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Revista SÍNTESE Direito Imobiliário ANO VI – Nº 28 – JUL-AGO 2015 REPOSITÓRIO AUTORIZADO Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Simone Costa Saletti Oliveira CONSELHO EDITORIAL Christiano Cassetari, Luciano Lopes Passarelli, Luiz Antonio Scavone Junior, Luiz Henrique Sormani Barbugiani, Marcelo Manhães de Almeida, Rubens Carmo Elias Filho COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Armando Antonio Lotti, Daniel Ustárroz, Francisco José Barbosa Nobre, Gilberto Carlos Maistro Junior, Julian Gonçalves da Silva, Kenedys Fernandes de Souza, Leomir Alves da Silva, Lindaura A. de Miranda, Lucas Bento Sampaio, Paula Saleh Arbs, Renata Cristina do Nascimento Antão, Wagner Saraiva Ferreira Lemgruber Boechat ISSN 2236-1553

ISSN 2236-1553 Revista SÍNTESE - bdr.sintese.com 28_miolo.pdf · Carta do Editor Nesta edição da Revista SÍNTESE Direito Imobiliário publicamos como Assunto Especial o tema “Usucapião”

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Revista SÍNTESEDireito Imobiliário

Ano VI – nº 28 – Jul-Ago 2015

ReposItóRIo AutoRIzAdo

Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087

dIRetoR executIVo

Elton José Donato

geRente edItoRIAl e de consultoRIA

Eliane Beltramini

cooRdenAdoR edItoRIAl

Cristiano Basaglia

edItoRA

Simone Costa Saletti Oliveira

conselho edItoRIAl

Christiano Cassetari, Luciano Lopes Passarelli, Luiz Antonio Scavone Junior, Luiz Henrique Sormani Barbugiani, Marcelo Manhães de Almeida, Rubens Carmo Elias Filho

colAboRAdoRes destA edIção

Armando Antonio Lotti, Daniel Ustárroz, Francisco José Barbosa Nobre, Gilberto Carlos Maistro Junior, Julian Gonçalves da Silva,

Kenedys Fernandes de Souza, Leomir Alves da Silva, Lindaura A. de Miranda, Lucas Bento Sampaio, Paula Saleh Arbs,

Renata Cristina do Nascimento Antão, Wagner Saraiva Ferreira Lemgruber Boechat

ISSN 2236-1553

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2011 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência e outros assuntos de Direito Imobiliário.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 4.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço: [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista SÍNTESE Direito Imobiliário. – Vol. 1, n. 1 (jan./fev. 2011)- . – São Paulo: IOB, 2011- . v.; 23 cm.

Bimestral. v. 6, n. 28, jul./ago. 2015

ISSN 2236-1553

1. Direito imobiliário.

CDU 347.453 CDD 342.1242

Bibliotecária responsável: Nádia Tanaka – CRB 10/855

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

Nesta edição da Revista SÍNTESE Direito Imobiliário publicamos como Assunto Especial o tema “Usucapião”. Sobre o tema escolhido selecionamos relevantes artigos dos ilustres juristas: Renata Cristina do Nascimento Antão, Francisco José Barbosa Nobre, Lucas Bento Sampaio, Julian Gonçalves da Silva, Wagner Saraiva Ferreira Lemgruber Boechat, Kenedys Fernandes de Souza e Leomir Alves da Silva e Lindaura A. de Miranda.

E, ainda, na Seção Especial “Com a Palavra, o Procurador”, artigo de Armando Antonio Lotti intitulado “Posse, Usucapião e Justo Título: Considera-ções à Luz do Novo Código Civil”.

Usucapião é um modo de aquisição da propriedade e ou de qualquer di-reito real que se dá pela posse prolongada da coisa, de acordo com os requisitos legais, sendo, também, denominada de prescrição aquisitiva.

A usucapião pode recair tanto sobre bens móveis quanto sobre imóveis. Sendo a usucapião sobre bens imóveis, ficará discriminada em três espécies: extraordinário, ordinário e especial (rural e urbana).

Na Parte Geral selecionamos um vasto conteúdo, para mantermos a qua-lidade desta Edição, com relevantes temas e doutrinas de grandes nomes do di-reito, tais como: Daniel Ustárroz, Gilberto Carlos Maistro Junior, e Paula Saleh Arbs.

Não deixe de ver nossa seção “Clipping Jurídico”, que traz notícias rele-vantes do mercado imobiliário.

Aproveite esse rico conteúdo e tenha uma ótima leitura!

Eliane Beltramini Gerente Editorial e de Consultoria

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ....................................................................7

Assunto Especial

UsUcapião

DoUtrinas

1. Novo Código de Processo Civil e a Usucapião Extrajudicial: um Avanço para as Ações PossessóriasRenata Cristina do Nascimento Antão ........................................................9

2. A Usucapião Administrativa no Novo Código de Processo CivilFrancisco José Barbosa Nobre ..................................................................13

3. A Usucapião no Novo Código de Processo CivilLucas Bento Sampaio ...............................................................................15

4. As Diferentes Modalidades de Usucapião e Seus Requisitos ProcessuaisJulian Gonçalves da Silva .........................................................................18

5. Usucapião e o Direito Agrário: Uma Visão Geral da Aplicabilidade da Usucapião no Direito Agrário e a Usucapião Especial RuralWagner Saraiva Ferreira Lemgruber Boechat ............................................47

6. Usucapião de Bens Imóveis no Direito BrasileiroKenedys Fernandes de Souza ...................................................................63

7. Usucapião: Uma Visão PanorâmicaLeomir Alves da Silva e Lindaura A. de Miranda ......................................84

com a palavra, o procUraDor

1. Posse, Usucapião e Justo Título: Considerações à Luz do Novo Código CivilArmando Antonio Lotti .............................................................................95

JUrisprUDência

1. Acórdão na Íntegra (STJ) .........................................................................103

2. Ementário ...............................................................................................110

Parte GeralDoUtrinas

1. Peculiaridades do Contrato de Corretagem no Direito BrasileiroDaniel Ustárroz .....................................................................................119

2. Breves Considerações sobre as Liminares na Ação de DespejoGilberto Carlos Maistro Junior ................................................................130

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3. A Ação de Nunciação de Obra Nova e Sua Natureza Preventiva – Inibitória – no Novo CPC Paula Saleh Arbs ...................................................................................142

JUrisprUDência

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1452. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1593. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1634. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios ..........................1695. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais .......................................1796. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná .................................................1857. Tribunal de Justiça Estado do Rio Grande do Sul ....................................1928. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina .....................................1959. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ............................................197

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência ...................................................................199

Clipping Jurídico ..............................................................................................234

Bibliografia Complementar .................................................................................239

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................240

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Usucapião

Novo Código de Processo Civil e a Usucapião Extrajudicial: um Avanço para as Ações Possessórias

REnATA CRISTInA DO nASCImEnTO AnTãOGraduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2009), Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo (2013). Atualmente leciona na Faculdade Projeção/DF e é candidata ao doutorado. Tem experiência na área de Direito Público, atuando principalmente nos seguintes temas: Direitos Humanos, Direito à Educação, Direito à Moradia, Liberdade de Expressão, Pesquisa e Extensão Universitária, Políticas Públicas e Ações Afirmativas.

ObServaçõeS INIcIaIS

No dia 24 do mês de março de 2015, depois de longas discussões, con-sulta a especialistas, audiências públicas e muito debate, foi aprovado o novo Código de Processo Civil (CPC) – PLS 166, de 2010. A reforma do CPC se ini-ciou em 2009, com a criação de uma Comissão de Juristas, nomeada pelo então Presidente do Senado, José Sarney.

Entre as diversas mudanças, temos que uma das mais inovadoras é a previsão do instituto da usucapião extrajudicial. Tal demanda é muito antiga e vem de diversos setores, como pequenos agricultores familiares, que, em razão de processos sucessórios imbricados e inacabados, não possuem os títulos de suas áreas e, assim, não podem realizar financiamentos e custeios agrícolas. A regularização fundiária dessas áreas abrirá possibilidades de planos de investi-mentos e a manutenção de sua subsistência.

A modalidade extrajudicial da usucapião também dinamizará os proces-sos de aquisição de propriedade, desafogando, assim, o Judiciário. Isso porque ela possibilita que todo o procedimento da usucapião, desde a notificação dos confrontantes e possíveis interessados até a análise da área e das provas da pos-se (comprovantes de residência, contas de luz e água, cadastros públicos, etc.), se dê no cartório de registro de imóveis1 da Comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo.

1 À época da discussão sobre o projeto de lei, diversas foram as propostas apresentadas para a usucapião extrajudicial, sendo uma delas a de que todo procedimento fosse realizado por meio do Tabelionato de Notas – Proposta de João Pedro Lamana Paiva, titular do Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre/RS.

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10 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

O Poder Judiciário apenas precisará ser demandado no caso de possí-veis conflitos, impugnações e dúvidas, afinal, o art. 216-A da Lei de Registros Públicos é claro ao afirmar que o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião será realizado sem prejuízo da via jurisdicional.

PrOceDIMeNTO e DINaMIZaçÃO Da DeMaNDa POSSeSSÓrIa

Conforme vemos na previsão do art. 1.071 do novo Código de Processo Civil, a Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973) passa a vigorar acrescida do pedido extrajudicial de usucapião.

O pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião deve ser reque-rido pelo interessado, o qual deve ser representado por advogado, instruído com (a) ata notarial lavrada pelo tabelião que ateste o tempo de posse do reque-rente e seus antecessores; (b) planta e memorial descritivo do imóvel, os quais devem ser assinados por profissional habilitado e pelos titulares de direitos reais e de outros direitos2; (c) certidões negativas dos distribuidores3; e (d) justo título4 ou documento que demonstre a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse5.

Com estes documentos em mãos, o registrador irá autuar o pedido. Cum-pre mencionar que a prenotação, anotação prévia e provisória feita pelo oficial para garantia da prioridade ou preferência em favor do requerente irá prorrogar--se até o acolhimento ou a rejeição do pedido.

A partir da autuação, passarão a ser analisados os documentos e com-provantes juntados, de modo que o registrador irá notificar eventuais titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, caso estes não houverem assinado a planta apresentada ao registrador.

Essa notificação será pessoal ou por correio com aviso de recebimento, possibilitando que os titulares de direito manifestem seu consentimento expres-

2 Estes direitos devem estar registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes.

3 Documentos que informam a existência de processos de natureza cível contra a pessoa pesquisada na cidade onde foi solicitada a certidão, assim, elas devem ser obtidas nos Fóruns Regionais ou Centrais da Comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente.

4 Por justo título temos os conceitos trazidos pelo Código Civil, em seus arts. 1.201 e 1.242:

“Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.

Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.”

“Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.”

5 Documentos tais quais comprovantes de pagamento de impostos e de taxas que incidirem sobre o imóvel.

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������11

so em um prazo de quinze dias. O silêncio destes será interpretado como dis-cordância do procedimento de usucapião.

Tal qual no procedimento judicial de usucapião, no procedimento ex-trajudicial, a União, o Estado, o Distrito Federal e o Município terão que se manifestar a respeito do procedimento em andamento, por meio de ciência dada pelo oficial de registro de imóveis, a qual poderá ser pessoal ou pelo cor-reio com aviso de recebimento. O prazo para manifestação sobre o pedido será igualmente de quinze dias.

Caso seja apresentada impugnação ao pedido de reconhecimento ex-trajudicial da usucapião, por qualquer um dos titulares de direito reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, por algum dos entes públicos ou por terceiro interessado, o oficial de registro de imóveis remeterá os autos ao Poder Judiciário, sendo o juízo da Comarca da situação do imóvel competente para analisar a matéria. Ao requerente caberá emendar a petição inicial, de modo a adequá-la ao procedimento comum de usucapião.

A ampla publicidade do procedimento também é visada quando este se realiza na modalidade extrajudicial; assim, será realizada, pelo oficial de regis-tro de imóveis publicação de edital em jornal de grande circulação, para que terceiros eventualmente interessados tenham ciência da usucapião e possam ser manifestar no prazo de quinze dias.

Importante mencionar que, havendo qualquer ponto de dúvida, o oficial de registro de imóveis poderá solicitar ou realizar diligências e, ao final destas, caso a documentação não esteja em ordem, o oficial rejeitará o pedido de usu-capião. Também é permitido ao interessado suscitar o procedimento de dúvida, nos termos da lei.

Transcorrido este prazo, não havendo diligências a serem realizadas e estando a documentação em ordem, isto com a concordância expressa dos titu-lares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, o oficial de registro de imóveis formalizará a usucapião, registrando a aquisição do imóvel com as descrições apresentadas, ou, se for o caso, abrindo nova matrícula de registro de imóvel.

Não estando presentes condições necessárias ao registro do pedido ex-trajudicial, este será rejeitado, o que não impede o ajuizamento de ação de usucapião judicial, a qual poderá valer-se de toda a documentação produzida pelo oficial de registro de imóveis, o que agilizará o procedimento e resultará em economia processual.

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cONcLUSõeS e POSSIbILIDaDeS

Podemos concluir que a previsão da usucapião na modalidade extrajudi-cial será um avanço para a regularização fundiária no Brasil, pois, além das suas principais vantagens de agilidade e celeridade, esta provê segurança jurídica a todo o procedimento.

Ainda temos muito que avançar na legislação civil para contemplar as expectativas do legislador constitucional ao redigir os arts. 182 e 183 da Cons-tituição Federal brasileira, mas não podemos ignorar os avanços e desburo-cratizações pensadas para a garantia da segurança na posse e regularização fundiária.

Enquanto isso, aguardamos a aplicação do instituto da usucapião na mo-dalidade extrajudicial para uma avaliação mais fundamentada de possíveis en-traves ou adaptações a serem feitas na norma, que apenas o uso do instituto e o tempo nos poderão fornecer.

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Assunto Especial – Doutrina

Usucapião

A Usucapião Administrativa no Novo Código de Processo Civil

FRAnCISCO JOSÉ BARBOSA nOBRERegistrador Imobiliário no Paraná, Ex-Professor da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Ex-Professor da Faculdade de Direito da UniBennett.

Uma das maiores novidades do novo CPC não diz respeito ao direito pro-cessual, mas sim ao direito notarial e registral: a usucapião administrativa, pela qual o possuidor tem reconhecida a propriedade sem precisar de ação judicial.

A chegada iminente do Novo Código de Processo Civil vem sendo rece-bida com festejos por todos os operadores do direito. Afinal, já é hora de rea-lizar modificações profundas na Lei Processual Civil, a fim de adaptar o Poder Judiciário aos novos tempos. O Código de 1973 é anterior à disseminação dos computadores pessoais, à Internet, ao processo judicial eletrônico. É anterior à Constituição de 1988, com seu complexo rol de direitos e garantias, tonificados pela ideia de valorização da pessoa humana. É anterior, também, a inúmeros fe-nômenos jurídico-sociais que impactaram o foro nas últimas décadas, como as demandas em massa, em que se repetem aos milhares, com o mesmo pedido e sobre os mesmos fundamentos, como ocorre com ações previdenciárias, FGTS e poupança, apenas para citar algumas. Enfim, o Código de 1973 não é mais contemporâneo aos acontecimentos que desenharam o mundo atual, dentro e fora do foro. Teve, é certo, alguma sobrevida, à custa de sucessivas minirrefor-mas a que foi submetido, tornando-se verdadeira colcha de retalhos legislativos. Mas já clamava pela sua substituição por um novo diploma, estruturado e mol-dado para atender às novas necessidades da sociedade.

Sem dúvida que o novo CPC trará muitas mudanças naquilo que é seu objeto próprio: a disciplina jurídica do processo civil, definindo as normas que governarão o dia a dia dos juízes e advogados na condução das ações judiciais, seus recursos e incidentes. Mas o objeto deste artigo é justamente uma alteração que repercute fora do processo civil, a saber, a desjudicialização da usucapião imobiliária.

Desjudicialização é um fenômeno que vem aportando no Direito brasi-leiro nos últimos anos, ainda pouco estudado pela doutrina, que consiste, em poucas palavras, em suprimir do âmbito judicial atividades que tradicionalmen-

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te lhe cabem, transferindo-as para os chamados particulares em colaboração, entre eles, especialmente, os notários e registradores públicos.

A expressão mais visível e conhecida da desjudicialização é a possibili-dade, instituída pela Lei nº 11.441/2007, de lavratura de escrituras públicas de inventário, separação e divórcio, sempre que não houver litígio, incapazes ou testamento. Apenas essa iniciativa legislativa – que, como disse, é apenas um exemplo, entre outros, da desjudicialização – foi capaz de esvaziar prateleiras no foro, do dia para noite, como nunca dantes se suspeitara ser possível.

Nesse contexto, a redação final do novo CPC traz, em seu art. 1.084, uma nova manifestação do tropismo da desjudicialização, prevendo a possibilidade de reconhecimento extrajudicial da usucapião imobiliária.

A usucapião extrajudicial, ou usucapião administrativa, como vem sen-do chamada, não é, a rigor, uma novidade no Direito brasileiro. Já a prevê a Lei nº 11.977/2009, com as modificações da Lei nº 12.424/2011. A previsão, entretanto, tem efeitos práticos bastante limitados, por dar-se exclusivamente no seio da regularização fundiária urbana, em procedimento administrativo de-masiadamente complexo, e, ademais, por ter a contagem do prazo usucapional condicionada ao prévio registro do título de legitimação de posse (art. 60 da Lei nº 11.977/2009).

A nova usucapião administrativa é inteiramente distinta e incomparavel-mente mais eficaz. O possuidor reúne alguns documentos comprobatórios da posse, de suas circunstâncias e extensão no tempo, bem como da ausência de ação reivindicando o imóvel. Apresenta a documentação ao tabelião da locali-dade, que, após examiná-la, lavra uma ata notarial, documento pelo qual atesta publicamente a existência da posse e suas características. A ata notarial e a do-cumentação são apresentadas ao registrador imobiliário, que expedirá editais e notificações, realizando, se necessário, diligências para certificar-se da exatidão do pedido de usucapião. Estando tudo em ordem e não havendo impugnação de terceiros, a usucapião é registrada.

O procedimento extrajudicial é incomparavelmente mais simples e rá-pido que uma ação judicial de usucapião. Ter o imóvel legalizado em poucas semanas é um sonho dourado hoje inacessível, eis que ações judiciais de usu-capião costumam durar vários anos.

As repercussões sociais e econômicas da usucapião administrativa são extraordinárias. A tranquilidade da família de saber que mora no que é seu, a possibilidade de acesso ao crédito com garantia real, a materialização do con-ceito constitucional de função social da propriedade, enfim, tornam a usuca-pião administrativa uma das inovações mais importantes a serem introduzidas com a vigência do novo Código de Processo Civil.

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Assunto Especial – Doutrina

Usucapião

A Usucapião no Novo Código de Processo Civil

LUCAS BEnTO SAmPAIOAdvogado, com atuação em todo Estado de São Paulo, Sócio do Escritório Leite & Sampaio.

O novo Código de Processo Civil trouxe diversas mudanças na sistemá-tica processual nacional, entre elas destaca-se a introdução (ou ampliação) da usucapião extrajudicial. Conheça um pouco mais sobre esta nova ferramenta jurídica com este artigo.

O novo Código de Processo Civil (L. 13.105/2015) trouxe diversas e im-portantes mudanças na nossa sistemática processual, com a finalidade de otimi-zar o andamento dos processos e buscar soluções alternativas para resolução do conflito, como a mediação e conciliação, valendo-se, inclusive, da desjudicia-lização, concedendo novos instrumentos às atividades extrajudiciais (registral e notarial). Entre estas mudanças, destaca-se a introdução (ou ampliação) da usucapião extrajudicial no ordenamento pátrio, como veremos adiante.

Como é cediço, a usucapião é, em apertada síntese, uma forma de aqui-sição da propriedade de determinado bem, seja ela móvel ou imóvel, pelo exer-cício prolongado no tempo da posse e pelo preenchimento de alguns requisitos legais.

No caso dos bens imóveis, em regra, o lapso temporal pode variar entre 5, 10 ou 15 anos, dependendo das características do imóvel (tamanho, de uso coletivo ou individual, rural ou urbano, etc.) e do tipo de posse exercida (man-sa, com justo título, de boa-fé, etc.).

Assim, verifica-se que a usucapião é um importante instrumento não só jurídico, mas de política social, especialmente para garantir a famosa função social da propriedade, garantia constitucional prevista nos arts. 5º, XXIII, e 170, III, da Carta Republicana.

Em razão da importância social da usucapião e, principalmente, da dimi-nuição das suas exigências nos últimos (diminuição no tempo de posse, etc.), houve um considerável incremento nas ações judiciais sobre o tema, gerando mais demandas para o nosso já assoberbado Poder Judiciário.

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Com isso, em que pesem os valorosos esforços dos servidores e magistra-dos, criou-se também em relação às ações de usucapião uma morosidade muito grande, principalmente no Estado de São Paulo, desencadeando a espera por anos pela decisão definitiva de aquisição da propriedade.

Diante de tal situação, os juristas que compuseram a comissão de elabo-ração do NCPC buscaram uma solução alternativa ao conflito judicial, quase que nos mesmos moldes da que foi aplicada aos inventários, divórcios e sepa-rações, introduzindo, ou, melhor dizendo, ampliando a usucapião extrajudicial em nosso sistema jurídico.

Neste ponto, vale destacar que a usucapião extrajudicial foi, em verdade, introduzida em nosso ordenamento pela lei que criou o Programa Minha Casa, Minha Vida (L. 11.977/2009, alterada pela L. 12.424/2011), sendo esta, no en-tanto, aplicável somente aos projetos de regularização fundiária de interesse social e com diversos requisitos específicos.

No entanto, a usucapião extrajudicial trazida pelo NCPC é muito mais ampla e contempla as mais diversas espécies de usucapião esculpidas no di-reito material, facilitando, ao menos em tese, a aquisição da propriedade pelo possuidor.

Pois bem. O procedimento da usucapião extrajudicial está previsto no art. 1.071 do novo Código de Processo Civil, o qual acrescentou o art. 216-A à Lei de Registros Públicos (L. 6.015/1973), estabelecendo que o interessado, representado pelo advogado, poderá apresentar requerimento ao Cartório de Registro de Imóveis da comarca onde estiver situado o imóvel usucapiendo, devendo tal requerimento estar instruído com a seguinte documentação:

a) ata notarial: lavrada pelo Tabelião de Notas da região de localiza-ção do imóvel, contendo (i) o tempo de posse do requerente, (ii) se for o caso, o tempo de posse dos antecessores, e (iii) circunstâncias;

b) planta e memorial descritivo do profissional legalmente habilitado, com reponsabilidade técnica e registro no respectivo Conselho de Fiscalização profissional, e pelos confinantes, titulares de domínio;

c) Certidões Negativas dos Distribuidores da Comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente;

d) Justo Título ou outra documentação que comprove: (i) origem da posse, (ii) continuidade, (iii) natureza e tempo (ex.: pagamento de impostos e taxas).

Após ser conferida a documentação, o requerimento de usucapião será autuado pelo registrador, e o prazo para a prenotação do registro pode ser pror-rogado até o acolhimento ou a rejeição deste pedido.

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Além disso, o registrador imobiliário deverá notificar os confinantes e titu-lares de domínio ou direito real que não assinaram a planta, que possuem prazo máximo de 15 (quinze) dias para manifestação. Esta notificação poderá ser pes-soal pelo próprio registrador (ou seu preposto) ou por meio dos Correios com AR.

Posteriormente, o oficial de registro dará ciência à União, ao Estado, Distrito Federal e Município para manifestação, também, em 15 (quinze) dias sobre o pedido; neste caso, a comunicação poderá se dar pessoalmente, por meio do Correio com AR ou, ainda, pelo Cartório de Registro de Títulos e Do-cumentos.

Realizadas as notificações estabelecidas na nova lei, o registrador deve realizar a publicação de edital em jornal de grande circulação na região do imóvel, sendo certo que, neste momento, os terceiros interessados poderão se manifestar no mesmo prazo de 15 (quinze) dias.

É facultado ao oficial registrador realizar diligências para a elucidação de dúvidas em relação ao imóvel usucapiendo. Após o decurso de todos os prazos acima indicados, achando-se a documentação em ordem, inclusive com a concordância expressa dos titulares de direitos reais e outros averbados na matrícula do imóvel e na matrícula dos imóveis confinantes, o registrador pro-cederá com o registro da aquisição imóvel, sendo permitida a abertura de nova matrícula, se for necessário.

Caso o registrador entenda que a documentação não está em ordem, po-derá indeferir o requerimento, sendo certo que este indeferimento não impede a propositura da ação de usucapião. Do mesmo modo, em havendo qualquer impugnação do processo por terceiros, o oficial obrigatoriamente remeterá os autos ao juízo da Comarca do imóvel, e o requerente deverá emendar a inicial para adequá-la aos moldes do quanto estabelecido na lei adjetiva.

Verifica-se, portanto, que, assim como no inventário1, divórcio e sepa-ração, só haverá a necessidade de judicialização do procedimento somente se houver lide, ou seja, se houver a impugnação por um interessado ou se não houver a concordância dos titulares de direitos reais do imóvel usucapiendo e dos imóveis confinantes.

Em resumo, em que pese a discussão casuística – se na prática este novo procedimento estabelecido pelo NCPC trará maior agilidade ou se será somente acréscimo de uma fase preliminar da Jurisdição –, tem-se que a inovação trazida é uma verdadeira adaptação histórica ao direito de propriedade, vez que é pos-sível concluir que, cada vez mais, tanto o direito material quanto o processual buscam facilitar a transformação da posse em propriedade, garantindo, assim, a efetivação deste viés social da propriedade.

1 Com exceção dos casos que envolvam incapazes.

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Assunto Especial – Doutrina

Usucapião

As Diferentes Modalidades de Usucapião e Seus Requisitos Processuais

JULIAn GOnçALvES DA SILvAAdvogado em Juiz de Fora/MG, Especialista em Direito Processual pela Universidade Federal de Juiz de Fora/MG.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A usucapião de bens imóveis; 1.1 A evolução da usucapião no ordena-mento jurídico brasileiro; 1.2 As usucapiões ordinária e extraordinária no Código Civil de 1916; 1.3 O Código Civil de 2002 e as formas de usucapião ordinária, extraordinária, especial urbana e rural; 2 A usucapião no Estatuto das Cidades; 2.1 A usucapião especial de imóvel urbano segundo o Estatuto das Cidades; 2.1.1 Aspectos processuais da usucapião especial de imóvel urbano; 2.2 A usucapião especial coletiva urbana; 3 Requisitos processuais atinentes a todas as modalidades de usucapião; 3.1 Da possibilidade jurídica do pedido e do interesse de agir; 3.2 Da legitimidade: capacidade de ser parte, de estar em juízo e postulatória; 3.3 Dos requisitos gerais e especiais; 4 A usucapião es-pecial coletiva urbana e seus requisitos processuais essenciais e específicos; 4.1 Aspectos gerais; 4.2 Requisitos processuais; 4.2.1 Da legitimidade ativa, do interesse de agir e do objeto hábil; 4.2.2 Dos demais requisitos processuais essenciais; 4.3 Críticas à ação de usucapião especial cole-tiva urbana; Conclusão; Referências.

São especificadas todas as espécies de usucapião de bens imóveis do Có-digo Civil de 2002, com destaque para a pesquisa acerca da nova modalidade de usucapião inserida com o advento do Estatuto da Cidade: a especial coletiva urbana.

INTrODUçÃO

O presente estudo pretende constatar, observar e descrever as diferentes modalidades de usucapião de bens imóveis existentes em nosso ordenamento jurídico e seus requisitos processuais, observando principalmente a usucapião especial coletiva urbana e seus aspectos essenciais e especiais.

Objetiva-se, relatar as formas de moradias irregulares existentes no solo urbano, tais como as favelas e loteamentos irregulares, o procedimento pro-cessual e a possibilidade de a comunidade carente usucapir conjuntamente as glebas onde possuem suas moradias, tornando estas em verdadeiros domínios.

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Para tanto, será feito um estudo minucioso dos requisitos inerentes a to-das as espécies de usucapião de bens imóveis urbanos existentes no Código Civil de 2002 e no Estatuto da Cidade, esclarecendo, por fim, os requisitos para a sentença de concessão da usucapião coletiva e as críticas doutrinárias em relação à mesma, tendo em vista a polêmica que cerca este assunto: população de baixa renda, favelados, irregularidades e condomínio de proprietários.

O primeiro capítulo objetiva demonstrar uma noção generalizada da usucapião de bens imóveis; a sua existência em nosso ordenamento jurídico; as modalidades e aspectos processuais das modalidades de usucapião existentes no Código Civil de 1916 e que ainda estão vigentes no direito pátrio, em virtude do disposto no art. 2.028 do Código Civil de 2002 e as modalidades de usuca-pião disciplinadas no Código Civil de 2002.

Já o segundo capítulo dispõe sobre o Estatuto da Cidade, o planejamento urbano dos grandes centros, a usucapião especial de imóvel urbano segundo o Estatuto da Cidade, a sua vigência, aplicabilidade, requisitos e possibilidades.

O terceiro capítulo faz uma análise geral dos aspectos e requisitos pro-cessuais de todas as modalidades de usucapião, condições da ação, bem como os documentos necessários e indispensáveis que devem acompanhar as peti-ções iniciais das ações de usucapião.

O quarto capítulo é o ponto-chave do presente estudo, que visa escla-recer a nova modalidade de usucapião que foi implementada com o advento do Estatuto da Cidade, sendo esta única no ordenamento jurídico pátrio, pois possibilita a usucapião de favelas e loteamentos irregulares pela população ca-rente que vive nos mesmos; seus requisitos fundamentais que a difere das outras modalidades de usucapião; as partes que podem pleiteá-la, a soma de posses, o condomínio especial, o procedimento processual, a sentença de usucapião e

as críticas doutrinárias.

1 a USUcaPIÃO De beNS IMÓveIS

A usucapião é forma de aquisição da propriedade, e para o seu reco-nhecimento são necessários dois elementos básicos, quais sejam, a posse e o tempo. Entende-se que este instituto é uma modalidade de aquisição originária da propriedade ou de outro direito real sobre coisa alheia, consistente na posse ininterrupta, com intenção de dono, sem oposição e no decurso do prazo pre-visto no Código Civil. Pode ser considerada como uma forma de alienação pres-crita na lei, na qual o legislador permite que uma determinada situação de fato, que se alongou por certo intervalo de tempo determinado na lei, transforme-se em situação de direito.

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São seus efeitos a transferência da propriedade, retroatividade e a indivi-sibilidade da coisa julgada. Segundo Caio Mário da Silva Pereira1:

Usucapião é a aquisição da propriedade ou outro direito real pelo decurso do tempo estabelecido e com a observância dos requisitos instituídos em lei. Mais simplificadamente, tendo em vista ser a posse que, no decurso do tempo e as-sociada às outras exigências, se converte em domínio, podemos repetir, embora com a cautela de atentar para a circunstância de que não é qualquer posse senão a qualificada: usucapião é a aquisição do domínio pela posse prolongada.

A posse é elemento básico da usucapião, mas não é qualquer posse que gera aptidão à obtenção da usucapião. A posse ad usucapionem deve ser con-tínua, pacífica, incontestada com intenção de dono, no prazo estipulado. Por-tanto, a posse não pode ter intervalos, vícios, defeitos, tampouco contestação.

Outro elemento básico da usucapião é o tempo, pois, para que se con-verta em propriedade, a posse deve durar pelo prazo estipulado nas leis que a disciplinam. Neste sentido, tem-se que para qualquer modalidade de usu-capião, é necessário o continuatio possessionis ininterruptamente por todo o tempo exigido.

Quanto à natureza jurídica da usucapião, existem duas correntes: objeti-va, que é aquela fundamentada na presunção de renúncia do direito de proprie-dade de um indivíduo diante de sua inércia e passividade, e a subjetiva, que se baseia na utilidade social que é dar estabilidade e segurança à propriedade, fa-cilitando a prova do domínio, consequentemente, consolidando as aquisições.

O processamento da ação de usucapião tem como principal efeito cons-tituir título para o usucapiente, oponível erga omnes, operando a transferência do bem ao usucapiente.

Neste sentido, Sílvio de Salvo Venosa2 define que:

A possibilidade de a posse continuada gerar a propriedade justifica-se pelo sen-tido social e axiológico das coisas. Premia-se aquele que se utiliza utilmente do bem, em detrimento daquele que deixa escoar pelo tempo, sem dele utilizar-se ou não se insurgindo que outro o faça, como se dono fosse.

Corroborando a este entendimento, pode-se analisar a posição de Darcy Bessone3, na qual alega que aparentemente a prescrição apresenta-se como injustiça, no entanto, esta se justifica nas razões de ordem social que regem a usucapião.

1 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direitos reais. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 4, 2004. p. 138.

2 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 5, 2003. p. 198.3 BESSONE, Darcy. Da compra e venda. 3. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 1998. p. 171.

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No tocante às razões de ordem social, a estabilidade das relações exige que, quando um estado perdure, permanecendo por muitos anos, sem reação da pessoa interessada, seja ele considerado definitivo e irremovível. De outro modo, se não se operasse a prescrição, a instabilidade preponderaria, pois que poderiam surgir impugnações muito tempo mais tarde, afetando as novas rela-ções que, por confiança naquela duradoura aparência, se constituíssem. Há, assim, manifesto interesse social em que os estados de fato se transformem, após certo tempo, em estados de direito.

1.1 A evolução dA usucApião no ordenAmento jurídico brAsileiro

O legislador brasileiro buscou os princípios do instituto da usucapião nos conceitos de Justiniano, que são, ao mesmo tempo, modo de extinção e de aquisição da coisa. Pela extinção, denota-se na perda da propriedade pelo indi-víduo que dela se desobrigou pelo tempo, assim sendo, esta prescrição extintiva extermina a ação que tem o titular, eliminando o direito pelo desaparecimento da tutela legal. Já a aquisição se dá pela apropriação de um indivíduo sobre a coisa resultante de uma posse prolongada. Esta prescrição aquisitiva cria direito em favor de um novo titular e, consequentemente, extingue a ação, que, para a defesa do direito, tinha o titular antigo.

Segundo o renomado professor Benedito Silvério Ribeiro4:

Se diz que a usucapião é a prescrição aquisitiva. Nesses dois elementos, por-tanto – a posse da coisa por quem não é proprietário e a sua duração, reside o fundamento da usucapião, pois, aliados esses dois elementos, surge legalmente a aquisição, transformando-se de mero estado de fato num estado de direito: a propriedade.

Leciona Washington de Barros Monteiro5 que a natureza jurídica deste instituto é muito questionada, no entanto, o legislador pátrio pendeu, tanto no Código Civil de 1916 como no de 2002, para o sistema alemão, que é funda-mentado na tradição romana, segundo o qual “este instituto tem vida própria, apresenta contornos que lhe são peculiares e é autônomo, malgrado inegáveis afinidades com a prescrição”.

Deve-se ser considerar a usucapião como um direito novo, autônomo, independente de qualquer ato negocial realizado com o proprietário. Para Maria Helena Diniz6, tanto é verdade esta autonomia da usucapião que “o trans-

4 RIBEIRO, Benedito Silvério. Tratado de usucapião. 4. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Saraiva, v. 3, 2006. p. 155.

5 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 39. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2003. p. 120/121.

6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. 24. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2010. p. 155.

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mitente da coisa não é o antecessor, o primitivo proprietário, mas a autoridade judiciária que reconhece e declara por sentença a aquisição por usucapião”.

Segundo preceitua Caio Mário7, desenvolve-se o instituto da prescrição ao se tratar do tempo influenciando as relações jurídicas, assim, assevera que esta “determina a extinção das relações jurídicas, mas autoriza a aquisição dos direitos”.

Anteriormente ao Código Civil de 1916, existiam no ordenamento jurídi-co brasileiro quatro hipóteses de prescrição aptas a gerar a usucapião: imemo-rial, quarentenária, ordinária e extraordinária.

A prescrição imemorial dispensava o justo título e a boa-fé e era admitida nos casos em que circunstâncias particulares tornavam impossível invocar-se a prescrição ordinária ou extraordinária.

Com relação à prescrição quarentenária, esta se dava em 40 (quarenta) anos, e era prevista para os bens do estado, cidades e vilas, imóveis da igreja, do imperador e lugares veneráveis.

Para obter a prescrição ordinária, era indispensável o justo título e a boa-fé. Incidia quanto a semoventes, após o decurso de 03 (três) anos e, para imóveis em que o proprietário e prescribente residissem na mesma comarca, o prazo era de 10 (dez) anos, porém, se residissem em comarcas divergentes o prazo era de 20 (vinte) anos

Já para a prescrição extraordinária, era exigida a boa-fé e o título era pre-sumido. Consumava-se com o decurso do prazo de 30 (trinta) anos, tanto para bens imóveis quanto móveis. Destarte, quanto a bens públicos patrimoniais, o lapso era de 40 (quarenta) anos.

1.2 As usucApiões ordináriA e extrAordináriA no código civil de 1916

Com o advento do Código Civil de 1916, restaram vigentes as formas de prescrição para obtenção da usucapião, ordinária e extraordinária, dispostas em seus arts. 550 e 551. Portanto, as prescrições imemorial e quarentenária, não remanesceram naquele códex.

Deve-se ressaltar que o este Código fez menção ao instituto da usucapião e não mais prescrição, pois esta é um instituto autônomo, peculiar do direito das coisas e cuida de forma de aquisição do domínio.

Outro aspecto importante resultante do advento do Código Civil de 1916 e que permaneceu no novo Código Civil de 2002 é a impossibilidade de se usucapir bens públicos.

7 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p. 137.

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A usucapião ordinária foi inserida no Código Civil de 1916 em seu art. 551:

Art. 551. adquire também o domínio do imóvel aquele que, por dez anos entre presentes, ou quinze entre os ausentes, o possuir como seu, contínua e incontes-tadamente, com justo título e boa-fé.

Seu parágrafo único rezava que presentes eram os moradores do mesmo município e ausentes aqueles que residiam em município diverso. Conforme Benedito Silvério8 disciplina, “a ausência ou presença relacionam-se ao local do imóvel, dizendo respeito à pessoa do proprietário e não o domicílio ou resi-dência do prescribente”. Assim, será presente o proprietário se residir no muni-cípio em que se localiza o imóvel e ausente se o seu domicílio for em localidade diversa.

Eram características fundamentais o justo título e a boa-fé do possuidor, além de a posse exercida ter de ser mansa, pacífica, ininterrupta e com animus domini.

Já a usucapião extraordinária foi disciplinada no art. 550 do Código Civil de 1916:

Art. 550. Aquele que, por vinte anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquirir-lhe-á o domínio, independentemente de título e boa-fé que, em tal caso, se presume, podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual lhe servirá de título para a transcrição no Registro de Imóveis.

A característica principal desta modalidade de usucapião era a dispensa de justo título e boa-fé, bem como maior decurso do prazo prescricional.

Como requisitos inerentes às duas modalidades de usucapião anterior-mente dispostas, tem-se que a posse exercida deveria ser mansa, pacífica, in-contestada, contínua e com animus domini.

Apesar de o Código Civil de 1916 ter sido revogado pelo atual de 2006, estas duas modalidades ainda restam vigentes no ordenamento jurídico, para os casos disciplinados no art. 2.028 do Código de Civil de 2002.

Este é o entendimento majoritário do eg. Tribunal de Minas Gerais, ve-jamos:

Ementa: USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO – REQUISITOS – AUSÊNCIA DE PRO-VA – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO – Havendo a autora alegado na exordial que possui o imóvel desde dezembro/1988, tem-se que decorreu, na data da en-

8 RIBEIRO, Benedito Silvério. Tratado de usucapião. 4. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Saraiva, v. 1, 2006. p. 158.

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trada em vigor do CC/2002, mais da metade do tempo estabelecido na lei revoga-da para a usucapião extraordinária (vinte anos), devendo ser aplicado este prazo previsto no art. 550 do CC/1916, visto que reduzido pelo art. 1.238, do CC/2002, conforme o disposto no art. 2.028 do CC/2002. Não restando demonstrado o preenchimento dos requisitos do exercício da posse mansa e pacífica, por um período de 20 (vinte) anos, necessários ao reconhecimento do domínio do imóvel em questão, há que ser julgado improcedente o pedido formulado na ação de usucapião. Súmula: negaram provimento ao recurso, vencido o relator quanto a fundamentação. (Número do processo: 1.0024.06.122835-9/001(1), Rel. Lucas Pereira, Data do Julgamento: 04.12.2008, Data da Publicação: 14.01.2009)

Ementa: APELAÇÃO – USUCAPIÃO ORDINÁRIA – PRAZO APLICÁVEL – IN-TELIGÊNCIA DO ART. 2.028 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 – APLICABILIDADE DO ART. 551 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 – REQUISITOS COMPROVADOS – PRETENSÃO DE USUCAPIR VIABILIZADA – É aplicável as regras do art. 1.242 do novo Código Civil, porém, somente quanto ao prazo, aplica-se o previsto no art. 551 do Código Civil de 1916, qual seja, 10 (dez) anos entre presentes e 15 (quinze) anos entre ausentes, quando da entrada em vigor do Novo Código, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada. Uma vez preenchidas as condições necessárias para a configuração da prescri-ção aquisitiva, nos termos previstos no art. 551, do Código Civil de 1916, é de se reconhecer a aquisição da propriedade pela usucapião ordinária. Súmula: deram provimento. (Número do processo: 1.0089.06.000582-7/001(1), Rel. Alvimar de Ávila, Data do Julgamento: 28.05.2008, Data da Publicação: 07.06.2008)

1.3 o código civil de 2002 e As formAs de usucApião ordináriA, extrAordináriA, especiAl urbAnA e rurAl

Pode-se afirmar que a propriedade, segundo o Código Civil de 2002, é voltada para o seu sentido social, assim como o fez a Constituição Federal de 1988, vez que a usucapião constitui meio eficaz hábil para proporcionar a maior dinâmica do uso da terra, concedendo moradia aos usucapientes. Tam-bém há de se ressaltar que o lapso temporal foi diminuído em relação ao exigi-do no anterior Código Civil de 1916.

Ressalte-se que o Código Civil de 2002 manteve a impossibilidade de se usucapir bens públicos, já delimitada na Constituição Federal de 1988 em seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único. Destarte, para alguns doutrinadores, como ilustra Nelson Rosenvald9, decisórios recentes permitem a usucapião de terras que ainda não foram registradas (res nullius), cabendo ao Poder Público elidir a presunção relativa.

9 ROSENVALD, Nelson. Direitos reais. 3. ed. atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2004.

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Assim, bens públicos, em lato sensu, são aqueles que pertencem à União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Observando-se, de maneira específica, mais precisamente o disposto no art. 98 do Código Civil de 2002, consideram--se públicos os bens de domínio nacional que pertencem às pessoas jurídicas de direito público interno, incluindo-se nestes os bens de uso comum do povo, de uso especial, os dominicais e as terras devolutas.

O Código Civil de 2002 estabelece a usucapião ordinária e seus requisi-tos no art. 1.242:

Art. 1.242. Adquire também propriedade de um imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.

Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respec-tivo cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e eco-nômico.

Para que o usucapiente possa adquirir por meio da ação de usucapião a propriedade do imóvel, é necessário que estejam presentes todos os requisi-tos indispensáveis à sua caracterização, que são a posse animus domini, lapso temporal, justo título, boa-fé e objeto hábil, além das condições da ação: legi-timidade de partes, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. A falta de qualquer um deles obsta sua pretensão de aquisição do domínio do bem usucapiendo.

Esta modalidade de usucapião possui dois requisitos essenciais inerentes somente a ela entre todas as outras presentes em nosso ordenamento jurídico: o justo título e a boa-fé. Pode-se afirmar ser aquele o fundamento do direito do prescribente. Exige a lei que o mesmo seja justo, isto é, formalizado e de-vidamente registrado, para que seja hábil à aquisição do domínio, como, por exemplo, a escritura.

No entanto, o parágrafo único do art. 1.242 do códex possibilita a redu-ção do prazo prescricional para cinco anos, caso exista título que tenha sido vá-lido durante o decurso do prazo legal, mas que fora cancelado posteriormente.

Já a boa-fé, recai na crença do usucapiente de que lhe realmente per-tence a coisa possuída, pois ele possui a certeza de seu direito, ou seja, tem a convicção de não ofender um direito alheio. Deve estar presente desde o início da posse e subsistir por todo o período aquisitivo.

Deste entendimento emana a existência de uma das condições da ação do usucapião que é a legitimidade ativa, vez que somente pode ingressar no polo ativo aquele que de fato exerceu a posse. Além disso, o pedido é conside-rado juridicamente possível, pois foram atendidos todos os requisitos explicita-

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dos na lei e o interesse de agir resta configurado ante a necessidade de que da posse se constitua o domínio daquele que esbulhou e adquiriu o imóvel pela prescrição aquisitiva

A usucapião extraordinária está definida no art. 1.238 do Código Civil:

Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé, po-dendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Esta forma de usucapião é conhecida como prescrição de longo prazo, ou quinzenária. É necessário que estejam presentes seus requisitos essenciais, quais sejam, posse com animus domini, lapso temporal e objeto hábil, para que se possa obter a propriedade do imóvel usucapiendo.

Desta maneira, podemos observar que há a dispensa de justo título e da boa-fé. Segundo Silvério10:

A longa duração da posse supre a falta de justo título, podendo-se adquirir a coisa, possuída em sua totalidade – tantum praescriptum quantum possessum, ao contrário da usucapião ordinária, na qual a prescrição somente pode ocorrer dentro dos contornos contidos no próprio título.

A posse deverá ser ininterrupta, ou seja, contínua e sem oposição, que é aquela incontestada, tranquila, mansa e pacífica, sendo de conhecimento pú-blico e notório.

Todavia, José Carlos de Moraes Salles11 aduz que a interrupção da posse só ocorre caso a ação de esbulho seja julgada contra o possuidor, pois, caso contrário, não tendo havido a interrupção aludida, se consubstanciou a prescri-ção aquisitiva.

Portanto, para este jurista, só haverá interrupção capaz de prejudicar a usucapião se o possuidor for despojado de sua posse de maneira inequívoca, antes de completar o lapso de quinze anos previsto no art. 1.238 do códex, sem a possibilidade de recuperar a posse perdida.

Disciplina Monteiro de Barros12 (2003, p. 124) que esta modalidade de usucapião

repousa em duas situações bem definidas: a atividade singular do possuidor e a passividade geral de terceiros, diante daquela atuação individual. Se essas duas

10 RIBEIRO, Benedito Silvério. Op. cit., v. 1. p. 237.11 SALLES, José Carlos de Moraes. Usucapião de bens imóveis e móveis. 2. ed. rev. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1992. p. 67.12 MONTEIRO, Washington de Barros. Op. cit., p. 124.

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atitudes perduram contínua e pacificamente por quinze anos, ou dez anos, inin-terruptos, consuma-se o usucapião. Qualquer oposição subseqüente mostrar-se-á inoperante, porque esbarrará ante o fato consumado.

Com relação a esta modalidade de usucapião, semelhantemente à ordi-nária, deve-se levantar a importante questão referente à acessão e sucessão de posses.

O art. 1.243 do Código Civil de 2002 estabelece que “o possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art. 1.207), contanto que todas sejam contí-nuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e boa-fé”. Nos dizeres de Arnaldo Rizzardo13, “significa a acessão de tempo a junção do lapso tempo-ral, durante o qual alguém exerceu a posse, ao período de posse exercido pelo seu antecessor, o que se dá a título universal ou singular”.

Como sucessor universal tem-se o posseiro (herdeiro), que substitui o antecessor na totalidade dos bens pertencentes ao patrimônio do de cujus. De acordo com o disposto no art. 1.784 do Código Civil de 2002, “aberta a suces-são, a herança transmite-se desde logo aos herdeiros legítimos e testamentá-rios”, assim, tem-se que esta posse será transmitida com todos os vícios que lhe são inerentes.

Fazendo-se uma leitura pormenorizada do art. 1.206 do Código Civil de 2002, tem-se que, se o finado exercia a posse com má-fé ou sem o animus domini, irrelevante será a posse do herdeiro, mesmo que de boa-fé ou com o ânimo de dono.

Já o art. 1.207 do Código Civil de 2002 disciplina que “o sucessor uni-versal continua de direito a posse de seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para efeitos legais”. Portanto, pode-se concluir que, na acessão a título singular, os vícios da posse anterior não são transmitidos, pois, ao adquirir a posse, é iniciado um novo estado da mesma, livre de quaisquer vícios anteriores.

Outrossim, caso a posse seja eivada de vícios, o sucessor singular tem a faculdade de não somar as duas, devido ao estado novo que esta apresenta quando a adquiriu.

Preceitua o art. 1.240 do Código Civil de 2002:

Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de ate duzentos e cin-qüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição,

13 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das coisas: Lei nº 10.406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 255.

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utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

Esta forma de usucapião é considerada uma nova modalidade no orde-namento jurídico pátrio, distinguindo-se das demais modalidades presentes no Direito brasileiro. Cumpre-se destacar que esta usucapião tem caráter eminen-temente social.

A usucapião especial urbana não exige como elemento essencial o justo título e a boa-fé, portanto, alguns doutrinadores, como Moraes Salles14, afirmam que aparentemente ela se assemelha à usucapião extraordinária.

No entanto, a norma constitucional, seguida pelo Código Civil de 2002, criou outros elementos essenciais para esta modalidade de usucapião, fato que a distingue, sobremaneira, da usucapião extraordinária. São estes elementos: sua incidência se dá apenas em área urbana; a área usucapienda se restringe a no máximo duzentos e cinquenta metros quadrados; é exigido que o usuca-piente utilize a área urbana para sua moradia ou de seus familiares; e não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

Seus demais requisitos essenciais são o animus domini, a posse contínua e sem oposição. Nesta modalidade de usucapião, não é admissível a acessão ou junção de posses em favor do sucessor singular, vez que há exigência de que a posse seja pessoal e com o intuito de moradia, desde o início do lapso temporal.

A prescrição aquisitiva válida será também única, ou seja, aquele que tornar-se proprietário de bem imóvel após sentença decretada mediante esta modalidade de usucapião, não poderá se valer deste instituto por mais de uma vez, mesmo que a localidade seja diversa.

O art. 1.239 do Código Civil de 2002 disciplina que:

Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona ru-ral não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Também conhecida como pro labore e agrária, esta modalidade de usu-capião não pode ser adquirida caso o prescribente possua outro imóvel urbano ou rural. São requisitos essenciais da mesma, animus domini, lapso temporal, posse ininterrupta com obrigatoriedade de moradia na área rural usucapienda e o dever de torná-la produtiva por seu trabalho ou de sua família, sem oposição.

Pode-se dizer que a intenção do legislador com esta modalidade de usu-capião foi beneficiar aquele que tornou a área rural sob a sua posse produtiva

14 SALLES, José Carlos de Moraes. Op. cit., p. 279.

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em decorrência de seu trabalho e de sua família, com o intuito de fixar o traba-lhador rural no campo. Neste paradigma está inserido uma das condições da ação que é o interesse de agir, pois, não estando presente esse requisito, a ação deverá ser extinta sem resolução do mérito.

Deve-se, pois, ressaltar, que o requisito essencial, segundo o qual o usu-capiente não pode possuir outro imóvel urbano ou rural se exige quando do lapso temporal para a aquisição do imóvel e não posteriormente à sua obtenção.

Maria Helena Diniz, citando Silvio Rodrigues e Juarez de Freitas15, cons-tata que, segundo a alínea f do art. 1239 do Código Civil de 2002, é proibida a usucapião de terras públicas, mesmo que abandonadas e improdutivas, todavia, no nosso ordenamento jurídico, há a possibilidade de se usucapir terras devo-lutas, conforme o disposto no art. 188 da Constituição Federal de 1988, para se dar continuidade na exploração econômica da terra.

2 a USUcaPIÃO NO eSTaTUTO DaS cIDaDeS

Os grandes centros urbanos são os espaços onde se verificou o maior crescimento populacional nas últimas décadas. A sociedade evoluiu e se trans-formou, e, com isso, diversos novos problemas surgiram, tais como a degrada-ção do meio ambiente, a utilização incorreta dos recursos financeiros, o grande número de desempregados, o uso impróprio do solo e das reservas naturais, violência urbana desenfreada, ausência de saneamento básico e de moradias, surgimento de favelas e ocupações clandestinas.

A par de todos estes problemas, a concepção de propriedade diante da história, bem como da legislação, principalmente por influência da Constitui-ção Federal de 1988, sofreu grandes transformações, admitindo um conceito social, havendo necessidade de sua regulamentação diante dos padrões do Di-reito Urbanístico.

Desta necessidade, fez-se surgir a Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, publicamente conhecida como Estatuto da Cidade. Esta lei funciona como ins-trumento de política urbana, sendo objeto apto a ensejar o cumprimento da tão observada função social da propriedade, ressaltada no texto constituinte.

Acerca do que foi implementado após a vigência do Estatuto das Cida-des, assevera Dallari16:

O Estatuto afirmou com ênfase que apolítica urbana não pode ser um amontoado de intervenções sem rumo. Ela tem uma direção global nítida: “ordenar o pleno

15 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2007. p. 173.

16 DALLARI, Adilson Abreu; FERRAZ Sérgio (Coord.). Estatuto da Cidade: comentários à Lei Federal nº 10.257/2001. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 54.

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desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana” (art. 2º, caput), de modo a garantir “o direito a cidades sustentáveis” (incisos I, V, VIII e X).

2.1 A usucApião especiAl de imóvel urbAno segundo o estAtuto dAs cidAdes

O Estatuto da Cidade disciplina, em seus arts. 9º e seguintes, matéria de interesse social inquestionável, que é a usucapião especial urbana.

Pode-se dizer que esta modalidade de usucapião, que tem como primor-dial finalidade a moradia, já havia sido prevista na Constituição da República de 1988, no Capítulo da Política Urbana, em seu art. 183.

Segundo leciona Liana Portilho Mattos17, a usucapião urbana foi inserida “no contexto e na esteira do comando constitucional da função social da pro-priedade, relacionando-se com o art. 182 que estabelece sanções aos proprietá-rios que não atendem a este princípio da política urbana”.

Disciplina o art. 9º do Estatuto da Cidade:

Art. 9º Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O título de domínio será conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2º O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito, a posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão.

Pode-se afirmar que o entendimento pacífico da doutrina pátria é que este artigo, que repete a redação do art. 183 da Constituição Federal de 1988, pune o proprietário que abandona a gleba urbana, deixando-a vazia, uma vez que a sua inércia ocasionou ocupação da área, concedendo aos posseiros as condições para que possam requerer em juízo a usucapião para a finalidade de moradia.

Neste sentido, pode-se dizer que o supracitado artigo não reconhece apenas um fato, mas sim um direito que emergiu deste fato, tendo em vista a permanência do possuidor no local ocupado, o qual poderá adquirir a proprie-dade pela via jurisdicional.

17 MATTOS, Liana Portilho (Org.). Estatuto da Cidade comentado: Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 152.

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O Estatuto da Cidade possibilitou que a usucapião possa se realizar em cinco anos, em lotes cuja área não ultrapasse 250 (duzentos e cinquenta) me-tros, desde que o possuidor não seja proprietário de outro imóvel e que a posse seja destinada à sua moradia e ou de sua família. Este fato representou uma evo-lução da regularização fundiária nos municípios brasileiros, vez que a redução do prazo prescricional atendeu ao princípio da função social da propriedade.

2.1.1 aspectos processuais da usucapião especial de imóvel urbano

Ressalta Moraes Sales18 que processualmente a declaração da usucapião especial urbana pode ser pleiteada tanto pelo brasileiro nato quanto pelo natu-ralizado, bem como o estrangeiro residente no Brasil, uma vez que não se fez expressa menção quanto à delimitação de somente ser possível a brasileiros.

Em relação à posse nesta modalidade de usucapião, destaca-se o lapso temporal reduzido, que é de 05 anos, devendo este transcorrer contínua, mansa e pacificamente, tendo o possuidor animus domini.

Também conhecida por usucapião pro casa, pro habitatio ou pro morare, esta deverá ter a posse exercida exclusivamente para moradia do possuidor ou de sua família, sendo esta posse de caráter pessoal.

Em relação à coisa hábil, para esta modalidade de usucapião, o seu limite se dá em 250 (duzentos e cinquenta) metros quadrados, tanto para a área total do terreno, quanto para a edificação. Outra característica específica desta mo-dalidade, inserida no § 3º do art. 9º, é que a família ou o possuidor individual somente poderá usucapir por esta modalidade de usucapião, uma única vez, não sendo reconhecido os seu direito se pleitear novamente em juízo a aqui-sição da propriedade por meio desta modalidade, ou se já for proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

Assim, tendo-se em vista que o conceito de família foi ampliado pela Constituição Federal de 1988, permitindo-se até mesmo a usucapião nos casos de união estável, esta lei reconheceu o direito de propriedade para ambas as partes, bem como para qualquer dos pais e seus descendentes.

Quanto à comprovação de que o possuidor é ou não proprietário de outro imóvel urbano, resta extrema dificuldade, vez que poderia se afirmar que cabe ao adquirente o ônus da prova, nos termos do art. 333 do Código de Pro-cesso Civil. No entanto, exigir-se do possuidor carente tal prova restaria impos-sível esta modalidade de usucapião, vez que em um país tão extenso quanto o Brasil, não há como este apresentar certidões negativas de todos os cartórios de registro de imóveis.

18 SALLES, José Carlos de Moraes. Op. cit., p. 303.

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A fim de elucidar tal questão, Odete Medauar19 assim disciplina:

Com base no art. 333 do Código de Processo Civil, a doutrina e a jurisprudência tem equalizado o problema que seria para o usucapiente, que se presume caren-te, produzir tais provas em juízo, uma vez que elas são elementos necessários para a caracterização do fato constitutivo de seus direito.

Baseando-se no ora explicitado, será suficiente ao autor da ação de usu-capião alegar a sua condição de não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Havendo réu, caberá a este provar a inverdade desta alegação, vez que lhe cabe o ônus de provar existência de fato impeditivo do direito do autor.

Tendo-se em vista a forte influência constitucional que disciplinou esta lei, o § 1º do art. 9º trouxe o comando de que as sentenças de usucapião devem conferir o título de domínio tanta para o homem quanto à mulher, ou ambos, não sendo requisito o estado civil do possuidor.

Destarte, é oportuno ressaltar-se a controversa matéria acerca da possi-bilidade da usucapião de terras devolutas, pois alguns doutrinadores entendem que as mesmas não devem ser consideradas públicas.

Porém, contra este entendimento equivocado, existe a Súmula nº 340 do STF, que dirime qualquer dúvida acerca deste tema, pois ressalta que, “desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião”, e, sendo as terras devolutas bens públicos, não são aptas à usucapião especial urbana.

2.2 A usucApião especiAl coletivA urbAnA

Esta é a modalidade de usucapião mais inovadora existente no or-denamento jurídico pátrio, e encontra-se disciplinada no art. 10 da Lei nº 10.247/2001:

Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, inin-terruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocu-pados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.

19 MEDAUAR, Odete; ALMEIDA, Fernando Dias Menezes de (Coord.). Estatuto da Cidade: Lei nº 10.257, de 10.07.2001. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 96.

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§ 2º A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis.

§ 3º Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferen-ciadas.

§ 4º O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio.

§ 5º As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão to-madas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também os demais, discordantes ou ausentes.

Fato inegável nos dias atuais é o grande avanço das favelas e loteamentos irregulares nas cidades brasileiras que, consequentemente, derivam-se de inva-sões e compras irregulares de terrenos.

Disserta Ricardo Pereira Lira20 que:

As populações carentes, predominantemente vindas do campo e até mesmo de áreas urbanas menos atendidas, em virtude da valorização do centro urbano, inclusive peça prática das renovações urbanísticas, se assentam nas periferias.

Atualmente, se pode ver nas cidades uma grande parcela da população vivendo irregularmente e de maneira clandestina, sob a ótica do registro de imóveis, diante da enormidade de conjuntos habitacionais e conglomerados humanos, tais como as favelas, loteamentos irregulares e clandestinos, que se enraízam e se tornam irremovíveis na paisagem das grandes cidades, integran-do, consequentemente, a zona urbana de maneira definitiva.

O legislador viabilizou o acesso das comunidades carentes na obtenção de suas moradias, tendo-se em vista a dificuldade encontrada pela população de baixa renda em adquirir a propriedade pelos meios convencionais, para que venham usucapir, conjuntamente, com a finalidade de que cada morador destas localidades possa se tornar o real proprietário de seu terreno.

Assim, é de suma importância o instituto da usucapião especial coletiva urbana para a perfeita regularização fundiária dos grandes centros, vez que pos-sibilita o desenvolvimento organizacional regular destas cidades, podendo-se até extinguir as moradias irregulares existentes nas mesmas.

20 LIRA, Ricardo Pereira. Elementos de direito urbanístico. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 300/301.

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Insta ressaltar que divergências foram apontadas pela doutrina acerca de ser a usucapião especial coletiva urbana um direito novo no ordenamento pá-trio. No entanto, observa-se que a lei fala em áreas com mais de 250 (duzentos e cinquenta) metros quadrados, impossibilitando a usucapião especial urbana individual.

Como finalidade desta usucapião, temos a consolidação de um condomí-nio e a possibilidade de substituição processual e de formação de litisconsórcio ativo com inúmeros possuidores, o que não existia anteriormente. Os demais requisitos desta modalidade de usucapião serão estudados de forma aprofunda-da em capítulo específico.

3 reQUISITOS PrOceSSUaIS aTINeNTeS a TODaS aS MODaLIDaDeS De USUcaPIÃO

Conforme podemos observar, em todas as modalidades de ação, existem requisitos essenciais estabelecidos na lei processual civil que são indispensáveis para a obtenção do direito tutelado. Os requisitos essenciais da ação de usuca-pião serão analisados a seguir.

3.1 dA possibilidAde jurídicA do pedido e do interesse de Agir

Possibilidade jurídica do pedido é a aptidão do pedido para ser acolhi-do, assim, se em tese é possível que o pedido seja acolhido, há a constatação desta. Essa condição foi pensada por Liebman para explicar os casos em que se pedia divórcio na Itália, à época, proibido. Em uma situação como aquela, nem mesmo deveria se processar, visto que o pedido não era admitido pelo ordena-mento jurídico. Posteriormente houve aprovação dessa possibilidade e Liebman ficou sem seu único exemplo para explicar tal condição. Diante disso, na edi-ção seguinte de seu livro, o autor resolveu por excluir essa condição. Todavia, dadas as dificuldades de comunicação naquela época, essa informação não foi passada aos processualistas brasileiros e, por isso, tal condição consta em nosso Código de Processo Civil.

Segundo Didier21, trata-se de algo um tanto quanto inapropriado, visto que, se o pedido não pode ser acolhido pelo ordenamento jurídico, a hipótese seria de improcedência do mesmo, e não de carência de ação, que é decisão sem exame de mérito. Tal entendimento encontra fundamento legal no art. 169, I, do Código de Processo Civil.

Desta forma, a possibilidade jurídica do pedido se enquadra na ação de usucapião, quando o autor da demanda tenha formulado pedido individuali-zando, atendidos os requisitos essenciais da modalidade que pretende usucapir

21 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo de conhecimento. 5. ed. Salvador: JusPodivm, v. 1, 2010. p. 261.

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e desde que o bem imóvel que pretende transferir para o seu domínio seja pas-sível de ser usucapido.

Já a condição do interesse de agir, segundo Didier22, deveria ser conside-rada um pressuposto processual, dada a sua importância. Trata-se da necessi-dade de que a demanda seja útil e necessária. Deve-se estabelecer que aquela demanda acarretará algum proveito, não se tratando de frivolidade. Por isso, quando há a perda do objeto, fala-se na perda do interesse de agir, pois o pro-cesso não terá qualquer utilidade.

Uma demanda necessária, por sua vez, é demonstrada pela necessidade de ir a juízo para que se atinja seus propósitos. Em não se restando comprovada essa necessidade, diz-se que tal ida é abusiva.

Não obstante, parte da doutrina defende que o interesse de agir tem uma terceira dimensão, pois, além da utilidade e da necessidade, no exame do in-teresse de agir também estaria adequação, ou seja, busca-se comprovar que o procedimento seja adequado ao que se pede. De forma diversa, o procedimento seria considerado inadequado, pela falta de interesse-adequação. Isto por que a escolha do procedimento nada tem a ver com a demanda, visto que aquela é puramente processual. Além disso, quando a parte escolhe o procedimento inadequado, nada impede que o juiz o conserte, diferentemente da utilidade e da necessidade.

Com efeito, Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Almeida e Eduardo Talamini23 afirmam que o interesse processual nasce, portanto, da necessidade da tutela jurisdicional do Estado, invocada pelo meio adequado, que determinará o resultado útil pretendido, do ponto de vista processual. Sen-do assim, não é admitida a usucapião nos casos em que o autor da demanda poderá adquirir a propriedade do imóvel pela via ordinária, ou seja, administra-tiva. Isto ocorre quando, por exemplo, o possuidor possui uma escritura válida de compra e venda, mas não registra para se eximir do pagamento do registro no Cartório de Registro de Imóveis competente e do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), ou quando os herdeiros pleiteiam a usucapião de imóvel que deveria ser objeto de partilha, uma vez que com a mesma poderão regular-mente registrar o mesmo no registro de imóveis.

3.2 dA legitimidAde: cApAcidAde de ser pArte, de estAr em juízo e postulAtóriA

O conceito de parte se relaciona com a capacidade processual prevista nos arts. 7º e seguintes do Código de Processo Civil. Com referência ao conceito

22 Idem, p. 263.23 WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flavio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de

processo civil. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, v. 2, 2007. p. 321.

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de parte, mister se faz distinguir três aspectos: capacidade de ser parte, capaci-dade de estar em juízo e capacidade postulatória.

A capacidade de ser parte está prevista especialmente no art. 12. Ela se refere à capacidade de ter direitos como ser humano, uma vez que a perso-nalidade civil é reconhecida desde o nascimento com vida, embora desde a concepção se resguardem alguns direitos do nascituro, nos termos do art. 2º do Código de Processo Civil. Toda pessoa pode ser titular de direitos civis e figurar em relação jurídica processual, seja como autor ou réu.

A capacidade de estar em juízo significa legitimidade para o processo e somente é cabível àqueles que se encontrarem no exercício de seus direitos, nos termos do art. 7º do Código Processual Civil. Essa legitimação não se confun-de com capacidade de ser parte, visto que constitui um requisito do processo de usucapião e não da ação, dizendo respeito à capacidade de exercício da demanda. Desta forma, analisando-se os arts. 4º, 5º, 8º, 9º e 1.767, todos do Código Civil, os absolutamente incapazes não poderão praticar qualquer ato no processo, devendo haver representação e os relativamente incapazes o poderão fazer, mediante assistência de quem lhes complete a capacidade.

Já a capacidade postulatória é o poder de requerer pessoalmente em juízo e somente será atingido por meio de pessoas especializadas e mediante outorga de mandato por escrito a advogado legalmente habilitado e inscrito nos quadros da Ordem de Advogados do Brasil24.

3.3 dos requisitos gerAis e especiAis

Conforme disciplina o art. 282 do Código de Processo Civil, são requi-sitos da petição inicial e deverão estar indicados na mesma: o juiz a que é dirigida; prenomes, sobrenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e réu; fato e fundamentos jurídicos do pedido; pedido com suas espe-cificações; valor da causa; provas que o autor pretende produzir e requerimento para citação do réu.

Como requisitos especiais da ação de usucapião, temos o disposto nos arts. 942 e 943 do Código Processualista, a saber, o autor deverá juntar a planta do imóvel usucapiendo, requererá a citação do proprietário e dos confrontantes do imóvel e por edital os réus em local incerto e terceiros interessados; serão intimados por via postal as Fazendas Públicas da União, Estado e Município em que se localiza o bem objeto da ação.

Ademais, outros documentos especiais devem ser apresentados pelo au-tor da ação de usucapião, como a certidão atualizada do imóvel, a fim de que

24 RIBEIRO, Benedito Silvério. Tratado de usucapião. 4. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Saraiva, v. 2, 2006. p. 1119/1137.

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se comprove em nome de quem o imóvel está registrado e demais certidões negativas dos demais cartórios de registros de imóveis, se houver no local da situação do bem imóvel; certidões de ações possessórias e petitórias em nome do usucapiente e de seus antecessores na posse, a fim de se comprovar que a posse, de fato, foi mansa, pacífica e ininterrupta; memorial descritivo a ser apre-sentado conjuntamente à planta do imóvel, sendo que ambos deverão possuir assinatura do engenheiro responsável com prova de anotação de responsabili-dade técnica no Crea ao qual o mesmo está vinculado; dependendo da moda-lidade de usucapião pretendida também é necessária certidão dos cartórios de registros de imóveis da localidade do bem, comprovando que o autor da ação não é proprietário de quaisquer outros imóveis (usucapiões especial individual e coletiva).

4 a USUcaPIÃO eSPecIaL cOLeTIva UrbaNa e SeUS reQUISITOS PrOceSSUaIS eSSeNcIaIS e eSPecÍFIcOS

4.1 Aspectos gerAis

Tendo em vista esta especialíssima modalidade de usucapião, seus re-quisitos essenciais e processuais vão ser objeto de estudos do presente capítulo, vez que o Estatuto das Cidades ao implementá-la, fez exigências distintas so-bremaneira de todas as outras modalidade de usucapião existentes em nosso ordenamento jurídico.

Sendo assim, o presente capítulo objetiva complementar o estudado no capítulo 3 anteriormente descrito, analisando os requisitos específicos e pró-prios da usucapião especial coletiva urbana.

4.2 requisitos processuAis

Reza o art. 10 do Estatuto da Cidade que, nas áreas urbanas com mais de 250 (duzentos e cinquenta) metros quadrados onde não se possa identificar os terrenos, haverá a possibilidade de a comunidade carente pleitear em juízo, coletivamente, a usucapião especial coletiva urbana.

Nos dizeres de Portilho Mattos25, os grandes obstáculos enfrentados pe-los municípios para regularizarem de forma ágil o parcelamento do solo era a abordagem individualista e privatista disciplinada no Código Civil de 1916. Até mesmo a Constituição Federal de 1988, intitulada de “constituição cidadã”, não operou com veemência a esta possibilidade da usucapião coletiva que trouxe o novel Estatuto da Cidade.

25 MATTOS, Liana Portilho (Org.). Op. cit., p. 156.

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Pode-se dizer que esta nova modalidade possibilita de forma nunca antes existente a regularização fundiária dos centros urbanos, pois a prova da ob-tenção do prazo prescricional poderá se fazer de forma coletiva, assim, desde que demonstrada a antiguidade da ocupação no prazo mínimo de cinco anos após a vigência do Estatuto da Cidade, poderá a comunidade carente proceder à usucapião.

Esta possibilidade se deve à grande mobilidade dos moradores, principal-mente daqueles que habitam em favela, vez que é comum a constante mudança de uma favela para outra vizinha e até dentro da mesma favela, devido a insa-lubridade e riscos que os barracos apresentam em determinadas regiões destes conglomerados.

Nesta modalidade de usucapião, não existe limite para o tamanho da área total a ser usucapida, apenas deverá ser superior a 250 (duzentos e cin-quenta) metros quadrados.

Destarte, como nas outras modalidades de usucapião anteriormente ex-pendidas, não é possível a usucapião de terras públicas, sejam elas de interesse comum do povo, especial ou devolutas. Assim, a área deverá ser de particular e ocupada por possuidores que habitam em barracos ou habitações precárias.

Benedito Silvério Ribeiro26 aduz que:

Como óbvio, tendo em vista os parâmetros constitucionais, não é possível aceitar que cada um dos ocupantes receba fração ideal, conquanto possa ser diferencia-da (§ 3º do art. 10 do Estatuto da Cidade), que supere 250m², quantum estipulado para moradia urbana, consoante se infere do preceito contido no art. 183 da CF.

Portanto, mister há de ressaltar que a metragem máxima para cada con-dômino não poderá ultrapassar os contornos da política urbana inserida no art. 182 da CF. Neste sentido, o ora possuidor não poderá usucapir área maior do que 250 (duzentos e cinquenta) metros quadrados, mesmo não existindo o limite máximo previsto no art. 10 da lei, pois assim restaria inconstitucional este artigo.

Nos termos do art. 10, § 3º, da lei, cada possuidor terá uma fração ideal idêntica à dos outros condôminos após o registro da sentença no cartório de registro de imóveis. Diz-se que o legislador assim determinou, tendo em vista a desorganização das moradias existentes nas favelas brasileiras. Pode-se afir-mar que esta determinação garantiu ampla liberdade ao Poder Público para implementar programas de regularização fundiária, para se utilizar da melhor maneira o solo urbano nas áreas a serem usucapidas coletivamente pela popu-lação carente.

26 RIBEIRO, Benedito Silvério. Op. cit., v. 2. p. 993.

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Nos dizeres de Portilho27:

Muitas vezes, a forma histórica de ocupação da área consagrou injustiças que po-dem ser corrigidas por um projeto que, ainda que respeitando as especificidades da ocupação, redistribua de forma mais ética a terra na favela. Essa possibilidade liberta o poder público de um grande obstáculo prévio ao Estatuto da Cidade para a regularização de favelas: o fato de que ao propor qualquer rearranjo territorial na área a ser usucapida, o Poder Público quebrava a continuidade da posse de cinco anos do possuidor relocalizado e o prazo se reiniciava do zero.

Destarte, o artigo possibilita que se os usucapientes ingressarem em juízo com acordo coletivo, as frações ideais poderão ser dispostas diversamente na forma pactuada para cada um dos futuros condôminos. Afirma-se que esta pos-sibilidade pode ser uma boa solução quando a favela for ordenada territorial-mente, ou quando a organização comunitária for enraizada e legitimada social-mente, casos em que serão desnecessárias as intervenções do Poder Público.

4.2.1 Da legitimidade ativa, do interesse de agir e do objeto hábil

Reza o art. 12 da Lei nº 10.257/2001:

Art. 12. São partes legítimas para a propositura da ação de usucapião especial urbana:

I – o possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;

II – os possuidores, em estado de composse;

III – como substituto processual, a associação de moradores da comunidade, regularmente constituída, com personalidade jurídica, desde que explicitamente autorizada pelos representados.

§ 1º Na ação de usucapião especial urbana é obrigatória a intervenção do Minis-tério Público.

§ 2º O autor terá os benefícios da justiça e da assistência judiciária gratuita, inclu-sive perante o cartório de registro de imóveis.

O legislador, quando da elaboração do presente artigo, vislumbrou di-rimir dúvidas que pudessem surgir na prática do processamento das ações de usucapião especial coletiva, estabelecendo quem são os legitimados a propor a ação de usucapião.

São legitimados: o possuidor em litisconsórcio ativo que pode ser su-perveniente à propositura da ação; o conjunto de moradores/possuidores do imóvel, por meio da composse exercida por todos que dá azo ao litisconsórcio

27 MATTOS, Liana Portilho (Org.). Op. cit., p. 158.

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e a associação de moradores que pode ingressar em juízo, e por meio da subs-tituição processual, representar seus associados.

A “ocupação” constante no art. 10 do Estatuto deve ser realizada por população carente, que é quem tem a legitimidade ativa para a propositura da ação de usucapião. A doutrina entende que esta legitimidade advém do obje-tivo do legislador em dar oportunidade à população de baixa renda para que consiga usucapir uma moradia para habitar.

O possuidor poderá pleitear a usucapião coletiva somente ou com sua família, porém, esta deverá ser de forma pessoal e direta, sendo proibida a posse por intermédio de prepostos. Como a finalidade desta usucapião foi possibilitar um teto para a população de baixa renda morar, o possuidor não poderá ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

Ainda, deverá o usucapiente exercer a posse, no prazo mínimo de cinco anos, com animus domini, ou seja, além de utilizá-la para a moradia, também deverá ter o ânimo de dono, ou seja, portar-se perante a sociedade como se realmente fosse o proprietário daquela gleba.

Entende grande parte da doutrina que a expressão “para sua moradia” constante do caput do art. 10 da lei não afasta a possibilidade da utilização do imóvel para pequenos comércios, tais como “boteco”, “venda” e “quitanda”, entre outros. Ressaltando-se este posicionamento, aduz o professor Benedito Silvério28:

As favelas, no entanto, constituem um todo orgânico e devem ser consideradas como unidades, daí por que alguns imóveis comerciais não podem, desde que exista predominância de residência, impedir futura urbanização. Não é de afastar a possibilidade de usucapião coletiva, no caso em que poucos imóveis sejam utilizados para fins comerciais [...].

O possuidor, a fim de cumprir o prazo prescricional estabelecido no caput do art. 10 da lei, poderá somar a sua posse com a do seu antecessor, não fazendo o legislador qualquer ressalva em ser o sucessor obrigatório ou facul-tativo, desde que ambas sejam contínuas, ou seja, não haja intervalo de tempo entre a posse do antecessor e a do sucessor.

Segundo doutrina dominante, a ação coletiva especial exige que os inte-resses individuais não sejam conflitantes, pois não há possibilidade de se obri-gar quem quer que seja a usucapir coletivamente, portanto, os interesses devem ter origem comum, não obstante serem os direitos divisíveis.

Quanto ao litisconsórcio dos moradores da comunidade carente, ou seja, a adesão ou não de certos possuidores à usucapião coletiva, certas diferenças

28 RIBEIRO, Benedito Silvério. Op. cit., v. 2. p. 998.

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quanto à localização de suas glebas podem interferir sobremaneira no intento dos demais usucapientes.

Sendo o imóvel possível de ser “desmembrado” da totalidade, o litiscon-sórcio será facultativo, pois a ação coletiva de usucapião não se torna inviável com a não adesão dos mesmos. Entende-se por imóvel desmembrado aquele que seja marginal à área, ou seja, que possa ser individualizado, vez que não está entre os demais.

Outrossim, caso o imóvel esteja inserido no interior da área que se queria usucapir e o possuidor não concorde com o ingresso da ação coletiva de usuca-pião, resta esta prejudicada, vez que o litisconsórcio, neste caso, será necessá-rio, vez que a recusa inviabiliza a demanda dos demais possuidores.

Porém, ressalte-se que existe uma solução jurídica para tal impasse, vez que os possuidores podem ingressar com a ação coletiva em juízo e procede-rem com a citação do possuidor omisso para integrar o pólo ativo da lide. Caso aceite, a legitimação resta cumprida, caso discorde, caberá ao juiz verificar se a procedência da demanda será oposta às suas conveniências ou se a recusa configura abuso de direito.

Assim, entendendo o juiz ser a recusa justificada, o processo será julgado extinto e os demais possuidores deverão ingressar individualmente, em queren-do, com a ação de usucapião especial urbana disposta no art. 9º do Estatuto da Cidade, porém, caso entenda a não anuência injustificada, o feito prosseguirá com situação semelhante à supressão de outorga de cônjuge.

A participação das associações de moradores, que possuem legitimidade para atuarem como substitutos processuais, pode assumir papel relevante na urbanização posterior da área usucapida coletivamente, exigindo providências do Poder Público, promovendo a realização de plantas e memoriais descritivos das glebas usucapidas, das vias públicas e das áreas reservadas.

4.2.2 Dos demais requisitos processuais essenciais

A primeira parte do § 4º do art. 10 do Estatuto da Cidade disciplina que o condomínio especial que vem a ser constituído após a sentença que julgou procedente o pedido de usucapião especial coletivo urbano é indivisível e não se extingue. No entanto, sua segunda parte aduz que, por deliberação de dois terços dos condôminos, poderá extinguir-se, no caso de urbanização posterior à sua constituição.

É cediço que para a efetivação e execução da urbanização relativa à área urbana que foi objeto da usucapião coletiva deverá haver previsão de recursos no plano diretor dos municípios com mais de vinte mil moradores.

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A fim de se obter a posterior urbanização, não se restringirá a regulariza-ção fundiária em mera outorga de título de domínio, mas sim em uma efetiva re-alização de infraestrutura básica da área usucapida coletivamente. Desta forma, o Poder Público poderá urbanizar a área, ou permitir que os próprios moradores a realizem, desde que observadas normas básicas para que não se comprometa o ordenamento do solo estabelecido no plano diretor do município.

Segundo Benedito Silvério29:

As leis estaduais e municipais que venham complementar o Estatuto da Cidade precisam atentar para o fato de que se evitem novas invasões, sobremodo em locais inapropriados e cuja regularização demande gastos extraordinários, a fim de que não desfigurem as cidades e não se prejudiquem aqueles que com muito custo adquirem seus imóveis e observam as posturas.

Quanto às deliberações na administração do condomínio especial, afir-ma Portilho Mattos30:

As decisões tomadas pela maioria dos condôminos obrigam a todos. Aqui, trata--se de maioria simples, ou seja, maioria dos presentes à assembléia. Esta é uma regra básica de qualquer sistema democrático: os que se ausentam devem sub-meter-se às decisões tomadas por aqueles que participam do processo de tomada de decisão. Da mesma forma, os vencidos em uma decisão tomada de forma democrática devem conformar-se ao decidido.

Tal como acontece na usucapião especial urbana, os possuidores encon-tram-se amparados pela justiça gratuita e assistência judiciária gratuita, com a isenção do pagamento de custas e honorários advocatícios pelo prazo de 05 anos, nos termos do art. 12 da LAJ, bem como para o registro da sentença da usucapião coletiva no cartório de registro de imóveis, tendo em vista a hipos-suficiência financeira dos posseiros que buscam esta via para a obtenção da propriedade.

O Estatuto da Cidade trouxe outra inovação disposta em seu art. 13, que é a possibilidade de o possuidor que comprove a existência de todos os requi-sitos exigidos na lei, alegar como matéria de defesa esta posse nas ações em que for réu, podendo até mesmo a usucapião especial urbana ser reconhecida e sentenciada nas ações em que o propósito do autor era a retirada do posseiro do imóvel.

Estabelece o art. 11 do Estatuto da Cidade que “na pendência da ação de usucapião especial urbana, ficarão sobrestadas quaisquer outras ações, pe-

29 RIBEIRO, Benedito Silvério. Op. cit., v. 2. p. 1009.30 MATTOS, Liana Portilho (Org.). Op. cit., p. 161.

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titórias ou possessórias, que venham a ser propostas relativamente ao imóvel usucapiendo”.

Sendo esta regra de caráter processual, visa estabelecer uma ordem hie-rárquica de prioridades acerca da usucapião especial coletiva, em detrimento das demais ações relativas ao mesmo terreno.

Leciona Mores Salles31 que esta norma visa impedir a concomitância da ação de usucapião e das ações petitórias ou possessórias, com “o objetivo evi-dente de evitar decisões contraditórias, que poderiam decorrer do processa-mento concomitante ou simultâneo de ambas as ações”.

Por fim, objetivando diminuir a morosidade nos processos de usucapião, a lei disciplinou em seu art. 14 que o rito processual a ser observado é o sumá-rio. Esta determinação, nos dizeres de Portilho Mattos32 “deriva de uma conjun-ção de facilidades admitidas pelo Estatuto da Cidade”.

Não obstante, também haverá a participação do Ministério Público nesta modalidade de usucapião, exercendo o papel de custos legis, vez que deverá acompanhar todos os atos do processo, nos termos dos arts. 943 e 944 do Có-digo de Processo Civil e art. 12, § 1º, do Estatuto da Cidade. Esta participação do Parquet é determinante na concretização da prescrição aquisitiva pela usu-capião especial coletiva.

Neste entendimento, ressalta Fiorillo33:

O Ministério Público além de participar na ação de usucapião especial urbana intervindo obrigatoriamente (art. 12, § 1º, do Estatuto), tem legitimidade ativa para propositura da usucapião ambiental metaindividual em decorrência do que estabelece o art. 127, caput, da CF.

Diz-se que a sentença da usucapião coletiva é declaratória de direito, e não constitutiva de direito, vez que o juiz declara a existência de requisitos autorizadores da aquisição do domínio pela usucapião por meio deste decisum.

Assim, para fins de registro do título, o possuidor ou a associação de moradores, caso ocorra a substituição processual, utilizar-se-á desta sentença, levando-a ao cartório de registro de imóveis, vez que é o ato que aperfeiçoa a prescrição aquisitiva do domínio, encerrando a insegurança da posse que ou-trora existia.

Portanto, a sentença que declara a usucapião especial coletiva urbana reconhece a aquisição da propriedade que foi realizada pelos posseiros, garan-

31 SALLES, José Carlos de Moraes. Op. cit., p. 329.32 MATTOS, Liana Portilho (Org.). Op. cit., p. 165.33 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Estatuto da Cidade comentado: Lei nº 10.257/2001: Lei do Meio

Ambiente Artificial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

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tindo-se, assim, a segurança jurídica para fins de que possam obter sua regular moradia.

4.3 críticAs à Ação de usucApião especiAl coletivA urbAnA

A doutrina pátria faz críticas do caráter processual da ação de usucapião especial coletiva urbana, afirmando que o número elevado de pessoas no polo ativo dificulta o regular andamento processual, haja vista a morosidade na cita-ção e intimação de todos os condôminos, confrontantes, réus e terceiros interes-sados, além da intimação de cônjuges, herdeiros, entre outros.

Também será dificultoso para o Poder Público julgar as ações de usuca-pião especial coletiva, tendo em vista a enorme dificuldade para produção de provas, tanto documentais (comprovação de que o possuidor não é proprietário de outro imóvel urbano ou rural) quanto testemunhais (possuidor recente tente comprovar que reside há mais de cinco anos no terreno), bem como para reu-nir as centenas de moradores para deliberarem acerca do condomínio especial criado no Estatuto da Cidade.

Por fim, há de se ressaltar que as críticas da doutrina não são unânimes, uma vez que o assunto tratado pelo Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) é bastante polêmico e divergente, já que a manutenção das favelas não é a me-lhor maneira de se atender ao plano diretor dos municípios, que visam ao orde-namento urbano, com o regular parcelamento do solo. Além disso, a população carente vive marginalizada nessas áreas, devido aos riscos à saúde e integridade física, bem como o perigo estrutural dos barracos e da própria comunidade.

Em contrapartida, o Poder Público não pode deixar de atender à enormi-dade de pessoas carentes existentes no Brasil, impedindo que tenham o consti-tucional direito à moradia. Além disso, deve ser atendida a função social da pro-priedade, vez que a usucapião de favelas, é direito coletivo, vide a abrangência de centenas de possuidores carentes que não poderiam, pelos meios próprios, obter uma regular moradia, mas desde que cumpridos todos os requisitos legais e processuais à concessão da sentença declaratória de usucapião especial co-letiva urbana.

cONcLUSÃO

O presente estudo objetivou identificar e especificar as hipóteses e requi-sitos processuais das ações de usucapião de imóveis existentes no Código Civil de 2002 e no Estatuto da Cidade.

Muito embora tenham sido especificadas todas as espécies de usucapião de bens imóveis do Código Civil de 2002, este estudo visou primordialmente

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discriminar e pesquisar acerca da nova modalidade de usucapião que foi inseri-da no ordenamento jurídico pátrio, com o advento do Estatuto da Cidade.

Esta modalidade de usucapião é denominada tanto pela lei quanto pela doutrina de usucapião especial coletiva urbana e tem como fator principal pos-sibilitar à população carente, residente de loteamentos urbanos irregulares e favelas, usucapir coletivamente glebas de terra onde exercem sua posse.

Além da observância do Estatuto, questões de ordem urbanística também foram objeto deste estudo, que demonstrou o direito à moradia, a função social da propriedade e a urbanização dos municípios brasileiros, com o plano diretor.

Portanto, não obstante, ser a lei de caráter fundamentalmente social, uma série de requisitos são exigidos dos carentes para que possam usucapir coletiva-mente os terrenos em que exercem a composse.

Desta forma, restou demonstrado que as exigências legais devem ser res-peitadas e cobradas pelo Poder Judiciário, mesmo que o andamento do proces-so se torne moroso, pois deverá ser mantida a segurança jurídica, bem como o contraditório e a ampla defesa, com a citação e intimação regular de condômi-nos, proprietários, confrontantes, herdeiros e cônjuges.

Outrossim, configurou-se que o entendimento da doutrina pátria não é uníssono, vez que há críticas quanto à processualidade das ações de usucapião especial coletiva urbana.

Além do mais, o Estatuto da Cidade ainda é recente em nosso ordena-mento jurídico, e tendo em vista a morosidade dos processos de usucapião especial coletiva urbana, não existem muitos julgados, tampouco é uníssona a jurisprudência.

Desta forma, deixo a seguinte indagação, extraída do posicionamento de Moraes Salles (2002, p. 319), acerca da usucapião especial coletiva urba-na: “Demagogia? Espírito tacanho incapaz de perceber a barbaridade cometida com tamanho disparate? Não sabemos!” Sequer sabemos se é realmente um grande disparate, haja vista as inúmeras favelas em nosso País e o direito cons-titucional de todos à moradia.

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Assunto Especial – Doutrina

Usucapião

Usucapião e o Direito Agrário: Uma Visão Geral da Aplicabilidade da Usucapião no Direito Agrário e a Usucapião Especial Rural

WAGnER SARAIvA FERREIRA LEmGRUBER BOEChATAdvogado, Consultor Ambiental, Professor de Direito na Universidade Vale do Rio Verde e Faculdade de São Lourenço, Graduado em Direito pela Faculdade de São Lourenço, Pós-Gra-duado em Direito Público pela Faculdade de São Lourenço, em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas, Direito Ambiental e Urbanístico pelo Centro Anhanguera de Promoção e Edu-cação Social e Mestre em Direito – Linha Constitucionalismo e Democracia – pela Faculdade de Direito do Sul de Minas Gerais.

SUMÁRIO: Visão geral da usucapião; As diversas formas de se usucapir e o direito agrário; As prin-cipais formas de se usucapir no direito agrário; Usucapião especial rural; Considerações finais; Re-ferências.

O instituto da usucapião apresenta, no Direito pátrio, diversas formas, cada qual com suas peculiaridades, sendo certo que, devido a essas caracterís-ticas próprias, alguns tipos terão maior aplicabilidade no Direito Agrário.

vISÃO GeraL Da USUcaPIÃO

Antes que se adentre propriamente no tema, urge que se faça uma pas-sagem, mesmo que de modo resumido, pelos principais pontos relativos à usu-capião.

Segundo ensina Diniz (2010, p. 155), usucapião é meio de aquisição da propriedade, mas também pode ser meio de aquisição de outros institutos de direito real, tais como usufruto e servidão.

Para que isso ocorra, deve haver o prolongamento da posse da coisa no tempo; situação essa que ainda deve ser revestida de outras características le-galmente estabelecidas (Diniz, 2010, p. 157).

De fato, a distinção entre os vários tipos de usucapião deriva da assime-tria entre essas características acessórias e da multiplicidade de períodos legal-mente exigidos de posse.

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Dessa constatação, surge a imperiosa conclusão de que não existe usu-capião sem posse; entretanto, não se trata de qualquer posse. Muito embo-ra os detalhes possam variar e serem influenciados por cada situação jurídica e/ou fática, pode-se elencar alguns requisitos inerentes à posse capazes de gerar usucapião, são eles: pacificidade, ininterrupção, justiça e o animus domini.

Pode-se dizer que a usucapião deriva em parte do desdém do proprietá-rio para com sua propriedade; nesse sentido, a posse do usucapiente não pode ser turbada por terceiros que tenham legítimo interesse na coisa, principalmente o proprietário. Assim, a posse deve ter permanecido incólume durante o perío-do temporal exigido pela lei. Por outro lado, se o proprietário perturbar tal posse (Diniz, 2010, p. 162), seja fisicamente, interpelando o possuidor, seja judicial-mente, o requisito será perdido, tornando-se a posse sem efeitos para usucapião (Diniz, 2010, p. 163).

Já o requisito da justiça, na verdade, apresenta-se como contraposto à pacificidade, uma vez que entende-se como justa a que não se adquiriu e/ou se mantém por violência ou clandestinidade (Diniz, 2010, p. 163). Assim, se a pacificidade fala de turbações impostas pelo proprietário e/ou terceiros, aqui se fala em ação do próprio possuidor perante terceiros e/ou principalmente contra o proprietário.

Por sua vez, o elemento temporal confere à usucapião sua natureza ju-rídica de prescrição aquisitiva, apresentando-se de modo diverso à prescrição normal (extintiva), pois, se nessa se perde determinado direito pelo decurso temporal, aqui se ganha tal direito (Gonçalves, 2010, p. 256).

Assim, a contagem do tempo é fator inerente e vital para o instituto. Nes-se sentido, vale a analogia com a vida. Uma vez que a vida seja interrompida, não se pode mais restabelecê-la. Do mesmo modo, a posse se dá por uma contagem de prazo, sendo certo que sua interrupção gera a perda do período anterior e o reinício desde o começo (Diniz, 2010, p. 163).

Assim, se um agricultor contava já com três anos de posse de determina-da gleba, mas a abandona por determinado período perderá tal período, deven-do recomeçar a contagem do tempo para usucapir a terra.

Aqui, vale lembrar que tal interrupção pode ser gerada pelo próprio pos-suidor ou pelo proprietário. Ou ainda, pode se dar por ação de terceiro, por caso fortuito ou por força maior.

Nos casos de interrupção por terceiros, por caso fortuito ou por força maior, há de se ponderar que os poderes de gozo do imóvel foram interrompi-dos por ação alheia à vontade dos interessados, não podendo o possuidor sofrer a perda de anos de trabalho, por exemplo.

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Nesse sentido, no Código Civil (CC), reiteradamente vem apresentado o caso fortuito e a força maior como excludentes de situações que fogem do domínio dos interessados. Portanto, o único modo de se compatibilizar a dou-trina civilista com a situação aqui tratada seria o entendimento de que caso o possuidor se visse impedido por uma dessas situações, não estar-se-ia diante de situação de interrupção do prazo.

Ainda no âmbito da ininterrupção, o CC, em instituto claramente social, estabelece que o possuidor pode acrescentar a seu tempo de posse o tempo dos seus ascendentes. É nesse sentido a redação do art. 1.243 do CC.

Quanto a essa possibilidade, deve-se atentar que para que o cômputo seja possível, ambas as posses devem atender aos demais requisitos legais.

Ainda quanto às interrupções de contagem do tempo, pode-se elencar ao lado da classificação anteriormente dada (que se baseia na pessoa), uma outra, apresentada por Opitz e Opitz (2013, p. 104), que separa os casos de interrup-ção entre naturais e civis, sendo aqueles quando o possuidor abdica da posse ou deixa passar um ano desde eventual esbulho, e estes quando o proprietário aciona o possuidor, quando este reconhece o direito daquele ou quando se verificam os demais casos de interrupção da usucapião segundo a lei civilista.

Vale ressaltar que o reconhecimento do direito do proprietário ou a ação deste contra o possuidor não necessita ser judicial, mas produz efeito desde que inequívoco(a) (Nery Júnior, 2009, p. 962), valendo para tal inclusive os atos verbais (Opitz; Opitz, 2013, p. 105).

Assim, aplicam-se ao instituto todas as causas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição (Gonçalves, 2010, p. 257). É o que se pode ler no art. 1.244 do CC.

Assim, o leitor deve se dirigir aos arts. 197 a 206 do CC e lê-los trocando--se as palavras “devedor” por “possuidor” e “credor” por “proprietário” (carto-rário).

Finalmente, mas não menos importante, tem-se o animus domini.

Diniz (2010, p. 162) esclarece que a intensão de dono é um caráter psi-cológico que se consubstancia pelo trato diferenciado que o possuidor tem com a coisa.

O caráter egoístico das relações civis impõe ao detentor de coisa que seja ou considere alheia relação de distância, de modo que, principalmente inves-timentos não serão realizados, a menos que sejam indenizados pelo dono ou suposto dono. Por outro lado, o usucapiente tem relação de dono com a coisa, portanto, investe seu tempo e seus recursos da mesma forma que investiria se já possuísse o título de domínio. De fato, seus atos devem demonstrar que, em

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sua mente, não há distinção da coisa como de outro, mas sim já integra psico-logicamente seu domínio.

Tal caráter é de suma importância, afastando da possibilidade de usuca-pião o locatário, o comodatário, o usufrutuário, o promitente comprador e as-sim por diante (Diniz, 2010, p. 158); todos por não possuírem intensão de dono sobre a coisa, mas sim se relacionarem com ela como pertencente a terceiros.

Mas a lei civilista ainda exige, adotando a concepção de Ihering, que, aos elementos internos, se acrescente o elemento externo de aparência de dono, ou seja, o possuidor, para usucapir, deve gerar, na sociedade, a crença de que é ele o proprietário da terra, de modo que todos devem tratá-lo como tal (Opitz; Opitz, 2013, p. 103).

Como anteriormente ventilado, ao lado da posse, o tempo é elemento essencial na equação que dá direito à aquisição por usucapião (Pereira, 2013, p. 118).

O período varia enormemente de um tipo de usucapião para outro; en-tretanto, ainda assim se pode dizer que sempre guarda o condão de servir como defesa para o proprietário, que pode reaver a coisa caso o decurso temporal não tenha se extinguido, ou para o possuidor que, segundo a Súmula nº 237 do STF, pode arguir como defesa a prescrição aquisitiva já consumada.

De mesmo teor é o Enunciado nº 315 da IV Jornada de Direito Civil:

315 – art. 1.241. O art. 1.241 do Código Civil permite que o possuidor que figu-rar como réu em ação reivindicatória ou possessória formule pedido contraposto e postule ao juiz seja declarada adquirida, mediante usucapião, a propriedade imóvel, valendo a sentença como instrumento para registro imobiliário, ressalva-dos eventuais interesses de confinantes e terceiros. (Brasil, 2012)

Também na mesma esteira é o art. 7º da Lei nº 6.969/1981.

Percebe-se assim que a sentença que reconhecer o direito, independen-temente de ser a ação de usucapião ou outra qualquer, servirá como título hábil para registro da propriedade.

Tendo-se em vista que a usucapião é meio de aquisição da propriedade por decurso temporal, uma vez que o usucapiente tenha transcorrido o período aquisitivo com observância de todos os requisitos legais, seu direito encontra-se constituído, ou seja, a sentença judicial somente declarará a propriedade e não a constituirá (Opitz; Opitz, 2013, p. 108). Isso conforme o art. 1.241 do CC.

Portanto, após o prazo de aquisição, se o proprietário interpelar o usu-capiente, esse poderá, como meio de defesa, utilizar o Poder Judiciário para reconhecer em sentença seu direito sobre o bem; declaração essa que é meio hábil para o registro de sua propriedade.

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Referido registro poderá ser feito de forma gratuita, caso o possuidor seja hipossuficiente e tenha se valido durante o processo judicial da assistência judi-ciária gratuita; isso de acordo com o art. 6º da Lei nº 6.969/1981.

Entretanto, caso se prove que o possuidor tinha condições financeiras, o registro somente poderá se dar após o pagamento das custas judiciais. É o que estabelece o parágrafo único do mesmo artigo.

Embora tangentes ao propósito final deste texto, as conjecturas aqui fei-tas dão subsídio ao leitor para que explore a íntima relação do instituto com o Direito Agrário.

aS DIverSaS FOrMaS De Se USUcaPIr e O DIreITO aGrÁrIO

Pereira (2013, p.123-134) para classificar as usucapiões em quatro gran-des grupos, a saber: usucapião extraordinária, usucapião ordinária, usucapião especial (que o autor subdivide em rural e urbana) e especialíssima.

A essa classificação, pode-se incluir a usucapião indígena (Gonçalves, 2010, p. 273).

Destas formas, pode-se dizer que, para o Direito Agrário, somente não são de relevância direta a usucapião especial urbana e usucapião especialíssi-ma, pois somente aplicáveis a imóveis urbanos.

Por outro lado, deve-se ainda acrescentar à supracitada classificação as usucapiões de coisas móveis descritas nos arts. 1.260 a 1.262 do CC.

Para fins didáticos, como analogia às espécies de usucapião de imóveis e seguindo a nomenclatura de Diniz (2010, p. 177), pode-se dizer que há dois tipos de usucapião de coisas móveis: uma ordinária e uma extraordinária.

No que se refere à usucapião extraordinária, à usucapião ordinária, à usucapião de coisa móvel extraordinária e à usucapião de coisa móvel ordiná-ria, suas utilizações serão sempre possíveis no âmbito do Direito Agrário, entre-tanto, tratam-se de institutos verdadeiramente civilistas que se aplicam à coisa agrária por conveniência, em um claro diálogo entre os ramos do direito. Diz-se isso pois os institutos podem ser aplicados tanto para bens urbanos como rurais.

Já no que se refere à usucapião especial rural, o instituto, muito embo-ra codificado no diploma civilista, tem íntima relação com o ramo do Direito Agrário, uma vez que se aplica exclusivamente a imóveis rurais e tem claro cunho social próprio da reforma agrária. Motivo esse pelo qual dispensar-se-á análise mais detalhada do mesmo.

Finalmente a usucapião indígena, muito embora sempre ocorra em imó-veis rurais, está muito mais afeto aos ramos do Direito Ambiental e de defesa de minorias do que com o Direito Agrário.

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aS PrINcIPaIS FOrMaS De Se USUcaPIr NO DIreITO aGrÁrIO

A primeira forma de se usucapir utilizando-se do Direito Agrário é a usu-capião ordinária.

Apesar de topologicamente no CC e na maioria da doutrina pátria esse tipo de usucapião ser tratada após a usucapião extraordinária, escolhe-se aqui sua abordagem antecipada, para melhor clareza e entendimento.

O instituto apresenta todos os elementos anteriormente apresentados no que se refere à posse, acrescendo mais dois requisitos: o justo título e a boa-fé.

No que se refere ao justo título, Diniz (2010, p. 164) descreve ser aquele formalizado, registrado e, a princípio, capaz de ensejar a transmissão do imó-vel, tal como uma escritura ou um formal de partilha, muito embora ele possa ser viciado. Sendo certo que tal falha será apagada pelo decurso temporal que evidencia a convalidação tácita do usucapido.

Com relação ao tempo, o decurso aquisitivo se dará, a princípio, em dez anos.

Entretanto, o CC estabelece que o prazo será reduzido para cinco anos “se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro cons-tante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possui-dores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico” (Brasil, 2002).

Assim, tem-se como condições sine qua non: [1] a aquisição onerosa e, cumulativamente, [2] o registro em cartório competente cancelado a posterior.

No que se refere ao registro em cartorário, deve-se atentar que o mesmo deve se dar no cartório onde se transmitiria ordinariamente, por compra ou he-rança, por exemplo, o imóvel. Sendo que, se o cancelamento tenha se dado por incompetência do cartório, não se estará diante de tal possibilidade de redução temporal. Isso certamente se dá por segurança jurídica e para que se evite frau-des e clandestinidades.

A essas situações devem necessariamente ser acrescidas pelo menos uma das seguintes situações alternativas, mas cumuláveis: [1] moradia e/ou [2] in-vestimentos de interesse social ou econômico.

A moradia poderá ser habitual ou não; não se podendo, entretanto, admi-tir como moradia o pernoite extremamente esporádico.

O legislador se decidiu por escolher expressão genérica ao usar a expres-são investimentos.

Trata-se de quaisquer melhorias que fomente a economia e os fins sociais (função social da propriedade), desde obras necessárias, passando pelas úteis,

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até ações não edilícias, tais como, por exemplo, plantações, principalmente as permanentes de colheitas regulares por se acrescerem ao imóvel e gerarem constantemente trabalho à comunidade.

Diniz (2010, p. 167) chama tal redução de usucapião ordinária abrevia-da, dando ares de subespécie do instituto usucapião ordinária. Segundo a reno-mada doutrinadora (2010, p. 167), sua justificativa é o princípio da socialidade, reconhecendo assim a chamada posse-trabalho; o que pode ser lido para fins agrários como um incentivo da execução da função social da propriedade.

Esse tipo de usucapião está codificada no art. 1.242 do CC.

A segunda forma de se usucapir utilizável do Direito Agrário é a usuca-pião extraordinária.

O legislador elencou basicamente dois requisitos para que se adquira, desse modo, a propriedade, são eles: a posse e o tempo. Elementos esses que traduzem, como já visto, o próprio cerne das usucapiões.

No que se refere ao fator temporal, foi estabelecido o prazo matriz de quinze anos, que se justifica por haver inexistência de comprovação de justo título.

Diniz (2010, p. 166) atenta que a presunção juris e de jure de justo título, pois se dispensa sua apresentação.

Quanto a isso, a autora (2010, p. 166) alerta que, apesar de haver diver-gência doutrinária, o CC proíbe que se demonstre a inexistência de tal título.

Muito embora difícil de consecução prática, a lei não proibiu o usu-capido de demonstrar a inexistência de justo título, mas sim barrou o juiz de apreciar essa inexistência.

Portanto, pode-se dizer que usucapido poderá apresentar tal situação em juízo, mas ela será em vão. Situação essa que gera procrastinação processual, na qual talvez a ilustre doutrinadora (2010, p. 166) tenha se baseado para tão veemente afirmação.

Também no mesmo diapasão está a questão de boa-fé.

A usucapião extraordinária, por expressa disposição legal, dispensa a comprovação de boa-fé.

Surge então a discrição análoga ao justo título anteriormente demonstra-da, sendo que faz-se aqui as mesmas ponderações anteriores, inclusive no que toca à presunção juris e de jure feita por Diniz (2010, p. 166).

Retomando-se a questão temporal, o diploma civilista impõe situação no qual o prazo será reduzido para dez anos.

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Isso ocorre quando “possuidor houver estabelecido no imóvel a sua mo-radia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo” (Brasil, 2002, art. 1.238, parágrafo único).

Há de se entender o que é moradia habitual.

Em contraponto à moradia habitual, tem-se a moradia eventual, ou seja, aquela que serve como auxiliar.

Assim, moradia habitual será aquela que o indivíduo usa como principal, e, por que não dizer, mantém um vínculo subjetivo mais extremo, sendo ela seu lar.

A outra situação é a execução de obras de caráter produtivo.

De grande relevância é tal possibilidade, uma vez que o Direito Agrário está sempre atento à produtividade da terra, que deve gerar o bem-estar da coletividade.

Assim, a implementação de tais obras contribui para que seja dado um fim socialmente correto ao imóvel, reestabelecendo ou, pelo menos, fomentan-do uma função social perdida pelo abandono do proprietário cartorário. O que, especificadamente no âmbito rural, pode se dar, por exemplo, pela construção de um silo, um terreiro ou mesmo a construção de tanques para criação de pei-xes e currais para gado. Situações essas que ainda evidenciam o animus domini do proprietário.

Deve-se frisar que as situações descritas no parágrafo único são alterna-tivas, mas cumuláveis, ou seja, para fazer jus à redução, o usucapiente deve preencher pelo menos uma das duas, porém nada obsta que preencha ambas, sem que isso altere o prazo ou outro atributo.

No que se refere à posse, segundo Diniz (2010, p. 166), ela deve ser: pacífica, ininterrupta, exercida com animus domini.

Esses elementos foram codificados no art. 1.238 do CC.

Ainda na esteira das usucapiões de coisas imóveis que guardam uso no Direito Agrário, vale citar a previsão do art. 1.379 do CC, que estabelece a usu-capião de servidões.

De grande valia é tal artigo, pois, devido à grande extensão do território rural brasileiro e à distância que as propriedades podem ter de uma via pública, o uso do instituto da servidão é hodierno na vida do homem do campo.

O referido artigo remete às necessidades da usucapião ordinária, exigin-do, portanto, que haja justo título e boa-fé, mas ainda reforça a necessidade de que a servidão seja aparente, evitando-se mais uma vez a clandestinidade.

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No que se refere à usucapião ordinária, se limita ao objeto, sendo que o decurso temporal é idêntico, ou seja, dez anos.

Entretanto, o leitor deve se atentar para o que estabelece o parágrafo úni-co do referido artigo, pois o legislador cria um subtipo de usucapião.

Pode-se perceber que o parágrafo único somente altera: [1] o tempo, que passa a ser de vinte anos, e [2] dispensa o justo título.

Portanto, o parágrafo único não cria situação análoga à usucapião ex-traordinária, pois o agricultor que deseje usucapir desse modo ainda terá que provar a boa-fé; algo desnecessário na usucapião extraordinária.

Quanto a esse respeito, o STF sumulou entendimento que a execução de obras demonstra que a servidão é aparente (Súmula nº 415).

Ainda no mesmo assunto, a III Jornada de Direito Civil, em seu Enuncia-do nº 251, entendeu que o prazo deve ser de quinze anos, no caso do parágrafo único, pois o prazo de vinte anos discrepa do restante do código.

Inspira cautela tal afirmação, já que o prazo é claro e inequívoco, sendo que sua redução por presunção de harmonia pode se assemelhar às atitudes extremadas do ativismo judicial.

Não se deve esquecer que, no caso das servidões, principalmente as ru-rais, não se está diante de um abandono da área, mas sim em uma benesse concedida de um proprietário a outro.

Ao reduzir tal tempo, não se está corrigindo a falta de um fim social, como nas usucapiões extraordinária ou ordinária, mas somente reduzindo-se um direito de um proprietário que muito provavelmente cumpre sua função. Ou seja, não se corrige nada, mas tão somente reduz-se o direito.

Na seara das usucapiões de coisas móveis, que, embora não sejam pro-priamente de Direito Agrário, nele podem ser utilizadas, tem-se a usucapião indígena; isso segundo seu o art. 33.

Embora semelhante à usucapião especial rural, pois somente ocorre so-bre área rural, o instituto guarda algumas diferenças.

Primeiramente, apenas pode usucapir indígena, não importando ser ele integrado ou não.

Segundo, o prazo é mais longo; o que se justifica, pois não é necessária a moradia ou o cultivo.

Em terceiro lugar, poder-se-ia apontar a área, mas aqui o leitor deve to-mar cuidado, pois se na usucapião especial rural a área é de até cinquenta hec-

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tares, aqui ela deve ser menor que cinquenta hectares, ou seja, a área usucapida por usucapião especial rural pode ser maior que a indígena.

Em outra esteira, mas ainda como formas de se usucapir utilizáveis no Direito Agrário, mas não inerentes a ele, têm-se as usucapiões de coisas móveis.

O estudo do tema é restrito, assim como seu tratamento no CC, pois a principal diferença aqui encontrada não reside nos polos essenciais da usuca-pião, mas sim na coisa usucapida, que passa de imóvel para móvel.

Desse modo, o art. 1.260 do CC, que define a usucapião ordinária de coi-sa móvel, se limita a adaptar a matéria do art. 1.242 do CC, somente alterando o tempo para se usucapir, que passa para três anos.

Nessa esteira, o artigo exige justo título e boa-fé.

Já o art. 1.261 do CC, que define a usucapião extraordinária de coisa mó-vel, muito embora não se assemelhe textualmente do que é dito no art. 1.238 do mesmo CC, tem conteúdo similar, não exigindo boa-fé ou justo título e somente alterando o tempo para se usucapir, que passa para cinco anos.

Finalmente o art. 1.262 do CC solidifica essa dependência das usucapi-ões de coisas imóveis, ao dizer que “[a]plica-se à usucapião das coisas móveis o disposto nos arts. 1.243 e 1.244” (Brasil, 2002).

A utilidade desses meios de usucapião é a mesma dos ordinário e extra-ordinário de coisas móveis para o Direito Agrário, ou seja, muito embora não lhe sejam inerentes, sempre poderão ser utilizados.

USUcaPIÃO eSPecIaL rUraL

A usucapião especial rural pode ser chamada também de usucapião constitucional, usucapião constitucional rural e usucapião pro labore, entre-tanto, adota-se aqui a nomenclatura “especial rural”, pois, conforme salienta Barros (2013, p. 153), tal denominação serve para diferi-la dos meios civis ordi-nários e, ao mesmo tempo, separa-a do “especial urbano”.

Trata-se da única usucapião que verdadeiramente sempre se enquadra no objeto de estudo do Direito Agrário, pois somente aplicável em imóveis rurais e seus fins estão plenamente de acordo com os objetivos de tal ramo do Direito.

É justamente esse o primeiro ponto de estudo que deve ser analisado: o imóvel que pode ser usucapido.

O Direito Agrário tende a favorecer o entendimento de que um imóvel é rural se sua destinação assim o for, situação essa defendida, por exemplo, por Marques (2011, p. 100).

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Ocorre que aqui a lei civilista consagra outro entendimento, o de zonas urbanas e zonas rurais, próprio de outros ramos do direito, como, por exemplo, o Direito Ambiental.

Portanto, para fins de usucapião especial rural, deve-se entender como imóvel rural não aquele com destinação rural, mas o que esteja na zona rural do Município de sua situação.

Tal entendimento poderia gerar problemas, já que, por exemplo, uma venda em zona rural seria considerada imóvel rural, teoricamente suscetível ser, deste modo, usucapida. Entretanto, o leitor deve estar atento, pois a própria letra da lei corrige essa possibilidade quando dita que serão assim usucapidas as “áreas de terra em zona rural” (Brasil, 2002, art. 1.239).

Claramente o legislador pôs à mercê deste meio de usucapião uma sor-te muito menor de imóveis do que entende o Direito Ambiental ou o Direito Agrário, pois aqui somente fazendas, sítios e similares que concomitantemente estejam na zona rural poderão ser usucapidos.

Assim, pode-se dizer que seu objeto será o imóvel em zona rural que te-nha destinação rural; excluindo-se, assim, [1] qualquer imóvel em zona urbana (independentemente de sua destinação ser urbana ou rural) e os imóveis com destinação urbana (independentemente de estarem em zona rural ou em zona urbana).

Ainda nesse assunto, a lei limita a área.

Para que se responda tal indagação, urge enfrentar a seguinte questão: qual lei deve ser usada para o presente estudo?

Ocorre que o art. 1º da Lei nº 6.969/1981, que “dispõe sobre a aquisi-ção, por usucapião especial, de imóveis rurais” (Brasil, 1981), estabelece vinte e cinco hectares.

Essa redação não difere muito do que estabelece o Estatuto da Terra em seu art. 98.

Entretanto, o CC, no art. 1.239, fala em cinquenta hectares.

Percebe-se assim que há uma divergência entre os diplomas.

A discussão poderia se aprofundar no que diz respeito a quais das leis prevaleceria, pelos critérios de especificidade ou antiguidade, mas a questão se torna clara ao se recorrer à Constituição da República (CR/1988), que define cinquenta hectares em seu art. 191.

Encerra-se assim a discussão, pois tanto o art. 98 quanto o art. 1º da Lei nº 6.969/1981 não foram recepcionados pela CR/1988; valendo portanto a área

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ditada pelo próprio diploma constitucional e pelo CC, qual seja: igual ou infe-rior a cinquenta hectares.

Vale ainda dizer que não se trata aqui de impedir a usucapião de imóveis maiores que cinquenta hectares, os quais poderão ser adquiridos pelos meios ordinários supracitados, mas sim de privilégio legal ao possuidor de área nessas condições.

Ressalte-se que, uma vez que imóveis agrários são extensões contínuas caracterizadas mais pelo uso do que pela titulação, não é possível restringir a posse de fato de mais de cinquenta hectares pelo simples pedido em ação na qual se requeira a usucapião. Inclusive este sendo o entendimento da IV Jornada de Direito Civil, a saber:

313 – arts.1.239 e 1.240. Quando a posse ocorre sobre área superior aos limites legais, não é possível a aquisição pela via da usucapião especial, ainda que o pedido restrinja a dimensão do que se quer usucapir (2012).

Portanto, se a posse for maior que o limite constitucional, o possuidor terá obrigatoriamente que pedir pela usucapião ordinária ou extraordinária, conforme o caso; mas não poderá fazê-lo pelos meios aqui citados.

Registra-se, entretanto, posicionamento contrário, pois Opitz (2013, p. 106) defende ser possível o pedido de usucapião no limite de cinquenta hec-tares e, posteriormente, o pedido do restante das terras na forma do art. 1.238 do CC.

Percebe-se, entretanto, que a área mínima não foi ditada pelos referidos diplomas.

Quanto a isso, deve-se lembrar que, ressalvadas as condições legais ex-plícitas, as quais não se aplicam no presente caso, não se pode possuir no Brasil gleba menor que um módulo rural, pois entende-se que essa seja a menor par-cela utilizável para fins agrários.

Portanto, chega-se à conclusão que não se poderá usucapir área menor que um módulo rural por constituir minifúndio, figura combatida no sistema legal agrário pátrio.

Têm-se assim a área mínima de um módulo rural e a máxima de cinquen-ta hectares.

Ocorre que uma análise sistemática das normas envolvidas conduz a situação de exceção.

O módulo rural varia sensivelmente de região para região do País, po-dendo chegar a cento e vinte hectares (Barros, 2013, p. 155). Neste caso, estar--se-ia em aparente conflito, pois a propriedade constituída por usucapião es-

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pecial rural seria imediatamente um minifúndio, ou seja, estaria, teoricamente, impedida de existir.

Porém, como bem salienta o doutrinador (2013, p. 155), por clara impo-sição constitucional, fora instituída exceção, pela qual o minifúndio constituído será plenamente possível e legal.

Também encerrada está a discussão sobre o tempo necessário para se usucapir desse modo, que é de cinco anos. É relevante a esse respeito observar que o cômputo deste tempo se dará observando-se o dia do início da posse e perfazendo-se um ano no mesmo dia e mês do ano calendário seguinte. Repe-tindo-se tal operação por cinco anos seguidos.

Ao retornar à questão da posse, percebe-se que as tipificações legais atuais evidenciam a necessidade de boa-fé ou de justo título; restando assim a conclusão de que não são parte do instituto, assim como ocorre na usucapião extraordinária (Barros, 2013, p. 154-156). Posição essa corroborada por uma análise histórica feita na Lei nº 6.969/1981, que expressamente os dispensava.

Ainda no que se refere à posse, Barros (2013, p. 157) salienta que as de-mais características da posse, qual sejam pacificidade, ininterrupção, justiça e o animus domini, são plenamente aplicáveis ao presente instituto.

Ao voltar de forma tangencial à questão do imóvel, o possuidor deverá transformá-lo em área produtiva. Nesse ponto, encaminha-se o leitor aos índi-ces de produtividade contidos na Lei nº 8.629/1993, que estabelece os índices pelos quais se considera determinada propriedade produtiva ou não.

De fato, a necessidade de produtividade está em total consonância com os ditames jusagrários e, em especial, como demonstra Rodrigues (2010, p. 71), a função social da propriedade, visando ao bem-estar do cidadão; situações essas que também se veem na obrigação de que essa produtividade se dê por meio do trabalho pessoal ou de sua família, ou seja, o trabalho não pode se dar por meio de prepostos. Requisito esse comumente conhecido por pessoalidade (Marques, 2011, p. 99; Gonçalves, 2010, p. 262).

Essa exigência está contida nos textos civilista e constitucional e em muito se assemelha à propriedade familiar – inclusive, segundo Opitz e Opitz (2013, p. 101), tratando-se de um estímulo legal a tal forma de domínio – e às exigências de um assentamento de reforma agrária, denotando, mais uma vez, que, apesar da inclusão em texto civilista, o instituto é, em essência, pertencen-te ao Direito Agrário, pois carrega consigo seus princípios e exigências.

Vale ressaltar que tal trabalho, à semelhança do que estabelece o art. 4º, inciso II, do Estatuto da Terra, deverá absorver toda a força de trabalho do possuidor e de sua família (Opitz; Opitz, 2013, p. 107).

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Entretanto, como bem demonstra Barros (2013, p. 155), a norma não especifica em que momento o possuidor tornou-a produtiva, portanto, pouco importa se o fez desde o início da posse ou no decorrer dos anos.

Também não há necessidade de que esse trabalho seja ininterrupto. Fato esse também inerente à moradia; que é outro requisito inerente dessa usucapião e fortemente estimulado pelo Direito Agrário.

A moradia, obrigando a fixação do homem no campo e evitando-se o inchaço das cidades pelo êxodo rural; o que, segundo Diniz (2010, p. 174), denota o intuito social do instituto.

Aqui também a lei não estabeleceu quando a moradia deve se iniciar, podendo, portanto, haver longo período sem o estabelecimento na terra (Barros, 2013, p. 155).

Trata-se de instrumento que colabora com a reforma agrária, podendo-se inclusive apontá-lo como meio para sua execução, pois somente poderá assim usucapir a pessoa que não tiver qualquer outro imóvel, seja urbano ou rural, segundo Opitz (2013, p. 102).

Em que pese a estipulação, Diniz (2010, p. 174-175) apresenta divergên-cia doutrinária pela qual alguns autores defendem que, desde que o valor do outro bem seja ínfimo, não se estará diante de impedimento para esse modo de se usucapir.

Em polo oposto está o posicionamento de Barros (2013, p. 155) e Rodrigues (2010, p. 71) que são enfáticos ao frisar que o possuidor do imóvel usucapindo não pode ser proprietário de qualquer outro imóvel.

Corrobora com o entendimento dos doutrinadores supracitados o fato de que, caso tenha tal domínio, ainda sim poderá usucapir pelas formas ordinária ou extraordinária.

Porém, em uma posição mediana que melhor se amolda ao que a lei estabelece e ao que o Direito Agrário visa, não seria possível essa usucapião, caso o possuidor exerça domínio sobre outro imóvel, exceto se esse imóvel não fornecesse as condições mínimas de subsistência a ele e sua família.

Assim, não se vislumbraria o valor do imóvel (situação menos importante para o Direito Agrário), mas sim se verificaria a capacidade daquele imóvel de fornecer sustento ao possuidor e a sua família (situação que deveras se amolda aos objetivos jusagrários). É o caso de agricultor que possua minifúndio, por exemplo.

Outra implicação se refere à propriedade em nome de cônjuge.

Segundo Opitz e Opitz (2013, p. 102), citando Nader, a questão será resolvida conforme o regime de bens que o casal escolhera. Assim: [1] caso

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o regime seja de comunhão universal, estar-se-ia diante de impedimento; [2] caso o regime seja de comunhão parcial, estar-se-ia diante de impedimento somente caso o bem se comunicasse, ou seja, fosse adquirido posteriormente ao casamento; [3] caso o regime seja de separação, não se estaria diante de impedimento.

Ponto interessante é posto por Barros (2013, p. 155), que salienta o fato da lei ter dito “propriedade”, que, no caso de imóveis, se consubstancia pelo registro em cartório. Com isso em vista, o autor (2013, p. 155) defende ser pos-sível o possuidor usucapiente ter posse de outros imóveis, ou seja, não é obste para a lei múltiplas posses, mas tão somente a propriedade.

Ainda no que se refere ao possuidor, a lei, embora não diga expressa-mente, deixa claro, por meio das expressões aquele e sua família, que deve ser pessoa natural; posicionamento esse defendido por Gonçalves (2010, p. 262), Marques (2011, p. 99) e Opitz e Opitz (2013, p. 101).

Já Rodrigues (2010, p. 71) revela que não existem impedimentos para a aquisição da propriedade por meio deste instituto por estrangeiros, sendo que, entretanto, deve-se atentar para o que Opitz e Opitz (2013, p. 113) esclarecem.

Os doutrinadores (2013, p. 114) alertam que a aquisição por usucapião especial rural por estrangeiros sofre restrições, quais sejam, estar legalmente no País e não se enquadrar nas exclusões do art. 3º da Lei nº 6.969/1981.

É de se salientar que não há nada na lei que impeça a usucapião coleti-va, sendo possível tal via desde que todos os possuidores perfaçam os ditames legais e sua posse não ultrapasse o montante de cinquenta hectares, caso con-trário nenhum poderá usucapir (Opitz; Opitz, 2013, p. 110).

No campo das áreas impedidas de serem usucapidas, o principal obste encontra-se tipificado no parágrafo único do artigo constitucional e não deixa dúvidas de que os imóveis públicos não são passíveis de usucapião.

Nessa baia, Barros (2013, p. 156) assevera a não recepção do art. 2º da Lei nº 6.969/1981, que estipulava a (antiga) possibilidade de se usucapir terras devolutas, que são, por definição, públicas.

Desta disposição, também se abrange grande parte das áreas contidas no art. 3º da Lei nº 6.969/1981.

Tendo-se em vista que a maioria das terras contidas no supracitado arti-go já são públicas, e, portanto, insuscetíveis de serem usucapidas, poder-se-ia pensar que o artigo perdera a necessidade; entretanto, embora diminuída, ele ainda se faz necessário, pois os ocupantes dessas áreas ainda fazem jus ao as-sentamento privilegiado quando de novas declarações.

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cONSIDeraçõeS FINaISAssim, apesar de serem vários os modos de usucapião utilizáveis no cam-

po agrarista, a usucapião especial rural é a única que reúne todas as caracterís-ticas de um instituto propriamente desse ramo do Direito.

Como visto, muito embora sua existência não seja nova, ainda residem incertezas, principalmente no campo de sua aplicação, pela profusão de di-plomas sucessivos e, por vezes, lacunosos ou contraditórios, entre si e com o ordenamento agrário.

De modo geral, entretanto, se valendo de métodos hermenêuticos, pode--se lançar maior clareza sobre tais pontos.

Com isso, demonstrou-se que a usucapião em geral, e principalmente a especial rural, representa um importante meio de se fomentar a sustentabilidade no campo por meio de uma contínua valorização do trabalho na terra.

reFerÊNcIaSBARROS, Wellington Pacheco. Curso de direito agrário. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.

BRASIL. Lei nº 6.969, de 10 de dezembro de 1981. Dispõe sobre a aquisição, por usu-capião especial, de imóveis rurais, altera a redação do § 2º do art. 589 do Código Civil e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 11 de dezembro de 1981. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6969.htm>. Acesso em: 2 mar. 2015.

______. Lei nº 10.406, 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, 11 de janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 2 mar. 2015.

______. Jornadas de direito civil I, III, IV e V: enunciados aprovados. Coordenador científico Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior. Brasília: Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, 2012.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 31. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2014.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas. 5. ed. São Paulo: Saraiva, v. 5, 2010.

MARQUES, Benedito Ferreira. Direito agrário brasileiro. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

OPITZ, Silvia C. B.; OPITZ, Osvaldo. Curso completo de direito agrário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 2013.

RODRIGUES, Fabrício Gaspar. Direito agrário. Salvador: JusPodivm, 2010.

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Assunto Especial – Doutrina

Usucapião

A Usucapião de Bens Imóveis no Direito Brasileiro

KEnEDyS FERnAnDES DE SOUzAAdvogado em Ipatinga/MG.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Conceito e natureza jurídica de usucapião; 2 Breve histórico; 3 Da posse; 3.1 Breve histórico da posse; 3.2 Teorias da posse; 3.2.1 Teoria subjetiva (clássica) de Savigny; 3.2.2 Teoria objetiva de Ihering; 4 Noções gerais sobre propriedade; 4.1 Breve histórico; 4.2 Funda-mento jurídico do domínio; 5 Modalidades de usucapião de bens imóveis; 5.1 Da usucapião ordinária; 5.2 Da usucapião extraordinária; 5.3 Da usucapião constitucional ou especial de imóvel rural – pro labore; 5.4 Da usucapião constitucional ou especial urbana – pro misero; 5.5 Da usucapião especial urbana coletiva; 5.6 Da usucapião especial indígena – Estatuto do Índio; 5.7 Da usucapião sobre servidões; 5.8 Da usucapião familiar; 6 Efeitos da usucapião; Considerações finais; Referências.

INTrODUçÃO

Este trabalho consta do estudo do Instituto da Usucapião de Bens Imóveis no Direito Brasileiro por meio da apresentação de suas várias espécies, pontos de vista doutrinário, surgimento e inovações que adentraram a esfera do Direito Civil.

A usucapião é um instituto que integra a teoria geral do direito compre-endendo espécies próprias do direito privado, bem como outras específicas do direito público.

A usucapião, em síntese, pode ser considerada como a aquisição do do-mínio pelo decurso do tempo de posse, desde que respeitados os dispositivos legais, cujo objetivo é acabar com a incerteza da propriedade assegurando a paz social pelo reconhecimento da propriedade em relação àquela pessoa que, de longa data, é o seu possuidor.

O acervo bibliográfico concernente à usucapião de bem imóvel é muito amplo. A doutrina majoritária aduz que os dispositivos legais visam garantir o pleno ordenamento das funções sociais, além de garantir o bem-estar de seus habitantes e regular todas as espécies de usucapião, inclusive o constitu-cional.

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Neste trabalho, a metodologia utilizada é a revisão bibliográfica, em es-pecial a doutrinária, trazendo ao seu bojo os pontos de vista de diferentes ju-risconsultos.

1 cONceITO e NaTUreZa JUrÍDIca De USUcaPIÃO

O conceito de usucapião, segundo o Dicionário Aurélio Buarque de Holanda1, é o modo de adquirir propriedade móvel ou imóvel pela posse pací-fica e ininterrupta da coisa durante certo tempo. Convém destacar, a título de língua portuguesa, que o vocábulo é tratado no gênero feminino. O art. 1.238 do Código Civil enfatiza a usucapião como modo de aquisição da propriedade imobiliária preocupando-se com a exatidão terminológica ao inserir o vocábulo no feminino, apesar de a comunidade jurídica do nosso País tê-lo convenciona-do no masculino. Seja qual for o gênero adotado, o termo usucapião é oriundo do latim usu capio, ou seja, tomar a coisa pelo uso.

A doutrina conceitua usucapião como modo originário de aquisição de propriedade e de outros direitos reais, como a servidão e o usufruto, pela posse prolongada da coisa, acrescida de demais requisitos legais2.

A posse é o poder de fato sobre a coisa, ao passo que a propriedade é o poder de direito nela incidente. O fato objetivo da posse, unido ao tempo (fator capaz de transformar o fato em direito, bem com o cumprimento dos demais requisitos legais, conferem juridicidade a uma situação de fato, convertendo-a em propriedade). A usucapião é o elo entre a situação fática e o direito, como alternativa jurídica à solução de tensões derivadas do confronto entre posse e propriedade, provocando uma transformação objetiva na relação de ingerência entre o titular e o objeto.

A usucapião tem como fundamento a consolidação da propriedade. O proprietário desidioso, em falta de cuidado com seu próprio patrimônio, deve ser privado da coisa em favor daquele que, da união dos fatores posse e tempo, deseja consolidar e pacificar a sua situação perante o bem e a sociedade.

2 breve HISTÓrIcO

O instituto da Usucapião já era disciplinado pelo Direito romano como modo aquisitivo do domínio em que o tempo era elemento precípuo. A própria etimologia da palavra indica isso: capio significa “tomar” e usu quer dizer “pelo uso”. Entretanto, “tomar pelo uso” não era fato instantâneo; exigia, sempre, um

1 HOLANDA, Aurelio Buarque de. Novo dicionário da língua portuguesa, p. 434.2 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direitos reais. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

p. 258.

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complemento de cobertura sem o qual esse capio nenhum valor ou efeito teria. Esse complemento consistia no fator tempo.

A usucapião restou consagrada na Lei das Doze Tábuas, datada de 455 antes de Cristo, como forma de aquisição de coisas móveis e imóveis pela posse continuada por um ou dois anos. Só poderia ser utilizada pelo cidadão romano, eis que os estrangeiros não gozavam dos direitos preceituados no ius civile. Desta forma, os romanos mantinham os seus bens perante os peregrinos e po-diam reivindicá-los quando bem entendessem. Sendo a transmissão da proprie-dade romana cercada de diversas solenidades, no início, a ação de usucapião era utilizada para convalidar aquisições formalmente nulas ou aquelas inefica-zes por vício ou defeito de legitimação, quando presente a boa-fé do possuidor3.

Com o passar do tempo e com a expansão do império, concedeu-se ao possuidor peregrino que não tinha acesso à usucapião uma espécie de prescri-ção, como forma de exceção, fundada na posse por longo tempo da coisa, nos prazos de 10 e 20 anos, servindo de defesa contra ações reivindicatórias. O legítimo dono não mais teria acesso à posse se fosse negligente por longo prazo, mas a exceção de prescrição não implicava a perda de propriedade.

Em 528 d.C., Justiniano funde em um só instituto a usucapio e a praescriptio, pois já não mais subsistiam diferenças entre a propriedade civil e a pretoriana (dos peregrinos). Ambos os institutos se unificam na usucapião, concedendo-se ao possuidor longi temporis a ação reivindicatória para obter a propriedade e não uma mera exceção, que não era capaz de retirar o domínio do proprietário.

Assim, a usucapião se converteu, simultaneamente, em modo de perda e aquisição de propriedade, considerada como prescrição aquisitiva. Ainda em Roma, a prescrição passou a ser isolada como meio de extinção de ações. As-sim, sob o mesmo vocábulo, praescriptio surgem duas instituições jurídicas: a primeira de caráter geral destinada a extinguir todas as ações e a segunda, um modo de adquirir, representado pela antiga usucapião. Ambas as instituições partiam do mesmo elemento: a ação prolongada do tempo4.

No Brasil, o Direito pré-codificado, a prescrição longissimi temporis se consumava em 30 anos, fossem os bens móveis ou imóveis e, em 40 anos, tratando-se de bens públicos e coisas litigiosas, inclusive as furtadas.

Na França, o Código Civil adotou o critério monista da prescrição como modo comum de aquisição e perda de direitos acabando por identificar pres-

3 Serpa Lopes ensina que “em primeiro lugar, destinava-se a transformar em domínio a posse daquele que tinha a coisa in bonis, constituindo formidável mecanismo por força do qual o defeito de regularidade do título de propriedade era constantemente sanado, de modo que a propriedade e a posse, separados durante uma certa fase, se reuniam novamente” (cf. Tratado dos Registros Públicos, nº 607).

4 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, p. 142.

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crição e usucapião sob uma forma unitária, apenas com o cuidado de nomear a primeira como prescrição extintiva e a segunda como prescrição aquisitiva.

Clóvis Beviláqua, em sentido contrário, buscou a corrente dualista, di-ferenciando prescrição da usucapião. Em sede legislativa, tanto o Código Civil de 1916 como o Código Civil de 2002 seguiram orientação do Código Civil alemão e separaram a prescrição da usucapião, com a instalação da prescrição extintiva na parte geral e da usucapião no Livro do Direito das Coisas, como modo de aquisição da propriedade.

Hoje, é sabido que é impróprio conceituar a usucapião como prescrição aquisitiva.

3 Da POSSe

3.1 breve histórico dA posse

A posse é explicada historicamente por meio do poder físico sobre as coisas e na necessidade de o homem apropriar-se de bens. Inúmeras teorias procuram, então, justificar a necessidade de proteção à posse. Inobstante, a cultura jurídica da modernidade é profundamente influenciada pelas teorias de Savigny e Ihering, sendo que cada qual fornece elementos identificadores dos limites da tutela da posse individualizando a seu modo as figuras do possuidor e do detentor, procurando justificar a essência da proteção possessória.

Como enfatiza Menezes Cordeiro, a dicotomia Savigny/Ihering tem o sentido dos dilemas permanentes que, esgotando a realidade do espaço hu-mano, acabam sempre por surgir, como igualmente ocorre com as dicotomias coletivo/individual, exterior/interior, Platão/Aristóteles ou Hegel/Kant. “Por cer-to que os discursos concretos de Savigny e Ihering não podem, hoje, ser pura e simplesmente subscritos: nem um, nem outro. As realidades que eles traduzem são, porém, bem reais. Os estudiosos da posse têm o dever de as conhecer e o ônus de optar, em termos justificados.”5

3.2 teoriAs dA posse

3.2.1 Teoria subjetiva (clássica) de Savigny

Em 1803, aos 24 anos de idade, Friedrich Karl Von Savigny elaborou a sua monografia Recht dês Besitzes, o Tratado da Posse. Em sua concepção, a posse seria o poder que a pessoa tem de dispor materialmente de uma coisa, com intenção de tê-la para si e defendê-la contra a intervenção de outrem.

5 CORDEIRO, Antônio de Menezes. A posse: perspectivas dogmáticas atuais, p. 52.

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Para o mestre, a posse apresenta dois elementos constitutivos: a) Corpus: é o elemento que se traduz no controle material da pessoa sobre a coisa, po-dendo dela imediatamente se apoderar, servir e dispor, possibilitando ainda a imediata oposição do poder de exclusão em face de terceiros; b) Animus: é o elemento volitivo, que consiste na intenção do possuidor de exercer o direito como se proprietário fosse, de sentir-se o dono da coisa, mesmo não sendo. Não basta deter a coisa (corpus), mas haver uma vontade de ter a coisa para si. Só haverá posse, onde houver animus possidendi.

Para Savigny, os dois elementos agregam-se em singela fórmula matemá-tica: P = C + A. Excepcionalmente, nas situações em que alguém atue material-mente sobre a coisa sem o animus, cogitar-se-ia de mera detenção (locatário, comodatário, usufrutuário e outras pessoas que entraram na coisa em virtude de relação jurídica). Os detentores não fariam jus à tutela possessória, justamen-te pela carência do elemento volitivo. Por atribuir tamanha ênfase ao aspecto psicológico, anímico, a teoria de Savigny sobejou conhecida como subjetiva.

Critica-se na teoria subjetiva, a exacerbação do papel da autonomia da vontade pela incondicionada ligação da posse ao animus domini. Segundo Savigny, refletindo o ideário liberal e individualista vigente na época, a pessoa era o indivíduo abstrato que ocupava um dos polos da relação jurídica, possuin-do autodeterminação nas relações econômicas. Esta visão restrita e unitarista camufla o ser humano concreto, capaz de se manifestar em uma pluralidade de relações possessórias, nas quais não releva o exame do animus domini, mas sim a proteção à moradia, ao trabalho e a defesa incondicional dos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana.

Contudo, o grande mérito de Savigny foi o de projetar autonomia à posse, por explicar que o uso dos bens adquire relevância jurídica fora da estrutura da propriedade privada, e que a titularidade forma deste direito subjetivo não en-cerra todas as possibilidades de amparo jurídico. A posse passa a ser vislumbra-da como uma situação fática merecedora de tutela, que decorre da necessidade de proteção à pessoa, manutenção da paz social e estabilização das relações jurídicas.

A posse seria um fato na origem e um direito nas consequências, pois confere ao possuidor a faculdade de invocar os interditos possessórios quando o estado de fato for objeto de violação, sem que isto implique qualquer ligação com o direito de propriedade e a pretensão reivindicatória dela emanada.

3.2.2 Teoria objetiva de Ihering

Na linha de Savigny, Rudolf Von Ihering (1818-1892) encontra a base da controvérsia possessória no Direito romano. Porém, para Ihering, a posse é o mero exercício da propriedade.

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O célebre romanista admite a anterioridade histórica da posse em rela-ção à propriedade, para justificar a inferioridade daquela em relação a esta. Na prática, traz para o Direito o determinismo darwiniano que expressa a evolução biológica pela necessária precedência na natureza dos seres inferiores aos su-periores.

A posse seria o poder de fato e a propriedade, o poder de direito sobre a coisa: “O fato e o direito: tal é antítese a que se reduz a distinção entre a posse e a propriedade”6. A posse não é reconhecida como modelo jurídico autônomo, pois o possuidor seria aquele que concede destinação econômica à proprie-dade, isto é, visibilidade ao domínio. A posse é a porta que conduziria à pro-priedade, um meio que conduz a um fim. A propriedade sem a posse seria um tesouro sem a chave, uma árvore frutífera sem a escada que atingisse os frutos, pois a propriedade sem a posse restaria paralisada.

Em outras palavras, não é possível conceder espaço ilimitado à vontade do possuidor, pois a liberdade da pessoa encontra limites na norma. Portanto, a posse merece respeito na conformação encontrada pelo ordenamento jurídico, que considera a posse como exteriorização e complemento necessário à prote-ção da propriedade.

Em suma, para Ihering, a tutela da posse não decorre da necessidade de evitar a violência, mas tem como único fundamento a defesa imediata da pro-priedade. Os interditos possessórios nascem em razão da propriedade e não da posse em si mesma, pois a origem das referidas ações no Direito romano reside na proteção da propriedade, mesmo que em um primeiro momento culminem elas por socorrer a posse e, indesejavelmente, a figura do não proprietário7.

A teoria objetiva repele a conceituação da posse, que se baseia no ele-mento puramente subjetivo – animus –, pois ele está implícito no poder de fato exercido sobre a coisa. A posse é evidenciada pela existência exterior, sem qualquer necessidade de descermos a intrincada questão do plano íntimo da vontade individual de quem possui. Bem percebe Moreira Alves que o animus, para Ihering, é a “consciência e a vontade do corpus, razão por que se acham ambos indissoluvelmente ligados, estando este para aquele como a palavra para o pensamento”8.

A fórmula de Ihering – P = C – indica que a posse é reconhecível exter-namente por sua destinação econômica, independentemente de qualquer ma-nifestação volitiva do possuidor, sendo suficiente que ele proceda em relação à coisa como se comportaria o proprietário em relação ao que é seu. Não é o

6 IHERING, R. Von. Teoria simplificada da posse, p. 9.7 Idem, p. 13.8 MOREIRA ALVES, José Carlos. Posse – Estudo dogmático, p. 39.

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elemento psicológico que revela a posse, e sim a forma como o poder fático do agente sobre a coisa revela-se externamente.

Ademais, corpus para Ihering não estaria na dominação material ou na vigilância pessoal sobre a coisa. Com efeito, se na teoria objetiva, a posse não existe sem que exista a propriedade, a questão da dominação material sobre o bem se torna secundária, pois é sabido que a propriedade sobrevive sem o con-tato com a coisa. Substitui-se a noção do controle material pela ideia da posse como exercício da propriedade, pois só ela justifica a relação material entre a pessoa e a coisa, assim como a necessidade de sua tutela. Não mais importa a possibilidade de apreensão imediata da coisa, mas o fato do possuidor agir como agiria o proprietário, concedendo destinação econômica ao bem, fazen-do valer a finalidade para a qual é naturalmente vocacionada. O que vale é o uso econômico facilmente reconhecido por qualquer pessoa, tenha ou não o possuidor o animus domini9.

Assim, vem a ser a posse o exercício de um poder sobre a coisa corres-pondente ao direito de propriedade ou de outro direito real. Ao dispensar-se o elemento psicológico do animus, estende-se a condição de possuidores àqueles que seriam considerados meros detentores pela teoria clássica (locatários, ar-rendatários). Outrossim, por dispensar o aspecto subjetivo da intenção de dono, a doutrina objetiva consagra a admissibilidade da coexistência das posses direta e indireta.

Do ponto de vista econômico e prático, a teoria de Ihering é inegavel-mente um avanço em comparação com a de Savigny, eis que, ao abdicarmos da exigência do animus domini, ampliamos consideravelmente o rol dos possui-dores, deferindo àqueles antes considerados meros detentores pela teoria subje-tiva, proteção possessória direta e imediata, podendo agir por conta própria na tutela de sua situação jurídica.

Savigny e Ihering concebem suas teorias com base em um ponto de parti-da comum: a detenção. Todavia, visceral é compreender que a teoria de Ihering é tida por objetiva pelo fato de explicar que a distinção entre possuidores e de-tentores não é traduzida à luz do elemento anímico da vontade de possuir, e sim por uma prévia conformação do ordenamento objetivo, que cuidará de explici-tar as hipóteses em que certas pessoas não alcançarão a tutela possessória por expressa opção de política legislativa, em razão da forma pela qual ingressaram na coisa. De fato, Ihering vislumbrava na detenção uma posse desqualificada pelo sistema jurídico, por razões objetivas e de ordem prática.

Ihering considerava que o interesse jurídico movimenta a vontade. É o interesse da realização da destinação econômica da propriedade que justifica a

9 IHERING, R. Von. Op. cit., p. 44.

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proteção, pois, em si mesma, ela não teria qualquer valia. A posse se converte em direito, em homenagem ao direito superior de propriedade10.

A crítica veemente que se faz à concepção objetiva concerne ao fato de reduzir a posse a um direito ínfimo, como mera exteriorização do direito de propriedade, ou seja, um complemento indispensável à sua tutela. A proteção possessória seria uma sentinela avançada da propriedade, pois, por meio da posse, poderia o titular formal aliviar a defesa do seu direito subjetivo mediante a adoção de uma vida defensiva preliminar (interditos possessórios). Neste par-ticular, temos evidente retrocesso, comparando-se à teoria de Savigny, na qual há um prenúncio de tutela à função social da posse.

Ao conceituar a posse da mesma maneira que o seu antecessor, o Código Civil de 2002 filia-se à teoria objetiva, repetindo a nítida concessão à teoria subjetiva no tocante à usucapião como modo aquisitivo da propriedade que demanda o animus domini de Savigny. Com efeito, predomina na definição da posse a concepção de Ihering. A teor do art. 1.196, “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”. Assim, pela letra do legislador, o possuidor é quem, em seu próprio nome, exterioriza alguma das faculdades da propriedade, seja ele proprietário ou não.

O Código Civil de 2002 ratificou a via eleita pelo Código de 1916, pela inserção da posse no livro do direito das coisas. Seguidor das teses de Ihering, Clóvis Beviláqua entendeu que a posse é um caminho para a propriedade e deve ser inserida antes de seu estudo, como um ponto de transição momentâ-nea. Aliás, neste ponto contrariou o próprio mentor, que entendia ser essencial o estudo prévio da titularidade, para posteriormente se alcançar a posse.

Será possível observar adiante que, nos dias atuais, as teorias de Savigny e Ihering não são mais capazes de explicar o fenômeno possessório à luz de uma teoria material dos direitos fundamentais. Mostram-se envelhecidas e dis-sonantes da realidade social presente. Surgiram ambas em momento histórico, no qual o fundamental era a apropriação de bens sob a lógica do ter em de-trimento do ser. Ambas as teorias se conciliavam com a lógica do positivismo jurídico, na qual a posse se confina no direito privado como uma construção científica, exteriorizada em um conjunto de regras herméticas.

Todavia, todo o processo contemporâneo de interpretação do Direito Pri-vado inicia-se na investigação dos princípios que se colocam como substrato do Estado Democrático de Direito. Apesar de o Código Civil conceituar a posse de forma abstrata e unitária, com sujeição à propriedade, ameniza-se a concepção patrimonialista e utilitarista no restante do tratamento da matéria, conferindo à

10 Idem, p. 62.

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posse um tratamento sistemático aperfeiçoado em comparação ao Código de 1916, com relevantes manifestações de uma intenção de dotá-la de autonomia com relação ao direito de propriedade.

4 NOçõeS GeraIS SObre PrOPrIeDaDe

4.1 breve histórico

A raiz histórica da propriedade é encontrada no Direito romano.

Na era romana, preponderava um sentido individualista de propriedade, apesar de ter havido duas formas de propriedade coletiva: a da gens e a da fa-mília. Nos primórdios da cultura romana, a propriedade era da cidade ou gens, possuindo cada indivíduo uma restrita porção de terra (1/2 hectare), e só eram alienáveis os bens móveis. Com o desaparecimento dessa propriedade coletiva da cidade, sobreveio a da família, que, paulatinamente, foi sendo aniquilada ante o crescente fortalecimento da autoridade do pater famílias. A proprieda-de coletiva foi dando lugar à privada, passando pelas seguintes etapas, que Hahnemann Guimarães assim resume: 1º) propriedade individual sobre os ob-jetos necessários à existência de cada um; 2º) propriedade individual sobre os bens de uso particular, suscetíveis de ser trocados com outras pessoas; 3º) pro-priedade dos meios de trabalho e de produção; e 4º) propriedade individual nos moldes capitalistas, ou seja, seu dono pode explorá-la de modo absoluto11.

Na Idade Média, a propriedade sobre as terras teve papel preponderante, prevalecendo o brocardo nulle terre sans seigneur12. Inicialmente, os feudos fo-ram dados como usufruto condicional a certos beneficiários que se comprome-tiam a prestar serviços, inclusive, militares. Com o tempo, a propriedade sobre tais feudos passou a ser perpétua e transmissível apenas pela linha masculina. Havia distinção entre os fundos nobres e os do povo, que, por sua vez, deveria contribuir onerosamente em favor daqueles, sendo que os mais humildes eram despojados de suas terras13.

O feudalismo só desapareceu do cenário jurídico mundial com o adven-to da Revolução Francesa, em 1789.

11 Hahnemann Guimarães. A propriedade, Ver. De direito contemporâneo, 3:8-10, 1957; Serpa Lopes, Curso de direito civil. 2. ed. Freitas Bastos, p. 233-4; Pachioni, Corso di diritto romano, v. 2, p. 195; Eduard Cuq, Manual de droit romain, p. 245 e s.; Von Mayr, História del derecho romano, p. 175; Arangio Ruiz, Istituzioni di diritto romano, p. 180 e s.; Silvio Meira, Instituições de direito romano. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, n. 132 a 137.

12 BRUGI, Instituiciones de derecho civil, p. 177.13 DAIBERT, Op. cit., p. 147; MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. São Paulo: Saraiva,

v. 3, 1978. p. 86.

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4.2 fundAmento jurídico do domínio

A questão da legitimidade da propriedade é divergente entre os autores.

Alguns, como Grócio, pretendem encontrar o fundamento da proprieda-de na ocupação de bens ainda não apropriados por ninguém, e que alargaria o domínio do homem sobre a natureza, convertendo os objetos da natureza em valores econômicos ou culturais, enriquecendo o patrimônio da nação. Contudo, a ocupação não justifica o domínio, porque este só pode surgir ante uma lei que o organize e que inclua a ocupação entre os modos aquisitivos de propriedade. Além do mais, muitas das propriedades atuais são originárias da violência, quer na esfera interna quer na internacional, e não da ocupação14.

Outros lhe deram a lei por fundamento, como Montesquieu, Hobbes, Benjamin Constant, Mirabeau, Bentham. Entretanto, insuficiente é essa teoria, porque não se pode fundar a propriedade na vontade do legislador que a cria, pois a mesma poderia ser levada a suprimi-la15.

Para a teoria da especificação preconizada pelos economistas, Locke, Guyot, Mac Culloch, o trabalho seria o único criador de bens, consistindo no título legítimo da propriedade, que não seria uma mera apropriação do bem da natureza, mas a transformação desse objeto por meio da forma que o homem, com seu trabalho, daria à matéria bruta16.

Planiol17 critica essa concepção dizendo que o trabalho deve ser recom-pensado com o salário e não com o objeto por ele produzido. Há ainda, o inconveniente apresentado pela divisão do trabalho, pois o trabalho de várias pessoas concentrado na produção de uma coisa daria origem a múltiplas pro-priedades sobre o mesmo bem, acarretando dificuldades. Radbruch18 aponta o fato de que essa doutrina da propriedade coletiva dos trabalhadores leva à espoliação do proprietário dos meios de produção, de que não participou com seu trabalho.

Ante todas essas críticas, não hesitamos em afirmar que a corrente dou-trinária mais sólida a esse respeito é a teoria da natureza humana, segundo a qual a propriedade é inerente à natureza do homem, sendo condição de sua existência e pressuposto de sua liberdade. É o instinto da conservação que leva o homem a se apropriar de bens, seja para saciar sua fome, seja para satisfazer suas variadas necessidades de ordem física e moral. A natureza humana é de tal

14 Vide MONTEIRO, W. Barros. Op. cit., p. 82-3.15 Idem, p. 83.16 Idem, ibidem.17 PLANIOL, Traité élémentaire de droit civil, 12. ed. v. 1. p. 793. Apud MONTEIRO, W. Barros. Op. cit., p. 84.

Apud DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 26. ed. v. 4, p. 124.18 RADBRUCH, Filosofia do Direito, v. 2. p. 31. Apud MONTEIRO, W. Barros. Op. cit., p. 84. Apud DINIZ, Maria

Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 4, p. 125.

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ordem que ela chegará a obter, mediante o domínio privado, um melhor desen-volvimento de suas faculdades e de sua atividade. O homem, como ser racional e eminentemente social, transforma seus atos de apropriação em direitos que, como autênticos interesses, são assegurados pela sociedade, mediante normas jurídicas que garantem e promovem a defesa individual, pois é imprescritível que se defenda a propriedade individual para que a sociedade possa sobreviver. Sendo o homem elemento constitutivo da sociedade, a defesa de sua proprieda-de constitui defesa da própria sociedade19.

Assim, a propriedade foi concebida ao ser humano pela própria natureza para que possa atender às suas necessidades e às de sua família. Por todas essas razões, pela sua função social e pelo serviço que presta às sociedades civiliza-das, justifica-se, plenamente, a existência jurídica da propriedade20.

5 MODaLIDaDeS De USUcaPIÃO De beNS IMÓveIS

5.1 dA usucApião ordináriA

O art. 1.242 do Código Civil expressa que:

Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestada-mente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos. Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório cancelado posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua mora-dia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.

Assim, usucapião ordinária é a que exige a posse contínua e incontes-tada, durante certo lapso de tempo, com justo título e boa-fé. Esses requisitos suplementares caracterizam-na porque, exigidos, o lapso de tempo é abreviado. A usucapião ordinária, por sua vez, recebeu alteração no diploma de 2002, visto que o prazo cogente reduziu-se para 10 anos quando o adquirente possuir justo título e boa-fé.

Para haver usucapião ordinária, é preciso, em primeiro lugar, que a posse seja fundada em justo título. A expressão é condenada, por ensejar confusão. O vocábulo justo título pode dar a impressão de que se trata de instrumento, isto é, de escrito. Mas não tem esse sentido. Título se emprega, no caso, como sinô-nimo de ato jurídico. Ainda assim, teria compreensão muito ampla, porque nem

19 DAIBERT, Op. cit., p. 157; Silvio Rodrigues, Op. cit., p. 99; Serpa Lopes, Op. cit., p. 252; GONNARD, René. La propriété dans la doctrine et dans I’histoire. Paris, 1943. p. 56; MONTEIRO, W. Barros. Op. cit., p. 84; LAURENT, Principes de droit civil, p. 9-107; Cunha Gonçalves, Tratado de direito civil, v. 11. p. 170; DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 4, p. 125.

20 Planiol e Ripert, Traité pratique de droit civil français, Paris, v. 3, 1926; TEPEDINO, Gustavo. Contorni della proprietà nella Costituizione brasiliana del 1988, Rassegna di Diritto Civile, 1: 96-119, 1991.

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todo ato jurídico serve de causa à posse. O título, a que se referem os Códigos, corresponde aos atos jurídicos cuja função econômica consiste em justificar a transferência de domínio. Em uma palavra, os atos translativos. Por outro lado, a qualificação do título é imprópria. O título deve ser justo no sentido de ido-neidade para transferir. Melhor, assim, dizer-se título hábil, para significar o ne-gócio jurídico que habilita qualquer pessoa a tornar-se proprietária de um bem.

Com a locução justo título, o que se designa, por conseguinte, é o ato jurídico cujo fim, abstratamente considerado, é habilitar alguém a adquirir a propriedade de uma coisa. Todo negócio jurídico apto a transferir o domínio considera-se justo título.

Mas, se a despeito de sua existência, a propriedade não se transfere, é preciso, para que a transferência se consuma e que o adquirente possua o bem pelo tempo necessário, para usucapi-lo. Desse modo, justo título vem a ser o ato translativo que não produziu efeito; o título de aquisição ineficaz.

Necessário investigar a causa da ineficácia, isto é, a razão por que um ato jurídico destinado a habilitar uma das partes a adquirir o domínio de uma coisa não produz seu efeito. Três são as causas que impedem a sua eficácia:

1. A aquisição a non domino, isto é, o fato de não ser o transmitente dono da coisa;

2. A aquisição a domino, na qual o transmitente não goza do direito de dispor, ou transfere por ato nulo de pleno direito;

3. O erro no modo de aquisição.

Quem adquire um bem de quem não é seu proprietário realiza negócio eficaz. Ninguém pode transferir mais direito do que tem. Consequentemente, quem não é proprietário não pode transmitir propriedade. Mas, se o adquirente está na convicção de que trata com o dono da coisa, o título que serve de causa à aquisição serve como elemento para que realmente adquira o bem mediante usucapião ordinária. Exige a lei, apenas, que esse título seja adequado à transfe-rência; justo é que tenha a virtude de justificá-la, enfim, que a possibilitasse, se emanado do proprietário genuíno. Mas, para que sirva a esse fim, o defeito há de consistir unicamente na falta de qualidade do transmitente. Se a ineficácia resulta de outra causa de nulidade, não pode haver usucapião ordinária.

O título pode provir do verdadeiro proprietário e, ainda assim, o ad-quirente não se tornar dono da coisa. A hipótese ocorre quando o ato jurídico translativo é contaminado de nulidade. Distingue-se, no entanto, a nulidade absoluta da nulidade relativa ou anulação. Se o ato é nulo de pleno direito, a aquisição só se verifica, em princípio, mediante usucapião extraordinária, porque o fim da usucapião ordinária é sanar o defeito que resulta da falta de qualidade do transmitente e não todos os que tornam ineficaz a alienação. Mas,

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se o ato é simplesmente anulável, a aquisição se opera mediante usucapião or-dinária, até porque é mais curto o prazo de prescrição dentro do qual deve ser proposta a ação de rescisão.

Finalmente, pode haver erro no modo de aquisição, como na hipótese de quem adquire por instrumento particular bem cuja transmissão requer escritura pública. Embora o ato seja nulo, por defeito de forma, é de se admitir a possibili-dade de ser sanado o defeito com a usucapião ordinária. Certo que a ninguém é lícito ignorar a lei, mas o erro de direito, como o erro de fato, deve ser conside-rado em pé de igualdade, porque, afinal, se converte em uma questão de boa-fé.

Contudo, não se deve confundir justo título com boa-fé. A ideia de que se requer justo título porque se exige a boa-fé o eliminaria como um dos requisitos da usucapião ordinária. A boa-fé, como elemento que integra o fato jurídico da usucapião, é tomada em seu sentido subjetivo. Entretanto, proclama a maioria dos escritores que o título deve ser certo e real. Se há boa-fé sem justo título, a usucapião ordinária não pode ser invocada. Nestas condições, o chamado título putativo não a justifica. Não basta, pois, que o adquirente tenha a convicção de que adquiriu mediante justo título. É preciso que o título tenha existência real. Do contrário, esse elemento seria absorvido pelo de boa-fé. É por essa razão, além da assinalada, que um justo título de pleno direito não pode ser conside-rado justo título, salvo quando, pelo jogo de outros princípios, é aconselhável aceitá-lo como elemento constitutivo da usucapião ordinária. Além da usuca-pião, o Código Civil de 2002, no art. 70, permite o aproveitamento do ato nulo mediante conversão, substancial ou formal.

Em resumo: todo fato jurídico apto a transferir o domínio pode servir para sua aquisição mediante usucapião ordinária, se o seu efeito específico não se produziu em virtude de um dos obstáculos apontados.

Os atos translativos mais comuns, que podem ser considerados justo tí-tulo, são: a) A compra e venda; b) A troca; c) A dação em pagamento; d) A doação; e) O dote; f) O legado; g) A arrematação; h) A adjudicação; i) O com-promisso de compra e venda.

Além do justo título, requer-se a boa-fé. Poderia parecer, à primeira vista, que a existência do justo título implicaria boa-fé, o que dispensaria este requisi-to. Assim não é. Se a boa-fé se presume quando há justo título, pode este existir sem aquela, como quando o comprador soube que a coisa comprada não per-tencia ao vendedor. A boa-fé, realmente, é elemento autônomo na usucapião ordinária.

É possuidor de boa-fé quem ignora o vício ou o obstáculo, que lhe im-pede a aquisição da coisa. Dessa ignorância resulta a convicção de que possui legitimamente. A boa-fé procede, por conseguinte, de erro do possuidor, que, falsamente, supõe ser proprietário. Esse erro deve ser cometido ao adquirir a

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coisa. Não se limita, porém, à convicção falsa de a ter adquirido do verdadeiro proprietário. Também se configura quando ignora a existência de obstáculo im-peditivo da aquisição. O erro do possuidor pode ser de fato ou de direito. Um e outro devem ser levados em conta. Diz-se que o erro de direito não pode servir de fundamento à boa-fé, porque ninguém pode ignorar a lei: Nemo jus ignorare consetur. Mas não deve ser assim. O obstáculo pode provir de razões jurídicas ignoradas pelo possuidor. A ignorância, no particular, não deve afastar a boa-fé. Daí se admitir que um título anulável conduz à usucapião ordinária.

O momento em que a boa-fé deve ser apreciada é controvertido. No Di-reito romano, bastava que o possuidor estivesse de boa-fé no momento da aqui-sição. No Direito canônico, deveria perdurar mala fides superveniens nocet. Entre nós, prevalece a doutrina canônica21. Assim, a superveniência de má-fé prejudica, impedindo a consumação da usucapião ordinária.

5.2 dA usucApião extrAordináriA

Nos termos literais do caput do dispositivo, “aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire--lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis”. De acordo com seu parágrafo único, “o prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabe-lecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo”.

A usucapião extraordinária caracteriza-se pela maior duração da posse e por dispensar o justo título e a boa-fé. Basta que alguém possua, como seu, um bem, durante um certo lapso de tempo, para que lhe adquira a propriedade. Seus requisitos resumem-se à posse sem interrupção nem oposição, em certo prazo, desde que possuída a coisa com animus domini. Alguns códigos exigem, ainda, o requisito boa-fé. Assim era em nosso direito anterior. Outros, porém, o presumem, como o nosso.

O lapso de tempo, no caso de bens imóveis, é de 15 (quinze) anos.

Na usucapião extraordinária, a boa-fé e o justo título presumem-se. Aquele que, por quinze anos, se a coisa for imóvel, e por cinco, se móvel, possuí-la como sua, sem interrupção nem oposição, adquirir-lhe-á o domínio, independentemente de título ou boa-fé. Decorrido o prazo, pode requerer ao juiz que o declare proprietário da coisa. Em se tratando de imóveis, a sentença serve de título para a transcrição no competente registro. É, entretanto, mera-mente declaratória, sendo necessária, todavia, para certificar a existência do

21 Lafayette, Clóvis Beviláqua, Espínola, entre outros.

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direito do possuidor que se tornou proprietário. Mas a aquisição da propriedade não se verifica por meio da sua transcrição. Se assim fosse, a usucapião não seria modo de adquirir a propriedade. A aquisição se daria pela transcrição do título. Nesse caso, a usucapião seria meio de prova da propriedade, quando, em verdade, é modo de adquiri-la, ainda quando o prescribente vise apenas a sanar o título de aquisição do domínio.

Em outras palavras, pode-se assim dizer que, para a usucapião extraor-dinária, necessita-se da existência de posse mansa e pacífica, ininterrupta, com animus domini e sem oposição por 15 (quinze) anos, sendo que o prazo pode cair para 10 (dez) anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel sua mora-dia habitual, se a função social da posse estiver sendo cumprida pela presença da posse-trabalho.

5.3 dA usucApião constitucionAl ou especiAl de imóvel rurAl – pro lAbore

Dispõe o caput do art. 191 da CF/1988 que “aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos inin-terruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade”. A regra foi reproduzida, na lite-ralidade, pelo art. 1.239 do Código Civil/2002; estando o instituto da usuca-pião constitucional ou especial rural do mesmo modo regulamentado pela Lei nº 6.969/1981. Em relação aos seus requisitos, podem ser destacados os seguin-tes: a) a área não pode ser superior a 50 hectares, e deve estar localizada na zona rural; b) A posse deve ter cinco anos ininterruptos, sem oposição e com animus domini; c) O imóvel deve ser utilizado para subsistência ou trabalho (pro labore), podendo ser na agricultura, na pecuária, no extrativismo ou em atividade similar, sendo fundamental que a pessoa ou a família esteja tornando produtiva a terra por força de seu trabalho; d) Aquele que deseja adquirir por usucapião não pode ser proprietário de outro imóvel, seja ele rural ou urbano.

Aqui, neste caso, não há que se falar em justo título e boa-fé, pois tais elementos se presumem de forma absoluta (presunção iure et de iure) pela des-tinação que foi dada ao imóvel, atendendo à sua função social.

5.4 dA usucApião constitucionAl ou especiAl urbAnA – pro misero

A usucapião constitucional ou especial urbana (pro misero) está tratada no caput do art. 183 da CF/1988: “Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”. A

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norma está reproduzida no art. 1.240 do Código Civil e no caput do art. 9º da Lei nº 10.257/2001.

Nos termos do Estatuto da Cidade, o título de domínio será conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil (art. 9º, § 1º, da Lei nº 10.257/2001). Ademais, o direito à usucapião especial urbana não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez, o que confirma a ideia de que a aquisição da propriedade atende ao direito mínimo de mora-dia. Para os efeitos desta modalidade de usucapião, de acordo com o § 3º do art. 9º da Lei nº 10.257/2001, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito, a posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão. Eis aqui o tratamento específico da accessio possessionis para a usucapião especial urbana. Assim, pela literalidade da norma, que a soma das posses para a usucapião especial urbana somente pode ser mortis causa e não inter vivos, como é na regra geral.

5.5 dA usucApião especiAl urbAnA coletivA

É a redação do art. 10 do Estatuto da Cidade – Lei nº 10.257: “As áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamen-te e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural”. Consagra-se a usucapião especial urbana coletiva, ou, tão somente, usucapião coletiva, possível nos casos envolvendo imóveis localizados em zonas urbanas, desde que obedecidos os seguintes requisitos: a) Área urbana, havendo limita-ção mínima de 250 m2; b) Posse de cinco anos ininterruptos, sem oposição, com animus domini, não havendo exigência de que a posse seja de boa-fé; c) Existência no local de famílias de baixa renda, utilizando o imóvel para mora-dia, nos termos do art. 6º, caput, da CF/1988; d) Ausência de possibilidade de identificação da área de cada possuidor; e) Aquele que adquire não pode ser proprietário de outro imóvel – rural ou urbano22.

Vale ressaltar que os parágrafos do art. 10 do Estatuto da Cidade trazem importantes regras de cunho material e processual. De início, prevê que o pos-suidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar a sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas. Outra nor-ma especial está consagrada a possibilidade da accessio possessionis, ou seja, a possibilidade de o sucessor da posse somar, no aspecto temporal, a posse ante-rior para fins de usucapião coletiva. Quanto ao campo processual, a usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença,

22 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. Volume único. São Paulo: Método, 2011. p. 834-835.

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a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis, sendo que nesta sentença, o juiz atribuirá igual fração de terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas. A norma consagra o estabelecimento de um condomínio a favor dos usucapientes, o que deve constar da sentença declaratória da proprie-dade. Esse condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio. As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão tomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando tam-bém os demais, discordantes ou ausentes.

5.6 dA usucApião especiAl indígenA – estAtuto do índio

Além das formas de usucapião previstas no Código Civil de 2002, na Constituição Federal, na Lei Agrária e no Estatuto da Cidade, há, no nosso orde-namento jurídico, a Usucapião Especial Indígena, tratada pelo Estatuto do Índio, Lei nº 6.001/1973. Enuncia o art. 33 dessa Lei Especial que “o índio integrado ou não, que ocupe como próprio, por dez anos consecutivos, trechos de ter-ras inferior a cinquenta hectares, adquirir-lhe-á propriedade plena”. Em síntese, pelo que consta da norma, são requisitos da usucapião indígena: a) Área de, no máximo, 50 (cinquenta) hectares; b) Posse mansa e pacífica por dez anos, exercida por indígena.

5.7 dA usucApião sobre servidões

Art. 1.379: “O exercício incontestado e contínuo de uma servidão apa-rente, por dez anos, nos termos do artigo 1.242, autoriza o interessado a regis-trá-la em seu nome no Registro de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença que julgar consumado a usucapião”.

Parágrafo único: “Se o possuidor não tiver título, o prazo da usucapião será de vinte anos”.

5.8 dA usucApião fAmiliAr

O ordenamento jurídico brasileiro foi contemplado com mais uma mo-dalidade de usucapião, qual seja, a usucapião familiar. No dia 16 de junho de 2011, passou a vigorar a Lei nº 12.424, inserindo, no Código Civil, o art. 1.240-A e seu § 1º tratando desta modalidade.

O texto do art. 1.240-A aduz que:

Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, pos-se direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250 m² (duzentos e

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cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex--companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua fa-mília, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

Esta modalidade de usucapião foi orientada a partir da possibilidade de se permitir que um dos ex-cônjuges ou ex-companheiros oponha em face do outro a pretensão de usucapir a fração que lhe pertence. Assim, o ex-cônjuge ou ex-companheiro que prosseguiu habitando o imóvel afastado pelo outro con-sorte ou convivente titularizará a integralidade da propriedade.

Ressalta-se que o sentido desta nova modalidade de usucapião especial urbana – pro moradia – é uma derivação do disposto no art. 1.240 do Código Civil de 2002, que dá disciplina à citada usucapião especial, nos moldes pre-vistos na Constituição Federal em seu art. 183. Neste dispositivo, tem-se que “aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”.

Os pressupostos comuns a ambas as espécies – usucapião especial ur-bana e usucapião “familiar” – são clarividentes: necessita-se que o pretendente exerça posse mansa, pacífica e ininterrupta em imóvel urbano com até 250 m2

de área com finalidade de moradia própria ou de sua família, além de não poder ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Não podendo, ainda, que a medida seja concedida mais de uma vez em favor da mesma pessoa em ambas as hipóteses.

Entre as diferenças notáveis existentes entre as duas modalidades retro-citadas, enumeram-se: a) Na usucapião familiar, exige-se que o pretendente seja coproprietário do imóvel conjuntamente com seu ex-cônjuge ou ex-com-panheiro. O dispositivo permitirá a aquisição da parte ideal pertencente ao seu ex-cônjuge ou companheiro em razão de ter abandonado o lar permitindo ao interessado que tenha permanecido na posse do bem a possibilidade de ser seu proprietário exclusivo. b) Na usucapião familiar, ainda, o prazo (lapso tempo-ral), neste caso, é muito inferior às demais espécies de usucapião contempladas no Código Civil, pois o pretendente, exercendo uma posse por um período ininterrupto de 2 anos será suficiente para adquirir a parte de propriedade per-tencente ao seu ex-cônjuge ou ex-companheiro.

Embora o novo art. 1.240-A do Código Civil não o preveja expressamen-te, forçoso é entender que o ato de abandono que justifica a espécie de usuca-pião em apreço deve ser voluntário e injustificado.

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Sintetizando, temos no Direito brasileiro, com exceção da usucapião fa-miliar e indígena, as seguintes modalidades e requisitos de usucapião23.

ModalidadEs TEMpo Boa-fé JusTo TíTulo REsTRiçõEs

Usucapião extraordinária(art. 1.238 do CC)

15 anos, podendo chegar a 10 anos

NÃO EXIGE NÃO EXIGE SEM RESTRIÇÕES

Usucapião ordinária(art. 1.242 do CC)

10 anos, podendo chegar a 5 anos

EXIGE EXIGE SEM RESTRIÇÕES

Usucapião const. rural (arts. 191 da CR e 1.239 do CC)

5 anos NÃO EXIGE NÃO EXIGE

1. Área rural de até 50 ha;2. Não ter outro imóvel urbano ou rural;3. Utilizar como sua mo-radia e tirar dali o seu sus-tento.

Usucapião const. urbano (arts. 183 da CR, 1.240 do CC e 9º do EC.

5 anos NÃO EXIGE NÃO EXIGE

1. Área urbana de até 250 m2;2. Não ter outro imóvel urbano ou rural;3. Utilizar como sua mo-radia.

Usucapião coletiva urbana (art. 10 do EC)

5 anos NÃO EXIGE NÃO EXIGE

1. Área urbana superior a 250 m2;2. Ocupada por popula-ção de baixa renda;3. Utilizada como sua mo- radia;4. Impossibilidade de se identificar os terrenos ocu-pados por cada possuidor;5. Possuidores não serem donos de outro imóvel ur-bano ou rural.

6 eFeITOS Da USUcaPIÃO

O efeito fundamental da usucapião é transferir ao possuidor a proprie-dade da coisa. É certo que, não raro, o verdadeiro proprietário se socorre da usucapião para acabar qualquer incerteza de seu direito. Quando o proprietário se socorrer da usucapião para dirimir qualquer incerteza de seu direito, estará a ação disciplinada pelo parágrafo único do art. 1.242. Nesses casos, a usuca-pião limita-se a confirmar direito de propriedade preexistente, mas, ainda assim, deve ser tida como o modo pelo qual é adquirido, uma vez que esse direito não podia ser estabelecido24.

23 SOUZA, Adriano Stanley Rocha. Direito das coisas. Coleção Direito Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 97.

24 Mazeaud e Mazeaud, Ob. cit.

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A usucapião, em geral, aproveita ao possuidor, que não é proprietário.

Com a finalidade de proteger terceiros que, supondo o ser proprietário o possuidor, mantiveram relações jurídicas com base na aparência de proprie-dade, a aquisição da propriedade pela usucapião opera-se pelo efeito ex tunc, retroagindo ao momento em que se inicia a posse.

Salienta-se que esta retroatividade acarreta consequências, tais como: a) todos os atos praticados pelo possuído são válidos; b) mesmo que fosse pos-suidor de má-fé, não estará obrigado a restituir os frutos da coisa; c) os atos praticados pelo proprietário no decurso do prazo da usucapião decaem, se esta é consumada. Assim, se o possuidor constitui direitos reais sobre o bem, con-sideram-se válidos desde o momento da constituição, uma vez consumada a usucapião.

A ação de usucapião compete ao possuidor para que se lhe declare o do-mínio do imóvel25. Exige-se atualmente que a petição inicial seja instruída com a planta do imóvel. O procedimento é ordinário e a sentença deve ser transcrita no Registro de Imóveis.

cONSIDeraçõeS FINaIS

A posse prolongada de um bem pode conduzir à aquisição da proprieda-de, se preenchidos determinados requisitos estabelecidos em lei. Concretamen-te falando, usucapião é o modo de aquisição da propriedade mediante a posse suficientemente prolongada sob determinadas condições.

A possibilidade de a posse prolongada gerar a propriedade justifica-se pelo sentido social e axiológico das coisas. É uma premiação àquele que se utiliza utilmente do bem, em detrimento daquele que deixa escoar o tempo, sem dele utilizar-se ou não se insurgindo que outro o faça, como se fosse dono. Destarte, não haveria justiça em suprimir-se o uso e o gozo de imóvel de quem dele cuidou, produzir ou residiu por longo espaço de tempo, sem oposição.

Embora destinado a móveis e imóveis, é evidente a maior observância econômica e social dos imóveis. Tendo sob orientação esses princípios é que nossa legislação mais recente permite prazos menores do que os estabelecidos originalmente no Código Civil para certas modalidades conforme examinado. Assim, a usucapião tem o condão de transformar a situação do fato da posse, sempre suscetível a vicissitudes, em propriedade, situação jurídica definida. Nesse sentido, também se coloca a prescrição extintiva, que procura dar esta-bilidade à relação jurídica pendente. Desse modo, justifica-se a perda da coisa pelo proprietário em favor do possuidor.

25 Está regulada nos arts. 941 a 945 do Código de Processo Civil. O CPC trata a usucapião como procedimento especial quanto às “terras particulares”. Poderá ser ordinário ou sumário, conforme o valor.

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Assim, verifica-se que o Instituto da Usucapião, em suas diversas mo-dalidades, mostra-se clara e efetivamente um instrumento de regularização da questão fundiária, seja ela de natureza urbana, seja ela de natureza rural con-cretizando o princípio constitucional da função social da propriedade. Confere--se, assim, segurança da posse dada a todos aqueles que preencham os requi-sitos necessários para a caracterização do instituto por meio da titularidade da propriedade então conferida.

reFerÊNcIaSBRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 18. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2002.

______. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. 26. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2011.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direitos reais. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

GOMES, Orlando. Direitos reais. 20. ed. Atual. por Luiz Édson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

SOUZA, Adriano Stanley Rocha. Direito das coisas. Coleção Direito Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 11. ed. Coleção Direito Civil. São Paulo: Atlas, v. 5, 2011.

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Assunto Especial – Doutrina

Usucapião

Usucapião: Uma Visão Panorâmica

LEOmIR ALvES DA SILvAServidor do Tribunal de Justiça do Paraná, Graduado em Direito pela Fesp/PR, Pós-Graduando em Direito do Trabalho pela Fesp/PR, Pós-Graduando em Filosofia – UFPR.

LInDAURA A. DE mIRAnDAAcadêmica de Direito.

RESUMO: O artigo trata do instituto da usucapião, sua formação histórica, assim como a maneira como ele se apresenta na atual legislação e todos os seus requisitos estabelecidos pela lei, como meio de adquirir o domínio da coisa, pela sua posse continuada durante certo lapso de tempo e a exceção prevista quanto aos imóveis públicos que são excluídos desse conceito, ou seja, não podem ser usucapidos.

PALAVRAS-CHAVE: Usucapião; posse; domínio.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Breve histórico; 2 Conceito e natureza jurídica; 3 Legislação vigente; 4 Das regras comuns entre as espécies; 5 Requisitos da usucapião; 5.1 Requisitos pessoais; 5.2 Requisitos reais; 5.3 Requisitos formais; 6 Espécies e prazos; 6.1 Usucapião extraordinária; 6.2 Usucapião ordinária; 6.2.1 Justo título; 6.2.2 A boa-fé; 6.3 Usucapião especial; 6.3.1 Usucapião rural; 6.3.2 Usucapião urbana; 6.4 Usucapião coletiva; Conclusão; Referências.

INTrODUçÃO

O instituto objeto deste artigo provém do latim usu + capere, adquirir pelo uso, pela posse prolongada1. Como principal objetivo, veremos a usuca-pião em determinadas espécies, e, como não poderia deixar de ser, analisa-remos sua exceção, que exclui os imóveis públicos entre os aceitáveis para usucapir.

A palavra usucapião é usada tanto na forma masculina (o usucapião) como na forma feminina (a usucapião). Há sérias divergências entre os lexicó-grafos a respeito de a palavra ser do gênero masculino ou feminino, mas restou

1 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2009. p. 857.

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consagrado na atual legislação a forma feminina2. O Código Civil de 2002 an-dou da mesma forma.

Conforme será visto, em suma, se alguém que detém a posse sobre a coi-sa age e reage, como se dono fosse, e se assim age, certamente faz com que a propriedade cumpra sua função social; e passado determinado lapso de tempo, e se preencher os outros requisitos exigidos pela lei, terá direito de aquisição da propriedade, pela ação própria que é a ação de usucapião.

A usucapião deve ser deduzida em juízo, com as devidas provas exigi-das, que configuram título de propriedade a ser registrado no Registro de Imó-veis (art. 167, I, item 28, da Lei de Registros Públicos).

Inegável a utilidade da usucapião, pois contribui de modo eficaz para a consolidação da propriedade, sendo assim, vigoroso e poderoso instrumento para a paz social.

1 breve HISTÓrIcO

A usucapião aparece consagrada na Lei das Doze Tábuas, datada de 445 a.C., como forma de aquisição de coisas móveis e imóveis pela posse continua-da por um ou dois anos respectivamente, e só poderia ser utilizada pelo cidadão romano3.

Esta data foi elevada depois para dez anos entre presentes e vinte para ausentes4.

Com o tempo, as fronteiras do império expandiram-se, concedendo ao possuidor peregrino, que não tinha acesso à usucapião, uma espécie de pres-crição, fundada na posse por longo tempo da coisa, no prazo de 10 e 20 anos.

Em 528 d.C., Justiniano funde em um só instituto a usucapio e a praescriptio, pois já não mais subsistiam diferenças entre a propriedade civil e a pretoriana (dos peregrinos).

Assim, a usucapião se converteu, simultaneamente, em modo de perda e aquisição de propriedade, considerada como prescrição aquisitiva. Ainda em Roma, a prescrição passou a ser isolada como meio extintivo de ações. Assim, sob o mesmo vocábulo, praescriptio, surgem duas instituições jurídicas: a pri-meira, de caráter geral, destinada a extinguir todas as ações, e a segunda, um modo de adquirir, representado pela antiga usucapião. Ambas as instituições

2 FARIAS, Cristiano Chaves de. Direitos reais. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 273.3 Idem, ibidem.4 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das coisas. 37. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3,

2003. p. 120.

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partiam do mesmo elemento: a ação prolongada do tempo5. No Direito brasilei-ro pré-codificado, a prescrição longissimi temporis se consumava em 30 anos, fossem os bens moveis ou imóveis, e, de 40 anos, tratando-se de bens públicos e coisas litigiosas, inclusive às furtadas.

O Código Civil francês adotou o critério monista da prescrição como modo comum de aquisição e perda de direitos e acabou por identificar pres-crição e usucapião sob uma forma unitária, apenas com o cuidado de nomear a primeira como prescrição extintiva e a segunda como prescrição aquisitiva.

Afirmam, ainda, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:

Clóvis Bevilácqua, em sentido contrário, buscou a corrente dualista, diferencian-do prescrição da usucapião. Em sede legislativa tanto o Código Civil de 1916 como o Código Civil de 2002, seguiram a orientação do Código Civil alemão e separou a prescrição da usucapião, com a instalação da prescrição extintiva na parte geral e da usucapião no Livro do Direito das Coisas, como modo de aquisi-ção da propriedade. Com efeito, veremos a seguir que é impróprio conceituar a usucapião como prescrição aquisitiva.6

2 cONceITO e NaTUreZa JUrÍDIca

A usucapião é também chamada de prescrição aquisitiva, em confronto ou comparação com a prescrição extintiva, que resta disciplinada nos arts. 205 e 206 do Código Civil7. No presente artigo, abordaremos apenas a usucapião como modo de aquisição da propriedade de bens imóveis. Todavia, pelo con-ceito que formulamos, é clara a possibilidade da aquisição da propriedade al-cançar bens móveis (art. 1.260 do CC) e outros direitos reais, como a servidão (art. 1.379 do CC) e o usufruto (art. 1.391 do CC).

Sendo assim, sobre a situação da usucapião e seus elementos constituti-vos, em sua obra Direitos reais, afirmam:

Posse é o poder de fato sobre a coisa; já a propriedade é o poder de direito nela incidente. O fato objetivo da posse, unido ao tempo – como força que opera a transformação do fato em direito – e a constatação dos demais requisitos legais, confere juridicidade a uma situação de fato, convertendo-a em propriedade. A usucapião é a ponte que realiza essa travessia, como uma forma jurídica de solu-ção de tensões derivadas do confronto entre a posse e a propriedade, provocando uma mutação objetiva na relação de ingerência entre o titular e o objeto.8

5 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito das coisas. 17. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2002. p. 142.

6 FARIAS, Cristiano Chaves de. Op. cit., p. 273.7 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 118.8 FARIAS, Cristiano Chaves de. Op. cit.

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O fundamento da usucapião é a consolidação da propriedade. O pro-prietário desidioso, que não cuida de seu patrimônio, deve ser privado da coisa, em favor daquele que, unindo posse e tempo, deseja consolidar e pacificar a sua situação perante o bem e a sociedade9.

Por isso, a sentença de usucapião implicará o cancelamento de qualquer registro que se relacione com garantias primitivamente relacionadas a débitos contraídos pelo antigo proprietário. Contudo, deverá o usucapiente arcar com os custos relacionados aos impostos de propriedade urbana ou rural. Trata-se da obrigação propter rem, que incide sobre o bem, independentemente da qua-lidade do proprietário.

Esta é a razão pela qual o art. 945 do Código de Processo Civil condicio-na o registro da sentença de usucapião ao cumprimento de obrigações fiscais. Certamente, a prescrição do crédito tributário reduzirá a abrangência do débito naqueles casos de longo inadimplemento dos débitos tributários. Excepcional-mente, para fins de usucapião especial rural, ao art. 8º da Lei nº 6.969/1981, expressamente prevê a imunidade tributária10.

Washington de Barros Monteiro afirma em sua obra que há uma discus-são se a usucapião – que ele usa no masculino – é modo de aquisição originário ou derivado de adquirir a propriedade, mas parece que tal questão está conso-lidada no modo originário, porquanto, para o usucapiente, a relação jurídica de que é titular surge como direito novo, ou seja, torna-se proprietário não por alienação precedente, mas em virtude da posse exercida. Uma propriedade de-saparece e outra surge11.

3 LeGISLaçÃO vIGeNTe

Além do já citado Código Civil brasileiro de 2002, arts. 1.260 a 1.262, e a Constituição Federal de 1988, existe previsão também em outros ordenamen-tos, como Estatuto da Cidade, ou seja, a Lei nº 10.257/2001, que regulamentou os arts. 182 e 183 da Constituição Federal ao estabelecer diretrizes gerais da política urbana e outras providências12.

4 DaS reGraS cOMUNS eNTre aS eSPÉcIeS

O possuidor deve exercer sobre o objeto que pretende usucapir a pos-se, dando-se e fazendo-se entender como proprietário, ou seja, com animus domini; sem interrupção do prazo e sem oposição de terceiros; o possuidor uni-

9 DINIZ, Maria Helena. Op. cit.10 FARIAS, Cristiano Chaves de. Op. cit., p. 275.11 MONTEIRO, Washington de Barros. Op. cit., p. 121.12 Disponível em: <www.boletinjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=403>.

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versal ou singular pode somar a sua posse à de seu antecessor, como fim para contar o prazo exigido. Assim sendo, não pode ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural; o título de domínio e a concessão de uso serão conferidos tanto ao homem quanto à mulher, ou a ambos, independente do estado civil; somente será reconhecido esse direito ao mesmo possuidor uma única vez, ex-ceto para o imóvel adquirido onerosamente, a usucapião deve ser requerida por meio do devido processo judicial, mediante qual o juiz se manifesta por meio de sentença declaratória, a qual servirá de título para o registro no cartório de Registro de Imóveis13.

5 reQUISITOS Da USUcaPIÃO

5.1 requisitos pessoAis

Conforme art. 1.244 do Código Civil, se estende aos possuidores as causas impeditivas e suspensivas do curso da prescrição a que se referem os arts. 197 a 201 do mesmo código. Por isso, sempre se faz necessário rigoroso exame para averiguar se a usucapião está tramitando entre cônjuges, compa-nheiros, pais e filhos na constância do poder de família, ou contra os absoluta-mente incapazes a que se refere o art. 3º do Código Civil.

Apesar de qualquer pessoa ter capacidade para possuir, faltará legitima-ção, como a “aptidão para a prática de determinado ato, ou para o exercício de certo direito, resultante não da qualidade da pessoa, mas de sua posição jurídica em face de outras pessoas”14.

Daí não se cogitar a possibilidade de marido usucapir imóvel pertencente à esposa ou de pai usucapir imóvel do filho incapaz. Porem, após a dissolução da sociedade conjugal e o término do poder de família, inicia-se a contagem dos prazos.

Da mesma forma, ninguém poderá usucapir um bem de titularidade de menor de 16 anos de idade ou de pessoa sob regime de curatela. Portanto, cessada a incapacidade a que alude o art. 3º, do Código Civil, o prazo volta a fluir com o aproveitamento do período consolidado antes do advento da causa paralisante15.

5.2 requisitos reAis

Somente os direitos reais que recaiam em coisas usucapíveis poderão ser obtidos por este modo de aquisição originário (seja a título de propriedade, ser-

13 Disponível em: <http://forum.jus.uol.com.br/65703>.14 AMARAL, Francisco. Direito civil – Introdução. São Paulo: Saraiva. p. 230.15 MONTEIRO, Washington de Barros. Op. cit., p. 131.

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vidão, enfiteuse, usufruto, uso e habitação). Portanto, bens públicos de qualquer natureza são insuscetíveis de usucapião (Constituição Federal, art. 183, § 3º, e art. 191, parágrafo único).

Segundo a definição do art. 98 do Código Civil, os bens públicos são aqueles que pertencem às pessoas jurídicas de direito público interno. Portanto, são os do domínio nacional pertencentes à União, aos Estados, ao Distrito Fe-deral ou aos Municípios. Todos os demais são particulares, pertençam a quem pertencerem16.

Outros bens inusucapíveis são aqueles que estão fora do comércio, os insuscetíveis de apropriação e os legalmente inalienáveis.

5.3 requisitos formAis

Em nosso ordenamento jurídico, três são os requisitos essenciais a qual-quer modalidade de usucapião: o tempo, a posse mansa e pacifica e o animus domini; a respeito da posse mansa, entende-se que da posse violenta, traduzida na má-fé, não derivam direitos; esta ainda deve ser pública, porque deve ser manifestada à vista de todos; e ainda contínua, porque ininterrupta, sem oposi-ção ou contestação. Acrescenta-se a estes os requisitos suplementares do justo título e a boa-fé, tratando-se da usucapião ordinária; o requisito da moradia na usucapião urbana e, associado a esta, o requisito do trabalho na usucapião rural17.

6 eSPÉcIeS e PraZOS

6.1 usucApião extrAordináriA

O requisito formal com maior significância da usucapião extraordinária, assim como de qualquer outra modalidade, é o tempo.

A usucapião, nesta condição, não exige requisito específico, por requerer maior tempo de posse, dispensam-se outras exigências18.

A questão temporal é um problema de política legislativa. A duração irá variar para maior ou para menor, conforme a orientação preponderante ser no sentido da tutela da propriedade ou da posse. Tudo dependerá do enfoque sistêmico, no concerto entre a proteção da segurança jurídica ou da pacificação social.

16 RODRIGUES, Sílvio. Parte geral. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 1988. p. 149 – novo Código Civil de 2002, art. 98.

17 Disponível em: <http://www.diasgomes.com/artigos/artigo_jose_maria.doc>.18 TEPEDINO, Gustavo. Código civil interpretado conforme a constituição da República. Rio de Janeiro:

Renovar, 2011. p. 523.

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Pelo revogado art. 550 do Código Civil de 1916, a usucapião extraordi-nária era alcançada em trinta anos, prazo que foi reduzido para vinte anos, por força da Lei nº 2.437/1955, até a entrada em vigor do Código Civil de 2002.

O art. 1.238, do mesmo código, atento ao princípio da operabilidade, reduziu os prazos da usucapião extraordinária de vinte para quinze ou dez anos, conforme o tipo de posse praticada, ou seja, a posse simples e a posse qualificada.

A posse simples é aquela que se satisfaz com o exercício de fato pelo usu-capiente de algum dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.196 do Código Civil), conduzindo-se o possuidor como o faria o dono, ao exteriorizar o poder sobre o bem. Assim, mesmo que não habite o imóvel – deixado sob vigilância de um detentor –, alcançará a usucapião em quinze anos, caso satisfaça os outros requisitos. Mas, se, além de demonstrada a posse, qualificar-se a ocupa-ção do bem pela concessão de função social, por intermédio de efetiva moradia do possuidor ou realização de obras e serviços de caráter produtivo (art. 1.238 do CC), o usucapiente será agraciado pela redução do prazo para dez anos19.

O segundo requisito formal da usucapião é a posse. A posse necessaria-mente será acompanhada do animus domini. Consiste no propósito de o usuca-piente possuir a coisa como se esta lhe pertencesse. Este sabe que a coisa não lhe pertence, porém atua com o desejo de se converter em proprietário, pois quer excluir o antigo titular.

Mansidão pacificada e continuidade indicam o exercício ininterrupto e sem oposição da posse. Muitos, equivocadamente, tendem a acreditar que a posse pacífica é aquela exercida por quem cuida do terreno, cercando-o, plan-tando-o e mantendo relações amistosas com vizinhos; tais dados pesam apenas como indícios que confirmam o animus domini.

6.2 USUcaPIÃO OrDINÁrIa

Aqui, o legislador aplica o princípio da operabilidade, pois exige a posse contínua e incontestada durante o lapso de tempo variável entre cinco ou dez anos, somando-se o justo título e a boa-fé (art. 1.242 e parágrafo único do Có-digo Civil).

Fundamental à compreensão da modalidade ordinária da usucapião é a conjugação de seus dois elementos predominantes e peculiares.

Os pressupostos da usucapião ordinária são, pois, posse, decurso de dez ou cinco anos, justo título e boa-fé20.

19 FARIAS, Cristiano Chaves de. Op. cit., p. 286/287.20 MONTEIRO, Washington de Barros. Op. cit., p. 125.

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6.2.1 Justo título

É, pois, o fundamento do direito. Em tese, trata-se de um título que se apresenta como instrumento formalmente idôneo a transferir a propriedade. O justo título dispensa a formalidade do registro para fins de usucapião. Eis aqui uma diferença entre a usucapião extraordinária e a ordinária, pois naquela dis-pensa-se o justo título.

Assim, na preleção de Washington de Barros, o usucapiente, para invo-car a usucapião ordinária, deve ter título, mas título justo, hábil à aquisição do domínio, como uma escritura de compra e venda um formal de partilha, com aparência de legítimo e válido21. Ou seja, trata-se de título hábil a transferir a propriedade.

Conforme o Enunciado nº 303 do Conselho da Justiça Federal: “Conside-ra-se justo título para presunção relativa da boa-fé do possuidor o justo motivo que lhe autoriza a aquisição derivada da posse, esteja ou não materializado em instrumento público ou particular. Compreensão na perspectiva da função social da posse”22.

6.2.2 a boa-fé

A boa-fé é o estado subjetivo de ignorância do possuidor quanto ao ví-cio ou obstáculo que lhe impede a aquisição da coisa. Para fins de usucapião, resulta na convicção de que o bem possuído lhe pertence. Ao adquirir a coisa, falsamente supôs ser o proprietário. Neste caso, incide em estado de erro, uma vez que é gerado nele a falsa percepção de ser titular da propriedade23. Este requisito dignifica moralmente o usucapiente24.

6.3 usucApião especiAl

Esta modalidade de usucapião é gênero que comporta duas espécies, quais sejam: rural e urbano.

6.3.1 Usucapião rural

Contemplada na legislação pátria desde a Constituição de 1934, a partir daí sempre encontrou guarida nas demais leis posteriores25. Também chamada de pro labore, foi instituída originalmente em benefício daquele que ocupas-

21 Idem, p. 126.22 Disponível em: <www.conjur.com.br/enunciados>.23 FARIAS, Cristiano Chaves. Op. cit., p. 299.24 MONTEIRO, Washington de Barros. Op. cit., p. 127.25 FARIAS, Cristiano Chaves. Op. cit., p. 315.

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se por dez anos ininterruptos, sem oposição nem reconhecimento de domínio alheio26.

Permite a aquisição da propriedade de imóvel ocupado por cinco anos de área rural, de no máximo 50 hectares, sendo a área produtiva e utilizada para morada pelo possuidor, e desde que não seja possuidor de outro imóvel rural ou urbano, conforme o art. 191 da Constituição Federal27.

A função deste instituto está na ideia implícita de fixar o homem à terra, nela mantendo sua moradia e ali aplicando o seu trabalho.

6.3.2 Usucapião urbana

O art. 183 é inovação da Constituição de 1988. Ao tratar da política de desenvolvimento urbano, a constituição consignou que aquele que possuir como sua área de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para a sua moradia ou de sua família28, adquire, desta forma, o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Nesta forma de usucapião, e na forma anterior-mente trabalhada, há que se ter a pessoalidade, ninguém poderá adquirir a propriedade pela habitação no local por outra pessoa, desta forma, é conhecida como usucapião pro moradia ou pro habitatio e assim percebe-se a função co-limada deste instituto29.

Como se pode depreender da função pretendida, somente a pessoa física pode usucapir, a pessoa jurídica não pode valer-se desta modalidade.

A moradia insere-se entre os direitos sociais, e esta usucapião urbana é instrumento valioso para sua efetivação30.

6.4 usucApião coletivA

Prevista no art. 10 da Lei nº 10.257/2001, também conhecida como Esta-tuto da Cidade, de inegável alcance social, de áreas urbanas com mais de 250 metros quadrados, ocupados por população de baixa renda para sua moradia por cinco anos, onde não for possível identificar os terrenos ocupados indivi-dualmente31.

Antes do advento deste instituto, os possuidores de áreas inseridas em glebas não teriam êxito em demandas individuais, uma vez que era impossí-

26 MONTEIRO, Washington de Barros. Op. cit., p. 127.27 Constituição Federal de 1988, art. 191.28 Constituição Federal de 1988, art. 183.29 FARIAS, Cristiano Chaves. Op. cit., p. 303.30 TEPEDINO, Gustavo. Op. cit., p. 527.31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 128.

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vel demonstrar o tamanho do imóvel, ou porque ele estava em área irregular, ou ainda porque abaixo do módulo urbano mínimo. Desta forma, a sentença declaratória não formará, ou melhor, não dividirá as frações ideais e unidades autônomas, a propriedade será dada em favor da comunidade em caráter pro indiviso.

É a coletividade regularizando a ocupação, e logo se vê a função deste instituto que está em consonância com todo o ordenamento que afirma que a propriedade deve cumprir a sua função social.

cONcLUSÃO

O ordenamento jurídico deve ser um todo harmonioso, e desde cons-tituições anteriores, passando necessariamente pela atual, que foi rotulada de “Constituição Cidadã”, há a previsão legal da usucapião.

Como demonstrado, este instituto, que remonta a Lei das Doze Tábuas, é instrumento poderoso para a paz social.

Seus pressupostos, que são o tempo, a posse mansa e pacífica e o animus domini, têm como fim a obtenção da propriedade por aquele que, durante certo tempo, obteve a posse.

Sendo, então, considerada uma forma originária de aquisição da pro-priedade, somam-se a esse contexto vários outros direitos reais elencados no novo Código Civil de 2002, em seu art. 1.225, descritos como direitos reais suscetíveis, com possibilidade de apropriação; vale a pena enumerá-los: I – a propriedade; II – a superfície; III – as servidões; IV – o usufruto; V – o uso; VI – a habitação; VII – o direito do promitente comprador do imóvel; VIII – o penhor; IX – a hipoteca; X – a anticrese32.

A posse da coisa, obrigatoriamente, deve acontecer sem esbulho ou agressão, ou seja, de forma tranquila, mansa; necessariamente continuada, du-rante o lapso de tempo exigido pela lei, para que se possa configurar o direito de usucapião, sem que haja oposição de terceiros, e prove a necessidade para a moradia da família, ou para subsistência da mesma; a qual não deverá possuir outra propriedade, seja ela rural ou urbana.

A pessoalidade transparece nas modalidades de usucapião rural e urba-na, uma vez que ela contempla uma política de fixação do homem ao campo na primeira hipótese e da moradia, no caso urbano, e a moradia é um direito social, contemplados na Constituição Federal.

32 Novo Código Civil de 2002, art. 1.225.

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Vale lembrar que os imóveis públicos não serão adquiridos por meio da usucapião. Não havia esta previsão legal no ordenamento anterior, e somente agora o legislador atentou para tão importante artigo.

reFerÊNcIaSACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2009.

AMARAL, Francisco. Direito civil – Introdução. São Paulo: Saraiva.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2007.

DE PLÁCIDO E SILVA, Oscar Joseph. Vocabulário jurídico. São Paulo: Forense, 2005.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito das coisas. 17. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2002.

FARIAS, Cristiano Chaves de. Direitos reais. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

FUHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de direito civil. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

Lei nº 10.257/2001 – Estatuto da cidade.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das coisas. 37. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2003.

RODRIGUES, Sílvio. Parte geral. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 1988.

ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa-fé no código civil. São Paulo: Saraiva 2005.

TEPEDINO, Gustavo. Código civil interpretado conforme a Constituição da República. Rio de Janeiro: Renovar, 2011.

Vade Mecum Universitário RT. São Paulo: RT, 2009.

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Assunto Especial – Com a Palavra, o Procurador

Usucapião

Posse, Usucapião e Justo Título: Considerações à Luz do Novo Código Civil

ARmAnDO AnTOnIO LOTTIProcurador de Justiça/RS.

A posse sempre foi tema estimulante, supedâneo de vigorosos debates e de diversos enfoques, potencializados na medida em que os seus efeitos são objeto de exame. Aliás, é no usucapião, forma originária de aquisição do do-mínio, que se perfectibiliza pela satisfação de seus pressupostos, que a posse transcende a concepção de aparência da propriedade para modo de aquisição desta. É neste leito que passa a ter peculiar perfil. Pretendo, pois, no presente artigo, dissecar tal relação umbilical entre posse/usucapião, além de tecer al-gumas observações sobre justo título para fins de usucapião ordinário, em suas formas desdobradas pelo Código Civil de 2002, uma vez que obteve inaudita definição legal.

O novo Código Civil, no que se refere à teoria geral da posse, ampliou a posição preconizada por Ihering, a chamada corrente objetiva, em que o ele-mento anímico constitutivo do conceito de posse, o animus, é definido, apenas, como “vontade de proceder como habitualmente procede o proprietário”. Tal ampliação, aliás, faz-se sensível, v.g., nos decotes dos enunciados de aquisição e perda da posse, previstos nos incisos dos arts. 493 e 520 do Código Civil/1916, claro resquício da teoria subjetiva da posse em diploma legal objetivista. É co-mezinho, entretanto, que o animus domini, elemento subjetivo qualificado do conceito de posse da teoria de Savigny, foi incorporado ao suporte fático ne-cessário das diversas modalidades de prescrição aquisitiva. A lei, ao estabelecer que o usucapiente tenha a coisa “como se sua fosse”, exige, de forma clara, que ela a tenha, pois, cum animus domini. E já se disse, e é verdade, que este ele-mento anímico é “requisito substrativizado, subjetivamente colocado nos lindes dos limites do alcance intelectual do usucapiente, dividindo-se em atos e rea-ções subjetivo-objetivas, podendo colocar-se em seu contexto até a inexistência de reação por parte dos demais, para que o entenda como reconhecimento à sua intenção de dono” (Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Esta-do do Rio Grande do Sul, n. 97, p. 357). Vênia concessa, tenho que tal concei-

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to, pródigo em extensão, não possui contornos científicos. Como explicar, por este prisma, v.g., o elemento subjetivo em relação às pessoas jurídicas? Em re-alidade, constata-se a existência, ou ausência, do animus domini por exclusão, no momento da imissão da posse da res pelo prescribente. Explico. Haverá a exclusão do elemento subjetivo qualificado quando o possuidor for direto, nos termos do art. 1.197 do Código Civil de 2002, ou, obviamente, mero detentor, situações legais que afastam, à evidência, o requisito “ter a coisa como se sua fosse”. A lição do insigne e saudoso Mestre Orlando Gomes, registra-se, é neste sentido:

O animus domini precisa ser frisado para, de logo, afastar a possibilidade de usucapião dos fâmulos da posse. Em seguida, devem ser excluídos os que exercem temporariamente a posse direta, por força de obrigação ou direito, como, dentre outros, o usufrutuário, o credor pignoratício e o locatário. Ne-nhum deles pode adquirir, por usucapião, a propriedade da coisa que possui em razão do usufruto, penhor ou locação. É que, devido à causa da posse, impossível se torna possuírem como proprietários. Necessário, por conseguinte, que o possuidor exerça posse com animus domini. Se há obstáculo objetivo a que possua com esse animus, não pode adquirir a propriedade por usucapião. A existência de obstáculo subjetivo impede apenas a aquisição de requerer boa--fé. Por fim, é preciso que a intenção de possuir como dono exista desde o mo-mento em que o prescribente se apossa do bem. Inexistindo obstáculo objetivo, presume-se o animus domini.

A contemporânea jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, aliás, não destoa de tal posição, como ilustra, por exemplo, ementa de aresto da 17ª Câmara Cível, a saber:

Usucapião. Origem da posse. Prova.

1. Hipótese em que a causa possessionis da área usucapienda é verdadeiro óbice ao reconhecimento da prescrição aquisitiva perseguida, independente do prazo de ocupação do lote (CC, art. 550).

2. Prova que, em razão do parentesco colateral de segundo grau entre o compa-nheiro da usucapiente e o contestante, conforta a alegação de comodato verbal pactuado por estes e que, mormente chancelada pelo silêncio pontual da autora, encontra supedâneo na lógica do razoável.

3. A ninguém é dado, sponte sua, alterar a natureza de sua posse. (Apelação Cível nº 599.396.314, Rel. Des. Demétrio Xavier Lopes Neto, Julgada em 21.03.2000)

Verifica-se, dessa forma, que a definição do requisito posse qualificada perpassa pela causa possessionis descontaminada de obstáculos objetivos e não pelo exame da intenção do possuidor, de complexa aferição e tormentoso prog-nóstico. Não se trata de inaudita e imediata solução. Ao revés, conforme lembra

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Marcus Vinícios Rios Gonçalves, em sua aguda obra Dos vícios da posse, na caracterização da posse, à luz do Código Napoleão de 1804, que adotara a teo-ria subjetiva e reclamava, portanto, o elemento volitivo qualificado, a complexa questão do animus domini foi resolvida pelo referido diploma legal “por meio de uma presunção. No art. 2.230, lê-se, com efeito, que ‘admitir-se-á sempre que alguém possui para si, e a título de proprietário, se não ficar provado que começou a possuir por um outro’”.

Promessa de compra e venda

Tanto estabelecido, descortina-se, agora, outra questão que merece aten-ta reflexão, mormente porque, nos grampos dos autos, tem se vulgarizado, qual seja: a promessa de compra e venda na causa possessionis, ainda que ineficaz (na hipótese, por exemplo, de loteamento clandestino), contraindica, tal como preconiza segmento doutrinário tradicional, a pretensão prescricional aquisitiva por ausência de posse qualificada? Observa-se que Orlando Gomes, v.g., en-tendendo que “têm posse direta os titulares de direito real na coisa alheia ou de direito pessoal que importe uso ou gozo da coisa; é a pessoa subordinada”, ao exemplificar, catalogava, explicitamente, o promitente comprador como pos-suidor direto. Mas sustento que no contrato particular de promessa de compra e venda não há desdobramento da posse, e, portanto, afasta-se a configuração de obstáculo objetivo. Explico. “Quando, por força de obrigação ou direito, em casos como do usufrutuário, do credor pignoratício, do locatário, se exerce temporariamente a posse direta, não anula esta às pessoas, de quem eles a hou-veram, a posse indireta”.

Este era o teor do art. 486 do Código Civil de 1916. O novo Código Civil, em seu art. 1.197, ainda que alterando a redação, manteve íntegro o entendi-mento de que o desdobramento da posse funda-se em título jurídico, em que a posse direta tem, por natureza, duração limitada. Em outras palavras, havendo, de parte do possuidor pleno, demissão temporária da sua posse, há o desdo-bramento desta em direta (ou imediata) e indireta (ou mediata). Ocorre que, no contrato de promessa de compra e venda, o promitente vendedor, quando se demite da posse da res, não o faz de forma temporária. E isso porque, ao final da aludida avença, em regra, a posse da coisa não lhe é restituída e sim conso-lidada nas mãos do promitente comprador (com a outorga da escritura pública). Se a posse do promitente comprador é plena, tem este, por consectário, animus domini. Neste sentido, inclusive, ementa de acórdão da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, a saber:

Usucapião. Posse adquirida através da acessio possessionis a título singular. Compromisso de compra e venda. Inocorrência de desdobramento da posse di-reta e indireta. O promitente comprador que recebeu a posse por ocasião do negócio jurídico entabulado passa a exercê-la com animus domini, inocorrendo o desdobramento de posse direta e indireta pretendida pelos contestantes, her-

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deiros do promitente vendedor. Tendo a prova dos autos demonstrado a con-tinuidade, sem qualquer oposição, de forma mansa e pacífica, da posse entre os diversos e respectivos sucessores, pelo lapso temporal vintenário, em cuja cadeia se enquadra o promitente comprador de parte da área usucapiente, é de ser acolhida a pretensão de domínio, irrelevante eventual questão remanescente quanto ao pagamento do preço da área prometida vender. Apelação desprovida. (Apelação Cível nº 598.564.508, Relª Desª Elaine Harzheim Macedo, Julgada em 19 de outubro de 1999)

Se a promessa de compra e venda, como visto, não é, efetivamente, obs-táculo objetivo à configuração do animus domini, terá ela o contorno de justa causa usucapionis? De novo a resposta não é simples. A doutrina e, principal-mente, a jurisprudência controvergem sobre o conceito e a extensão do justo título para fins do usucapião ordinário. No Direito clássico, conforme anota Vandick Londres da Nóbrega, o usucapião

aplicava-se às coisas apropriadas que, não tendo sido expressamente renunciadas pelos respectivos proprietários, foram estas negligenciadas. Além disso, o usucapião também se aplicava quando alguém adquiria uma coisa por um meio irregular. A lei Plautia e as leis Iuliae proibiram o usucapião dos imó-veis tirados por violência, daí surgindo a necessidade de justo título e boa-fé”. E tal iustus titulos culminou por ser consagrado, regra geral, como o ato jurídico translativo de domínio que não atingiu o seu objetivo, pois não conferiu ao adquirente a propriedade. “Era o que acontecia”, continua o ilustre romanista, “se a traditio se operasse sobre uma res mancipi, ou se o accipiens recebesse a coisa de alguém que não fosse o proprietário; a non domino. Já tivemos a opor-tunidade de dizer que a traditio de uma res manicipi não conferia a propriedade quiritária, mas apenas a pretoriana graças à intervenção do pretor. Suponha-mos, por exemplo, que Aulus deixou a Nemesius uma res mancipi por meio de um legatum per vindicationem, e Nemesius aceitou o legado, entrando na posse da res mancipi. Verificou-se, posteriormente, que Aulus não era proprietário da coisa. Neste caso, o legado seria nulo, mas, não obstante isto, havia o iustus titulus usucapinonis. Portanto, decorrido o prazo de um ano, se a coisa fosse móvel, ou de dois, se imóvel, Nemesius adquiria a propriedade, desde que não se tratasse de res furtiva e agisse de boa-fé.

Tradicionalmente, ou de forma ortodoxa, conceitua-se justo título, se-guindo-se a doutrina francesa, como, na dicção de Lenine Nequete, “todo ato formalmente adequado a transferir o domínio, ou o direito real de que trata, mas deixa de produzir tal efeito em virtude de não ser o transmitente senhor da coisa, ou do direito, ou lhe faltar o poder legal de alienar”. Orlando Gomes, ainda dentro de um ponto de vista tradicional, amplia a definição de justo títu-lo, conceituando-o como o “ato jurídico abstrato, cujo fim é habilitar alguém a adquirir a propriedade”, mas que, por algumas causas determinadas, como,

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por exemplo: a) aquisição a non domino; b) a aquisição a domino, em que o transmitente ou não gozava do direito de dispor, ou transfere por ato nulo de pleno direito; c) a existência de erro no modo de aquisição “deixa de produzir o seu efeito”, sendo, portanto, justo título “o ato translativo que não produziu efeito, o título de aquisição ineficaz”. A par disso, segmento doutrinário respei-tável coloca como requisito indispensável para configuração do justo título a transcrição no registro imobiliário, quando somente por esse ato se adquire a propriedade. Por outro lado, não pode ser olvidada a posição sustentada pelo então Desembargador Ruy Rosado de Aguiar Júnior, após Ministro do Superior Tribunal de Justiça, que, nos autos da Apelação Cível nº 589.019.629, definiu justo título, para o efeito do usucapião ordinário, como aquele documento “que basta para legitimar o fato da posse com ânimo de dono, transferida de acordo com o sistema jurídico vigente”. Em razão da excelência da manifestação pre-toriana, segue transcrição literal do voto:

O justo título, como requisito para usucapião ordinária, tem sido definido em termos bem restritos, a tal ponto que a experiência forense raramente registra pedido de usucapião por este fundamento, podendo dizer-se que a interpretação restritiva praticamente impede a incidência da norma.

Apesar da predominância desse entendimento na doutrina e na jurispru-dência, penso que se deva reexaminar o tema para definir-se como justo título aquele que legitima o fato da posse, pois o justo título não há de ser o da pro-priedade, mas, tão só, o da posse.

Pedro Nunes (Do usucapião, 4. ed., p. 43) invoca a lição de Câmara Leal para primeiramente definir como título “o motivo jurídico pelo qual o pos-suidor começou a deter a coisa e havê-la como própria” e como justo título o que se apresenta com “veemente aparência de legitimidade”. Para ser título, em se tratando de usucapião, deve-se considerar apenas o título da posse; para ser justo, basta que sirva para legitimar a existência do fato, de acordo com as regras jurídicas vigentes. Nesse conceito, portanto, o justo título da posse é aquele que serve para legitimar a consciência do possuidor de que tem direito à posse do bem em razão de um ato juridicamente admitido pelo ordenamento. Tem justo título para posse aquele que passa a ocupar um imóvel, com ânimo de dono, em razão de um contrato de promessa de compra e venda celebrado com aquele que detinha a titularidade do domínio ou com aquele que também era titular de uma promessa de compra e venda registrada, como ocorre no caso dos autos, pois ambos podiam alienar o domínio e estavam legitimados a transferir a posse do bem.

É verdade que a veneranda sentença apelada tem em seu prol ensina-mentos, os mais respeitáveis, mas é preciso interpretar a lei de acordo com os fins sociais a que ela se destina, em obediência aos princípios indicados na lei

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de introdução e aos enunciados na nova Constituição Federal, de tal modo que o dispositivo legal que prevê a usucapião ordinária, em tempo curto, também possa ser aplicado em favor do possuidor com ânimo de dono que tenha ingres-sado no imóvel em razão de um título outorgado por quem lhe poderia transferir legitimamente a posse. É preciso distinguir entre a usucapião extraordinária, que favorece a todos, inclusive aos de má-fé, e a ordinária, em benefício da-queles que de boa-fé e legitimamente recebem a posse do imóvel” (Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul n. 146, os. 238/240).

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, flexibilizando a posição or-todoxa, ainda que por maioria de votos, consagrou entendimento no sentido de que a promessa de compra e venda, quando ato translativo de domínio inefi-caz imediato, é justo título para fins do art. 551 do Código Civil de 1916, mas afastou deste contexto a cessão de direitos possessórios. Na dicção da ementa oficial vencedora, tendo

direito à aquisição do imóvel, o promitente comprador pode exigir do promitente vendedor que lhe outorgue a escritura definitiva de compra e venda, bem como pode requerer ao juiz a adjudicação do imóvel. Segundo a jurisprudência do STJ, não são necessários o registro e o instrumento público, seja para o fim da Súmula nº 84, seja para que se requeira a adjudicação. Podendo dispor de tal eficácia, a promessa de compra e venda, gerando direito à adjudicação, gera direito à aquisição por usucapião ordinário. Inocorrência de ofensa ao art. 551 do Código Civil. (REsp 32-972/SP, 3ª Turma, Relator designado Ministro Nilson Naves, Jul-gado em 19.03.1996, publicado no DJU em 10.06.1996; RT 732/181)

Ao longo da vigência do Código Civil de 1916, pois, coexistiram três proposições doutrinárias jurisprudenciais sobre justo título: a) clássica, assim compreendida como ato translativo ineficaz registrado e, após, desconstituído (via manejo, em regra, de ação anulatória); b) ortodoxa, definida, tão somente, como o ato translativo ineficaz; e c) heterodoxa concebida como a posse plena transmitida por quem assim poderia proceder. Impõe-se pequena explicação sobre a nomenclatura das correntes adotadas: clássica porque segue, grosso modo, a formatação consagrada pelo Direito quiritário; ortodoxa porque, ape-sar de expungir a exigência de registro do título, mantém-se fiel à ideia do ato translativo de domínio; heterodoxa porque implica ruptura do modelo, adotan-do-se a transmissão da posse ad usucapionem como parâmetro.

Com o advento do novo Código Civil, ano 2002, o usucapião ordinário foi desdobrado em dois suportes fáticos, a saber:

Art. 1.242. Adquire-se também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.

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Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respec-tivo cartório, cancelada, posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido sua moradia, ou realizado investimento de interesse social e eco-nômico.

Observa-se, icto oculi, que o parágrafo único do art. 1.242 do Código Civil de 2002 culminou por consagrar, para efeito de privilégio quanto ao pra-zo, concepção restritiva de justo título, de difícil aperfeiçoamento, talvez dire-cionando o dispositivo em comento para as hipóteses de venda de ascendente e descendente sem o consentimento do cônjuge do alienante ou dos outros descendentes, ato anulável na novel dicção do art. 496 do Código Civil.

Mas, como verdadeira contrapartida, o justo título, para efeito do usu-capião ordinário geral, caput do art. 1.242 do Código Civil/2002, há que se afei çoar às concepções ortodoxa ou, mesmo, heterodoxa, com clara inclinação para a primeira em razão de linha de precedentes do Superior Tribunal de Jus-tiça. O certo é que, na hipótese em comento, por um princípio de lógica carte-siana, há a exclusão da posição clássica.

cONcLUSÃO

Do que foi exposto, conclui-se, em síntese, que, no usucapião, a posse deixa de ser mera aparência da propriedade e passa a ser pressuposto para aqui-sição desta. Para tanto, a posse deve ser qualificada, cum animus domini, verda-deira sequela subjetivista em diploma legal que tem a teoria objetiva da posse consagrada de modo extremado. E é por meio do exame da causa possessionis que se constata o aperfeiçoamento, ou não, do requisito subjetivo, isto é, have-rá a exclusão do elemento subjetivo qualificado quando o possuidor for direto ou mero detentor. Inexistindo tais obstáculos objetivos, presume-se o animus domini. A promessa particular de compra e venda, uma vez que não acarreta desdobramento da posse, não se enquadra no conceito de obstáculo objetivo. São três as concepções, por sua vez, de justo título: a) clássica, assim compre-endida como o ato translativo ineficaz registrado e, após, desconstituído; b) ortodoxa, definida tão somente como o ato translativo ineficaz; c) heterodoxa, concebida como a posse plena transmitida por quem assim poderia proceder.

O novo Código Civil desdobrou o usucapião ordinário em dois suportes fáticos, culminando por consagrar, no parágrafo único do art. 1.242, para efeito de privilégio quanto ao prazo, concepção restritiva de justo título, a clássica, talvez direcionando o dispositivo em comento para as hipóteses de venda de as-cendente a descendente sem o consentimento do cônjuge do alienante ou dos outros descendentes, ato anulável na novel dicção do art. 496 do Código Civil. Mas como verdadeira contrapartida, o justo título, para efeito do usucapião

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ordinário geral, caput do art. 1.242 do Código Civil/2002, há que se afeiçoar às concepções ortodoxa ou, mesmo, heterodoxa, com clara inclinação para a primeira em razão de linha de precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

reFerÊNcIaSGOMES, Orlando. Direitos reais. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Dos vícios da posse. 2. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001.

NEQUETE, Lenine. Da prescrição aquisitiva. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 1970.

NÓBREGA, Vandick Londres da. Compêndio de direito romano. 6. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S/A, v. II, 1971.

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Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Usucapião

2003

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Agravo em Recurso Especial nº 276.027 – RS (2012/0271670‑0)Relatora: Ministra Maria Isabel GallottiAgravante: Mário Roberto PintoAdvogados: Jean Newton Cristaldo Martins

Samir Adel SalmanAgravado: Hari Egon LungRepr. por: Marcio Marcelo Pereira LungAdvogado: Paulo Ricardo da Silveira MagirenaInteres.: Mara Claudete Minho Feijó e outrosAdvogados: Carla Barreneche e outro(s)

Jean Newton Cristaldo Martins Lisiane Martins Cruz

ementAaGravO reGIMeNTaL – aGravO eM recUrSO eSPecIaL – USUcaPIÃO eSPecIaL – IMÓveL UrbaNO – TaMaNHO DO IMÓveL QUe SUPera O LIMITe eSTabeLecIDO Na cONSTITUIçÃO FeDeraL – reeXaMe De PrOva

1. Inviável a análise do recurso especial quando dependente de ree-xame de matéria fática da lide (Súmula nº 7 do STJ).

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

Acórdão

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi-mental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi, Luis Felipe Salomão e Raul Araújo (Presidente) votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 02 de junho de 2015 (data do Julgamento).

Ministra Maria Isabel Gallotti Relatora

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relAtório

Ministra Maria Isabel Gallotti: Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão mediante a qual neguei provimento a agravo em recurso espe-cial, por aplicar ao caso a Súmula nº 7 do STJ.

O agravante afirma não se aplicar ao caso a referida Súmula, pois, segun-do afirma, é desnecessária a revisão de fatos e provas.

É o relatório.

voto

Ministra Maria Isabel Gallotti (Relatora): Os argumentos da agravante não foram suficientes para infirmar os fundamentos da decisão agravada, que adoto como razões de decidir:

Trata-se de agravo em recurso especial interposto por Mário Roberto Pinto com fundamento no art. 105, III, alíneas a e c, da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado (e-STJ, fl. 278):

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE – EXCEÇÃO DE USU-CAPIÃO ESPECIAL – IMÓVEL URBANO – TERRENO FOREIRO – PROPRIE-DADE DO AUTOR – ÁREA TOTAL DO IMÓVEL SUPERIOR A 250 METROS QUADRADOS – REQUISITO LEGAL – PRESCRIÇÃO AQUISITIVA NÃO OPERADA – PROCEDÊNCIA DO PEDIDO – SUCUMBÊNCIA INVERTIDA – PROVIDA A APELAÇÃO – UNÂNIME.

O agravante alega violação do art. 1.240 do Código Civil. Sustenta que duas fa-mílias residem no imóvel objeto da pretendida usucapião, de maneira que embo-ra o bem tenha 310 metros quadrados, cada família exerce posse sobre a metade dessa área, o que permite enquadrá-la na regra de usucapião urbana (limite de 250m2).

Assim posta a questão, observo que o recurso não poderia ser acolhido sem re-exame de prova, com a qual se poderia admitir, como pretendido, que mais de uma família reside no imóvel que se pretendia usucapir, bem como tirar con-clusões acerca de uma hipotética divisão de áreas entre as famílias. Razoável e mais consentâneo com as regras comuns da experiência é que as famílias têm a totalidade da posse do bem. Aplica-se ao caso a Súmula nº 7 do STJ.

Tem-se, outrossim, que a tese do agravante importa em interpretação de disposi-tivo constitucional no qual prevista a usucapião urbana e estabelecido o limite de área do imóvel que pode ser objeto dessa modalidade de aquisição. A discussão, portanto, seria apropriada em recurso extraordinário, pois a violação de lei fede-ral seria apenas oblíqua.

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O dissídio jurisprudencial não ficou caracterizado, pois não destacadas as cir-cunstâncias que assemelhassem os casos confrontados, o que, diante da incidên-cia do enunciado citado, seria mesmo inviável.

Em face do exposto, nego provimento ao agravo.

Publique-se.

Ressalte-se não ter sido impugnado o fundamento de que a argumenta-ção do especial importa em interpretação do dispositivo constitucional no qual prevista a usucapião urbana e estabelecido o limite de área do imóvel que pode ser objeto dessa modalidade de aquisição.

Em face do exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É como voto.

certidão de julgAmento quArtA turmA

Número Registro: 2012/0271670-0

Processo Eletrônico AgRg-AREsp 276.027/RS

Números Origem: 10800036547 365418120088210037 3978453220128217000 70049984503 70050912526 70052065778

Em Mesa Julgado: 02.06.2015

Relatora: Exma. Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Roberto Luis Oppermann Thomé

Secretária: Belª Teresa Helena da Rocha Basevi

AutuAção

Agravante: Mário Roberto Pinto

Advogados: Samir Adel Salman Jean Newton Cristaldo Martins

Agravado: Hari Egon Lung

Repr. por: Marcio Marcelo Pereira Lung

Advogado: Paulo Ricardo da Silveira Magirena

Interes.: Mara Claudete Minho Feijó e outros

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Advogados: Lisiane Martins Cruz Jean Newton Cristaldo Martins Carla Barreneche e outro(s)

Assunto: Direito Civil – Coisas – Posse

AgrAvo regimentAl

Agravante: Mário Roberto Pinto

Advogados: Samir Adel Salman Jean Newton Cristaldo Martins

Agravado: Hari Egon Lung

Repr. por: Marcio Marcelo Pereira Lung

Advogado: Paulo Ricardo da Silveira Magirena

Interes.: Mara Claudete Minho Feijó e outros

Advogados: Lisiane Martins Cruz Jean Newton Cristaldo Martins Carla Barreneche e outro(s)

certidão

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.

Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi, Luis Felipe Salomão e Raul Araújo (Presidente) votaram com a Sra. Ministra Relatora.

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Assunto Especial – Ementário

Usucapião

2004 – usucapião e de reintegração de posse – negativa de prestação jurisdicional – não ocor-rência

“Agravo regimental em recurso especial. Ação de usucapião e de reintegração de posse. Negativa de prestação jurisdicional. Art. 535 do CPC. Não ocorrência. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o Tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a contro-vérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.347.253 – (2012/0204581-2) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 19.08.2014)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento aos recursos especiais.Naquela oportunidade, conclui-se pela impossibilidade de acolhida das pretensões dos re-correntes ante (i) a não ocorrência da suscitada negativa de prestação jurisdicional e (ii) a inviabilidade da alteração das conclusões do acórdão recorrido, tendo em vista a incidência da Súmula nº 7/STJ.Nas razões do regimental, os agravantes voltam a defender a ocorrência de negativa de pres-tação jurisdicional porque a Corte de origem não teria se manifestado, mesmo quando provo-cada pela oposição de declaratórios, a respeito de questões que entendem imprescindíveis ao deslinde da controvérsia. Ao final, pugnaram pela reconsideração da decisão agravada ou, alternativamente, que seja o feito submetido ao órgão julgador Colegiado competente.O STJ negou provimento ao agravo regimental asseverando que não prosperam as alegações postas no regimental, incapazes de alterar os fundamentos da decisão impugnada.Citamos a seguir trecho da doutrina de Carlos José Cordeiro:“Professor Orlando Gomes diz que a tese da autonomia da usucapião é consagrada nas mo-dernas legislações, e traça com clareza a distinção entre os dois institutos. Assim, do ponto de vista da finalidade, a prescrição é um modo de extinguir pretensões, enquanto a usucapião é modo de adquirir direitos reais. A base dos institutos também é diversa; na prescrição, é a inércia do sujeito de direito; na usucapião, é a posse continuada. Diverso é o aspecto da apli-cabilidade; a usucapião restringe-se aos direitos reais. A prescrição, por fim, tem um sentido negativo, de extinção, enquanto que a usucapião é positivo, como força geradora. E conclui: ‘Não há que falar, por conseguinte, em prescrição aquisitiva’.No mesmo sentido, aponta Eduardo Espínola, reconhecendo que há regras comuns às duas espécies de prescrição, aquisitiva (suposto usucapião) e extintiva, porém há entre elas diferen-ças substanciais: a prescrição aquisitiva tem essencialmente por base a posse, e assim exige a boa-fé; a prescrição extintiva, em regra, dispensa a posse, não exige por parte do devedor o requisito da boa-fé; a prescrição aquisitiva pode ser fonte de uma ação ou de uma exceção em proveito do adquirente; a extintiva, sendo praticamente um meio de refletir a ação, se apresen-ta sempre como exceção; o campo da prescrição aquisitiva não é tão vasto como o da extintiva: a primeira limita-se à aquisição da propriedade e dos direitos reais; a extintiva abrange todo o domínio do direito civil, aplicando-se a todas as classes de relações jurídicas.Dessa forma, entende-se não se poder, sob a análise científica, considerar a usucapião como uma espécie de prescrição aquisitiva, uma vez que diversos são os seus regimes, somente tendo incidência comum o decurso do tempo, como forma de contato entre os dois institutos. Essa afirmativa acompanha o posicionamento do Professor Nélson Luiz Pinto, que, citando Lafayette, assevera ‘ter a prescrição conotação negativa, isto é, nascer da inércia, tendo por efeito dissolver a obrigação e paralisar o direito correlato, e, consequentemente, não gerar direitos. A usucapião, ao contrário, é positiva, porque no seu modo de atuar predomina a força geradora; o proprietário perde o domínio não só por sua inércia, mas também porque o adquire o possuidor. Assim, o não uso do direito de propriedade não importa sua extinção, por ser

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imprescritível, enquanto existir o seu objeto (propriedade). De sorte que a única possibilidade que se apresenta é a da aquisição por outrem, denominada usucapião, quando, então, o objeto passará a outro titular’.Pode-se, assim, esclarecido que a usucapião é uma forma de aquisição da propriedade, dentre os vários conceitos oferecidos pela doutrina, apresentar, segundo Nélson Luiz Pinto, ‘o que mais se aproxima do nosso ordenamento jurídico’, de lavra de Modestino: ‘O usucapio este adjectio dominii per continuationem possessionis temporis lege definit, ou, o modo de ad-quirir a propriedade pela posse continuada durante certo lapso de tempo, com os requisitos estabelecidos na lei’.Observa-se, dessa última conceituação, bem como das outras arroladas, que dois são os elementos básicos, essenciais, para a aquisição por usucapião: posse e tempo. Exigindo-se, ainda, o animus domini. Ressalte-se que outros elementos podem se fazer presentes nas várias espécies de usucapião (ordinário, extraordinário e especial), tais como o justo título e a boa-fé, os quais serão analisados no momento oportuno.[...]Feitas as considerações iniciais sobre a usucapião e ressaltada a importância do instituto, cabe revelar que o direito brasileiro admite cinco espécies de usucapião, quais sejam: usucapião extraordinário, previsto pelo art. 550 do CC; usucapião ordinário, definido no art. 551 do CC; usucapião mobiliário, descrito nos arts. 618 e 619 do CC, respectivamente nas moda-lidades ordinário e extraordinário; usucapião especial rural ou pro labore, regulado pela Lei nº 6.969/1981, com as alterações dadas pela CF no art. 191; e usucapião especial urbano, introduzido pelo art. 183 da Lei Maior.Discriminadas as várias espécies de usucapião, deve-se dizer que não será objeto de estudo a distinção entre os seus diversos tipos, sendo, na verdade, continente de outro tema monográ-fico. Disso, nota-se que fundamentalmente não divergem entre si as cinco formas de usucapir, exigindo-se sempre, dentre outros requisitos, para a sua concessão, coisa hábil, posse, lapso de tempo, animus domini e, em alguns casos, boa-fé e justo título.Por aí, percebe-se que para ocorrer a usucapião em geral, faz-se necessário o concurso de cer-tos requisitos, que dizem respeito às pessoas a quem interessa (pessoais); às coisas e direitos que podem ser adquiridos desta maneira (reais); à forma por que se constitui (formais); e à qualificação da posse (especiais).A explicação atinente a cada qual será feita nos tópicos seguintes, quando forem dissecados os requisitos da usucapião em geral. Advirta-se, porém, como anota Antônio Macedo de Campos, ‘que capacidade (pessoal) e coisa hábil (real) não estão expressas nos dispositivos referentes à usucapião. Resultam dos princípios gerais de direito’.Os requisitos pessoais são aqueles que têm em vista o possuidor e o proprietário, de forma a abranger a capacidade de cada um, para a ocorrência da usucapião, concebendo-se, assim, a aquisição do domínio por um e perda da propriedade da coisa pelo outro.Deveras, é regra manifesta que somente podem usucapir as pessoas capazes para possuir. Nesse engate, entende Lenine Nequete que são capazes de possuir tanto as pessoas físicas quanto morais, a comunidade hereditária, a pessoa jurídica de direito público e, inclusive, os incapazes, por intermédio de seus representantes. Inclui, ainda, os sucessores legítimos ou testamentários do possuidor, bem como os credores e demais interessados.Esta assertiva fundamenta-se, especialmente, no art. 162 do CC, uma vez que se permite a alegação da prescrição pela parte a quem aproveita. Ter-se-ia, então, terceiros interessados que seriam ‘todos aqueles que em favor dos quais constitui o possuidor um direito qualquer, que pereceria não se consolidando a propriedade nas mãos deste, v.g., o usufrutuário, o usuá-rio, o fideicomissário em relação ao gravado, o enfiteuta em relação ao senhorio direto etc.’.Com relação ao sujeito passivo, para sofrer os efeitos da perda da coisa, basta que ele seja o proprietário. Aí, incluem-se os relativamente incapazes, e excluem as pessoas jurídicas de direito público. Quanto aos primeiros, o art. 169, I, do CC não os abarca quando torna patente que não ocorre prescrição contra os incapazes de que trata o art. 5º, ou seja, os sujeitos ab-solutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quanto aos segundos, a CF determina que os bens públicos não serão adquiridos por usucapião.Em suma, o usucapiente deve ser capaz, mas, em determinados casos, essa faculdade sofre restrições decorrentes de diversos acontecimentos, inclusive familiar, obrigacional, etc.Antônio Ferreira Inocêncio relaciona pessoas e situações jurídicas que não se afinam com a usucapião. Assim, tem-se:

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‘a) Entre cônjuges, na constância do casamento (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, I), qualquer que seja o regime de bens;b) Entre ascendentes e descendentes, durante o pátrio poder (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, II);c) Entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, III);d) Em favor de credor pignoratício, do mandatário, e, em geral, das pessoas que lhe são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e as pessoas representadas ou seus herdeiros, relativamente aos bens confiados à sua guarda (CC, arts. 553, parágrafo único, e 168, IV).’Além dessas exceções, o mencionado autor enumera outros casos, aos quais é inaplicável a usucapião.Interessante noticiar que, face à força declaratória de certeza jurídica, é possível ao proprietário intentar a usucapião sobre o seu imóvel, pois não há a menor ilegalidade em que o possuidor, por não ter confiança em seu título dominial, recorra à ação de usucapião. A propósito, comenta Celso Agrícola Barbi que ‘não se justificam restrições ao uso da ação declaratória quanto à propriedade de imóveis. Pelo contrário, será de muita utilidade, quando alguém criar incerteza em torno do domínio de um bem dessa natureza, prejudicando seu uso, ou disponibilidade, pelo proprietário também possuidor. Poderá ele mover ação contra o pretenso dono, para ver declarado que é seu o domínio’.Os requisitos reais relacionam-se com as coisas e direitos que podem ser objeto de aquisição por usucapião (res habilis). Desse modo, para ser objeto de usucapião, é mister que a coisa esteja no comércio, não sendo usucapíveis, pois, as que estejam fora do comércio, assim consideradas as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis, na definição do art. 69 do CC.Anote-se, conforme José Carlos de Moraes Salles, ‘haver coisas naturalmente insuscetíveis de apropriação e, consequentemente, de usucapião, como, por exemplo, o ar, a luz natural e as águas livres. De outra parte, há coisas juridicamente inapropriáveis ou inusucapíveis, porque assim declaradas pelo Direito. Como exemplo, [...] os bens públicos de uso comum do povo, os de uso especial e os dominiais ou patrimoniais (art. 66 do CC)’.Confirma-se que as coisas legalmente inalienáveis também não são usucapíveis, posto que elas têm o seu destino fixado por lei, como o bem de família (art. 72 do CC); os imóveis dotais (arts. 293 e 298 do CC); os bens de menores sob pátrio poder ou tutela (arts. 386, 427, VI, e 429 do CC); e os bens dos sujeitos à curatela (arts. 446, 453 e 463 do CC). Deve-se mencionar que a doutrina, hodiernamente, entende que quando a inalienabilidade resulta de ato voluntário de testador ou doador, o bem assim clausulado pode ser objeto de usucapião. Quanto aos direitos suscetíveis de usucapião, a doutrina reconhece que somente os direitos reais prescritíveis podem ser adquiridos, assim os que implicam posse dos objetos sobre que recaem, vale dizer, a propriedade, as servidões, a enfiteuse, o usufruto, o uso e a habitação. A propósito, ensina Wolff que ‘sólo puede adquirir-se por usucapión los derechos reales que faculten para la posesión de una cosa o de un derecho: como la propiedad, la superficie, las servidumbres’.Em regra, só podem ser usucapidos os bens do domínio particular, ao passo que os bens públicos não se subordinam a tal incidência, conforme impõe a Súmula nº 340 do STF, pois que ‘desde a vigência do Código Civil, os bens dominiais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião’. Essa orientação do Pretório Excelso foi acompanhada pelo atual Texto Constitucional, como se nota nos seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único.A coisa hábil para usucapião é coisa corpórea e tangível, sendo indispensável para os imóveis que estes estejam perfeitamente individuados, com suas precisas características, extensão e confrontações, mesmo porque a posse ad usucapionem não seria compatível com a indetermi-nação dos limites ou de outros aspectos da coisa possuída.Ressalta-se, entretanto, que é crescente o número de julgados que admite posse e usucapião sobre bens intangíveis (incorpóreos) como, v.g., o direito ao uso de linha telefônica. Vale dizer, também, que embora na usucapião de imóvel exija-se certeza e determinação, tem-se admi-tido usucapião de compossuidores, sobre partes ideais, de imóvel divisível ou não, quando a posse do todo é exercida conjuntamente.” (CORDEIRO, Carlos José. Usucapião. Juris SíNTE-SE, Porto Alegre: IOB/Thomson, nov./dez. 2005. 56 CD-Rom)

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2005 – usucapião – imóvel rural – ausência de matrícula

“Processo civil, civil e registros públicos. Agravo retido. Não conhecimento. Ação de usucapião. Imóvel rural. Ausência de matrícula. Falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento do processo. Possibilidade jurídica do pedido. Pedido abstrato. Interesse de agir. Ausência de neces-sidade e utilidade. 1. Nos termos do art. 523, § 1º, do Código de Processo Civil, não se conhece de agravo retido, se não se formula pedido a respeito, no apelo ou na resposta ao recurso. 2. A ausência de identificação minuciosa do imóvel rural compromete a instrução da usucapião especial rural quanto às condições de regularidade para a transcrição no registro de imóveis. Essa ausência caracteriza a falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, conjunto de atos e procedimentos específicos para a propositura da ação. 3. Não há como usucapir área que não corresponda à unidade imobiliária autônoma e individualizada, vinculada à matrícula especí-fica. 4. Consoante abalizada doutrina, a possibilidade jurídica do pedido consiste na ‘admissibili-dade em abstrato, pelo ordenamento jurídico, do pedido do autor’ (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 260). 5. Não se mostra vedado, no ordenamento jurídico pátrio, pedir, em tese, a declaração da prescrição aquisitiva. Se essa será reconhecida ou não, por meio da análise do preenchimento dos requisitos específicos, trata-se de exame a ser realizado em sede meritória. 6. A constatação de imóvel não individualizado e não autônomo revela falta de necessidade e utilidade quanto à ação de usucapião, inviabilizando o processamento do feito, ante a falta do interesse de agir. 7. Agravo regimental não provido.” (TJDFT – Proc. 20121010008889 – (818926) – Rel. Des. Flavio Rostirola – DJe 15.09.2014 – p. 143)

Comentário Editorial SÍnTESECuida-se de agravo interno, dito regimental, interposto objetivando submeter à apreciação do órgão colegiado o inconformismo contra decisão monocrática deste Relator que negou segui-mento ao recurso de apelação, com assento no art. 557, caput, do Código de Processo Civil.Os agravantes reiteraram os argumentos expendidos no recurso de apelação. Ressaltaram que seria desnecessária a matrícula individualizada do imóvel usucapiendo. Argumentou que a usucapião consubstanciaria propriedade nova, de modo a não se atrelar à antiga. Frisou que a matrícula específica do bem a ser usucapido não configuraria requisito à prescrição aquisitiva do imóvel.O TJDFT negou provimento ao agravo.Em que pesem as ponderações delineadas, no recurso interposto, mantenho o posicionamento esposado na decisão liminar, pois esse reflete minha livre convicção sobre o tema.O Relator assim se manifestou:“Permito-me reiterar as razões que expus na decisão agravada. Quanto ao agravo retido, in-terposto às fls. 286/290, os recorrentes não postularam o conhecimento de tal recurso, no bojo do apelo, razão pela qual dele não conheço, nos termos do art. 523, § 1º, do Código de Processo Civil.[...]Recorde-se que, consoante abalizada doutrina, a possibilidade jurídica do pedido consiste na admissibilidade em abstrato, pelo ordenamento jurídico, do pedido do autor (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado artigo por artigo. 2. ed. rev. atua. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 260).Não se mostra vedado, portanto, no ordenamento jurídico pátrio, pedir, em tese, a declaração da prescrição aquisitiva. Se essa será reconhecida ou não, por meio da análise do preenchi-mento dos requisitos específicos, trata-se de exame a ser realizado em sede meritória.”Citamos, a seguir, trecho da doutrina de Carlos José Cordeiro:“Professor Orlando Gomes diz que a tese da autonomia do usucapião é consagrada nas mo-dernas legislações, e traça com clareza a distinção entre os dois institutos. Assim, do ponto de vista da finalidade, a prescrição é um modo de extinguir pretensões, enquanto o usucapião é modo de adquirir direitos reais. A base dos institutos também é diversa; na prescrição, é a inércia do sujeito de direito; no usucapião, é a posse continuada. Diverso é o aspecto da apli-cabilidade; o usucapião restringe-se aos direitos reais. A prescrição, por fim, tem um sentido

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negativo, de extinção, enquanto que o usucapião é positivo, como força geradora. E conclui: ‘Não há que falar, por conseguinte, em prescrição aquisitiva’.No mesmo sentido, aponta Eduardo Espínola, reconhecendo que há regras comuns às duas espécies de prescrição, aquisitiva (suposto usucapião) e extintiva, porém há entre elas diferen-ças substanciais: a prescrição aquisitiva tem essencialmente por base a posse, e assim exige a boa-fé; a prescrição extintiva, em regra, dispensa a posse, não exige por parte do devedor o requisito da boa-fé; a prescrição aquisitiva pode ser fonte de uma ação ou de uma exceção em proveito do adquirente; a extintiva, sendo praticamente um meio de refletir a ação, se apresen-ta sempre como exceção; o campo da prescrição aquisitiva não é tão vasto como o da extintiva: a primeira limita-se à aquisição da propriedade e dos direitos reais; a extintiva abrange todo o domínio do direito civil, aplicando-se a todas as classes de relações jurídicas.Dessa forma, entende-se não se poder, sob a análise científica, considerar o usucapião como uma espécie de prescrição aquisitiva, uma vez que diversos são os seus regimes, somente tendo incidência comum o decurso do tempo, como forma de contato entre os dois institutos. Essa afirmativa acompanha o posicionamento do Professor Nélson Luiz Pinto, que, citando Lafayette, assevera ‘ter a prescrição conotação negativa, isto é, nascer da inércia, tendo por efeito dissolver a obrigação e paralisar o direito correlato, e, consequentemente, não gerar direitos. O usucapião, ao contrário, é positivo, porque no seu modo de atuar predomina a força geradora; o proprietário perde o domínio não só por sua inércia, mas também porque o adquire o possuidor. Assim, o não uso do direito de propriedade não importa sua extinção, por ser imprescritível, enquanto existir o seu objeto (propriedade). De sorte que a única possibilidade que se apresenta é a da aquisição por outrem, denominada usucapião, quando, então, o objeto passará a outro titular’.Pode-se, assim, esclarecido que o usucapião é uma forma de aquisição da propriedade, dentre os vários conceitos oferecidos pela doutrina, apresentar, segundo Nélson Luiz Pinto, ‘o que mais se aproxima do nosso ordenamento jurídico’, de lavra de Modestino: ‘O usucapio este adjectio dominii per continuationem possessionis temporis lege definit, ou, o modo de ad-quirir a propriedade pela posse continuada durante certo lapso de tempo, com os requisitos estabelecidos na lei’.Observa-se, dessa última conceituação, bem como das outras arroladas, que dois são os elementos básicos, essenciais, para a aquisição por usucapião: posse e tempo. Exigindo-se, ainda, o animus domini. Ressalte-se que outros elementos podem se fazer presentes nas várias espécies de usucapião (ordinário, extraordinário e especial), tais como o justo título e a boa-fé, os quais serão analisados no momento oportuno.[...]Feitas as considerações iniciais sobre o usucapião e ressaltada a importância do instituto, cabe revelar que o direito brasileiro admite cinco espécies de usucapião, quais sejam: usucapião extraordinário, previsto pelo art. 550 do CC; usucapião ordinário, definido no art. 551 do CC; usucapião mobiliário, descrito nos arts. 618 e 619 do CC, respectivamente nas moda-lidades ordinário e extraordinário; usucapião especial rural ou pro labore, regulado pela Lei nº 6.969/1981, com as alterações dadas pela CF, no art. 191; e usucapião especial urbano, introduzido pelo art. 183 da Lei Maior.Discriminadas as várias espécies de usucapião, deve-se dizer que não será objeto de estudo a distinção entre os seus diversos tipos, sendo, na verdade, continente de outro tema monográ-fico. Disso, nota-se que fundamentalmente não divergem entre si as cinco formas de usucapir, exigindo-se sempre, dentre outros requisitos, para a sua concessão, coisa hábil, posse, lapso de tempo, animus domini e, em alguns casos, boa-fé e justo título.Por aí, percebe-se que, para ocorrer o usucapião em geral, faz-se necessário o concurso de certos requisitos, que dizem respeito às pessoas a quem interessa (pessoais); às coisas e direi-tos que podem ser adquiridos desta maneira (reais); à forma por que se constitui (formais); e à qualificação da posse (especiais).A explicação atinente a cada qual será feita nos tópicos seguintes, quando forem dissecados os requisitos do usucapião em geral. Advirta-se, porém, como anota Antônio Macedo de Campos, ‘que capacidade (pessoal) e coisa hábil (real) não estão expressas nos dispositivos referentes ao usucapião. Resultam dos princípios gerais de direito’.Os requisitos pessoais são aqueles que têm em vista o possuidor e o proprietário, de forma a abranger a capacidade de cada um, para a ocorrência do usucapião, concebendo-se, assim, a aquisição do domínio por um e perda da propriedade da coisa pelo outro.

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Deveras, é regra manifesta que somente podem usucapir as pessoas capazes para possuir. Nesse engate, entende Lenine Nequete que são capazes de possuir tanto as pessoas físicas quanto morais, a comunidade hereditária, a pessoa jurídica de direito público e, inclusive, os incapazes, por intermédio de seus representantes. Inclui, ainda, os sucessores legítimos ou testamentários do possuidor, bem como os credores e demais interessados.Esta assertiva fundamenta-se, especialmente, no art. 162 do CC, uma vez que se permite a alegação da prescrição pela parte a quem aproveita. Ter-se-ia, então, terceiros interessados que seriam ‘todos aqueles que em favor dos quais constitui o possuidor um direito qualquer, que pereceria não se consolidando a propriedade nas mãos deste, v.g., o usufrutuário, o usuá-rio, o fideicomissário em relação ao gravado, o enfiteuta em relação ao senhorio direto etc.’.Com relação ao sujeito passivo, para sofrer os efeitos da perda da coisa, basta que ele seja o proprietário. Aí, incluem-se os relativamente incapazes, e excluem as pessoas jurídicas de direito público. Quanto aos primeiros, o art. 169, I, do CC não os abarca quando torna patente que não ocorre prescrição contra os incapazes de que trata o art. 5º, ou seja, os sujeitos ab-solutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quanto aos segundos, a CF determina que os bens públicos não serão adquiridos por usucapião.Em suma, o usucapiente deve ser capaz, mas, em determinados casos, essa faculdade sofre restrições decorrentes de diversos acontecimentos, inclusive familiar, obrigacional, etc.Antônio Ferreira Inocêncio relaciona pessoas e situações jurídicas que não se afinam com o usucapião. Assim, tem-se:‘a) Entre cônjuges, na constância do casamento (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, I), qualquer que seja o regime de bens.b) Entre ascendentes e descendentes, durante o pátrio poder (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, II).c) Entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, III).d) Em favor de credor pignoratício, do mandatário, e, em geral, das pessoas que lhe são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e as pessoas representadas ou seus herdeiros, relativamente aos bens confiados à sua guarda (CC, arts. 553, parágrafo único, e 168, IV).’Além dessas exceções, o mencionado autor enumera outros casos, aos quais é inaplicável o usucapião.Interessante noticiar que, face à força declaratória de certeza jurídica, é possível ao proprietário intentar o usucapião sobre o seu imóvel, pois não há a menor ilegalidade em que o possuidor, por não ter confiança em seu título dominial, recorra à ação de usucapião. A propósito, comenta Celso Agrícola Barbi que ‘não se justificam restrições ao uso da ação declaratória quanto à propriedade de imóveis. Pelo contrário, será de muita utilidade, quando alguém criar incerteza em torno do domínio de um bem dessa natureza, prejudicando seu uso, ou disponibilidade, pelo proprietário também possuidor. Poderá ele mover ação contra o pretenso dono, para ver declarado que é seu o domínio’.Os requisitos reais relacionam-se com as coisas e direitos que podem ser objeto de aquisição por usucapião (res habilis). Desse modo, para ser objeto de usucapião, é mister que a coisa esteja no comércio, não sendo usucapíveis, pois, as que estejam fora do comércio, assim consideradas as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis, na definição do art. 69 do CC.Anote-se, conforme José Carlos de Moraes Salles, ‘haver coisas naturalmente insuscetíveis de apropriação e, consequentemente, de usucapião, como, por exemplo, o ar, a luz natural e as águas livres. De outra parte, há coisas juridicamente inapropriáveis ou inusucapíveis, porque assim declaradas pelo Direito. Como exemplo, [...] os bens públicos de uso comum do povo, os de uso especial e os dominiais ou patrimoniais (art. 66 do CC)’.Confirma-se que as coisas legalmente inalienáveis também não são usucapíveis, posto que elas têm o seu destino fixado por lei, como o bem de família (art. 72 do CC); os imóveis dotais (arts. 293 e 298 do CC); os bens de menores sob pátrio poder ou tutela (arts. 386, 427, VI, e 429 do CC); e os bens dos sujeitos à curatela (arts. 446, 453 e 463 do CC). Deve-se mencionar que a doutrina, hodiernamente, entende que, quando a inalienabilidade resulta de ato voluntário de testador ou doador, o bem assim clausulado pode ser objeto de usucapião.

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Quanto aos direitos suscetíveis de usucapião, a doutrina reconhece que somente os direitos reais prescritíveis podem ser adquiridos, assim os que implicam posse dos objetos sobre que recaem, vale dizer, a propriedade, as servidões, a enfiteuse, o usufruto, o uso e a habitação. A propósito, ensina Wolff que ‘sólo puede adquirir-se por usucapión los derechos reales que faculten para la posesión de una cosa o de un derecho: como la propiedad, la superfície, las servidumbres’.Em regra, só podem ser usucapidos os bens do domínio particular, ao passo que os bens públicos não se subordinam a tal incidência, conforme impõe a Súmula nº 340 do STF, pois que, ‘desde a vigência do Código Civil, os bens dominiais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião’. Essa orientação do Pretório Excelso foi acompanhada pelo atual Texto Constitucional, como se nota nos seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único.A coisa hábil para usucapião é coisa corpórea e tangível, sendo indispensável para os imóveis que estes estejam perfeitamente individuados, com suas precisas características, extensão e confrontações, mesmo porque a posse ad usucapionem não seria compatível com a indetermi-nação dos limites ou de outros aspectos da coisa possuída.Ressalta-se, entretanto, que é crescente o número de julgados que admite posse e usucapião sobre bens intangíveis (incorpóreos) como, v.g., o direito ao uso de linha telefônica. Vale dizer, também, que embora no usucapião de imóvel exija-se certeza e determinação, tem-se admi-tido usucapião de compossuidores, sobre partes ideais, de imóvel divisível ou não, quando a posse do todo é exercida conjuntamente.” (CORDEIRO, Carlos José. Usucapião. Juris SíNTE-SE, Porto Alegre: IOB/Thomson, nov./dez. 2005. 56 CD-Rom)

2006 – usucapião – interposição de apelação – embargos de declaração – ausência de posterior ratificação

“Agravo regimental em agravo em recurso especial. Ação de usucapião. Interposição de apela-ção antes do julgamento dos embargos de declaração. Ausência de posterior ratificação. Súmula nº 418/STJ. Aplicação analógica. Precedentes. 1. Por aplicação analógica da Súmula nº 418/STJ, é inadmissível o recurso de apelação interposto antes da publicação do acórdão dos embargos decla-ratórios sem posterior ratificação. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 517.135 – (2014/0115658-6) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 30.10.2014 – p. 347)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão desta relatoria que conheceu do agravo para negar seguimento ao recurso especial.Sustenta o agravante que aplicação da Súmula nº 418/STJ ao recurso de apelação viola os arts. 51 e 516 do Código de Processo Civil.O STJ negou provimento ao agravo.O Relator assim aduziu:“Outrossim, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a Questão de Ordem suscitada nos autos do RHC 104.270/DF (Rel. Min. Celso de Melo, DJe de 06.09.2011, es-clareceu que ‘a intempestividade dos recursos tanto pode derivar de impugnações prematuras (que se antecipam à publicação dos acórdãos) quanto resultar de oposições tardias (que se registram após o decurso dos prazos recursais). Em qualquer das duas situações (impugnação prematura ou oposição tardia), a consequência de ordem processual é uma só: o não conheci-mento do recurso, por efeito de sua extemporânea interposição. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem advertido que a simples notícia do julgamento, além de não dar início à fluência do prazo recursal, também não legitima prematura interposição de recurso, por abso-luta falta de objeto, ainda que se cuide de matéria criminal’.Tal entendimento, inclusive, restou consolidado na Súmula nº 418 desta Corte Superior: ‘É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação’.Em consequência, não há falar em tempestividade da apelação diante da falta de ratificação ou reiteração dos recursos, após a intimação da decisão dos declaratórios.”Segundo os ensinamentos de Carlos José Cordeiro, a usucapião tem cabimento nestes termos:“Feitas as considerações iniciais sobre o usucapião e ressaltada a importância do instituto, cabe revelar que o Direito brasileiro admite cinco espécies de usucapião, quais sejam: usuca-

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pião extraordinário, previsto pelo art. 550 do CC; usucapião ordinário, definido no art. 551 do CC; usucapião mobiliário, descrito nos arts. 618 e 619 do CC, respectivamente nas mo-dalidades ordinário e extraordinário; usucapião especial rural ou pro labore, regulado pela Lei nº 6.969/1981, com as alterações dadas pela CF, no art. 191; e usucapião especial urbano, introduzido pelo art. 183 da Lei Maior.Discriminadas as várias espécies de usucapião, deve-se dizer que não será objeto de estudo a distinção entre os seus diversos tipos, sendo, na verdade, continente de outro tema monográ-fico. Disso, nota-se que fundamentalmente não divergem entre si as cinco formas de usucapir, exigindo-se sempre, dentre outros requisitos, para a sua concessão, coisa hábil, posse, lapso de tempo, animus domini e, em alguns casos, boa-fé e justo título (38).Por aí, percebe-se que, para ocorrer o usucapião em geral, faz-se necessário o concurso de certos requisitos, que dizem respeito às pessoas a quem interessa (pessoais); às coisas e direi-tos que podem ser adquiridos desta maneira (reais); à forma por que se constitui (formais); e à qualificação da posse (especiais) (39).A explicação atinente a cada qual será feita nos tópicos seguintes, quando forem dissecados os requisitos do usucapião em geral. Advirta-se, porém, como anota Antônio Macedo de Campos (40), ‘que capacidade (pessoal) e coisa hábil (real) não estão expressas nos dispositivos refe-rentes ao usucapião. Resultam dos princípios gerais de direito’ (41).6.2 Requisitos pessoaisOs requisitos pessoais são aqueles que têm em vista o possuidor e o proprietário, de forma a abranger a capacidade de cada um, para a ocorrência do usucapião, concebendo-se, assim, a aquisição do domínio por um e perda da propriedade da coisa pelo outro.Deveras, é regra manifesta que somente podem usucapir as pessoas capazes para possuir (42). Nesse engate, entende Lenine Nequete (43) que são capazes de possuir tanto as pessoas físicas quanto morais, a comunidade hereditária, a pessoa jurídica de direito público e, inclusi-ve, os incapazes, por intermédio de seus representantes. Inclui, ainda, os sucessores legítimos ou testamentários do possuidor, bem como os credores e demais interessados.Esta assertiva fundamenta-se, especialmente, no art. 162 do CC, uma vez que se permite a alegação da prescrição pela parte a quem aproveita. Ter-se-ia, então, terceiros interessados que seriam ‘todos aqueles que em favor dos quais constitui o possuidor um direito qualquer, que pereceria não se consolidando a propriedade nas mãos deste, v.g., o usufrutuário, o usu-ário, o fideicomissário em relação ao gravado, o enfiteuta em relação ao senhorio direto, etc.’ (44).Com relação ao sujeito passivo, para sofrer os efeitos da perda da coisa, basta que ele seja o proprietário. Aí, incluem-se os relativamente incapazes e excluem as pessoas jurídicas de direito público. Quanto aos primeiros, o art. 169, I, do CC não os abarca quando torna patente que não ocorre prescrição contra os incapazes de que trata o art. 5º, ou seja, os sujeitos abso-lutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quanto aos segundos, a CF determina que os bens públicos não serão adquiridos por usucapião (45).Em suma, o usucapiente deve ser capaz, mas, em determinados casos, essa faculdade sofre restrições decorrentes de diversos acontecimentos, inclusive familiar, obrigacional, etc.Antônio Ferreira Inocêncio (46) relaciona pessoas e situações jurídicas que não se afinam com o usucapião. Assim, tem-se:‘a) Entre cônjuges, na constância do casamento (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, I), qualquer que seja o regime de bens.b) Entre ascendentes e descendentes, durante o pátrio poder (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, II).c) Entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, III).d) Em favor de credor pignoratício, do mandatário, e, em geral, das pessoas que lhe são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e as pessoas representadas ou seus herdeiros, relativamente aos bens confiados à sua guarda (CC, arts. 553, parágrafo único, e 168, IV).’Além dessas exceções, o mencionado autor enumera outros casos, aos quais é inaplicável o usucapião.

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Interessante noticiar que, face à força declaratória de certeza jurídica, é possível ao proprietário intentar o usucapião sobre o seu imóvel, pois não há a menor ilegalidade em que o possuidor, por não ter confiança em seu título dominial, recorra à ação de usucapião (47).A propósito, comenta Celso Agrícola Barbi (48) que ‘não se justificam restrições ao uso da ação declaratória quanto à propriedade de imóveis. Pelo contrário, será de muita utilidade, quando alguém criar incerteza em torno do domínio de um bem dessa natureza, prejudicando seu uso, ou disponibilidade, pelo proprietário também possuidor. Poderá ele mover ação contra o pretenso dono, para ver declarado que é seu o domínio’ (49).6.3 Requisitos reaisOs requisitos reais relacionam-se com as coisas e direitos que podem ser objeto de aquisição por usucapião (res habilis). Desse modo, para ser objeto de usucapião, é mister que a coisa esteja no comércio, não sendo usucapíveis, pois, as que estejam fora do comércio, assim consideradas as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis, na definição do art. 69 do CC.Anote-se, conforme José Carlos de Moraes Salles (50), ‘haver coisas naturalmente insuscetí-veis de apropriação e, consequentemente, de usucapião, como, por exemplo, o ar, a luz natural e as águas livres. De outra parte, há coisas juridicamente inapropriáveis ou inusucapíveis, porque assim declaradas pelo Direito. Como exemplo, [...] os bens públicos de uso comum do povo, os de uso especial e os dominiais ou patrimoniais (art. 66 do CC)’.Confirma-se que as coisas legalmente inalienáveis também não são usucapíveis, posto que elas têm o seu destino fixado por lei, como o bem de família (art. 72 do CC); os imóveis dotais (arts. 293 e 298 do CC); os bens de menores sob pátrio poder ou tutela (arts. 386, 427, VI, e 429 do CC); e os bens dos sujeitos à curatela (arts. 446, 453 e 463 do CC) (51). Deve-se mencionar que a doutrina, hodiernamente, entende que quando a inalienabilidade resulta de ato voluntário de testador ou doador, o bem assim clausulado pode ser objeto de usucapião (52).Quanto aos direitos suscetíveis de usucapião, a doutrina reconhece que somente os direitos reais prescritíveis podem ser adquiridos, assim os que implicam posse dos objetos sobre que recaem, vale dizer, a propriedade, as servidões, a enfiteuse, o usufruto, o uso e a habitação. A propósito, ensina Wolff (53) que ‘sólo puede adquirir-se por usucapión los derechos reales que faculten para la posesión de una cosa o de un derecho: como la propriedad, la superfície, las servidumbres’.Em regra, só podem ser usucapidos os bens do domínio particular, ao passo que os bens públicos não se subordinam a tal incidência, conforme impõe a Súmula nº 340 do STF, pois que ‘desde a vigência do Código Civil, os bens dominiais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião’. Essa orientação do Pretório Excelso foi acompanhada pelo atual texto constitucional, como se nota nos seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único.A coisa hábil para usucapião é coisa corpórea e tangível (54), sendo indispensável para os imóveis que estes estejam perfeitamente individuados, com suas precisas características, ex-tensão e confrontações, mesmo porque a posse ad usucapionem não seria compatível com a indeterminação dos limites ou de outros aspectos da coisa possuída.Ressalta-se, entretanto, que é crescente o número de julgados que admite posse e usucapião sobre bens intangíveis (incorpóreos) como, v.g., o direito ao uso de linha telefônica (55). Vale dizer, também, que, embora no usucapião de imóvel exija-se certeza e determinação, tem-se admitido usucapião de compossuidores, sobre partes ideais, de imóvel divisível ou não, quan-do a posse do todo é exercida conjuntamente (56).6.4 Requisitos formaisOs requisitos formais no usucapião devem ser, obrigatoriamente, a posse (ad usucapionem contínua e incontestada) e o transcurso de um determinado lapso de tempo, que varia em função do prazo estabelecido em lei.A posse ad usucapionem, segundo o Professor Natal Nader (57), ‘é a que, além dos elementos indispensáveis à configuração da posse, preenche ainda os requisitos exigidos à aquisição da propriedade pelo usucapião. Deve ser sem interrupção, sem oposição e ser exercida com intenção de dono, animus domini’.Por posse contínua, ou sem interrupção, deve-se entender a sucessão ordenada de atos pos-sessórios, não bastando, pois, o comportamento exterior do agente em face da coisa, em ati-tude análoga à do proprietário. O usucapiente deve provar que foi diligente na prática de atos

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possessórios, não tendo havido desleixo, descaso ou ausência de cuidados no trato da coisa possuída e que sempre se manteve eficazmente na posse do bem (58).Como esclarece Caio Mário da Silva Pereira (59), ‘o possuidor não pode possuir a coisa em in-tervalos, intermitentemente, nem tê-la maculada de vícios ou defeitos (vi, clam aut precario)’ (60). Todavia, ainda que a posse tenha sido obtida mediante violência, ou com clandestinida-de, haverá possibilidade de seu convalescimento para o efeito de usucapião, desde o momento em que cessarem os mencionados vícios (61).Não retiram na posse ad usucapionem a sua característica de contínua as intermitências ocasionais e temporárias, provocadas por circunstâncias fortuitas, como, v.g., uma eventual inundação. Por outro lado, os atos de posse podem ser praticados por prepostos do possuidor, como, por exemplo, presença física no imóvel, seu cultivo, sua manutenção, etc. (62).A posse ad usucapionem exige que a posse seja mansa e pacífica, sendo conhecida por aqueles contra que o usucapiente invocará o seu direito. Exige-se, também, que a posse seja sem oposição, sendo de se ressaltar que somente a impugnação feita por quem tenha legítimo interesse para tanto, como é o caso do proprietário contra quem visa a usucapir, poderá retirar--lhe essa característica, desde que o mesmo logre êxito em sua pretensão (63).Observa José Carlos de Moraes Salles (64) que a oposição deve traduzir ‘medidas efetivas e concretas, identificáveis na área judicial, visando a quebrar a continuidade da posse, opondo à vontade do possuidor uma outra vontade que lhe contesta o exercício daqueles poderes inerentes ao domínio qualificador da posse’.Outra condição da posse ad usucapionem é que ela seja exercida com o ânimo de dono, de ter a coisa para si – animus rem sibi habendi. Conforme Caio Mário da Silva Pereira (65), este requisito psíquico é essencial, excluindo todo contato físico com a coisa que não se faça acompanhar de ter a coisa para si, como é o caso do locatário, do comodatário e do usufru-tuário, que embora tenham a posse direta da coisa, o que os habilita a invocar os interditos possessórios, lhes falta a intenção de ser dono.Nélson Luiz Pinto (66) assevera que, ‘para caracterizar-se o animus domini, não basta somen-te a vontade (do contrário, admitir-se-ia, assim, para o ladrão que sabe que a coisa não lhe pertence), sendo o elemento característico e identificador da posse ad usucapionem, a causa possessionis, ou o título em virtude do qual se exerce a posse. Logo, se a posse se funda em contrato, não há que se falar em animus rem sibi habendi, salvo se houver, posteriormente, inversão da causa de possuir’ (67).Ainda sobre a posse, deve-se acrescentar que, se o usucapiente vier a perdê-la, deixará de existir um dos requisitos essenciais do usucapião, de modo que não será possível o seu reco-nhecimento judicial, haja vista que a perda da posse inutiliza o tempo anteriormente vencido.Importante dizer sobre o prazo no usucapião que, em relação aos bens móveis, aquele é menor, em razão da dificuldade de sua individualização e da facilidade de serem transmitidos através da tradição. Revela-se também que os bens móveis têm menor importância econômi-ca do que os bens imóveis, ratificando o lapso temporal mais curto para a aquisição de sua propriedade pelo usucapião.Outra questão que influi no lapso de tempo do usucapião é se este corre entre presentes ou entre ausentes, pois se o possuidor e o proprietário residem no mesmo Município em que está situado o imóvel, o prazo prescricional é menor, do contrário, mais dilatado, em favor das garantias jurídicas (68).6.5 Requisitos especiaisOs requisitos especiais, justo título e boa-fé, acrescentam à caracterização da posse ad usucapionem, na espécie do usucapião ordinário, qualificando esta modalidade de usucapir a propriedade e, consequentemente, reduzindo o lapso de tempo da posse.O conceito do justo título viveu durante muito tempo atrelado ao conceito de boa-fé, porém a doutrina e a jurisprudência têm procurado separá-los, tratando-os como realidades jurídicas autônomas, podendo aparecer juntas ou sozinhas.O justo título é um título hábil, em tese, a transferir o domínio (causa habilis ad dominium transferendum), mas que deixa de operar tal efeito, por ressentir-se de algum vício ou irregula-ridade, que o decurso do tempo (dez ou quinze anos) se encarrega de sanar (69). A boa-fé, por sua vez, é a crença do possuidor de que a coisa possuída realmente lhe pertence, ignorando a existência de vício que macule o seu título aquisitivo.

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O Professor Orlando Gomes (70) define o justo título como o ‘ato jurídico abstrato, cujo fim é habilitar alguém a adquirir a propriedade’, mas que por algumas determinadas causas, como, por exemplo: 1º) a aquisição a non domino; 2º) a aquisição a domino, em que o transmitente ou não gozava do direito de dispor ou transfere por ato nulo de pleno direito; 3º) existência de erro no modo de aquisição, deixa de produzir seu efeito, sendo, portanto, justo título ‘o ato translativo que não produziu efeito, o título de aquisição ineficaz’ (71).A maioria da doutrina coloca como requisito indispensável para a configuração do justo título a transcrição no registro imobiliário, para adquirir-se a propriedade. Nesse sentido, comenta Washington de Barros (72) que ‘a transcrição é ainda outro requisito para que o título havido seja como justo. Sem essa formalidade, inexiste aquisição do domínio. Título não registrado não preenche a condição primacial para que seja havido como justo’.Por outro lado, vem crescendo o entendimento de que a transcrição não é elemento essencial ao justo título, pois que, como elucida Pontes de Miranda (73), ‘a) se o título foi transcrito e houve boa-fé, se transferiu a propriedade, portanto, é absurdo exigir-se para o usucapião título justo transcrito e boa-fé; b) se tem confundido na maioria dos acórdãos plano da existência e plano da eficácia, o que se exige é o titulo habilis ad dominium transferendum, e não o título que haja transferido (se transferiu, tollitur quaestio)’.Porém, o mencionado autor admite o justo título sem transcrição, mas exige que o título tenha efeito erga omnes. Desta forma, não se pode apresentar como título para se adquirir, por usu-capião contra alguém, escrito particular que não tem efeito erga omnes (74).Entretanto, a doutrina mais recente vem reconhecendo o compromisso de compra e venda como justo título para os efeitos de usucapião ordinário, o que vem repercutindo em vários julgados (75). José Osório de Azevedo Júnior, a esse respeito, conclui que ‘forçoso é admitir o compromisso como título hábil para gerar usucapião ordinário. Trata-se de um negócio jurídico que, abstratamente considerado, leva à aquisição do domínio, pois, negando-se o promitente--vendedor a outorgar a escritura definitiva, a sentença produzirá os mesmos efeitos’ (76).Segundo o Professor Nélson Luiz Pinto (77), não se pode deixar de reconhecer ao compromis-sário comprador, que quita o preço, o animus domini, a intenção de possuir a coisa como sua, como proprietário, independentemente de estar ou não o instrumento registrado. As formali-dades legais, inclusive a transcrição, devem ter em vista a interpretação da lei em função da realidade social, adequando os institutos jurídicos aos anseios da coletividade.Dessa forma, conclui o citado professor que ‘não é só o compromisso de compra e venda como qualquer outro documento que retrate uma justa causa possessiones, posse com animus domini, e que possibilitaria ao possuidor futura transcrição desse documento ou substituição por outro definitivo, como é o caso, por exemplo, da promessa de cessão de direitos heredi-tários, de dação em pagamento, etc., desde que, naturalmente, cumprida a contraprestação do adquirente’ (78).Além do justo título, é indispensável para o usucapião ordinário que o prescribente esteja de boa-fé. Esta, por sua vez, apesar da caracterização dada pelo art. 490 do CC, traz muitas controvérsias na doutrina e na jurisprudência.No Direito pátrio, como já se disse na introdução desse tópico, encontram-se autores que separam ou fundem conceitos de justo título e boa-fé. Porém, como ressalta Nélson Luiz Pinto (79), ‘a separação desses conceitos se faz necessária, principalmente porque o justo título deve ter uma existência objetiva, ao lado da boa-fé, para que viabilize o usucapião ordinário previsto pelo art. 551 do CC’.Observa Caio Mário da Silva Pereira (80) que ‘boa-fé é a integração ética do justo título [...] e reside na convicção de que o fenômeno jurídico gerou a transferência da propriedade. Inter-namente, a boa-fé assenta na convicção de não ofender o possuidor um direito alheio [...], ou no erro de entendimento do possuidor que, razoavelmente, se supõe proprietário’. Ressalte-se que o que importa é a ignorância de se estar lesando direito alheio.A boa-fé ou é plena, total, ou não existe. Assim, há de estender-se sem qualquer interrupção durante todo o período prescricional, ou seja, deve a boa-fé perdurar durante todo o tempo necessário para a aquisição por usucapião, não bastando a sua incidência no momento da aquisição. Esse é o entendimento de Armando Roberto Holanda Leite (81), para quem ‘a su-perveniência de má-fé impede a consumação do usucapião ordinário, devendo, pois, a boa-fé ocorrer do início ao fim do prazo prescricional.Revela-se, por fim, que no usucapião extraordinário a boa-fé não é tratada como critério obje-tivo e, por sua vez, não admite prova em contrário. No ordinário, a boa-fé se presume, admi-

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tindo, porém, prova em contrário. A prova incumbe a quem a alega. Destarte, no usucapião ordinário milita a presunção iuris tantum de boa-fé em razão do justo título, é o que se nota pela leitura do parágrafo único do art. 490 do CC (82).” (Usucapião. Disponível em: online.sintese.com)

2007 – usucapião – modo originário de aquisição da propriedade – ausência de transmissão

“Usucapião. Modo originário de aquisição da propriedade. Ausência de transmissão de um sujeito a outro. Imóvel inserido em loteamento considerado irregular. Irrelevância. Usucapião que tem como um dos escopos a regularização da ocupação irregular de área, legitimando a posse de moradores que ali permanecem, salvo má-fé. Sentença mantida. Recurso desprovido.” (TJSP – Ap 0001746-96.2009.8.26.0450 – Piracaia – 1ª CDPriv. – Rel. Luiz Antonio de Godoy – DJe 16.09.2014 – p. 1244)

2008 – usucapião – requisitos – reexame de prova

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Usucapião. Requisitos. Reexame de prova. 1. Inviável a análise do recurso especial quando dependente de reexame de matéria fática da lide (Súmula nº 7 do STJ). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 447.641 – (2013/0403615-9) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 20.10.2014 – p. 2293)

2009 – usucapião extraordinária – cessão de posse – soma dos antecessores – lapso temporal vintenário – não demonstração

“Direito civil. Usucapião extraordinária. Cessão de posse. Soma da posse dos antecessores. Lapso temporal vintenário não demonstrado. Posse ad usucapionem não configurada. Ônus dos autores. Improcedência mantida. Recurso negado. 1. A ausência de provas, por omissão da parte autora, que se limita a apresentar parcos e insuficientes documentos, a par de declarações contraditórias às suas alegações, importa no reconhecimento da ausência de configuração de posse ad usucapionem, impedindo o reconhecimento da prescrição aquisitiva alegada. 2. Apelação cível a que se nega provimento. Acórdão.” (TJPR – AC 1131188-5 – 17ª C.Cív. – Rel. Juiz Subst. Francisco Jorge – DJe 15.09.2014 – p. 293)

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Parte Geral – Doutrina

Peculiaridades do Contrato de Corretagem no Direito Brasileiro

DAnIEL USTáRROz Professor Adjunto de Direito Civil na PUCRS, Doutor em Direito Civil pela UFRGS, Advogado.

SUMÁRIO: 1 Conceito e função; 2 Natureza jurídica da corretagem; 3 Abordagem dos principais deveres do corretor; 4 A remuneração do corretor; 5 A responsabilidade pelo adimplemento da co-missão; 6 Análise da cláusula de exclusividade (artigo 726); 7 Uma questão polêmica: a necessidade de inscrição no Creci.

1 cONceITO e FUNçÃO

Segundo a dicção do art. 722, “pelo contrato de corretagem, uma pes-soa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas”. Já se observa a nota característica da corretagem: a tentativa de aproximação de potenciais contratantes1. O corre-tor é um intermediário com a missão de encontrar pessoas dispostas a contratar nos termos desejados por seu cliente.

Nesse sentido, aponta Orlando Gomes que a atividade do corretor con-siste

em aproximar pessoas que desejam contratar, pondo-as em contato. Cumpre sua função aconselhando a conclusão do contrato, informando as condições do ne-gócio e procurando conciliar os interesses de pessoas que aproxima. A relação jurídica entre as partes e o corretor não surge exclusivamente do negócio con-tratual de mediação, pois direitos e obrigações nascem também do simples fato de que o intermediário haja concorrido de modo eficaz para a aproximação das partes na conclusão do negócio.2

Como se observa, o corretor procura aproximar pessoas com interesses complementares. Em algumas oportunidades, os sujeitos que foram apresenta-dos pelo corretor conseguirão celebrar um negócio jurídico, encontrando con-dições satisfatórias para ambos. Em outras tantas, não. É por isso que Araken

1 No conceito proposto por Caio Mário da Silva Pereira, observa-se a importância da intermediação: “O contrato de corretagem é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante remuneração, a agenciar negócios para outra, ou fornecer-lhe informações para celebração de contrato. É intermediação que o corretor realiza, pondo o outro contratante em contato com pessoas, conhecidas ou desconhecidas, para a celebração de algum contrato, ou obtendo informes, ou conseguindo o que aquele necessita” (Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, v. 3, 1995. p. 244.

2 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 380.

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de Assis destaca que, neste tipo contratual, “alguém se obriga a contratar pos-síveis interessados em contratar com outra pessoa, em geral compra e venda. Transforma-se a atividade do corretor numa interferência feliz, concluindo-se o negócio almejado”3. É justamente com a formação deste segundo negócio ju-rídico – entre terceiros – que surgirá ao corretor o direito a obter remuneração, como será observado adiante.

2 NaTUreZa JUrÍDIca Da cOrreTaGeM

Tendo em vista que o consenso é suficiente para a sua formação, a corre-tagem é um contrato meramente consensual4. Não se exige qualquer prestação ou a entrega de determinado bem para que ele tenha valor jurídico. Pode ser formado por variados meios, desde que presente o consenso das partes.

A sua qualificação como bilateral é discutida em sede doutrinária. Orlando Gomes reputa que “o contrato de corretagem é simplesmente unilate-ral porque não se obriga a cuidar do negócio e levá-lo a bom termo. Se ficasse a cargo de corretor, o contrato não seria de simples mediação. Admite-se, não obstante, que não se desfigura se houver estipulação condicionando o paga-mento da retribuição à circunstância de se concluir o negócio. Obriga o corre-tor a praticar atos de execução de que se tenha incumbido. Nessa hipótese, o contrato é bilateral”5. De seu turno, Caio Mário da Silva Pereira reputa bilateral o contrato, “porque gera obrigações para os ambos contratantes”6. Entendemos que esta segunda corrente, do mestre fluminense, é mais coerente com o con-trato, pois, na verdade, é a remuneração do corretor que depende do negócio fechado. De resto, os deveres assumidos pelas partes brotam desde a contrata-ção e, como será abaixo analisado, eles estão distribuídos de forma semelhante.

Outrossim, o contrato de corretagem é oneroso. Na linha do art. 724, “a remuneração do corretor, se não estiver fixada em lei, nem ajustada entre as partes, será arbitrada segundo a natureza do negócio e os usos locais”. Por-tanto, quando as partes silenciam a respeito da comissão, é cabível a “ação de arbitramento de honorários”, os quais serão fixados consoante os parâmetros da natureza do negócio, dos usos locais, do tempo dispendido para a aproximação das partes, a qualidade do assessoramento, entre outros critérios.

Por fim, destaca-se que o contrato não é solene, muito embora seja de todo aconselhável a sua celebração por escrito, para estampar o que foi acor-

3 ASSIS, Araken de. Contratos nominados: mandato, comissão, agência e distribuição, corretagem, transporte. São Paulo: RT, 2005. p. 247.

4 Refere Araken de Assis, a este respeito, que, “além de típico, ou nominado, o contrato de corretagem é consensual. Ele se completa com a simples anuência de que o corretor atue para obter o negócio, acolhendo instruções do incumbente quanto ao negócio visado” (op. cit., p. 248).

5 GOMES, Orlando. Op. cit., p. 381.6 Instituições de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. III, 1995. p. 245.

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dado e dirimir futuras dúvidas. Desta forma, poderá ser provado por distintos meios, como a troca de e-mails ou fax, ligações telefônicas, bem como com o aproveitamento da prova testemunhal, desde que idônea, logicamente7.

3 abOrDaGeM DOS PrINcIPaIS DevereS DO cOrreTOr

Se fôssemos resumir os principais deveres do corretor, utilizaríamos a seguinte frase: o corretor deve ser fiel ao seu cliente, zelando pelos seus interes-ses e pela sua proteção8. Quem contrata um corretor espera que o profissional seja pró-ativo, que vasculhe o mercado em busca de oportunidades. Imagina que contará com a assessoria competente, por parte de um corretor que detém conhecimento específico. Nesse sentido, surge o dever do corretor de colocar o cliente à par das condições do mercado, da realidade subjacente ao negócio pretendido, com o objetivo de esclarecer ao cliente quanto às reais chances de consecução do fim colimado. Percebendo que o preço fixado pelo cliente é muito distante do valor de mercado do bem, o cliente poderá eventualmente adequá-lo ou aguardar um período para realizar o negócio. Estes ajustes são essenciais para ampliar a chance de sucesso da contratação.

O art. 38 do Decreto nº 81.871/1978 arrola infrações disciplinares do corretor de imóveis, as quais são caracterizadas justamente em face da não ob-servância de seus deveres profissionais. São consideradas infrações: (I) transgre-dir normas de ética profissional; (II) prejudicar, por dolo ou culpa, os interesses que lhe forem confiados; (III) exercer a profissão quando impedido de fazê-lo ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos ou impedidos; (IV) anunciar publicamente proposta de transação a que não esteja autorizado por meio de documento escrito; (V) fazer anúncio ou impresso relativo à ativi-

7 Desta forma, a ausência de contratação escrita de forma alguma inibe o recebimento da comissão, desde que comprovado por outros meios a efetiva contratação. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – COMISSÃO DE CORRETAGEM – INTERMEDIAÇÃO DE COMPRA E VENDA MERCANTIL INTERNACIONAL – AUSÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO – PROVA SUFICIENTE DA INTERMEDIAÇÃO E DA REALIZAÇÃO DOS NEGÓCIOS – 1. A atividade econômica da autora caracterizou-se como de intermediação de negócios mercantis, realizada através do contrato de corretagem, atualmente disciplinado pelos arts. 722 e seguintes do CC, e não o contrato de comissão, ora disciplinado nos arts. 693 e seguintes do CC, nem tampouco o contrato de representação comercial autônoma, regulado pela Lei nº 4.886/1965. 2. No contrato de corretagem, ‘a remuneração do corretor, se não estiver fixada em lei, nem ajustada entre as partes, será arbitrada segundo a natureza do negócio e os usos locais’ (art. 724 do CC). 3. Restando evidenciado pela prova produzida que os usos correntes no Brasil, no negócio celebrado entre as partes – exportação de couros wet blue – que a comissão do intermediador é paga pelos exportadores, e não pela importadora, é devida a comissão pela requerida. 4. Os documentos constantes nos autos são suficientes para confortar a versão esposada na inicial, no sentido de que a ré se obrigou a pagar à autora comissão de 3% sobre os negócios intermediados pela autora, relativamente à remessa de couros para a Empresa italiana Divania. 5. Concretizadas as vendas, e inadimplido o pagamento da comissão, impõe-se o acolhimento da pretensão. Apelo provido” (TJRS, AC 70036347318, 19ª C.C., Des. Rel. Eugênio Facchini Neto, J. 06.12.2011).

8 “Art. 723. O corretor é obrigado a executar a mediação com diligência e prudência, e a prestar ao cliente, espontaneamente, todas as informações sobre o andamento do negócio. Parágrafo único. Sob pena de responder por perdas e danos, o corretor prestará ao cliente todos os esclarecimentos acerca da segurança ou do risco do negócio, das alterações de valores e de outros fatores que possam influir nos resultados da incumbência.”

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dade profissional sem mencionar o número de inscrição; (VI) anunciar imóvel loteado ou em condomínio sem mencionar o número do registro do loteamen-to ou da incorporação no Registro de Imóveis; (VII) violar o sigilo profissio-nal; (VIII) negar aos interessados prestação de contas ou recibo de quantia ou documento que lhe tenham sido entregues a qualquer título; (IX) violar obri-gação legal concernente ao exercício da profissão; (X) praticar, no exercício da atividade profissional, ato que a lei defina como crime de contravenção; (XI) deixar de pagar contribuição ao Conselho Regional; (XII) promover ou fa-cilitar a terceiros transações ilícitas ou que por qualquer forma prejudiquem interesses de terceiros; (XIII) recusar a apresentação de Carteira de Identidade Profissional, quando couber.

De outra banda, o corretor não tem o dever de elaborar contratos ou analisar as suas cláusulas. Esta é uma atividade que compete à parte, que tem a prerrogativa de ser orientada por advogado, caso assim deseje9.

Como se observa, espera-se diligência do corretor, com atenção aos usos e costumes do mercado, bem como às normas legais. Ao exercer a sua atividade com seriedade, ampliará a chance de satisfação do cliente (com a viabilização do negócio pretendido) e fará jus à remuneração acordada, a qual será analisa-da no tópico seguinte.

4 a reMUNeraçÃO DO cOrreTOr

Conforme o art. 725, “a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes”. Interpretando o dispositivo, a doutrina sugere existir uma “obrigação de resultado”, porquanto a remuneração do corretor é vinculada ao sucesso de sua atividade10.

À luz deste dispositivo, fica estampado que o corretor apenas terá direito à remuneração quando propiciar, efetivamente, a celebração do contrato dese-jado pelo cliente. Desta forma, nada será devido caso o corretor, em que pese dedicar dezenas de horas de trabalho, não encontrar um interessado que aceite as condições desejadas por seu cliente. Como nenhum contrato será formaliza-

9 Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: “Para que seja devida a comissão, basta a aproximação das partes e a conclusão bem-sucedida de negócio jurídico. A participação efetiva do corretor na negociação do contrato é circunstância que não desempenha, via de regra, papel essencial no adimplemento de sua prestação. Portanto, esse auxílio, posterior à aproximação e até a celebração do contrato, não pode ser colocado como condição para o pagamento da comissão devida pelas comitentes” (REsp 1.072.397/RS, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 09.10.2009).

10 Ensina Washington de Barros Monteiro: “Cuida o contrato de corretagem de obrigação de resultado, uma vez que o corretor obriga-se perante o comitente a obter para este ou mais negócios, conforme as instruções recebidas. A remuneração ao corretor só será devida uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação” (Curso de civil: direito das obrigações, 2ª parte. São Paulo: Saraiva, v. 5, 2003. p. 316).

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do, nenhum valor poderá cobrar, a despeito de sua dedicação. Contudo, caso, por uma coincidência do destino, o corretor na primeira hora de trabalho tenha a sorte de conhecer um sujeito que se interesse pelo negócio e forme com o seu cliente o negócio idealizado, terá pleno direito à remuneração pactuada. Nessa segunda hipótese, por aquelas poucas horas de serviço, receberá uma quantia significativa, que servirá para compensar o esforço em vão naquelas outras contratações.

Este arcabouço geral do direito à remuneração resolve a maioria dos casos. Contudo, há situações problemáticas, as quais geram conflito entre os contratantes. Um caso típico ocorre quando, após a celebração do contrato, observa-se o inadimplemento do terceiro. Figure-se o exemplo da compra e venda. Caso o corretor apresente ao seu cliente uma pessoa disposta a pagar o preço pretendido pelo apartamento e o contrato seja assinado, inclusive com o pagamento da comissão da corretagem, deverá o corretor restituir o valor, caso, no futuro, o comprador se mostre inadimplente em relação à integralização do preço? De um lado, argumentará o corretor que o seu trabalho foi bem executa-do, afinal o negócio foi viabilizado pela sua atuação, razão pela qual será justo receber a remuneração. De outro, o vendedor se mostrará insatisfeito, afinal, além de privado da posse do bem, necessitará ingressar em juízo para postular a resolução do contrato por inadimplemento do comprador, tendo ao fim o dever de restituir ao menos parcela do que recebeu por ocasião da contratação?

Consideramos correta a posição do Professor Arnoldo Wald, quando destaca que a remuneração do corretor independe do adimplemento das par-tes quanto ao contrato que as vincula. Ensina o mestre que: “A corretagem é devida, independentemente do cumprimento das obrigações entre comprador e devedor. Anteriormente ao advento do nosso Código Civil, por exemplo, a jurisprudência já decidira que descabe sujeitar o pagamento da corretagem à assinatura da escritura definitiva se as partes já chegarem a um acordo quanto aos pontos essenciais da alienação”11. Com efeito, tratam-se de relações distin-tas e como tal devem ser tratadas. O contrato de corretagem vincula o cliente e o corretor. Já o de compra e venda, o cliente do corretor e um terceiro. Em cada negócio, há individualidade, de sorte que as partes, os deveres e o objeto são distintos.

O contrato de corretagem não é acessório do principal. Bem assinala Araken de Assis:

É frequente reputar-se o contrato de mediação, ou de corretagem, acessório do contrato principal. No entanto, o contrato de corretagem pode existir, valer e mostrar-se eficaz, inclusive quanto à remuneração, independentemente do des-fazimento do contrato obtido pela atividade intermediadora, conforme resulta

11 Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2009. p. 250.

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da parte final do art. 725. Ora, o autêntico contrato “acessório”, ou dependente, acompanha a sorte do “principal”. Por isso, a afirmativa de que o contrato é aces-sório contradiz a “noção mesma de acessoriedade dos contratos”, ou, como pre-fere Gustavo Tepedino, afigura-se “tecnicamente injustificada”, uma ilusão pro-vocada pela íntima relação econômica entre a corretagem e o contrato obtido.12

Esta posição foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça, em acórdão que foi alvo de notícia publicada no Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça13. O acórdão da Terceira Turma assentou que,

para o efeito de tornar devida a remuneração a que faz jus o corretor, a mediação deve corresponder somente aos limites conclusivos do negócio jurídico, median-te acordo de vontade entre as partes, independentemente da execução do próprio negócio. A inadimplência das partes, após a conclusão deste, mesmo que acarre-te a rescisão contratual, não repercute na pessoa do corretor.

Nessa linha, como bem salienta Flávio Tartuce, pouco importa se o “con-trato principal” for desfeito no futuro, pois “o que se remunera é a utilidade da atuação do corretor ao aproximar as partes e o respeito aos deveres que lhe são inerentes. Nessa utilidade é que está a finalidade do negócio jurídico em questão”14.

Outra questão polêmica reside na celebração de contrato de compra e venda e posterior recusa por parte de instituição financeira de fornecer os va-lores para a satisfação do crédito. Novamente, aqui, consideramos que, salvo disposição contratual em sentido contrário, terá o corretor direito a perceber a sua remuneração, uma vez que propiciou a contratação. Se é ou não viável a

12 Contratos nominados. São Paulo: RT, v. 2, 2005. p. 248.13 Notícia publicada no Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “DIREITO CIVIL –

DIREITO AO RECEBIMENTO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM – Ainda que o negócio jurídico de compra e venda de imóvel não se concretize em razão do inadimplemento do comprador, é devida comissão de corretagem no caso em que o corretor tenha intermediado o referido negócio jurídico, as partes interessadas tenham firmado contrato de promessa de compra e venda e o promitente comprador tenha pagado o sinal. Conforme o art. 725 do CC/2002, ‘a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude do arrependimento das partes’. A realização de um negócio jurídico de compra e venda de imóvel é um ato complexo, que se desmembra em diversas fases – incluindo, por exemplo, as fases de simples negociação, de celebração de contrato de promessa de compra e venda ou de pagamento de arras – até alcançar sua conclusão com a transmissão do imóvel, quando do registro civil do título imobiliário no respectivo Cartório de Registro, nos termos do art. 1.227 do CC/2002. Nesse contexto, somente com a análise, no caso concreto, de cada uma dessas fases, é possível aferir se a atuação do corretor foi capaz de produzir um resultado útil para a percepção da remuneração de que trata o art. 725 do CC/2002. Assim, para o efeito de tornar devida a remuneração a que faz jus o corretor, a mediação deve corresponder somente aos limites conclusivos do negócio jurídico, mediante acordo de vontade entre as partes, independentemente da execução do próprio negócio. A inadimplência das partes, após a conclusão deste, mesmo que acarrete a rescisão contratual, não repercute na pessoa do corretor” (REsp 1.339.642/RJ, Relª Min. Nancy Andrighi, Julgado em 12.03.2013).

14 Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 8. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 535.

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consecução de um financiamento imobiliário, este risco não é do corretor, mas das partes15.

Distinta seria a hipótese se o contrato de compra e venda não tivesse sido celebrado. Apreciando um caso concreto, no qual ficou evidenciada a falta de regularidade dos documentos necessários à transmissão de propriedade, bem como a existência de intransponíveis óbices ambientais, malgrado a aproxima-ção dos negociantes tenha sido propiciada pelo corretor, nenhuma remunera-ção lhe foi deferida16.

5 a reSPONSabILIDaDe PeLO aDIMPLeMeNTO Da cOMISSÃO

Não há dúvidas quanto à natureza onerosa da corretagem. Contudo, a lei silencia a respeito da responsabilidade pelo adimplemento da comissão. Muitas pessoas, quiçá pelo costume social, imaginam que este custo deve recair sobre o vendedor. Trata-se, porém, de apenas uma impressão que não é esposada pela lei civil. Há silêncio, no Código Civil, quanto ao tema.

Com base nessa realidade, alguns autores sugerem que o ônus seja supor-tado pelo vendedor. Por ilustração, o magistério de Arnaldo Rizzardo:

O costume predominante é no sentido de que, salvo disposição em contrário, a comissão corre por conta do comitente. De sorte que a venda procedida por um corretor a um comprador que não o procurou determina a obrigação de unica-mente o vendedor pagar a remuneração. Não se parece razoável, nem fundado em direito, impor-se, ao comprador de um imóvel, o ônus de pagar a comissão a corretor com quem nada contratou e que somente prestou os serviços que lhe foram solicitados pelo vendedor.17

O autor gaúcho, na passagem anteriormente citada, parte do pressuposto de que quem contratou o corretor foi o vendedor, logo não seria lícito imputar ao comprador, que desconhecia o corretor e que não o procurou, a obrigação de pagar a comissão. Desta forma, alcança-se a conclusão de que, em verdade, quem deve arcar com esta remuneração é o interessado, que procura o corretor

15 Sobre o tema, assim decidiu o TJRS: “AÇÃO ORDINÁRIA – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA – DANOS MORAIS – Danos morais inexistentes em razão do risco do negócio. A não realização do negócio decorreu de ausência de financiamento por parte da autora junto à CEF, não havendo provas da responsabilidade da demandada no evento. Os valores pagos pela autora, a título de comissão de corretagem, pagos ao profissional que intermediou o negócio, não são passíveis de devolução. Sentença mantida. Apelo desprovido. Unânime” (TJRS, AC 70053806311, 20ª C.Cív., Rel. Des. Rubem Duarte, J. 24.04.2013).

16 Íntegra da ementa: “APELAÇÃO CÍVEL – PROCESSO DE EXECUÇÃO – COBRANÇA DE COMISSÃO DE CORRETAGEM – Restando incontroverso que, não obstante o autor tenha aproximado as partes, o negócio fora realizado sem a presença do corretor e não se perfectibilizou em virtude da falta de regularização dos documentos e liberação ambiental. Assim, considerando que não houve resultado útil para ambos os contraentes, a comissão de corretagem não é devida. Precedentes jurisprudenciais. Apelação provida” (TJRS, AC 70039386156, 16ª C.Cív., Relª Desª Ana Maria Nedel Scalzilli, J. 18.04.2013).

17 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 786.

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e o contrata. Pode ter sido o vendedor ou o comprador. A posição da parte no contrato é irrelevante. O que vale é a contratação da corretagem e não a da compra e venda ou outro negócio almejado.

Quanto ao ponto, muito pertinente a lição do Professor Antônio Carlos Mathias Coltro: “Por vezes, é o interessado na compra a procurar um corretor, obrigando-se, perante ele, a responder pela comissão devida, se conseguir en-contrar um imóvel conforme o solicitado ou se obtiver o acordo do proprietário para a venda de determinado imóvel”18. Prossegue o eminente jurista, salien-tando que “poderão ser responsáveis, ainda, ambos os contratantes, desde que haja expressa convenção neste sentido, o mesmo ocorrendo quanto a responder terceiro pela paga da corretagem, devendo ele assentir no acordo para tanto estabelecido”19.

Com efeito, absolutamente nada impede que as pessoas acordem a divi-são dos custos da corretagem, quer em partes iguais ou distintas. É plenamente lícito que o vendedor arque com 30% ou 50% da comissão e comprador com 70%, ou 50% ou 100%, desde que haja acerto entre os interessados. Se não houver esta divisão, vale a regra geral: a comissão é paga por quem contratou e foi brindado com o assessoramento do corretor.

É lapidar a conclusão de Araken de Assis: “Respeitada a natureza do contrato de corretagem, que pressupõe a obrigação de o corretor obter para o incumbente determinado negócio (art. 722), desaparece toda dúvida acerca do devedor da comissão: trata-se da pessoa que contratou o corretor”. Ao propó-sito, assentou a 1ª Turma do STF: “A comissão constitui obrigação a cargo de quem incumbe a realização da corretagem. Via de regra, a comissão do corretor é devida pelo vendedor”. No mesmo sentido, a 4ª Turma do STJ proclamou o seguinte: “Em princípio, quem responde pelo pagamento da comissão é aquele que contratou o corretor, ou seja, o comitente”20.

No mesmo sentido é a posição de Arnoldo Wald: “Cliente é aquele que contrata o corretor para realizar o negócio. Esse contratante, caso seja efeti-vado o negócio pretendido, deve remunerar o corretor. A outra parte, que é aproximada, não se configura como cliente no contrato de corretagem e, por consequência, não tem a obrigação de pagar a comissão, que certos corretores exigem, recebendo duplamente”21. Outro não é o alvitre de Vera Helena de Mello Franco: “O intermediário tem direito a receber uma comissão por sua

18 COLTRO, Antônio Carlos Mathias. Contrato de corretagem imobiliária. 3. ed. São Paulo: Atlas. p. 162.19 Idem, ibidem.20 Op. cit., p. 266.21 Direito civil, contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2009. p. 247/248.

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atuação e é esta a principal obrigação de quem contratou seus serviços (art. 724 do CC/2002)”22.

Desta forma, quem deve arcar com a remuneração do corretor é a pessoa que o contrata, como regra. Caso haja cláusula contratual (ou estampado por outro meio inequívoco) o acerto para uma fórmula diversa, então pela autono-mia privada esta nova composição é que deve ser prestigiada.

6 aNÁLISe Da cLÁUSULa De eXcLUSIvIDaDe (arTIGO 726)

Como regra, o corretor não possui exclusividade para a realização da-quele negócio indicado pelo cliente. Com efeito, registra a prática o costume das pessoas contratarem diversos corretores, imaginando que assim encontrarão um número maior de interessados, o que potencializará a chance de efetiva contratação. Nesses casos, aquele corretor que, por competência ou sorte, en-contrar o terceiro que realize negócio com o seu cliente receberá a remunera-ção convencionada.

Todavia, nada proíbe a estipulação de exclusividade em favor de um corretor ou de uma empresa de corretagem. Embora não usual, esta exclusivi-dade pode ser importante para viabilizar os investimentos necessários para a divulgação do produto. Com a certeza do recebimento da comissão, o corretor encontra maior tranquilidade para trabalhar, envitando o máximo esforço para atender o seu cliente.

Quando, portanto, é estabelecida a exclusividade em favor do corretor, quer por cláusula contratual expressa, quer por outro meio absolutamente idô-neo de prova documental (como a troca de e-mails, cartas, etc.), prevê a lei que o corretor tenha direito à remuneração integral, ainda que realizado o negócio sem a sua mediação.

A norma é justificada por duas especiais razões. Inicialmente, a exclu-sividade transmite a ideia de que o cliente deveria encaminhar ao corretor os eventuais interessados, abstendo-se de fechar negócios isoladamente ou com o auxílio de outros corretores. Ademais, a exclusividade gera a expectativa de que o corretor irá dedicar a maior parte do seu tempo atendendo a este determinado contrato, que lhe brindou com o monopólio da negociação com terceiros. Daí o seu direito a ser remunerado, ainda que o negócio seja formalizado sem a sua efetiva contribuição.

Todavia, a lei contempla exceção. Trata-se da difícil prova, cujo ônus incumbe ao cliente, de demonstrar a ausência de zelo por parte do corretor na condução de seu trabalho. Provada a sua inércia ou ociosidade, desaparece o

22 Contratos direito civil e empresarial. 4. ed. São Paulo: RT, 2013. p. 295.

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128 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – DOUTRINA

direito à remuneração pelos negócios que foram realizados, independentemen-te de sua contribuição.

7 UMa QUeSTÃO POLÊMIca: a NeceSSIDaDe De INScrIçÃO NO crecI

Há divergência acerca da necessidade de inscrição do corretor em órgão de classe para justificar o recebimento da comissão.

De um lado, surgem precedentes que consideram típica, sob a ótica pe-nal, a atividade de corretagem sem o competente registro no Conselho. Assen-tou o Superior Tribunal de Justiça, em precedente da Terceira Seção Turma, que

a conduta do agente que exerce atividades de corretagem de imóveis após o cancelamento de sua inscrição no Creci, por inadimplência das anuidades devidas, se amolda à contravenção penal prevista no art. 47 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, haja vista que permaneceu clandestinamente na profissão regu-lamentada, exercendo-a sem o preenchimento de condição legal a que está su-bordinado o seu exercício, qual seja, inscrição perante o órgão de fiscalização profissional.23

Com efeito, muitos julgados destacam o trabalho em concreto realizado pelo “corretor”, valorizando o papel da intermediação na consecução do negó-cio24. Em sede doutrinária, é a posição de Araken de Assis:

23 Íntegra da ementa: “CONFLITO DE COMPETÊNCIA – PENAL – CORRETOR DE IMÓVEIS – EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES APÓS CANCELAMENTO DE SUA INSCRIÇÃO NO CRECI, POR INADIMPLÊNCIA DAS ANUIDADES – CONTRAVENÇÃO PENAL CONFIGURADA (ART. 47 DO DECRETO-LEI Nº 3.688/1941) – EXERCÍCIO ILEGAL DA PROFISSÃO OU ATIVIDADE – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL – 1. A conduta do agente que exerce atividades de corretagem de imóveis após o cancelamento de sua inscrição no Creci, por inadimplência das anuidades devidas, se amolda à contravenção penal prevista no art. 47 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, haja vista que permaneceu clandestinamente na profissão regulamentada, exercendo-a sem o preenchimento de condição legal a que está subordinado o seu exercício, qual seja, inscrição perante o órgão de fiscalização profissional. 2. Não há que se falar, no caso dos autos, de violação à decisão administrativa proibitiva do exercício de atividade e, consequentemente, no crime previsto no art. 205 do CP, haja vista o disposto nos arts. 3º, 4º e 5º da Resolução nº 761/2002 do Conselho Federal de Corretores de Imóveis – Cofeci, no sentido de que o pagamento do débito acarreta a restauração automática da inscrição no Creci, e que ‘o cancelamento de inscrição por falta de pagamento [...] não representa punição disciplinar mas, sim, mero ato administrativo de saneamento cadastral’. 3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 1ª Vara do Juizado Especial Cível e Criminal de Poços de Caldas/MG, o suscitado” (CC 104.924/MG, 3ª S., Rel. Min. Jorge Mussi, J. 24.03.2010, DJe 19.04.2010).

24 Por ilustração: “CORRETAGEM – INTERMEDIAÇÃO DE VENDA DE IMÓVEL RURAL – COMPROVADA – INSCRIÇÃO NO CRECI – DESNECESSIDADE – COMISSÃO DEVIDA – É desnecessário o registro no Conselho Regional de Corretores de Imóvel Creci para legitimar a cobrança da comissão devida em razão de contrato de corretagem. Comprovada a intermediação pelo autor no atinente à venda do imóvel, faz jus à remuneração devida pelo trabalho desenvolvido. Contudo, pelo que se depreende dos autos, já foi alcançada ao corretor a remuneração pactuada, de modo que improcede o pleito deduzido na vestibular. Desproveram o apelo” (TJRS, 16ª C.Cív., AC 70030192876, Rel. Des. Paulo Sérgio Scarparo, J. 04.06.2009). No mesmo sentido: “AÇÃO DE COBRANÇA E RECONVENÇÃO – COMISSÃO DE CORRETAGEM – INTERMEDIAÇÃO DE VENDA – Desnecessária prova da inscrição no Creci para cobrança de comissão de corretagem, mostrando-se devida a comissão do corretor de imóveis pelo ato da intermediação da venda, conforme precedentes jurisprudenciais, inclusive do STJ. Valor da comissão: deve ser calculado com base no valor da venda atualizada. Correção monetária não é um plus que se agrega, mas um minus que se evita. RECONVENÇÃO – Prova do pagamento deve ser feito pelo reconvinte, pois trata-se de fato constitutivo do seu direito. Art. 333, I, do CPC. Negaram provimento. Unânime” (TJRS, 16ª C.Cív., AC 70019589324, Rel. Des. Ergio Roque Menine, J. 08.08.2007).

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É importante assinalar, relativamente aos corretores livres, que o direito à redistri-buição pecuniária não se vincula ao registro no órgão de classe competente. Por exemplo, a 1ª Turma do STF assentou que, pronunciada a inconstitucionalidade do art. 7º da Lei nº 4.116/1962 – diploma anterior à vigente Lei nº 6.530/1978 –, tornou-se ilegítima a exigência de registro profissional para cobrar a comissão. Do mesmo entendimento, já sob a vigência da lei nova, assim decidiu a 4ª Turma do STJ.25

Com razão, há precedentes das Turmas que compõem a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, valorizando a liberdade de exercício do tra-balho e coibindo o enriquecimento injustificado das pessoas que se valem da atividade de mediação e, após, recusam-se a adimplir o pactuado, sob funda-mento da inexistência de inscrição no Creci26.

Na nossa visão, uma alternativa razoável para evitar o enriquecimento sem causa da pessoa beneficiada pela atuação do corretor e para estimular o cumprimento da lei acerca do registro profissional seria a redução equitativa da comissão27.

25 Contratos nominados. São Paulo: RT, v. 2, 2005. p. 265.26 Por ilustração: “PROCESSO CIVIL – COBRANÇA DA COMISSÃO DE CORRETAGEM – PRESCINDÍVEL

A INSCRIÇÃO NO CRECI – INEXISTÊNCIA DE INFRINGÊNCIA AO ART. 401 DO CPC, UMA VEZ QUE O OBJETIVO PRINCIPAL DA DEMANDA NÃO É PROVAR A EXISTÊNCIA DO CONTRATO EM SI, MAS A DEMONSTRAÇÃO DOS EFEITOS DECORRENTES DO PACTO – 1. É possível a cobrança de valores decorrentes de intermediação exitosa para a venda de imóvel, sendo prescindível a inscrição do autor no Creci, pois é livre o exercício do trabalho e vedado o enriquecimento ilícito do vendedor. 2. Em verdade, não é permitido provar-se exclusivamente por depoimentos testemunhais a existência do contrato em si, mas a demonstração dos efeitos dos fatos que envolveram as partes, assim como da prestação de serviços, afigura-se perfeitamente admissível, conforme precedentes da Corte. 3. A mera transcrição de parte do voto paradigma, sem, contudo, providenciar-se a demonstração analítica, apontando os pontos divergentes entre os julgados, não induz ao conhecimento do dissídio. 4. De outro lado, ‘não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’. Súmula nº 83/STJ. Recurso não conhecido” (REsp 185.823/MG, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, J. 14.10.2008, DJe 03.11.2008).

27 Já decidiu o STJ que os profissionais regularmente inscritos não podem ser tratados da mesma maneira que aqueles que atuam à margem, sendo razoável a redução da comissão destes últimos: “CIVIL E PROCESSUAL – ACÓRDÃO ESTADUAL – NULIDADE NÃO CONFIGURADA – CORRETAGEM – ALEGAÇÃO DE INTERESSE DO INTERMEDIADOR NO NEGÓCIO – FATO NÃO COMPROVADO – REVISÃO – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ – INCIDÊNCIA – PERCENTUAL – CRITÉRIO – VOLUME DO NEGÓCIO – AUSÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO – CORRETOR NÃO INSCRITO EM ÓRGÃO DE CLASSE – REDUÇÃO – I – Não se configura nulidade no acórdão se o mesmo enfrentou suficientemente os temas essenciais ao deslinde da controvérsia, apenas que com conclusão desfavorável à parte. II – Impossibilidade de ser reexaminada a interpretação da matéria fática, em que o Tribunal estadual, soberano no seu exame, entendeu que houve o trabalho de intermediação, não demonstrado, na espécie, o interesse direto do corretor na realização do negócio, o que desfiguraria, em tese, a natureza da corretagem. Incidência da Súmula nº 7 do STJ. III – Percentual da comissão, contudo, extremamente elevado, dado o porte do negócio, a inexistência de contrato escrito e a circunstância de não se ter como razoável que a prática profissional sem a inscrição no Conselho de classe, submissão a fiscalização, pagamento de impostos e anuidade respectivas, possa gerar direitos iguais aos daqueles que exercem a atividade regularmente. Redução. IV – Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido” (REsp 331.638/SP, 4ª T., Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, J. 07.10.2003, DJ 24.11.2003, p. 309).

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Parte Geral – Doutrina

Breves Considerações sobre as Liminares na Ação de Despejo

GILBERTO CARLOS mAISTRO JUnIORAdvogado, Mestre em Direito, Professor e Coordenador Pedagógico do Curso de Especia-lização em Direito e Operações Imobiliárias da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP e do Curso de Especialização em Direito Processual Civil da Faculdade de Direito de Sorocaba/SP (Fadi), Professor Convidado no Curso de Especialização em Direito Imobiliário da Faculdade Legale/SP, Professor Contratado de Prática Jurídica na Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP, Professor Titular de Estágio II da Faculdade de Direito de Sorocaba/SP (Fadi), Professor Convidado em Diversos Programas de Pós-Graduação Lato Sensu.

RESUMO: As ações de despejo consistem no único instrumento para o locador reaver, em juízo, o imóvel locado. Ocorre que a morosidade da tramitação processual não raro emerge como fator de maximização dos prejuízos do locador, com a majoração do débito locatício, por vezes desprovido de melhores garantias, entre outras questões que conduzem à busca de tutelas liminares. Para tanto, nas nove hipóteses taxativamente elencadas no art. 59, § 1º, a Lei do Inquilinato permite ao locador reaver o imóvel de modo célere, com a concessão de liminar para desocupação do imóvel, pelo locatário, no prazo de quinze dias, tudo mediante caução, pelo autor, no valor equivalente a três alu-guéis. Nada obsta, porém, que, nas demais hipóteses de ação de despejo, o locador possa pleitear a satisfação liminar da sua pretensão com base na regra geral – e preenchidos os requisitos para tanto – do Código de Processo Civil, atual art. 273, o que restará mantido com o novo CPC, porém, à luz de novidades procedimentais, inclusive e principalmente no que toca às chamadas tutelas antecipadas com caráter antecedente, dos arts. 303 e 304.

PALAVRAS-CHAVE: Liminares; ação; despejo; lei; inquilinato; código; processo civil; tutela anteci-pada.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Liminares; 2 As hipóteses de liminares típicas na ação de despejo e os requisitos legais para a concessão; 3 Os sublocatários: ciência e prazo para desocupação; 4 A tutela antecipada, nos termos do atual CPC, artigo 273, na ação de despejo; 5 A antecipação de tutela em caráter antecedente nas ações de despejo e o novo Código de Processo Civil; Conclusão; Refe-rências.

INTrODUçÃO

Tratar-se-á, neste trabalho, das linhas gerais sobre as liminares na ação de despejo, com o propósito de introduzir o estudo do tema, observados limites suficientes para o início da atuação prática no que tange à propositura destas. Portanto, afasta-se do propósito da redação deste artigo esgotar o estudo sobre tema tão rico: pretende-se fornecer roteiro básico para uma análise propedêu-tica, porém confiável.

Nesse sentido, passa-se a tratar das liminares.

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1 LIMINareS

Como bem salienta Marcus Claudio Acquaviva, trata-se, a liminar, de: “Ordem judicial que determina uma providência a ser tomada antes da dis-cussão do feito, com a finalidade de resguardar direitos”1. No mesmo sentido, e de modo objetivo, afirma Daniel Mitidiero que a tutela é liminar, ou seja, concedida in limine, quando tal se dá “no início do processo”, mencionando, outrossim, a possibilidade de assim ocorrer “sem que se tenha citado a parte contrária – inaudita altera parte”2.

Entre as possíveis liminares admitidas pelo ordenamento pátrio, encon-tram-se aquelas de natureza cautelar (quando destinadas à determinação de providências necessárias à salvaguarda da utilidade e da eficácia de provimento jurisdicional principal, assumindo, assim, caráter acessório, e duplamente ins-trumental – por servir de instrumento para resguardo da efetividade de outro ins-trumento3), bem como as de natureza antecipatória. Trata-se de medida atrelada à noção de urgência4, verificada no caso concreto, e que deve ser concedida quando constatada a reunião dos requisitos legais para tanto (que variam, cabe destacar, de acordo com o procedimento).

Podem ser concedidas após a oitiva da parte contrária, ou, então, inaudita altera parte, a depender do caso e da reunião de requisitos para tanto. Nesse sentido, parece claro que o receio de dano irreparável ou de difícil reparação, inerente à noção de periculum in mora, ou, então, o risco da possibilidade do conhecimento da medida, pela parte contrária, viabilizar conduta ardilosa ten-dente a esvaziar o resultado almejado com a tutela de urgência, emerge como requisito central para a concessão da liminar inaudita altera parte.

1 Dicionário básico de Direito Acquaviva: de acordo com o novo Código Civil. 5. ed. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004. p. 182.

2 Daniel Mitidiero apud WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno (Coord.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015. p. 783.

3 Assim entendido o que se tenha por “processo principal”, ideia que cederá diante da alteração trazida pelo novo Código de Processo Civil, que fulminou o processo cautelar para fazer da tutela em questão espécie do gênero tutelas provisórias (“art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental”). Vale pontuar que se preservou a possibilidade de busca da tutela cautelar de modo incidental ou antecedente, como visto. Destaque-se que o novo CPC dedica os arts. 305 a 310 ao procedimento das cautelares requeridas em caráter antecedente. Por fim, vale destacar que autores como Daniel Mitidiero (idem, p. 777) negam ser a tutela cautelar “um instrumento do instrumento”. Nessa linha, Mitidiero, embora reconheça que a posição refutada é “endereço doutrinário comum no direito brasileiro”, citando, como exemplo, o escólio de Galeno Lacerda, filia-se à doutrina de Ovídio A.Baptista da Silva para afirmar que a tutela cautelar “presta tutela ao direito material”.

4 Na dicotomia do novo CPC, trata-se como tutelas provisórias tanto a cautelar quanto a antecipadas, que se classificam como tutelas de urgência, ao lado da tutela da evidência (a nosso ver, sempre de natureza antecipatória).

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2 aS HIPÓTeSeS De LIMINareS TÍPIcaS Na açÃO De DeSPeJO e OS reQUISITOS LeGaIS Para a cONceSSÃO

A Lei do Inquilinato (8.245/1991) traz, nos incisos do art. 59, § 1º, as hipóteses de liminares típicas, específicas, na ação de despejo. Neste trabalho, proceder-se-á à análise de uma a uma, de modo objetivo, mas suficiente à visão propedêutica almejada.

Antes, porém, necessário pontuar que, a teor do art. 59, § 1º, a concessão da liminar para desocupação em quinze dias, nas ações de despejo, dar-se-á independentemente da audiência da parte contrária (ou seja, inaudita altera parte), o que não colide com o contraditório, princípio constitucional do pro-cesso esculpido no art.5º, LV, do Texto Maior. Tem-se, aqui, o que se chama de “contraditório diferido”, de modo que não há a supressão da possibilidade de participação da parte contrária no processo de formação do convencimen-to do juiz, mas, apenas, um postergar do momento oportuno para tanto, em razão da relevância da medida diante da concretização de situação hipotética aventada pelo legislador. Via de regra, tais hipóteses de liminares justificam-se na necessidade de estabilização da relação jurídica, e monitorizam, por assim dizer, o procedimento, para fim de afastar o risco da morosidade na entrega da prestação jurisdicional (a “demora do processo”) vir a servir de fator de con-traincentivo àqueles que empreendem no mercado imobiliário, ou nele atuam, dada a relevância do setor no contexto econômico e social.

Além disso, o mesmo § 1º do art. 59 da Lei do Inquilinato exige, como requisito para a concessão da liminar para desocupação do imóvel locado, a prévia prestação de caução, no valor equivalente a três meses de aluguel.

Algumas considerações são necessárias. A referida caução há de se dar por meio de depósito judicial com código específico para esse fim, cujo com-provante deve ser apresentado para juntada nos autos do processo. Recomenda--se que se tome a dita providência antes dos autos seguirem à conclusão do juiz (atual CPC, art. 285), com o objetivo de agilizar o trâmite procedimental e, con-sequentemente, a obtenção da concessão da liminar e expedição do respectivo mandado do modo mais célere possível.

Todavia, não se pode ignorar a possibilidade de propositura da ação de despejo com requerimento de concessão da mencionada tutela de cunho ante-cipatório sem, de início, comprovar-se a realização do dito depósito. Diversas razões de ordem prática conduziriam a tal opção, por parte do autor da ação. Uma delas – talvez a principal – reside no seguinte: e se o juiz não conceder a liminar? O autor já terá sofrido os prejuízos da imobilização da quantia equiva-lente a três aluguéis, sem o resultado prático almejado: duplo prejuízo, dupla frustração!

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Defende-se que, diante de quadro como o narrado, o juiz, caso reco-nheça a reunião dos demais requisitos para a concessão da liminar, deverá fazê-lo, com a fixação de prazo para a comprovação do depósito (caução), cuja observância passará a ser condição para a expedição do respectivo mandado (de citação e de intimação acerca da concessão da medida com ordem para desocupação no prazo de quinze dias)5, sob pena de revogação da liminar e prosseguimento do feito apenas com a citação do réu. Na mesma trilha:

Agravo de instrumento. Locação comercial. Despejo por falta de pagamento. Li-minar. Presença dos requisitos. Extinção da caução prestada. Valor do débito superior ao valor caucionado. Possibilidade de concessão da liminar, desde que prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, antes do início dos atos de execução do despejo. Recurso provido. (TJSP, 28ª Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento nº 2078710-78.2015.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, Rel. Cesar Lacerda, DJ 26.05.2015)

Neste caso, entende-se que, por cautela, deve o autor inserir no texto de sua petição inicial requerimento de concessão de prazo para a comprovação da efetivação da caução (depósito).

Porém, cabe destacar, o caminho mais prudente indica para a realização do depósito com sua juntada aos autos antes do requerimento de concessão de liminar vir a ser apreciado pelo juiz.

Outra questão também merece ser analisada: pode o locador, ao invés de proceder ao depósito da quantia equivalente a três aluguéis, ofertar um bem, cujo valor se mostre igual ou superior à referida quantia?

Entende-se que sim. Aliás, quanto à oferta do próprio imóvel locado para fim da necessária caução, são diversos os precedentes positivos na jurisprudên-cia. A guisa de exemplo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – LOCAÇÃO – AÇÃO DE DESPEJO POR FAL-TA DE PAGAMENTO – PEDIDO DE LIMINAR – CAUÇÃO CONSISTENTE NO PRÓPRIO IMÓVEL – POSSIBILIDADE – DECISÃO REFORMADA – RECURSO PROVIDO, COM OBSERVAÇÃO – A Lei nº 8.245/1991 não exige que a caução seja prestada somente em dinheiro. Dessa forma, nada impede o oferecimen-to do próprio imóvel objeto da locação como caução, desde que se observe o valor mínimo equivalente a três meses de aluguel, bem como a comprova-ção, perante o Juízo a quo, da titularidade e da inexistência de ônus reais sobre

5 Embora em procedimento diverso, no sentido de deferir a cautelar condicionada à efetivação da caução: “Ação cautelar de sustação de protesto. Liminar inaudita altera pars. Deferimento condicionado à prestação de caução. Possibilidade. Decisão mantida. Contracautela que fica ao arbítrio do juiz. Arts. 804 e 827 do CPC. Recurso não provido” (TJSP, 22ª CDPriv., Agravo de Instrumento nº 0054021-72.2013.8.26.0000, Rel. Fernandes Lobo, DJ 25.04.2013).

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o bem ofertado. (TJSP, 31ª Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento nº 0031161-77.2013.8.26.0000, Comarca de São Paulo, Rel. Adilson de Araujo, DJ 05.03.2013)

Passa-se, agora, para a análise dos possíveis fundamentos para a conces-são da liminar no despejo. As cinco primeiras já constavam do texto da Lei do Inquilinato, antes das alterações introduzidas pela Lei nº 12.112/2009, e restam expressas em textos claros, que dispensam maiores comentários. São elas:

Inciso I – o descumprimento do mútuo acordo (art. 9º, inciso I), celebrado por escrito e assinado pelas partes e por duas testemunhas, no qual tenha sido ajus-tado o prazo mínimo de seis meses para desocupação, contado da assinatura do instrumento.

Inciso II – o disposto no inciso II do art. 47, havendo prova escrita da rescisão do contrato de trabalho ou sendo ela demonstrada em audiência prévia.

Inciso III – o término do prazo da locação para temporada, tendo sido proposta a ação de despejo em até trinta dias após o vencimento do contrato.

Inciso IV – a morte do locatário sem deixar sucessor legítimo na locação, de acordo com o referido no inciso I do art. 11, permanecendo no imóvel pessoas não autorizadas por lei.

Inciso V – a permanência do sublocatário no imóvel, extinta a locação, celebrada com o locatário.

A Lei nº 12.112/2009 introduziu quatro hipóteses, que passam a ser rela-cionadas e, brevemente, comentadas.

Inciso VI – o disposto no inciso IV do art. 9º, havendo a necessidade de se pro-duzir reparações urgentes no imóvel, determinadas pelo poder público, que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário, ou, po-dendo, ele se recuse a consenti-las; (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009)

Se os reparos são urgentes e não podem ser realizados com a permanên-cia do locatário no imóvel, ou, pior, ele se recusa a consenti-las, evidente (pela própria anunciada urgência, acompanhada do fato de que houve determinação de providência pelo Poder Público) que há de ser viabilizada a obra, com o afastamento do locatário do local. A urgência da medida já justifica a urgência da tutela e, assim, a liminar.

Inciso VII – o término do prazo notificatório previsto no parágrafo único do art. 40, sem apresentação de nova garantia apta a manter a segurança inaugural do contrato. (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12112.htm-art2>)

O art. 40 referido no texto do art. 59, § 1º, inciso VII, elenca as hipóteses nas quais o locador pode exigir novo fiador ou a substituição da modalidade de

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garantia. No parágrafo único, o referido artigo traz que o locador poderá noti-ficar o locatário para apresentar nova garantia locatícia no prazo de trinta dias, obviamente contados do recebimento da notificação, sob pena de desfazimento da locação e, consequentemente, da possibilidade de retomada do imóvel, na via da ação de despejo (Lei nº 8.245/1991, art. 5º).

A referida hipótese de cabimento da ação de despejo tem, em seu pro-cedimento, a possibilidade de concessão de liminar para tanto, inaudita altera parte, desde que requerida e preenchidos os requisitos do § 1º do art. 59 da mesma Lei do Inquilinato. É o que traz o inciso VII, sob exame.

Justifica-se a hipótese na insegurança trazida à relação contratual, em detrimento dos interesses do locador, pela extinção da garantia locatícia sem a devida substituição, pelo locatário. Observa-se, também, a manutenção do equilíbrio contratual, pois, na base da manifestação de vontade do locador, por ocasião do consentimento no que toca à locação, encontra-se a existência da garantia locatícia, sem a qual, no mais das vezes, o negócio (locação) sequer teria sido celebrado.

Não se pode negar que a demora na reconstituição da garantia pode acarretar ao locador prejuízo de considerável monta, que restaria maximizado diante da natural morosidade do processo, fruto da prática dos atos processuais previstos em lei e, por vezes, de outros fatores externos a essa, relacionados à estrutura do serviço judiciário, acúmulo de processos, entre outros elementos conhecidos pela comunidade jurídica.

Sendo assim, largamente justificável a opção do legislador, ao consagrar a hipótese de liminar estudada.

Inciso VIII – o término do prazo da locação não residencial, tendo sido proposta a ação em até 30 (trinta) dias do termo ou do cumprimento de notificação comu-nicando o intento de retomada.

O inciso dispensa maiores comentários: caso a locação vigore por pra-zo indeterminado, haverá necessidade de prévia comunicação, do locador ao locatário, acerca da intenção de colocar fim à relação contratual, para que se mostre possível o ajuizamento da ação de despejo por denúncia vazia (Lei nº 8.245/1991, arts. 56, parágrafo único, e 57). Também será cabível a ação, in-dependente de notificação prévia, se proposta nos trinta dias seguintes ao termo do contrato (art. 56, caput, da mesma lei).

Assim, na ação de despejo por denúncia vazia, em locação para fim não residencial, é possível a obtenção da liminar para desocupação no prazo de quinze dias, a ser concedida inaudita altera parte, na forma do art. 59, § 1º, VIII.

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Observe-se que, na ação de despejo por denúncia vazia, em sede de locação residencial, o locador não tem o mesmo direito: nesse caso, não caberá liminar, ao menos nos moldes fixados na Lei do Inquilinato.

Inciso IX – a falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no venci-mento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exone-ração dela, independentemente de motivo.

O texto do inciso IX é bastante claro: para que se mostre possível a con-cessão da liminar de desocupação nas ações de despejo por falta de pagamen-to, trate-se de locação celebrada para fins residenciais ou não residenciais, é indispensável que o contrato se mostre desprovido de qualquer das garantias previstas no art.37 da Lei do Inquilinato (caução; fiança; seguro de fiança loca-tícia; cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento). Saliente-se que o parágrafo único do art. 37 tratado traz: “É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação”.

Assim, caso não exista garantia, quer por não contratada, quer por ter deixado de existir, poderá o locador pleitear, na ação de despejo por falta de pagamento, concessão de liminar para desocupação em quinze dias.

Interessante, aqui, analisar a hipótese da caução em dinheiro como ga-rantia (os conhecidos “três meses de depósito”).

Caso o atraso no pagamento dos aluguéis se dê por mais de três meses, ou, enfim, por período que faça do débito locatício mais representativo do que o próprio valor do depósito ofertado: ter-se-á extinção da garantia, suficiente a tornar possível a concessão da liminar?

Entende-se que sim. Ora, se o atraso fez com que a garantia ofertada já se mostre insuficiente, restará evidente que há crédito locatício desprovido de ga-rantia (ao menos parcialmente). Não se deixa, também, de observar uma certa aproximação com a ideia que sustentou a inclusão do inciso VII, afinal, temos o perecimento da garantia (depósito; caução em dinheiro) por sua insuficiência frente ao débito.

Aliás, nesse sentido, vale destacar:

De acordo com o art. 59, § 1º, IX, da Lei nº 8.245/91, com a redação dada pela Lei nº 12.112/09, é possível a concessão liminar do despejo quando, inadimpli-dos aluguéis e encargos locatícios, o contrato, por qualquer motivo, não possuir garantia. No presente caso, a garantia prestada (R$ 500,00) foi superada pelo valor do débito locatício (R$ 10.530,00), devendo ser considerada extinta, pois não se mostra hábil a assegurar o recebimento do crédito pelo locador. Ademais, é possível a antecipação dos efeitos da tutela, com base no art. 273 do CPC. No caso em análise, as provas produzidas pelo agravante são suficientes para

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demonstrar a verossimilhança das suas alegações, haja vista a prática de infração contratual pelo agravado, que vem utilizando o imóvel locado para depósito de lixo e entulho, tendo ocorrido autuação pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, com imposição de multa em patamar elevado. Houve, inclusive, ins-crição da dívida ativa e o ajuizamento de execução fiscal em face do locador, ora recorrente, por ser o proprietário do imóvel. De rigor, portanto, o deferimen-to da liminar de despejo. Recurso provido. (TJSP, 34ª Câmara de Direito Priva-do, Agravo de Instrumento nº 2000598-66.2013.8.26.0000, Rel. Gomes Varjão, DJ 20.05.2013)

Observa-se o mesmo na seguinte decisão:

Agravo de instrumento. Despejo por falta de pagamento liminar de despejo. Dí-vida superior à garantia por depósito em caução. A locação está desprovida de garantia locatícia, uma vez que a garantia por depósito caução, no valor de três meses de aluguéis, restou superada com a inadimplência de mais de três meses de aluguéis, o que autoriza a concessão da ordem liminar de despejo prevista no art. 59, § 1º, inciso IX, da Lei nº 8.245/91. Recurso provido. (TJSP, 25ª Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento nº 2090226, 95.2015.8.26.0000, da Comarca de São Bernardo do Campo, Rel. Edgard Rosa, DJ 28.05.2015)

Saliente-se que o locatário, no despejo por falta de pagamento, poderá elidir a liminar de desocupação se, no prazo concedido para a desocupação (quinze dias), proceder ao depósito judicial de quantia suficiente a quitar todo o débito (portanto, se purgar a mora integralmente). Entende-se, aqui, que a in-tegralidade alcança, também, as decorrências do processo – custas, despesas e honorários advocatícios. Nesse sentido, a Lei nº 8.245/1991, art. 59, § 3º:

No caso do inciso IX do § 1º deste artigo, poderá o locatário evitar a rescisão da locação e elidir a liminar de desocupação se, dentro dos 15 (quinze) dias conce-didos para a desocupação do imóvel e independentemente de cálculo, efetuar depósito judicial que contemple a totalidade dos valores devidos, na forma pre-vista no inciso II do art. 62. (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009)

Esse, o conteúdo principal acerca dos incisos estudados.

3 OS SUbLOcaTÁrIOS: cIÊNcIa e PraZO Para DeSOcUPaçÃO

Quanto aos sublocatários, vale mencionar que a Lei do Inquilinato, art. 59, § 2º, dispõe: “Qualquer que seja o fundamento da ação dar-se-á ciên-cia do pedido aos sublocatários, que poderão intervir no processo como assis-tentes”.

Qual será o prazo para desocupação? Esclarece José Guy de Carvalho Pinto: “O prazo para desocupação (quinze dias) terá seu início a partir da in-

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timação pessoal e por mandado, como é de praxe nas relações nascidas de locação”6.

4 a TUTeLa aNTecIPaDa, NOS TerMOS DO aTUaL cPc, arTIGO 273, Na açÃO De DeSPeJO

O fato da Lei do Inquilinato trazer expressamente um rol de hipóteses ensejadoras da concessão de liminar para desocupação em quinze dias (art. 59, § 1º) fez com que, por muito tempo, fosse defendida a tese de que seria vedada, na ação de despejo, a antecipação dos efeitos da tutela com fulcro no CPC, art. 273.

Nesse sentido, fixou o Centro de Estudos e Debates do extinto Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo o Enunciado nº 31, verbis: “É incabível nas ações de despejo a antecipação de tutela de que trata o art. 273 do atual CPC, em sua nova redação”.

Ocorre que não se pode ignorar a função instrumental do processo e a importância da tutela antecipada como mecanismo de promoção da efetividade da função jurisdicional. Considerando que a Lei do Inquilinato, no art. 59, § 1º, não carrega afirmação no sentido de que as hipóteses de seus incisos formam rol taxativo, nada obsta a aplicação do CPC, art. 273, para concessão de tutela antecipada em ação de despejo “fora das hipóteses” do art. 59 da lei de regên-cia, desde que preenchidos os requisitos legais para tanto (prova inequívoca, verossimilhança da alegação, receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou abuso no exercício do direito de defesa, incontrovérsia ou manifesto propó-sito protelatório, reversibilidade da medida – requisito, aliás, de controvertida necessidade de verificação – entre outros)7.

Sobre o tema, Rogério Licastro Torres de Melo, ao defender a possibili-dade de concessão initio litis do despejo, por cabimento da tutela antecipada nos termos do CPC, art. 273, afirma que não há colisão entre Lei do Inquilina-to e Código de Processo Civil mas, ao contrário, complementação. Ademais, salienta o autor, “há que se admitir que o CPC compõe o conjunto legislativo que gravita em torno das demais legislações processuais esparsas”, a exigir uma interpretação harmônica. Disso, afirma Torres de Melo, não é possível

que exista uma providência genérica de antecipação para todas as demais situa-ções regradas pelo CPC e que tal não ocorra relativamente às ações de despe-jo regradas pela Lei do Inquilinato, como se tais fossem imunes a cenários de

6 Locação e ações locatícias. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 600.7 Requisitos que passam a ser desmembrados a partir da vigência do novo CPC, fruto da classificação das

tutelas antecipadas a partir do critério ensejador de sua concessão: urgência ou evidência. Nesse sentido, dispõe o novo CPC sobre as tutelas provisórias a partir do art. 294, passando a cuidar especificamente da tutela antecipada pautada na evidência e com caráter antecedente nos arts. 303 e 304 e da tutela da evidência no art. 311.

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urgência, de abuso de direito de defesa, incontrovérsia ou manifesto propósito protelatório.8

Diante do exposto, vale ressaltar o seguinte julgado, já mencionado:

De acordo com o art. 59, § 1º, IX, da Lei nº 8.245/91, com a redação dada pela Lei nº 12.112/09, é possível a concessão liminar do despejo quando, inadimpli-dos aluguéis e encargos locatícios, o contrato, por qualquer motivo, não possuir garantia. No presente caso, a garantia prestada (R$ 500,00) foi superada pelo valor do débito locatício (R$ 10.530,00), devendo ser considerada extinta, pois não se mostra hábil a assegurar o recebimento do crédito pelo locador. Ademais, é possível a antecipação dos efeitos da tutela, com base no art. 273 do CPC. No caso em análise, as provas produzidas pelo agravante são suficientes para demonstrar a verossimilhança das suas alegações, haja vista a prática de infração contratual pelo agravado, que vem utilizando o imóvel locado para depósito de lixo e entulho, tendo ocorrido autuação pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, com imposição de multa em patamar elevado. Houve, inclusive, ins-crição da dívida ativa e o ajuizamento de execução fiscal em face do locador, ora recorrente, por ser o proprietário do imóvel. De rigor, portanto, o deferimen-to da liminar de despejo. Recurso provido. (TJSP, 34ª Câmara de Direito Priva-do, Agravo de Instrumento nº 2000598-66.2013.8.26.0000, Rel. Gomes Varjão, DJ 20.05.2013)

Não podemos esquecer que o processo é verdadeiro instrumento, e, as-sim, seus princípios e regras devem ser interpretados no sentido que melhor conduza à viabilização da missão concreta dos órgãos prestadores da tutela jurisdicional. Nada justificaria, então, considerar o rol do art. 59, § 1º, incisos, da Lei do Inquilinato, como numerus clausus. Aliás, nesse mesmo caminho, caminha a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça9.

5 a aNTecIPaçÃO De TUTeLa eM carÁTer aNTeceDeNTe NaS açõeS De DeSPeJO e O NOvO cÓDIGO De PrOceSSO cIvIL

A partir do início de sua vigência, em 18.03.2016 (novo CPC, art. 1.045), a antecipação de tutela continuará possível nas ações de despejo, nas hipóteses distintas das previstas no art. 59, § 1º, da Lei nº 8.245/1991, sendo necessário, porém, passar a observar o disposto nos arts. 294 e seguintes, do novo Código,

8 Tutela antecipada nas ações de despejo. In: CARVALHO, Fabiano; BARIONI, Rodrigo (Coord.). Processo imobiliário. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 393 a 402.

9 Vide REsp 1207161/AL, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 18.02.2011; vide, também, o seguinte julgado, cuja ementa segue transcrita: “Recurso especial. Locação. Ação de despejo. Art. 273 do Código de Processo Civil. Antecipação de tutela. Cabimento. 1. A antecipação de tutela é cabível em todas as ações de conhecimento, inclusive nas ações de despejo. 2. Recurso provido” (REsp 595172/SP, Rel. Paulo Gallotti, 6ª T., DJe 21.10.2004).

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inclusive quando a dita pretensão restar pautada na urgência, em caráter ante-cedente (novo CPC, arts. 303 e 304).

Nesse caso, nada, no procedimento da ação de despejo, obstará o re-querimento nos moldes do art. 303, caput, limitado à postulação pertinente à antecipação da tutela e à indicação do pedido de tutela final, com exposição da lide, do direito que se buscar realizar e do perigo de dano, peça na qual também deverá indicar o valor da causa considerando, para tanto, o pedido de tutela final (art. 303, § 4º), e a pretensão de valer-se do benefício previsto no caput do referido art. 303.

Uma vez concedida a tutela antecipada, o autor deverá aditar a peti-ção inicial, nos mesmos autos e sem incidência de novas custas processuais (art. 303, § 3º), com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, para o que terá quinze dias ou outro prazo maior fixado pelo juiz (§ 1º, I), sob pena de extinção sem resolução do mérito (§ 2º), após o que será o réu citado (§ 1º, II).

Caso não seja concedida a tutela antecipada, terá o autor cinco dias para emendar a inicial, sob pena de indeferimento e consequente extinção do feito sem resolução do mérito.

Uma vez concedida a antecipação da tutela, tornar-se-á estável a decisão que a conceder, com a extinção do processo (art. 304, § 1º) se não for interpos-to, no prazo de quinze dias, recurso de agravo de instrumento (novo Código de Processo Civil, art. 304, caput, combinado com art. 1.015, I), permitido o desar-quivamento dos autos (art. 304, § 4º) para obtenção do necessário à instrução de nova ação (§ 2º), que poderá ser proposta por qualquer das partes no prazo de dois anos (§ 5º), sob pena de extinção do referido direito.

Saliente-se, todavia, que o procedimento especial da ação de despejo por falta de pagamento oferece ao réu a opção da purgação da mora. Desse modo, caso o réu proceda ao depósito judicial da quantia total devida (aluguéis e aces-sórios da locação que vencerem até a sua efetivação, multas ou penalidades contratuais quando exigíveis, juros de mora, custas e honorários advocatícios fixados), independentemente de cálculo e no prazo de quinze dias contados da citação, evitará a rescisão do contrato (Lei nº 8.245/1991, art. 62, II), mesmo que não recorra da decisão que conceder, liminarmente, a antecipação dos efeitos da tutela.

A conclusão ora referida resta extraída da interpretação sistemática e teleológica da própria lei especial que, até quando elenca as hipóteses de li-minares típicas, resguarda o direito à purgação da mora, ex vi do disposto no art. 59, § 3º, já mencionado. Nesse sentido, encontra-se na jurisprudência atual entendimento que, parece, não tende a ser alterado com o novo Código de Pro-

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cesso Civil, por faltar qualquer justificativa teleológica para tanto, afinando-se a conclusão aqui defendida ao disposto no art. 8º do novo texto:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE DESPEJO – Tutela antecipada. Inde-ferimento de despejo liminar. Manutenção da decisão, porém por outros funda-mentos. A antecipação da tutela do despejo não impede a purga da mora, nos ter-mos do art. 59, § 3º, da Lei de Locações. Não é impedimento para a concessão da liminar, ainda, o fato de o autor ter formulado demandas cumuladas de despejo e de cobrança. Todavia, há ausência de prova do instrumento contratual escrito. Necessidade do contraditório. Tratando-se de ação fundada em negócio verbal, imperioso proceder-se com cautela, razão pela qual se revela cabível a prévia realização de contraditório, de modo a tornar clara a relação contratual vigente entre os litigantes, para só então se cogitar a concessão de medida de urgência. Manutenção da decisão de indeferimento. Negado provimento. (TJSP, Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento nº 2174954-06.2014.8.26.0000, da Comarca de Campinas, Rel. Hugo Crepaldi, DJ 23.10.2014)

Assim, em síntese, estes são os principais aspectos, em uma visão direta e prática, pertinentes à questão das liminares nas ações de despejo.

cONcLUSÃO

Diante do exposto, conclui-se que existem hipóteses de concessão de liminar previstas na própria Lei nº 8.245/1991, a serem concedidas na ação de despejo.

Conclui-se, também, que, quando não houver perfeito enquadramento nas hipóteses de liminar para desocupação previstas no art. 59, § 1º, da lei, des-de que preenchidos os requisitos legais, é possível pleitear, e o juiz conceder, a antecipação dos efeitos da tutela nos moldes do atual CPC, art. 273, o que continuará sendo possível com o novo Código de Processo Civil, observada a nova regência e o novo procedimento pertinente à matéria.

reFerÊNcIaSACQUAVIVA, Marcus Claudio. Dicionário básico de Direito Acquaviva: de acordo com o novo Código Civil. 5. ed. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004.

MELO, Rogério Licastro Torres de. Tutelas antecipadas nas ações de despejo. In: CARVALHO, Fabiano; BARIONI, Rodrigo (Coord.). Processo imobiliário. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

MITIDIERO, Daniel. In: WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno (Coord.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015.

PINTO, José Guy de Carvalho. Locação e ações locatícias. São Paulo: Saraiva, 1997.

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Parte Geral – Doutrina

A Ação de Nunciação de Obra Nova e Sua Natureza Preventiva – Inibitória – no Novo CPC

PAULA SALEh ARBS Mestranda em Direito Processual Civil pela Universidade de Coimbra, Portugal.

A tutela inibitória é um instituto específico que objetiva conservar a inte-gralidade do Direito. É caracterizada por ser voltada para o futuro1, sendo dirigi-da a impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito, e fundamentada na necessidade de proteção já diante da ameaça ao Direito (art. 5º, XXXV, in fine, da CRFB/1988), ou seja, antes mesmo da ocorrência de dano, sendo mes-mo prescindível a existência ou a prova do dano, em razão de a inibitória ter como objetivo o combate ao ato ilícito. Segundo Joaquim Spadoni, a tutela inibitória é aquela que tem por objetivo alcançar um provimento judicial apto, que impeça “a prática, continuação ou repetição do ato ilícito”2.

A tutela inibitória, para além da previsão constitucional, está potenciali-zada no ordenamento jurídico pátrio no art. 461, do CPC e no art. 84 do Códi-go de Defesa do Consumidor (CDC), de forma genérica (ou atípica, ou, ainda, inominada), bem como também de forma específica (típica ou nominada), no caso do interdito proibitório (art. 932) e nos casos de nunciação de obra nova (art. 934), objeto de nosso artigo, ambas de caráter possessório3.

A ação de nunciação de obra nova é uma ação judicial que repercute no exercício da posse e poderá ser manejada: pelo proprietário ou possuidor de imóvel, pelo condômino ou pelo Município, a fim de impedir a edificação calcada em (ou tida por) ato ilícito, traduzido em violação, respectivamente, do uso e gozo do prédio, suas servidões ou fins a que é destinado; alteração da coisa comum; e ferimento da lei, do regulamento ou do código de postura.

É sua natureza eminentemente inibitória, caracterizada pela prescindi-bilidade de existência e prova de dano4 ou, ainda, de sua ocorrência para ter procedência que a decisão de “embargo” tem a finalidade de fazer cessar o iní-

1 RAPISARDA, Cristina. Inibitoria (azione). Enciclopedia giuridica Treccani, v. 17, p. 1. 2 Ação inibitória: a ação preventiva prevista no artigo 461 do CPC. São Paulo: RT, 2002. 3 Acerca do caráter possessório da ação de nunciação de obra nova: STJ, REsp 126281/PB, 1997/0023167-4. 4 Nesse sentido o renomado Professor Dr. Aldo frignani (L’Injunction nella common law e l’inibitoria nel diritto

italiano), ao tratar do tema, deixa claro que a tutela inibitória tem por fim prevenir o ilícito e não o dano (p. 413).

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cio da construção, ou, ainda, embora já iniciada a obra, a sua paralisação será suficiente para satisfazer o autor5.

Nos casos em que, por exemplo, o particular já iniciou os trabalhos pre-paratórios para construir uma obra “em contravenção da lei, do regulamento ou de postura” (art. 934, III, do CPC), a tutela de embargo da obra poderá impedir a construção que seria ilícita, daí novamente verifica-se o resultado da sua na-tureza nitidamente inibitória.

Não obstante o caráter eminentemente preventivo desta ação, que, repi-se-se, independe de existência, prova de perigo de dano ou ocorrência do mes-mo, outros pedidos poderão ser cumulados com a inibição do ato ilícito, como obrigação de fazer (reconstituir, modificar ou demolir o que estiver feito em seu detrimento), preceito cominatório (fixação de pena para o caso de inobservân-cia), ressarcitório (condenação em perdas e danos) e a apreensão e depósito de materiais e produtos já retirados.

Com o advento do novo CPC, Lei nº 13.105/2015, não existirão mais ações inibitórias típicas, devendo ser realizada a proteção dos bens jurídicos ameaçados por ato ilícito futuro com fundamento no art. 497, caput6. Perceba--se que a redação dada ao dispositivo é precisa e atende aos contornos jurídi-cos desenhados pelos civilistas especialistas nesta matéria, já a partir de Aldo Frignani7.

Não obstante já não existam mais as assim chamadas ações inibitórias típicas, a redação do art. 497 e, nomeadamente, seu parágrafo único têm técni-ca mais apurada e preveem as três modalidades de ações preventivas possíveis, consideradas ou classificadas a partir do tipo de ato ilícito a que se contrapõem, ou, pelo menos de acordo com o tempo de surgimento dos mesmo: que é o ato futuro puro (que nunca ocorreu, mas vai ocorrer), o ato futuro que é uma repe-tição de um ato que já ocorreu, e a continuação (logicamente para o futuro) do ilícito que está ocorrendo.

Quanto aos legitimados, poder-se-á manejar a ação inibitória contra ato futuro que vise, por meio de obra nova, a prejudicar direitos, e não teremos

5 Pode ocorrer início de obra sem dano, conforme exemplo de Adroaldo Furtado Fabrício: “O nunciado, por exemplo, iniciou a construção da barragem que, concluída, elevaria as águas a ponto de inundar o terreno vizinho, mas foi detida pelo embargo ainda nos alicerces. O que se chegou a fazer nenhum detrimento traz ao nunciante: a função preventiva da ação de embargo bastou plenamente à proteção do seu interesse, não havendo o que indenizar, nem porque demolir o construído” (Comentários ao Código de Processo Civil, v. 8, t. III, p. 610).

6 FRIGNANI, Aldo. L‘Injunction nella common law e l’inibitoria nel diritto italiano, 1974. O dano é requisito indispensável para o surgimento da obrigação de ressarcir, mas não para a constituição do ilícito.

7 “Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou não fazer, o juiz, se precedente o pedido, condenará a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. E Parágrafo único: Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo”.

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mais rol explícito, como no atual art. 934, do CPC, podendo, evidentemente, ser ajuizada pelo proprietário, possuidor, condômino Município ou, ainda, por qualquer autor que demonstrar ser titular do direito8 ferido pelo ilícito.

Também os tipos de atos ilícitos e suas formas, para efeito de manejo da sobredita ação, não são mais previstos expressamente, entretanto, correspon-derão àqueles que violem o uso e o gozo, as servidões ou, também, os fins a se destina o prédio; os atos ilícitos que visem à alteração a coisa comum; ou as obras novas que se pretendam realizar com inobservância da lei, do regulamen-to ou do código de postura.

Ressalte-se que, não obstante o art. 497 seja expresso (e coerente com a natureza mesma da inibitória) ao prescrever que “é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano”, no caso de o mesmo ter ocorrido (ou da possibilidade de ocorrer no curso do processo), o autor pode, pelas regras do art. 327 (do novo Código), cumular pedidos. Aliás, não apenas em relação ao ressarcimento das perdas e danos, mas também outros pedidos, como o preceito cominatório (arts. 536 e seguintes), por exemplo.

Esse caráter preventivo mencionado objetiva explicitar que é melhor pre-venir, inibir, do que ressarcir, o que equivale a dizer que, no confronto entre a tutela preventiva e a tutela ressarcitória, deve-se dar preferência à primeira9, pois a tutela ressarcitória, que ocorre na maioria das vezes, substitui o direito originário por um direito de crédito equivalente ao valor do dano verificado e, nesse sentido, tem por escopo apenas garantir a integralidade patrimonial dos direitos. Já a inibitória, que não tem qualquer caráter sub-rogatório, destina-se a garantir a integralidade do direito em si10.

8 Ressalvados os casos de legitimação extraordinária.9 TRIMARCHI, Pietro. Illecito, Enciclopedia del diritto, v. 20, p. 106.10 RAPISARDA, Cristina. Inibitoria, Digesto delle discipline privatiche, v. 9, p. 476.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2010

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.207.129 – MG (2010/0146409‑9)Relator: Ministro Luis Felipe SalomãoRecorrente: Gilberto Batista Diniz e outroAdvogado: Elísio da Silva e outro(s)Recorrido: Calsimec Indústria e Comércio Ltda. e outrosAdvogado: José Roberto da Costa

ementADIreITO cIvIL – cONDOMÍNIO – arT. 504 DO cÓDIGO cIvIL – DIreITO De PreFerÊNcIa DOS DeMaIS cONDÔMINOS Na veNDa De cOISa INDIvISÍveL – IMÓveL eM eSTaDO De INDIvISÃO, MaS PaSSÍveL De DIvISÃO – MaNUTeNçÃO DO eNTeNDIMeNTO eXaraDO PeLa SeGUNDa SeçÃO TOMaDO À LUZ DO arT. 1.139 DO cÓDIGO cIvIL De 1916

1. O condômino que desejar alhear a fração ideal de bem em esta-do de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, deverá dar preferên-cia ao comunheiro da sua aquisição. Interpretação do art. 504 do CC/2002 em consonância com o precedente da Segunda Seção do STJ (REsp 489.860/SP, Relª Min. Nancy Andrighi), exarado ainda sob a égide do CC/1916.

2. De fato, a comparação do art. 504 do CC/2002 com o antigo art. 1.139 do CC/1916 permite esclarecer que a única alteração subs-tancial foi a relativa ao prazo decadencial, que – de seis meses – passou a ser de cento e oitenta dias e, como sabido, a contagem em meses e em dias ocorre de forma diversa; sendo que o STJ, como Corte responsável pela uniformização da interpretação da lei federal, um vez definida tese sobre determinada matéria, deve prestigiá-la, mantendo sua coesão.

3. Ademais, ao conceder o direito de preferência aos demais condô-minos, pretendeu o legislador conciliar os objetivos particulares do vendedor com o intuito da comunidade de coproprietários. Certa-mente, a função social recomenda ser mais cômodo manter a proprie-dade entre os titulares originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no grupo.

4. Deve-se levar em conta, ainda, o sistema jurídico como um todo, notadamente o parágrafo único do art. 1.314 do CC/2002, que veda

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146 �������������������������������������������������������������������������������������������� RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

ao condômino, sem prévia aquiescência dos outros, dar posse, uso ou gozo da propriedade a estranhos (que são um minus em relação à transferência de propriedade), somado ao art. 504 do mesmo diplo-ma, que proíbe que o condômino em coisa indivisível venda a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto.

5. Não se pode olvidar que, muitas vezes, na prática, mostra-se extre-mamente difícil a prova da indivisibilidade. Precedente: REsp 9.934/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T.

6. Na hipótese, como o próprio acórdão reconhece que o imóvel sub judice se encontra em estado de indivisão, apesar de ser ele divisível, há de se reconhecer o direito de preferência do condômino que pre-tenda adquirir o quinhão do comunheiro, uma vez preenchidos os demais requisitos legais.

7. Recurso especial provido.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo (Pre-sidente), Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 16 de junho de 2015 (data do Julgamento).

Ministro Luis Felipe Salomão Relator

relAtório

O Senhor Ministro Luis Felipe Salomão (Relator):

1. Gilberto Batista Diniz e sua esposa Conceição Aparecida de Lourdes Batista Diniz ajuizaram ação de preferência em face de José Gustavo Rosa, sua mulher Nizia Pereira da Silva Rosa e Calsimec Indústria e Comércio Ltda. sustentam que são condôminos do imóvel denominado Fazenda Vazantes, em Vazantes/MG, e que, em 14.07.2004, os primeiros réus alienaram à segunda requerida o quinhão correspondente, obstando-lhes o direito de preferência.

O magistrado de piso julgou improcedente o pedido ao entendimento de ser inexistente o direito de preferência do imóvel em questão, pois, apesar de momentaneamente indiviso, o bem era divisível (fls. 160-164).

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA�������������������������������������������������������������������������������������������������147

Interposta apelação, o Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso, nos termos da seguinte ementa:

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE PREFERÊNCIA DO CONDÔMINO À AQUI-SIÇÃO DO IMÓVEL – AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA – ART. 504 DO CC/2002 – INAPLICABILIDADE – IMÓVEL PASSÍVEL DE CÔMODA DIVISÃO – SENTENÇA MANTIDA

É inaplicável o disposto no art. 504 do CC/2002, sendo, pois, dispensável a noti-ficação prévia da alienação ao condômino, se o imóvel for divisível.

Opostos aclaratórios, os embargos foram rejeitados (fls. 271-275).

Irresignados, interpõem recurso especial com fulcro nas alíneas a e c do permissivo constitucional, por negativa de vigência aos arts. 504, 1.314 e seguintes do Código Civil.

Aduzem que têm direito de preferência para aquisição do quinhão ven-dido à segunda recorrida. Afirmam que existe controvérsia na doutrina e na jurisprudência sobre o tema, inclusive entre a Terceira e Quarta Turmas do STJ, sendo necessária a uniformização da jurisprudência.

Alegam que deverá prevalecer a tese que reconhece a preferência ao condômino mesmo quando o bem se encontrar em estado de indivisão, seja ele divisível ou indivisível.

Apontam que se deve evitar os inconvenientes da inclusão de um condô-mino novo, hostil aos demais ou por algum deles indesejado, inclusive porque o condômino não pode dar posse, uso ou gozo da propriedade em condomínio a estranhos sem que os demais condôminos consintam.

Contrarrazões às fls. 294-300 defendendo que o imóvel sub judice é di-visível natural e juridicamente, sendo que o art. 1.314 do CC autoriza expressa-mente que o condômino possa alhear a respectiva parte ideal.

O recurso especial recebeu crivo de admissibilidade positivo na origem (fls. 304-305).

É o relatório.

ementADIreITO cIvIL – cONDOMÍNIO – arT. 504 DO cÓDIGO cIvIL – DIreITO De PreFerÊNcIa DOS DeMaIS cONDÔMINOS Na veNDa De cOISa INDIvISÍveL – IMÓveL eM eSTaDO De INDIvISÃO, MaS PaSSÍveL De DIvISÃO – MaNUTeNçÃO DO eNTeNDIMeNTO eXaraDO PeLa SeGUNDa SeçÃO TOMaDO À LUZ DO arT. 1.139 DO cÓDIGO cIvIL De 1916

1. O condômino que desejar alhear a fração ideal de bem em esta-do de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, deverá dar preferên-

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cia ao comunheiro da sua aquisição. Interpretação do art. 504 do CC/2002 em consonância com o precedente da Segunda Seção do STJ (REsp 489.860/SP, Relª Min. Nancy Andrighi), exarado ainda sob a égide do CC/1916.

2. De fato, a comparação do art. 504 do CC/2002 com o antigo art. 1.139 do CC/1916 permite esclarecer que a única alteração subs-tancial foi a relativa ao prazo decadencial, que – de seis meses – passou a ser de cento e oitenta dias e, como sabido, a contagem em meses e em dias ocorre de forma diversa; sendo que o STJ, como Corte responsável pela uniformização da interpretação da lei federal, um vez definida tese sobre determinada matéria, deve prestigiá-la, mantendo sua coesão.

3. Ademais, ao conceder o direito de preferência aos demais condô-minos, pretendeu o legislador conciliar os objetivos particulares do vendedor com o intuito da comunidade de coproprietários. Certa-mente, a função social recomenda ser mais cômodo manter a proprie-dade entre os titulares originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no grupo.

4. Deve-se levar em conta, ainda, o sistema jurídico como um todo, notadamente o parágrafo único do art. 1.314 do CC/2002, que veda ao condômino, sem prévia aquiescência dos outros, dar posse, uso ou gozo da propriedade a estranhos (que são um minus em relação à transferência de propriedade), somado ao art. 504 do mesmo diplo-ma, que proíbe que o condômino em coisa indivisível venda a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto.

5. Não se pode olvidar que, muitas vezes, na prática, mostra-se extre-mamente difícil a prova da indivisibilidade. Precedente: REsp 9.934/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T.

6. Na hipótese, como o próprio acórdão reconhece que o imóvel sub judice se encontra em estado de indivisão, apesar de ser ele divisível, há de se reconhecer o direito de preferência do condômino que pre-tenda adquirir o quinhão do comunheiro, uma vez preenchidos os demais requisitos legais.

7. Recurso especial provido.

voto

O Senhor Ministro Luis Felipe Salomão (Relator):

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2. A controvérsia principal consiste em saber se existe direito de prefe-rência ao condômino quando se tratar de alienação de imóvel que, apesar de indiviso, seja passível de divisão.

O acórdão, confirmando a sentença, entendeu que não haveria a pre-empção e, por conseguinte, o dever de notificação prévia:

O pedido dos apelantes embasa-se no disposto no art. 504 do CC/2002, segundo o qual:

“Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto.

O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.”

A controvérsia em torno do mencionado dispositivo legal está em saber se a in-divisibilidade compreende os imóveis que, embora indivisos, sejam passíveis de divisão, ou se referem apenas aos indivisíveis por natureza ou por força de lei, havendo divergência na doutrina e jurisprudência sobre o tema.

Adoto o primeiro posicionamento, como bem explicitado na sentença, “a norma em questão visa à pacificação social, a fim de evitar que um terceiro passe a ser proprietário comum de um bem indivisível, fisicamente, ou que a lei vede a sua divisão, esse é o inconveniente a ser evitado, as coisas impassíveis de divisão quando com muitos possuidores, tendem a gerar relações mais complexas, que podem piorar quando um condômino é um estranho” (fl. 121). No entanto, sendo o imóvel passível de divisão, é inaplicável o referido artigo, já que há possibili-dade de ser desmembrado o bem, evitando-se que haja conflito com os demais condôminos.

Nesse sentido:

[...]

Sobre o assunto, vale trazer a seguinte lição:

“Se a coisa é divisível, nada impede que o condômino venda a sua parte a estra-nho, sem dar preferência aos seus consortes, pois estes, se não desejarem com-partilhar o bem com aquele, poderão requerer a sua divisão.” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, v. IIl, 2004. p. 220.).

No caso ora tratado, verifico que o imóvel, embora esteja indiviso, é passível de cômoda divisão, sem qualquer alteração da destinação, já que a área total é de 43.39.30,48ha, e a fração ideal (01.44.14,34ha), havendo certidão da Prefeitura Municipal de Vazante à fl. 76 declarando que o imóvel “divide-se com perímetro urbano desta cidade, é passível para ser loteada em conformidade com as legis-lações pertinentes para o caso”.

Portanto, não há que se falar em indivisibilidade da parte do imóvel alienada, não se aplicando ao caso as disposições do art. 504 do Código Civil.

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Nem há que se falar na impossibilidade da divisão em razão da existência de ônus de restrição de uso sobre o imóvel em razão da exploração de minério, que inclusive já foi cancelado em dezembro de 2004, já que não impede a divisão do imóvel, apenas limita a sua utilização.

No que se refere à aplicação do disposto no art. 1.314 do CC/2002, entendo não haver incompatibilidade com o disposto no art. 504, tendo em vista a pos-sibilidade de divisão do imóvel e consequente alienação do mesmo, permitindo ao proprietário de se utilizar, em conformidade com o art. 1.228 do CC/2002 (fls. 245-247).

3. Realmente, quanto ao tema jurídico, verifico que há embate doutriná-rio e jurisprudencial, notadamente entre os antigos integrantes das Turmas de Direito Privado que compunham a Segunda Seção do STJ.

No julgamento do REsp 9.934/SP, o Min. Sálvio de Figueiredo bem res-saltou a dicotomia existente entre a lição dos clássicos, verbis:

É certo que as posições doutrinárias a respeito do tema não são uníssonas.

Ao contrário.

Na mesma diretriz que venho de sustentar, situa-se o magistério de Clóvis Bevilaqua, verbis:

“Coisa indivisível, define o Código (art. 53), é, 1ª, a que não se pode partir sem alteração na sua substância; 2ª, a que se considera indivisível por lei ou vontade das partes. O condômino de coisa dessa categoria não pode vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O que o condômino pode alienar é a parte ideal, que possui na coisa comum. Parte material não tem o comproprietário.

Mas se é uma parte ideal que o condômino pode alienar, por que esta exi-gência de ser a coisa indivisível? É certo que na fonte portuguesa o mesmo se diz: ‘Não podem os comproprietários de coisa indivisível vender a estranhos a sua respectiva parte, se o consorte a quiser tanto por tanto’. Mas a verdade é que não se justifica a distinção, porque, seja a coisa comum divisível ou indivisível, no estado de comunhão está indivisa. Além disso, o condomínio é transitório (arts. 629 e 630). E, dando o Código direito de preferência ao condômino, quando a coisa é indivisível, segue-se que não há esse direito, quando a coisa for divisível: inclusio unius exclusio alterius. Mas os inconve-nientes, que resultam de entrar um estranho na comunhão, são os mesmos, seja a coisa divisível ou não.

Parece, portanto, que não foi feliz a emenda do Senado, restaurando o epíteto indivisível, que a Comissão do Governo intencionalmente eliminara. Aliás, este artigo não se harmoniza, facilmente, com o art. 633 que proíbe ao con-dômino, sem prévio consenso dos outros, dar posse, uso ou gozo da proprie-dade a estranhos. Melhor fora não o ter ido buscar em um sistema jurídico diferente, para criar dificuldades aos interessados. Realmente, se o condômi-

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no não pode, sem prévio assentimento dos outros, dar posse da propriedade a estranhos, é claro que não pode, sem essa condição, alienar a sua parte ideal. E se os condôminos aprovam essa alienação, não se podem dar as hipóteses previstas pelo art. 1.139” (Código civil dos Estados Unidos do Brasil, v. IV, editora Rio, edição Histórica, 5ª tiragem, 1958, art. 1.139, p. 249/250).

Em idêntico sentido, pontifica Caio Mário da Silva Pereira:

“Enquanto pende o estado de indivisão, o condômino não pode vender a sua parte a estranho, se outro consorte a quiser, tanto por tanto (Código Civil, art.1139)” (Instituições de Direito Civil, v. III, Forense, 5. ed., 1981, n. 220, c, p. 162).

Também assim Carvalho de Mendonça, ao acentuar:

“A coisa indivisa não pode ser objeto de venda a estranhos, se um dos con-sortes se propuser a dar tanto por tanto ao condômino que pretender vender.

O condômino a quem se não der conhecimento da venda poderá depositar o preço e haver para si a parte vendida, contanto que o requeira no prazo de seis meses” (Contratos no Direito Civil Brasileiro, v. I, Forense, 4. ed., 1957, n. 142, p. 328).

Sustentando entendimento diverso, encontram-se Pontes de Miranda, Sílvio Rodrigues e Carvalho dos Santos.

Este último, com a costumeira excelência e rebatendo as razões alinhadas por Clóvis, assim se posiciona em relação ao particular:

“1. Não pode o condômino em coisa indivisível... A proibição diz respeito ao condômino em coisa indivisível isto é, em coisa que não se pode partir sem alteração da substância, ou porque, pela divisão, se torna imprópria a seu uso.

Donde se conclui que a venda de parte de coisa divisível é possível e inde-pende das condições deste artigo. Note-se bem. A venda é possível.

A posse, uso e gozo da coisa nestas condições, porém, tem que obedecer ao disposto no art. 633.

2. Vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto [...] Justifica-se o dispositivo pela intenção de evitar os inconvenientes que decerto resultariam para o condomínio, com a intrusão de condômino novo, hostil a algum dos consortes, ou destes não desejado, por qualquer outro justo motivo.

De maneira que o consorte tem preferência para a aquisição da parte da coi-sa, em igualdade de condições. Se dela não usa nenhum deles, segue-se que não vêem inconveniente na substituição do condômino e a aceitam.

Clóvis, comentando o artigo, crítica a exigência de indivisibilidade nos se-guintes termos:

[...]

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Os argumentos do insigne civilista não podem convencer do acerto da con-clusão, a respeito dos inconvenientes apontados serem iguais, como bem faz ver Melquíades Picanço, observando que ‘em se tratando da primeira, há possibilidade da divisão, que porá termo a um condomínio incômodo ou intolerável’.

E essa razão é bastante, por isso que, no caso de divisibilidade possível, pode o condômino promover a divisão da coisa, desaparecendo os inconvenientes, o que já não sucede sendo a coisa indivisível, em que ficará o condômino em posição desfavorável se for admitido um comprador da parte de outro condômino, sem lhe ser assegurada a preferência” (Código Civil Brasileiro interpretado, v. XVI, Freitas Bastos, 8. ed., 1953, art. 1139, p. 168/169).

Com o devido respeito a essas opiniões em contrário, tenho, no entanto, que a orientação que mais se ajusta aos fins da lei é a que proclama existir direito de preferência em favor dos comproprietários não-alienantes nos casos em que a coisa em comum, divisível ou indivisível, permaneça indivisa.

Naquela oportunidade, a Quarta Turma seguiu o entendimento de que deveria ser reconhecido ao condômino o direito de preempção da coisa que estivesse em estado de indivisão, mesmo que passível de divisão. O julgado recebeu a seguinte ementa:

DIREITO CIVIL – CONDOMÍNIO – IMÓVEL INDIVISO – ALIENAÇÃO DE FRA-ÇÃO IDEAL – DIREITO DE PREFERÊNCIA – ART. 1.139, CC – POLÊMICA NO TEMA – HERMENÊUTICA – EXEGESE SISTEMÁTICA E TELEOLÓGICA – CARÊN-CIA AFASTADA – RECURSO PROVIDO

I – Se a coisa em comum, divisível ou indivisível, permanece em estado de in-divisão (não dividida), o condômino que pretenda alhear a terceiro seu quinhão deve, antes, expedir comunicação aos demais comproprietários para possibilitar--lhes o exercício da prelação que lhes assegura o art. 1.139, CC.

II – Em linha de princípio, a orientação legal e no sentido de evita o ingresso de estranho no condomínio, preservando-o de futuros litígios e inconvenientes.

III – A interpretação meramente literal deve ceder passo quando colidente com outros métodos exegéticos de maior robustez e cientificidade.

(REsp 9.934/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T., Julgado em 02.03.1993, DJ 17.05.1993, p. 9338)

Posteriormente, este mesmo Colegiado manteve referido posicionamento nos seguintes precedentes: REsp 71.731/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha e REsp 88.408/SP, Rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira.

Todavia, a Terceira Turma seguiu em sentido oposto, assegurando a noti-ficação ao condômino para exercício de seu direito de prelação apenas quando a coisa fosse efetivamente indivisível, pois, caso passível de divisão, a alienação poderia ocorrer livremente, conforme se vê do seguinte acórdão:

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DIREITO DE PREFERÊNCIA – CONDÔMINO – RESTRINGE-SE ESSE DIREITO À HIPÓTESE DE COISA INDIVISÍVEL E NÃO SIMPLESMENTE INDIVISA

Cessão de quotas hereditárias. A indivisibilidade, no caso, não é econômica ou material, mas simplesmente jurídica e tem caráter transitório. Não conduz a in-cidência do art. 1.139/CC. Hipótese em que, de qualquer sorte, reconheceu-se a decadência, com base nos aspectos fáticos da causa, o que não se pode rever no recurso especial. (REsp 60.656/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, 3ª T., Julgado em 06.08.1996, DJ 29.10.1996, p. 41641)

O Min. Relator ressaltou em seu voto que:

Interessante salientar, de outra parte, que, segundo relata Agostinho Alvim, não havia, no texto do projeto de Código Civil, originário da Câmara, alusão a coisa indivisível. Dizia simplesmente: “Não podem os condôminos vender a estranhos sua respectiva parte...”. A modificação resultou de emenda, introduzida no Se-nado, por Rui Barbosa, que observou não se dever aplicar a norma a qualquer espécie de propriedade comum, mas só à coisa indivisível (Da compra e venda. 1. ed. Forense, p. 114/5).

A Terceira Turma reiterou seu entendimento quando do julgamento dos REsps 7.525, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, 109.787 e 20.446, Rel. Min. Waldemar Zveiter.

Visando uniformizar a jurisprudência do STJ, a Segunda Seção, nos idos de 2004, julgando o REsp 489.860/SP, ainda sob a égide do CC/1916, entendeu por encampar a tese da Quarta Turma, conforme se percebe da ementa de seu julgado:

Civil. Recurso especial. Condomínio. Alienação de parte ideal por condômino. Estado de indivisão do bem. Direito de preferência dos demais condôminos.

Na hipótese de o bem se encontrar em estado de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, o condômino que desejar alienar sua fração ideal do condomínio deve obrigatoriamente notificar os demais condôminos para que possam exercer o direito de preferência na aquisição, nos termos do art. 1.139 do CC/1916. Pre-cedentes da Quarta Turma.

Recurso especial conhecido e provido.

(REsp 489.860/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, 2ª S., Julgado em 27.10.2004, DJ 13.12.2004, p. 212)

4. Assim, parece conveniente trazer novamente à discussão o tema para saber se, à luz do Código Civil de 2002, referido posicionamento deve ser man-tido.

Nesse passo, ainda persiste dúvida sobre a questão, inclusive tendo sido uma das propostas de enunciado carreada nas Jornadas de Direito Civil do CJF/STJ:

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Surge uma primeira dúvida prática, referente à aplicação do art. 504 do CC. Isso porque, quando da IV Jornada de Direito Civil, José Osório de Azevedo Jr., um dos grandes especialistas no tema da compra e venda no Brasil, fez proposta de enunciado no seguinte sentido: “O preceito do art. 504 do Código Civil aplica-se tanto às hipóteses de coisa indivisível como às de coisa divisível”. Em suas justi-ficativas, o jurista apontou a existência de entendimento no Superior Tribunal de Justiça de aplicação da restrição também para a venda de bens divisíveis, apesar de resistências. Vejamos o trecho fundamental do seu parecer:

“O STJ julga nos dois sentidos: a) Direito de preferência. Condomínio. Res-tringe-se esse direito à hipótese de coisa indivisível e não simplesmente in-divisa. (STJ, REsp 6056/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, J. 06.08.1996, DJU 29.10.1996). Condomínio. Coisa divisível. Alienação de fração ideal. Direito de Preferência. Art. 1.139 do CC.

O condômino não pode alienar o seu quinhão a terceiro, sem prévia comu-nicação aos demais consortes, a fim de possibilitar a estes o exercício do direito de preferência, tanto por tanto, seja a coisa divisível ou não. Recurso especial não conhecido. (STJ, REsp 71.731/SP, Rel. Min. Cesar A. Rocha, DJU 13.10.1998). O CC/2002 perdeu a oportunidade de dirimir a controvérsia. Urge dar ao texto interpretação sistemática, harmonizando-o com o preceito do art. 1.314, parágrafo único, a saber: Art. 1.314. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a res-pectiva parte ideal, ou gravá-la. Parágrafo único. Nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o consenso dos outros. Não é coerente exigir o consenso dos condôminos para transmitir posse a estranhos e afastar essa exigência em caso de transmissão de propriedade, e, consequentemente, da própria posse. Em abono dessa tese, também se observam os arts. 1.794 e 1.795, a propósito de venda de quota hereditária. Aqui o CC inovou e deixou expresso o direito de preferência dos herdeiros, sem qualquer distinção quanto à indivisibilida-de dos bens que compõem o acervo. Quanto a esse ponto, também diverge a jurisprudência: Pela preferência: STJ, REsp 33.176, Rel. Min. Cláudio Santos, J. 03.10.1995, indicando precedentes – REsp 4.180 e 9.934; em sentido con-trário: REsp 60.656-0/SP – 3ª T., J. 06.08.1996, DJU 29.10.1996, RT 737/192. Diante do exposto, propõe-se o enunciado supra, prestigiando a interpretação sistemática em detrimento da literal, que é a mais tosca de todas.”

A questão é realmente polêmica no próprio STJ, como se pode perceber da pro-posta de enunciado doutrinário. Todavia, inicialmente, ainda é majoritário o en-tendimento de que a restrição somente se aplica aos casos de condomínio de coisa indivisível. A norma do art. 504 do CC é restritiva da autonomia privada e, sendo assim, não admite interpretação extensiva.

(TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. São Paulo: Método, 2015. p. 668-669.)

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Outrossim, há também na jurisprudência (como se percebe do próprio acórdão recorrido) e na doutrina atual divergência de entendimentos.

Uns defendendo a tese mais restritiva de que a “se a coisa é divisível, nada impede que o condômino venda a sua parte a estranho, sem dar preferên-cia aos seus consortes, pois estes, se não desejarem compartilhar o bem com aquele, poderão requerer a sua divisão” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2010. p. 242.).

Outros encampando posicionamento muito mais abrangente, segundo o qual “a doutrina contemporânea ao novo Código Civil orienta-se pela interpre-tação abrangente dos condomínios divisíveis e indivisíveis. A inconveniência da entrada de um estranho é a mesma para ambas as espécies de co-proprieda-des. (RODRIGUES JÚNIOR, Otavio Luiz. Código civil comentado: artigos 481 a 537. Coordenador Álvaro Villaça Azevedo. São Paulo: Atlas, v. VI, t. I., 2008, p. 292-293.).

5. No ponto, o art. 504 do novo CC estabelece que:

Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a es-tranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.

A comparação do dispositivo invocado com o antigo art. 1.139 do CC/1916, permite esclarecer que a única alteração substancial foi a relativa ao prazo decadencial, que – de seis meses – passou a ser de cento e oitenta dias e, como sabido, a contagem em meses e em dias ocorre de forma diversa.

Nessa linha de intelecção, apesar da divergência doutrinária, não vislum-bro motivo para alterar o entendimento conferido pela Segunda Seção do STJ, adotado, como dito, ainda sob a égide do Código Civil de 1916.

Primeiro, porque como Corte responsável pela uniformização da inter-pretação da lei federal, uma vez definida tese sobre determinada matéria, deve prestigiá-la, mantendo sua coesão.

Segundo, porque realmente parece ser, numa interpretação teleológica, o posicionamento mais consentâneo com o melhor direito. Deveras, ao conceder o direito de preferência aos demais condôminos, pretendeu o legislador “conci-liar os objetivos particulares do vendedor com o intuito da comunidade de co-proprietários. Certamente, a função social recomenda ser mais cômodo manter a propriedade entre os titulares originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no grupo” (ROSENVALD, Nelson. Código civil comen-tado. Coordenador Cezar Peluso. Barueri, São Paulo: Manole, 2014. p. 532.).

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Terceiro, porque deve ser levado em conta todo o sistema jurídico, nota-damente o parágrafo único do art. 1.314 do CC/2002, que veda ao condômino, sem prévia aquiescência dos outros, dar posse, uso ou gozo da propriedade a estranhos (que são um minus em relação à transferência de propriedade), soma-do ao art. 504 que proíbe que o condômino em coisa indivisível venda a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto.

É o que destaca a doutrina especializada:

A interpretação literal do texto legal conduz à conclusão de que, somente no caso de bem indivisível, o condômino que quer vender está obrigado a dar preferência aos consortes. De qualquer modo, fica logo a afirmação de que, se os bens são naturalmente divisíveis mas a divisão acarreta diminuição considerável de valor, são eles considerados indivisíveis e, assim, ficam submetidos à hipótese legal.A interpretação teleológica faz concluir que o preceito incide sobre coisas indi-visas, sejam indivisíveis ou divisíveis. Se a finalidade da lei é evitar o ingresso de estranhos no condomínio em razão das inconveniências daí resultantes – o que é percebido intuitivamente –, a preferência deve existir ainda que o bem seja divisível, pois as inconveniências são as mesmas no condomínio sobre coisas divisíveis.(AZEVEDO JÚNIOR, José Osório de. Compra e venda, troca ou permuta. São Paulo: RT, 2005. p. 79-80.)

Não se pode olvidar, ademais, que muitas vezes, na prática, mostra-se extremamente difícil a prova da indivisibilidade. É o que destacou o Min. Sálvio de Figueiredo quando do julgamento do multicitado REsp 9.934/SP:

Não raras vezes – e a hipótese destes autos é bem exemplificativa – inexiste con-senso sobre se divisível, ou indivisível a coisa havida em condomínio. Em casos tais, o que se mostra preferível em relação ao condômino que pretenda alienar a sua fração ideal? Exigir que comunique aos demais condôminos a sua intenção, com isso assegurando a licitude da compra e venda, ou, ao contrário, permitir que a alienação se faça sem consentimento dos demais comproprietários, reme-tendo-se a discussão sobre a divisibilidade ou não da coisa para litígio judicial que com base nessa falta de notificação venha a se instaurar?Parece bem mais lógico e racional o primeiro procedimento, até porque a ação de preferência, como a que se examina, não é sede própria para debate acerca de ser divisível ou indivisível o objeto comum. Nela se analisa, apenas, se os consortes não alienantes foram regularmente avisados, com ciência e oportuni-dade para o exercício da preempção. Adentrar, em sede de ação de preferência, a apreciação de aspectos atinentes à divisibilidade ou indivisibilidade de imóvel comum, sem observância ao iter procedimental previsto nos arts. 967 e ss., CPC, que, inclusive, exige a citação de todos os condôminos, pode dar ensejo a inde-sejáveis decisões contraditórias.

Por fim, corroborando esse entendimento, há julgado mais recente da Quarta Turma que, mantendo posição de outrora quanto à incidência do

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA�������������������������������������������������������������������������������������������������157

art. 1.139 do CC/1916 (REsp 50.226/BA, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T., DJ 19.09.1994), estendeu aos co-herdeiros – na cessão de di-reitos hereditários – o direito de preferência concedido aos condôminos, agora com base no art. 504 do CC/2002, verbis:

DIREITO CIVIL – CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS – CONDOMÍNIO – INDIVISIBILIDADE – DIREITO DE PREFERÊNCIA DOS CO-HERDEIROS – ART. 1.139 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 (ART. 504 DO CC EM VIGOR)

1. “Os co-herdeiros, antes de ultimada a partilha, exercem a com propriedade sobre os bens que integram o acervo hereditário pro indiviso, sendo exigível, daquele que pretenda ceder ou alhear seu(s) quinhão(ões), conferir aos demais oportunidade para o exercício de preferência na aquisição, nos moldes do que preceitua o art. 1139, CC” (REsp 50.226/BA).

2. O art. 1.139 do Código Civil de 1916 (art. 504 do CC em vigor) não faz ne-nhuma distinção entre indivisibilidade real e jurídica para efeito de assegurar o direito de preferência ali especificado.

Interpretação em sintonia com a norma do art. 633 do mesmo diploma legal, segundo a qual “nenhum condômino pode, sem prévio consenso dos outros, dar posse, uso, ou gozo da propriedade a estranhos” (art. 633).

3. Ao prescrever, do modo taxativo, a indivisibilidade da herança, assim o fez o legislador por divisar a necessidade de proteção de interesses específicos da universalidade ali estabelecida, certamente não menos relevantes do que os as-pectos de ordem meramente prática que poderiam inviabilizar a divisão física do patrimônio.

4. Recurso especial provido.

(REsp 550.940/MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 4ª T., Julgado em 20.08.2009, DJe 08.09.2009)

6. Na hipótese, como o próprio acórdão reconhece que o imóvel sub judice se encontra em estado de indivisão, apesar de ser ele divisível, há de se reconhecer o direito de preferência do condômino que pretenda adquirir o qui-nhão do comunheiro, uma vez preenchidos os demais requisitos legais.

De fato, O condômino que desejar alhear a fração ideal de bem em es-tado de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, deverá dar preferência ao comunheiro na sua aquisição.

7. Ante o exposto, dou provimento ao recurso para, cassando a sentença e o acórdão recorrido, estabelecer como possível a preferência dos recorrentes para o imóvel em questão, devendo ser remetido os autos ao magistrado de piso para que analise os demais requisitos da ação de preempção, facultada a dilação probatória.

É o voto.

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certidão de julgAmento quArtA turmA

Número Registro: 2010/0146409-9

Processo Eletrônico REsp 1.207.129/MG

Números Origem: 10710040078366001 10710040078366002 10710040078366003 710040078366

Pauta: 16.06.2015 Julgado: 16.06.2015

Relator: Exmo. Sr. Ministro Luis Felipe Salomão

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Mônica Nicida Garcia

Secretária: Belª Teresa Helena da Rocha Basevi

AutuAção

Recorrente: Gilberto Batista Diniz e outro

Advogado: Elísio da Silva e outro(s)

Recorrido: Calsimec Indústria e Comércio Ltda. e outros

Advogado: José Roberto da Costa

Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Compra e venda

certidão

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos ter-mos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Raul Araújo (Presidente), Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2011

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.229.873 – RS (2010/0226604‑9)Relator: Ministro Reynaldo Soares da FonsecaAgravante: Albino Gelsdorf FilhoAdvogado: Ari Darci WachholzAgravado: TW Participações e Representações Ltda.Advogado: Débora Cristina Dick Pedroso e outro(s)Interes.: Eitor FritschInteres.: Romilda Azambuja Krüger

ementA

cIvIL – açÃO De DeSPeJO – aLUGUeL – cONTraTO De LOcaçÃO – FIaNça PreSTaDa SeM reSTrIçõeS – SeNTeNça cONDeNaTÓrIa SeM QUaLQUer reSSaLva NO QUe TaNGe À LIMITaçÃO Da reSPONSabILIDaDe – SOLIDarIeDaDe cONFIGUraDa – eXecUçÃO – reSPONSabILIDaDe DO FIaDOr PeLa INTeGraLIDaDe Da DÍvIDa

1. In casu, o recorrente assumiu obrigação de caráter solidário, con-forme constatado pela Magistrada sentenciante, por meio da análise do contrato de locação que originou a ação de despejo.

2. Por outro lado, o dispositivo da sentença em questão condenou os demandados sem qualquer ressalva. Não houve limitação da respon-sabilidade dos réus, ou seja, a condenação ocorreu de forma solidá-ria, ao contrário do alegado pelo ora agravante, razão pela qual este responde pela integralidade da dívida. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal.

3. Agravo regimental improvido.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Newton Trisotto (Desembargador Convocado do TJ/SC), Leopoldo de Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJ/PE), Felix Fischer e Gurgel de Faria votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 02 de junho de 2015 (data do Julgamento).

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Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Relator

relAtório

O Exmo. Senhor Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

Trata-se de agravo regimental interposto por Albino Gelsdorf Filho contra decisão exarada pelo eminente Ministro Marco Aurélio Bellizze, que negou seguimento ao recurso especial interposto pelo ora agravante, ao fundamento de que, “a sentença proferida no julgamento da ação de despejo cumulada com cobrança de aluguéis condenou, solidariamente, o locatário e os dois fiadores. Não foi estabelecida, na sentença condenatória, nenhuma limitação à respon-sabilidade dos fiadores, a qual, nos termos do celebrado entre as partes, era integral [...] na ausência de limitação da fiança no momento de sua prestação, responde o fiador pela integralidade das obrigações decorrentes do contrato de locação”.

Alega o agravante, em síntese, que, no dispositivo da sentença, o Magis-trado prolator não inseriu a menção de que a condenação seria em regime de solidariedade.

Portanto, ver tal instituto onde ele não foi posto expressamente consiste em inserir elemento novo, não existente quando a imutabilidade da res judicata incidiu.

Requer, nesse diapasão, o prosseguimento do REsp e seu final provimen-to ou o julgamento do presente recurso pela Turma competente.

É o relatório.

voto

O Exmo. Senhor Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

Razão não assiste ao agravante, devendo a decisão agravada ser mantida por seus próprios fundamentos.

Com efeito, in casu, o recorrente assumiu obrigação de caráter solidário, conforme constatado pela Magistrada sentenciante por meio da análise do con-trato de locação que originou a ação de despejo.

Por outro lado, o dispositivo da sentença em questão condenou os de-mandados sem qualquer ressalva. Não houve limitação da responsabilidade dos réus, ou seja, a condenação ocorreu de forma solidária, ao contrário do alegado pelo ora agravante.

Incide, na espécie, a seguinte diretriz jurisprudencial, verbis:

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA�������������������������������������������������������������������������������������������������161

FIADOR – Locação. Ação de despejo. Sentença de procedência. Execução. Res-ponsabilidade solidária pelos débitos do afiançado. Penhora de seu imóvel resi-dencial. Bem de família. Admissibilidade. Inexistência de afronta ao direito de moradia, previsto no art. 6º da CF. Constitucionalidade do art. 3º, inc. VII, da Lei nº 8.009/1990, com a redação da Lei nº 8.245/1991. Recurso extraordinário desprovido. Votos vencidos. A penhorabilidade do bem de família do fiador do contrato de locação, objeto do art. 3º, inc. VII, da Lei nº 8.009, de 23 de março de 1990, com a redação da Lei nº 8.245, de 15 de outubro de 1991, não ofende o art. 6º da Constituição da República. (RE 407688, Rel. Min. Cezar Peluso, Tri-bunal Pleno, Julgado em 08.02.2006, DJ 06.10.2006, p. 00033, Ement. v. 02250-05, p. 00880, RTJ v. 00200-01, p. 00166, RJSP v. 55, n. 360, 2007, p. 129-147)

CIVIL – ALUGUÉIS EM ATRASO – FIANÇA – NÃO SE TENDO COMO EXTIN-TA A FIANÇA (ART. 1.503 DO CÓDIGO CIVIL), RESPONDE O FIADOR DO LOCATÁRIO PELOS ALUGUÉIS EM ATRASO, NÃO SE PODENDO CONSIDE-RAR COMO HAVENDO MORATÓRIA A MERA TOLERÂNCIA DE MAIOR PRA-ZO NO RECEBIMENTO DOS ALUGUÉIS – Não conhecimento pela letra a do art. 119, III, da Constituição Federal. E não é, igualmente, de admitir-se o re-curso pela letra d se o acórdão trazido a confronto não oferece questão idên-tica ou semelhante àquela objeto do apelo excepcional. (RE 76969, Rel. Min. Aldir Passarinho, 2ª T., Julgado em 07.06.1985, DJ 27.09.1985, p. 16612, Ement. v. 01393-03, p. 00461)

CIVIL – LOCAÇÃO DE IMÓVEL – CONTRATO GARANTIDO POR FIANÇA – DESCUMPRIMENTO DE CLÁUSULA CONTRATUAL – PERDAS E DANOS – OBRIGAÇÃO DO FIADOR – RECURSO ESPECIAL – OFENSA AO ART. 908 DO CÓDIGO CIVIL – RESPONSABILIDADE INTEGRAL DO FIADOR

1. Se a fiança não foi limitada no ato de sua prestação, respondem os fiadores pela integralidade das obrigações decorrentes do contrato, bem como pelas inde-nizações decorrentes do descumprimento de qualquer delas.

2. A fiança prestada em caráter universal, sem restrições, faz dos fiadores corres-ponsáveis por todo e qualquer prejuízo causado pelo afiançado.

3. Recurso não conhecido. (REsp 49.568/SP, Rel. Min. Anselmo Santiago, 6ª T., Julgado em 11.12.1997, DJ 16.02.1998, p. 134)

Ante o exposto, nega-se provimento ao agravo regimental.

É o voto.

Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Relator

certidão de julgAmento quintA turmA

Número Registro: 2010/0226604-9

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Processo Eletrônico AgRg-REsp 1.229.873/RS

Números Origem: 10600009161 200900346936 70025812090 70026997213 72153

Em Mesa Julgado: 02.06.2015

Relator: Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Felix Fischer

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Augusto Brandão de Aras

Secretário: Bel. Marcelo Pereira Cruvinel

AutuAção

Recorrente: Albino Gelsdorf Filho

Advogado: Ari Darci Wachholz

Recorrido: TW Participações e Representações Ltda.

Advogado: Débora Cristina Dick Pedroso e outro(s)

Interes.: Eitor Fritsch

Interes.: Romilda Azambuja Krüger

Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Locação de imóvel

AgrAvo regimentAl

Agravante: Albino Gelsdorf Filho

Advogado: Ari Darci Wachholz

Agravado: TW Participações e Representações Ltda.

Advogado: Débora Cristina Dick Pedroso e outro(s)

Interes.: Eitor Fritsch

Interes.: Romilda Azambuja Krüger

certidão

Certifico que a egrégia Quinta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental.”

Os Srs. Ministros Newton Trisotto (Desembargador Convocado do TJ/SC), Leopoldo de Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJ/PE), Felix Fischer e Gurgel de Faria votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2012

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoApelação Cível – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0027867‑81.2009.4.02.5101 (2009.51.01.027867‑0)Relator: Desembargador Federal Aluisio Gonçalves de Castro MendesApelante: Iranildo de Rezende Miranda e outroAdvogado: Carlos Henrique de Oliveira DantasApelado: CEF – Caixa Econômica FederalAdvogado: Larissa Maria Silva TavaresOrigem: 4ª Vara Federal do Rio de Janeiro (00278678120094025101)

ementA

aDMINISTraTIvO – SISTeMa FINaNceIrO IMObILIÁrIO – aLIeNaçÃO FIDUcIÁrIa – LeI Nº 9.514/1997 – INaDIMPLeMeNTO – reGULar cONSOLIDaçÃO Da PrOPrIeDaDe eM NOMe Da ceF – reINTeGraçÃO De POSSe – aPeLaçÃO DeSPrOvIDa

1. Os mutuários adquiriram imóvel por meio de financiamento con-tratado com a CEF, no valor de R$ 31.500,00, a ser paga em prazo de 240 meses, pelo Sistema de Amortização Crescente – Sacre. Contudo, alegam que desde o final de 2007 vêm passando por graves proble-mas financeiros os quais impossibilitaram o regular pagamento das prestações e, ao tentarem a quitação de duas parcelas atrasadas com saldo de seu FGTS, receberam negativa por parte da CEF, que incluiu seus nomes nos cadastros restritivos de crédito.

2. Da análise dos documentos acostados aos autos, bem como do Processo nº 0009634-36.2009.4.02.5101, ajuizado pelos mutuários, verifica-se que pactuaram contrato de financiamento imobiliário com a CEF, nos ditames da Lei nº 9.514/1997, diploma legal que dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI, sob a égide do qual as operações de financiamento são livremente negociadas pe-las entidades autorizadas a operar no sistema, segundo condições de mercado, observadas as prescrições legais.

3. Deve ser afastada a alegação de que necessária a observância do DL 70/1966 ao caso em tela, vez que o contrato em questão não é garantido por hipoteca, mas por alienação fiduciária, de forma que, nos termos do art. 26 da Lei nº 9.514/1997, “vencida e não paga no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante,

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consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário”.

4. Notificados os mutuários a realizar a purgação da mora, em 04.06.2008 e, não o fazendo, consolida-se a propriedade do imó-vel em nome da instituição fiduciária, no caso a CEF, nos termos do art. 26, §§ 1º e 7º da Lei nº 9.514/1997, conforme se verifica da aver-bação, pelo oficial do Registro de Imóveis, na cópia da matrícula do imóvel, restando à CEF promover o leilão público do mesmo, deter-minando a desocupação do imóvel, tudo em consonância com os ditames do referido diploma legal.

5. Configurado o esbulho possessório dos mutuários e, em conse-quência, consumado o procedimento executório, através da regular consolidação da propriedade em nome da CEF, averbada no registro no Cartório de Registro Público de Imóveis, sua reintegração na posse é medida que se impõe.

6. Apelação desprovida.

Acórdão

Vistos e relatados os presentes autos em que são partes as acima in-dicadas, decide a 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, na forma do Relató-rio e do Voto, que ficam fazendo parte do presente julgado.

Rio de Janeiro, 07 de julho de 2015 (data do Julgamento).

Aluisio Gonçalves de Castro Mendes Desembargador Federal

relAtório

Trata-se de recurso de apelação interposto por Iranildo de Rezende Miranda e outra, contra sentença, às fls. 160/163, que, nos autos de ação de reintegração de posse, ajuizada pela Caixa Econômica Federal – CEF, julgou procedente o pedido, confirmando a liminar, para reintegrá-la na posse do imó-vel em questão.

Em razões recursais, às fls. 171/175, os Apelantes alegam, em sínte-se, que a adjudicação do imóvel teria ocorrido de forma irregular ensejando sua nulidade, visto que a CEF não teria observado os ditames do Decreto-Lei

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA�������������������������������������������������������������������������������������������������165

nº 70/1966 e, apesar de a sentença ter se firmado nos termos da Lei nº 9.514/1997, o contrato, ao contrário, teria se regido pelo DL 70/1966.

Sustentam, ademais, que um dos objetivos da criação do Fundo de Ga-rantia por Tempo de Serviço – FGTS teria sido garantir ao trabalhador a possibi-lidade de financiar a aquisição da casa própria e, com isso, o direito à moradia previsto no art. 6º da CRFB. Argumentam que o valor por eles pretendido para quitação do saldo devedor da casa própria seria decorrente do saldo de FGTS, de forma que em nada privaria os demais indivíduos ou causaria prejuízo à CEF.

A CEF apresentou contrarrazões, às fls. 189/192, pugnando pelo despro-vimento do apelo.

A Procuradoria Regional da República, em parecer às fls. 200/201, opi-nou pela não intervenção no feito.

É o relatório. Peço inclusão em pauta.

Aluisio Gonçalves de Castro Mendes Desembargador Federal

voto

Conheço do recurso de apelação, vez que presentes seus requisitos de admissibilidade.

Em breve síntese da demanda, os mutuários adquiriram imóvel situado na Rua Bélgica, nº 65, apartamento 102, Campo Grande, Rio de Janeiro, por meio de financiamento contratado com a CEF, no valor de R$ 31.500,00, a ser paga em prazo de 240 meses, pelo Sistema de Amortização Crescente – Sacre. Contudo, alegam que desde o final de 2007 vêm passando por graves proble-mas financeiros os quais impossibilitaram o regular pagamento das prestações e, ao tentarem a quitação de duas parcelas atrasadas com saldo de seu FGTS, receberam negativa por parte da CEF, que incluiu seus nomes nos cadastros restritivos de crédito.

Cumpre ressaltar que os mutuários ajuizaram ação ordinária em que postulam a condenação da CEF à indenização por danos morais, bem como a retirar seus nomes de cadastros restritivos de crédito, e permitir o saque do saldo existente na conta de FGTS para a finalidade específica de quitação do financiamento habitacional (Processo nº 0009634-36.2009.4.02.5101), deman-da que foi considerada dependente do presente feito, determinando o juízo a quo a conexão das ações.

Da análise dos documentos acostados aos autos, bem como do mencio-nado Processo nº 0009634-36.2009.4.02.5101, ajuizado pelos ora Apelantes,

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verifica-se que pactuaram contrato de financiamento imobiliário com a CEF, nos ditames da Lei nº 9.514/1997, diploma legal que dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI, sob a égide do qual as operações de finan-ciamento são livremente negociadas pelas entidades autorizadas a operar no sistema, segundo condições de mercado, observadas as prescrições legais.

Deve ser afastada a alegação dos Apelantes quanto à necessidade de ob-servância do DL 70/1966 ao caso em tela, vez que o contrato em questão não é garantido por hipoteca, mas por alienação fiduciária (fl. 25), de forma que, nos termos do art. 26 da Lei nº 9.514/1997, “vencida e não paga no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário”.

De fato, notificados os mutuários a realizar a purgação da mora, em 04.06.2008 (fls. 50/53 do Processo nº 0009634-36.2009.4.02.5101) e, não o fazendo, consolida-se a propriedade do imóvel em nome da instituição fidu-ciária, no caso a CEF, nos termos do art. 26, §§ 1º e 7º da Lei nº 9.514/1997, conforme se verifica da averbação, pelo oficial do Registro de Imóveis, na cópia da matrícula do imóvel (fl. 26), restando à CEF promover o leilão público do mesmo, determinando a desocupação do imóvel, tudo em consonância com os ditames do diploma legal referido. Veja-se:

“Art. 26. Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do fidu-ciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamen-to, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação.

[...]

§ 7º Decorrido o prazo de que trata o § 1º sem a purgação da mora, o oficial do competente Registro de Imóveis, certificando esse fato, promoverá a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade em nome do fiduciário, à vista da prova do pagamento por este, do imposto de transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio.

[...]

Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.

[...]

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Art. 30. É assegurada ao fiduciário, seu cessionário ou sucessores, inclusive o adquirente do imóvel por força do público leilão de que tratam os §§ 1º e 2º do art. 27, a reintegração na posse do imóvel, que será concedida liminarmente, para desocupação em sessenta dias, desde que comprovada, na forma do dispos-to no art. 26, a consolidação da propriedade em seu nome.”

Neste sentido, é também uníssona a jurisprudência:

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA – LEI Nº 9.514/1997 – EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL – DESEMPREGO – DIGNI-DADE DA PESSOA HUMANA – DIREITO SOCIAL À MORADIA – REVISÃO CONTRATUAL AFASTADA

1. O procedimento de execução extrajudicial previsto na Lei nº 9.514/1997, que instituiu a alienação fiduciária de coisa imóvel no Sistema de Financia-mento Imobiliário, não apresenta qualquer inconstitucionalidade, haja vista a possibilidade de acesso ao Poder Judiciário sempre que constatado o cometi-mento de eventual ilegalidade por parte do agente fiduciário.

2. A mera alegação de desemprego dos devedores/fiduciantes não dá ensejo, por si só, à revisão do contrato, tal como pretendido.

3. O princípio da dignidade humana e o direito social à moradia não podem ser levianamente interpretados como cláusulas de chancela ampla e irrestrita à inadimplência, sob pena de se dificultar, ainda mais, a concretização dos fins a que se destinam, uma vez que o sistema atende a um conjunto de cida-dãos que não se esgota na pessoa dos Apelantes, sendo o retorno do crédito concedido uma premissa básica para o seu equilíbrio e manutenção.

4. Apelação desprovida.

(TRF 2ª R., 8ª T.Esp., AC 200851010001873, Rel. Des. Fed. Marcelo Pereira da Silva, e-DJF2R 14.08.2014)

CIVIL – REINTEGRAÇÃO DE POSSE – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL EM GARANTIA – AUSÊNCIA DE PURGAÇÃO DA MORA – CONSOLIDA-ÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO FIDUCIÁRIO – CAIXA ECONÔMI-CA FEDERAL

1. Segundo informação colhida no sistema processual eletrônico deste Tri-bunal, houve a baixa definitiva dos autos da ação revisional em 29.02.2012, tornando prejudicada a análise da suposta conexão daquela ação com o pre-sente feito.

2. Estabelece a Lei nº 9.514/1997 que é possível a propositura de ação reinte-gratória para reaver a posse de imóvel adquirido por contrato de mútuo com cláusula de alienação fiduciária em garantia, quando comprovada a consoli-dação da propriedade em nome do fiduciário, ante a falta do pagamento da dívida pelo fiduciante.

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3. O procedimento extrajudicial que culminou na retomada do bem foi re-gular, inclusive com a observância da notificação pessoal do devedor para purgar a mora.

4. Resta configurado o esbulho possessório, que decorre da permanência da apelante na posse direta do imóvel, sem qualquer título idôneo para justificá--la, e consolidação da propriedade do imóvel em favor da CEF, tornando a reintegração da posse medida impositiva.

5. Consumado o procedimento executório, através da consolidação da pro-priedade em nome da CEF e o registro no Cartório de Registro Público de Imóveis, não há permissão para que, em sede de reintegração de posse, se discuta as cláusulas de um contrato que já se encontra extinto, sendo ausente o interesse processual neste ponto.

6. Apelação desprovida na parte conhecida.

(TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 200850010127696. Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 07.01.2014)

“CIVIL – PROCESSUAL CIVIL – SFH – IMÓVEL – REINTEGRAÇÃO DE POSSE – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – PROPRIEDADE CONSOLIDADA EM FAVOR DO FIDUCIÁRIO – LEI Nº 9.514/1997

1. Agravo Retido não conhecido, ante a ausência do requisito previsto no art. 523, § 1º, do CPC.

2. Conforme estabelece a Lei nº 9.514/1997, é possível a propositura de ação reintegratória para reaver a posse de imóvel adquirido por contrato de mú-tuo com cláusula de alienação fiduciária em garantia, quando comprovada a consolidação da propriedade em nome do fiduciário, ante a falta do paga-mento da dívida pelo fiduciante.

3. Hipótese em que, inexistindo irregularidade no procedimento extrajudicial que culminou na consolidação da propriedade do imóvel em favor da CEF, a reintegração de posse é medida impositiva.

4. Não conhecimento do agravo retido. Apelação improvida.”

(TRF 5ª R., AC 00024454020114058500, Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho, 3ª T., DJe Data: 30.07.2012, p. 192)

Configurado o esbulho possessório dos mutuários e, em consequência, consumado o procedimento executório, através da regular consolidação da pro-priedade em nome da CEF, averbada no registro no Cartório de Registro Público de Imóveis, sua reintegração na posse é medida que se impõe.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É como voto.

Aluisio Gonçalves de Castro Mendes Desembargador Federal

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2013

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos TerritóriosÓrgão: 5ª Turma CívelClasse: ApelaçãoProcesso: 20120111321345APC(0037191‑90.2012.8.07.0001)Apelante(s): Manoel Sebastião MachadoApelado(s): Espólio de Antonino CefaloRelatora: Desembargadora Maria de Lourdes AbreuAcórdão nº 882325

ementAcIvIL – PrOceSSO cIvIL – açÃO De DeSPeJO – DeNÚNcIa vaZIa – LOcaçÃO – IMÓveL reSIDeNcIaL – NOTIFIcaçÃO eXTraJUDIcIaL – NÃO aTeNDIMeNTO – rePreSeNTaçÃO PrOceSSUaL – GraTUIDaDe JUSTIça – PreLIMINareS reJeITaDaS – DIreITO De PreFerÊNcIa Na aQUISIçÃO – aUSÊNcIa De reGISTrO eM cONTraTO IMObILIÁrIO – NÃO cOMPrOvaDO – reTeNçÃO – beNFeITOrIaS NÃO aUTOrIZaDaS – DeScabIMeNTO

1. A procuração geral para o foro com poderes da cláusula ad judicia habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto as hipóteses elencadas no art. 38 do Código de Processo Civil.

2. Ao magistrado é oportunizado indeferir o benefício da gratuidade de justiça, quando dos autos não constar elementos indicativos de que o requerente realmente necessite, cabendo a ele comprovar o fato alegado, de que não tem condições financeiras de arcar com as custas do processo, sem sacrificar o próprio sustento ou o de sua família.

3. Prorroga-se a locação por prazo indeterminado quando, findo o prazo estipulado em contrato, o locatário permanecer no imóvel sem oposição do locador por mais de trinta dias, podendo este, não ha-vendo mais interesse na continuidade da locação, denunciar o con-trato, notificando o locatário para desocupação no prazo de 30 dias. (Inteligência dos arts. 56 e 57, da Lei nº 8.245/1991).

4. O exercício do direito de preferência ou preempção na aquisição do imóvel locado é conferido ao locatário que tenha levado a registro o contrato de locação no cartório imobiliário competente. (art. 33 da Lei nº 8.245/1991).

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5. Nos termos do art. 35 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991), somente as benfeitorias necessárias, salvo expressa disposição contra-tual em contrário, ainda que não autorizadas pelo locador, e as úteis, desde que autorizadas, serão passíveis de indenização e legitimam o exercício do direito de retenção.

6. Recurso conhecido e desprovido.

Acórdão

Acordam os Senhores Desembargadores da 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Maria de Lourdes Abreu – Relatora, Silva Lemos – 1º Vogal, Sandoval Oliveira – 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador Angelo Passareli, em proferir a seguinte decisão: conhe-cer. Negar provimento. Unânime, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 18 de junho de 2015.

Documento Assinado Eletronicamente Maria de Lourdes Abreu Relatora

relAtório

Cuida-se de apelação interposta por Manoel Sebastião Machado em face da sentença de fl. 168/171 v., proferida pelo MMª Juíza da 13ª Vara Cível de Brasília/DF, nos autos da ação de despejo por denúncia vazia proposta por Es-pólio de Antonio Cefalo rep. por Alberto Cefalo.

Adoto, em parte, o relatório da r. sentença, que ora transcrevo:

Espólio de Antonino Cefalo ingressou com ação de despejo em face de Manoel Sebastião Machado, ambos qualificados nos autos, alegando, em síntese, que celebraram, em 25.08.2004, contrato de locação do imóvel situado no SHIS, QL 06, Conjunto 08, Casa 17, Lago Sul, Brasília, Distrito Federal, que foi prorrogado por prazo indeterminado.

Afirmou que notificou o réu para desocupar voluntariamente o imóvel, não lo-grando êxito, razão pela qual requereu a procedência do pedido, com a rescisão do contrato de locação, bem como a decretação do despejo.

Juntou os documentos de fls. 03/14 e 18/22.

Devidamente citado, o réu apresentou contestação (fls. 42/53), afirmando que, quando foi celebrado o contrato de locação, o imóvel estava em péssimas con-

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dições, razão pela qual foi convencionado entre as partes que os primeiros 30 meses de locação seriam pagos por meio de reforma do bem, a fim de deixá-lo habitável. Afirmou, ainda, que, no ano de 2008, realizou nova reforma no imó-vel, com a autorização da viúva do antigo proprietário, para a construção de uma suíte com closet e um quiosque com churrasqueira, no valor de R$ 133.805,40 (cento e trinta e três mil, oitocentos e cinco reais e quarenta centavos).

Asseverou que o anterior proprietário, Antonino Cefalo, havia prometido lhe ven-der o imóvel tão logo conseguisse reunir o valor necessário, promessa esta que foi reafirmada pela viúva, razão pela qual investiu tempo e dinheiro no referido bem, sendo surpreendido com a notificação para que desocupasse o bem, em claro desrespeito ao princípio da boa-fé. Afirmou que a representação processual da parte autora está irregular, pois confere tão somente poderes específicos para o processo de inventário; que a notificação para desocupação também padece de vício, pois o procurador não tem poderes para fazê-la; que a ação de despejo somente poderia ter sido proposta após o encerramento do inventário; e, final-mente, que tem o direito de retenção pelas benfeitorias realizadas por ocasião da segunda reforma. Requereu a extinção do processo sem resolução do mérito, a improcedência do pedido ou, ainda, que lhe seja assegurado o direito de reten-ção por benfeitorias. Requereu, finalmente, os benefícios da assistência judiciária gratuita e juntou aos autos os documentos de fls. 54/113. O autor apresentou réplica (fls. 117/119), afirmando que a segunda reforma não foi autorizada e, portanto, não cabe o direito de retenção por benfeitorias. Alegou que a notifica-ção e a representação processual estão regulares e reiterou o pedido formulado na petição inicial.

Determinada a especificação de provas (fl. 121), a parte autora afirmou que não tinha provas a produzir (fl. 125) e a parte ré requereu a oitiva de testemunhas, a fim de provar a promessa de venda do bem (fl. 126 e 135).

Realizada audiência de instrução (fl. 155/157), as partes apresentaram alegações finais (fls. 158/159 e 162/166).

Acrescento que a MMª Juíza sentenciante julgou procedente o pedido da inicial para decretar a rescisão do contrato com o consequente desocupação do imóvel locado descrito na inicial, no prazo de 15 dias, contados da notificação pessoal do locatário, sob pena de despejo. Fixou, ainda, para o caso de execu-ção provisória, a caução no valor correspondente a 12 meses de aluguel. Em razão da sucumbência condenou o réu ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados em R$ 1.500,00, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC.

Irresignado, apela o réu às fls.174/190.

Suscita, em preliminar, a irregularidade da representação processual do autor, porquanto os poderes outorgados ao advogado Mário Honório se restrin-gem à atuação e prática de atos no processo específico constante do mandato de procuração.

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Aduz que é necessária a concessão dos benefícios da justiça gratuita uma vez que teria afirmado em contestação não ter condições financeiras de arcar com os gastos processuais sem comprometer o sustento familiar. Afirma que o local de moradia, a profissão exercida e os gastos com reformas não dão aporte ao acúmulo de riquezas, atestam, sim, “o triste quadro de um empresário entre à falência” (fl.182)

Sustenta que tem preferência na aquisição do imóvel, porquanto o “pacto entre as partes desenvolveu-se em termos escritos e verbais, tudo dentro da mais legítima e costumeira boa-fé do apelante, o qual não mediu esforços e inves-timentos na preservação e no melhoramento do imóvel que lhe foi prometido [...]” (fl. 186).

Afirma que tem direito à retenção de benfeitorias, que conferiram va-loração expressiva ao bem, devendo ser considerado que a reforma realizada em 2008 teve autorização da usufrutuária e que ainda que não haja este en-tendimento, deve ser garantido, ao menos, o direito de retirada, sob pena de premiação do apelado.

Ao final pugna pelo provimento do recurso para que seja reformada a sentença, acatando as preliminares ventiladas, para extinguir o feito, sem julga-mento de mérito, nos termos do art. 267, VI,do CPC.

Preparo à fl. 191.

Contrarrazões às fls. 213/217, pela manutenção da sentença.

É o relatório.

votos

A Senhora Desembargadora Maria de Lourdes Abreu – Relatora:

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

PreLIMINareS

Analiso, a priori, as preliminares suscitadas, quanto à irregularidade da representação processual do autor e quanto à negativa de concessão da justiça gratuita.

Em relação à alegada irregularidade na representação processual do au-tor, verifico que não merece prosperar.

Da análise dos instrumentos de procuração de fls. 05/06, verifica-se que o senhor Alberto Cefalo, nomeado inventariante do espólio de Antonio Cefalo (fl. 07), outorgou ao Dr. Mário Honório Teixeira Filho, advogado inscrito na

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OAB/RJ sob o nº 116.932, poderes para o foro em geral (cláusula ad judicia – art. 38, do CPC) e ainda, poderes especiais para assinar a folha de partilha dos bens deixado pelo de cujus e acompanhar o processo de inventário, em trâmite na 12ª Vara de Órfãos e Sucessões da Comarca do Rio de Janeiro. Por sua vez, este substabeleceu, através do instrumento de fl. 04, todos os poderes a ele ou-torgados ao Dr. Onório Justiniano Teixeira, OAB/DF 1.909.

A procuração outorgada pelo inventariante ao Dr. Mário Honório Teixei-ra Filho lhe confere poderes ad judicia para o foro em geral, e tendo substabe-lecido os mesmos poderes ao Dr. Onório Justiniano Teixeira, não se verifica a irregularidade processual.

Quanto à alegação do apelante de que tem direito aos benefícios da gratuidade de justiça, porquanto em contestação teria afirmado não ter condi-ções financeiras de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do sustento familiar, vejo que não merece prosperar.

De acordo com a situação demonstrada nos autos, não se pode crer que o réu/apelante não possa suportar as despesas processuais.

Ademais, é oportunizado ao magistrado indeferir o benefício da gratui-dade de justiça, quando dos autos não constar elementos indicativos de que o requerente realmente necessite, cabendo a ele comprovar o fato alegado, de que não tem condições financeiras de arcar com as custas do processo, sem sacrificar o próprio sustento ou o de sua família.

Neste sentido é o entendimento deste Tribunal de Justiça:

AÇÃO DE COBRANÇA – TAXAS CONDOMINIAIS – GRATUIDADE DE JUSTIÇA – DECLARAÇÃO DE POBREZA – PROVA DAS CONDIÇÕES ECONÔMICAS – JUROS MORATÓRIOS – TERMO INICIAL

I – Incumbe ao Juiz averiguar a alegação de pobreza, deferindo ou não a gratui-dade de justiça, quando houver incongruência entre a declaração e a situação demonstrada pelos documentos que instruem o processo.

[...]

IV – Apelações providas. (Acórdão nº 847762, 20110710369089APC, Relª Vera Andrighi, Revisor: Esdras Neves, 6ª T.Cív., Data de Julgamento: 04.02.2015, Pu-blicado no DJe: 19.02.2015) (destacou-se)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – GRATUIDADE JUDICIÁRIA – DECLARAÇÃO DE POBREZA – HIPOSSUFICIÊNCIA – ANÁLISE DO CASO CONCRETO – PRE-TENSÃO DEFERIDA

1. Ao juiz é permitido indeferir o benefício da gratuidade de justiça, quando dos autos não constar elementos indicativos de que a parte necessite do benefício requerido, cabendo a ela comprovar o fato alegado, qual seja, que não dispõe de

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condições financeiras que lhe possibilitem satisfazer as custas processuais sem sacrificar o próprio sustento ou o de sua família.

2. Embora a Constituição Federal tenha aparentemente inovado, afirmando que os necessitados que comprovarem o estado peculiar de pobreza fazem jus aos benefícios da assistência judiciária gratuita, vem se pacificando o entendimento de que o inciso LXXIV do art. 5º recepcionou o art. 4º, da Lei nº 1.060/1950 c/c o art. 1º da Lei nº 7.115/1983.

3. A mitigação a este direito pode ocorrer com a constatação de prova contrária à existência dos requisitos essenciais para a concessão do benefício, dispostos no art. 7º da Lei de Assistência Judiciária, cabendo ao juiz analisar o caso em concreto.

[...]

6. Recurso conhecido e provido. (Acórdão nº 862478, 20150020014320AGI, Rel. Sandoval Oliveira, 5ª T.Cív., Data de Julgamento: 22.04.2015, Publicado no DJe: 27.04.2015, p. 314)(destacou-se)

Rejeito, pois, as preliminares.

mÉrito

Observa-se da análise dos autos, que o réu/apelante celebrou contrato de locação residencial com o autor/apelado com vigência até o dia 24.02.2008, pelo valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) (fls. 09/11), sendo que, para os 30 primeiros meses, foi estipulado o valor total de R$ 135.732,00 (cento e trinta e cinco mil, setecentos e trinta e dois reais), importância gasta pelo apelante na reforma do imóvel.

Expirado esse prazo, houve prorrogação por prazo indeterminado.

Segundo o parágrafo único do art. 56 da Lei nº 8.245/1991, “findo o prazo estipulado, se o locatário permanecer no imóvel por mais de trinta dias sem oposição do locador, presumir-se-á prorrogada a locação nas condições ajustadas, mas sem prazo determinado”.

Considerando que nos autos não se demonstrou ter sido entabulado novo contrato, vigora o de locação por prazo indeterminado e, não sendo mais de interesse da locadora manter o aluguel, tem ela o direito de denunciar o con-trato por escrito, bastando que conceda à locatária prazo para a desocupação voluntária, conforme estabelece a Lei nº 8.245/1991, em seu art. 57:

“Art. 57. O contrato de locação por prazo indeterminado pode ser denuncia-do por escrito, pelo locador, concedidos ao locatário trinta dias para a desocu-pação.”

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A notificação para desocupação do imóvel é regular e foi enviada em 13.07.2012 (fls. 12/13) nos termos do enunciado acima.

Com efeito, a denúncia vazia é a faculdade de rescisão do contrato lo-catício, sem que haja a necessidade de o locador demonstrar os motivos que ensejaram a retomada do imóvel.

O réu/apelante não atendeu à notificação feita pelo autor/apelado, moti-vo pelo qual, o mesmo propôs a presente ação de despejo.

Resta evidente a possibilidade de desfazimento da locação diante da de-núncia realizada pelo locador, com observância do prazo de 30 (trinta) dias para a desocupação.

O e. TJDFT apresenta entendimento neste sentido:

LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL – VIGÊNCIA POR PRAZO INDETERMINADO – DENÚNCIA VAZIA – DIREITO DO LOCADOR DE PEDIR O IMÓVEL – NOTI-FICAÇÃO COM PRAZO DE 30 DIAS PARA DESOCUPAÇÃO – CUMPRIMENTO DAS EXIGÊNCIAS DO ART. 57, DA LEI Nº 8.245/1991 – DIREITO RECONHECI-DO – 1. O contrato de locação não comercial por prazo indeterminado por ser encerrado, desde que seja denunciado por escrito, pelo locador, e concedidos ao locatário trinta dias para a desocupação. 2. A denúncia vazia independe de qualquer motivo, pois é direito subjetivo do locador. 3. Se a locatária preten-dia a continuidade do vínculo locatício deveria ter ajuizado a ação renovatória, observadas as exigências do art. 71 da Lei de Locação. 4. Recurso conhecido e negado provimento.” (Acórdão nº 684871, 20110710285843APC, Rel. Rômulo de Araujo Mendes, 2ª T.Cív., Data de Julgamento: 05.06.2013, Publicado no DJe: 19.06.2013, p. 43)

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE DESPEJO – RETOMADA DE IMÓVEL LOCADO – PRELIMINARES DE CARÊNCIA DE AÇÃO E INÉPCIA DA INICIAL – REJEIÇÃO – DENÚNCIA VAZIA – PRAZO PARA DESOCUPAÇÃO NÃO ATENDIDO – DI-REITO AO DESPEJO – 1. Havendo contrato de locação entra as partes e sua pror-rogação por prazo indeterminando, bem como notificação para desocupação do imóvel, que não foi atendida, patente é o interesse processual e fundamentação jurídica do pedido, não havendo se falar em carência de ação ou inépcia da inicial. 2. “Findo o prazo estipulado, se o locatário permanecer no imóvel por mais de trinta dias sem oposição do locador, presumir-se-á prorrogada a loca-ção nas condições ajustadas, mas sem prazo determinado” (art. 56 da Lei nº 8.245/1991). 3. Vigorando o contrato de locação por prazo indeterminado e, não sendo mais de interesse da locadora manter a locação, tem ela o direito de de-nunciar o contrato por escrito, bastando que conceda à locatária o prazo de trinta dias para a desocupação voluntária, conforme estabelece a Lei nº 8.245/1991, em seu art. 57. 4. É dizer ainda: quando o locador comercial exercitar a de-núncia vazia, baseado na vigência do contrato por prazo indeterminado, ne-cessário apenas que se promova a notificação prévia do locatário, para que este

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restitua o imóvel locado no prazo de trinta dias 6. Recurso improvido. (Acórdão nº 624974, 20090111096078APC, Rel. João Egmont, 5ª T.Cív., Data de Julga-mento: 03.10.2012, Publicado no DJe: 10.10.2012, p. 108)

Alega o réu/apelante que tem preferência na aquisição do imóvel, por-quanto o “pacto entre as partes desenvolveu-se em termos escritos e verbais, tudo dentro da mais legítima e costumeira boa-fé do apelante, o qual não mediu esforços e investimentos na preservação e no melhoramento do imóvel que lhe foi prometido [...]” (fl. 186).

Quanto ao tema, tenho que a douta sentença, tal como proferida, merece ser confirmada, porquanto bem analisou e julgou os fatos, aplicando corre-tamente o direito. Reporto-me aos seus fundamentos também como razão de decidir o presente recurso. Vejamos:

[...]

A parte ré afirma que possuía direito de preferência na aquisição do bem objeto do contrato de locação. Todavia, conforme se depreende da certidão da matrícu-la do imóvel, tal direito de preferência não foi objeto de inscrição no Registro de Imóveis (fl. 08). Da mesma forma, tal direito de preferência não restou avençado no instrumento particular celebrado entre a parte ré e o antigo proprietário do bem (fls. 09/11). Finalmente, cumpre consignar que embora a parte ré tenha plei-teado a produção de prova oral a fim de comprovar o aludido direito de prefe-rência (fl. 136), é certo que as testemunhas ouvidas durante a instrução foram ex-pressas ao afirmar que desconheciam qualquer ajuste neste sentido (fls. 156/157).

A própria parte ré, em alegações finais, reconhece que não houve prova do fato alegado, afirmando, contudo que sempre “zelou e cuidou do imóvel como se fosse seu” (fl. 164), o que, no seu entender seria indício da alegada promessa de aquisição. Contudo, evidente que zelar pela conservação e manutenção do bem como se seu fosse é dever do locatário, conforme expressa dicção do art. 23, inciso II, da Lei de Locação, aqui assumindo ainda maior relevo, em virtude do que restou avençado no contrato, acerca da isenção de pagamento de alugueres nos primeiros 30 meses.

Desta forma, não demonstrada a promessa de preferência na aquisição do bem. Ademais, conforme se infere dos autos, o imóvel não está sendo colocado à venda, ao contrário, o espólio está adotando as medidas necessárias à transferên-cia da propriedade e posse do bem, em virtude do falecimento do proprietário anterior.

[...]

Como se vê, não há nos autos qualquer prova que venha a fazer presumir o interesse do locatário na aquisição do imóvel, nem tampouco no desejo do locador de aliená-lo.

Ademais, a fim de resguardar seu direito de preferência, deveria o réu/apelante proceder à averbação do contrato de locação junto à matrícula do

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imóvel, não procedendo a afirmação de que o pacto se deu de forma verbal, primeiro, porque não comprovado, segundo, porque deve prevalecer o ajuste firmado de forma tácita.

Nesse sentido, é a jurisprudência desta colenda Corte, in verbis:

LOCAÇÃO – LEI Nº 8.245/1991 – DIREITO DE PREFERÊNCIA – NÃO AVERBA-ÇÃO DO CONTRATO LOCATIVO NA MATRÍCULA DO IMÓVEL – RECURSO ADESIVO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – MAJORAÇÃO – EQUIDADE

1. O fato de o contrato de locação não ter sido averbado junto à matrícula do imóvel mitiga o direito da apelante em ter preferência na sua aquisição, segundo se depreende do art. 33 da Lei nº 8.245/1991. [...]

(APC 2004.01.1.064894-4, 4ª T.Cív., Maria Beatriz Parrilha, DJU: 10.07.2007, p. 120)

PREFERÊNCIA DA LOCATÁRIA À AQUISIÇÃO DO IMÓVEL (LEI Nº 6.649/1979) – DESCABIMENTO – AUSÊNCIA DE AVERBAÇÃO NO ÁLBUM IMOBILIÁRIO – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – HONORÁRIOS DE SU-CUMBÊNCIA – JULGAMENTO SIMULTÂNEO – AÇÃO PRINCIPAL E CAUTELAR – HIPÓTESE DE APRECIAÇÃO EQUITATIVA DO JUIZ.

O exercício do direito de preferência ou preempção na aquisição do imóvel loca-do, é conferido ao locatário que tenha levado a registro o contrato de locação no cartório imobiliário competente (art. 33 da Lei nº 8.245/1991). Necessariamente há que prevalecer o contrato escrito em face do ajuste dito entabulado de forma tácita.

(APC 5064198, 5ª T.Cív., Dácio Vieira, DJU: 13.10.1999, p. 34)

“LOCAÇÃO – ALIENAÇÃO DO IMÓVEL – DIREITO DE PREFERÊNCIA DO LO-CATÁRIO À AQUISIÇÃO – NECESSIDADE DE AVERBAÇÃO DO CONTRATO

Para que o locatário exerça o direito de preferência à aquisição do imóvel loca-do, é necessário que o contrato de locação seja averbado, pelo menos trinta dias antes da alienação, no registro de imóveis (art. 33 da Lei nº 8.245/1991). Apelo improvido.

(APC 463939, 4ª T.Cív., Jair Soares, 16.09.1998, p. 104)

Portanto, ausente qualquer indício de verossimilhança à alegação do re-corrente com relação ao suscitado direito de preferência à aquisição do imóvel locado.

De outra parte, quanto à irresignação do réu/apelante quanto às benfei-torias realizadas no imóvel no ano de 2008 (acrescentou uma suíte e um quios-que com churrasqueira – fl.187) sob o fundamento de que estas ocorreram tão somente porque tinha a intenção de adquirir o imóvel e procurou sempre zelar pela integridade do mesmo, carece de fundamento.

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Da mesma forma quanto à pretensão ao ressarcimento dos valores que alega ter vertido em decorrência das melhorias de habitabilidade, pois não há prova de que foram autorizadas, ou de que se refiram a benfeitorias necessárias.

É induvidoso que a pretensão deduzida pelo réu/apelante neste sentido não se sustenta, porquanto, consoante preconizado pelo art. 35 da Lei do Inqui-linato (Lei nº 8.245/1991), somente as benfeitorias necessárias, salvo expressa disposição contratual em contrário, ainda que não autorizadas pelo locador, e as úteis, desde que autorizadas, serão passíveis de indenização e legitimam o exercício do direito de retenção, verbis:

“Art. 35. Salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias ne-cessárias introduzidas pelo locatário, ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão indenizáveis e permitem o exer-cício do direito de retenção.”

Fato é que, do cotejo detido dos elementos que abastecem os autos, infere-se que não houve autorização prévia por parte do autor/apelado para a realização das benfeitorias pelo réu/apelante, e, assim, as obras que realizou de-vem ser compreendidas como atos de mera liberalidade, objetivando a melhor utilização do imóvel, sem que, contudo, lhe seja assegurado qualquer direito à indenização ou a retenção do bem locado.

Quanto ao pedido de que sejam consideradas as voluptuárias as benfei-torias realizadas (uma suíte e um quiosque com churrasqueira), a autorizar o seu levantamento, não tem como proceder, porquanto impossível a retirada sem que afete a estrutura e a substância do imóvel.

Diante de todo o exposto, conheço do recurso e a ele nego provimento.

É como voto.

O Senhor Desembargador Silva Lemos – Vogal

Com o relator.

O Senhor Desembargador Sandoval Oliveira – Vogal

Com o relator.

decisão

Conhecer. Negar provimento. Unânime.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2014

Tribunal de Justiça do Estado de Minas GeraisApelação Cível nº 1.0701.12.008573‑6/001Comarca de UberabaNumeração 0085736‑Relator: Des.(a) Leite PraçaRelator do Acórdão: Des.(a) Leite PraçaApelante(s): Construtora Brilhante Ltda.Apelado(a)(s): Esmeralda dos Santos NascimentoData do Julgamento: 09.07.2015Data da Publicação: 21.07.2015

ementAaçÃO De reScISÃO De cONTraTO De PrOMeSSa De cOMPra e veNDa – LOTeaMeNTO UrbaNO – PeDIDO De INSTaUraçÃO De INcIDeNTe De UNIFOrMIZaçÃO De JUrISPrUDÊNcIa – NÃO acOLHIMeNTO – aGravO reTIDO – INverSÃO De ÔNUS Da PrOva De OFÍcIO PeLO JUIZ – aUSÊNcIa DOS reQUISITOS – PeTIçÃO INIcIaL – DOcUMeNTOS INDISPeNSÁveIS À PrOPOSITUra Da açÃO – PreSeNça – LeI Nº 6.766/1979 – aTeNDIMeNTO

Inexistindo prova do dissídio jurisdicional entre os órgãos fracionários do Tribunal, não é de se acolher o pedido de instauração de incidente de uniformização de jurisprudência.

A inversão do ônus da prova, em ações envolvendo relações de con-sumo, não é automática, exigindo-se a demonstração da hipossufi-ciência do consumidor para a realização da prova necessária ao des-linde da lide ou a verossimilhança da pretensão deduzida na ação.

Tratando-se de pedido de rescisão de contrato cujo objeto constitui terreno em loteamento, aplica-se a Lei nº 6.766/1979.

Nos termos do art. 46 da Lei nº 6.766/1979, o loteador não pode fun-damentar qualquer ação ou defesa sem a apresentação dos registros e contratos a que ele se refere.

Atendida a exigência legal, impõe-se a cassação da sentença que ex-tinguiu ação por ausência de documentos essenciais.

Acórdão

Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em rejeitar

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o pedido de instauração de incidente de uniformização de jurisprudência, dar provimento aos agravos retidos e ao recurso de apelação.

Des. Leite Praça Relator

voto

Trata-se de recurso de apelação interposto pela Construtora Brilhante Ltda. contra a r. sentença proferida pelo Exmo. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Uberaba, que extinguiu a “Ação de Rescisão Contratual c/c Perdas e Danos” proposta pela ora Apelante em desfavor de Esmeralda dos Santos Nascimento, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, inciso I, cumulado com o parágrafo único do art. 284 do Código de Processo Civil, condenando-a ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatí-cios de 20% sobre o valor da causa.

A Apelante, preliminarmente, pugna pela instauração de incidente de uniformização de jurisprudência, haja vista a existência de dissídio jurisdicional entre as Câmaras deste eg. Tribunal de Justiça. Requer, ainda, o conhecimento e provimento dos agravos retidos interpostos às fls. 97/102 e 146/157, a fim de revogar as decisões de fls. 94 e 127, respectivamente. No mérito, pede seja anulada a v. sentença, determinando-se o regular prosseguimento do feito, sob argumento de que todos os documentos indispensáveis à propositura da ação foram juntados com a petição inicial.

De forma subsidiária, requer a minoração da verba honorária, em respei-to do § 3º do art. 20 do CPC.

Contrarrazões foram apresentadas pela Recorrida, através da Defensoria Pública, às fls. 212/218, pugnando pela confirmação da sentença.

É o relatório.

Passo a decidir.

Conheço do recurso, uma vez presentes seus requisitos de admissibili-dade.

Cuidam os autos de “Ação de Rescisão Contratual c/c Perdas e Danos” ajuizada pela Construtora Brilhante Ltda. em desfavor de Esmeralda dos Santos Nascimento, pretendendo a Autora a rescisão do “Contrato Particular de Pro-messa de Venda e Compra de Terreno Localizado no Loteamento Denominado Residencial Pacaembu” firmado com a Ré, sob argumento de que esta encontra--se inadimplente desde janeiro de 2006. Requer, ainda, a reintegração de posse

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do imóvel e a condenação da Requerida ao pagamento de indenização por perdas e danos.

A parte Ré, representada pela Defensoria Pública, apresentou contesta-ção às fls. 51/72, tendo a Autora se manifestado às fls. 79/93.

À fl. 94, o digno Juiz, de ofício, inverteu o ônus da prova em desfavor da Requerente, entendendo que a relação estabelecida entre as partes é de con-sumo.

Contra esta decisão, a Autora apresentou o agravo retido de fls. 97/102.

Posteriormente, o eminente Magistrado primevo determinou a intimação da Requerente para atender à exigência prevista no art. 46 da Lei nº 6.766/1979, que dispõe sobre o parcelamento de solo urbano (fl. 127).

Novamente inconformada, a Autora apresentou agravo retido às fls. 146/157.

Diante do não atendimento do despacho de fl. 127, o douto Juiz julgou extinta a presente ação, por ausência de documentos indispensáveis a sua pro-positura (fls. 167/168).

A Autora, então, interpôs o recurso em tela, impugnando a integralidade das decisões proferidas pelo digno Magistrado de 1º grau.

DO PeDIDO De INSTaUraçÃO De INcIDeNTe De UNIFOrMIZaçÃO De JUrISPrUDÊNcIa

A Apelante suscita incidente de uniformização de jurisprudência, no que concerne à aplicação da regra inserta no art. 46 da Lei nº 6.766/1979, alegando haver divergência de entendimento entre as Câmaras Cíveis deste eg. Tribunal de Justiça.

Para comprovar tal dissídio, junta os acórdãos de fls. 197/207.

Em exame das decisões apresentadas pela Recorrente, sendo uma delas inclusive de minha relatoria, não observo a divergência apontada, eis que am-bas exigiram o cumprimento do dispositivo legal supracitado.

Importa aqui consignar que inexiste, no acórdão em que atuei como Re-lator, qualquer menção à forma como deve o loteador comprovar a regularida-de do empreendimento.

Tenho, assim, que não há se falar em interpretação diversa entre os alu-didos julgados, mostrando-se descabida a suscitação do incidente, mormente porque não atendidas as regras previstas para tanto no Regimento Interno deste eg. Tribunal de Justiça (arts. 522 e seguintes).

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Neste contexto, deixo de acolher o pleito de instauração do incidente de uniformização de jurisprudência.

DO aGravO reTIDO De FLS. 97/102

Razão assiste à Agravante, ora Apelante, merecendo ser reformada a de-cisão proferida pelo ilustre Juiz à fl. 94, o qual, de ofício, inverteu o ônus da prova em favor da parte Ré, sob o simples fundamento de que a relação entre as partes é de consumo.

É cediço que, ainda que se trate de ação envolvendo relação de consu-mo, a inversão do ônus da prova não é medida automática, exigindo a demons-tração da hipossuficiência do consumidor para a produção da prova, necessária ao deslinde da lide, ou da verossimilhança da pretensão deduzida no feito.

A respeito do assunto, confira-se a oportuna doutrina:

“O primeiro dos requisitos legais é a verossimilhança das afirmações do consu-midor.

Verossímil é a alegação que tem aparência de verdade, ou que é semelhante à verdade. [...].

A verossimilhança o juiz extrairá dos indícios, dos fatos alegados e provados, dos quais se possa deduzir, com base no que ordinariamente acontece, a ocorrência de outro fato, este, todavia, não provado. Em outras palavras: o juiz, a partir do indício, presumirá acontecido, também, o fato que constitui o thema probandum. [...]

A segunda hipótese na qual se admite a inversão reside na circunstância de ser o consumidor ‘hipossuficiente’ [...].

A hipossuficiência é uma característica integrante da vulnerabilidade. E vulne-rável são todos os consumidores, por força do que dispõe o art. 4º, I, do CDC já citado. Já a hipossuficiência é a marca pessoal limitada a apenas alguns, nunca de todos os consumidores.

A hipossuficiência deve relacionar-se com a dificuldade do consumidor de desin-cumbir-se do ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito.

Refere-se à dificuldade na tarefa de produção da prova pelo consumidor.

Assim, impõe-se ao juiz decisão de inversão, em favor do consumidor, sempre que se evidencie mais fácil ao fornecedor a produção da prova.

Por isso que a hipossuficiência de que trata a lei não é a econômica, pois, nesta hipótese, desejasse o juiz inverter os ônus da prova, simplesmente atribuiria ao fornecedor os encargos financeiros da prova em razão de sua situação econômi-ca privilegiada. Além disto, poderia o julgador também valer-se do disposto na

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Lei nº 1.060/1950 para liberar o consumidor do custo da produção de eventual prova técnica, diante da mera declaração de necessitado o consumidor.

A hipossuficiência exigida pela lei é a técnica, aquela diminuição da capacidade do consumidor que diz respeito à falta de conhecimentos técnicos inerentes à atividade do fornecedor – ou retidos por ele –, segundo o grau de instrução, de acesso à informação, educação, associação e posição social do consumidor.” (CARVALHO FILHO, Milton Paulo de. Inversão do ônus da prova do CDC in MARQUES, Cláudia Lima; MIRAGEM, Bruno. Doutrinas essenciais do direito do consumidor: tutela das relações de consumo. São Paulo: Revista dos Tribunais, v, VI, 2011. p. 542-545.).

Dito isso, no caso sob análise, verifico que as provas apresentadas pelas partes são suficientes para o convencimento do Juiz e para a solução da lide, não havendo necessidade de ampliação do conjunto probatório.

E tampouco vislumbro a verossimilhança da pretensão deduzida ou a hipossuficiência do consumidor.

Portanto, entendo incabível na espécie a inversão do ônus da prova, de-vendo ser desconstituída a decisão de fl. 94.

DO aGravO reTIDO De FLS. 146/157 e DO aTeNDIMeNTO Da eXIGÊNcIa PrevISTa NO arT. 46 Da LeI Nº 6.766/1979

Registro, de início, que, por conterem matérias coincidentes, o agravo retido de fls. 146/157 e o mérito da apelação serão analisados conjuntamente.

Pois bem.

Importa consignar, primeiramente, que inexiste dúvida de que a Lei nº 6.766/1979 aplica-se ao caso concreto, vez que o objeto do contrato que se pretende rescindir é um terreno localizado em um loteamento, tornando im-periosa a incidência da aludida lei, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano.

Frise-se que o próprio contrato firmado entre as partes estabelece expres-samente que “se regerá pelas normas da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979” (fl. 23).

Logo, impõe-se a observância ao disposto no art. 46 da Lei nº 6.766/1979.

Confira-se:

Art. 46. O loteador não poderá fundamentar qualquer ação ou defesa na presente Lei sem apresentação dos registros e contratos a que ela se refere.

Na hipótese em apreço, entretanto, diferentemente do digno Juiz, enten-do que a aludida exigência fora devidamente cumprida pela parte Autora, ora Apelante.

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Isso porque, juntamente com a petição inicial a Autora apresentou a cer-tidão expedida pelo 1º Ofício de Registro de Imóveis de Uberaba referente à matrícula do imóvel alienado à Requerida, em que consta, ainda, a existên-cia de registro anterior, bem como o registro do loteamento sob o nº 1/40.535 (fl. 21). Juntou, também, a Apelante, além do contrato particular de promessa de venda e compra originalmente firmado entre as partes e termo de renegociação contratual (fls. 23/33), a Guia de Arrecadação Municipal de fl. 22, relativa ao IPTU do loteamento em questão, denominado Residencial Pacaembu.

Neste contexto, tenho que restou suficientemente demonstrada a regu-laridade das atividades da loteadora, do loteamento, assim como do negócio jurídico celebrado entre as partes, sendo certo que fora fielmente atendido o que dispõe o art. 46 da Lei nº 6.766/1979.

Não se pode olvidar, ademais, que a Guia de IPTU de fl. 22 faz prova da aprovação do loteamento e do respectivo desmembramento pela Prefeitura Municipal de Uberaba.

Por conseguinte, é de se reconhecer que a inicial da presente ação en-contra-se instruída com os documentos indispensáveis a sua propositura, respei-tado o art. 283 do CPC.

Deste modo, a v. sentença deve ser cassada, prosseguindo-se regular-mente o feito, eis que todos os documentos exigidos pela lei para a propositura da ação já foram apresentados nos autos.

Ante o exposto, rejeito o pedido de instauração de incidente de unifor-mização de jurisprudência, dou provimento aos agravos retidos e ao recurso de apelação para revogar a decisão de fl. 94 e desconstituir a v. sentença, determi-nando o regular prosseguimento da presente ação, uma vez que atendido o art. 283 do CPC e o art. 46 da Lei nº 6.766/1979.

Custas ao final.

Des. Evandro Lopes da Costa Teixeira (Revisor) – De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Eduardo Mariné da Cunha – De acordo com o(a) Relator(a).

Súmula: “Rejeitaram o pedido de instauração de incidente de uniformi-zação de jurisprudência, deram provimento aos agravos retidos e ao recurso de apelação.”

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2015

Tribunal de Justiça do Estado do ParanáApelação Cível nº 1.358.824‑4, de Cianorte – 1ª Vara Cível e da Fazenda PúblicaApelante: Ponto Rural Comércio e Distribuição de Insumos Agrícolas Ltda.Apelado: Vinícius de Paula DalbertoRelator: Des. Luiz Carlos GabardoRevisor: Dr. Marco Antonio Antoniassi

aPeLaçÃO cÍveL – eMbarGOS De TerceIrO – IMÓveL PeNHOraDO – aLIeNaçÃO a TerceIrO aNTerIOr À cITaçÃO DO DeveDOr NO PrOceSSO De eXecUçÃO – FraUDe À eXecUçÃO – NÃO caracTerIZaçÃO – FraUDe cONTra creDOreS – DIScUSSÃO – IMPOSSIbILIDaDe – MeIO PrOceSSUaL aDeQUaDO – açÃO PaULIaNa – SÚMULa Nº 195, DO STJ

1. Não há que se falar em fraude à execução na hipótese em que a alienação do bem ocorre antes da citação do devedor no processo de execução.

2. De acordo com a Súmula nº 195, do Superior Tribunal de Justiça, “Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores”.

3. Apelação cível conhecida e não provida.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1.358.824-4 (NPU 0081327-21.2011.8.16.0014), da Comarca de Cianorte – 1ª Vara Cível e da Fazenda Pública, em que é apelante Ponto Rural Comércio e Distribuição de Insumos Agrícolas, e apelado Vinícius de Paula Dalberto.

i – relAtório

Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença de fls. 346/350-mí-dia, exarada pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível e da Fazenda Pública da Comarca de Cianorte, nos autos de embargos de terceiro, NPU 0081327-21.2011.8.16.0014, que Vinícius de Paula Dalberto opõe em face de Ponto Rural Comércio e Distribuição de Insumos Agrícolas Ltda., pela qual julgou procedente o pedido inicial, “[...] para o fim de manter o Embargante na posse do bem discutido (Matrícula nº 2.998), bem como determinar o levantamento da constrição” (fl. 350-mídia).

Diante da sucumbência, condenou a embargada ao pagamento das cus-tas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).

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A apelante sustenta, em síntese, que o “[...] apelado agiu em conjunto com seu pai a fim de obstar o recebimento do crédito exequendo. Houve nítida má-fé por parte de ambos, não restando dúvidas quanto à configuração da frau-de à execução” (fl. 360-mídia).

Afirma que, “Para constatação da conduta fraudulenta não se deve con-siderar apenas o fato (isolado) da hipoteca haver sido outorgada antes da pro-positura da ação executória. É imperioso analisar que a escritura de dação em pagamento foi lavrada em data posterior à execução promovida pela apelante e, sobretudo, em data anterior ao vencimento da confissão de dívida, oportu-namente quando o executado já havia sido cientificado da execução proposta, conforme certidão expedida pelo Cartório distribuidor da Comarca de Cianorte em data de 22.09.2009 constando a existência de carta precatória decorrente da execução promovida pela apelante” (fl. 360-mídia).

Aponta que, “[...] embora a Confissão de Dívida tenha sido efetuada em relação ao imóvel matriculado sob nº 12.195, optaram as partes (executado e apelado) por firmar Escritura de Dação em Pagamento em relação ao imóvel nº 2.998 (cláusula quarta), em absoluta fraude” (fl. 360-mídia).

Defende que “Desde sua primeira manifestação nos embargos opostos a apelante já pugnou pelo reconhecimento da fraude, da má-fé, sinalizando por meio dos documentos acostados que havia conluio entre as partes envolvidas a fim de impedir a satisfação do débito exequendo. Ora, é um absurdo achar que o filho não sabe da situação financeira do pai quando desenvolvem a mesma atividade” (fl. 362-mídia).

Subsidiariamente, postula a redução dos honorários sucumbenciais. Com base nesses fundamentos, requer a reforma da sentença.

Recebido o recurso em ambos os efeitos (fl. 375-mídia), o apelado apre-sentou contrarrazões (fls. 381/389-mídia).

É o relatório.

ii – voto e suA fundAmentAção

Presentes os requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

Da FraUDe À eXecUçÃO

O MM. Juiz julgou procedentes os presentes embargos de terceiro, para “manter o Embargante na posse do bem discutido (Matrícula nº 2.998), bem como determinar o levantamento da constrição” (fl. 350-mídia).

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A apelante insurge-se contra esse entendimento, amparada na tese de que a propriedade do referido bem foi transferida ao apelado por meio de ato fraudulento, a caracterizar fraude à execução.

Para tanto, sustenta que a transferência da titularidade do bem ocorreu por meio de dação em pagamento, em 01.10.2009, quando já havia sido ajui-zada ação de execução.

Pois bem.

A fraude à execução está disciplinada no art. 593, do Código de Processo Civil, que dispõe:

“Art. 593. Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens:

I – quando sobre eles pender ação fundada em direito real;

II – quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor deman-da capaz de reduzi-lo à insolvência;

III – nos demais casos expressos em lei.”

De acordo com o inciso II, do citado dispositivo, o reconhecimento de fraude à execução tem como requisito a existência de ação em trâmite contra o devedor ao tempo da alienação ou oneração do bem e a sua insolvabilidade.

No caso, contudo, nenhum desses requisitos foi preenchido.

Na sentença, o MM. Juiz entendeu que, “a despeito de a Embargada sus-tentar que a dação em pagamento ocorreu depois de ajuizada a execução em desfavor do devedor, já estava averbada na Matrícula, desde 10 de janeiro de 2007 (Escritura de 19.12.2006), a outorga de hipoteca do bem ao credor, ora Embargante” (fl. 348-mídia).

Considerou, assim, que o termo a ser utilizado para apuração de fraude à execução não seria a data da dação em pagamento (01.10.2009, fl. 152-mídia), mas, sim, a hipoteca averbada na matrícula do imóvel em favor do apelado, em 10.01.2007.

A apelante defende que essa interpretação é equivocada, pois, segundo entende, o que deve ser levado em consideração é a data em que houve a transferência da titularidade do bem e não a da garantia ofertada anteriormente.

No entanto, qualquer que seja a data adotada (hipoteca ou dação em pagamento), a fraude à execução não resulta caracterizada.

Isso porque a regularidade da alienação (ou oneração) não é aferida com base na data do ajuizamento da ação de execução, mas sim do dia em que a relação jurídica processual é formalizada, ou seja, quando da citação dos exe-cutados.

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Conforme prescrevem Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero1:

“Fundamental para caracterização da fraude à execução é a existência de litis-pendência ao tempo da alienação ou oneração do bem passível de constrição executiva. Vale dizer: é imprescindível que o demandado tenha sido citado vali-damente para o processo em curso (STJ, 5ª T., REsp 719.969/RS, Rel. Min. Feliz Fischer, J. em 02.08.2005, DJ 26.09.2005, p. 450)”.

Entendimento, aliás, já consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo (art. 543-C, do Código de Processo Civil):

“PROCESSO CIVIL – RECURSO REPETITIVO – ART. 543-C DO CPC – FRAUDE DE EXECUÇÃO – EMBARGOS DE TERCEIRO – SÚMULA Nº 375/STJ – CITA-ÇÃO VÁLIDA – NECESSIDADE – CIÊNCIA DE DEMANDA CAPAZ DE LEVAR O ALIENANTE À INSOLVÊNCIA – PROVA – ÔNUS DO CREDOR – REGIS-TRO DA PENHORA – ART. 659, § 4º, DO CPC – PRESUNÇÃO DE FRAUDE – ART. 615-A, § 3º, DO CPC

1. Para fins do art. 543-c do CPC, firma-se a seguinte orientação: 1.1 É indis-pensável citação válida para configuração da fraude de execução, ressalvada a hipótese prevista no § 3º do art. 615-A do CPC.

1.2 O reconhecimento da fraude de execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente (Súmula nº 375/STJ).

1.3 A presunção de boa-fé é princípio geral de direito universalmente aceito, sendo milenar a parêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova.

1.4 Inexistindo registro da penhora na matrícula do imóvel, é do credor o ônus da prova de que o terceiro adquirente tinha conhecimento de demanda capaz de levar o alienante à insolvência, sob pena de tornar-se letra morta o disposto no art. 659, § 4º, do CPC.

1.5 Conforme previsto no § 3º do art. 615-A do CPC, presume-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens realizada após a averbação referida no dispositivo.

2. Para a solução do caso concreto: 2.1. Aplicação da tese firmada.

2.2 Recurso especial provido para se anular o acórdão recorrido e a sentença e, consequentemente, determinar o prosseguimento do processo para a realização da instrução processual na forma requerida pelos recorrentes.”

(REsp 956.943/PR, Relª Min. Nancy Andrighi, Rel. p/ Ac. Min. João Otávio de Noronha, Corte Especial, julgado em 20.08.2014, DJe 01.12.2014)

1 Código de Processo Civil: comentado artigo por artigo. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 593.

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA�������������������������������������������������������������������������������������������������189

Na hipótese, de acordo com os documentos constantes dos autos, verifi-ca-se que os executados somente foram citados acerca do processo de execu-ção em 06.11.2009 (fl. 26-mídia).

Logo, como os executados não haviam sido citados acerca do processo executivo na data em que foi concretizada a dação em pagamento (01.10.2009, fl. 152-mídia), inexistia qualquer óbice à alienação do bem ao apelado.

Além disso, mesmo que esse requisito resultasse preenchido, a fraude à execução não poderia ser reconhecida diante da não comprovação da insolva-bilidade dos executados.

Com efeito, o magistrado sentenciante consignou na sentença “[...] que há outro bem constrito na execução conexa a este feito, cuja avaliação apenas da porção do Executado totalizou a quantia de R$ 110.000,00, valor aparente-mente condizente com a quantia exequenda, também não se podendo, por esse fundamento, concluir-se que a alienação reduziu o Executado à insolvência” (fl. 349-mídia).

E, em seu recurso, a apelante nem sequer impugnou essa conclusão, de modo que se presume que a alienação do bem em discussão não levou o deve-dor a insolvência.

Portanto, ausentes os requisitos necessários ao reconhecimento da fraude à execução, o recurso não pode ser acolhido em relação ao tema.

Da fraude contra credores

Ainda que a apelante não tenha formulado pedido expresso de reco-nhecimento da fraude contra credores, em suas razões de apelação discorreu brevemente acerca desse instituto.

Todavia, de acordo com o entendimento jurisprudencial atual, tal discus-são somente seria cabível em ação própria (ação pauliana), conforme dispõe a Súmula nº 195, do Superior Tribunal de Justiça:

“Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores.”

No mesmo sentido, o entendimento desta 15ª Câmara Cível:

“CIVIL E PROCESSO CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS DE TERCEIRO – DEFESA DA MANUTENÇÃO DA PENHORA EM DECORRÊNCIA DE FRAU-DE CONTRA CREDORES – IMPOSSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DA SÚMULA Nº 195/STJ – DISCUSSÃO QUANTO AO VALOR DA CAUSA – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO NO PRAZO DA CONTESTAÇÃO – PRECLUSÃO – REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – DESCABIMENTO – 1. Nos termos do Enunciado nº 195 da súmula do STJ, ‘em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores’, especialmente porque tal vício revela

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hipótese de mera anulabilidade (ou ineficácia não-originária do ato), sendo im-prescindível a concessão de provimento jurisdicional constitutivo negativo para que o bem voltasse a integrar o patrimônio do executado (alienante). Provimento incompatível com a via processual dos embargos de terceiro. 2. Nos termos do art. 261 e parágrafo único, caso o réu entenda incorreto o valor atribuído à causa pelo autor, pode impugná-lo, no prazo da resposta, em peça apartada que deve ser autuada em apenso, dando início a um incidente processual. Mantendo-se inerte durante esse prazo não pode questionar a referida alteração somente em via recursal. 3. Não comporta alteração o quantum fixado em sentença a título de honorários advocatícios que se mostra compatível com as circunstâncias do caso concreto, observando, com isso, as normas do §§ 3º e 4º do art. 20 do Código de Processo Civil. Apelação Cível não provida.” (TJPR, 15ª C.Cív., AC 808636-8, Assaí, Rel. Jucimar Novochadlo, Unânime, J. 14.09.2011)

“EMBARGOS DE TERCEIRO – RECONHECIMENTO DE SIMULAÇÃO E ANULA-ÇÃO DA CESSÃO DO CRÉDITO PENHORADO – SÚMULA Nº 195 DO STJ – FALTA DE PROVA DA SIMULAÇÃO – 1. É vedada a anulação de ato jurídico em embargos de terceiro por fraude contra credores. 2. Para o reconhecimento de simulação é indispensável a demonstração da sua ocorrência por prova inequí-voca, que deixa de existir se documentos demonstrarem ser plausível a versão, dada pela cessionária do crédito, de que a referida cessão integrou operação de faturização de compra de títulos. Apelação 1 provida. Apelação 2 prejudicada.”

(TJPR, 15ª C.Cív., AC 709478-8, Londrina, Rel. Hayton Lee Swain Filho, Unâni-me, J. 27.10.2010)

Destarte, afasta-se a possibilidade de discussão, nesta lide, acerca da ale-gada ocorrência de fraude contra credores.

Dos honorários advocatícios

Por fim, a apelante postula a redução dos honorários advocatícios fixados na sentença, no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).

Não lhe assiste razão.

Os honorários advocatícios, por valor certo (art. 20, § 4º) ou percentual (art. 20, § 3º), devem ser fixados com base nos critérios elencados nas alíneas do art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil, que dispõe:

“Art. 20. [...] [...] § 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, atendidos: a) o grau de zelo do Profissional; b) o lugar de prestação do serviço; c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. [...]”

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA�������������������������������������������������������������������������������������������������191

A lide versa sobre embargos de terceiro, e as petições apresentadas pelo procurador do embargante/apelado demonstram qualidade técnica no trabalho, tanto que os embargos foram acolhidos.

A ação teve duração aproximada de um ano (07.06.2013 – fl. 01-mídia, até 25.07.2014 – fl. 350-mídia), com a realização de audiência de instrução e julgamento para oitiva de testemunhas (fl. 292-mídia).

O feito tramitou na mesma Comarca em que se situa o escritório do pro-curador do embargante (Cianorte), no entanto, a ação de execução foi ajuizada na Comarca de Londrina.

O valor atribuído à causa é de relativa expressividade (R$ 57.444,50 – cinquenta e sete mil, quatrocentos e quarenta e quatro reais e cinquenta cen-tavos).

Nesses termos, a importância de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) é adequada para remunerar o profissional atuante nos autos.

Assim, deve ser mantida na íntegra a sentença exarada pelo Dr. João Alexandre Cavalcanti Zarpellon.

Em face do exposto, voto no sentido de conhecer do recurso de apelação interposto pela embargada, Ponto Rural Comércio e Distribuição de Insumos Agrícolas Ltda., e negar-lhe provimento.

iii – dispositivo

Acordam os Excelentíssimos Senhores Magistrados Integrantes da Dé-cima Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso de apelação interposto pela embargada, Ponto Rural Comércio e Distribuição de Insumos Agrícolas Ltda., e negar-lhe provimento.

O julgamento foi presidido por este Relator e dele participaram os Ex-celentíssimos Senhores Magistrados Jucimar Novochadlo e Marco Antonio Antoniassi.

Curitiba, 17 de junho de 2015.

Luiz Carlos Gabardo Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2016

Tribunal de Justiça Estado do Rio Grande do SulAgravo de Instrumento nº 70008074106Décima Oitava Câmara CívelComarca de Porto AlegreAgravante: Renato Silveira MalhãoAgravante: Jessica Hermes Gomes Agravado: Departamento Municipal de Habitação – Demhab

aGravO De INSTrUMeNTO – reINTeGraçÃO De POSSe – IMÓveL Para aSSeNTaMeNTO UrbaNO – DeMHab – OcUPaçÃO De IMÓveL PÚbLIcO, SeM a DevIDa INTerveNIÊNcIa Da MUNIcIPaLIDaDe – LIMINar De reINTeGraçÃO MaNTIDa

Restando caracterizado o esbulho, com a ocupação indevida de ter-ceiros em imóvel que serve para assentamento urbano, sem a devida participação do Poder concedente, é de ser mantida a decisão de reintegração na posse do imóvel.

Agravo desprovido. Unânime.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminen-tes Senhores Des. Pedro Celso Dal Prá e Dr. Pedro Luiz Pozza.

Porto Alegre, 20 de maio de 2004.

Des. Mario Rocha Lopes Filho, Relator

relAtório

Des. Mario Rocha Lopes Filho (Relator):

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Departamento Muni-cipal de Habitação contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Fazenda

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA�������������������������������������������������������������������������������������������������193

Pública, 1º Juizado, da Comarca de Porto Alegre que, nos autos da ação de reintegração de posse ajuizada contra Renato Silveira Malhão e Jéssica Hermes Gomes, deferiu liminar reintegratória de posse postulada.

Em suas razões, sustentam os agravantes não estarem presentes os requi-sitos indispensáveis à concessão da medida pleiteada, pois não houve aliena-ção, permuta ou qualquer outra forma de aquisição do imóvel pertencente ao casal João Hortêncio Nunes e sua esposa Jurema de Lourdes Nunes, mas tão somente que estão tomando conta do imóvel, em razão de saída momentânea dos titulares. Noticiam, ainda, “perseguição” contra o casal titular do direito real de uso, devido a problemas com a vizinhança. Por fim, propugnaram pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva, pois na posse do imóvel de forma precária e a pedido dos titulares, bem como da revogação da liminar concedi-da. Pediram fosse atribuído efeito suspensivo ativo e o provimento do recurso de agravo.

Restou indeferido, pelo eminente Dr. Luiz Roberto Imperatore de Assis Brasil, o efeito suspensivo ativo postulado (fls. 75-76).

Foram apresentadas contrarrazões, onde o agravado sustenta a prática de esbulho por parte dos agravantes.

Manifestou-se o Ministério Público pelo desprovimento do recurso de agravo (fls. 94-95).

É o relatório.

votos

Des. Mario Rocha Lopes Filho (Relator):

Eminentes Colegas:

O agravo não prospera.

Com efeito, restou evidenciado o uso do imóvel por terceiros, que não os titulares do direito real de uso sobre o imóvel, não convencendo o alegado “pedido de licença para afastamento do imóvel”, circunstância possível de ser utilizada para violar determinação contratual, no caso, o disposto na cláusula 1.7 do contrato juntado nas fls. 19-21.

Aliás, como muito bem assinalado pelo digno Relator Plantonista, há for-tes indícios de ter havido “uma troca de casas” entre a cessionária Jurema e o casal ora agravante, em desrespeito às regras do assentamento urbano.

Todavia, no momento o que se tem é a efetiva comprovação do esbulho praticado pelos agravantes, em flagrante ilegalidade, pois o contrato de conces-

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são de direito real de uso não prevê a hipótese defendida pelos agravantes, os quais inclusive, não contaram com a aquiescência do Poder Público Municipal.

Por fim, não se descarta a possibilidade de serem verdadeiras as alega-ções dos agravantes, porém, no caso, bem andou o digno magistrado a quo, ao deferir o pleito liminar de reintegração de posse.

Pelas razões acima, voto em negar provimento ao presente agravo de instrumento interposto.

Des. Pedro Celso Dal Prá – de acordo.

Dr. Pedro Luiz Pozza – de acordo.

Julgador(a) de 1º Grau: Jose Luiz John dos Santos

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2017

Tribunal de Justiça do Estado de Santa CatarinaApelação Cível em Mandado de Segurança nº 2014.044565‑4, de Barra VelhaRelator: Des. Pedro Manoel Abreu

aPeLaçÃO cÍveL eM MaNDaDO De SeGUraNça – IMPeTraçÃO cONTra aTO DO TITULar DO carTÓrIO De reGISTrO De IMÓveIS – eXIGÊNcIa De cerTIDõeS Da MUNIcIPaLIDaDe cOMO cONDIçÃO Para O reGISTrO De cOMPra e veNDa De IMÓveL – QUeSTÃO SOLUcIONaDa aDMINISTraTIvaMeNTe – PerDa SUPerveNIeNTe DO ObJeTO – eXTINçÃO DO wrIT SeM aNÁLISe De MÉrITO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível em Mandado de Segurança nº 2014.044565-4, da comarca de Barra Velha (2ª Vara), em que é apelante Anilise Teixeira da Silva, e apelado Oficial do Cartório do Registro de Imóveis de Barra Velha:

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, extinguir a pre-tensão recursal pela superveniente perda de objeto. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 23 de junho de 2015, foi presidido pelo signatário, com voto, e dele participaram os Desembargadores Stanley da Silva Braga e Júlio César Knoll.

Florianópolis, 30 de junho de 2015.

Pedro Manoel Abreu Presidente e Relator

relAtório

Cuida-se de Apelação Cível em Mandado de Segurança interposta por Anilise Teixeira da Silva contra ato do Oficial do Cartório do Registro de Imó-veis de Barra Velha. Pretendeu a impetrante fosse realizado o registro de es-critura de compra e venda de imóvel independentemente da apresentação de determinadas certidões exigidas do delegatário.

No recurso, o apelante buscava reformar a sentença que indeferiu a peti-ção inicial, extinguindo o feito sem resolução do mérito.

Após o parecer Ministerial, a impetrante peticionou informando que o impetrado “passou a aceitar o registro de imóveis sem a exibição de certidões e

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ou informações relativas à SPU, laudêmios e congêneres, ora objeto do remédio jurídico em tela”.

Este é o relatório.

voto

Conforme informado pela impetrante à fl. 76, o objeto do presente man-dado de segurança foi alcançado na esfera administrativa, não mais sendo ne-cessário um parecer judicial sobre o tema.

Resta caracterizada, assim, a superveniente falta de interesse da impe-trante, fato que dá azo à imediata extinção do writ.

A propósito, Cândido Rangel Dinamarco leciona:

Como conceito geral, interesse é utilidade. Consiste em uma relação de com-plementariedade entre um bem e uma pessoa, a saber, entre um bem portador da capacidade de satisfazer uma necessidade e uma pessoa portadora de uma necessidade que pode ser satisfeita por esse bem. Há o interesse de agir quando o provimento jurisdicional postulado for capaz de efetivamente ser útil ao deman-dante, operando uma melhora em sua situação na vida comum, ou seja, quando for capaz de trazer-lhe uma verdadeira tutela, a tutela jurisdicional. O interesse de agir constitui o núcleo fundamental do direito de ação, por isso que só se legi-tima o acesso ao processo e só é lícito exigir do Estado o provimento pedido, na medida em que ele tenha essa utilidade e essa aptidão. [...]

Assim configurado como aptidão a propiciar o bem ao demandante se ele tiver razão, o interesse de agir não existe quando o sujeito já dispõe do bem da vida que vem a juízo pleitear e quando o provimento pedido não é mais, ou simples-mente não é, capaz de propiciar-lhe o bem. (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, v. II, 2009. p. 309-311)

À vista do exposto, julga-se extinto o presente mandamus, forte o contido no art. 267, VI, do Código de Processo Civil.

Este é o voto.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2018

Tribunal de Justiça do Estado de São PauloRegistro: 2015.0000397774Voto nº 19.746Ap 0154940‑02.2009.8.26.0100Comarca: São Paulo (31ª Vara Cível Central da Capital)Apelante: SPE Chácara Santo Antonio Ltda.Apelada: Melhor Bocado Alimentos Ltda.

cONSIGNaTÓrIa – LOcaçÃO cOMercIaL – FUNDaDa DÚvIDa QUaNTO aO TITULar DOS LOcaTIvOS – açÃO revOcaTÓrIa PrOceDeNTe – beM arrecaDaDO eM PrOceSSO FaLIMeNTar – PrOceDÊNcIa MaNTIDa – recUrSO NÃO PrOvIDO

Consignatória de aluguéis. Dúvida fundada quanto à titularidade do imóvel. Bem arrecadado em processo falimentar. Declaração de ine-ficácia das alienações em relação à massa falida. Sentença mantida por esta Câmara. Procedência do pedido consignatório. Manutenção. Recurso não provido.

A sentença proferida pela Doutora Carla Themis Lagrotta Germano jul-gou procedente o pedido para determinar a continuidade dos pagamentos dos aluguéis junto ao Juízo da Falência de Giovanna Fábrica Ltda.

A corré recorreu da sentença e alegou, em síntese, que não há dúvida séria e fundada a justificar o pedido consignatório; que é a única e exclusiva proprietária do imóvel; e que improcede o pedido da autora.

A autora e a falida, por seu síndico, apresentaram respostas nas quais pediram a manutenção da sentença.

A Procuradoria de Justiça, pelo parecer da Dra. Maria da Glória Villaça Borin Gavião de Almeida, opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

Não é intempestivo o recurso, como bem anotou o Ministério Público no parecer de fls. 449/452, porquanto a corré protocolou suas razões no último dia do prazo (19.08.2010), considerando a disponibilização da sentença no Diário Oficial no dia 03.08.2010 e a publicação no dia útil seguinte, dia 04.08.2010.

Tampouco a autora é carecedora de ação. Com efeito, restou eviden-ciado nos autos o interesse de agir da autora para o pedido consignatório, vez que firmou o contrato de locação com a empresa LK Participações e Empreen-dimentos Ltda. em 1999, foi cientificada da venda à corré, mas ao providenciar certidão registral do imóvel, constava como verdadeiro dono Gilberto Duarte de Lima. A dúvida quanto ao real titular dos locativos deu causa ao pedido.

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A ação revocatória ajuizada pelo síndico da massa falida foi julga-da procedente para declarar a ineficácia das alienações do imóvel alugado à autora, sentença confirmada no julgamento da Apelação por esta Câmara (Ap 0154940-02.2009.8.26.0100).

Desse modo, foi mantida a arrecadação do imóvel na falência de Giovanna Fábrica Ltda., na qual foi declarada a extensão da quebra à empresa LK Participações e Empreendimentos Ltda. que, por efeito da sentença, passou a ser a efetiva proprietária do imóvel.

Diante desse quadro, decidiu com acerto a sentença ao anotar que “Na ação revocatória procedente, a propriedade do imóvel continuou sendo de LK Participações e Empreendimentos Ltda., tendo sido determinada a extensão dos efeitos da falência da Giovanna Fábrica Ltda., razão pela qual os aluguéis devi-dos à ré LK, foram revertidos em favor da Massa Falida. Assim, sem consistência as alegações dos réus. Posto isso e considerando o que mais consta dos autos julgo a ação procedente para o fim de declarar válida a obrigação da autora para com a co-ré LK Participações e Empreendimentos Ltda., devendo continuar a pagar os aluguéis no Juízo da Falência da Giovanna Fábrica Ltda. Determino a transferência de eventuais valores aqui depositados, para o processo falimentar da Giovanna Fábrica Ltda.”

A sentença, assim, deu adequada solução à controvérsia, de modo que deve ser mantida por seus próprios fundamentos.

Pelo exposto, nego provimento ao recurso.

Carlos Alberto Garbi Relator

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0154940-02.2009.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante SPE Chácara Santo Antonio Ltda., são apelados Melhor Bocado Alimentos Ltda. e Giovanna Fábrica Ltda. (Massa Falida).

Acordam, em 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores João Carlos Saletti (Presidente) e Elcio Trujillo.

São Paulo, 9 de junho de 2015.

Carlos Alberto Garbi Relator

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Parte Geral – Ementário2019 – ação de busca e apreensão – contrato de financiamento – cláusula de alienação fidu-

ciária

“Apelação cível. Ação de busca e apreensão. Contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária. Sentença que extinguiu o processo por abandono de causa (art. 267, inciso III, do Código de Processo Civil). Reclamo interposto após o esgotamento do prazo recursal. Intempestividade. Art. 508 do Código de Processo civil. Precedentes. Recurso não conhecido.” (TJSC – AC 2014.058327-7 – Rel. Des. Mariano do Nascimento – DJe 15.07.2015)

2020 – ação de cobrança de aluguéis – alegação de ofensa às normas – falta de prequestiona-mento

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de cobrança de aluguéis. Alegação de ofensa às normas dos arts. 130, 131, 333, I, e 515 do CPC, e do art. 1.238 do CC/2002. Falta de pre-questionamento. Súmula nº 211/STJ. Agravo regimental não provido. 1. Não enseja interposição de recurso especial matéria que não tenha sido ventilada no v. aresto atacado e sobre a qual, embora tenham sido opostos os embargos declaratórios competentes, o órgão julgador não se pronunciou e a parte interessada não alegou ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil. Incidência da Súmula nº 211 do Superior Tribunal de Justiça. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AgRg-Ag-RE 594.593 – (2014/0253896-9) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 01.07.2015 – p. 2382)

2021 – ação ordinária – obrigação de fazer – interesse de agir – cessão de direitos – carta de adjudicação – juízo de família

“Civil e processual civil. Apelação. Ação ordinária. Obrigação de fazer. Interesse de agir. Cessão de direitos. Carta de adjudicação. Juízo de família, órfãos e sucessões. Imóvel. Codhab. Política habitacional. Políticas públicas. Mérito administrativo. Observância dos critérios e da ordem dos beneficiários. Recurso adesivo não conhecido. Recurso provido. 1. O interesse de agir está consubs-tanciado no trinômio necessidade, utilidade do provimento jurisdicional e adequação, sob pena de não poder ter satisfeita uma pretensão, ou seja, a satisfação da pretensão não dispensa o respectivo provimento jurisdicional. 1.1 De acordo com Humberto Theodoro Júnior, citando Alfredo Buzaid, ‘O interesse de agir, que é instrumental e secundário, surge da necessidade de obter através do pro-cesso a proteção ao interesse substancial. Entende-se, dessa maneira, que há interesse processual se a parte sofre um prejuízo, não propondo a demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo, necessita exatamente da intervenção dos órgãos jurisdicionais’ (Agravo de Petição nº 39, p. 88/89). 2. Apesar de o Juízo de Família, Órfãos e Sucessões de Samambaia/DF ter determinado a expedição de Carta de Adjudicação relativo a imóvel proveniente de política habitacional do Distrito Federal, o referido instrumento de cessão não se presta a transmitir direitos sobre o imóvel, eis que carece de legitimidade aos beneficiários de programas habitacionais a transferência, a qualquer título, de imó-vel de quem não é proprietário ou possuidor. 3. Lei Distrital nº 3.877/2006, que dispõe sobre a polí-tica habitacional do Distrito Federal, se destina a distribuir terrenos, em consonância com os planos de desenvolvimento habitacional, àqueles que preencherem requisitos para inscrição no Cadastro da Habitação do Distrito Federal, perante a Codhab, de forma a suprir a carência de moradia. 4. Nos termos do art. 10 da referida lei: ‘Enquanto não houver a transferência de domínio do Poder Público para o beneficiário, é vedado a este transferir a terceiros a posse de bem imóvel recebido no âmbito de programa habitacional do Distrito Federal, salvo se autorizado pelo Poder Executivo’. 5. Diante da acentuada demanda pela moradia, o Distrito Federal adotou critérios para classificar a ordem das pessoas a serem beneficiadas com os imóveis distribuídos. 5.1 São exigidos uma série de requisitos, inclusive investigatórios, a fim de ser determinada ao candidato a sua ordem de classificação na lista do programa. 6. O benefício habitacional não pode concedido a quem sequer se encontra inscrito no programa habitacional de famílias de baixa renda do Distrito Federal. 7. É vedado ao Judiciário, no exercício do controle dos atos da administração, apreciar o mérito administrativo no tocante à regulamentação e implementação de programas habitacionais. 8. O atendimento ao pedido teria

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como consequência a alteração da ordem dos beneficiários do programa em questão, em flagran-te afronta ao princípio da isonomia. 9. Precedente da Casa: ‘[...] I – O programa habitacional do Distrito Federal destina-se a distribuir terrenos, de acordo com o plano de desenvolvimento habita-cional, a pessoas que preenchem os requisitos para inscrição e classificação no Cadastro da Habita-ção do Distrito Federal, perante à Codhab/DF, e dentro das possibilidades de atendimento, a fim de solucionar as necessidades de moradia. II – Ausente demonstração de irregularidade ou ilegalidade no procedimento adotado pela Administração. III – Apelação desprovida’ (20120110185647APC, Relª Vera Andrighi, 6ª T.Cív., DJe 05.03.2013). 10. Recurso provido.” (TJDFT – PC 20120111970985 – (880099) – 2ª T.Cív. – Rel. Des. João Egmont – DJe 15.07.2015 – p. 113)

2022 – ação pauliana – fraude contra credores – venda precipitada de bens – necessidade de demonstração dos requisitos

“Apelação. Ação pauliana. Fraude contra credores. Venda precipitada de bens. Necessidade de demonstração dos requisitos. Ausência de provas. Ônus do autor. Sentença mantida. Improvimen-to. 1. É ônus do autor da ação pauliana demonstrar a existência de tais requisitos, não podendo presumir-se sua existência. 2. Transferir o ônus de prova ao juízo porque determinadas diligências não foram concretizadas, não podem servir de base para eximir o autor do onus probandi. Não há como se presumir fraude, presumir dilapidação de patrimônio para se esvair da responsabilidade de cumprimento de obrigação. 3. Apelo improvido.” (TJMA – AC 038400/2014 – (167391/2015) – Rel. Des. Lourival de Jesus Serejo Sousa – DJe 09.07.2015 – p. 96)

2023 – ação reivindicatória – usucapião arguida em defesa – reconhecimento

“Ação reivindicatória. Usucapião arguida em defesa. Reconhecimento com acerto pela respeitável sentença. Oposição não caracterizada no caso. Requisitos preenchidos. Sentença de improcedência confirmada. Recurso desprovido.” (TJSP – Ap 0007391-46.2003.8.26.0278 – Itaquaquecetuba – 13ª C.Ext.DPriv. – Rel. Milton Carvalho – DJe 24.06.2015)

2024 – adjudicação compulsória – compromisso – compra e venda – lotes – prescrição – apli-cabilidade

“Adjudicação compulsória. Compromisso. Compra e venda. Lotes. Prescrição. Aplicabilidade. Pri-meira unidade. Venda. Terceiro. Boa-fé. Segunda unidade. Adjudicação compulsória. Imprescritibi-lidade. Contrato. Registro. Cartório de imóveis. Desnecessidade. Código de Defesa do Consumidor. Prequestionamento. Autos. Cópia. Envio. Ministério Público. Apuração. Crime. Cabimento. 1. Se-gundo a Súmula de nº 239 do Superior Tribunal de Justiça, ‘o direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda’. Também é imprescritível tal direito, à exceção do direito adquirido por outrem por meio da usucapião, consoante precedentes. 2. Ven-dido lote a terceiro de boa-fé, resta ao adquirente o direito à reparação civil, na forma de indeniza-ção por perdas e danos, prescrevendo em três anos, segundo a disposição do art. 206, § 3º, V, do Código Civil, contados da data de registro da compra e venda do imóvel. 3. O Órgão Julgador não está obrigado a analisar todos os pontos arguidos pelas partes, quando esclarece, suficientemente, as suas razões de decidir, mesmo para fins de prequestionamento, hipótese em que basta que a tese do recorrente esteja claramente explicitada nos autos. 4. Em caso de indícios da prática de crime, deve o juiz encaminhar cópia dos autos ao Ministério Público, para verificação da materialidade e da autoria, cabendo, inclusive a análise de eventual incidência do instituto da prescrição. 5. Ape-lações conhecidas e desprovidas.” (TJDFT – Proc. 20111110059135 – (871679) – 2ª T.Cív. – Relª Desª Gislene Pinheiro – DJe 08.06.2015 – p. 103)

2025 – adjudicação compulsória – ilegitimidade ativa – matéria já decidida – preclusão – mérito – exigência de anuência prévia

“Apelação cível. Ação de adjudicação compulsória. Ilegitimidade ativa. Matéria já decidida. Pre-clusão. Mérito. Exigência de anuência prévia do promitente vendedor para cessão do contrato.

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Pagamento efetuado ao corretor de imóveis. Previsão contratual. Regularidade. Abusividade. Justiça gratuita. Recolhimento do preparo recursal. Ato incompatível. Indeferimento. Embora a ilegitimi-dade ativa seja matéria de ordem pública, podendo ser arguida em qualquer momento processual, uma vez resolvida por decisão transitada em julgado, não pode a preliminar ser indefinidamente reiterada, sob pena de sujeição do jurisdicionado a temerária insegurança jurídica. É nula a cláusula que estabelece a prévia anuência do promitente vendedor em caso de cessão do contrato pelo pro-mitente comprador, por frustrar o direito de disposição da coisa. É legítimo o pagamento efetuado ao corretor de imóveis que intermediou a compra e venda, ainda que através da empresa adminis-tradora de imóveis da qual este é sócio. O preparo do recurso consiste em ato incompatível com a gratuidade de justiça, impondo-se o indeferimento do pedido.” (TJMG – AC 1.0694.11.000916-4/002 – 14ª C.Cív. – Rel. Valdez Leite Machado – DJe 10.07.2015)

2026 – arras – ação rescisória – devolução de quantias pagas

“Apelação cível. Ação rescisória c/c devolução de quantias pagas. O pedido de rescisão e devo-lução das quantias pagas em cumprimento de contrato de promessa de compra e venda pode ser formulado pelo promissário-comprador, ainda que inadimplente. A Câmara tem pacificado entendi-mento de que cabe a devolução em uma única parcela, admitida a retenção no percentual de 10% apenas. Não se pode admitir a perda total das parcelas pagas, sob pena de afronta ao disposto no art. 53 do Código de Defesa do Consumidor, pelo que fica repelida de ofício, independentemente de requerimento da parte inadimplente. Todavia, a fim de evitar a reformatio in pejus, mantém--se a retenção de 12% fixada na sentença. As demais cláusulas de retenção previstas no contrato, em caso de rescisão, são abusivas, tanto no Código de Defesa do Consumidor, quanto no Código Civil, não se permite o enriquecimento ilícito, que no caso ocorreria, caso acolhida a pretensão da apelante. Apelo desprovido. A sentença de fls. 129/133, cujo relatório se adota, nos autos da ação rescisória c/c devolução de quantias pagas, julgou parcialmente procedentes os pedidos para condenar a requerida na devolução aos autores do valor de R$ 105.729,24, devidamente corrigidos monetariamente desde a data dos seus respectivos pagamentos, com juros mensais legais de mora a contar da citação, abatendo-se desse montante apenas e tão somente o percentual de 12% a título de eventuais despesas administrativas da requerida com o contrato em questão. A ré recorre, fls. 137/153, para que a devolução das quantias pagas a título de preço do imóvel se proceda nos exatos termos do quanto estipulado nas cláusulas 29 e seguintes do instrumento particular firmado entre as partes, haja vista que a rescisão operou-se por culpa exclusiva do apelado. Subsidiaria-mente, requer seja utilizado o valor total do imóvel como base de cálculo do percentual a ser retido, e não apenas o valor pago pelo apelado, eis que o mesmo não será suficiente para reparar os prejuízos incorridos pela apelante com a rescisão do negócio. Recurso recebido em ambos os efeitos, fl. 156. Contrarrazões apresentadas às fls. 160/167. Certidão de fl. 173 informando a não oposição ao julgamento virtual. É o relatório. Cuida-se de ação rescisória c/c devolução de quantias pagas ajuizada por João Lucilio Ruegger de Albuquerque contra Tibério Construções e Incorporações Ltda., na qual requer o autor a resolução de contrato de promessa de venda e com-pra de dois imóveis, atinentes aos apartamentos 133 e 101 do empreendimento Edifício Intense Vila Mascote, situados na Rua Doutor Djalma Pinheiro Franco, nº 30, Vila Santa Catarina, nesta cidade, com a devolução dos valores pagos por esse produto, de R$ 105.729,24 (salvo desconto de 10% a título de despesas administrativas), e dos que desembolsou para pagamento de taxas de condomínio, ante o atraso na entrega do empreendimento. A ré recorre alegando culpa exclusiva do apelado pelo desfazimento do negócio, ante sua impossibilidade financeira. Ressalta inexistir ilícito, nexo causal ou culpa, motivo pelo qual não resta configurada a responsabilidade civil da apelante. Insurge-se contra a decisão que determinou a retenção de apenas 12% dos valores pagos, eis que tal percentual não é suficiente para cobrir as despesas da apelante, não guardando qualquer relação com o ajustado entre as partes. Alega que se admitisse a eventual devolução das quantias pagas pelo apelado, deveriam ser deduzidos, além dos gastos que a construtora teve com a venda

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da unidade, o valor pago a título de sinal, uma vez que referida penalidade está prevista no art. 418 do Código Civil, sendo aplicada à parte que deu causa ao desfazimento dos negócios. A Câmara tem pacificado entendimento de que, como no caso dos autos, cabe a devolução em uma única parcela, admitida a retenção no percentual de 10% apenas. Não se pode admitir a perda total das parcelas pagas, sob pena de afronta ao disposto no art. 53 do Código de Defesa do Consumidor, pelo que fica repelida de ofício, independentemente de requerimento da parte inadimplente. Nesse sentido vem reiteradamente decidindo esta 8ª Câmara de Direito Privado. Destaque merece, ainda, o julgamento da Apelação Cível nº 129.560.4/0, da 7ª Câmara de Direito Privado deste E. Tribunal, que teve como Relator o Desembargador Sousa Lima, que, ao discorrer acerca dessa possibilidade, cita entendimento do C. STJ, no julgamento do REsp 132.903/SP, publicado na RSTJ 106/334, que teve como Relator o Min. Ruy Rosado de Aguiar, que, em situação semelhante ao caso dos autos, decidiu: ‘Penso que não corresponde à melhor interpretação do nosso sistema legal a assertiva de que o pedido de devolução das quantias pagas em cumprimento de contrato de promessa de compra e venda não possa ser formulado pelo promissário-comprador, ainda que inadimplente. A restituição das partes à situação anterior é uma consequência da resolução do contrato, pois a extinção da avença implica a necessidade de recomposição, tanto quanto possível, da situação assim como ela era antes... É partindo desse Enunciado que esta eg. 4ª Turma tem reafirmado, em diversos julgados, seu entendimento de que, em princípio, o promissário-comprador tem direito à devolução das prestações pagas na execução de contrato que ficou impossibilitado de cumprir, face à superveniente alteração das circunstâncias, direito que pode ser reconhecido seja na ação de resolução proposta pela promitente-vendedora, seja na iniciativa do promissário-comprador, pois a restituição, como efeito da extinção do contrato, se faz presente tanto em um caso como em outro, independentemente da autoria da ação...’ Cabe o desconto de 10% a título de despesas feitas presumidamente na administração do empreendimento, como esta 8ª Câmara de Direito Privado vem reiteradamente decidindo pelo seu cabimento, merecendo destaque o julgamento da Apelação Cível nº 85.058-4, que teve como Relator o Desembargador Cesar Lacerda, cuja ementa apresenta a seguinte redação: ‘Compromisso de compra e venda. Rescisão contratual. Culpa dos adquirentes que não reúnem condições pessoais de obter financiamento e honrar ajuste. Previsão contratual para devolução das quantias pagas, com retenção de 10% do preço do negócio, a título de prefi-xação de perdas e danos. Ausência de abusividade. Multa que se destina a cobrir despesas várias inerentes ao negócio desfeito (corretagem, administração, publicidade). Recurso provido’. Todavia, apenas a ré apelou para majorar o percentual de retenção sobre os valores pagos, razão pela qual a indenização deve ser mantida nos moldes fixados na sentença (abatendo-se desse montante apenas e tão somente o percentual de 12% a título de eventuais despesas administrativas da requerida com o contrato em questão), a fim de evitar a reformatio in pejus. As demais cláusulas de retenção previstas no contrato, em caso de rescisão, são abusivas, tanto no Código de Defesa do Consumi-dor, quanto no Código Civil, não se permite o enriquecimento ilícito, que no caso ocorreria, caso acolhida a pretensão do apelante. As arras previstas no art. 418 do Código Civil possuem natureza indenizatória, servindo para compensar os prejuízos suportados, e no caso, o percentual de 12% sobre os valores pagos fixados na sentença já cumprem referida finalidade. No mais, alvitro ser o caso de confirmar a sentença por seus fundamentos, nos termos do art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça. Nego provimento ao recurso. Silvério da Silva Relator.” (TJSP – Ap 1002982-73.2014.8.26.0100 – São Paulo – 8ª CDPriv. – Rel. Silvério da Silva – DJe 22.06.2015)

2027 – arras penitenciais – ação de rescisão contratual – cláusula penal – redução do percen-tual de retenção previsto – rescisão contratual – promitente comprador – possibilidade

“Processo civil, direito civil e consumidor. Apelação cível. Ação de rescisão contratual. Cláusula penal. Redução do percentual de retenção previsto para a rescisão contratual por culpa do pro-mitente comprador. Possibilidade. Arras penitenciais cumuladas com cláusula penal. Incidência afastada. Sentença mantida. 1. A jurisprudência deste Tribunal Justiça firmou o entendimento de

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que é permitida a redução de cláusula penal abusiva para 10% (dez por cento) dos valores pagos pelo promitente comprador à época da resolução do contrato, montante suficiente para ressarcir o vendedor pelos prejuízos decorrentes da inexecução do contrato. 2. A retenção das arras cumu-lada com a cláusula penal configura bis in idem e, por consequência, enriquecimento ilícito do promitente vendedor, pois ambas ostentam natureza indenizatória. 3. Apelação conhecida, mas não provida. Unânime.” (TJDFT – Proc. 20140111725277 – (882103) – 3ª T.Cív. – Relª Desª Fátima Rafael – DJe 23.07.2015 – p. 124)

2028 – arrematação de imóvel – dívida tributária anterior à arrematação – previsão editalícia

“Agravo de instrumento. Direito civil. Arrematação de imóvel. Dívida tributária anterior à arre-matação. Previsão editalícia. Obrigação do arrematante. 1. Se houver menção expressa no edital quanto à responsabilidade do arrematante pelos ônus incidentes sobre o imóvel, não há que se falar em abatimento do débito tributário no preço do bem. 2. Agravo de instrumento não provido.” (TJDFT – AI 20150020065626 – (874331) – 4ª T.Cív. – Rel. Des. Arnoldo Camanho de Assis – DJe 24.06.2015 – p. 156)

2029 – arrendamento mercantil – reintegração de posse – rescisão contratual com devolução do bem – restituição do VRG – possibilidade

“Civil e processual civil. Revisão contratual. Arrendamento mercantil. Reintegração de posse. Res-cisão contratual com devolução do bem. Restituição do VRG. Possibilidade. Devolução conforme entendimento do colendo STJ. Tarifas administrativas. Necessidade de previsão em resoluções do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central. Multa do art. 940, do CC. Não aplicação. Liti-gância de má-fé. Hipóteses do art. 17, do CPC. Não incidência. 1. Rescindido o contrato de arren-damento mercantil, mesmo em sede de reintegração de posse, impõe-se a devolução do VRG pago, antecipadamente, cujo valor deve ser compensado com eventuais prestações inadimplidas até a entrega efetiva do bem, não se permitindo sua retenção, para que as partes retornem ao status quo ante. Entendimento contrário implicaria enriquecimento ilícito da arrendadora, pois permitiria a in-corporação do VRG – que não é devido em caso de opção do arrendatário pela devolução do bem –, ao patrimônio desta. 2. O colendo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.09.212/RJ, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos, pacificou o entendimento quanto à validade da cláusula presente em contrato de arrendamento mercantil, que condiciona a devolução do VRG à prévia venda do veículo e abatimento das despesas, a fim de que seja apurada a existência ou não de saldo remanescente a ser devolvido ao arrendatário. 3. A cobrança das tarifas de ‘Gravame Eletrônico’ e de ‘Ressarcimento de Promotora de Venda’ deve ser considerada abusiva e, portanto, indevida, por ausência de previsão em resoluções editadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central, órgãos competentes para dispor sobre a matéria, e por contrariar o disposto no do art. 51, inciso IV, do CDC. 4. A incidência da multa prevista no art. 940, do CC, pressupõe a existência de má-fé, dolo ou malícia do credor na exigência da dívida. Não compro-vada a má-fé, indevida a dobra prevista no art. 940, do CC, consoante determina o Enunciado nº 159, da Súmula do STF. 5. A aplicação da multa por litigância de má-fé decorre da subsunção da conduta imputada à parte a uma das hipóteses do art. 17, do CPC. 4. Apelos não providos. Sentença mantida.” (TJDFT – PC 20130610138939 – (874321) – 4ª T.Cív. – Rel. Des. Arnoldo Camanho de Assis – DJe 24.06.2015 – p. 160)

2030 – Comissão de corretagem – devolução ao promissário adquirente – ação declaratória de nulidade de cláusulas contratuais c/c obrigação de fazer e indenização – prazo indeter-minado para conclusão da obra e entrega das chaves – cláusula nula de pleno direito

“Direito do consumidor e civil. Recurso de apelação. Ação declaratória de nulidade de cláusulas contratuais c/c obrigação de fazer e indenização. Prazo indeterminado para conclusão da obra e entrega das chaves. Cláusula nula de pleno direito. Comissão de corretagem. Devolução ao promis-

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204 ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO

sário adquirente. Ausência de prova robusta do pagamento de aluguéis. Dano moral configurado. Recurso conhecido e provido em parte. 1. A cláusula que prevê a entrega do imóvel em julho/2011, ou, alternativamente, 18 (dezoito) meses após a assinatura do contrato de financiamento perante o agente financeiro, é ambígua e até mesmo contraditória, na medida em que estabelece datas distintas para o cumprimento da mesma obrigação contratual, devendo ser declarada nula de pleno direito. 2. Se houve contratação de empresa de corretagem, esta se deu pela promitente vendedora, para atuar em seu stand de vendas, devendo, pois, ser por ela custeadas as comissões que porven-tura decorram da venda de suas unidades autônomas. 3. O dever de ressarcir os aluguéis pagos durante o período de atraso da obra só serão devidos quando demonstrados e comprovados de forma robusta, o que não ocorreu na espécie. Capítulo reformado. 4. O dano moral corresponde à frustração da legítima expectativa da parte autora quanto à entrega do imóvel na data aprazada, em desconformidade aos ditames da boa-fé objetiva e do princípio da confiança, sendo evidente que os fatos narrados ultrapassaram a barreira do mero aborrecimento e do simples descumprimento contratual, atingindo, como restou alegado, o foro íntimo do promissário comprador. 5. Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJCE – Ap 0907806-02.2012.8.06.0001 – Rel. Washington Luis Bezerra de Araujo – DJe 20.07.2015 – p. 22)

2031 – Compra e venda de imóvel – atraso na entrega – prazo indeterminado – nulidade – caso fortuito – força maior – inocorrência

“Direito do consumidor. Compra e venda de imóvel. Atraso na entrega. Prazo indeterminado. Nuli-dade. Caso fortuito. Força maior. Inocorrência. Risco da atividade. Termo final da mora. Averbação da carta habite-se no registro imobiliário. Multa do art. 475-J do CPC. Prévia intimação do devedor. Necessidade. Precedentes do STJ. Lucros cessantes. Valor arbitrado. Princípio da adstrição. Multa moratória. Previsão contratual. Extensão à construtora. Impossibilidade. Honorários sucumbenciais. Devidamente fixados. 1. É de se ressaltar que, conquanto seja válida a estipulação de prorrogação para conclusão da obra pelo prazo de 180 dias, a prorrogação por prazo indeterminado é mani-festamente abusiva, devendo ser declarada nula. 2. Mostra-se impossível acolher a alegação de ocorrência de caso fortuito ou força maior, quando estes não restaram devidamente comprovados. 2.1 Cumpre salientar que a alegação de escassez de mão de obra na construção civil, a greve do serviço de transporte público, além da ocorrência de chuvas constituem fato externo ao âmbito da relação negocial estabelecida entre o consumidor e a fornecedora, inerente ao risco do empreen-dimento, sendo defeso dividi-lo com a outra contratante, ou simplesmente atribuí-lo a terceiros. 3. O termo final da mora da construtora corresponde à data da averbação da Carta do Habite-se no registro de imóveis, porquanto somente após esse procedimento é que se torna possível o financia-mento bancário com o fim de quitar o saldo devedor. 4. O c. Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento acerca da incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC, em julgamento de representativo da controvérsia, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, de modo que é imprescin-dível a prévia intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, mediante publicação na imprensa oficial, para efetuar o pagamento no prazo de 15 dias. 5. Cabe ao juiz se valer do princípio da razoabilidade para a fixação do valor dos lucros cessantes, nos termos do art. 402 do Código Civil, bem como permanecer adstrito aos limites do pedido. 5.1 Mostra-se incabível no presente caso a fixação do valor dos lucros cessantes em 0,5% do valor do imóvel, porquanto não há previsão contratual nesse sentido, devendo prevalecer o valor apontado pelos autores, porquanto o art. 47 do CDC prevê a interpretação mais favorável ao consumidor. 6. O Código de Defesa do Consumidor expressamente admite a incidência de multa moratória de 2% para o caso de atraso nos pagamen-tos devidos pelo consumidor, nos termos de seu art. 52, § 1º, de maneira que não cabe estender à construtora uma obrigação contratual atribuída somente ao consumidor e plenamente admitida pela legislação consumerista. 7. Considerando a expressão econômica dos pedidos, verifico que sentença não merece qualquer reforma quanto à distribuição dos ônus sucumbenciais, porquanto condenou cada parte ao pagamento de 50% das custas processuais, compensando os honorários

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advocatícios, nos termos dos arts. 20, § 3º e 21 do CPC. 8. Recurso da ré e dos autores conhecidos e parcialmente providos.” (TJDFT – DirCons. 20140110559342 – (876284) – 3ª T.Cív. – Relª Desª Ana Cantarino – DJe 29.06.2015 – p. 99)

Comentário Editorial SÍnTESETratam-se de apelações cíveis interpostas pela ré e pelos autores em face da sentença de com-plementada, proferida nos autos da ação de indenização, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais.Em suas razões recursais, a ré sustentou que se previu no contrato entabulado a possibilidade de não atendimento do prazo de entrega, incluindo o prazo de prorrogação, em decorrência de caso fortuito e força maior.Afirmou que por fatos alheios à sua vontade não foi possível concluir as obras dentro do prazo previsto, dentre os quais destaca a ocorrência de chuvas torrenciais, greves no transporte público e carência de mão de obra qualificada, fatos que se enquadram no conceito de caso fortuito e de força maior, além de impedimento na expedição da carta de habite-se pela não instalação da subestação de energia elétrica pela CEB, de modo que não se mostra cabível a condenação ao pagamento de lucros cessantes.Alegou que o termo final para incidência de indenização por lucros cessantes deve ser con-siderado como a averbação da carta de habite-se no registro do imóvel, quando a unidade imobiliária estará à disposição do promitente comprador, bastando que este cumpra todos os requisitos contratuais para o recebimento das chaves.Aduziu que a incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC ocorre somente decorrido o prazo da intimação para pagamento e não da data do trânsito em julgado, conforme entendi-mento pacífico do Superior Tribunal de Justiça.Ao final, requereu o provimento do recurso para que sejam julgados improcedentes os pedidos iniciais ou, subsidiariamente, para que o termo final para o pagamento da indenização por lucros cessantes seja determinado quando da averbação do Habite-se do empreendimento.Por sua vez, os autores alegam em suas razões que o Juízo a quo, por mera liberalidade, ar-bitrou o valor do m² em 0,5% do valor do imóvel, incorrendo em manifesta violação aos arts. 127 e 335 do CPC, tendo sido exaustivamente exposto pelos autores o valor do aluguel do m² no importe de R$ 70,00 (setenta reais), conforme laudo confeccionado por corretor de imóvel devidamente credenciado ao Creci.Afirmaram que o próprio Juízo a quo se manifestou sobre os documentos apresentados pela ré, referentes a avaliações imobiliárias, devendo, portanto, o valor dos lucros cessantes ser fixado conforme valor apurado pelo laudo apresentado.Aduziram que a multa moratória de 2% prevista na cláusula 5.1, embora se refira somente à mora dos autores, deve ser estendida à construtora ré, com o fim de estabelecer igualdade de condições entre fornecedor e consumidor, sob pena de violação ao art. 47 do Código de Defesa do Consumidor.Asseveraram que a jurisprudência entende ser perfeitamente cabível no contrato de promessa de compra e venda de imóvel a cumulação de multa contratual e indenização por lucros ces-santes, pois a primeira possui natureza moratória e a segunda indenizatória.Ressaltaram que a inicial possui seis pedidos, sendo um sucessivo, e apenas um foi julgado improcedente, de modo que a sentença deve ser reformada para que a sucumbência seja aplicada de forma proporcional ao disposto no art. 20 do CPC.Requereram o provimento do recurso para que seja majorado o valor arbitrado a título de lucros cessantes, bem como que a multa moratória de 2% seja estendida à ré, aplicando de forma proporcional o valor dos honorários advocatícios, nos termos do art. 20 do CPC.Deste modo, considerando a expressão econômica dos pedidos, verifico que sentença não merece qualquer reforma quanto à distribuição dos ônus sucumbenciais, porquanto condenou cada parte ao pagamento de 50% das custas processuais, compensando os honorários ad-vocatícios, nos termos dos arts. 20, § 3º e21 do CPC, devendo ser mantida inalterada nesse ponto.O relator assim aduziu:“Ante todo o exposto, dou parcial provimento aos recursos da ré e dos autores para, refor-mando a sentença:

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a) fixar como termo final da mora a data em que ocorrer a efetiva averbação da Carta Habite-se no registro imobiliário;b) determinar que a multa prevista no art. 475-J incida somente após decorrido o prazo de 15 dias da intimação para efetuar o pagamento.c) fixar os lucros cessantes com base no valor de aluguel mensal trazido pelos autores, qual seja R$ 2.377,20 (dois mil e trezentos e setenta e sete reais e vinte centavos).Oportuno colacionar julgados no mesmo sentido:CIVIL E PROCESSUAL – ACÓRDÃO ESTADUAL – NULIDADE NÃO CONFIGURADA – CON-TRATO DE CONSTRUÇÃO IMOBILIÁRIA – INADIMPLÊNCIA DA PROMITENTE VENDEDORA – ATRASO NA OBRA – RESCISÃO DECRETADA – RESTITUIÇÃO INTEGRAL DO VALOR DAS PARCELAS PAGAS – EMBARGOS DECLARATÓRIOS APENADOS COM MULTA – PROPÓSITO DE PREQUESTIONAMENTO – EXCLUSÃO – SÚMULA Nº 98 – STJ – I – Não padece de nu-lidade o acórdão estadual que enfrenta, suficientemente, as questões essenciais ao deslinde da controvérsia, apenas que trazendo conclusões desfavoráveis à parte-ré. II – Firmado pelo Tribunal a quo que houve inadimplência da construtora na entrega da obra, que sequer se iniciara quando do ajuizamento da ação, é devida ao adquirente a restituição integral dos valores pagos, sem qualquer retenção. III – “A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial’ (Súmula nº 7/STJ) IV – ‘Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não tem caráter protelatório” (Súmula nº 98/STJ). V – Recurso especial conhecido em parte e provido, para afastar a multa aplicada aos embar-gos declaratórios. (STJ – REsp 200201456107 – (476481) – 4ª T. – Rel. Min. Aldir Passari-nho Junior – DJe 14.04.2008)PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO CONTRA A INADMISSÃO DE RE-CURSO ESPECIAL – PROMESSA DE COMPRA E VENDA – ATRASO NA OBRA – DIVERGÊN-CIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA – AUSÊNCIA DE PARTICULARIZAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO – SÚMULA Nº 284/STF – EXCESSIVA DEMORA NA ENTREGA DO IMÓVEL – DANO MORAL – SÚMULA Nº 7/STJ – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO – 1. A jurisprudência pacífica desta Casa dispõe que a ausência de particularização dos disposi-tivos legais a que os acórdãos – recorrido e paradigma – teriam dado interpretação discrepante consubstancia deficiência insanável, inviabilizando a abertura da instância especial, a incidir a censura da Súmula nº 284 do STF. 2. No caso em exame, o col. Tribunal a quo, à luz dos princípios da livre apreciação da prova e do livre convencimento motivado, bem como me-diante análise soberana do contexto fático-probatório dos autos, entendeu pela existência de danos morais diante da excessiva demora na entrega do imóvel (três anos), gerando transtorno de ordem psíquica ao comprador. 3. Esta Corte de Justiça tem entendido que a revisão do acórdão recorrido, em hipóteses similares à dos presentes autos, encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. Precedentes. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ – AgRg-Ag-REsp 684.176 – (2015/0075500-5) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 30.06.2015 – p. 2460)” (Disponível em: http://online.sintese.com.)

2032 – Compra e venda de lote urbano – ação ex empto – contrato particular que aponta me-tragem quadrada superior

“Apelação cível. Direito obrigacional. Ação ex empto. Compra e venda de lote urbano. Contrato particular que aponta metragem quadrada superior (360 m²) àquela de fato existente no local (285 m²). Promitente comprador que constata o diferencial apenas após a celebração da avença. Alegada aquisição ad mensuram. Elementos de prova que, no entanto, permitem concluir, a despeito da sensível disparidade entre as medidas de área declarada e efetiva, que a venda se deu sob a moda-lidade ad corpus. Contrato entabulado pelo preço ‘certo e ajustado’ de R$ 50.000,00. Negociações realizadas entre as partes pessoalmente. Terreno baldio murado pelas laterais. Fácil constatação da verdadeira superfície do imóvel, sobretudo em razão de suas diminutas dimensões. Lote adquirido preponderantemente em razão de sua localização, próximo a parentes do adquirente. Inviabilidade da pretensão de complementação de área ou, sucessivamente, de abatimento proporcional do pre-ço (CC, art. 550, § 3º). Recurso desprovido. Segundo o sempre abalizado magistério de Washington de Barros Monteiro, na compra e venda ad corpus entende-se que o comprador percorreu o imóvel, conheceu sua extensão, constatou as divisas. Comprou-o, ao fim e ao cabo, não em razão da área

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declarada e especificada, mas, sobretudo, pelo conjunto que lhe foi mostrado, conhecido e deter-minado. E, ainda, se o bem adquirido estiver quase todo murado ou cercado, como é o caso, tem-se meramente acidental a declaração de medidas e confinação.” (TJSC – AC 2014.048319-7 – Rel. Des. Eládio Torret Rocha – DJe 09.07.2015)

2033 – Compra e venda – minuta de escritura – adjudicação compulsória de imóvel – quitação do preço contratado – matéria incontroversa

“Adjudicação compulsória de imóvel. Quitação do preço contratado. Matéria incontroversa. Mi-nuta de escritura de compra e venda não elaborada ante a ausência de manifestação da adminis-tração e a necessidade de certidões. Interessado notificado verbalmente após dois anos e quando a presente ação já havia sido ajuizada. Exigência suprida em sede jurisdicional devido à demora da administração. Ocorrência de dano moral devidamente demonstrada. 1. Os autores pretendem a adjudicação compulsória do imóvel descrito em escritura de promessa de compra e venda, res-tando a questão da quitação do preço contratado superada, por ser incontroversa, uma vez que a matéria não foi impugnada. 2. Dos documentos carreados aos autos, verifica-se que nos termos do parecer da Procuradoria Federal Especializada, a minuta da Escritura de Compra e Venda deixou de ser elaborada, em face da ausência de manifestação administrativa a respeito da quitação do financiamento imobiliário, bem como, ante a necessidade de juntada de certidões. O interessado só foi notificado verbalmente sobre a exigência documental quando a presente ação já havia sido ajuizada, após reiterados requerimentos dos autores e de diversas providências juntos ao ofício de registro de imóveis competente. 3. A exigência documental, solicitada em sede administrativa, só foi suprida em sede jurisdicional, devido ao fato, única e exclusivamente, de a administração levar dois anos para notificar verbalmente os autores e, o fez depois de terem sido compelidos a ingressar com ação judicial para verem reconhecido um direito assegurado, que o recorrente não logrou demonstrar qualquer fato modificativo ou extintivo de tal direito. 4. Ocorrência de dano moral devi-damente demonstrada, ante o transtorno causado pela demora injustificada e a indevida resistência da administração (2 anos para notificar verbalmente), obrigando os autores a buscar a garantia do direito através de processo judicial, situação que por si só gera abalo psíquico em face da inseguran-ça jurídica. Nexo causal entre o dano sofrido e a atuação administrativa claramente evidenciado, de modo que o quantum da indenização fixada pela douta sentença se mostra razoável e proporcional ao dano. 5. Recurso de apelação não provido.” (TRF 2ª R. – AC 0000880-09.2013.4.02.5120 – Relª Salete Maria Polita Maccalóz – DJe 17.07.2015 – p. 366)

2034 – Condomínio – cotas em atraso – obrigação propter rem

“Civil. Cotas condominiais em atraso. Obrigação propter rem. 1. O pagamento das despesas do condomínio constitui obrigação propter rem (art. 12, § 1º, da Lei nº 4.591/1964), de modo que o proprietário da unidade constante do registro de imóveis responde pelo pagamento das co-tas respectivas, ainda que o bem esteja ocupado por terceiro. 2. No caso, conforme certidão de ônus reais, o INSS consta como proprietário do imóvel objeto da lide e, conforme o disposto no art. 1.245 do Código Civil de 2002, sua legitimidade passiva ad causam não pode ser afastada pela mera juntada de contrato particular de promessa de compra e venda celebrado anteriormente, e não registrado em Cartório de Registro de Imóveis. Precedentes (TRF 2ª R., AC 20035101007323-0 e AC 20075101025817-0). 3. Os valores dos juros de mora e multa devem ser os previstos no art. 1.336, § 1º, do Código Civil de 2002, tal como observado na sentença. 4. Considerando que somente foi afastado o período abrangido pela prescrição quinquenal, sendo mantido o reconhecimento do dever de pagamento das cotas condominiais vencidas a partir de março/2006, o INSS sofreu maior sucumbência, devendo ser mantida a sua condenação ao pagamento de honorários de 10% sobre o valor da dívida, que atende aos critérios do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC. 5. Remessa necessária e apelação desprovidas.” (TRF 2ª R. – AC-RN 0000900-25.2011.4.02.5102 – 7ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Luiz Paulo da Silva Araújo Filho – DJe 10.06.2015 – p. 290)

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2035 – Conflito de competência – arrematação de imóvel em razão de leilões realizados na justiça do trabalho e na justiça federal – competência

“Processual civil. Embargos de declaração. Correção de erro material. Cabimento. Conflito de competência. Arrematação de imóvel em razão de leilões realizados na Justiça do Trabalho e na Justiça Federal. Competência fixada por conta da anterioridade do registro (in casu, prenotação). Precedentes do STJ. Solução da lide mediante aplicação por analogia. Rediscussão do mérito. Uti-lização como sucedâneo recursal. Impossibilidade. 1. Primeiramente, no que se refere às notas taquigráficas, observo que o requerimento se encontra precluso, pois foi apreciado e indeferido pela autoridade competente – o Presidente da Primeira Seção – por meio da decisão publicada no DJe 15.03.2013 e irrecorrida. 2. No que concerne ao erro material, procede a assertiva dos embargan-tes, pois a data de realização do leilão com Arrematação na Justiça do Trabalho foi 10.02.2009, e não 10.02.2010, como constou. 3. Ao contrário do que afirmam os embargantes, o principal fun-damento adotado para a solução dada ao presente Conflito de Competência não tem por parâmetro a data de arrematação do imóvel, tendo em vista que esse ato processual permaneceu sub judice tanto no juízo da Execução Fiscal quanto na Justiça do Trabalho. 4. Diante da pendência judicial instaurada sobre a validade das arrematações feitas – foram ajuizados Embargos à Arrematação em ambas as Justiças (Federal e Trabalhista) –, este juízo, de forma clara e motivada, optou por adotar precedente análogo no sentido de que prevalece, para definição do juízo competente, a Justiça responsável pelo registro que primeiramente foi feito no Cartório de Registro de Imóveis (no caso dos autos, o registro da prenotação). 5. Se, por um lado, a realização do leilão que resultou na arre-matação se deu primeiramente na Justiça do Trabalho, é, por outro lado, igualmente incontroverso que a pendência judicial quanto à validade da Arrematação (julgamento dos Embargos à Arremata-ção), com a consequente expedição da Carta de Arrematação e respectiva prenotação no Cartório de Registro de Imóveis, foi definida com antecedência na Justiça Federal. 6. Registro, por entender necessário, que a presente solução não visa a definir qual das Arrematações deve prevalecer, mas apenas o juízo competente para apreciar as discussões relativas a esse tema. Dito de outro modo, nada impede que a parte interessada se dirija ao juízo competente, por meio das vias judiciais ade-quadas, para pleitear eventual nulidade na Arrematação. 7. É exatamente por esta razão que os de-mais pontos suscitados pelos embargantes não podem ser enfrentados nos aclaratórios, seja porque versam intenção inadequada de rediscutir o mérito do decisum (tese relacionada à inaplicabilidade dos precedentes utilizados no acórdão proferido no Agravo Regimental), seja porque extrapolam os limites do Conflito de Competência (teses de nulidade da decisão do juízo da 3ª Vara das Exe-cuções Fiscais, e dos efeitos decorrentes do pedido de desistência da Arrematação formulado no referido órgão), transformando-o em sucedâneo recursal. 8. Embargos de Declaração parcialmente acolhidos, sem efeito modificativo, apenas para correção de erro material.” (STJ – EDcl-CC 118.003 – (2011/0151273-1) – 1ª S. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 01.07.2015 – p. 1631)

2036 – Contrato de financiamento e seguro habitacional – alegada ausência de comprometi-mento do fundo de Compensação de Variações salariais (fCVs)

“Processual civil e administrativo. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Contrato de fi-nanciamento e seguro habitacional. Alegada ausência de comprometimento do Fundo de Compen-sação de Variações Salariais – FCVS. Matéria fática. Súmula nº 7/STJ. Agravo regimental improvido. I – O entendimento pacificado nesta Corte, por ocasião do julgamento do REsp 1.091.363/SC, sob a sistemática dos recursos repetitivos, é no sentido de que, sendo a apólice de seguro habitacional de natureza pública, do Ramo 66, garantida pelo Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS, existe interesse jurídico a amparar o pedido de intervenção da CEF, na forma do art. 50 do CPC, com a consequente remessa dos autos à Justiça Federal. II – Na hipótese, as instâncias ordinárias, com fundamento no contexto fático-probatório dos autos, asseguraram tratar-se, na hi-pótese, de apólice de seguro habitacional de natureza pública (Ramo 66), garantida pelo Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS. III – Nesse contexto, a análise da pretensão recursal,

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acerca da alegada ausência de comprometimento do FCVS, demandaria a incursão no contexto fático-probatório dos autos, vedada em Recurso Especial, conforme Súmula nº 7 desta Corte: ‘a pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial’. IV – Agravo Regimental im-provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 673.645 – (2015/0031880-2) – 2ª T. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 25.06.2015 – p. 1441)

2037 – Corretagem – comissão – desfazimento do negócio por culpa exclusiva da contratada – dever de ressarcimento

“Apelação cível. Promessa de compra e venda de imóvel. Rescisão. Comissão de corretagem. Des-fazimento do negócio por culpa exclusiva da contratada. Dever de ressarcimento. 1. Nos casos de rescisão contratual por culpa exclusiva do incorporador ou construtor, frustrando a promessa da coisa que não é entregue no prazo previsto em contrato, as partes devem retornar à situação eco-nômica existente à época da contratação, inclusive no tocante ao valor pago a título de comissão de corretagem. 2. Consoante o sistema de proteção destinado a atender aos interesses de consumi-dores em geral, sobressai hipótese de responsabilidade solidária entre o empreendedor promitente vendedor, para que assim restituam ou de algum modo recomponham o patrimônio do promitente comprador que não recebe a coisa prometida na forma e no tempo ajustados no contrato. 2. Recur-so conhecido e desprovido.” (TJDFT – EIC 20130310249286EIC – (880824) – 1ª C.Cív. – Rel. Carlos Rodrigues – J. 17.07.2015)

2038 – Corretagem – restituição da taxa – anulação ex officio de cláusula abusiva

“Civil, processual civil e consumidor. Apelação cível em ação de entrega de coisa certa c/c indeni-zação por danos morais. Sentença parcialmente procedente. Apelação de ambas as partes. Anulação ex officio de cláusula abusiva. Alegativa de não cabimento de dano moral ou sua minoração como pedido alternativo. Redução proporcional. Condenação em honorários advocatícios. Sucumbência em parcela mínima. Entendimento do art. 21, parágrafo único do CPC e da Súmula nº 326/STJ. Fixação da correção monetária e juros de mora conforme art. 405 do Código Civil e Súmula nº 362/STJ. Restituição da taxa de corretagem. Impossibilidade. Limites subjetivos da coisa julgada. Pedido de tutela antecipada. Concedida na sede recursal. Recursos conhecidos, dando-lhes parcial provimento. 1. Trata-se de recursos de apelação manejado por MRV Engenharia e Participações S/A e Joaquim Cardoso Neto e Tereza Cristina Cardoso em face de sentença de lavra do Juízo de Direito da 13ª Vara Cível de Fortaleza que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por Joaquim Cardoso Neto e Tereza Cristina Cardoso em ação de entrega de coisa certa c/c inde-nização por danos morais. 2. Na referida decisão (fls. 309/314), foi determinado o pagamento de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) a título de danos morais em favor dos apelados, não foi reconhecido o direito à percepção de indenização por dano material face à não comprovação de prejuízo e indeferido o pedido de devolução da taxa de corretagem paga pela transação do imóvel. 3. A cláusula contratual que posterga indefinidamente a entrega de imóvel quando da ocorrência de caso fortuito ou força maior, se demonstra como irrazoável e excessivamente prejudicial ao consumidor que adquire um bem já projetando a sua data provável de entrega, ferindo o disposto no art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor. Cláusula anulada neste ponto, mantendo inal-teradas as demais regras avençadas. 4. Princípio da conservação do negócio jurídico. Art. 184 do Código Civil: ‘Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal’. 5. Alegativas para atraso na entrega do objeto do contrato como chuvas, greves, dificuldade para obtenção de materiais se caracterizam como riscos próprios do negócio da construção civil, se demonstrando, pelo menos, como previsíveis ao bom administrador, devendo a apelante arcar pelo excesso prazal. 6. É firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça que é possível ao tribunal ad quem modificar o quantum indenizatório quando marcado pelo excesso ou pela escassez. No caso em tela, a indeni-

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zação fixada ficou em aproximadamente 20% (vinte por cento) do valor do contrato, o que se de-monstra excessivo. Redução para o patamar de 15% (quinze por cento). 7. Art. 405 do Código Civil: ‘Contam-se os juros de mora desde a citação inicial’. 8. Súmula nº 362/STJ: ‘A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento’. 9. Impossível a devo-lução da taxa de corretagem, pois o profissional não compôs o feito e não possibilitada a oportuni-dade para defesa e manifestação nos autos, o que violaria o art. 472 do Código de Processo Civil. 10. Tutela antecipada recursal concedida para determinar que MRV Engenharia e Participações S/A realize a entrega do imóvel contratado, no prazo de 30 (trinta) dias ou, na impossibilidade, que seja pago aos Apelantes Joaquim Cardoso Neto e Tereza Cristina Cardoso o valor mensal de R$ 1.000,00 (mil reais), a título de aluguel, até que se ultime a entrega do objeto avençado. 11. Recursos de ape-lação conhecidos e dando-lhes parcial provimento.” (TJCE – Ap 0843553-34.2014.8.06.0001 – Relª Lira Ramos de Oliveira – DJe 07.07.2015 – p. 63)

2039 – desapropriação – ação anulatória – vistoria do imóvel – ausência de prévia comunica-ção escrita

“Administrativo. Processual civil. Desapropriação. Ação anulatória. Violação do art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.629/1993. Vistoria do imóvel. Ausência de prévia comunicação escrita ao proprietário. Irregu-laridade formal. Nulidade caracterizada. Existência de efetivo prejuízo. Verificação. Incidência da Súmula nº 7/STJ. 1. As Cortes superiores têm entendido que a notificação prévia no procedimento de desapropriação por interesse social, exigida pela Lei nº 8.629/1993 (art. 2º, § 2º), é formalidade essencial, configurando, a sua ausência, ofensa direta aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Precedentes. 2. Por outro lado, não há como reformar o acórdão recorrido no sentido de se afirmar a inexistência de prejuízo (princípio pas de nullité sans grief) como pleiteia o recorrente, pois exigiria o revolvimento da matéria fático-probatória dos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7 do STJ. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1.389.365 – (2013/0180373-9) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 25.06.2015 – p. 1500)

Comentário Editorial SÍnTESECuida-se de agravo regimental interposto pelo Incra contra decisão por meio neguei provimento ao recurso especial do agravante nos termos da seguinte ementa:“Administrativo. Processual civil. Desapropriação. Ação anulatória. Violação art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.629/1993. Não demonstrada violação à lei federal. Incidência da Súmula nº 284/STF. Vistoria do imóvel. Ausência de prévia comunicação escrita ao proprietário. Irregularidade for-mal. Nulidade caracterizada. Existência de efetivo prejuízo. Verificação. Incidência da Súmula nº 7/STJ. Recurso especial improvido.”Nas razões do regimental, o agravante asseverou que, no “caso presente, não se pode dizer que o Recurso Especial padece de deficiência na sua fundamentação, por supostamente não ter declinado ‘em que medida referido dispositivo teria sido violado’, pois, uma simples análise das razões recursais acostadas às fls. 1.579/1.592, permite concluir que houve expressa indi-cação dos dispositivos de lei federal que foram violados pelo acórdão recorrido (art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.629/1993), bem como a forma pela qual tais dispositivos legais restaram violados”.Alegou que “o STF possui firme entendimento no sentido de ser possível sanear a irregula-ridade se o proprietário, preposto ou funcionário por ele designado tenha acompanhado os trabalhos de vistoria. [...] Ou seja, muito embora seja necessária essa ciência prévia, a mesma é suprida caso o interessado participe, efetivamente, do ato de vistoria previsto no § 2º da Lei nº 8.629/1993”.Aduziu, por fim, que “não se apresenta procedente, data maxima venia, desacolher a alegação de violação aos dispositivos legais invocados pela Incra em seu Apelo nobre com base na pretensa incidência da Súmula nº 07/STJ. Isso porque, ao contrário do afirmado no r. decisum atacado, não é necessário incorrer em ‘análise das provas constantes dos autos’ para que se conclua pela incidência do princípio pas de nullité sans grief”.Requereu, por fim, caso não seja reconsiderada a decisão agravada, para que se submeta o presente agravo à apreciação da Turma.

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O Relator afirmou que não tendo a parte agravante trazido argumento que pudesse infirmar a decisão agravada, nego provimento ao agravo regimental.A ilustre Jurista Bruna Fernandes Coelho discorrendo sobre a desapropriação assim elucida:“O termo desapropriação está intimamente ligado à palavra propriedade. Essa tem garantia constitucional, elencada no art. 5º, XXII, da Carta Magna. O inciso mencionado determina que toda propriedade deve exercer sua função social, podendo o Estado intervir, caso essa prerrogativa não seja cumprida.A intervenção do Estado se dá de duas formas: restritiva, por meio da qual o Poder Público retira algumas das faculdades relativas ao domínio; e a supressiva, que gera transferência da propriedade além das consequências restritivas.Pode-se conceituar a desapropriação como o procedimento pelo qual o Estado, por ato uni-lateral, despoja um indivíduo de sua propriedade mediante prévio aviso e justa indenização, que é aquela que corresponde real e efetivamente ao valor do bem expropriado, sem que o proprietário tenha prejuízos. Tal valor é estipulado pela Administração Pública e pode ser contestado pelo proprietário, que tão somente a isto pode opor-se. Tal procedimento, fundado no interesse social e para esse fim, é normatizado pelo direito público e ressalta a supremacia estatal sobre o proprietário.O objetivo da desapropriação é a transferência de um bem mediante indenização, contanto que a finalidade do procedimento, no caso concreto, seja satisfazer o interesse social.De acordo com o Professor Celso Antônio Bandeira de Mello, há dois tipos de desapropriação no direito brasileiro que admitem indenização: a desapropriação urbanística e a desapropria-ção rural.A desapropriação de imóvel urbano está fundamentada no art. 182, § 4º, III, da Lei Maior. O legislador constituinte conferiu ao município o poder sobre a política de desenvolvimento urbano. Nesse caso, a competência para desapropriar é do município. Entretanto, o Poder Municipal está subordinado à Lei Federal, ainda gozando do poder de regulamentar acerca da área incluída no plano diretor. Esse é aprovado na Câmara Municipal e é obrigatório para cidades com mais de 20 mil habitantes. O plano diretor é instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana e, por conta da previsão constitucional, a propriedade atenderá à sua função social a partir do momento em que atender às exigências municipais.[...]O procedimento expropriatório engloba duas etapas: a fase declaratória e a fase executória. A primeira etapa, a declaratória, é a etapa na qual o Poder Público manifesta a sua intenção de adquirir compulsoriamente um determinado bem. Apesar de ser um ato de natureza admi-nistrativa, tanto o Poder Executivo como o Poder Legislativo são legítimos para manifestar a intenção. São competentes para tal:A União;Os Estados;Os Municípios e o Distrito Federal;O Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), investido de tal poder pelo Decre-to-Lei nº 512, de 21 de março de 1969.O objetivo de tal declaração é submeter o bem à força expropriatória do Estado. Entretanto, como a simples declaração não transfere a propriedade do futuro bem expropriado ao Estado, o proprietário do bem mantém o direito de ainda gozar, usar e dispor do bem.” (Comentários acerca da desapropriação. Disponível em: http://online.sintese.com)

2040 – desapropriação – declaração de utilidade pública – processo expropriatório – ausência de demonstração

“Declaração de utilidade pública para fins de desapropriação. Início, apenas, de processo expro-priatório (fase administrativa). Ausência de demonstração de que o bem tenha sido efetivamente expropriado. Entendimento confirmado em grau de apelação. Ação rescisória. Indeferimento do pedido. Embargos de declaração. Pretensão de rediscutir a causa. Impropriedade. Improvimento. 1. A União pretende, por meio de embargos declaratórios, rejulgamento da causa, objetivo a que não se presta tal recurso. 2. Não há a alegada prova de indenização por desapropriação do terreno em referência. 3. O terreno pode encontrar-se na área declarada de utilidade pública para fins de

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desapropriação, mas não está demonstrado que se encontre em área efetivamente desapropriada. Por isso mesmo, não se pode afirmar que o bem seja de propriedade da União. 4. Ao insistir na tese de erro de fato, a embargante argumenta que ‘se encontra no processo originário a comprovação do direito da União e, ao mesmo tempo, a ausência de razão à parte adversa’, portanto, cristalina-mente, suposto erro de direito. 5. Negado provimento aos embargos de declaração.” (TRF 1ª R. – EDcl-AR 0051546-12.2012.4.01.0000 – Rel. Juiz Fed. Conv. Evaldo de Oliveira Fernandes Filho – DJe 16.07.2015 – p. 42)

2041 – desapropriação – execução de título judicial – indenização – benfeitorias

“Processual civil. Agravo de instrumento. Execução de título judicial. Desapropriação. Indenização. Benfeitorias. Cálculos complementares. Pretensão. Atendimento. Juízo a quo. 1. A pretensão trazida no recurso de agravo, relativamente à necessidade de pagamento complementar da indenização das benfeitorias, na fase de execução de título judicial em ação de desapropriação, foi atendida pelo Ju-ízo a quo. 2. Agravo de Instrumento prejudicado.” (TRF 1ª R. – AI 0019912-27.2014.4.01.0000/PA – Rel. Des. Fed. Mário César Ribeiro – DJe 11.06.2015 – p. 3169)

2042 – dúvida registral – sentença que a rejeitou por reputá-la incabível na espécie – manu-tenção

“Apelação cível. Dúvida registral. Sentença que a rejeitou por reputá-la incabível na espécie. Manu-tenção. Pedido de natureza administrativa com a finalidade de trazer ao juízo competente o exame da legalidade da exigência documental promovida por oficial de cartório. Debate que se resume aos valores das custas constantes de orçamento. Inexistência de conflito quanto à exigência docu-mental. Apelo desprovido. 1. ‘A dúvida é um pedido de natureza administrativa, formulada pelo Oficial do registro, a rogo do apresentante do título, para que o juízo competente se manifeste sobre a legalidade da exigência feita, relativamente a um instrumento ou a vários documentos, decidindo se é ou não indispensável ao registro pretendido’ (DINIZ, Maria Helena. Sistemas de registro de imóveis. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2004). 2. Expediente que, por ter sido suscitado em razão do in-conformismo manifestado pela Cohapar – Companhia de Habitação do Paraná em relação ao valor das custas detalhadas em orçamento apresentado pelo Sr. Oficial, não diz respeito a qualquer con-flito relacionado à exigência documental promovida pelo registrador. Rejeição justificada.” (TJPR – AC 1277813-1 – 12ª C.Cív. – Relª Desª Denise Kruger Pereira – DJe 16.06.2015 – p. 537)

2043 – financiamento habitacional – cobertura securitária – vícios de construção – ilegitimida-de passiva

“Processual civil. Civil. Financiamento habitacional. Cobertura securitária. Vícios de construção. Ilegitimidade passiva da CEF. REsp 1.091.393/SC (Recurso Repetitivo). Incompetência da Justiça Federal. 1. Apelação interposta pelas mutuárias contra decisão do Juízo da 4ª Vara Federal da Seção Judiciária Rio Grande do Norte, que julgou improcedente o pedido inicial de indenização pelos vícios de construção de seu imóvel, envolvendo o valor necessário à cobertura do conserto integral do prédio, os aluguéis de outros imóveis no período necessário ao conserto e os danos morais sofri-dos. 2. A sentença recorrida destoa do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial repetitivo (REsp 1.091.393/SC), no sentido de considerar que, ‘nos feitos em que se discute a respeito de contrato de seguro adjeto a contrato de mútuo, por envolver discussão entre seguradora e mutuário, não comprometer recursos do SFH e não afetar o FCVS (Fun-do de Compensação de Variações Salariais), inexiste interesse da Caixa Econômica Federal a justi-ficar a formação de litisconsórcio passivo necessário, sendo, portanto, da Justiça Estadual a compe-tência para o seu julgamento. Precedentes deste Tribunal (Processo nº 00025533720134058100, AC 573263/CE, Rel. Des. Fed. José Maria Lucena, 1ª T., Julgamento: 04.12.2014, Publicação: DJe 11.12.2014; Processo nº 00064331520104058400, AC 563110/RN, Rel. Des. Fed. Fernando Braga, 2ª T., Julgamento: 22.04.2014, Publicação: DJe 24.04.2014; Processo nº 00204416920114058300,

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AC 561722/PE, Rel. Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho (Convocado), 3ª T., Julgamento: 26.09.2013, Publicação: DJe 01.10.2013; Processo nº 00044778320134058100, AC 571403/CE, Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira, 4ª T., J. 17.06.2014, Publicação. DJe 20.06.2014). 3. O contrato de financiamento da mutuária Joseneide Maria dos Santos foi firmado em 08.03.1982 (fl. 552), fora, portanto, do período compreendido entre as edições da Lei nº 7.682/1988 e da MP 478/2009, e o contrato da mutuária Carla Sarmento Batista Benjamim, embora celebrado dentro do mencionado período, notadamente em 02.01.1995, não tem vinculação com a apólice pública, ramo 66 (fl. 128) nem tampouco comprovação de esgotamento da reserva técnica do Fesa. 4. Ape-lação provida para, reconhecendo a ilegitimidade passiva ad causam da CEF, excluí-la da demanda, determinando o envio dos autos para a Justiça Estadual, restando anulada a sentença de primeiro grau.” (TRF 5ª R. – AC 0000112-56.2013.4.05.8400 – (581032/RN) – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira – DJe 18.06.2015 – p. 339)

2044 – Herança – venda de imóvel – pagamento do imposto iTCMd – responsabilidade do ad-quirente

“Apelação cível. Ação de indenização por danos morais. Venda de imóvel objeto de herança. Paga-mento do imposto ITCMD. Responsabilidade do adquirente conforme promessa de compra e ven-da. Inadimplemento tributário decorrente da demora na concessão de alvará para venda do imóvel e da discussão administrativa do valor junto a Sefaz. Quantia posteriormente reduzida e adimplida. Reconhecimento da inscrição indevida pelo Estado do Ceará. Isenção de responsabilidade indeni-zatória por parte das apeladas na inscrição indevida do nome do alienante/herdeiro na dívida ativa estadual. Apelação conhecida, mas desprovida. 1. No caso sub oculi, pretende o apelante a inde-nização por danos morais, decorrentes de inscrição indevida na Dívida Ativa Estadual, ocasionada por débito quanto ao adimplemento de ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Morte e Doação), este gerado em função da alienação de imóvel objeto de herança do apelante, o qual fora vendido às apeladas, que ficaram na responsabilidade de liquidar dito imposto. 2. O que houve, de fato, foi uma longa demora na concessão do alvará para fins de pagamento do tributo, o que acarretou a elevação de seu valor, ensejando discussão administrativa em torno dele. Após vasto lapso temporal de espera pela deliberação do dito instrumento, e pleito no âmbito administrativo, o referido tributo foi recolhido com a devida redução valorativa. 3. Inexiste na presente lide qualquer configuração de dano moral, bem como se entremostra inviável a possibilidade de responsabilização das recorridas. Ademais, ressalte-se que o suposto inadimplemento contratual em apreço não gera dano moral. Precedentes do STJ. 4. Apelação conhecida e desprovida. (TJCE – Ap 0093564-76.2009.8.06.0001 – Rel. Francisco Darival Beserra Primo – DJe 01.06.2015 – p. 61)

2045 – Hipoteca – ação de cobrança de cotas condominiais – execução – arrematação do imó-vel gravado – terceiro – credor hipotecário

“Agravo de instrumento. Ação de cobrança de cotas condominiais, em fase de execução. Arrema-tação do imóvel gravado com hipoteca por terceiro. Credor hipotecário devidamente intimado da data das praças. Pedido de habilitação do crédito indeferido. Preclusão não constatada. Preferência do credor hipotecário. Agravante, ademais, não intimada dos atos praticados. Decisão reformada. Recurso provido. 1. O magistrado singular indeferiu o pedido de habilitação do crédito do agravan-te em face da sua inércia, ao deixar de se manifestar sobre a decisão que determinou a extinção da hipoteca e tratou do destino do produto da arrematação. 2. Contudo, o credor hipotecário possui preferência no recebimento do produto da arrematação, após a quitação dos débitos condominiais que, por se tratar de dívida para a manutenção do bem, prefere a hipoteca. 3. Ademais, da análise detida dos autos, verifica-se que o agravante não foi intimado da referida decisão e nem mesmo de atos posteriores praticados nos autos de carta precatória em que houve a arrematação do imó-vel, bem como a decisão sobre o destino do produto da alienação, o que impõe a necessidade

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de reforma da decisão agravada.” (TJPR – AI 1329975-1 – 10ª C.Cív. – Rel. Des. Luiz Lopes – DJe 20.07.2015 – p. 203)

Comentário Editorial SÍnTESECuida-se de Agravo de Instrumento com pedido de atribuição de efeito suspensivo, voltado contra a decisão que nos autos de cobrança de cotas de condomínio, em fase de execução indeferiu o pedido de habilitação de crédito apresentado pela Caixa de Previdência dos Funcio-nários do Banco do Brasil – Previ, credor hipotecário.Insurge-se a agravante alegando que o indeferimento do pedido de habilitação de crédito, impedirá sua participação nos atos processuais futuros, situação flagrantemente prejudicial, pois tolherá o direito de receber o seu crédito.Assevera que para o levantamento do saldo remanescente mostra-se imprescindível a prévia habilitação do crédito, que pode ser formulada a qualquer momento, não havendo preclusão.Ademais, a agravante é credora hipotecária, tendo preferência sobre o saldo remanescente.Em face do exposto, requer o provimento do recurso, para o fim de “assegurar a habilitação da Agravante, com ressalva de seu direito de preferência em caso de arrematação do imóvel, para que após o levantamento dos valores devidos ao Município de Curitiba, o saldo remanescente seja destinado para saldar os débitos que o Agravado Marcelino Cesário da Silva possui com o ora Agravante”.Ao final, pugnou pela concessão de efeito suspensivo e a posterior reforma da decisão agra-vada.O TJPR votou no sentido de dar provimento ao agravo de instrumento, para reformar a decisão agravada e permitir a habilitação do crédito nos autos de ação de cobrança de cotas condomi-niais, em fase de execução.José Rogério Cruz e Tucci disciplina sobre a Hipoteca judiciária:“Havendo, pois, sentença de natureza condenatória, impondo ao réu o pagamento de quan-tia certa ou a entrega de determinada coisa, aflora para o autor o direito de constituição da hipoteca judiciária.”Dispõe, com efeito, o caput do art. 466 do Código de Processo Civil que: “A sentença que condenar o réu no pagamento de uma prestação consistente em dinheiro ou em coisa, valerá como título constitutivo de hipoteca judiciária, cuja inscrição será ordenada pelo juiz na forma prescrita na Lei de Registros Públicos”.Comentando essa norma processual, aduz Moacyr Amaral Santos que: “Do só fato de haver sentença de efeito condenatório resulta, por força da lei, hipoteca judiciária sobre os bens imóveis do condenado e, assim, o poder do autor de fazer inscrevê-la mediante simples man-dado do juiz.”Enfatizam, a propósito, Marçal Justen Filho, Eduardo Talamini e Egon Bockmann Moreira que a respectiva sentença constitui imediatamente a hipoteca judiciária, não importando qual seja o seu conteúdo e do que dela conste. “Basta que traga em si alguma condenação pecuniária ou a entrega de coisa”.E, por isso, sustenta Theotonio Negrão, à luz do transcrito art. 466, que a hipoteca judiciária “é consequência imediata da sentença, pouco importando a pendência ou não de recurso contra esta”.Verifica-se, nesse sentido, que, na esteira de alguns precedentes, a 12ª Câmara do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, em julgamento unânime, teve oportunidade de patentear que, in verbis:“A sentença que condena o réu no pagamento de prestação em dinheiro vale como título cons-titutivo de hipoteca judiciária (CPC, art. 466, caput).Cuida-se de efeito que não depende do trânsito em julgado da decisão, nascendo da publica-ção da sentença de mérito condenatória (GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil bra-sileiro, v. 2/230; PIMENTEL, Wellington Moreira. Comentários ao Código de Processo Civil, v. III/567; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de conhecimento, v. II/667).”Trilhando idêntico posicionamento, a 5ª Câmara do mesmo sodalício paulista, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 445.726-9, sendo Relator o Juiz Alvares Lobo, houve por bem dar provimento ao recurso, uma vez que, in casu, “a sentença foi proferida em ação de respon-sabilidade civil, decorrente de acidente automobilístico e condenada a agravada a reparar o dano, cujo montante será apurado por simples cálculo do Contador. Dispensando o trânsito em

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julgado da sentença, há um acórdão do e. Tribunal de Justiça e publicado na RT 596/1999, sendo Relator o Des. Joaquim de Oliveira”.3. Procedimento para a constituição da hipoteca judiciáriaA despeito de constituir importante instrumento preventivo de fraude à execução, verifica-se que, por não conter regulamentação procedimental específica, o instituto da hipoteca judiciária é de rara incidência prática.Considerando a lacuna legal atinente ao procedimento a ser observado para a concretização dessa espécie de hipoteca, os doutrinadores pátrios têm procurado traçar algumas diretrizes básicas, sob pena de ser nula, ipso iure, aquela providência judicial.Examinando essa relevante questão, Luiz Alberto Hoff anota ter sido muito incipiente o tra-tamento atribuído à hipoteca judicial pelo Código de Processo Civil, “e, por conseguinte, tão pouco lhe dedicou à doutrina, que aqueles que se deparam com o art. 466 do CPC, embora tendo à sua frente a afirmação da lei de que a sentença produz a hipoteca, não se animam a postular a sua especialização e inscrição por falta de diretriz processual; o caminho, entretan-to, é simples, bastando peticionar nos próprios autos em que foi dada a sentença, registrando: 1) a estimativa da repercussão financeira da responsabilidade do perdedor da ação; 2) a exis-tência de imóveis em nome do devedor, e seus valores estimados; 3) requerendo seja expedido o mandado de especialização da hipoteca sobre aqueles imóveis, ou sobre tantos quantos bastem à satisfação da responsabilidade. O juiz avaliará, com seu prudente arbítrio, os valores estimados pelo postulante, recorrendo a peritos, se necessário, mas sempre tendo em vista a necessidade de acelerar a inscrição da hipoteca”.Ademais, não pode restar dúvida que ao devedor – que vai sofrer todos os ônus emergentes do direito real de garantia consistente na hipoteca judiciária – devem ser asseguradas, no iter procedimental, todas as garantias ínsitas ao devido processo legal.Recorde-se, aliás, que o art. 5º, LIV, da Constituição Federal, acolhendo tradicional princípio de justiça, reza que: “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido pro-cesso legal”.Despiciendo salientar que a garantia da plenitude da defesa reclama sejam os sujeitos parciais do processo cientificados de todos os atos praticados no desenrolar do procedimento civil ou penal, com a probabilidade de manifestar-se sempre, e no prazo legal, ou no fixado pelo juiz, sobre a atividade desenvolvida pelo antagonista.Com efeito, a bilateralidade da audiência, ou contraditoriedade, assenta-se num importantíssi-mo regramento, dito princípio de justiça, e determinante da exigência de tratamento paritário das partes, de tal sorte que haja o mais perfeito equilíbrio entre as suas respectivas atividades processuais.Traduzindo doutrinação universal, aduzem, a propósito, Mauro Cappelletti e Vincenzo Vigoriti que:“O direito de ação e defesa não está limitado ao pedido inicial ou à resposta, mas expressa também uma garantia geral do direito de ser adequadamente ouvido durante todo o procedi-mento. Cada fase do procedimento deve ser estruturada de tal modo que propicie às partes uma real oportunidade de defesa.”Deflui, à evidência, dessa perspectiva, o fundamento lógico da regra do contraditório, moldado na vetusta máxima audiatur et altera parte.Expressão da estrutura dialética do processo, em decorrência do caráter bilateral da ação, a contraditoriedade inculca-se, marcantemente, no procedimento de formação de convencimen-to do juiz e decorrente pronunciamento judicial.Daí por que se faz ela instituída, também, no interesse da própria Justiça e, consequentemen-te, do julgador, que, por força do diálogo encetado pelas opostas e contrastantes alegações, encontra, iluminado sob os mais diversos aspectos, o caminho da verdade e do Direito.E, como não poderia ser diferente, o nosso Código de Processo Civil, em diversos dispositivos, assegura não só o direito de ser informado no momento da fase postulatória, como também a bilateralidade da audiência ao longo de todo o desenrolar do procedimento: arts. 125, 213, 214, 297, 398, 421, 452, 454, 518, 552, § 1º, 554.É, aliás, da própria sistemática do Código de Processo Civil que se infere, também para a instituição da hipoteca judiciária, a exigência de observância do princípio do contraditório.Realmente, se para a constituição da penhora – objetivando, igualmente, a garantir a efetivi-dade futura de provimento condenatório – o devedor se manifesta a cada momento (arts. 652,

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654, 655, 668, 669), não pode restar dúvida de que, para a hipoteca em apreço, o devedor também necessita ser ouvido!E isso, até porque, a teor do disposto no art. 620 do Código de Processo Civil, “quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor”.Mas não é só...Caio Mário da Silva Pereira, após elencar, como ressaltado, dentre os pressupostos da hipoteca judiciária a especialização, ensina que por esta se impõe “referência precisa ao imóvel gravado e à dívida garantida”. Somente preenchidos todos os requisitos – complementa o civilista pátrio – é que se viabiliza a hipoteca judicial.Esposando idêntica opinião, esclarece Wellington Moreira Pimentel que o direito de sequela decorrente da hipoteca judiciária não engloba todos os bens do devedor. É imprescindível que se especialize, isto é, “que se individualize o imóvel, ou imóveis, sobre os quais recairá a hipoteca judicial para que possa ser oponível a terceiros”, e, por certo, para que possa ser registrada.Por outro lado, mesmo assistindo direito ao credor, como visto, à hipoteca judiciária, deve ser ela efetivada, a teor da parte final do caput do art. 466 do Código de Processo Civil, em consonância com as normas cogentes da Lei de Registros Públicos.Tal orientação, com efeito, tem sido perfilhada pelos pretórios brasileiros, inclusive pelo 1º Tribunal de Alçada Civil paulista, como evidencia, dentre outros, acórdão da 11ª Câmara, ao deixar assentado que a inscrição da hipoteca judiciária deve ser “ordenada pelo Juiz, de acordo com a forma prescrita na Lei de Registros Públicos, como determina, ainda, a parte final do art. 466, para produzir efeito em relação a terceiros...”.A 17ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, fiel a tal princípio, também teve opor-tunidade de patentear, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 88.873-2, que:“A hipoteca judiciária pode ser inscrita, desde que se ajuste às disposições legais, independen-temente de pendência ou não de recurso...”.Ora, o art. 175, III, da Lei de Registros Públicos, de clareza notória, dispõe que se faz necessá-rio, para o respectivo registro, “o valor do contrato, da coisa, da dívida, prazo desta, condições e mais especificações, inclusive os juros, se houver”.Acrescente-se que a ordem judicial e, por via de consequência, o respectivo mandado deverá atender ao disposto nos arts. 175, III, e 225, da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. (Hipoteca judiciária e devido processo legal. Disponível em: http://online.sintese.com.)

2046 – Hipoteca – pedido de extinção – quitação do imóvel

“Ação de obrigação de fazer de cumprimento de contrato, cumulada com indenização por perdas e danos. Pedido de extinção de hipoteca. Quitação do imóvel que restou demonstrada. Ré que alega ser parte ilegítima para tanto, apontando a Caixa Econômica Federal como a responsável pela libe-ração do gravame. Inadmissibilidade. Contrato firmado entre a ré e os autores. Súmula nº 308 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Sentença de parcial procedência que fica mantida. Aplicação do art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça. Recurso não provido.” (TJSP – Ap 0024265-54.2011.8.26.0625 – Taubaté – 4ª CDPriv. – Rel. Fábio Quadros – DJe 20.07.2015)

2047 – Hipoteca – penhora desconstituída – pedido de reconhecimento de ineficácia

“Penhora desconstituída. Pedido de reconhecimento de ineficácia de hipoteca. Honorários advo-catícios. 1. No art. 47 do CPC está prevista a existência de litisconsórcio necessário ‘quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uni-forme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo’. Como bem ensinam Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero (in Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. 2. ed. Revista dos Tribunais, 2010, nos comentários ao art. 47), o litisconsórcio necessário unitário decorre da ‘natureza incindível da rela-ção jurídica de direito material afirmada em juízo’, resultando em dever ao julgador de outorga da tutela jurisdicional de maneira uniforme, uma vez constatada a incidibilidade na situação deduzida em juízo. Entretanto, não é o que ocorre no caso em tela, conforme bem decidiu o Juízo de Origem,

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eis que o alegado reflexo patrimonial na esfera jurídica dos sócios se dá em outra ação referente a desconstituição da penhora e não na presente, em que buscado o reconhecimento da ineficácia da hipoteca. Dessa forma, é caso de ser mantida a sentença relativamente ao afastamento da legi-timidade passiva do sócio da CBL, Luiz Guilherme Christino Alho da Silva, e, por consequência, a condenação da autora em honorários àquela parte. 2. A respeito do arbitramento ou fixação dos honorários advocatícios, o entendimento da 3ª Turma vem sendo pacificado no sentido de remune-rar adequadamente o advogado, ajustando-se a sucumbência com valores praticados no mercado de trabalho. Cabe ressaltar que inexiste vinculação aos limites percentuais estabelecidos no § 3º do art. 20 do CPC, tampouco obrigação de o julgador adotar como base de cálculo desses honorá-rios o valor dado à causa ou à condenação (STJ, REsp 726265/RS, 1ª T., Relª Min. Denise Arruda, DJ 30.04.2007, p. 286). Ao mesmo tempo, a jurisprudência autoriza o manejo prudente dos vetores inscritos no art. 20, § 3º e alíneas, do CPC, relativamente aos limites quantitativos e qualitativos. No caso dos autos, foi atribuído à causa o valor de R$ 135.937,50 (cento e trinta e cinco mil nove-centos e trinta e sete reais e cinquenta centavos), e a parte autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios ao sócio da CBL, excluído da ação, no equivalente a 10% do valor da cau-sa. Entretanto, verifica-se que o sócio da CBL, excluído do polo passivo da ação, veio ao processo para contestar, apresentando errata subsequente, e para informar novo endereço. Dessa forma, em atenção aos critérios supra, entendo ser o caso de redução do valor em que fixados os honorários advocatícios ao réu excluído do polo passivo, para fixá-los em 5% sobre o valor da causa. 3. Senten-ça ajustada parcialmente para redução do valor dos honorários advocatícios em favor do sócio da CBL excluído do polo passivo da ação, para fixá-los em 5% sobre o valor da causa.” (TRF 4ª R. – AC 5001479-49.2014.404.7001 – 3ª T. – Rel. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz – J. 03.06.2015)

2048 – Hipoteca judicial – necessária prévia especialização

“Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Hipoteca judicial. 1. Necessá-ria prévia especialização. 2. Agravo regimental improvido. 1. Não se verifica a omissão apontada, pois ‘o aresto foi claro ao asseverar a necessidade de procedimento próprio de jurisdição voluntária para registro da hipoteca judiciária, eis que é necessária a prévia avaliação dos bens indicados pela embargante, com a realização de prova técnica’. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 595.548 – (2014/0258587-1) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 10.06.2015 – p. 361)

2049 – locação comercial – ação renovatória – ilegitimidade passiva

“Processo civil. Recurso de apelação. Ação renovatória de locação comercial. Ilegitimidade passiva dos locadores afastada. Insurgência. Alienação do bem imóvel objeto da locação que não afasta a legitimidade passiva dos locadores proprietário do imóvel até sua efetiva transferência imobiliá-ria. Observância ao princípio da segurança jurídica. Contradição em relação à sentença proferida nos autos da ação de consignação em pagamento apenas aparente. 1. ‘3. Tem legitimidade para figurar no polo passivo da ação renovatória de aluguel o locador/promissário vendedor, enquanto o respectivo título translativo da propriedade não for registrado no competente cartório de registro de imóveis. Inteligência do art. 1.245 do novo Código Civil. Precedentes. 4. Agravo regimental im-provido’ (AgRg-Ag 951.566/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., Julgado em 27.03.2008, DJe 12.05.2008). 2. Recurso conhecido e desprovido.” (TJPR – AC 1310340-9 – 11ª C.Cív. – Rel. Des. Ruy Muggiati – DJe 22.06.2015 – p. 153)

2050 – locação comercial – crédito – alugueres e acessórios locatícios – advento do termo final do contrato – ausência de renovação expressa

“Direito civil. Direito das obrigações. Contrato de locação comercial. Rescisão. Crédito. Alugue-res e acessórios locatícios. Advento do termo final do contrato. Ausência de renovação expressa. Prorrogação por prazo indeterminado. Manutenção das cláusulas e condições originais. Reajustes.

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Omissão contratual. Reajuste. Preservação do equilíbrio contratual. Necessidade. Imperativo legal. Valores pagos a maior pela locatária. Abatimento no débito. Juros moratórios. Incidência. Impos-sibilidade. Ausência de mora da locadora. Honorários advocatícios. Existência de condenação. Parâmetros. 1. Conquanto omisso o contrato quanto ao reajustamento anual dos locativos, o reajus-tamento traduz imperativo legal, pois volvido simplesmente a preservar a comutatividade e o equi-líbrio contratual, obstando que o locador fique afetado por auferir importe aquém do originalmente convencionado ante o efeito corrosivo da inflação sobre o valor nominal da moeda, determinando que, sob essa realidade, seja fixado que os locativos deverão ser reajustados anualmente mediante a utilização do IGP-M, por refletir a intenção das partes manifestada no instrumento negocial, to-mando-se como base de cálculo o aluguel originariamente convencionado. 2. Reajustado o aluguel em percentual superior ao alcançado pelo indexador monetário convencionado, portanto aplicável, resultando na apuração de locativo superior ao efetivamente devido na forma convencionada, os locativos em aberto devem ser revistos e mensurados de acordo com o valor do aluguel reajustado tendo como base de cálculo o locativo avençado, conforme se apurar em liquidação de sentença por cálculo, decotando-se o que lhe sobejar como forma de se evitar o locupletamento indevido. 3. Cuidando-se de cobrança de débito oriundo de locativos e demais encargos oriundos de contrato de locação mensuradas de forma certa e determinada e com termo definido pela próprio contrato, os juros de mora que devem incrementar os valores inadimplidos têm como termo inicial a data do vencimento de cada prestação, pois, tratando-se de dívida certa quanto à existência, líquida quanto ao objeto e exigível, o inadimplemento constitui de pleno direito em mora o devedor (art. 397, CC), fórmula não aplicável, porém, aos valores pagos a maior pela locatária e destinados ao abati-mento dos locativos devidos em razão da inexistência de mora da locadora. 4. Encerrando a ação pretensão de natureza condenatória e acolhido parcialmente o pedido, os honorários advocatícios devidos aos patronos da parte autora como contrapartida pelos serviços que realizaram, ponderados os trabalhos efetivamente executados, o zelo com que se portaram, o local e tempo de execução dos serviços e a natureza e importância da causa, devem necessariamente ser mensurados em per-centual incidente sobre o valor da condenação, ensejando que sejam mensurados de conformidade com esses parâmetros de forma a ser privilegiada a previsão legal (CPC, art. 20, §§ 3º e 4º). 5. Ape-lação conhecida e parcialmente provida. Unânime.” (TJDFT – Proc. 20130111598689 – (875071) – 1ª T.Cív. – Rel. Des. Teófilo Caetano – DJe 24.06.2015 – p. 115)

2051 – locação de imóvel – ação de consignação em pagamento – recusa no recebimento

“Locação de imóvel. Ação de consignação em pagamento. Recusa no recebimento. Sentença de procedência. Recurso da ré não provido. Patente a recusa da ré em receber o valor contratado, exi-gindo o pagamento de quantia reajustada unilateralmente e ao arrepio dos termos do contrato e das normas regentes da matéria, pertinente a consignação judicial do valor efetivamente devido. Hono-rários advocatícios sucumbenciais. Fixação. Sentença que arbitrou os honorários advocatícios sobre o valor da causa. Pretensão de aplicação do art. 67, IV, da Lei nº 8.245/1991. Inaplicabilidade, ao caso. Recurso do autor não provido. Com efeito, na hipótese, a locadora-ré ofereceu contestação, postulando a improcedência da demanda, bem como não recebeu os valores depositados, de modo que não tem aplicação no caso em exame o disposto no art. 67, IV, da Lei nº 8.245/1991.” (TJSP – Ap 4001320-48.2013.8.26.0006 – São Paulo – 31ª CDPriv. – Rel. Paulo Ayrosa – DJe 15.07.2015)

Comentário Editorial SÍnTESECuida-se de ação de consignação em pagamento julgada procedente pela r. sentença de fls. 128/130, cujo relatório se adota, condenando a ré ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da causa.Inconformadas, apelam ambas as partes.A ré recorre almejando a reforma da r. sentença, reiterando os termos de sua contestação, alegando, em síntese, todas as tratativas ocorridas quanto aos novos valores da locação, de modo que a demanda deve ser julgada improcedente.

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Já o autor apela alegando que a r. sentença comporta reforma, unicamente, no que concerne ao percentual e montante de incidência dos honorários advocatícios arbitrados, sendo impe-rioso fixar os honorários advocatícios em 20% (vinte por cento) sobre o valor depositado, nos termos da Lei de Locações.O TJSP negou provimento aos recursos.O Relator afirmou que neste caso, a locadora-ré ofereceu contestação, postulando a improce-dência da demanda, bem como não recebeu os valores depositados, de modo que não tem aplicação à hipótese em exame o disposto no referido dispositivo legal e que em tais condi-ções, nada havendo a ser alterado resta mantida a sentença recorrida por seus próprios e bem deduzidos fundamentos.Os juristas Leandro Lomeu e Gustavo Lomeu assim asseveram sobre a locação:“O contrato de locação é tradicionalmente, atrás apenas da compra e venda, o mais importante e comum negócio jurídico em nossa sociedade, sendo um dos mais utilizados no cotidiano. De fato, a locação está presente nos momentos de lazer, quando alugamos um imóvel na praia, ou um sítio em datas comemorativas; nos transportes, aluguéis de carros; em momentos mar-cantes, como os casamentos, aluguéis de vestidos, ternos, salão de festas; em atos simples, como alugar um filme para o final de semana. Mas, de todas as espécies possíveis, o que mais preocupa todos, pelo seu caráter econômico e social, é a locação para moradia e para o esta-belecimento comercial. Trataremos, então, neste primeiro contato com a matéria, em distinguir a locação predial urbana residencial e não residencial das demais.A locação de prédio urbano é subordinada à Lei do Inquilinato – LI (Lei nº 8.245/1991, com as alterações introduzidas pela Lei nº 12.112, de 9 de dezembro de 2009). O Código Civil de 2002 não dispõe a respeito da locação de prédios, ficando sob sua regência a locação de coisas, de vagas autônomas de garagem ou de espaços para estacionamento de veículos, de espaços destinados à publicidade, de apart-hotéis, hotéis residência, ou equiparados, assim considerados aqueles que prestam serviços regulares a seus usuários e, como tais, sejam autorizados a funcionar. Por outro lado, as locações de imóveis de propriedade da União, dos Estados e dos Municípios, de suas Autarquias e fundações públicas, e o arrendamento mercan-til, em qualquer de suas modalidades, são dirigidas pelo Direito Administrativo.Na locação que tem como locador o Poder Público, não se aplica nem a Lei de Locação nem o Código Civil. Sendo a União locadora, aplica-se o Decreto-Lei nº 9.760/1946 e a Lei nº 8.666/1993. Sendo o locador o Estado, o Município, suas Autarquias e fundações públicas, haverá, neste âmbito, leis específicas variando de acordo com cada ente, porém respeitando sempre os dispositivos constitucionais. Por fim, o arrendamento mercantil será tratado por lei própria, ou seja, a Lei nº 6.099/1974 e as resoluções do Bacen (Banco Central do Brasil).Por conseguinte, quando o Poder Público, representado pela Administração direta ou indireta, se apresenta no outro polo contratual, como locatário, será aplicada a Lei do Inquilinato.O Código Civil conceitua a locação em seu art. 565, com a seguinte redação: ‘Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição’. No mesmo sentido, na locação urbana, o locador dispõe ao locatário a posse direta de imóvel, destinado a sua residência familiar ou a estabelecimento comercial, mediante o pagamento de remuneração (alugueres), por certo tempo, restituindo-o ao término ao locador nos mesmos estados de conservação em que fora recebido. Dessa forma, o contrato de locação estabelece-se em três elementos básicos: a) o ob-jeto, imóvel urbano, assim classificado não pela localização geográfica, mas pela sua destina-ção e utilização. Assim, exemplo comum na jurisprudência, os postos de gasolina, mesmo que situados em zona rural, encontram-se sujeitos à Lei do Inquilinato, bem como qualquer outra atividade industrial e comercial, ou, ainda, servindo o imóvel rural mesmo que para moradia, sem a utilização da terra para cultivo, labor ou subsistência, está, do mesmo modo, sujeito à locação urbana – trata-se de interpretação teleológica da lei; b) a remuneração, o pagamento de um aluguel, interessante expor que a remuneração não é necessariamente fixada em dinhei-ro. ‘O preço na locação deve ser determinado ou ao menos determinável, nada impedindo que o valor seja variável de acordo com índices aceitos pela lei’; c) o tempo; a locação pactuada por escrito deverá ser determinada: se por prazo superior a 30 (trinta) meses, a resolução do contrato ocorrerá findo o prazo ajustado, podendo o locador denunciar o contrato – o que se convencionou denominar de denúncia vazia –, pedindo a desocupação do imóvel no prazo de 30 dias sem justificativa para o pedido, sendo o fim do prazo a exigência suficiente. Se a

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locação, findo o prazo, continuar por mais de trinta dias sem oposição do locador, perdurará por prazo indeterminado.De outra forma, quanto ao tempo, a locação constituída verbalmente ou por escrito por prazo inferior a 30 (trinta) meses terá dogmática diferente quanto à resolução da locação. O imóvel poderá ser retomado somente nos casos descritos na lei – denúncia cheia. Assim, o art. 47 da LI dispõe que pode ser retomado o imóvel na ocorrência dos motivos de desfazimento da locação, presentes no art. 9º da LI; na extinção do contrato de trabalho, no caso da locação em que o locatário se confunde na pessoa do empregado; para uso próprio, de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente ou descendente que não disponha, assim como seu cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial próprio; para demolição e edificação licenciadas pelo Poder Público que aumentem no mínimo em vinte por cento a área construída; para a exploração do imóvel como hotel ou pensão, em cinquenta por cento; por fim, o único caso de denúncia vazia (denúncia imotivada), presente no art. 47 da LI: a vigência ininterrupta da locação por prazo superior a cinco anos, que deverá ser efetuada mediante no-tificação prévia do inquilino, pois, ao contrário do art. 46, não há disposição expressa quanto à dispensabilidade da notificação ou aviso.O descumprimento das justificativas para a desocupação, presentes no art. 47 – principalmen-te, por ser mais comum, o desvio de uso –, possui reflexos penais, sendo punido por detenção de três meses a um ano, que poderá ser substituída pela prestação de serviços à comunidade, a fim de proteger o inquilino de simulações do locador, evitando fraudes à lei.Assim, o contrato de locação se caracteriza por ser bilateral, oneroso, comutativo, típico, con-sensual, não formal e de trato sucessivo.Desde a origem da locação, há para ambas as partes, locador e locatário, obrigações recípro-cas, daí sua bilateralidade. ‘O contrato de locação é bilateral por sua própria natureza, não podendo a vontade das partes alterar essa característica’. Esta especialidade desprende-se em importantes construções doutrinárias aplicadas à locação por sua bilateralidade. Neste senti-do, atua no contrato de locação o princípio contratual de exceção de contrato não cumprido.Somente nos contratos bilaterais é aplicável a exceptio non adimpleti contractus, exceção (defesa) substancial do contrato não cumprido, prevista expressamente no Código Civil bra-sileiro (art. 476 do CC/2002; art. 1.092 do CC/1916), consistente na regra de que nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação (o que já afasta a sua incidência em contratos unilaterais), pode exigir o implemento da prestação do outro. Por consequência, a garantia de execução do contrato (outrora prevista no mesmo art. 1.092 do CC/1916 e, hoje, em dispositivo próprio, a saber, o art. 477 do CC/2002) também pode ser invocada em tais avenças sinalagmáticas pela incompatibilidade estrutural com os contratos unilaterais. Esta característica bilateral do contrato de locação confere-lhe importantes aplicações práticas, atuando conjuntamente com os princípios da lealdade contratual ou boa-fé objetiva. De fato, não poderá o inquilino cobrar consertos e exigir obrigações do locador se ele não pagar o alu-guel e encargos; do mesmo modo, não poderá o locador, sem cumprir os seus deveres, exigir do locatário o cumprimento de suas responsabilidades; assim, a ‘exceção de contrato não cumprido’ firma-se no equilíbrio contratual das partes, característica típica da bilateralidade.Todo contrato bilateral é oneroso, possuindo reciprocidade de direitos e deveres para ambos os contratantes. Na subdivisão de contrato oneroso, a locação se classifica como contrato comutativo. É comutativo, pois os contratantes já conhecem, a priori, as suas respectivas obrigações, contrapondo-se aos contratos aleatórios que se sujeitam à álea ou sorte.O contrato de locação é regulado e disciplinado por lei própria, a Lei nº 8.245/1991, por isso sua relação é típica.Quanto à consensualidade, a locação se concretiza com a simples declaração de vontade, e, por conseguinte, trata-se de contrato não solene, pois a ordem jurídica não exige forma pres-crita, sendo possível até mesmo o contrato verbal de locação.Quanto ao tempo, o contrato de locação classifica-se como de duração ou de trato sucessivo, sendo por prazo determinado ou indeterminado. Essa característica molda a relação contra-tual, pois, no decurso do tempo, a relação pode se modificar quanto a valores, garantias, aditivos contratuais, renovação – caso as partes agregam novas cláusula – ou recondução do contrato – se este se mantém sem modificações. É importante salientar que, nos casos de renovação do contrato, é necessária a anuência de todas as partes, assim perderá a garantia o novo contrato ou aditivo que não possua as assinaturas dos fiadores ou a renovação da garantia locatícia.

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Assim, após a conceituação e classificação contratual, passamos ao posicionamento da loca-ção urbana no universo do Direito, apresentando as relações da matéria locatícia com o direito privado e suas novas tendências.” (Locação urbana: enfoque material da Lei nº 12.112/2009. Disponível em: http://online.sintese.com)

2052 – penhora – alienação a terceiro anterior à citação do devedor no processo de execução – fraude à execução – não caracterização

“Apelação cível. Embargos de terceiro. Imóvel penhorado. Alienação a terceiro anterior à citação do devedor no processo de execução. Fraude à execução. Não caracterização. Fraude contra credo-res. Discussão. Impossibilidade. Meio processual adequado. Ação pauliana. Súmula nº 195, do STJ. 1. Não há que se falar em fraude à execução na hipótese em que a alienação do bem ocorre antes da citação do devedor no processo de execução. 2. De acordo com a Súmula nº 195, do Superior Tribunal de Justiça, ‘Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores’. 3. Apelação cível conhecida e não provida.” (TJPR – AC 1358824-4 – 15ª C.Cív. – Rel. Des. Luiz Carlos Gabardo – DJe 20.07.2015 – p. 379)

2053 – posse – ações conexas – anulação de negócio jurídico, reivindicatória e manutenção

“Direito civil e processual civil. Ações conexas. Anulação de negócio jurídico, reivindicatória e ma-nutenção de posse. Sentença única. Múltiplos apelos. Conhecimento apenas de um deles. Recurso adesivo. Intempestividade. Configuração. Art. 508, CPC. Não conhecimento. Compra e venda de imóvel. Anulação. Alegação de coação moral. Ausência de demonstração do vício de vontade. Nemo potest venire contra factum proprium. Ação reivindicatória. Propriedade. Comprovação. Anotação do título no registro de imóveis. Arts. 1.245/1.247, do CCB. Proteção possessória frente ao proprietário. Inviabilidade. Recursos improvidos. 1. Por força do princípio da unirrecorribilidade, singularidade ou unicidade recursal, somente é admissível a interposição de um único recurso fren-te ao veredicto objeto da inconformação. 1.1 Dentro desta perspectiva, e por lógica decorrência, no caso de julgamento simultâneo de duas ou mais ações, por sentença única, apenas um dos recursos manejados poderá ser conhecido em sede de juízo de prelibação. 1.2 É dizer: ‘não se conhece de recurso reproduzido em autos de ação conexa, se a sentença proferida é única para ambos os feitos’ (TJDFT, 5ª T.Cív., APC 2008.01.1.114316-2, Rel. Des. Ângelo Canducci Passareli, DJe de 07.01.2014, p. 279). 2. Nos termos do art. 508, do CPC, a apelação deve ser interposta no prazo de 15 (quinze) dias. 2.1 Assim, afigura-se intempestivo e, por conseguinte, não merece ser conhecido, o apelo adesivo manejado depois de transcorrido o prazo previsto na lei, sem qualquer justificativa para a demora, nem tampouco a demonstração de que parte se encontra amparada por qualquer norma excepcional que lha assegure prerrogativa quanto aos prazos processuais. 3. A pretensão de anulação de negócio jurídico, sob a alegação de coação moral, deve ser acompanhada da compro-vação da existência de uma ameaça séria e idônea de possibilidade de ocorrência de algum dano (de ordem material ou moral) que possa ser causado à parte ou a pessoa afetivamente ligada a ela, capaz de viciar sua vontade quando da realização do ato jurídico. 3.1 No caso concreto, diante da ausência de demonstração de qualquer causa de anulabilidade apta a macular o negócio jurídico (compra e venda de imóvel), não há como acolher o pleito deduzido a este título, notadamente quando a própria parte afirma que tinha plena ciência do seu ato, e que o realizava com o fim de receber seu quinhão decorrente da partilha em razão de divórcio. 4. Uma vez demonstrada a con-dição de proprietário, por meio da anotação junto à matrícula do imóvel do Registro de Imóveis, no termos dos arts. 1.245/1.247, do CCB, mostra-se pertinente o ingresso em juízo formulando pre-tensão reivindicatória diante do título hábil a embasar o pedido. 5. Não há como subsistir o pleito de proteção possessória, deduzido frente ao proprietário do bem, diante da rejeição do pedido de anulação do negócio jurídico translativo da propriedade. 6. Destarte, bem lembrado pela nobre magistrada a aplicação do princípio da vedação do comportamento contraditório (ou princípio da tutela da confiança legítima ou, ainda, nemo potest venire contra factum proprium), o qual se relaciona diretamente à boa-fé objetiva e decorre do valor constitucional da dignidade da pessoa

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humana. 6.1 A vedação do comportamento contraditório decorre, em suma, da tutela da confiança e da lealdade, que, invariavelmente, transcende o próprio âmbito da boa-fé, estendendo-se sobre todo o direito. Traduz-se na imposição de balizamentos ao comportamento dos indivíduos, tendo em vista a concretização da solidariedade social. 6.2 No dos autos, ‘O comportamento da autora ao assinar a escritura de compra e venda do imóvel é contraditório com o ajuizamento da presente demanda. Ao pretexto de que foi prejudicada na partilha de bens, não pode anular ato que ela mesma praticou de forma livre e autônoma. Se teve motivos emocionais ou caridosos ao concordar com a venda, ou se depois simplesmente dela se arrependeu, não pode, posteriormente, requerer ao Judiciário o seu desfazimento, pois efetivamente não restou configurado qualquer vício que macule o negócio jurídico celebrado. Se logo após a homologação do acordo judicial, a autora concordou em vender o bem, renunciou tacitamente à garantia que lhe foi ofertada pelo réu Jonas, devendo buscar outros meios para obter o pagamento do valor do qual é credora’ (Juíza de Direito Yuki Fugishita Sorrentino). 7. Apelações idênticas interpostas por Francielle Picolo Rosa dos Santos nos autos da ação de manutenção de posse (Processo nº 2012.01.1.159352-3, folhas 315/338) e da ação reivindicatória (Processo nº 2011.01.1.144037-6, folhas 395/418), bem como do recur-so adesivo interposto por Marcelo Perboni, de folhas 423/442 da ação reivindicatória (Processo nº 2011.01.1.144037-6) não conhecidas. 8. Recursos manejados por Francielle Picolo Rosa dos Santos nos autos de ação anulatória (Processo nº 2011.01.1.199603-0), e por Jonas Felix dos Santos na ação de manutenção de posse (Processo nº 2012.01.1.163678-3), conhecidos e improvidos.” (TJDFT – Proc. 20120111440376 – (878854) – 5ª T.Cív. – Rel. Des. João Egmont – DJe 08.07.2015 – p. 277)

2054 – posse – imissão – imóvel adjudicado – notificação para desocupar o imóvel e da adjudi-cação – ocorrência – execução extrajudicial

“Civil. Processual civil. Notificação para desocupar o imóvel e da adjudicação. Ocorrência. Decre-to-Lei nº 70/1966. Execução extrajudicial. Imissão na posse. Imóvel adjudicado. Requisitos atendi-dos. Taxa de ocupação. Apelação improvida. 1. A constitucionalidade ou recepção do Decreto-Lei nº 70/1966 pela Constituição Federal de 1988 já foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. 2. ‘A validade da execução extrajudicial pode ser apreciada na ação de imissão de posse prevista no art. 37, §§ 2º e 3º, do Decreto-Lei nº 70/1966’ (AC 1999.36.00.004538-3/MT). 3. A juntada dos documentos referentes à execução extrajudicial, malgrado as afirmações do mutuário no sentido de que não recebeu nenhum aviso de vencimento e cobrança de dívida, bem como que não foi notificado nos termos do art. 31, § 1º, do Decreto-Lei nº 70/1966, para constituição e purgação da mora, demonstram que houve sim a cientificação, não só da cobrança do débito por meio do Serviço do 2º Ofício de Registro de Títulos e Documentos, mas também de todo o procedimento de execução extrajudicial. 4. De acordo com a jurisprudência do STJ e deste Tribunal, após a ad-judicação do bem, com o consequente registro da carta de arrematação no Cartório de Registro de Imóveis, a relação obrigacional decorrente do contrato de mútuo habitacional se extingue com a transferência do bem, hão havendo interesse em se propor ação de revisão de cláusulas contratuais (REsp 886.150/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, 1ª T., Julgado em 19.04.2007, DJ 17.05.2007, p. 217 e AC 0022917-21.2005.4.01.3800/MG, Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, 6ª T., e-DJF1 p. 105 de 30.08.2012). Em não havendo interesse de agir no ajuizamento de ação com vistas à discussão de cláusulas do contrato de mútuo habitacional, que dirá em sede de imissão na posse de imóvel adjudicado. 5. A ação de imissão na posse é a via processual adequada a ser utilizada pelo agente financeiro, como é o caso da Caixa Econômica Federal – CEF, para reclamar a posse de imóvel de devedor ou terceiro ocupante de imóvel, nos termos do art. 37, § 2º, do Decreto-Lei nº 70/1996. 6. Demonstrada a transcrição, no Registro Geral de Imóveis, da carta de arrematação/adjudicação do imóvel submetido ao leilão decorrente da execução extrajudicial, impõe-se a imissão da credo-ra na posse do imóvel. 7. É devida a taxa de ocupação mensal no período compreendido entre o registro da carta de arrematação/ adjudicação e a efetiva imissão na posse do imóvel alienado, nos

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termos do art. 38 do Decreto-Lei nº 70/1966. Precedentes deste Tribunal. 8. Apelação a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – AC 2008.38.00.037005-0/MG – Rel. Des. Fed. Kassio Nunes Marques – DJe 22.07.2015 – p. 227)

2055 – promessa de compra e venda – reconvenção – restauração de autos – quitação do saldo devedor e liberação da hipoteca

“Apelos cíveis. Promessa de compra e venda. Reconvenção. Restauração de autos. Quitação do sal-do devedor e liberação da hipoteca. Quitação das prestações do contrato de promessa de compra e venda. Pagamento do IPTU. Vaga definida de garagem. I – As partes firmaram contrato de promessa de compra e venda e estabeleceram a obrigação da ré em entregar o imóvel livre de ônus hipotecá-rio. A ré não cumpriu o avençado e, em decorrência, os autores não pagaram o saldo devedor do contrato entabulado. II – Mantida a sentença que decidiu a lide nos termos do contrato de promessa de compra e venda e em consonância com a prova testemunhal produzida. III – Correta a conde-nação da ré ao pagamento do saldo devedor junto ao credor hipotecário, em razão do disposto no pacto firmado entre as partes. IV – Descabe o pedido formulado pelos autores de outorga de escritu-ra definitiva, já que a obrigação está condicionada ao pagamento da totalidade das prestações, nos termos da cláusula sétima do contrato. V – Correta a incidência de correção monetária sobre o saldo devedor para evitar dano à parte ré, em razão da defasagem da moeda pela inflação. VI – Consta expressamente do contrato entabulado pelas partes que a obrigação do pagamento do IPTU cabe ao comprador (autores). Por outro lado, os autores não se desincumbiram de provar alegado ajuste verbal de forma diversa. VII – A parte autora também não provou o suposto direito à vaga definida de garagem, não se desincumbindo do ônus imposto pelo art. 333, I, do CPC. Apelos desprovidos.” (TJRS – AC 70064172323 – 17ª C.Cív. – Rel. Des. Gelson Rolim Stocker – J. 16.07.2015)

2056 – Registro – retificação – suscitação de dúvida – alteração de áreas verdes – loteamento urbano

“Agravo regimental em apelação cível. Suscitação de dúvida. Retificação de registro. Alteração de áreas verdes em loteamento urbano. Lei municipal. Necessidade de ampla produção de prova. Au-sência de fato novo. 1. Tratando-se de alegação de supressão de área verde em loteamento urbano efetuado por lei municipal, hipótese em que há necessidade de esclarecimentos mediante ampla produção probatória, não comporta solução em sede de suscitação de dúvida, cujo âmbito estreito não admite investigação dessa ordem; 2. Ao interpor Agravo Regimental da decisão monocrática que negou seguimento a recurso, a parte Agravante deve sustentar as razões de sua insurgência em elementos novos que justifiquem o pedido de reconsideração. Agravo Regimental conhecido e desprovido. Decisão mantida.” (TJGO – AC 201392325650 – 3ª C.Cív. – Rel. Des. Itamar de Lima – DJe 23.06.2015 – p. 188)

2057 – Registro de imóveis – alvará judicial – escritura pública

“Apelação cível. Procedimento de jurisdição voluntária. Alvará judicial. Escritura pública. Registro. Honorários advocatícios. Não são devidos. Não havendo vencido, nem vencedor, mas apenas in-teressados, no procedimento de jurisdição voluntária, devem ser decotados os honorários advoca-tícios, porquanto além do Sr. Oficial do Registro de Imóveis não se opor ao registro, sequer houve a apresentação do título para registro e, consequentemente, também não houve recusa do Regis-trador.” (TJMG – AC 1.0016.13.012298-5/001 – 6ª C.Cív. – Relª Yeda Athias – DJe 19.06.2015)

2058 – Registro de imóveis – arrematação de imóvel – expedição da carta

“Direito processual civil. Agravo de instrumento. Arrematação de imóvel, com subsequente expe-dição da carta e registro da mesma no cartório imobiliário, ao pé da matrícula do bem arrematado. Hasta pública formalmente hígida, com o fazimento ulterior dos atos necessários ao ingresso do bem no domínio jurídico e econômico do licitante vencedor. Anulação de ofício da arrematação, à

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conta de descoberta posterior de uma situação de fato envolvente do imóvel. Impossibilidade. Ne-cessidade de ação própria (devido processo legal). Inteligência dos arts. 694 do CPC e 1.245 do CC. Recurso provido para reformar a interlocutória. 1. Carta de arrematação registrada no registro de imóveis (Registro nº 5, de 19.04.2014, ao pé da matrícula nº 332, ficha dois, fl. 86), de modo que a teor do art. 1.245 do Código Civil a propriedade do imóvel (descrito na tal matrícula) já se inseriu no patrimônio jurídico e econômico do arrematante. 2. Art. 694 do CPC: a assinatura do auto de arre-matação pelo juiz, pelo arrematante e pelo serventuário da justiça ou leiloeiro torna perfeita, acaba-da e irretratável a arrematação; sem ação própria não há que se cogitar da anulação do ato, mesmo porque – na espécie – existe situação de fato a ser amplamente revolvida por quem seja interessado, e não a simples nulidade formal que por vezes tem sido invocada em favor na anulação ex officio (REsp 130.911, 2ª T., caso de arrematação por preço vil). 3. Expedida a carta de arrematação e uma vez transcrita no cartório do registro imobiliário, ao pé da matrícula, o desfazimento da alienação judicial somente pode ser acolhido, se o caso, em ação autônoma anulatória, nos termos do art. 486 do CPC. Necessidade do devido processo legal.” (TRF 3ª R. – AI 0005825-12.2014.4.03.0000/SP – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo – DJe 03.07.2015 – p. 758)

2059 – Registro de imóveis – arrolamento de bens – procedimento legal – inobservância

“Mandado de segurança. Arrolamento de bens. Registro de imóveis. Inobservância do procedimen-to legal. É inaplicável ao mandado de segurança o art. 475 do Código de Processo Civil, pois a regra especial contida no art. 12, parágrafo único, da Lei nº 1.533/1954, e reproduzida no art. 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009, prevalece sobre a disciplina genérica do Código de Processo Civil (art. 2º, § 2º, da LICC). Precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça. Ainda que a finalidade em tese fosse legíti-ma, não é dado ao Poder Público ignorar que a lei não permite o arrolamento de bens pertencentes a terceiros e não ao suposto devedor. A descrição do bem é requisito previsto no art. 225, c/c o § 1º da Lei de Registros Públicos. Apelação improvida.” (TRF 3ª R. – AC 0001820-38.2009.4.03.6105/SP – 4ª T. – Relª Desª Fed. Marli Ferreira – DJe 24.06.2015 – p. 1055)

2060 – Registro de imóveis – dúvida – escritura pública de compra e venda de fração ideal

“Apelação cível. Registro de imóveis. Dúvida. Escritura pública de compra e venda de fração ideal. Recusa ao registro do ato. Hipótese em que resulta caracterizada situação de loteamento irregu-lar, assim inviabilizando o pretendido registro da escritura pública. Consequente manutenção da sentença apelada, no sentido do acolhimento da dúvida suscitada pelo registrador. Apelação des-provida.” (TJRS – AC 70063422513 – 19ª C.Cív. – Relª Desª Mylene Maria Michel – J. 09.07.2015)

2061 – seguro habitacional – indenização securitária – mútuo habitacional – juízo de retratação – vícios construtivos – litisconsórcio passivo necessário e competência

“Apelação cível. Indenização securitária. Mútuo habitacional. Juízo de retratação. Vícios cons-trutivos. Litisconsórcio passivo necessário e competência. A admissão da Caixa, como assistente simples, nas ações envolvendo seguros de mútuo habitacional, no âmbito do Sistema Financeiro Habitacional – SFH, consistentes em apólices públicas, do ramo 66, está condicionada aos seguin-tes requisitos: a) que o contrato tenha sido celebrado no período de 02.12.1988 a 29.12.2009; b) o instrumento deve estar vinculado ao fundo de compensação de variações salariais FCVS; e c) a insti-tuição financeira deve provar documentalmente o seu interesse jurídico, mediante demonstração da existência de apólice pública, e do comprometimento do FCVS, com risco efetivo de exaurimento da reserva técnica do fundo de equalização de sinistralidade da apólice Fesa. Assim, não tendo havido qualquer demonstração de comprometimento do FCVS, que se daria apenas na hipótese de risco efetivo de exaurimento da reserva técnica do Fesa (que é superavitário), pressuposto basilar para que se reconheça interesse do ente federal no feito, o reconhecimento da competência Esta-dual para o processamento e julgamento do feito é medida que se impõe. Razões pelas quais já vão afastadas as preliminares de litisconsórcio passivo necessário (União e CEF) e de competência

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da Justiça Federal. Inépcia da inicial. Com efeito, a exordial apresentada preenche os requisitos elencados nos arts. 282 e 283 do Código de Processo Civil, não sendo caso de indeferimento, vez que o pedido formulado é juridicamente possível e decorre da narração lógica dos fatos. Ademais, a documentação acostada restou suficiente à exata compreensão da causa, não tendo havido qual-quer prejuízo à ré que exerceu de forma plena o seu direito de defesa, restando hígido princípio do contraditório. Ilegitimidade Ativa. Não há prova de que todos os autores sejam efetivamente adquirentes mutuários segurados dos imóveis que necessitam de reforma, ônus que lhes cabia, nos termos do art. 333, inc. I, do CPC, por se tratar de fato constitutivo do direito alegado na inicial, não sendo caso de inversão do ônus da prova. Fosse o caso de reconhecer que os autores litigam na condição de cessionários, haveria necessidade de anuência da instituição financeira mutuante, nos termos da Lei nº 10.150/2000, o que não restou comprovado nos autos. Orientação do STJ através do REsp 1.150.429/CE, julgado com base na Lei dos Recursos Repetitivos. Sendo assim, não com-provada a contratação do seguro habitacional, impõe-se reconhecer a ilegitimidade de parte dos autores e julgar extinto o feito, sem resolução de mérito. Carência da ação. Afasta-se, da mesma for-ma, a alegação de carência da ação por força da quitação dos contratos. O contrato de seguro não findou com a quitação e o levantamento da hipoteca. Ora, os riscos cobertos não existem somente enquanto perdura o contrato de financiamento ou a hipoteca, e podem, como no caso concreto, prosseguir no tempo, embora tenha advindo da época do financiamento. Prescrição. A alegação de prescrição não prospera, visto que a hipótese prevista no art. 206, § 1º, inciso II, alínea b, do Código Civil, vigente ao tempo da propositura da demanda, é contada da data que o interessado tiver conhecimento do fato e seus efeitos. Como os danos no imóvel foram contínuos e permanentes e para sua aferição dependiam de perícia, não se pode estabelecer data exata para o termo inicial. Em contratos de tal ordem, que se manifestam progressivamente e, até mesmo, decorrem da própria implantação do empreendimento, quando não demonstrado, de maneira estreme de dúvidas, a data em que os segurados tomaram ciência inequívoca dos sinistros, não há que se falar em prescrição. Precedentes jurisprudenciais. Mérito. Comprovados os danos por meio de perícia judicial e carac-terizada a responsabilidade da ré, resta imperioso o juízo de procedência da demanda. Ademais, consoante já referido a quitação dos financiamentos não cessa a obrigação de adimplemento das coberturas securitárias contratadas. No que pertine à multa decendial, entendo ser devida, porquan-to prevista expressamente na cláusula nº 17 das condições especiais da apólice, não podendo, en-tretanto, ultrapassar o montante da obrigação principal. Ainda, os juros moratórios incidem a partir da citação, consoante expressamente previsto nos arts. 219 e 405, ambos do Código Civil. Em juízo de retratação, negaram provimento ao apelo. Unânime.” (TJRS – AC 70044771715 – 6ª C.Cív. – Rel. Des. Luís Augusto Coelho Braga – J. 25.06.2015)

2062 – sfH – financiamento – revisão de contrato – inadmissibilidade

“Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Financiamento pelo Sistema Fi-nanceiro da Habitação. Revisão de contrato. Inadmissibilidade do recurso especial com fundamen-to no art. 543-C, § 7º, I, do CPC. Cabimento de agravo regimental. Questão de ordem. Deficiência na fundamentação do recurso. Incidência da Súmula nº 284 do STF. Divergência jurisprudencial. Não demonstração, nos moldes legais. Decisão mantida. 1. Ao analisar questão de ordem, a Corte Especial, por maioria, entendeu não ser cabível o agravo de instrumento, mas sim o agravo regimen-tal contra decisão que, fundamentada no art. 543-C, § 7º, I, do CPC, nega seguimento ao recurso especial sempre que o acórdão recorrido estiver no mesmo sentido daquele que foi proferido em recurso representativo de controvérsia, o que ocorre no presente caso. 2. A alegada afronta a lei federal não foi demonstrada com clareza, caracterizando, dessa maneira, a ausência de funda-mentação jurídica e legal, conforme previsto na Súmula nº 284 do STF. 3. A não observância dos requisitos dos arts. 541 do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ, torna inadmissível o conhecimento do recurso com fundamento na alínea c do permissivo constitucional. 4. Agravo regimental não pro-

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vido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 639.213 – (2014/0326391-7) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 01.06.2015 – p. 5211)

2063 – sfH – pedido de revisão de contrato de compra e venda e mútuo com obrigações e hi-poteca – Tabela price – amortização – seguro

“Civil. SFH. Pedido de revisão de contrato de compra e venda e mútuo com obrigações e hipoteca. SFH. Tabela Price. Amortização. Seguro. I – Apelação interposta por contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado à inicial de revisional de contrato de mútuo celebra-do no âmbito do SFH, ao determinar revisão contratual mediante aplicação do PES. II – Conforme reiterados estudos realizados pelas contadorias de foro das Seções Judiciárias vinculadas a este Re-gional, bem como pela contadoria desta Corte, a utilização da Tabela Price, por si só, não implica na capitalização de juros. III – Nos contratos vinculados ao SFH, a atualização do saldo devedor antecede sua amortização pelo pagamento da prestação. Inteligência da Súmula nº 450 do STJ. IV – Os apelantes não lograram êxito em comprovar irregularidades na cobrança do seguro, referen-te ao contrato de mútuo celebrado. V – A devolução em dobro só é devida se comprovada má-fé, conforme preceitua a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. VI – Apelação improvida.” (TRF 5ª R. – AC 2002.81.00.013577-3 – (509030/CE) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Conv. Ivan Lira de Carvalho – DJe 29.06.2015 – p. 58)

2064 – sfH – penhora sobre imóvel – construtora – liberação

“Direito civil. Sistema Financeiro da Habitação. Embargos de terceiros. Caixa Econômica Federal. Penhora sobre imóvel hipotecado pela construtora. Súmula nº 308 do Superior Tribunal de Justiça. Liberação da hipoteca. Cabimento. Honorários advocatícios. Majoração. 1. Trata-se de embargos de terceiros incidentes a uma ação de execução de título extrajudicial, ajuizada pela CEF em face da construtora, com a qual firmou contrato de mútuo com recursos do SFH, com obrigações, hipoteca e fiança, objetivando a construção de um edifício, com finalidade residencial. 2. Inexistência de controvérsia acerca do direito autoral em obter a declaração da ineficácia da hipoteca que recai sobre o imóvel, tendo a sentença se baseado no entendimento do STJ (Súmula nº 308), segundo o qual nos contratos de financiamento para construção de imóveis residenciais vinculados ao SFH, a garantia hipotecária do contrato, concedida pela construtora ao banco, não atinge o terceiro adqui-rente da unidade. 3. Embora determinado o cancelamento da penhora sobre o imóvel, a sentença deixou de declarar a ineficácia da hipoteca sobre o bem, o que foi expressamente requerido na exordial. 4. Os embargos de terceiros constituem-se via adequada para tal desiderato, sobretudo porque a prestação jurisdicional não atingiria seu escopo básico no âmbito do processo, caso ficas-se pendente de solução a questão relativa à hipoteca. 5. Se de um lado se mantém a desconstituição da penhora sobre o imóvel, mas, de outro, permanece a hipoteca sobre ele incidente, ter-se-ia um aparente contrassenso, pois não se estaria dando efetiva solução ao problema veiculado pela parte autora. 6. Na ação ajuizada pelos apelantes, posteriormente ao ajuizamento destes embargos, plei-teando a ineficácia da hipoteca sobre o imóvel em comento, foi proferida sentença julgando extinto o processo por litispendência com os presentes embargos de terceiros, que restou mantida neste Tribunal, cuja decisão ressaltou que a expedição de ofício de liberação de hipoteca é consequên-cia lógica do êxito no pedido de declaração de ineficácia de hipoteca entre a CEF e a construtora, vez que não haverá mais óbice para a expedição do referido documento. 7. No caso dos autos, levando-se em conta o tempo de tramitação do presente feito por quase cinco anos, bem como o trabalho desenvolvido pelos patronos dos apelantes, que, por diversas vezes, manifestaram-se nos autos (fls. 23/24, 25/26, 39/42, 44/45, 60, 80/85), e, ainda, o valor dado à causa, na ordem de R$ 80.000,00, é razoável, proporcional e atende aos requisitos estabelecidos pelo art. 20, §§ 3º e 4º, a majoração da verba honorária ao patamar de R$ 8.000,00 (oito mil reais), que equivale a 10% do valor da causa, quantia a ser paga de forma rateada pelas embargadas. 8. Sentença reformada, para determinar a expedição de ofício ao Cartório do Décimo Ofício do Registro de Imóveis, para que

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este proceda à averbação do cancelamento da hipoteca e da penhora junto à matrícula do imóvel referido na exordial, bem como para majorar os honorários advocatícios ao valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), quantia a ser paga de forma rateada pelas embargadas. 9. Apelação provida.” (TRF 2ª R. – AC 2010.51.01.013250-0 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes – DJe 02.07.2015 – p. 274)

2065 – sfH – revisão contratual – plano de Equivalência salarial (pEs) – saldo devedor – forma de amortização

“Civil. Processo civil. Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Revisão contratual. Plano de Equi-valência Salarial (PES). Saldo devedor. Forma de amortização, com a utilização da Tabela Price. Juros remuneratórios. Taxa referencial. Coeficiente de Equiparação Salarial (CES). Fundhab. Índice de Preços ao Consumidor (IPC) relativo a março de 1990. Plano real. Contribuição para o Fundo de Assistência Habitacional (Fundhab). 1. Segundo já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ‘o Código de Defesa do Consumidor não se aplica aos contratos do SFH em que haja a cobertura do FCVS, tampouco àqueles celebrados antes da entrada em vigor da Lei nº 8.078/1990’ (EDcl--AgRg-REsp 1.075.721/PR, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., DJe de 06.12.2013), caso dos autos em que o contrato, embora não preveja a contribuição para o FCVS, foi firmado em 1988, data anterior ao advento do Código de Defesa do Consumidor (CDC). 2. Encontrando-se o contrato de mútuo habitacional vinculado ao Plano de Equivalência Salarial (PES), o reajuste das respectivas prestações deverá observar o índice de variação salarial da categoria profissional a que pertence o mutuário. 3. ‘Tendo o contrato sido celebrado antes da Lei nº 8.004/1990, é possível o reajuste das prestações pela variação do salário mínimo quando houver previsão contratual, na hipótese de mu-tuário classificado como trabalhador autônomo e que não integra categoria profissional específica’ (AC 1999.35.00.021285-4/GO, Rel. Juiz Fed. Rodrigo Navarro de Oliveira, e-DJF1 de 21.09.2009, p. 332), caso dos autos. 4. O mecanismo de amortização da Tabela Price não implica, necessaria-mente, capitalização de juros. O Superior Tribunal de Justiça, em procedimento de recursos repeti-tivos (art. 543-C do Código de Processo Civil) decidiu que a verificação da legalidade da utilização da Tabela Price, nos contratos vinculados ao SFH, não deve ser feita em abstrato, analisando a questão como se fosse apenas de direito, sendo, portanto, necessariamente, precedida de realiza-ção de prova pericial, para, assim, aferir se houve capitalização de juros e/ou amortização nega-tiva, e que o julgamento da lide sem essa prova caracteriza cerceamento de defesa e violação aos arts. 130, 131, 330, 333, 420 e 458, do Código de Processo Civil. Precedente: REsp 1.124.552/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe de 02.02.2015. 5. Hipótese em que o processo está instruído com a apresentação das planilhas de evolução do financiamento e do laudo pericial. 6. ‘Nos contratos vinculados ao SFH, a atualização do saldo devedor antecede sua amortização pelo pagamento da prestação’ (Súmula nº 450 do STJ), ressalvada a hipótese de amortização negati-va. 7. As diferenças decorrentes do fenômeno da amortização negativa deverão ser computadas em separado, incidindo sobre elas apenas a correção monetária (precedentes). 8. É legítima a incidên-cia da Taxa Referencial, como índice de reajuste das prestações mensais e do saldo devedor, quan-do previsto no contrato, como critério de reajuste desses encargos, a aplicação dos mesmos índices de atualização dos depósitos em caderneta de poupança. 9. ‘O art. 6º, e, da Lei nº 4.380/1964 não estabelece limitação aos juros remuneratórios nos contratos vinculados ao SFH’ (Súmula nº 422 do STJ). Legítima, pois, a taxa estipulada no contrato, a qual, no caso, é inferior a 12%. 10. O CES, criado, inicialmente, pela Resolução nº 36/1969 do Banco Nacional da Habitação, foi reconhecido, expressamente, pela Lei nº 8.692/1993, sendo legítima sua cobrança nos contratos celebrados no âmbito do SFH, desde que expressamente previsto, o que não é o caso dos autos. 11. A jurispru-dência do Superior Tribunal de Justiça já está pacificada no sentido de que o saldo devedor do mútuo habitacional deve ser atualizado, em abril de 1990, pelo IPC de março de 1990 (84,32%) e não pelo BTNF. 12. A URV, instituída pela Lei nº 8.880/1994, ‘como padrão de valor monetário’, não representava reajuste salarial, mas a manutenção do valor da moeda, e era aplicável a todas

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as operações e transações financeiras, no período em que teve vigência, sendo legítima a sua apli-cação aos contratos celebrados no âmbito do SFH, sem representar reajuste indevido do valor das prestações. 13. Não comprovado que foi imputado aos autores o pagamento de parcela a título do Fundhab, embora constando esse encargo da planilha de evolução do financiamento juntada pelos recorrentes, improcedente a pretensão de devolução dessa parcela. 14. Sentença mantida apenas quanto à exclusão do CES e da capitalização de juros, verificada em razão da amortização negativa. 15. Agravo retido da CEF provido. 16. Apelação da CEF provida, em parte. 17. Apelação da parte autora não provida.” (TRF 1ª R. – AC 2004.36.00.002958-4/MT – Rel. Des. Fed. Daniel Paes Ribeiro – DJe 15.07.2015 – p. 1127)

2066 – usucapião – animus domini – discussão

“Usucapião. Discussão acerca do animus domini. Agravo regimental. Embargos de divergência. Não cabimento. Dessemelhança fático-jurídica dos julgados. Dissenso não comprovado. Indefe-rimento liminar mantido. Na sede dos embargos de divergência, a similitude fático-jurídica das teses cotejadas tem de ser de total equivalência, sob pena de não servir ao intuito do cabimento do recurso. Havendo a necessidade, portanto, de aproximar as teses por uma terceira análise, por certo que não viável a sede da divergência. Decisão unipessoal mantida por seus próprios fundamentos. Agravo desprovido.” (STJ – AgRg-ED-REsp 1.210.396 – (2012/0260128-6) – C.Esp. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 01.07.2015 – p. 1578)

Comentário Editorial SÍnTESECuida-se de embargos de divergência interpostos por espólio de José Cândido de Souza, em cuja análise inicial, por meio de decisão monocrática, esta Relatora indeferiu liminarmente o recurso, consoante se observa do seguinte sumário:“Embargos de divergência. Usucapião. Requisitos. Animus domini. Reconhecimento no acór-dão embargado. Situação particular. Apresentação de suposta divergência em que não de-monstrada a similitude fático-jurídica. Indeferimento liminar.”Contra essa decisão, vem agora o Embargante interpor agravo interno, objetivando reformar a mencionada decisão.Em síntese, diz o Agravante que o ponto nodal da controvérsia cinge-se à interpretação do art. 1.238 do Código Civil atual, art. 550 do CC/1916, acerca da exigência do animus domini no reconhecimento de usucapião, sendo, segundo defende, elemento indispensável à aquisi-ção da propriedade por esse instituto.Sustentou, também, que eventuais “minúcias fáticas peculiares do caso concreto” não reti-ram a obrigação de o pretendente a usucapião comprovar o “exercício da posse cum animo domini”, que deve ser observado em qualquer caso e em qualquer circunstância para o fim de permitir o reconhecimento da propriedade.No demais, em robusta petição, o Agravante reconduz toda a discussão da causa e extrai os trechos importantes, tanto do acórdão da Quarta Turma quanto do decisum que apreciou os embargos de divergência, destacando que a impossibilidade de se provar o animus domini não pode ser motivo para desconsiderar o requisito constante do art. 1.238 do CC.Realizando uma espécie de confronto de expressões utilizadas pela decisão, com o sentido de desconsiderar as afirmações por ela vertidas, chega o Agravante a sustentar que elas não correspondem ao quanto foi anotado no acórdão embargado, o qual teria concluído, no caso concreto, pela prescindibilidade da comprovação do animus domini. Assevera, por outro lado, que a decisão não demonstrou as particularidades do caso concreto de sorte a impedir a via da divergência.Registre-se, por fim, a presença em meu gabinete dos Ilustres advogados do Agravante, mo-mento em que anunciaram o desejo de juntar parecer e pediram o adiamento do feito por uma sessão, já que programado o julgamento para a última sessão Corte Especial.Sobre o parecer acostado às fls. 998/1009, verifica-se a ratificação dos termos da peça de re-curso interno, bem assim, dos embargos de divergência, no sentido de defender a divergência com o acórdão paradigma, na medida em que este considerou indispensável ao usucapião o requisito do animus domini.O STJ negou provimento ao recurso.

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Citamos a seguir trecho da doutrina de Carlos José Cordeiro:“Professor Orlando Gomes diz que a tese da autonomia da usucapião é consagrada nas mo-dernas legislações, e traça com clareza a distinção entre os dois institutos. Assim, do ponto de vista da finalidade, a prescrição é um modo de extinguir pretensões, enquanto a usucapião é modo de adquirir direitos reais. A base dos institutos também é diversa; na prescrição, é a inércia do sujeito de direito; na usucapião, é a posse continuada. Diverso é o aspecto da apli-cabilidade; a usucapião restringe-se aos direitos reais. A prescrição, por fim, tem um sentido negativo, de extinção, enquanto que a usucapião é positivo, como força geradora. E conclui: ‘Não há que falar, por conseguinte, em prescrição aquisitiva’.No mesmo sentido, aponta Eduardo Espínola, reconhecendo que há regras comuns às duas espécies de prescrição, aquisitiva (suposto usucapião) e extintiva, porém há entre elas diferen-ças substanciais: a prescrição aquisitiva tem essencialmente por base a posse, e assim exige a boa-fé; a prescrição extintiva, em regra, dispensa a posse, não exige por parte do devedor o requisito da boa-fé; a prescrição aquisitiva pode ser fonte de uma ação ou de uma exceção em proveito do adquirente; a extintiva, sendo praticamente um meio de refletir a ação, se apresen-ta sempre como exceção; o campo da prescrição aquisitiva não é tão vasto como o da extintiva: a primeira limita-se à aquisição da propriedade e dos direitos reais; a extintiva abrange todo o domínio do direito civil, aplicando-se a todas as classes de relações jurídicas.Dessa forma, entende-se não se poder, sob a análise científica, considerar a usucapião como uma espécie de prescrição aquisitiva, uma vez que diversos são os seus regimes, somente tendo incidência comum o decurso do tempo, como forma de contato entre os dois institutos. Essa afirmativa acompanha o posicionamento do Professor Nélson Luiz Pinto, que, citando Lafayette, assevera ‘ter a prescrição conotação negativa, isto é, nascer da inércia, tendo por efeito dissolver a obrigação e paralisar o direito correlato, e, conseqüentemente, não gerar direitos. A usucapião, ao contrário, é positiva, porque no seu modo de atuar predomina a força geradora; o proprietário perde o domínio não só por sua inércia, mas também porque o adquire o possuidor. Assim, o não uso do direito de propriedade não importa sua extinção, por ser imprescritível, enquanto existir o seu objeto (propriedade). De sorte que a única possibilidade que se apresenta é a da aquisição por outrem, denominada usucapião, quando, então, o objeto passará a outro titular’.Pode-se, assim, esclarecido que a usucapião é uma forma de aquisição da propriedade, dentre os vários conceitos oferecidos pela doutrina, apresentar, segundo Nélson Luiz Pinto, ‘o que mais se aproxima do nosso ordenamento jurídico’, de lavra de Modestino: ‘o usucapio este adjectio dominii per continuationem possessionis temporis lege definit, ou, o modo de ad-quirir a propriedade pela posse continuada durante certo lapso de tempo, com os requisitos estabelecidos na lei’.Observa-se, dessa última conceituação, bem como das outras arroladas, que dois são os elementos básicos, essenciais, para a aquisição por usucapião: posse e tempo. Exigindo-se, ainda, o animus domini. Ressalte-se que outros elementos podem se fazer presentes nas várias espécies de usucapião (ordinário, extraordinário e especial), tais como o justo título e a boa-fé, os quais serão analisados no momento oportuno.[...]Feitas as considerações iniciais sobre a usucapião e ressaltada a importância do instituto, cabe revelar que o direito brasileiro admite cinco espécies de usucapião, quais sejam: usucapião extraordinário, previsto pelo art. 550 do CC; usucapião ordinário, definido no art. 551 do CC; usucapião mobiliário, descrito nos arts. 618 e 619 do CC, respectivamente nas moda-lidades ordinário e extraordinário; usucapião especial rural ou pro labore, regulado pela Lei nº 6.969/1981, com as alterações dadas pela CF, no art. 191; e usucapião especial urbano, introduzido pelo art. 183 da Lei Maior.Discriminadas as várias espécies de usucapião, deve-se dizer que não será objeto de estudo a distinção entre os seus diversos tipos, sendo, na verdade, continente de outro tema monográ-fico. Disso, nota-se que fundamentalmente não divergem entre si as cinco formas de usucapir, exigindo-se sempre, dentre outros requisitos, para a sua concessão, coisa hábil, posse, lapso de tempo, animus domini e, em alguns casos, boa-fé e justo título.Por aí, percebe-se que para ocorrer a usucapião em geral, faz-se necessário o concurso de cer-tos requisitos, que dizem respeito às pessoas a quem interessa (pessoais); às coisas e direitos que podem ser adquiridos desta maneira (reais); à forma por que se constitui (formais); e à qualificação da posse (especiais).

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A explicação atinente a cada qual será feita nos tópicos seguintes, quando forem dissecados os requisitos da usucapião em geral. Advirta-se, porém, como anota Antônio Macedo de Campos, ‘que capacidade (pessoal) e coisa hábil (real) não estão expressas nos dispositivos referentes ao usucapião. Resultam dos princípios gerais de direito’.Os requisitos pessoais são aqueles que têm em vista o possuidor e o proprietário, de forma a abranger a capacidade de cada um, para a ocorrência da usucapião, concebendo-se, assim, a aquisição do domínio por um e perda da propriedade da coisa pelo outro.Deveras, é regra manifesta que somente podem usucapir as pessoas capazes para possuir. Nesse engate, entende Lenine Nequete que são capazes de possuir tanto as pessoas físicas quanto morais, a comunidade hereditária, a pessoa jurídica de direito público e, inclusive, os incapazes, por intermédio de seus representantes. Inclui, ainda, os sucessores legítimos ou testamentários do possuidor, bem como os credores e demais interessados.Esta assertiva fundamenta-se, especialmente, no art. 162 do CC, uma vez que se permite a alegação da prescrição pela parte a quem aproveita. Ter-se-ia, então, terceiros interessados que seriam ‘todos aqueles que em favor dos quais constitui o possuidor um direito qualquer, que pereceria não se consolidando a propriedade nas mãos deste, v.g., o usufrutuário, o usuário, o fideicomissário em relação ao gravado, o enfiteuta em relação ao senhorio direto etc.’.Com relação ao sujeito passivo, para sofrer os efeitos da perda da coisa, basta que ele seja o proprietário. Aí, incluem-se os relativamente incapazes, e excluem as pessoas jurídicas de direito público. Quanto aos primeiros, o art. 169, I, do CC não os abarca quando torna patente que não ocorre prescrição contra os incapazes de que trata o art. 5º, ou seja, os sujeitos ab-solutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quanto aos segundos, a CF determina que os bens públicos não serão adquiridos por usucapião.Em suma, o usucapiente deve ser capaz, mas, em determinados casos, essa faculdade sofre restrições decorrentes de diversos acontecimentos, inclusive familiar, obrigacional, etc.Antônio Ferreira Inocêncio relaciona pessoas e situações jurídicas que não se afinam com a usucapião. Assim, tem-se:‘a) Entre cônjuges, na constância do casamento (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, I), qualquer que seja o regime de bens;b) Entre ascendentes e descendentes, durante o pátrio poder (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, II);c) Entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, III);d) Em favor de credor pignoratício, do mandatário, e, em geral, das pessoas que lhe são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e as pessoas representadas ou seus herdeiros, relativamente aos bens confiados à sua guarda (CC, arts. 553, parágrafo único, e 168, IV).’Além dessas exceções, o mencionado autor enumera outros casos, aos quais é inaplicável a usucapião.Interessante noticiar que, face à força declaratória de certeza jurídica, é possível ao proprietário intentar a usucapião sobre o seu imóvel, pois não há a menor ilegalidade em que o possuidor, por não ter confiança em seu título dominial, recorra à ação de usucapião. A propósito, comenta Celso Agrícola Barbi que ‘não se justificam restrições ao uso da ação declaratória quanto à propriedade de imóveis. Pelo contrário, será de muita utilidade, quando alguém criar incerteza em torno do domínio de um bem dessa natureza, prejudicando seu uso, ou disponibilidade, pelo proprietário também possuidor. Poderá ele mover ação contra o pretenso dono, para ver declarado que é seu o domínio’.Os requisitos reais relacionam-se com as coisas e direitos que podem ser objeto de aquisição por usucapião (res habilis). Desse modo, para ser objeto de usucapião, é mister que a coisa esteja no comércio, não sendo usucapíveis, pois, as que estejam fora do comércio, assim consideradas as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis, na definição do art. 69 do CC.Anote-se, conforme José Carlos de Moraes Salles, ‘haver coisas naturalmente insuscetíveis de apropriação e, consequentemente, de usucapião, como, por exemplo, o ar, a luz natural e as águas livres. De outra parte, há coisas juridicamente inapropriáveis ou inusucapíveis, porque assim declaradas pelo Direito. Como exemplo, [...] os bens públicos de uso comum do povo, os de uso especial e os dominiais ou patrimoniais (art. 66 do CC)’.

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Confirma-se que as coisas legalmente inalienáveis também não são usucapíveis, posto que elas têm o seu destino fixado por lei, como o bem de família (art. 72 do CC); os imóveis dotais (arts. 293 e 298 do CC); os bens de menores sob pátrio poder ou tutela (arts. 386, 427, VI, e 429 do CC); e os bens dos sujeitos à curatela (arts. 446, 453 e 463 do CC). Deve-se mencionar que a doutrina, hodiernamente, entende que quando a inalienabilidade resulta de ato voluntário de testador ou doador, o bem assim clausulado pode ser objeto de usucapião. Quanto aos direitos suscetíveis de usucapião, a doutrina reconhece que somente os direitos reais prescritíveis podem ser adquiridos, assim os que implicam posse dos objetos sobre que recaem, vale dizer, a propriedade, as servidões, a enfiteuse, o usufruto, o uso e a habitação. A propósito, ensina Wolff que ‘sólo puede adquirir-se por usucapión los derechos reales que faculten para la posesión de una cosa o de un derecho: como la propiedad, la superfície, las servidumbres’.Em regra, só podem ser usucapidos os bens do domínio particular, ao passo que os bens públicos não se subordinam a tal incidência, conforme impõe a Súmula nº 340 do STF, pois que ‘desde a vigência do Código Civil, os bens dominiais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião’. Essa orientação do Pretório Excelso foi acompanhada pelo atual texto constitucional, como se nota nos seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único.A coisa hábil para usucapião é coisa corpórea e tangível, sendo indispensável para os imóveis que estes estejam perfeitamente individuados, com suas precisas características, extensão e confrontações, mesmo porque a posse ad usucapionem não seria compatível com a indetermi-nação dos limites ou de outros aspectos da coisa possuída.Ressalta-se, entretanto, que é crescente o número de julgados que admite posse e usucapião sobre bens intangíveis (incorpóreos) como, v.g., o direito ao uso de linha telefônica. Vale dizer, também, que embora na usucapião de imóvel exija-se certeza e determinação, tem-se admi-tido usucapião de compossuidores, sobre partes ideais, de imóvel divisível ou não, quando a posse do todo é exercida conjuntamente.” (CORDEIRO, Carlos José. Usucapião. Juris Síntese, Porto Alegre: IOB/Thomson, nov./dez. 2005. 56 CD-Rom)

2067 – usucapião especial urbana – requisitos – preenchimento – não verificação – gravação de hipoteca sobre o bem

“Apelação cível. Ação de usucapião especial urbana. Art. 1.240 do Código Civil. Requisitos. Preen-chimento. Não verificação. Gravação de hipoteca sobre o bem usucapiendo. Ausência de animus domini. Nos termos do art. 1.240, do Código Civil, que reproduz o disposto no art. 183 da Consti-tuição da República, aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Não prospera a pretensão de usucapião especial urbana quando recai sobre o bem gravação de hipoteca imobiliária em favor da Caixa Econômica Federal, notadamente porque descaracteri-zado o animus domini, requisito formal subjetivo sem o qual não se reconhece o domínio.” (TJMG – AC 1.0701.10.015533-5/002 – 12ª C.Cív. – Rel. Juiz Conv. Anacleto Rodrigues – DJe 02.07.2015)

2068 – usucapião extraordinária – ausência de prequestionamento

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de usucapião extraordinária. 1. Análise de violação de dispositivos da CF/1988. Impossibilidade. 2. Ofensa aos arts. 243 e 245 do CPC. Au-sência de prequestionamento. Súmula nº 211 do STJ. 3. Dissídio jurisprudencial não comprovado. Ausência de cotejo analítico. 4. Agravo regimental desprovido. 1. Inviável a análise da ofensa ao art. 93, IX, da CF/1988, porquanto a competência desta Corte restringe-se à interpretação e unifor-mização do direito infraconstitucional federal, ficando obstado o exame de eventual violação a dis-positivos e princípios constitucionais sob pena de usurpação da competência atribuída ao Supremo Tribunal Federal. 2. A despeito da interposição de embargos de declaração, a matéria veiculada no recurso especial não foi objeto de deliberação no Tribunal de origem sob o enfoque dos arts. 243 e 245 do CPC, indicados como violados, incidindo, na espécie, o óbice da Súmula nº 211 desta Cor-te. 3. A simples transcrição de ementas, trechos ou inteiro teor dos precedentes colacionados, sem o necessário cotejo analítico não viabiliza o conhecimento do recurso especial pelo dissídio, ante

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a inobservância dos requisitos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ. Ademais, ausente a similitude fática entre os casos confrontados. 4. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 661.705 – (2015/0029343-5) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 01.06.2015 – p. 5232)

2069 – usucapião – impossibilidade jurídica do pedido, inépcia da petição inicial e ilegitimida-de ativa ad causam – afastamento

“Agravo regimental em apelação cível. Ação de usucapião. Preliminares de impossibilidade jurí-dica do pedido, inépcia da petição inicial e ilegitimidade ativa ad causam afastadas. Requisitos do art. 1.238, parágrafo único, do Código Civil, para a prescrição aquisitiva da propriedade. Animus domini e lapso temporal decenal demonstrados. Fatos impeditivos, modificativos ou extintivos não comprovados pelo réu. Decisão mantida. Recurso manifestadamente infundado. 1. É admissível o julgamento monocrático do recurso, nos termos do art. 557 e seus parágrafos, do Código de Pro-cesso Civil, quando houver jurisprudência dominante a respeito da matéria objeto de discussão, em prestígio ao direito fundamental à duração razoável do processo. 2. A usucapião é modo originário de aquisição de propriedade e de outros direitos reais, pela posse mansa e pacífica prolongada da coisa, classificada em virtude dos requisitos existentes para a sua caracterização. 3. A alegação de impossibilidade jurídica do pedido não merece acolhida quando a pretensão deduzida encontra amparo, pelo menos em abstrato, no ordenamento jurídico. 4. A exordial da demanda deve, além de atender ao art. 282 do Código de Processo Civil, apontar os fundamentos do pedido do interes-sado, indicando o preenchimento das exigências para tanto e descrevendo, pormenorizadamente, o bem a ser usucapido. 5. A legitimidade para propositura dessa espécie de feito é ampla, bastando ser possuidor, consoante se extrai do caput do art. 1.238 c/c art. 1.196, ambos do Código Civil. 6. Para a configuração da usucapião extraordinária exige-se a posse mansa, contínua e pacífica, com animus domini, pelo prazo legal de 10 (dez) anos, se o possuidor houver estabelecido no imóvel a moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. Comprovado o preenchimento desses pressupostos formais, sem que o réu tenha apresentado fatos modificativos, extintivos ou impeditivos, a procedência do pleito inaugural revela-se medida impositiva, nos mol-des do art. 333 da Lei Adjetiva Civil. 7. O agravo regimental deve ser desprovido quando a matéria nele versada tiver sido suficientemente analisada na decisão recorrida e o agravante não apresentar elementos capazes de demonstrar a ocorrência de prejuízo a ponto de motivar sua reconsideração ou justificar sua reforma. Inteligência do art. 364 do Regimento Interno deste egrégio Tribunal de Justiça. 8. Agravo regimental conhecido e desprovido.” (TJGO – AC 201390384322 – 4ª C.Cív. – Relª Desª Elizabeth Maria da Silva – DJe 24.06.2015 – p. 156)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de agravo regimental em apelação cível contra a decisão monocrática de que, nos termos do art. 557, caput, do Código de Processo Civil, conheceu do apelo manejado e desproveu-lhe.Decisão Monocrática nos moldes do caput do art. 557 do Estatuto Processual Civil, conheceu do apelo aviado e negou-lhe provimento, em decorrência da matéria tratada encontrar-se pa-cificada na jurisprudência da colenda Corte da Cidadania e deste egrégio Tribunal de Justiça.Irresignado, o réu/agravante elabora um roteiro fático do feito e reitera as teses de impossibili-dade jurídica do pedido, inépcia da proemial e ilegitimidade ativa ad causam.Destaca que a suplicante não conseguiu demonstrar o exercício efetivo da posse mansa e pacífica em relação ao bem em voga pelo lapso temporal estipulado em lei, desatendo ao disposto no inciso I do art. 333 da Lei Adjetiva Civil, restando impositiva a improcedência da pretensão inaugural.A Relatora do TJGO pronunciou-se no sentido de que o agravo regimental seja conhecido e desprovido.O Professor Carlos José Cordeiro assim nos ensina:

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������233

“A aquisição da propriedade imobiliária ou mesmo mobiliária se dá quando consumado o usucapião. Logo, a usucapião é um modo de aquisição, muito embora para que se chegue a consumar exija uma paulatina e progressiva verificação de diversos pressupostos.A doutrina, no entanto, de longa data, tem se dividido quanto à natureza da aquisição por usucapião, se originária ou derivada. Tal diferenciação possui reflexos práticos e de manifesta importância, pois, como afirma Oscarlino Moeller, ‘a integridade das múltiplas transações, cir-cunscrita aos títulos que as cercam, impõe-se nas aquisições derivadas, visto que o encadea-mento lógico dos títulos é indispensável, pelo menos até o tempo suficiente para eventual for-mação do prazo do usucapião extraordinário, vinte anos. Nas aquisições originárias a tal não se caminhará, visto que basta o exame do fato constitutivo atual dentro de seus requisitos legais’.Há quem entenda a usucapião ao lado da propriedade, da desapropriação, da alienação, da re-núncia, do abandono e do perecimento do objeto, sendo aquele, na verdade, forma derivada de aquisição, pois pressupõe a vinculação do novo titular do direito real com o antigo titular usu-capido, sendo que, para este, com a aquisição do direito real por aquele, ocorre sua correlata perda. Nesse sentido, Caio Mário da Silva Pereira conclui que ‘a usucapião é uma modalidade aquisitiva que pressupõe a perda do domínio por outrem, em benefício do usucapiente’. De conseguinte, como modo derivado de aquisição do direito de propriedade se funda em direito do titular anterior, que, como pressuposto do direito transmitido, determina-lhe a existência, a extensão e as qualidades.Entretanto, a maioria dos doutrinadores, com os quais comunga o autor, vê a usucapião como forma originária de aquisição, pois este se consuma com a posse continuada e esse fato, aliado aos demais pressupostos legais, acaba por constituir um direito real novo. Desse modo, como ressalta Pontes de Miranda, na usucapião não se adquire de alguém: ‘No usucapião, o fato principal é a posse, suficiente para originariamente se adquirir; não para se adquirir de alguém. É bem possível que o novo direito se tenha começado a formar antes que o velho se extinguisse. Chega momento em que esse não mais pode subsistir, suplantado por aquele. Dá--se, então, impossibilidade de coexistência, e não sucessão, ou nascer um do outro. Nenhum ponto entre os dois marca a continuidade. Nenhuma relação, tampouco, entre o perdente do direito de propriedade e o usucapiente’.Corroborando este raciocínio, Nélson Luiz Pinto afirma ‘ser o usucapião uma forma de aqui-sição originária, porque não deriva de ato entre usucapiente e proprietário, tal qual se dá na desapropriação e na ocupação, por exemplo. A nosso ver, a aquisição da propriedade pela usucapião faz com que se extingam todos os direitos reais constituídos sobre a coisa pelo antigo proprietário, durante a posse ad usucapionem’.O usucapiente adquire a propriedade da coisa com o mesmo caráter de quando começou a possuí-la. Assim, como informa Luiz Edson Fachin, ‘a transferência do domínio de um imóvel hipotecado, por venda, não levanta por si só a hipoteca que perdura sobre o imóvel adquirido. Isso se dá na aquisição derivada. A usucapião extraordinária de imóvel eventualmente hipote-cado não respeita tal gravame, e o usucapiente o adquire livre desse ônus’.Em verdade, na usucapião há coincidência entre a aquisição pelo sujeito e o nascimento do direito, eis que a relação jurídica surge pela primeira vez, não havendo, entrementes, sub-ro-gação de titular a titular. Daí, sendo a usucapião forma originária de aquisição da propriedade, não há transmissão inter vivos, não se podendo falar em imposto sobre o mesmo, uma vez que, inexistindo a ocorrência de fato gerador, nada justificaria a cobrança do tributo.Assim, conclui-se que a usucapião é modo originário de aquisição, pois se dá quando inexiste relação entre um precedente e um subseqüente sujeito de direito. A própria jurisprudência mais recente tem se firmado neste sentido, inclusive o STF, podendo-se arrolar os seguintes acórdãos: RT 435/206, 439/214, 623/58; RJTJESP 94/203, 107/239, 107/321, 112/238; e RTJ 117/652, todos consolidando o entendimento de que a aquisição por usucapião é origi-nária.” (Usucapião. Disponível em: http://online.sintese.com.)

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Clipping Jurídicoprojeto muda cálculo de indenização de terra desapropriadaTramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 8.212/2014, de autoria do Ex--Deputado André de Paula, que propõe indenizar as pessoas cuja terra desapropriada, por interesse social, possua áreas de florestas naturais, matas nativas e vegetação natural, sem que haja limites de avaliação pelo preço de mercado. Pela Lei nº 8.629/1993, essas áreas já integram o preço da terra, desde que o valor apurado não supere, em qualquer hipótese, o preço de mercado do imóvel. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) começa a desapropriação de áreas após sua classificação como impro-dutivas. Após a publicação de decreto presidencial, o Incra dá início a uma ação, cujos laudos de vistoria podem ser contestados administrativa e judicialmente pelo expropria-do. Concluída essa fase, o órgão deve pagar uma indenização ao proprietário pela terra nua, em títulos da dívida agrária. As benfeitorias, como cercas e pastos, são ressarcidas em dinheiro. “Sob o argumento de que as áreas de preservação ambiental não podem ser utilizadas para fins econômicos, o Incra sustenta que não cabe indenização pelas Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de reserva legal”, explicou André de Paula. No entanto, segundo o ex-parlamentar, há como desconsiderar a cobertura vegetal se a existência de mata valoriza a propriedade e o seu preço de mercado é diretamente in-fluenciado por essa realidade. Segundo o projeto, os serviços ambientais prestados pela cobertura vegetal nas áreas de servidão florestal, de preservação permanente e de reserva legal também passam a ser considerados na hora de pagar a indenização. A legislação brasileira impede o uso das áreas de preservação permanente e impõe restrições à ex-ploração da área de reserva legal. “Em alguns casos, pode chegar a 80% da propriedade, mas, quando o Estado efetua o cálculo da indenização, simplesmente desconsidera esses aspectos importantíssimos”, reclamou. Atualmente, já são levados em consideração no cálculo da indenização: a localização e a dimensão do imóvel, a aptidão agrícola, a área ocupada, o tempo de uso e o estado de conservação das benfeitorias. (Conteúdo extraído do site da Câmara dos Deputados)

imóvel único de família não pode ser objeto de penhora judicialO TRF4 negou, na última semana, recurso da Caixa Econômica Federal (CEF) que pedia a penhora judicial do apartamento de um casal de Laguna/SC. Segundo a 4ª Turma, o imóvel não pode ser apreendido por se tratar da única residência dos réus. O casal era sócio proprietário e fiador da construtora Frontal Engenharia e Comércio, no início da década de 1990, quando esta contraiu um empréstimo com a Caixa. Em 1996, a empresa se tornou inadimplente, levando o banco a cobrar a dívida por via judicial. Os empre-sários entraram com processo de embargos à execução alegando indisponibilidade do apartamento por se configurar bem de família utilizado como residência. A CEF afirmou que os réus utilizam o imóvel apenas para veranear, uma vez que alugam outro em Florianópolis. Segundo o Relator do processo, Desembargador Federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, “há uma série de comprovantes de despesas que demonstram a ocu-pação do imóvel [de Laguna], como conta de luz, de telefone e Internet”. Para o ma-gistrado, “se um tem importância secundária certamente é o de Florianópolis, por ser alugado”. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

aluguel deve ser abatido em rescisão contratual de imóvelEm virtude de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel, o consumidor inadim-plente tem direito à restituição pelas parcelas pagas, uma vez que devolverá o bem. Con-

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – CLIPPING JURÍDICO �������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������235

tudo, pelo tempo em que o cliente usufruiu do local, a incorporadora imobiliária pode abater valor de um suposto aluguel. Esse é o entendimento da 5ª Câmara Cível do Tribu-nal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), em ação movida pela MAC Empreendimentos. A relatoria do voto – acatado à unanimidade – foi do Desembargador Alan Sebastião de Sena Conceição. “É incontroverso que a inadimplência da ré fora a causa determinante da rescisão do contrato, e, com efeito, se o promissário comprador ingressa na posse do imóvel e dá causa à desconstituição do pacto, deve indenizar a promissária vendedora pelos prejuízos advindos do desfazimento do negócio”, destacou o magistrado relator. O processo em questão foi ajuizado pela MAC Empreendimentos em desfavor de uma compradora, a fim de conseguir a reintegração de posse de um imóvel em Goiandira. A mulher havia adquirido, em 2009, uma casa no Residencial Triunfo, em 120 parce-las. Contudo, cerca de quatro anos depois da compra, ela alegou ter sido demitida do emprego e não conseguiu arcar com o restante do financiamento. Em primeiro grau, a Juíza da Comarca, Ângela Cristina Leão, deferiu o pleito da empresa, para cancelar o compromisso de venda, ainda, atribuindo ao aluguel o valor de 0,5% do total do imóvel, até a data da desocupação. A cliente recorreu, mas o Colegiado manteve sem reformas o veredicto singular. “Uma vez rescindido o contrato, a adquirente possui direito irre-futável à restituição das parcelas pagas, garantida ao promissário vendedor a retenção de parte deste valor para pagamento daquilo que fora fixado a título de aluguel e gastos outros decorrentes de sua alienação, sob pena de configurar o chamado enriquecimento sem causa”, concluiu Alan Sebastião. (Conteúdo do site do Tribunal de Justiça de Goiás)

afastada multa por litigância de má-fé aplicada a militar que não desocupou imóvel funcionalA 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região deu parcial provimento à apela-ção interposta por um militar na reserva, ora parte autora, contra a União Federal, objeti-vando a declaração de ilegalidade da notificação para desocupação do imóvel funcional que ocupa em uma área de propriedade da União, e administrado pelas Forças Armadas. Na inicial, o demandante informou que recebeu permissão verbal do comando da Aero-náutica para residir em imóvel pertencente à União, cujo valor da taxa de ocupação era descontado diretamente de seu soldo e que, apesar desse fato, recebeu notificação para desocupar o referido imóvel até o dia 6 de setembro de 2009, data em que se expirava o prazo de permissão de uso, quando, segundo afirma, “não se estipulou prazo de saída”. Requereu, assim, a declaração de nulidade da notificação. Em primeira instância, o pe-dido foi julgado improcedente ao fundamento de que a ocupação do imóvel pelo autor era precária e sem nenhum documento que a autorizasse, já que a autorização teria sido feita de forma verbal; que a transferência do militar para a reserva, “tal como a aposen-tadoria do servidor civil, faz cessar, de pleno direito, a permissão de uso de imóvel resi-dencial de propriedade da União (art. 16, V, do Decreto nº 980/1993)”, mesmo que por autorização informal; que o art. 16, § 3º, do Decreto nº 980/1993 assegura que “o imóvel deverá ser restituído, independentemente de notificação judicial ou extrajudicial, no pra-zo de trinta dias corridos, contados da data em que cessou o direito de uso”. A sentença condenou o requerente ao pagamento de multa de R$ 500,00 por litigância de má-fé em virtude da ocupação irregular do imóvel funcional entre 07.10.2009 a 18.11.2009. Inconformada, a parte autora recorreu ao TRF1 sustentando que a União, em momento algum, contestou o fato por ele alegado. Ponderou que a União não precisa do imóvel,

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mesmo porque destinou várias unidades residenciais para civis, quando são destinadas a militares, e que ele não descumpriu qualquer regra regimental ou legal para ser expulso do bem. Afirma que houve diversas permissões de uso emitidas pelo comando da Aero-náutica quando o autor já se encontrava na reserva e que não poderia ser compelido a desocupar o imóvel da noite para o dia, sem, ao menos, ter sido dada a ele oportunidade de defesa. Ao analisar o caso, o Relator, Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro, concordou em parte com o apelante. No voto, ele descreveu o histórico do processo da concessão de uso do referido imóvel. “Com base no histórico, vê-se que o autor estava ciente de que, cessado o motivo que o autorizava a usufruir do imóvel de propriedade da União, ocorreria a rescisão do termo de permissão de uso”, disse o magistrado, ao ressaltar que, nesse ponto, não merece acolhimento a alegação do autor. Com relação à multa aplicada pelo Juízo de primeiro grau, o relator destacou que “a permanência do autor no imóvel funcional, depois de expirado o prazo fixado em decisão judicial liminar, não caracteriza litigância de má-fé a justificar a imposição de multa”. Processo nº 0016177-35.2009.4.01.3500/GO. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Comissão da Câmara dos deputados aprova isenção do iTR para áreas produtivasA Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câ-mara dos Deputados aprovou isenção do Imposto Territorial Rural (ITR) para áreas pro-dutivas. Trata-se do Projeto de Lei nº 7.250/2014, do Deputado Irajá Abreu (PSD-GO). A intenção é premiar, com desconto no imposto, o produtor rural que mais produz. O projeto acrescenta uma tabela de descontos do ITR à Lei nº 9.393/1996, que trata desse imposto. Pela tabela, o desconto do ITR será progressivo de acordo com a área produti-va. Para o cálculo, será considerada produtiva a diferença percentual entre a área total e as reservas ambientais (reserva legal ou área de proteção permanente). Será isento de ITR quem tiver entre 90,1% e 100% de área produtiva na propriedade rural. Entre 70,01% e 90%, o imposto será 75% menor; entre 50,01% e 70%, o desconto será de 50%. Já quem utilizar menos de 30% da área produtiva terá um aumento em 100% do valor devido do ITR. O Relator, Deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), avaliou que o projeto é positivo ao estimular ainda mais a utilização das áreas das propriedades rurais em sua totalidade. “O ITR é um imposto com características extrafiscais, ou seja, seu objetivo principal não é simplesmente a arrecadação, mas estimular o uso adequado das propriedades rurais”. PL 7.250/2014. (Conteúdo extraído do site da Câmara dos Deputados)

Novo CpC prevê processo extrajudicial de usucapiãoO texto estabelece que deve constar na planta do imóvel exigida pelo cartório a assina-tura do proprietário que consta na matrícula. Uma antiga reivindicação dos cartórios foi atendida com edição do novo Código de Processo Civil (CPC): a instituição do processo extrajudicial de usucapião. O texto, porém, não foi o esperado pelos tabeliães. No pro-cesso, estabelecido para facilitar a regularização de imóveis e desafogar o Judiciário, faz-se uma exigência que, de acordo com especialistas, é muito difícil de ser cumprida: solicita-se a assinatura do proprietário que consta na matrícula. De acordo com especia-listas, os pedidos de usucapião costumam ser feitos muitos anos depois da ocupação e raramente se conhecem os proprietários que constam nas matrículas. Em muitos casos, inclusive, já morreram. A possibilidade de regularização de imóveis por processo extra-judicial está prevista no art. 1.071 do novo CPC, que acrescenta o art. 216-A ao texto da

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Lei nº 6.015, a Lei de Registros Públicos, de 1973. O problema, segundo especialistas, está no § 2º. O texto estabelece que deve constar na planta do imóvel exigida pelo car-tório a assinatura do proprietário. Caso não seja possível cumprir a exigência, o regis-trador de imóveis poderá notificar pessoalmente ou pelo correio o titular, que deverá se manifestar em 15 dias. Se não houver resposta, ficará interpretado que está discordando do processo. O caso, então, terá que ser levado à Justiça. “Em vez de facilitar, vai difi-cultar”, afirma Rogério Bacellar, Presidente da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg). “Uma falta de resposta deveria ser interpretada como desinteresse do proprietário, assim como ocorre na Justiça”. Em um processo judicial, o proprietário é citado. Caso não se manifeste, um edital é publicado. Se ainda assim não se pronunciar no prazo determinado, considera-se que concordou com a regularização do imóvel. O presidente da Anoreg afirma que o tema já foi tratado em um fórum que discutiu o novo CPC, em Brasília, e que o departamento jurídico da entidade está elaborando um parecer para enviar à Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Vamos pedir um esclarecimento”, diz Bacellar. Na Justiça, um processo de usucapião pode levar mais de uma década para ser resolvido, segundo o Advogado Flávio Yunes Fraiha, sócio do escritório que leva o seu nome. O trâmite é burocrático. Demora-se meses apenas para juntar uma petição ao processo. Por meio extrajudicial, um caso poderia ser solucionado em, no máximo, 120 dias. Luis Rodrigo Almeida, sócio do Viseu Advogados, diz que a demora gera impacto negativo no mercado. Ele conta que há muitos casos em que incorporadoras deixam de fechar negócios porque não querem assumir o risco. “Se o processo passasse a ser de seis meses, como previam os cartórios, com certeza o empreendedor assumiria o risco”, afirma. Um outro item da lei questionado por advogados é a participação do tabelião no processo. Pela nova lei, o trabalho do perito judicial – que em todo processo é nomeado por um juiz para ir até o local do imóvel e colher depoimentos de testemunhas – será transferido para ele. Ou seja, o requerente terá que ir até um tabelionato e fazer a solicitação de uma ata notarial. O documento deverá ser entregue juntamente com a planta e o memorial descritivo do imóvel no cartório de registro para que se possa dar início ao processo. Com as exigên-cias, segundo advogados, casos de usucapião continuarão a ser levados ao Judiciário. Segundo levantamento do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), somente de janeiro a julho, cerca de 1,6 mil novos processos foram distribuídos nas Varas da capital paulista. Titular do 26º Tabelionato de Notas de São Paulo, Paulo Roberto Gaiger Ferreira afirma que os treinamentos já estão sendo feitos e que todos estarão prontos quando o novo CPC entrar em vigor. No tabelionato em que atua, por exemplo, já há um espaço exclu-sivo para tratar dos casos. Ele diz, inclusive, que já vem sendo procurado por advogados. “Um dos que nos procuraram atua em um caso que está há nove anos na Justiça”, diz. Gaiger também vê a exigência da assinatura do proprietário como um problema da lei, mas acredita que, mesmo se não for modificada, poderá colaborar para melhorar a si-tuação atual. “O usucapião poderá ser declarado pelo juiz com maior rapidez, já que o autor que tentou antes ir ao cartório estará com todas as provas exigidas”, afirma. (Con-teúdo extraído do site do Jornal Valor Econômico)

Condômino tem direito de preferência na compra de imóvel momentaneamente indiviso, mas passível de divisãoO condômino que desejar vender sua fração de imóvel em estado de indivisão, seja ele divisível ou não, deverá dar preferência de aquisição a outro condômino. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que voltou a discutir o tema ainda

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controverso na doutrina e na jurisprudência. No caso julgado, um casal de condôminos de uma fazenda em Minas Gerais ajuizou ação de preferência contra outro casal que vendeu sua parte na propriedade a uma indústria. O pedido foi negado em primeira e segunda instâncias, sob o fundamento de que o imóvel, apesar de momentaneamente indiviso, era divisível. O Relator do recurso no STJ, Ministro Luis Felipe Salomão, reco-nheceu que a questão era mesmo controvertida nas Turmas de Direito Privado do Tribu-nal. Para uniformizar o entendimento, em 2004, em um caso ainda sob o comando do Código Civil (CC) de 1916, a Segunda Seção, que reúne a Terceira e a Quarta Turmas, entendeu que havia a preferência. Para Salomão, esse deve ser o entendimento também sob a vigência do CC de 2002. O Relator analisou o art. 504 do CC/2002, que impede um condômino de vender sua parte em coisa indivisível a estranhos. Ele destacou que o objetivo do legislador com a norma era conciliar os objetivos particulares do vendedor com o intuito da comunidade de coproprietários. “Certamente, a função social reco-menda ser mais cômodo manter a propriedade entre os titulares originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no grupo”, cita o ministro no voto. Salomão afirmou ainda que deve ser levado em conta todo o sistema jurídico, nota-damente o parágrafo único do art. 1.314 do CC/2002, que veda ao condômino, sem a prévia concordância dos outros, dar posse, uso ou gozo da propriedade a estranhos, somado à vedação do art. 504. Seguindo o voto do relator, a Turma deu provimento ao recurso para cassar a sentença e o acórdão do Tribunal mineiro, estabelecer como possível a preferência dos condôminos para o imóvel e remeter o processo ao magis-trado de primeiro grau para que analise os demais requisitos da ação de preferência, juridicamente denominada ação de preempção. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Fechamento da Edição: 04�08�2015

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Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição os seguintes conteúdos:

arTIGOS DOUTrINÁrIOS

• AExpressão“MaisouMenos”noRegistroImobiliário João Pedro Lamana Paiva Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET Disponíveis em: online.sintese.com

• BemdeFamílianoNovoCódigoCivileoRegistrodeImóveis Ademar Fioranelli Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET Disponíveis em: online.sintese.com

• ACauçãoemBensImóveisnaLeinº8.245/1991eseuAcessoaoRegistro de Imóveis

Erik Esswein Muller Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET Disponíveis em: online.sintese.com

• AEstatizaçãodosServiçosdeRegistrosdeImóveis Marcos Sousa e Silva Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET Disponíveis em: online.sintese.com

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Índice Alfabético e Remissivo

Índice por assunto especialDOUTRINAS

assunto

UsUcapião

•A Usucapião Administrativa no Novo Código deProcesso Civil (Francisco José Barbosa Nobre) .......13

•A Usucapião no Novo Código de Processo Civil (Lucas Bento Sampaio) .........................................15

•As Diferentes Modalidades de Usucapião e Seus Requisitos Processuais (Julian Gonçalves daSilva) ....................................................................18

•Novo Código de Processo Civil e a Usucapião Extrajudicial: um Avanço para as Ações Posses-sórias (Renata Cristina do Nascimento Antão) ........9

•Usucapião de Bens Imóveis no Direito Brasileiro (Kenedys Fernandes de Souza) .............................63

•Usucapião e o Direito Agrário: Uma Visão Ge-ral da Aplicabilidade da Usucapião no Direito Agrário e a Usucapião Especial Rural (Wagner Saraiva Ferreira Lemgruber Boechat) ....................47

•Usucapião: Uma Visão Panorâmica (LeomirAlves da Silva e Lindaura A. de Miranda).............84

autor

Francisco José BarBosa noBre

•A Usucapião Administrativa no Novo Códigode Processo Civil ................................................13

JUlian Gonçalves Da silva

•As Diferentes Modalidades de Usucapião e Seus Requisitos Processuais .........................................18

KeneDys FernanDes De soUza

•Usucapião de Bens Imóveis no Direito Brasileiro ............................................................................63

leomir alves Da silva e linDaUra a. De miranDa

•Usucapião: Uma Visão Panorâmica .....................84

linDaUra a. De miranDa e leomir alves Da silva

•Usucapião: Uma Visão Panorâmica .....................84

lUcas Bento sampaio

•A Usucapião no Novo Código de Processo Civil ...15

renata cristina Do nascimento antão

•Novo Código de Processo Civil e a Usuca-pião Extrajudicial: um Avanço para as AçõesPossessórias ...........................................................9

WaGner saraiva Ferreira lemGrUBer Boechat

•Usucapião e o Direito Agrário: Uma Visão Geral da Aplicabilidade da Usucapião no Direito Agrá-rio e a Usucapião Especial Rural ..........................47

COM A PALAVRA, O PROCURADOR

assunto

UsUcapião

•Posse, Usucapião e Justo Título: Considerações à Luz do Novo Código Civil (Armando AntonioLotti) ....................................................................95

autor

armanDo antonio lotti

•Posse, Usucapião e Justo Título: Considerações à Luz do Novo Código Civil ................................95

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

assunto

UsUcapião

•Agravo regimental – Agravo em recurso espe-cial – Usucapião especial – Imóvel urbano – Tamanho do imóvel que supera o limite esta-belecido na Constituição Federal – Reexame deprova (STJ) ...............................................2003, 103

EMENTÁRIO

assunto

UsUcapião

•Usucapião e de reintegração de posse – negati-va de prestação jurisdicional – não ocorrência ................................................................2004, 107

•Usucapião – imóvel rural – ausência de matrícula ................................................................2005, 110

•Usucapião – interposição de apelação – em-bargos de declaração – ausência de posterior ratificação ................................................2006, 113

•Usucapião – modo originário de aquisição dapropriedade – ausência de transmissão ...2007, 118

•Usucapião – requisitos – reexame de prova ................................................................2008, 118

•Usucapião extraordinária – cessão de posse – soma dos antecessores – lapso temporal vinte-nário – não demonstração .......................2009, 118

Índice Geral

DOUTRINAS

assunto

ação De nUnciação De oBra

•A Ação de Nunciação de Obra Nova e Sua Na-tureza Preventiva – Inibitória – no Novo CPC (Paula Saleh Arbs) ..............................................142

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ����������������������������������������������������������������������������������������������������������241 corretaGem

•Peculiaridades do Contrato de Corretagem no Di-reito Brasileiro (Daniel Ustárroz) ........................119

DespeJo

•Breves Considerações sobre as Liminares na Ação de Despejo (Gilberto Carlos MaistroJunior) ................................................................130

autor

Daniel Ustárroz

•Peculiaridades do Contrato de Corretagem no Direito Brasileiro ...............................................119

GilBerto carlos maistro JUnior

•Breves Considerações sobre as Liminares na Ação de Despejo ...............................................130

paUla saleh arBs

•A Ação de Nunciação de Obra Nova e Sua Na-tureza Preventiva – Inibitória – no Novo CPC ..... 142

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

assunto

ação De consiGnação

•Consignatória – Locação comercial – Fundada dúvida quanto ao titular dos locativos – Ação re-vocatória procedente – Bem arrecadado em pro-cesso falimentar – Procedência mantida – Re-curso não provido (TJSP) ..........................2018, 197

conDomínio

•Direito civil – Condomínio – Art. 504 do Código Civil – Direito de preferência dos demais con-dôminos na venda de coisa indivisível – Imóvel em estado de indivisão, mas passível de divisão – Manutenção do entendimento exarado pela segunda seção tomado à luz do art. 1.139 do Código Civil de 1916 (STJ) .......................2010, 145

DespeJo

•Civil – Processo civil – Ação de despejo – De-núncia vazia – Locação – Imóvel residencial – Notificação extrajudicial – Não atendimento – Representação processual – Gratuidade justiça – Preliminares rejeitadas – Direito de preferên- cia na aquisição – Ausência de registro em con-trato imobiliário – Não comprovado – Reten-ção – Benfeitorias não autorizadas – Descabi-mento (TJDF) ...........................................2013, 169

locação

•Civil – Ação de despejo – Aluguel – Contrato de locação – Fiança prestada sem restrições – Sentença condenatória sem qualquer ressal-va no que tange à limitação da responsabili- dade – Solidariedade configurada – Execu-

ção – Responsabilidade do fiador pela integra-lidade da dívida (STJ) ...............................2011, 159

loteamento

•Ação de rescisão de contrato de promessa de compra e venda – Loteamento urbano – Pedido de instauração de incidente de uniformização de jurisprudência – Não acolhimento – Agra-vo retido – Inversão de ônus da prova de ofício pelo juiz – Ausência dos requisitos – Petição inicial – Documentos indispensáveis à propo-situra da ação – Presença – Lei nº 6.766/1979 – Atendimento (TJMG) .............................2014, 179

penhora

•Apelação cível – Embargos de terceiro – Imó-vel penhorado – Alienação a terceiro anterior à citação do devedor no processo de execu-ção – Fraude à execução – Não caracterização – Fraude contra credores – Discussão – Impos-sibilidade – Meio processual adequado – Açãopauliana – Súmula nº 195, do STJ (TJPR) ... 2015, 185

posse

•Agravo de instrumento – Reintegração de posse – Imóvel para assentamento urbano – Demhab – Ocupação de imóvel público, sem a devida interveniência da municipalidade – Liminar de reintegração mantida (TJRS) .....................2016, 192

reGistro

•Apelação cível em mandado de segurança – Impetração contra ato do titular do cartório de registro de imóveis – Exigência de certidões da municipalidade como condição para o regis-tro de compra e venda de imóvel – Questão solucionada administrativamente – Perda su-perveniente do objeto – Extinção do writ sem análise de mérito (TJSC) ...........................2017, 195

sFh

•Administrativo – Sistema financeiro imobiliário – Alienação fiduciária – Lei nº 9.514/1997 – Inadimplemento – Regular consolidação da pro- priedade em nome da CEF – Reintegração deposse – Apelação desprovida (TRF 2ª R.) .. 2012, 163

EMENTÁRIO

assunto

ação De BUsca e apreensão

•Ação de busca e apreensão – contrato de fi-nanciamento – cláusula de alienação fidu ciária ................................................................2019, 199

ação De coBrança

•Ação de cobrança de aluguéis – alegação de ofensa às normas – falta de prequestionamento ................................................................2020, 199

Page 242: ISSN 2236-1553 Revista SÍNTESE - bdr.sintese.com 28_miolo.pdf · Carta do Editor Nesta edição da Revista SÍNTESE Direito Imobiliário publicamos como Assunto Especial o tema “Usucapião”

242 �����������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

•Ação ordinária – obrigação de fazer – interesse de agir – cessão de direitos – carta de adjudi-cação – juízo de família ...........................2021, 199

ação paUliana

•Ação pauliana – fraude contra credores – ven-da precipitada de bens – necessidade de de-monstração dos requisitos ........................2022, 200

ação reivinDicatória

•Ação reivindicatória – usucapião arguida emdefesa – reconhecimento .........................2023, 200

aDJUDicação compUlsória

•Adjudicação compulsória – compromisso – compra e venda – lotes – prescrição – aplicabili-dade ........................................................2024, 200

•Adjudicação compulsória – ilegitimidade ati-va – matéria já decidida – preclusão – mérito – exigência de anuência prévia ................2025, 200

arras

•Arras – ação rescisória – devolução de quantias pagas .......................................................2026, 201

•Arras penitenciais – ação de rescisão contra tual – cláusula penal – redução do percen tual de retenção previsto – rescisão contratual – promi-tente comprador – possibilidade ..............2027, 202

arrematação De imóvel

•Arrematação de imóvel – dívida tributária ante-rior à arrematação – previsão editalícia ...2028, 203

arrenDamento mercantil

•Arrendamento mercantil – reintegração de pos-se – rescisão contratual com devolução do bem– restituição do VRG – possibilidade .......2029, 203

comissão De corretaGem

•Comissão de corretagem – devolução ao pro-missário adquirente – ação declaratória de nu-lidade de cláusulas contratuais c/c obrigação de fazer e indenização – prazo indeterminado para conclusão da obra e entrega das chaves – cláu-sula nula de pleno direito ........................2030, 203

compra e venDa

•Compra e venda de imóvel – atraso na entrega – prazo indeterminado – nulidade – caso fortuito – força maior – inocorrência ....................2031, 204

•Compra e venda de lote urbano – ação ex empto – contrato particular que aponta metra-gem quadrada superior ............................2032, 206

•Compra e venda – minuta de escritura – ad-judicação compulsória de imóvel – quitação do preço contratado – matéria incontroversa ................................................................2033, 207

conDomínio

•Condomínio – cotas em atraso – obrigação propterrem ..........................................................2034, 207

conFlito De competência

•Conflito de competência – arrematação de imó-vel em razão de leilões realizados na justiça do trabalho e na justiça federal – competência ................................................................2035, 208

contrato

•Contrato de financiamento e seguro habitacio-nal – alegada ausência de comprometimen-to do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS) ........................................2036, 208

corretaGem

•Corretagem – comissão – desfazimento do negócio por culpa exclusiva da contratada – dever de ressarcimento ............................2037, 209

•Corretagem – restituição da taxa – anulação ex officio de cláusula abusiva .......................2038, 209

Desapropriação

•Desapropriação – ação anulatória – vistoria do imóvel – ausência de prévia comunicaçãoescrita ......................................................2039, 210

•Desapropriação – declaração de utilidade pú-blica – processo expropriatório – ausência dedemonstração ..........................................2040, 211

•Desapropriação – execução de título judicial – indenização – benfeitorias .......................2041, 212

DúviDa reGistral

•Dúvida registral – sentença que a rejeitou por reputá-la incabível na espécie – manutenção ................................................................2042, 212

Financiamento

•Financiamento habitacional – cobertura secu-ritária – vícios de construção – ilegitimidade passiva .....................................................2043, 212

herança

•Herança – venda de imóvel – pagamento do imposto ITCMD – responsabilidade do adqui-rente ........................................................2044, 213

hipoteca

•Hipoteca – ação de cobrança de cotas condo-miniais – execução – arrematação do imóvelgravado – terceiro – credor hipotecário ...2045, 213

•Hipoteca – pedido de extinção – quitação do imóvel .....................................................2046, 216

•Hipoteca – penhora desconstituída – pedido de reconhecimento de ineficácia ..................2047, 216

•Hipoteca judicial – necessária prévia especia-lização .....................................................2048, 217

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RDI Nº 28 – Jul-Ago/2015 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ����������������������������������������������������������������������������������������������������������243 locação

•Locação comercial – ação renovatória – ilegiti-midade passiva ........................................2049, 217

•Locação comercial – crédito – alugueres e acessórios locatícios – advento do termo final do contrato – ausência de renovação expressa ................................................................2050, 217

•Locação de imóvel – ação de consignação empagamento – recusa no recebimento .......2051, 218

penhora

•Penhora – alienação a terceiro anterior à citação do devedor no processo de execução – fraude à execução – não caracterização ................2052, 221

posse

•Posse – ações conexas – anulação de negóciojurídico, reivindicatória e manutenção ....2053, 221

•Posse – imissão – imóvel adjudicado – notifica-ção para desocupar o imóvel e da adjudicação –ocorrência – execução extrajudicial ........2054, 222

promessa De compra e venDa

•Promessa de compra e venda – reconvenção – restauração de autos – quitação do saldo deve-dor e liberação da hipoteca .....................2055, 223

reGistro

•Registro – retificação – suscitação de dúvida – alteração de áreas verdes – loteamento urbano ................................................................2056, 223

•Registro de imóveis – alvará judicial – escritura pública ....................................................2057, 223

•Registro de imóveis – arrematação de imóvel – expedição da carta ..................................2058, 223

•Registro de imóveis – arrolamento de bens – pro-cedimento legal – inobservância ..............2059, 224

•Registro de imóveis – dúvida – escritura públi-ca da compra e venda de fração ideal .....2060, 224

seGUro

•Seguro habitacional – indenização securitária – mútuo habitacional – juízo de retratação –

vícios construtivos – litisconsórcio passivo ne-cessário e competência ............................2061, 224

sFh

•SFH – financiamento – revisão de contrato– inadmissibilidade ..................................2062, 225

•SFH – pedido de revisão de contrato de compra e venda e mútuo com obrigações e hipoteca –Tabela Price – amortização – seguro ........2063, 226

•SFH – penhora sobre imóvel – construtora – li-beração ...................................................2064, 226

•SFH – revisão contratual – Plano de Equivalên-cia Salarial (PES) – saldo devedor – forma deamortização .............................................2065, 227

UsUcapião

•Usucapião – animus domini – discussão..2066, 228

•Usucapião especial urbana – requisitos – preen-chimento – não verificação – gravação de hipo-teca sobre o bem .....................................2067, 231

•Usucapião extraordinária – ausência de pre-questionamento .......................................2068, 231

•Usucapião – impossibilidade jurídica do pedi-do, inépcia da petição inicial e ilegitimidadeativa ad causam – afastamento ................2069, 232

CLIPPING JURÍDICO

•Afastada multa por litigância de má-fé aplicadaa militar que não desocupou imóvel funcional ..235

•Aluguel deve ser abatido em rescisão contratualde imóvel ..........................................................234

•Comissão da Câmara dos Deputados aprovaisenção do ITR para áreas produtivas .................236

•Condômino tem direito de preferência na com-pra de imóvel momentaneamente indiviso, maspassível de divisão .............................................237

• Imóvel único de família não pode ser objetode penhora judicial ............................................234

•Novo CPC prevê processo extrajudicial de usu-capião ...............................................................236

•Projeto muda cálculo de indenização de terradesapropriada ....................................................234