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LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Definio do termo negociao (ordem cronolgica).............................................19 Quadro 2 - Estratgias de negociao.......................................................................................28 Quadro 3 - Propostas para o processo de negociao...............................................................33 Quadro 4 - Variveis para diagnstico da situao a ser negociada (KOZICKI,1999)............35 Quadro 5 - Plano de negociao baseado em conhecimento (SHELL, 2001)..........................36 Quadro 6 - Sntese das diferenas culturais..............................................................................54 Quadro 7 - Modos como a cultura pode afetar a negociao....................................................56 Quadro 8 - Variveis estudadas no modelo de Money (1998)..................................................65 Quadro 9 - Anlise comparativa entre os modelos de Money (1998) e Calantone (1998).......68 Quadro 10 - Variveis estudadas no contexto da negociao internacional.............................80 Quadro 11- Classificao de empresas por nmero de empregados.........................................84 Quadro 12 - Principais causas da mortalidade de empresas.....................................................86 Quadro 13 - Objetivos especficos, questes, proposies e variveis...................................110 Quadro 14 - Categorizao das variveis estudadas...............................................................112 Quadro 15 - Decises tomadas e informaes pesquisadas na fase de preparao................133 Quadro 16 - Sntese das recomendaes gerenciais................................................................149
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Diferenas culturais nos modelos de comunicao no-verbal...............................50 Tabela 2 - Diferenas culturais nos modelos de comunicao verbal......................................51 Tabela 3 - Participao das MPE na economia brasileira.........................................................86 Tabela 4 - Descrio do processo de seleo dos casos..........................................................107 Tabela 5 - Evoluo do setor mdico-hospitalar e odontolgico............................................120 Tabela 6 - Distribuio da indstria por segmento e regio....................................................121 Tabela 7 - Evoluo do BHP (Brazilian Health Products).....................................................124 Tabela 8 - Distribuio das empresas por porte..125 Tabela 9 - Participao no consrcio de exportao...125 Tabela 10 - Experincia internacional....125 Tabela 11 - Formas de atuao no mercado internacional..126 Tabela 12 - Motivaes para a internacionalizao.127 Tabela 13 - O sucesso nas negociaes internacionais.127 Tabela 14 - Perfil dos responsveis por comrcio exterior.....128 Tabela 15 - Principais dificuldades em relao negociao internacional...129 Tabela 16 - Desenvolvimento das habilidades de negociao129 Tabela 17 - Formas de iniciao de contato internacionais em ordem de preferncia...130 Tabela 18 - Resultados de uma negociao131 Tabela 19 - Preparao e planejamento da negociao internacional.132 Tabela 20 - Planejamento da negociao....132 Tabela 21 - Informaes utilizadas no planejamento da negociao internacional....134 Tabela 22 - Freqncia de utilizao..135 Tabela 23 - Grau de importncia.135 Tabela 24 - Envolvimento de funcionrios na fase de preparao para a negociao....136 Tabela 25 - Decises tomadas antes da rodada de negcios...136 Tabela 26 - Importncia das decises tomadas antes da rodada de negcios.....137 Tabela 27 - Conhecimento e aplicao do conceito de BATNA138 Tabela 28 - Comportamento durante a rodada de negcios137 Tabela 29 - Dificuldades enfrentadas durante a rodada de negcios..138 Tabela 30 - Comportamento ps-acordo....139 Tabela 31 - Distribuio em relao ao sexo..173 Tabela 32 - Formao acadmica...173 Tabela 33 - Experincia no mercado internacional....173 Tabela 34 - Experincia na empresa...174 Tabela 35 - Faixa etria...174 Tabela 36 - Nvel hierrquico na empresa......174 Tabela 37 - Vnculo com a empresa...174
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Grade de posicionamento estratgico.......................................................................27 Figura 2 - Os contextos das negociaes internacionais de Phatak e Habib (1996).................63 Figura 3 - Modelo de negociao internacional de Money (1998)...........................................64 Figura 4 - Modelo de negociao de Calantone, Graham e Mintu-Wimsatt (1998).................66 Figura 5 - O papel do afeto em negociaes interculturais.......................................................69 Figura 6 - Influncias culturais em processos de interao de compra e venda.......................71 Figura 7 - Estrutura conceitual de Paik e Tung (1999) para a negociao internacional..........72 Figura 8 - Modelo de negociao intercultural (BRETT, 2000)...............................................73 Figura 9 - Efeitos diretos e indiretos da cultura em negociaes internacionais......................74 Figura 10 - Determinantes da satisfao em exportaes.........................................................75 Figura 11 - Influncia da cultura em estilos de negociao......................................................78 Figura12 - Representao do resultado do levantamento terico.............................................99
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1 INTRODUO
1.1 Apresentao
cada vez maior o fluxo de bens, servios, informao e capital que vem circulando ao redor
do mundo, entre povos, pases e culturas diferentes. Tal fenmeno recebe o nome de
globalizao. Trata-se de um processo amplo que envolve pessoas, empresas, pases e
economias. Pessoas buscam conhecer outras lnguas e culturas para garantir empregabilidade
em empresas que buscam a internacionalizao como forma de sobrevivncia. Pases
incentivam exportaes e internacionalizao de empresas, assim como se unem para formar
blocos comerciais visando aumentar sua participao e competitividade na economia global
(FLEURY; FLEURY, 2003, MARTINELLI; VENTURA; MACHADO, 2004, SIMINTIRAS;
THOMAS, 1998, SUEN, 1997, SZAPIRO; ANDRADE, 2001).
A globalizao um fenmeno de grandes propores, em que se notam, entre outros
fenmenos, a diminuio das fronteiras e o aumento da interdependncia da economia dos
pases. muito comum a afirmao de que o processo de globalizao um fenmeno
diretamente ligado ao progresso da tecnologia da informao (comunicao e informtica),
assim como da modalidade intercontinental do capital. No entanto, seu significado muito
mais complexo e dinmico, permitindo que se examine o tema por diferentes dimenses,
como, por exemplo, econmica, poltica, legal, cultural (SUEN, 1997).
A literatura da rea relaciona a globalizao com a acelerao das trocas de bens, servios,
contratos e informaes, das viagens e dos intercmbios culturais. Embora o processo de troca
entre os povos seja algo muito antigo, detecta-se um aumento na velocidade com que essas
trocas esto sendo feitas hoje. Essa velocidade seria, portanto, a principal caracterstica do
processo de globalizao (ZINI; ARANTES, 1996).
A anlise da globalizao sob o enfoque econmico permite afirmar que, para sobreviver
neste cenrio, vital para um pas relacionar-se comercialmente com outros pases. Assim
como para uma empresa ser competitiva necessrio que uma parcela de seus negcios
ocorra no mercado internacional (MARTINELLI; VENTURA; MACHADO, 2004).
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Impulsionadas pelo processo de globalizao, as empresas tm buscado uma rpida expanso
tanto por meio de fuses e aquisies quanto por diferentes formas de cooperao. cada vez
mais freqente a formao de alianas entre companhias transnacionais, com o objetivo de
influenciar a seu favor as polticas internas e externas (SANER, 2002).
Ainda sob esse enfoque, a globalizao tem transformado a vida das empresas, medida que
permite que a produo e a distribuio de bens de relativa homogeneidade possam ser feitas
em maiores quantidades, levando a ganhos de economia de escala. Essa tendncia, aliada
competio que passou a ocorrer em escala mundial, tem levado a uma reestruturao das
empresas para atender aos requisitos desse novo ambiente global (SUEN, 1997).
Qualquer que seja o enfoque escolhido para abordar o processo de globalizao, pode-se
observar que pessoas, empresas, organizaes e pases esto cada vez mais interdependentes,
dando origem a inmeros conflitos de interesses. Quando se recorre ao senso comum, tem-se
uma associao do termo conflito a noes negativas como briga, coliso, luta, oposio de
vontades, estando implcito que apenas um dos lados pode ganhar.
Como papel da cincia, essa noo foi questionada por vrios autores, uma vez que se
percebeu que situaes de conflito tambm podem gerar ganhos mtuos e solues criativas.
Conflito passou a ser visto como resultado da diversidade que caracteriza os pensamentos,
atitudes, crenas, percepes, bem como o sistema e estrutura social (WEEKS, 1992). Visto
dessa forma, natural concluir que o conflito inerente s relaes humanas. Sua soluo
pode ter diferentes caminhos: negociao, sorteio, exame, competio, votao, uso de
autoridade, uso de normas rgidas e at mesmo luta e guerra.
Segundo Martinelli e Almeida (1998), a negociao no a nica, mas uma das melhores
formas de solucionar conflitos quando o objetivo produzir benefcios duradouros para todos
os participantes. Segundo Hofstede (1991), a negociao ganha relevo como meio de soluo
de conflitos de interesses entre partes que cada dia esto mais inter-relacionadas, como o
caso do mercado global.
Em 1989, Adler e Graham citaram uma estimativa do professor Howard Perlmutter, de 1983,
segundo a qual mais da metade do tempo dos gerentes internacionais era gasto com
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negociaes (ADLER; GRAHAM, 1989). Essa citao permite estabelecer um parmetro
para a importncia da negociao como forma de solucionar conflitos no contexto da
globalizao.
Diante dessa importncia, surgiu o interesse em estudar aspectos relacionados negociao
no cenrio internacional. Para isso, decidiu-se estudar a negociao internacional no contexto
da pequena empresa. Negociaes internacionais na pequena empresa constituem-se em um
rico universo para a aplicao dos conceitos de negociao. Primeiramente, porque estudos
que contribuam para a sobrevivncia da pequena empresa certamente traro benefcios
econmicos e sociais de grande relevncia (SACHS, 2002). Segundo, porque as principais
teorias e tcnicas administrativas so desenvolvidas tendo por base grandes estruturas
organizacionais. Caractersticas especficas da pequena empresa nem sempre so levadas em
considerao, o que muitas vezes inviabiliza a aplicao dos modelos tericos nesse porte de
empresa.
Definiu-se como delimitao geogrfica do estudo a cidade de Ribeiro Preto, que se insere
em uma regio economicamente importante do pas e se destaca como uma das cidades mais
desenvolvidas do interior de So Paulo. O potencial econmico da regio de Ribeiro Preto,
por si s, no indicativo de um desenvolvimento seguro, consistente e efetivo da cidade.
Ribeiro Preto passa, hoje, por problemas comuns s grandes cidades, como concentrao de
riquezas, atrao de mo-de-obra no-qualificada, nveis crescentes de desemprego, violncia
urbana etc. (GARCIA, 1998). A pesquisadora deseja realizar um trabalho que possa gerar
contribuies ao desenvolvimento local na regio de Ribeiro Preto.
Para viabilizao deste trabalho, a opo da pesquisadora foi desenvolver um estudo mais
profundo em um setor relevante, ao invs de um estudo superficial que abrangesse diferentes
setores. O setor mdico-odontolgico um segmento industrial de grande relevncia na
cidade de Ribeiro Preto, que se destaca como centro de excelncia no ensino superior na rea
da sade e na prestao de servios de sade. A existncia dos cursos de sade da
Universidade de So Paulo, alm de outras faculdades particulares, e de um grande nmero de
profissionais dessa rea na cidade explica a concentrao de empresas nesse setor (TELLES,
2002).
10
1.2 Justificativa
A justificativa deste estudo est fundamentada nos seguintes aspectos: atualidade do tema
(insero do tema no contexto atual), originalidade do trabalho (proporciona maior
importncia ao assunto), relevncia do tema (importncia social e poltica) e pertinncia do
tema (contribuio do tema).
Negociao um tema recente, bastante amplo e de larga aplicao, que vem recebendo a
ateno de muitos autores, tanto no Brasil como no exterior (WEEKS, 1992, KOZICKI, 1999,
SHELL, 2001, MARTINELLI, 2002, OSMANI-GANI; TAN, 2002, REYNOLDS;
SIMINTIRAS; VLACHOU, 2003). Segundo Bazerman e Neale (1998, p. 17), todos
negociam. Para Robinson (1996) todos podem negociar sempre e se negocia desde o dia em
que se nasce. Mills (1993) tambm destaca a participao da negociao na vida de todos. No
mundo empresarial, a negociao tem sido vista como um aspecto central na vida das
organizaes (KIM; FRAGALE, 2005).
Martinelli e Almeida (1997) destacam a importncia do assunto negociao no momento
atual. Segundo os autores, a abrangncia do tema, ainda no totalmente explorado, apresenta-
se como um desafio aos pesquisadores. Sua interdisciplinaridade permite o estudo sob
diferentes ngulos, ligado a diferentes reas do pensamento cientfico. Neste trabalho, optou-
se por estudar a negociao internacional na pequena empresa.
O aumento na velocidade das trocas de bens, servios, contratos e informaes, viagens e
intercmbios culturais entre povos, pases e culturas diferentes, fruto da globalizao (ZINI;
ARANTES, 1996, OSMANI-GANI; TAN, 2002), confere maior atualidade escolha da
negociao no contexto internacional. A rea vem recebendo ateno considervel de
pesquisadores, e o volume de trabalhos produzidos apresenta tendncia crescente na dcada
de 1990-2000 (OSMANI-GANI; TAN, 2002, REYNOLDS; SIMINTIRAS; VLACHOU,
2003).
A competncia em negociao internacional uma das habilidades mais importantes e
indispensveis em se tratando de negcios internacionais. A habilidade para obter benefcios
mtuos em negociaes interculturais vista por vrios autores como crucial para obter
sucesso no contexto internacional (COHEN, 1980, NIERENBERG, 1981, FISHER; URY,
11
1985, ADLER; GRAHAM, 1989, SIMINTIRAS; THOMAS, 1998, CHAISRAKEO;
SPEECE, 2004).
A importncia de um trabalho cientfico no est relacionada apenas atualidade do tema
estudado. Temas originais conferem maior relevncia pesquisa. Nesse sentido, a proposta
estudar a negociao internacional no contexto da pequena empresa. Reynolds, Simintiras e
Vlachou (2003) realizaram uma reviso bibliogrfica e uma anlise crtica da literatura
recente (de 1990 a 2000) em negociao internacional. Foram pesquisados 111 trabalhos.
Segundo os autores, apenas um trabalho (MONEY, 1998) abordou o impacto do tamanho da
empresa no resultado da negociao. Ainda assim, o trabalho de Money (1998) apenas cita
que estudos tm mostrado que: (1) os negociadores que representam empresas maiores e mais
poderosas tm uma probabilidade maior de assumir posio de destaque em negociaes
multilaterais do que negociadores de empresas menores; (2) os negociadores de empresas
maiores tendem a ter maior sucesso que os negociadores de empresas menores.
A reviso bibliogrfica permitiu localizar outro trabalho que aborda o porte da empresa ao
estudar os fatores de sucesso em negociaes internacionais (GULBRO; HERBIG,1996). Os
autores concluram que as pequenas empresas tm apresentado insucesso nas negociaes
interculturais, em um nvel desproporcionalmente maior do que o das grandes empresas.
Ainda segundo os autores, grandes empresas tendem a ter mais sucesso do que as pequenas,
no necessariamente em funo do seu tamanho, mas em funo do que o seu tamanho lhe
permite fazer: mais tempo para a preparao, maior uso de tradutores, mais acesso s
diferenas culturais e a especialistas. Esses fatores mostraram-se determinantes do sucesso em
negociaes interculturais, por isso Gubro e Herbig (1996) sugerem que as pequenas
empresas imitem o comportamento das grandes. Analisar criticamente essa questo faz parte
do escopo deste trabalho.
At o momento da redao desta proposta de trabalho, no foi localizado nenhum outro
estudo emprico relacionando a negociao internacional pequena empresa. Isso conduz
possibilidade de uma lacuna cientfica, o que confere maior importncia a este projeto de
pesquisa.
Alm da originalidade, a deciso de pesquisar as negociaes internacionais em empresas de
pequeno porte agrega relevncia social a este trabalho. A importncia que as pequenas
12
empresas tm para a economia de um pas reforada quando o assunto a exportao.
Segundo Alaby (2003), para ser parte integrante do desenvolvimento econmico de um pas,
as pequenas e mdias empresas devem participar efetivamente da atividade exportadora. O
autor cita que, nos EUA e na Itlia, mais da metade das exportaes realizada por empresas
com menos de 19 empregados. Diferentemente disso, ainda segundo o autor, no Brasil, o
modelo exportador foi baseado na concentrao dos grandes conglomerados empresariais, que
representam 85% da pauta exportadora.
Muito se tem debatido sobre a eficincia do modelo brasileiro de exportaes. Existe
consenso sobre a preocupao com a concentrao do mercado na mo de poucas empresas e
a necessidade de diminuir essa concentrao. Em virtude disso, as atenes se voltam para a
micro e, sobretudo, para a pequena empresa, como forma de viabilizar a expanso do setor de
exportao (ASSIS, 2003).
Estudos que contribuam para a sobrevivncia e o crescimento das pequenas empresas de
Ribeiro Preto podero ajudar a minimizar problemas de desemprego na regio. A insero da
pequena empresa de Ribeiro Preto no mercado internacional surge como alternativa para
promover o desenvolvimento local.
A proposta bsica deste trabalho trazer contribuies que possam estimular a
internacionalizao no contexto da pequena empresa, contribuindo para tornar mais eficiente
o modelo exportador brasileiro, trazendo impactos positivos na gerao de empregos e na
distribuio de renda, itens necessrios ao desenvolvimento econmico brasileiro.
1.3 Problema de pesquisa
Caractersticas como complexidade das negociaes internacionais, aliada a limitaes de
recursos situao comum s pequenas empresas , trazem relevncia ao estudo da
negociao nesse contexto.
O estudo do referencial terico permitiu chegar concluso de que a racionalizao, em
contraponto negociao intuitiva, tende a melhorar o processo de negociao e seus
13
resultados. (BAZERMAN; NEALE, 1998).
A literatura de negociao evidencia a importncia do planejamento para uma negociao
racional, destacando a busca de informaes no processo de planejamento como algo que
tenderia a aumentar a probabilidade de sucesso (LITERER, 1985, ACUFF, 1993, MILLS,
1993, HERBIG, 1996, RAY, 1996, SUEN, 1997, DONALDSON; DONALDSON, 1999,
GULBRO; LEWICKI; MARTINELLI, 2002, SANER, 2002). Alguns autores chegam a
afirmar que mais tempo deveria ser despendido na preparao do que na realizao da
negociao (MILLS, 1993, GULBRO; HERBIG, 1996).
Dada a importncia do planejamento, o que se pretende estudar como as pequenas empresas
agem em relao ao planejamento da negociao internacional. Ser que existe uma
preparao racional, sistematizada para enfrentar esse tipo de negociao? Ou ser que
prevalece a postura intuitiva e no-reflexiva? Qual o tempo disponvel e o envolvimento dos
empresrios para lidar com esse tema? Eles buscam conhecer tcnicas e ferramentas de
negociao?
Supe-se que a complexidade do cenrio internacional tende a levar as empresas a se
voltarem para a busca de informaes tcnicas de exportao. Entende-se por questes
tcnicas de exportao a adequao do produto demanda internacional, o atendimento das
normas tcnicas e regulamentos internacionais, processos de certificao e aspectos
mercadolgicos (previso da demanda, precificao, distribuio e logstica). Cabe entender
como as empresas costumam agir em relao aos aspectos comportamentais relacionados ao
processo de negociao: abordagens, estratgias e tticas, estilos de negociao e de
comunicao. Ser que esses aspectos tambm so contemplados na preparao da
negociao?
Conhecendo-se as especificidades da negociao internacional na pequena empresa, pode-se
partir para a criao de uma estrutura conceitual que auxilie o planejamento da negociao
nesse contexto.
A partir dessas reflexes, definiu-se o seguinte problema de pesquisa: como planejar a
negociao internacional na micro e pequena empresa, a fim de contribuir para seu processo e
resultados?
14
1.4 Objetivos
O objetivo geral do trabalho propor uma estrutura conceitual que ajude a sistematizar o
planejamento da negociao internacional na micro e pequena empresa, a fim de auxiliar os
administradores dessas empresas a aperfeioar o processo de preparao para a negociao
internacional, contribuindo, ainda que indiretamente, para a internacionalizao de empresas
brasileiras.
Definem-se como objetivos especficos:
1. conhecer as principais motivaes por trs do comportamento de internacionalizao das micro e pequenas empresas industriais do setor mdico-hospitalar e odontolgico da cidade de
Ribeiro Preto;
2. compreender como ocorrem as negociaes internacionais no ambiente das micro e pequenas empresas industriais do setor mdico-hospitalar e odontolgico da cidade de
Ribeiro Preto;
3. estudar o ambiente das micro e pequenas empresas pesquisadas, procurando conhecer as especificidades relacionadas internacionalizao;
4. conhecer as dificuldades enfrentadas pelas micro e pequenas empresas industriais do setor mdico-hospitalar e odontolgico da cidade de Ribeiro Preto em relao s negociaes
internaciona is;
5. analisar como as micro e pequenas empresas pesquisadas costumam se preparar para a negociao internacional.
15
2 REFERENCIAL TERICO
O objetivo deste captulo apresentar o marco terico do trabalho, identificando, na literatura
disponvel, os conceitos de negociao e de negociao internacional e as principais teorias e
tcnicas que envolvem esses conceitos.
O captulo busca, tambm, construir um arcabouo terico para o planejamento da negociao
internacional, com base na literatura, dando nfase s etapas do processo de negociao, aos
modelos de negociao e aos modelos para o planejamento da negociao.
Na primeira seo, discutem-se os fundamentos da teoria da negociao, especificando os
conceitos centrais e os aspectos relacionados ao planejamento da negociao (etapas do
processo, modelos e mtodos de planejamento). Na segunda seo, aborda-se o conceito de
negociao especificamente na esfera internacional, apresentando as principais caractersticas
desse tipo de negociao, destacando a influncia da cultura e a apresentao das propostas de
sistematizao do processo de planejamento internacional. A seguir, abordam-se os aspectos
relacionados negociao na pequena empresa, com nfase na negociao internacional.
2.1 Fundamentos da teoria da negociao
A compreenso dos fundamentos da negociao internacional passa por um conhecimento da
conceituao de negociao. Apesar de a negociao ser algo to antigo quanto a convivncia
de indivduos na humanidade, sua teorizao recente (BAZERMAN; NEALE, 1998,
MARTINELLI; ALMEIDA, 1997). A razo pela qual um tema to ant igo, que faz parte da
vida de todos, s ter recebido ateno por parte de tericos e pesquisadores recentemente
encontra-se no fato de que se negocia intuitivamente. Durante muito tempo, por ser a
negociao algo to intuitivo, que se aprende praticando, o tema no mereceu uma
investigao mais profunda (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997).
O estudo do referencial terico permitiu chegar concluso de que, apesar de a negociao
poder acontecer de forma intuitiva, sua racionalizao contribui para melhorar o processo e
16
seus resultados. Segundo Bazerman e Neale (1998, p. 6), negociar racionalmente significa
tomar as melhores decises para maximizar seus interesses. primeira vista, essa afirmao
pode levar concluso de que os autores defendem uma forma de negociao unilateral, em
que as partes se preocupam com seus prprios interesses e com as vantagens que podem levar
em relao ao oponente. Na verdade, no bem assim. Ao aprofundar a leitura da obra citada,
percebe-se que os autores defendem a posio inversa: a negociao encarada como um
processo bilateral, baseado em concesses mtuas, buscando o melhor resultado para ambas
as partes. Nesse sentido, destaca-se a imagem torta fixa mtica, criada pelos autores, para
defender seu ponto de vista: a negociao deve ser encarada como mais do que uma simples
luta para ver quem fica com o maior pedao da torta; deve-se encarar a situao competitiva
alm do ganhar ou perder, a fim de aumentar a probabilidade de se encontrar solues
criativas para o problema.
O conceito da torta fixa apresentado por Bazerman e Neale (1998) poderia ser comparado
ao clssico exemplo da laranja, citado por Martinelli e Almeida (1998), em que duas crianas
brigam por uma nica laranja, mas cada uma tem objetivos e interesses diferentes e
complementares. Ao dividirem a laranja ao meio, na tentativa de encontrar a melhor soluo
para o conflito, caminham em sentido contrrio, uma vez que cada criana estava interessada
em uma parte diferente da laranja (uma queria a casca e a out ra, a polpa). Se ambas tivessem
conscincia do que a outra parte desejava, a soluo teria sido melhor para as duas partes.
Atravs das idias de Bazerman e Neale (1998) e de Martineli e Almeida (1998), transcritas
acima, pode-se concluir que a razo pela qual a negociao passou a ser vista de forma mais
ampla, envolvendo os interesses de ambas as partes, reside na perspectiva da realizao de
novas negociaes com a outra parte. Partindo dessa perspectiva, fica muito claro entender
por que conhecer os interesses do oponente passa a ser vital: a negociao ganha uma viso
de longo prazo. Passa a ser importante refletir sobre como as atuais negociaes (presente)
podero influenciar novas negociaes (futuro).
Aps uma reviso ampla na literatura sobre negociao, pode-se afirmar que existem diversas
definies para o termo. Nesse sentido, buscaram-se aqui relatar algumas dessas definies
com base na viso de diferentes autores. Os resultados esto apresentados em ordem
cronolgica, no quadro 1. Entre as vrias definies existentes, foram selecionadas trs, que
sero utilizadas neste trabalho. As definies selecionadas, bem como a razo de sua escolha,
17
sero apresentadas a seguir.
A primeira definio escolhida foi proposta por Nierenberg (1981, p. 8): pode afetar
qualquer tipo de relacionamento humano e produzir benefcios duradouros para todos os
participantes. Selecionou-se essa definio pois, apesar de se tratar de uma das mais antigas1,
traz consigo o enfoque atual do conceito, baseado na percepo das necessidades de ambas as
partes. Alm disso, a definio amplifica o conceito e sua aplicabilidade, uma vez que
enxerga as relaes humanas como pano de fundo do processo de negociao, o que combina
com os objetivos deste trabalho.
A segunda definio adotada foi proposta por Fisher e Ury (1985, p. 30): Negociao um
processo de comunicao bilateral, com o objetivo de se chegar a uma deciso conjunta. A
escolha dessa definio reside na importncia que ela d ao processo de comunicao para a
realizao da negociao e viso bilateral desse processo. Uma vez que negociar implica
estabelecer uma relao entre duas partes, a comunicao se torna uma situao sine qua non
para a ocorrncia da negociao. Segundo Pinto (1993, p. 26), a comunicao to
importante para a negociao quanto o sangue para o corpo humano. ela o instrumento que
possibilita a ampliao das convergncias reduzindo a esfera das divergncias. Segundo
Martinelli e Almeida (1997, p. 58 et seq.), a negociao requer comunicao entre as partes,
independentemente de quo imperfeitos os canais possam ser na realidade [...] A comunicao
pode ser considerada o corao do processo de negociao [...] Sem a comunicao [...] no
haveria negociao. Lewicki e Literer (1985) afirmaram que a comunicao o corao do
processo de negociao. De fato, fica impossvel imaginar uma negociao em que no haja
qualquer comunicao entre as partes.
Um problema comum em processos de comunicao a existncia de mal-entendidos, que
podem dificultar a interpretao do contedo das mensagens pelas partes envolvidas
(MARTINELLI; VENTURA; MACHADO, 2004). Nesse sentido, importante citar a viso
de Money (1998) que acrescenta o conceito de multilateralidade negociao. O autor afirma
que as negociaes que ocorrem no contexto internacional muitas vezes so multilaterais, isto
, envolvem vrias partes, no apenas duas, que negociam simultaneamente. Temas de grande
relevncia no contexto mundial, como desarmamento, poluio ambiental, poltica
1 Essa definio foi apresentada pela primeira vez em 1968, na primeira edio de seu livro de 1981.
18
econmica, imigrao etc. so alvos de negociaes multilaterais.
Segundo o autor, a negociao multilateral distingue-se da bilateral em funo (1) das
alianas inevitavelmente formadas entre algumas partes, (2) da tendncia supersimplificao
do problema pelos negociadores e (3) dos vrios papis que podem emergir durante o
processo de negociao (lder, mediador, bode expiatrio, cabea-dura). Ainda segundo o
autor, isso tende a tornar as negociaes multilaterais um fenmeno extremamente complexo
(MONEY, 1998).
Tanto em negociaes bilaterais quanto em multilaterais, a importncia da comunicao
ganha destaque quando o assunto a negociao internacional, porque aspectos culturais
podem influenciar na comunicao entre as partes, dificultando a interpretao das
mensagens, criando barreiras e at inviabilizando o acordo (MARTINELLI; VENTURA;
MACHADO, 2004). Tais aspectos sero discutidos na segunda seo desta reviso
bibliogrfica.
A terceira definio adotada foi proposta por Steele, Murphy e Russill (1995, p. 3):
Negociao o processo pelo qual as partes se movem de suas posies iniciais divergentes
at um ponto no qual o acordo pode ser obtido. O principal motivo para a escolha dessa
ltima definio est no carter dinmico que ela emprega ao termo, sugerindo que as partes
devem se mover de suas posies iniciais divergentes na direo do acordo. Essa idia
tambm foi abordada por Bazerman e Neale (1998, p. 5) quando tocaram na questo da
escalada irracional do compromisso. Segundo os autores, em se tratando de negociao, um
dos erros mais comuns o de ficar fixo na posio assumida no incio do processo. A
persistncia irracional pode levar a resultados desastrosos, aumentando prejuzos ou
inviabilizando acordos. Afirmam ainda que compreender esse conceito fator-chave para
poder chegar ao melhor acordo, mas salientam a grande dificuldade de sua aplicao: este
um conceito difcil de ser absorvido. Uma vez dedicado a um curso de ao, executivos
muitas vezes alocam recursos de maneira a justificar suas escolhas anteriores,
independentemente de parecerem vlidas (BAZERMAN; NEALE, 1998, p. 27).
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Quadro 1 - Definio do termo negociao (ordem cronolgica)
AUTORES / ANO
DEFINIO DE NEGOCIAO
Cohen (1980)
Negociao o uso da informao e do poder com o fim de influenciar o comportamento dentro de uma "rede de tenso".
Nierenberg (1981)
Negociao um processo que pode afetar profundamente qualquer tipo de relacionamento humano e produzir benefcios duradouros para todos os participantes.
Graham (1985b) (...) processo complexo que significativamente influenciado pela cultura na qual os negociadores esto socializados, educados e reforados.
Fisher; Ury (1985) Negociao um processo de comunicao bilateral, com o objetivo de se chegar a uma deciso conjunta.
Sparks (1992) Negociao implica caracteristicamente uma troca de dar e receber entre um negociador e o oponente, que tentam chegar a uma concluso agradvel ou aceitvel no ajuste de um problema ou disputa.
Acuff (1993)
Negociao o processo de comunicao com o propsito de atingir um acordo sustentvel sobre diferentes idias e necessidades.
Kozicki (1995)
Negociao a arte de se alcanar um acordo, resolvendo as diferenas por meio do uso da criatividade. Envolve dois lados tentando chegar a um acordo, uma soluo que, idealmente, deixar ambas as partes felizes a clssica soluo ganha-ganha.
Steele; Murphy;
Russill (1995)
Negociao um processo no qual as partes se direcionam de suas posies divergentes para um ponto em que se possa alcanar um acordo.
Hodgson (1996)
Negociao uma atividade que envolve um elemento de negcio ou barganha, que permite que ambas as partes alcancem um resultado satisfatrio.
Simintiras;Thomas (1998)
um processo no qual duas ou mais entidades renem-se para discutir interesses comuns e conflitantes a fim de alcanar um acordo e benefcios mtuos apud Harris e Moran, 1987, p. 55.
Paik; Tung (1999) Negociao uma tarefa especial de comunicao que ganha lugar para alcanar acordos sobre como manejar interesses comuns e contrastantes entre duas ou mais partes; trata-se de um processo dinmico pelo qual duas partes, cada uma com seus objetivos, tentam chegar a um acordo mutuamente aceitvel em relao a um problema ou interesse comum. Ocorre em um perodo de tempo definido e envolve no somente dados e intuio, mas tambm boa vontade das partes para entender o ponto de vista do outro.
Brett (2000) uma forma de interao social. o processo pelo qual duas ou mais partes tentam resolver objetivos incompatveis percebidos
Saner (2002) um processo no qual duas ou mais partes buscam um acordo para determinar o que cada uma delas dever dar ou ganhar, ou fazer e receber, numa transao entre elas. Pontos importantes da definio: duas ou mais partes; interesses convergentes e divergentes; relacionamento voluntrio; distribuio ou troca de recursos tangveis ou intangveis; processo seqencial e dinmico; informao incompleta; valores e posies passveis de mudanas se afetados por persuaso ou influncia.
Fonte : elaborado pela autora com base na reviso bibliogrfica.
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A partir do conhecimento do que negociao, surge a pergunta: como negociar? Segundo
Fisher e Ury (1985), existem alguns princpios que so indispensveis para a eficcia da
negociao. So eles: (1) separar as pessoas do problema; (2) concentrar-se nos interesses a
serem buscados e no nas posies pessoais; (3) buscar encontrar o maior nmero possvel de
alternativas de soluo; (4) identificar critrios objetivos para a soluo do problema.
O primeiro princpio remete a uma viso racional do problema, evitando que as emoes
dificultem avaliar os mritos da questo. O segundo tem como objetivo evitar o impasse, pois
interesses permitem maior flexibilidade que posies. O terceiro princpio exige um
exerccio de criatividade, no qual da quantidade se extrai a qualidade. E o ltimo princpio
prope que se evite julgar as propostas de soluo de problema de modo subjetivo. Segundo
os autores, esses princpios deveriam nortear o processo de negociao desde sua preparao
at sua concluso (FISHER; URY, 1985).
Acuff (1993) tambm contribui para a formao de uma atitude favorvel negociao
racional. Sua proposta mescla alguns princpios defendidos por Fisher e Ury (1985) com
aspectos de sistematizao do planejamento da negociao: (1) identificar todas as questes
envolvidas; (2) priorizar as questes; (3) estabelecer o alcance do acordo; (4) desenvolver
estratgias e tticas. Os dois primeiros itens de sua proposta esto bem prximos da proposta
de Fisher e Ury (1985). No terceiro item, o autor reala a importncia de se estabelecer limites
dentro dos quais o acordo possvel. No ltimo item, prope que se desenvolvam estratgias
e tticas que ajudem a atingir os objetivos das duas partes, indo ao encontro das suas
necessidades.
Ainda como parte da reviso da teoria bsica de negociao, devem-se citar as variveis
bsicas do processo de negociao. Segundo Martinelli e Almeida (1997, p. 65), qualquer
que seja o objetivo da negociao, sua importncia e oportunidade, haver trs variveis
bsicas que condicionam esse processo: poder, tempo e informao. Ainda segundo os
autores, para haver uma negociao efetiva, necessria a presena de pelo menos duas
dessas variveis, alm de sua correta aplicao. Veja a seguir como os autores definem cada
uma dessas variveis, bem como sua interferncia no processo de negociao.
Ao definir a varivel poder, deve-se evitar a conotao negativa do termo e entend- lo como
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capaz de permitir a mudana da realidade e o alcance dos objetivos; deve ser empregado
como poder de fazer algo e no como o poder sobre algum. Deve ser utilizado para
aumentar a autoconfiana das partes e jamais para prejudicar, massacrar ou humilhar o
oponente. Os autores subdividem os poderes em:
a) poderes pessoais so vlidos para qualquer situao, independentemente do papel
desempenhado, dos conhecimentos e das habilidades para lidar com pessoas. Exemplos: poder
da moralidade; poder da atitude; poder da persistncia; poder da capacidade persuasiva;
b) poderes circunstanciais baseiam-se na situao em questo; nas circunstncias em que
ocorre a negociao. Exemplos: poder do especialista; poder de investimento; poder de
posio; poder da legitimidade; poder da concorrncia; poder do precedente; poder dos riscos;
poder do compromisso; poder de conhecer as necessidades; poder de recompensa e de
punio; poder de identificao; poder de barganha.
O tempo, segunda varivel da negociao, deve ser cuidadosamente analisado, verificando-se
como ele afeta o processo e transformando-o em ponto de apoio para projetar o negcio e
alcanar a satisfao dos envolvidos. Pode ser fator de presso e limitao ao processo de
negociao. Percebe-se que, conforme os prazos vo se esgotando, maior a presso do
tempo, podendo gerar concesses para o fechamento do acordo.
O modo como o tempo utilizado pode influenciar relacionamentos, contribuindo para o
sucesso ou fracasso de uma negociao. Diferentes conotaes podem ser dadas maneira
com que o negociador lida com o tempo. Atrasos, por exemplo, podem ser associados tanto
autoconfiana quanto ao desinteresse/hostilidade. O tempo pode favorecer tanto um quanto o
outro lado, dependendo das circunstncias e da habilidade do negociador para lidar com essa
varivel.
A varivel informao se relaciona varivel poder (poder de conhecer as necessidades,
poder de especializao). Identificada como conhecimento ou instruo que um indivduo ou
grupo obtm atravs de diversas fontes, essa varivel importantssima para o sucesso da
negociao. Quanto mais informaes confiveis as partes tm, mais distante se fica de um
resultado inesperado.
Graas sua importncia, deveria haver grande empenho em reunir uma grande quantidade de
informaes antes mesmo de se sentar mesa de negociao. Essa preocupao deveria
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permanecer durante o processo de negociao, desenvolvendo a capacidade de perceber
informaes passadas indiretamente, atravs de comunicao no-verbal (gestos, expresses
faciais, tom de voz) ou deixas (mensagem transmitida indiretamente, cujo significado pode
ser ambguo e requerer interpretao), para, depois, associ-las negociao.
A teoria a respeito das variveis bsicas do processo de negociao tambm se aplica s
negociaes internacionais. Todas essas variveis esto presentes em negociaes
internacionais, porm a varivel informao merece destaque, pois surge como meio de
promover a an lise do ambiente e da influncia que ele exerce sobre os negociadores,
transformando-se em fonte de poder para o encaminhamento do acordo (MARTINELLI;
ALMEIDA, 1997).
O estudo das variveis bsicas da negociao leva ao conceito de habilidades de negociao.
Maximiano (2000) define habilidades como competncias para o desempenho de tarefas. O
estudo das habilidades de negociao baseia-se em um princpio, defendido por muitos
autores da rea, de que, entre as habilidades gerenciais, existem aquelas que so especficas
para negociar. Esses autores renem uma srie de caractersticas e competncias que definem
o perfil do negociador.
Segundo Martinelli e Almeida (1997) o negociador precisa concentrar-se nas idias, discutir
proposies, proporcionar alterna tivas outra parte, ter objetividade no equacionamento dos
problemas, apresentar propostas concretas, saber falar e ouvir, colocar-se no lugar da outra
parte, saber interpretar o comportamento das pessoas, saber separar os relacionamentos
pessoais dos interesses.
Para Fisher e Erthel (1997), um negociador ideal firme, amistoso e criativo. Afirma tambm
que, para que uma negociao seja eficiente, todo negociador deve ter as seguintes
habilidades: gerar comunicao eficaz, criar bom relacionamento, descobrir o interesse da
outra parte, elaborar os diversos acordos possveis, convencer a outra parte de que est sendo
tratada com justia, definir quais so as opes para o acordo e chegar ao compromisso final.
Casse (1995) apresenta as habilidades que deve m ser usadas pelo negociador para ser efetivo,
agrupando-as em dois conjuntos: (1) as habilidades convencionais saber formular questes
abertas; verificar a compreenso sobre aquilo que a outra parte disse; saber usar o silncio;
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fazer resumo de tempos em tempos dos aspectos mais importantes do processo; saber lidar
com a dimenso humana da negociao (sentimentos e emoes); (2) e as no convencionais
simular equvocos para forar a outra parte a se explicar melhor; exagerar o que a outra
parte diz atravs do uso de hiprboles; quebrar a seqncia lgica da discusso atravs de
afirmaes inesperadas ou mudanas repentinas de assunto; usar sarcasmo para provocar
reaes assertivas na outra parte; sufocar a outra parte com excesso de questes ou
informaes, buscando enfraquec- la. Segundo o autor, de acordo com as circunstncias da
negociao, o negociador pode optar pelo uso de um ou de outro conjunto de habilidades.
Ao abordar comunicao, percepo e vieses cognitivos, Lewicki, Saunders e Minton (2002)
apresentam algumas caractersticas e habilidades do bom negociador: capacidade de anlise,
coragem para fazer concesses e assumir posies impopulares quando necessrio,
criatividade, persuaso, pacincia, perseverana, capacidade de visualizar o contexto da troca,
capacidade de manter o equilbrio entre agressividade e concesso, capacidade de administrar
as aparncias, capacidade para formular e usar perguntas e capacidade para escutar.
Andrade, Alyrio e Macedo (2004) apresentam as seguintes caractersticas do bom negociador:
ser cooperativo, ter autenticidade na comunicao, realizar a preparao para a negociao, ter
percepo ampla, ser observador, saber ouvir, saber concentrar-se no que h por trs das
posies e interesses, ter capacidade para criar ganhos mtuos, utilizar critrios e padres
objetivos para criar confiana, ser criativo e flexvel, ser tico, claro, transparente, sincero e
confivel, preocupar-se com a satisfao da outra parte e ter conscincia dos vieses culturais.
No existe consenso em relao ao desenvolvimento das habilidades de negociao. Algumas
pessoas acreditam que as habilidades dos negociadores so inatas. Em contrapartida, muitos
autores, como, por exemplo, Pollan e Levine (1994), destacam que muitas habilidades dos
negociadores so aprendidas na prtica. Segundo Mattos, negociar no um atributo inato
nem meramente tcnico, e sim o resultado de investimento permanente em educao
gerencial.
Em 2005, OConnor e Arnold publicaram um artigo em que estudam a importncia da
experincia passada na construo do perfil do negociador, no desenvolvimento de suas
habilidades e em seu comportamento em negociaes futuras. Assim, apontam que
negociadores que enfrentaram impasse na sua primeira experincia em negociao tendem a
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ser menos cooperativos em negociaes futuras e apresentam uma probabilidade maior de
chegar a novos impasses e de alcanar benefcios mtuos mais baixos, quando comparados
com aqueles que tiveram uma primeira experincia positiva (OCONNOR; ARNOLD, 2005).
Martinelli e Almeida (1997) afirmam que o conhecimento das habilidades de negociao, da
sua importncia e das maneiras como se pode desenvolv- las contribui para melhorar o
processo de negociao.
Alm de desenvolver as habilidades de negociao, para obter melhores resultados
necessrio um bom planejamento do processo de negociao. A sistematizao do
planejamento da negociao torna-se indispensvel para a maximizao dos interesses
envolvidos (MARTINELLI, 2002). A seguir, sero apresentadas diferentes propostas de
sistematizao do processo de negociao e de seu planejamento.
2.1.1 Planejamento da negociao
Ao enxergar a negociao de maneira racional, no apenas intuitiva, deve-se reconhecer a
necessidade de empreender um planejamento formal do processo de negociao. Para
entender o significado de planejamento da negociao, deve-se partir de seu significado geral.
Drucker (1962 apud MATTAR, 1993) define planejamento como:
[...] processo contnuo e sistemtico de tomar decises futuras no presente com o melhor conhecimento possvel do que dever acontecer, organizando sistematicamente os esforos necessrios para levar estas decises e medir os resultados em relao ao esperado, atravs de um organizado sistema de controle (DRUCKER,1962 apud MATTAR, 1993, p. 25).
Analisando-se a definio de Drucker, nota-se a relao que se estabelece, em um processo de
planejamento, entre o presente e o futuro. Ao planejar, decidem-se antecipadamente, no
momento presente, aes que sero desenvolvidas no futuro. Deve-se faz- lo de maneira
sistemtica, minimizando riscos de tomar decises erradas. A busca de informaes que
permitam conhecer fatos e fenmenos relacionados com o alvo do planejamento e fazer
previses de como esses fatos ou fenmenos interferiro na situao futura esto no cerne da
tentativa de minimizar erros na deciso. Isso demonstra a importncia da busca de
informaes no processo de planejamento.
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A literatura de negociao deixa evidente a importncia do planejamento para uma
negociao racional. A busca de informaes no processo de planejamento tambm
destacada por vrios autores que afirmam que, para aumentar a probabilidade de sucesso,
mais tempo deveria ser despendido na estruturao da negociao do que em sua realizao
(ACUFF, 1993, DONALDSON; DONALDSON, 1999, GULBRO; HERBIG, 1996,
LEWICKI; LTERER, 1985, MARTINELLI, 2002, MILLS, 1993, RAY, 1996, SANER, 2002,
SUEN, 1997).
Alm de ressaltarem que o planejamento a etapa mais importante do processo de
negociao, os livros costumam ressaltar, tambm, outro aspecto bsico em relao ao
planejamento: que a maioria dos negociadores no se prepara adequadamente para a
negociao (ACUFF, 1993, DONALDSON; DONALDSON, 1999, MILLS, 1993).
Segundo Acuff (1993), muitos negociadores norte-americanos no gostam de colocar no
papel um plano de negcios. A resistncia em realizar um planejamento formal decorre,
segundo o autor, do receio de serem responsabilizados pelo plano elaborado em caso de
insucesso; da idia equivocada de que, uma vez escrito o plano, este no possa ser mudado; e
da dificuldade em articular e transcrever suas idias.
Mills (1993) destaca a falta de preparao adequada como uma das principais causas de
insucesso em negociaes. Apesar disso, Donaldson e Donaldson (1999) assinalam que o
primeiro item eliminado por grande parte dos negociadores que esto com seu tempo escasso
o planejamento da negociao. Ao relacionarem os dez erros mais comuns nas negociaes,
os autores destacam, como sendo o pior deles, comear a negociao sem estar devidamente
preparado para ela.
Saner (2002) cita o desastre da Conferncia de Munique, em 1938, como um exemplo claro
de que a negociao se torna particularmente ineficaz quando o negociador ignora, subestima
ou simplesmente desconsidera os fatores decisivos do conflito:
Se ele (o negociador) s toma conhecimento das verdadeiras questes em jogo quando j est sentado mesa de negociaes, suas chances de sucesso so de fato mnimas. Esses erros podem ser evitados com uma preparao mais cuidadosa [...] o planejamento o principal elemento da negociao, por mais modesto que possa parecer quando comparado com o lado mais espetacular do processo de negociao face a face. (SANER, 2002, p. 41).
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Antes de se pensar na sistematizao do processo de planejamento, necessrio destacar
algumas variveis essenciais definidas durante o planejamento. A primeira consiste na
determinao clara dos limites mnimos, ou o ponto de transio em que voc passa a perder,
ou quando passa a uma situao pior, e no melhor, com aquele acordo (ANASTASI, 1996,
p. 31). Ao definir o limite mnimo at onde se pode chegar, deve-se tambm pensar no que
fazer caso no se chegue ao acordo. o que Fisher e Ury (1985) chamam de BATNA (Best
Alternative To a Negotiated Agreement ). O BATNA (Fisher; Ury, 1985) , de um modo geral,
segundo Anastasi (1996, p. 31), o resultado, no caso de no haver nenhuma negociao, isto
, quando voc suspende as negociaes e no chega a nenhum acordo.
muito importante, na fase de preparao para a negociao, definir o BATNA e o limite
mnimo aceitvel, porque nessa fase voc no est envolvido com o calor da discusso e
ter uma viso mais racional do problema. Quando isso no ocorre, pode acontecer o que
Bazerman e Neale (1998, p. 25) chamam de escalada irracional do compromisso, em que as
partes envolvidas em uma negociao podem comportar-se de maneira incoerente at mesmo
com seus prprios interesses, mantendo-se presas a decises iniciais e caminhando para um
acordo bem inferior ao seu limite mnimo.
Em artigo publicado recentemente, Kim e Fragale (2005) fazem uma interessante abordagem
do poder em negociao relacionando-o ao BATNA. Segundo os autores, estudos sobre o
poder em negociao costumam se fundamentar na teoria do poder versus dependncia.
Assim, quanto maior a dependncia, menor o poder. A dependncia, por sua vez, est
relacionada a duas dimenses: (1) diretamente proporcional ao valor atribudo ao resultado
do embate e (2) inversamente proporcional disponibilidade de resultados alternativos.
Nesse sentido, o artigo aponta que negociadores que possurem BATNA mais atrativos sero
menos dependentes da negociao e, portanto, possuiro maior poder e alcanaro melhores
resultados que a outra parte (KIM; FRAGALE, 2005).
Alm dessa constatao, o artigo de Kim e Fragale (2005) analisa a margem de contribuio
de cada parte para com o resultado da negociao e sua relao com o BATNA no
desempenho na negociao. Concluem os autores que a importncia relativa do BATNA
versus margem de contribuio de cada parte e a influncia desses dois fatores no
desempenho do negociador variam em funo do tamanho da zona de barganha. Os benefcios
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provenientes de um BATNA superior diminuem, e os benefcios provenientes de uma
contribuio superior aumentam com o crescimento da zona de barganha.
Outra varivel importante a definio das estratgias que sero utilizadas para negociar.
Alguns autores enxergam as estratgias de negociao como um componente endgeno, que
pode sofrer alteraes durante o processo de negociao (BRETT, 2000, GRAHAM, 1985b,
PHATAK; HABIB, 1996, CALANTONE; GRAHAM; MINTU-WIMSATT, 1998). O fato de
poder ser alterada durante o processo de negociao no impede a adoo de uma estratgia
inicial, estabelecida na fase de preparao, como resultado da busca de informaes
(PHATAK; HABIB, 1996).
Existem diferentes formas de classificao das estratgias de negociao. Para este trabalho,
optou-se por utilizar a mais comum na literatura de negociao (LEWICKI; HIAM;
OLANDER, 1996, MARTIN et al., 1999, REYNOLDS; SIMINTIRAS; VLACHOU, 2003,
SANER, 2002), baseada em dois critrios para a soluo de conflitos: a importncia do
relacionamento (cooperao) e a relevncia do resultado (assertividade). Com base nesses
critrios surgem cinco tipos bsicos de estratgia, conforme mostrado na figura 1. Observa-se
no quadro 2 o significado de cada estratgia.
Figura 1 - Grade de posicionamento estratgico
Fonte: adaptado pela autora (LEWICKI; HIAM; OLANDER, 1996, SANER, 2002).
Competio
Evitao
Colaborao
Acomodao
conciliao
Importncia do relacionamento
Rel
evn
cia
do
resu
ltado
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Segundo Calantone, Graham e Mintu-Wimsatt (1998), vrios autores afirmam que os
negociadores costumam ajustar suas estratgias de negociao de acordo com a impresso que
formam de seus oponentes. Isto , se uma das partes emprega um determinado
comportamento, provvel que a outra parte responda da mesma maneira. Gouldner (1960
apud CALANTONE; GRAHAM; MINTU-WIMSATT, 1998) denominou esse fenmeno de
reciprocidade. Para Francis (1991 apud CALANTONE; GRAHAM; MINTU-WIMSATT,
1998), em um contexto intercultural esse comportamento faz parte da adaptao cultural das
partes. Gulbro e Herbig (1996) chegam a recomendar mudanas no comportamento bsico
como forma de aumentar a probabilidade de sucesso em negociaes internacionais.
Os conceitos de reciprocidade estratgica e adaptao cultural da estratgia abordados no
pargrafo anterior remetem concluso de que os negociadores no adotam uma nica
estratgia de negociao, e sim diferentes estratgias em diferentes situaes, embora possam
dar preferncia a uma delas, em funo de suas caractersticas individuais.
Quadro 2 - Estratgias de negociao
ESTRATGIA DE EVITAO Por haver pouca importncia tanto do relacionamento quanto dos resultados, no h interesse em negociar; evita-se a negociao, com a tendncia de levar ao perde-perde.
ESTRATGIA DE ACOMODAO Por haver alta importncia do relacionamento e baixa importncia dos resultados, abre-se mo dos resultados para preservar o relacionamento; tende a levar ao perde-ganha.
ESTRATGIA DE COMPETIO Alta preocupao com o resultado, sem muita nfase ao relacionamento; busca-se ganhar a qualquer custo levando para uma negociao ganha-perde. Baseia-se na crena de que os objetivos das partes so mutuamente exclusivos e apenas uma parte pode ganhar; tende a levar ao ganha-perde.
ESTRATGIA DE COLABORAO Alta importncia para ambos: relacionamento e resultados; leva ao ganha-ganha; procura-se uma soluo que atenda a ambas as partes, mesmo que, de incio, as partes no tenham objetivos compatveis entre si; tambm chamada de estratgia cooperativa.
ESTRATGIA DE CONCILIAO Importncia mdia a ambos: relacionamento e resultados; tambm chamada de estratgia de satisfao; baseia-se na concesso de ambas as partes para se chegar ao acordo.
Fonte: Lewicki; Hiam; Olander (1996).
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Saner (2002) apresenta um mtodo para determinar a posio estratgica inicial do
negociador. Prope um questionrio e uma escala para medir a importncia do resultado, a
posio de poder, os interesses comuns e a qualidade do relacionamento. Cada um desses
fatores apresenta um nmero como resultado. Os quatro nmeros so ento transferidos para
uma grade de posicionamento estratgico semelhante apresentada na figura 1, da qual se
conclui o posicionamento estratgico inicial.
A fim de caminhar na sistematizao do planejamento da negociao, necessrio conhecer
as etapas do processo de negociao para, a seguir, avaliar alguns modelos de planejamento
disponveis na literatura, o que ser apresentado nos dois prximos itens.
2.1.2 Etapas do processo de negociao
Um primeiro passo a ser considerado no planejamento da negociao o seu processo, que
inclui tudo o que antecede e influencia a rodada de negcios, o momento de estar face a face
com o negociador da outra parte, pondo em prtica o plano traado e, finalmente, o
fechamento do acordo ou o reincio da negociao.
Existem diferentes propostas para a subdiviso do processo de negociao, conforme pode ser
observado no quadro 3 (MATOS, 1989, MILLS, 1993, CASSE, 1995, STEELE; MURPHY;
RUSSILL, 1995, HODGSON, 1996, KOZICKI, 1999, PAIK; TUNG, 1999, SHELL, 2001,).
Observa-se que, na maior parte das propostas, a fase de planejamento propriamente dita
corresponde primeira e, em alguns casos, s duas primeiras etapas. Os autores abordam mais
a fase interativa do processo, que ocorre quando uma rodada de negociao tem incio, do que
as etapas que antecedem a interao entre as partes. Exceto no modelo de Saner (2002), no
h uma separao clara entre o processo prvio de tomada de deciso e a ao propriamente
dita.
Paik e Tung (1999) dividem o processo de negociao em trs estgios. O primeiro,
denominado estgio inicial ou de abertura, aquele em que as partes procuram aprender mais
sobre a posio da outra parte e caminham em direo ao acordo, por meio da busca de
informaes e preparao para a negociao. Segundo o autor, os negociadores tambm
procuram criar impresses favorveis em relao sua prpria posio e desfavorveis em
relao posio do oponente. No segundo estgio, chamado pelos autores de estgio de
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resoluo, enfatiza-se a reduo do espao entre a posio das partes, por meio de concesses
mtuas, at um ponto em que o acordo se torne possvel. No estgio final, a barganha
finalizada, e o acordo, fechado. Percebe-se que os autores se atm a dividir o processo a partir
de quando a negociao (ao) tem incio, no incluindo a sua preparao.
A proposta de Steele, Murphy e Russill (1995), de seis etapas, mais ampla do que a de Papik
e Tung (1999). Nela, h uma clara distino entre o que os autores chamam de preparao e o
que chamam de planejamento. A primeira expresso utilizada para designar a fase inicial do
processo de negociao, baseado principalmente no levantamento de informaes a respeito
do que ser negociado: a outra parte, o mercado, os prprios objetivos, o espectro da
negociao etc. O planejamento, para os autores, implica imaginar a sesso de negociao e
estabelecer as estratgias que sero utilizadas, tentando imaginar as que sero utilizadas pela
outra parte. As demais fases so semelhantes s dos outros autores apresentadas no quadro 3.
Saner (2002) apresenta uma proposta de ciclo da negociao baseada nas fases do processo de
negociao. Dentre todas as propostas apresentadas, essa a que mais se adapta aos objetivos
deste trabalho, em funo da nfase dada ao planejamento e do detalhamento das etapas a
serem seguidas antes que a ao de negociao tenha incio. O autor tambm apresenta uma
distino entre o planejamento anterior primeira rodada de negociao (preparao) e o
planejamento que ocorre aps esse momento (avaliao e replanejamento). As rodadas de
negociao so chamadas pelo autor de fase de ao. Outra diferena entre o modelo de Saner
(2002) e o dos demais autores estudados (CASSE, 1995, HODGSON, 1996, KOZICKI, 1999,
MATOS, 1989, MILLS, 1993, PAIK; TUNG, 1999, SHELL, 2001, STEELE MURPHY;
RUSSILL, 1995) a viso cclica que dada ao processo. De todos os autores estudados,
Saner (2002) o que deixa mais claro que, aps a avaliao da rodada de negociao, o ciclo
recomea.
Por valorizar o planejamento, o autor o subdivide em seis etapas: (1) conscincia do conflito
refletir em profundidade sobre o problema ou conflito em questo, buscando identificar
convergncias que possam levar ao acordo; (2) anlise das necessidades conhecer as
prprias necessidades e tambm as da outra parte; (3) seleo de objetivos estabelecer as
metas e as possveis concesses; (4) seleo de estratgias estudar o equilbrio de foras
entre as partes, a importncia da negociao para cada parte, o relacionamento entre as partes
e os interesses comuns, a fim de definir uma estratgia para a negociao; (5) antecipao das
31
aes da outra parte buscar informaes sobre o oponente e (6) seleo de tticas
selecionar os meios para atingir os objetivos definidos (SANER, 2002).
Simintiras e Thomas (1998), ao estudarem a literatura sobre negociaes interculturais,
propuseram a subdiviso da parte interativa do processo de negociao (rodada de negcios)
em dois diferentes estgios: (1) interao no-relacionada tarefa refere-se aos primeiros
contatos, face a face, para conhecer a equipe de negociao da outra parte; (2) interao
relacionada tarefa refere-se ao negcio em jogo. Segundo os autores, o primeiro estgio
influenciado pelo status, pela preciso na formao de impresso sobre a outra parte e pela
atrao interpessoal. O segundo estgio envolve a troca de informaes sobre as necessidades
e preferncias dos negociadores; ganham nfase o poder de persuaso, as estratgias de
barganha e as concesses, que acabam levando ao acordo.
A proposta de Simintiras e Thomas (1998) remete a uma forma clssica de diviso do
processo interativo de negociaes interculturais em quatro partes: (1) construo do
relacionamento no-relacionada tarefa; (2) troca de informaes relacionadas tarefa; (3)
persuaso e compromisso e (4) concesses e acordo (GULBRO; HERBIG, 1996, MARTIN et
al., 1999).
As vrias propostas de segmentao do processo de negociao apresentadas nesta reviso
fazem uma distino entre a abordagem inicial e o incio da negociao propriamente dita. No
entanto, o artigo de Simintiras e Thomas tem como foco central estabelecer essa diferena.
Em funo disso, exploram o assunto mais a fundo, abordando as principais variveis
envolvidas em cada estgio. O conhecimento dessas variveis pode ser de grande valia no
planejamento da negociao.
De um modo geral, as vrias propostas de diviso do processo de negociao apresentam (1) o
momento que antecede a rodada de negcios, chamado por muitos de preparao, (2) o
momento das primeiras trocas de informaes entre as partes, que marca o incio da
negociao, (3) o momento da discusso das propostas, barganhas e concesses e (4) o
fechamento da negociao, atravs do acordo. Alguns autores enxergam o acordo como o
final do processo. Outros sinalizam como etapas posteriores a (5) reviso do acordo e a (6)
avaliao do desempenho no processo de negociao. Saner (2002) enxerga a negociao de
modo evolutivo, sem um fim determinado.
32
Parece oportuno agregar a essas propostas a viso da negociao sob um enfoque sistmico.
Dessa maneira, seu processo seria descrito como um conjunto de entradas (as influncias s
quais a negociao est sujeita, tambm chamadas de antecedentes do processo), o processo
em si (a negociao propriamente dita, o processo de transformao das entradas em sadas) e
as sadas (resultados da negociao acordos, relacionamentos, lucros, benefcios). A grande
vantagem de analisar o processo de negociao sob um enfoque sistmico justamente a
possibilidade de identificar, com maior clareza, os possveis elementos que influenciam e
impactam uma negociao e, com isso, ser mais efetivo em relao aos resultados do processo
e na consolidao de negociaes futuras (MARTINELLI, 2002). Atravs da reviso
bibliogrfica realizada, pde-se confirmar a importncia dessa concepo do processo de
negociao. Os estudos mais recentes publicados nessa rea utilizam modelos multicausais
para estudar a relao entre variveis dependentes e independentes. Esses modelos se baseiam
na forma sistmica clssica: antecedentes, processo e resultados. Essa discusso ser
aprofundada no prximo captulo (item 2.2.3 Planejamento da negociao internacional).
33 Quadro 3 - Propostas para o processo de negociao
AUTORES
ETAPAS Matos (1989) Mills (1993) Casse (1995)
Steele, Murphy e Russill (1995)
Hodgson (1996) Kozicki (1999) Paik e Tung (1999)
Shell (2001) Saner (2002)
1 abordagem
(R) preparar-se pr-formulao
preparao e planejamento
preparao fase investigativa Estgio inicial (abertura)
preparao da estratgia
Planejamento conscincia do conflito anlise das necessidades
2 argumentao
(E) explorar formulao
abordagem discusso fase da apresentao
Estgio de resoluo
troca de informaes
Ao (rodada de negociao) aquecimento apresentao das posies abordagem
3 superao de objees
(S) sinalizar a movimentao
tempestade
teste propostas fase da negociao Estgio final propostas e concesses
Avaliao fechamento do acordo ou nova rodada
4 acordo
(P) testar Padronizao movimentao/ fazer concesses
barganha fase do acordo fechamento do acordo e compromissos
Planejamento (o ciclo recomea)
5 reforo (E) trocar concesses
execuo concluso e acordo acordo
6 reabordagem (C) fechar o acordo controle do desempenho
avaliao do resultado
7 (T) amarrar as pontas
Fonte: elaborado pela autora com base na reviso bibliogrfica.
34
2.1.3 Modelos para o planejamento da negociao
Ray (1996) afirma que muitos tericos e prticos da negociao concordam com a idia de
que a base para o sucesso em negociao est no planejamento que ocorre antes da rodada
de negcios. Entretanto, a forma como deve se dar esse planejamento no consenso,
segundo o autor. Muitos dos conselhos escritos sobre a preparao e o planejamento da
negociao so prescritivos (receitas). Isso atrativo para uma audincia que busca
solues garantidas apresentadas de forma simples. Em contraste com essas receitas, a
pesquisa acadmica sobre o assunto, na opinio do autor, tem sido conduzida de maneira
fragmentada e descritiva, ainda no conseguindo apresentar um entendimento completo do
papel crtico desempenhado pelo planejamento no processo de negociao.
Os resultados desta reviso bibliogrfica apontam na mesma direo das concluses de Ray
(1996). A maior parte dos trabalhos encontrados sobre o tema apresenta carter descritivo e
no converge para a mensurao do impacto do planejamento no sucesso da negociao. A
dificuldade para isolar variveis intervenientes talvez seja um dos motivos para explicar
essa lacuna. Apesar da importncia de medir o impacto do planejamento no resultado da
negociao, a ausncia dessa medida no descaracteriza sua importncia. Por isso, sero
apresentadas, a seguir, propostas para o planejamento da negociao encontradas na
literatura. Deve-se lembrar que o objetivo central desta tese no medir o impacto do
planejamento, mas propor uma estrutura conceitual que auxilie os administradores da
pequena empresa a se preparar para as negociaes internacionais.
Corroborando as idias de Ray (1996) sobre a importncia do planejamento, Saner (2002)
apresenta um modelo de plane jamento bastante sinttico baseado em estabelecer
divergncias e convergncias entre as partes na fase de preparao. Comea por estabelecer
os nossos desejos e necessidades. Uma vez identificadas, as necessidades devem ser
traduzidas em objetivos especficos. A seguir, esses objetivos so traduzidos em
reivindicaes especficas apresentadas durante a negociao. Completa-se o planejamento
com o que se pode oferecer outra parte (vantagens tangveis e intangveis), organizando
essas concesses em ordem crescente de custo e esforo.
35
Segundo o autor, deve-se pensar tambm no outro lado, nas intenes da outra parte. E aqui
Saner (2002) prope um exerccio contrrio: parte-se das provveis reivindicaes da outra
parte, procura-se interpretar os objetivos por trs dessas reivindicaes e, com base na
teoria das necessidades, chega-se aos desejos e s necessidades mais profundas que esto
por trs dos objetivos. A idia tentar montar um quebra-cabea a fim de construir um
quadro cada vez mais completo da situao.
Segundo Robinson (1996), para planejar a negociao necessrio seguir as seguintes
etapas: (1) estabelecimento de todos os objetivos; (2) coleta e anlise das informaes; (3)
definio da estratgia a ser adotada; (4) seleo das tticas que sero empregadas; (5)
identificao das habilidades necessrias. Percebe-se uma preocupao em determinar os
objetivos da negociao e as maneiras de atingi-los, antes que a ao de negociao tenha
incio.
Quadro 4 - Variveis para diagnstico da situao a ser negociada (KOZICKI, 1999) I. AMBIENTE INTERNO
1. Estrutura formal (hierarquia, nvel de autonomia nas decises etc.)
2. Estrutura informal (poder, cultura organizacional)
3. Objetivos da empresa (avaliar a negociao luz do objetivo da empresa)
4. Relacionamentos interdepartamentais
5. Relacionamentos pessoais
6. Sindicatos (checar implicaes da negociao sobre os membros do sindicato)
II. AMBIENTE EXTERNO
1. Mercado internacional
2. Orientao poltica e polticas econmicas
3. Localizao geogrfica
4. Era da informao (preparao contnua)
Fonte: elaborado pela autora com base em KOZICKI, 1999.
Kozicki (1999) apresenta um mtodo de planejamento da negociao em que sugere um
checklist com os itens que devem ser investigados para o diagnstico da situao a ser
negociada, antes de se definir objetivos e limites da negociao (quadro 4). Quando fala de
objetivos, estabelece trs perspectivas: otimista, realista e pessimista. A seguir, sugere que
se determinem estilo e estratgia e se revisem todas as etapas. O modelo de planejamento
36
de Kozicki est voltado para negociaes comerciais empresariais.
Quadro 5 - Plano de negociao baseado em conhecimento (SHELL, 2001). I. PROBLEMA
Defina o problema que se est tentando solucionar.
II. SUAS METAS ESPECFICAS
Qual sua meta especfica e otimista?
Qual a sua condio bsica?
Pessoa responsvel pelas decises.
O estilo de negociao da pessoa responsvel pelas decises (se conhecido).
Histrico do relacionamento.
III. OS INTERESSES DA OUTRA PARTE
Como os interesses da outra parte seriam aplicados para ajud-lo a atingir sua meta (i.e. interesses
compartilhados)?
O que o levaria a dizer no (i.e. interesses conflitantes e secundrios)?
IV. PROPOSTAS VIVEIS
Baseie-se nos interesses m tuos/solucione os interesses conflitantes.
V. PODER DE INFLUNCIA
At o momento, o que eles perderiam, caso o acordo no se realizasse?
O que voc perderia?
Voc pode afetar as alternativas da outra parte?
Como voc pode melhorar as suas prprias alternativas?
VI. PADRES E NORMAS DOMINANTES
Meus
Deles
Meus contra -argumentos
VII. ANLISE DA SITUAO E DA ESTRATGIA
A situao sob meu ponto de vista (transao, relacionamento, preocupaes balanceadas, coordenao tcita)
Meu estilo bsico _____________ ______ ento preciso ser mais _______________ nessa situao.
A situao sob o ponto de vista deles (transao, relacionamento, preocupaes balanceadas, coordenao
tcita)
A estratgia esperada deles (competitiva, solucionadora de problemas, transigente, que evita conflitos,
flexvel)
Fonte: adaptado de Shell (2001), p. 309.
Shell (2001) tambm traz uma contribuio ao planejamento da negociao atravs de sua
abordagem: negociao baseada em conhecimento. Destaca-se no trabalho do autor a
37
formalizao do processo de planejamento atravs da apresentao de um modelo de plano
de negociao baseado em conhecimento (quadro 5). Deve-se entender o plano como
resultado do processo de planejamento, a consubstanciao do exerccio de planejamento
formal (CAMPOMAR, 1983).
Um retorno s idias de Ray (1996) necessrio para aprofundar a discusso sobre a forma
como a preparao pode ser segmentada. Do mesmo modo que se pode classificar a
negociao, de acordo com sua abordagem, em distributivo-competitiva e integrativa, a
abordagem da preparao tambm pode variar. Segundo o autor, ela pode (1) estar voltada
para estabelecer posies para iniciar a negociao ou pode (2) dar nfase ao
estabelecimento de princpios contra os quais os resultados possam ser julgados. Alguns
autores sugerem incorporar as duas abordagens na negociao, mas, na opinio do autor,
trata-se de abordagens contrastantes e importante explorar o balano dessas nfases na
atividade de preparao dos negociadores (RAY, 1996).
Em seu estudo (simulao com 99 respondentes), Ray (1996) observou que os negociadores
tendiam a dar maior ateno aos resultados pretendidos do que ao modo como deviam obter
os resultados (processo). A maioria dos entrevistados se preparou para a negociao
estabelecendo uma posio baseada em pelo menos um dos seguintes elementos: um limite
mnimo aceitvel para o acordo e um objetivo pretendido. Um aspecto interessante do
estudo de Ray (1996) que os negociadores afirmaram que possuir ambos, limite mnimo e
objetivo desejado, auxiliou-os durante o processo de negociao. Dentre os dois, o limite
mnimo foi considerado o mais importante para decidir os avanos durante a rodada de
negcios, uma vez que conferiu aos participantes um conforto psicolgico e uma certeza
de que no fariam um acordo desfavorvel.
Em relao preparao para o processo de negociao, os resultados so bem diferentes.
Os poucos que se preocuparam com o modo como os objetivos seriam negociados (cerca de
29% dos respondentes) apenas estabelec eram alguns princpios gerais como ser o iniciador
ou permitir que a outra parte inicie o processo, sem planejar o que aconteceria depois disso.
Contrariamente a essa constatao, os resultados apontaram que uma maior ateno
38
preparao do processo tornaria a negociao mais efetiva (RAY, 1996).
2.2 Negociaes internacionais
A partir da compreenso dos conceitos gerais de negociao, pode-se aprofundar o estudo
das especificidades da negociao internacional. Esse tipo de negociao vem ganhando
importncia no cenrio atual em funo da globalizao da economia, do aumento dos
investimentos no exterior e da ampliao de acordos de negcios em nvel mundial
(GULBRO; HERBIG, 1996, VIDA, 1999, MARTINELLI, 2002, OSMAN-GANI; TAN,
2002).
A globalizao da economia criou novas oportunidades, mas tambm desafios, que levaram
as empresas a desenvolver esforos na adoo de estratgias de internacionalizao como
forma de sobrevivncia. Pases incentivam exportaes e internacionalizao de empresas,
assim como se unem formando blocos comerciais com vistas a aumentar sua participao e
competitividade na economia global (GULBRO; HERBIG, 1996, SUEN, 1997, VIDA,
1999, OSMAN-GANI; TAN, 2002, MARTINELLI; VENTURA; MACHADO, 2004).
O conceito de internacionalizao de empresa pode ser descrito como a participao da
empresa no mercado internacional. Segundo Szapiro e Andrade (2001), a
internacionalizao pode ser definida como o conjunto de atividades que a empresa
desenvolve fora dos mercados que constituem seu ento rno geogrfico natural. A Fundao
Dom Cabral (2002, p. 5) prope uma definio mais precisa: internacionalizao o
processo de obteno de parte ou totalidade do faturamento a partir de operaes
internacionais, seja por meio de exportao, licenciamento, alianas estratgicas, aquisio
de empresas em outros pases ou construo de subsidirias prprias.
Segundo Lemaire, Petit e Desgardins (1997), dentre os fatores desencadeantes da insero
de empresas no mercado internacional, destacam-se o inevitvel processo de abertura
internacional e a tendncia globalizante das economias e mercados, que se firmou depois de
39
uma ou duas dcadas dentro de um cenrio em que as trocas de bens, servios e capitais
tornaram-se mais complexas.
Para se internacionalizarem, as empresas precisam adotar estratgias competitivas
adequadas a esse processo, como atitude competitiva, concentrao geogrfica,
mecanismos de gesto e de coordenao de atividades, desenvolvimento interno de
competncias dinmicas, absoro e integrao de conhecimento, relao com outras
empresas (concorrentes, clientes, fornecedores) e capacidade de adaptao e articulao das
diferentes condies locais especificidades culturais, econmicas, regulamentares e
lingsticas dos pases ou regies (CALDEIRA, 2002).
Segundo Rezende (2002), processos de internacionalizao de empresas tm atrado a
ateno de pesquisadores, tornando-se alvo de debates acadmicos por mais de quarenta
anos. Os estudos nessa rea esto bastante adiantados e complexos. Um dos alvos desse
debate acadmico a idia de gradualismo e continuidade em processos de
internacionalizao. Segundo o modelo proposto por Johanson e Wiedersheim-Paul (1975
apud JOHANSON; VAHLNE, 1977), a internacionalizao vista como um processo de
aprendizagem em que a empresa investe recursos de modo gradual e adquire
conhecimentos sobre o mercado internacional de modo evolutivo. Atravs de estudo
realizado com empresas suecas, os autores desenvolveram um modelo para
internacionalizao de empresas, baseado em quatro etapas. Esse modelo apresenta grau
crescente, em cada etapa ou estratgia subseqente, do potencial de comprometimento,
risco, controle e lucro, pressupondo uma entrada gradual e seqencial em mercados
internacionais. A seguir, as etapas do modelo: (1) atividades de exportao inconstantes; (2)
exportao por meio de representantes independentes (agentes); (3) estabelecimento de uma
ou mais filiais de vendas e (4) estabelecimento de instalaes de produo no exterior.
Um outro pressuposto do modelo de Johanson e Wiedersheim-Paul (1975 apud
JOHANSON; VAHLNE, 1977) consiste na afirmao de que a distncia psquica entre
pases um fator de deciso para a internacionalizao. Os autores definem distncia
psquica como as diferenas percebidas entre valores, prticas gerenciais e educao de
40
dois pases. Ainda, segundo eles, existem evidncias de que a empresa comea seu processo
de internacionalizao em pases considerados culturalmente prximos, a fim de diminuir o
grau de incerteza do processo.
A partir desses resultados, Johanson e Vahlne (1977) apresentaram outro modelo, que ficou
conhecido como modelo de Uppsala, baseado em trs pressupostos: (1) a falta de
conhecimento o maior obstculo em processos de internacionalizao; (2) o
conhecimento necessrio internacionalizao principalmente adquirido atravs das
experincias atuais da empresa em determinado mercado-alvo e (3) a empresa
internacionaliza suas operaes investindo recursos de modo gradual.
Baseados nesses pressupostos, Johanson e Vahlne (1977) introduziram o modelo em que
so identificados dois estados: conhecimento e comprometimento. O primeiro refere-se ao
conhecimento do mercado-alvo, e o segundo, ao montante de recursos investidos em
determinado mercado internacional e ao grau de especificidade desses recursos. Alm
desses estados, o modelo apresenta dois aspectos transitrios que esto relacionados aos
estados: as decises de investimento e as operaes atuais. Existe uma relao direta entre
estados e aspectos transitrios: enquanto as decises de investimento definem o
comprometimento da empresa em determinado mercado, as operaes atuais constituem-se
na principal fonte de conhecimento da empresa sobre esse mercado. Mas o modelo tambm
sugere uma interao dinmica entre estados e aspectos transitrios: quanto maior o
investimento em determinado mercado internacional, maior o grau de conhecimento sobre
esse mercado, maior o seu grau de aptido para efetuar novos investimentos e assim
sucessivamente. Os aspectos transitrios possuem duplo papel no processo de
internacionalizao: resultam de conhecimento e comprometimento efetuados no passado;
determinam os nveis de conhecimento e comprometimento futuros.
Vrios outros autores tm confirmado o pressuposto de que a insero de empresas em
mercados internacionais se d de modo gradual e seqencial (CAMINO; CARZOLA, 1998,
CALOF, 1995, CHANG, 1995). No entanto, outras pesquisas tm sugerido que a
internacionalizao de empresas pode ocorrer de maneira descontnua (BENITO; WELCH,
41
1997; REZENDE, 2002). Alguns autores justificam a inadequao do modelo de Uppsala
para representar a realidade atual, com base na alterao do cenrio. Afirmam que um
modelo formulado no final da dcada de 1970, poca em que o ambiente de negcio era
menos ligado internacionalmente, no pode mais explicar a realidade com a consolidao
da globalizao e o aumento da interdependncia no mercado internacional (REZENDE,
2002).
Forsgren (2000) afirma que a relao entre conhecimento de mercado e comportamento
incremental negativa, e no positiva, como prega o modelo de Uppsala. Segundo o autor,
medida que aumenta o conhecimento sobre determinado mercado internacional, a
empresa passa a ter uma atitude mais ousada e menos incremental, pois diminui sua
necessidade de desenvolver-se gradualmente para minimizar a incerteza.
Andersen (1997) acredita que a idia de gradualismo do modelo de Uppsala
demasiadamente determinista, pois a empresa pode seguir diferentes seqncias no modo
de entrada em mercados internacionais. Segundo Rezende (2002), algumas empresas suecas
com operaes no mercado japons no passaram pelos estgios iniciais da cadeia de
estabelecimento (modelo de Johanson e Wiedersheim-Paul, 1975). Para Kobrin (1992), em
funo do ambiente mais interdependente em nvel global, as empresas evoluem de maneira
mais rpida em mercados internacionais para obter economia de escala, escopo e
aprendizagem por meio da integrao de suas operaes.
Alguns autores (BENITO; WELCH, 1997, FLETCHER, 2001, REZENDE, 2002) mostram
que empresas podem seguir uma trajetria inversa do modelo de Uppsala, diminuindo
investimentos em mercados internacionais.
Entre tantas crticas ao modelo de Uppsala, surgem propostas alternativas baseadas na
teoria de redes industriais, que sugerem analisar processos de internacionalizao como
resultados de relacionamentos intra- e interorganizacionais ( JOHANSON; VAHLNE, 1990,
BIRKINSHAW, 1996, REZENDE, 2002, FLEURY; FLEURY, 2003, LIMA;
CARVALHO; GARCIA; MARTINELLI, 2006).
42
Verifica-se que uma das principais caractersticas da nova economia a transio da
eficincia individual para a eficincia coletiva. A competitividade , e ser cada vez mais,
relacionada ao desempenho de redes interorganizacionais e no de empresas isoladas
(FLEURY; FLEURY, 2003; GARCIA; LIMA, 2005; LIMA; CARVALHO; GARCIA;
MARTINELLI, 2006a, 2006b). De acordo com Amato Neto (2000), uma das principais
tendncias que vm se intensificando na economia moderna a que diz respeito s formas
de relaes intra- e interempresariais, particularmente aquelas que envolvem pequenas
organizaes. Essa constatao torna -se ainda mais importante no que tange
internacionalizao das pequenas empresas.
A competncia de negociao ganha relevncia num quadro de globalizao e
interconectividade cada vez maiores (GULBRO; HERBIG, 1996). Em funo desses dois
aspectos, empresrios, funcionrios de empresas pblicas e privadas, alm de governantes e
polticos precisam dominar uma multiplicidade de habilidades, das quais uma das mais
importantes a capacidade de negociar num contexto que ultrapassa fronteiras culturais e
profissionais (SANER, 2002).
Partindo-se da esfera internacional para a nacional, o estudo da internacionalizao das
empresas brasileiras vem despertando o interesse de muitos pesquisadores (LOUREIRO;
SANTOS, 1991, CARVALHO; ROCHA, 1998, CAMPANHOL; SMITH, 2002,
FUNDAO DOM CABRAL, 2002, MARKWALD; PESSOA, 2002, FLEURY;
FLEURY, 2003).
Segundo Loureiro e Santos (1991), a maior parte das empresas brasileiras no possui
tradio de investimentos em negcios no exterior. Essa falta de experincia leva ao
desconhecimento de instrumentos, procedimentos e estratgias comumente utilizados nos
processos de internacionalizao.
A insero do Brasil no mercado in ternacional ainda pouco expressiva quando comparada
com a de pases desenvolvidos. O Brasil ocupa a 47 posio entre os 49 pases pesquisados
43
com relao ao volume do comrcio internacional. O pas tem conseguido criar uma forte
atrao para o capital internacional, com forte impacto dos investimentos estrangeiros, na
internacionalizao conhecida como de fora para dentro. Mas ainda existe um esforo
tmido no sentido contrrio, de dentro para fora (FUNDAO DOM CABRAL, 2002).
A partir da compreenso do conceito de internacionalizao, pode-se entender o conceito
de negociao internacional como aquela que ocorre no contexto da internacionalizao.
Em outras palavras, negociao internacional todo tipo de negociao em que partes,
provenientes de diferentes pases, sentam-se face a face, para negociar um acordo de
negcios envolvendo qualquer tipo de transao internacional, como a venda de produtos
para um comprador estrangeiro, formao de joint venture entre empresas de diferentes
nacionalidades para dividir canais de distribuio em um terceiro pas, fuses, aquisies e
licenciamentos