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www.ondajovem.com.br ano 5 – número 14 – março/maio 2009 Para ir à escola com motivação, o jovem pede mais sentido e conexão entre os conteúdos INTERDISCIPLINARIDADE

Onda Jovem #14

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Para ir à escola com motivação, o jovem pede mais sentido e conexão entre os conteúdos www.ondajovem.com.br ano 5 – número 14 – março/maio 2009 18% dos jovens de 15 a 17 anos estão fora da escola somente 48% dos jovens de 15 a 17 estão no ciclo médio 8,4 milhõEs de alunos cursavam o ensino médio em 2008 sonar alunos apoiam esforço interdisciplinar na educação pág. 8 Professores atraem estudantes para a área de exatas pág. 16 3 olhar circular/Divulgação

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Para ir à escola com motivação, o jovem pede mais sentido e conexão entre os conteúdos

InterdIscIplInarIdade

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Evasão chEga a 13% no Ensino médio

18% dos jovens de 15 a 17 anos estão fora da escola

8, 4 milhõEs de alunos cursavam o ensino médio em 2008

somente 48% dos jovens de 15 a 17 estão no ciclo médio

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estão fora da escola

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Projetos visam fixar alunos no ensino médio pág. 20

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de 15 a 17 estão no ciclo médio

alunos apoiam esforço interdisciplinar

na educação pág. 8

área de exatas pág. 16

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âncoras

“A escola precisa ter mais presença no cotidiano. O jovem acaba não se identificando, acha que estudar é só uma obrigação.”

Caco Barcellos,

jornalista, comanda o programa de TV “Profissão: Repórter”, com jovens profissionais

“O professor fica falando e você, só ouvindo.”José Ferreira da Silva,

17 anos, no 3º ano do ensino médio de uma escola pública em João Pessoa

“É preciso criar já na universidade um ambiente onde a visão sistêmica seja favorecida na formação dos professores.”

Mozart Neves,

membro do Conselho Nacional de Educação e coordenador do movimento Todos Pela Educação

“Quando se oferecem projetos interdisciplinares, os alunos são levados a investigar, empregando uma variedade de processos mentais, o que se constitui em extraordinária fonte de motivação.”

Heloísa Lück,

diretora educacional do Centro de Desenvolvimento Humano Aplicado, em Curitiba

“Informações foram transformadas em conhecimento, pois houve vivência prática dos temas trabalhados em sala de aula.”

Ana Cristina Bettoni,

professora de química em São Carlos (SP)

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“Quem traz o conhecimento não é a tecnologia e, sim, o usuário. A Internet é o melhor meio de levar esse conhecimento para as pessoas.”

Ana Celina Belotti,

17 anos, aluna de escola particular de São Paulo

“A gente tem abertura para tirar dúvidas e discutir os assuntos. Há esforço para tornar as aulas mais participativas e ligar as coisas.”

Ana Luiza Vera e Silva,

estudante do 2º ano do ensino médio em escola privada de Ribeirão Preto (SP)

“Rompemos com o paradigma tradicional, cujo centro é nota e prova, privilegiando o estudo e a aprendizagem.”

João Batista Costa,

professor de química em Parnamirim (RN), recebeu menção honrosa do Prêmio Professores do Brasil 2008

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“Os meios digitais permitem uma visão globalizada, maior universalização da informação, diversos pontos de vista sobre um fato.”

Júlio Moreira Gomes, 18 anos,

medalhista de ouro na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), em 2007

“Quando perguntava alguma coisa, às vezes o professor reclamava que aquilo era da outra matéria.”

Ricardo Ferreira do Nascimento,

21 anos, aluno do 3º ano do ensino médio de uma escola pública em Salvador

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ano 5número 14março/ maio 2009

um projeto de comunicação apoiado peloinstituto votorantim

Projeto editorial e realizaçãoFátima Falcão e marcelo nonatoolhar cidadão – Estratégias para o Desenvolvimento humanowww.olharcidadao.com.br

Direção editorialJosiane lopes

secretaria editoriallélia chacon

Projeto gráficoartur lescher e ricardo van steen(tempo Design)

colaboradores

texto: aydano andré motta, cristiane ballerini, Frances Jones, ivani Fazenda, Jaime Paviani, lélia chacon, roberto amado

foto: augusto Pessoa, Deise lane lima, Edigley Feitosa, Fábia hafermann, Felipe barra, Joyce cury, lucian Kleyton, marcelo mendonça, márcia Zoet

ilustração: beto uchoa, tigone, tikka, Willmangraff

capa: izabela gonçalves fotografada por Deise lane lima

apoio editorialinstituto votorantim www.institutovotorantim.org.br

revisão: moira de andrade

DiagramaçãoD´lippi Editorial

impressãoipsis

tiragem10 mil exemplares

como entrar em contato com onda Jovem:E-mail: [email protected]ço: r. Dr. neto de araújo, 320 – conj. 403,são Paulo, cEP 04111 001tel.: 55 11 5083-2250 e 55 11 5579-4464www.ondajovem.com.br um portal para quem quer saber de juventude

Onda jovem é um dos 50 jeitos brasileiros de mudar o mundo – Programa de Voluntários das Nações Unidas no Brasil – 2007

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8 – navEgantEs

a abordagem interdisciplinar na escola, do ponto de vista de jovens estudantes do ensino médio

16 – EducadorEs

Professores usam estratégias interdisciplinares para atrair alunos ao estudo de ciências exatas

20 – Banco dE PrÁticas

quatro iniciativas que fazem do interesse direto dos alunos ferramenta da educação

24 – Ângulo 1

Jaime Paviani escreve sobre as relações entre interdisciplinaridade e educação

28 – Ângulo 2

ivani Fazenda comenta os desafios da prática interdisciplinar na escola

32 – o sujEito da frasE

o jornalista caco barcellos sonha com uma escola mais integrada à realidade dos jovens estudantes

36 – lunEta

os projetos interdisciplinares facilitam e reforçam a gestão participativa nas escolas de ensino médio

40 – ciÊncia

a flexibilidade característica do cérebro juvenil ajuda a determinar a forma como os jovens apreendem a realidade

44 – chat da rEvista

quatro jovens conversam sobre como é ser um nativo digital, o representante da geração nascida em berço tecnológico

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sonar 2Pistas sobre a educação juvenil

Âncoras 4Comentários sobre interdisciplinaridade

cartas 48As mensagens dos leitores

navEgando 50A grafiteira Tikka desenha sua visão de interdisciplinaridade na sala de aula

Em seu quinto ano de publicação, a revista e o site Onda Jovem vão se dedicar a refletir sobre a Educação para a juventude, em especial no período mais frágil de sua trajetória: o ensino médio. Desse modo, Onda Jovem dá sentido de urgência à Educação de qualidade, como principal desafio e condição para o desenvolvimento integral do jovem. Com esse foco prioritário hoje, queremos contribuir para que a pauta ocupe um lugar central na agenda da sociedade e transforme-se em uma bandeira intergeracional.

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navegantes

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por _ Cristiane Ballerini

aluno tenha uma visão sistêmica dos processos, de possibilitar, por exem-plo, vários caminhos para resolver um problema, ou refletir sobre uma questão”, diz Mozart Neves, membro do Conselho Nacional de Educação, ex-reitor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-Secretário de Edu-cação de Pernambuco, hoje à frente do movimento Todos Pela Educação, que visa mobilizar a sociedade pela qualidade da educação.

Para Mozart, que é doutor em quí-mica, a ausência dessa visão integra-da dos saberes entre si, e deles com a realidade, enfraquece os currículos e não contribui para tornar a educação atraente e significativa para o jovem, constituindo-se num dos três prin-cipais motivos dos altos índices de repetência e evasão verificados no ensino médio. Os outros dois fatores se relacionam com a quantidade e a formação dos professores e a falta de uma interface entre o ensino médio e o mundo do trabalho.

Construindo o conhecimentoDe fato, é um grande incentivo para

os alunos relacionar o que aprendem na escola com a própria vida e fazer conexões entre vários temas. A pro-fessora de artes Ivonete Machado co-nhece bem essa estratégia pedagógi-ca. Coordenado por ela, um grupo de professores da Escola de Educação Básica Holando Marcellino Gonçalves, em Jaraguá do Sul (SC), lançou um projeto coletivo que mobilizou toda a escola, especialmente os alunos de ensino médio. A missão da turma era buscar conhecimento e, com o auxílio dos professores, construir um biodi-gestor. Trata-se de um equipamento que transforma lixo orgânico em gás para uso doméstico.

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estudantes do ensino médio contam como percebem a presença, ou a ausência, da abordagem interdisciplinar na escola

O professor preenchia a lousa com cálculos há mais de dez minutos quando um dos alunos perguntou so-bre a biografia de John Nash – o ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 1995 e um dos mais originais matemáticos da história. Irritado com a “interrupção”, o professor virou-se lentamente e fuzilou o rapaz com os olhos: “Mocinho, nós estamos na aula de matemática e não de literatura. Se quiser falar de biografias, espere a aula de português”. O aluno ficou mudo e, para evitar novas broncas, não fez mais perguntas.

Esse episódio, que aconteceu no ensino médio de uma escola pública em Santa Catarina, é um exemplo extremo de como um educador, em vez de estimular, pode afastar os alunos de uma compreensão mais ampliada e significativa da realidade. Isso em um mundo conectado em alta velocidade pelas novas tecnologias, onde fica cada vez mais evidente o inter-relacionamento entre fatos e entre saberes: a eco-nomia sofre influência direta da política, as questões do meio ambiente estão ligadas ao desenvolvimento social e à educação...

Na escola, a tradição manda que as matérias tenham recortes e uma organização específica dos vários conte-údos. No entanto, desde a década de 1950, educadores defendem um conceito fundamental para a qualidade de ensino: a interdisciplinaridade. A convicção de sua importância na educação em geral, e na dos jovens em particular, a colocou em destaque nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o ensino médio.

“Não se trata de abandonar as disciplinas do currículo escolar, mas de encontrar formas de fazer com que o

aquIles coelho sIlva, de São Paulo: professores que dão

aula em dupla no ensino técnico

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“Já havíamos pensado em uma atividade com objeti-vo de conscientização ambiental. Mas, entre os profes-sores, surgiu a vontade de fazer alguma coisa diferente, concreta. A ideia foi fabricar algo que pudesse também ser uma resposta para as questões locais e mundiais de energia, algo que, um dia, as pessoas pudessem ter em casa para gerar o gás para o consumo próprio e ainda colaborasse com a reciclagem”, diz Ivonete.

Inicialmente destinada aos alunos do ensino médio, a iniciativa mobilizou toda a escola. Mesmo aqueles

que não estavam diretamente en-volvidos, vinham curiosos perguntar aos colegas do que se tratava. “A gente se interessou pela ideia logo de cara”, conta Malu Francine Girardi, aluna do terceiro ano do ensino mé-dio e uma das líderes do projeto do biodigestor.

Para desenvolver e construir o equipamento, alunos e professores se uniram em busca de conhecimento técnico. As dificuldades não foram poucas: além da falta de referências nacionais sobre esse tipo de projeto, o grupo não contava com recursos financeiros. A ideia seguiu adiante com o empenho dos envolvidos e o apoio de uma empresa local, que doou latões especialmente preparados para integrar o equipamento. Os restos or-gânicos vinham da merenda escolar.

O aproveitamento pedagógico foi total. “Em química, estudamos os elementos químicos que compõem o gás; em biologia, vimos o processo de digestão e as bactérias envolvidas;

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Malu FrancIne GIrardI,à direita da professora Ivonete (no centro) e colegas da escola: construção de biogás em Jaraguá do Sul (SC)

José FerreIra da sIlva, 17 anos,de João Pessoa: sem diálogo no ensino noturno

prevista nos parâmetros curriculares do ensino médio, a interdisciplinaridade pode contribuir para tornar a escola mais significativa para os jovens

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em artes, trabalhamos a logomarca e fizemos uma maquete; em ma-temática, revimos conteúdos como volumes, e ainda produzimos textos”, conta Malu. E para a própria estudante, que acabou se tornando a “relações públicas” do projeto, foi a oportuni-dade de treinar suas habilidades de comunicação em apresentações e em entrevistas, como esta.

Pronto, o biodigestor produziu gás. Pouco, é verdade, devido às limita-ções físicas do equipamento. Mas as conquistas de aprendizagem foram reconhecidas. O projeto foi um dos vencedores do Prêmio Professores do Brasil, do Ministério da Educação, que pela primeira vez destacou tam-bém educadores do ensino médio. A equipe que desenvolveu o trabalho recebeu R$5 mil, e a escola, R$2 mil. Os recursos serão utilizados para construir um novo biodigestor. Des-sa vez, para gerar o gás utilizado na cozinha da escola.

Para a professora Ivonete, a experi-ência fortaleceu ainda mais a relação entre alunos e professores: “O aluno passa a respeitar o professor como um sujeito que também está sempre aprendendo. E como os alunos apren-dem muito pelo exemplo, ao ver que o professor navega por várias áreas para construir conhecimento, eles também são incentivados a criar seu próprio percurso”.

Exercício de poderMas muitos alunos ainda reclamam

da distância imposta pelo “poder” do professor. “Não rola comunicação entre professores e alunos. É aquela história do mestre, que está acima da gente. O professor fica falando e você, só ouvindo. O aluno fica com medo de chegar no professor”, diz José Ferreira da Silva, 17 anos, no 3º ano do ensino médio.

Zezinho, como é conhecido, estuda no período noturno de uma escola estadual na periferia de João Pessoa, Paraíba. Cansado das aulas “chatas”, em que a única coisa a fazer era ouvir, ele foi à luta sozinho para buscar o que a escola nem sempre lhe dá. “A escola tem doze computadores, mas só um funciona. Para piorar, quando

você trabalha o dia todo, fica cansado à noite. A gen-te não quer estudar, e os professores não querem dar aula. Então, quase não tem diálogo”, lamenta Zezinho, que começou a estudar informática como autodidata, pesquisando em livros, revistas e fre-quentando lan houses.

Mozart Neves, que já lecionou para jovens no pe-ríodo noturno, lembra que cansou de ver os alunos dormindo nas carteiras. “Eu era um professor inician-te, mas vi que havia algo de errado. Quem não dormia ia embora. Então, fiz uma reunião com a turma e perguntei como poderia tornar as aulas mais interes-santes. No começo foi um silêncio total. Mas bastou um falar para a sala toda se manifestar”, diz.

Como resultado da interação, as aulas se tornaram mais dinâmicas, participativas e conectadas com os problemas que os alunos enxergavam no cotidiano. “Ainda há, infelizmen-te, a percepção de que o professor precisa manter a autoridade na sala para ter disciplina O caminho não é esse. É preciso derrubar as barreiras entre professores e alunos e dar aulas capazes de chamar a atenção dos estudantes”, diz Mozart.

Zezinho, que conseguiu passar em um concurso do Banco do Brasil

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graças a seus conhecimentos de informática e matemática, faz ques-tão de lembrar-se de professores que fizeram a diferença: “Tive um professor que me fez tomar gosto pela matemática. Ele se importava se a gente aprendia. Lançava uns de-safios, fazia alguma pressão para eu resolver. Quando comecei a estudar física, não tive dificuldade porque já sabia fazer os cálculos”.

Também craque em matemática, mas no ângulo oposto do espectro da educação brasileira, a estudante do 2º ano do ensino médio Ana Luiza Vera e Silva está bem mais satisfeita com a escola. Aos 16 anos, ela sempre estudou na mesma escola particular, o Liceu Albert Sabin, em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.

Enquanto vários colegas “sentiram a pressão” quando começaram o ensino médio, Ana Luiza continua tranquila nos assuntos escolares: “A gente tem abertura para tirar dúvidas e discutir os assuntos. Há esforço para tornar as aulas mais participativas e ligar as coisas. O professor de geografia, por exemplo, sempre discute os últimos aconteci-mentos em sala e fala de temas que poderiam estar na aula de história, ou até de literatura”.

ana luIza vera e sIlva, 16 anos,

de Ribeirão Preto (SP): abertura e esforço interdisciplinar

na escola privada

MarIane chelI de olIveIra,de Tamboara (PR): uma das vencedoras da Olimpíada de Língua Portuguesa

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Trabalho em redeMas a experiência de Mariane Cheli

de Oliveira, que acaba de concluir o ensino médio, mostra que não é pre-ciso estudar em uma escola privada ou com amplos recursos financeiros para desfrutar dos benefícios de uma abordagem interdisciplinar da educação. Moradora de Tamboara, uma cidadezinha com pouco mais de 4.000 habitantes no interior do Paraná, Mariane se formou em uma escola pública com aulas bastante animadas.

“Alguns professores faziam de tudo para tornar as aulas mais ricas, traziam até filmes para discutir. No meu caso, que trabalhava como costureira e chegava cansada, era um incentivo”, conta Mariane. A úl-tima “aventura” de sua turma foi a participação na Olimpíada de Língua Portuguesa 2008, um concurso de redação promovido pelo Ministério da Educação, e capitaneado na escola pela professora Vanicléia Rabelo.

O tema foi escolhido coletivamente e acabou intensificando a relação dos participantes com a cidade. A idéia da turma foi discutir o cultivo da cana-de-açúcar e seus impactos, como a geração de empregos e a poluição ambiental. Até o plano diretor de

Tamboara foi parar na sala de aula. “Por conta disso, ficamos sabendo mais sobre nossa cidade e relembra-mos coisas que a gente tinha esquecido, ou nem tinha parado para pensar”, conta a jovem.

O texto da estudante, escrito e reescrito muitas vezes sob orientação de Vanicléia, foi premiado. E, com a fama da aluna vencedora correndo o Estado, veio outro prêmio: empresários em busca de novos talentos resolveram contratá-la como secretária de uma das maiores empresas da região. “Esse projeto mudou minha vida”, diz Mariane.

Se esse e outros projetos interdisciplinares interfe-rem tão positivamente no processo de aprendizagem, e às vezes até na vida pessoal dos alunos, como incenti-var esse tipo de atividade nas escolas? O caminho para o educador Mozart Neves está na formação continuada do professor. “Os atuais cursos de formação continua-da, infelizmente, repetem os erros da formação inicial. Trabalham apenas conteúdo. E, muitas vezes, conteúdo que não tem nada a ver com o ensino médio. É preciso

a integração entre as disciplinas e entre estas e a realidade deve tornar o currículo mais atraente para os jovens do ensino médio

Izabela Gonçalves, 18 anos,de Duque de Caxias (RJ):aulas e provas inusitadas

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O DIFÍCIL RETORNO

criar já na universidade um ambiente onde a visão sistêmica seja favorecida na formação dos professores”. Para isso, Mozart propõe uma integração maior das disciplinas, como acontece em outras áreas que não a educação. Um projeto que envolva nanotecno-logia, por exemplo, pode ter físicos, biólogos e matemáticos interagindo. “Precisamos levar esse conceito de trabalho em rede para a educação básica”, diz o educador.

Sem medo de ousarA ideia de trabalho em equipe, ou

em rede, é essencial à interdisciplina-ridade. E, às vezes, para possibilitar a interação de várias áreas, os próprios professores acabam literalmente dividindo espaços. No Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica) de São Paulo, o aluno do 2º ano Aquiles Coelho Silva conta que os professores de história e filosofia dão aulas em dupla. Enquanto um enfatiza o aspec-to histórico, o outro propõe reflexões que remetem à filosofia. Às vezes, a turma é dividida e depois reunida novamente para o debate. �Eu mesmo não gostava muito de história na 8ª série, mas adoro filosofia. Agora, com essa conexão entre os conteúdos, meu conceito sobre a história mudou�, diz Aquiles. Além das aulas combina-das, os estudantes do Cefet de São

Evasão E rEpEtência assolam também o ciclo médio

Paulo também escolhem o tema de alguns trabalhos do bimestre e aproveitam para buscar os aspectos que mais lhes interessam nas apresentações para os colegas.

Também os alunos da Escola Estadual Guadala-jara, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, estão se acostumando a unir busca de novos conhecimentos e prazer. Além da intensa prática de esportes nas quadras, a escola incentiva o funcionamento de um núcleo de cultura que atrai o interesse dos estudantes com atividades como teatro e �contação� de histórias.

Izabela Gonçalves, 18 anos, que veio transferida de outra escola e hoje está no 2º ano do ensino médio, logo se encantou com o �diferencial� da Guadalajara. �Aqui, além da prova, temos chance de fazer coisas mais interessantes para aumentar a nota. Por exemplo, em vez de ler um livro e somente responder perguntas, a gente pode transformar o livro em peça de teatro, em apresentações. É um jeito diferente de aprender, e a gente estuda várias coisas ao mesmo tempo.�

Integrante e entusiasta do grupo de teatro, Izabela diz que alguns professores investem na criatividade pedagógica. A professora de português, por exemplo, usou durante as aulas uma brincadeira conhecida como adedonha. O nome não é lá muito conhecido, mas todo mundo já brincou: os jogadores devem escre-ver categorias no papel (nome de cidade, fruta, título de filme...), sortear uma letra e preencher as categorias com nomes começando por essa letra. A professora adaptou a brincadeira ao conteúdo de algumas aulas e até na prova lançou mão do recurso para testar o conhecimento dos alunos. �Ninguém acreditou quando contei que fizemos uma prova em forma de adedonha. Assim, fica mais fácil aprender�, diz Izabela.

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“Eu deveria estar quase terminando a faculdade”, lamenta Ricardo Ferreira do Nascimento, 21 anos, aluno do 3º ano do ensino médio de uma escola estadual em Pau Miúdo, bairro popular de Salvador. O rapaz faz parte do grande número de adolescentes brasileiros que amadureceu nos bancos escolares. Segundo dados do Ministério da Educação de 2007, 42,6% dos estudantes brasileiros do ensino médio estão na condição que os especialistas chamam de defasagem idade-série, ou seja, estão atrasados na escola. Há, ainda, um número significativo – 9,4% – que abandona a escola já na 8ª série.

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21 anos,de Salvador:

volta por cima à escola

O rapaz teve de deixar a escola várias vezes para ajudar no sustento dos irmãos e da mãe. “Passava o dia perambulado pelas ruas da cidade, nos ônibus, vendendo balas, cartões telefônicos, verduras. Quando chegava à escola, já não tinha forças para estudar”, conta Ricardo. E a escola também não ajudava, com seu excesso de aulas teóricas enfadonhas. A interdisciplinaridade tendia a zero. “Quando perguntava alguma coisa que me interessava, às vezes o professor reclamava que aquilo era da outra matéria”, conta.

Apesar de fazer parte das estatísticas negativas da educação, Ricardo é um vitorioso. Consciente de que deveria redobrar os esforços para aprender, o rapaz começou a ler tudo o que lhe caísse nas mãos. Ele se orgulha de ler uma média de um livro por semana, sempre emprestado por alguém.

Foi observando tudo o que via ao redor e aprendendo nos livros que Ricardo se conscientizou da necessidade dos estudos. Depois de mais um ano longe dos bancos escolares, ele finalmente conseguiu voltar à escola. Ao mesmo tempo, passou a frequentar aulas de reforço e fez alguns cursos gratuitos, já de olho no mercado de trabalho.

Graças ao seu empenho, o estudante se integrou ao programa Menor Aprendiz. Ganha uma bolsa para trabalhar como auxiliar de escritório por meio período e pode se dedicar aos estudos no resto do dia. Seu sonho é chegar à faculdade.

Sobre a escola, Ricardo sabe exatamente o que mudar para que outros jovens, iguais a ele, não se afastem dela: “Nem sempre os professores ajudam. Tem aqueles muito autoritários, que não admitem questionamentos. Há também aqueles que são professores de verdade, que conversam com você. Mas o que eu acho que falta mesmo é falar de assuntos que têm a ver conosco. Até hoje, tive só umas duas aulas em que a gente pôde falar de drogas, de sexo e outras coisas que fazem parte da nossa vida”.

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aIda Fadel, da unb:oficinas para fazer de estudantes do ensino médio futuros engenheiros FE

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17

Por _ Lélia Chacon

a ciÊncia daintEgraÇão

do fomento de uma cultura de ino-vação, por meio do programa Inova Engenharia. O Precoce surgiu neste contexto, com a missão de atrair alu-nos do ensino médio para as carreiras de engenharia.

Duas escolas públicas de Brasília (Centro de Ensino Médio 1, de Sobra-dinho, e CEAN, da Asa Norte) foram escolhidas para sediar a experiência piloto por dois anos. A iniciativa, que conta com recursos de R$ 500 mil, busca a melhoria dos processos de ensino por meio de uma proposta interdisciplinar, que desperta o inte-resse do aluno e, por isso, facilita seu aprendizado, em especial nas ciências de base da engenharia (matemática, física, química e informática). Em 2008, foram realizadas cerca de 30 oficinas nas escolas.

Fórmulas, equações, nomes e nú-meros tidos como esquisitos e com-plicados. O “bicho pega” na escola quando os estudantes se deparam com esses conteúdos. Acontece no ensino em geral e no aprendizado das ciências em particular, na hora da física, química, matemática ou biologia. Mas pode ser diferente quando professores e alunos per-cebem que a graça de ensinar e de aprender está na interdisciplinaridade – conceito amplo que, no dia a dia da educação escolar, significa apresen-tar um assunto em um contexto de inter-relações, dar significado a ele com experiências práticas e, muito importante, combinar tudo isso com estímulos instigantes e criativos. É o que fazem educadores antenados com a realidade do jovem inserido no mundo atual, interdisciplinar, múltiplo e conectado como nunca. Educadores como a brasiliense Aida Fadel, o potiguar João Batista Costa e o cearense Luciano Guedes Siebra têm colhido bons frutos com jovens do ensino médio na rede pública. En-volvidos justamente com disciplinas consideradas mais “espinhosas”, eles desafiam a expectativa predominante entre muitos mestres e aprendizes na escola básica: por parte do aluno, a certeza de que ele não consegue aprender e, do lado do professor, a desesperança de ensinar a um aluno que não aprende.

proFEssorEs da ÁrEa dE EXatas conQUistam alUnos dE Ensino médio com propostas intErdisciplinarEs

“No ensino das ciências, não dá para fazer um aluno decorar fórmulas. É preciso contextualizar o aprendiza-do. Ele tem de perceber a aplicação prática da física, da química, da matemática, biologia ou informática no seu cotidiano e também a combinação dessas ciências, ou seja, perceber que todos os processos e sistemas reais são multidisciplinares. E o jovem reconhece isso reali-zando experimentos, brincando com materiais, cons-truindo conhecimentos. Depois, aprender a fórmula é fácil, porque ela faz sentido. Em vez de uma abstração, torna-se uma representação do real”, diz a professora Aida Fadel, graduada em engenharia mecânica e co-ordenadora do projeto Precoce, da Universidade de Brasília, dirigido à educação, em ciências exatas, de alunos do ensino médio de escolas públicas.

Despertando engenheirosO Projeto de Educação em Ciências Continuadas

da Engenharia (Precoce) começou em 2007, a partir de uma iniciativa do Sistema S (SESI, SENAI etc.) de discutir a formação de profissionais de engenharia e

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Nelas, os jovens reciclam óleo usado para fazer biodiesel e sabão, atividade com a qual aprendem conceitos de sustentabilidade, a química das rea-ções, a física do aquecimento gerado pela mistura dos componentes, a ma-temática para acertar as proporções. Um cabo de vassoura, corda, elástico e garrafas pet criam uma espécie de balança para os alunos verificarem, por exemplo, se o bujão de gás de 13 quilos tem realmente esse peso. Enquanto isso, eles aprendem o que é torque, equilíbrio de forças e as leis de Newton. E apostam uma corrida para conhecer o que é a frequência Hertz a partir da frequência cardíaca, e a que mais essa medida se aplica. Em uma oficina de astronomia, constrói-se uma luneta igual à utilizada por Galileu para observar a superfície da Lua e aprender sobre ótica, razão e proporção, expansão do universo, história etc. Ao responderem a um questionário após as oficinas, há, segundo Aida, uma manifestação constante dos alunos: “Eu nunca pen-sei que pudesse aprender tanto”.

Mais do que atrair para as carreiras de engenharia, o projeto Precoce

quer mostrar ao jovem que aprender é prazeroso e, ao professor, que a abordagem interdisciplinar funciona. Segundo Aida, a tarefa é desafiadora porque a baixa qualidade do ensino em geral, e do ensino de ciências em especial, está ligada também à desmotivação do professor que, por sua vez, desmotiva o aluno. “Senti-mos essa dificuldade na hora de mobilizar o professor. Grande parte deles coloca o foco do problema de baixa aprendizagem no aluno, o que tende a agravar a situação, pois gera em ambos descrédito no papel de aprender e de ensinar”, diz Aida.

Este ano, a estratégia para enfrentar o problema é um trabalho conjunto e continuado com os professores das escolas para adaptar cada vez mais os conteúdos da sala de aula às oficinas do Precoce. Assim se cria a oportunidade de estreitar mais a relação com o educa-dor e de tornar seu ensino atraente para o estudante. “Queremos capacitá-lo a absorver nossa metodologia e a desenvolver suas próprias abordagens para vencer as limitações postas no processo de ensino e apren-dizagem”, diz Aida.

Mudança de paradigmaNo município de Parnamirim, no Rio Grande do

Norte, o professor de química João Batista Costa e seus alunos da Escola Estadual Dom Nivaldo Monte dão outro exemplo da abordagem interdisciplinar na escola pública. Com o projeto “O Diálogo e a Interação para Aprendizagem de Química”, que recebeu uma menção honrosa no Prêmio Professores do Brasil

2008, ele conseguiu impregnar os estudantes de uma nova cultura, baseada no interesse em aprender e não simplesmente em adquirir notas para passar de ano. “Rompemos com o paradigma tradicional, cujo centro é nota e prova, privilegiando o estudo e a aprendizagem”, resume João Batista.

O projeto, iniciado em 2006, foi motivado pela percepção de que os alunos chegavam ao ensino médio sem nenhuma base para acompanhar a disciplina de química. “Iniciamos um trabalho de recuperação dos conceitos básicos, mas tratando o conhecimento de forma interdiscipli-nar e em sua totalidade, e buscando torná-lo significativo para o aluno”, diz João Batista. Como exemplo, ele se lembra de uma aula sobre hidrocar-boneto e gás natural que teve como base a Escola de Samba da Grande Rio (Do Verde de Coari vem meu gás Sapucaí), do carnaval do Rio de Janeiro de 2008. “Os alunos ficaram impressionados com as descobertas que fizeram sobre a cultura e o fol-clore da Amazônia. Chegaram à con-clusão de que o desfile da escola de samba é uma grande ópera popular”, conta o professor. Em outra aula, a origem dos elementos químicos foi explorada com base num vídeo de Carl Sagan. “Apesar de ser em inglês, eles pesquisaram e superaram as suas limitações, fazendo um gran-de debate acerca do assunto, que envolveu a origem do universo e a teoria da criação cristã”, assinala. E um projeto sobre drogas mobilizou a turma para aprender sobre funções e nomenclaturas de substâncias, os problemas causados pelos diversos tipos de droga, os países produtores e consumidores.

O impacto de experiências como essas nos estudantes – 120 por semestre no turno noturno, com idade entre 18 e 60 anos, a maioria trabalhadores da construção civil, do comércio e domésticas – e no con-junto da escola foi impressionante. Segundo João Batista, a instituição passou da 77ª colocação (2006) para a décima colocação estadual (2007) no Exame Nacional do Ensino

o professor de biologialuciano siebra, de araripe (ce):alunos transformarammunicípio em objeto de estudo

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19Médio, o Enem. “O sucesso escolar dos alunos elevou sua autoestima, servindo de incentivo para aumen-tar sua participação em concursos diversos e estimular a construção do hábito de estudar”, diz o mestre. Jarbas Batista Silva Araújo, um des-ses alunos, devolveu ao professor a dedicação que recebeu. Foi agracia-do, sob a orientação de João Batista, com o segundo lugar no Prêmio Jovem Cientista 2007. “Eu não te dou respostas e, sim, os meios para que você as encontre. Vá, você con-segue”, dizia o professor ao aluno tímido diante das possibilidades que se abriam. “Se hoje eu provo dessa vitória, foi graças a ele”, diz Jarbas.

João Batista só vê vantagens no trabalho interdisciplinar, como tornar as aulas significativas e contextuali-zadas e permitir maior abertura para a aquisição de conhecimentos. Mas as dificuldades para implementá-lo estão em geral na organização

da escola e da estrutura curricular que favorece a compartimentalização do conhecimento. O relacio-namento com os colegas professores é outro ponto crítico. “Projetos interdisciplinares dão trabalho, exi-gem estudo e dedicação por parte dos professores, e isso não é muito comum no meio dos profissionais de escola pública”, diz o educador.

Iniciação científicaPelos mesmos motivos considerados pelo pro-

fessor de Parnamirim, a interdisciplinaridade ainda é um desafio nas escolas de Araripe, no Ceará. Mas há exceções quanto ao empenho e dedicação para superá-lo. O professor de biologia Luciano Guedes Siebra conseguiu a proeza com alunos do ensino médio da EEFM Dona Carlota Távora. Ele implantou na escola o projeto de iniciação científica “Pesquisar é Produzir Novos Conhecimentos e Comunicar os Resultados”, também premiado no concurso Profes-sores do Brasil do ano passado. Propôs aos jovens uma pesquisa sobre os problemas do município, com foco na questão ambiental. A idéia entusiasmou logo a turma que, dividida em oito grupos, montou oito projetos.

A proposta compreendeu dois meses de estudos teóricos, com leitura de textos científicos e pesquisas. Outros quatro meses de trabalho de campo para cada grupo delimitar a área a ser investigada e seu objeto de pesquisa, realizando entrevistas nas comunidades e a apuração dos dados junto ao poder público. Depois, houve o tempo de escrever o trabalho e apresentá-lo. O desafio dos estudantes era oferecer soluções para os problemas diagnosticados. E ofereceram. Um grupo pesquisou a apicultura como alternativa de trabalho e renda para os agricultores locais e comprovou, depois de investigar a produção de apicultores, que a atividade era mais vantajosa comparada a outros

o professor de química João batista costa, de parnamirim (rn):alunos recuperam conceitos básicos com samba e filme

cultivos agrícolas, por conta do in-vestimento, do lucro e por provocar menos desmatamentos. A atividade era sustentável.

Outro grupo investigou o sistema de abastecimento de água de certa localidade, sugerindo ao prefeito a construção de um poço profundo e a criação de um mecanismo de con-trole do consumo. Uma estação de tratamento foi a proposta de outra equipe para um córrego da região, onde antes a população dispunha de água limpa para beber e se banhar e que hoje virou um criadouro natural de doenças. As olarias foram mais um objeto de pesquisa dos estudantes, que investigaram o aspecto cultural de uma atividade artesanal, passada de pai para filho, e viram seu impacto ambiental no solo, no uso da água, da lenha e na emissão de gás carbônico, que contribui para o efeito estufa. E um documentário produzido pelos jovens ainda comprovou o potencial turístico de outra localidade.

Com essa pedagogia de projeto interdisciplinar, os estudantes co-nheceram e exploraram com prazer conteúdos biológicos, geográficos, matemáticos, históricos e da língua portuguesa, entre outros. “É um bom caminho para quem pretende traba-lhar de forma diferente na escola”, garante o professor Luciano. Para ele, o projeto propiciou ao aluno o sentimento de pertencimento e foi motivador porque produzido pelo estudante. “Ele se sentiu responsá-vel, cuidou do projeto com carinho porque se importava com o resul-tado que queria mostrar e divulgar.” Tudo isso fortaleceu a comunicação entre alunos e professores e estrei-tou os laços entre famílias e escola. “O município todo ficou sabendo”, conta Luciano, informando que um dos estudos foi escolhido para repre-sentar Araripe na Feira de Ciências e Cultura do Ceará com o tema Álcool: a causa ou a solução dos nossos problemas? Por fim, os números que selaram o êxito do professor e seus 80 jovens aprendizes no ano letivo de 2007: o índice de aprovação das turmas foi de 95% e o de evasão, simplesmente 0%.

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banco de práticas

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QUatro proJEtos intEGram ÁrEas do conHEcimEnto para tornar o aprEndiZado siGniFicativo para o JovEm do ciclo médio

PONTOS DE ATRAÇÃO

Crescer, engrossar, atingir a maturi-dade biopsicossocial. São significados da palavra “adolescer”, que vem do latim. O processo é complexo e exige que o jovem use seu potencial cria-tivo, “bebendo” em diversas fontes de experiências e conhecimentos. A escola é um dos espaços vitais para a empreitada, pois nela o jovem exerce um de seus papéis mais importantes, na condição de estudante. É um aluno que, a esta altura, está enriquecido mentalmente pela capacidade de fazer abstrações, interpretações e relações, habilidades a serem exploradas para o desenvolvimento de competências. Mas, pelos dados do Censo Escolar do MEC, 13% dos jovens que se matriculam no ensino médio abandonam os estudos,� entre outros motivos, porque não encon-tram na escola pontos de atração capazes de satisfazer sua necessi-dade criativa.

Os projetos aqui descritos buscam combater esse quadro, apoiando-se na estratégia da multidisciplinari-dade; integram saberes, tornando

o aprendizado atraente e significativo para o jovem. Um deles, no Rio Grande do Sul, alia os conceitos da física e da educação no trânsito. “Velocidade, atrito, força e aceleração são noções importantes da física presentes no trânsito, assunto pertinente aos alunos do ensino médio, que já estão de olho na carteira de habilitação”, diz o professor Leandro Londero da Silva, segundo lugar no Prêmio Professores do Brasil, do Ministério da Educação. Em São Carlos (SP), a profes-sora de química Ana Cristina Bettoni desenvolveu um projeto sobre o carbono, também premiado pelo MEC, a partir de elementos próximos dos alunos, como o bairro onde moram. “Eles aprenderam sobre o efeito estufa e entenderam como a devastação ambiental pode comprometer a vida deles”, diz.

Na Escola Estadual Professora Oscarlina de Araújo Oliveira, em Itatiba (SP), o projeto Excelência, que também tem como eixo multidisciplinar o meio am-biente, envolve 15 professores de quatro áreas, em oficinas no contraturno escolar, e foi selecionado no concurso O Desafio do Ensino Médio – Como Evitar que os Jovens Abandonem a Escola?, promovido pelo Instituto Unibanco. Em Alagoas, no município de Ma-rechal Deodoro, o projeto Olhar Circular, desenvolvido pela ONG Saudáveis Subversivos, subverte o destino de estudantes a partir de um trailer com laboratório multimídia e palestras interdisciplinares. A seguir, mais detalhes sobre as iniciativas. (LC)

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Em Marechal Deodoro, a 28 km de Maceió, o índice de violência é alto e o consumo de craque faz de jovens entre 15 e 24 anos suas principais vítimas. Por isso, o co-letivo Saudáveis Subversivos escolheu esse cenário para implantar a experiência piloto do projeto Olhar Circular, em 2008, depois de equipar um trailer com laboratório multimídia, acoplado ao Teatro Cine Kombi, utilizado pelo grupo para exibições de filmes, apresentações musicais e teatrais. “Estacionamos junto ao Cefet Marechal Deodoro

Marechal Deodoro (AL)

projeto olhar circular

O professor Leandro Londero da Silva percebeu que muitos assuntos da física e do trânsito estavam relacio-nados e que trabalhá-los no contexto escolar era uma forma de educar os jovens e contribuir para a redução de acidentes. Por isso, em 2007, decidiu construir, com as turmas de 1º ano do ensino médio, de duas escolas públicas das cidades gaúchas de Formigueiro e São Pedro do Sul, noções de física presentes no trânsito, como veloci-dade, atrito, força, aceleração. Os estudantes pesquisaram estatística e legislação sobre o tema, juntamente com con-

São Carlos (SP)

projeto o carbono nosso de cada dia

São 1.168 jovens matriculados no ensino médio, na Escola Estadual Professora Oscarlina de Araújo Oliveira. As taxas de evasão e repetência atingem 17% e 13%, respectivamente. A proposta para combater os proble-mas foi uma das vencedoras do concurso promovido pelo Instituto Unibanco, com o tema O Desafio do En-sino Médio – Como Evitar que os Jovens Abandonem a Escola? e recebeu um prêmio em dinheiro para apoiar sua implantação neste ano. Segundo a professora-coordenadora da escola, Cláudia Aparecida Furlan, o pro-

Itatiba (SP)

projeto excelência

Ensinar química da perspectiva do desenvolvimento socioambiental-sustentável permite eliminar barreiras rígidas entre as áreas da disciplina, como a química or-gânica, a inorgânica e a bioquímica, e também transitar por outros campos do conhecimento, como biologia, geografia, história, sociologia. Isso foi possível no projeto da professora Ana Cristina Bettoni, na Escola Estadual Aracy Leite Pereira Lopes, com 75 alunos que cursavam o ensino médio em 2007. “A partir do conhecimento do meio, foi despertada nos alunos a consciência de que os

Formigueiro (RS)

projeto educação para o trânsito: a contribuição da Física

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jeto visa à promoção do atendimento educacional complementar em quatro oficinas: Arte&Palavra, Arte&Números, Eco&Artes e Arte&Ação. “Além do reforço de conteúdos disciplinares básicos, queremos melhorar a auto-estima desses jovens, incentivar o protagonismo juvenil e valorizar competências como a do trabalho

conteúdos trabalhados em sala de aula fazem parte do dia a dia”, diz Ana. O Carbono Nosso de Cada Dia foi o título usado para que os alunos entendes-sem que o CO2 proveniente da queima de combustíveis, principalmente de derivados do petróleo e carvão mineral, é sequestrado no processo da fotossín-tese das plantas, transformando-se em

teúdos de mecânica e termodinâmica, e discutiram procedimentos e atitudes, construindo placas de sinalização. “Partilhamos conhecimentos e infor-mações científicas, relacionando-os a experiências e observações cotidianas dos alunos sobre o trânsito”, diz Londe-ro. Os jovens participaram da Semana Nacional do Trânsito, em parceria

e capacitamos, em seis meses de aulas diárias, 24 jovens do ensino médio para produzir material imagético sobre suas comunidades. O resultado foi uma exposição com 50 fotos, a produção de sete documentários e a Associa-ção Novo Olhar, formada por jovens participantes do projeto”, diz Glauber Xavier, sócio fundador do grupo. O viés

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metas. “As atividades acontecem no contraturno porque o objetivo é auxiliar os alunos com defasagem, mantendo-os por mais tempo na escola, com atividades diferenciadas”, diz. Estão envolvidos no projeto 15 professores das áreas de matemática, ciências da natureza, linguagem e códigos, e ciências humanas.

glicose e, depois, celulose. “O mesmo carbono se transforma o tempo todo dentro de um ciclo. Isso é ser reno-vável”, explica. Os alunos assimilaram a lição com visitas ao bairro, em uma região de cerrado. Plantaram árvores, coletaram óleo usado e produziram sabão, que venderam na Feira da Bar-ganha, tradicional na cidade. Na feira,

com a ONG Vida Urgente, e acabaram premiados no Concurso Denatran de Educação no Trânsito. A metodologia adotada pelo professor fez com que muitos conteúdos da física, “odiados” pelos alunos, fossem percebidos como úteis para a vida deles, facilitando seu aprendizado. O professor de química aproveitou para trabalhar os com-

multidisciplinar está nas capacitações e palestras que relacionam temas como comunicação, cultura, cidadania, ecologia, ética, antropologia, história do Brasil e de Alagoas, entre outros. “A interdisciplinaridade deve ser ine-rente a qualquer projeto educacional na contemporaneidade, pois, além de as crianças e jovens de hoje estarem

artesanal e a do uso de tecnologias de informação e comunicação, como al-ternativas para gerar renda”, diz Cláu-dia. O tema ambiental será enfatizado e trabalhado de forma multidisciplinar. A produção de uma revista, a encena-ção de uma peça teatral e a criação e comercialização de produtos feitos de material reciclável são algumas das

divulgaram as informações discutidas na escola, e o dinheiro apurado foi para o programa SOS Mata Atlântica. Na base, os conteúdos de química: hidro-carbonetos, combustíveis, reações de combustão, efeito estufa. “Informações foram transformadas em conhecimento, pois houve vivência prática dos temas trabalhados em sala de aula”, diz Ana.

bustíveis, e a professora de português investiu na linguagem visual das placas de sinalização. “Conseguimos modificar a cultura presente na escola do traba-lho exclusivo de conteúdos presentes em livros e, muitas vezes, apenas de memorização de equações e tabelas”, diz Leandro, atualmente concluindo seu doutorado em São Paulo.

imersos na cultura das mídias, não estão dispostos a gastar tempo pensando em coisas sem significado para suas vidas”, diz. Um desafio do projeto para 2009 é a realização do 1o Festival Olhar Circular de Cultura Livre (www.olharcircular/festival.php), evento colaborativo para divulgar a produção de realizadores independen-tes e projetos inclusivos.

proJEto o carbono nosso dE cada diaÁrEa dE atUação são carlos, spproposta com base no conhecimento do meio, despertar nos alunos a consciência de que os conteúdos de química trabalhados em sala de aula fazem parte de seu dia-a-dia.JovEns atEndidos 75apoio Escola Estadual aracy leite pereira lopescontato [email protected]

proJEto GraElÁrEa dE atUação rio dE JanEiro (rJ)rEsUmo da proposta projeto que pretende, pelo ensino do iatismo, formar o jovem tanto de forma técnica quanto cidadã. Há formação para o mercado náutico e aulas complementares de geografia e marcenaria, além de apoio psicológico.nÚmEro dE JovEns atEndidos 350 por semestreprincipais apoiadorEs criança Esperança, instituto oi Futuro, supermercado Wal-mart, companhia de Gás cEG. contato www.projetograel.com.br, tel.: (21) 2711-9875

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proJEto olHar circUlarÁrEa dE atUação alaGoasproposta Fortalecer os jovens e suas comunidades, utilizando a arte e as tecnologias da informação e da comunicação como agentes educacionais e mobilizadores.JovEns atEndidos 24apoio programa novos brasis do instituto oi Futuro, programa bnb de cultura e prêmio parcerias do instituto interage.contato [email protected]

proJEto EXcElênciaÁrEa dE atUação itatiba, spproposta combater a evasão e a repetência no ensino médio.JovEns atEndidos Em fase experimental, 40 alunosapoio instituto Unibanco, por meio do concurso “o desafio do Ensino médio – como Evitar que os Jovens abandonem a Escola?”contato [email protected]

proJEto EdUcação para o trânsito: a contribUição da FísicaÁrEa dE atUação rio GrandE do sUlproposta inserção da educação no trânsito em aulas de física do ensino médio.JovEns atEndidos 126apoio premiação no concurso denatran de Educação no trânsitocontato [email protected]

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InterdIscIplInarIdade e hIstórIa

que estejam. Já no ensino, a inter-disciplinaridade depende da atitude cognitiva do professor e do aluno com a realidade. Mas o verdadeiro ensino é interdisciplinar. Olga Pombo afirma que a interdisciplinaridade é algo que necessariamente fazemos, ou devemos fazer, e, portanto, não depende apenas de um projeto vo-luntarista (2004, p. 20). Não se age interdisciplinarmente só por decisão, mas por necessidade que surge do processo educacional. Não fazemos interdisciplinaridade apenas porque usamos o termo, mas porque agimos conforme os padrões que a educação atual exige.

A noção de interdisciplinaridade é recente. Não é um conceito claro, distinto e, por isso, consolidado. Ela nasce como um fenômeno consta-tado por diversos autores, filósofos e cientistas, a partir da segunda me-tade do século 20. Nos últimos ses-senta anos, realizaram-se congressos e seminários, foram escritos livros e artigos, e também foram realizadas experiências interdisciplinares em diversas partes do mundo, em todos os níveis de ensino: do ensino fun-damental até universidades (PAVIANI, 2008). Entretanto ainda não temos um conceito de interdisciplinaridade acessível e aceito universalmente pela comunidade científica e edu-

A educação, fenômeno mais abrangente do que ensino e aprendizagem, escola e formação profis-sional, é por natureza multi e interdisciplinar. Toda formação que envolve conhecimentos, habilidades, competências, valores, condutas, ideias, crenças re-quer a cooperação e a integração de disciplinas e de práticas escolares. O conceito de educação remete a um sentido de totalidade e, nessa perspectiva, vai além da setorização dos conhecimentos e das ações pedagógicas. Por isso, examinar as relações entre educação e interdisciplinaridade não é nada mais do que explicitar as modalidades de inter-relação que, nos processos educativos e pedagógicos, ocorrem entre as disciplinas e as práticas escolares.

A interdisciplinaridade na pesquisa é natural, pois o cientista resolve um problema científico buscando os conhecimentos e os métodos adequados onde quer

A NATUREZA DA EDUCAÇÃO

Por _ Jayme Paviani

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a FraGmEntação disciplinar é circUnstancial, pois EdUcar rEmEtE sEmprE a Um sEntido dE totalidadE

cacional, sem objeções e críticas. A interdisciplinaridade é apontada, às vezes, apenas como um sintoma escolar das deficiências da educação. O uso polêmico do conceito, todavia, não impede que se reflita sobre a questão para a qual ele aponta.

Nomes e conceitosA questão fundamental da interdis-

ciplinaridade está na compreensão do conceito de disciplinaridade. O simples uso de prefixos como pluri ou multi, inter, intra e trans não es-clarece o problema da fragmentação do conhecimento e do surgimento de novas disciplinas. As disciplinas são arranjos pedagógicos e científicos que resultam da sistematização de conhe-cimentos, às vezes, fundada em cri-térios epistemológicos, outras vezes, em critérios político-administrativos das instituições de ensino e, ainda, em outras ocasiões, em critérios de política econômica. Portanto, tendo

como base a validade desses pressupostos, a interdisci-plinaridade não tem o objetivo de dissolver as disciplinas, ao contrário, quer valorizá-las no exato sentido de que os limites entre elas são flexíveis e variam com o desenvol-vimento do conhecimento e da educação. Uma disciplina completa a outra, é apenas uma parte de um todo e, por isso, uma requer a integração na outra, a cooperação entre os professores. Língua portuguesa, por exemplo, é assunto do professor de português, mas também de todos os outros, pois o fenômeno da linguagem é co-mum e universal à vida e aos conhecimentos. O mesmo se pode afirmar da matemática, ou de qualquer outra disciplina. As disciplinas desenvolvem-se com base na troca de conceitos, de teorias e métodos entre elas.

Para entender o conceito e a ação interdisciplinar, é necessário conhecer a história da formação das disciplinas, desde o ensino na Academia de Platão e no Liceu de Aristóteles até o fantástico número de disciplinas existentes numa grande universidade hoje. A fragmentação do conhecimento em disciplinas é, ao mesmo tempo, uma necessidade natural e também um problema político-administrativo ligado aos interesses corporativistas. Portanto a autonomia das disciplinas é relativa às necessidades da educação do cidadão e do profissional. is

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esteve muito presente na minha formação, pois cursei o ensino médio integrado ao curso técnico de edificações, no Cefet Minas Gerais. Então a proposta já era relacionar áreas de conhecimento. E isso acontecia na sala de aula e também nos eventos extras como a Semana Cultural, que integrava assuntos de português, história e geografia, por exemplo, e na Semana Nacional da Ciência e Tecnologia que a escola adotou, integrando disciplinas de exatas. Na própria pesquisa com a qual venci o Prêmio Jovem Cientista 2007, eu usei essa prática, utilizando conhecimentos da biologia, da microbiologia, da história, da área de edificações, além de informações da comunidade em que o projeto foi aplicado e conhecimentos da minha experiência pessoal. O projeto, desenvolvido com uma colega, foi a construção de um concentrador solar, feito de garrafas pet e outros materiais recicláveis, para a desinfecção da água. Pesquisamos as condições sanitárias e de escolaridade de uma comunidade próxima de um rio. O produto final, além do concentrador, foi uma cartilha educativa sobre os riscos de um rio poluído, os cuidados sanitários e um passo-a-passo

Sem clareza sobre o estado da ciência hoje, do desenvolvimento tecnológico e das novas possibili-dades pedagógicas decorrentes da situação atual, é difícil perceber que ações interdisciplinares podem ser praticadas. Em vista disso, o agir e o fazer interdisciplinar exigem o aten-dimento de requisitos. Entre eles, podem-se mencionar as transfor-mações nos modos a) de produzir ciência; b) de perceber a realidade social e histórica; c) de proceder nas relações político-administrativas das instituições escolares e científi-cas; d) de entender a clara exigência de se desfazerem a rigidez, a arti-ficialidade e a falsa autonomia das disciplinas; e) de cooperação e de boa vontade dos professores para trabalhar em conjunto.

Finalmente, é preciso registrar que o agir e o fazer interdisciplina-res são múltiplos, pois existem mo-dalidades diferentes de praticá-los. A prática da interdisciplinaridade no ensino fundamental e no ensino médio não pode ser a mesma dos cursos de graduação e de pós-graduação, apesar da existência de processos comuns. Em cada caso, torna-se necessário considerar as variáveis próprias de cada situação. E, igualmente, o grau de criatividade que ela exige e suporta.

para a construção do aparelho. O prêmio, um computador com impressora, é ótimo porque a interdisciplinaridade tem na Internet uma grande ferramenta que abre todas as portas para relacionar e integrar conhecimentos.”

Júlia soares parreiras,19 anos,estudante de psicologia na UFMG, conquistou o 1º lugar na categoria Ensino Médio da última edição do Prêmio Jovem Cientista, como aluna do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais

a aprEndiZaGEm é Um problEma FilosÓFico, psicolÓGico, biolÓGico, sociolÓGico, HistÓrico, E todos os pEsQUisadorEs podEm contribUir para EsclarEcEr sEUs procEssos

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Jaime paviani é professor e coordenador do programa de pós-graduação em educação,

Mestrado, da universidade de caxias do sul. é autor

dos seguintes livros, entre outros, Problemas de

Filosofia da Educação e Interdisciplinaridade: conceitos e distinções

Padrão contemporâneoEntre os problemas educacionais,

merece uma atenção especial o da aprendizagem. Basta observar e analisar a literatura recente sobre o assunto para perceber que as con-tribuições para descrever e explicar o fenômeno da aprendizagem partem de diversas áreas do conhecimento. A aprendizagem é, ao mesmo tempo, um problema filosófico, psicológico, sociológico, biológico e histórico. Todos os pesquisadores podem con-tribuir para esclarecer os processos de aprendizagem, pois a produção do conhecimento não se faz de mo-dos isolados. Tudo está interligado. A especialização exige transversa-lidade. Não é mais possível que as decisões e as ações pedagógicas se realizem isoladamente, cada um com seus alunos, em sua hora e local definidos, sem saber o que acontece com os outros.

A interdisciplinaridade é o padrão dos projetos educativos atuais. Isso requer o entrecruzamento, bem entendido, das disciplinas escolares. Exige, igualmente, significados amplos e relevantes para os conteúdos disciplinares, pois, só expandindo a validade do “conteúdo” e da informação, é possível produzir o conhecimento desejado, a competência requerida. Aliás o verdadeiro procedimento interdisciplinar não separa conhecimentos de habilidades e de competências. Saber, por exemplo, distinguir, definir, classificar algo, identificar variáveis, analisar situações-problema, sinte-tizar, julgar e abstrair conceitos, construir argumentos, solucionar problemas, elaborar propostas etc. requer ao mesmo tempo domínio cognitivo, habilidades e competências.

Para completar essas observações, é possível sublinhar que o conceito de interdisciplinaridade exige um permanente esforço crítico e de colaboração. Não existem fórmulas nem modelos de interdisciplinaridade que podem ser repetidos de modo automático. Projetos e definições que exprimem meras intenções e desejos não são suficientes para um trabalho com resultados. As atividades interdisciplinares não se limitam a estabelecer arranjos e justaposições externas ao processo de aprendizagem. Ao contrário, exi-gem procedimentos detalhados e coerentes, próprios da lógica interna do ensinar e do aprender.

Referências• FAZENDA, I. Interdisciplinaridade:

história, teoria e pesquisa. São Paulo: Papirus, 2002.

• PAVIANI, J. Interdisciplinaridade: conceitos e distinções. Caxias do Sul: EDUCS, 2008.

• POMBO, O. A interdisciplinaridade: ambições e limites. Lisboa: Relógio D´Água Editores, 2004.

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InterdIscIplInarIdade escolar

Por _ Ivani FazendaIlustração _ Beto Uchoa, Tigone, Willmangraff

TEORIA FECUNDA, PRÁTICA DIFÍCIL

o conHEcimEnto acadêmico sobrE a intErdisciplinaridadE sE mUltiplica, mas sEUs EFEitos na Escola ainda são poUcos

Há trinta anos, quando iniciei meus estudos sobre interdisciplinaridade na formação de educadores, falar disso era um sacrilégio e, infelizmen-te, por desconhecimento de alguns, essa prática, embora fecunda, ainda é vista como difícil.

Certamente nestes dois atributos – fecunda e difícil – há um parado-xo. Fecunda porque hoje a Teoria da Interdisciplinaridade invade a academia – um espaço privilegiado de construção e disseminação dos conhecimentos que, de algum modo, beneficiarão as sociedades humanas. Fecunda produção teórica, porém difícil de ser implementada porque, infelizmente, o rito das cabeças de-formadas pelo acúmulo de conteúdos ainda impera.

No Brasil, essa produção ainda não é muito conhecida, o que reduz o produto a algumas experiências esparsas em algumas instituições, que somente agora atentam para seu valor. Embora as políticas públi-cas, em suas diretrizes, continuem apontando para a problemática da in-terdisciplinaridade, ignoram toda uma produção na área que coloca o Brasil como centro de referência mundial nas questões da interdisciplinaridade, reconhecido pela Unesco.

O que com isso queremos dizer é que, para viver a interdisciplinaridade, é necessário, antes de mais nada, conhecê-la, em seguida, pesquisá-

la, e posteriormente definir o que por ela se pretende, respeitando as diferenças entre uma formação pela ou para a interdisciplinaridade.

Outra questão é entender do que estamos tratando: de uma interdisciplinaridade profissional, científica ou escolar? Existem variações já pesquisadas para cada um desses aspectos. Existem cuidados que devemos ter ao trabalhar em cada dimensão. Trata-se de um conceito abrangente de significados e referências e, portanto, possível causador de equívocos em sua compreensão e consequente aplicação.

No Brasil, conceituamos interdisciplinaridade como uma nova atitude frente à questão do conhecimento, de abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato de aprender e dos aparentemente expressos, colocando-os em questão. Atitude que exige, consequentemente, uma profunda imersão no trabalho cotidiano, na prática.

A metáfora que subsidia a interdisciplinaridade, que determina e auxilia sua efetivação é a do olhar; metáfo-ra essa que se alimenta de natureza mítica diversa.

Na interdisciplinaridade escolar, cinco princípios subsidiam a prática docente: humildade, coerência, espe-ra, respeito e desapego. E alguns atri-butos são próprios a esses princípios, os determinam ou identificam. São eles a afetividade e a ousadia, que impelem às trocas intersubjetivas, às parcerias.

A interdisciplinaridade pauta-se por uma ação em movimento. Esse movimento pode ser percebido em sua natureza ambígua, tendo a metamorfose, a incerteza como pressuposto.

Todo projeto interdisciplinar com-petente nasce de um locus bem delimitado; portanto é fundamental contextualizar-se para poder conhe-cer. A contextualização exige uma recuperação da memória em suas diferentes potencialidades, envolven-do então o tempo e o espaço no qual se aprende.

A análise conceitual facilita a com-preensão de elementos interpretativos do cotidiano. Para tanto, é necessário compreender-se a linguagem em suas diferentes modalidades de expressão e comunicação; uma linguagem refle-xiva, mas sobretudo corporal.

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amadurecimento intelectual e prático, uma aquisição no processo reflexivo que vai além do simples nível de abstração, mas demanda uma devida utilização de metáforas e sensibilizações.

Os fundamentos conceituais advindos dessa capaci-dade adquirida influirão na maneira de orientar tanto a pesquisa como a intervenção do professor-pesquisador que recorrer à interdisciplinaridade.

Os estudos mostram que uma sólida formação da interdisciplinaridade encontra-se extremamente aco-plada às dimensões advindas de sua prática em situ-ação real e contextualizada. Conhecer o lugar de onde se fala é condição fundamental para quem necessita investigar o como proceder, ou o como desenvolver uma atitude interdisciplinar na prática cotidiana.

Da ação à teoriaA trilha interdisciplinar caminha do ator ao autor de

uma história vivida; de uma ação conscientemente exercida a uma elaboração teórica arduamente cons-truída. Tão importante quanto o produto de uma ação exercida é o processo – e, dentro dele, o movimento desenhado pela ação. Somente ao pesquisarmos os movimentos das ações exercidas será possível deli-nearmos seus contornos e seus perfis.

O movimento ambíguo de uma pesquisa ou de uma didática interdisciplinar sugere a emergência e a confluência de outros movimentos, porém é impe-rioso que o movimento inicial se explicite, se mostre adequadamente. O que com isso queremos dizer é: novos movimentos, nascidos de ações e práticas bem-

sucedidas, geram-se em movimen-tos anteriores. Somente é possível analisá-los e conhecê-los quando investigamos seus elementos de origem. Negar o velho, substituindo-o pelo novo é um princípio oposto a uma atitude interdisciplinar na di-dática e na pesquisa em educação. A pesquisa interdisciplinar parte do velho, analisando-o em todas as suas potencialidades. Negar o velho é uma atitude autoritária que impossibilita a execução de uma didática e de uma pesquisa interdisciplinar.

Essa recorrência ao velho traves-tido do novo decorre do recurso e exercício da memória. Dupla forma de memória: a memória-registro, es-crita, impressa e ordenada em livros, artigos, comunicados, anotações de aulas, diários de classe, resumos de cursos e palestras, fotos e imagens, e a memória explicitada, falada, so-cializada, enfim, comunicada.

Ambas as formas ou recursos da memória permitirão a ampliação do sentido maior do homem – a comunica-ção. Esta, quando trabalhada, permitirá uma releitura crítica e de perspectiva múltipla dos fatos ocorridos nas prá-ticas docentes, que poderão ajudar a compor histórias de vida de profes-sores, vidas que, cuidadosamente analisadas, poderão contribuir para a revisão conceitual e teórica da didática e da educação.

Tão importante quanto o exercício da memória é o exercício da dúvida. Se nossa intenção é revelar e explicitar o homo loquens – aquele que comunica –, teremos que ativar o mecanismo anterior e antropológico que o cons-titui – o do homo quaerens – do homem que pergunta e da situação específica de seu ato de perguntar. O homo quaerens constitui-se numa das últimas especificidades do ser racional homem, pois quanto mais se evolui na investigação do homem como ser reflexivo, mais nos aproximamos de nossos antepassados e de suas pri-meiras perguntas. Tanto a pergunta mais imediata, suscitada no porquê, quanto em sua sequencialidade, mas por que, aspiram a uma compreensão última ou total, interdisciplinar do conhecimento.

No início do século 21 e no contexto da internacionalização, caracterizada por uma intensa troca entre os ho-mens, a interdisciplinaridade assume um papel de grande importância. Além do desenvolvimento de novos saberes, a interdisciplinaridade na educação favorece novas formas de aproximação da realidade social e no-vas leituras das dimensões sociocul-turais das comunidades humanas.

A formação na educação da, pela e para a interdisciplinaridade se impõe e precisa ser concebida sobre bases específicas, apoiadas por trabalhos desenvolvidos na área, trabalhos esses referendados em diferentes ciências que pretendem contribuir para desde as finalidades particula-res da formação profissional até a atuação do professor. A formação da interdisciplinaridade (enquanto enunciadora de princípios), pela inter-disciplinaridade (enquanto indicadora de estratégias e procedimentos) e para a interdisciplinaridade (enquanto indicadora de práticas na intervenção educativa) precisa ser realizada de forma concomitante e complementar. Exige um processo de clarificação conceitual que requer um alto grau de

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o concEito dE intErdisciplinaridadE como Uma nova atitUdE FrEntE À

QUEstão do conHEcimEnto EXiGE Uma proFUnda imErsão na prÁtica EdUcativa

Ângulo 2

Uma educação ou uma didática interdisciplinar fun-dada na pesquisa compreende que o importante não é a forma imediata ou remota de conduzir o processo de inquirição, mas a verificação do sentido que a pergunta contempla. Nesse processo interdisciplinar, é necessá-rio aprendermos a separar as perguntas intelectuais das existenciais. As primeiras conduzem o homem a respostas previsíveis, disciplinares; as segundas trans-cendem o homem e seus limites conceituais, exigem respostas interdisciplinares. O saber perguntar, próprio de uma atitude interdisciplinar, envolve uma arte cuja qualidade extrapola o nível racional do conhecimento. Em nossas pesquisas, tratamos de investigar a forma como se pergunta e se questiona em sala de aula, e a conclusão mais genérica e peculiar revela-nos a impor-tância do ato e da forma como a dúvida se instaura – ela será a determinante do ritmo e do contorno que a ação didática contemplará.

A pesquisa e a didática interdisciplinar tratam do mo-vimento (do dinâmico), porém aprendem a reconhecer o modelo (o estático); tratam do imprevisível (dinâmico), porém no possível (estático); tratam do caos (dinâmico), mas respeitam a ordem (estático).

A possibilidade de um trabalho de natureza inter-disciplinar nas pesquisas sobre sala de aula anuncia-

nos possibilidades que antes não eram oferecidas. Quando isso acontece, surge a oportunidade de

revitalização das instituições e das pessoas que nelas trabalham. O processo interdisciplinar desempenha um papel decisivo no sentido de

dar corpo ao sonho, o de fundar uma obra de educação à luz da sabedoria, da coragem e da humildade.

Planejamento e imaginaçãoNas questões da interdisciplinaridade, é

tão necessário e possível planejar quanto imaginar. Isto impede que possamos prever

o que será produzido, em que quan-tidade ou intensidade. O processo de interação permite a geração de entidades novas e mais fortes, poderes novos, energias diferentes. Caminharemos nele na ambiguida-de, entre a força avassaladora das transformações e os momentos de profundo recolhimento e espera.

O cuidado primeiro que se deve ter é o de encontrar-se o ponto ótimo de equilíbrio no movimento engendrado por essa ambiguidade: da imobilidade ao caos. As fontes novas de saber vivenciadas no conhecimento inter-disciplinar permitem-nos facilmente reconhecer que a estrutura na qual vivemos é reflexo de outras épocas, gestadas no passado. Sentimo-nos tolhidos, nesse processo, em exer-cer o imperativo de ordens que não nos pertencem, de valores que não desejamos, e nosso primeiro impul-so é rompermos com ela. Porém o processo de metamorfose pelo qual passamos e que fatalmente con-duzirá a um saber mais livre, mais nosso, mais próprio e mais feliz é um processo lento, exige uma atitude de espera, não uma espera passiva, mas vigiada. Alterar violentamente o curso dos fatos não é próprio de uma educação que abraça a interdiscipli-naridade. Ela exige que se prove aos poucos o gosto que tem a paixão por

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prIscIla olIveIra costa,17 anos,

estudante do ensino médio na Escola de Educação Básica Embaixador Espedito Resende, em Teresina

(PI), 2º lugar no 23º Prêmio Jovem Cientista

“A escola em que estudo tem um perfil totalmente diferente do das escolas públicas que fizeram parte da minha pesquisa sobre violência escolar, trabalho que inscrevi no Prêmio Jovem Cientista do ano passado e que me deu o segundo lugar na categoria Ensino Médio. Naquelas escolas, de uma comunidade de baixa renda, não há engajamento entre professor e aluno. No primeiro dia de aula, se o aluno não gosta do professor por algum motivo, isso vira um atrito que impede o aprendizado e gera

de, no sentido de que esse procedimento rejeita a mediocridade das idéias, estimula a vitalidade espiritual, é radicalmente contrário ao hábito ins-taurado da subserviência, pois reconhece que o mesmo massacra as mentes e as vidas. A lógica que a interdisciplinaridade imprime é a da invenção, da descoberta, da pesquisa, da produção científica, porém gestada num ato de vontade, num desejo planejado e construído em liberdade.

Ivani catarina arantes Fazenda é professora titular da pós-graduação em educação / currículo da puc de

são paulo, onde coordena o GepI – Grupo de estudos e pesquisas em

Interdisciplinaridade (www.pucsp.br/gepi), credenciado no cnpq e

na Unesco. Mestre em Filosofia da educação, doutora em antropologia,

presidente do Fórum paulista de pós-graduação em educação, é

autora de vários livros sobre o tema

agressões de todo tipo. Geralmente, nem o aluno, nem seus pais, nem o professor, nem a direção da escola dão atenção ao problema. E as aulas continuam com o professor falando lá na frente, sempre do mesmo jeito, e com o aluno conversando lá atrás, sem o menor interesse. No meu colégio, se isso acontece, professor e aluno são chamados pela direção da escola para esclarecer a situação. Se necessário, os pais também entram na história. O núcleo escolar é engajado. Os professores ensinam as disciplinas de maneiras variadas, usando audiovisuais, laboratório, seminários. Temos os Grupos de Protagonismo Juvenil para realizar pesquisas científicas sobre temas regionais. O aluno aprende sem ficar entediado, porque participa de tudo. Nas escolas que pesquisei, como nas escolas públicas em geral, a gente encontra professor bom, que tem amor ao ensinar. Acho que eles fazem a diferença para mudar a realidade do ensino, mas também depende da direção da escola e ainda do interesse dos pais pelo que o filho faz na escola. Esse conjunto todo tem que funcionar para uma escola ser boa. E pode ser. Este ano, no vestibular para a Universidade Estadual do Piauí, 62% dos aprovados foram alunos de escola pública. São jovens que estão conseguindo mudar sua realidade escolar.”

formar, até nos embebedarmos dela, no entanto o sentido que um trabalho interdisciplinar desperta, e para o qual não estamos preparados, é o da sabedoria, de aprender a intervir sem destruir o construído.

Decorrente deste cuidado, um outro se faz necessário na elabo-ração de princípios mais coerentes com essa atitude: num processo interdisciplinar, é preciso olhar o fenômeno sob múltiplos enfoques. Isto vai alterar a forma como ha-bitualmente conceituamos. Não estamos habituados a questionar ou investigar conceitos.

Numa dimensão interdisciplinar, um conceito novo ou velho que aparece adquire apenas o encantamento do novo ou o obsoleto do velho. Para que ganhe significado e força, ele precisa ser estudado no exercício de suas possibilidades. Esse exercício nós, educadores, ainda estamos por viver. Geralmente cuidamos da forma, sem cuidarmos da função, da estética, da ética, do sagrado que colore o cotidia-no de nossas proposições educativas ou de nossas pesquisas.

Os cuidados anteriormente enun-ciados, quando analisados em sua po-tencialização, certamente alterarão o conceito macro de ser professor. Gradativamente, precisamos nos habituar ao exercício da ambiguida-

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o sujeito da frase

“SONHO COM ESCOLAS MAIS ATENTAS À REALIDADE”

o Jornalista caco barcEllos, QUE oriEnta JovEns no proGrama dE tv “proFissão: rEpÓrtEr”, não vê intEGração da Escola com a vida dos EstUdantEs

O gaúcho Caco Barcellos é um exemplo de vitória pelo esforço. Nascido numa comunidade pobre de Porto Alegre, 59 anos atrás, ele transformou-se num dos mais res-peitados jornalistas brasileiros, com uma trajetória marcada pela ética e qualidade no trabalho. Repórter investigativo, forjado na ditadura militar, foi correspondente internacio-nal, e autor de livros como “Rota 66, a história da polícia que mata”, um impressionante levantamento sobre a tropa de combate da polícia de São Paulo que o obrigou a sair do país, sob ameaças de morte. Caco recebeu mais de 20 prêmios jornalísticos, entre eles uma distinção especial das Nações Unidas, como um dos cinco jornalistas que mais se destacaram, nos últimos 30 anos, na defesa dos direitos humanos no Brasil. Hoje, toda essa experiência orienta jovens profissionais, no programa jornalístico “Profissão: repórter”, da TV Globo. Caco conversou com a revista, sobre suas experiências formadoras.

Onda Jovem: Em qual escola você cursou o Ensino Médio? Quais são suas principais recordações desse período?

Caco Barcellos: Estudei em escola pública a minha vida inteira e sou eternamente grato a Leonel Brizola, porque me beneficiei de sua aposta na educação. Nasci numa família simples de Porto Alegre, e só pude ir para o colégio aos 8 anos de idade. Aprendi a ler sozinho, por meio de

placas, com a ajuda da minha irmã. A escola, feita pelo Brizola, era de madeira, mas já no conceito de período integral. Ganhei, assim, noções de cidadania, alimen-tação de qualidade e material – lá recebi meu primeiro caderno. O ensino médio foi cursado na Escola Júlio de Castilhos, o Julinho, no centro da cidade. Tive professo-res interessantíssimos, que infelizmente terminaram, muitos deles, cassados pela ditadura militar. Os últimos dois anos foram péssimos, com professores ligados à ditadura, informantes do regime, etc.

Você teve algum professor, no Ensino Médio, que influenciou sua escolha profissional? Como se deu essa influência?

A grande influência foi de Ruy Carlos Ostermann, comentarista esportivo famoso no mundo inteiro e, na minha época de colégio, professor de filosofia bri-

lhante. Fiz cursinho pré-vestibular, e ele era um professor-artista, com narrativa muito talentosa, eloquente. Ficava fascinado, nas aulas que ele dava, com o raciocínio e a oratória dele. É a referência mais forte que tenho. Por coincidência, no primeiro jornal em que trabalhei, a “Folha da Manhã”, ele era diretor de redação. Foi muito marcante, um ídolo que, para minha sorte, pude conhecer no dia a dia do trabalho, à frente de um grupo interessante de jornalistas, profissionais jovens e talentosos, que passaram por São Paulo e Rio. Eles formaram uma equipe que tive a sorte de integrar.

Por _ Aydano André Motta

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caco barcellos compartilha sua experiência com jovens jornalistas: “a autoridade é um mérito que nasce do cotidiano”

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Que tipo de jovem você era no Ensino Médio: rebelde, estudioso, alheio...? Como você se relacionava com o restante da escola?

Tinha sido mais estudioso antes, era muito cuidadoso com lições de casa, adorava estudar. No antigo gi-násio e no que se chama hoje Ensino Médio – à minha época, científico –, eu trabalhava e estudava. Minha lembrança é de um curso cansativo, feito à noite. Tinha virado rebelde, meus amigos mais maduros haviam entrado na luta política, e fiquei com aquela revolta comum aos jovens mais politizados, que quase viram as costas para o sistema todo. Perdi o encanto, porque, por causa da repressão, a escola virou referência de medo e indignação. Cheguei a ser preso na escola, e passei uma noite na cadeia, após uma manifestação estudantil em frente ao Julinho. Na verdade, o processo decisivo veio não de um professor, mas de um colega, que sentava ao meu lado na sala. À época, eu gostava de escrever crôni-cas, sem saber que aqueles textos tinham esse nome. Saía com meu cachorro vira-latas pela rua e depois, botava no papel meus pensamentos e impressões. Não tinha coragem de mostrar para ninguém, mas um dia, esse colega leu. “Cara, como você esconde esse negócio aqui? Você tem que ser escritor”. Foi a primeira referência que tive de outra profissão. E olha que no dia anterior tinha tirado 2,5 em português. Fiquei muito feliz e continuei escrevendo. Talvez tenha sido a mais importante influência para, um dia, eu virar jornalista.

para barcellos, a escola precisa se abrir mais. “o jovem acaba não se identificando, acha que estudar é só uma obrigação”, diz

A escola atendia suas necessida-des como jovem?

Atendeu muito bem, afinal, havia movimento estudantil forte, do qual foi importante ter participado. Não atendeu, entretanto, em relação à graduação, ao ensino propriamente dito. Mas tive oportunidade de conhe-cer jovens de todas as classes, numa convivência transformadora, que per-mitiu a descoberta da realidade longe do meu bairro. Foi muito rico.

Quais foram os primeiros sinais de sua vocação? Eles apareceram ainda no colégio? Você chegou a trabalhar em jornais estudantis?

Não. Só na faculdade de Matemática, a primeira que fiz. Um dia, o centro acadêmico quis fazer um jornal, convocou voluntários e fui o único da Matemática que apareceu para escrever. Mais tarde, terminei por assu-mir o jornal e chamei um grupo de fora da faculdade, hippies, para me ajudar. Foi outra influência forte, porque virei hippie junto com eles.

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E fora da escola? Que adultos influenciaram suas decisões em relação à profissão?

Sem saber, tive influência da igreja progressista, que me deu ferramentas fundamentais para minha sobrevivên-cia, me ensinando uma meia dúzia de ofícios, como datilografia, primeiros socorros, encadernação de livros. E me apresentou livros essenciais, de filoso-fia, que me despertaram o prazer da leitura. Autores como Nietzsche, Scho-penhauer, Rosa Luxemburgo, e temas como o materialismo dialético. Enfim, as ferramentas básicas para interpretar a realidade. Lembro também do que um padre me disse, em relação ao medo, quando eu era muito perseguido. “Por que vocês correm?” perguntou ele, uma vez, em que fugíamos da polícia. “Não faz sentido, eles são empregados de vocês. Como podem ter medo? Até admito que, se eu for sozinho, vou ser maltratado. Mas experimentem juntar o bairro todo para protestar”. Um dia, nos mobilizamos em grupo e os policiais ficaram com medo. Daí, aprendi a usar a ferramenta da informação para vencer o medo. Naquela época, não tinha a noção de que delegacia de polícia era algo público. Até, hoje, sempre tento me informar o mais que posso para vencer os medos.

O que, na sua opinião, falta nas escolas em relação às necessidades dos jovens de hoje?

Não sou especialista, mas desejo e sonho com escolas mais atentas à realidade da vida do estu-dante. Uma escola mais aberta à integração com a família, que participe mais da vida do bairro. O Rio, por exemplo, tem jovens sendo exterminados de maneira muito cruel. O Brasil é o país onde mais se mata no mundo e a escola não parece participar desse processo de socorro a jovens em situação de risco. Precisa mais presença no cotidiano, sem ficar presa somente à questão da formação cultural, que, claro, também é importante. O jovem acaba não se identificando, acha que estudar é só uma obrigação. Tenho filho adolescente, e outro dia fiquei impres-sionado com um professor dele, chamado Baroni. Na aula, quando jogavam bolas de papel pela janela, ele ia buscar e devolvia, para continuarem jogando. Usava isso pedagogicamente. Quando foi demitido, houve paralisação e manifestação dos alunos em protesto. Era uma convivência produtiva com a re-beldia, e a escola não entendeu o processo. Preferiu investir no professor que não conquista a adesão do aluno na aventura do saber. Uma pena.

Quando você fez o Ensino Médio havia uma preo-cupação com a interdisciplinaridade, com a conexão dos conteúdos entre si e com o mundo? Ou vigorava aquela dúvida que acompanha os jovens: “por que estou aprendendo isso”?

Eu adorava matemática, mas me perguntava para que aquelas equações que tomavam a lousa inteira. Foi o que me levou a abandonar a Engenharia, que tentei por ser bom em matemática. Lembro em especial de um professor que, toda aula, escrevia em silêncio uma imensa equação. Se você falasse qualquer coisa em sala, ele ficava parado, congela-do, até o silêncio imperar novamente. Um dia, ele me chamou lá na frente; peguei o giz e comecei a escrever como ele, em silêncio, e, quando alguém riu, parei, exatamente como ele fazia. Fui expulso de sala, e decidi que não via sentido naquilo.

Fazer essas conexões com a vida lá fora é uma função da escola, na sua opinião?

Acho que sim. A escola precisa se voltar para a formação profissional. É fundamental. O processo dos adolescentes é sofrido, uma fase da vida em que você está perdido e tem de tomar decisões impor-tantes. Começo, aliás, a questionar a importância da faculdade. Não vejo tanto sentido, especialmente por causa das faculdades que ven-dem diploma, sem preocupações acadêmicas, apenas pelo status da graduação. E a sociedade im-põe a necessidade radical de ter o diploma. Alguns países da Europa já valorizam mais os cursos técnicos. É algo que precisamos debater.

Hoje, você é um professor também, que ajuda a formar profissionais, no “Profissão: repórter”. Como você trabalha essa influência? Em que medida ela deve acontecer?

Não acho que sei nada. Tenho, sim, experiência que tem importân-cia. Mas cada reportagem envolve uma história, não há fórmula para fazê-la. Uma frase pode mudar tudo, tornar aquilo completamente novo. Quem sabe, no fundo, é quem está ali, fazendo a reportagem. Procuro, assim, oferecer o exemplo, não o discurso. Eu me envolvo em todas as reportagens do programa, e deixo claro que ganha mais espa-ço quem estiver mais empenhado em produzir uma matéria de quali-dade. Se forem eles, e não eu, eles ganham. Tenho consciência de que minha experiência é importante, mas se eu parar no tempo, vou perder. O jornalismo é um ofício de exercício permanente. A postura de empenho constante ajuda a democracia a ficar mais bem posta e o espaço de líder não me habilita a garantir a espaço por si só. O que vai decidir é o que eu trouxer da rua. Assim, o sistema torna-se mais justo. A autoridade é um mérito que nasce do cotidiano, e ajuda a nos manter vivos. Tenho uma certeza: se eu parar, me estagnar, eu perco.

“dEsEJo Uma Escola mais abErta À intEGração com a Família, QUE participE mais da vida do bairro.”

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CONVOCAÇÃO Por _ Roberto Amado

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CONVOCAÇÃO

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a abordaGeM InterdIscIplInar Favorece e reForça açÕes de GestÃo partIcIpatIva na escola

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Não faz muito tempo, a escola era sinônimo de disciplina, obediência e comportamento padronizado. Aos alunos, cabia exclusivamente prestar atenção nas aulas e permanecer em silêncio, a não ser para fazer perguntas pertinentes. Mas os tempos muda-ram, e o ensino médio, em especial, vem sendo desafiado a oferecer uma possibilidade preciosa para jovens entre 15 e 18 anos: a de participar.

são a melhor maneira de se conhecer a realidade e de atender aos anseios dos jovens por autenticidade”, diz He-loísa Lück, doutora em educação pela Columbia University em Nova York, diretora educacional do Centro do Desenvolvimento Humano Aplicado, em Curitiba, e autora de vários títulos ligados à participação educacional e interdisciplinaridade.

“Nosso foco é o princípio da gestão democrática e participativa. E envolve não só os alunos como, também, pais, professores e funcionários”, diz Maria Auxiliadora Seabra Resende, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), associação que congrega e integra as secretarias de educação de todos os Estados. Preocupado com a qualidade do ensino público, o Consed elabora projetos di-versos com essa finalidade e promove o Prêmio Nacional de Referência em Ges-tão Escolar, em parceria com empresas e outras entidades. Os prêmios do ano passado destacaram seis escolas públicas de diferentes Estados cujos projetos coincidiam em pelo menos um aspecto: a intensa participação dos alunos nas atividades educativas — conteúdo, eventos, gestão e, em alguns casos, até na manutenção das dependências físicas da escola.

Participação ampla, não só nas deliberações do processo educativo como, também, na própria gestão da escola. As experiências na área costumam ter resultados tão significativos que esta passou a ser uma tendência buscada e almejada por educadores. E a perspectiva interdisciplinar tem muito a contribuir para a abordagem participativa da educação juvenil.

“O ensino convencional oferece conteúdo fragmenta-do. Mas para conhecer a realidade dinâmica, é preciso saber como os conhecimentos se associam e interagem. O paradigma e a metodologia da interdisciplinaridade

GERAL

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A interdisciplinaridade é percebida como um recurso decisivo para convocar a uma maior participação dos alunos. No caso da Escola Frederico Rolla, por exemplo, foi levada aos jovens do ensino médio a proposta de fazer um estudo interdisciplinar, mas foram eles que decidiram o tema, o conteúdo e a execução, com a su-pervisão e a aprovação da diretora e dos professores. E aí entra mais um elemento importantíssimo: o espírito democrático da gestão.

“Se a sociedade passou e passa por um processo de democratização, é natural que a escola passe tam-bém. A implantação desses métodos de participação começou nos anos de 1980, juntamente com a abertura política”, diz Regina Inês Villas Boas Estima, pedagoga a serviço do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), organização de São Paulo que trabalha com políticas de educação pública. Dessa forma, ela justifica essa tendência de implantação de processos educacionais interdiscipli-nares e participativos que vem se manifestando no ensino público do País.

Sobre essa questão, Aparecido Roque da Silva não tem dúvida: a participação dos alunos é decisiva para se conquistarem índices de desempenho educacional muito melhores. Ele é diretor do Colégio Estadual Ante-nor Padilha, de Ivolândia, em Goiás e, no cargo há pouco mais de um ano, viu o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) subir cinco pontos, atingindo a meta prevista para 2015. No ano passado, os seus 115 alunos do ensino médio executaram 62 projetos interdisciplinares, envolvendo uma rádio interna, feira de ciências, jardinagem, reflorestamento e até futsal. Em cada um dos projetos, há sempre o envolvimento de professores de diversas matérias e os resultados são in-questionáveis. “Desse jeito, não há como não aprender”, diz Aparecido. Recentemente, o diretor organizou um mutirão entre alunos, professores, pais e funcionários para fazer uma reforma na escola. Todos se envolveram numa campanha para arrecadar recursos e, em quatro dias, promoveram as reformas necessárias – incluindo pintura, alvenaria e manutenção em geral.

Salto de qualidadeUm dos destaques do prêmio é a Es-

cola de Educação Básica Dr. Frederico Rolla, da cidade de Atalanta, em Santa Catarina. Conduzida nos dois últimos anos pela diretora Margaret Dalabene-ta, a escola deu um salto de qualidade importante graças à implantação de uma gestão democrática, pela qual os alunos participam das decisões, juntamente com os professores. O ambiente, que era péssimo, com des-contentamento generalizado e muitas reclamações, abrandou-se, dando lugar a um sentimento de equipe. Os resultados educacionais vieram com a participação dos alunos em projetos interdisciplinares. Como no estudo das culturas de milho, feijão e cebola, típi-cas da região. “Nesse trabalho, envol-vemos várias disciplinas: a história do desenvolvimento agrícola da cidade, as condições geográficas que permitem essas culturas e até o professor de matemática participou, falando sobre o mercado agrícola e finanças”, diz Margaret. “Nós procuramos trazer a realidade do aluno para a escola”.

o sUcEsso do Ensino participativo dEpEndE mUito da iniciativa tanto do proFEssor como do GEstor

A participação do aluno, no entanto, não pode substituir a função do Esta-do, alerta Aline Andrade, também pe-dagoga do Cenpec. “É preciso saber distinguir participação de ativismo”, sintetiza ela. Em outras palavras, mesmo em situações críticas, como a falta de recursos para fazer reformas necessárias, as atividades devem ser utilizadas com objetivo educacional. Ou seja, não apenas usar a força de trabalho dos alunos, mas também tirar proveito educacional dessa situ-ação. Por exemplo, dando-lhes cons-ciência sobre os motivos pelos quais não há recursos para a reforma e até mesmo ensinando-os a escrever uma carta para a autoridade responsável, solicitando esses recursos.

Ator e autorO exemplo vem da Escola Estadual

Professor Luiz Antônio Corrêa de Oli-veira, em Araxá, referência em Minas Gerais. Ali o processo de participação envolve todos os 1.430 alunos e, prin-cipalmente, as 19 turmas de ensino médio distribuídas nos três períodos do dia. Uma das características da escola, conduzida pela diretora Edna de Fátima Resende Campos, é o protagonismo juvenil. “Eu sempre digo aos meus alunos que eles de-vem parar de ser atores para serem autores”, diz ela. Isso significa, nas palavras de Edna, “tomar propriedade da escola”, não só decidindo e execu-tando projetos educacionais como, também, interferindo na comunidade e buscando aproximar-se da realida-de em que vivem.

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A diretora organizou três grupos de estudo, cada um com um tema e formado por equipes de professores e alunos. Os projetos sempre envolvem os três grupos, consolidando o proces-so interdisciplinar. É o que acontece, por exemplo, com o Coral Teatral Policantus, formado por alunos da escola e conhe-cido pelas apresentações que faz não só pelo Estado como, ainda, fora dele. No musical recentemente apresenta-do “Chapeuzinho Vermelho e o Lobo Guará”, os três grupos temáticos se envolveram no processo educacional, desenvolvendo conteúdos relacionados à peça — não só na área de música, como também literatura, português, história, geografia e ciências. E o mes-mo acontece com o livro que publicam todo ano, com poemas, artigos e textos literários produzidos pelos alunos. Os jovens se deixam envolver pela propos-ta de participação e se apaixonam pela escola. “Se deixar, eles não voltam para a casa”, conta Edna.

“Quando se oferecem projetos interdisciplinares, os alunos são le-vados a investigar, empregando uma variedade de processos mentais, o que se constitui em uma extraordinária fonte de motivação. A prática tem demonstrado que dessa forma os alunos canalizam suas energias para esse processo, aprendem sem limites e sentem satisfação em aprender e desenvolver seus talentos. Aliás, aju-dar os alunos a desenvolver os seus talentos é a maior responsabilidade da escola. Não é ensinar conteúdos frag-mentados, como se tivessem valor em si mesmos e dissociados da possibili-dade de sua identificação e aplicação na realidade”, diz Heloísa Lück.

E é nesse momento que se destaca a importância do papel do educador — tanto do gestor como do professor. “É um desafio individual que envolve o empenho pessoal dos professores em querer mudar o modo como ensinam e, coletivo, em definir uma metodologia comum de trabalho pela qual façam interagir suas áreas de conhecimento, nas práticas de ensino oferecidas aos alunos. É preciso ter a coragem de enfrentar uma nova perspectiva, mais desafiadora e, por-

a GEstão dEmocrÁticaE participativa convoca ao conHEcimEnto da rEalidadE E À sUa transFormação,atraindo os JovEns pEla intEGração EntrE tEoria E prÁtica

tanto, mais estimulante de trabalho”, diz Heloísa Lück. “A verdade é que o sucesso do ensino participativo depende muito da iniciativa do edu-cador. Não que a responsabilidade seja só dele, mas o envolvimento de gestores e professores é decisivo”, diz Anna Helena Altenfelder, gerente de Projetos Apoiados do Cenpec, confrontando a cultura do “tentei, mas não deu certo”.

“O professor que vê uma coisa de cada vez, não será capaz de praticar a interdisciplinaridade, mesmo que em sua escola adote-se um currículo or-ganizado para facilitá-la. Por exemplo, o professor que afirma que os alunos não aprendem porque não estudam, que as aulas não podem ser boas porque não dispõem de recursos tecnológicos, está dissociando o con-junto de fatos que interferem numa situação real e como uns elementos influenciam os outros. É preciso ques-tionar sobre como as coisas são, ou como podem ser diferentes e fazer investigações a partir da realidade. Integrar teoria e prática, o pensar e o fazer — do que, aliás, os jovens muito gostam”, diz Heloísa Lück.

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ciência

O TODO E AS PARTES

o cérEbro JUvEnil aprEsEnta Uma

FlEXibilidadE QUE mUltiplica sEUs

intErEssEs E Forma sEU modo dE aprEEndEr

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Flexibilidade, criatividade e senso-rialidade. Essas características mar-cantes dos cérebros de adolescentes e jovens deveriam ser exploradas por todos os professores e profissionais que trabalham especificamente com essa faixa etária, segundo o neurope-diatra Mauro Muszkat, coordenador do Núcleo de Atendimento Neuropsi-cológico Infantil Interdisciplinar (Nani), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Quem lida com jovens deveria colocar as informações de forma mais múltipla, aproximando-se bastante de suas motivações”, afirma ele. A colocação coincide com uma perspectiva mais orgânica, na edu-cação juvenil, da interdisciplinaridade, pela qual se busca a superação das limitações decorrentes da visão frag-Por _ Frances Jones

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mentada e estanque de quando se privilegia a divisão de disciplinas mais tradicional. “As formas de dialogar devem ser mais próximas de como o jovem percebe o mundo; atitudes mais professorais não funcionam.” Do mesmo modo que o amadureci-mento cerebral da criança determina estratégias específicas da educação infantil, a percepção do nível cognitivo dos jovens auxilia a compreensão de seu processo de aprendizagem. Ainda há muito que compreender sobre o desenvolvimento cerebral, que certamente não é linear, mas se sabe que o refinamento das es-truturas e funções cerebrais ocorre seguindo a direção da parte posterior do cérebro – em geral associada ao processamento sensorial – para a

parte anterior, ligada ao planejamento executivo. À medida que o cérebro amadurece, há um desenvolvi-mento maior das áreas simbólicas e o processamento de informações mais complexas. “O jovem precisa de muita acomodação entre o que vê no concreto e a sua imaginação”, explica Muszkat. “Quando o jovem sai do mundo só da experiência e vai para o das idéias, fica entre dois mundos.” Do ponto de vista biológico, diz ele, o pensamento mais conceitual passa a ser o dominante. Além disso, ele sai do mundo das emoções primárias para chegar ao dos sentimentos. É uma fase na qual é muito comum se transitar entre dois polos – o da hiperatividade e o da apatia.

Detalhamento e abrangênciaSegundo o neuropediatra, o cérebro sempre lida com

duas possibilidades principais na forma de processar as informações: a partir das sensações, ou a partir do pensamento abstrato. “A criança primeiro processa o mundo no todo e reage mais sensorialmente”, diz. Conforme o cérebro se desenvolve, ele também vai se especializando. Os hemisférios cerebrais ficam com funções cada vez mais definidas. Enquanto o hemisfé-rio esquerdo está relacionado à linguagem, o hemisfério direito é associado à comunicação não-verbal.

“O hemisfério esquerdo é mais do detalhe, analítico, vê as informações como numa ligação elétrica em série, enquanto o hemisfério direito é holístico, guestáltico, mais abrangente, como numa ligação em paralelo”, exemplifica o neurologista e psicanalista Deusvenir de Souza Carvalho, professor da Unifesp. A especialização traz vantagens ao planejamento executivo, mas pode ter consequências na perspectiva mais geral. Para equi-librar as duas perspectivas, o estímulo às artes mostra-se como uma boa opção no trabalho com jovens.

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devagar”, acrescenta. “Com isso, cada emoção que o jovem tem, ele põe em prática. O amadurecimento é a defa-sagem entre as áreas que vão deixar as emoções se manifestarem mais e as que freiam isso.”

É interessante notar, aponta Muszkat, que o caminho feito pelo cérebro, da perspectiva mais geral para o particular, normalmente é percorrido de volta na velhice, na direção contrária, quando se passa novamente do particular para uma visão mais geral.

Longo amadurecimentoA educação pode se valer muito do

conhecimento mais aprofundado a respeito do desenvolvimento do cére-bro, que fornece muitas pistas sobre o comportamento de adolescentes e jovens. Até não muito tempo atrás, pensava-se que o cérebro de uma pessoa já estivesse praticamente for-mado na infância, em especial até os três anos. Os avanços científicos dos últimos anos, no entanto, permitiram a realização de pesquisas mostrando que não é bem assim. Apesar de, aos seis anos, o cérebro já ter entre 90% e 95% do tamanho que atingirá na idade adulta, e já nascermos com a maior parte dos neurônios de que disporemos ao longo da vida, gran-des e importantes transformações acontecem até a adolescência – e mesmo depois. Munidos com infor-mações provenientes de imagens por ressonância magnética funcional, os cientistas foram capazes de perceber que o amadurecimento de algumas regiões cerebrais, em especial nas regiões frontais e pré-frontais, não acontece antes dos 25 anos, às vezes até dos 30 anos. Essas são justamente as regiões associadas ao planejamento executivo, à orga-nização e ao controle inibitório. “Os comportamentos passam por uma interface biológica”, diz Muszkat.

O maior período de produção de neurônios ocorre ainda no útero, entre o terceiro e o sexto mês de gestação. Depois, nos meses anteriores ao nascimento, o cérebro passa por um processo de remodelamento, no qual neurônios excedentes e desneces-

o desenvolvimento das áreas cerebrais responsáveis pela liberação e pelo refreamento das emoções se dá em tempos diferentes, afetando o amadurecimento juvenil

Durante o período em que o córtex pré-frontal ainda está amadurecendo, o processamento das informações emocionais depende muito da amígdala, estrutura cere-bral com forma de amêndoa que faz parte do “centro de recompensa” do cérebro e está associada à impulsivida-de, aos comportamentos compulsivos e sentimentos de medo e raiva. Segundo Carvalho, a amígdala amadurece rapidamente nessa época e é responsável por soltar os ‘freios’ comportamentais. “Quem vai segurar são as áreas anteriores do cérebro, que amadurecem mais

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o HEmisFério cErEbral EsQUErdo é analítico E o dirEito, abranGEntE. no JovEm, é prEciso bUscar EQUilíbrio EntrE as dUas pErspEctivas

sários são desativados. Mais recen-temente, os cientistas descobriram uma segunda onda de transformação cerebral. Ela ocorre no final da infância, quando há uma grande proliferação de conexões nervosas entre os neurônios, as sinapses. Os neurônios ficam mais espessos, com novas ramificações, criando novas vias para os impulsos nervosos. O aprendizado ocorre nas sinapses entre os neurônios, à medida que as células excitam ou inibem umas às outras e desenvolvem sinapses mais robustas com a repetição do estímulo. A excitação celular permite que crianças e adolescentes aprendam, por exemplo, idiomas e instrumentos musicais com maior facilidade que os adultos.

Igualmente importante é o pro-cesso de desativação das sinapses desnecessárias, a chamada poda sináptica – e, nessa segunda onda de transformação, isso acontece até o final da adolescência. As pesquisas indicam que determinadas conexões são fortalecidas, ou descartadas, conforme o uso e a necessidade. As

conexões são fortalecidas quando a parte mais com-prida dos neurônios (axônios) é envolta por um material composto por proteína e gordura, a bainha de mielina. “É como se fosse uma capa de plástico envolvendo um fio de metal”, explica Carvalho. “Sem ela, o impulso nervoso não segue um caminho único.”

DiálogoSomando-se a essas transformações, há uma

verdadeira “invasão hormonal” vivida pelos jovens, quando os hormônios pautam o ritmo do desenvolvi-mento e das grandes mudanças verificadas no corpo dos jovens. Uma forma de atenuar as instabilidades da adolescência é a prática de atividade física, que favorece a produção de neurotransmissores (como dopamina, serotonina e endorfina). “Esses atuam na área de recompensa do cérebro, melhorando a própria cognição”, afirma Muszkat.

Para ele, outra maneira de educadores facilitarem o desenvolvimento mais harmônico dos jovens seria relacionar o máximo possível as experiências a juízos de valor. Carvalho, seu colega na Unifesp, ressalta que o importante ao se trabalhar com essa faixa etária é não “fechar questão” e manter o diálogo aberto. “O conflito ocorre porque o adolescente tem a emoção que se exterioriza como comportamento, e o adulto tenta brecar isso.”

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chat de revista

CABEÇA DIGITAL

QUatro EstUdantEsdEbatEm a rEalidadEdos nativos virtUais

Um típico nativo digital – termo atri-buído às novas gerações, que já nasce-ram em berço tecnológico – tem total intimidade com as novas tecnologias. É capaz de processar informações de diversas fontes, executar ao mesmo tempo várias tarefas e interagir si-multaneamente com meia dúzia de amigos, comunidades ou mídias. Ele partilha a vida pessoal em páginas na Internet e, do mesmo modo, divide conhecimento, informação e diversão. Gosta de aprender. Um nativo digital parece ser muitos, pois ele é um ser múltiplo. A compreensão da forma de

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FrancIele GoMes paIM, 17 anos,de caxias do sul (rs), tem uma wiki

vInIcIus vInhaes, 17 anos,de Guarulhos (sp), campeão em robótica

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pensar destes jovens é uma aliada do educador na hora de planejar a inte-gração de saberes – e ajuda a explicar porque eles a recebem tão bem.

Quatro estudantes trocam ideias sobre esse modo próprio de ver a rea-lidade. Vinicius Vinhaes, de Guarulhos (SP), 17 anos, é um craque em robóti-ca. Durante o ensino médio, liderando a equipe Eniac Challengers, do Colégio Eniac, de Guarulhos, tornou-se tetra-campeão nacional e vice-campeão mundial em competições da área. Este ano ingressou na faculdade, em engenharia da automação. O mineiro

Júlio Moreira Gomes, 18 anos, é outro craque: medalhis-ta de ouro na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) em 2007. Depois de cursar o ensino médio no Colégio Militar de Belo Horizonte, foi aprovado este ano em 4º lugar no vestibular para direito da Universidade Federal de Minas Gerais.

A paulistana Ana Celina Belotti, 17 anos, internauta de carteirinha e doceira de mão cheia, mantém o blog Celinices e Gulodices, onde comenta o que vê no mundo e na culinária. Cursa o 3º ano do ensino médio no colégio Santa Cruz, construiu um site sobre trilhas sonoras no projeto interdisciplinar “Expressão em Multimídia” da escola e adora muitas coisas, como produzir festas te-máticas com maratonas de Star Wars. Só não gosta de falar ou pensar sobre faculdade. O ano de 2009, para ela,

tem de ser “desmetizizado”, quer dizer sem metas. Franciele Gomes Paim, 17 anos, gaúcha de Caxias do Sul, quer ser professora e está no 4º ano do curso Normal do Instituto Estadual de Educação Cristóvão de Mendoza. Ela descobriu e se encantou com o mundo digital no ano passado, ao participar do projeto Escola – Espaço de Construção e Autonomia, sobre o uso da tecnolo-gia da informação na educação infantil, iniciativa da professora Teresinha Ber-nardete Motter, premiada no concurso Professores do Brasil 2008. A seguir, o principal do bate-papo.

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ana celIna belottI, 17 anos,de são paulo, dona de um blog

JúlIo MoreIra GoMes, 18 anos,de belo horizonte, campeão da olimpíada de Matemática

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ONDA JOVEM: Você se considera um nativo digital típico?Ana Celina: Sim, os meios digitais se encaixam na minha vida natural-

mente. Eles formam um universo caótico, de infinitas possibilidades, pon-tos de vista e características, e esta loucura já me é natural. Ser um nativo digital é isto, esta capacidade de ver o mundo de diversos pontos de vista, viver com várias opções, janelas e oportunidades ao mesmo tempo.

Vinicius: Pode-se dizer que sim. Todos os jovens estão conectados com a Internet e informações de diversos meios digitais desde cedo. Nesse uni-verso, eu às vezes me pego realizando diversas coisas ao mesmo tempo.

Júlio: Embora meu primeiro contato com um computador tenha sido relativamente tarde (aos 8 anos de idade), as inovações tecnológicas estão completamente inseridas em meu cotidiano, desde o MP3, que ouço no ônibus, aos blogs que leio sobre política e a maioria das infor-mações sobre o Brasil e o mundo que recebo pela Internet.

Franciele: Considero-me uma nativa digital típica. Adoro o mundo da Internet. A minha, discada, é muito lenta e dificulta fazer atualizações em minha wiki. Mas sempre estou conectada em várias janelas dife-rentes, utilizando-as alternadamente. Também não consigo estudar sem estar escutando música ou vendo TV.

Há “tribos” diferentes entre os nativos digitais?Vinícius: Com certeza, e para encontrá-las basta ir a uma feira de

tecnologia, como a Campus Party, que aconteceu em São Paulo, em janeiro. Há grupos de blog, música, robótica, games etc.

Ana Celina: Faço parte do grupo que prefere não as reconhecer, pelo sim-ples fato de que não consigo me incluir em um grupo determinado. Eu mudo a cada segundo e gosto de pensar que estou aberta a todas as opções. As tribos existem, como a dos gamers e tal, mas não acho que o mundo digital, principalmente o da Internet, tenha que ser mais um universo tachado e dividido. É um universo sem barreiras, você pode ser quem você quiser.

Franciele: Acho que desde sempre, em qualquer lugar, as pessoas se dividem em grupos. Com os nativos digitais não é dife-rente, a exemplo das comunidades no Orkut. Eu mesma, com uma amiga, tenho uma wiki (friendsddpk.pbwiki.com). Nos juntamos por uma curiosidade em comum.

Júlio: A interligação no mundo digital é tão forte que é quase imperceptível a existência de diferentes “tribos”. Embora o acesso às tecnologias dependa do poder aquisitivo, na maioria dos casos as pessoas fazem coisas parecidas: mexer no Orkut, olhar a cai-xa de e-mails, ouvir músicas em seus MP3 players, utilizar o celular etc.

Os jovens nativos digitais acolhem numa boa os “não-digitais”?

Franciele: Acredito que não haja preconceito.

Ana Celina: Eu tenho amigos que estão tão presentes neste universo digital que praticamen-te não conseguem se relacionar com qualquer outro ser humano. Eles têm a sua própria língua e seu próprio jeito de enxergar o mundo. Outros amigos nem utilizam e-mail. Não é um problema. Acho essencial que a relação entre as pessoas, fisicamente, seja um aspecto diferente da relação entre elas na rede.

Vinicius: Depende do grupo, alguns “acolhem” sim, mas existem preconceitos, principalmente contra pessoas que não têm conhecimento sobre a área.

Júlio: Não percebo dificuldades de relacionamento entre os nativos digitais e os não-digitais. É verdade que a grande difusão da Internet e da TV, por exemplo, torna raros jovens “desligados” do mundo digital.

Ser nativo digital facilita o entendimento da realidade?Ana Celina: Sim, porque com a Internet eu posso procu-

rar entender e entrar em qualquer outra realidade. Isto é o que eu mais gosto: da possibilidade de estar, entender, procurar, participar do que eu quiser.

Júlio: Facilita. Os meios digitais permitem uma visão globalizada, maior universalização da informação, diversos pontos de vista sobre um fato.

Vinicius: Pode facilitar como também dificultar, tudo depende do meio em que você está. Na Internet, pode-se encontrar de tudo, desde informações úteis até as que não acrescentam nada.

Franciele: Creio que sim. Vejo por meus pais a dificul-dade que eles têm para retirar um simples dinheiro no banco, mexer no DVD, ou entender o celular. E a Internet proporciona a troca de ideias, que facilita a visão mais diversificada da realidade.

VINÍCIUS

FRANCIElE

PARA fAzeR contatoolimpíada brasilEira dE matEmÁtica das Escolas pÚblicasorganizada pela sociedade brasileira de matemática (sbm), impa, ministérios da tecnologia e da Educação, com apoio do cnpqwww.obmep.org.brwww.cmbh.eb.mil.br (colégio militar de belo Horizonte)

proJEto EXprEssão Em mUltimídia – coléGio santa crUZwww.santacruz.g12.brblog celinices e Gulodiceshttp://potatoplantatio.blogspot.com/

“um bom professor é sempre bem-vindo”

vInIcIus

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Qual a tecnologia que pode trazer maior conhecimento?

Ana Celina: Quem traz o conhecimento não é necessariamente a tecnologia e, sim, o usuário. A Internet, a meu ver, é o melhor meio de levar esse conhecimento para as pessoas.

Franciele: Também acho. É por meio da Internet que podemos aprender de tudo, adquirir com facilidade qualquer tipo de co-nhecimento.

Júlio: Sem dúvida, a tecnologia que já traz maior quantidade de conhecimento é a Internet. Os sites de pesquisa eliminaram a necessidade de se ter 20 livros de uma enciclopédia para se fazer trabalhos escolares.

O que acham da Internet como universalizadora da cultura, mesmo que isso implique infringir direitos como os autorais?

Franciele: Acho que não podemos nos privar da Internet por conta de uma minoria que não sabe usá-la com consciência.

Ana Celina: Ao tratar de Internet, temos que reavaliar os nossos padrões e leis. E pouco a pouco isto vem sendo feito. Sim, a Internet serve como ferramenta para ações criminosas, as pessoas baixam coisas ilegalmente. Mas ao mesmo tempo existem meios de se adaptar. Algumas bandas ou autores publicam em primeira mão seus trabalhos na Internet para garantir a qualidade. É uma tecnologia em evolução, então temos de ir ajustando alguns pontos. O essencial é que a Internet é uma ferramenta muito positiva e poderosa ao tornar as informações acessíveis.

Vinicius: A Internet é o meio mais poderoso de “transporte” da cultura, se soubermos usá-la. A restrição ou exclusão desse meio é que força a busca de alternativas. Dificilmente se encontra pirataria, por exemplo, em países desenvolvidos.

Que tecnologia estará entre os nativos digitais do futuro?Júlio: Com a crise atual, creio que o desenvolvimento de novas

tecnologias será comprometido. Mas há alguns campos promissores, como nanotecnologia e computadores atômicos, que poderão estar ao alcance das pessoas em algumas décadas, o que abrirá um enorme espectro de possibilidades de produtos digitais.

Franciele: Acredito que teremos um futuro de muitas descobertas. Eu pretendo, dando aulas, passar o que aprendo para meus alunos, quem sabe formando novos nativos digitais.

Ana Celina: Acho que o futuro está em convergir todas as tecnolo-gias. Um dia não teremos mais um computador, um videogame e uma televisão, mas tudo junto e muito mais.

Vinicius: Quem é que sabe do futuro? Inovações aparecem a todo tempo. Continuaremos fazendo o que buscamos hoje, um sistema cada vez mais perfeito.

O ensino está adequado aos interesses de um nativo digital?

Ana Celina: Acho que um bom giz e lousa são essenciais em algumas matérias, mas no geral é importantíssima a utilização de diferentes mídias para aprender, pois elas tornam o aprendizado mais dinâmico e variado.

Franciele: Nem o ensino, nem a escola. Até o ano passa-do, por exemplo, eu nunca havia entrado no laboratório de informática da minha escola. O problema é que os profes-sores estão desatualizados, muitos nem sabem ligar um computador e não fazem questão de aprender. O laborató-rio da minha escola é ótimo. Se as professoras realizassem algumas aulas lá, seria bem mais interessante.

Vinicius: Poucas escolas, principalmente as particulares. Algumas integram computadores e algum tipo de “nova maneira de ensino” na sala de aula.

Júlio: Devido ao descaso com a educação neste País, não é de se esperar um grande uso de novas ferramentas de ensino nas escolas públicas. Mesmo nas particulares, é incipiente e se limitam a um Data-show.

O que os estudantes tecnológi-cos gostam mais de aprender?

Franciele: Coisas modernas, da atualidade, descobertas no mundo da tecnologia, aprender a mexer com elas. É uma chatice uma aula em que a professora só fala.

Ana Celina: Acho que isso depende também do professor. Aqueles com mais energia, estilos de aula menos

tradicionais e que envolvam mais o aluno em discussões e ati-vidades costumam receber a preferência dos nativos digitais.

Vinicius: Existem diversas maneiras de aprender, e cada estudante possui a sua. Alguns são autodidatas, outros preferem ter alguém ensinando.

Júlio: A preferência é por aulas inovadoras, que valorizem a prática em vez da teoria, que sejam divertidas, que não fiquem restritas ao quadro-negro e giz.

O que torna um aprendizado significativo: estar conectado com várias áreas, ser um jogo divertido, ou vir de uma fonte que você admira, como o professor?

Vinicius: Um bom professor é sempre bem-vindo. E estar conectado com várias fontes de conhecimento, se houver interesse em aprender, é ótimo.

Júlio: Estar conectado com várias fontes é muito importante. Entretanto não há aluno que não prefira um professor divertido, inovador, que trate a matéria de uma forma mais brincalhona e menos expositiva. Minha preferência é por um aprendizado semelhante a um jogo divertido.

Ana Celina: Acho que tudo junto. A multidisciplinaridade é importante, mas também o meio pelo qual ela chega ao aluno. Jogos são sempre métodos inteligentes de se aprender.

Franciele: Para mim, um pouco dos três, porque o apren-dizado fica mais interessante, chama mais atenção, e assim é mais fácil aprender.

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ANA CElINA

PARA fAzeR contatoEscola – Espaço dE constrUção E aUtonomiaprojeto premiado no prêmio professores do brasil 2008prof.ª terezinha bernardete motterhttp://caminhosparachegar.blogspot.com/wiki da Franciele (friendsddpk.pbwiki.com)

proJEto Eniac cHallEnGErs do coléGio E FacUldadE Eniachttp://robotica.ning.comwww.eniac.com.br

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FAçA CONTATOEnvie cartas ou e-mails para esta seção com nome completo, endereço e telefone. ONDA JOVEM se reserva o direito de resumir os textos. Endereço: Rua Dr. Neto de Araújo, 320, conjunto 403, CEP 04111-001, São Paulo, SP. E-mail: [email protected].

EducadorEs

Trabalho com o tema ambiental na educação formal e informal e com a construção da Agenda 21 escolar. Quero desejar à “família onda jovem” um ano de muitas realizações, saú-de, paz, amor, prosperidade, e que esse trabalho de vocês continue lindo e encantando a todos que têm acesso a essa revista maravilhosa e intensa. O material enviado por vocês é muito legal e ajudou muito. Os alunos adoraram.

elineusa silva,são Luis – mA

Sou professor da rede pública municipal e uso Onda Jovem nas minhas aulas. Quero felicitar a todos pelo brilhante trabalho.

José márlio salviano,bom Jardim – Pe

Sou coordenadora do Colégio Estadual Prof. Neilton Lima. Rece-bemos a revista e o boletim do site Onda Jovem e resolvemos fazer o Plano de Ação da disciplina Empre-endorismo com os materiais rece-bidos. O trabalho da Onda Jovem é completo. Muito obrigado pela atenção ao nosso trabalho.

Iolanda sepúlvedaItuberá – bahia

Conheci o site e a revista Onda Jovem durante um curso na cidade de Lajeado. Trabalho com ensino médio regular e Educação de Jovens e Adultos – Ensino Fundamental, com as seguintes disciplinas: Língua Inglesa, Língua Portuguesa e Literatura Brasileira. Gostaria de receber a revista.

Ingrid PolisLajeado – Rs

Gostaríamos de receber Onda Jovem na Escola Fran-cisco Oscar Karnal.

Lucimara fioreseLajeado – Rs

Sou professora na Educação de Jovens e Adultos. Vi uma revista com uma professora e fiquei muito interessada. Acre-dito que pode ajudar na minha prática em sala de aula.

samira feitosasalvador – bA

Sou professora da rede pública estadual de Salvador e trabalho com a modalidade EJA (Educação de Jovens e Adultos). Gostaria muito de receber os exemplares da revista Onda Jovem. As informações da revista e do site contribuirão muito para o nosso trabalho.

Viviane borges Dias salvador – bA

Conheci o trabalho de vocês há menos de um ano e parabenizo a todos pelo compromisso assumido. Venho recebendo exemplares da revista para trabalhar com os professores com os quais atuo como Coordenadora Pe-dagógica do Projovem no município de Vitória/ES. Antes mesmo desse trabalho, já me encontrava inserida nas discussões sobre as juventudes e gostaria de partilhar com vocês algumas reflexões.

Tânia Tessinari miranda,Vitória – es

Sou padre, educador, com mestrado em Teologia Pas-toral e especialização em Pastoral Juvenil. O tema das juventudes me interessa muito. Quero saber da possibili-dade de me enviarem todos os números da revista Onda Jovem. Vi um exemplar de um jovem daqui de Fortaleza e achei muito bem feita.

eliomar Ribeiro,fortaleza – Ce

Sou educador licenciado em ma-temática e milito com a Pastoral da Juventude em Anápolis, GO. Gosta-ria de receber Onda Jovem.

Pedro CaixetaAnápolis – GO

Sou irmã religiosa e trabalho com jovens na escola e em comu-nidades, incentivando a formação de lideranças juvenis e o prota-gonismo. Agradeço imensamente se puder receber esta revista. Um forte abraço.

Ir.Lidiany,manaus – Am

articulaÇão

Faço parte de uma rede global de jovens, chamada TakingITGlobal (www.takingitglobal.com), que tem cerca de 230.000 membros do mundo inteiro. São jovens que, de alguma forma, contribuem para o desenvolvimento de suas comuni-dades. O lema da rede é: Inspirar, Informar e Envolver. Queria ver a possibilidade de veicular a rede nas páginas de Onda Jovem.

Luciana brasilCommunity Connector TIG

Gostaríamos de receber Onda Jovem. A publicação pode contribuir com a formação cidadã da juventu-de na ONG da qual fazemos parte. Nosso grupo tem como missão a defesa dos direitos de crianças e adolescentes em situação de vio-lência sexual e tráfico humano. Uma parceria com vocês fortaleceria nosso trabalho.

CeDeCA emaús,belém – PA

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Prezados parceiros, gostaríamos de saber da possibilidade do envio de exemplares da revista para a II Conferência Estadual de Promoção da Igualdade Racial – II COEPIR.

Nelma Nunessecretaria de estado da mulher,

da Cidadania e dos Direitos Humanos

maceió – Alagoas

Realizamos trabalho socioedu-cativo junto a 1.200 famílias em situação de altíssima vulnerabi-lidade social, na Zona Sul de São Paulo. Temos interesse em receber a versão impressa da revista Onda Jovem, cujo conteúdo frequente-mente utilizamos.

Paulo de souza filho, Programa Ação família,

Jd. marilda – sP

Sou coordenador do grupo de jovens do Centro Espírita Porto da Paz. Tive acesso à revista Onda Jovem em um curso de formação do Instituto Aliança e gostaria de receber as edições.

edilson Dias de Oliveira,Porto seguro, bA

Esta é uma revista de grande alcance social. Como trabalho com adolescentes em situação de rua e uso de drogas, gostaria de continuar a receber as edições.

Yone Gonçalves de mouraUniversidade federal de são Paulo/ Cebrid –

Centro brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas – são Paulo – sP

Integro a equipe técnica da Promotoria da Infância e da Juventude de Belo Horizonte - área Infracional, que desenvolve trabalhos junto a adolescentes e jovens em conflito com a lei. Gostaria de solicitar o envio periódico da edição impressa da revista Onda Jovem para nossa instituição. Agradecemos a atenção e parabenizamos a equipe editorial pela excelência de seu trabalho.

selmara mamedeCentro Integrado do Adolescente / mP

belo Horizonte – mG

Recebo há muito tempo a revista Onda Jovem, o que me deixa muito contente devido à qualidade e à relevância de seu conteúdo, associados ao trabalho que desenvolvemos na instituição e como cidadãos em geral. Renata Aparecida Francisca E. Pereira, que trabalha também na Promotoria, desenvolveu trabalho de conclusão de curso em Serviço Social, realizando uma pesquisa junto aos adolescentes e à equipe de uma das unidades de privação de liberdade de Belo Horizonte, administrada pelos Salesianos, em parceria com o Estado (CEAD). Na bibliografia, consta a revista Onda Jovem, com temática sobre a família, que foi o foco principal da pesquisa.

Ingrid martins estevesPromotoria da Infância e Juventude

belo Horizonte – mG

Somos psicólogas formadas pela Universidade de Rio Verde – Fesurv. Ao participarmos do CECRIA – Centro de Referências e Estudos sobre Crianças e Adolescentes, tivemos contato com as revistas Onda Jovem e gostaríamos de receber os exemplares, pois realizamos trabalhos e pesquisas sobre o tema.

Carla Angélica mendes e Janaina Rocha da silva

setor Universitário Rio Verde – GO

Tive oportunidade de ler uma revista de vocês que ganhei de um amigo. Gostei muito da linguagem usa-da, dos temas abordados e divulguei as matérias para os jovens dos nossos projetos. Gostaria de receber exemplares para entregar aos jovens, estimulando assim o hábito da leitura e possíveis conversas em sala de aula.

Alexandra forestieri Centro de estudos Tomas zinner, Instituto Unibanco

são Paulo – sP

Quero parabenizar pelas matérias on-line da revista Onda Jovem, edição nº13. Coordeno o CEDEJOR–Centro de Desenvolvimento do Jovem Rural de Santa Catarina. Acompanhamos o site e queremos também receber a revista.

silvia Verona zanol, Cedejor, Lauro müller – sC

O Instituto Sincades (Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor do Espírito Santo) promove e apoia as ações sociais e culturais. Um dos nossos objetivos é incentivar a educação de jovens e fazer que esta seja uma forma de inclusão social. Para melhor executar esse trabalho e compreender a realidade dos nossos jovens, gostaríamos de receber esta excelente revista.

Denise modolo de Assunção,Vitória – es

Estou muito interessada em obter as edições de Onda Jovem. Entre 2005 e 2007, consegui ter acesso a apenas três delas, mas, como gostei imensamente e não parei de falar bem das revistas, acabei “empres-tando pra sempre” duas e me restou apenas a número 1!

Hellen melo Pereira,florianópolis – sC

Sou pedagoga e coordenadora de um grupo jovem em Porto Seguro e

gostaria de receber edições da revista Onda Jovem. Desde já agradeço!

fernanda machado bueno Valiense,Porto seguro – bA

instituiÇõEs

Agradecemos o envio de exemplares da edição 12 de Onda Jovem, que con-tém artigo da Dra. Karina Andrade, nossa especialista do Projeto da OIT na região da América Latina, PREJAL (Promoción del Empleo Juvenil de América Latina). No ensejo, agradeceríamos a possibi-lidade de nos enviar exemplares adi-cionais para o Centro de Informações deste Escritório.

Josélia Oliveira, Oficial de Informação

escritório da OIT no brasil

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símbolos de conteúdos disci-plinares unidos por um fio que se desprende da lousa e envolve as cabeças de jovens estudantes. “O fio dá a idéia de junção e as cores são um contraste com o restante do desenho”. É assim que o tema da interdisciplinaridade na edu-cação inspira a grafiteira paulis-tana Tikka meszaros, de 22 anos. Primeira mulher indicada como revelação do grafiti no prêmio Hutuz, o maior festival de hip-hop do País, Tikka desenha desde sempre e sabia que queria viver de arte. A descoberta dos muros e sprays aconteceu em 2002, numa brincadeira com amigas. mas ela levou a sério: já participou de exposições no brasil e no exterior, ministra oficinas, é web designer e trabalha no Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso, na Vila Nova Cachoeirinha, zona Norte da cidade. Concluiu o ensino médio e não tem planos imediatos para a faculdade. seu estilo lúdico tem referência nos personagens de desenhos animados e, nos mu-ros, ganha muita cor. e por que não no papel? “No desenho, uso caneta bic.”

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Para nós, Educação é a rota que leva ao desenvolvimento do País.

Nesse ciclo virtuoso, todos nós também temos um papel decisivo de mobilização pela qualidade da Educação.

Por isso, o Instituto Votorantim está atento aos dois desafios: despertar o valor da Educação nas comunidades onde atua e ainda contribuir para a Educação de qualidade aos jovens brasileiros.

O Instituto Votorantim considera a Educação como o principal patrimônio de um jovem para a construção de seu projeto de vida.

Educar o jovem é dar a ele melhores condições de participar ativamente do desenvolvimento da sua comunidade.