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A COMPLEXIDADE NO ESTUDO DO CONTROLE MOTOR HUMANO Alexandre Matos 1 [email protected] Cristiano Sena 1 [email protected] Francisco Antônio Pereira Fialho 2 [email protected] Irlândia Ramos Araújo 1 [email protected] Milena Alves Medrado 1 [email protected] Rosângela Martins Gueudeville 1 [email protected] Resumo A evolução das teorias que procuram explicar o controle motor partiu do pensamento cartesiano positivista e caminharam para uma abordagem mais ampla e holística. Nas teorias do controle motor mais atuais como a teoria ecológica é possível notar a preocupação com os fatores ambientais e cognitivos. O objetivo deste artigo é entender o organismo humano e para tal foi realizado uma revisão bibliográfica em livros e artigos. Como resultado verificou-se que o controle motor humano dever ser compreendido como um sistema complexo e como tal está sujeito a uma organização baseada na dinâmica não linear. Assim este artigo colabora para uma melhor compreensão do movimento e em especial das teorias do controle motor. Palavras-chave: Controle Motor; Movimento; Complexidade. INTRODUÇÃO O movimento é a mudança de posição ou postura que envolve gasto energético, controle e produção de força (HAMILL, 1999). De uma maneira geral o movimento humano pode ser entendido como uma comunhão de vários sistemas orgânicos: neurológico, biomecânico e bioquímico em associação com as características ambientais. O controle motor responsável pelo movimento humano vem sendo analisado por muitos estudiosos na tentativa de descrever como o movimento é adquirido, desenvolvido e durante o ato motor como ele é planejado e executado. Para tal, muitas teorias foram elaboradas na tentativa de explicar de que forma os movimentos são controlados, ou seja, como ocorre o Controle Motor. 1

Neurofisiologia

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Neurofisiologia do controle motor

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  • A COMPLEXIDADE NO ESTUDO DO CONTROLE MOTOR HUMANO

    Alexandre Matos1 [email protected] Sena1 [email protected]

    Francisco Antnio Pereira Fialho2 [email protected] Ramos Arajo1 [email protected]

    Milena Alves [email protected] Martins Gueudeville1 [email protected]

    Resumo

    A evoluo das teorias que procuram explicar o controle motor partiu do pensamento cartesiano positivista e caminharam para uma abordagem mais ampla e holstica. Nas teorias do controle motor mais atuais como a teoria ecolgica possvel notar a preocupao com os fatores ambientais e cognitivos. O objetivo deste artigo entender o organismo humano e para tal foi realizado uma reviso bibliogrfica em livros e artigos. Como resultado verificou-se que o controle motor humano dever ser compreendido como um sistema complexo e como tal est sujeito a uma organizao baseada na dinmica no linear. Assim este artigo colabora para uma melhor compreenso do movimento e em especial das teorias do controle motor.

    Palavras-chave: Controle Motor; Movimento; Complexidade.

    INTRODUOO movimento a mudana de posio ou postura que envolve gasto energtico,

    controle e produo de fora (HAMILL, 1999). De uma maneira geral o movimento

    humano pode ser entendido como uma comunho de vrios sistemas orgnicos:

    neurolgico, biomecnico e bioqumico em associao com as caractersticas

    ambientais.

    O controle motor responsvel pelo movimento humano vem sendo analisado por

    muitos estudiosos na tentativa de descrever como o movimento adquirido,

    desenvolvido e durante o ato motor como ele planejado e executado. Para tal, muitas

    teorias foram elaboradas na tentativa de explicar de que forma os movimentos so

    controlados, ou seja, como ocorre o Controle Motor.

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  • METODOLOGIAA pesquisa bibliogrfica foi realizada em livros, artigos, revistas, dissertaes,

    teses e sites sobre o Controle Motor Humano, Complexidade e Movimento.

    Teorias do Controle MotorEstas teorias so um grupo de hipteses ou idias que tentam descrever a

    interao dos sistemas orgnicos e o ambiente na elaborao e controle do movimento.

    Teoria do ReflexoNesta teoria os reflexos so considerados a unidade bsica do movimento,

    assim os movimentos mais complexos seriam formados por uma juno de reflexos.

    (FREDERICKS, 1996).

    Um exemplo desta teoria seria o sapo que ao ver uma mosca, desencadeia um

    estmulo, que produz a ativao reflexa do impulso da lngua para capturar a mosca, o

    que corresponde resposta, caso seja realmente capturada (SHUMWAY-COOK E

    WOOLLACOTT, 2003). Entretanto, esta teoria possui diversas limitaes, pois no

    explica os movimentos voluntrios e os movimentos que acontecem na ausncia de um

    estmulo sensorial.

    Teoria HierrquicaA teoria hierrquica prope que no Sistema Nervoso existe uma hierarquia, onde

    os centros superiores (crtex, reas motoras frontais e reas responsveis pela

    conscincia) comandam os centros inferiores (medula espinhal e nervos cranianos).

    Umphred (2004) relata que nesta teoria o centro superior contm toda a informao

    necessria para o movimento e pode ou no usar o feedback externo ou interno para

    regular o movimento.

    Conforme esta teoria os centros superiores e inferiores no interagem, no

    existindo controle de baixo para cima e apenas de cima para baixo. Alguns

    pesquisadores uniram as teorias acima citadas, formando a teoria reflexo-hierrquica,

    sugerindo que o controle motor ocorre devido a reflexos organizados hierarquicamente

    no sistema nervoso, mas no esclarece a dominncia do comportamento reflexo que

    acontece em algumas situaes como no exemplo da pisada em um prego que leva a

    uma resposta reflexa estereotipada de retirada imediata da perna.

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  • Teoria da Programao MotoraIndica que o movimento acontece devido a programas motores que so ativados

    por processo central e estmulo sensorial, assim pode ocorrer na ausncia de uma ao

    reflexa.

    Bernstein (1967 apud SHUMWAY-COOK E WOOLLACOTT, 2003) um dos

    criadores desta teoria, descreve sua limitao, para ele o programa central no pode

    ser considerado a nica determinante da ao motora, uma vez que dois comandos

    iguais para uma regio especfica do corpo pode produzir movimentos diferentes, por

    exemplo a flexo do joelho pode ser executada ou controlada por aes musculares

    diferentes a depender se o p estiver fixo no solo a flexo controlada por uma ao

    muscular excntrica do quadrceps e se estiver com a extremidade inferior livre a flexo

    produzida por uma contrao dos msculos isquiotibiais.

    Teoria dos SistemasSugere que vrios sistemas atuam no controle motor, tanto os componentes internos

    como musculares, neurais quanto externos, gravidade e inrcia e que diferentes

    comandos podem resultar no mesmo movimento (FREDERICKS, 1996).

    Uma grande limitao desta teoria o no aprofundamento na interao do organismo

    com o ambiente.

    Teoria da Ao DinmicaAborda variveis denominadas parmetros de controle, que segundo esta teoria,

    regulam as alteraes no comportamento de todo o sistema. Uma alterao critica

    destas variveis em um dos sistemas induz a um novo movimento. Este ponto crtico

    seria o limite mximo que os sistemas suportariam naquele determinado movimento

    quando ento haveria a transio para um novo estgio de movimento.

    Esta teoria faz referncia ao estado atrator que seria aquele padro preferido do

    movimento, que poderia ser entendido como aquele ritmo preferido para realizar as

    atividades da vida cotidiana. Por exemplo, poderamos caminhar com diversos tipos de

    velocidade de macha, mas normalmente caminhamos em um ritmo preferido que

    individual e pode variar segundo exigncias ambientais.

    Shumway-Cook e Woollacott (2003) relatam que uma limitao deste modelo

    pode ser a suposio de que o Sistema Nervoso cumpre uma funo

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  • consideravelmente irrelevante e que a relao entre o sistema fsico do animal e o

    ambiente no qual ele funciona determina principalmente o comportamento do animal.

    Teoria EcolgicaSurgida em 1960 com estudos do psiclogo James Giibson, que pesquisou as

    interaes do sistema motor com o meio ambiente (GIBSON, 1986). Esta teoria

    posteriormente desenvolvida por dois alunos de Gibson foi conhecida como teoria

    ecolgica do controle motor e caracterizada pela grande nfase percepo que ao

    contrario das demais teorias que apontavam a sensao como fator mais importante no

    controle motor. Segundo Shumway-Cook e Woollacott (2003), a perspectiva ecolgica

    ampliou o nosso conhecimento sobre o Sistema Nervoso Central que deixou de ser

    considerado um sistema sensrio-motor que reage s variveis ambientais e

    transformou-se em um sistema de percepo/ao capaz de explorar ativamente o

    ambiente, a fim de satisfazer seus prprios objetivos.

    As teorias de controle motor possuem limitaes decorrentes do momento

    histrico em que foram desenvolvidas e do paradigma aceito na sua criao, por

    exemplo, as primeiras teoria se encaixam no paradigma newtoniano-cartesiano,

    tradicional, que dividia o todo em partes e as teorias da ao dinmica e a teoria

    ecolgica trazem uma abordagem mais atual, na qual o ambiente pode limitar ou

    influenciar a atividade funcional.

    Contudo, percebe-se que a teoria da ao dinmica no destaca o organismo

    como um sistema complexo que est sujeito dinmica no-linear existente na relao

    entre a estrutura e o processo relativos ao movimento humano principalmente em

    relao questo da subjetividade como por exemplo a conscincia. A nica teoria que

    mais se aproxima da abordagem experincia subjetiva a teoria ecolgica ao dar

    nfase percepo em vez da sensao.

    Para compreender como a teoria da complexidade pode influenciar e fornecer bases

    conceituais para maior conhecimento das atuais teorias do controle motor necessrio

    entender como surgiu a idia complexa a partir do pensamento simplificador.

    Pensamento SimplificadorSegundo Morin, 1995, o pensamento simplificador est baseado na confiana

    absoluta da lgica para estabelecer as verdades da sua teoria. Ren Descartes no

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  • sculo XVII baseado no ideal separatista e reducionista procurou explicar a natureza

    das coisas e assim dividiu em mente ou coisa pensante (res cogitans) e matria ou

    coisa extensa (res extensa). Ele ordena a separao do objeto do meio, da ordem da

    desordem, das disciplinas das cincias, da cincia da filosofia. Estas foram as bases

    conceituais da teoria cartesiana que norteou por muito tempo a cincia e a filosofia

    ocidental.

    A partir disto, entende-se porque no existem teorias completas, pois h

    inmeros fatores a se considerar, principalmente quando se reconhece que o ser

    humano um sistema aberto e est sujeito a influncias externas.

    Hoje os cientistas se deparam com o paradigma da complexidade e por assim ser ainda

    se encontra relutncia em seu aceito pela dificuldade que alguns cientistas tm em

    adotar a estrutura no-linear da teoria da complexidade.

    A ComplexidadePara Morin (1995) a Complexidade uma forma de compreender o mundo,

    tendo a capacidade de integrar no real as relaes que sustentam a co-existncia entre

    os seres no universo, possibilitando o reconhecimento da ordem e da desordem, do uno

    e do diverso, da estabilidade e da mudana. As idias de ordem, desordem e

    organizao necessitam ser pensadas em conjunto e surgem de diferentes pontos de

    vista.

    Assim, a idia de ordem, desordem e organizao demonstra o antagonismo e a

    complementaridade que se encontra na complexidade. Morin (1998) coloca tambm

    que o funcionamento do ser vivo tolera, at certos limites, uma parte de desordem, de

    rudos, de erros. A degradao contnua das molculas e das clulas de um organismo,

    por exemplo, a desordem permanente.

    Princpios da complexidadeSete princpios bsicos so colocados por Morin (2000), os quais so

    complementares e interdependentes.

    O primeiro princpio denominado sistmico ou organizacional associa o

    conhecimento das partes ao conhecimento do todo, sendo que o todo igualmente

    mais e menos que a soma das partes.

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  • O segundo princpio o hologrfico, o qual demonstra que a parte est no todo,

    como o todo est na parte, ressaltando que cada parte possui sua singularidade e sua

    individualidade, alm de conter o todo. Por exemplo, as clulas do corpo humano que

    possuem a informao gentica do corpo, mas no em si o corpo.

    O terceiro princpio, a retroatividade, aceita o conhecimento dos processos auto-

    reguladores, rompe com o princpio da causalidade linear, no qual a causa age sobre o

    efeito e o efeito sobre a causa.

    O quarto princpio, a recursividade, refere-se ao circuito gerador, em que os

    produtos e os efeitos so causadores e produtores do que se produz. Como exemplo,

    o ciclo da reproduo, que produz seres vivos que reproduzem o ciclo de vida da

    reproduo.

    O quinto princpio, a autonomia/dependncia, relata que os seres vivos so

    autnomos, mas esta autonomia depende do meio exterior, por isso so seres auto-

    eco-organizadores.

    O sexto princpio o dialgico, o qual se refere a duas lgicas, pois um

    fenmeno complexo une duas noes que tendem a excluir-se reciprocamente e ao

    mesmo tempo so indissociveis em uma mesma realidade, como a ordem, a

    desordem e a organizao.

    O stimo princpio a re-introduo do conhecimento em todo conhecimento, ou

    seja, todo o conhecimento uma reconstruo de um conhecimento prvio.

    Sistemas Complexos e a dinmica no linearOs sistemas complexos no so lineares, envolvem muitos componentes,

    apresentam uma dinmica de interao entre eles, dando origem a um nmero de

    nveis ou escalas que exibem comportamentos comuns, apresentando processos de

    emergncia e auto-organizao.

    Segundo Axelrod (2000), complexidade no denota simplesmente muitas

    partes em movimento. Ao contrrio, indica que o sistema consiste de partes as quais

    interagem de forma que influenciam fortemente o sistema como um todo. A

    complexidade normalmente resulta em caractersticas que so propriedades do sistema

    que as partes separadas no tem. Por exemplo, nenhum neurnio tem conscincia,

    mas o crebro humano tem conscincia como uma propriedade emergente.

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  • Conforme Capra, 1997, a dinmica no-linear a nova matemtica da

    complexidade que permite um nmero limitado de forma e funes possveis, que so

    descritos matematicamente pelos atratores padres geomtricos complexos que

    representam as propriedades dinmicas do sistema. Para o matemtico Stewart, 1998

    a dinmica no-linear ser um dos campos mais frutferos da cincia nos prximos

    anos, no qual a matemtica traduzir a necessidade de compreender a organizao do

    mundo vivo.

    Para entender a complexidade natural ao organismo humano, o primeiro passo

    procurar compreender como a complexidade tendo como base a teoria da autopoiese

    explica a formao de redes de relacionamento e o surgimento de formas e funes

    biolgicas. Conforme Capra, (2002) o sistema autopoitico aquele que sofre

    mudanas estruturais continuas ao mesmo tempo em que conserva seu padro de

    organizao em teia. Os componentes da teia continuamente produzem e transformam

    uns aos outros, e os fazem de maneiras distintas.

    Assim, os sistemas vivos so sistemas fechados quanto sua organizao e por

    isso so redes autopoiticas, mas aberto do ponto de vista material e energtico, uma

    vez que necessita de matria e energia do ambiente e devolve estes elementos na

    forma de excrementos.Quando o fluxo de energia aumenta o sistema pode chegar a

    uma instabilidade que Capra chama de ponto de bifurcao, o qual pode resultar em

    um estado totalmente novo, em que podem surgir novas estruturas e novas formas de

    ordem. O fenmeno do surgimento espontneo reconhecido como a origem dinmica

    do desenvolvimento, do aprendizado e da evoluo. Assim, a gerao de formas novas

    uma das propriedades dos sistemas vivos que uma caracterstica essencial dos

    sistemas abertos.

    O conhecimento da teoria da complexidade nos permite dizer que no possvel

    mais explicar os fenmenos biolgicos a luz simplista da fsica e da bioqumica sem

    levar em considerao a dinmica no-linear dos sistemas complexos. Por exemplo, o

    ato motor humano, o foco deste estudo, no deve ser entendido apenas como uma

    funo apenas dos sistemas neurolgicos e biomecnicos. Na verdade o controle motor

    oriundo da dinmica no-linear complexa das redes que envolvem os sistemas

    neurolgicos e biomecnicos em constante relao com seu ambiente.

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  • Desta forma a cincia que busca estudar fenmenos biolgicos como o controle

    motor deve reconhecer a importncia da analise da experincia viva, ou seja, da

    subjetividade que envolve os agentes. E isso representa mais uma quebra de

    paradigma uma vez que nega a viso cartesiana de separao do corpo da mente.

    com este pensamento que as teorias do controle motor evoluram e chegaram as atuais

    teorias da ao dinmica e ecolgica

    Para uma melhor compreenso da complexidade no controle motor e avanar

    num aspecto pouco abordado pela teoria da ao dinmica e mais amplamente pela

    teoria ecolgica necessrio entender a relao do corpo e da mente em especial no

    estudo da conscincia.

    Corpo, mente e conscinciaPor mais que as teorias tenham modificado, uma questo sempre motivou os

    pesquisadores: a relao entre o corpo e a mente. Segundo Capra (2002), o avano

    decisivo da concepo sistmica da vida foi o abandono da viso cartesiana da mente

    como uma coisa e ter percebido que mente e conscincia so processos.

    Uma das teorias que surgiram a partir desta viso sistmica foi difundida na

    dcada de 70 pelos bilogos Humberto Maturana e Franscisco Varela e conhecida

    como a teoria da cognio de Santiago. A idia central desta teoria reconhecer que a

    cognio um processo essencial da vida. As interaes de um organismo vivo com

    seu ambiente so interaes cognitivas. Assim a cognio envolve todos os processos

    da vida, percepo, emoo, aprendizado, comportamento e por assim ser tambm o

    movimento humano.

    Sendo o organismo humano um sistema aberto e autopoitico ele est sujeito a

    influencia ambiental e como resultado desta interao est submetido a constantes

    mudanas que refletem no desenvolvimento do homem. Um exemplo claro o sistema

    nervoso do homem.

    A estrutura do sistema nervoso supra segmentar tem em sua caracterstica a

    neuroplasticidade que pode ser entendida como a capacidade que os neurnios

    possuem de assumir novas funes a partir do uso e reuso de estmulos adequados a

    uma tarefa. Isto fica evidente nos casos de leso cerebral como, por exemplo, um

    trauma crnio-enceflico. Durante o processo de reabilitao, verifica-se uma mudana

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  • estrutural para observar uma mudana funcional, uma vez que, a funo motora

    pertencente a rea de tecido cerebral morta pode ser substituda por uma nova rea,

    mesmo que esta nunca tenha sido usada para tal. Esta capacidade (neuroplasticidade)

    ocorre na dependncia de estmulos e do treinamento adequados destas funes

    perdidas ( ARRIBAS et al, 2006).

    O grande fator estimulante que favorece a neuroplasticidade parece ser mesmo

    o inter-relacionamento do indivduo com o seu ambiente. Porem h que se ver que os

    sistemas vivos so autnomos. O ambiente s faz desencadear as mudanas

    estruturais, no as especifica nem as dirige. Isto porque, segundo Maturana e Varela,

    (1987), a interao de um sistema vivo com seu ambiente responde a um padro no-

    linear e assim o resultado imprevisvel. No caso de treinamento de tarefas em um

    paciente com leso cerebral por mais que o terapeuta busque uma resposta em

    especial ele deve estar ciente que o resultado pode ser o mais diverso possvel, uma

    vez que como foi visto esta resposta est de acordo com a dinmica no-linear e

    dependente da natureza comportamental do individuo.

    A teoria ecolgica do controle motor interessante por levar em considerao o

    fator ambiental e a percepo individual na aquisio e controle do movimento. Ao

    reconhecer que o organismo vivo responde s influencias ambientais com mudanas

    estruturais que iro refletir no seu comportamento, percebe-se que o treinamento de

    reabilitao deve ser o mais motivador possvel e as tarefas a serem prescritas devem

    fazer parte do cotidiano do paciente. Isto fica claro quando Capra, (2002), afirma que o

    sistema que se liga ao ambiente atravs de um vnculo estrutural um sistema que

    aprende. As mudanas contnuas so seguidas de adaptaes, aprendizados e

    desenvolvimentos tambm contnuos, o que uma caracterstica dos seres vivos.

    Para Maturana e Varela, (1987) nenhum sistema vivo pode ser controlado, s

    pode ser perturbado. Os sistemas vivos no especificam somente as mudanas

    estruturais; especificam tambm quais so as perturbaes do ambiente que podem

    desencade-las. Ou seja, reside ao sistema vivo a capacidade de filtrar os tipos de

    perturbaes e assim ter a liberdade de aceitar que tipo de perturbao do seu

    interesse. E assim a teoria ecolgica ao envolver a dicotomia o ambiente-percepo

    define estmulos, no caso perturbaes que normalmente fazem parte da vida diria do

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  • paciente. Por isto, as aquisies de tarefas durante o treinamento de pacientes

    lesionados devem englobar justamente as tarefas que fazem parte do ambiente natural

    do indivduo, pois assim tornam-se mais fceis de ser percebidas e reprogramadas pelo

    paciente.

    Assim as idias da teoria da cognio de Santiago se complementam com a

    teoria ecolgica do controle motor, pois da mesma forma so uma ciso com a viso

    cartesiana ao fornecer uma viso mais holstica, alm disso, a teoria da cognio de

    Santiago fornece subsdios para compreenso da complexidade no controle motor ao

    entender que a resposta ao um estimulo est de acordo com o padro no-linear, ou

    seja o estmulo ou perturbao pode ser ou no aceito pelo individuo e da mesma

    forma o resultado pode ser aquele esperado ao no. Alm disso, fica evidente que a

    mente um processo de cognio do viver e o crebro a estrutura na qual se d este

    processo. Desta forma a relao da mente com o crebro uma relao entre processo

    e estrutura. E a conscincia emerge como fator atribudo a esta relao.

    Importncia da conscincia no controle motorPara entender a importncia da conscincia no controle motor necessrio estar

    ciente da dinmica no-linear que envolve os sistemas complexos e assim levar em

    considerao a subjetividade e os resultados imprevisveis dos relacionamentos entre

    os agentes. Para tal, Capra em 2002 fez uma reviso das escolas de estudo da

    conscincia:

    1.Neurorreducionista: definio dada por Fransico Varela por reduzir a conscincia a

    mecanismos nervosos. O comportamento definido pela relao das clulas nervosas

    e das molculas.

    2.Funcionalista: a mais popular entre estudiosos da cognio, afirma que os estados

    mentais so definidos pela organizao funcional, descritos por padres de relaes

    causais no sistema nervoso. E ao levar em considerao estes padres est diante da

    dinmica no-linear dos sistemas complexos.

    3.Misterianos: escola menos conhecida que define a conscincia como um mistrio

    profundo o qual o homem jamais ir compreender. Por mais que se compreenda a

    estrutura cerebral, isto no permitir condies do entendimento da experincia

    consciente.

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  • 4.Neurofenomenologista: difundida por Francisco Varela uma escola que vem

    crescendo e faz uso da teoria da complexidade e das experincias subjetivas contidas

    nos relatos de caso em primeira pessoa e assim procura compreender de que maneira

    as experincias subjetivas surgem espontaneamente a partir de atividades neurais

    complexas.

    Aprofundando os conhecimentos preconizados pela escola

    neurofenomenologista, entendemos que o estudo do controle motor deve compreender

    o estudo da cognio e as atividades neurais complexas devem envolver as

    experincias subjetivas consciente.

    ResultadosA experincia consciente se baseia num conjunto especfico de clulas que

    envolve muitas atividades neuronais diferentes, associadas percepo sensorial, s

    emoes, memria, aos movimentos corporais, etc. As experincias subjetivas ao

    estarem ligadas aos movimentos corporais devem ser um campo de ateno para o

    entendimento do controle motor humano. Para tal, as bases cientficas das escolas

    Funcionalista e Neurofenomenologista servem de primeiro entendimento uma vez que

    estas entendem que a conscincia um processo cognitivo que surge

    espontaneamente a partir da atividade neural complexa em especial a ultima por estar

    ligada a fenmenos subjetivos faz jus a a dinmica no-linear dos sistemas complexos.

    (VARELA, 1996 apud CAPRA, 2002)

    A fim de entender a complexidade desta atividade neural Capra, (2002), define

    que os principais estudiosos foram Francisco Varela e mais recentemente Gerald

    Edelman junto com Giulio Tononi.

    Nestes estudos fica evidente que a experincia consciente no se localiza numa

    parte especfica do crebro, nem pode ser relacionada a determinadas estruturas

    neurais. Na verdade uma propriedade que surge espontaneamente de um processo

    cognitivo particular (formao de aglomerados funcionais transitrios de neurnios)

    Estes aglomerados seriam estruturas que se formam para descrever um padro que

    define uma funo realizada pelo sistema nervoso.

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  • No caso do movimento humano ou ato motor este padro pode ser descrito

    como uma seqncia de padres de excitaes neuronais que inicia com uma

    motivao e planejamento do ato motor em reas especificas do crtex cerebral. Para

    este planejamento so usadas informaes sensoriais internas (posio corporal) e

    externas (distancia de agentes externos, topografia, luminosidade, etc.) em seguida o

    movimento iniciado com as contraes musculares que produzem o movimento e a

    tarefa funcional desejada, por exemplo, o caminhar. Aps inicio do movimento ocorre

    uma constante avaliao pelo feedback sensorial que tambm so padres de ativao

    neuronal que surgem a partir dos mesmos estmulos internos e externos que de forma

    aferente se direcionam ao sistema nervoso central e so encaminhados ao encfalo

    para serem comparados a padres aprendidos e armazenados no cerebelo que

    influencia a rea motora determinando o controle da ao motora que est sendo

    executada (LUNDY-EKMAN, 2004).

    Com estas informaes possvel relacionar a tarefa que se deseja realizar ou

    que est sendo executada com ambiente externo e assim ajustar a ao motora ao

    planejamento feito ou ao movimento executado s exigncias do ambiente em que se

    encontra.

    CONCLUSOFrente a este padro percebe-se que o ato motor est relacionado a dois fatores

    vistos neste estudo: ambiente e conscincia. E assim fica evidente que qualquer estudo

    que deseje entender o movimento humano dever levar em considerao a dinmica

    no-linear que envolve a relao complexa entre os sistemas vivos e seu ambiente, no

    subestimando a experincia subjetiva, em especial a conscincia, essencial no controle

    das atividades motoras ou em qualquer programa de reabilitao funcional.

    REFERNCIASARRIBAS, M.J.D.,HERVS, P. P., LAVADO M. T. B., LAGO, M. R.,MAEST, F. Plasticidad del sistema nervioso central y estratgias de tratamiento para la reprogramacin sensoriomotora: comparacin de dos casos de accidente cerebrovascular isqumico em el territrio de la artria cerbral media, Rev Neurol, n.42, 2006.

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    1 - Mestrando do programa EGC, Gesto do Conhecimento na UFSC.2 Prof. Dr. do programa Engenharia e Gesto do Conhecimento (EGC) na UFSC.

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