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O FILÓSOFO PLATÃO (427-347 a. C.) 1. BIOGRAFIA Nasceu em Atenas 1 , em 427 a.C., numa família aristocrática, seu nome original era Arístocles, recebeu o apelido de Platão devido ao seu porte físico atlético, robusto. 2 Em 404 a. C., termina a Guerra do Peloponeso, que determina o fim da hegemonia ateniense; a democracia é derrubada e substituída pela tirania. Em 399 a. C., um novo governo democrático condena Sócrates à morte. Platão tornou-se aprendiz de Sócrates por volta dos vinte anos. Acompanhou de perto todos os passos do julgamento de seu grande mestre, e o seu fim trágico marcou-o profundamente, deixando seqüelas para o resto de sua vida. Platão é fortemente influenciado por esta instabilidade política: não concorda nem com a tirania, nem com a democracia. Esta desilusão e, simultaneamente, a admiração por Sócrates e o impacto de sua morte, o afastam da vida política propriamente dita, trilhando, então, o caminho da Filosofia e partiu em peregrinação pelo mundo. Dentre suas muitas viagens, destacam-se: o Egito , onde admirou a antigüidade e a estabilidade política; a Sicília , onde houve a tentativa de colocar em prática a 1 Centro cultural do mundo antigo. 2 Possuía as omoplatas desenvolvidas, “ombros largos”. 1

PLATÃO

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O FILÓSOFO PLATÃO (427-347 a. C.)

1. BIOGRAFIA Nasceu em Atenas1, em 427 a.C., numa família aristocrática, seu nome

original era Arístocles, recebeu o apelido de Platão devido ao seu porte físico atlético, robusto.2

Em 404 a. C., termina a Guerra do Peloponeso, que determina o fim da hegemonia ateniense; a democracia é derrubada e substituída pela tirania. Em 399 a. C., um novo governo democrático condena Sócrates à morte. Platão tornou-se aprendiz de Sócrates por volta dos vinte anos. Acompanhou de perto todos os passos do julgamento de seu grande mestre, e o seu fim trágico marcou-o profundamente, deixando seqüelas para o resto de sua vida.

Platão é fortemente influenciado por esta instabilidade política: não concorda nem com a tirania, nem com a democracia. Esta desilusão e, simultaneamente, a admiração por Sócrates e o impacto de sua morte, o afastam da vida política propriamente dita, trilhando, então, o caminho da Filosofia e partiu em peregrinação pelo mundo.

Dentre suas muitas viagens, destacam-se: o Egito, onde admirou a antigüidade e a estabilidade política; a Sicília, onde houve a tentativa de colocar em prática a idéia do “rei-filósofo”, da Sofocracia.3 Fundou, em Atenas, a Academia um dos mais importantes centros culturais da Antigüidade que durou até 529 quando Justiniano a fecha.4

Em 348 a. C., Filipe da Macedônia invade a Grécia determinando o fim de sua autonomia e independência política, no ano seguinte Platão morre.

2. OBRASA característica mais marcante de suas obras é que elas são escritas em

forma de diálogo, utilizando uma linguagem poética e simbólica, cheia de metáforas e alegorias.

1 Centro cultural do mundo antigo.2 Possuía as omoplatas desenvolvidas, “ombros largos”.3 A sofocracia, sistema político que será explicado no item 6.4 Imperador do Império Bizantino, a escola pagã rivalizava com a imposição do culto e da educação cristã, isto será mais bem entendido no estudo da filosofia cristã.

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PRINCIPAIS: “Apologia de Sócrates”, “A República” (reúne vários livros escritos ao longo de sua vida), “Fédon”, “Fedro”, “Timeu”, “Teetetos”, “O Banquete”, entre outras.

3. BREVE INTRODUÇÃO À FILOSOFIA PLATÔNICAApesar de sua originalidade, percebe-se no pensamento de Platão a

influência dos filósofos anteriores: a) de Sócrates, herdou a noção do conceito (imutáveis, necessários, universais) e a preocupação com o Homem; b) dos pré-socráticos, herdou a pergunta pela “arqué”, perguntando-se pela origem dos conceitos; c) por fim, herdou a tentativa de superar a controvérsia Heráclito-Parmênides, tentando conciliá-los.

Platão possivelmente tenha sido um dos mais ferrenhos inimigos dos sofistas, criticando sua forma de atuar. Considerava os sofistas como aqueles que detinham uma sabedoria apenas aparente, uns charlatões que se ocupavam mais em falar bem “enrolando” as pessoas, do que realmente defender a verdade.

4. EPISTEMOLOGIA5

Para Platão, há dois mundos: o mundo sensível e o mundo inteligível.O mundo sensível é percebido pelos sentidos e é caracterizado pela

multiplicidade, pelo movimento, pela mudança; é mundo aparente (restrito às opiniões - “doxa”), isto é, apenas sombra do verdadeiro. O verdadeiro conhecimento (“episteme”) é alcançado através do intelecto, da capacidade humana de raciocinar. Pois, o mundo verdadeiro, real, é o das idéias, das essências imutáveis. As coisas sensíveis são, na verdade, reflexos de idéias. Assim, pode haver variedade de um determinado tipo de coisa, mas há apenas uma idéia comum. Por exemplo: por que um cavalo é sempre um cavalo e não, por exemplo, uma coisa intermédia, um misto, entre cavalo e porco. Porque, apesar de algunscavalos serem castanhos como ursos, e outros brancos como cordeiros, todos os cavalos tem qualquer coisa em comum. Então, como alcançar o mundo inteligível? Pela contemplação e depuração ou purificação dos sentidos.

As almas que, em si, são incorruptíveis e eternas, já teriam vivido, uma vez, como puro espírito. Neste estado contemplaram o mundo das idéias, depois, decaíram para o mundo sensível e foram aprisionadas, cada uma, em um corpo, que é o cativeiro da alma, esquecendo tudo o que contemplaram no mundo das idéias. No entanto, quando, neste mundo sensível, os sentidos percebem as coisas sensíveis são despertadas, na alma, as lembranças daquilo que uma vez havia contemplado e que se esqueceu quando foi aprisionada em um corpo. A este processo, Platão chama de teoria da Reminiscência.

A partir dessas lembranças inicia-se um processo que fará a alma elevar-se do mundo sensível para o mundo das idéias. A este processo, Platão chama de

5 Reflexão sobre o conhecimento humano.

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Dialética, que é o processo do conhecimento que vai do grau menor, percepção das imagens pelos sentidos, ascendendo até a perfeição que está na contemplação das idéias em si mesmas.

Para Platão, somente o filósofo consegue contemplar, já neste mundo sensível, as idéias em si mesmas. OBSERVAÇÕES: 1) O conhecimento por reminiscência é um conhecimento inato. 2) A alma, em si mesma, é eterna e incorruptível, não é pessoal. 3) A alma reencarna, tantas vezes quantas forem necessárias, até se purificar, quando estiver inteiramente purificada, passa a habitar, definitivamente, junto às idéias contemplando o “Sumo-Bem” no Hiperurânio.

5. A ALEGORIA DA CAVERNA – Mito da Caverna“Imaginemos um grupo de cativos acorrentados numa caverna. Na parede

que lhes está em face avistam sombras que se movem. São as sombras de corpos que se deslocam num caminho colocado acima e atrás deles, corpos que eles não vêem e que são iluminados por um fogo igualmente invisível. Solte-se um dos prisioneiros e lhe dê permissão para se voltar. Verá, então, não mais as sombras das coisas, mas as próprias coisas, e saberá que o que via antes não eram objetos, mas sombras. Não adquirirá, por certo, no primeiro instante e sem perturbação Fora da caverna, ofuscado por este fogo que é o sol, terá dificuldade, a princípio, em distinguir os objetos, ser-lhe-á preciso acostumar-se pouco a pouco, contentando-se em ver-lhes o reflexo nas águas. À noite, poderá contemplar o céu suavemente iluminado pela lua e pelas estrelas, até que esteja enfim capacitado a encarar o astro do dia e toda a verdade na pureza de sua luz. (...) Que acontecerá , entretanto, se este homem livre retornar para junto de seus companheiros, lhes comunicar a descoberta feita e lhes propuser que o sigam, desvencilhando-se de suas cadeias? Isso equivaleria a dizer-lhes que não vêem o que vêem; e assim interpretarão a proposta, acolhendo com risos e zombarias esse visionário que lhes traz a salvação.”

PARA REFLETIR: a) O que significam as sombras? b) O fogo e a luz do sol o que representam? c) O que significa a dificuldade do prisioneiro solto em ver a luz do sol, adaptando-se pouco a pouco a claridade? d) O que significam os risos, a zombaria dos demais prisioneiros da caverna quando o homem livre retorna e lhes diz que o que vêem são sombras?

6. A POLÍTICADefendia a sofocracia, o governo do sábio. Valoriza o Estado como

instituição necessária para a organização da sociedade. Assim, refere-se a três classes que são um reflexo das três partes da alma: classe dos produtores (artesãos, agricultores, comerciantes) na qual predomina a parte concupiscível da alma, possui a função de abastecer a polis; classe guerreira (força militar e policial) orientada pela parte irascível da alma, possuem a função de proteger a polis; classe dos governantes dirigida pela parte racional da alma, sua função é

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governar e administrar a pólis. Deve existir uma harmonia entre as três classes, cada uma cumprindo com zelo sua função. Como poucos são sábios, poucos são aptos para governar. Defende, assim, um governo elitista. O objetivo do seu sistema consiste em “dar ao saber tanta força, capaz de transformar a força em saber”.

7. A ÉTICAA alma, prisioneira do corpo, busca um Bem perdido e esquecido (a

contemplação das idéias). No mundo sensível, o corpo pode ajudar a alma, mas pode também atrapalhar (por exemplo, tornando-se escravo dos instintos impedindo o conhecimento da verdade). Por isto, defende que a alma deve ter total controle sobre o corpo, guiar o corpo impedindo-o de ser escravo dos instintos. Aqui está, a primeira normativa ética de Platão: a pessoa humana deve preocupar-se acima de tudo com o espiritual dominando os instintos corporais.

Segundo Platão, o filósofo6 não tem medo da morte, pois a morte significa libertação, isto é, a alma se livra do cativeiro do corpo, podendo voltar a viver, se estiver totalmente purificada, no mundo das idéias, e contemplar o Sumo-Bem. Entretanto, enquanto dura a peregrinação desta vida, deve-se seguir a norma de vida.

Conclui-se que corpo fraco é aquele “super influenciado” pelos sentidos, e corpo robusto é aquele onde maior disciplina sobre os sentidos. E para que ter um corpo robusto? Para ter uma alma saudável. E como conseguir um corpo robusto disciplinado? Pela ginástica.7

6 Aquele que consegue destacar-se na preocupação com o espiritual.7 Platão considera como as quatro grandes virtudes: fortaleza e temperança (controle dos sentidos), sapiência (contemplar as idéias), justiça (aplicação social da sabedoria).

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Significado de palavras utilizadas no texto:

Democracia: governo do povo; governo que acata a vontade da maioria da população.

Tirania: poder de um único tirano ou um grupo de pessoas cujo governo é injusto e cruel, onde é colocado a sua vontade e a sua autoridade acima das leis e da justiça.

Instabilidade: ausência de estabilidade; falta de solidez, de firmeza.

Doxa: Termo grego que significa "crença", "opinião", ou ainda "o que se diz". Platão foi um dos primeiros filósofos a colocar o problema da distinção entre a doxa e a episteme, isto é, entre opinião ou crença e conhecimento.

Episteme: Termo grego que significa "conhecimento" e de onde deriva a palavra "epistemologia". A esse termo opunha-se o termo doxa, que significa opinião. Isto porque, como Platão começou por sublinhar, não é possível conhecer falsidades, sendo contudo possível — e até frequente — ter opiniões falsas. Assim, um dos problemas que desde logo se coloca é o de saber como se alcança o conhecimento e se evita a mera opinião.

Depuração: aperfeiçoamento, refinamento;atividade de limpeza ou exclusão de substâncias indesejáveis.

Incorruptíveis: algo incapaz de deixar-se corromper, seduzir, subornar.

Reminiscência: Lembrança vaga ou incompleta. O processo que, segundo Platão, nos leva a recordar o que já tínhamos aprendido num estado de existência (numa vida) anterior e que estava como que adormecido na nossa alma.

Dialética: A dialética pode ser descrita como a arte do diálogo. Uma discussão na qual há contraposição de idéias, onde uma tese é defendida e contradita logo em seguida; uma espécie de debate. Para Platão a dialética é o único caminho que leva ao verdadeiro conhecimento. Pois a partir do método dialético de perguntas e respostas é possível iniciar o processo de busca da verdade.

Inato: Para Platão significa algo que não é adquirido com a experiência, que não depende da experiência, nem dos nossos sentidos.

Hiperurânio: Para Platão o Hiperurânio é um mundo que é parcialmente visível só para as almas que estão desligadas do próprio corpo. Quando nossa alma estava desligada do nosso corpo ela viu e conheceu as idéias do hiperurânio e quando

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entraram novamente em um corpo, reencarnando-se, nossa alma esqueceu a visão que teve das idéias. O trabalho do filósofo é fazer com que as pessoas recordem dessas idéias através do diálogo.

Ofuscado: que não dá para ver, oculto, encoberto, apagado, sem brilho.

Sofocracia: um sistema de governo na qual só pode exercer o poder e governar que detiver o saber.

Concupiscível: que deseja ardentemente, que cobiça os bens materiais.

Irascível: que se irrita com facilidade ou que frequentemente demonstra raiva, irritação; irritável, violento.

Racional: que se baseia pela razão, no que tem coerência, no que é lógico e inteligente.

Elitista: que demonstra elitismo, ou seja, que apóia uma minoria que detém o prestígio e o domínio sobre as outras pessoas.

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