia Aymará e quecausou enorme polêmica com a Petro-bras, ao nacionalizar a exploração doshidrocarbonetos. O episódio foi lembra-do pela enfermeira aposentada Hercí-lia Mendes, presente à sessão especial:

- É muito importante que filmes comoesse sejam exibidos ao público. Somoslatinos e devemos ficar atentos ao queacontece com nossos irmãos, princi-palmente agora que os movimentos so-ciais tomam corpo novamente no Con-tinente.

Talento e denúnciaOutro destaque da mostra sobre a

América Latina, exibido também emmaio pelo Cine ABI, foi o clássico Es-tado de Sítio (État de Siege, 1973), dodiretor grego naturalizado francês Cos-ta Gravas, que se destacou no cinemapelo conteúdo de denúncia política desua obra. O filme mostra a atuação doGoverno norte-americano na implan-tação das ditaduras militares na Amé-rica Latina, nas décadas de 1960 e 1970.O roteiro de Franco Solinas dá especi-al atenção ao seqüestro do cônsul bra-sileiro no Uruguai, Aloísio Gomide, edo agente norte-americano Philip Ma-chael Santore (interpretado pelo atorYves Montand), praticado pelo grupoguerrilheiro Tupamaros.

Santore, também conhecido comoDan Mitrione, foi responsável pelo en-sino de práticas de tortura a policiais emilitares de países da América Latina,que institucionalizaram o delito duranteseus regimes ditatoriais. Com o suces-so do seqüestro, o Tupamaros negocia atroca dos reféns por militantes presos.A repercussão internacional e diplomá-tica do episódio abalou o Governo uru-guaio e deixou clara a participação dosEstados Unidos na estrutura repressivados regimes militares da época. Estadode Sítio foi indicado ao Globo de Ourocomo melhor filme estrangeiro.

Após a sessão, o jornalista Miro Lo-pes, Conselheiro da ABI, destacou a luzque Costa Gravas lançou sobre as prá-ticas de tortura e de interrogatório pra-

ticadas tanto pela direita quanto pelaesquerda:

- O filme é um alerta quanto a práticasde revolucionários e de regimes no Uru-guai, na Grécia, na Itália, em Portugal e aténo Brasil. É bom lembrar que ConstantinCosta Gravas, nascido na Grécia, berçoda democracia, mas uma nação que tam-bém sofreu com as agruras de uma dita-dura, teve a inspiração do filme quandoesteve num festival de cinema no Reci-fe. Ele atuou em cima dos fatos, lançan-do a obra oito anos depois do golpe mili-tar no Brasil. E ela continua atualíssima,servindo como chave para entender a ori-gem do Esquadrão da Morte, que por suavez inspirou as atuais milícias, que con-tinuam atuando criminosamente con-tra a sociedade brasileira.

- Ao assistir a esses filmes percebe-mos como o mundo dá voltas – obser-va o jornalista Mário Augusto Jako-bskind, membro do Conselho Delibe-rativo e da Comissão de Liberdade deImprensa e Direitos Humanos da ABIe Diretor da Casa da América Latina. –Veja o exemplo da episódio históricoretratado em Estado de Sítio: após 40anos, um dos dirigentes tupamaros, oagora Senador Pepe Mujica, participan-te do seqüestro de Dan Mitrione e pre-so pela ditadura uruguaia por 12 anos,poderá ser o candidato à Presidência doUruguai pela aliança de partidos deesquerda, a Frente Ampla, nas eleiçõesde novembro próximo. Isso só confir-ma o acerto da iniciativa de exibir obrasque permitam o maior conhecimentoda América Latina. A integração se dáprincipalmente pela aproximação cul-tural e não somente pelo contato polí-tico e econômico. Acredito que os fil-mes que entrarão na mostra, normal-mente obras de difícil acesso e que es-tão fora dos circuitos comerciais, cum-prirão muito bem esse propósito.

Estado de Sítio denuncia a atuação dos EUA na criação das ditaduras na América Latina.

Foi a imprensa que fez do futebol uma paixãonacional, disse Renato Maurício Prado.

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16 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Aconteceu na ABIAconteceu na ABI

A ABI empossou no dia 13 de maioos novos integrantes de seus ConselhosDeliberativo e Fiscal. No primeiro de-les, assumiram 15 membros efetivos e15 suplentes, que atuarão deste ano até2012. Para o Conselho Fiscal foramempossados mais sete associados, commandatos válidos até 2010. Tambémforam empossados os membros dasComissões Auxiliares do Conselho,eleitos nessa sessão. A proposta de re-eleição dos membros da mesa foi apre-sentada pelo Presidente da ABI, Mau-rício Azêdo, e aprovada por unanimi-dade. Foram reconduzidos aos seuscargos o Presidente Pery Cotta e osSecretários Lênin Novaes e ZilmarBorges Basílio.

Ao assumir, Pery Cotta falou da suasatisfação de ver todos os assentos dasala do Conselho ocupados, lembran-do que a ABI, que completou 101 anosem 7 de abril, experimenta nova eta-pa na sua História, marcada pela vi-vacidade de sua atuação no cenário na-cional. Ele fez questão de ressaltar oapoio recebido desde que tomou pos-se na vaga deixada por Fernando Bar-bosa Lima, falecido em setembro doano passado.

“Pretendo manter os mesmo objeti-vos de trabalho que têm orientado asreuniões do nosso Conselho até aqui,como um fórum de grandes debates,onde se respeita a opinião de todos,mesmo que com pontos de vista dife-rentes. A finalidade do Conselho émesmo esta: debater os temas. É mui-to bom quando todos conseguem seexpressar. É por isso que vamos esta-belecer uma agenda para os próximosencontros. O Conselho está com umbom pique de reuniões, não há falta dequórum. Estamos com uma participa-ção bem acima da média”, disse Pery.

O Presidente do Conselho Delibera-tivo agradeceu a Maurício Azêdo pelainiciativa de propor sua recondução aocargo e destacou sua atuação. “Esta Casaestá no seu ano 101, iniciando uma novaetapa da sua vida. Nos últimos anos, anossa Associação conseguiu retomar asua posição de realce no cenário brasi-leiro graças ao esforço, à determinaçãoe à competência de Maurício Azêdo e detodos os que o ajudaram nessa tarefa,sua Diretoria, os próprios membros doConselho Precisamos continuar empu-nhando essa bandeira.”

O Primeiro-Secretário Lênin Nova-es destacou a atuação do Conselho De-liberativo, que teve como meta prin-cipal a reestruturação da ABI. Disse eleque há muitos desafios a serem supe-rados, dentre os quais a mudança doEstatuto da Casa. Ele adiantou que há

Conselheiros são empossadosPery Cotta é reconduzido ao cargo de Presidente do Conselho Deliberativo;

Lênin Novaes e Zilmar Basílio, Secretários, também reeleitos.

uma comissão trabalhando nesse sen-tido, visando a ajustar a ABI à nova re-alidade da mídia, inclusive em relaçãoà utilização de novas tecnologias.“Fico muito feliz e muito grato pela in-dicação e pelo fato de podermos estarjuntos, continuarmos trabalhando”,afirmou.

Em seguida, Zilmar Basílio falousobre a sua recondução ao cargo. Elaagradeceu a acolhida de Pery Cotta eLênin Novaes e revelou a satisfação deestar trabalhando numa equipe lidera-da por Azêdo. “Eu agradeço a indica-ção para continuar fazendo parte doConselho. Orgulho-me de estar parti-cipando deste momento da ABI, com

o Presidente em que acredito e sempreacreditei em todos os momentos e lu-gares pelos quais passou. Ele foi tam-bém Presidente da Câmara Municipaldo Rio de Janeiro, sendo reconhecidocomo um dos mais atuantes que aquelaCasa já teve. Foi assim também no Tri-bunal de Contas do Município. Mau-rício sempre esteve renovando todoprocesso que encontrou, em todos oslugares”, destacou a Segunda-Secretá-ria do Conselho Deliberativo.

A reunião teve ainda dois momen-tos especiais. Um deles foi a posse comoConselheiro do jornalista José Ângeloda Silva Fernandes, Presidente da As-sociação Espírito-Santense de Impren-

sa-AEI que veio ao Rio especialmentepara participar da solenidade de posse.Emocionado, José Ângelo agradeceu aoportunidade que lhe foi dada de fazerparte do Conselho Deliberativo:

“Estou aqui nesta solenidade, ondeestou sendo empossado Conselheirodesta grandiosa Casa, templo da im-prensa brasileira. Hoje, 13 de maio, éo dia da Abolição, data que todos nósreconhecemos como memorável e quepara mim é mais especial porque a par-tir de agora me sinto realmente umhomem de imprensa. Toda a minhavida profissional eu quis participardesta instituição. Essa oportunidadesurgiu através da iniciativa do nossoquerido Presidente, que me recebeucarinhosamente em função do traba-lho que venho realizando no EspíritoSanto”, agradeceu.

José Ângelo lembrou que a institui-ção capixaba tem 76 anos de luta pelaindependência da atividade jornalísti-ca. Modesto, disse que gostaria deaprender com os companheiros da ABI.“Principalmente nos lugares mais dis-tantes, onde não existe apenas a trucu-lência daqueles que dominam as regi-ões, mas ainda temos que enfrentar osnossos ditadores togados. Se, por umlado, não existe mais a violência pra-ticada pelos homens de farda, hojesomos vítimas daqueles que deveriamestar a nosso favor. É por isso que euvejo este momento como importante.Nós precisamos dar respaldo a todos osnossos companheiros que precisam dapresença moral, da História e da tradi-ção da ABI neste País”, disse.

Outro momento de emoção da ses-são foi a lembrança, pelo ConselheiroCarlos Rodrigues, da revogação da Leide Imprensa. A colaboração principalpara tal feito, lembrou, foi a atuaçãopersistente do Deputado Federal MiroTeixeira (PDT-RJ), também membrodo Conselho Consultivo da ABI. Naavaliação de Maurício Azêdo, Miro écredor das homenagens da ABI peloempenho que teve ao questionar a exis-tência de uma legislação equivocada,por ele próprio bem definida como umdos ‘últimos entulhos da ditadura’.

“Indo além das palavras, Miro for-mulou com sua extrema competênciauma Argüição de Descumprimento dePreceito Fundamental da Constituição,fez uma defesa brilhante no Plenário doSTF, numa audiência de que a ABI tam-bém participou como amicus curiae.Ele expressou a opinião favorável danossa entidade à revogação da Lei deImprensa pelos motivos alinhadostambém pelo eminente relator, Minis-tro Carlos Ayres Britto”, disse Azêdo.

CONSELHO DELIBERATIVOEFETIVOSAfonso Faria, Adolfo Martins, Aziz Ahmed,Cecília Costa, Domingos Meirelles, FernandoSegismundo, Glória Suely Alvarez Campos,Jorge Miranda Jordão, José Ângelo da SilvaFernandes, Lênin Novaes de Araújo, LuísErlanger, Márcia Guimarães, Nacif Elias HiddSobrinho, Pery de Araújo Cotta e WilsonFadul Filho.

SUPLENTESAntônio Calegari, Antônio Henrique Lago,Argemiro Lopes do Nascimento (Miro Lopes),Arnaldo César Ricci Jacob, Ernesto Viana,Hildeberto Lopes Aleluia, Jordan Amora, JorgeNunes de Freitas, Lima de Amorim, Luiz CarlosBittencourt, Marcus Miranda, Mário JorgeGuimarães, Múcio Aguiar Neto, RaimundoCoelho Neto e Rogério Marques Gomes.

CONSELHO FISCALAdail José de Paula, Adriano Barbosa doNascimento, Geraldo Pereira dos Santos,Jorge Saldanha de Araújo, Luiz Carlos deOliveira Chesther, Manolo Epelbaum eRomildo Guerrante.

A nova composiçãodos Conselhos

A sessão do Conselho elegeu os associadosmencionados a seguir para as suas ComissõesAuxiliares.

COMISSÃO DE SINDICÂNCIACarlos Di Paola, Jarbas Domingos Vaz, JoséCarlos Machado, Luiz Sérgio Caldieri,Marcus Antônio Mendes de Miranda, MariaIgnez Duque Estrada Bastos e Toni Marins.

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Arthur José Poerner, CíceroSandroni, Ivan Alves Filho e Paulo Totti.

COMISSÃO DE DEFESA DA LIBERDADE DEIMPRENSA E DIREITOS HUMANOSWilson Fadul Filho, Presidente, Arcírio GouvêaNeto, Daniel de Castro, Ernesto Viana,Germando de Oliveira Gonçalves, GilbertoMagalhães, Lucy Mary Carneiro, Maria CecíliaRibas Carneiro, Mário Augusto Jakobskind,Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles,Wilson Nunes de Carvalho e Yacy Nunes.

COMISSÃO DIRETORA DE ASSISTÊNCIA SOCIALPaulo Jerônimo de Sousa, Presidente, IlmaMartins da Silva, Jorge Nunes de Freitas,José Rezende Neto, Maria do PerpétuoSocorro Vitarelli, Moacyr Lacerda e WilsonNunes de Carvalho.

Nossas Comissões

O Presidente da ABI (ao centro) propôs a reeleição de Pery Cotta (à esquerda), deLênin Novaes e Zilmar Basílio (à direita) para os cargos que ocupavam no Conselho.

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O reconhecimento do esforço emdefesa da plena liberdade de expressão.Foi graças a esse trabalho que a ABI foia vencedora da primeira edição do Prê-mio Barbosa Lima Sobrinho de Jorna-lismo, concedido pela Assembléia Le-gislativa do Estado do Rio de Janeiro-Alerj. O troféu, instituído pela Reso-lução nº 341, de autoria do DeputadoMarcelo Simão (PHS-RJ), compreendeo busto do jornalista que dá nome aoprêmio, morto em 2000, e foi entregueao Presidente da Casa, Maurício Azêdo,na noite de 14 de maio.

“O objetivo é premiar anualmentepessoas físicas e jurídicas que reconhe-cidamente tenham prestado meritóriae destacada contribuição ao desenvol-vimento da imprensa no Estado do Riode Janeiro. Portanto, nada mais justodo que homenagear a ABI, que, no anopassado, completou 100 anos de glóriase lutas”, disse o Deputado durante asolenidade, realizada no Plenário daAlerj, que também leva o nome do jor-nalista Barbosa Lima Sobrinho, ex-Pre-sidente da ABI. “Em 1992, o ilustre po-lítico, advogado e jornalista pernam-bucano, então Presidente da Associa-ção, foi responsável direto pelo impe-achment de Collor, sendo o primeiroorador inscrito para defender a cassa-ção dele no processo”, lembrou o par-lamentar.

Poderoso estímuloAo agradecer a homenagem à Casa,

Maurício Azêdo destacou a importân-cia da premiação para a imprensa doRio de Janeiro. “A iniciativa constituium poderoso estímulo à qualificaçãodo trabalho profissional dos jornalis-tas, porque eles vêem que a sua atua-ção pode ser reconhecida por institui-ções importantes. A Alerj tem atual-mente uma posição de destaque naelaboração legislativa, na discussão dasquestões políticas, econômicas e soci-ais de interesse do povo do Rio de Ja-neiro e na investigação de fatos quepreocupam o conjunto da cidadania,como as milícias. A Alerj se afirmoucomo um Poder interessado na preser-vação de ideais de convivência harmo-niosa na sociedade”, afirmou o Presi-dente da ABI.

Maurício sublinhou o reconheci-mento da ABI por ser a primeira enti-dade a conquistar a distinção. “A Asso-ciação aplaude a iniciativa do Deputa-do Marcelo Simão, primeiro por insti-

HOMENAGEM

A ABI , a primeira noPrêmio Barbosa Lima

Criada pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio por iniciativa doDeputado Marcelo Simão, a distinção tem a Casa como primeira destinatária.

tuir o Prêmio Barbosa Lima Sobrinhode Jornalismo, que mereceu o referen-do do Plenário da Alerj. E também porter sido escolhida como a primeiradestinatária. A ABI se sente duplamen-te honrada pela homenagem a Barbo-sa Lima e também a ela, como a Casaà qual o jornalista serviu com empe-nho, dedicação e espírito público”,destacou Maurício para os presentes àsolenidade, entre os quais associadose Conselheiros, como Zilmar BorgesBasílio, Leonor Guedes, Ilma Martins

disse em 1969 Fernando Segismundo,que presidiu a Casa, ‘além das finalida-des fundamentais, a Associação deveinterpretar o pensamento, as aspira-ções, os reclamos, a expressão culturale cívica da nossa imprensa, estimularentre os jornalistas o sentimento dedefesa do patrimônio cultural e mate-rial da Pátria, realçar a atuação da im-prensa nos fatos da História e colabo-rar em tudo o que diga respeito ao de-senvolvimento intelectual do País’.Sendo assim, nada mais justo do quea entidade ser a primeira a receber apremiação”, explicou Marcelo Simão.

IntegraçãoMaurício Azêdo complementou a

fala do parlamentar. “Esta homenagemé uma forma de integração muito gran-de entre a Assembléia Legislativa e aABI. Nós acompanhamos o trabalho daAlerj não só através do noticiário dosjornais, mas também por meio das pu-blicações da Casa, como o jornal edi-

tado pela Assessoria deComunicação Social, quetem à frente a jornalistaFernanda Pedrosa”.

Marcelo Simão tam-bém salientou a impor-tância da parceria do Po-der Legislativo com a mí-dia. “Sem a imprensa,nossas decisões e atitudes,tanto as boas quanto ascondenáveis, não sairiamdaqui de dentro. Pelo jor-nalismo o País toma co-nhecimento do que acon-tece na Alerj”.

Membro do ConselhoDeliberativo e da Comis-são de Liberdade de Im-prensa e Direitos Huma-nos da ABI, Mario Augus-to Jakobskind, que com-pôs a mesa da solenidade

ao lado de Maurício Azêdo e MarceloSimão, destacou a significação do ato.“Esta homenagem é oportuna, pois aABI representa todos os jornalistas bra-sileiros há mais de 100 anos, atuandosempre em defesa dos interesses des-ses profissionais e da liberdade de im-prensa, que é um bem vital para a de-mocracia no Brasil. O País hoje estáavançando no processo democrático,e esse avanço passa por algo que a ABIsempre defendeu: a democratizaçãodos meios de comunicação”.

da Silva, Yacy Nunes e Moacir Lacer-da, e convidadas especiais, como a mu-seóloga Lygia Santos.

Evocando palavras de Fernando Se-gismundo, que presidiu a ABI de 1977a 1978 e de 2000 a 2004, o Deputadorevelou os motivos que o levaram aprestar a homenagem. “A ABI jamaisdeixou de cumprir os objetivos que aoriginaram, mas se adaptou ao longodo tempo. Seus estatutos foram ajus-tados às diversas situações socioeconô-micas da indústria jornalística. Como

Criador da distinção, o Deputado Marcelo Simão entrega ao Presidente da ABIo diploma do Prêmio Barbosa Lima Sobrinho, o primeiro conferido pela Alerj.

Mário Augusto Jakobskind (à esquerda), membro da Comissão de Liberdade de Imprensa da ABI, disseque o avanço no processo de democratização passa pela democratização dos meios de comunicação.

FOTOS: HENRIQUE HUBER/FOLHA DIRIGIDA

18 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

HOMENAGEM

Medalha Pedro Ernesto para Villas-BôasCom mais de seis décadas de atuação no jornalismo, ele é considerado

o mais experiente e respeitado analista político em atividade no País.

POR CLAUDIA SOUZA

Uma homenagem ao mais antigoanalista político em atividade no Bra-sil. Já são mais de seis décadas de incan-sável exercício jornalístico. Por isso,poucas vezes a condecoração com aMedalha Pedro Ernesto, honraria con-cedida pela Câmara Municipal do Riode Janeiro, foi tão simbólica e expres-siva. Villas-Bôas Corrêa recebeu a co-menda especial na noite do dia 27 demaio, por iniciativa do Vereador Elio-mar Coelho (Psol).

Luiz Antônio Villas-Bôas Corrêanasceu no bairro da Tijuca, no Rio deJaneiro, em 2 de dezembro de 1923.Formou-se em Direito pela FaculdadeNacional de Direito, da antiga Univer-sidade do Brasil, em 1947. Logo no anoseguinte traçou as primeiras linhas desua carreira jornalística e se tornou umdos comentaristas políticos mais res-peitados do País, com passagens porempresas como A Notícia, Diário deNotícias, O Dia, Rede Manchete, O Es-tado de S. Paulo e Jornal do Brasil, en-tre outras.

Jornalistas, políticos e parentes deVillas-Bôas Corrêa participaram dahomenagem, com destaque para a mu-lher, Regina de Sá Corrêa, os filhosMarcos e Marcelo Sá Corrêa e a netaJoana Ramalho Ortigão Corrêa. A mesade honra da solenidade, conduzida peloVereador Eliomar Coelho, foi formadapelo Presidente da ABI, MaurícioAzêdo, pelo acadêmico Murilo MeloFilho, pelo jornalista Teixeira Heizer epelo Embaixador e acadêmico Affon-so Arinos de Melo Franco.

Anos de amizadeTeixeira Heizer iniciou seu discur-

so recordando os anos de amizade e derelacionamento profissional com Vi-llas-Bôas Corrêa. “Eu o conheci emetapas distintas. Como um grande re-pórter, que iniciou carreira em A Noi-te; como editorialista, função que sem-pre exerceu com brilho. E, ainda hoje,no Jornal do Brasil, onde nos brindacom suas colunas, verdadeiras aulas dejornalismo. Guardo outra fase impor-tante, ocorrida nas proximidades dasRuas São José e Quitanda, no Centrodo Rio, onde funcionava a SucursalRio de O Estado de S.Paulo. A Redaçãoera uma bomba de nitroglicerina e aliestavam jornalistas que, mesmo semutilizar o recurso da pólvora, enfren-taram os momentos mais cruéis daimprensa e do País. Villas-Bôas era oprincipal redator. Foi a época de ourodo jornalismo e o momento áureo doEstadão no Rio. Ali, ele nos ensinou

com seus textos brilhantes e equilibra-dos”, destacou.

Teixeira Heizer sublinhou a atuaçãofirme de Villas durante a ditadura e orespeito que ele inspirava nos milita-res. “Villas fazia duras críticas no espa-ço denominado Destaque, na página 3do Estadão. Lembro de um artigo queele assinou a respeito do ‘solitário daGranja do Torto’, o General Garrasta-zu Médici. Esse foi um dos textos maisduros do período. Nesta época, porgenerosidade dele, eu atuava como seusecretário. A partir daquele texto só res-tavam duas opções: o fim da sucursalou o fim da ditadura. Os militares pren-deram, torturaram e assassinaram jor-nalistas com a maior facilidade. Villas-Bôas enfrentou a todos com garra. Éum exemplo de dignidade, honestida-de e grandeza. Repetindo a velha ex-pressão que aprendi com meu pai, digoque “Villas-Bôas Corrêa é um homemde bem”, resumiu.

Affonso Arinos discursou em segui-da e destacou a sua convivência estreitacom a imprensa e com o homenagea-do. “Ao longo de toda a minha vidaestive sempre próximo ao jornalismo.Meu pai dirigiu os jornais O Estado deMinas e Diário da Tarde e fundou a Folhade Minas. Tenho laços familiares como Márcio Moreira Alves, herói da ba-talha pela liberdade de imprensa. Mi-nhas lembranças de Villas-Bôas Corrêacomeçam na década de 40, quando ele,muito jovem, iniciava a carreira cobrin-

do a Câmara dos Deputados. Recordoainda dos nossos encontros em minhacasa, em Copacabana. Eu costumava irà Redação tarde da noite para visitá-lo.Acompanhei sua trajetória na cobertu-ra política, que incluía nomes comoCarlos Castelo Branco, Pompeu de Sou-za e Prudente de Moraes, neto, amigofraterno de meu pai”, afirmou.

Arinos ressaltou também a relevân-cia do jornalista no cenário políticonacional. “Com a mudança da capitalpara Brasília, Villas-Bôas, que já eraindispensável, passou a ser uma espé-cie de bússola a nos conduzir, cobrin-do fatos com integridade, isenção eespírito público. Um exemplo que oBrasil merece ter e seguir na imprensae no Legislativo, Executivo e Judiciá-rio. As denúncias que acompanhamosdiariamente envolvendo os três Pode-res da República viraram regra, quan-do no passado eram exceção. O Brasilprecisa de homens como Villas-BôasCorrêa para que o Direito volte a pre-valecer de fato na vida política brasi-leira”, disse.

A década de ouroMurilo Melo Filho falou sobre os

momentos que marcaram o início dacarreira de Villas-Bôas Corrêa. “Elecomeçou como simples foca, mas logoem seguida era promovido a repórterpolítico. E foi aí que nos conhecemospessoalmente, quando testemunha-mos a década de ouro da democracia

brasileira, entre 1950 e 1960, antes datransferência da capital. Extasiados,assistimos nós dois, Villas-Boas e eu, aalguns históricos debates, ali no Palá-cio Tiradentes, com suas galerias reple-tas de entusiasmados participantes,que acompanharam o permanente ediário exercício de talentos oratórios.Embates travados por cultos e erudi-tos parlamentares”.

Murilo citou grandes talentos que,ao lado do homenageado, construírama História da Imprensa no Brasil.“Aqueles foram anos dourados, exerci-dos na imprensa por mestres tais comoCarlos Castelo Branco, Heráclio Sales,Prudente de Morais, neto, BeneditoCoutinho, Otacílio Lopes, Mário Mar-tins, João Duarte Filho, Pompeu deSouza, Joel Silveira, Osório Borba,Mauritônio Meira, Otto Lara Resende,Rubens Amaral, Evandro Carlos deAndrade, Murilo Marroquim, OctávioMalta, Paulo Mota Lima, Maria da Gra-ça Dutra, Odylo Costa Filho e muitosoutros, todos eles pioneiros do nossojornalismo. Somos os últimos rema-nescentes dessa escola de reportagempolítica, num modelo que, ainda ago-ra, 60 anos depois, provoca muitassaudades”, afirmou.

Observou Murilo Melo Filho que aolongo destas seis décadas fortes mu-danças foram impostas à imprensabrasileira: “Villas-Bôas e eu somos dotempo em que a Câmara era constitu-ída de 200 deputados. Quase todos eles

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Sob as vistas desua mulher,Regina de SáCorrêa, e doVereador EliomarCoelho, quepropôs ahomenagem,Villas-Bôasrecebe da netaJoana RamalhoOrtigão Corrêauma dasmedalhas quecompõem oconjunto decondecoraçõescom o nome doPrefeito PedroErnesto.

19Jornal da ABI 341 Maio de 2009

moravam no Rio, garantindo presen-ça certa no trabalho dos parlamenta-res, em vez da semana de apenas trêsdias, como agora acontece. Não erampoucos os que preferiam morar emmodestos hotéis do Flamengo, de Bo-tafogo ou do Catete. E Villas reconhe-ce que os tempos do jornalismo atualsão bem diferentes dos daqueles anos.Quando entra numa Redação, tem aimpressão de estar entrando numamaternidade, com todos voltados paraa tela da sua televisão. Ninguém con-versa... Para falar com o colega ao lado,preferem mandar-lhe, pelo computa-dor, um e-mail.”

Estoque de emoçõesConvidado a discursar, o Presiden-

te da ABI saudou os presentes e cum-primentou o Vereador Eliomar Coelhopela iniciativa de homenagear Villas-Bôas. “Vossa Excelência está prestan-do uma homenagem não só a Villas,mas a todos nós que tivemos e aindatemos o prazer de enriquecer o nossoconhecimento e nosso estoque de emo-ções ouvindo os depoimentos dos com-ponentes desta mesa de honra”, disseMaurício, que destacou o perfil com-bativo do homenageado.

“Villas-Bôas Corrêa é um infatigá-vel escritor de jornal a nos iluminarcom textos que revelam o seu domínio

da arte de escrever e, sobretudo, a suaindignação diante das mazelas quemarcam a vida brasileira hoje. Ele im-prime seu traço neste setor especial danossa admiração, que é o alto sentidoético no desempenho profissional, nacompreensão da sociedade e na neces-sidade de incorporarmos aos nossoscostumes e práticas valores que atual-mente são desdenhados com uma fre-qüência que nos causa estupor e vergo-nha. A ABI, aqui representada por mime por Lênin Novaes, Primeiro-Secretá-rio do Conselho Deliberativo, aplaudea homenagem que celebra o que Villasrepresenta desde o início de sua ativi-dade em A Notícia e de sua corajosaatuação na Sucursal Rio de O Estado deS. Paulo. Ele é uma referência do jorna-lismo brasileiro e do comportamentoético na vida pessoal e profissional”,destacou.

Autor da homenagem, o VereadorEliomar Coelho enalteceu a figura deVillas-Bôas Corrêa e a relevância dasolenidade: “Esta é uma noite especi-al, e a Medalha Pedro Ernesto é umaforma de agradecimento que o Rio deJaneiro, através de sua Câmara de Ve-readores, presta às pessoas que contri-buíram para tornar nossa cidade maishumana, digna e melhor de se viver.Este jornalista fez muito por nós todos,cariocas e brasileiros. Com 60 anos de

profissão, é o mais importante cronistada política brasileira. Aos 85 anos, é oúltimo sobrevivente da geração queforjou o modelo de reportagem queainda hoje se pratica. Estamos diantede um mestre que sempre fez um jor-nalismo no qual o espírito crítico e acapacidade de isenção são duas molasmestras das análises imparciais, carre-gadas de credibilidade que caracteri-zam sua vasta produção”.

Furo jornalísticoApós a condecoração, Villas-Bôas,

muito aplaudido pela platéia que ocu-pava o Plenário da Câmara, agrade-ceu a homenagem e as palavras doscompanheiros que participavam damesa. Em seguida, detalhou parte desua trajetória profissional. “Procureimeu sogro, Bitencourt de Sá, pois pre-cisava conseguir mais um empregopara pagar a cesariana da minha mu-lher no nascimento do meu segundofilho. Meu sogro me encaminhou aojornalista Silva Ramos, de A Notícia,que me deu uma oportunidade. Seismeses depois, fui autor de um furojornalístico, uma denúncia envolven-do autoridades políticas importantesdo Governo do Presidente Eurico Du-tra, em transação de venda de dor-mentes para a Central do Brasil. Fuialçado à reportagem política e, ao lado

de Carlos Castelo Branco, ajudei a for-jar o modelo que está aí até hoje. Erao momento de ouro do jornalismo, im-pulsionado pelo fim da ditadura Var-gas, a Constituinte de 1946 e o gran-de interesse da sociedade pelo notici-ário político. Para vocês terem umaidéia, nós, repórteres, atravessávamoso Centro da cidade a pé. Ninguém ti-nha carro. Apenas um do grupo ti-nha... Era um repórter de A Noite. Maso carro só andava para frente, não ti-nha marcha-à-ré”, contou, arrancan-do risos da platéia.

Disse Villas-Bôas que a mudança dacapital federal para Brasília promoveuo esvaziamento político do Rio e o dis-tanciamento da população do debateacerca das grandes questões nacionaise de fatos que geraram profundas trans-formações no País. “O rumo da repor-tagem mudou e a realidade políticatambém, até nós chegarmos aos diasatuais, com o pior Congresso da His-tória do País, cercado por escândalos edenúncias de toda sorte. Contudo, sougrato por poder contar aqui um pou-co da minha vida, na presença de todaa minha família e amigos, até mesmopara justificar a torrente de elogios querecebi. Me senti um Deus... Se fossemenos humilde estaria aqui a operarmilagres”, encerrou, com seu marcantesenso de humor.

20 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

“Meu bisavô mandou dizer a vocêsmuito obrigado.”

Foi com apenas estas oito palavrasque, tímido, e emocionado, o jovemarquiteto Paulo Sérgio Niemeyer agra-deceu em nome de Oscar Niemeyer aplaca e o diploma que lhe foram con-feridos como uma das dez Personalida-des Cidadania 2009 pelo Grupo FolhaDirigida, numa promoção com o apoioda ABI e da Organização das NaçõesUnidas para a Educação, a Ciência e aCultura-Unesco na qual, sem inscriçãoprévia de candidaturas, votaram maisde 4 mil pessoas dos diferentes setoresda vida social do Rio de Janeiro.

Paulo Sérgio, que recebeu a placa eo diploma das mãos do Presidente daABI, Maurício Azêdo, é um dos arqui-tetos que trabalham no escritório dobisavô, na Avenida Atlântica, no Rio.Após a premiação, porém, ele não eco-nomizou palavras ao descrever a inten-sa atividade que Niemeyer desenvol-ve, aos 101 anos, completados em 15de dezembro passado.

A solenidade de entrega dos títulosfoi realizada na noite de 5 de maio, nasede social do Jóquei Clube Brasileiro,e contou com discursos emocionadosde defesa da geração de empregos e dadistribuição de oportunidades e rendasno País. Este ano foram eleitos comoinstituições o Centro de IntegraçãoEmpresa-Escola do Rio de Janeiro-Ciee-RJ, a Ordem dos Advogados do Brasil-Seção do Estado do Rio de Janeiro e ainstituição educacional Pró-Saber.Como Personalidades, tiveram sua atu-ação destacada o jurista Célio Borja; oArcebispo Emérito do Rio Dom Eugê-nio Sales; o fundador da Biblioteca To-bias Barreto, Evando dos Santos; o ex-Presidente da República FernandoHenrique Cardoso, o empresário Isra-el Klabin; o coordenador do Afroreggae,José Júnior; o Presidente da Fecomér-cio-RJ, Orlando Diniz; o Ministro doTrabalho Carlos Lupi e o Governadordo Estado do Rio de Janeiro Sérgio Ca-bral, além de Niemeyer.

A escolha dos homenageados, porvoto direto e secreto em sobrecartaenviada e recebida pelo Correio pelaFolha Dirigida, é feita por um colégioeleitoral formado por mais de quatromil pessoas com atuação destacadanos setores educacional, cultural e po-lítico e entidades e movimentos soci-ais da Região Metropolitana do Rio de

PREMIAÇÃO

Niemeyer e mais nove, asPersonalidades Cidadania

O arquiteto foi um dos homenageados pela Folha Dirigida comoum dos exemplos de dedicação aos valores das lutas cidadãs.

declarou numa referência aos homena-geados da noite.

Necessidade de mobilizaçãoO Presidente da ABI, Maurício

Azêdo, disse em seu discurso que açõescidadãs devem ser cada vez mais incen-tivadas e promovidas e salientou quea sociedade está permeada por indiví-duos, inclusive vinculados à adminis-tração pública, que constantemente fe-rem o princípio de cidadania e até mes-mo de civilidade.

“Esta iniciativa da Folha Dirigidaganha um contorno degrande atualidade nomomento que o País vive.Práticas que ofendem acidadania estão presentescom freqüência no noti-ciário dos meios de co-municação e é precisoque as pessoas se unam,através de iniciativascomo esta, para enalteceraqueles que exaltam osvalores da cidadania ple-na”, acentuou.

Representante da Unes-co, uma das organizado-ras do Personalidades Ci-dadania 2009, o Coorde-nador do Escritório Ante-na da Organização noRio, Pedro Lessa, chamoua atenção para a necessi-dade da construção deuma cidadania inclusiva emais justa no País.

“O cenário atual pro-põe novos e inesperadosdesafios ao desenvolvi-mento social. Os proble-

mas não demandam mais a soluçãoapenas pela ação do Estado e do mer-cado, mas sim um novo pacto que con-sidere a importância estratégica deorganizações não-governamentais, daimprensa e de entidades internacio-nais”, destacou.

Desafios à cidadaniaEm seu discurso de agradecimento,

o Ministro do Trabalho e Emprego,Carlos Lupi, destacou a importância dopapel de instituições como a Unesco ea ABI, parceiras da Folha Dirigida napromoção, por possuírem a visão socialde um mundo mais justo, lutando pelapromoção e resgate da cidadania.

“As ações cidadãs vão desde os direi-tos mais elementares do ser humano,como o da liberdade de ir e vir, do di-reito à saúde, do direito a uma educa-ção de qualidade, até todos terem aces-so a um trabalho digno e bem remune-rado”, disse.

O Presidente da OAB-RJ, Wadih Da-mous, saudou de maneira efusiva outrohomenageado, o ex-Ministro do Supre-mo Tribunal Federal Célio Borja, consi-derado um dos maiores juristas do Bra-sil, e discorreu de forma objetiva sobrea atuação da instituição que dirige.

“Bastaria a OAB-RJ exercer estepapel, em defesa de uma classe como

Após a cerimônia, o arquiteto Paulo Sérgio Niemeyer comentou a expressividadeda obra daquele que é considerado o maior arquiteto vivo do País e um dos maisprestigiados no mundo inteiro: seu bisavô Oscar Niemeyer. “Eu acho que ele é umcara incrível e que merece esta homenagem. Ele diz que não, mas eu acho quemerece muito. Para se ter uma idéia, na semana passada ele terminou trêsprojetos, aos 101 anos. Amanhã levantará cedo, seguirá para Niterói, onde temuma obra que acompanha, almoçará, passará o dia lá e, assim, vai seguindo suacarreira profissional com a competência que nós conhecemos”, disse Paulo Sérgio.

Aos 101 anos, Niemeyer não pára

Janeiro. À solenidade de entrega dostítulos às personalidades e instituiçõeseleitas nesta quinta edição da promo-ção seguiu-se um coquetel de confra-ternização reunindo homenageados econvidados.

Ações cidadãsPresidente do grupo Folha Dirigida,

o jornalista Adolfo Martins saudou emseu discurso de apresentação um con-vidado em especial, além das demais ins-tituições organizadoras da promoção.

“Eu gostaria de saudar os componen-tes da mesa na figura deste baluarte dohumanismo que é Dom Eugênio Sales.Mário Quintana já dizia que a modés-tia geralmente é a vaidade escondidaatrás da porta. Então, não tomem issocomo modéstia, mas imaginem comoseria esta promoção sem a presença da

ABI e da Unesco. Nós temos o maiororgulho do papel cidadão que exerce-mos, mas os holofotes desta festa nãoestariam tão iluminados se não fossemestas duas instituições”, disse

Adolfo, que em abril passado foieleito membro do Conselho Delibera-tivo da ABI, fez a defesa do papel docidadão nos dias de hoje.

“Temos tempos marcados pela pe-quenez ética que se banaliza, pela ex-clusão que se apresenta, pela injustiçaque se institucionaliza, pelo humanis-mo que se fragiliza. Um tempo em quemuitos já não têm capacidade de sesensibilizar diante de uma criança fa-minta ou de se comover diante de umadulto desempregado. Torna-se maisque oportuno, eu diria que fundamen-tal, que busquemos exemplos daque-les que não se rendem, não se omitem”,

POR PAULO CHICO ARQUIVO ABI

21Jornal da ABI 341 Maio de 2009

a dos advogados, da cidadania destaclasse, para merecer esta comenda. Masela não faz só isso. Representa muitomais. Nós entendemos, e basta olharpara o panorama da sociedade, queapesar dos inúmeros avanços, aindatemos milhares de pessoas carentes decidadania. Fazemos parte da luta pelademocracia, contra a tortura, pela anis-tia e por melhores dias para a nossapopulação”, lembrou.

Mensagem de FHCEleito pela primeira vez Personalida-

de Cidadania, o ex-Presidente FernandoHenrique Cardoso não pôde compare-cer à cerimônia de entrega do título,

O reconhecimento da informaçãocomo remédio. Como elemento vitalpara a prevenção e o tratamento deuma doença que ainda é envolta empreconceitos e provoca medo e apreen-são, apesar de cada vez mais curável.Uma forma de incentivo para que amídia passe a dar mais atenção à deli-cada editoria de saúde. Assim pode sercompreendido o Prêmio Inca-Ary Frau-zino de Jornalismo, iniciativa do Ins-tituto Nacional de Câncer, com o apoioda Fundação do Câncer, realizado pelasegunda vez este ano.

A solenidade de entrega do Prêmio,que tem o nome de um dos mais des-tacados ex-diretores do Inca, foi rea-lizada na noite de 26 de maio na Aca-demia Nacional de Medicina, no Cen-tro do Rio. A Vida Por Um Fio, de Ve-rônica Almeida, e Câncer: Por Que aLuta Ainda é Tão Difícil, de CristianeSegatto, foram as grandes vencedoras.A matéria de Verônica, publicada noJornal do Comércio, de Pernambuco, e

Cristiane Segatto, bicampeã do Prêmio Ary FrauzinoRepórter da revista Época vence pela segunda vez consecutiva o certame realizado pelo

Instituto Nacional do Câncer para estimular a divulgação de informações sobre o câncer na mídia.

pois já havia assumido compromissosno exterior. Ele enviou uma mensagemde agradecimento à organização dapremiação, a qual foi lida pelo represen-tante da Unesco, Pedro Lessa:

“Lamento não estar presente a estahomenagem que me calou fundo. Res-ta-me dar os parabéns à Unesco, à As-sociação Brasileira de Imprensa e àFolha Dirigida por essa iniciativa e agra-decer, sensibilizado, aos que me distin-guiram, por eleição, com este título, oqual farei questão de receber pessoal-mente, assim que regressar ao Brasil”,dizia o texto do sociólogo e professoraposentado da Universidade de SãoPaulo-Usp, que atualmente preside o

a de Cristiane, feita na Época, concor-reram, respectivamente, nas catego-rias jornal e revista. A primeira delas en-

frentou 45 reporta-gens selecionadas.Na competiçãocom a segunda, ha-via outros 21 traba-lhos inscritos. Cris-tiane Segatto tor-nou-se bicampeãdo Prêmio, que elavencera tambémno ano passado.

Em cada catego-ria foram selecionadas cinco finalistas,após uma avaliação inicial do júri cons-tituído por representantes da Divisãode Comunicação Social e das coorde-nações médicas do Inca. As matérias fo-ram, então, avaliadas por jurados comexperiência em comunicação e saúde.O vencedor de cada categoria recebeu,além de diploma e troféu, prêmio emdinheiro no valor de R$ 9.000,00.

A vitoriosa repórterCristiane Segattodeclarou-seimpressionadacom a corageme o otimismo doseu mais ilustreentrevistado, oVice-PresidenteJosé Alencar.

Instituto Fernando Henrique Cardoso-iFHC, em São Paulo, centro de estudose de debates sobre a democracia e odesenvolvimento e que preserva o acer-vo pessoal construído ao longo da vidapública.

Exortação de Dom EugênioEleito pela terceira vez Personalidade

Cidadania e agora, por essa nova elei-ção, integrante da Galeria das GrandesPersonalidades, o Arcebispo EméritoDom Eugênio de Araujo Sales lembrouque desenvolve ações de defesa da ci-dadania desde seus tempos de estudan-te, no Rio Grande do Norte. Ao longode seu discurso, Dom Eugênio enfati-

zou a alegria de ser homenageado, masgarantiu que os nomes eleitos devemfazer um exame de consciência e ava-liar seus papéis na sociedade, de manei-ra a contribuir para seu constante cres-cimento cultural e social.

“Os grandes avanços na cultura dahumanidade costumam ter, como seuimpulso inicial, transformadores, ins-pirações de personagens que, na suaintegridade, transcendem seus interes-ses próprios e fecundam a consciênciapública para uma nova humanizaçãoda vida coletiva e da história dos povos.Com imensa estima, vemos inúmeraspessoas que silenciosamente se gastampelo bem da sua comunidade, embora,mesmo merecendo, não sejam contem-plados com tal alta distinção comonós”, afirmou.

Também eleito pela terceira vez, oGovernador do Estado do Rio, SérgioCabral Filho, tem uma trajetória polí-tica ligada à promoção da cidadania.Em 1987, criou o Clube da Maior Ida-de e o Albergue da Juventude, facilitan-do o turismo das pessoas idosas e jo-vens. Atualmente, prioriza investimen-tos do Governo nas áreas de saúde,educação e segurança para garantir acidadania plena à população fluminen-se. O Governador foi representado nasolenidade pela Secretária de Estado deEducação, Tereza Porto.

“Desde o início de sua gestão, Sér-gio Cabral vem estreitando os laçoscom o Governo Federal, ampliando aparceria com as 92 prefeituras e traba-lhando fortemente com a iniciativaprivada na promoção dos direitos dasociedade”, disse a Secretária.

A Secretária de Educação Teresa Porto recebeua placa e o diploma conferidos ao GovernadorSérgio Cabral. O Cardeal Emérito Dom EugênioSales exaltou as pessoas que silenciosamentese gastam pelo bem da sua comunidade.

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22 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

MOBILIZAÇÃO

NAS RUAS,DE NOVO,

COM OPETRÓLEOÉ NOSSO

Entidades sindicais e da sociedade civil iniciaram no Rio umasérie de manifestações de repúdio à campanha contra a

Petrobras, denunciada em discursos, cartazes e faixas como umaameaça à hegemonia da empresa na exploração do petróleo no

País. Convidada, a ABI participou do ato, em coerência comuma tradição histórica: foi em seu auditório, em 4 de abril de

1948, que começou a campanha o petróleo é nosso.

Na cerimônia, foi prestada home-nagem ao jornalista Guilherme Dun-can, falecido há três meses. Bill, comoera conhecido, era um dos organiza-dores do Prêmio Esso de Jornalismo ecolaborou com o Inca na criação e or-ganização do Prêmio Ary Frauzino.

Duas campeoníssimasNa primeira edição do Prêmio Cris-

tiane Segatto foi a primeira classifica-da com a matéria As Mil Faces do Cân-cer. Ela já conquistou três vezes o Prê-mio Alexandre Adler, instituído peloInstituto Brasileiro de Controle doCâncer-IBCC, e duas vezes o prêmioconcedido pela Unimed. Ao todo, jáobteve mais de 10 premiações.

Cristiane recebeu o prêmio das mãosdo curador da Fundação do Câncer ePresidente da Academia Nacional deMedicina, Marcos Moraes. Em seuagradecimento, ela destacou a corageme o otimismo de seu entrevistado maisilustre, o Vice-Presidente da Repúbli-ca José Alencar, diante do câncer queenfrenta há 11 anos, e agradeceu aomarido e à filha, Beatriz, de nove anos,pelo apoio e compreensão, principal-mente no período em que esteve mer-gulhada na produção dessa e de tantasoutras reportagens extensas.

Verônica Almeida também temuma coleção de prêmios jornalísticos,conquistados tanto por reportagensna área de saúde como na de direitoshumanos - duas editorias nas quaistem especialização. Em sua estante detroféus estão prêmios nacionais – Vla-dimir Herzog, Embratel, da Associa-ção Brasileira de Medicina de Grupo,Alexandre Adler – e regionais, comoos da OAB e do Senai. Seu troféu foientregue pelo Diretor-Geral do Inca,Luiz Antônio Santini. Verônica disse

Com faixas e bandeiras, entre asquais uma com a inscrição SindicatoUnificado de São Paulo - Em defesa daPetrobras, que cobria toda a largura daAvenida Rio Branco, milhares de pes-soas marcharam na manhã do dia 21 demaio, da Candelária à sede da estatal,na Avenida República do Chile, emprotesto contra a convocação da Co-missão Parlamentar de Inquérito apro-vada pelo Senado Federal.

O ato foi convocado por uma sériede entidades, à frente a FederaçãoÚnica dos Petroleiros-Fup, a CentralÚnica dos Trabalhadores-Cut e a Con-federação dos Trabalhadores do Brasil-CTB, e atraiu representações de sindi-catos do Rio, entre os quais o dos Ban-cários e Financiários, de Municípios daBaixada Fluminense, de Angra dos Reise do Sul do Estado, bem como dirigen-tes e delegações de São Paulo, EspíritoSanto, Minas Gerais e Bahia. Tambémse fizeram presentes dirigentes do PT,do PCdoB e do PCB. A convite da Fe-deração dos Petroleiros, a ABI partici-pou da manifestação, em coerênciacom uma tradição histórica da Casa: foiem seu Auditório Oscar Guanabarino,no nono andar do Edifício HerbertMoses, que começou a campanha opetróleo é nosso, em 4 de abril de 1948.

Em nota distribuída à imprensa, adireção da Fup disse que a manifesta-

ção tinha como objetivo revelar a ur-gência de aprovar uma nova legislaçãopara garantir o controle estatal e soci-al sobre as reservas brasileiras de petró-leo e gás. O texto reafirma a determi-nação do movimento sindical de defen-der a Petrobras e acusa os parlamenta-res da oposição, principalmente doPSDB, de atacarem a soberania nacio-nal.

Para os petroleiros, a CPI da Petro-bras surge exatamente no momentoem que o Governo e a sociedade discu-tem mudanças na Lei do Petróleo. “Aidéia da marcha é denunciar o golpe quealguns senadores querem dar na Petro-bras. O que eles pretendem é abafar adiscussão do marco regulatório da leique rege o petróleo do Brasil”, declarouDaltro Bonfim, diretor do Sindicatodos Petroleiros da Bahia.

No ponto de concentração, diante daIgreja da Candelária, e, depois, próxi-mo à sede da Petrobras, a manifestaçãoexpressou repúdio ao PSDB e ao DEM,evidente nos dizeres de uma das mui-tas faixas exibidas: CPI tucana é paraentregar o petróleo do Brasil. Na aberturado ato, iniciado pouco depois das 9h,discursaram dezenas de oradores, en-tre os quais os Deputados Federais LuizSérgio (PT-RJ), Carlos Santana (PT-RJ)e Luiz Alberto (PT-BA), além dos De-putados Estaduais Gilberto Palmares e

que dividia o prêmio com os pacien-tes que entrevistou e suas famílias ecom seu editor, André Galvão, quesugeriu o tema da reportagem.

Cristina Ruas, Chefe de Comunica-ção do Inca, destacou a importância doPrêmio concedido pelo Instituto. “In-formações de qualidade – disse – con-tribuem para a adoção de hábitos sau-dáveis de vida, e a prevenção e o diag-nóstico precoce são fundamentais paramodificar a curva do câncer em nossoPaís. Neste sentido, queremos chamara atenção do jornalista para a impor-tância de seu papel no controle da do-ença, assim como despertar a popula-ção para a importância da prevençãoe do diagnóstico precoce. Além, é cla-ro, de reconhecer os melhores traba-lhos publicados.” (Paulo Chico)

Em jornal, concorreram com areportagem vencedora:– Efeito Dominó e Mulheres NãoSabem Que Câncer Atinge MaisObesas, ambas de Flávia Mantovani,da Folha de S.Paulo;– Terapia de Grupo, - Solidão queNada, da dupla Julliane Silveira eAmarílis Lage, também da Folha deS.Paulo;– O Remédio é a Doação, deSimone Miranda, publicada no Extra.

Na categoria revista, foramselecionadas estas reportagens:– A Nova Cara do Câncer Infantil eA Força de José de Alencar, ambasda vencedora Cristiane Segatto, daÉpoca;– Comida Anticâncer, de Cida deOliveira, da Revista Saúde (SP);– Uma Rede Solidária, de Phydia deAthayde, da CartaCapital.

OS SELECIONADOS

PREMIAÇÃO

Repórter do Jornal doComércio do Recife,

Verônica Almeida recebeudois troféus por suas

reportagens na categoriajornal. Ela tem prêmios por

matérias nas áreas desaúde e direitos humanos.

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23Jornal da ABI 341 Maio de 2009

A FOLHA PISOUNA BOLA DA ÉTICA

A manifestação de 2l de maio foia maior de caráter estritamente po-lítico que se realizou no Centro doRio nos últimos anos. Os principaisjornais diários do Rio e São Paulo fi-zeram a cobertura da manifestação,que se prolongou por mais de trêshoras, e publicaram matérias na edi-ção do dia seguinte, com chamadase fotografias na primeira página.

Três dias após o ato, em sua ediçãode domingo 24 de maio, a Folha de S.Paulo publicou na página A9 uma ma-téria em oito colunas (ou seis, atual-mente) sob o título Entidades contraCPI recebem de estatal, na qual seus au-tores, os repórteres Rubens Valentee Ana Flor, da Reportagem Local dojornal, procuram atribuir a mobiliza-ção contrária à realização da CPI e emdefesa da Petrobras a um interessepecuniário, como deixam claro nosubtítulo da manchete do alto de pá-gina: Nos últimos 3 anos, Petrobras in-jetou R$ 12 mi em projetos da CUT, UNEe ABI, que protestaram contra investiga-ção. Em seu quinto parágrafo, dizia areportagem:

“Ao longo dos últimos três anos,a Petrobras apoiou com R$ 11,9 mi-lhões projetos desenvolvidos porCUT. UNE e ABI.”

Essa informação é maldosa, de umlado, e destituída de ética, de outro:

l. para ser veraz, preciso e respon-sável, o texto deveria enunciar quan-to dos R$ 11,9 milhões foi destina-

do a cada uma das entidades citadas,até mesmo para dotar a informaçãode credibilidade que essa generaliza-ção não permite;

2. no caso da referência à ABI, a in-formação é destituída de procedên-cia, mentirosa, porque no períodocitado e mesmo antes a ABI não de-senvolveu qualquer projeto comapoio da Pertrobras.

Nesse ponto o jornal feriu a éticajornalística, porque a repórter AnaFlor, que entrevistou o Presidente daABI, foi informada da inexistência dequalquer projeto da ABI que a Petro-bras tivesse apoiado; mesmo assimincorporou ao texto da matéria oupermitiu que neste fosse imcluída ainformação inverídica e improceden-te. Aagressão à ética só não foi mai-or porque a reportagem reproduziua declaração em que o Presidente daABI justificou a presença da Casa noato público:

“A ABI tem uma posição históri-ca vinculada à Petrobras desde suacriação. A campanha “O petróleo énosso” foi lançada no auditório daABI em 4 de abril de 1948. A defesaque a ABI faz não é algo recente ouvinculado a patrocínios. O mesmoevento que a Petrobrás patrocinouteve apoio da Rede Globo, Furnas,Bradesco e Odebrecht; todos inde-penderam de contrapartida nossa.Nosso ataque à CPI tem base em seuconteúdo partidário visível.”

Inês Pandeló, ambos do PT. Tambémparticiparam o Prefeito de Nova Igua-çu, Lindberg Farias (PT), e Lúcia Stum-pf, Presidente da União Nacional dosEstudantes-Une.

A passeata culminou com um abraçocoletivo no edíficio-sede da Petrobrás,na Avenida República do Chile, ondediscursaram os representantes dasentidades nacionais. Convidado a dis-

cursar, no alto de uma caminhão desom, o Presidente da ABI, MaurícioAzêdo, lembrou que o ato público quedesencadeou a campanha do petróleoteve como cenário o seu AuditorioOscar Guanabarino, há 61 anos. “A ABItem desde então uma posição vigoro-sa de defesa da Petrobras e do mono-pólio estatal do petróleo”, disse o Pre-sidente da ABI.

A passeataem defesa daPetrobrasreuniurepresentaçõesde váriosEstados,entre estasnumerosadelegação deSão Paulo,que exibiagigantescafaixa,conduzidaporparlamentares,líderessindicais ediretores deentidades dasociedadecivil. Amanifestaçãoculminoucom umabraçocoletivona sededa Petrobras,na AvenidaRepúblicado Chile.

FOTOS: RAFAEL ANDRADE/FOLHA IMAGEM

24 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

25Jornal da ABI 341 Maio de 2009

26 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Um dos mais tradicionais e comba-tivos jornais do País, a Tribuna da Im-prensa ainda não superou uma de suasmaiores crises. Depois de ter a circula-ção de sua edição impressa suspensa noinício de dezembro de 2008, o jornalsobreviveu por mais quatro meses nainternet, sofreu um baque, durante oqual a última atualização foi feita em31 de março deste ano, e finalmentevoltou a respirar, com a retomada daversão eletrônica e a criação de um blogpor seu diretor, o indomável Hélio Fer-nandes, que o atualiza de hora em hora.

O drama pôde ser acompanhado noblog, como revela Hélio Fernandes,“Desde que este blog foi lançado – con-ta —, dezenas de leitores me repetemsempre a mesma pergunta, que eu tam-bém recebo diariamente por telefone ecartas. ‘Quando o jornal vai voltar a cir-cular?’. Com muita tristeza, admito,não sei”, afirmou em um de seus posts.

Como o Jornal da ABI já relatou,Hélio Fernandes decidiu suspender acirculação do jornal em face da impos-sibilidade da empresa de pagar dívidascontraídas em razão das perseguiçõessofridas durantea ditadura mili-tar, de 1964 a1985. Hélio acu-sou o SupremoTribunal Federalde morosidadena tramitação doprocesso relativoao pedido de in-denização feito àUnião, para repa-ração das perse-guições sofridas.Quando a inde-nização for paga,diz, o jornal fundado por Carlos Lacer-da em 1949 poderá livrar-se das dívi-das e voltar às bancas. E à internet.

“De fato, a Suprema Corte confir-mou as decisões das instâncias inferi-ores e mandou a União indenizar a Tri-buna. Isso já faz três meses. Por incrí-

MERCADO

A crise bate à portados jornais. E entra

Sufocada pelas seqüelas das perseguições sofridas sob a ditadura militar,a Tribuna da Imprensa deixou de circular em dezembro de 2008 e só não

desapareceu totalmente porque seu diretor, o indomável Hélio Fernandes,edita uma versão eletrônica do jornal e criou um blog, agora atualizadode hora em hora. O Jornal do Brasil melhorou a qualidade editorial, mas

enfrenta problemas de distribuição. A Gazeta Mercantil entrou em agonia.

vel que pareça, desolado, não posso as-segurar quando retornaremos às ban-cas, pois esse processo de execução, decobrança dos valores, por incrível quepareça, nem se iniciou. Tem advogadoque tão logo ganha em primeira e segun-da instâncias, dá início à ação de execu-ção. Isso não se verificou no nosso casoe se ocorreu, pode ser, não deu resulta-do ainda”, contou Hélio em seu blog.

Em 1979 a Tribuna da Imprensa ou-torgou procuração aos advogados Ra-phael de Almeida Magalhães e SérgioBermudes para que processassem aUnião pela censura diária, que se pro-longou por mais de dez anos. “Isso sedeu, portanto, há 30 anos. Inacreditá-vel! Justiça tardia é injustiça manifes-ta e qualificada, como escreveu RuiBarbosa. Já não sei a quem recorrer parareceber a indenização, pagar as contase devolver a Tribuna ao povo. Sem dú-vida, de todos os jornais censurados aTribuna foi o que sofreu a mais severae truculenta perseguição de censores ig-norantes e atrabiliários, que inclusivedenunciavam à Receita Federal e aosmilitares os nomes de empresas que ou-savam nela anunciar. A ordem era umasó: sufocar e inviabilizar a Tribuna”,

queixa-se Hélio.De seu lado,

funcionários dojornal reclamamuma definição daempresa Tribunada Imprensa so-bre a situação deseus contratos detrabalho. Em seublog, onde conti-nua a exercer averve de críticaácida aos princi-pais assuntos dodia, sobretudo no

campo político e econômico, HélioFernandes, apesar de mostrar-se porvezes incrédulo, deixa uma mensagemde esperança.

“Desculpem-me o desabafo. Não seiquando a Tribuna voltará às bancas.Certamente, isso ocorrerá só depois

que os advogados conseguirem promo-ver a execução da dívida da União, oque, espero, não deverá demorar maisalgumas décadas. Em 1979, a ditadu-ra e a perseguição militar ainda impe-ravam em nosso País. Basta a gente selembrar da explosão do prédio da Tri-buna em 1981 e do atentado no Riocen-tro, que, por milagre, não se transfor-mou numa carnificina inimaginável”.

Crise também no JB e na GazetaNo início de maio, moradores de

Nova Iguaçu reclamaram do desapa-recimento do Jornal do Brasil das ban-cas da cidade, uma dos principais dapopulosa Baixada Fluminense. A in-formação foi publicada no Correio daLavoura, o mais antigo jornal do Mu-nicípio fluminense. A dificuldade dese encontrar o JB tem sido verificadanão apenas nas bancas de Nova Igua-çu, mas tambném de boa parte dascidades da Baixada.

Na reportagem do Correio da Lavou-ra, quem chamou a atenção para o casofoi o jornaleiro Ari Marques, que traba-lha em uma banca ao lado da Igreja deSão Jorge, no Centro da cidade. Infor-mou Ari que a distribuição do jornal foi

interrompida sem explicação e ele ficousem saber o que dizer aos seis leitoresque diariamente se dirigem à banca,sempre na esperança de encontrar al-gum exemplar do jornal. publicação.

Marcos Andrade, dono da bancaHélio Andrade, disse à reportagem doCorreio da Lavoura que recebeu carta dojornal informando que por motivos de“custo operacional elevado” o JB esta-ria deixando de circular em Nova Igua-çu. Apesar das queixas, o setor de aten-dimento ao leitor do JB informou quenão houve qualquer alteração no esque-ma de distribuição do jornal em NovaIguaçu, onde, disse a empresa, as ven-das acontecem normalmente.

Também o jornal Gazeta Mercantil,que faz parte do grupo CompanhiaBrasileira de Multimídia-CBM, ao qualpertence também o JB, enfrenta gravecrise financeira, com reflexos na suacirculação, que está ameaçada. Especu-lava-se que a última edição do jornal,cujas atividades seriam paralisadas,chegaria às bancas no dia 29 de maio,já com a imediata suspensão da circu-lação a partir de 1º de junho.

Referência no jornalismo econômi-co no País, a Gazeta tenta agora admi-nistrar dívidas trabalhistas de quaseR$ 200 milhões. A CBM pertence aNélson Tanure, empresário que arren-dou a marca Gazeta Mercantil em 2003e desde então responde por sua publi-cação. O motivo da desistência em re-lação ao jornal seria o acúmulo de inú-meras decisões judiciais favoráveis acredores, especialmente na Justiça doTrabalho.

Diante da rescisão de contrato coma CBM, o dono da Gazeta Mercantil,Luiz Fernando Levy, afirmou que fariatudo para garantir a sobrevivência dojornal, fundado há 90 anos. Levy dis-se ainda que pretende processar o donoda CBM, Nélson Tanure, o qual, por suavez, alega que as dívidas trabalhistasem questão seriam de responsabilida-de dos proprietários da publicação.

POR PAULO CHICO

27Jornal da ABI 341 Maio de 2009

A derrubada da Lei de Imprensa, nasessão do Supremo Tribunal Federal dodia 30 de abril, teve grande repercus-são na mídia e especialmente no meioacadêmico, como provou o debate re-alizado pelas Faculdades IntegradasHélio Alonso-Facha na manhã de 28 demaio, quando mais de duas centenasde estudantes de Jornalismo lotaramo auditório da instituição, em Botafo-go, para assistir a uma palestra sobreo fim da Lei nº 5.250, de 9 de fevereirode 1967. Participaram o Presidente daABI, Maurício Azêdo, o colunista de OGlobo Ancelmo Góis e os ProfessoresIvan Cavalcânti Proença e José Eudes,este último mediador do encontro.

Ao iniciar sua exposição, MaurícioAzêdo lembrou o momento em que a Leifoi editada. Politicamente, afirmou, seuobjetivo era claro: censurar as publica-ções que contestassem a ditadura.

“Essa Lei de Imprensa surgiu paralegalizar as intervenções que as Reda-ções já vinham sofrendo por parte dosmilitares desde as primeiras horas dogolpe militar de 1964. Foram silencia-dos e fechados logo no primeiro dia daquartelada jornais de esquerda ou pro-gressistas, como Novos Rumos, do Par-tido Comunista Brasileiro-PCB; O Se-manário, do jornalista nacionalistaOsvaldo Costa; Brasil Urgente, dos pa-dres dominicanos de São Paulo; A Liga,de Francisco Julião, criador das LigasCamponesas e deputado federal eleitopelo Partido Socialista Brasileiro (PSB)de Pernambuco.

Disse Maurício que se verificou apartir de então a padronização do pen-samento e do noticiário na imprensa.“A partir de então, passaram a circularsomente os jornais da grande impren-sa, que adotaram a censura interna eapresentavam as versões dos fatos quevinham direto da Rua da Relação, sededa Polícia, no Centro da Ciodade, ondeficava o Dops, sigla do Departamentode Ordem Política e Social, órgão derepressão política. Com a Lei nº 5.250foi implantado um sistema de controledos jornalistas e dos órgãos de comu-nicação. Tivemos um período em quea liberdade de imprensa ficou castra-da por essa Lei”, contou.

O Professor Ivan Cavalcânti Proençaacendeu a polêmica no encontro, aoafirmar que ainda hoje há censura in-terna na imprensa. “Eu citaria três re-vistas como exemplo disso: Veja, IstoÉe Época, as quais denomino ‘Não Veja’,‘Isto NãoÉ’ e ‘Fora de Época’. Em cer-

A Lei de Imprensa já era,mas continua em discussão

Estudantes, professores e jornalistas reuniram-se nas Faculdades Hélio Alonso-Fachapara discutir o antes, o agora e o depois da legislação que o Supremo derrubou.

ta ocasião, uma delas me procurou parafazer uma matéria que mostrava oquanto o professor universitário erabem remunerado; que essa história deque no Brasil o professor ganha mal épura balela. Eu discordei completamen-te dessa tese durante a entrevista.Quando li a reportagem, vi que o úni-co depoimento que não foi publicadofoi o meu”, disse o professor.

Agradecimento a MiroO Presidente da ABI explicou aos

alunos que a derrubada da Lei de Im-prensa só foi possível graças à atuaçãodo Deputado Miro Teixeira (PDT-RJ),que, por meio de seu partido, apresen-tou a Argüição de Descumprimento dePreceito Fundamental nº 130 pedindosua revogação total e definindo-a sim-bolicamente como o “último entulhoda ditadura”. Neste processo, a ABItambém teve participação ativa.

“Nós apresentamos memorial aoSupremo Tribunal como amicus curi-ae (amigo da Corte) pedindo, comoMiro Teixeira, a revogação total da Lei,que foi acatada pelo Supremo por setevotos a quatro”.

Para Ivan Cavalcânti Proença, quepresidiu o Conselho Deliberativo daABI de 2005 a 2006, o último entulhoda ditadura não é a Lei de Imprensa, esim a da Anistia.

“Nunca fomos consultados se que-ríamos mesmo o perdão para ambos oslados. Nessa história, nós servimos delimão para a limonada deles. Nós jáconseguimos derrubar a Lei de Impren-

sa, agora temos que concentrar esfor-ços para acabar com a Lei da Anistia.Assim como o Uruguai e a Argentina,temos que colocar nossos torturadoresno banco dos réus”, reivindicou.

A revogação da Lei de Imprensa nãopôs fim à polêmica sobre regras para oexercício do jornalismo. Surge agora apolêmica sobre a regulação do direitode resposta, trazida à tona pelo Presi-dente do Supremo, Ministro GilmarMendes. Maurício Azêdo tambémabordou o tema.

“Na nossa opinião, essa questão está

sendo superdimen-sionada, pois o di-reito de respostanão pode servir depretexto para fazera edição de umanova Lei de Impren-sa que pode abrigaragressões ao exercí-cio da liberdade deexpressão. Enten-demos que o Códi-go Civil já supreessa lacuna. Quemse sentir agredido,que entre com umaação e pleiteie seudireito de resposta”,ponderou o Presi-dente da ABI.

José Eudes citouum editorial da Fo-lha de S.Paulo, que

também defendia a criação de umanova Lei de Imprensa. Ele questionouqual seria o interesse das empresas decomunicação em postular a necessida-de de uma nova regulamentação parao exercício do jornalismo.

Ancelmo Góis disse não perceberessa intenção nas Organizações Globo.“Lá eu não sinto isso. E concordo coma posição da ABI de que não é necessáriauma nova regulação para o direito deresposta. O Código Civil já abriga essaquestão”, disse Ancelmo, que fez umacrítica à classe.

“Nós não pedimos desculpas, istonão está na cultura do brasileiro. Bate-mos na manchete e só vamos nos des-culpar dentro da seção de cartas dosleitores de uma forma imperceptível,que ninguém vê”.

As desculpas também devem partirdaqueles que cometeram e cometemcrimes contra a democracia, defendeAncelmo, que citou, como exemplo, ofrustrado atentado ocorrido no dia 1ºde maio de 1981, quando militares ten-taram colocar uma bomba no Centro deConvenções Riocentro, na cidade do Riode Janeiro, onde artistas da música po-pular brasileira faziam um show emcomemoração ao Dia do Trabalhador.

“Acredito que nossas Forças Arma-das, em sua grande maioria, sentemgrande constrangimento pelo fato,mas até hoje nenhum militar pediudesculpas. As pessoas têm vergonhade dizer ‘eu errei’. É interessante ob-servar isso quando falamos em direi-to de resposta.”

Liberdade de imprensaLiberdade de imprensa

FOTOS ANGELO CUISSI

Ivan Cavalcânti Proença e Maurício, assim como os estudantes, aplaudiram a irreverência de Ancelmo Góis:“Batemos na manchete e só vamos nos desculpar na seção de cartas dos leitores, de uma forma que ninguém vê”.

Professor e jornalista, José Eudes questiona:Que interesse têm os grandes jornais na

edição de uma nova Lei de Imprensa?

28 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Ainda que tenham recebido com aplausos aderrubada das disposições mais repressivas daLei de Imprensa (Lei nº 5.250, de 9 de fevereirode 1967), como a possibilidade de apreensão depublicações, o agravamento das penas para oscrimes de calúnia, injúria e difamação quandocometidos por jornalistas e o tabelamento dasindenizações em ações de dano moral, os prin-cipais diários do País – a Folha de S. Paulo, O Globoe O Estado de S. Paulo – estão defendendo a ins-tituição de uma nova lei para regular, num tex-to único, como o revogado pelo Supremo Tribu-nal Federal em 30 de abril passado, aspectos daatividade jornalística que consideram lançadosnum vácuo legal, como o direito de resposta.

Em editoriais especialmente dedicados aotema, os três jornais, que figuram entre os demaior circulação no País, mas também, certa-mente por isso, os mais influentes no campopolítico, partem do pressuposto, exposto peloEstadão (edição de 2l de maio, página A3), de que“o vácuo jurídico está disseminando insegurançaentre os órgãos de comunicação e no próprio Ju-diciário, onde tramitam milhares de ações con-tra jornais e jornalistas”. A decisão do Supremo,diz o jornal, produziu o que “muitos advogados,promotores e magistrados mais temiam”, o talvácuo gerador do sentimento de insegurança.

No editorial sob o título Antes que tardia (edi-ção de 3 de maio, página 6), O Globo apontouo que seriam “dois vácuos que precisam ser pre-enchidos: regras que racionalizem o exercíciodo direito de resposta e normas que disciplinemos pedidos de indenização”. Diz o jornal que es-sas regras e normas “são necessárias para evi-tar excessos, geralmente cometidos por juízesde primeira instância, onde são aceitos pedidosde resposta inexequíveis – leitura de extensosveredictos em jornais de tv, publicação de tex-tos em páginas e páginas de jornais e revistasetc. – e às vezes decretadas indenizações que,se pagas, levarão a empresa de comunicação àfalência”.

Acrescenta o jornal, com razão, que “este éum problema especialmente grave no interiordo País”.

Liberdade de imprensaLiberdade de imprensa

A grande imprensaquer nova lei

Insatisfeitos com a derrubada da Lei nº 5.250/67, os três maioresdiários do País estão defendendo a instituição de nova lei, a fim de

regular num texto único aspectos da atividade jornalística queconsideram lançados num vácuo legal, como o direito de resposta.

POR MAURÍCIO AZÊDO Ao defender a elaboração de “uma nova lei deimprensa, plenamente democrática”, objeto deseu editorial Direito à informação (edição de 3 demaio, página A2), a Folha de S. Paulo sustentouque com a revogação total da Lei nº 5.250/67“decisões relativas às várias formas de manifes-tação da imprensa estão entregues, a partir deagora, a interpretações fragmentárias e por ve-zes intempestivas de juízes singulares”. Diz ojornal nesse ponto: “Uma das principais fontesde incerteza, decerto, será a ausência de parâme-tros para o direito de resposta —, o que vai afe-tar não só empresas jornalísticas, mas sobretu-do o cidadão que se sentir ofendido por umapublicação”. Acrescenta a Folha:

“Grandes companhias de comunicação po-dem, sem dúvida, prosseguir na defesa do direitoà informação, apelando a instâncias superiores,onde o princípio encontra abrigo sólido. Mas sópor meio de uma lei de imprensa estariam osórgãos de comunicação regionais, os sites iso-lados da internet e os cidadãos em geral mais bemprotegidos das ameaças, que nunca cessam.”

Diferentemente de O Globo e da Folha, quecentraram a postulação de instituição de novalei na necessidade de regulação do direito de res-posta, ambos, e também de disciplinamento dospedidos de indenização, como fez o primeiro, oEstadão alinhou pelo menos nove aspectos que,a seu juízo, justificariam a edição de um textode substituição da Lei nº 5.250/67. Em editori-al que dá o seu recado já a partir do título (Poruma nova Lei de Imprensa), o Estadão enuncioucomo lacunas a serem removidas pela regulaçãopreconizada estes pontos:

l. direito de resposta;2. pedido de explicações;3. retratação;4. retificação espontânea;5. sigilo da fonte;6. exceção da verdade;7. cálculo da indenização por danos morais;8. garantias dos jornalistas;9. competência da ação.Ao contrário de O Globo e da Folha, o

Estadão não fez por menos: em seu enten-dimento, exposto no último parágrafo doeditorial citado, a nova Lei de Imprensa deve seraprovada em regime de urgência.

RITA BR

AGA

29Jornal da ABI 341 Maio de 2009

A revogação da Lei de Imprensa peloSupremo Tribunal Federal e a atuaçãodo Deputado Federal Miro Teixeira(PDT-RJ) no episódio foram objeto deaplausos no Conselho de Cultura doEstado do Rio de Janeiro. Por decisãode seu colegiado, por proposta de umdos seus membros, o cartunista Ziral-do, o Conselho encaminhou um ofícioao parlamentar enaltecendo a sua atu-ação na derrubada da Lei. No texto, aPresidente do Conselho, jornalista eescritora Ana Arruda Callado, afirmaque a decisão restituiu ao povo brasi-leiro o seu direito ao acesso à informa-ção e à livre manifestação em todos ossetores da nossa sociedade.

“Na Sessão Plenária n° 1373 doConselho Estadual de Cultura do Riode Janeiro, o Colegiado, por indicaçãode Ziraldo Alves Pinto, resolveu enviarcongratulações a V. Ex.ª por sua inici-ativa em relação à extinção da coerciva

Aplauso a Mirono Conselhode Cultura

A iniciativa dele restituiu o direitode acesso à informação a todos ossetores da sociedade, diz moção

dirigida ao parlamentar.

O questionamento quanto à neces-sidade de instituição de uma lei que re-gule o direito de resposta foi formula-do pelo Presidente do Supremo Tribu-nal Federal, Ministro Gilmar Mendes,na sessão de l de abril passado, quandoa Suprema Corte iniciou o julgamentoda Argüição de Descumprimento de Pre-ceito Fundamental n º 130/2008, ajui-zada pelo Deputado Miro Teixeira(PDT-RJ) através de seu partido, quedetém a titularidade do direito de repre-sentação em questões dessa natureza.

Como o julgamento entrara pelanoite, após o voto do relator, MinistroCarlos Ayres Britto, que se manifestoupela revogação total da Lei de Impren-sa, por considerá-la incompatível como texto da Constituição de 5 de outu-bro de 1988, houve tempo apenas paraa manifestação de voto do Ministro ErosGrau, que, numa intervenção objetivae sucinta, acompanhou o entendimen-to de Ayres Britto.

Ao suspender a sessão, em razão doadiantado da hora e da previsível exten-são da enunciação do voto pelos demaisministros, o Presidente do Supremo

No artigo que fez para a ediçãodo antigo Boletim da AssociaçãoBrasileira de Imprensacomemorativa dos 50 anos daABI, com data de capa junho de1958, o poeta Manuel Bandeiracriou um neologismo para relatarseu diálogo com o entãoPresidente Raul Pederneiras, quepôs em dúvida a declaraçãoemitida em seu favor por LuísAníbal Falcão, diretor da revistaIdéia Ilustrada, para que elepudesse filiar-se à entidade.

Transcrito sob o título Osamores de Manuel Bandeira com aABI na página 10 da edição nº340 do Jornal da ABI, com datade capa abril de 2009, o texto dopoeta narra o encontro que elemanteve com Pederneiras mais de30 anos antes, em 1925, visandoà sua filiação. Contou Bandeira:

“Raul passou a vista noatestado de Falcão e indagou, semme olhar: Essa revista existemesmo?

A pergunta pareceu-me“desobligeante”. Mas Raul eraum humorista e eu decidi tomá-lacomo humorismo. Respondi:Existe sim, mas nós não apercebemos porque ela existeapenas ... Percebi que Raul nãoconhecia os versos de Vicente deCarvalho; considerei-medesforrado. (...)”

Para a reprodução da crônicana edição 340, o Jornal da ABItomou a grafia de desobligeantecomo erro de revisão e substituiuo termo por desobrigante, semsupor que Bandeira criara umvocábulo que o nosso maismoderno Dicionário, o Houiass,não registra, assim como oDicionário Aurélio. Nascido noRecife em 1886 e falecido no Rioem 1968, Bandeira deixou-nossem explicar o que pretendeudizer com este seu desobligeante.Algum leitor saberá?

Lei de Imprensa. Esta louvável vitóriarestitui ao povo brasileiro o acesso àinformação e o direito de manifesta-ção. Este Conselho, que sempre defen-deu os ideais de liberdade em todas asáreas, reconhece sua luta em prol destacausa e vem, por este ofício, se mani-festar partícipe e disseminador destaconquista que contempla todos ossetores de nossa sociedade. Uma ini-ciativa que demonstra o inegável sen-so de oportunidade que o caracterizacomo homem de governo, de culturae de ação”, diz o texto da mensagemenviada a Miro.

Além da Presidente Ana Arruda

Callado, assinaram o ofício os Conse-lheiros Urbino Ubiratan Corrêa, Car-los José Fontes Diegues (Cacá Die-gues), Edino Krieger, Frederico Augus-to Liberalli de Góes, Godofredo deOliveira Neto, Haroldo Costa, Helo-ísa Aleixo Lustosa, Hermínio Bello deCarvalho, Lélia Coelho Frota, MarcosVinícius Rodrigues Vilaça, MariaÂngela Abras Vianna, Martinho JoséFerreira (Martinho da Vila), NilsonLuiz Raman Pereira, Paulo RobertoMenezes Direito, Reinaldo Paes Bar-reto, Ziraldo Alves Pinto, Amir Had-dad, Affonso Maria Furtado Silva eRaymundo Nery Stelling Júnior.

ERRATA

Bandeira criouum neologismo

indecifrável

Um direito, sim.Mas de quem?

Foi o Presidente do Supremo, Gilmar Mendes, quem provocouo debate sobre o direito de resposta. A quem este servirá?

marcou a continuação do julgamentopara o dia 15 seguinte, não sem antesantecipar o voto que proferiria na sessãoposterior. Gilmar Mendes concordavaparcialmente com o relator, admitindoa revogação de disposições da Lei º 5.250/67, mas divergindo da proposta de revo-gação total, por entender que havia ne-cessidade de preservação de numerososdispositivos do texto legal, como os re-lacionados com o direito de resposta.

Mendes declarou então que temiaque se instaurasse um vácuo legal e, emconseqüência deste, os juízes chama-dos a decidir sobre pedidos de direitode resposta adotassem decisões confli-tantes. Marcada para o dia 15, a sessãode continuação do julgamento foi adi-ada para o dia 29 e depois para o dia 30de abril, quando efetivamente se rea-lizou. Mendes manteve o voto pela re-vogação apenas parcial, posição assu-mida também pelos Ministros JoaquimBarbosa e Ellen Gracie.

Foi a luva lançada no ar por GilmarMendes que os chamados jornalõesagarraram com unhas e dentes, apro-fundando a polêmica que ele suscita-

ra. A insistência com que proclamarame sustentam a necessidade de edição deuma nova Lei de Imprensa, seja pararegular apenas o direito de resposta,como defendem O Globo e a Folha, oupara disciplinar os nove aspectos enun-ciados pelo Estadão, deixa dúvidas so-bre um ponto essencial: como a liber-dade de imprensa não é um bem jurí-dico-constitucional dos jornalistas edos veículos de comunicação, mas doconjunto da sociedade, que é o verda-deiro destinatário do direito à informa-ção, a grande imprensa está a defenderquem? A ela própria ou a cidadania? Otempo por certo oferecerá a resposta aessa indagação. (MA)

Ministro Gilmar Mendes: luva lançada no ar.

A atuação deMiro (foto) paraa revogação daLei de Imprensafoi exaltada pelaunanimidade doConselhoEstadual deCultura: moçãoapresentada porZiraldo foiaprovada eassinada pelos20 membros doprincipal órgãoculturalfluminense.

GILBERTO NASCIMENTO

GIL FER

REIR

A/SCO-STF

REPROD

ÃO

30 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

A corrupção é uma praga histórica noBrasil. Periodicamente novos casos sur-gem na imprensa, revelando um univer-so de abusos e de desmandos com o di-nheiro público. Um dos mais recenteslevantamentos sobre o tema, feito pelaconsultoria KPMG, revela que cerca deR$ 160 bilhões – ou 6% do Produto In-terno Bruto brasileiro – são perdidos acada ano com crimes de colarinho bran-co, como lavagem de dinheiro, sonega-ção fiscal e fraudes. Uma tragédia quecusta caro ao País não apenas pelas al-tas cifras que escoam dos cofres públi-cos para os bolsos privados, mas tam-bém por conta dos valores que deixamde ser aplicados com a perda de inves-tidores e pela imoralidade intrínseca quecarrega cada escândalo em um país emque cada centavo desviado é dinheiroque deixa de ser gasto em merenda es-colar, na compra de remédios ou na me-lhoria de serviços como saneamento,educação e transporte para a imensapopulação carente.

Esse quadro é denunciado quasediariamente nas páginas de jornais erevistas, reportagens na televisão e nainternet por conta dos novos e suces-sivos casos. Entretanto, a memória bra-sileira parece ser curta. Por causa darepetição exaustiva ou pelo sentimentode impunidade, pouca gente se dá con-ta do real tamanho do problema. Pen-sando nisso, o Diário do Comércio, deSão Paulo, resolveu encarar a questãode um modo bastante inusitado: coma criação do Museu da Corrupção, oMuCo, um memorial virtual na inter-net, “erguido” para que Lalaus, men-saleiros e anões do orçamento não se-jam esquecidos, mas devidamentecombatidos.

NOVIDADE

Na telinha,um museu

para acorrupção“Construído” pelo jornal Diário do

Comércio, de São Paulo, o espaço évirtual, mas lembra quão reais são as

mazelas provocadas pelo históricoproblema das falcatruas no Brasil.

POR MARCOS STEFANO O espaço pode ser acessado no en-dereço www.dcomercio.com.br/espe-ciais/2009/museu desde 22 de abril, diaem que se comemoraram os 509 anosdo descobrimento do Brasil – e tambémde problemas com corrupção, já que,como explica o editor Luiz Octávio deLima na introdução, a corrupção che-gou ao País com as caravelas – e que afarra das passagens aéreas no Congres-so ganhou as manchetes do noticiário.

Nesse primeiro momento, o Museuda Corrupção trata de casos ocorridosentre a década de 1970 e os dias atuais,mas o objetivo é, aos poucos, recuarmais e mais no tempo, levantando ca-sos até os tempos coloniais. Pensandodessa maneira, o acervo inicial doMuseu, fruto de seis meses de pesqui-sas feitas pela jornalista Kássia Caldeirae que já se tornou um material de ines-timável importância para a memórianacional, deve aumentar muito ainda.

A iniciativa de aprofundar a temá-tica da corrupção não é propriamen-te uma novidade no Brasil. Vários jor-nais e revistas mantêm hotsites comartigos e as principais reportagens fei-tas sobre o assunto. Porém, a forma en-contrada pelo Diário do Comércio paratratar do tema é bastante original einusitada:

– Queremos montar um banco dedados sobre corrupção, não apenas comnossos textos, mas com um materialmuito mais amplo. A proposta é ter umespaço on line de exibição e reflexãosobre os escândalos que marcam o País– explica Moisés Rabinovici, Diretorde Redação do Diário e um dos ideali-zadores do museu virtual.

Apesar de se tratar de um Museu,como diria a música, esse é também umespaço de grandes novidades. A come-çar pela introdução animada que ofe-

rece ao visitante uma vista panorâmi-ca do prédio da instituição, logo que seacessa o site. Como conta Rabinovici,apesar de ser virtual, o projeto é bas-tante real e, apesar de existir apenas nainternet, bem poderia ser erguido comuma estrutura metálica e vidro. O de-senho foi feito pelo arquiteto Rodrigode Araújo Moreira, professor da Uni-versidade Federal de Minas Gerais, quedesenvolveu a proposta com um gru-po de alunos.

Rabinovici diz que durante dois outrês meses muitas idéias passaram porsua cabeça; sabia, porém, que esse se-ria um desafio diferente. Afinal, pelaprimeira vez em seus 78 anos de vidapoderia trabalhar com total liberdade,sem limite de valor, sem metragem deterreno e sem dimensões pré-definidas.O resultado é um prédio em forma deuma enorme pirâmide triangular com40 metros de base em cada face e 60metros de altura. A fachada, com umtriãngulo, lembra bastante o Museu doLouvre, em Paris.

– Achei que essa era uma boa solu-ção. Por isso, criei uma pirâmide comuma parte virtualmente transparente.Tem vidro nas duas faces, e a face dafrente se repete atrás. Esse é o lado emque a corrupção precisa ficar transpa-rente. Porém, também há uma partecega, toda a parede dos fundos, com otriângulo inclinado e a torre. Se fizer ascontas, essa estrutura é maior que atransparente. Quem passa por esse la-do, percebe que tudo está muito ocul-to ainda. Claro, tudo tem uma inten-ção, que é transformar o espaço em ummarco permanente de denúncia comgrande visibilidade, no qual a purezada forma contraste fortemente com aessência do tema – afirma o arquiteto,em entrevista ao site do próprio Museu.

Ataque terroristaO sucesso do museu virtual foi ins-

tantâneo. Apenas poucos dias depoisde entrar no ar, o espaço ganhou elo-gios de alguns parlamentares nas tri-bunas do Congresso e ultrapassou amarca dos 50 mil visitantes diários.Mas nem todos gostaram da idéia.Alguém foi até mais longe e, segundoconta o Diretor de Redação Rabino-vici, tentou corromper o Museu daCorrupção:

– Fomos vítimas de um ataque dehackers. O site foi invadido, infecta-do por um vírus e ficou três dias forado ar. Fomos obrigados a refazer tudoe criar uma blindagem mais sólida paraagüentar essas invasões. Já houvenovo ataque, mas desta vez estávamospreparados e pudemos resistir. Nemaqui esses corruptos dão folga, pode?

Rabinovici explica ainda que umacuradora foi contratada especialmen-te para gerir o projeto e novos espa-ços já estão sendo planejados e desen-volvidos. Há propostas de se criarlinks para livros virtuais sobre cor-rupção em bibliotecas como a de Wa-shington e do site de serviços Google,e colocar pessoas para administrar aloja do Museu. Até agora, já aparece-ram três interessados em colocar pro-dutos reais à venda. Outra idéia écolocar uma música de fundo. Asfavoritas são o tema da animação OAprendiz de Feiticeiro, pela clara cono-tação com o assunto, e Bolero de Ra-vel, por possuir uma nota que se re-pete continuamente.

– Queremos denunciar o problema,que é gravíssimo. Mas sempre combom humor e sem desesperança. Há so-luções e, acima de tudo, esse tambémé um espaço para encontrá-las – com-pleta Rabinovici.

31Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Logo no início do tour virtual, o visitante se depara com umaescultura de terracota, presente de Rodrigo Moreira ao Museu. Apeça mostra quatro corpos decapitados sem braços e sem um pe-daço de perna. Eles estão entrelaçados e empilhados. O memorialdescritivo da obra garante que a escultura foi escolhida “como marcoindelével do monumento, evocando a imagem grotesca do povopobre e dilacerado”. Na perspectiva do prédio, a escultura é repre-sentada por esferas sobrepostas; assim como todo o conjunto, estásobre um imenso espelho d’água que duplica a imagem da obra.

Logo que adentra o saguão principal (1), o visitante tem vá-rias opções para iniciar seu passeio pelas salas, galerias e audi-tórios do Museu. Em todas elas, é possível acessar textos, repor-tagens e entrevistas produzidas pelo jornal diário ou especial-mente para o site, além de vídeos e músicas. Clicando na salamultimídia o internauta pode ver vídeos que o MuCo mantémno YouTube, com trechos de reportagens, pequenos documen-tários e até um engraçadíssimo Melô do Congresso. Também dápara ler entrevistas com artistas e diretores e críticas sobre pe-ças teatrais que abordam temas relativos à corrupção.

A Sala dos Escândalos (2) é na verdade um conjunto com osespaços menores sobre os mais diversos casos denunciados noBrasil nos últimos tempos: a Operação Satiagraha, a Máfia dosSanguessugas, o Mensalão, o caso da construção da nova sededo Tribunal Regional do Trabalho em São Paulo – o escândalodo juiz Nicolau -, a Operação Anaconda e até o incidente dosdólares na cueca. Todos com um breve relato do assunto, ima-gens e uma lista de links que remetem a reportagens que mos-tram a repercussão que cada um teve na grande imprensa.

A Sala das Operações da Polícia Federal traz um resumo sobrecada ação de investigação e combate às falcatruas desde 2003. Logoao lado, o visitante ainda acessa uma extensa cronologia de es-cândalos e fraudes, com mais de duas centenas de casos desde 1964.Outros dois espaços, o da Arquitetura da Corrupção (3) e a Ga-leria Edemar Cid Ferreira, dão o ar da modernidade ao desenhodo espaço. No primeiro, é possível encontrar fotos de alguns dosprincipais prédios e construções em que houve suspeita de des-vio de dinheiro ou superfaturamento, como o Estádio João Ha-velange, no Rio, e a Ponte Forte-Redinha, no Rio Grande do Nor-te. Ainda é possível “admirar” o escandaloso Edifício Palace 2 de-sabando em 1998, por ter sido construído pela empresa do De-putado Sérgio Naya com areia da praia, e o majestoso castelo doDeputado Edmar Moreira, construído para ser um cassino, numadas apostas mais recentes com suspeita de corrupção.

Quem gosta de arte pode conferir mais de perto parte do acervode Edemar Cid Ferreira, que se tornou conhecido como um au-têntico mecenas e por ser controlador do Banco Santos. Acusa-do de fraudes fiscais, ele teria sido o grande responsável pelo rom-bo de R$ 2,2 bilhões que levou o banco à falência em 2005.

Antes de encerrar seu tour pelo Museu, o visitante tem a op-ção de se manter atualizado, acessando a sala Em Exibição. Ali,encontra diversas reportagens sobre os últimos escândalos noPaís. Antes de ir embora, no entanto, vale a pena dar uma passa-dinha na Livraria do Museu, que oferece artigos e entrevistas comsugestões sobre como combater tantos escândalos. Prova de quenão é preciso arrancar os cabelos diante de tantas calamidades,mas para enfrentá-las será preciso muita perseverança e profun-das mudanças.

Quem quiser, ainda pode conferir uma série de souvenirs da lojade lembranças (4). Eles vão de camisetas com a logomarca do Mu-seu – curiosamente cortado, como se estivesse ele também cor-rompido –, banquinho para guardar o mensalão recebido dos pais,camisas de colarinho branco, última moda na alta costura, e, comonão poderia faltar, cuecas para levar dólares. Se estiver com fome,dê um pulinho na Pizzaria Zia Ângela (5) e, no clima da célebredança da ex-Deputada Federal Ângela Gadagnin, comemorandoa absolvição de um colega envolvido nas denúncias do mensalão,aproveite para clicar no vasto cardápio da casa, que conta comvariedades como a pizza Celso Daniel, a dos Cartões Corporati-vos e a da Crise Aérea. Gostosas a ponto de fazer qualquer turis-ta aproveitar – afinal, a ordem é “relaxar e gozar”. Certo?

Um passeio pelosescândalos Desembargadores

pedem apoio àemenda dos 75 anosEntidade quer a elevação da idade

limite para a aposentadoriacompulsória no serviço público.

Uma ação em defesa da qualidade doserviço público e também de proteção àsaúde da Previdência Social. Assim podeser vista a Proposta de Emenda à Cons-tituição 457/2005, que propõe a elevaçãoda idade limite para aposentadoria com-pulsória no serviço público de 70 para 75anos de idade. A Associação Nacional deDesembargadores-Andes pediu o apoioda ABI ao Projeto, através do envio demensagens a parlamentares e aos líderesde partidos no Congresso.

O pedido foi formalizado no dia 17 demaio pelo Presidente da Andes, Desembar-gador aposentado Luiz Eduardo Rabello,durante encontro que ele, o Diretor de Re-lações Institucionais da entidade, Desem-bargador Amaral e Silva, e o Presidente doTribunal de Contas do Município do Riode Janeiro, Conselheiro Thiers Montebe-llo, também sócio da Andes, mantiveramcom o Presidente da ABI, Maurício Azêdo.

O documento da Andes afirma que oretardamento da aprovação da emendaacarreta perdas não só para o Judiciário,mas também para outros segmentos im-portantes do serviço público em geral, in-cluindo as universidades, centros de pes-quisa e o corpo diplomático.

“As instituições perdem profissionaiscom notável conhecimento, grande expe-riência, serenidade e preparação técnico-científica acumulada durante longos anosde trabalho, sem que lhes seja dada a op-ção de continuarem ativos, prestando osseus serviços, caso assim queiram”, afirmao Presidente da Andes, DesembargadorLuiz Eduardo Rabello, que expõe outros ar-gumentos em defesa do projeto.

“O Brasil já tem um aumento da ex-pectativa de vida que, segundo dados doInstituto Brasileiro de Geografia e Esta-tística, beira os 81 anos. Outro ponto estáligado à Previdência Social. É que os pro-fissionais, por terem maior expectativade vida, ficarão mais tempo recebendo aaposentadoria. A Emenda Constitucio-nal daria folga de cinco anos à Previdên-cia Social”, prevê.

A apreciação da Pec 457/05, de auto-ria do Senador Renan Calheiros (PMDB-AL), pela Câmara dos Deputados estavaprevista para ocorrer no final de maio.Contudo, uma forte mobilização de en-tidades representativas da magistraturaconseguiu retirar o texto da pauta de vo-tação. São contra a proposição entidadescomo a Associação dos Magistrados Bra-sileiros-AMB, a Associação Nacional dosMagistrados da Justiça do Trabalho-Anamatra e o Conselho Federal da Or-dem dos Advogados do Brasil-OAB. Ape-sar de ter tido a votação adiada, a Pec 457/05 está pronta para ir à pauta e, por isso,pode ser incluída na ordem do dia a qual-quer momento.

JUSTIÇA

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32 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

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ENTREVISTA A FRANCISCO UCHA*

JORNAL DA ABI – COMO FOI SUA INFÂNCIA

E COMO SURGIU ESSA SUA PAIXÃO PELO CINEMA?Rubens Ewald Filho – Venho de uma

família razoavelmente abastada de San-tos, litoral paulista. Lá, éramos fazendei-ros e, entre outras coisas, cultivávamosbanana. Porém, na década de 1970 hou-ve muitas enchentes. Dois anos seguidosde muitos prejuízos foram suficientespara perder tudo o que tínhamos. Minhafamília era rica, mas eu não sabia, poistudo era muito controlado em casa, eleseram bastante austeros. A ironia é quemeus pais não aceitavam que eu traba-lhasse com cinema e, de repente, foi essetrabalho que os sustentou durante muitotempo. Não que pensasse apenas em tra-balhar com crítica. Cheguei até a fazerpós-graduação em Administração, como objetivo de lidar com os negócios dafamília e não jogar dinheiro fora. Não seise foi por causa da estrutura extrema-mente conservadora lá de casa, comminha avó controlando tudo e todos aoextremo, mas as minhas memórias deinfância foram bloqueadas. Minha vida

ubens Ewald Filho costuma ser tão polêmi-

co com as palavras, que sua vida mais se

parece um roteiro de filme. E dos bons, com

direito à aventura, suspense e drama. Apontado como um

dos melhores críticos brasileiros, ele entende de cinema

como poucos. Afirma já ter visto mais de 30 mil filmes e

foi chamado pela revista Veja de “O Homem do Oscar”,

por ter comentado mais de 20 vezes a transmissão da en-

trega do prêmio para as redes Globo, SBT e o canal pago

TNT e por conhecer os bastidores e a política da Acade-

mia em profundidade. “Por aí está cheio de gente que faz

crítica superficial e descompromissada. Quem faz bom

jornalismo nessa área foge dos releases e busca informa-

ção”, diz, com o natural tom provocativo.

Pioneiro nas críticas de filmes da televisão em jornais,

na publicação de livros sobre cinema no País, na produ-

ção de guias e críticas de vídeos e dvds e em programas

do gênero para a tv por assinatura e para a internet, ele é

acima de tudo um empreendedor que não gosta apenas

de falar, mas também de pôr a mão na massa. Por isso,

além de criticar também dirige e produz. Isso, quando não

trabalha em um ousado projeto: a criação de um pólo ci-

nematográfico em Paulínia, no interior paulista. Para falar

sobre tudo isso e contar os bastidores de suas duas gran-

des paixões, cinema e literatura, Rubens Ewald Filho re-

cebeu o Jornal da ABI em seu apartamento em São Paulo

para esta entrevista.

praticamente começa depois dos noveanos. Antes disso, algumas das poucaslembranças que tenho são justamentedos filmes a que assisti.Desde pequeno, sou umapessoa solitária. Moro so-zinho e sou meio obsessi-vo com trabalho. Acredi-to que a dedicação é a fór-mula para se vencer. Issovem desde cedo. Para mi-nha geração, o cinema erauma válvula de escape,um sonho, uma droga.Não fumávamos maco-nha, mas tínhamos os fil-mes. Costumo brincar edigo que sou um pouco como no filmeA Rosa Púrpura do Cairo, aquela perso-nagem da Mia Farrow, que sai para rea-lizar seus sonhos. Minha outra paixãoé a literatura. Por isso, sou um poucocomo aquele menino de História SemFim, que lendo, tinha coragem de en-frentar o mundo. A natação, quepratiquei até os 18 anos, deu-

me a disciplina. No universo de imagi-nação que construí na infância, o cine-ma tornou-se outra paixão, uma ânco-ra para minha vida.

JORNAL DA ABI – COMENTA-SE QUE VOCÊ

JÁ TENHA ASSISTIDO A MAIS DE 20 MIL FILMES.AFINAL, QUANTOS FILMES VOCÊ JÁ VIU?

Rubens Ewald Filho – Comecei a con-tar com onze anos. Nessa época, compreium caderninho e comecei a fazer anota-ções sobre cada filme a que assistia. Co-locava a data, o nome do filme, o cine-ma em que o vi, o nome dos atores e,eventualmente, também o do diretor.Não parei mais e, desde então, fui apri-morando esse trabalho e a escrever crí-ticas. As primeiras que saíram eram meiobobinhas, de acordo com a cabeça que ti-nha naquele tempo. Mas guardo todosos caderninhos, por isso, sei a quantosfilmes já assisti. Estou na casa dos 30 mile pretendo fazer uma festa junto com olançamento da nova edição do Guia deDVD. Por que fazer isso? Um dos críti-cos do mais importante jornal de Lon-dres decidiu se aposentar quando com-pletou 70 anos e declarou que chegavanesse momento satisfeito, afinal, já ti-nha assistido uns 16 mil filmes. Eu já viquase o dobro! Tudo anotado, sem con-tar reprises. Em outro caderno, eu faziaa votação dos melhores de cada ano. Erao meu Oscar particular. Num terceirocaderno, comecei a fazer uma espécie dedicionário de cineastas, pois não havianada igual ainda.

JORNAL DA ABI – VOCÊ FALOU SOBRE LI-TERATURA NAQUELA FASE. ALGUMA PUBLICA-ÇÃO CONTRIBUIU NESSE SEU ENVOLVIMENTO

COM O CINEMA?Rubens Ewald Filho – Duas revistas

alimentaram essa minha paixão, a Filme-lândia e a Cinelândia, publicadas pela RioGráfica, da Globo [atual Editora Globo].Ambas não têm nada equivalente hoje.A Cinelândia era a versão nacional deuma revista norte-americana chamadaModern Screen e trazia fofocas, matéri-as com dicas sobre como lidar com pro-blemas cotidianos, assinadas por atores,reportagens sobre importantes nomesdo cinema como John Ford e grandesdiretores, colunas assinadas por Louella

Parsons, Ida Hoppern eSheilah Graham, as gran-des fofoqueiras da época,

reunidas numa única publicação. Ape-sar de muito material bem traduzido,não se limitava a isso. Tinha muita coi-sa produzida por aqui. Ela conseguiatransmitir o fascínio, mas a que realmen-te fez a cabeça foi a Filmelândia, adapta-ção da Screen Stories. Ela pegava os filmese, a partir do roteiro original, produziaum grande conto, uma verdadeira nove-la. Nada a ver com telenovelas. Ela tra-zia todos os filmes do mês, que eram unsoito, e fazia uma cotação de 1 a 5, siste-ma que até hoje eu uso. A única coisa quelamento é não ter visto todos aquelesfilmes. Uns eram proibidos para meno-res de 18 anos, outros, para menores de14, e eu não conseguia entrar. Escola ehorários também me brecavam muitasvezes. Estou correndo atrás do “filmeperdido” até hoje. Até pouco tempo,dificilmente eram lançados em dvd, masjá vi alguns dos anos 50 no site do Inter-net Movie DataBase-IMDb, nos EstadosUnidos. A Filmelândia também me deutoda uma estrutura que usei quando fuiescrever novela com o Silvio de Abreu.Ele me pedia certas cenas específicas, dediscussão ou de brigas, e eu tinha vári-as estruturas já armadas na cabeça. Po-rém, com isso, também tornou-se mui-to comum para mim encontrar filmeseditados e com trechos cortados e finaisinteiros mudados, como aconteceu comO Passado Não Perdoa, do John Houston.

JORNAL DA ABI – COMO ASSIM?Rubens Ewald Filho – A revista traba-

lhava em cima do roteiro original e nãoda versão editada final. Há filmes incri-velmente danificados na edição final dosestúdios. De certa forma, tudo isso des-pertou em mim o autodidatismo, faci-litado porque dominava bem o inglês eo francês.

JORNAL DA ABI – COMO VOCÊ AVALIA

AQUELE PERÍODO DO CINEMA, FINAL DOS ANOS

50 E ANOS 60?Rubens Ewald Filho – Para mim, foi o

melhor momento do cinema. A Itáliatinha o melhor cinema, mas tambémsurgia a Nouvelle Vague, na França, e nosEstados Unidos, Hollywood morria nocomeço da década para ressurgir no fi-nal dela. Eu tenho críticas do primeiroSpielberg, do primeiro Copolla, do pri-meiro Brian de Palma. É com essa quali-dade que vou. Toda essa geração e maisos franceses. A geração que surgia ali eainda hoje está por aí é também a minha.As coisas foram mudando. No cinemabrasileiro, a mesma coisa. Eu via chan-chada e passei para o Cinema Novo. Euadorei o Gláuber Rocha. Até ele enlou-quecer. Por que as pessoas não falaramque isso tinha acontecido? Isso costuma

acontecer com muitos gênios. Opoeta Rimbaud, por exemplo,termina como traficante de es-cravos. Depois dos 21 anos, não

escreve mais nada. Bem, o finalé perfeitamente coerente, masas pessoas não entendem e nãoperdoam.

JORNAL DA ABI – GOSTOU DE

TUDO O QUE O GLÁUBER DIRIGIU?Rubens Ewald Filho – Adoro o Ter-

A revista Cinelândia, quepublicava reportagenscom astros de Hollywoodcomo Terry Moore(abaixo), foi uma daspublicações quealimentou a paixão deRubens Ewald pelo cinema.

33Jornal da ABI 341 Maio de 2009

DEPOIMENTO

Rubens Ewald FilhoO HOMEM QUE MAIS ENTENDE DE FILMES NO BRASIL

Um dos mais prestigiados críticos doPaís, Rubens fala sobre seus quarentaanos de carreira, jornalismo, bons emaus filmes. Ele tem dois amores:

além do cinema, a literatura.

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ra em Transe, mas detesto o Idade da Ter-ra, por exemplo. Nesse último, ele já es-tava pirado. Aliás, não gosto nem deCabeças Cortadas. A verdade é que ele pa-rou em Terra em Transe. A partir daí, per-sonagens como Antônio das Mortes já setornavam esquisitos, mas possíveis. Aí oGláuber vai para a Europa e fica deslum-brado demais.

JORNAL DA ABI – TÃO FASCINADO PELO

CINEMA, COMO FOI PARAR NO JORNALISMO?Rubens Ewald Filho – Santos até tinha

um bom cineclube, mas mesmo assimmuitos filmes não passavam lá. Então,eu ficava limitado. No último ano daescola, o meu científico, ainda não sabiao que fazer da vida. Decidi passar por umteste vocacional, algo que a maioria ain-da não conhecia bem naquele tempo. Eele apontou as áreas em que tinha apti-dão: diplomacia, direito, jornalismo emedicina. Estava certo, afinal, procuroser sempre diplomático (risos). Para fa-zer o curso do Itamarati, não precisavater cursado uma faculdade, mas a idademínima era 21 anos. E eu estava com 17.Parti para as outras opções. Chegou umtempo em que estava cursando Direito,pela manhã, História e Geografia, à tar-de, e Jornalismo, à noite. Apesar de terme formado em Direito, ter carteirinhade advogado e até estar aposentado, poispaguei à Caixa dos Advogados a vida in-teira, nunca gostei da área. Gostava deJornalismo, até porque lá estavam meusamigos. Mas ainda naqueles tempos defaculdade fiz movimento estudantil eparticipei de um grupo de teatro da fa-culdade, ao lado de Ney Latorraca, Jan-dira Martini, Neide Veneziano e CarlosRoberto Sofredini. Eles e mais gentecomo Bete Mendes e Bruno Del Maia éque formavam a minha turma. Mesmocom tanta coisa, ainda dava aula nosmomentos vagos.

JORNAL DA ABI – DE CINEMA, NATURAL-MENTE...

Rubens Ewald Filho – É. Uma das coi-sas que fiz no período em que estudeiJornalismo foi dar aula de cinema paraos colegas que pediam. Mesmo sem re-ceber nada. O curso foi muito elogiadoe logo comecei a dar aula também nasmelhores escolas da cidade. Não era re-munerado, mas foi uma ótima experiên-cia que, inclusive, me encorajou a dar

aulas mais tarde sobre História do cine-ma em uma faculdade, a São Luiz, em SãoPaulo. Além disso, conheci muita gentetalentosa, como o Carlos Monforte, hojena Globo. Fui eu quem o lançou na Tri-buna de Santos.

JORNAL DA ABI – E COMO FOI O COMEÇO

DE SUA CARREIRA?Rubens Ewald Filho – Além das amiza-

des, uma experiência me impulsionoupara o mundo do jornalismo. No últimoano da faculdade, a Folha de S. Paulo re-solveu lançar um novo jornal na cidadepara concorrer com a Tribuna de Santos.Esse jornal, Cidade de Santos, seria oprimeiro com sistema ofsete colorido doBrasil e, por isso, provocou muita ansi-edade. Fizeram um teste com os estudan-tes e eu fui reprovado. Foi um golpe paraum jovem de 21 anos que se achava o tal,

mas necessário como experiência devida. Por outro lado, depois de muitopensar, decidi que deveria mostrar meuvalor e que era capaz de ser um bom jor-nalista. Eles tinham cometido uma in-justiça e eu provaria isso. Devido a falhasna administração, o jornal não se trans-

formou no sucesso esperado. Eu, po-rém, tive como professor na Faculda-

de de Filosofia, Ciências e Letras,hoje Universidade Católica de

Santos, o Juarez Bahia, umdos grandes jornalistas da

História do País. Ele trabalhouno Jornal do Brasil, na Folha de S. Paulo,no Estadão e em outros importantes ve-ículos, foi correspondente internacional,escreveu obras teóricas e referenciais noensino do jornalismo. Lutou contra a di-tadura e acabou sendo perseguido e pre-so. Ele tinha sido o homem de confian-ça do Prefeito de Santos, José Gomes, cas-sado posteriormente pelo regime mili-tar. Quando passou a chefiar a Secreta-ria da Tribuna, ele iniciou uma reformado jornal e me convidou a trabalhar lá.

JORNAL DA ABI – VOCÊ FOI TRABALHAR NA

REDAÇÃO DO JORNAL?Rubens Ewald Filho – Em 1967, o Bahia

convidou-me para começar um departa-mento de pesquisas no jornal. Por cau-sa do JB, que foi pioneiro nisso, era umsonho para qualquer jornalista trabalharcom esse tipo de coisa. Mas tambémescrevia algumas críticas, mais como umplus. Depois, passei a escrever com fre-qüência. Lá também conheci o ChicoSanta Rita, criador do marketing políticono Brasil, um cara altamente criativo. Elediagramava e criou uma página inteirachamada de O Jornal da Praia. O traba-lho serviu de passaporte para o Jornal daTarde, novo veículo do maior do jornaldo País na época, o Estadão. A revoluçãodo JB já tinha terminado e estava come-çando agora a do JT. Quando ele saiu, eu,que era seu colaborador direto, assumia seção. Fizemos naquela época coisas

que ninguém tinha feito, inovando e ex-perimentando.

JORNAL DA ABI – ESCREVER CRÍTICAS DE

FILMES TROUXE PROBLEMAS PARA VOCÊ?Rubens Ewald Filho – O dono de uma

grande distribuidora – a Paris Filmes –durante anos foi paranóico, chegando aoponto de mandar investigar a minha vida.Eu não sabia de nada. Só fiquei sabendono dia em que concluíram que eu erahonesto e não tinha nada a esconder.Então vieram falar comigo. Puxa, por quenão me perguntaram antes? Eu teria ditoque era honesto para eles. O pior é que eugostava de muitos desses exibidores,achava que eram empreendedores, esta-vam valorizando o cinema, trazendo coi-sas novas para o Brasil, inovando no ma-rketing. Jamais discriminaria algum dis-tribuidor boicotando filmes ou prejudi-cando deliberadamente em minhas críti-cas. Mas muitos não viam a crítica comsimpatia. A gente não tinha noção dequem trouxe o filme, porque não nosenvolvíamos nesse tipo de coisa. Na épocade Santos, já comecei a ser perseguido peloexibidor local. Evidentemente, por seruma cidade pequena, quando falava queo filme era ruim, acabava com o filme.Depois, vim para São Paulo, trabalhar noJornal da Tarde, e assumi a crítica de cine-ma. Certo momento, vou ao Festival deBrasília e lá falo mal do filme do RogérioSganzerla, que me dá um tapa nas costase outro na cara. Saímos rolando no chão.Quando estréia o filme em São Paulo, ojornal me prestigia e publica a mesmacrítica. Nisso, eu estou num restaurante,de frente para o Chico Santa Rita, mas decostas para a porta. De repente, ele fala:“Você não sabe quem está entrando”. Sóvi uma mão e depois todos nós rolandooutra vez, desta feita, por cima das me-sas: o Sganzerla, eu e o Santa Rita. As re-vistas não tinham site como hoje, nemsequer a fofoca e as celebridades não eramtão prestigiadas como agora, mas esse tipode incidentes me tornou conhecido: vi-rei o cara, o crítico que provoca briga. Massou o oposto, um diplomata.

JORNAL DA ABI – E CONSEGUIRAM RESOL-VER A PENDENGA?

Rubens Ewald Filho – Quando fui paraa Globo, o Sganzerla me procurou e pe-diu para publicar uma matéria. Publi-quei, editei e fiquei amigo dele. Hojeestou publicando o livro da Helena Inês,da coleção Aplauso. Também publiqueio roteiro de O Bandido da Luz Vermelha,uma obra-prima. O fato é que a vida émesmo assim: cheia de idas e voltas.

JORNAL DA ABI – FOI NO JORNAL DA TAR-DE QUE SURGIRAM AQUELAS PEQUENAS CRÍTI-CAS AOS FILMES EXIBIDOS NA TELEVISÃO?

Rubens Ewald Filho – Sim. A gente ti-nha criado uma coluna inédita chama-da Filmes de Hoje na TV. O título quemdeu foi o Maurício Kubrusly, que era umaespécie de editor de criação, mas o pro-jeto é meu. Antes dessa coluna, não exis-tia nada na imprensa. E a coluna criou,por tabela, a assessoria de imprensa. Essacoluna deve ter durado uns 33 anos, até2002. É muito tempo na imprensa bra-sileira e influenciou todas as outras pu-

Rubens Ewaldcomeçou a relacionar

todos os filmes que via em cadernosescolares a partir dos onze anos. Hoje osmantém preservados desde os primeiros(acima alguns deles e abaixo, segurandoo primeiro). Numa rápida folheada pode-

se conferir clássicos como Vera Cruz,Vinhas da Ira, O Último Pôr de Sol, E DeusCriou a Mulher, La Violetera, O Homem do

Oeste, O Filho Pródigo e muitos outros.

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blicações. Filmes na TV era página intei-ra de críticas e não meros releases. Atéhoje, muita gente me diz que aprendeua gostar de cinema por causa daquelaspáginas. Naquela altura, no Jornal daTarde, a gente trabalhava a noite intei-ra, porque o jornal era vespertino, saíaao meio-dia. Ás vezes, ficávamos procu-rando um título até as seis da manhã. Eumesmo vivia em função do jornal.

JORNAL DA ABI – MAS VOCÊ NÃO PERMA-NECEU POR MUITO TEMPO NESSA ROTINA DE

REDAÇÃO...Rubens Ewald Filho - Em 1972, o Mu-

rilo Felizberto, já falecido, que na épo-ca era o editor do Jornal da Tarde, resol-ve me mandar embora. Eu nunca soubedireito as razões, mas ele me deixoucomo colaborador por causa da coluna.Aí passo a diversificar minhas ativida-des: dou aulas em Santos, na Faap, façotestes para a televisão, a Irene Ravacheme leva para conhecer algumas pessoas,tenho contato com o pessoal da TVCultura. Certo dia, a própria Cultura fazum teste para apresentador de um pro-grama chamado Cinema de Estrelas. Euparticipo e eles dizem que é para lança-mento de filmes da Metro, como O Re-trato de Dorian Gray. Disse na hora: “Le-gal, então vamos gravar”. “Ah mas vocênão precisa ir para sua casa para se pre-parar?”, perguntaram, surpresos. “Não”,completei, “sei de cor o assunto” (risos).A Lídia Lícia, diretora da emissora e hojeuma grande amiga, estranhou. Mas re-solveu apostar. Hoje, ela também escrevepara a coleção Aplauso. Mas daquelemomento em diante entro para o mun-do da televisão: fazendo testes. Não seicomo consegui, pois era extremamentetímido. Aliás, sou até hoje. Se eu puderevitar de ir a algum lugar, evito. Você nãome vê em coquetel, lançamento etc.

JORNAL DA ABI – PARECE CONTRADITÓRIO

ESSA TIMIDEZ EM ALGUÉM COM SUA EXPOSIÇÃO.Rubens Ewald Filho - Eu me fecho em

tudo, porém faço questão de ser muitoatencioso com os fãs, com a pessoa queestá me prestigiando. Eu levanto, cum-primento e me torno fácil, fácil, amigoda pessoa. Mas aparecer por aparecer, jáé outra história. Eu acabei de ter umconvite para fazer uma peça de teatro,mas uma coisa que não quero ser é ator.Mesmo que seja um papel importante.No fundo, criamos uma persona, técni-cas de apresentação. É obvio que eu sei,mas não quero porque não sinto dentrode mim essa necessidade. Certo tempo,eu tinha ainda um pouco do sonho defazer cinema, e esse sonho quem me aju-dou a realizar foi o Rubem Biáfora, ocrítico mais importante do Estado naépoca. Fiz uma crítica acabando com ofilme dele, mas ele não deu bola e aca-bamos nos aproximando. Nossa relaçãosempre foi muito conturbada, masaprendi muito também. É engraçado queeu não era discípulo, mas amigo mesmo.

JORNAL DA ABI – O BIÁFORA NÃO ACABOU

INFLUENCIANDO SEU MODO DE FAZER CRÍTICA?Rubens Ewald Filho - Ele tinha algu-

mas coisas muito certas, legais e tinhaoutras muito ruins. Propositalmente, eu

JORNAL DA ABI – MAS NEM PARA FAZER OS

GUIAS VOCÊ COSTUMA LER CRÍTICAS?Rubens Ewald Filho - Leio críticas no

IMDb, quando faço guias de dvd, maspara ver informações. Primeiro, eu nãogosto de saber das histórias antes de verqualquer filme, eu quero que o filme mesurpreenda. Aí eu vou me informar, sa-ber como, quando foi feito, por quem,essas coisas, depois de ter visto. Quandodigo que não leio, obviamente não estouquerendo dizer que em hipótese alguma.Teria que viver numa gruta para não sa-ber o que está acontecendo. Então, aca-bo sabendo algo por meio das notícias queaparecem. Isso acontece muito com tex-tos do pessoal lá de fora. Particularmen-te, gosto do Roger Ebbert, acho que é umcara que escreve bem, sensato, inteligen-te, culto, muito além do padrão. E gostotambém do Leonard Maltin, que temmuito a ver comigo dentro do trabalho depesquisa, conhecimento.

JORNAL DA ABI – VOCÊ FOI O PRIMEIRO

CRÍTICO A ESCREVER SOBRE VÍDEO, NÃO?Rubens Ewald Filho – Sim, fui a primei-

ra pessoa a escrever sobre vídeo. A cadasemana, ia numa locadora e fazia de gra-ça, noticiando o que tinha, no começodo mercado de vídeo. Até por isso elesficaram meus amigos depois. Por fim, fuio primeiro a produzir guias e críticas dedvd, que estão na moda hoje. Fui tam-bém o primeiro crítico na tv por assina-tura. O Paulo Autran foi o primeiro aaparecer, inaugurando o canal, mas oprimeiro programa foi meu, o Showtime,de 1990 para 91. Trabalhei 12 anos naGlobo, fiz novelas lá e no SBT. Quandoprecisaram de alguém para comentar oOscar, chamaram-me. Comento isso nolivro O Oscar e Eu. Todo ano vinha umrepórter aqui e fazia a festa do Oscar emcasa, e durante os três ou quatro anos euacertava tudo. Então, passamos a fazera transmissão. Deu tão certo, que pas-so a fazer jornalismo cotidiano também.Estou falando de 1979 e de toda décadade 80. Saio quando entra o FernandoCollor de Melo na Presidência.

JORNAL DA ABI – COMO FOI ESSA NOVA

TRANSIÇÃO?Rubens Ewald Filho – Foi boa, até por-

que tive liberdade como ninguém. Sevocê parar para pensar na TV Globo,principalmente nos anos 80, ela não fa-lava mal de nada. A única pessoa quefalava mal de alguma coisa era eu. Eupodia falar mal do Stallone, do Schwar-zenegger, de Sete Gatinhos. O NélsonRodrigues quase morreu quando eu fa-lei. Ou seja, eles me davam liberdade equeriam que fosse ponta-de-lança con-tra a censura, mostrar que a censura nãose metia com o cinema. Hoje, a Globo seretraiu novamente. Ninguém criticanada. O Jabor, por exemplo, não é lite-rário, nem somente de arte, fala de tudo.Fica difícil dar opinião assim.

JORNAL DA ABI – POR CAUSA DESSAS PO-SIÇÕES, VOCÊ TEVE ALGUM PROBLEMA COM ACENSURA NA DITADURA?

Rubens Ewald Filho – Na época em queentrei no Jornal da Tarde, ele estava sendoduramente censurado. Eu participei de

não o lia, para não ser influenciado; afi-nal, éramos colegas e trabalhávamos pa-ralelamente. Eu era influenciado, sim,por outros tipos de crítica, às vezes ame-ricanas, pelos livros que li e pela críti-ca americana intelectual, não o tipo decrítica de todos os dias. Mas para ser jus-to, o Moniz Viana, que morreu recen-temente, acabou exercendo alguma in-fluência sobre mim. Quando garoto, liao Correio da Manhã e gostava muito doque ele escrevia. Não lia o Estado, nemo Biáfora. Só muito mais tarde passei aler algumas coisas que ele escreveu. Na-quele tempo, não fui, mas hoje sou in-fluenciado por elas.

JORNAL DA ABI - VOCÊ LÊ ALGUM CRÍTICO

DO BRASIL?Rubens Ewald Filho - Eu não leio críti-

ca nenhuma, para dizer a verdade. Issonão quer dizer que eu não goste de al-guns. Acho interessante o padrão doEstado e, em especial, adoro o Merten[Luiz Carlos Merten]. Posso discordar doque ele escreve, mas isso não tem impor-tância nenhuma. Acho que o Estado fazuma grande cobertura de cinema. OSérgio Augusto, do Rio, é uma pessoamaravilhosa também, uma cabeça óti-ma. Fora esses, lamento a situação dacrítica. Vejo a crítica hoje como algoabominável, as pessoas estão ficandocada vez mais burras.

JORNAL DA ABI - CADA VEZ MAIS INFLUEN-CIADAS PELO MARKETING, NÃO?

Rubens Ewald Filho – Sim. Lamento asituação, ainda mais porque fui um dospioneiros na área.

FOTOS: ACERVO PESSOAL

Amigos desde os tempos de faculdade, Rubens Ewald conheceu Carlos Monfortequando dava aulas de cinema, e logo o levou para a Tribuna de Santos.

Como nãopoderia deixarde ser, RubensEwald conheceumuitos diretoresde cinemaimportantes,como ospremiadosSidney Pollack,de Entre DoisAmores - Out ofAfrica (acima) eAnselmo Duarte,ganhador daPalma de Ouroem Cannes porO Pagador dePromessa.

36 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

muitas ações, desde o primeiro dia emque entrou o censor. Num desses protes-tos, uma a uma, as pessoas iam se levan-tando, iam embora e deixando-o sozinhona Redação. Mas ele não percebeu, por-que nunca tinha entrado numa Redação(risos). Mesmo assim, nos achamos osgrandes heróis contra a censura. Em meutrabalho, especificamente, nunca tiveproblemas. Era a área em que você po-dia falar, porque o censor não lia. Mui-tas vezes, a gente se permitia fazer algu-mas críticas sutis ao regime.

JORNAL DA ABI – POR QUE VOCÊ DECIDIU

FAZER CINEMA NOS ANOS 70?Rubens Ewald Filho – Na verdade, fiz

um curta-metragem, que acabou perse-guido e tentei fazer um longa, com aMarília Pêra, chamado O Cordão Umbi-lical, adaptação de uma peça do MárioPrata. Mas não deu muito certo, porquea pessoa encarregada de levantar dinhei-ro sumiu com tudo. Essas coisas que sóacontecem no cinema. No fim, o Pratacedeu os direitos a outra pes-soa e o filme nunca saiu. Apartir daí, o Biáfora começoua me chamar para fazer filmescomo ator. O último foi o doKhouri (Walter Hugo Khou-ri), Amor, Estranho Amor. Fizpara aprender o que é um set,para saber como dublar ecomo se faz um filme. Essaexperiência também me aju-dou no trabalho de roteirista.Continuo não querendo serator. Só atuo em circunstân-cias especiais, como uma quesurgiu recentemente. Partici-pei do Manual Para AtropelarCachorro, O Filme. Nele, façouma única participação comoeu mesmo, tirando sarro doRubens Ewald Filho. Na Glo-bo, já fiz A Vida Como Ela É,com o Luis Fernando Guima-rães e o Pedro Cardoso. O LuisFernando interpretava o atorbrasileiro que concorria aoOscar. Eu falava: “Não, ele nãovai ganhar de jeito nenhum”.Cortava e ele aparecia rece-bendo o Oscar. Esse tipo decoisa é legal, o norte-america-no faz muito e acho legal fa-zer também, para mostrar quevocê não se leva tão a sério.

JORNAL DA ABI – NESSE CASO

A TIMIDEZ NÃO ATRAPALHOU...Rubens Ewald Filho – Não.

Depois de fazer Amor, Estranho Amor, fil-me de resultado muito bom até, algumaspessoas chegaram a mim e me disseram:“Eu vi você, você está legal no filme maso problema é que eu não consigo acre-ditar em você. Sua cara está muito mar-cada. É você, tentando fazer outra pes-soa”. A revista Veja já tirou sarro de mim,porque estou com a mesma cara há trintaanos. De fato, esse é meu estilo. Tornei-me um crítico e sou reconhecido assim.Não quero mudar minha cara. Estou en-velhecendo com o meu público. Se fos-se uma coisa que eu quisesse, faria naboa. Mas acho a profissão de ator mise-

rável; ele sofre, é rejeitado o tempo in-teiro. Eu prefiro dirigir ator a ser ator.

JORNAL DA ABI – O QUE VOCÊ PENSA SO-BRE AS AÇÕES NA JUSTIÇA DA XUXA CONTRA

AMOR, ESTRANHO AMOR?Rubens Ewald Filho – Absurdas. Ela

afirma que era inocente, que não sabiaque a trama estava sendo produzidadaquela maneira. Mas no making-of quefizemos, quase um documentário quetambém serviria como trailer, ela própriaapresenta a produção em detalhes. Masem qualquer lugar justiça é muito rela-tiva, aqui no Brasil mais ainda. Então éum absurdo proibir, coisa de fascismo,absurdo. Assim como comprar os direi-tos e mandar recolher todas as cópias daslocadoras e lojas do País.

JORNAL DA ABI – E AS EXPERIÊNCIAS COM

NOVELAS?Rubens Ewald Filho - A Irene Ravache

apresentou-me ao Sílvio Abreu dizendoque tínhamos muito em comum. Ele

precisou de alguém, chamou-me e escre-vemos quatro roteiros, dois foram filma-dos. No segundo, os produtores fizeramtantas concessões, que a obra virou umapornochanchada. Por isso, o Silvio deci-diu rumar para as novelas. Ele já estavafilmando quando a Irene novamente melevou para a TV Tupi. O Roberto Talmadisse que queria sangue novo e pediupara levarmos um projeto. A gente levouum na semana seguinte, ele aprovou,contratou e a novela nunca saiu porquea Tupi foi muito pressionada pelo Gover-no. O nome da novela é O Acidente, umaespécie de Lost em dois tempos, mas sem

as pirações da série norte-americana,porque isso já é coisa contemporânea. Sefizéssemos tais coisas naquele tempo, se-ríamos presos. A história tratava da quedade um avião e da sobrevivência das pes-soas na selva. Só quando entrou um novodiretor, o Henrique Martins, fizemosÉramos Seis, que foi um grande sucesso.

JORNAL DA ABI – POR QUE DECIDIU DES-BRAVAR A ÁREA DE LIVROS?

Rubens Ewald Filho – Realmente, en-trei numa área bastante complicada, jáque na época em que comecei a escrevernão havia muitos livros sobre cinema.Acabei me tornando uma referência, masnão tive esse objetivo. Apenas escrevi oslivros que eu gostaria de ter para consul-tar. O primeiro a sair foi Filmes de Hojena TV, em 1975. Em 1978, sai o Dicioná-rio de Cineastas, que é um livro impor-tante, tanto que agora vou lançar umanova edição. Para fazê-lo, passei doisanos vasculhando o arquivo do Estado,procurando nos jornais, porque não ha-

via informação nenhuma. OBiáfora me ajudou muito,com a memória dele, mastambém não tinha anotações,era só pela memória. E o livroé dedicado a ele, e é o únicolivro brasileiro assim, não háoutro. Eu acho que o fã de ci-nema gosta de ter um guiaanual para ficar sabendo so-bre os filmes, anotar, compa-rar cotações, discordar ou nãodas críticas. É para esse tipo depessoa que eu faço hoje osguias de dvd. Dinheiro não dá.Ás vezes, preciso colocar dobolso, mas dá prestígio e su-pre um espaço vazio.

JORNAL DA ABI – E QUANDO

SURGIU A HISTÓRIA DE QUE VOCÊ

ASSISTIA A VÁRIOS FILMES AO MES-MO TEMPO?

Rubens Ewald Filho – Erauma época áurea do mercadode vídeo e, de certa maneira, éverdadeira. Trabalhava emcasa e formei uma pequenaequipe que me ajudava com-posta por pessoas como o Ro-berto Rios, atualmente Vice-Presidente da HBO, o Mane-co, que se tornou assessor deimprensa, e o Cléber Eduardo,que foi crítico da revista Épo-ca, entre outros. Aí começoua lenda. Aqui, tínhamos duastelevisões, uma ao lado da

outra e eu assistia às duas. Naquele tem-po trabalhávamos com cópias de serviço,realmente muito ruins. Então, na da es-querda, eu via uma primeira vez, semprelegendado. Na outra, da direita, apenasrevia cópias, algumas vezes dubladas.Mas já aumentaram, dizendo que acom-panhava quatro ou mais filmes ao mes-mo tempo. Quem me dera. Isso é perfei-tamente possível quando se pensa quehoje a pessoa trabalha, assiste à televisão,escuta música, tudo ao mesmo tempo.Claro, vai se concentrar mais em algumadelas. Outros, com os recursos da tv di-gital, assistem a mais de um programa ao

mesmo tempo. A atenção é seletiva e, como tempo, você aprende a render. Busqueiessa forma para acompanhar os filmes docomeço ao fim e mais de uma vez.

JORNAL DA ABI – VOCÊ COSTUMA DIZER

QUE O PÚBLICO ESTÁ PASSANDO POR UMA

ENORME TRANSFORMAÇÃO E AS PUBLICAÇÕES

ESPECIALIZADAS EM CINEMA CONTINUAM COMO

HÁ MUITO TEMPO. COMO ASSIM?Rubens Ewald Filho - A primeira coisa

é a crise do jornal, que hoje não tem di-nheiro para pagar bem aos seus jornalis-tas. As novas tecnologias e a internetcrescem, enquanto a circulação dos jor-nais diminui cada vez mais. Por outrolado, as pessoas não se deram conta deque o público da televisão aberta estáenvelhecendo. O jovem vê muito pou-co tv aberta. Prefere séries de televisãoe internet; fica no computador ou nolaptop, ouvindo música, baixando arqui-vos, entrando em sites de relacionamen-to, assistindo a vídeos e achando nove-las totalmente caretas. A ausência des-se público provoca um círculo vicioso:as novelas ficam cada vez piores, perdemaudiência, buscam fórmulas extravagan-tes. As emissoras ainda não perceberamque esse é um caminho sem volta. Onovo público, que gosta de cinema, pre-cisa ser educado para entender cinema.Há muita gente perdida, cheia de opini-ões. Vou dar um exemplo: todo mundosabe que o Mickey Rourke é um grandeator porque fez um papel recente em OLutador. Todo mundo, inclusive críticos,o colocaram no topo dos favoritos aoOscar. Fui o único a falar em uma maté-ria para o Uol que ele não ganharia oprêmio. E expliquei por quê. Experiên-cia os outros até poderiam ter para dizer,mas não tinham a tranqüilidade de ob-servar isso. Não adianta, é necessárioconhecer a regra do jogo. Não entro nomérito se é justo ou injusto.

JORNAL DA ABI – VOCÊ FICOU SURPRESO POR

ELE TER GANHO O GLOBO DE OURO?Rubens Ewald Filho – Mas isso não quer

dizer muita coisa também. Na verdade,eu preferia o Frank Langella, que paramim é ator, não é parecido, ele construiuum personagem ali. O Oscar preferiuSean Penn, que é filho da indústria: o paiera perseguido, diretor; o irmão morreu;ele estava defendendo os gays, que erauma forma de também limparem a bar-ra da bobagem que a Academia fez emO Segredo de Brokeback Mountain. Ouseja, a Academia é o country clube deBeverly Hills, nada mais.

JORNAL DA ABI – QUADRINHOS?Rubens Ewald Filho - Eu acho que os

quadrinhos são a grande moda, até parao cinema. Você vai à banca e não encon-tra nenhuma revista de cinema que vaibem. A Set está cambaleando, nunca teveum apogeu porque só sobrevive com aajuda de alguém que gosta de cinema. ARevista de Cinema do Brasil também vivede força de vontade. Quadrinhos hojesão mais importantes para essa geraçãodo que cinema. É assustador isso, é bomque se explique também, porque há qua-drinhos e quadrinhos; quadrinhos quedão certo e os que não prestam.

DEPOIMENTO RUBENS EWALD FILHO

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K HILL/TN

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Apresentador do Oscar desde as primeiras transmissões para oBrasil, Rubens Ewald atualmente faz esse trabalho para o canal TNT.

37Jornal da ABI 341 Maio de 2009

JORNAL DA ABI – COMO ESTÁ O PROJETO DE

SE CRIAR UM PÓLO DO CINEMA NACIONAL EM

PAULÍNIA, NO INTERIOR DE SÃO PAULO?Rubens Ewald Filho – Estou bastante

animado com esse projeto e as coisasestão indo muito bem. Tudo começou háuns quatro anos, quando o Prefeito Ed-son Moura, de Paulínia, procurou-mepara fazer lá um festival de cinema. Eufalei para ele que já havia muitos festi-vais de cinema. Mas a proposta que eleme apresentou era muito maior: trans-formar a cidade num pólo de cinema, quetambém seria turístico, um tipo de tu-rismo cultural. A cidade tem um proble-ma grave: vive só da indústria do petró-leo, que é uma indústria com data defalecimento. Se morrer o petróleo mor-re a cidade, então eles queriam transfor-mar a cidade atraindo para lá o audiovi-sual, a indústria do entretenimento, queno mundo inteiro é muito forte. A mi-nha parte foi pôr os pés no chão. NaEuropa e nos Estados Unidos, visitamosos estúdios para escolher o melhor mo-delo. Fomos a Cannes conhecer o festi-val e mostrar a ele como fazia. Em Cu-ritiba, fomos ver como é organizado ofestival de teatro, visitar o Guiarão. Hoje,Paulínia tem o melhor teatro do interi-or. A cidade tem dinheiro e isso é umdiferencial. Mas só isso não basta. É pre-ciso vontade de trabalhar aquilo cultu-ralmente, e foi o que ele fez. Ficamos unstrês anos lá, fizemos o Primeiro Festivalde Paulínia, e houve eleição. Seu suces-sor não quis me liberar e continuo lácomo consultor do pólo e curador dofestival. A cidade tem um estúdio e estáconstruindo mais três, um bem grandee dois pequenos, para produção de tele-visão. Tem teatro funcionando, escola decinema que é muito legal, vai ter ummuseu que será chamado Museu da Ima-ginação, coisa do futuro – o Marcelo Dan-tas fez, é sensacional. O pólo deve dispo-nibilizar neste ano uns R$ 8 milhões paraa produção, dois milhões para séries e pro-gramas de televisão, e seis para longas-metragens. A gente não interfere no con-teúdo, mas exige que 25% do filme sejamfeitos na cidade, e sejam contratados es-tagiários de lá, assim como outras despe-sas sejam realizadas lá também. Não in-terferimos no trabalho, apenas leio o ro-teiro e avalio os projetos.

JORNAL DA ABI – O QUE ACHOU DE OMENINO DA PORTEIRA, FEITO POR LÁ?

Rubens Ewald Filho - Achei que seriaum filme interessante comercialmente,até acompanhei parte das filmagens.Infelizmente, ficou insosso, sem graçae bobo. Mas outros já foram rodados lá,uns oito ou dez e há patrocínio para uns30. Agora vamos fazer outro pacote. Nãotenho números ainda, mas vamos come-çar as inscrições de projetos.

JORNAL DA ABI – A REVISTA VEJA O CHAMOU

DE “O HOMEM DO OSCAR”, POR CAUSA DAS TAN-TAS VEZES EM QUE PARTICIPOU DA APRESENTA-ÇÃO DO PRÊMIO E PELO SEU CONHECIMENTO.COMO VOCÊ SE SENTE COM RELAÇÃO A ISSO?

Rubens Ewald Filho – A ligação é tan-ta que até escrevi um livro para falarsobre ela: O Oscar e Eu. Em todos os meuslivros, sou extremamente objetivo e dis-

creto, eu não me coloco muito. Acho queo único em que eu me coloquei foi o doOscar, a pedido da editora, que queriadessa forma. Fiz o livro em tempo recor-de; terminei de madrugada, vomitandoe passando mal.

JORNAL DA ABI – QUANDO VOCÊ ENTREVIS-TA ALGUM ATOR DE QUEM GOSTA, COMO FAZ

PARA EVITAR A TENTAÇÃO DA TIETAGEM? UMA

DE SUAS ENTREVISTAS, COM O ED HARRIS, VOCÊ

FEZ MUITOS ELOGIOS A ELE.Rubens Ewald Filho – É muito difícil

para o brasileiro entrevistar um atorestrangeiro. Primeiro porque o tempo écurto demais, até para aprofundar oucriar qualquer relacionamento. A únicacoisa que você pode falar é sobre o Bra-sil e se a pessoa tem alguma relação como País. Você pode entrevistá-los duran-te dez anos e, mesmo assim, eles não oreconhecem. De alguma forma, se a pes-soa estava realmente bem no papel vocêtem que encontrar alguma coisa boa parapuxar assunto. Por acaso, sou fã do EdHarris. E era um caso muito especial, emque ele herdou um papel que era doDennis Hopper. Então era também umaforma de deixá-lo aberto pra responder

o que eu queria ouvir. Minha técnica deentrevista é fazer um bate-papo. Eu nãovenho preparado demais, eu dou umaolhada na carreira da pessoa, e tentoouvir tudo aquilo que ela tem a dizer. Oque me incomoda mais em qualquerpessoa que me entrevista, particular-mente em televisão, é isso. Se a pessoapreparou a entrevista antes, ela está comum papelzinho e ela não me ouve. Achoque quem cumpre tarefa burocrática des-sa maneira deveria repensar porque es-colheu essa área para trabalhar, pois émuito ruim ser exibido ou demonstrarque sabe mais que o entrevistado. E o EdHarris é tradicionalmente uma pessoafechada. Daquela maneira, deu samba eficou maravilhoso. Outra vez, entrevis-tei o ator John Savage, que fez Hair.Enquanto conversamos, ele me diz queestá morando num sítio, numa fazenda,e que costuma passear sozinho. Resol-vi perguntar se ele era uma pessoa espi-ritual. Ele disse que sim, e acabamosconversando sobre Deus, o que era Deuspara ele, como ele se sentia, sem dogma-tismo. E virou uma entrevista maravi-lhosa. O homem é muito inteligente,mas entrei também na dele, com a per-gunta e o assunto certos. Ele não agüen-tava falar mais de filme, de violência;queria falar um pouco sobre sua expe-riência. O jornalista seguinte veio meindagar o que tinha dito a ele, pois elesó falava de mim, dizendo que foi a me-lhor entrevista que já havia concedido.Apenas deixei-o falar. Não é todo diaque eu vou encontrar um ator falandosobre como encontrar Deus num ran-cho em Nevada.

JORNAL DA ABI – O QUE É MAIS DIFÍCIL:FAZER UMA ENTREVISTA, UMA CRÍTICA OU INTER-PRETAR?

Rubens Ewald Filho – Sabe que hámuito em comum entre esses ofícios?Fazendo, você aprende a estrutura decada uma e aprendendo uma ajuda aoutra. Ao elaborar uma entrevista ouuma crítica, você deve saber conduzir o

que está fazendo, de forma a uma coisalevar a outra. É importante chegar até ohoje. Os anos em que fiquei fazendoentrevistas foram para mim como fazeroutra pós-graduação de interpretação,não de técnica de entrevista. De comoaprender o que é a arte de interpretar.Hoje, essa experiência me ajuda muitona hora de lidar com o ator, dirigir ator.De respeitá-lo, respeitar o tempo deles,o processo de criação, porque eu discu-ti isso com muita gente, de todos os lu-gares possíveis. Já conversei com cine-astas do mundo inteiro sobre processode criação. A mim não interessava a fo-foca; então eu acho que também apren-di muito artisticamente.

JORNAL DA ABI – TRABALHAR COM ATORES,DIRIGIR, ENTREVISTAR, ASSISTIR A UM FILME.TUDO BEM. MAS COMO VOCÊ LIDA COM A CRÍ-TICA A SEU TRABALHO?

Rubens Ewald Filho – Ainda bem queexistem as pré-estréias (risos). Mas, parater mais isenção, costumo convidar pes-soas, se possível não amigas, para daropinião. E acredito no que elas dizem.Não quero que riam ou reajam para meagradar, quero que sejam autênticos esem idéias pré-concebidas. O bom críticoé aquele que aponta saídas, funções. Eusempre conto a história do Inácio Ara-újo. Dizem até que virou crítico porminha causa, mas o fato é que tinha vi-rado montador de cinema, quando eu fizmeu primeiro curta. Foi ele quem perce-beu e me alertou que a primeira parte nãocombinava com a segunda. Era verdade,eu não tinha percebido, mas não davamais tempo de arrumar. No teatro, vocêconcerta no dia seguinte; no cinema,não. Respeito o crítico que me dá a dica;por outro lado, o crítico que fala por fa-lar me deixa enlouquecido. Não consi-go ver isenção. Mas serve para mim tam-bém, porque quando você lê a críticaavalia o crítico também. A boa críticaaponta soluções, mostra onde a pessoaerrou ou acertou, discute as soluçõessejam formais ou de idéia mesmo.

DIVU

LGAÇ

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CISCO

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Além de sededicar a

produzir e dirigirpeças de teatro,

como Hamlet-Gasshô,

adaptação daobra de

Shakespeare,Rubens tambémestá na internet

com o seuprograma

Cinema ComRubens Ewald

Filho, em parceriacom a Clic TV e o

portal Uol.

38 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

JORNAL DA ABI – E COMO ANDAM AS CRÍ-TICAS A SEU TRABALHO NO TEATRO?

Rubens Ewald Filho – Acho que estouaté dando sorte com a crítica. Fui para oFestival de Teatro de Curitiba e estoucom duas peças em cartaz: O QueridoMundo, há três anos, o que não é nadamal e também um sinal de que acerta-mos; e Lady Chatterley, que lançamos nofestival. Ela teve uma crítica média, masum dos críticos reclamou que não tiro aroupa das personagens e não mostro osexo mais explícito. Desculpe, mas eunão estou ali para apresentar sacanagem;quer dizer, acho que o crítico nem temconsciência de que ficou excitado em vera peça, que era exatamente o que querí-amos. O fato de despertar a curiosidade,de querer mais da montagem era o nos-so alvo. Isso não me aborreceu porquea pessoa soube avaliar uma série de ou-tras coisas. Também serve como adver-tência aos críticos: é muito difícil fazerboas críticas em espaço curto e quase im-possível fugir à superficialidade, poisvocê acaba falando muita bobagem.“Gostei” ou “não gostei” me dá sono enão é essa a questão. Frases pela meta-de, do tipo “é chato”, também não sãoboas para se avaliar uma obra de arte.

JORNAL DA ABI – COMO FOI SUA EXPERI-ÊNCIA COM A HBO?

Rubens Ewald Filho – Quando fui con-vidado para assumir o trabalho lá, esta-va no canal Showtime, na Abril. O Show-time foi um caso muito curioso e eu di-zia na época que era o melhor canal detelevisão por assinatura do mundo. Por-que tinha todos os estúdios, tinha cine-ma francês, cinema nacional, absoluta-mente tudo. Tinha mais filmes bons doque horários para exibi-los. A HBO foio autêntico herdeiro do Showtime. Pra-ticamente o que havia de bom no Sho-wtime foi levado para a HBO, quando fuipara lá. Lá, fizemos uma revolução. Euera diretor de tudo, de produção e de pro-gramação. Fizemos tudo, a chamada, otipo de letra, o tipo de apresentador, aroupa, como era apresentado um filme.O canal Cinemax foi criado do zero. Ali-ás, a marca já veio dos Estados Unidos,mas só. Infelizmente, a HBO foi vítima,primeiro, da falência da TVA; ficou semo sócio brasileiro. Segundo, da ganânciada Venezuela: o pessoal de lá veio aquie detonou o canal, queriam mandar,achando que eles eram melhores que agente. Acabaram com o canal e fomosobrigados a fechar o canal e mandarembora um monte de gente. Foi a coisamais difícil pela qual passei, criar umgrupo, montar uma equipe, treiná-la emandar embora sem razão. Eu fui o úl-timo, apaguei a luz e fechei a porta.

JORNAL DA ABI – SE SOUBESSE DESSE FI-NAL, VOCÊ TERIA ACEITADO A MISSÃO?

Rubens Ewald Filho – Com toda certe-za. Além da lição de vida, mesmo passa-dos quase dez anos – tudo aconteceu em2000 e 2001 –, as amizades e experiênciaspermanecem para futuros desafios. Achoque é uma história que precisa ser conta-da, junto com a da tv por assinatura.

JORNAL DA ABI – QUAL É SUA OPINIÃO SO-

BRE O JORNALISMO PRATICADO HOJE NO BRASIL?Rubens Ewald Filho – Eu sempre fui um

pouco adepto da teoria de que o sapateirodeve falar do sapato que concerta. Porisso, prefiro falar do jornalismo do cine-ma. Quando eu comecei a fazer críticade cinema, sabia-se que no JT quem fa-zia crítica de cinema é porque estavaganhando pouco na sua área, então ga-nhava um pouquinho mais como formade compensar o salário. Ou seja, nãohavia a preocupação de pegar uma pes-soa da área. Eu entrei meio por acaso,como copidesque. Passei a subeditor deVariedades e, por acaso, entendia de ci-nema. Então essa falta de preocupaçãode pegar especialistas da área era umacoisa que o jornalismo sempre teve,porque ele sempre achou que a cultura

não era uma coisa importante. E estoufalando de um jornal com tradição ecaderno específico sobre cultura. Paravocê ter uma idéia, o JT fez certa vez umaexposição e não havia qualquer mençãonem ao Divirta-se, nem à revolução quefizemos na área. Não era um caderno sóde reportagens, era um jornal meio re-vista e nosso trabalho mostrava omaking-of, os bastidores. Era o prenún-cio do que pode se encontrar nos extrasdos dvds, hoje. Há quarenta anos, jáapontávamos que o cinema seguiria poresse caminho e já mostrávamos essenegócio do culto às celebridades, coisaque abomino por causa dos excessos,mas nem o próprio veículo se deu con-ta. O jornalismo, hoje mais do que nun-ca, é uma passagem, porque o jornalis-

ta vai trabalhar numa assessoria, noGoverno, arranja um galho não sei onde,e muitas vezes não consegue se dedicarao seu trabalho no jornal. Penso que éesse tipo de coisa que desprestigia. Aque-le jornalismo épico muitas vezes mostra-do no cinema se perdeu. Não temos maiso jornalismo investigativo por aqui. Agente tem revistas semanais que se se-guram mais ou menos, mas os jornais...

JORNAL DA ABI – QUAIS JORNAIS VOCÊ

COSTUMA LER?Rubens Ewald Filho – Há muito não

compro jornais brasileiros. Leio o TheNew York Times, dou uma passada noUol e no Terra para ficar informado. Masa internet também tem problemas. Ademocracia que oferece é sua maior qua-lidade e também seu maior defeito. Passepor lá e você verá que é tanto um fenô-meno de crítica quanto é arrasado porelas. Um caso ilustra bem isso: a Tina Fey,atriz que ganhou o Globo de Ouro pelasérie 30 Rock e é a estrela do momento,deu uma entrevista quando ganhou oprêmio e disse: “Quem se acha uma gran-de estrela deve dar um pulinho na inter-net”. Se você está com problemas de ego,se achando maravilhosa, vai na internete você vai encontrar sempre alguém aca-bando com você. Porque ninguém é nin-guém, eu e o José da Silva temos o mes-mo peso no Google. Só que o jornalismotem embarcado por esse caminho de efe-meridade e de falta de responsabilidadee compromisso com o que se escreve.

JORNAL DA ABI – APESAR DE SEU NOME

APARECER MAIS DE 220 MIL VEZES NO GOOGLE...Rubens Ewald Filho – Pode ser, mas não

para o pesquisador casual, ou seja, amaioria dos internautas. Esses dias, eurecebi um comentário pela internet:“Gosto muito de você. Sempre defendovocê quando dizem que não entendenada de cinema” (risos). É a primeira vezque isso acontece. Graças à internet, quepopularizou a crítica. Mas devemos tercuidado, pois a selva é verdadeira. Mui-ta gente quer “ser igual ao Rubens EwaldFilho”, porque o conhecem superficial-mente. “É o cara que entrevista celebri-dades, vai ao Oscar...”. Mas não se pre-ocupam em aprender, em conhecer. Sepego um filme e há uma atriz dos anos40 e não a conheço, fico absolutamentetranstornado enquanto não for investi-gar quem é, quando e como surgiu, o queaconteceu e por que não fez sucesso? Equero saber também por que eu não aconheço! Isso não acontece com nin-guém. As pessoas não têm o menor in-teresse em descobrir nada. E a internethoje é uma arma de pesquisa sensacio-nal, tem coisas incríveis e as pessoas nãousam e não sabem usar. Muitos jornaistambém sobrevivem praticando aquelejornalismo enciclopédico, mas sem oestofo de um Rui Castro ou um Marce-lo Correia, que são pessoas que tiveramuma formação filosófica e fizeram muitomais do que publicar informação telegra-fada. Mas eles são uma raça em extinção.Temo que o jornalista à moda antiga aca-be e não encontre um substituto, nemmesmo na internet.

*Colaborou Marcos Stefano

DEPOIMENTO RUBENS EWALD FILHO

FOTOS: ACERVO PESSOAL

Dois encontros internacionais: com o desenhista Maurício de Souza, que fazia umaviagem a Boston, e com a jornalista e produtora Paoula Abou-Jaoude, em Los Angeles.

39Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Numa coleção,o Brasil que

tem memóriaAplauso faz um registro histórico das artes cênicas

brasileiras e leva ao grande público roteiros de filmes, peçasde teatro e perfis de dramaturgos, atores, atrizes e diretores.

POR MARCOS STEFANO

LivrosLivros

Aracy Balabanian, GianfrancescoGuarnieri, Dina Sfat, Paulo Goulart,Eliane Caffé, Fernando Meirelles, Alci-des Nogueira, Joana Fomm, Ewerton deCastro, Raul Cortez... O que todos elestêm em comum? Além de serem gran-des nomes do cinema, do teatro e da te-levisão no Brasil, todos são protagonis-tas da Coleção Aplauso, publicada pelaImprensa Oficial do Estado de São Pau-lo. Com 165 títulos já lançados, a cole-ção documenta a produção cultural bra-sileira ao falar da vida eda carreira de alguns dosmais notáveis persona-gens da cena artística,publicar roteiros e aná-lises de obras cinemato-gráficas e peças de tea-tro. Um registro histó-rico que mostra um paísque tem, sim, memória– pelo menos nessescampos.

Criada em 2004,Aplauso nada tem a vercom a atual febre da mí-dia de celebridades, que faz a festa doscuriosos, expondo publicamente a in-timidade de famosos. Apesar de nãotrazer revelações bombásticas, a cole-ção abre arquivos de documentos eimagens, permitindo a pesquisadores,professores, estudantes e mesmo inte-ressados nas artes cênicas conhecer ointrincado processo de criação do cine-ma e do teatro e facetas que caracteri-zam a formação e o ofício de artistas ediretores. Nada efêmero ou inversa-mente proporcional ao real talento dospersonagens e de suas obras. O conteú-do publicado na Coleção depende desua relevância para a cultura.

Apesar de existirem outras iniciati-vas regionais em realização no País,principalmente em Curitiba, no Rio eem Porto Alegre, a coleção paulista éinovadora devido à sua abrangência.Como já acontece em diversos países,Aplauso procura trabalhar uma visãopreservacionista de toda a memóriacultural brasileira:

– Não há restrição de tema, desdeque voltado para recuperação ou pre-

servação dessa memória, especialmen-te no tocante às obras biográficas deautores, diretores e atores. Quanto àspeças teatrais e aos roteiros cinemato-gráficos, queremos começar a preen-cher uma lacuna editorial, já que estu-dantes, pesquisadores e interessadosquase não têm material disponível emedições nacionais – explica MarceloPestana, Coordenador Operacional e dePesquisa Iconográfica da Coleção.

A série começou ainda em 2003,quando o Presidente da Imprensa Ofi-cial, Hubert Alquéres, idealizador da

Aplauso, convidou o crí-tico e comentarista Ru-bens Ewald Filho paradar forma e coordenara Coleção. Mas haviadificuldades a seremvencidas:

– Pensamos em pro-duzir grandes biografi-as, mas para preparar-mos uma boa biografiaprecisávamos de trêsanos de trabalho: doisde pesquisas e um pararedação. E não sabía-

mos se haveria esse tempo, se o Gover-no seguinte daria continuidade ao pro-jeto. Então, optamos por um caminhointermediário, que reunisse aspectostécnicos com histórias de vida elabo-radas a partir do registro oral e que pu-desse mapear a história cultural doBrasil. Para isso, montamos uma estru-tura que pudesse funcionar paralela-mente à Imprensa Oficial, de forma agarantir a continuidade do projeto casohouvesse mudança no comando. E pri-vilegiamos áreas menos cobertas daprodução cultural – conta Ewald Filho.

Alternativas como a música popu-lar e a arquitetura foram pesquisadas.Alguns títulos sobre dança e até ópe-ra foram publicados, mas o foco ficoumesmo nas artes cênicas. Ainda assim,o leque é bastante amplo e novidadespodem aparecer. A certeza é que devemseguir a linha adotada no restante daColeção: ter preços acessíveis. A mai-or parte dos volumes, em formato po-cket – de bolso –, tem preço de R$ 15cada um. Alguns, em formato maior ecom mais fotos, custam R$ 30.

– Esperamos com isso tornar acessí-veis ao grande público depoimentos etestemunhos, análises e teses, biogra-fias e significativos roteiros da nossaprodução artística – afirma Pestana, quefoi chamado junto com Carlos Cirne,responsável pelo Projeto Gráfico e Edi-toração, para operacionalizar o trabalho,dar assessoria a autores e biografados,

fazer a ligação com a Imprensa Oficiale coordenar o levantamento iconográ-fico para a montagem dos livros.

Dos clássicos aos contemporâneosCostuma-se dizer que não se pode

ter um bom filme sem um bom rotei-ro. Por isso, a Coleção Aplauso tem in-vestido na publicação do roteiro de

Na série Perfil, grandes atores ganham destaque merecido em volumes repletos de fotoshistóricas: Raul Cortez (capa ao lado), Eva Wilma (acima, com Edney Giovenazzi emUm Bonde Chamado Desejo) e Dina Sfat (abaixo, com Ney Latorraca, no ensaio de

A Mandrágora) são apenas três exemplos do que é possível encontrar na Coleção Aplauso.

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40 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

LivrosLivros

Eis a relação completa dos livros daColeção Aplauso:

SÉRIE CINEMA BRASILAlain Fresnot, Um Cineasta semAlma - Alain FresnotAgostinho Martins Pereira, UmIdealista - Máximo BarroO Ano em Que Meus Pais Saíram deFérias - Roteiro de Cláudio Galperin,Bráulio Mantovani, Anna Muylaert eCao HamburgerAnselmo Duarte, O Homem daPalma de Ouro - Luiz Carlos MertenAntonio Carlos da Fontoura, Espelhoda Alma - Rodrigo MuratAry Fernandes, Sua FascinanteHistória - Antônio Leão da Silva NetoO Bandido da Luz Vermelha - Roteirode Rogério SganzerlaBatismo de Sangue - Roteiro de DaniPatarra e Helvécio RattonBens Confiscados - Roteirocomentado pelos seus autores DanielChaia e Carlos ReichenbachBraz Chediak, Fragmentos de uma vida -Sérgio Rodrigo ReisCabra-Cega - Roteiro de Di Moretti,comentado por Toni Venturi e RicardoKauffmanO Caçador de Diamantes - Roteiro deVittorio Capellaro, comentado porMáximo BarroCarlos Coimbra, Um Homem Raro -Luiz Carlos MertenCarlos Reichenbach, O Cinema ComoRazão de Viver - Marcelo LyraA Cartomante - Roteiro comentadopor seu autor Wagner de AssisCasa de Meninas - Romance originale roteiro de Inácio AraújoO Caso dos Irmãos Naves - Roteiro deJean-Claude Bernardet e Luis SérgioPersonO Céu de Suely - Roteiro de KarimAïnouz, Felipe Bragança e MaurícioZachariasChega de Saudade - Roteiro de LuizBolognesiCidade dos Homens - Roteiro deElena SoárezComo Fazer um Filme de Amor -Roteiro escrito e comentado por LuizMoura e José Roberto ToreroCríticas de B.J. Duarte, Paixão,Polêmica e Generosidade - Org. LuizAntônio Souza Lima de MacedoCríticas de Edmar Pereira, Razão eSensibilidade - Org. Luiz Carlos MertenCríticas de Jairo Ferreira, Críticas deinvenção: Os Anos do São PauloShimbun - Org. Alessandro GamoCríticas de Luiz Geraldo de MirandaLeão, Analisando Cinema: Críticas deLG - Org. Aurora Miranda Leão

Críticas de Ruben Biáfora, ACoragem de Ser - Org. Carlos M.Motta e José Júlio SpiewakDe Passagem - Roteiro de CláudioYosida e direção de Ricardo Elias

TÍTULOS QUE MERECEM APLAUSOS Audiovisual - Luiz Gonzaga Assis de Luca

SÉRIE CRÔNICASCrônicas de Maria Lúcia Dahl, OQuebra-cabeças - Maria Lúcia Dahl

SÉRIE DANÇARodrigo Pederneiras e o Grupo Corpo,Dança Universal - Sérgio Rodrigo Reis

SÉRIE TEATRO BRASILAlcides Nogueira, Alma de Cetim -Tuna DwekAntenor Pimenta, Circo e Poesia -Danielle PimentaCia de Teatro Os Satyros, Um PalcoVisceral - Alberto GuzikCríticas de Clóvis Garcia, A CríticaComo Oficio - Org. CarmelindaGuimarãesCríticas de Maria Lucia Candeias,Duas Tábuas e Uma Paixão - Org.José Simões de Almeida JúniorJoão Bethencourt, O Locatário daComédia - Rodrigo MuratLeilah Assumpção, A Consciência daMulher - Eliana PaceLuís Alberto de Abreu, Até a ÚltimaSílaba - Adélia NicoleteMaurice Vaneau, Artista Múltiplo -Leila CorrêaRenata Palottini, Cumprimenta e PedePassagem - Rita Ribeiro Guimarães

Teatro Brasileiro de Comédia, Eu Vivio TBC - Nydia LiciaO Teatro de Alcides Nogueira,Trilogia: Ópera Joyce; Gertrude Stein,Alice Toklas & Pablo Picasso; Pólvorae Poesia - Alcides NogueiraO Teatro de Ivam Cabral, Quatrotextos para um teatro veloz: Faz deConta que tem Sol lá Fora; Os Cantosde Maldoror; De Profundis; AHerança do Teatro - Ivam CabralO Teatro de Noemi Marinho:Fulaninha e Dona Coisa, Homeless,Cor de Chá, Plantonista Vilma -Noemi MarinhoTeatro de Revista em São Paulo, DePernas para o Ar - Neyde VenezianoO Teatro de Samir Yazbek: AEntrevista, O Fingidor, A TerraPrometida - Samir YazbekTeresa Aguiar e o Grupo Rotunda,Quatro Décadas em Cena - Ariane Porto

SÉRIE PERFILAracy Balabanian, Nunca Fui Anjo -Tania CarvalhoArllete Montenegro, Fé, Amor eEmoção - Alfredo SternheimAry Fontoura, Entre Rios e Janeiros -Rogério MenezesBete Mendes, O Cão e a Rosa -Rogério MenezesBetty Faria, Rebelde por Natureza -Tania CarvalhoCarla Camurati, Luz Natural - CarlosAlberto MattosCecil Thiré, Mestre de Seu Ofício -Tania CarvalhoCelso Nunes, Sem Amarras - ElianaRocha

Cleyde Yaconis, Dama Discreta -Vilmar LedesmaDavid Cardoso, Persistência e Paixão -Alfredo SternheimDenise Del Vecchio, Memórias da Lua -Tuna DwekElisabeth Hartmann, A Sarah dosPampas - Reinaldo BragaEmiliano Queiroz, Na Sobremesa daVida - Maria LeticiaEtty Fraser, Virada Pra Lua - VilmarLedesmaEwerton de Castro, Minha Vida naArte: Memória e Poética - Reni CardosoGeórgia Gomide, Uma Atriz Brasileira -Eliana PaceGianfrancesco Guarnieri, Um GritoSolto no Ar - Sérgio RoveriGlauco Mirko Laurelli, Um Artesãodo Cinema - Maria Angela de JesusIlka Soares, A Bela da Tela - Wagnerde AssisIrene Ravache, Caçadora de Emoções -Tania CarvalhoIrene Stefania, Arte e Psicoterapia -Germano PereiraIsabel Ribeiro, Iluminada - LuisSergio Lima e SilvaJoana Fomm, Momento de Decisão -Vilmar LedesmaJohn Herbert, Um Gentleman noPalco e na Vida - Neusa BarbosaJonas Bloch, O Ofício de uma Paixão -Nilu LebertJosé Dumont, Do Cordel às Telas -Klecius HenriqueLeonardo Villar, Garra e Paixão -Nydia LiciaLília Cabral, Descobrindo Lília Cabral -Analu RibeiroLolita Rodrigues, De Carne e Osso -Eliana CastroLouise Cardoso, A Mulher doBarbosa - Vilmar LedesmaMarcos Caruso, Um Obstinado -Eliana RochaMaria Adelaide Amaral, A EmoçãoLibertária - Tuna DwekMarisa Prado, A Estrela, O Mistério -Luiz Carlos LisboaMauro Mendonça, Em Busca daPerfeição - Renato SérgioMiriam Mehler, Sensibilidade ePaixão - Vilmar LedesmaNicette Bruno e Paulo Goulart, Tudoem Família - Elaine GuerriniNívea Maria, Uma Atriz Real - MauroAlencar e Eliana PaceNiza de Castro Tank - Niza, Apesardas Outras - Sara LopesPaulo Betti, Na Carreira de umSonhador - Teté RibeiroPaulo José, Memórias Substantivas -Tania CarvalhoPedro Paulo Rangel, O Samba e oFado - Tania CarvalhoRegina Braga, Talento é umAprendizado - Marta GóesReginaldo Faria, O Solo de UmInquieto - Wagner de AssisRenata Fronzi, Chorar de Rir -Wagner de AssisRenato Borghi, Borghi em Revista -Élcio Nogueira SeixasRenato Consorte, Contestador por

Desmundo - Roteiro de Alain Fresnot,Anna Muylaert e Sabina AnzuateguiDjalma Limongi Batista, LivrePensador - Marcel NadaleDogma Feijoada: O Cinema NegroBrasileiro - Jeferson DeDois Córregos - Roteiro de CarlosReichenbachA Dona da História - Roteiro de JoãoFalcão, João Emanuel Carneiro eDaniel FilhoOs 12 Trabalhos - Roteiro de CláudioYosida e Ricardo EliasEstômago - Roteiro de Lusa Silvestre,Marcos Jorge e Cláudia da NatividadeFernando Meirelles, BiografiaPrematura - Maria do Rosário CaetanoFim da Linha - Roteiro de GustavoSteinberg e Guilherme Werneck;Storyboards de Fábio Moon e Gabriel BáFome de Bola, Cinema e Futebol noBrasil - Luiz Zanin OricchioGeraldo Moraes, O Cineasta doInterior - Klecius HenriqueGuilherme de Almeida Prado, UmCineasta Cinéfilo - Luiz Zanin OricchioHelvécio Ratton, O Cinema Além dasMontanhas - Pablo VillaçaO Homem que Virou Suco - Roteiro deJoão Batista de Andrade, organizaçãode Ariane Abdallah e Newton CannitoIvan Cardoso, O Mestre do Terrir -RemierJoão Batista de Andrade, AlgumaSolidão e Muitas Histórias - Maria doRosário CaetanoJorge Bodanzky, O Homem com aCâmera - Carlos Alberto MattosJosé Antonio Garcia, Em Busca daAlma Feminina - Marcel NadaleJosé Carlos Burle, Drama naChanchada - Máximo BarroLiberdade de Imprensa, O Cinema deIntervenção - Renata Fortes e JoãoBatista de AndradeLuiz Carlos Lacerda, Prazer & Cinema -Alfredo SternheimMaurice Capovilla, A Imagem Crítica -Carlos Alberto MattosMauro Alice, Um Operário do Filme -Sheila SchvarzmanMiguel Borges, Um Lobisomem Sai daSombra - Antônio Leão da Silva NetoNão por Acaso - Roteiro de PhilippeBarcinski, Fabiana Werneck Barcinskie Eugênio PuppoNarradores de Javé - Roteiro deEliane Caffé e Luís Alberto de AbreuOnde Andará Dulce Veiga - Roteiro deGuilherme de Almeida PradoOrlando Senna, O Homem daMontanha - Hermes LealPedro Jorge de Castro, O Calor daTela - Rogério MenezesQuanto Vale ou É por Quilo? - Roteirode Eduardo Benaim, Newton Cannitoe Sergio BianchiRicardo Pinto e Silva, Rir ou Chorar -Rodrigo CapellaRodolfo Nanni, Um RealizadorPersistente - Neusa BarbosaO Signo da Cidade - Roteiro de BrunaLombardiUgo Giorgetti, O Sonho Intacto -Rosane PavamVladimir Carvalho, Pedras na Lua ePelejas no Planalto - Carlos AlbertoMattosViva-Voz - Roteiro de Márcio AlemãoZuzu Angel - Roteiro de MarcosBernstein e Sergio Rezende

SÉRIE CINEMABastidores, Um Outro Lado doCinema - Elaine Guerini

SÉRIE CIÊNCIA & TECNOLOGIACinema Digital, Um Novo Começo? -Luiz Gonzaga Assis de LucaA Hora do Cinema Digital,Democratização e Globalização do

Índole - Eliana PaceRolando Boldrin, Palco Brasil - Iedade AbreuRosamaria Murtinho, Simples Magia -Tania CarvalhoRubens de Falco, Um InternacionalAtor Brasileiro - Nydia LiciaRuth de Souza, Estrela Negra - MariaÂngela de JesusSérgio Hingst, Um Ator de Cinema -Máximo BarroSérgio Viotti, O Cavalheiro das Artes -Nilu LebertSilvio de Abreu, Um Homem de Sorte -Vilmar LedesmaSônia Guedes, Chá das Cinco - AdéliaNicoleteSonia Maria Dorce, A Queridinha domeu Bairro - Sonia Maria Dorce ArmoniaSonia Oiticica, Uma AtrizRodrigueana? - Maria Thereza VargasSuely Franco, A Alegria deRepresentar - Alfredo SternheimTatiana Belinky, ... E Quem QuiserQue Conte Outra - Sérgio RoveriTony Ramos, No Tempo daDelicadeza - Tania CarvalhoVera Holtz, O Gosto da Vera - AnaluRibeiroVera Nunes, Raro Talento - Eliana PaceWalderez de Barros, Voz e Silêncios -Rogério MenezesZezé Motta, Muito Prazer - RodrigoMurat

ESPECIALAgildo Ribeiro, O Capitão do Riso -Wagner de AssisBeatriz Segall, Além das Aparências -Nilu LebertCarlos Zara, Paixão em Quatro Atos -Tania CarvalhoCinema da Boca, Dicionário deDiretores - Alfredo SternheimDina Sfat, Retratos de uma Guerreira -Antonio GilbertoEva Todor, O Teatro de Minha Vida -Maria Angela de JesusEva Wilma, Arte e Vida - Edla van SteenGloria in Excelsior - Ascensão,Apogeu e Queda do Maior Sucessoda Televisão Brasileira - Álvaro MoyaLembranças de Hollywood, DulceDamasceno de Britto - organizadopor Alfredo SternheimMaria Della Costa, Seu Teatro, SuaVida - Warde MarxNey Latorraca, Uma Celebração -Tania CarvalhoRaul Cortez, Sem Medo de se Expor -Nydia LiciaRede Manchete - Aconteceu, VirouHistória - Elmo FrancfortSérgio Cardoso, Imagens de Sua Arte -Nydia LiciaTônia Carrero, Movida Pela Paixão -Tania Carvalho

TV Tupi, Uma Linda História de Amor -Vida AlvesVictor Berbara, O Homem das MilFaces - Tania CarvalhoWalmor Chagas, Ensaio Aberto paraum Homem Indignado - DjalmaLimongi Batista

41Jornal da ABI 341 Maio de 2009

Quando bem trabalhados, futebol eliteratura podem se tornar dois ladosde uma mesma moeda: aarte. E também motivopara uma enorme paixão,que começa nos campos etermina nas páginas dos li-vros. Isso fica muito claroquando se lê A Bola CorreMais que os Homens (Roc-co, 2006, 210 páginas) ePasse de Letra – Futebol e Li-teratura (Rocco, 2009, 168páginas), as duas mais no-vas obras a integrar o acer-vo da Biblioteca Bastos Tigre.

Com 13 crônicas e três ensaios, A Bola

filmes brasileiros clássicose contemporâneos, massempre com algum diferen-cial. Pode ser o comentáriodo diretor ou mesmo doautor. Ou então, a apresen-tação das diversas versõespelas quais a obra passouaté chegar às telas. Dessaforma, a série Cinema Bra-sil conta com o históricoroteiro de O Caçador de Di-amantes, de Vittorio Cape-llaro, de 1933, consideradoo primeiro roteiro comple-to escrito no País com a in-tenção de ser efetivamentefilmado. Mas também háobras mais recentes como OCaso dos Irmãos Naves, deLuís Sérgio Person; Dois Cór-regos, de Carlos Reichenba-ch; Narradores de Javé, deEliane Caffé; Como Fazer umFilme de Amor, de José Ro-berto Torero; O Homem queVirou Suco, de João Batistade Andrade; Quanto Vale ouÉ Por Quilo?, de NewtonCannito, Eduardo Benaim eSérgio Bianchi.

Na série Teatro Brasil, hácríticas, peças e análises commomentos históricos dos palcos naci-onais como Teatro Brasileiro de Comédia– Eu Vivi o TBC, de Nydia Licia; A Críti-ca como Ofício – Críticas de Clóvis Gar-cia, organizado por Carmelinda Guima-rães; De Pernas para o Ar – O Teatro deRevista em São Paulo, de Neyde Venezi-ano; Quatro Textos para um Teatro Veloz,de Ivam Cabral. Apesar de alguns ato-res, diretores e autores não aceitarem oconvite para participar, a maioria reve-lou plena simpatia pelo projeto e rapi-damente toma parte:

Duas paixões emperfeita harmonia

Obras doadas à Biblioteca da ABI fazem um autênticogol de letra ao traçar paralelos entre a literatura e o futebol.

– Tem gente que não topa fazer por-que não quer aparecer, principalmen-te na série Perfil. Mas quando acabacompreendendo qual é nossa propos-ta, participa e ainda ajuda a convencerquem está mais reticente – comentaRubens Ewald Filho.

Perfis, de quem topaA maioria dos títulos da Coleção é

da série Perfil. Não se trata do registrobiográfico das personalidades, mas darevelação do artista e de seu ofício. Para

Corre Mais que os Homens reúne textospublicados na imprensa, especialmen-

te em O Estado de S. Pauloe no Jornal da Tarde, duran-te as Copas de 1994 e 1998,e ensaios produzidos parapublicações acadêmicas,para falar sobre grandes cra-ques, como Didi, o inven-tor da folha-seca, antropo-logia e ciências sociais.

Ao misturar o popularcom o erudito, o antropó-logo e ensaísta RobertoDaMatta, com habilidade

similar à dos grandes boleiros, conse-gue encantar, como se estivesse num

bate-papo, tanto especialistas no espor-te bretão, como Armando Nogueira,autor do prefácio da obra, quanto genteque não possui qualquer intimidadecom a bolinha, como a Professora Lí-via Barbosa, do Departa-mento de Antropologia daUniversidade Federal Flu-minense-Uff, que escrevena orelha do livro:

“Não precisa gostar defutebol para ler o livro. Eunão gosto e mesmo assimtive excelentes momentosao atravessar suas páginas”.

Passe de Letra – Futebol eLiteratura, do ex-ponta-di-reita e hoje escritor, crítico literário eprofessor universitário Flávio Carnei-ro, é outra obra que se propõe uma ta-refa nada simples e tenta responder àquestão “Como duas paixões tão dís-pares como o futebol e a literatura po-dem se juntar?”. A resposta, assimcomo DaMatta, ele dá a la Nélson Ro-drigues, traçando um consistente para-lelo entre ambos. O livro, que tem apre-

sentação de Luiz Fernando Veríssimo,conta com fotos e ilustrações.

Inicialmente publicadas no jornal li-terário Rascunho, de Curitiba, as crôni-cas de Carneiro têm um tom algo pes-

soal e memorialístico. Eleconta como alimentoudesde criança o sonho de setornar jogador de futebol,enquanto o desejo de setornar escritor surgiu re-pentinamente, quase donada. Com o perdão do tro-cadilho, quase num passede mágica.

Também dessa mesmamaneira, ele fala sobre

como Garrincha dominava a arte dasimplicidade, tornando-se tão líricoquanto os poetas Carlos Drummondde Andrade e Manuel Bandeira; comoDadá Maravilha fazia graça com a bola,tal qual um comediante; e como Pelése apresentava heróico e perseverantedentro das quatro linhas, digno de umpersonagem da epopéia de Homero.

(José Reinaldo Marques)

produzi-los foram chama-dos experientes jornalistasque, por meio de pesquisa eentrevistas, apresentam aopúblico um texto narradoem primeira pessoa, comtom extremamente colo-quial e direito às lembrançasda infância, dos momentosmais marcantes da vida doartista e, de quebra, uma re-flexão sobre aquilo queacontece nos bastidores domundo das artes. Entre ou-tros perfis estão os de Bet-ty Faria, Carla Camurati,Cleyde Yaconis, Marcos Ca-ruso, Paulo Betti, Paulo Josée Maria Adelaide Amaral.Na relação ainda há volu-mes especiais, em formatomaior e repleto de fotos, deAgildo Ribeiro, Beatriz Se-gall, Carlos Zara, Eva Todor,Ney Latorraca, Sérgio Car-doso, Tônia Carreiro e Wal-mor Chagas.

A Coleção também nãofica restrita aos palcos, sets,coxias e cenários. Atrás dascâmeras, discute e proble-matiza o mundo das artes.É assim com o livro Bastido-

res – Um Outro Lado do Cinema, que trazentrevistas feitas pela jornalista Elai-ne Guerini e publicadas originalmen-te em jornais e revistas brasileiros; Ci-nema da Boca do Lixo, um dicionário dediretores do movimento, produzidopor Alfredo Sternheim; Cinema Digi-tal – Um Novo Começo?, em que LuizGonzaga Assis de Luca debate o futu-ro e as técnicas da Sétima Arte. Não tãoteóricas, mas bastante históricas são asobras que fazem o registro da memó-ria da televisão nacional.

O que aconteceu na tvRede Manchete – Aconteceu, Virou

História é fruto de mais de uma cente-na de entrevistas e muita pesquisa deElmo Francfort, que conta a história daemissora, de 1983 a 1999, e mostracomo sua programação unia o popularcom o refinado, com novelas, musicais,Carnaval, documentários, grandes re-portagens e programas de entrevistas.

Com tom de paixão e aventura, aatriz, autora, apresentadora, produtorae diretora Vida Alves narra a trajetó-ria da Tupi, a primeira emissora daAmérica Latina, que ajudou a fundarem 1950. TV Tupi – Uma Linda Histó-ria de Amor mostra como a emissorapaulista definiu as bases da televisãobrasileira, formou seus primeiros pro-fissionais e definiu uma tipologia queexiste até hoje.

Pena que Gloria in Excelsior, de Álva-ro Moya, que apresenta a ascensão, oapogeu e a queda da TV Excelsior, es-teja esgotado e não exista previsão dereedição. A obra relata como tantas per-sonalidades que promoveram o cresci-mento da Globo, na década de 1970, fo-ram forjadas nos estúdios da Excelsi-or, que sucumbiu com o Grupo Simon-sen, perseguido pelo regime militar.

– São informações que corriam sé-rio risco de se perder por falta de re-cursos, interesse comercial ou pela ine-xistência de uma política voltada pararesgatar, valorizar e consolidar essa be-líssima produção. Agora, aos poucos,o Governo de São Paulo coloca capadura nos livros e os envia para todasas escolas públicas, promovendo oacesso à cultura. Gostaríamos até depublicar biografias mesmo, mas porenquanto não dá. Porém, esperamoslogo criar e consolidar, quem sabe, umgênero no Brasil – acredita, otimista,Rubens Ewald Filho.

Sérgio Cardoso como um corcunda em A Raposa e as Uvas.

42 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

A movimentação na Redação dojornal A Noite era de total atividade.Ouvia-se o tec-tec-tec das máquinas deescrever, provocado pelos dedos dosjornalistas ansiosos por encerrar maisum dia de batente. Mas alguém entrade surpresa e brada:

“Quem é o tal de Mendez? Queroum entendimento com ele!”

Foi o suficiente para toda a zoeiratípica que acontece nos jornais se trans-formar em silêncio. Impossível olharpara o autor da frase sem gelar. Naentrada da Redação, estava plantado,esperando uma resposta, um homemmal-encarado. Pilar Drumond, chefe daseção, logo identificou quem era amedonha figura. Tratava-se de Virgo-lino de Oliveira, também conhecidocomo Lampeão do Boxe, o pugilista quehavia poucas horas estivera no ringue;seu rosto cheio de marcas, principal-mente nos olhos e supercílio, não dei-

do de Drumond, que avisou que Men-dez não estava, já que ele gozava de me-recidas férias. Contrariado e acreditan-do na lorota, o injuriado atleta foi em-bora e não mais voltou.

Como sempre acontece em ambien-tes de trabalho, durante bom tempo oassunto foi motivo de brincadeiras. Erasó o Mendez chegar à Redação, quealguém gritava:

“Olha o Lampeão!”.

Um contador de históriasEssa era uma das muitas históri-

as que o genial caricaturista cearensegostava de contar. Muitas delas nosforam narradas pessoalmente, nosanos em que freqüentávamos sua re-

sidência, no bairro de Fátima. Mendezadorava conversar. Ficava horas relem-brando fatos engraçados que acon-teceram com ele e com alguns de seusfamosos colegas. As narrativas ti-nham sempre a participação de Dona

Emília, sua amada esposa. Ela semprelembrava algum detalhe das histórias

quando a memória do marido o traía.Dedicada, Emília fazia questão de dizerque era ela que administrava a vida fi-nanceira do artista.

“Se deixar, ele faz tudo de graça”, dizia.Mendez ouvia o comentário e mor-

ria de rir, mesmo sabendo que ela ti-nha razão.

Quando o conheci, Mendez já con-tava 80 anos de caricatura e aventuras.O encontro foi marcado pelo telefone.Me lembro que descobri uma antigalista de assinantes, dos tempos em queas pessoas não temiam deixar seusnomes e endereços registrados num ca-tálogo, que havia pertencido ao meuavô. Não tive dificuldades em encon-trá-lo naquelas páginas, já que nelasexistia apenas um Mário de OliveiraMendes. Liguei, falei com ele e marca-mos para aquela mesma semana nos-so primeiro encontro, que aconteceuem março de 1988.

Não me recordo mais quantas vezesestive em seu apartamento. Foram mui-tas. Geralmente as visitas aconteciamaos sábados. Cada encontro era especial.Cada dia era como freqüentar uma aulade artes, ou como assistir a uma pales-tra sobre História, jornalismo e humorgráfico. A memória do casal era invejá-vel. Mendez e Emília lembravam comdetalhes alguns dos fatos mais interes-santes e divertidos. Bastava um come-çar uma história que o outro termina-va e arrematava numa seguinte, às ve-zes ainda mais divertida e curiosa.

Encontro com J. CarlosEm 1988, Max Barbosa, caricaturis-

ta que iniciava sua carreira, era muitoinfluenciado pela obra de José Carlosde Brito e Cunha, o caricaturista J. Car-los, que se consagrou graças ao seu tra-ço clássico e extremamente belo. Paraestudar melhor o estilo de seu artistapredileto, Max estava em contato comos herdeiros do grande caricaturista eme sugeriu que fizéssemos uma visitaà casa dos Brito e Cunha; sabendo daminha amizade com Mendez, reco-mendou que o levássemos também.

Apesar da preocupação de DonaEmília e das muitas, e justas, recomen-dações exigidas, fomos com nosso ami-

POR ZÉ ROBERTO GRAÚNA xava esconder que seu desempenho naúltima luta fora sofrível.

Na edição anterior do jornal, uma ca-ricatura anunciava o embate que mar-cou a face daquele atleta. Porém, a ca-ricatura do Mendez feriu mais o pobreVirgolino do que seu oponente nas qua-tro cordas. O caricaturista usou e abu-sou do seu talento humorístico. Retra-tou o valente boxeador conforme o via.

“Ele era feio como o diabo, e aindapor cima estrábico”, afirmava MárioMendez.

Para deixá-lo ainda mais selvagemuma argola foi encaixada em seu bei-ço. O desenho foi publicado ilustran-do um texto cujo título dizia: “Olhan-do atravessado”. Para piorar, o reda-tor de esportes registrou na matéria:“Lampeão visto pelo nosso compa-nheiro Mendez, que o traçou com cer-ta maldade... o rapaz não é tão feiocomo parece”.

O gaiato do traço escapou de levaruns sopapos graças ao raciocínio rápi-

EVOCAÇÃO

MÁRIO MENDEZ

Foi Herman Lima, o historiador da caricatura no Brasil, quemdefiniu assim esse cearense de Baturité, que, além de rigoroso nadescrição física, fixava em seus desenhos a psique dos retratados.

Artista do traçoe leitor de almas

Um encontro de grandes mestres do desenho: Mendez, Lan e Nássara numa exposição em homenagem a outro genial caricaturista: Alvarus.

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43Jornal da ABI 341 Maio de 2009

go para a Rua J. Carlos, no Jardim Bo-tânico, o mesmo local onde anos antes,ao lado dos colegas Alvarus,Théo, Raul Pederneiras e K.Lixto, Mendez inauguroua rua que, em homena-gem ao caricaturista, ga-nhou o nome do criadorda Melindrosa.

O encontro foi um dosmais marcantes de queparticipei. É claro que re-gistrei com algumas fotogra-fias esse dia especial. A alegriado Mendez em rever os filhos deseu amigo e colega, além de po-der recordar alguns fatos diverti-dos sobre ambos, era flagrante.

Meu amigo aproveitou paralembrar como conheceu J. Car-los e nos contou que quandotrabalhava para o jornal A Ba-talha costumava almoçarnuma pensão cuja proprie-tária se chamava Laura e era amiga deDona Emília, com quem Mendez já na-morava na época. Num dia, enquantoalmoçava, começou a rabiscar a carica-tura de um sujeito que estava sentadopróximo. O homem não percebeu, masDona Laura viu e comentou:

“O senhor é caricaturista... Tenhoum freguês que é seu colega”.

Achando que ela fosse falar sobre umamador que gostava de rabiscar,

Mendez perguntou, com aresde quem já era profissional,quem seria o tal caricaturis-ta. Ela respondeu:

“Ah, é J. Carlos”.Ao ouvir o nome, Men-

dez corou de espanto. Elenão imaginava que fre-

qüentava o mesmo local queo grande mestre, de quemguardava grande admiração

desde os tempos de menino.Quando J. Carlos chegou, Dona

Laura fez as apresentações e osdois passaram a conversar anima-

damente. Numa demons-tração de humildade queMendez nunca mais es-queceria, J. Carlos afirmouque já conhecia o trabalho

do novo amigo, e que havia gostado es-pecialmente de uma caricatura de umcômico espanhol que atendia pelopseudônimo de Palitos.

Uma turma de pesoMendez adorava conversar e recor-

dar histórias como essas. Ganhou re-nome com as centenas de caricaturasque publicou em jornais e revistas, re-tratando cantores do rádio, escritores,estrelas de cinema e políticos. Suas ca-ricaturas eram de qualidade indis-cutível e mereceu comentárioscheios de elogios do maior his-toriador da caricatura no Bra-sil, Herman Lima, que o defi-niu como um “leitor de almas”,que registrava não só os traçosexternos, como também os se-gredos mais íntimos da psiquedos seus retratados.

Quando jovem, Mendez morouem Santa Teresa, onde costumava re-ceber muitos amigos e colegas paraalmoços comemorativos. As reuni-ões, que ficaram famosas, eram fre-qüentadas por jornalistas, artistas eintelectuais da estirpe de Grande Ote-lo, Dorival Caymmi, Alvarus, CarlosThiré e os Pachecos, o desenhista eseu homônimo, o jornalista.

Numa das edições da revista Vamos Ler,em 1945, o jornalista Armando Pachecoescreveu um artigo sobre Mendez justa-mente num desses almoços. No texto afir-mava Pacheco que o fato mais importante

ocorrido em 25 de dezembro de 1907,em Baturité, no Ceará, foi o

nascimento do seu filho maisilustre, o caricaturista MárioMendez. Pacheco chegou aparodiar o nascimento de Je-sus dizendo que, assim como

aconteceu com o Salvador,que foi admirado por

três reis, Mendez foitambém homenage-ado, mas pelos céle-bres nordestinos Pa-dre Cícero, o canga-ceiro Lampeão e An-

tônio Silvino. Estestrouxeram presentes, in-

censo e mirra, além deuma mamadeira cheiade água que passarinhonão bebe.

Zé Roberto Graúna (José Roberto Lopes deAlmeida) é cartunista e sócio da ABI.

Depois da brincadeira, Armando Pa-checo contou sobre as idas e vindas dodesenhista de humor pelas terras doNordeste, até chegar ao Rio de Janei-ro, em 1925. Sua estréia na imprensacarioca aconteceu quando da publica-ção de uma caricatura do maestro Fran-cisco Braga na Revista Musical. A par-tir daí, conquistou seu espaço nas pá-ginas dos principais jornais e revistasda cidade publicando caricaturas e ilus-trações em veículos importantes comoA Batalha, A Noite, Vamos Ler, A Ma-nhã, Noite Ilustrada, Revista Carioca,Radiolândia, Revista do Rádio, Cario-ca, Jornal do Brasil, O Globo.

Mendez faleceu no dia 21 de outu-bro de 1996, aos 88 anos, deixando vi-úva Dona Emília, com quem conviveupor 63 anos. Ele sobrevive na memó-ria dos que o conheceram e admirarame o festejam como um dos nossos mai-ores artistas do traço.

Na solene inauguraçãoda rua em homenagemao caricaturista J. Carlos,no Jardim Botânico, umencontro de grandesmestres do traço: Alvarus,Théo, Raul Pederneiras,K. Lixto e Mendez (aocentro), quehomenageou, atravésde suas caricaturas,personalidades dacultura e do esporte,como o jogador Dida,do Flamengo (à direita);além de J. Carlos, doradialista Jorge Cúri edo historiador HermanLima (abaixo, daesquerda para adireita), que o definiucom um “leitor dealmas”. No pé dapágina o pintor DiCavalcânti e o jogadorHeleno de Freitas.

REPRO

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ÇÃO

44 Jornal da ABI 341 Maio de 2009

BoalVidasVidas

“Ele reinventou o teatro político e éuma figura internacional tão impor-tante quanto Brecht ou Stanislawski”.

As palavras do The Guardian, um dosmais importantes diários da Europa,dão idéia do que significou a morte dodramaturgo, diretor teatral e ensaístaAugusto Boal, ocorrida no dia 2 de maio.Um dos nomes mais importantes doteatro brasileiro, Boal foi a principalliderança do Teatro de Arena de SãoPaulo nos anos 1960 e, mais tarde, criouo Teatro do Oprimido, juntando a artecom a ação social. Conhecido em todoo mundo como protagonista de um te-atro radical, ganhou fama por fazerexperiências, sem medo de ousar e ten-tar ir mais fundo na tentativa de bus-car transformação pela arte.

“Todos os seres humanos são atores,porque atuam. E espectadores, porqueobservam. Somos todos espect-atores”,costumava dizer. Mas com isso nãoficava apenas nas palavras. Boal era dospoucos homens de teatro que tambémescreviam sobre sua prática, formulan-do teorias a respeito de seu trabalho etornando-se referência. Com expres-siva obra escrita, traduzida em mais de20 línguas, suas concepções são estu-dadas nas principais escolas de teatrodo mundo. Livros como Teatro do Opri-mido e Outras Poéticas Políticas trazemsistemas de exercícios, jogos e técnicasde teatro-imagem, utilizadas por ato-res e interessados. Utilizadas não ape-nas por quem vê no teatro um instru-mento de luta política, mas tambémem áreas como educação, saúde men-tal e no sistema prisional.

— Boal foi o mestre de todos nós, éo artista que universaliza o teatro bra-sileiro. O reconhecimento que nossaarte tem no exterior começa com ele.A qualidade, a profundidade, a huma-nidade de seu teatro possibilitam isso.Não por acaso seus livros são traduzi-dos em tantos idiomas. Para mim, eleera um amigo querido, mestre e imor-tal – diz o amigo e diretor teatral Ader-bal Freire-Filho.

A abrangência de seu trabalho é re-conhecida não apenas no meio artísti-co. Para o Ministro da Saúde José Go-mes Temporão, o dramaturgo deuexemplo ao aproximar o mundo das

POR MARCOS STEFANO artes cênicas ao cuidado com pacien-tes mentais. A ação social do teatro deBoal foi destaque de nota oficial deTemporão:

“Augusto Boal foi um símbolo, nomundo inteiro, do intelectual genero-so que abre caminhos com a arte e acoragem para enfrentar a desigualda-de que marcou, historicamente, a so-ciedade brasileira. Fez isso também nasaúde pública, levando o Teatro doOprimido aos Centros de Atenção Psi-cossocial. Tornou protagonistas dogrande teatro da cena pública os paci-entes mentais pobres, duplamenteexcluídos pelo estigma e pela pobreza.”

A arte de um químicoAugusto Pinto Boal nasceu no Rio

de Janeiro em 16 de março de 1931.Filho de um padeiro português, des-de a infância dirigia os irmãos naspeças familiares. Mesmo durante otempo em que cursou Química naantiga Universidade do Brasil, hojeUniversidade Federal do Rio de Janeiroescrevia seus textos teatrais. Quandoembarcou para Nova York, nos anos 50,para fazer seu PhD na Universidade deColumbia, também aproveitou paraestudar direção e dramaturgia na Scho-ol of Dramatics Arts, com John Gass-ner, e assistir a montagens do ActorsStudio. A paixão pelas artes tomavaforma e ganhava corpo.

Quando volta ao Brasil, Boal estádecidido a seguir um caminho diferen-te. Em 1956, aos 25 anos, é contratadopara integrar o Teatro de Arena de SãoPaulo, dividindo as tarefas de direçãocom José Renato, o mentor artístico dacompanhia. Começa ali uma história deinovação que durará até 1970. Logo noinício, Boal investe na formação dra-matúrgica da equipe, criando um Cur-so Prático de Dramaturgia, e aprofun-da o trabalho de interpretação, adap-tando o método de Stanislawski àscondições brasileiras e ao formato deteatro arena. Sua atuação é decisivapara que o grupo faça a opção ideoló-gica pela esquerda e volte seu trabalhopara as discussões e reivindicações na-cionalistas, em voga na época.

Sua estréia na direção de Ratos eHomens, de John Steinbeck, rendeu-lheseu primeiro prêmio, o de Diretor Re-velação de 1956, concedido pela Asso-

O REINVENTOR DO TEATROUm dos mais importantes nomesdo teatro contemporâneo emtodo o mundo, esse filho de umpadeiro realizou trabalhosque o tornaram conhecido comoo “Brecht dos palcos brasileiros”.

ROBERTO FAUSTINO/FOLHA IMAGEM

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ciação Paulista de Críticos de Artes.Outras peças de sucesso se seguiriamsob sua direção, como Chapetuba Fu-tebol Clube, de Oduvaldo Viana Filho;O Testamento do Cangaceiro, de Chicode Assis; A Mandrágora, de Maquiavel;e O Noviço, de Martins Pena. Em 1960,um texto de sua autoria, Revolução naAmérica do Sul, dirigido por José Rena-to, torna-o um dos melhores dramatur-gos do período.

Durante esse tempo, Boal sugere acriação do Seminário de Dramaturgia.O objetivo é propor a criação de umteatro próprio, voltado para a realida-de nacional. Além de compor o reper-tório da fase nacionalista do Arena, emtempos de Bossa Nova e Cinema Novo,também produções brasileiras em ou-tras áreas, esse seminário seria decisi-vo para formar toda uma geração nadramaturgia do País.

Mas o reconhecimento não vemapenas por causa do trabalho no Are-na. Em parceria com o Teatro Oficina,Boal produziu alguns de seus princi-pais trabalhos: A Engrenagem, de Jean-Paul Sartre, que fez ao lado de José

Celso Martinez, e Um Bonde Chama-do Desejo, de Tennessee Williams. Em1964, logo após o golpe militar, Boalvai ao Rio de Janeiro dirigir o showOpinião, com Zé Kéti, João do Vale eNara Leão – substituída depois porMaria Betânia. A iniciativa de umgrupo de autores ligado ao CentroPopular de Cultura, o CPC, da UniãoNacional dos Estudantes, seria o em-brião do combativo Grupo Opinião.

Até o AI-5, em 1968, Boal dirigiriaoutras bem-sucedidas adaptações deobras nacionais e clássicas para o Are-na, além de produzir musicais e cri-ar um dos principais núcleos de resis-tência da classe artística brasileira,em São Paulo. Em 1969 e 1970, che-gou a passar muito tempo excursio-nando pelo exterior e apresentandoparte desse trabalho. Porém, já em1971, sua carreira é interrompida pelaprisão e pela tortura, que o obrigama se exilar, primeiro na Argentina,depois nos Estados Unidos, em Por-tugal e na França, onde passa a leci-onar, na Universidade de Sorbonne,em Paris.

Embora fosse portador de leuce-mia, Boal se tratava e, sem suspei-tar que estivesse no fim da v ida,continuava a trabalhar com a pai-xão com que se entregou ao teatroe à cultura desde moço. Ele tinhapaixão de viver, para poder criar,como demonstrou na mensagemque dirigiu à ABI em 14 de fevereiropassado, menos de três meses an-tes do seu falecimento. Ao agrade-cer o convite da Casa para partici-par do ato de lançamento da Edi-ção Especial do Centenário, Volu-me 2, do Jornal da ABI, ele mandouum e-mail em que expressava o seudesejo de viver. Disse então:

“Caríssimo Maurício Azêdo,Justamente na quarta-feira pela

manhã embarco para Buenos Airespara visitar meu sogro que comple-tou 99 anos, exemplo que preten-do seguir à risca.

Mesmo ausente, estarei torcen-do por você e pelo Jornal da ABI.

Um fraterno abraço do Augus-to Boal.”

Declaração feita em mensagem àABI em setembro de 2007 ao aceitaro convite para integrar a Comissãode Honra do Centenário da Casa. Elese declarou honradíssimo com o con-vite. Foi esta a sua manifestação:

“Caríssimo Maurício Azêdo,Eu me sinto honradíssimo em ser

convidado para integrar essa Comis-são de Honra do Centenário da ABIe aceito com alegria seu convite porduas razões principais: porque vemda ABI, entidade que sempre respei-tei, e de você, pessoa que sempreadmirei. Um grande abraço fraternodo (a) Augusto Boal.”

“Meu sogro completou99 anos, exemplo que

pretendo seguir à risca.”

A ABI É ENTIDADE QUESEMPRE RESPEITEI

Embaixador Mundial do TeatroNo tempo de exílio, que dura até

1986, Augusto Boal fixou as bases te-óricas de seu Teatro do Oprimido,transformando o espectador em ele-mento ativo do espetáculo e dandorenovada liberdade aos atores. Umconceito novo, que preconizava a in-serção das pessoas na sociedade e, ape-sar de sofrer pesados ataques de parteda mídia brasileira, que se espalhoupelo mundo. Hoje, conta com centrosde difusão nos Estados Unidos, na Fran-ça e nas cidades brasileiras do Rio, San-to André, SP, e Londrina, PR. O reco-nhecimento viria em 2008, quando

teve seu nome indicado para o PrêmioNobel da Paz, pelo trabalho do Teatrodo Oprimido; depois, em março des-te ano, quando foi nomeado pela Unes-co Embaixador Mundial do Teatro. Suaindicação para o Nobel recebeu o apoioda ABI, que se dirigiu ao Comitê doPrêmio Nobel da Paz pedindo que fos-se ele o esolhido.

– Boal pertence à primeira geraçãode brasileiros mestres da dramaturgia,mestres do teatro que sempre estimu-laram a existência de grupos teatrais,de grupos culturais acima de tudo. Foibastante perseguido naquele momentoda censura, da ditadura, teve que viverfora do País e usou isso em função deseu aprendizado cada vez mais inten-so, mais completo. Quando retornou,retornou mais informado e formadoculturalmente – disse a atriz Eva Wil-ma, em entrevista a O Globo.

A atuação do dramaturgo na defe-sa da cidadania, nas transformaçõessociais e na formação de lideranças nasperiferias das grandes cidades e naszonas rurais não se resumiu apenas aoteatro e ao ensino. Seis anos depois dese estabelecer novamente no Brasil,Boal foi eleito vereador no Rio de Janei-ro, pelo PT. E foi na cidade que morouaté o fim da vida.

Sua família informou que ele sofriade leucemia. No dia 28 de abril, foiinternado no Hospital Samaritano, emBotafogo, Zona Sul do Rio, com infec-ção respiratória, que teria causado suamorte na madrugada de 2 de maio.Durante a cerimônia de cremação docorpo, no Cemitério do Caju, sua obrafoi lembrada, desde a visão progressistaque conferiu à cena cultural brasileiranos anos 50 e 60, passando pela resis-tência contra a censura e o lançamen-to de técnicas que aliaram arte e peda-gogia. Justo para quem brilhou nospalcos da vida e da cultura. Ou, comodisse certa vez o diretor da revista es-pecializada The Drama Review, RichardSchechner:

“Boal conseguiu fazer aquilo comque Brecht apenas sonhou e escreveu:um teatro alegre e instrutivo.”

Logo em sua estréia no teatro, na peça Ratos e Homens, de John Steinbeck (à esquerda, com José Serber e GianfrancescoGuarnieri), Boal ganhou o prêmio de Diretor Revelação da Associação Paulista de Críticos de Artes. Sua carreira marcante incluiudiversas peças de sucesso, como Chapetuba Futebol Clube, de Oduvaldo Viana Filho (abaixo, com Flávio Migliaccio e Francisco de

Assis) e o espetáculo Opinião (à direita, com Zé Kéti), que teve grande repercussão em 1964, logo após o golpe militar.

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VidasVidas

m anarquista. Um idealistasempre preocupado com osseus. Autor de mais de 60 li-vros publicados em diversospaíses, Edgar Rodrigues fale-ceu no dia 14 de maio, víti-

ma de parada cárdio-respiratória. Maisantigo exilado político português noBrasil, o escritor, nascido António Fran-cisco Correia, em Angeiras, em 1921,foi duramente perseguido durante o Es-tado Novo, regime político autoritárioque vigorou em Portugal de 1933 a1974. Exilou-se em 1951 no Brasil, ondeaderiu aos setores anarco-sindicalistas.

Além de sua militância nos meiosanarquistas, Rodrigues colaborou comdiversos setores oposicionistas portu-gueses exilados no País em apoio aoGeneral Humberto Delgado, fundadorda Frente Portuguesa de LibertaçãoNacional. No Brasil, foi sempre incan-sável no combate à ditadura militar quese instaurou em 1964. Nessa mesmadécada, criou a Editora Mundo Livre –nome que traduzia muito da tônica desua obra, classificada como essencial-mente libertária. Uma de suas últimasobras foi Lembranças Incompletas, de2007, que aborda a trajetória de mili-tância do escritor desde a adolescência,em Portugal, a partir de 1939, até àchegada à antiga colônia.

Autor de centenas de artigos sobrea história e as idéias anarquistas, Ed-gar foi o maior e o mais importantedifusor da cultura libertária desde ofinal dos anos 1960. Mesmo sob o pesoda ditadura militar, publicou livrosclássicos como Socialismo e Sindicalis-mo no Brasil, Nacionalismo e CulturaSocial, Novos Rumos e Alvorada Operá-ria. Em 1989, com o Brasil já de voltaà democracia, produziu Anarquistas:Trabalhadores Italianos no Brasil.

No Rio, onde desembarcou no come-ço dos anos 50, relacionou-se com osmilitantes anarquistas históricos, entreos quais José Oiticica e Edgard Leuen-roth e passou a participar das ativida-des do movimento e a colaborar com aimprensa libertária. Em 1969, foi um dospresos durante a repressão militar con-tra os anarquistas do Centro de EstudosJosé Oiticica, também nacapital fluminense.

Rodrigues é autor dequatro volumes sobre omovimento operário e oanarquismo em Portugal.Seus trabalhos são ummanancial de informa-ção para pesquisadoresda História Social do Brasil e de Por-tugal; pode-se afirmar que foi mesmoum precursor do estudo do movimen-to operário, em boa parte ainda inci-piente e até mesmo desacreditado.Nas suas atividades de pesquisa per-correu o Brasil recolhendo depoimen-tos de militantes e seus descenden-tes, coletando documentos de operá-rios e ativistas anarquistas e forman-do um acervo singular da HistóriaSocial do Brasil

O escritorportuguês, morto

aos 88 anos,deixa importante

obra, graçasà sua intensa

militância social,política eintelectuale ao vasto

levantamentode depoimentose documentosde militantesanarquistas

e sindicalistasde Portugale do Brasil.

POR PAULO CHICO

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Filho de um militante anar-co-sindicalista português doSindicato da Construção Civilfiliado à CGT, Edgard Rodri-gues participou desde jovem daluta contra a ditadura salaza-rista. Quando chegou ao Bra-sil, em 1951, trazia na poucabagagem os originais de suasprimeiras obras: Na Inquisiçãode Salazar e Fome em Portugal.No Rio, além de recomeçar avida, tratou de publicar livroscontra a ditadura portuguesa,os quais logo entraram no ín-dex do regime autoritário, em-bora Edgar Rodrigues não te-nha deixado de os fazer entrarclandestinamente no seu paísde origem. Só voltou a visitarPortugal após a derrubada dofascismo, em 1974.

No final de 2008 Edgar Rodri-gues recebeu no Consulado-Ge-ral de Portugal no Rio de Janeiroa Medalha da Associação 25 deAbril, alusiva à Revolução dosCravos e às ações de combate de-senvolvidas em prol da liberda-de. O Embaixador de Portugal noBrasil, Francisco Seixas da Cos-ta, que participou dessa homena-gem no Palácio de São Clemen-te, residência do Consulado-Geral de Portugal, dis-se que a iniciativa teve um significado especial.

Sócio da Casa desde 27 de julho de 1978, Edgar Ro-drigues era membro da Comissão de Honra do Cen-tenário da ABI, distinção honorífica que aceitou atra-vés desta declaração:

“Ilustre Presidente da Associação Brasileira de Im-prensa, Maurício Azêdo,

Confirmo e agradeço sua carta-convite de 1 de ou-tubro de 2007 para integrar a Comissão de Honra doCentenário da ABI, em abril de 2008.

Foi uma surpresa e uma honra seu convite! Embo-ra seja um lutador pela Li berdade Plena há mais demeio século, ainda assim sou ignorado, quase sempre...

Fazia pouco mais de meia dúzida de anos que mehavia refugiado no Rio de Juaneiro quando fui (a con-vite do anarquista e jornalista Edgard Leuenroth, emcaráter particular) assistir ao 7º Congresso (7-14/9/1958) da Associação Brasileira de Imprensa, recebendodois grossos volumes com 1.170 páginas , de teses edebates, que guardo em meu acervo.

Logo em 1959, participei de outro Congresso em de-fesa da Liberdade Plena, numa chácara no Itaim, SãoPaulo, que teve a cobertura do jornalista e do fotógrafoda revista O Cruzeiro, Audálio Dantas e Neil Ferreira.

Isto posto, em abril de 2008 terei completado 87anos de idade, carregando bastante problemas de saú-de. No entanto, se meu nome for para atestar a luta-defesa da Liberdade Plena, com meus dois mil artigospublicados em jornais e revistas de vários países e dossessenta livros publicados em cinco países, sem neces-sidade de esforços físicos e intelectuais maiores, quenão tenho como dispor deles, ACEITO!”

PERFIL

Militância, herança de família

COMISSÃO DE HONRA

“Se meu nome for para atestar aluta-defesa da liberdade, aceito!”

“O Brasil constituiu portode refúgio para muitos portu-gueses, que aqui vieram encon-trar a liberdade que a ditadu-ra portuguesa lhes negava”,afirmou “Esta homenagem étambém um gesto de respeitoe gratidão ao acolhimento fra-terno que o Brasil deu aos por-tugueses perseguidos e impe-didos de expressarem as suasidéias políticas na sua terra na-tal”, disse Seixas da Costa nasolenidade, na qual exaltou atrajetória do homenageado:

“Edgar Rodrigues representauma figura política e intelectu-al com percurso pessoal quasesolitário, guardião de valores so-ciais que acalentou ao longo detoda a sua vida, durante a qualpublicou uma imensa obra, edi-tada em vários países”.

O funeral de Rodrigues esta-va previsto para o dia 15 demaio. Contudo, conforme infor-mou sua neta Renata CorreiaEspanol, foi encontrada certidãoem cartório na qual ele pediapara ter o corpo cremado, o queocorreu em cerimônia realizadano dia 16, no Rio. Edgar Rodri-gues deixou esposa, dois filhos

e netos, além de uma obra intelectual ímpar. Einestimável.

Algumas opiniões expostas por EdgardRodrigues em entrevista aopesquisador Jor-ge E. Silva, Assessor do Centro de Cultura eCidadania de Florianópolis-Cecca.

OS SINDICATOS, HOJE“Os assalariados de hoje vivem ainda sujei-

tos à exploração ou à exclusão social como osoperários e trabalhadores do passado. Tambémos movimentos sociais e o sindicalismo enfren-tam muitos dos problemas do passado, por issoacredito que muitos dos métodos e da teoriado sindicalismo autônomo continuam sendoválidos. Esse sindicalismo, em que acredito, po-deria ser a base da produção, da distribuição eda própria autogestão social. O suporte da novasociedade. Agora o sindicalismo que aí estáperdeu-se no corporativismo, politicagem ecorrupção pelega. Mesmo o que se apresentapintado de esquerda”.

MUDANÇAS: A CURTO PRAZO, NÃO“Já não tenho idade para ser ingênuo e

pensar que vão acontecer a curto prazo

IDÉIAS

“O sindicalismo perdeu-se nocorporativismo e na corrupção pelega

mudanças profundas nas sociedades que co-nheço. Os obstáculos a vencer são tais quecertamente exigem, entre outras coisas, tem-po, agravamento da crise e o renascimentode novos movimentos sociais mais capazes,mais preparados, mais cooperativos e maisfortes para enfrentar esse desafio de criaruma sociedade realmente humana”.

ANARQUISTA NÃO É MÁGICO“O anarquismo, como qualquer outra fi-

losofia social, não se baseia em milagres. Nãose propõe curar todas as enfermidades. Nemsomos mágicos. Pelo contrário, o anarquis-ta é um atleta, um corredor de fundo, queprecisa ter fôlego para agüentar os desafiosque enfrenta. Quem não for capaz disso, deresistir, não é certamente um libertário. Teráde pensar em ser comerciante ou conseguirum cargo político e se acomodar. Outra so-lução é criar uma igreja e conseguir muitoscrentes, prometendo a vida melhor na eter-nidade. Dessa forma, consolam-se os tolose fica rico o padre ou pastor!”

Dono de uma biblioteca preciosa, Edgar Rodriguesreuniu uma documentação igualmente preciosa de

militantes do movimento social em Portugal e no Brasil,sobre o qual escreveu nada menos de 60 livros.

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