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Revista SÍNTESE DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL ANO XVII – Nº 102 – JUL-AGO 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Superior Tribunal de Justiça – nº 45/2000 Tribunal Regional Federal da 1ª Região – nº 20/2001 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – nº 1999.02.01.057040-0 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – nº 19/2010 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – nº 07/0042596-9 Tribunal Regional Federal da 5ª Região – nº 10/2007 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Simone Costa Salleti Oliveira CONSELHO EDITORIAL Ada Pellegrini Grinover, Antônio Carlos Marcato, Araken de Assis, Arruda Alvim, Ênio Santarelli Zuliani, Humberto Theodoro Jr., João Baptista Villela, José Carlos Barbosa Moreira, José Roberto Neves Amorim, José Rogério Cruz e Tucci, Nehemias Domingos de Melo, Ricardo Raboneze, Sérgio Gilberto Porto, Silvio de Salvo Venosa COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Augusto Franke Dahinten, Bernardo Franke Dahinten, Carlos Henrique Soares, Daniela Copetti Cravo, Eduardo Henrique de Oliveira Yoshikawa, Felipe Cunha de Almeida, Leonardo Oliveira Soares, Luiz Fernando Valladão Nogueira, Marcelo Muritiba Dias Ruas, Marcio Evangelista Ferreira da Silva, Paulo Roberto do Nascimento Martins, Rogério Montai de Lima ISSN 2179-166X

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Revista SÍNTESE Direito Civil e ProCessual Civil

ano Xvii – nº 102 – Jul-ago 2016

rePositório autorizaDo De JurisPruDênCia

Superior Tribunal de Justiça – nº 45/2000Tribunal Regional Federal da 1ª Região – nº 20/2001

Tribunal Regional Federal da 2ª Região – nº 1999.02.01.057040-0Tribunal Regional Federal da 3ª Região – nº 19/2010

Tribunal Regional Federal da 4ª Região – nº 07/0042596-9Tribunal Regional Federal da 5ª Região – nº 10/2007

Diretor eXeCutivo Elton José Donato

gerente eDitorial e De Consultoria Eliane Beltramini

CoorDenaDor eDitorial Cristiano Basaglia

eDitora Simone Costa Salleti Oliveira

Conselho eDitorial

Ada Pellegrini Grinover, Antônio Carlos Marcato, Araken de Assis, Arruda Alvim, Ênio Santarelli Zuliani, Humberto Theodoro Jr., João Baptista Villela,

José Carlos Barbosa Moreira, José Roberto Neves Amorim, José Rogério Cruz e Tucci, Nehemias Domingos de Melo,

Ricardo Raboneze, Sérgio Gilberto Porto, Silvio de Salvo Venosa

ColaboraDores Desta eDição

Augusto Franke Dahinten, Bernardo Franke Dahinten, Carlos Henrique Soares, Daniela Copetti Cravo, Eduardo Henrique de Oliveira Yoshikawa, Felipe Cunha de Almeida, Leonardo Oliveira Soares, Luiz Fernando Valladão Nogueira, Marcelo Muritiba Dias Ruas,

Marcio Evangelista Ferreira da Silva, Paulo Roberto do Nascimento Martins, Rogério Montai de Lima

ISSN 2179-166X

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1999 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência e outros assuntos de Direito Civil e Processual Civil.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REVISTA SÍNTESE DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL Nota: Continuação de REVISTA IOB DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

v. 1, n. 1, jul. 1999

Publicação periódica Bimestral

v. 17, n. 102, jul./ago. 2016

ISSN 2179-166X

1. Direito civil – periódicos – Brasil 2. Direito processual civil

CDU: 347.9(05) (81) CDD: 347

(Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851)

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.iobfolhamatic.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

O Assunto Especial desta edição trata do tema “Valor da Causa – Dano Moral – Novo CPC” com a participação dos brilhantes juristas: Felipe Cunha de Almeida, Marcelo Muritiba Dias Ruas e Eduardo Henrique de Oliveira Yoshikawa.

O Novo Código de Processo Civil exige muita cautela das partes e de seus procuradores quando do ajuizamento de ação de indenização por dano moral.

Na petição caberá atribuir à causa o valor preciso do ressarcimento pe-cuniário do dano moral pretendido (art. 292, inciso V). O que significa dizer, por consequência, que o pedido deverá mensurar o valor do dano moral, sendo vedado ao autor formular pedido genérico de condenação.

Na Parte Geral da Revista, publicamos importantes doutrinas sobre di-versos temas do direito, contando com a participação dos seguintes autores: Carlos Henrique Soares, Luiz Fernando Valladão Nogueira, Daniela Copetti Cravo, Rogério Montai de Lima, Augusto Franke Dahinten, Bernardo Franke Dahinten, Paulo Roberto do Nascimento Martins e Marcio Evangelista Ferreira da Silva.

E, também, na Seção Especial “Com a Palavra, o Procurador”, artigo de Leonardo Oliveira Soares intitulado “O NCPC e o Princípio Constitucional da Presunção da Inocência”.

Por fim, publicamos a seção denominada “Clipping Jurídico”, em que oferecemos a você, leitor, textos concisos que destacam, de forma resumida, os principais acontecimentos do período, tais como notícias, projetos de lei, normas relevantes, entre outros.

É com prazer que a IOB deseja a você uma ótima leitura!

Eliane BeltraminiGerente Editorial e de Consultoria

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto Especial

Valor da Causa – dano Moral – noVo CPC

doutrinas

1. Novo Código de Processo Civil e o Valor da Causa nas Ações de Reparação por Danos ExtrapatrimoniaisFelipe Cunha de Almeida ...........................................................................9

2. O Pedido de Reparação por Danos Morais e o Valor da Causa em Causas Cíveis e Trabalhistas Segundo o CPC de 2015Marcelo Muritiba Dias Ruas .....................................................................25

3. Valor da Causa no Novo CPCEduardo Henrique de Oliveira Yoshikawa ................................................35

Parte Geraldoutrinas

1. Duração Razoável do Processo e Sua Aplicação no Novo Código de Processo CivilCarlos Henrique Soares ............................................................................39

2. A Alteração da Ordem Processual no Novo CPC – Aspectos Gerais e o Direito EmpresarialLuiz Fernando Valladão Nogueira ............................................................71

3. Argumentos Consequencialistas: Legitimidade ou Arbitrariedade?Daniela Copetti Cravo ..............................................................................85

4. Das Ações Possessórias, Habilitação e Restauração de Autos no Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015Rogério Montai de Lima ...........................................................................99

5. A Cobrança de Coparticipação e os Planos de Saúde: Análise do Regime JurídicoAugusto Franke Dahinten, Bernardo Franke Dahinten e Paulo Roberto do Nascimento Martins ...................................................110

6. O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema JurídicoMarcio Evangelista Ferreira da Silva .......................................................130

JurisPrudênCia

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça....................................................................149

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2. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1563. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1654. Tribunal Regional Federal da 1ª Região ..................................................1825. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1876. Tribunal Regional Federal da 3ª Região ..................................................1937. Tribunal Regional Federal da 4ª Região ..................................................1988. Tribunal Regional Federal da 5ª Região ..................................................202

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Civil, Processual Civil e Comercial ............207

Seção EspecialCoM a PalaVra, o ProCurador

1. O NCPC e o Princípio Constitucional da Presunção da InocênciaLeonardo Oliveira Soares .......................................................................229

Clipping Jurídico ..............................................................................................237

Bibliografia Complementar ..................................................................................244

Índice Alfabético e Remissivo ...............................................................................245

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Revista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remune-ração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Valor da Causa – Dano Moral – Novo CPC

Novo Código de Processo Civil e o Valor da Causa nas Ações de Reparação por Danos Extrapatrimoniais

FeLIPe CunhA De ALmeIDA1

Mestre em Direito Privado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Professor pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Advogado, Especialista em Direito Civil e Processual Civil com ênfase em Direito Processual Civil, em Porto Alegre/RS.

RESUMO: O artigo tratou de abordar a necessidade de a parte indicar o valor da causa em ações de reparação civil, previsão inovadora, pelo novo Código de Processo Civil.

PALAVRAS-CHAVE: Novo Código de Processo Civil; danos extrapatrimoniais; valor da causa; indicação.

ABSTRACT: The article is to address the need for the party to indicate the amount of the claim in civil damages actions, innovative forecasting, the new Civil Procedure Code.

KEYWORDS: New Civil Procedure; materials damage; amount of the claim; indication.

SUMÁRIO: Introdução; Danos extrapatrimoniais; Arbitramento dos danos extrapatrimoniais; Danos extrapatrimoniais e valor da causa no novo CPC; Conclusão; Referências.

Introdução

A Lei nº 13.105, sancionada em 16.03.2015 traduz-se no novo Código de Processo Civil e que, como observamos da dicção do seu art. 1.045, entrará em vigor após um ano de sua publicação2. Portanto, já neste mês de março de 2016 sensíveis mudanças já são notadas com a nova legislação, tais como o fim do agravo retido e dos embargos infringentes, o agravo de instrumento e as suas hipóteses taxativas, entre outras.

O objeto deste artigo gira em torno do inciso V do art. 292 da nova legis-lação processual, que assim vem transcrita:

Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será:

1 E-mail: [email protected] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm.>. Acesso em:

6 abr. 2015.

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[...]

V – na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor preten-dido;

[...].

Marco Félix Jobim e Elaine Harzheim Macedo lecionam sobre o novo Código de Processo Civil. Explicam os autores que a nova codificação conso-lida “[...] uma legislação processual civil mais atualizada aos anseios sociais”3.

Como se pode observa da redação do novo CPC, mesmo para as causas relativas à reparação civil que evolvam pedido de condenação por danos ima-teriais, o valor deve ser indicado pelo autor da ação. Na sistemática processual civil de 1973, tal exigência não guardava previsão. Portanto, este artigo tem a intenção de analisar a novidade processual em termos de reparação, bem como as consequências para o jurisdicionado.

danos extrapatrImonIaIs

A indenização por danos imateriais também tem previsão constitucio-nal4. Assim, o seu deferimento tem por base, origem, a Carta Política, de forma que a sua relevância, além de ímpar, tem status de direito fundamental e, como tal, merece a devida aplicação, quando for o caso.

Resta claro que as normas constitucionais, dotadas e caracterizadas de hierarquia superior, balizam a interpretação e a aplicação da legislação infra-constitucional. Portanto, conclusão lógica a que se chega é a de que as normas, regras, leis, decisões (judiciais e administrativas), enfim, todo o ordenamento jurídico, tem de estar em harmonia com a Carta Política5.

Pedimos licença para nos utilizarmos dos ensinamentos de Sergio Cavalieri Filho, quando aborda a função da responsabilidade civil. Pondera o

3 JOBIM, Marco Félix; MACEDO, Elaine Harzheim. Das normas fundamentais do processo e o projeto de novo código de processo civil brasileiro: repetições e inovações. In: RIBEIRO, Darci Guimarães; JOBIM, Marco Félix (Org.). Desvendando o novo CPC. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015. p. 48.

4 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

[...]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

[...].”5 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 79.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA �����������������������������������������������������������������������������������������������������������11

ilustre jurista que o anseio de buscar a obrigação do causador do dano à de-vida reparação tem como inspiração o mais elementar sentimento de justiça. De sorte que, existindo dano causado pelo ato ilícito, há o rompimento do equilíbrio jurídico-econômico que existia antes entre o agente e a vítima. Exis-te uma necessidade fundamental de se ver restabelecido o anterior equilíbrio, recolocando-se o prejudicado no statu quo ante. Imperativo é o princípio da restitutio in integrum, ou seja, tenta-se, o mais perto do possível, repor a vítima ao estado anterior ao dano causado, pois, segundo o mestre aqui referido, “in-denizar pela metade é responsabilizar a vítima pelo resto; limitar a reparação é impor à vítima que suporte o resto dos prejuízos não indenizados”6. Em igual sentido trazemos decisão do Superior Tribunal de Justiça7. Assim, dependendo da forma como inobservados determinados deveres, tais como de assistência, de criação dos filhos, da boa-fé com o cônjuge ou companheiro (como exemplo deste último, a omissão quanto à verdadeira paternidade, como será abordado mais adiante), a indenização, a compensação, sem dúvida nenhuma é devida.

Trazendo a responsabilidade civil para a Constituição Federal, o art. 5º, caput, da Carta Política brasileira8, de forma expressa e como antes referido, ga-rante aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País o exercício dos direitos e das garantias fundamentais, e sem distinção de qualquer natureza. Portanto, entre outros aspectos e dirigindo-se à possibilidade de incidência da responsa-bilidade civil no campo do direito de família, o intérprete deve ter, de forma a utilizar como parâmetro, o princípio da igualdade, na consideração dos direitos fundamentais9. Continuando, nos casos de violação da integridade pessoal do

6 Idem, p. 13.7 “EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA –

SERVIDOR PÚBLICO – NULIDADE DA DEMISSÃO – REINTEGRAÇÃO – STATUS QUO ANTE – VENCIMENTOS – TERMO INICIAL – DATA DA DEMISSÃO – ADICIONAL DE FÉRIAS – MAJORAÇÃO NÃO COMPROVADA

1. A anulação do ato de demissão tem como consequência lógica a reintegração do servidor afastado com o restabelecimento do status quo ante, vale dizer, assegura-se ao servidor a recomposição integral de seus direitos, inclusive o de receber os vencimentos que deveriam ter sido pagos durante o período em que esteve indevidamente desligado do serviço público, em observância ao princípio da restitutio in integrum, não havendo que se falar, portanto, em ofensa à coisa julgada por não ter a ordem sido expressa quanto aos efeitos financeiros, tampouco em excesso de execução por ter sido considerado como termo inicial das parcelas devidas a data do afastamento do servidor dos quadros da Administração.

2. O ônus de provar os fatos alegados na exordial dos embargos incumbe ao embargante, o que, no caso, não ocorreu quanto ao apontado excesso relativo ao adicional de férias.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, AgRg-EmbExeMS 14081/DF, 3ª Seção, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, J. 11.04.2012. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=1136604&sReg=201101720885&sData=20120417&formato=HTML>. Acesso em: 22 abr. 2014)

8 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...].”i9 BERNARDI, Silvia, Waltrick. Constituição Federal comentada. Coord. Célio Armando Janczeski. Curitiba:

Juruá, 2011. p. 48.

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lesado, quanto ao aspecto moral, a Constituição Federal prevê a indenização como direito fundamental10.

Mas a história da reparação por danos puramente imateriais encontrou algumas objeções. Um dos argumentos, e talvez o principal, era o de que seria imoral a busca de valor monetário à dor, ou, então, de que seria impossível a determinação dos sujeitos atingidos, sejam pais, irmãos, noivos, etc. A questão da impossibilidade de mensuração da dor também foi questionada. Por outro lado, e com o passar dos tempos, tanto a jurisprudência como a doutrina trata-ram de rechaçar tais óbices11.

O Código Civil de 1916, segundo a doutrina de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, tratava-se de uma legislação a frente do seu tem-po. E a prova de tal afirmativa, segundo os mencionados autores, foi quanto à aprovação e à reprovação de muitos dos seus dispositivos. Um dos artigos de lei que Clóvis Beviláqua tinha intenção de que integrasse a legislação revoga-da, era exatamente a possibilidade de condenação a título de danos imateriais. O próprio caput do então art. 159 referia que quem violasse direito de ou-trem, ou causasse prejuízo, tinha o dever de indenizar, ou seja, ficava obrigado a reparar o dano. E, segundo os comentários ao Código pelo próprio Clóvis Beviláqua, a norma não fazia distinção entre danos materiais e imateriais, e não excluía um em relação ao outro. É que a violação de direito poderia se dar tanto na esfera patrimonial como na esfera extrapatrimonial, não havendo, portanto, discriminação sobre qual o direito se tratava, ou seja, se recaía sobre prejuízos econômicos ou sobre questões que compunham a humanidade da pessoa. E resumiu assim Clóvis Beviláqua: “Onde a lei não distingue, não cabe ao intér-prete fazê-lo”12.

Na segunda metade do século XX, o Supremo Tribunal Federal passou a admitir indenizações de cunho moral, mas com uma condição: desde que expressamente tal condenação não restasse cumulada com danos patrimoniais e, mesmo assim, o valor da indenização era sempre simbólico, não a tornando

10 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

[...]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

[...].”11 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4,

2013. p. 397.12 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 10. ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2013. p. 454-455.

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efetiva. Já, nos anos noventa, o Superior Tribunal de Justiça tratou de admitir indenizações, tanto a título de danos patrimoniais como a título de danos ima-teriais, com origem no mesmo fato13.

A indenização a título de danos imateriais, atualmente, representa uma compensação ao lesado, mesmo que pequena, em decorrência da tristeza in-fligida a alguém de forma injusta14. Temos, ainda, as Súmulas nºs 37 e 387 do Superior Tribunal de Justiça que tratam da cumulação, respectivamente, de da-nos morais e materiais decorrentes do mesmo fato, bem como da cumulação de indenizações de dano estético e dano moral.

Carlos Roberto Gonçalves afirma que a doutrina, de modo geral, entende que a enumeração das hipóteses previstas na Constituição Federal, no tocante aos bens lesados e à configuração do dano imaterial, seja de forma exemplifi-cativa. Por outro lado, alerta que o julgador não deve se afastar das diretrizes lá traçadas. O fundamento é que, caso contrário, o dano extrapatrimonial conside-rará pequenos incômodos e desprazeres, que todos, em razão de uma vida em sociedade, devem suportar15. Nesse sentido, trazemos julgamento do Superior Tribunal de Justiça que considera os meros dissabores, incômodos, como não passíveis de reparação a título de danos imateriais, em razão do referido conví-vio em sociedade16.

Pois bem. San Tiago Dantas há muito dizia que o principal objetivo da ordem jurídica é proteger o lícito e reprimir o ilícito. De tal sorte que, para atingir a esse fim, a ordem jurídica estabelece deveres e que, dependendo da natureza desses deveres, podem ser positivos, de dar ou fazer; ou negativos,

13 Idem, p. 455.14 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4,

2013. p. 397.15 Idem, p. 385.16 “EMENTA: DIREITO CIVIL – RESPONSABILIDADE CIVIL – COMPRA PELA INTERNET – PRESENTE DE NATAL

– NÃO ENTREGA DA MERCADORIA – VIOLAÇÃO A DIREITO DE PERSONALIDADE NÃO COMPROVADA NO CASO CONCRETO – DANOS MORAIS INDEVIDOS

1. A jurisprudência desta Corte tem assinalado que os aborrecimentos comuns do dia a dia, os meros dissabores normais e próprios do convívio social não são suficientes para originar danos morais indenizáveis.

2. A falha na entrega de mercadoria adquirida pela internet configura, em princípio, mero inadimplemento contratual, não dando causa a indenização por danos morais. Apenas excepcionalmente, quando comprovada verdadeira ofensa a direito de personalidade, será possível pleitear indenização a esse título.

3. No caso dos autos, as instâncias de origem concluíram não haver indicação de que o inadimplemento da obrigação de entregar um ‘Tablet’, adquirido mais de mês antes da data do Natal, como presente de Natal para filho, fatos não comprovados, como causador de grave sofrimento de ordem moral ao recorrente ou a sua família.

4. Cancela-se, entretanto, a multa, aplicada na origem aos embargos de declaração tidos por protelatórios (CPC, art. 538, parágrafo único).

5. Recurso especial a que se dá provimento em parte, tão somente para cancelar a multa.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, REsp 1399931/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Ministro Sidnei Beneti, J. 11.02.2014. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=1296475&sReg=201302819034&sData=20140306&formato=HTML>. Acesso em: 12 mar. 2014)

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de tolerar ou não fazer algo. Vamos ainda mais longe, ou seja, existe um dever geral de não prejudicar a ninguém, expresso pelo Direito romano, por meio da máxima neminem laedere17.

Quando há situação que viole determinado dever jurídico, resta confi-gurado o ilícito e, como regra, gera, para aquele que o violou, um novo dever jurídico, qual seja, o de reparar o dano. De modo que Sergio Cavalieri Filho assevera que existem dois deveres jurídicos: um originário ou primário e ou-tro sucessivo, ou também chamado de secundário, que será o de indeniza-ção quanto aos prejuízos. Quanto ao primeiro, o dever originário, trazemos o exemplo dado pelo Mestre, qual seja, o de que todos têm o dever de respeitar a integridade física do ser humano. Todavia e como referido, aquele que lesa tal direito tem o dever jurídico de repará-lo18.

Neste aspecto é que entra a noção da responsabilidade civil, que reflete a ideia de obrigação, encargo. Melhor explicando, aponta o dever que deter-minada pessoa tem de reparar o prejuízo causado a outrem, eis que decorrente da violação de um dever jurídico. Resumindo a ideia, a responsabilidade civil espelha que o dever jurídico sucessivo surge, emerge, no sentido de recomposi-ção por dano que decorreu de violação de dever jurídico originário19.

O direito à vida gera o direito à integridade física e moral, priorizando--se sempre o princípio da dignidade da pessoa humana, este que é fundamento do Estado Democrático de Direito20, conforme observamos da leitura de nossa Constituição Federal21. Trazendo a teoria supracolocada para a prática, impor-tante a leitura do julgamento trazido. Em que pese a fundamentação no sentido do indeferimento de condenação por danos imateriais no direito de família ser a regra, há situações que extrapolam a normalidade, como a violência psíquica e física22. Portanto, o dever jurídico originário que foi violado foi a integridade

17 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 1.18 Idem, p. 2.19 Idem, p. 2.20 BERNARDI, Silvia, Waltrick. Constituição Federal comentada. Coord. Célio Armando Janczeski. Curitiba:

Juruá, 2011. p. 50.21 “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do

Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana;

[...].”22 “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – DIVÓRCIO – ALIMENTOS – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – ABUSO E

VIOLÊNCIA PSÍQUICA E FÍSICA – GRAVIDADE DOS DANOS SUFICIENTEMENTE PROVADAS – VALOR DA CONDENAÇÃO E VERBA ALIMENTAR MANTIDOS NO PATAMAR POSTO NA SENTENÇA – 1. Indenização por dano moral. A gravíssima situação dos autos, em que a autora, desde menina (a partir dos 8 anos de idade), foi submetida a violência física e sexual, tendo, aos 25 anos, se casado com o agressor, configura, à saciedade, a dor, vexame, sofrimento e humilhação que, fugindo à normalidade, interferiram intensamente no comportamento psicológico da apelada, gerando sério desequilíbrio em seu bem-estar. 2. É certo que a jurisprudência em geral – e muito particularmente a deste Tribunal – é justificadamente recalcitrante em deferir danos morais no âmbito das relações familiares, dadas as peculiaridades que as cercam. O caso,

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física e psíquica da autora da ação. De modo que, como consequência, há um dever jurídico sucessivo, que é a indenização por danos morais, a qual trata a decisão em análise. O art. 389 do Código Civil23 trata do dever de indenização quando não cumprida determinada obrigação, seja a relação contratual ou ex-tracontratual24.

Finalizando, a responsabilidade é dever jurídico sucessivo, e tem como consequência a violação do primeiro, ou seja, do dever originário. Utiliza o au-tor, para melhor ilustrar o tema, as palavras de Kar Larenz: “A responsabilidade é a sombra da obrigação”25.

Maria Helena Diniz leciona que o dano imaterial traduz-se em uma “[...] lesão de interesses não patrimoniais de pessoa natural ou jurídica (CC, art. 52; Súmula nº 227 do STJ), provocada pelo fato lesivo”. Ainda, é importante asseve-rar que o caráter patrimonial ou moral do dano não advém da natureza do di-reito subjetivo lesado, mas sim dos efeitos da lesão. É que o prejuízo em face de determinado bem jurídico econômico pode ocasionar “perda de ordem moral, e da ofensa a um bem jurídico extrapatrimonial pode originar dano material”26. Portanto27: “O dano moral é, na verdade, lesão ao direito da personalidade. De-veras, ‘o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento’ (Enunciado nº 444 da V Jornada de Direito Civil)”.

porém, extrapola tudo o que se possa cogitar em termos de dano à pessoa, caracterizando dano moral mesmo que abstraída a conjuntura familiar em que foi praticado. 3. Valor da condenação. A intensidade do dano e seqüelas emocionais, justificam a quantia – não obstante não haver valor suficiente para recompor as lesões psíquicas ou reparar os traumas e sofrimento vivido pela autora desde criança (‘uma vida perdida’). De outro lado, cabia ao recorrente a prova de sua condição financeira e neste sentido foi de todo insuficiente o que trouxe aos autos. Várias foram as oportunidades de dilação probatória, sempre decorrendo o prazo sem manifestação do apelante – até que se encerrou a instrução, também sem inconformidade do demandado. 3. Alimentos. A mesma fundamentação serve para desacolher o pedido de redução da verba alimentar, prevalecendo o valor fixado pela sentença, ou seja, 40% do rendimento líquido da sua folha de pagamento, excetuados somente os descontos obrigatórios. Negaram provimento. Unânime (Segredo de Justiça).” (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Apelação Cível nº 70042267179, 8ª Câmara Cível, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, J. 14.07.2011. Disponível em: <http://google8.tjrs.jus.br/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70042267179%26num_processo%3D70042267179%26codEmenta%3D4249349+APELA%C3%87%C3%83O+C%C3%E7VEL.+DIV%C3%93RCIO.+ALIMENTOS.+INDENIZA%C3%87%C3%83O+POR+DANO+MORAL.+ABUSO+E+VIOL%C3%8ANCIA+PS%C3%E7QUICA+E+F%C3%E7SICA.+&site=ementario&client=buscaTJ&access=p&ie=UTF-8&proxystylesheet=buscaTJ&output=xml_no_dtd&oe=UTF-8&numProc=70042267179&comarca=Viam%E3o&dtJulg=14-07-2011&relator=Luiz+Felipe+Brasil+Santos>. Acesso em: 5 dez. 2012)

23 “Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.”

24 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 2-3.25 Idem, p. 3.26 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 29. ed. São Paulo: Atlas, v. 7,

2015. p. 108-110.27 Idem, p. 111.

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Assim, a angústia, a dor, o vexame, a humilhação, por exemplo, não são os danos extrapatrimoniais propriamente ditos, mas sim “o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois estes estados de espíritos constituem o seu con-teúdo, ou melhor, a consequência do dano”28.

Contudo, há hipóteses extremamente difíceis ou, segundo Sergio Cavalieri Filho, até impossíveis no sentido de se alcançar a quantificação dos danos. Daí que o princípio da equidade vem servir de base às indenizações. O próprio Código Civil contempla hipóteses nesse sentido, de acordo com: parágrafo único do art. 928, parágrafo único do art. 944, parágrafo único do art. 952, parágrafo único do art. 953 e parágrafo único do art. 95429.

ArbitrAmento dos dAnos extrApAtrimoniAis

A lógica do razoável deve ser utilizada como critério para a fixação dos danos extrapatrimoniais. Sergio Cavalieri Filho é taxativo ao asseverar que “a sua quantificação como um decréscimo patrimonial é também absolutamen-te impossível, razão pela qual o critério do arbitramento judicial é o único apropriado”30.

Portanto, o juiz deve arbitrar quantia que31,

de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes.

Existe a possibilidade de se atribuir à causa o valor de alçada, senão veja-mos32: “Ressalto que a jurisprudência acerca do tema vem assentada no sentido de se admitir seja atribuído à causa o valor de alçada quando a parte pretende

28 Idem, ibidem.29 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 159.30 Idem, p. 155.31 Idem, ibidem.32 “EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – VALOR DA CAUSA – MONTANTE INDENIZATÓRIO NÃO

ESPECIFICADO NA EXORDIAL – POSSIBILIDADE – Tendo a parte autora intentado ação de indenização por danos morais, impossibilitada a valoração econômica, e postulando seja o quantum fixado ao arbítrio do juiz, viável atribuir-se à causa o valor de alçada, sendo desnecessária a emenda com a valoração do montante visado. Precedentes jurisprudenciais. Agravo provido, de plano.” (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento nº 70062163274, 10ª Câmara Cível, Rel. Des. Paulo Roberto Lessa Franz, J. 13.11.2014. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php%3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1%26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70062163274%26num_processo%3D70062163274%26codEmenta%3D6040832+danos+morais+e+valor+da+causa+e+al%C3%A7ada+e+possibilidade++++&proxystylesheet=tjrs_index&ie=UTF-8&lr=lang_pt&access=p&client=tjrs_index&site=ementario&oe=UTF-8&numProcesso=70062163274&comarca=Comarca%20de%20Pelotas&dtJulg=13/11/2014&relator=Paulo%20Roberto%20Lessa%20Franz&aba=juris>. Acesso em: 29 dez. 2016)

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haver indenização de difícil ou inviável quantificação, postulando, inclusive, a fixação do quantum reparatório pelo juiz”.

Por outro lado, vejamos o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca do valor de alçada33:

Ao analisar o pedido de efeito suspensivo, o Desembargador Federal Relator Fábio Prieto de Souza proferiu a seguinte decisão:

“A r. decisão agravada está bem fundamentada. Confira-se:

‘O impugnado formulou, nos autos principais, pedido de condenação do im-pugnante por danos morais, requerendo o arbitramento do valor pelo Juízo; contudo, sugeriu a quantia de R$ 93.000,00 (noventa e três mil reais).

A mera sugestão do valor de RS 93.00,00 (noventa e três mil reais) para fixação da indenização não configura pedido certo e determinado.

Portanto, a quantia sugerida pelo autor não reflete no valor da causa, pois o mesmo deixou a cargo do juiz o arbítrio dos valores da indenização pleiteada.’

Mantenho a r. decisão, por seus próprios e jurídicos fundamentos.

[...]

Tal entendimento merece reforma. Com efeito, esta Corte possui entendimento no sentido de que se há indicação clara na petição inicial do benefício econô-mico pretendido na demanda, ainda que em patamar mínimo, é este que deve figurar como valor da causa, sendo que, mesmo que haja a impossibilidade de se avaliar a dimensão integral desse benefício, não se justifica a fixação do valor da causa em quantia muito inferior ao de um valor mínimo desde logo estimá-vel.” (Pet 2398/SP, Corte Especial, Relª Min. Laurita Vaz, DJe 12.05.2010)

Portanto e pela leitura de parte da transcrição da decisão supra, podemos perceber que se há menção ao conteúdo econômico, mesmo que por meio de mera sugestão, impossível a aplicação do valor de alçada. Vale transcrever, em conjunto com a ementa, parte de outro voto que aborda a evolução dos pedidos

33 “EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – DANOS MORAIS – VALOR DA CAUSA – INDICAÇÃO – VALOR CERTO E DETERMINADO – PRECEDENTES DO STJ

1. Esta Corte possui entendimento no sentido de que ‘se há indicação clara na petição inicial do benefício econômico pretendido na demanda, ainda que em patamar mínimo, é este que deve figurar como valor da causa, sendo que, mesmo que haja a impossibilidade de se avaliar a dimensão integral desse benefício, não se justifica a fixação do valor da causa em quantia muito inferior ao de um valor mínimo desde logo estimável’ (Pet 2398/SP, Corte Especial, Relª Min. Laurita Vaz, DJe 12.05.2010).

2. Agravo regimental não provido.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, AgRg-REsp 1445991/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 05.06.2014. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1328836&num_registro=201400722333&data=20140611&formato=HTML>. Acesso em: 29 fev. 2016)

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de condenação por danos extrapatrimoniais e a extensão do dano, experimen-tada pela parte que alega34.

34 “EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – REQUERIMENTO DE ARBITRAMENTO PELO JUIZ DA CAUSA – SUGESTÃO DE VALOR – LIMITAÇÃO – JULGAMENTO ULTRA PETITA

1. Na formação dos precedentes desta Corte, já se firmou que na ação de indenização por danos morais não se exige que o autor formule pedido certo e determinado quanto ao valor da condenação pretendida, a ser fixada, diante da dificuldade de mensuração, segundo o prudente arbítrio do juiz. À medida em que a jurisdição foi tratando do tema, contudo, certos parâmetros foram se estabelecendo para a fixação, de modo que se pode iniciar o caminho em prol da exigência de formulação de pleito preciso inclusive quanto a valores e elementos a serem ponderados na sua fixação, prestigiando-se o contraditório, que baliza o debate jurisdicional e acarreta maior precisão em valores.

2. No caso, o autor, além de pedir o arbitramento da indenização pelo Juízo, também indicou, ele próprio, um valor para a indenização, de modo que é de se entender que o julgador não podia ultrapassá-lo para fixar valor maior, em evidente julgamento extra petita, não fazendo sentido a exigência, pelo ofendido, de valor maior do que o que ele próprio sugeriu.

3. Recurso especial provido, reduzindo-se o valor da condenação ao valor pleiteado pelo autor.

[...]

Particularmente no que diz respeito a recurso do réu, entendeu que estaria suficientemente provada relação de causalidade entre o laudo e o sofrimento moral experimentado pelo autor. Também entendeu que não teria havido julgamento ultra petita, porque a parte requereu que a indenização fosse fixada segundo prudente arbítrio do juiz, o qual não estava, por isso, limitado ao parâmetro sugerido por ela, de 50 salários mínimos.

14. O recurso especial do laboratório, que reitera as teses da apelação, colhe êxito em parte.

15. A alegação de ofensa ao art. 159 do Código Civil de 1916 esbarra na Súmula nº 7/STJ. Com efeito, tendo as instâncias ordinárias entendido que havia prova suficiente da relação de causa e efeito entre o laudo e o diagnóstico equivocado de câncer e, por conseguinte, entre o laudo e o sofrimento moral experimentado pelo paciente, não seria possível afastar essas conclusões sem novamente examinar fatos e provas.

16. O recorrente tem razão, todavia, no que tange à alegação de julgamento ultra petita.

17. Os arts. 282 e 286 do Código de Processo Civil estabelecem como regra geral a orientação de que a parte autora deve apresentar petição inicial contendo pedido certo e determinado. O legislador previu, como se sabe, algumas exceções, em que se admite pedido genérico, por exemplo: a) nas ações universais quando o autor não puder individualizar os bens demandados – verbi gratia a petição de herança (art. 286, I); b) nos casos em que o valor da condenação depende de ato a ser praticado pelo réu – como ha hipótese da ação de prestação de contas (art. 286, III); c) nas ações indenizatórias por ato ou fato ilícito, quando não for possível determinar, desde logo, a extensão do dano (art. 286, II).

Mesmo nesta última hipótese, contudo, de ação indenizatória por ato ilícito, em que a previsão legislativa mais se aproxima da situação fática retratada nos autos, falta uma subsunção perfeita.

Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery (Código de Processo Civil comentado, 9. ed., Revista dos Tribunais, São Paulo, 2006. p. 484) bem destacam que essa modalidade de pedido genérico somente pode ser admitida quando ainda não seja possível conhecer todos os desdobramentos do evento danoso:

‘O pedido pode ser genérico nas ações de indenização quando não se puder, desde logo, determinar as conseqüências do ato ou fato ilícito. Neste caso, o juiz poderá levar em consideração fatos novos ocorridos depois da propositura da ação, para que possa proferir sentença. Uma das decorrências da exceção prevista no CPC, art. 286, II, é a possibilidade de fazer-se liquidação de sentença por artigos, quando houver de provar-se fato novo, superveniente à sentença. V. CPC, art. 475-E.’

No caso dos autos, como soe ocorrer nas ações de indenização por danos morais, a extensão do dano é conhecida pelo autor. Se o dano moral corresponde ao sofrimento psíquico, ao constrangimento íntimo, à violação de um direito de personalidade; parece razoável sustentar que a vítima desse sofrimento a tenha experimentado em toda a sua extensão desde o momento em que verificado o ato ilícito. Naturalmente haverá casos em que possível reconhecer uma lesão moral continuada e, por conseguinte, a aplicação do art. 286, II, do Código de Processo Civil, mas, via de regra, a ofensa à honra se dá pontualmente em virtude de um único fato.

Talvez por essa razão diversos autores afirmem que o pedido de indenização por danos morais está submetido à regra geral do pedido certo, prevista nos arts. 282 e 286, caput, do Código de Processo Civil.

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Caio Mário da Silva Pereira (Responsabilidade civil, 9. ed., Forense, Rio de Janeiro, 2000, p. 328) afirma que: ‘Na inicial o autor preencherá as exigências contidas no art. 282 do Código de Processo Civil’.

Joel Dias Figueira Júnior (Comentários ao Código de Processo Civil, v. 4, t. 2, RT, São Paulo, p. 92/93) defende que é ônus processual do postulante quantificar o valor da indenização pleiteada nas hipóteses em que a tristeza e o sofrimento nasçam de forma ínsita da própria relação de direito material violado. Para ele não é possível relegar para fase processual posterior ou confiar ao prudente arbítrio do julgador a tarefa em questão, porquanto isso representaria um pedido de julgamento por equidade em hipótese não prevista ou autorizada pelo art. 127 do Código de Processo Civil.

Fredie Didier Júnior (Curso de direito processual civil, v 1, 11. ed., Jus Podivum, Salvador, 2009. p. 440/441) vai além e afirma que a necessidade de o próprio autor indicar o valor para os danos morais se estabelece como um imperativo lógico, já que ninguém além da própria vítima estaria habilitado a por preço no sofrimento moral experimentado.

‘Problema que merece cuidadosa análise é a do pedido genérico nas ações de reparação de dano moral: o autor deve ou não quantificar o valor da indenização na petição inicial? A resposta é positiva: o pedido nestas demandas deve ser certo e determinado, delimitando o autor quanto pretende receber como ressarcimento pelos prejuízos morais que sofreu. Quem além do próprio autor, poderia quantificar a “dor moral” que alega ter sofrido? Como um sujeito estranho e por isso mesmo alheio a esta “dor” poderia aferir a sua existência, mensurar e quantificá-la em pecúnia?’

18. Apesar de todas essas considerações, a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, reconhecendo a dificuldade da parte em formular um pedido certo diante da ausência de critérios definidos para fixação desse tipo de indenização, adota uma postura mais elástica com relação ao tema.

Na linha dos precedentes desta Corte passou-se a admitir a formulação de pedido genérico com relação ao quantum dos danos morais: REsp 125417/RJ, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, Terceira Turma, DJ 18.08.1997; REsp 167.132/RJ, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, DJ 05.08.2002; REsp 175362/RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, DJ 06.12.1999; AgRg-Ag 639.979/RJ, Rel. Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, DJe 24.03.2009.

Atente-se, contudo, que essa diretriz veio a formar-se ao início do alargamento da admissão da indenizabilidade do dano moral, quando ainda não havia parâmetros firmes para a quantificação – que, como se sabe, integra também o próprio mérito do julgamento, isto é, insere-se, na frase lapidar de Liebman, no núcleo da pretensão deduzida em Juízo.

À medida em que o tempo passa e a jurisprudência vai traçando critérios para superar as dificuldades iniciais na fixação dos valores, volta a prestigiar-se a necessidade de que o contraditório se exerça inclusive quanto às dimensões da indenização por dano moral, voltando-se, forçosamente, o foco no sentido da garantia processual do contraditório.

Com efeito, se as partes pleiteiam e resistem com precisão e clareza a respeito do que pretendem e recusam, mais segurança haverá, para elas próprias, no julgamento, que terá elementos concretos mais firmes para a fixação do valor, deixando, o Juízo, de vagar em meio a mar imenso de imprecisões fático-valorativas, em que, por dever legal, tem de decidir fixando valores – cuja diversidade, algumas vezes expressiva, em situações idênticas, vem a fornecer aos jurisdicionados imagem da mais pura subjetividade judiciária, sabidamente sempre arriscada, de modo que, em princípio, deve antes ser restringida do que incentivada.

Nessa trilha, será mesmo razoável que, ao despachar a petição inicial, o Juízo determine que o autor diga exatamente o valor que pretende e os elementos que leva em consideração para mensurá-lo, a fim de que, em seguida, o contraditório se estabeleça inclusive quanto aos valores e critérios.

19. No caso dos autos, porém, conforme antes destacado, a parte autora não se limitou a remeter ao juiz a tarefa de arbitrar o quantum indenizatório. Ao mesmo tempo em que requereu que o juízo se desincumbisse dessa tarefa, também indicou ela própria, a título de sugestão, um valor que entendia razoável.

20. O que importa saber, na hipótese dos autos é, portanto, se essa ‘sugestão’ de valor deixe ser tomada como uma limitação material ao pedido.

21. O art. 128 do Código de Processo Civil estabelece que ‘o juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta’.

22. Celso Agrícola Barbi (Comentários ao Código de Processo Civil, v. I, 14. ed., Forense, Rio de Janeiro, 2010. p. 402), comentando esse dispositivo legal afirma que para a correta apreciação do seu alcance, impõe-se, antes de mais nada, a adequada compreensão do que seja ‘lide’.

Segundo lições da Teoria Geral do Processo, ‘lide’ é um conceito que guarda íntima relação com o mundo do ser. Os bens da vida, como se sabe, são escassos para atender as necessidades e os interesses dos homens, o que faz nascer, de forma inexorável, os conflitos intersubjetivos de interesse. Quando esse conflito

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dAnos extrApAtrimoniAis e vAlor dA cAusA no novo cpc

Como analisado em tópico anterior, a legislação processual de 2015 pre-vê que, nas demandas que venham a discutir danos imateriais, o valor deve ser indicado pela parte. O dispositivo anterior, ou seja, o art. 291, determina que “a toda causa será atribuído valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico

de interesse se manifesta de forma concreta, isto é, quando um sujeito manifesta de forma concreta a sua vontade de subordinar o interesse dos demais ao seu próprio, toma forma aquilo que a ciência do direito chama de Pretensão. Assim, ‘pretensão’ pode ser compreendida como ‘um modo de ser do direito (subjetivo), que tende a fazer-se valer frente a quem não o respeita, ou, em geral, o discute’ (CARREIRA ALVIM, J. E. Teoria geral do processo. 12. ed. Forense: Rio de Janeiro, 2009. p. 8). Quando aquele em face de quem se exige essa subordinação não concorda e resiste, tem-se ‘lide’. ‘Lide’ na lição de Carnelutti pode ser resumidamente definida, portanto, como o conflito (intersubjetivo) de interesses qualificado por uma pretensão resistida.

Critica-se esse conceito, aduzindo-se que ele traduz um fenômeno muito mais sociológico que jurídico. Contudo, se é verdade que a ‘lide’, enquanto entidade sociológica, extrapola os limites do processo, não é menos verdade que ela possui um viés estritamente processual, pois dentro do processo o conflito de interesses se apresenta de uma forma parcial, mais reduzida (mérito do processo). O juiz não pode resolver integralmente o conflito entre as partes, ele apenas poderá fazê-lo na medida em que o Direito traga solução para ele e nos limites em que as partes o tenham trazido à Juízo.

Vê-se assim, que a atividade das partes é essencial para a definição do que seja lide. Esta só pode ser compreendida a partir da pretensão formulada pela parte perante à Autoridade Judiciária e da resistência oposta pela parte contrária à essa mesma pretensão.

Não por outro motivo Liebman assinava que o importante não era propriamente a lide em seu conceito carneluttiano, mas o pedido formulado pela parte em juízo (Apud ALVIM, Carreira. Ob. cit., p. 190). Da mesma forma, Alexandre Freitas Câmara (Princípio da Correlação entre Demanda e Sentença no Direito Processual Civil, em Revista Dialética de Direito Processual – RDDP, n. 44, nov. 2006, p. 13) afirma que pedido é a manifestação processual de uma pretensão.

23. Não obstante essa necessária observação epistemológica, deve-se buscar o quanto possível, interpretar o pedido manifestado no processo em harmonia com a pretensão da parte a fim de que a atividade jurisdicional se preste da melhor forma possível à solução dos conflitos intersubjetivos de interesse ontologicamente considerados.

Da mesma forma como na teoria contratual se afirma que a literalidade dos contratos deve ser interpretada, o quanto possível, em conformidade com a intenção das partes, também no direito processual, a fórmula escrita por meio da qual se manifestou in concreto o pedido deve ser interpretada à luz da dimensão sociológica da lide subjacente. Isso pela singela razão de que o Direito, segundo noção mais elementar, existe para organizar as relações sociais e pacificar as tensões e animosidades do tecido social.

24. Assim, é preciso identificar qual a verdadeira pretensão da parte para, então, com os olhos voltados nesse horizonte, interpretar o pedido efetivamente formulado na petição inicial.

25. O autor, ao sugerir, em sua petição inicial, um valor de indenização que entendia razoável, anunciou de modo suficientemente claro, se não o bem da vida de que se entendia merecedor, pelo menos os limites da sua pretensão. Ao sugerir que a indenização fosse fixada em cinquenta salários mínimos, afirmou, implicitamente, que esse valor o satisfazia, que se não tivesse havido resistência da parte contrária em entregar espontaneamente essa quantia, não teria havido nem lide nem processo. Com efeito, o autor ao sugerir um valor para a indenização, muito embora não tenha formulado pedido certo, deixou transparecer que ele já se dava por satisfeito com uma indenização correspondente a cinquenta salários mínimos. Dessa forma ele também delimitou a própria lide.

26. A condenação em valor superior àquele que foi mencionado pela parte, mesmo a título de sugestão, como suficiente para por cobro à lide deve ser considerada, por isso, excessiva, desnecessária aos fins últimos do processo, que é a realização do Direito e a pacificação social. Inafastável, portanto, o alegado vício de julgamento ultra petita. [...].” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, REsp 1313643/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, J. 22.05.2012. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1150440&num_registro=201200244020&data=20120613&formato=HTML>. Acesso em: 29 fev. 2016)

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imediatamente aferível”. Em relação ao valor da causa, importante são as lições doutrinárias a respeito35:

O valor da causa é requisito essencial da petição inicial e serve de parâmetro para diferentes mensurações que se farão ao longo do processo. Tomem-se como exemplos o cálculo do valor a ser pago a título de custas processuais, tanto na propositura da ação quanto na interposição de recursos, assim como as multas, seja a que pode ser aplicada ao litigante de má-fé, quanto ao recorrente que interpõe embargos de declaração tidos por protelatórios.

Pode se perceber que a inovação processual vem no sentido das decisões anteriormente trazidas, especialmente a posição do Superior Tribunal de Justiça.

E mesmo que se considere a hipótese de valor atribuído à reparação me-nor do que o pleiteado pelo autor, não se cogita de sucumbência recíproca, eis que o direito foi reconhecido, senão vejamos36:

35 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 477.

36 “EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – IRRESIGNAÇÃO DA PARTE – EFEITOS INFRINGENTES – IMPOSSIBILIDADE – APRECIAÇÃO – NORMA ESTADUAL – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 280/STF – PRESIDÊNCIA DA SESSÃO DE JULGAMENTO POR DESEMBARGADOR IMPEDIDO – NULIDADE DO ACÓRDÃO NÃO CARACTERIZADA – INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL – CERCEAMENTO DE DEFESA – INEXISTÊNCIA – VENDA DE BEM DADO EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – PRÉVIA CIENTIFICAÇÃO DO AVALISTA – NECESSIDADE, PARA QUE O AVALISTA PERMANEÇA RESPONSÁVEL POR EVENTUAL SALDO DEVEDOR – INCLUSÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES – INDENIZAÇÃO – DANO MORAL – CORREÇÃO MONETÁRIA – INPC/IBGE, A CONTAR DA DECISÃO – JUROS MORATÓRIOS – 0,5% AO MÊS NA VIGÊNCIA DO CC/1916 E 1% AO MÊS NA VIGÊNCIA DO CC/2002, A CONTAR DA DATA DA CITAÇÃO – INDENIZAÇÃO FIXADA EM VALOR BEM ABAIXO DO PLEITEADO NA EXORDIAL – SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA – INEXISTÊNCIA – CUSTAS RATEADAS, ARCANDO CADA PARTE COM AS DESPESAS PROCESSUAIS A QUE DERAM CAUSA

O julgador não precisa responder, um a um, todos os pontos apresentados. Não há necessidade, outrossim, de expressa menção a todos os dispositivos legais invocados pelas partes. Importa é que todas as questões relevantes sejam apreciadas.

A irresignação do recorrente e a tentativa de emprestar aos embargos de declaração efeitos modificativos não se mostra viável no contexto do art. 535 do CPC.

A via especial mostra-se inadequada para dirimir a controvérsia de normas que não sejam federais. Súmula nº 280/STF.

Tendo o TJSP decidido que a competência é do extinto 1º TAC/SP, não há de se cogitar conflito de competência. Súmula nº 22/STJ.

A mera presidência da sessão, por juiz impedido, sem atuação como relator, revisor ou vogal, não pode ser interpretada como exercício de função jurisdicional, na medida em que não votou e, portanto, não participou ativamente do julgamento, não tendo a oportunidade de agir com a parcialidade que a lei imputa de maneira presumida ao impedido.

Sendo o juiz o destinatário final da prova, cabe a ele, em sintonia com o sistema de persuasão racional adotado pelo CPC, dirigir a instrução probatória e determinar a produção das provas que considerar necessárias à formação do seu convencimento.

Não há ilegalidade nem cerceamento de defesa na hipótese em que o juiz, verificando suficientemente instruído o processo e desnecessária a dilação probatória, desconsidera o pedido de produção de prova testemunhal.

O posicionamento deste Tribunal evoluiu para entender pela necessidade de intimação do avalista acerca da venda do bem dado em alienação fiduciária, para que persista sua responsabilidade por eventual saldo devedor.

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No tocante à sucumbência, as Turmas que compõem a 2ª Seção vêm se filiando ao entendimento firmado no julgamento do REsp 494.867/AM, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ de 29.03.2003, segundo o qual “em se tratando de repara-ção por dano moral, não fica o magistrado jungido aos parâmetros quantitativos estabelecidos pelo autor, na inicial. Por isso, reconhecido o direito à reparação, ainda que esta venha a ser fixada em valores muito inferiores à quantia preten-dida pelo autor, não se há de falar em êxito parcial ou sucumbência recíproca. A sucumbência é total, uma vez que o objeto do pedido é a condenação por dano moral. Escapando o valor da condenação à vontade do ofendido e inexis-tindo, consoante a sistemática de nosso direito positivo, tarifação para os casos de lesão ao patrimônio imaterial, o êxito da parte autora é sempre total, a me-nos, claro, que, tendo havido cumulação de pedidos, num deles haja sucumbi-do. Não é o caso”.

No mesmo sentido: REsp 856.006/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ de 06.11.2006; REsp 674.678/AP, minha relatoria, DJ de 16.11.2004; e REsp 327.397/PR, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 16.11.2004.

A regra, entretanto, segundo entendimento contido no julgamento do REsp 291.625/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ de 04.08.2003, vale somente para os honorários advocatícios e não para as custas. Estas, desde que consi-derável a redução, conforme ocorre na presente hipótese, devem ser rateadas, arcando cada parte com as despesas processuais a que deram causa.

Mas um aspecto é importante ressaltar, levantado e analisado por Elpídio Donizetti, acerca da indicação do valor da reparação civil, senão vejamos37:

Ainda que se trate de dano moral, o NCPC estabelece que deve ser atribuído à causa o valor pretendido pelo autor. Entendo, contudo, que o valor atribuído deve ser meramente estimativo, podendo o juiz fixar o dano moral em montante inferior, sem que isso implique em sucumbência recíproca. Em síntese, a previ-

Não cientificado o avalista acerca da venda do bem, torna-se ilegítima a sua inclusão em cadastro de inadimplentes por conta da existência de saldo devedor.

Indenização por danos morais fixada em R$ 10.000,00, a serem corrigidos monetariamente com base no INPC/IBGE, a contar da data do julgamento do recurso especial, e acrescidos de juros moratórios no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês na vigência do CC/1916 e de 1% (um por cento) ao mês na vigência do CC/2002, a contar da data da citação.

Em se tratando de reparação por dano moral, não fica o magistrado jungido aos parâmetros quantitativos estabelecidos pelo autor, na inicial. Por isso, reconhecido o direito à reparação, ainda que esta venha a ser fixada em valores muito inferiores à quantia pretendida pelo autor, não se há de falar em êxito parcial ou sucumbência recíproca. A regra, entretanto, vale somente para os honorários advocatícios e não para as custas. Estas, desde que considerável a redução, devem ser rateadas, arcando cada parte com as despesas processuais a que deram causa.

Recurso especial conhecido e parcialmente provido.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 844.778/SP, 3ª Turma, Relª Min. Nancy Andrighi, J. 08.03.2007. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=669237&num_registro=200600869406&data=20070326&formato=HTML>. Acesso em: 3 fev. 2016.

37 DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e CPC/1973. São Paulo: Atlas, 2015. p. 227.

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são contida no inciso V do art. 292 não deve “revogar” o entendimento descrito na Súmula nº 326 do STJ, segundo a qual “na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca”.

ConClusão

Como referido na introdução deste artigo, estamos em tempos de um novo Código de Processo Civil. É sabido que a responsabilidade civil vem em gradativa evolução, seja pela construção doutrinária, seja pela jurisprudência, que refletem as mudanças que a sociedade vem sofrendo, especialmente em relação às novas tecnologias e que, em que peses possam facilitar e dar mais conforto à vida, podem também, por outro lado, causar danos de diversas espé-cies, por meio de um único fato.

O que deve ficar claro é que, com a nova legislação processual, deve o jurisdicionado apontar o valor da causa nas ações de reparação civil, nos termos do inciso V do art. 292, mesmo que por estimativa. Portanto, no sentido de se evitar que a parte deva emendar a inicial38 para atribuir à causa o valor da reparação39 nos termos em que se ora analisa, deve cumprir com as disposi-ções que traz o novo CPC, até para que ela própria não dê causa a demora da tramitação do feito.

referÊnCIas

BERNARDI, Silvia, Waltrick. Constituição Federal comentada. Coord. Célio Armando Janczeski. Curitiba: Juruá, 2011.

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. DF, 1º de janeiro De 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>.

______. Código de Processo Civil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. DF, 16 de março de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>.

______. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Dis-ponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>.

38 “Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.

Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.”39 “Art. 319. A petição inicial indicará:

[...]

V – o valor da causa;

[...].”

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BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015.

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

______. Programa de responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 29. ed. São Paulo: Atlas, v. 7, 201.

DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e CPC/1973. São Paulo: Atlas, 2015.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2013.

JOBIM, Marco Félix; MACEDO, Elaine Harzheim. Das normas fundamentais do pro-cesso e o projeto de novo Código de Processo Civil brasileiro: repetições e inovações. In: RIBEIRO, Darci Guimarães; JOBIM, Marco Félix (Org.). Desvendando o novo CPC. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015.

NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

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Assunto Especial – Doutrina

Valor da Causa – Dano Moral – Novo CPC

O Pedido de Reparação por Danos Morais e o Valor da Causa em Causas Cíveis e Trabalhistas Segundo o CPC de 2015

Request of Reparation of Moral Damages and Complaint Value on Civil and Labor Lawsuits Under the 2015 Civil Procedure Code

mARCeLO muRITIBA DIAS RuASPós-Graduado e Especialista em Direito Empresarial, Pós-Graduando do Curso de MBA em Direito e Economia da Empresa pela FGV/Sociesc, Advogado e Consultor Jurídico atuante. Só-cio do escritório Bogo & Ruas Sociedade de Advogados. Membro do Conselho Deliberativo da Associação Comercial Industrial de Indaial/SC para o período 2016/2017. Bacharel em Direito pela FURB – Fundação Universidade Regional de Blumenau.

RESUMO: Pretende-se no presente estudo abordar os efeitos do art. 292, inciso V, do Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015, quanto à necessidade de valorar o dano moral pretendido (art. 292, V, do CPC) e quanto a sua característica de pedido genérico e possibilidade de pedido subsidiário e até alternativo para que o julgador fixe o quantum debeatur, diante da manifestação de alguns autores no sentido de que, pela redação do citado dispositivo processual, o valor haveria de ser certo, determinado pelo próprio lesado, não se admitindo mais a generalidade, o pedido subsi-diário e o livre-arbitramento pelo Estado-juiz.

PALAVRAS-CHAVE: Valor da causa; dano moral; pedido certo, genérico; subsidiário; cível; trabalhista; vinculação; CPC; art. 292, V.

ABSTRACT: It is intended in this study to address the effects of art. 292, V, of the new Civil Procedure Code – Law 13.105/2015, regarding the need to establish the desired amount as reparation to moral damages (art. 292, V, CPC) and as its feature as a generic request and the possibility of a subsidiary or alternative claim for to the judge to set the quantum debeatur, given some authors’ manifestations in the sense that, considering the wording of that procedural rule, the value should be certain, deter-mined by the individual himself, no longer being admitted the generality, the application subsidiary and the free arbitration state judge.

KEYWORDS: Complaint value; moral damages; determined request, generic; subsidiary; civil; labor; binding; CPC; art. 292, V.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O dano moral e sua dúplice natureza quanto à finalidade – reparatória e pu-nitiva/pedagógica; 2 Valor da causa não vincula ou restringe o objeto da lide no pedido de indenização por dano moral; 3 O procedimento – pedido mínimo, genérico, subsidiário e alternativo; Conclusão; Referências.

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Introdução

Com o advento do novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015 surgiram artigos1 afirmando que, em virtude do disposto no inciso V do art. 2922, novidade do referido diploma, o valor da causa deve representar o exato quantum pretendido, inclusive em sede de dano moral, com isso afirman-do não ser mais admissível o pedido genérico previsto no § 1º do art. 324.

Na seara do direito do trabalho, conjugados os arts. 769 e 8893 da Con-solidação das Leis do Trabalho com a disposição contida no art. 1.046, § 2º, do novo CPC4, entendeu o c. Tribunal Superior do Trabalho em editar a Instrução Normativa nº 385, para desde logo dizer o que se aplica e o que não se aplica ao processo do trabalho, e, na questão do valor da causa, entendeu ser necessária a valoração do quantum pretendi, mesmo em se tratando de dano moral6, ou seja, pela aplicabilidade do inciso V do art. 292 do novo CPC ao processo do trabalho.

Assim está descrito no dispositivo processual em estudo: “Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: [...] V – na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; [...]”.

A novel regra, então, não permitiria mais que o autor deixasse ao livre--arbítrio do julgador a fixação do quantum debeatur, resultando que, em caso de improcedência do pedido formulado, fosse a parte condenada em honorá-rios sucumbenciais, caso o valor restasse fixado à menor do que o pretendido na inicial.

1 Disponível em: <http://jota.uol.com.br/novo-cpc-e-o-pedido-de-indenizacao-fim-da-industria-do-dano-moral>. Acesso em: 30 maio 2016; e também em: <http://rodrigoperfeitopeghini.jusbrasil.com.br/artigos/221519552/a-acao-de-danos-morais-e-os-honorarios-sucumbenciais-no-novo-cpc>. Acesso em: 30 maio 2016.

2 CPC/2015: “Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: [...] V – na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; [...]”.

3 CLT: “Art. 769. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título. [...] Art. 889. Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal”.

4 CPC/2015: “Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. § 1º As disposições da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, relativas ao procedimento sumário e aos procedimentos especiais que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código. [...]”.

5 Resolução nº 203, de 15 de março de 2016: “Edita a Instrução Normativa nº 39, que dispõe sobre as normas do Código de Processo Civil de 2015 aplicáveis e inaplicáveis ao Processo do Trabalho, de forma não exaustiva”.

6 IN/TST 39/2016: “Art. 3º Sem prejuízo de outros, aplicam-se ao Processo do Trabalho, em face de omissão e compatibilidade, os preceitos do Código de Processo Civil que regulam os seguintes temas: [...] IV – art. 292, V (valor pretendido na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral); [...]”.

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Não nos parece ser esta a melhor solução e, muito menos, que haja uma limitação no pedido pelo fato de que o valor da causa deve representar o valor pretendido, em especial quando se trata de pedido de indenização decorrente de dano moral.

Para tanto, antes cabe discorrer, ainda que muito suscintamente, sobre a norma material e a doutrina quanto à natureza do dano moral, que, como se sabe, tem dúplice função, qual sejam indenizatória e punitiva-pedagógica, e, neste último ponto em especial, pode-se dizer que não há como ser limitado o pedido, mas, tão somente e para efeitos de valoração da causa, declarado certo valor, ainda que mínimo, o qual servirá de parâmetro ao julgador na fixação por sentença do quantum debeatur.

1 o dano moral e sua dÚplICe natureZa Quanto À fInalIdade – reparatÓrIa e punItIVa/pedaGÓGICa

Já é mais do que notória, não só pela doutrina como também pelas deci-sões nos tribunais, a definição de que na reparação pelo dano moral se busca, além da reparação do sofrimento experimentado pela vítima (caráter ressarcitó-rio), também a punição e advertência do infrator pelo seu ato faltoso em relação ao direito de outrem (caráter punitivo-pedagógico).

Diversos aspectos7-8 devem ser avaliados pelo julgador, pois não irá tão somente mensurar o valor da dor sofrida pela vítima, estabelecendo uma in-denização, mas também buscar que, dentro deste valor, por meio de diversos critérios objetivos e subjetivos, também seja alcançada a função punitiva e pe-dagógica, no sentido de alertar o ofensor e adverti-lo para que não mais cometa o ilícito, cumprindo assim o Estado não somente a sua função de assegurar o direito pretendido pelo ofendido, mas garantir certa paz social ao punir aquele que desobedece a lei e causa lesão ao terceiro.

Sobre a questão da finalidade punitiva, citamos trabalho desenvolvido por Orlando L. Z. Junior9, no sentido de que,

7 A indenização com caráter exemplar e sancionador observa, sobretudo, o seguinte: (a) a gravidade da falta; (b) a situação econômica do ofensor, especialmente no atinente à sua conduta fortuna pessoal; (c) os benefícios obtidos ou almejados com o ilícito; (d) a posição de mercado ou de maior poder do ofensor; (e) o caráter antissocial da conduta; (f) a finalidade dissuativa futura perseguida; (g) a atitude interior do ofensor, uma vez que a sua falta foi posta a descoberta; (h) O número e nível de empregados comprometidos na grave conduta reprovável; (i) Os sentimentos feridos da vítima (SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral indenizável. 3. ed. São Paulo: Método, 2001. p. 178-179).

8 Cabe asseverar, adicionalmente, que a pretensão reparatória é formulada sob as designações genéricas de danos materiais e/ou morais, cabendo à jurisdição identificar quais as modalidades pertinentes, mediante a análise dos fatos lesivos descritos pelo postulante. Ou seja, as diversas espécies (injúria, agravo, abalo e punitivos) estão incluídas no pedido geral de reparação de danos morais, cabendo à jurisdição identificá-los e, então, atribuir-lhes a reparação respectiva (ZANON JUNIOR, Orlando Luiz. Danos morais: modalidades. Jus Navigandi, Teresina, a. 18, n. 3712, 30 ago. 2013. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/25184>. Acesso em: 17 maio 2016).

9 Idem.

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sobre o critério de fixação do valor dos danos punitivos, cabe reiterar que difere daquele empregado no arbitramento dos prejuízos materiais e das demais lesões morais, haja vista que a cláusula penal geral não é pautada pela extensão do dano, mas sim pela reprovabilidade da conduta e pela capacidade financeira do agente, como forma de efetivamente desestimular a conduta. Com efeito, a relevância dos danos morais para a integridade do sistema jurídico reside muito especialmente na sua função de coerção, ou seja, de reprimir a conduta lesi-va, razão pela qual não merece ser regido pelo critério de proporcionalidade à extensão do dano, mas sim pelo parâmetro de exemplaridade. Trata-se de uma cláusula punitiva que, em relação contratual ou extracontratual, objetiva deses-timular o inadimplemento das obrigações jurídicas, razão pela qual deve ser fi-xado num valor suscetível de gerar a mudança de comportamento do lesante.

Então, diante de tantos fatores a serem postos sob o critério do julgador, não se pode dizer, em sede de dano moral, que haverá um valor específico ou mesmo que é a vítima a melhor parte a lhe dar mensuração pecuniária, pois o Estado aqui intervém fortemente, especialmente nos casos em que se tratam de direitos por ele protegidos em razão do caráter social, como ocorre para as crianças e adolescentes, consumidores, enfim, aqueles a quem a lei confere proteção especial e em decorrência de matérias de ordem pública.

E isto se dá em especial quando tratamos de direito material trabalhista, que, em sua maioria, constitui norma com caráter de ordem pública, cogente, cuja aplicação pede ao julgador melhor cautela na proteção de interesses de cunho social.

Passada esta singela análise sobre a dúplice função que se espera da in-denização pelo dano moral, cabe-nos agora abordar a sua instrumentalização no plano da solução das lides, ou seja, do processo, como meio de solução de conflitos e entrega efetiva10 da prestação jurisdicional.

2 Valor da Causa não VInCula ou restrInGe o oBJeto da lIde no pedIdo de IndenIZação por dano moral

Ainda que deva, agora, o autor, em determinada lide, dar valor ao que pretende como ressarcimento pelo dano moral sofrido, seja em demanda sob a Justiça Comum, seja aquela pertencente à Justiça Especializada do Trabalho, isso não limita o jurisconsulto em seu mister de julgar, dados os diversos aspec-tos que devem ser avaliados quando de sua fixação, salvo a regra do art. 492 do CPC11, que não permite a decisão ultra petita ou além do pedido do dano.

10 CPC/2015: “Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

11 CPC/2015: “Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado”.

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Assim, uma vez fixado pedido certo (reparação do dano moral, p. ex.), de determinado valor (quantum pretendi), não poderá o julgador estabelecer valor maior, porém, poderá sim decidir a menor e, neste ponto, mais uma vez pode-mos afirmar que não cabe exclusivamente ao lesado a estipulação do quantum. No máximo e tomando por base a jurisprudência, poderá o autor sugerir certo valor que, no seu entendimento, serve como parâmetro da sua pretensão.

A valoração da causa não é parte do fundamento e do pedido12 quanto ao direito pretendido. Também não é tão somente a declaração daquilo que se pretende para fins de dar o valor econômico da avença posta em juízo em razão do cálculo de custas judiciais, pois pelo valor da causa será também estabele-cido em determinados casos o rito processual pretendido, como no caso da Lei nº 9.099/1995 e até para fins de condenação do vencido em honorários, na forma do § 2º do art. 84 do novel CPC13.

O valor da ação não vincula o pedido. Advém do entendimento subjetivo do autor quanto ao seu direito à reparação do dano que sofreu, ou objetivo, quando esteja representado, p. ex., por um orçamento específico em caso de dano material para o qual se faz necessária a prova material. Sempre estará su-jeito à correção de ofício (§ 3º do art. 292 do CPC) e ao contraditório, por meio da impugnação – agora permitida nos próprios autos, como preliminar (art. 293 do CPC).

Lembrando a sempre valiosa lição de Humberto Theodoro Júnior14: “De-termina-se, portanto, o valor da causa apurando-se a expressão econômica da relação jurídica material que o autor quer opor ao réu. O valor do objeto ime-diato pode influir nessa estimativa, mas nem sempre será decisivo”.

É forte em nossa jurisprudência nos Tribunais Superiores15, dando inter-pretação ao art. 253 do Código de 1973, cujo correspondente no atual diploma é o art. 292, que o valor atribuído ao pedido de dano moral e também do dano material é tão somente um norte para o valor da causa, um parâmetro para

12 O pedido é o núcleo da petição inicial; a providência que se pede ao Poder Judiciário; a pretensão material deduzida em juízo (e que, portanto, vira pretensão processual); a consequência jurídica (eficácia) que e pretende ver implementada por meio da atividade jurisdicional. É, como dito alhures, o efeito do fato jurídico posto como causa de pedir (DIDIER, Jr. Fredie. Curso de direito processual civil. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. 8. ed. Bahia: JusPodivm, v. I, 2007. p.383).

13 CPC/2015: “Art. 84 [...] § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: [...]”.

14 JUNIOR, Humberto Theodoro. Curso de direito processual civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, 2009.

15 “Nas ações de indenização por danos morais e materiais, o montante estimado pelo autor a título de indenização na exordial serve como parâmetro para a fixação do valor da causa, nos termos do artigo 258 do CPC” (STJ-RJTAMG 85/384). Assim, e o autor pede “um valor mínimo para a indenização por danos morais, não pode atribuir à causa valor menor” (STJ-RT 780/198) (NEGRÃO, Theotonio; F. GOUVÊA, José Roberto; A. BONDIOLI, Luis Guilherme; N. DA FONSECA, João Francisco. Novo código de processo civil e legislação em vigor – Anotações à Lei nº 13.105/2015. 47. ed. Saraiva, 2016. Anotações ao art. 292, 23c. p. 357).

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sua fixação. A nova redação e a inserção da regra estabelecida no inciso V do art. 292 não altera este aspecto.

Alguns têm dado interpretação ao dispositivo em questão (inciso V do art. 292), no sentido de que agora deve o autor formular pedido certo, não sendo cabível o genérico16, quanto a sua pretensão de reparação, contrariando entendimento consolidado junto ao Superior Tribunal de Justiça.

É equivocado, data máxima vênia aos que discordam, dizer que o novo dispositivo processual que pede seja dado o exato valor da indenização preten-dida possa vincular o pedido e que, portanto, este deve ser certo, não admitin-do-se que se formule pretensão mínima ou que se peça, de forma subsidiária, outro valor, pois, em se tratando de dano moral, como anteriormente dito, com dúplice objetivo (reparatório e punitivo-pedagógico), cabe ao Magistrado fixar o quantum debeatur, ainda que não atenda ao entendimento do autor, o quantum pretendi.

É neste sentido que “cabe ao magistrado, na fixação do valor atribuído à causa nas ações de indenização por dano moral, agir com a máxima prudência e parcimônia, de modo a se evitar exageros e possível desequilíbrio e/ou emba-raçamento ao exercício do direito de defesa: [...]”17.

Como já demonstrado18, há escritos no sentido ser necessário que se dê valor ao pedido, não se admitindo a generalidade mesmo em caso de dano moral19, e existem valiosos julgados agasalhando esta tese20, mas o pedido em si é o de indenização pelo dano moral, e o quantum debeatur somente poderá ser fixado após a devida cognição exauriente, mesmo que se admita julgamen-to antecipado ou que se trate de dano in re ipsa, o que nos leva a dizer que, em tema de dano moral é sim, ainda, admissível o pedido genérico, na forma do § 1º21 do art. 324 e até subsidiário ou alternativo, pela previsão contida no art. 32622, ambos no novo CPC.

16 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo código de processo civil – Lei nº 13.105/2015. 2. ed. rev. atual. ampl., Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2015. p. 226.

17 RF 364/377. No mesmo sentido: Bol. AASP 2.002/146j (NEGRÃO, Theotonio; F. GOUVÊA, José Roberto; A. BONDIOLI, Luis Guilherme; N. DA FONSECA, João Francisco. Op. cit. Anotações ao art. 292, 23c. p. 358.

18 Vide nota de rodapé nº 2.19 DIDIER JR., Fredie. Op. cit., p.373. 20 É de rigor que o pedido de indenização por danos morais seja certo e determinado, para que não fique somente

ao arbítrio do juiz a fixação do quantum, como também para que seja dada ao réu a possibilidade de contrariar a pretensão do autor de forma pontual, com objetividade e eficácia, de modo a garantir-lhe o direito à ampla defesa e ao contraditório”(RT 761/242). Também contra: JTJ 208/203, 350/66 (AI 990.10.010585-0) (NEGRÃO, Theotonio et al. Op. cit. Anotações ao art. 34: 5. p. 399.

21 CPC/2015: “Art. 324. O pedido deve ser determinado. 1º É lícito, porém, formular pedido genérico: I – nas ações universais, se o autor não puder individuar os bens demandados; II – quando não for possível determinar, desde logo, as consequências do ato ou do fato; III – quando a determinação do objeto ou do valor da condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu”.

22 CPC/2015: “Art. 326. É lícito formular mais de um pedido em ordem subsidiária, a fim de que o juiz conheça do posterior, quando não acolher o anterior. Parágrafo único. É lícito formular mais de um pedido, alternativamente, para que o juiz acolha um deles”.

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É necessário diferenciar o quantum pretendi do quantum debeatur. O primeiro reflete a pretensão contida nos fundamentos e pedido da inicial, en-quanto que o segundo é aquele que foi definido em sentença23, que pode ser diverso do valor pretendido pelo autor, obedecida a regra quanto ao limite do pedido, na forma do art. 492 do CPC24.

E o artigo do novel Código de Processo Civil que trata da valoração da causa, inclusive quando se tratar de dano moral, vem justamente dizer isto, que se deve dar valor, que se sugere seja seguindo o atual entendimento quanto ao tema junto aos tribunais superiores, mas em momento algum proíbe o pedido mínimo e/ou lhe retira a generalidade no que diz respeito ao valor a ser definido por sentença.

Aliás, é importante lembrar que, se na Justiça Comum, em que a matéria que diz respeito à indenização pelo dano moral e seu valor já se encontra há muito tempo sendo discutida, havendo certa jurisprudência uniforme em alguns casos, como ocorre nas negativações de nome de forma indevida junto aos chamados órgãos de proteção ao crédito, é certo que na seara do direito do tra-balho ainda há muito que se caminhar em tal sentido, não havendo que se falar nesta mesma uniformidade, o que torna praticamente impossível, atualmente, que se busque certo parâmetro jurisprudencial para o pedido.

Além disto, em se falando de Justiça do Trabalho e acesso, sabe-se que não há necessidade de que a parte, seja autor reclamante ou réu, reclamado, estejam representados por advogado (art. 791, caput25), o que demonstra ser inviável exigir-se que qualquer uma delas tenha conhecimento técnico sufi-ciente para compreender a dúplice natureza da prestação indenizatória, em se tratando de dano moral.

É bem clara a redação do art. 292, V, do novo CPC no sentido de que se deve dar valor à causa, valor este certo (ou seja, o que se pretende), mesmo nos casos em que o objeto não seja de fácil aferição ou, como diz o novo Diploma Processual, não seja imediatamente aferível.

O autor precisa dizer qual o valor que entende ser justo para si, isto pela leitura do art. 291 do CPC26, e esta obrigação também ocorre em sede de pedido de danos morais, porém isto não quer dizer que, para este tipo de lesão, se ônus

23 CPC/2015: “Art. 491. Na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso, salvo quando: [...]”.

24 CPC/2015: “Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado”.

25 CLT: “Art. 791. Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final”.

26 CPC/2015: “Art. 291. A toda causa será atribuído valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediatamente aferível”.

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do autor dar o quantum debeatur, pois, repete-se, são diversas as variáveis a serem observadas pelo julgador na aferição do valor da indenização, já que não se trata de simples prova material e exata do valor.

3 o proCedImento – pedIdo mÍnImo, GenÉrICo, suBsIdIÁrIo e alternatIVo

Partindo-se da afirmação de que, então, ainda que a nova regra proces-sual estabeleça que o valor da causa, nas ações de dano moral, deve representar o valor pretendido, ou seja, é obrigatório que o autor expresse o valor que no seu entender é justo, tal procedimento não poderá por si só vincular o pedido ou a decisão, servindo tão somente como um parâmetro.

Ainda que se diga qual o valor pretendido, não se estará abandonando a generalidade, pois pode o autor deduzir pedido mínimo, cabendo ao julga-dor decidir se este é justo, se deve ser menor ou, ainda, em havendo pedido subsidiário, se para alcançar a função punitiva-pedagógica deve ser superior ao pretendido pela vítima.

Sobre o pedido genérico e o bem da vida que se pretende buscar prote-ção pela tutela jurisdicional, leciona Wambier27:

Quanto ao pedido mediato, este deverá ser determinado quando a extensão do bem da vida postulado puder, desde logo, ser delimitada. Todavia, pode o pe-dido mediato, quando não determinado, ser oportunamente determinável, se tal fixação for impossível no momento da propositura da demanda. A isto o Código chamou de pedido genérico.

Como já dito e demonstrado anteriormente28, alguns dos argumentos en-contrados, no sentido de que a parte deve indicar o valor pretendido e que este é certo, determinado e não comporta majoração, baseiam-se no fato de que existe numeroso material nos Tribunais Pátrios que realmente podem nos indi-car um parâmetro para este pedido. Mas, lembremo-nos, não estamos falando de decisões sumuladas, precedentes ou demandas repetitivas, conforme o rol estampado no art. 927 do CPC/2015 e seus incisos29.

Tais decisões, como já insistentemente dito, servem como um parâmetro para o pleito do autor e este pode entender que merece um mínimo indenizável que, por sua vez, estará sujeito à cognição exauriente, com análise específica do

27 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de direito civil. 8. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 1, 2006. p. 281.

28 Vide nota de rodapé nº 2.29 CPC/2015: “Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em

controle concentrado de constitucionalidade; II – os enunciados de súmula vinculante; III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados”.

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seu caso e, então, definição do valor. O autor não possui capacitação técnica de dar certeza ao seu pedido, no muito, pode tão somente limitá-lo, dizendo que quer tal valor e pronto, ou um valor mínimo, e, ainda, optar por incluir pedido subsidiário, para que o Magistrado arbitre em não sendo atendido o primeiro.

Cabe, portanto, e é perfeitamente admissível, o pedido de um mínimo indenizatório ou, ainda, na forma do que permite o art. 326 do CPC/2015, pedi-do subsidiário, cujo valor da causa será o mesmo do pedido principal (art. 292, VIII, do CPC/2015), para que, na impossibilidade de atendimento do principal, fixar o juiz, segundo seu juízo, o quantum que entender irá significar efetiva30 entrega da tutela reparatória e com a devida observância da função punitiva--pedagógica da indenização.

ConClusão

Conclui-se pelo singelo estudo que, quando o legislador determinou a regra de que o valor da causa, mesmo nos pedidos de dano moral, será o valor pretendido, não significa dizer que limitou seu interesse, podendo este pedir valor mínimo ou, ainda, utilizar-se do pedido subsidiário e/ou alternativo.

A fixação do quantum indenizatório pode ser feita pelo lesado de uma forma indicativa e de acordo com os parâmetros obtidos das diversas decisões exaradas nos Tribunais deste País, porém tais valores não vinculam seu inte-resse, pois não há como saber com absoluta certeza se, analisados todos os elementos necessários para a tutela, se o valor declarado na inicial corresponde realmente ao valor a ser acatado pelo julgador no caso concreto.

O dano moral, possuindo dupla natureza, sob a ótica de sua finalidade reparatória e pedagógica, estará sujeito à avaliação do Estado-juiz, que não só pretenderá dar a tutela ao particular, mas também atender ao interesse público, especialmente naquelas causas em que o direito material encontra amparo em fundamentos constitucionais ou em que está em jogo matéria de ordem pública ou interesses não renunciáveis, estes mais presentes em se tratando das lides trabalhistas.

referÊnCIas

DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. Teoria geral do processo e proces-so de conhecimento. 8. ed. Bahia: JusPodivm, v. I, 2007.

NEGRÃO, Theotonio; F. GOUVÊA, José Roberto; A. BONDIOLI, Luis Guilherme; N. DA FONSECA, João Francisco. Novo código de processo civil e legislação em vigor – Anotações à Lei nº 13.105/2015. 47. ed. Saraiva, 2016.

30 CPC/2015: “Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

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NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo código de processo civil – Lei nº 13.105/2015. 2. ed. rev. atual. ampl., Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2015.

SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral indenizável. 3. ed. São Paulo: Método, 2001.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, 2009.

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de direito civil. 8. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 1, 2006.

ZANON JUNIOR, Orlando Luiz. Danos morais: modalidades. Jus Navigandi, Teresi-na, a. 18, n. 3712, 30 ago. 2013. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/25184>. Acesso em: 17 maio 2016.

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Assunto Especial – Doutrina

Valor da Causa – Dano Moral – Novo CPC

Valor da Causa no Novo CPC

eDuARDO henRIque De OLIveIRA YOShIkAwAAdvogado, Mestre e Doutorando em Direito Processual pela USP. Autor do livro Execução Extrajudicial e Devido Processo Legal.

À semelhança de seu antecessor, o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) continua a disciplinar, sob vários aspectos, o valor da causa, a ele dedicando um título próprio, composto de 3 artigos, e mencionando-o em outros 18.

Como ressaltamos em monografia sobre o tema (Valor da causa, Dialé-tica, 2008), no CPC/1973, o valor da causa mostrava-se relevante em razão de sua repercussão sobre os seguintes temas: a) custas judiciais; b) competência; c) procedimento; d) revisão das decisões judiciais (remessa necessária); e) san-ções pecuniárias; f) honorários de sucumbência. Embora tais funções continuem a existir no CPC/2015, algumas tiveram sua importância diminuída e outras au-mentada, como se verá mais adiante.

O valor da causa (expresso em moeda nacional) continua a ser elencado como requisito da petição inicial (art. 319, V, do CPC), seja de ação, seja de re-convenção (agora expressamente mencionada pelo caput do art. 292) ou do pe-dido de tutela antecipada requerida em caráter antecedente (art. 303, § 4º), cuja ausência pode levar à extinção do processo. Diante das repercussões do valor da causa, como visto anteriormente, outra realmente não poderia ser a solução. Para tanto, continua o Código a afirmar a indispensabilidade de atribuição de valor a todas as causas, ainda que sem “conteúdo econômico imediatamente aferível” (art. 291), o que abrange tanto os casos de direitos patrimoniais (pedi-do genérico) como os não patrimoniais (direitos da personalidade). De forma a nosso ver contraditória, porém, encontra-se no Código referência a causas de valor “inestimável” (art. 85, § 8º), expressão que sugeriria a possibilidade de não se atribuir valor à causa, em violação da regra anteriormente citada. Melhor te-ria sido falar em valor “estimatório” ou “simbólico”, expressões encontradas na doutrina e na jurisprudência para se referir aos casos sem conteúdo econômico imediatamente aferível.

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No tocante às regras de determinação do valor da causa, que concreti-zam a diretriz estabelecida no art. 291, poucas foram as alterações. No inciso I, que trata das ações de cobrança, incluiu-se, de forma expressa, a necessidade que o valor do principal esteja atualizado, o que, na prática, já existia. No inciso II, que trata das ações cujo objeto seja um ato jurídico, o Código consagrou en-tendimento doutrinário e jurisprudencial de que, se o litígio não disser respeito ao ato como um todo, mas apenas à parte dele (por exemplo, declaração de nulidade de apenas uma cláusula contratual), o valor da causa deverá levar em consideração apenas a parte controvertida. No inciso IV, que trata das ações de divisão, demarcação ou reivindicação, não se fala mais em “estimativa oficial para lançamento do imposto”, e sim em “valor de avaliação da área ou bem objeto do pedido”. Finalmente, no inciso V, o Código passa a disciplinar o valor da causa nas ações de indenização, qualquer que seja o seu fundamento e a espécie do dano, estatuindo que, em qualquer hipótese, este corresponderá ao valor pretendido, inclusive em se tratando de dano moral. A mudança merece ser elogiada, por favorecer a moderação dos autores ao dimensionarem o pedi-do de indenização por danos morais, vez que, em caso de improcedência, uma estimativa exagerada pode se refletir no montante dos honorários de sucumbên-cia a serem pagos.

No que diz respeito ao controle do valor da causa, o CPC/2015 alterou substancialmente o modelo anterior. Em primeiro lugar, admite expressamente (art. 292, § 3º) a correção de ofício do valor da causa pelo juiz “quando verifi-car que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido”, permitindo que o juiz desde logo arbitre o novo valor e, se for o caso (quando o valor da causa for utilizado como base de cálculo), determine o recolhimento das custas correspondentes. O dispositivo não esta-belece limite temporal ao exercício deste poder-dever, mas, não obstante, con-tinuamos a entender que a alteração do valor da causa de ofício somente po-derá ocorrer até o saneamento do processo (art. 357 do CPC), ficando preclusa para o juiz a partir deste momento. De outro lado, o Código continua a permitir a impugnação do valor da causa pelo réu, porém não mais por meio de um in-cidente processual (impugnação ao valor da causa), que deixou de existir, mas como matéria preliminar da contestação (art. 337, III), sob pena de preclusão. A decisão que vier a ser proferida, alterando ou não o valor da causa, não po-derá ser impugnada de imediato, vez que inadmissível o agravo de instrumento (art. 1.015 do CPC), devendo a parte interessada na sua reforma suscitar a ques-tão como preliminar em seu recurso de apelação ou nas respectivas contrarra-zões (art. 1.009, § 1º).

Valor da causa e custas judiciais: o Código não trata diretamente da re-percussão tributária do valor da causa, vez que a eleição da base de cálculo e das custas judiciais compete à legislação tributária da União (no tocante à Jus-

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tiça Federal e do Trabalho) e dos Estados e Distrito Federal (no caso da Justiça Estadual), a ela fazendo apenas referência em alguns dispositivos.

Valor da causa e competência: o CPC/2015 menciona a competência em razão do valor apenas no art. 63, que estabelece a possibilidade de eleição de foro, tendo sido suprimidas as referências que constavam dos arts. 91 e 102 do CPC/1973. A previsão acaba se tornando inócua, vez que a utilização do valor da causa como critério de determinação de competência há muito já não é encontrada no Código, mas em leis extravagantes (Juizados Especiais) ou de organização judiciária (foros regionais), sendo que, nesta hipótese, aliás, tem prevalecido o entendimento de que se trata de competência absoluta e não relativa.

Valor da causa e procedimento: com a extinção do rito sumário, subme-tendo-se todas as causas a um procedimento comum (art. 318), salvo previsão expressa em sentido contrário, praticamente é nenhuma atualmente a influência do valor da causa sobre o procedimento a ser adotado, ao menos do que diz res-peito aos disciplinados pelo Código de Processo e não em leis especiais (como as dos Juizados Especiais, em que o valor da causa continua sendo relevante). Resta apenas a regra do art. 664, que determina a adoção do rito simplificado do arrolamento para os inventários em que o valor dos bens do espólio (que deve ser o valor da causa) for igual ou inferior a 1.000 salários-mínimos.

Valor da causa e mecanismos de revisão das decisões: cedendo a argu-mentos cujo mérito nos parece mais do que duvidoso, o CPC/1975 manteve o reexame necessário (art. 496) das decisões proferidas contra as pessoas jurídicas de direito público, desde que o valor da condenação ou do proveito econômico obtido sejam líquidos e superiores a determinas quantias, diferentes para cada esfera de governo da Federação. À vista da regra do art. 291, segundo o qual o valor do proveito econômico deve corresponder ao valor da causa, ou esta ou o valor de eventual condenação (se líquida) deverá ser utilizado para os fins do art. 496.

Valor da causa e sanções processuais: no sistema revogado, havíamos manifestado a nossa discordância da eleição do valor da causa como base de cálculo das penalidades a serem aplicadas por ofensa à dignidade da justiça, reputando tal critério ineficiente e injusto (porque a sanção é nenhuma quando pequeno o valor e draconiana quando muito elevado) e defendendo a sua subs-tituição por valores previamente determinados, fixos ou variáveis. O CPC/2015, porém, enfrentou apenas parte do problema e apenas quanto a uma das multas, estabelecendo, no art. 81, § 2º, que, quando o valor da causa fosse irrisório ou “inestimável”, a multa por litigância de má-fé seria arbitrada em até 10 (dez) salários-mínimos. No mais, não apenas manteve tal critério, como criou novas hipóteses de multa (art. 334, § 8º, art. 702, § 10). A única limitação ao valor de

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multa atrelada ao valor da causa aparece na disciplina da ação rescisória, em que o § 2º do art. 968 determina que o depósito exigido para a propositura da rescisória (que se converte em multa em caso de julgamento unânime desfavo-rável ao autor) não poderá ser superior a 1.000 salários-mínimos.

Valor da causa e honorários de sucumbência: adotando critério que, ape-sar de não previsto pelo CPC/1973, era largamente adotado pela jurisprudência, o CPC/2015 estabelece, em determinadas hipóteses, que o valor da causa seja parâmetro para a fixação dos honorários de sucumbência devidos pela parte vencida ao patrono do seu adversário. O valor da causa deverá ser considerado, subsidiariamente, quando a sentença não contiver condenação líquida ou pro-veito econômico mensurável (art. 85, §§ 2º e 4º, III). O valor da causa também é utilizado pelo parágrafo único do art. 338, o qual determina que o autor que reconhecer a ilegitimidade de parte arguida pelo réu e proceder à retificação do polo passivo pagará ao advogado do réu honorários variáveis entre 3% e 5% do valor da causa, salvo se este for irrisório.

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Parte Geral – Doutrina

Duração Razoável do Processo e Sua Aplicação no Novo Código de Processo Civil

CARLOS henRIque SOAReS1

Doutor e Mestre em Direito Processual Civil pela PUC-Minas, Professor da PUC-Minas de Di-reito Processual Civil – Barreiro (Graduação e Pós-Graduação), Coordenador de Curso de Pós--Graduação em Direito Processual Civil do IEC-PUC-Minas, Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do Instituto Pan-americano de Derecho Procesal (IPDP), do Instituto de Direito de Língua Portuguesa (IDILP) e do Instituto dos Advogados de Minas Gerais (IAMG), Advogado e Sócio da Pena, Dylan, Soares & Carsalade Sociedade de Advogados. Escritor de diversas obras e artigos jurídicos. Palestrante.

SUMÁRIO: 1 Breve análise da situação judiciária brasileira; 2 Breve análise histórica da garantia à razoável duração do processo; 3 Duração razoável do processo – Imprecisão do termo; 4 Tempes-tividade procedimental e jurisdicional – Pressuposto processual constitucional; 5 Análise normativa do novo Código de Processo Civil para a garantia da tempestividade procedimental e jurisdicional; Conclusões; Referências.

1 BreVe anÁlIse da sItuação JudICIÁrIa BrasIleIra

Não é de hoje que a realidade judiciária brasileira vem recebendo inú-meras críticas por parte de todos os operadores do Direito. Tais críticas sempre se voltam ao procedimento jurisdicional, à atuação das partes, à burocracia procedimental, ao número exagerado de recursos, à participação do advogado e à morosidade judicial e procedimental.

A partir de 2009, o Conselho Nacional de Justiça, órgão fiscalizador do Judiciário e corregedor, para entender plenamente o Judiciário brasileiro e a sua realidade, começa a promover uma série de pesquisas quantitativas e qualita-tivas, permitindo conhecer os problemas e apontar as soluções que pudessem transformar o Judiciário brasileiro em um órgão mais eficiente.

Assim, diante da assinatura do chamado II Pacto Republicano de Estado por um sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo2, foram incluídas algu-mas diretrizes para incrementar o acesso à justiça, especialmente para os mais necessitados, com a busca do aprimoramento da prestação jurisdicional, com a garantia da razoável duração do processo, a prevenção de conflitos e o fortale-

1 E-mail: [email protected] Relatório do Conselho Nacional de Justiça do ano de 2009. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/

programas-de-a-a-z/eficiencia-modernizacao-e-transparencia/pj-justica-em-numeros/relatorios>. Acesso em: 6 set. 2014.

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cimento das instituições de Estado para uma maior efetividade do sistema penal no combate à violência e à criminalidade.

Tais informações sobre o Judiciário brasileiro, anualmente, mostram a realidade judiciária brasileira e permitem desenvolver políticas públicas no sen-tido de resolver o pior problema que os brasileiros enfrentam, qual seja, a au-sência de prestação jurisdicional ou sua contumaz morosidade procedimental e judicial.

No ano de 2009, conforme Relatório do CNJ3, percebe-se que as despe-sas totais da Justiça (Federal, Trabalhista e Estadual) somaram o montante de R$ 37,3 bilhões, indicando que o Brasil tem um gasto com o Judiciário de 1,2% do Produto Interno Bruto nacional (PIB).

Segundo o próprio relatório do CNJ do ano de 2009:

Para determinar se os gastos do Judiciário são elevados, sob uma perspectiva mundial, pode-se compará-los aos gastos dos Estados Unidos. Apesar de adotar a tradição da Common Law, o Judiciário norte-americano possui uma estrutu-ra judiciária similar à brasileira, em virtude de também ser uma federação de proporções continentais. Em 20064, os EUA gastaram US$ 46 bilhões em todos os níveis de Justiça (Estadual e Federal), o que representaria R$ 82 bilhões em valores atualizados (ou seja, mais do que o dobro do gasto brasileiro, da ordem de R$ 37,3 bilhões).5

Uma pequena ressalva há que se apontar na comparação feita pelo CNJ sobre os gastos dos Judiciários brasileiro e norte-americano, qual seja, enquan-to o Judiciário brasileiro gasta 1,2% do PIB, os Estados Unidos, mesmo com o dobro de orçamento em relação ao seu PIB, gasta no Judiciário menos de 0,8%. Isso revela que, em números absolutos, o Judiciário norte-americano gasta mais, mas, se compararmos com o número de processos e pessoas, bem como com a relação junto ao PIB norte-americano, chegaremos à conclusão de que o Brasil gasta mais e pior os recursos que possui para o Judiciário brasileiro.

O Judiciário brasileiro está com o seu orçamento totalmente comprome-tido com despesas com pessoal (recursos humanos), sem recursos financeiros para novos investimentos e para modernização. Apenas por curiosidade, se o orçamento do ano de 2009 para o Judiciário brasileiro totalizou o valor de R$ 37,3 bilhões de reais, somente com o pagamento de pessoal foi gasto nesse ano a quantia aproximada de R$ 35 bilhões de reais. Ou seja, todo o orçamento do Judiciário está comprometido com o gasto e o pagamento de pessoal (magis-

3 Idem, p. 174.4 Último dado disponível do U.S. Bureau of Judicial Statistics.5 Relatório do Conselho Nacional de Justiça do ano de 2009. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/

programas-de-a-a-z/eficiencia-modernizacao-e-transparencia/pj-justica-em-numeros/relatorios>. Acesso em: 6 set. 2014, p. 174.

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trados e servidores), não sobrando quase nada para investimento em moderni-zação e reestruturação6.

Com essa pequena informação sobre os recursos financeiros do Judiciá-rio brasileiro já é possível perceber que, infelizmente, precisamos modificar a estrutura organizacional do Judiciário, a forma de investimento e a quantidade de investimento. Se quisermos evoluir na prestação jurisdicional, essa evolução passa por mais recursos financeiros e a sua melhor aplicação no Judiciário.

Segundo o relatório do CNJ do ano de 2009, o Brasil e o Judiciário pos-suíam, em média, 8 juízes por 100 mil habitantes. Esse dado, visto isoladamen-te, pode parecer que estamos dentro de um média razoável de juízes por ha-bitantes, mas, se comparados com outros países, infelizmente estamos abaixo, especialmente com relação aos países da Europa, como é o caso da Espanha, com 10,1 magistrados por 100 mil habitantes; da Itália, que possui 11 magis-trados por 100 mil habitantes; e da França e de Portugal, que possuem 11,9 magistrados e 17,4 magistrados por 100 mil habitantes, respectivamente7.

Tramitaram nos três ramos da Justiça cerca de 86,6 milhões de processos em 2009, com a soma dos casos novos com o dos processos pendentes de bai-xa8. No entanto, a avaliação de números absolutos de casos novos e número de juízes não revela dados interessantes. O importante é saber se os casos ajuiza-dos e os pendentes estão tendo o devido andamento e a devida prestação juris-dicional. É com o dado sobre a taxa de congestionamento judicial que podemos verificar a efetividade processual e judicial e a garantia do acesso à justiça e da razoável duração do processo.

O índice sobre a taxa de congestionamento processual do ano de 2009, que leva em consideração que os mesmos devem ser resolvidos, em primeiro grau de jurisdição, no prazo máximo de 1 ano. Caso isso não ocorra, verifi-camos que se soma à taxa de congestionamento para o próximo ano. Assim, em 2009, a taxa de congestionamento global da Justiça brasileira foi de 71%, percentual que tem se revelado estável desde 2004. A cada 100 casos novos, apenas 29 são resolvidos no primeiro ano, ficando o restante para os anos pos-teriores.

A Justiça Estadual apresentou taxa de congestionamento de 73% e é a maior responsável para uma taxa global tão expressiva, uma vez que os demais ramos de Justiça apresentaram-se abaixo da média auferida. Destaque para a Justiça do

6 Idem, p. 175.7 Vide Relatório European Judicial Systems (2008), p. 110, editado pelo European Commission for the

Efficiency of Justice – Cepej (ou Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça, em português).8 Relatório do Conselho Nacional de Justiça do ano de 2009. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/

programas-de-a-a-z/eficiencia-modernizacao-e-transparencia/pj-justica-em-numeros/relatorios>. Acesso em: 6 set. 2014, p. 177.

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Trabalho, que apresentou uma taxa de 49%, mais uma vez mostrando-se como o ramo do Judiciário que atende com maior celeridade aos jurisdicionados.

[...]

Analisando os dados por grau de jurisdição, verifica-se que, em todos os ramos de Justiça, o principal gargalo está no total de processos que não são finalizados na 1ª instância. De cada cem processos em tramitação, apenas 24 foram finali-zados até o final do ano. Destaque para a Justiça Estadual, que apresentou taxa de congestionamento de quase 80% em 2009.9

Segundo o relatório de 2009 do CNJ, ainda é possível verificar que a taxa de congestionamento na fase de conhecimento da Justiça Estadual na 1ª instân-cia (1º grau e juizados especiais) totalizou 62,1% em 2009, percentual próximo ao da Justiça Federal de 1º grau (58%). Em relação à taxa de congestionamento na fase de execução, observa-se que o congestionamento é bem superior à fase de conhecimento, e, na média geral, o indicador atingiu, na primeira instância das Justiças Federal e Estadual, os valores de 81% e 90%, respectivamente10.

De posse dessas informações, verificamos que o Judiciário brasileiro pre-cisa de profunda reforma e modificação, não apenas de legislação processual, mas, sobretudo, de inúmeros investimentos e novas propostas de gestão e de implementação de metas para serem buscadas11. Infelizmente, a produtividade dos magistrados brasileiros é pequena e fraca no objetivo de obter êxito na di-minuição da taxa de congestionamento processual.

Segundo o Relatório do CNJ de 2009, em média cada magistrado julgou 1.439 processos12. No entanto, verificando a questão de um ponto um pouco mais profundo e refletindo sobre o presente número, é fácil constatar que o nú-mero de casos julgados por magistrados não revela a qualidade dos julgamentos e quantas foram as sentenças terminativas, que, obviamente, nos termos do art. 267 do CPC, não resolveram o mérito da questão posta em juízo, e que po-

9 Idem, p. 178.10 Idem, p. 179.11 Cf. Relatório do CNJ de 2009: “Cumpre destacar que, atento à questão da morosidade judicial, o CNJ lançou,

em 2009, a Meta nº 2, a qual tinha por objetivo principal eliminar os estoques de processos responsáveis pelas altas taxas de congestionamento. A Meta nº 2/2009 consistia em identificar os processos judiciais mais antigos e estimulava a adoção de medidas concretas para o julgamento de todos os distribuídos até 31.12.2005 (em 1º, 2º grau ou tribunais superiores). Durante o ano de 2009, foram julgados (nos Tribunais Regionais Federais, nos Tribunais Regionais do Trabalho e nos Tribunais de Justiça dos Estados) cerca de 2,5 milhões de processos referentes à Meta nº 2/2009, cujo universo, por fazer restrição a algumas classes processuais, não abrange a totalidade dos dados analisados na Justiça em números. Desse modo, cabe distinguir que, enquanto no presente relatório constam 61,1 milhões de processos pendentes (de baixa) no início do ano de 2009, os processos pendentes (de julgamento) da Meta nº 2/2009 referiam-se a um acervo de 4,4 milhões de processos (ou seja, apenas 7% do total). Por esse motivo, não se pode concluir que as alterações da litigiosidade ocorridas entre 2008 e 2009 foram consequência exclusiva da Meta nº 2/2009; pois, na verdade, também houve mudanças de metodologia trazidas pela Resolução CNJ nº 76, que atualmente rege a Justiça em números” (Idem, p. 179).

12 Idem, p. 181.

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dem mostrar uma produtividade alta, mas sem eficácia alguma, pois o problema a ser resolvido ainda fica pendente.

Vamos verificar que, nos próximos dados, novos elementos serão tra-zidos para a avaliação do Judiciário brasileiro, bem como também teremos a constatação de que os números judiciários não estão revelando uma melhora qualitativa e qualitativa da atividade jurisdicional, e isso implica diretamente na questão de garantia dos princípios processuais do contraditório, da ampla defe-sa, da isonomia, do devido processo legal, da celeridade e da razoável duração do processo. Se o Judiciário não modificar a estrutura, será cada dia mais difícil implementar uma prestação jurisdicional de qualidade.

Analisando o relatório de 2010 do CNJ sobre o Judiciário brasileiro, e fazendo a comparação com o ano de 2009, já percebemos, em primeira mão, que houve um aumento dos gastos com o Judiciário brasileiro, especialmente na “justiça estadual”, com um aumento de 7% em relação ao ano de 200913. Na justiça federal e do trabalho, praticamente se mantiverem estável, sem al-terações significativas. Portanto, aumentaram os gastos do Judiciário estadual em 7%, totalizando o valor de 23,88 bilhões de reais, mas isso não refletiu em melhoria para a prestação de serviços judiciários, pois os valores aumentados, como ocorreu em 2009, foram destinados para o pagamento de pessoal, recur-sos humanos e pouco em infraestrutura e informatização.

É necessário ressaltar que não houve um aumento significativo de pessoal do Judiciário brasileiro de 2009 para 2010. Isso significa dizer que as despesas com pessoal se mantiveram estagnadas, mas, também, nada de inovação e de infraestrutura promoveu a modificação da realizada jurisdicional brasileira.

Interessante observar que no ano de 2010 o número de casos novos por magistrados diminuiu. Em 2009, o número de casos novos era de 1.505 casos novos por magistrado estadual; já, em 2010, esse número passou para 1.399 ca-sos novos por magistrado estadual. No que tange à magistratura federal e do tra-balho, também verificamos uma pequena, mas interessante, redução. Vejamos o gráfico 5.10 do relatório do CNJ de 2010, abaixo, que confirma tais dados14:

No entanto, em que pese a diminuição do número de casos novos por magistrados, isso não refletiu na melhoria da sua produtividade. Pelo contrário, seria óbvio se esperar que houvesse a diminuição de casos novos, mais rapida-mente os casos antigos seriam decididos. Tal fato não se verificou na prática, pois o que verificamos no gráfico 5.11 do relatório do CNJ de 2010 foi justa-mente o contrário, ou seja, uma diminuição do número de sentenças proferidas

13 Relatório do Conselho Nacional de Justiça do ano de 2010. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas-de-a-a-z/eficiencia-modernizacao-e-transparencia/pj-justica-em-numeros/relatorios>. Acesso em: 6 set. 2014, p. 173.

14 Idem, p. 177.

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por magistrado no ano. No Judiciário estadual, a diminuição foi significativa, pois no ano de 2009 cada magistrado exarava 1.483 sentenças (terminativas ou definitivas) e no ano de 2010 o número reduziu para 1.326. Já, no Judiciário federal, houve um pequeno aumento, passando de 1.024 sentenças, em 2009, para 1.108, em 2010; e no Judiciário trabalhista também verificamos uma invo-lução, sendo que cada magistrado exarou, no ano de 2009, 1.746 sentenças e, no ano de 2010, diminuiu para 1.641 sentenças15. Ou seja, verificamos pelos dados abaixo que a produtividade judiciária brasileira vem caindo e interferin-do na produtividade e na taxa de congestionamento processual, que a cada ano se agrava.

Com tais números, verificamos que a taxa de congestionamento proces-sual do Judiciário brasileiro, em média, ainda está superior a 70% anualmente, o que faz do Brasil, em termos absolutos, o País que mais possui morosidade processual e violação ao princípio da duração do processo em prazo razoável16.

Entre 2009 e 2010, observou-se um aumento da taxa de congestiona-mento da Justiça da ordem de 2,6%. A Justiça Estadual foi a principal respon-sável por esse aumento, pois nesse ramo a taxa subiu de 68% para 72%. O mesmo indicador diminuiu na Justiça Federal, de 70% para 69%, e na Justiça do Trabalho, com redução de 50% para 48%. Um olhar mais detido sobre o in-dicador revela que o maior gargalo encontra-se na fase de execução do 1º Grau da Justiça Estadual, onde a taxa de congestionamento chega a 89,8%. Análise ainda mais específica revela que as execuções fiscais respondem pela maior parte desta taxa, com um congestionamento de 91,6%17.

Mais uma vez, com tais dados, podemos indicar que o retrato do Judiciá-rio brasileiro não é nada promissor, quando se pretende destacar a celeridade processual e a razoável duração do processo como índices de qualidade. Infe-lizmente, o Brasil vem repetindo, a cada ano, números de congestionamento processual da ordem de 70%, que revelam estagnação e ausência de ruptura com modelos antigos e defasados de resolução de casos.

É preciso mais do que apenas investimento em pessoal, mais que técnicas modernas de informáticas para diminuir a taxa de congestionamento e na pro-dutividade dos magistrados. Tais pontos serão abordados em outro tópico; no entanto, já fica apresentado que precisamos, muito rapidamente, se quisermos resolver o problema da duração razoável do processo, investir no Judiciário, mas, também, em todas as funções públicas fiscalizatórias e regulatórias dos serviços públicos. Sem essa organização, as lesões aos direitos só encontraram

15 Idem, p. 177.16 Idem, p. 178.17 Idem, p. 184.

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amparo no Judiciário, contribuindo para o aumento dos casos novos e para a taxa de congestionamento.

Para não repetir, todos os resultados dos relatórios do Conselho Nacional de Justiça sobre a precária situação judiciária brasileira, vamos analisar o rela-tório de 2014 (ano-base 2013)18, que, de forma continuada, revela uma situação atual e preocupante com o Judiciário brasileiro e com a efetiva prestação juris-dicional de qualidade, bem como com a razoável duração do processo.

Segundo o relatório de 2014 (2013), o total gasto pelo Poder Judiciário foi de, aproximadamente, R$ 61,6 bilhões, com crescimento de 1,5% em relação ao ano de 2012, e em 8,9% em relação ao último triênio (2011-2013). Essa despesa é equivalente a 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, 2,7% do total gasto pela União, pelos Estados e pelos Municípios no ano de 2013 e a R$ 306,35 por habitante. A despesa da Justiça Estadual é a maior de todas e representa mais da metade (55,2%) de todo o gasto do Poder Judiciário19.

Em linhas gerais, há um crescimento da litigiosidade de forma mais acen-tuada que os recursos humanos e as despesas. Enquanto que, no ano (2013), houve crescimento de 1,5% nos gastos totais, 1,8% no número de magistrados e 2% no de servidores, tramitaram cerca de 3,3% a mais de processos nesse período, sendo 1,2% a mais de casos novos e 4,2% de casos pendentes de anos anteriores. Já o total de processos baixados aumentou em apenas 0,1% em relação ao ano anterior, ou seja, o aumento na estrutura orçamentária, de pessoal e da demanda processual dos Tribunais não resultou, necessariamente, em aumento, proporcional, da produtividade20.

Tramitaram aproximadamente 95,14 milhões de processos na Justiça, sendo que, entre eles, 70%, ou seja, 66,8 milhões já estavam pendentes desde o início de 2013, com ingresso no decorrer do ano de 28,3milhões de casos novos (30%). É preocupante constatar o progressivo e constante aumento do acervo processual, que tem crescido a cada ano, a um percentual médio de 3,4%. Some-se a isto o aumento gradual dos casos novos, e se tem como resul-tado que o total de processos em tramitação cresceu, em números absolutos, em quase 12 milhões em relação ao observado em 2009 (variação no quinqu-ênio de 13,9%). Apenas para que se tenha uma dimensão desse incremento de processos, a cifra acrescida no último quinquênio equivale à soma do acervo total existente, no início do ano de 2013, em dois dos três maiores Tribunais da Justiça Estadual, quais sejam: TJRJ e TJMG21.

18 CNJ. Justiça em números 2014: ano-base 2013, Brasília: CNJ, 2014. 395 f. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas-de-a-a-z/eficiencia-modernizacao-e-transparencia/pj-justica-em-numeros/relatorios>. Acesso em: 6 set. 2014.

19 Idem, p. 32.20 Idem, p. 34.21 Idem, p. 34.

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Quanto aos Indicadores de Produtividade dos Magistrados (IPM) e Indica-dores de Produtividade dos Servidores (IPS), houve redução em ambos os casos no último ano. O IPS passou de 102 para 100 processos baixados por servidor (-1,8%) e o IPM de 1.712 para 1.684 processos baixados por Magistrado (-1,7%) entre 2012 e 2013. Como uma das derivações da redução desses dois indica-dores, percebe-se que a taxa de congestionamento passou de 70% para 70,9%, ou seja, de 100 processos que tramitaram no ano de 2013, aproximadamente 29 foram baixados no período. A alta taxa de congestionamento é causada pela grande quantidade de processos pendentes na fase de execução da primeira ins-tância, tendo em vista que a taxa de congestionamento é de, aproximadamente, 86% nessa fase, enquanto que, na fase de conhecimento, o percentual cai para 60%. A taxa de congestionamento no segundo grau é a menor e registrou 47% de congestionamento em 2013, enquanto que a maior taxa foi registrada nos processos de execução de título extrajudicial fiscal 91%22.

Diante desse cenário, poderíamos deduzir que os problemas do Judiciá-rio brasileiro são: alta taxa de litigiosidade, baixa produção judicial, poucos juízes e alta taxa de congestionamento de processos. Essa realidade, para que possa ser modificada, deve partir de mudanças estruturais no Judiciário brasilei-ro, bem como de reformas processuais profundas, que, a um só tempo, garan-tam maior efetividade à prestação jurisdicional, segurança jurídica e celeridade procedimental e judicial.

De outro lado, o problema que buscamos resolver no presente artigo é justamente esse: Como conciliar as altas taxas de congestionamento processual (acima de 70%) verificadas no Judiciário brasileiro e a duração razoável do processo? Tal questionamento, diante da complexidade, não pode ser resolvido apenas com modificações de leis. Muitas leis no Brasil deixam de ser aplicadas por falta de estrutura administrativa para a sua implementação. Precisamos, an-tes de mais nada, buscar efetivas medidas políticas judiciárias que garantam aos cidadãos o devido acesso aos direitos.

Acesso aos direitos é diferente de acesso à justiça. Em que pese ambos busquem a aplicação efetiva dos direitos materiais, quando falamos em acesso aos direitos estamos falando em garantia de todos os direitos para todos, sem precisar, passar diretamente pelo Judiciário para a sua garantia e implemen-tação. Já, quando se fala em acesso à justiça, estamos falando em acesso à jurisdição, ou seja, acesso aos direitos materiais por meio de um procedimento jurisdicional.

22 Idem, p. 35.

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2 BreVe anÁlIse hIstÓrICa da GarantIa À raZoÁVel duração do proCesso

É possível afirmar que a duração razoável do processo está vinculada diretamente ao conceito de devido processo legal23. A difusão do processo com duração razoável iniciou-se nos Estados Unidos da América, que incluiu o ins-tituto da speedy trial clause (cláusula do julgamento rápido) junto à 6ª Emenda à Constituição dos Estados Unidos24.

Atualmente, a razoável duração do processo em vários ordenamentos jurídicos estrangeiros, especialmente na Itália (art. 111 da Constituição italiana). Na Alemanha, a doutrina desenvolveu o Beschleunigungsprinzip (princípio da aceleração)25.

No entanto, a consagração do princípio da duração razoável do processo foi justamente com a sua previsão na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, cujo parágrafo 47 enaltece que “toda pessoa tem direito a que sua casa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável”, o que foi reproduzido na Constituição europeia, em seu artigo II, 10726.

No Brasil, o princípio da razoável duração do processo não é novo. No Código de Processo Civil de 1973, já havia tal previsão, junto aos poderes do juiz, no art. 125 do CPC, determinando que deveria o juiz velar pela rápida solução do litígio. No CPC/1973, o juiz era o agente garantidor pela duração razoável do processo.

Mas, além desse artigo, temos a Convenção Americana de Direitos Hu-manos assinado no ano de 1969, que também prevê, nos arts. 7º, 5, e 8º, 1, o direito a um processo de duração razoável, e que também o Brasil foi signatário.

Com a assinatura do Pacto São José da Costa Rica, pelo Brasil, que versa-va sobre inúmeras questões, inclusive sobre direitos fundamentais, acabou en-trando no ordenamento jurídico brasileiro, for força do art. 60, § 4º, da CR/1988, a garantia da duração razoável do processo, que, para evitar qualquer discussão sobre constitucionalidade, foi positivado em norma constitucional pela Emenda Constitucional nº 45/2004 no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da Repú-

23 KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino. A razoável duração do processo. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2013. p. 35.

24 Idem, p. 37.25 Exemplo do esforço de aceleração na Alemanha é o §495ª da ZPO, incluído pela Gesetz zur Reform des

Zivilprozesses vom 27. Juli 2001, introduzindo o “Verfahren nach billigem Ermessen” (processo por juízo de equidade), com o seguinte teor: “§495ª. Processo por juízo de equidade. 1. O órgão judicial pode decidir o processo por juízo de equidade, quando o valor da causa não ultrapassar 600 euros. 2. A petição deve ser processada oralmente” (tradução nossa). Sobre o dispositivo, confira- se a lição de BAUMBACH, Adolf; LAUTERBACH, Wolfgang; ALBERS, Jan; HARTMANN, Peter. Zivilprozeβordnung: mit Gerichtsverfassngsgesetz und andaren Nebengesetzen. 64. Auflage. Münchem: C. H. Beck, 2006. p. 1624, nota 2: na qual se lê que a finalidade do dispositivo é clara: a simplificação (Verbilligung) do processo.

26 TAVARES, André Ramos. Reforma do Judiciário no Brasil pós-1988: (des)estruturando a Justiça. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 32.

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blica27, assegurando expressamente a todos os interessados, no âmbito judicial e administrativo, o direito à razoável duração do processo e aos meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Já no novo Código de Processo Civil brasileiro podemos perceber, nova-mente, uma preocupação enorme com a duração razoável do processo, tanto que, no capítulo que verse sobre “normas fundamentais do processo civil”, en-tre os arts. 1º ao 12, verificamos que a expressão “duração razoável do proces-so” aparece em duas oportunidades, quais sejam, no art. 4º e no art. 6º.

Assim, no art. 4º do novo CPC está dito que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade sa-tisfativa”. E no art. 6º do mesmo Código está prescrito assim: “Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. Isso significa que a responsabilidade pela duração razoável do processo não é mais somente do juiz, mas de todos os sujeitos processuais, que de alguma forma participam do processo (juiz, partes, advogados, terceiros e Ministério Público).

Há uma ligação entre o princípio da cooperação jurisdicional e o princí-pio da razoável duração do processo, e, portanto, o art. 6º do novo Código de Processo Civil fez questão de ressaltar. Segundo Teixeira de Sousa, o princípio da cooperação no ordenamento português não possui eficácia normativa direta capaz de agregar situações não previstas em regras ou subprincípios. Para o autor, a normatividade e a regulamentação constitucional e infraconstitucional são necessárias para a implantação e garantia da razoável duração do processo. Defende, ainda, que a sistemática de funcionamento da cooperação estrutura-se pela expressa previsão de regras que estabeleçam um plexo de deveres impos-tos ao magistrado: de esclarecimento, de prevenção, de auxílio e de diálogo28.

Portanto, para a duração razoável do processo é necessária a observância da cooperação ou colaboração, rompendo com o paradigma da responsabilida-

27 “Mesmo antes dessa inovação, muitos autores, como José Roberto Bedaque, Cândido Dinamarco e Barbosa Moreira, entre outros, haviam procedido a uma interpretação atualizada do art. 5º, XXXV, da CF/1988 – numa espécie, pois, de aggionarmento – para considerar-se que a garantia do direito de ação ali estampada incluía o direito à tutela jurisdicional a esta somente seria completa se se desse em prazo razoável” (DANTAS, Francisco Wildo Lacerda. A reforma das leis processuais. Revista da Esmafe 5ª Região, n. 10, p. 141, dez. 2006). No mesmo sentido: SPALDING, Alessandra Mendes. Direito fundamental à tutela jurisdicional tempestiva à luz do inciso LXXVIII do artigo 5º da CF inserido pelo EC 45/2004. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; WAMBIER, Luiz Rodrigues; GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel; FISCHER, Octávio Campos; FERREIRA, William Santos (Coord.). Reforma do Judiciário: primeiros ensaios críticos sobre a EC 45/2004. São Paulo: RT, 2005, p. 31. Cf., ainda, SLAIBI FILHO, Nagib. Direito fundamental à razoável duração do processo judicial e administrativo. In: QUEIROZ , Rafael Augusto Sofiati de (Org.). Acesso à justiça. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 119-120: em que o autor afirma crer que o direito à razoável duração do processo já detinha guarida constitucional antes da EC 45, com base nos arts. 5º, LIV (devido processo legal), XXXIV (direito de petição), XXXV (inafastabilidade da jurisdição), 37, caput (princípio da eficiência na Administração Pública) e 70 (a economia como objeto de controle dos Poderes Públicos), todos da Constituição Federal.

28 SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2. ed. Lisboa: Lex, 1997. p. 65/66.

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de da prestação jurisdicional exclusivamente judicial para uma responsabilida-de de todos os sujeitos processuais.

3 duração raZoÁVel do proCesso – ImpreCIsão do termo

Ao longo do presente artigo, iremos muitas vezes nos referir ao termo duração razoável do processo. Ao nos referir ao presente termo, nosso objetivo é, justamente, relacionar duas expressões, quais sejam: o tempo e o iter proce-dimental. Assim, antes é necessário explicar o sentido do termo, como sendo o direito fundamental a um procedimento jurisdicional, em contraditório, em prazo razoável, ou seja, que não demore muito a ponto de levar a uma ausência da aplicação do direito material ao caso concreto e a perda do direito, e nem ande rápido demais, a ponto de violar os diretos fundamentais do processo, quais sejam, o contraditório, a ampla defesa, a isonomia e o devido processo constitucional)29.

A expressão prazo razoável indica uma relação com o tempo, ou seja, um meio termo entre a celeridade e a morosidade procedimental. No entanto, a expressão razoável é imprecisa e subjetiva, e não contribui para afastar dúvidas sobre a aplicação nos casos concretos e muito menos permite a possibilidade de uma discussão objetiva sobre a fixação de um termo de duração mínimo e máximo para os procedimentos judiciais civis, penais ou trabalhistas.

O termo duração razoável do processo para a sua definição como ele-mento necessário para a garantia da democracia e de instrumento de proteção aos direitos fundamentais deve levar em consideração duas perspectivas. A pri-meira, voltada para as partes, indicando o tempo necessário para a realização dos atos procedimentais. A segunda é voltada para a atuação do órgão juris-dicional, indicando o tempo necessário para se proferir decisões judiciais de mérito ou interlocutórias.

Muitas vezes, a demora na realização de um único ato procedimental não causa a violação razoável do processo. No entanto, a demora ou a rapidez em praticar um conjunto de atos procedimentais, invariavelmente, pode trazer uma violação ao direito razoável ao processo e à prestação jurisdicional ou à violação do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

Ana Maria Scartezzini sustenta que

29 Candido Rangel Dinamarco explica: “O direito moderno não se satisfaz com a garantia da ação como tal e por isso é que procura extrair da formal garantia desta algo de substancial e mais profundo. O que importa não é oferecer ingresso em juízo, ou mesmo julgamento de mérito. Indispensável é que, além de reduzir os resíduos de conflitos não jurisdicionalizáveis, possa o sistema processual oferecer aos litigantes resultados justos e efetivos, capazes de reverter situações injustas. Tal é a ideia de efetividade da tutela jurisdicional, coincidente com a plenitude do acesso à justiça e a do processo civil de resultados” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. 4. ed. São Paulo: Malheiros, t. 2, 2001. p. 798).

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a razoabilidade tem um conteúdo mínimo, que abrange o tempo mínimo de apreciação por parte do magistrado, para se inteirar dos interesses do autor e réu e definir quem tem razão; de outro lado, contém a expectativa do detentor do direito em ver solvida a lide, com a análise de sua pretensão deduzida em juízo.30

O processo

não apenas deve outorgar uma satisfação jurídica às partes, como também, para que essa resposta seja a mais plena possível, a decisão final deve ser pronuncia-da em um lapso de tempo compatível com a natureza do objeto litigioso, visto que – caso contrário – se tornaria utópica a tutela jurisdicional de qualquer di-reito. Como já se afirmou, com muita razão, para que a Justiça seja injusta não faz falta que contenha equívoco, basta que não julgue quando deve julgar!31

Ressalta José Lebre de Freitas que, no Código de Processo Civil portu-guês, a duração razoável do processo é uma derivação do direito ao acesso aos Tribunais, e que a demora desrazoável dos processos judiciais viola, constituin-do uma atuação inconstitucional32.

A maioria dos doutrinadores e Tribunais (nacionais e internacionais) que já tiveram a oportunidade de se pronunciar sobre o tema da duração razoável do processo sempre tenta explicar o termo razoável de modo empírico e casuís-tico, ou seja, por meio de estudos de casos práticos, extraindo um conjunto de regras e requisitos que deveriam ser generalizados para serem aplicados em casos semelhante. A explicação que parte do caso concreto para explicar a realidade é o que chamamos de método indutivo.

E, por isso, consoante orientação jurisprudencial da Corte Europeia dos Direitos do Homem, consolidada em 1987, no famoso caso Capuano, três cri-térios, segundo as circunstâncias de cada caso concreto, devem ser levados em consideração para ser apreciado o limite temporal razoável de duração de um determinado processo. Por via de consequência, somente será possível verificar a ocorrência de uma indevida dilação processual a partir da análise: a) da com-plexidade do assunto; b) do comportamento dos litigantes e de seus procurado-res; e c) da atuação do órgão jurisdicional33.

30 SCARTEZZINI, Ana Maria Goffi Flaquer. O prazo razoável para a duração dos processos e a responsabilidade do Estado pela demora na outorga da prestação jurisdicional. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (et al.) (Coord.). Reforma do Judiciário: primeiros ensaios críticos sobre a EC 45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 43.

31 BIELSA, Rafael; GRAÑA, Eduardo. El tiempo y el proceso. Revista del Colegio de Abogados de La Plata, La Plata, 55, p. 190, 1994.

32 FREITAS, José Lebre de. Em torno da revisão do direito processual civil. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, 55, p. 15, 1995.

33 CRUZ E TUCCI, José Rogério. Tempo e processo. São Paulo: RT, 1997. p. 69 ss.

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Como afirmado, o termo razoável está impregnado de conotação subjeti-va, uma verdadeira cláusula geral e abstrata, sem qualquer conteúdo normativo. O termo razoável é inexplicável do ponto de vista científico, pois tanto pode justificar a demora da prestação jurisdicional quanto pode justificar a celeridade na prestação jurisdicional.

A utilização desse termo razoável, sem a necessária explicação legal do mesmo, como dito, é uma cláusula geral, e, portanto, inexequível, do ponto de vista de eficiência, efetividade e eficácia dos direitos procedimentais e pro-cessuais. Ou seja, razoável, processualmente falando, é um termo hermético, impossível de ser creditado e extraído de normas para implementar a sua apli-cação em casos concretos.

Diante da dificuldade em entender o conceito do processo em prazo ra-zoável, tendo em vista a sua difícil interpretação, além do alto grau de subjetivi-dade e abstração, seria interessante entender que o termo razoável tem ligação direta com o tempo e, portanto, melhor seria utilizar a expressão: “Tempestivi-dade procedimental e jurisdicional”.

A razoável duração do processo deve ser compreendida como direito do cidadão, a resolução dos direitos colocados em juízos em tempo procedimental e judicial legalmente estabelecidos. Isso significa que os atos das partes e dos juízes devem ser pautados pelo tempo.

Sustenta-se a ideia de que a lei tenha que fixar o conceito para a expres-são razoável, permitindo, assim, delimitar quando um processo durou razoavel-mente ou não.

Fernando Fonseca Gajardoni34, de forma legalista, explica que em siste-mas processuais preclusivos e de prazos majoritariamente peremptórios, como o brasileiro, o tempo ideal do processo é aquele resultante do somatório dos prazos do Código de Processo Civil para o cumprimento de todos os atos que compõem o procedimento, somado ao tempo de trânsito em julgado. A tutela jurisdicional prestada além desse prazo seria intempestiva35.

Também verificamos Carlos Henrique Haddad36, para quem o lapso da conclusão dos processos cíveis em primeira instância resultará do total de pra-zos previstos em lei, sendo este o melhor critério, por derivar da lei, e, conse-quentemente, por ser peremptório e objetivo37.

34 GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Técnicas de aceleração do processo. São Paulo: Lemos & Cruz, 2003.35 Idem, p. 59/60.36 HADDAD, Carlos Henrique Borlido. Fatores de produtividade: proposta de avaliação do desempenho do

magistrado federal. In: Administração da Justiça Federal: concurso de monografias – 2004. Série Monografias do CEJ, Brasília/DF: CJF, v. 10, 2005. p. 37/38.

37 Cf. Alessandra Spalding somou os prazos de cada fase do procedimento ordinário, desde o ajuizamento da ação até a prolação de sentença de primeiro grau, obtendo o total de 131 (cento e trinta e um) dias, período de tempo este que identificaria um processo com duração razoável, ressaltando, no entanto, que o prazo

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Em entendimento moderado, mas sempre aliando o termo razoável com o termo tempo, o Tribunal Constitucional da Espanha que afirma que nem toda infração aos prazos processuais constitui uma suposta dilação processual inde-vida. O atraso injustificado na tramitação dos processos não se produz necessa-riamente pelo simples descumprimento das normas sobre os prazos processuais, e sim pelo fato de que a pretensão deduzida em juízo não se resolva definitiva-mente em um prazo razoável38. Ou seja, é possível que os prazos processuais não sejam observados de forma isoladamente, mas que, em seu conjunto, tem garantido a resolução em tempo razoável39.

Além disso, quando se fala em duração razoável do processo, ficamos com a falsa ideia de que apenas o iter procedimental deve ser controlado e fis-calizado. No entanto, também sabemos que o atraso na atividade jurisdicional interfere na duração do processo em tempo razoável. Isso significa dizer que os atos jurisdicionais também devem ser regidos pelo tempo, sob pena de inviabi-lizar qualquer garantia de duração razoável do processo. Não adianta esperar um processo com duração tempestiva, sem que o órgão jurisdicional tenha, também, a obrigação de dar, tempestivamente, a decisão jurisdicional.

variaria de acordo com as peculiaridades da lide. Na doutrina espanhola, colhe-se entendimento semelhante, porém mais elaborado e minucioso, dividindo os feitos em grupos de acordo com as matérias versadas (penal, de estado e capacidade das pessoas, laboral e de seguridade social e o restante das matérias), e levando em consideração se os processos são singelos e sem comportamento indevido das partes, e as paralisações ocorridas no trâmite processual. Com essa sistemática, conclui-se, por exemplo, que a duração de um processo penal pode ser considerada irrazoável quando exceda os seguintes prazos: 1) Para processos singelos e sem comportamento indevido das partes: 5 anos; 2) Para processos complexos e/ou com comportamento indevido das partes: 7 anos; 3) Período de inatividade permitido: 1 ano (SPALDING, Alessandra Mendes. Direito fundamental à tutela jurisdicional tempestiva à luz do inciso LXXVIII do artigo 5º da CF inserido pela EC 45/2004. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Coord.). Reforma do Judiciário: primeiros ensaios críticos sobre a EC 45/2004. São Paulo: RT, 2005. p. 37-38.).

38 MARTÍN, Agustín Jesús Pérez-Cruz. Teoria General de Derecho Procesal. Coruña: Tórculo Edicións, 2005. p. 259-260.

39 Importante precedente da Suprema Corte da Espanha bem demonstra a influência do Tribunal de Estrasburgo sobre os julgados do Tribunal Constitucional espanhol: “Estimo oportuno destacar en este mismo sentido, que el Tribunal Constitucional Español, al referirse al derecho a un proceso sin demoras indebidas que reconocen el artículo 14.3.c del Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos, el artículo 6.1 de la Convención Europea de Derechos Humanos y el artículo 24.2 de la Constitución Española, ha sostenido que toda infracción a los plazos de procedimiento no constituye una violación al mencionado derecho, pues la noción de retardo indebido es una noción indeterminada y abierta que debe ser dotada de un contenido preciso en cada caso, mediante la aplicación a sus circunstancias especificas de los factores objetivos y subjetivos en forma coherente con su enunciado genérico, tales como la complejidad del pleito, los tiempos ordinarios de los litigios del género en juego, el interés que toque a las partes y la conducta de éstas últimas y de las autoridades del proceso (conf. sentencia del 1º de diciembre de 1994, 3/1994. pág. 243, y sentencia del 12 de noviembre de 1996, 3/1996 p. 365, reseñadas en “Investigaciones”, publicación de la Secretaría de Investigación de Derecho Comparado de la Corte Suprema de Justicia, nº 3 del año 1997, páginas 52 1/522). Esa jurisprudencia, a su vez, se inspira en los criterios generales enunciados por el Tribunal Europeo de Derechos Humanos, en cuanto a que no existen plazos automáticos o absolutos y que la inobservancia de los que fija el derecho interno no configura, por sí, una violación al artículo 6º, inciso 1º, ‘de la Convención Europea de Derechos Humanos, sino sólo un indicio de morosidad (conf. citas en el mencionado considerando 13 del voto en disidencia de los doctores Petracchi y Boggiano, en Fallos: 322:360)”.

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Razoável seria praticar atos procedimentais/processuais em tempo pre-visto em lei, bem como praticar atos jurisdicionais também em tempo previsto em lei. Razoável é o processo que possui atos jurisdicionais e procedimentais dentro dos prazos legais. Razoável está diretamente ligado à ideia de tempo.

O tempo é o elemento caracterizador e norteador da palavra razoável, permitindo entender o que seria ou não irrazoável. A razoável duração do pro-cesso não pode ser uma cláusula geral em branco, e não pode ficar sem aplica-ção, por dificuldade de sua compreensão. A duração razoável do processo não é uma norma programática.

O termo razoável deve ser usado nos discursos de fundamentação do Direito, mas não nos discursos de aplicação do Direito. Isso significa dizer que o termo razoável deve ser uma preocupação do legislador, e não do órgão ju-risdicional. Para o órgão legislador, a apresentação do problema sobre o tempo máximo de um processo pode gerar debates acalorados, determinando-se, por-tanto, um tempo médio, um prazo razoável, um denominador comum. Já, no discurso apresentado para o órgão jurisdicional, deve-se ter como pressuposto a legalidade, e, portanto, o razoável deve ser aquilo que determina a lei, nem mais nem menos.

Somente o elemento tempo pode permitir a conceituação do termo ra-zoável. Temos que ter um processo jurisdicional e uma atividade jurisdicional regida pelo binômio: tempo-lei ou teremos um processo e uma atividade juris-dicional irrazoável. Nesse sentido, o princípio da razoável duração do processo deve ser compreendido como uma garantia da observância à tempestividade procedimental e jurisdicional.

Para fins de determinação do lapso temporal procedimental é utilizado no processo de conhecimento o tempo entre a citação e o trânsito em julgado da sentença (com ou sem a resolução do mérito) e, no processo de execução, o tempo necessário para o término do respectivo procedimento, pouco importan-do se houve ou não a satisfação do crédito40.

Segundo Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias,

quando os órgãos jurisdicionais descumprem essas normas do ordenamento ju-rídico, relativas aos prazos, o que é prática ilícita corriqueira no Estado Brasilei-ro, a jurisdição se apresenta morosa, intempestiva e ineficiente.41

[...] Tem-se, então, nesses casos habituais, atividade estatal desempenhada com afronta manifesta ao princípio da eficiência e ao princípio da legalidade [...].42

40 NIGRO, Casimiro; PROSPERI, Luigi. L’irragionevole durata dei processi. Forli, Experta, 2009. p. 159.41 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Processo constitucional e Estado Democrático de Direito. 3. ed. rev. e

ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2015. p. 194.42 Idem, p. 195.

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No entanto, a duração do processo em tempo razoável não pode ser interpretada de modo absoluto, sendo admitido, em determinados casos, a sua extrapolação para garantir o direito ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo. E, para que haja a extrapolação dos prazos legais-legais processuais, devemos nos pautar pela fundamentação de tal necessidade, nos termos previs-tos pelo art. 93, IX, da CR/1988, art. 10 e art. 489, § 1º, do novo CPC.

Portanto, os critérios fornecidos pelas Cortes Internacionais de Direitos Humanos, que em casos concretos retirou normas e critérios para entender a expressão razoável, não servem para garantir que um processo demore tempo razoável. Os limites não estão na complexidade da causa, no comportamento dos litigantes e na atuação jurisdicional, mas, sim, na necessidade de observar o tempo procedimental e jurisdicional, e, com permissão de extrapolar, excep-cionalmente, e desde que fundamentados, para a observância do contraditório, da ampla defesa e do devido processo.

4 tempestIVIdade proCedImental e JurIsdICIonal – pressuposto proCessual ConstItuCIonal

Como dito, a razoável duração do processo é um termo genérico e im-possível de ser aplicado sem que se leve em consideração o elemento tempo como fator estruturante e definidor de sua aplicação.

Portanto, o termo, como sustentado, deve ser interpretado como elemen-to de garantia da tempestividade procedimental e jurisdicional (art. 5º, inciso LXXVIII, da CR/1988), como um pressuposto processual constitucional, sem o qual, infelizmente, não temos a existência de processo constitucional.

O processo constitucional é procedimento (conjunto de atos procedi-mentais) que garanta o contraditório (participação efetiva das partes), a ampla defesa (produção de provas lícitas e dentro do prazo), a isonomia (aplicação de normas iguais para todos), o devido processo (observância do procedimento em contraditório) e a duração razoável do processo (garantia temporal de prática de atos processuais e da atividade jurisdicional) como elementos estruturantes, e que, em sua ausência, temos a verificação de um processo antidemocrático e autoritário, com decisões solipsista e discricionária.

Portanto, a tempestividade procedimental não se relaciona com a celeri-dade procedimental. Celeridade procedimental seria a prática de atos procedi-mentais no menor espaço de tempo possível. Já a tempestividade procedimental seria a prática de atos procedimentais no devido tempo e com a garantia do contraditório, da ampla defesa e do devido processo. Nas palavras de Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias,

não pode o Estado suprimir o contraditório ou olvidá-lo na construção norma-tiva dos procedimentos, como também lhe é defeso dispensar a presença do

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advogado ou do defensor público no processo, eliminar o duplo grau de juris-dição, abolir a instrumentalidade das formas, restringir o direito das partes à produção de provas lícitas ou dispensar o órgão jurisdicional de fundamentar racionalmente suas decisões. A restrição de quaisquer dessas garantias proces-suais constitucionais, sob a canhestra justificativa de agilizar ou tornar célere o procedimento, revela-se inconstitucional e antidemocrática, somente prestando para estimular o árbitro dos juízes, fomentar a insegurança jurídica e escarne-cer da garantia fundamental do devido processo legal, em resumo, deslavada e grosseira agressão ao modelo constitucional do processo concebido pelo Estado Democrático de Direito brasileiro, verdadeira fraude à Constituição.43

Sendo o contraditório um dos elementos fundamentais para a caracte-rização do processo constitucional, é necessário explicá-lo, e temos como a melhor explicação a apresentada por Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias. Ele sus-tenta que o contraditório é delimitado pelo quadrinômio: informação – reação – diálogo – influência44. A informação é direito básico para que as partes pos-sam atuar no processo. A informação é justamente garantida pelo princípio da publicidade dos atos procedimentais e jurisdicionais. A reação é justamente a garantia do direito de defesa. O diálogo como elemento garantidor da participa-ção efetiva das partes junto ao juiz, obrigando que todos debatam as questões controvertidas e as suas prováveis consequências.

A influência é a garantia de evitar a decisão surpresa, ou seja, que não levou em consideração o diálogo efetivado pelas partes, decidindo sem que houvesse a devida contradição sobre o ponto. A influência é elemento que evita a decisão-surpresa. Nas considerações de Dierle Nunes, o processo cons-titucional moderno deve ser entendido como elemento normativo estruturador da comparticipação, assegurando o policentrismo processual. Nesse sentido, “a todos os sujeitos potencialmente atingidos pela incidência do julgado (poten-cialidade ofensiva) a garantia de contribuir de forma crítica e construtiva para sua formação”45.

A opção por colocar o princípio da tempestividade procedimental e judi-cial dentro dos pressupostos processuais é pela necessidade e impossibilidade, que muitas vezes ocorre, de decidir sobre o mérito, que por razões de moro-sidade procedimental e judicial já não tem mais sentido de ser proferida, pela absoluta falta ou carência do objeto ou da causa de pedir.

Assim, se analisarmos um caso, e verificarmos que o mesmo já não pode mais ser decidido, por razões temporais procedimentais e jurisdicionais, verifi-camos que não foi cumprido o direito fundamental à razoável prestação juris-

43 Idem, p. 209.44 Idem, p. 133.45 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 227.

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dicional ou tempestividade procedimental e jurisdicional, e tal violação consti-tucional impacta no dever do Estado brasileiro, nos termos do art. 37 (caput) e § 6º da Constituição da República, de indenizar o cidadão lesado na medida e na extensão dos danos causados, nos termos do art. 944 do Código Civil brasi-leiro, devidamente apurado em liquidação judicial.

A colocação da duração razoável do processo (tempestividade procedi-mental e judicial) como um pressuposto processual constitucional é condicio-nante para a existência do processo constitucional. A sua ausência não importa na extinção do procedimento sem a resolução do mérito, nos termos da doutri-na tradicional processual, mas no reconhecimento de violação de direitos fun-damentais e, portanto, no reconhecimento de ineficiência estatal e de violação grave à legalidade, devendo ser extinto o processo sem o julgamento do mérito e nos remetendo à necessidade de reparar os danos causados, sejam de ordem moral, sejam de ordem material.

É bom ressaltar que o pedido de reparação de danos em razão da in-tempestividade procedimental ou jurisdicional pode ser feita em procedimento autônomo, obrigando a parte lesada a deduzir nova pretensão com causa de pedir fundada na ineficiência estatal à prestação jurisdicional ou pode ser feito nos mesmos autos, quando se verificar que o demandante, em dedução de sua pretensão ou pretensão resistida, apresentou pedido para a conversão do direito em indenização em razão da ineficiência estatal na prestação jurisdicional.

O dever de indenizar a parte prejudicada pela intempestividade procedi-mental e jurisdicional pode ser do próprio Estado, que agiu de forma ineficiente, seja contribuindo para a não resolução da demanda em tempo hábil, seja pela não fiscalização dos atos praticados pelas partes que levem a um tempo irra-zoável para a resolução da lide.

Obviamente, se a ausência de tempestividade procedimental ou judicial for feita pelo Estado ou por seu agente/servidor (juiz), nos termos do art. 37, § 6º, da CR/1988, em nome da responsabilidade objetiva, o Estado ficará obri-gado a indenizar os prejuízos causados, mas nada obsta que a parte contrária, ou seja, aquela que contribuiu para que o procedimento e a jurisdição não fossem eficientes e em tempo hábil, pode ser responsabilizada solidariamente com o Estado brasileiro. Só é possível chegar à presente conclusão quando ve-rificamos o art. 6º do Código de Processo Civil de 2015, que estabelece o dever de colaboração para se garantir a duração razoável do processo.

Além do artigo supracitado, verificamos que o Código de Processo Civil de 2015 possui previsão legal de inúmeras multas e outras medidas coercitivas para as atitudes consideradas abusivas e contrárias à tempestividade procedi-

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mental e jurisdicional, reputando serem os atos atentatórios à dignidade da jus-tiça ou litigância de má-fé46.

Em conclusão, o Estado brasileiro precisa atender ao princípio da lega-lidade, respeitar os prazos e coibir as práticas abusivas do direito processual que podem trazer dificuldades para a garantia da tempestividade procedimental e jurisdicional. E, quando não o faz, fica responsável pela indenização pelos prejuízos causados, podendo, ainda, a parte contrária responder de forma soli-dária, se contribuiu para o dano, violando o dever de colaboração previsto no art. 6º do Código de Processo Civil de 2015.

5 anÁlIse normatIVa do noVo CÓdIGo de proCesso CIVIl para a GarantIa da tempestIVIdade proCedImental e JurIsdICIonal

O novo Código de Processo Civil, para garantir a tempestividade proce-dimental e jurisdicional, trouxe alguns dispositivos legislativos interessantes, e que iremos citar, pontualmente, nos próximos parágrafos. O que devemos ter como perspectiva, ao analisar pontualmente alguns desses dispositivos, é que houve uma mudança fundamental em relação ao CPC/1973, qual seja, a res-ponsabilidade pela duração razoável do processo é uma obrigação de todos os sujeitos processuais, e não apenas uma função do juiz, como era estabelecido no art. 125, inciso III, do CPC/1973.

Claro que isso faz muita diferença, pois verificamos vários artigos do novo Código de Processo Civil com expressa condenação de práticas atentató-rias à dignidade da justiça, litigância de má-fé, ausência de colaboração, entre outras situações, que levam o legislador a concluir que há uma conduta repro-vável e que deve ser coibida, especialmente com multa ou outro ônus proces-sual, como é o caso da aplicação da tutela de evidência, prevista pelo art. 311 do novo Código de Processo Civil.

Assim, vamos passar a indicar alguns artigos que servem de complemen-to e de garantia para a tempestividade procedimental e jurisdicional (razoável duração do processo).

46 Carlos Henrique Soares: “El acto abusivo, en el ámbito procesal, es aquél que posee la apariencia de normalidad y legalidad, sin embargo el objetivo pretendido, no es lícito sino causarle perjuicio a la otra parte o al andamiento regular del procedimiento y de la dignidad de la prestación judicial. [...] Siendo así, la mejor técnica para la represión del abuso del derecho procesal puede ser indicada por la apertura de una discusión profunda y dialógica sobre su ocurrencia y los eventuales daños que determinada conducta ocasionó. [...] De lo contrario, cualquier condena en litigios de mala fe es un acto de autoritarismo y antidemocrática, que viola de plano la Constitución de la República de Brasil” (SOARES, Carlos Henrique. Abuso del derecho procesal brasileño. In: SOARES, Carlos Henrique; RAMOS, Glauco Gumerato; GRADOS, Guido Aguila; RÚA, Mónica Bustamante; DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho (Coord.). Proceso Democrático y Garantismo Procesal. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2015. p. 140, 145 e 146.

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Um dos principais pontos que merece ser observado no novo CPC/2015 é a indicação de que os arts. 4º47 e 6º48 estabelecem uma ligação entre a dura-ção razoável do processo e a colaboração/cooperação processual. Isso significa que o CPC/2015 atribuiu a todos, não somente ao juiz, dever de observar o procedimento e o julgamento em tempo razoável.

Também verificamos que o CPC/2015 ressalta, com forma de garantir a rápida resolução dos litígios, a estimulação da conciliação, da mediação e de outros métodos de solução consensual de conflitos, conforme é possível perce-ber no art. 3º, § 3º49.

A obrigatoriedade dos juízes e Tribunais em obedecer à ordem cronoló-gica de conclusão para proferir sentença ou acórdão também está ligada à tem-pestividade procedimental e jurisdicional, nos termos do art. 12 do CPC/201550.

Repetindo literalmente o que já prescrevia o CPC/1973, mas dando força à tempestividade procedimental e jurisdicional, verificamos que o art. 77 do CPC/2015 estabelece os deveres das partes no processo, bem como indica que as mesmas devem agir com lealdade e boa-fé, expondo os fatos em juízo con-forme a verdade; não formulando pretensão ou apresentando defesa cientes de que são destituídas de fundamento; não produzindo provas e não praticando atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do direito; cumprindo com exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criando embaraços à sua efetivação.

No entanto, para garantir a efetividade das disposições previstas no art. 77 do CPC/2015, o legislador trata com mais rigor aqueles que não seguem os seus deveres e violam a dignidade da justiça e, consequentemente, a tem-pestividade procedimental e jurisdicional. Assim, estabelece o § 2º desse art. 77 que caso a parte não cumpra as decisões jurisdicionais ou crie embaraços ao seu cumprimento, o juiz deve aplicar multa de até 20% do valor da causa, sem prejuízos de penalidades civis e penais que devem ser apuradas. E no § 5º do mesmo artigo ficou estabelecido que se o valor da causa for irrisório ou inesti-mável, a multa prevista no § 2º poderá ser fixada em até 10 (dez) vezes o valor do salário-mínimo. Vejam que a preocupação do legislador processual é com a tempestividade procedimental e jurisdicional.

47 NCPC/2015: “Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

48 NCPC/2015: “Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.

49 NCPC/2015: “Art. 3º [...] § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”.

50 NCPC/2015: “Art. 12. Os juízes e os Tribunais deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão”.

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Interessante, também, é o que verificamos no § 6º do art. 77 do CPC/2015, que também estabelece punição para os advogados públicos e privados que re-presentam as partes no processo, bem como a Defensoria Pública e o Ministério Público, indicando que os mesmos não serão multados, mas que a sua res-ponsabilidade disciplinar deve ser apurada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, ao qual o juiz oficiará, também em nome da garantia da duração razoável do processo.

A litigância de má-fé, prevista nos arts. 79 e 80 do CPC/2015, que re-pete o que já conhecíamos no CPC/1973, também busca garantir a duração do processo em tempo hábil. É bom lembrar que a interpretação do art. 8151 do CPC/2015, que estabelece a possibilidade de condenação da parte como litigante de má-fé em multa superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, mais indenização por prejuízos e honorários, deve respeitar o art. 10 do CPC/2015, ou seja, ter a observância do contraditório.

Tratando-se de autos físicos, o CPC/2015 não autoriza que os advogados, os defensores públicos e o Ministério Público excedam os prazos de vista fora da secretaria. Assim, em nome da razoável duração do processo, caso o advo-gado, defensor ou membro do Ministério Público exceda o prazo de vista dos autos, e devidamente intimado, o mesmo perderá o direito de retirar os autos da secretaria e incorrerá em multa correspondente à metade do salário-mínimo (art. 234 do CPC/201552).

Assevera o art. 226 do CPC/2015 que o juiz proferirá os despachos no prazo de 5 (cinco) dias,as decisões interlocutórias no prazo de 10 (dez) dias e as sentenças no prazo de 30 (trinta) dias. Já, no art. 227 do CPC/2015, indica que em qualquer grau de jurisdição, havendo motivo justificado, pode o juiz exceder, por igual tempo, os prazos a que está submetido. Nesse aspecto, es-tamos entendendo que, no máximo, a sentença, após o encerramento da fase de instrução, poderá ser emitida no prazo de 60 dias, com a devida justificativa

51 NCPC/2015: “Art. 81. De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou. § 1º Quando forem 2 (dois) ou mais os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na proporção de seu respectivo interesse na causa ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte contrária.§ 2º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até 10 (dez) vezes o valor do salário-mínimo. § 3º O valor da indenização será fixado pelo juiz ou, caso não seja possível mensurá-lo, liquidado por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos”.

52 NCPC/2015: “Art. 234. Os advogados públicos ou privados, o defensor público e o membro do Ministério Público devem restituir os autos no prazo do ato a ser praticado. § 1º É lícito a qualquer interessado exigir os autos do advogado que exceder prazo legal. § 2º Se, intimado, o advogado não devolver os autos no prazo de 3 (três) dias, perderá o direito à vista fora de cartório e incorrerá em multa correspondente à metade do salário-mínimo. § 3º Verificada a falta, o juiz comunicará o fato à seção local da Ordem dos Advogados do Brasil para procedimento disciplinar e imposição de multa. § 4º Se a situação envolver membro do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da Advocacia Pública, a multa, se for o caso, será aplicada ao agente público responsável pelo ato. § 5º Verificada a falta, o juiz comunicará o fato ao órgão competente responsável pela instauração de procedimento disciplinar contra o membro que atuou no feito”.

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para tanto, pois, normalmente, o prazo computado será de 30 dias. No entan-to, no caso do juiz não observar o que determina tal enunciado previsto no art. 226 do CPC/2015, não verificamos nenhuma sanção processual para o mes-mo, ficando a questão a ser resolvida diretamente pela Corregedoria de Justiça e pelo Conselho Nacional de Justiça, com penalidades funcionais ao magistrado.

Outro dispositivo processual que está diretamente relacionado à tempes-tividade procedimental e jurisdicional é justamente a chamada “tutela provisó-ria”, prevista entre os arts. 294 a 311 do CPC/2015. Claro que não é possível tratar todas as particularidades das tutelas provisórias no presente artigo; no entanto, vejamos que o CPC/2015 é bastante claro que em algumas hipóteses, previstas no art. 31153, por exemplo, permite-se, independentemente de de-monstração de urgência e probabilidade de dano irreparável e de difícil repa-ração, que a decisão seja concedida e antecipada, em nome da tempestividade procedimental e jurisdicional efetiva.

Inovação do CPC/2015, mas que pode ser visto como elemento necessá-rio para garantir a tempestividade procedimental e jurisdicional, é justamente o requisito indispensável da petição inicial em informar, nos casos de direitos disponíveis, o interesse do autor em conciliar. Isso está previsto no art. 319, inciso VII54, e enaltece a conciliação e a mediação, bastante incentivadas no CPC/2015.

Outro instituto muito criticado, do ponto de vista processual democrá-tico, mas que permaneceu no CPC/2015 como elemento forte para uma deci-são célere, garantindo a tempestividade jurisdicional, mesmo em detrimento ao contraditório e ao devido processo legal, é o chamado julgamento de im-procedência liminar do pedido, previsto no art. 332 do CPC/2015. Assim, nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar: a) enuncia-do de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competên-cia; d) enunciado de súmula de Tribunal de Justiça sobre o direito local. Nos termos do § 1º desse mesmo artigo, estabelece que o juiz também poderá julgar

53 NCPC/2015: “Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando: I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III – se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável”.

54 NCPC/2015: “Art. 319. A petição inicial indicará: [...] VII – a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação”.

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liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição.

Também em nome da tempestividade procedimental e jurisdicional ve-rificamos que o CPC/2015 estabelece que a contestação é a principal defesa direta e indireta do réu. Assim, as exceções dilatórias e peremptórias, em regra, devem ser alegadas em preliminar, na contestação, não mais sendo possível abertura de incidentes processuais como eram previstos no CPC/1973. Portan-to, são inúmeras as preliminares que devem ser arguidas pelo réu e que estão previstas no art. 33755 do CPC/2015, bem como, além das matérias de mérito, a reconvenção (art. 33456 CPC/2015) não mais necessita ser apresentada auto-nomamente em relação à contestação, consistindo de mais uma parte da defesa do réu.

Outra inovação do novo Código de Processo Civil brasileiro, e que tam-bém garante a tempestividade procedimental e jurisdicional, é a possibilidade de julgamento antecipado parcial do mérito, previsto no art. 356 do CPC/2015, possibilitando que um ou mais pedidos ou parcelas que se mostrarem incontro-versos ou estiverem em condições de imediato julgamento possam ser decidi-dos, com brevidade, não sendo necessário aguardar o julgamento das questões que dependam de prova ou de maior discussão jurídica de fatos e de direito. Nesse caso, garantindo a efetividade da decisão, e a sua executividade, é pos-sível, desde logo, a instauração do cumprimento de sentença, em caráter pro-visório ou definitivo.

O duplo grau de jurisdição obrigatório no novo Código de Processo Civil brasileiro, em seu art. 496, também sofreu profunda modificação, justamente no intuito de satisfazer a celeridade processual e a tempestividade procedimen-tal e jurisdicional. Assim, está sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, não produzindo efeito senão depois de confirmada, pelo Tribunal, a sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as suas respectivas autarquias e fundações de direito público, bem como que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. No entanto, o § 3º estabelece que não se aplica o disposto no art. 496 do CPC/2015 quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior: a) a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público; b) a 500 (quinhentos) salários-míni-

55 NCPC/2015: “Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar: I – inexistência ou nulidade da citação; II – incompetência absoluta e relativa; III – incorreção do valor da causa; IV – inépcia da petição inicial; V – perempção; VI – litispendência; VII – coisa julgada; VIII – conexão; IX – incapacidade da parte, defeito de representação ou falta de autorização; X – convenção de arbitragem; XI – ausência de legitimidade ou de interesse processual; XII – falta de caução ou de outra prestação que a lei exige como preliminar; XIII – indevida concessão do benefício de gratuidade de justiça”.

56 NCPC/2015: “Art. 343. Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa”.

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mos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados; c) a 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público. E, no § 4º do mesmo artigo, informa que não haverá a remessa necessária. Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em: a) súmula de Tribunal Superior; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competên-cia; d) entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa. A remessa necessária e obrigatória das decisões judi-ciais para a análise dos Tribunais, bem como os limites impostos nos parágrafos supracitados, verificamos que haverá uma considerável diminuição de revisão das decisões pelo segundo grau de jurisdição desfavoráveis ao Estado.

Outra diretriz bastante forte no novo Código de Processo Civil brasileiro é a utilização dos precedentes judiciais e as súmulas vinculantes como forma de garantir a tempestividade jurisdicional e a duração razoável do processo. O CPC/2015 direcionou, incisivamente, a reforma processual em busca de celeridade jurisdicional e procedimental, buscando padronizar as decisões e estabelecer a segurança jurídica e previsibilidade nas decisões judiciais e na segurança jurídica57.

A segurança jurídica é trabalhada pelos precedentes e pelas súmulas ape-nas como previsibilidade das decisões e da aplicação das normas. No entanto, verificamos que a segurança jurídica, no Estado Democrático, deve ser entendi-da como garantia do devido processo, no qual as partes tenham oportunidade de esclarecer e debater questões de fato e de direito58.

Pelo novo Código de Processo Civil brasileiro, há uma clara indicação de jurisprudencialização do Direito e posterior vinculação dos órgãos inferiores do Judiciário, permitindo que as decisões judiciais sejam padronizadas com entendimentos expostos em súmulas com efeito vinculante ou em precedentes judiciais. É flagrante a opção do novo Código de Processo Civil brasileiro pelo julgamento em quantidade em detrimento da qualidade, buscando a garantia da celeridade e a tempestividade jurisdicional, em detrimento, muitas vezes, do contraditório, da ampla defesa e do devido processo.

Vejamos o celebrado art. 489 do novo Código de Processo Civil brasi-leiro, que em seu parágrafo único explica quando uma sentença é considerada carente de fundamentação. No entanto, verificando o presente § 1º com maior

57 MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. São Paulo: RT, 2010. p. 122.58 FARIA, Gustavo de Castro. Jurisprudencialização do direito. Belo Horizonte: Arraes, 2012. p. 93/95.

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acuidade, o que parece ser muito bom para o contraditório e para a fundamen-tação das decisões, bem como contribuir para a qualidade das decisões e a de-mocracia, pode servir apenas para a celeridade jurisdicional e a tempestividade procedimental. No art. 489, parágrafo único, do CPC/2015, é possível identifi-car a expressa referência à súmula e ao precedente judicial, indicando que não se considera fundamentada a decisão que invocar precedente ou enunciado de súmula sem identificar os seus fundamentos determinantes nem demonstrar se o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos. Assim, a súmula e o precedente são elementos fundantes de justificação da sentença, mas, para tanto, deve o julgador explicar a relação que existe entre elas e o caso concreto. Obviamente, a utilização de súmulas e precedentes judiciais, pela perspectiva da tempestividade procedimental e jurisdicional, auxiliará em muito os julga-mentos e a celeridade, desde que devidamente observada a fundamentação vinculada do art. 489 do CPC/2015. Aliado a isso, verificamos que o inciso IV do referido art. 489 do novo CPC estabelece que não se considera devidamente fundamentada a sentença ou decisão judicial que deixar de aplicar enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendi-mento. Ou seja, verificamos que o juiz é obrigado a seguir a padronização de entendimento ou apresentar motivos para deixar de aplicar a súmula ou o precedente judicial. O art. 489 do NCPC deve ser aplicado em todos os graus de jurisdição.

O art. 926 do CPC/2015 estabelece que os Tribunais devem uniformizar a sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. Tal razão é justamente para garantir, no fundo, a tempestividade procedimental e jurisdicional. E, para manter a integridade, a estabilidade e a coerência das decisões, os Tribunais devem levar em consideração, no momento do julgamento, as decisões dadas pelo Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalida-de; os enunciados de súmula vinculante; os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

Também, em fase recursal, o novo Código de Processo Civil de 2015 autoriza os Tribunais a inadmitam recursos que possuam fundamentos jurídicos contrários aos precedentes judiciais e às súmulas com efeito persuasivo ou com efeito vinculante. Tal regra está prevista no art. 93259, inciso IV, do CPC/2015.

59 NCPC/2015: “Art. 932. Incumbe ao relator: I – dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação à produção de prova, bem como, quando for o caso, homologar autocomposição das partes; II – apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal; III – não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos

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Isso irá, além de impedir recursos que já contenham matéria decidida e não mais controvertida pelos Tribunais, incentivar a celeridade jurisdicional.

Caso haja desrespeito à súmula vinculante e ao precedente judicial por juízes de qualquer grau de jurisdição, o novo Código de Processo Civil estabe-lece, em seu art. 988, que caberá reclamação. A reclamação é um instrumento processual cabível para denunciar junto às altas cortes do País que foram dadas decisões por juízes de instância inferior em descumprimento e desrespeito ao precedente judicial ou à súmula.

Também verificamos que o novo Código de Processo Civil brasileiro pro-cura impedir ou evitar a interposição de recursos para os Tribunais, estabele-cendo, o art. 496, que, nos casos em que a sentença, decisão de primeiro grau, condenar o Estado à obrigação de pagar com fundamento em súmula do Tri-bunal Superior (Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça), não ocorrerá o reexame necessário da sentença pelo segundo grau de jurisdição.

Por fim, verificamos que o novo Código de Processo Civil, no objetivo de resolver com celeridade e eficiência o problema de ausência de decisões judiciais que assola o Brasil, bem como a morosidade procedimental, insti-tuiu o chamado incidente de resolução de demandas repetitivas, previstos nos arts. 976 e seguintes do NCPC e que tem cabimento quando se verificar que há inúmeros casos tramitando no Judiciário brasileiro com a mesma questão de direito sendo discutida ou quando houver risco de ofensa à isonomia e à segu-rança pública. Nestes casos, sendo o incidente admitido e julgado pelo Tribunal competente, nos termos do art. 985 do CPC/2015, a tese jurídica debatida e decidida será aplicada: a) a todos os processos individuais ou coletivos que ver-sem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo Tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou da região; b) aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do Tribunal. E, caso algum juiz não observe o modelo decisório apresentado e decidido pelo Tribunal, caberá reclamação, que, como dito, é uma forma denunciar o desres-peito ao precedente judicial ou à súmula.

da decisão recorrida; IV – negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; V – depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; VI – decidir o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, quando este for instaurado originariamente perante o tribunal; VII – determinar a intimação do Ministério Público, quando for o caso; VIII – exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do Tribunal”.

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Estes exemplos citados são apenas para informar que o novo Código de Processo Civil brasileiro privilegia, de forma absoluta e com bastante força, a celeridade procedimental e jurisdicional. No entanto, como dito, a tempestivi-dade procedimental e jurisdicional possui definição diferente, pois tem como pressuposto, justamente, a qualidade da decisão, e essa qualidade passa pelo processo democrático, necessitando da observância do contraditório e da am-pla defesa, do devido processo, do acesso à jurisdição e da eficiência. O novo CPC/2015 confunde celeridade procedimental e jurisdicional com tempestivi-dade procedimental e jurisdicional.

O uso indiscriminado dos precedentes judiciais e das súmulas vinculan-tes pode interferir na garantia do contraditório e na ampla defesa, bem como in-terferir no direito constitucional ao recurso e no devido processo legal, e violar a constituição e os direitos fundamentais do processo constitucional.

A preocupação exacerbada do novo Código de Processo Civil com a celeridade procedimental e jurisdicional, bem como com a quantidade de de-cisões em detrimento da qualidade, além de uma busca por padronização de decisões e a sua massificação, podem estar indicando para uma ausência de processo democrático no direito processual brasileiro.

Ressalta José Lebre de Freitas que “a progressiva valoração da celeridade processual não deve, porém, levar a subalternizar, como por vezes entre nós se verifica, a necessária maturação e a qualidade da decisão de mérito, com o inerente desvio da função jurisdicional”60.

Isso significa que se quisermos respeitar a tempestividade procedimental e jurisdicional ou a duração razoável do processo, precisamos, acima de tudo, diferenciar celeridade e tempestividade e interpretar as normas do CPC/2015 como normas que buscam a tempestividade procedimental e jurisdicional sem a necessidade de prescindir do contraditório, da ampla defesa, do devido pro-cesso, do acesso à jurisdição e do duplo grau de jurisdição. Corremos o risco, caso não haja a realização da diferenciação entre os conceitos e a sua interpre-tação de estarmos incentivando a arbitrariedade judicial e as decisões antide-mocráticas.

ConClusões

Diante do que foi desenvolvido ao longo do presente texto, concluímos:

a) Tramitaram aproximadamente 95,14 milhões de processos na Jus-tiça, sendo que, entre eles, 70%, ou seja, 66,8 milhões já estavam pendentes desde o início de 2013, com ingresso no decorrer do ano

60 FREITAS, José Lebre de. Introdução ao processo civil – Conceito e princípios gerais à luz do Código revisto. Coimbra: Coimbra, 1996. p. 113.

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de 28,3 milhões de casos novos (30%). É preocupante constatar o progressivo e constante aumento do acervo processual, que tem crescido a cada ano, a um percentual médio de 3,4%. Some-se a isto o aumento gradual dos casos novos, e se tem como resultado que o total de processos em tramitação cresceu, em números ab-solutos, em quase 12 milhões em relação ao observado em 2009 (variação no quinquênio de 13,9%). Apenas para que se tenha uma dimensão desse incremento de processos, a cifra acrescida no últi-mo quinquênio equivale à soma do acervo total existente, no início do ano de 2013, em dois dos três maiores Tribunais da Justiça Esta-dual, quais sejam: TJRJ e TJMG.

b) Quanto aos Indicadores de Produtividade dos Magistrados (IPM) e os Indicadores de Produtividade dos Servidores (IPS), houve re-dução em ambos os casos no último ano. O IPS passou de 102 para 100 processos baixados por servidor (-1,8%) e o IPM de 1.712 para 1.684 processos baixados por Magistrado (-1,7%) entre 2012 e 2013. Como uma das derivações da redução desses dois indica-dores, percebe-se que a taxa de congestionamento passou de 70% para 70,9%, ou seja, de 100 processos que tramitaram no ano de 2013, aproximadamente, 29 foram baixados no período. A alta taxa de congestionamento é causada pela grande quantidade de proces-sos pendentes na fase de execução da primeira instância, tendo em vista que a taxa de congestionamento é de, aproximadamente, 86% nessa fase, enquanto que, na fase de conhecimento, o percentual cai para 60%. A taxa de congestionamento no segundo grau é a menor e registrou 47% de congestionamento em 2013, enquanto que a maior taxa foi registrada nos processos de execução de título extrajudicial fiscal 91%.

c) O problema do Judiciário brasileiro são: alta taxa de litigiosidade, baixa produção judicial, poucos juízes e alta taxa de congestiona-mento de processos. Essa realidade, para que possa ser modificada, deve partir de mudanças estruturais no Judiciário brasileiro, bem como de reformas processuais profundas, que a um só tempo ga-rantam maior efetividade à prestação jurisdicional, segurança jurí-dica e celeridade procedimental e judicial, com o devido respeito ao contraditório, à ampla defesa, ao devido processo, ao acesso à jurisdição, à fundamentação das decisões, à cooperação judicial entre os sujeitos processuais e à tempestividade procedimental e jurisdicional.

d) Foi com a assinatura do Pacto São José da Costa Rica, pelo Brasil, que versava sobre inúmeras questões, inclusive sobre direitos fun-

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damentais, que acabou entrando no ordenamento jurídico brasi-leiro, por força do art. 60, § 4º, da CR/1988, a garantia da duração razoável do processo.

e) Para evitar qualquer discussão sobre constitucionalidade, foi po-sitivado em norma constitucional, pela Emenda Constitucional nº 45/2004, no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República, assegurando expressamente a todos os interessados, no âmbito judi-cial e administrativo, o direito à razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

f) Já, no novo Código de Processo Civil brasileiro/2015, podemos per-ceber, novamente, uma preocupação enorme com a duração razo-ável do processo, tanto que, no capítulo que verse sobre “normas fundamentais do processo civil”, verificamos que a expressão “du-ração razoável do processo” aparece em duas oportunidades, quais sejam, no art. 4º e no art. 6º.

g) No art. 4º do novo CPC, está dito que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”. E no art. 6º do mesmo Código está prescrito assim: “Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efeti-va”. Isso significa que a responsabilidade pela duração razoável do processo não é mais somente do juiz, mas de todos os sujeitos pro-cessuais, que de alguma forma participam do processo (juiz, partes, advogados, terceiros e Ministério Público).

h) Há uma ligação entre o princípio da cooperação jurisdicional e o princípio da razoável duração do processo, e, portanto, o art. 6º do novo Código de Processo Civil fez questão de ressaltar.

i) A razoável duração do processo é um termo genérico e impossível de ser aplicado sem que se leve em consideração o elemento tem-po como fator estruturante e definidor de sua aplicação. O termo, como sustentado, deve ser interpretado como elemento de garan-tia da tempestividade procedimental e jurisdicional (art. 5º, inciso LXXVIII, da CR/1988), como um pressuposto processual constitu-cional, sem o qual, infelizmente, não temos a existência de proces-so constitucional.

j) A colocação da duração razoável do processo (tempestividade pro-cedimental e judicial) como um pressuposto processual constitucio-nal é condicionante para a existência do processo constitucional. A sua ausência não importa na extinção do procedimento sem a resolução do mérito, nos termos da doutrina tradicional proces sual,

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mas no reconhecimento de violação de direitos fundamentais e, portanto, no reconhecimento de ineficiência estatal e de violação grave à legalidade, devendo ser extinto o processo sem o julgamen-to do mérito e nos remetendo à necessidade de reparar os danos causados, sejam de ordem moral, sejam de ordem material.

k) O dever de indenizar a parte prejudicada pela intempestividade procedimental e jurisdicional pode ser do próprio Estado e, solida-riamente, da outra parte que assim praticou atos que foram conside-rados contrários ao princípio da colaboração/cooperação judicial, nos termos do art. 6º do CPC/2015.

l) Inúmeros foram os exemplos citados no presente texto que busca a celeridade procedimental e jurisdicional. No entanto, como dito, a tempestividade procedimental e jurisdicional possui definição dife-rente, pois tem como pressuposto, justamente, a qualidade da deci-são, e essa qualidade passa pelo processo democrático, necessitan-do da observância do contraditório e da ampla defesa, do devido processo, do acesso à jurisdição e da eficiência. O novo CPC/2015 confunde celeridade procedimental e jurisdicional com tempestivi-dade procedimental e jurisdicional.

m) A preocupação exacerbada do novo Código de Processo Civil com a celeridade procedimental e jurisdicional, bem como com a quan-tidade de decisões em detrimento da qualidade, além de uma busca por padronização de decisões e a sua massificação, podem estar indicando para uma ausência de processo democrático no direito processual brasileiro.

n) A tempestividade procedimental e jurisdicional ou a duração ra-zoável do processo é um conceito indissociável do processo de-mocrático, do contraditório, da ampla defesa, do devido processo, do acesso à jurisdição e do duplo grau de jurisdição. Ou temos tempestividade procedimental e jurisdicional ou corremos o risco de convivermos de forma mais aguda com a arbitrariedade judicial e as decisões antidemocráticas.

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Parte Geral – Doutrina

A Alteração da Ordem Processual no Novo CPC – Aspectos Gerais e o Direito Empresarial

LuIz FeRnAnDO vALLADãO nOgueIRAAdvogado, Procurador do Município de Belo Horizonte, Professor e Coordenador da Pós-Gra-duação em Processo Civil da Faculdade de Direito Arnaldo Janssen, Professor Convidado da Pós-Graduação do IEC-PUC/MG, Membro do Conselho Editorial da Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro. Autor de diversos livros e artigos sobre Direito Processo Civil.

SUMÁRIO: Rápida referência aos princípios; Princípios relevantes para compreensão da alteração da ordem processual; A ordem processual e sua alteração; A inversão em situações relacionadas ao direito empresarial; Conclusão.

rÁpIda referÊnCIa aos prInCÍpIos

A Lei nº 13.105/2015, que consubstancia o novo Código de Processo Civil, encampou a compreensão de que as normas se identificam como gênero, do qual se extraem espécies como são as regras e os princípios.

A propósito, pode-se dizer que as regras têm contornos objetivos, de maneira que o Magistrado pode aplicá-las ao caso concreto, conforme a sua interpretação.

Diferente disso, os princípios trazem conceitos mais genéricos e amplos. Eles contribuem para a própria criação das regras, assim como na manifestação de escolha pelo Magistrado quando aquelas trazem cláusulas abertas. De igual forma, ajudam para a superação de conflitos entre regras distintas ou decorren-tes de lacunas legislativas.

De fato, já no primeiro artigo, o novo Código chama a atenção para o fato de que ele não se guiará por aprioristicamente regras legais, mas sim por “normas fundamentais”.

Em uma demonstração de que haverá certa horizontalidade entre as nor-mas, em vez de hierarquia, tem-se a mudança redacional adotada pelo legisla-dor no art. 140 do NCPC. Sim, no novel dispositivo, diz o Código, valendo-se de induvidosa generalidade, que “o juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico”. Na redação do dispositivo correlato no CPC/1973 constava, diferente disso, que o juiz não se recusaria a decidir sob a alegação de “lacuna ou obscuridade da lei” (art. 126). E, eviden-ciando a hierarquia à época adotada, constava na parte final do artigo: “No jul-

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gamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”.

Em outras palavras, antes, o Código Processual indicava preponderância das leis. Só não as havendo é que poderia se socorrer a outras fontes, inclusive aos princípios. Agora no novo Código, em sintonia com o que aqui já foi dito, excluiu-se aquela parte final que consubstanciava hierarquia em prol da lei, autorizando-se a utilização das demais fontes em aparente pé de igualdade.

prInCÍpIos releVantes para Compreensão da alteração da ordem proCessual

A boa-fé processual, na mesma linha do sempre vigente princípio da leal-dade, impõe conduta pautada pela eticidade. Tal imposição, como decorre do próprio art. 5º do NCPC, alcança todos que “de qualquer forma” participam do processo. Dito de maneira objetiva, a boa-fé processual importa que as partes, embora dotadas de parcialidade, devem guardar coerência em suas manifesta-ções e posturas processuais, não criando embaraços à prestação jurisdicional.

Já o princípio da cooperação, previsto no art. 6º do NCPC, exige trans-parência no diálogo entre os sujeitos do processo. É referencial a ser seguido, a fim de obter-se um processo justo e que não seja maculado por armadilhas. Se o desejo é que o mérito seja desatado, impõe-se colaboração de todos.

De outro lado, tem-se como verdadeira obsessão do novel Código o atin-gimento do mérito, ou seja, o efetivo desate da lide. A isso se tem dado o nome de princípio da primazia do mérito. Com efeito, o art. 4º do novo Diploma Pro-cessual informa que a duração razoável do processo está atrelada à “solução in-tegral do mérito”. De igual forma, o art. 6º estabelece que a cooperação entre os sujeitos do processo tem em mira alcançar “decisão de mérito justa e efetiva”. E o art. 139, ao versar sobre as incumbências do Juiz, insta-o a optar, sempre, por “determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais” (inc. IX).

Anote-se, ainda, o estímulo do legislador à autocomposição. Sim, diz o código que “a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públi-cos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial” (art. 3º, § 3º, do NCPC). A permissividade à solução consensual de conflitos chegou, inclusive, ao ponto de viabilizar-se, doravante, a autocomposição ao redor do procedimento e dos ônus, poderes, faculdades e deveres processuais das partes, o que pode ser estabelecido antes mesmo da instauração do proces-so ou durante seu trâmite (art. 190 do NCPC).

Por derradeiro, pontue-se que o Código, como não poderia deixar de ser, manteve o princípio do impulso oficial (art. 2º do NCPC). Dele decorre a com-

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preensão no sentido de que as partes devem vir a juízo com suas postulações, porém, assim feito, compete ao Magistrado, na direção do processo, dar-lhe impulso e prosseguimento ex officio. Mais ainda, o Magistrado detém poder inquisitivo (iniciativa probatória – art. 370 do NCPC), o qual lhe atribui flexibi-lidade, sem perda de imparcialidade, para apurar a verdade real.

Trazendo os referidos princípios ao tema ora em debate (ordem proces-sual), é possível fixar as seguintes premissas objetivas:

– Para que o Magistrado visualize claramente os limites da lide e con-duza o processo voltado ao efetivo desate do mérito, as partes tra-rão, de maneira leal quando da petição inicial e da resposta, suas pretensões probatórias (arts. 319, VI, e 336 do NCPC) e, desde já, a prova documental (art. 434 do NCPC).

– Quando do saneamento (art. 357 do NCPC), competirá ao juiz, en-tre outras atribuições, fixar os limites fáticos e probatórios, assim como eventual inversão do ônus probatório. De tal forma, o Ma-gistrado cooperará para que as partes saibam como se comportarão durante a instrução probatória.

– Em seguida, as partes, imbuídas de boa-fé e movidas pelo espírito de cooperação, proporcionarão o debate e a produção das provas pendentes, em conformidade com o que foi deliberado no sanea-mento aludido.

– Nada obsta, inclusive, que se componham com relação aos ônus probatórios ou, até mesmo, quanto à ordem processual. Aliás, tal composição pode ocorrer antes mesmo do ajuizamento da ação (art. 190 do NCPC)1.

– O Juiz, contudo, não é mero expectador. Compete-lhe, enquanto dirigente do processo e observando o impulso oficial, dar-lhe movi-mentação segundo o fluxo legal e, sempre e em qualquer instante, sanear vícios ou imperfeições que possam retardar o exame do mé-rito.

– De igual forma, o magistrado, sempre atento à imparcialidade e ao contraditório efetivo, poderá determinar a produção de provas, ainda mais por ser ele quem as analisará.

1 “Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.”

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a ordem proCessual e sua alteração

O Direito Processual sempre esteve como espécie do Direito Público, na medida em que, até a vigência do CPC/1973, o Juiz devia atenção ao rito legal, com poucos poderes de flexibilização. De igual forma, as partes não detinham poderes mais intensos para negociar a alteração dos ritos e suas próprias in-cumbências processuais. Em outras palavras, o processo, entendido como meio judicial para a aplicação do direito material, sempre era regrado pelo Estado, com espaço reduzido para alterações pelo juiz ou pelas partes.

A ideia de um processo previamente idealizado estava associada ao pa-radigma da segurança. Ou seja, para que as partes não fossem prejudicadas no exercício oportuno do contraditório e para que o processo alcançasse seu fim, era necessário seguir um rito reto e inflexível.

Porém, tal rigor acabava por levar a resultados injustos, como aqueles decorrentes de inércia probatória da parte, muitas vezes advinda da sua fragi-lidade econômica ou social. De igual forma, o preconizado rito inflexível im-pedia o saneamento de vícios e conduzia à extinção de processos sem exame de mérito ou o não conhecimento de recursos. Em situações deste jaez, como a lide não chegava a ser equacionada, as partes ficavam no desalento, restando ao Judiciário o descrédito.

Pois bem, a nova ordem legal trouxe, movida por princípios de grandeza constitucional – como são os do devido processo legal, da razoável duração do processo, do livre-arbítrio ou autonomia das partes –, o recebimento pelo pro-cesso civil de estímulos próprios do direito privado2. Agora, o Juiz tem poderes para mudar a ordem processual, podendo as partes, inclusive, pactuarem nessa seara3.

Com efeito, a primazia do mérito exige que não se perca tempo com atos processuais desnecessários que atrasarão a solução do conflito. No sentido

2 Atualmente, o Estado e o direito público têm sido invadidos pela ideia da consensualidade: revê-se a atuação imperativa do Poder Público, a fim de buscar maior consenso com os cidadãos, inclusive como técnica para alcançar enquadramento mais democrático da atuação estatal, não mais permeada pela perspectiva democrática apenas para a escolha dos ocupantes do poder estatal, mas sim em busca da evolução para a democracia administrativa. Essas duas perspectivas gerais do direito público (consensualidade e eficiência) são introduzidas no mundo processual a partir do reconhecimento dos atuais princípios da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF) e da cooperação, nitidamente entrelaçados no âmbito do novo CPC, quando se dispõe que todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva (art. 6º) (ANDRADE, Érico. A contratualização do processo. In: THEODORO JR., Humberto (Coord.). Processo civil brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2016. p. 49).

3 O fato é que, com a abertura do Estado para a consensualidade, não deixa de ser possibilidade das mais interessantes a abertura do processo para esse tipo de ajuste processual, que permite maior participação e cooperação entre as partes e o juiz, no ajustamento da forma de condução processual, engajando as partes na condução do processo. Conjunto que, no mínimo, abre o processo para uma perspectiva participativa na sua condução, que passa a ser não apenas unilateral, imposta pelo Estado-juiz (ANDRADE, Érico. A contratualização do processo. In: THEODORO JR., Humberto (Coord.). Processo civil brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2016. p. 53).

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inverso também tem valia o princípio citado, pois não mais se admite que a en-trega do bem de vida seja postergada a fases posteriores, se é possível defini-lo com clareza, desde já4.

Ao influxo de tais ponderações, pode-se apontar, à guisa de exemplos, os seguintes dados quanto à inversão da ordem processual no novo sistema codificado:

– Art. 317 – Impõe ao juiz oportunizar o saneamento do processo e correção do vício antes de extingui-lo sem resolução de mérito. Ou seja, o juiz deve oportunizar a correção do vício, mesmo que já fei-tas tentativas anteriores, de forma que, se vendo na contingência de extinguir o feito sem resolução de mérito, há de instar, derradeira-mente, a parte interessada. Nessa hipótese, volta-se à etapa anterior, mas assegura-se o efetivo enfrentamento do mérito.

– Art. 338 – Nesse dispositivo, o legislador faculta ao autor, deparan-do com preliminar de ilegitimidade ou invocação de que o mesmo não é “responsável pelo prejuízo invocado”, alterar sua petição ini-cial “para substituição do réu”. Ou seja, mitiga-se o rigor da esta-bilidade da lide, no plano subjetivo, e permite-se mudança do réu após a contestação. Dito de outra forma, tal dispositivo repugna a ideia de extinção do processo sem resolução de mérito e autoriza a solução da lide com a inserção de novo réu.

– Art. 139, VI – Permite não só a dilação de prazos processuais como, em especial, que venha o juiz “alterar a ordem de produção dos meios de prova”. Por tal dispositivo, que será esmiuçado mais adiante, o legislador, de forma programática e principiológica, insta o Juiz a “conferir maior efetividade à tutela do direito”, mesmo que, para tanto, flexibilize a ordem na produção das provas.

– Art. 361, caput – Diferente do CPC/1973 e atento à provocação do citado art. 139, IV, do NCPC, o legislador, ao estabelecer ordem na produção de provas em audiência, diz que se deve segui-la, “prefe-rencialmente”. Isso significa que a ordem não é absoluta, compor-tando adequações conforme as especificidades do caso.

4 Aliás, o art. 491 do NCPC estimula a apuração dos valores, sempre que possível, pela decisão da fase cognitiva, ainda que o pedido inicial seja genérico. “Art. 491. Na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso, salvo quando: I – não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido; II – a apuração do valor devido depender da produção de prova de realização demorada ou excessivamente dispendiosa, assim reconhecida na sentença. § 1º Nos casos previstos neste artigo, seguir-se-á a apuração do valor devido por liquidação. § 2º O disposto no caput também se aplica quando o acórdão alterar a sentença”.

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– Arts. 331, 333, § 3º, e art. 485, § 7º – Estes dispositivos admitem que o Juiz, mesmo após proferir decisão extintiva do feito (indeferi-mento da inicial, improcedência liminar e extinção sem resolução de mérito), volte atrás e retrate-se, dando, em seguida, continuidade no processo.

– Art. 938 – Este dispositivo e seus parágrafos trazem a proposição de que as preliminares antecedem ao mérito. E, mais ainda, se re-sultarem na identificação de vício sanável, elas serão corrigidas por mera diligência, sem anulação do ato judicial recorrido. E a grande novidade está no § 3º do citado artigo: identificado cerceamento ao direito de produção de provas ou mesmo havendo iniciativa pro-batória pelo próprio tribunal, haverá mera conversão em diligên-cia, sendo que, produzido o elemento probatório, o julgamento na instância recursal será concluído. Ou seja, as decisões não serão anuladas, a fim de que sejam renovadas após a produção da prova faltante. O próprio tribunal resolverá de imediato o recurso após vir aos autos a prova.

– Art. 700, § 5º – Trata-se de exemplo típico da fungibilidade das ações no novo Código. O legislador, em referido dispositivo, permi-te que o Juiz, em vez de extinguir ação monitória sem resolução de mérito (descabimento), inste o autor para adaptá-la ao procedimen-to comum e, assim, oportunizar seja alcançado o desate da lide. Em situações deste jaez, o processo retrocede à fase inicial postulatória, mas evita-se a extinção do feito sem resolução de mérito.

– Art. 932, parágrafo único – Por força desse dispositivo, o Relator, mesmo que retarde um pouco o julgamento do recurso, a fim dele conhecer (superar o juízo de admissibilidade), concederá ao recor-rente oportunidade para sanar vício ou complementar documenta-ção. Ou seja, para alcançar o mérito, vale voltar um pouco atrás e corrigir vício formal.

Ao que se verifica, o novo Código, prestigiando a menor intervenção estatal na vontade das partes e a primazia do mérito, contemplou inversões e acordos quanto à ordem processual.

E a prática forense mostrará inúmeras situações que revelarão o acerto do legislador, pois a segurança processual não pode se transformar em dogma, ao ponto de, desnecessária e desproporcionalmente, impedir o exame do mérito.

A procura pela verdade real, de outro lado, fomentará diversas situações de inversão, mormente no campo da produção das provas.

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Assim é que se pode exemplificar com a hipótese em que, quando do exame de tutela provisória sobre paralisação ou demolição de determinada obra, o juiz, já ao início do processo e antes de proferir dita decisão, marque a prova pericial em caráter de urgência. Ora, se o dano pode ser irreversível tanto ao autor quanto ao réu, o juiz poderá determinar prova que lhe traga a segu-rança necessária para se posicionar. A flexibilização na ordem da produção das provas (art. 139, VI, do NCPC) autoriza que assim faça o Magistrado.

Na mesma toada, pode acontecer de o juiz, em uma ação indenizatória, designar, em primeiro lugar, a audiência de instrução e julgamento, para apura-ção da culpa. E, em uma autêntica inversão da sequência probatória5, designar a perícia depois, a fim de quantificar os danos sofridos pela vítima, uma vez evidenciada a responsabilidade civil. Ou seja, o juiz, de uma só vez no exemplo dado, permitirá que a perícia seja designada apenas se imprescindível (prévio reconhecimento da culpa do agente), e que os valores sejam, desde já e inde-pendente de posterior liquidação, fixados na decisão final.

Ainda na ilustração por exemplos, a despeito de aparente peremptorie-dade do parágrafo único do art. 456 do NCPC6, poderá, inexistindo real pre-juízo ao réu e com base no que contém o art. 139, VI, do mesmo Codex, ser ouvida, em primeiro lugar, alguma testemunha por este arrolada, antes da oitiva daquelas do autor. Ora, o que o parágrafo único assevera é a possibilidade de o juiz aceitar e dar concretude à composição das partes quanto à inversão da inquirição das testemunhas. Porém, nada obsta que, com base no seu poder instrutório, inverta referida sequência7. É o que pode acontecer na hipótese de desnecessário e prejudicial adiamento de audiência para oitiva de testemunha

5 O art. 477 do NCPC evidencia que, como regra geral, o laudo pericial antecederá à audiência de instrução e julgamento, devendo ser apresentado em pelo menos 20 dias antes de sua realização. Aliás, o perito poderá ser ouvido na referida audiência, acerca do laudo que já produziu (§ 3º do art. 477).

6 “Art. 456. O juiz inquirirá as testemunhas separada e sucessivamente, primeiro as do autor e depois as do réu, e providenciará para que uma não ouça o depoimento das outras. Parágrafo único. O juiz poderá alterar a ordem estabelecida no caput se as partes concordarem.”

7 A propósito, mesmo no CPC/1973 já se admitia a viabilidade de inversão, partindo do pressuposto de não ser absoluta a ordem:

“Prova. Inversão na ordem prevista no art. 452 do CPC. Ausência de prejuízo. Além de não ser peremptória a ordem estabelecida no art. 452, do CPC, há a parte de evidenciar o prejuízo que lhe adviria com a inversão ocorrida. Aplicação ao caso, ademais, da Súmula nº 283-STF. Recurso especial não conhecido”. (STJ, REsp 35.786/SP, Rel. Ministro Barros Monteiro)

“A ordem de oitiva das testemunhas prevista no artigo 413 do estatuto processual aplicar-se-á apenas quando as testemunhas forem ouvidas na mesma audiência, pois no caso de alguma residir em comarca distinta, necessitando ser ouvida por cumprimento de carta precatória, não há como compatibilizar esta norma, em face da necessidade de cada juízo designar a data da audiência de acordo com a disponibilidade das atividades forenses, evitando-se, assim, atrasos e embaraços na conclusão dos atos processuais que lhes cabe cumprir.” (TAMG, Apelação Cível nº 2.0000.00.367964-1/000, Relª Juíza Tereza Cristina da Cunha Peixoto, DJ 23.11.2002)

“A inversão da ordem estabelecida no art. 413 do Código de Processo Civil não constitui nulidade, se não demonstrado prejuízo para qualquer das partes, mormente quando a oitiva das testemunhas se deu por meio de carta precatória, razão pela qual o não provimento do Agravo Retido é medida que se impõe [...].” (TJMG, Apelação Cível nº 1.0079.10.007376-0/001, Rel. Des. Arnaldo Maciel, DJ 10.10.2014)

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do réu, se a do autor ainda não foi ouvida por carta precatória pendente de cumprimento. De igual forma, é o que pode acontecer no caso em que o juiz, para avaliar a suspeição de testemunha do autor, tiver que, antes, ouvir aquela arrolada pelo réu. Ou mesmo naquele caso em que a testemunha do réu trará, pela sua qualificação, informações fáticas que facilitarão ao juiz a coleta de dados daquela arrolada pelo autor.

Vale imaginar, ainda, a hipótese de, após exaurimento da fase probató-ria e já em alegações finais, surgir um fato não comprovável por simples do-cumento e que deva ser levado ao conhecimento do juízo8. E imagine-se que tal fato seja comprovado por ata notarial (art. 384 do NPC)9, prova esta que poderá ser admitida pelo Magistrado, desde que ouvida a parte contrária. O referido fato poderá ser comprovado – também imagine-se – por meio do procedimento de produção antecipada de prova, hipótese em que os autos respectivos são entregues ao promovente da demanda (art. 383, parágrafo único, do NCPC). Enfim, tem-se situações em que, mesmo sem redesignar audiência ou perícia, o juiz terá acesso, já em momento próximo ao julgamento, a fatos relevantes e que vieram à tona posteriormente.

Seguindo adiante, é importante pontuar, agora no campo recursal, tam-bém a viabilidade de produção de provas.

De fato, o novo sistema processual ampliou o chamado efeito translativo dos recursos. Trata-se da possibilidade de a instância recursal conhecer de ma-téria ainda não enfrentada na instância a quo e, sequer, veiculada no recurso originariamente. Ou seja, a alegação de supressão de instância, ínsita ao duplo grau de jurisdição, deixa de ser relevante.

Pode-se identificar tal situação, por exemplo, na permissão do Código Processual a que a instância ad quem, por meio de mera diligência, supra os vícios que maculam o processo, sem impor nova decisão à instância a quo (conferir art. 938, e seus parágrafos, do NCPC).

No concernente à apelação, o código permite que o tribunal identifique o vício formal ou o equívoco advindo da extinção do feito sem desate da lide, corrija-os e julgue “desde logo o mérito” (art. 1013, § 3º, do NCPC).

No tocante às provas, partindo o legislador da premissa de que o princí-pio do duplo grau de jurisdição pode ser relativizado, assim estabeleceu:

8 “Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão. Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir.”

9 “Art. 384. A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião. Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.”

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a) O art. 933 do NCPC admite a apuração e consideração de fato su-perveniente à decisão recorrida, devendo o relator, em tal hipótese, dar vista à parte contrária. Em outras palavras, se o fato pode vir à baila durante o trâmite do recurso, necessariamente deve-se permi-tir à parte interessada prová-lo, ainda que em sede recursal.

b) Antes disso, o mesmo código acentua ser competência do relator, de forma geral nos tribunais, “dirigir e ordenar o processo [...], in-clusive em relação à produção de prova” (art. 932, I, do NCPC).

c) Mais enfática e diretamente, o art. 938, § 3º, do NCPC, aqui já ci-tado rapidamente, estabelece o procedimento para a produção de provas em sede recursal. Diz aquele dispositivo que, “reconhecida a necessidade de produção de prova, o relator converterá o julga-mento em diligência, que se realizará no tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, decidindo-se o recurso após a conclusão da ins-trução”.

Portanto, a prova, seja qual for sua natureza, pode, em determinadas si-tuações, ser produzida no tribunal ou por ordem deste, sem necessidade de que a decisão recorrida seja anulada e outra proferida em seu lugar. A primazia do mérito prepondera sobre o princípio do duplo grau de jurisdição, permitindo a imediata decisão pela instância revisora10. O poder inquisitivo da instância ad quem dá esta maior extensão ao efeito translativo dos recursos.

10 No Livro Recursos e Procedimentos nos Tribunais no Novo Código de Processo Civil, assim acentuei sobre o tema (D’Plácido, 2016, p. 34/35):

“Como já adiantado, o duplo grau de jurisdição, que já vinha sendo relativizado no CPC/1973, passou a ser tratado pelo legislador como de menor importância. Não há como ignorar essa realidade!

O que aconteceu foi que, no confronto entre o princípio do duplo grau de jurisdição e o da duração razoável do processo, preponderou, na livre opção do legislador, o segundo.

Com efeito, em diversas situações, verifica-se que o novel Código eliminou a necessidade de exaurimento do debate na instância inferior, sendo cabível a manifestação única sobre determinado tema pela instância recursal.

Assim é que, por exemplo, a nulidade pela ausência de produção de provas não ensejará a repetição de atos processuais e da própria decisão pelo magistrado da instância inferior. Sim, o art. 938 do NCPC prevê, em seu § 3º, que, em casos tais, “o relator converterá o julgamento em diligência, que se realizará no tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, decidindo-se o recurso após a conclusão da instrução”.

Na hipótese acima aventada, ao que se percebe da clareza da norma, não se submeterá ao crivo da instância primeira a prova nova colhida. Poderá, isso sim, o tribunal decidir diretamente sobre a nova prova, relativizando-se aí o duplo grau de jurisdição.

Na mesma toada, vê-se, no tocante ao julgamento de apelação, que o legislador quer que o tribunal decida “desde logo o mérito” (art. 1013, § 3º, NCPC), ainda que a sentença recorrida seja de extinção do processo sem resolução de mérito ou esteja ela maculada por nulidade. De fato, a circunstância de não haver efetivo exame da lide pela instância originária não é impeditivo à apreciação da mesma pelo tribunal.

As referidas alterações e outras mais neste sentido estão coesas com a tendência legislativa. Já vinha o nosso legislador assim agindo e, embora se trate de tendência perigosa, é necessária, ante a expectativa do jurisdicionado com a decisão de mérito célere e com um processo menos burocrático.

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Neste diapasão, tem-se autêntica inversão da ordem processual, a se im-plementar quando a instância recursal verificar a necessidade de produção de provas. Vale dizer que, mesmo já decidida a lide em instância anterior e encer-rada a fase probatória, pode-se voltar àquela etapa por ordem da instância ad quem, produzindo-se, assim, as provas pendentes. Produzidas as provas, como se viu, retoma-se o julgamento, sacramentando-se a alteração da ordem proces-sual (por exemplo, provas novas depois da própria sentença).

É importante destacar que a previsão legal anteriormente citada está inse-rida no capítulo que versa sobre “ordem dos processos no tribunal”. Aplica-se, pois, a todo e qualquer recurso, desde que sua natureza comporte discussão sobre matéria fática.

Em assim sendo, deve-se dar por superada a exegese extremamente ra-dical, no sentido de que o efeito devolutivo do agravo de instrumento deve-se limitar aos fatos e às provas, inclusive documentais, já ofertadas em 1ª instância. Realmente, como acentuado, o tribunal pode conhecer, em qualquer recurso, de fatos novos ou pretéritos, ainda não submetidos ao 1º grau, desde que liga-dos à questão controvertida que ensejou a decisão interlocutória agravada. O princípio da primazia do mérito aqui estudado, aliado àquele que versa sobre a eficiência (art. 8º do NCPC), exige a decisão de imediato sobre a prova nova.

A propósito, vale acrescer que o art. 435 do novel Código é cristalino ao permitir a juntada de documentos, ainda que posteriormente à petição inicial ou contestação. E, ao estabelecer tal permissão, o legislador, sem excluir a fase recursal de seu alcance, apenas exigiu, no parágrafo único do citado artigo, a justificativa da parte e a fundamentação do Magistrado (sob a ótica do princípio da boa-fé).

A ressalva que cabe, a esta altura, é sobre a necessidade de a instância ad quem, por força do contraditório efetivo, ouvir a parte contrária sobre a nova prova (arts. 10 e 933 do NCPC). Sim, não se concebe a ideia de haver a produ-ção de prova sem que sobre ela se manifeste a parte contrária.

a InVersão em sItuações relaCIonadas ao dIreIto empresarIal

O Direito Empresarial consiste “no conjunto de normas jurídicas que re-gulam as transações econômicas privadas empresariais que visam à produção e à circulação de bens e serviços por meio de atos exercidos profissional e habi-tualmente, com o objetivo de lucro”11.

E, para arrematar, cabe consignar que tais mudanças não ofendem a Constituição Federal, na medida em que o duplo grau de jurisdição, por ser princípio implícito, comporta sim atenuações, ainda mais se atentas estas à efetividade e à duração razoável do processo.”

11 REQUIÃO, Rubens Edmundo. Curso de direito comercial. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. 2 v.

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Em tal seara, diversos são os conflitos que consubstanciarão lides e ense-jarão a intervenção judicial. Sem dúvida, porém, que o novo Código Processual deu ênfase à denominada ação de dissolução parcial de sociedade, tanto que lhe dedicou um capítulo (arts. 599 a 609 do NCPC).

O art. 599 deixa claro que o litígio pode versar sobre resolução de socie-dade cumulativamente com a apuração de haveres, mas também apenas sobre um ou outro, isoladamente (inc. III)12.

O regramento eleito pelo legislador, na hipótese de cumulação, demons-tra o propósito claro de definir na fase cognitiva a dissolução da sociedade, ficando a discussão sobre os valores devidos aos sócios ou à sociedade para a liquidação de sentença. Com efeito, dando concretude aos princípios da pri-mazia do mérito e da eficiência, o legislador chega a criar estímulo ao réu para concordar com a dissolução da sociedade, isentando-o, em contrapartida, de condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais (art. 603, § 1º, do NCPC). E, assim solucionado o pedido de dissolução, gasta-se energia apenas, e com mais rapidez, na apuração dos haveres.

Com efeito, vale verificar que o art. 603 estabelece que, havendo “mani-festação expressa e unânime pela concordância da dissolução, o juiz a decre-tará, passando-se imediatamente à fase de liquidação”. No § 1º, como dito, o legislador afasta a hipótese de honorários sucumbenciais, caso haja a referida concordância unânime. Mas, se houver contestação, a lide, quanto à dissolu-ção e outros pontos controvertidos, será resolvida por decisão de mérito. E a apuração de haveres será, por praticidade escolhida pelo código, relegada para a liquidação de sentença, a qual, na dicção do § 2º, “seguirá o disposto neste Capítulo”.

A liquidação de sentença na ação de dissolução parcial de sociedade, de fato, tem regramento específico, estabelecido nos arts. 604 e seguintes do Código, os quais disciplinam, em especial, sobre os critérios de apuração dos haveres.

É importante destacar três cuidados do legislador, adotados expressa-mente: (i) permissão à sociedade para invocar, no âmbito desta mesma ação de dissolução parcial13, “indenização compensável com o valor dos haveres a

12 “Art. 599. A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter por objeto: I – a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; e II – a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou III – somente a resolução ou a apuração de haveres. § 1º A petição inicial será necessariamente instruída com o contrato social consolidado. § 2º A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado, por acionista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim.”

13 O STJ tem precedente, na vigência do CPC revogado, recusando tal cumulação: “[...] 4. A ação de dissolução parcial de haveres é contenda deveras específica, que se limita à superficialidade das questões atinentes a forma de apuração do patrimônio contábil e seus haveres – seja adotando o contrato social, seja em balanço

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apurar” (art. 602); (ii) imposição à sociedade ou aos sócios que nela permane-cerem no sentido de que “depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos”, a qual poderá ser levantada “desde logo” (§§ 1º a 3º do art. 604); (iii) determinação de que, “até a data da resolução, integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos sucessores a participação nos lucros14 ou os juros sobre o capital próprio declarados pela sociedade e, se for o caso, a remunera-ção como administrador” (art. 608).

Pois bem, na sequência lógica estabelecida pelo Codex, depois de resol-vida a sociedade (dissolução) e o direito à eventual indenização, assim como outro pedido que tenha sido objeto de cumulação (fase cognitiva), é que se passará à apuração de haveres propriamente dita (liquidação).

Ocorre que, para este prévio reconhecimento de dilapidações ou frau-des por sócio e do consequente direito ressarcitório à sociedade, poderá ser indispensável a prova pericial. Mas como é inviável ter a decisão condenatória feição condicional (parágrafo único do art. 492 do NCPC), poderá haver, em casos tais, inversão na ordem processual e, na fase cognitiva mesmo, ser reali-zada prova pericial e, desde já, apuradas as dilapidações ou fraudes, essenciais que são à análise do direito material em discussão (indenização). Inclusive, pelo princípio da economia processual e, se viável, poderá o Magistrado, em casos tais, aproveitando da prévia realização da perícia, já definir os critérios de apu-ração e fixar os haveres.

Com efeito, à luz da instrumentalidade das formas, o procedimento es-pecial poderá ser alterado, caso pelo rito efetivamente adotado seja alcançado

especialmente levantado, o que sumariza o seu conhecimento, limitando sua extensão e/ou profundidade. 5. Com efeito, discussões sobre eventuais vícios de gestão, atos ultra vires societatis ou ainda abusos ou desvios em atos de administração, concorrência desleal, bem como eventuais artimanhas para fins de prejudicar determinado sócio, por certo, escapam aos limites objetivos da ação de resolução que, com a análise da situação patrimonial da sociedade, terá a função de apurar os cabedais do sócio egresso e, ao mesmo tempo, permitir o prosseguimento da sociedade empresária, com eventual preservação da empresa. 6. No caso, eventual indenização por descumprimento contratual, concorrência desleal, uso indevido da firma social, desvio de capital, há de ser apurada, se for o caso, por meio de ação própria, permitindo ampla defesa e produção de provas aos réus e chamando à lide possíveis terceiros prejudicados, sob pena de desvirtuar a dissolução em comento. [...]” (REsp 1444790/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJ 25.09.2014). Porém, enfatizando a adoção do rito ordinário (expressão do CPC/1973), o mesmo STJ, posteriormente, decidiu diferente: “A não adoção do rito especial na dissolução de sociedade em comum (de fato) e a cumulação dos pedidos de indenização da inicial não importa nulidade, visto que o rito comum ordinário é mais amplo e mais completo, mormente quando exercidos a ampla defesa e o contraditório pela parte contrária. Ademais, devem ser prestigiados os princípios da economia processual, efetividade, respeito ao contraditório e ausência de prejuízo concreto. Precedentes” (AgRg-REsp 1563983/ES, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 12.05.2016).

14 Ainda na vigência do CPC/1973, assim entendia a jurisprudência: “Na hipótese de retirada de um dos sócios da sociedade, a apuração de haveres deve ser efetivada da forma mais ampla possível, tendo em vista os valores reais do patrimônio social, para se apurar o patrimônio líquido, visando garantir a divisão lídima da sociedade, com a exata quantificação do ativo, passivo e lucros eventualmente não repassados ao sócio retirante. Tais elementos deverão ser levados em consideração pelo juízo, entregando às partes o que lhes cabe, sob pena de enriquecimento ilícito dos sócios remanescentes ou do sócio dissidente” (TJMG, Agravo de Instrumento nº 1.0024.94.094234-5/002, Rel. Des. José Flávio de Almeida, DJ 18.04.2011).

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o fim almejado por aquele (no caso da ação de em exame, o levantamento real, a tempo e modo, dos haveres). O que não se pode alterar, por decisão do Magistrado, são os critérios impostos pelo legislador para a apuração dos ha-veres, como é o caso da necessária fixação da data da resolução da sociedade (art. 604, I, do NCPC) e a utilização do balanço de determinação (art. 606 do NCPC). Estes não podem ser olvidados pelo magistrado.

Destaque-se que a vantagem da apuração dos haveres, apenas na época da liquidação de sentença, reside na circunstância de que a perícia, nessa re-gra geral, poderá abarcar eventuais ocorrências havidas no curso do processo, sendo, assim, eficiente e definitiva. Mas, com exceção da hipótese em que a data da resolução da sociedade é aquela do trânsito em julgado da decisão que dissolvê-la (art. 605, IV, do NCPC15), nas demais situações os levantamen-tos periciais considerarão, a rigor, movimentações anteriores à instauração do processo, inexistindo, pois, prejuízos pela inversão da ordem quanto à prova pericial16. Mas é evidente que se deve prestigiar, ao máximo, o critério do le-gislador, até porque este evita, por situações diversas e próprias da discussão, riscos de repetição ou complementação de prova pericial.

Volvendo aos exemplos, outra situação a ponderar-se está naquele caso em que inexista controvérsia no processo sobre determinada parcela, a qual, à luz dos citados §§ 1º a 3º do art. 604, a rigor, deve ser, desde já, depositada pelo devedor e levantada pelo credor. Pode acontecer, porém, de a rubrica ser incontroversa (por exemplo, valores decorrentes de determinadas transa-ções) e o valor correlato, diferente disso, ser controvertido. É direito subjetivo do credor, ante a incontrovérsia e em vista do princípio da eficiência, levan-tar o que advém da parcela pacificada. Para se apurar o montante, contudo, será necessária prova pericial ou outra modalidade probatória17, o que, ante o art. 139, VI, do NCPC, poderá ser feito ao início do processo mesmo, a fim de que o credor, mormente em situações de necessidade, possa receber aquilo que não está marcado pelo dissenso.

Pode-se avançar em outro exemplo (ainda na ação de dissolução parcial da sociedade), qual seja a hipótese em que, na forma do art. 608 do NCPC, o sócio precisa receber a devida remuneração, até mesmo para sua subsistência. Ainda que a total extensão dos haveres seja complexa e, portanto, realizada

15 A data da resolução da sociedade será: “[...] IV – na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade”.

16 Os arts. 604, 606 e 608 do Código revelam que os valores serão apurados considerando a data da resolução da sociedade, que, na maioria das vezes, é anterior ao próprio ajuizamento da ação (art. 605, incs. I a III e V).

17 Anote-se a viabilidade da prova técnica simplificada (art. 464, §§ 2º a 4º, do NCPC); a apresentação de laudos e/ou pareceres técnicos pelas partes, mesmo que, por ordem do juiz, depois da inicial e contestação (art. 472 do NCPC); perícia consensual (art. 471 do NCPC); diligência por Oficial de Justiça (art. 154, I, do NCPC) etc.

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apenas na fase de liquidação, justifica-se, em casos tais, a antecipação de prova pericial ou outra que a supra. De tal forma, apurar-se-á o montante da referida remuneração, que poderá ser concedida pelo juiz, se incontroversa (art. 604 e parágrafos) ou, mesmo se controvertida, em sede de tutela provisória (art. 300 do NCPC).

Não se pode ignorar situações de dilapidação, dissimulação ou oculta-ção de dados, a inviabilizar que se aguarde a fase de liquidação de sentença. Em hipóteses tais, para se apurar elementos imprescindíveis, ainda que não se trate propriamente da perícia destinada a apurar os haveres, pode-se requerer produção antecipada de provas em feito separado ou mesmo o simples arrola-mento dos bens (art. 381, § 1º, do NCPC).

Enfim, são diversas as situações de alteração da ordem processual no campo do Direito Empresarial, notadamente na ação de dissolução parcial de sociedade. O que se deve ter em mente, frise-se, é que o rito especial dedicado à ação em comento pode ser alterado ou relativizado, desde que inexista prejuízo à ampla, correta e eficiente apuração dos haveres.

ConClusão

A nova sistemática processual adota princípios que devem nortear toda a interpretação sobre o próprio Código. Assim é que a primazia do mérito e a eficiência autorizam a alteração da ordem processual, desde que inexista ofensa à desejada boa-fé.

Dessa forma, afigura-se viável e até desejável a alteração das etapas pro-cessuais, seja por consenso entre as partes seja por conveniência e praticidade verificadas pelo Magistrado.

A fim de alcançar decisão de mérito o quanto antes, deve o Magistrado evitar a produção desnecessária de atos processuais e, ao mesmo tempo, não postergar a especificação do bem de vida a ser entregue ao vencedor.

Com certeza, a alteração da ordem processual encontra campo fértil no Direito Empresarial, com ênfase à ação de dissolução parcial de sociedade, cujo rito especial se concentra na fase de liquidação. Desde que não se subtraia dos litigantes o acesso eficiente à correta e abrangente apuração dos haveres, inexistirá óbice para eventuais modificações e/ou antecipações no rito especial em estudo.

Ao nosso sentir, a opção legislativa é positiva, veiculando escolha do legislador pela eficiência do processo e desprezo pela exagerada adoração às formas.

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Parte Geral – Doutrina

Argumentos Consequencialistas: Legitimidade ou Arbitrariedade?

Consequentialism Arguments: Legitimacy or Arbitrariness?

DAnIeLA COPeTTI CRAvOMestre e Doutoranda em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul − UFRGS.

RESUMO: Um assunto muito em voga atualmente é a utilização de argumentos consequencialistas na interpretação jurídica. Esse assunto desperta interesse e promove discussões acaloradas, não apenas pela dificuldade prática inerente a esses argumentos quando da sua aplicação, mas princi-palmente pelo risco que representam ao Estado Democrático de Direito e à separação de poderes.

Apesar disso, acreditamos que ignorar as consequências no momento decisório não seja a solução que gere melhores externalidades ao desenvolvimento das instituições e ao Direito. Dessa forma, na luta por uma harmonia entre os argumentos consequencialistas e a dogmática jurídica, o trabalho busca afastar a valoração per se de subsidiariedade dos argumentos consequencialistas, a fim de verificar uma possível institucionalização desses.

PALAVRAS-CHAVE: Interpretação; argumentos consequencialistas; institucionalização.

ABSTRACT: A subject much in vogue today is the use of consequentialist arguments in legal in-terpretation. This issue arouses interest and promotes lively discussions, not only by the practical difficulties inherent in these arguments when they are applied, but mostly for the risk they represent to the democratic rule of law and the separation of powers.Nevertheless, we believe that ignoring the consequences in the decision making time is not the solution that generates the best externalities to the development of institutions and law. Thus, in the struggle for harmony between the consequentialist arguments and legal dogmatics, the work seeks to exclude the valuation per se of the subsidiarity of consequentialist arguments in order to verify a possible institutionalization of these.

KEYWORDS: Interpretation; consequentialist arguments; institutionalization.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Consequencialismo; 2 Problemática; 3 Possível institucionalização?; Consi-derações finais; Referências.

Introdução

Ignorar que decisões judiciais possuem sim consequências que refletem no campo social, econômico e político do País é negar uma realidade latente, e sobre isso não há dúvidas. A questão se torna mais acalorada e tumultuada, por outro lado, quando se põe em pauta se os juízes devem ou não levar em consideração essas consequências quando forem decidir.

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Tal problemática recebe ainda mais saliência pelo papel que o Poder Judiciário passa a assumir. Esse se tornou a instância decisória final, em grande parte pelo descrédito depositado nas outras instituições, servindo de arena às disputas políticas, econômicas e sociais. É também em decorrência disso que vão surgindo novos atores nos processos judiciais, bem representados pela figu-ra do amicus curiae.

Apenas para melhor exemplificar, citamos o surto midiático do qual o Supremo Tribunal Federal, nos últimos anos, foi objeto. Isso decorre, evidente-mente, das decisões sensíveis à sociedade tomadas por esse órgão, tais como demarcação de terra indígena, interrupção de gravidez de feto anencéfalo, co-tas nas universidades, união homoafeitva e recorrentes casos de corrupção.

Nessa senda, emerge a dúvida sobre o peso que pode ser dado às conse-quências em tais decisões. Uma resposta a essa indagação, possivelmente, não fica adstrita à matéria de interpretação e de argumentação jurídica.

O debate evolui e põe em pauta o papel de cada instituição, em uma clássica discussão acerca do Estado Democrático de Direito e da separação de poderes. Longe de tentar dar uma resposta a essa problemática, busca-se verificar a possibilidade de uma harmonização entre a dogmática jurídica e os argumentos consequencialistas. A possível institucionalização dos argumentos consequencialistas, afastando a sua subsidiariedade per se, constitui, destarte, o âmago do presente estudo.

1 ConseQuenCIalIsmoO consequencialismo possui uma conceituação bastante ampla e muitas

vezes está associado a certos posicionamentos ideológicos. Transportado para a ciência do Direito, ele pode ser entendido como todo programa teórico ou ati-tude que se proponha a condicionar, explícita ou implicitamente, a adequação jurídica de determinada decisão à valorização de suas consequências.

Veja que da forma como foi exposto anteriormente, a ponderação das consequências na decisão pode englobar uma variedade infinita de considera-ções. Inevitavelmente, emerge a dúvida: o que considerar como consequência?

Deveras, se o conceito é amplo e abrange toda a forma de consequên-cias, poderíamos aqui mencionar que até mesmo o aplicador do Direito mais conservador e formalista seria um consequencialista. Dessa forma, divergindo do que coloca Ricardo Luis Lorenzetti1 acerca do juiz formalista e do juiz conse-quencialista, o primeiro seria, também, um consequencialista ao entender que a não observância estrita à norma geraria consequências sistêmicas e externalida-

1 LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da decisão judicial: fundamentos do Direito. São Paulo: Revista dos Tribunas, 2009.

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des negativas, desestimulando o compliance, seja com relação às instituições, seja aos cidadãos, tendo em vista o precedente que seria aberto.

Destarte, apesar de os estudos sobre o consequencialismo estarem na maioria das vezes relacionados a valores de cunho econômico e político, o conceito aqui explorado abrange todas as consequências, isto é, extra e intra-jurídicas, reais e legais, relacionadas às partes de determinada lide e às demais pessoas que serão afetadas por reflexo.

A respeito desse grande espectro dos argumentos consequencialistas, Sylvie Salles2, em seu estudo sobre a presença do argumento consequencialista nas deliberações do Conselho Constitucional Francês, bem enuncia:

De plus, le spectre d’intérêt de l’argument conséquentialiste est large: il s’intéresse, tant à la gravité des effets politiques de la décision du Conseil, qu’à la prise en compte de la réaction que suscitera la décision auprès de l’opinion publique. Dès lors, seule une analyse qualitative, menée au cas par cas, permet de déterminer la nature formelle de l’argument conséquentialiste.3

Nessa linha de raciocínio, precisamos frisar que preferimos o termo “con-sequencialismo” do que o “pragmatismo”, isto é, argumentos práticos, uma vez que este pode abranger tanto questões de ordem consequencialista propriamen-te dita, quanto questões do contexto da realidade. A fim de melhor elucidar essa distinção, citamos o exemplo de Diego Arguelles4:

Pense-se, por exemplo, na discussão em torno da constitucionalidade do valor do salário mínimo, enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal na ADIn 1458 MC/DF. Por um lado, é possível formular o argumento prático segundo o qual seria impossível, dadas as condições econômicas do país, estabelecer um salá-rio mínimo capaz de atender a todas as exigências do Art. 7, IV; por outro, seria igualmente possível fornecer um argumento diferente, segundo o qual a fixa-ção do salário mínimo em um valor apto a atender às exigências do Art. 7 teria como consequência a quebra e o desemprego.

Feitas essas considerações preliminares, cabe aqui tecermos algumas li-nhas acerca dos fundamentos do consequencialismo, que serviram de base para muitas teorias bastante difundidas atualmente. Primeiramente, precisamos fazer menção ao utilitarismo, desenvolvido por Jeremy Bentham5.

2 SALLES, Sylvie. La Présence de l’argument Conséquentialiste dans les Délibérations du Conseil Constitutionnel. VIIIe Congrès Français de Droit Constitutionnel, AFDC, Nancy, 2011.

3 Tradução livre da autora: “Além disso, o espectro de interesse do argumento consequencialista é grande: ele se concentra, tanto na gravidade dos efeitos políticos da decisão do Conselho, quanto na reação que sucitará na opinião pública. Portanto, apenas uma análise qualitativa, realizada caso a caso, para determinar a natureza formal do argumento consequencialista”.

4 ARGUELHES, Diego. Argumentação conseqüencialista e estado de direito: subsídios para uma compatibilização. XIV Encontro Nacional do Conpedi, Fortaleza, 2005.

5 BENTHAM, Jeremy. The Principles of Morals and Legislation. New York: Prometeu Books, 1988.

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Tal corrente filosófica possui como máxima a satisfação individual, atra-vés da maximização da felicidade, tendo como enfoque a utilidade. A grande crítica que emerge desse paradigma refere-se ao desrespeito a questões indivi-duais, das minorias e de quantificação de certos valores.

Michael Sandel6 bem simplifica: “Jeremy Bentham’s (1748-1832) princi-ple of utility is open to the objection that it may well sacrifice the rights of the minority for the sake of the happiness of the majority”7. Buscando rebater as inevitáveis críticas lançadas ao utilitarismo, ganha destaque os esforços de John Stuart Mill.

A esse respeito, Michael Sandel8 observa:John Stuart Mill (1806-1873), himself a utilitarian, sought to rescue utilitaria-nism from this and other objections. In his essay Utilitarianism, Mill argues that respect for individuals rights as “the most sacred and binding part of morality” is compatible with the idea that justice rests ultimately on utilitarian conside-rations. But is Mill right to be confident? Can the principle of utility support the notion that some rights should be upheld even if doing so makes the majority very unhappy?9

Assim, John Stuart Mill tenta, em uma difícil missão, aperfeiçoar os fun-damentos do utilitarismo, principalmente nos seus pontos mais sensíveis. Em um momento posterior, na construção das bases dos argumentos consequencia-listas aplicáveis à interpretação jurídica, temos o desenvolvimento do pragma-tismo de Oliver Holmes, estampado em sua obra The Path of the Law10.

A essência desse pragmatismo era se contrapor ao formalismo. Compre-endia que o Direito não decorreria de conceitos lógicos e formais, mas sim da própria experiência prática do Direito e de suas possíveis transformações.

É desse contexto que surge a concepção de que os homens cumprem as leis quando assim acham mais conveniente e não pelas consequências ou imperatividade dessas. Essa é a razão pela qual Holmes, segundo Thomas C.

6 SANDEL, Michael. Justice. Disponível em: <http://www.justiceharvard.org/resources/j-s-mill-utilitaria-nism-1863/>. Acesso em: 1º fev. 2013.

7 Tradução livre da autora: “O princípio da utilidade de Jeremy Bentham (1748-1832) está suscetível à objeção de que podemos sacrificar o direito das minorias para consagrar a felicidade da maioria”.

8 SANDEL, Michael. Justice. Disponível em: <http://www.justiceharvard.org/resources/j-s-mill-utilita-rianism-1863/>. Acesso em: 1º fev. 2013.

9 Tradução livre da autora: “John Stuart Mill (1806-1873), um utilitarista, procurou resgatar o utilitarismo a partir desta e de outras objeções. Em seu trabalho ‘Utilitarismo’, Mill argumenta que o respeito pelos direitos individuais como ‘a parte mais sagrada e obrigatória da moralidade’ é compatível com a idéia de que a justiça repousa em última instância sobre considerações utilitárias. Mas pode Mill estar confiante? Pode o princípio da utilidade apoiar a noção de que alguns direitos devem ser defendidos mesmo que isso faça a maioria muito infeliz?”.

10 HOLMES, Oliver. The Path of the Law. Harvard Law Review, 1897.

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Grey11, é considerado um “darwinista social”, por ter analisado o Direito a partir da perspectiva do bad man.

Na sequência do desenvolvimento das teorias consequencialistas, des-tacamos o Realismo Jurídico, na década de 20, o qual sofreu influências da perspectiva sociológica do Direito. Michel Troper12 leciona que o Realismo Ju-rídico é um conjunto de teses sobre a natureza ou o modo de operação da lei, de forma que a validade das decisões judiciais não dependem de sua conformi-dade com a lógica ou com a ideia de que a intepretação é uma função não do conhecimento, mas da vontade.

Há quem sustente que o Realismo Jurídico teria criado um ambiente pro-pício para o desenvolvimento da famosa Análise Econômica do Direito (Law and Economics). Apesar das controvérsias a esse respeito, certo é que a Análise Econômica do Direito teria no mínimo se apoiado no Realismo Jurídico no que toca à crítica ao formalismo.

Alega-se, por outro lado, que a Análise Econômica do Direito teve como impulso as pesquisas desenvolvidas por Ronald Coase13, na elaboração e defesa de uma Nova Economia Institucional. De qualquer sorte, o que se busca defen-der é que a Análise Econômica do Direito, como apontam Cristiano Carvalho e Ely Mattos14, também possui como pilar o consequencialismo.

Essa metodologia de análise do Direito surgiu na Escola de Chicago, no contexto do Antitruste, tendo como precursor Aaron Director. Além de ser es-tendida a outros ramos do Direito, essa vem sendo difundida não só nos países de commom law, mas também no mundo todo, inclusive no Brasil.

Bruno Salama15, sinteticamente, descreve como ocorreu a disseminação dessa abordagem multidisciplinar:

O Direito e Economia é tido por muitos como o movimento de maior impacto na literatura jurídica da segunda metade do século passado. Tendo surgido nos Estados Unidos, nas Universidades Chicago e Yale, o movimento se espalhou primeiro pelos Estados Unidos, depois pelo mundo. Desde os anos 1980, a dis-ciplina vem ganhando cada vez mais visibilidade nos países da tradição de Di-reito Continental, inclusive no Brasil.

11 GREY, Thomas. Holmes and Legal Pragmatism. Stanford Law Review, v. 41, n. 4, apr. 1989.12 TROPER, Michel. Le Réalisme et Le Juge Constitutionnel. Cahier du Conseil constitutionnel nº 22 (Dossier: Le

Réalisme en Droit Constitutionnel), juin 2007.13 COASE, Ronald. The Problem of Social Cost. Journal of Law and Economics, n. 3, p. 1-23, 1961.14 CARVALHO, Cristiano; MATTOS, Ely. Entre princípios e regras: uma proposta de análise econômica no direito

tributário. Revista Dialética de Direito Tributário, v. 157, p. 27-44, 2008.15 SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é Direito e Economia? Disponível em: <http://works.bepress.com/bruno_

meyerhof_salama/16>. Acesso em: 10 maio 2012.

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Richard Posner, em decorrência de sua obra Economic Analysis of Law16, é considerado o mais notável advogado da Análise Econômica do Direito. Essa consiste em utilizar métodos próprios da Economia para solução de problemas jurídicos, segundo informam Luciano Timm e Manoel Neubarth17.

A Análise Econômica do Direito é dividida em análise positiva e análise normativa. Ivo Gico Jr.18 explica que a primeira se refere às consequências de um dado arcabouço jurídico, isto é, de uma dada regra, e a segunda diz respeito à investigação de qual regra jurídica deveria ser adotada.

Em última análise, constata-se a grande amplitude conceitual do conse-quencialismo e seus fundamentos, ramificados em diferentes vertentes teóricas. Diante de tal contexto, é inevitável a emergência de questões acerca da insegu-rança jurídica e do desrespeito à separação dos poderes, que podem surgir com a aplicação do consequencialismo.

2 proBlemÁtICa

A valoração das consequências para resolução de um caso concreto pode ser bastante arbitrária e é defendida por todos os tipos de interesses, seja pelos mais conservadores, seja pelos mais progressistas. Além disso, surgem po-sicionamentos contraditórios no debate jurídico por aqueles que, por um lado, criticam decisões do Poder Judiciário envolvendo a implementação de políticas públicas e, por outro, defendem o sopesamento de consequências com apoio na ciência econômica.

Neste diapasão, impossível não indagar: mas caberia ao Judiciário ve-rificar as consequências? Será que uma posição como essa não colocaria em vulnerabilidade a separação dos poderes, estampada constitucionalmente?

Veja-se, dessa forma, a importância que o estudo merece. Os argumentos consequencialistas, quando não bem estruturados em uma teoria clara e legí-tima, acabam servindo como uma válvula de escape, chancelando quaisquer preferências individuais do aplicador do Direito.

Evidente que não se pretende argumentar que qualquer quê de subjetivo deva ser extirpado da argumentação. Humberto Ávila19 ilustra que o subjetivo

16 POSNER, Richard. Economic Analysis of Law. Wolters Kluwer Law & Business, 2007.17 TIMM, Luciano Benetti; TRINDADE, Manoel Gustavo Neubarth. As recentes alterações legislativas sobre

os recursos aos tribunais superiores: a repercussão geral e os processos repetitivos sob a ótica da Law and Economics. Revista de Processo, São Paulo, n. 178, p. 157, 2009.

18 GICO JR., Ivo Teixeira. Metodologia e Epistemologia da Análise Econômica do Direito. Disponível em: <http://www.iders.org/textos/ivo_gicco_metodologia_epistemologia_da_aed.pdf>. Acesso em: 13 maio 2012.

19 ÁVILA, Humberto. Argumentação jurídica e a imunidade do livro eletrônico. Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Porto Alegre, n. 19, p. 157, 2001.

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é inevitável, mas esse, em respeito ao Estado Democrático de Direito, deve ser visível, permitindo, ao auditório, a possibilidade de controle.

Nessa linha de raciocínio, estampamos a preocupação de que o conse-quencialismo, fora dos limites institucionais, acabe se apropriando do Direito. Não se pode admitir que qualquer consequência, por certas vezes até incom-patível com o que foi preconizado pela nossa Constituição, seja utilizada como justificativa para apartar ou restringir valores escolhidos democrática e legitima-mente pelo legislador.

Assim, o grande alerta que se lança ao consequencialismo é que esse pode ser utilizado como um Cavalo de Tróia20, ignorando os próprios limites do Direito. Ademais, o foco central da discussão reflete no princípio republicano que institui a representatividade com responsabilidade.

O poder, conforme colocado em nossa Constituição, será exercido pelos representantes do povo, e os parlamentares, a quem cabe sopesar as conse-quências da lei, atuam por meio do procedimento legislativo. Como poderiam, então, os juízes (que não possuem a representatividade democrática para ava-liar as consequências e nessas basear suas decisões) exercer um papel ativista, disfarçado no manto dos argumentos consequencialistas?

Luis Fernando Schuartz21 muito se dedicou à utilização dos argumentos consequencialistas na interpretação jurídica. Em seus consistentes estudos sobre o tema, esse chegou a concluir que onde há fortemente a militância do con-sequencialismo, há, por conseguinte, uma intensa fragilidade das construções dogmáticas. Nesses ambientes, claramente se observa que qualquer justificativa pode embasar uma decisão: desde a cópia fiel de doutrinas estrangeiras, visões do mundo, até teorias científicas, filosóficas e poéticas.

Seguindo os estudos de Luis Fernando Schuartz22, pode-se dizer que a defesa de um consequencialismo sem limites nada mais é que um romance, que vê a figura do juiz como um exemplar visionário. Esse, experimentalmente, lança-se em direção a um futuro incerto, disposto a escolher aquela decisão que seria a melhor para o bem-estar da sociedade.

Um consequencialismo sem rigor e parâmetros faz emergir perigos, que se concretizam em equívocos. Tal situação decorre principalmente da dificul-dade de os juízes preverem o futuro.

20 Preocupação que a obra “MATHIS, Klaus. Efficiency, sustainability, and justice to future generations. Lucerne: Springer, 2011”, busca afastar.

21 SCHUARTZ, Luis Fernando. Consequencialismo Jurídico, Racionalidade Decisória e Malandragem. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/1724/consequencialismo%20racionalidade%20e%20malandragem%20schuartz%20final.pdf?sequence=1>. Acesso em: 1º fev. 2013.

22 Idem.

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Neil Maccormick23 pondera esse problema, ao tentar desenvolver um consequencialismo mitigado, já que não se pode esquecer a dificuldade que é medir determinadas consequências, especialmente se levarmos em considera-ção a assimetria de informação.

O Ministro do STF Marco Aurélio, no julgamento do Recurso Extraordi-nário nº 56508924, frisa essa dificuldade lançada aos juízes:

O pragmatismo jurídico leva a considerar as consequências práticas da decisão judicial, lançando o magistrado em posição que não lhe é confortável. Ao re-conhecer-lhe a condição de agente político no sentido estrito do termo, retira o juiz do hábitat natural e o põe na função de legislador, para que tome a decisão com fundamento na antecipação hipotética de resultados.

Postas essas dificuldades e complicações inerentes ao consequencialis-mo, não poderíamos deixar de tomar nota das espécies de consequencialismo e suas vicissitudes. Para tanto, lançamos mão da terminologia e da conceituação utilizadas por Luis Fernando Schuartz25.

O pragmatismo festivo é caracterizado por aqueles que desprezam os meios convencionais de solução dos problemas jurídicos, lecionados nas fa-culdades de Direito e aplicados usualmente pelos profissionais. Trata-se de um clamor pela doutrina norte-americana de Análise Econômica do Direito, que acaba sendo transportada para a realidade brasileira de uma maneira superficial e, por certas vezes, seletiva.

O pragmatismo militante, por sua vez, é bem representado por aqueles que utilizam a ponderação desenfreada dos princípios, a fim de alcançar as consequências desejadas. A propósito, essa técnica de “pular” diretamente à Constituição, ignorando as Leis, vem conduzindo, conforme Humberto Ávila26, um antiescalonamento normativo, de um lado, e, de outro, a perda da impor-tância da Lei para uma aplicação quase que exclusiva dos princípios.

Os juízes justiceiros podem muito bem ser identificados nesses casos. Esses, por simpatia à determinada doutrina econômica e ideológica, acabam fraquejando no seu mister, substituindo os demais poderes públicos.

23 MACCORMICK, Neil. Retórica e estado de direito. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.24 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 565089. Rel. Min. Marco Aurélio Mendes de

Faria Mello, 2011.25 SCHUARTZ, Luis Fernando. Consequencialismo Jurídico, Racionalidade Decisória e Malandragem.

Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/1724/consequencialismo%20racionalidade%20e%20malandragem%20schuartz%20final.pdf?sequence=1>. Acesso em: 1º fev. 2013.

26 ÁVILA, Humberto. Interpretación de Las Leyes. In: MATUS, Jean Pierre (Org.). 250 Años Después: Dei Delitti e Delle Pene. Buenos Aires: Euros, v. 1, 2011, p. 61-70.

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O mais maléfico dos pragmatismos, sem dúvida, segundo Luis Fernando Schuartz27, é o pragmatismo sofisticado, apelidado de “malandro”. O malandro, diante de seus profundos conhecimentos técnicos, consegue reconstruir os ele-mentos da argumentação, de forma que esses fiquem favoráveis à decisão que se pretende chegar, sem perfurar a moldura da dogmática.

A comunidade jurídica espera um posicionamento do Supremo Tribunal Federal a respeito dos argumentos pragmáticos, especialmente ao analisar os processos que envolvem os planos econômicos, tais como Collor I e II, Bresser e Verão. No entanto, podemos notar a recusa do Supremo Tribunal Federal de ser visto como um órgão de apoio ao Poder Executivo, fazendo malabarismos técnicos para salvar as finanças daquele.

Tal posicionamento foi adotado pelo Relator Ministro Marco Aurélio Mendes de Faria Mello no Recurso Extraordinário nº 56508928, que versou sobre a falta de revisão geral anual dos servidores públicos do Estado de São Paulo. O Relator consignou que não se pode impor o contorcionismo técnico para salvar as finanças públicas. Cabe aos poderes constituídos agir com responsabilidade, e não simplesmente jogar para o Supremo o ônus de impedir que as promessas políticas inconsequentes tornem-se realidades desastrosas.

Apesar de toda essa problemática, inerente à utilização dos argumen-tos consequencialistas na interpretação jurídica, buscar ignorar a existência das consequências nas decisões judiciais é negar uma realidade latente. Sylvie Salles29 bem destaca que, ao observamos cuidadosamente a presença do argu-mento consequencialista em deliberações, esse é indiscutivelmente aparente nas amostras.

Assim, o desafio que nos recai é verificar a possibilidade de uma conci-liação entre os argumentos consequencialistas e a dogmática jurídica.

3 possÍVel InstItuCIonalIZação?

A análise acerca da valoração dada às consequências na argumentação jurídica é apenas a ponta do iceberg, isto é, simplesmente a “ponta” de um problema muito maior. Trata-se da delimitação do papel que cabe ao Poder Judiciário em um Estado Democrático de Direito.

27 SCHUARTZ, Luis Fernando. Consequencialismo Jurídico, Racionalidade Decisória e Malandragem. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/1724/consequencialismo%20racionalidade%20e%20malandragem%20schuartz%20final.pdf?sequence=1>. Acesso em: 1º fev. 2013.

28 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 565089. Rel. Min. Marco Aurélio Mendes de Faria Mello, 2011.

29 SALLES, Sylvie. La Présence de l’argument Conséquentialiste dans les Délibérations du Conseil Constitutionnel. VIIIe Congrès Français de Droit Constitutionnel, AFDC, Nancy, 2011.

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É, em decorrência disso, que se pode sustentar que os juízes devem abster-se de ponderar as consequências de suas decisões. No entanto, não po-demos concordar que essa seja a solução mais benéfica e que gere melhores externalidades ao desenvolvimento do Direito e das instituições, pois, conforme assinalado anteriormente, as decisões possuem sim consequências e essas, mui-tas vezes, podem ser bastante gravosas.

Claro que isso não significa que as consequências devam ser utilizadas para velar decisões parciais e tendenciosas. Até mesmo para evitar a utilização simulada de certos instrumentos da caixa de ferramentas fornecidas ao aplica-dor do Direito é que os argumentos não possuem o mesmo peso na interpreta-ção e na tomada de decisões.

Leciona Humberto Ávila30 que os argumentos devem ser valorados de acordo com ordenamento jurídico. Nesse sentido, caso os argumentos sejam identificáveis segundo um critério formal e objetivo, o argumento será institu-cional, referenciando o papel específico do juiz em um Estado Democrático de Direito e possibilitando o controle intersubjetivo da argumentação, isto é, ofe-recendo ao auditório um fundamento que possa ser objetivamente reconhecido.

Por terem uma maior capacidade de objetivação, esses argumentos, em uma escala de hierarquização, estariam acima dos não institucionais, os prá-ticos, que incluem questões políticas, sociais e econômicas. Para Humberto Ávila31, seria nesse último em que os argumentos consequencialistas estariam localizados, já que esses fazem apelo a qualquer outro elemento que não ao próprio ordenamento jurídico.

Como conclusão do posicionamento posto anteriormente, podemos identificar um consequencialismo subsidiário, em que os argumentos dessa na-tureza são apenas aplicados em ultima ratio. É evidente que não há como se sustentar o oposto a esse consequencialismo, ou seja, o consequencialismo for-te, que dá aos argumentos consequencialistas caráter exclusivo, em detrimento dos institucionais. No entanto, será que não poderíamos afastar essa valoração per se de subsidiariedade dos argumentos consequencialistas? Haveria possibi-lidade de os argumentos consequencialistas serem institucionalizados?

Como marco referencial, trazemos o pensamento Neil Maccormick32, que rejeita extremos com relação ao consequencialismo e busca desenvolver uma posição intermediária. Na tentativa de desenvolver esse consequencialis-mo mitigado, Neil Maccormick33 enfrenta muitos problemas.

30 ÁVILA, Humberto. Argumentação jurídica e a imunidade do livro eletrônico. Op. cit., p. 157. 31 Idem, ibidem.32 MACCORMICK, Neil. Op. cit. 33 Idem.

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Primeiro com relação à extensão das consequências, ou seja, sua esfera de abrangência. Segundo, com relação à mensuração das consequências, que sequer para economistas é uma tarefa fácil, como bem podemos observar nos casos envolvendo o Direito da Concorrência.

Destarte, como se pode inferir do pensamento de Neil Maccormick34, a melhor alternativa seria identificar quais seriam os comportamentos permitidos e quais não. Perceba-se, dessa forma, que os requisitos de objetividade da deci-são que leva em consideração as consequências estariam determinados e limi-tados no próprio ramo específico do Direito, ao qual a decisão está relacionada.

Diego Werneck Arguelhes35 enfrenta esta problemática buscando de-monstrar de que forma um argumento que retira sua força de uma avaliação das consequências pode ser compatibilizado com a ideia de Estado de Direito. Dessa forma, Diego Werneck Arguelhes36 busca responder a seguinte pergunta: a construção de argumentos consequencialistas pode ser entendida como uma forma válida de obediência às normas jurídicas?

Nessa linha de raciocínio, Diego Werneck Arguelhes37 identifica na fina-lidade da lei a institucionalização do consequencialismo. A avaliação do con-sequencialismo, portanto, possibilitaria a promoção do estado de coisas cuja consecução o ordenamento teria instituído como obrigatória.

Veja-se que, por possibilitar, pois, a promoção do estado de coisas que foi elevado como meta no ordenamento jurídico, o consequencialismo pode passar a ser visto como um instrumento de auxílio e complementação da in-terpretação teleológica. Dessa forma, o mesmo poderia ser valorado como um argumento institucional.

Diego Werneck Arguelhes38, a fim de elucidar a questão, colaciona o julgamento do Recurso Extraordinário nº 135.328-7/SP39. Conforme esse relata, o Estado de São Paulo argumentava que a atribuição conferida pelo art. 68 do Código de Processo Penal, qual seja a legitimidade do Ministério Público para a propositura de ação na esfera cível para a reparação ex delicto, não teria sido recepcionada pela Constituição Federal de 1988.

Assim, sustentava-se que a função de representação judicial de pessoas com baixa renda teria sido atribuída pelo Constituinte a uma instituição especí-

34 Idem.35 ARGUELHES, Diego. Argumentação conseqüencialista e estado de direito: subsídios para uma compatibilização.

XIV Encontro Nacional do Conpedi, Fortaleza, 2005.36 Idem.37 Idem.38 Idem.39 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 135.328-7-SP. Min. Marco Aurélio,

J. 29.06.1994.

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fica, a Defensoria Pública. Durante o julgamento, os Ministros evoluíram para uma investigação acerca das consequências decorrentes da interpretação que entenderia pela não recepção do art. 68 do Código de Processo Penal.

Tal avaliação das consequências pode ser constatada no voto do Ministro Néri da Silveira40:

Se o art. 68 do Código de Processo Penal, que é norma anterior ao sistema da Constituição de 1988, prevê que, “quando o titular do direito à reparação do dano for pobre, a execução da sentença condenatória” será requerida “pelo Mi-nistério Público”, não me parece que, a esta altura, em face do art. 134, pará-grafo único da Constituição, ao afirmar que o Ministério Público não deve mais dar assistência judiciária aos pobres, poderá a Corte assentar decisão de con-sequência contrária ao espírito da própria Constituição, pois ela quer que os necessitados tenham assistência jurídica e judiciária pelo Estado.

Diego Werneck Arguelhes41, ao analisar o mencionado precedente, con-clui que a decisão no sentido pela não recepção do referido artigo acarretaria um estado de coisas no qual os pobres não teriam o seu acesso à justiça ga-rantido, o que iria de encontro aos fins buscados pela Constituição Federal. Nesse sentido, Diego Werneck Arguelhes42 arremata: “Neste caso, portanto, o argumento consequencialista do Ministro Néri da Silveira esclareceu a conexão sistemática entre as normas que instituem o Ministério Público, de um lado, e o princípio constitucional da prestação de assistência jurídica gratuita aos que dela necessitarem, de outro”.

Portanto, quando falamos na finalidade da Lei, por meio de uma inter-pretação teleológica, é onde podemos verificar a institucionalização do con-sequencialismo. A valoração das consequências serviria de ferramenta para a identificação da interpretação que mais se aproxima do estado de coisas eleito pela norma, auxiliando, pois, na promoção desse.

ConsIderações fInaIs

A essência dos argumentos consequencialistas é por si só complexa e pode englobar uma variedade infinita de considerações. Diante das dificulda-des que lhes são inerentes – não só em relação à sua extensão, mas também à sua mensuração, já que prever o futuro é algo que foge da competência técnica dos juízes –, a valoração dada às consequências nas decisões é bastante flexí-vel, dando ensejo a arbitrariedades e subjetivismo.

40 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 135.328-7-SP. Min. Marco Aurélio, J. 29.06.1994.

41 ARGUELHES, Diego. Argumentação conseqüencialista e estado de direito: subsídios para uma compatibilização. XIV Encontro Nacional do Conpedi, Fortaleza, 2005.

42 Idem.

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Como confirmação disso, podemos verificar a defesa das consequências com viés tanto progressista quanto conservador. Outras vezes, deparamo-nos com aqueles que criticam a implementação de políticas públicas pelo Poder Ju-diciário, mas, por outro lado, defendem o sopesamento de consequências com apoio na ciência econômica.

Assim, a discussão sobre os argumentos consequencialistas, além de identificar esses perigos ao Estado Democrático de Direito, evolui para debates antigos e acalorados sobre ativismo judicial e separação de poderes. Cabe ao Judiciário verificar as consequências em suas decisões? Teria o juiz representa-tividade democrática e legitimidade para tanto?

Longe de dar uma resposta a perguntas desse nível, o estudo buscou verificar como os argumentos consequencialistas podem ser utilizados na inter-pretação jurídica, de uma maneira legítima e não arbitrária. Buscou-se não se limitar à defesa do consequencialismo subsidiário, mas sim ver a possibilidade de sua institucionalização.

Na luta por uma harmonia entre argumentos consequencialistas e a dogmática jurídica, já que partimos do pressuposto de que ignorar as conse-quências nas decisões judiciais é negar uma realidade latente, afastou-se, em primeiro momento, a valoração per se de subsidiariedade dos argumentos con-sequencialistas. Assim, em um segundo momento, defendeu-se que a utilização dos argumentos consequencialistas seria institucional na medida em que esses estariam incluídos dentro da interpretação teleológica.

A valoração das consequências serviria, então, como um indicador ao intérprete. Ou seja, a partir dos argumentos consequencialistas seria possível verificar se a interpretação adotada pelo aplicador do Direito seria aquela ali-nhada à promoção do estado de coisas visado pela norma.

Ressalva-se, evidentemente, que essa utilização das consequências na defesa da finalidade elegida pela Lei não pode ser desmedida. A interpretação finalística, que se apoia no consequencialismo, não é ilimitada, estando subor-dinada, em última análise, aos argumentos imanentes ao sistema jurídico, tais como os linguísticos e os sistemáticos.

referÊnCIas

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Parte Geral – Doutrina

Das Ações Possessórias, Habilitação e Restauração de Autos no Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13�105/2015

ROgéRIO mOnTAI De LImAMagistrado e Professor, Doutor em Direito Público pela Unesa/RJ, Pós-Doutor em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa, Professor de Processo Civil do Departamento de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Rondônia.

RESUMO: O presente texto pretende apresentar as novidades inseridas nos institutos das Ações Pos-sessórias, Habilitação e Restauração de Autos, procedimentos especiais do novo Código de Processo Civil brasileiro, Título III.

PALAVRAS-CHAVE: Novo CPC; ações possessórias; habilitação; restauração de autos.

ABSTRACT: This paper intends to present the news inserted in the institutes of Ações Possessórias, Habilitação e Restauração de Autos, special procedures of the new Brazilian Civil Procedure Code, Title III.

KEYWORDS: New CPC; Possessory actions, qualification autos; restoration.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Das ações possessórias; 2 Da habilitação; 3 Da restauração de autos.

Introdução

Após seis anos de tramitação no Congresso (PL 166/2010 do Senado Fe-deral e Projeto de Lei nº 8.046/2010 da Câmara dos Deputados), o ordena-mento jurídico prepara-se para receber um novo caderno processual civil, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, publicada no Diário Oficial da União em 17.03.2015. O Novo Codex entrará em vigor depois de decorrer 1 (um) ano da data de sua publicação oficial nos termos do seu art. 1.045.

É importante destacar que o Código foi construído sobre matriz constitu-cional e, já em seu art. 1º afirma que o processo civil será ordenado, disciplina-do e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil.

O presente texto pretende apresentar as novidades inseridas nos institu-tos das Ações Possessórias, Habilitação e Restauração de Autos, procedimentos especiais do novo Código de Processo Civil, Título III.

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1 das ações possessÓrIas

A proteção possessória é uma das consequências jurídicas, que advêm da posse, de maior importância. Trata-se, na verdade, do estudo dos mecanismos de que se pode valer o possuidor para defender sua posse diante de agressões praticadas por terceiros.

Importante destacar que antes do manejo das ações possessórias, nos-so ordenamento jurídico já garante a permissão ao possuidor molestado para que defenda sua posse mediante o desforço físico. Tal permissivo encontra-se estampado no Código Civil, art. 1.210, § 1º, ao dizer que o possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indis-pensável à manutenção, ou restituição da posse. Trata-se da conhecida legítima defesa da posse.

Além disso, o possuidor molestado poderá defender seu direito de posse buscando a tutela jurisdicional do Estado, utilizando-se das ações possessórias.

As ações possessórias são três: ação de reintegração de posse (ou ação de força espoliativa), ação de manutenção de posse (ou ação de força turbativa) e interdito proibitório (ou ação de preceito cominatório, ou de força iminente).

Diante da prática de um esbulho, ofensa à posse de maior gravidade, já que despojado o possuidor do bem possuído, surge como remédio processual adequado a ação de reintegração de posse. Já no caso de turbação – menor intensidade da ofensa em relação ao esbulho –, o possuidor não perde a dispo-sição física da coisa, mas o exercício da posse é dificultado pela prática de atos materiais do ofensor. Por fim, ainda menos grave que o esbulho e a turbação, surge a ameaça de turbação ou de esbulho. Embora não tenham sido praticados atos materiais turbativos ou espoliativos, o ofensor está na iminência de praticá--los.

Atualmente, as ações possessórias seguem procedimento especial previs-to no Livro IV do CPC (arts. 920 e ss.), cujas principais diferenças em relação ao procedimento comum ordinário são as seguintes: possibilidade de concessão de liminar (CPC, art. 924); se o caso, audiência de justificação antes da conces-são de liminar (CPC, art. 928); ação dúplice (CPC, art. 922) e fungibilidade das ações possessórias.

Para obtenção da proteção possessória, a parte terá que provar, nos ter-mos do art. 927 do CPC: I – a sua posse; II – a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III – a data da turbação ou do esbulho; IV – a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reinte-gração de posse.

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Lembrando que, se não há – na ação de força velha – a possibilidade de concessão de liminar, tem-se atualmente a possibilidade de “antecipação de tutela” com base no art. 273 do CPC.

A última proposta legislativa que criou o novo Código de Processo Civil, versão final, Lei nº 13.105/2005, praticamente não alterou as regras hoje exis-tentes sobre as possessórias, mas acrescenta alguns dispositivos regulamentan-do em especial a legitimidade coletiva e a consequente forma de citação e a possibilidade de mediação em conflitos dessa natureza, tudo a partir do art. 554 do novo Codex.

Acrescenta o novo Código de Processo Civil que, no caso de ação pos-sessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, será feita a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais; será ainda determinada a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública. Nesse caso, o oficial de justiça procurará os ocupantes no local por uma vez e os que não forem identificados serão citados por edital. Ainda, o juiz dará ampla publicidade sobre a existência da ação e dos respectivos prazos pro-cessuais, podendo se valer de anúncios em jornais ou rádios locais, publicação de cartazes na região dos conflitos e de outros meios.

Outra novidade positivada é o fato de o juiz poder julgar antecipada-mente a questão possessória, prosseguindo-se em relação à parte controversa da demanda.

Ainda, de acordo com o novo Código, pode o autor requerer, além disso, imposição de medida necessária e adequada para evitar nova turbação ou es-bulho e cumprir-se a tutela provisória ou final.

O Código de Processo Civil de 1973 diz que, na pendência do processo possessório, é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar a ação de reconhe-cimento do domínio (art. 923). O novo CPC mantém a ideia, mas acrescente a ressalva de que tal ação poderá ser manejada desde que seja contra terceiro. Note-se:

Art. 557. Na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor quanto ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for de-duzida em face de terceira pessoa.

Parágrafo único. Não obsta à manutenção ou à reintegração de posse a alega-ção de propriedade ou de outro direito sobre a coisa.

Por fim, a maior novidade quanto às possessórias é o fato de que, no litígio coletivo pela posse de imóvel, com esbulho ou turbação ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão de medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 dias. A

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au diência de mediação também deverá ocorrer caso o autor não execute medi-da liminar concedida no prazo de um ano.

O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência e a De-fensoria Pública será também intimada sempre que houver parte beneficiária da gratuidade da justiça.

Longe de ser uma novidade, outro ponto positivado é a observação de que o juiz poderá comparecer à área do objeto de litígio quando sua presença se fizer necessária à efetivação da tutela jurisdicional. Trata-se de inspeção ju-dicial já utilizada por Magistrados em ações dessa natureza.

Por fim, o texto inova ao dizer que órgãos responsáveis pela política agrária e política urbana da União, Estados, Distrito Federal e Municípios onde se situe a área objeto do litígio poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse na causa e a existência de possibilidade de solução do conflito possessório.

Estas regras também poderão ser aplicadas nos litígios que discutem pro-priedade de imóvel.

2 da haBIlItação

Conforme os dispositivos do Código de Processo Civil de 1973, a habi-litação tem lugar quando, por falecimento de qualquer das partes, os interessa-dos houverem de suceder-lhe no processo e pode ser requerida pela parte, em relação aos sucessores do falecido ou pelos sucessores do falecido, em relação à parte.

O novo Código de Processo Civil de 2015 regulamenta a questão em seu Capítulo IX, art. 687, dispondo que a habilitação ocorre quando, por falecimen-to de qualquer das partes, os interessados houverem de suceder-lhe no processo e pode ser requerida pela parte, em relação aos sucessores do falecido ou pelos sucessores do falecido, em relação à parte.

Portanto, note-se que, quanto ao cabimento e à legitimidade, não houve alteração de conteúdo, apenas ajuste gramatical.

Quanto à postulação, diz o Código de Processo Civil de 1973 que, rece-bida a petição inicial, ordenará o juiz a citação dos requeridos para contestar a ação no prazo de 5 (cinco) dias. Essa citação, diz o Código revogado, será pessoal, se a parte não tiver procurador constituído na causa (art. 1.057).

Achando-se a causa no tribunal, a habilitação processar-se-á perante o relator e será julgada conforme o disposto no regimento interno.

O novo Código de Processo Civil de 2015 diz, em seu art. 688, que, recebida a petição, o juiz ordenará a citação dos requeridos para se pronun-

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ciarem no prazo de 5 (cinco) dias. Essa citação será pessoal se a parte não tiver procurador constituído nos autos.

Assim, salvo questões terminológicas, nesse ponto e até aqui, a regra do recebimento da petição e da citação também continua a mesma.

A primeira novidade do novo texto está na determinação expressa para que o processo principal seja suspenso em caso de propositura de Habilitação (e até que ela seja resolvida). Não que isso não acontecia, ao contrário. Na grande maioria dos processos dessa natureza, juízes já determinavam essa pro-vidência. Ocorre que não havia menção expressa no CPC/1973 e isso poderia gerar interpretações diversas.

O novo Código diz que se procede à habilitação nos autos do processo principal, na instância em que estiver, suspendendo-se, a partir de então, o processo (art. 689).

Outra novidade interessante e que poderá contribuir com a efetividade, celeridade processual e razoável duração do processo – princípios processuais constitucionais – é o contido no art. 691 do novo CPC. Nele, há regramento no sentido de que o juiz decidirá o pedido de habilitação imediatamente, salvo se este for impugnado e houver necessidade de dilação probatória diversa da documental, caso em que determinará que o pedido seja autuado em apartado e disporá sobre a instrução.

Assim, com as novas regras, após o recebimento da Habilitação, abrem--se três possibilidades.

1) Se não houver “Impugnação”, nomenclatura utilizada pelo código como modalidade de defesa em caso de propositura de Habilitação, o juiz deverá julgar desde logo, habilitando ou não os pedidos da parte requerente.

2) Caso sobrevenha “Impugnação” com a juntada apenas de provas documentais, o juiz deverá decidir imediatamente, com o posterior e normal prosseguimento do feito.

3) Por outro lado, caso haja “Impugnação” e houver necessidade de dilação probatória, diversa da documental, o Magistrado deverá determinar que o pedido seja autuado em apartado, saneando o incidente e deliberando sobre a instrução.

A nova regra prima pela melhor organização do processamento da Ha-bilitação, determinando que somente se formado autos em apenso (apartados) caso haja necessidade de dilação probatória. Caso contrário, o imediato jul-gamento permite que o incidente caminhe em tempo mais razoável e menos burocrático, com a primazia da economia processual.

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O CPC/1973, art. 1.060, menciona que

proceder-se-á à habilitação nos autos da causa principal e independentemen-te de sentença quando promovida pelo cônjuge e herdeiros necessários, desde que provem por documento o óbito do falecido e a sua qualidade; em outra causa, sentença passada em julgado houver atribuído ao habilitando a quali-dade de herdeiro ou sucessor; o herdeiro for incluído sem qualquer oposição no inventário; estiver declarada a ausência ou determinada a arrecadação da herança jacente; oferecidos os artigos de habilitação, a parte reconhecer a pro-cedência do pedido e não houver oposição de terceiros.

Note-se que o art. 1.060 do Código revogado apresentava situações em que se poderia promover habilitação nos autos da causa principal “independen-temente de sentença”, e isso, de acordo com a nova sistemática, principalmente principiológica do direito processual, viola o devido processo legal, pois nega olhares mais atentos ao contraditório e à ampla defesa, além do que poderia causar insegurança jurídica e tumulto processual. Esse dispositivo não encontra correspondência no Código de Processo Civil de 2015, portanto regramento revogado.

Já o art. 1.061 do CPC/1973 diz que, falecendo o alienante ou o cedente, poderá o adquirente ou o cessionário prosseguir na causa, juntando aos autos o respectivo título e provando a sua identidade. Da mesma forma como citado anteriormente e pelos mesmos motivos, esse dispositivo não encontrou corres-pondência no Código de Processo Civil de 2015, portanto revogada também esta sistemática.

Quanto ao trânsito em julgado, o Código de Processo Civil de 1973 diz que, passadas em julgado a sentença de habilitação, ou admitida a habilitação nos casos em que independer de sentença, a causa principal retomará o seu curso (art. 1.062).

O dispositivo correspondente no novo Código/2015 é o art. 692, e frisa que, transitada em julgado a sentença de habilitação, o processo principal reto-mará o seu curso, e cópia da sentença será juntada aos autos respectivos.

Portanto, salvo ignorando o artigo revogado acima (art. 1.060 do CPC/1973), a nova legislação segue a mesma linha do Código de 1973 ao fir-mar que, após resolvido o incidente e somente após o trânsito em julgado, o processo principal deverá ter sequência.

Foram poucas, mas boas, as alterações no instituto da Habilitação, pois a ele o novo Código conferiu maior segurança jurídica e melhor organização em relação a seu processamento.

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3 da restauração de autos

Primeiramente é importante destacar que o procedimento de Restaura-ção de Autos, felizmente, e a cada dia, tenderá a ser um expediente mais redu-zido em virtude da virtualização dos processos e a adoção sistemática e gradual do PJE – Processo Judicial Eletrônico em todo País.

Nos termos do Código de Processo Civil de 1973, art. 1.063, verificado o desaparecimento dos autos, pode qualquer das partes promover-lhes a restaura-ção e, havendo autos suplementares, nestes prosseguirá o processo.

O novo Código de Processo Civil de 2015 apresentou dispositivo equiva-lente, mas incluindo a possibilidade de se restaurar, inclusive, autos eletrônicos – em consonância com as normas do PJE – Processo Judicial Eletrônico.

Assim, o art. 712 dispõe que, verificado o desaparecimento dos autos, eletrônicos ou não, pode o juiz, de ofício, qualquer das partes ou o Ministério Público, se for o caso, promover-lhes a restauração. Havendo autos suplemen-tares, nesses prosseguirá o processo.

Além de acrescentar como legitimado a promover a abertura da Restau-ração de Autos o Ministério Público (nas causas de sua atribuição), importante acréscimo é a possibilidade de o próprio juiz, de ofício, dar início ao expediente da Restauração. Tal permissivo vai ao encontro de uma melhor gestão cartorá-ria e eficiência na condução dos processos por parte do Magistrado – que não dependeria de qualquer requerimento para abertura do procedimento de Res-tauração. Aliás, sempre se considerou mesmo dever funcional do Magistrado assim agir.

Quanto à postulação, o Código de 1973 diz que, na petição inicial, de-clarará a parte o estado da causa ao tempo do desaparecimento dos autos, ofe-recendo certidões dos atos constantes do protocolo de audiências do cartório pelo qual haja ocorrido o processo; cópia dos requerimentos que dirigiu ao juiz; quaisquer outros documentos que facilitem a restauração.

O Código Processual de 2015 regulamenta esse ponto no seu art. 713 e diz que, na petição inicial, declarará a parte o estado do processo ao tempo do desaparecimento dos autos, oferecendo certidões dos atos constantes do protocolo de audiências do cartório pelo qual haja corrido o processo; cópia das peças que tenha em seu poder; qualquer outro documento que facilite a restauração.

Note-se que houve maior abrangência nos documentos que devem ser juntados no pedido. O novo Código faz menção à “cópia das peças que tenha em seu poder”, ponto simplificado, ao invés de “cópia dos requerimentos que dirigiu ao juiz”, mais limitativo a petições.

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Não há dúvidas de que aqueles que pretendem restaurar os autos tendem a possuir em seu poder não só as cópias dos requerimentos que dirigiu ao juiz (petições), mas também outras cópias do processo que não sejam somente re-querimentos, a exemplo de documentos, laudos, fotos, etc.

Quanto ao ato de chamamento do réu ao processo (citação), diz o CPC/1973 que a parte contrária será citada para contestar o pedido no prazo de 5 (cinco) dias, cabendo-lhe exibir as cópias, contrafés e mais reproduções dos atos e documentos que estiverem em seu poder (art. 1.065). Se a parte concordar com a restauração, lavrar-se-á o respectivo auto que, assinado pelas partes e homologado pelo juiz, suprirá o processo desaparecido. Se a parte não contestar ou se a concordância for parcial, observar-se-á o disposto no art. 803 [não sendo contestado o pedido, presumir-se-ão aceitos pelo requerido, como verdadeiros, os fatos alegados pelo requerente (arts. 285 e 319); caso em que o juiz decidirá dentro em 5 (cinco) dias].

O Código de Processo Civil de 2015 regulamente a questão no seu art. 714. Nele foi fixado que a parte contrária será citada para contestar o pe-dido no prazo de 5 (cinco) dias, cabendo-lhe exibir as cópias, as contrafés e as reproduções dos atos e dos documentos que estiverem em seu poder. Se a parte concordar com a restauração, lavrar-se-á o auto que, assinado pelas partes e ho-mologado pelo juiz, suprirá o processo desaparecido. Se a parte não contestar ou se a concordância for parcial, observar-se-á o procedimento comum.

A diferença está na parte final anteriormente destacada, que é o § 2º do art. 714 do novo CPC/2015. Conforme descrito, caso não haja concordância ou se ela for parcial, o processo segue o procedimento comum com o regular pro-cessamento, possibilidade de apresentação de respostas, produção de provas, audiências e sentença.

No instituto da Restauração de Autos se fixam consequências diversas caso o perdimento dos autos tenha ocorrido antes ou depois da produção de provas.

É evidente que, se as provas ainda não foram realizadas, após a restaura-ção, abre-se a fase de instrução probatória normalmente.

Por outro lado, caso as provas tenham sido já realizadas, assim estabe-lece a legislação processual: O CPC de 1973 diz que se o desaparecimento dos autos tiver ocorrido depois da produção das provas em audiência, o juiz mandará repeti-las (art. 1.066). Serão reinquiridas as mesmas testemunhas; mas se estas tiverem falecido ou se acharem impossibilitadas de depor e não houver meio de comprovar de outra forma o depoimento, poderão ser substituídas. Não havendo certidão ou cópia do laudo, far-se-á nova perícia, sempre que for possível e de preferência pelo mesmo perito. Não havendo certidão de docu-mentos, estes serão reconstituídos mediante cópias e, na falta, pelos meios ordi-

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA �����������������������������������������������������������������������������������������������������������������107

nários de prova. Os serventuários e auxiliares da justiça não podem eximir-se de depor como testemunhas a respeito de atos que tenham praticado ou assistido. Se o juiz houver proferido sentença da qual possua cópia, esta será juntada aos autos e terá a mesma autoridade da original (parágrafos).

A redação do CPC de 2015, no art. 715, diz que se a perda dos autos tiver ocorrido depois da produção das provas em audiência, o juiz, se necessário, mandará repeti-las.

O art. 715 do novo Código retira a obrigatoriedade de repetir necessa-riamente a produção da prova, em lúcida iniciativa, eis que não são todos os casos em que a prova deve ser repetida – aliás, são mínimos os casos em que isso se legitimaria, a exemplo de situações em que registros da prova realizada não são localizados.

Se a prova oral tiver de ser reproduzida, diz o § 1º do art. 715 do CPC/2015 que serão reinquiridas as mesmas testemunhas, que, em caso de impossibilida-de, poderão ser substituídas de ofício ou a requerimento. A redação simplifica o contido no código revogado citado antes e que apresentava hipóteses especí-ficas que as testemunhas seriam substituídas.

A nova redação contempla de forma aberta e genérica a possibilidade de substituição da oitiva realizada anteriormente diante de qualquer caso de impossibilidade de reprodução.

Outro ponto relevante (e novo) é o permissivo para que o juiz, de ofício, possa determinar a substituição da oitiva.

O § 2º do art. 715 do CPC/2015 regulamente a reprodução de laudo pericial e mantém quase a mesma a redação do código anterior, excluindo ape-nas a expressão “de preferência” quando da escolha do mesmo perito. A nova redação diz: “Não havendo certidão ou cópia do laudo, far-se-á nova perícia, sempre que possível pelo mesmo perito”.

O § 3º do art. 715 do CPC/2015 disciplina a reconstituição de certidão de documentos e mantém a mesma redação do Código de 1973, eis: “Não ha-vendo certidão de documentos, esses serão reconstituídos mediante cópias ou, na falta dessas, pelos meios ordinários de prova”.

O § 4º do art. 715 do CPC/2015 disciplina o depoimento de serven-tuários e auxiliares da justiça e também mantém a mesma redação do Código de 1973. Diz a nova redação: “Os serventuários e os auxiliares da justiça não podem eximir-se de depor como testemunhas a respeito de atos que tenham praticado ou assistido”.

O § 5º do art. 715 do CPC/2015, regulamente a reconstituição da sen-tença e diz que: “Se o juiz houver proferido sentença da qual ele próprio ou o

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escrivão possua cópia, esta será juntada aos autos e terá a mesma autoridade da original”. A redação é parecida com a do Código revogado de 1973, acrescen-tando que o próprio juiz ou o escrivão possa ter a cópia e apresentar nos autos. Em ambos os casos, ela terá a mesma validade para juntada.

Após o julgamento da restauração, o processo seguirá normalmente. Essa é a redação do Código de 1973, art. 1.067, que prevê que, julgada a restaura-ção, seguirá o processo os seus termos. Aparecendo os autos originais, nestes se prosseguirá sendo-lhes apensados os autos da restauração. Os autos suplemen-tares serão restituídos ao cartório, deles se extraindo certidões de todos os atos e termos a fim de completar os autos originais.

O Código processual de 2015 prevê a mesma regulamentação quanto ao julgamento do incidente ao dispor, no art. 716, que, julgada a restauração, seguirá o processo os seus termos e aparecendo os autos originais, neles se prosseguirá, sendo-lhes apensados os autos da restauração. Frisa-se que o novo Codex só não dispõe sobre a questão dos autos suplementares informada ante-riormente e que é objeto do § 2º do art. 1.067 do CPC/1973.

Há também na legislação processual dispositivo que regulamenta o caso de desaparecimento de autos que se encontram nos tribunais. O CPC/1973 diz que, se o desaparecimento dos autos tiver ocorrido no tribunal, a ação será dis-tribuída, sempre que possível, ao relator do processo, mas a restauração far-se-á no juízo de origem quanto aos atos que neste se tenham realizado. Remetidos os autos ao tribunal, aí se completará a restauração e se procederá ao julgamen-to (art. 1.068).

No CPC/2015, art. 717, a ideia é mantida ao constar que, se o desapa-recimento dos autos tiver ocorrido no tribunal, o processo de restauração será distribuído, sempre que possível, ao relator do processo, e que a restauração far-se-á no juízo de origem quanto aos atos nele realizados. Remetidos os autos ao tribunal, nele completar-se-á a restauração e proceder-se-á ao julgamento. Note-se que nenhuma mudança foi apresentada no novo Código processual quanto a esta questão.

O último ponto diz respeito à responsabilidade civil e ao pagamento das custas e honorários neste incidente processual. Quem houver dado causa ao desaparecimento dos autos responderá pelas custas da restauração e honorários de advogado, sem prejuízo da responsabilidade civil ou penal em que incorrer (art. 1.069 do CPC/1973).

O art. 718 do novo CPC firma a mesma premissa no sentido de que, quem houver dado causa ao desaparecimento dos autos responderá pelas cus-tas da restauração e pelos honorários de advogado, sem prejuízo da responsa-bilidade civil ou penal em que incorrer.

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Portanto, verifica-se que não foram muitas as alterações quanto ao proce-dimento de restauração de autos. Vale atenção nesta seara quanto à nova possi-bilidade de restauração de autos eletrônicos, legitimidade do Ministério Público para requerer abertura da Restauração, bem como permissivo para que o juiz, de ofício, possa determinar a Restauração e ouvir testemunhas. Além disso, os autos poderão ser restaurados com todas as peças em poder dos interessados e as provas só serão repetidas se necessário.

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Parte Geral – Doutrina

A Cobrança de Coparticipação e os Planos de Saúde: Análise do Regime Jurídico

The Copays and the Health Plans Contracts: Legal Regime Analysis

AuguSTO FRAnke DAhInTenMestre em Direito pela PUCRS, Especialista em Direito Internacional Público e Privado pela UFRGS, Especialista em Direito Ambiental Nacional e Internacional pela UFRGS, Advogado. Possui MBA em Direito Empresarial, com ênfase em Direto Tributário pelo Instituto de Desen-volvimento Cultural – IDC.

BeRnARDO FRAnke DAhInTenMestre em Direito pela PUCRS, Especialista em Direito Médico pela Escola Superior Verbo Jurídico, Especialista em Direito Empresarial pela PUCRS, Especialista em Direito Imobiliário, Contratos e Responsabilidade Civil pelo Instituto de Desenvolvimento Cultural – IDC, Advo-gado.

PAuLO ROBeRTO DO nASCImenTO mARTInSEspecialista em Direito Cooperativista pela Unisinos, Especialista em Direito Médico pela Es-cola Superior Verbo Jurídico, Advogado.

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar o regime jurídico das coparticipações no âmbito dos contratos de plano de saúde. Analisa-se, inicialmente, a função dos mecanismos de regulação, com especial destaque para a copartipação. Na sequência, se observam algumas das principais referências sobre a coparticipação na normatização vigente aplicável ao sistema da saúde suplementar. A seguir, se analisa o tema à luz do Código de Defesa do Consumidor e os direitos pro-tetivos previstos nesta legislação. Por fim, é realizada uma pesquisa jurisprudencial sobre a aceitação da coparticipação junto aos Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul e de São Paulo, bem como ao Superior Tribunal de Justiça.

PALAVRAS-CHAVE: Direito securitário; contratos de planos de saúde; coparticipação.

ABSTRACT: This essay has as its scope to analyze the brazilian legal regime of the copays (similar to the deductible in the insurances) in the context of the health plans contracts. It is analyzed, initially, the function of the regulation mechanisms, with special focus on the copays. Following, it is observed some of the main references about the copays in the current legal system applicable to the supple-mentary (private) health system. Next, it is analyzed the thematic under the lens of the Consumer Protection Code and the consumers protective rights. At last, it is researched about the acceptation of the copays on the Brazilian Courts of the States of Rio Grande do Sul (RS) and São Paulo (SP), and the Superior Justice Court.

KEYWORDS: Insurance law; health plans contracts; copay.

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SUMÁRIO: Introdução; 1 A saúde suplementar e os mecanismos de regulação; 2 As coparticipações e os planos de saúde; 3 As proibições legais e os temperos do CDC; 4 O tratamento jurisprudencial no âmbito do TJRS e do TJSP; 5 As recentes “soluções” do Superior Tribunal de Justiça; Considerações finais; Referências.

Introdução

Entre os elementos mais importantes e fundamentais às operações secu-ritárias encontram-se os chamados mecanismos de regulação. Gênero do qual as “franquias” e as “coparticipações” são seguramente duas das principais espé-cies, estes mecanismos agem nos contratos de seguro como ferramentas volta-das ao controle da utilização das coberturas securitárias.

A sua incidência, além de se justificar pelo relevante papel que desem-penham, é admitida, de modo geral, pela maioria dos consumidores. Ainda que representem, na prática, um “pedágio” para a utilização de algumas coberturas securitárias, poucos discutem a sua licitude e validade, sendo rubricas que, res-salvadas situações muito particulares, são aceitas.

Ocorre, contudo, que, neste contexto, uma questão apresenta-se como especialmente inquietante e controvertida. Fala-se da cobrança de copartici-pações no âmbito dos contratos de planos de saúde. Embora a razão de existir destas seja, a rigor, a mesma compartilhada pelas franquias e pelos demais me-canismos desta natureza, não são incomuns beneficiários se insurgirem, inclu-sive judicialmente, contra estas cobranças, e com os mais diversos argumentos.

Precisamente no que tange a estas situações – em que se discute acerca das coparticipações cobradas no âmbito dos contratos de assistência privada à saúde –, o entendimento jurisprudencial majoritário, encontrado nas principais Cortes nacionais, vem sendo no sentido de se admitir esta rubrica, mas com a imposição de diversas regras e ressalvas, as quais, na prática, acabam resultan-do na invalidação dos valores cobrados pelas operadoras de planos de saúde a este título.

Este assunto ganhou, recentemente, um novo episódio, com o julgamen-to, pelo Superior Tribunal de Justiça, do Recurso Especial nº 1.511.640/DF, ca-paz de redirecionar as decisões dos Tribunais estaduais a esse respeito. Nesse cenário, o presente artigo, ainda que sem qualquer pretensão de esgotar o tema, presta-se a explorar esta específica controvérsia, com especial foco na mencio-nada decisão.

1 a saÚde suplementar e os meCanIsmos de reGulação

O universo dos contratos securitários é, no mundo moderno, sabidamen-te complexo e plural. São incontáveis as formas de produtos e serviços securitá-

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rios que são, atualmente, passíveis de contratação, realidade verificada tanto no Brasil quanto no resto do mundo. Entretanto, embora existente esta verdadeira pluralidade de produtos, estruturalmente falando, a maioria dos pactos securi-tários compartilha dos mesmos elementos (risco, contraprestação econômica, entre outros) e das mesmas lógicas operacionais (previsibilidade de riscos com base em cálculos atuariais, predeterminação dos eventos cobertos, etc.).

Neste contexto, um importante instrumento – que, embora tenha impli-cações práticas diretas para os segurados-beneficiários, é pouquíssimo estudado pela comunidade jurídica – é, precisamente, os denominados mecanismos de regulação1. Estes, ao contrário do que o título deste trabalho pode sugerir, não se restringem ao sistema de saúde suplementar e, portanto, não se limitam aos planos de saúde. Incidem, pois, em verdade, em boa parte das apólices securitá-rias comercializadas no mercado, constatação cujo exemplo mais emblemático e conhecido é, provavelmente, a franquia nos seguros de automóvel.

É no âmbito do sistema de saúde suplementar, contudo, e nos contratos de assistência privada à saúde que estes mecanismos de regulação mostram-se especialmente intrigantes e juridicamente controvertidos. Em linhas gerais (e tendo como pano de fundo os planos de saúde), pode-se defini-los como ferra-mentas contratualmente previstas, cujo efeito prático consiste em controlar, ou, conforme sugere a sua própria denominação, regular a utilização dos serviços assistenciais2.

Especificamente neste mercado, ditos instrumentos aparecem de diversas formas, das quais se destacam as seguintes: a criação de junta médica (para resolução de divergências médicas/odontológicas de ordem técnica); a implan-tação de sistemas de autorização prévia (exigindo, por exemplo, que os serviços sejam, como regra geral, precedidos de autorização prévia por parte do plano

1 “Por mecanismos de regulação entende-se o conjunto de atos de cunho contratual, previstos e nominados na legislação específica, aplicáveis setorialmente a determinado mercado regulado, dos quais os agentes econômicos podem se valer para controlar a oferta e a demanda de seus produtos e serviços, desde que previamente autorizados pelo Poder Público. Isto é, trata-se de cláusulas estipuladas nos contratos de prestação de serviços celebrados entre os usuários e os agentes econômicos, com a prévia autorização do ente regulador, destinados a controlar a demanda dos serviços prestados, evitando-se, assim, que, em virtude de abusos de direitos, os consumidores aumentem o risco moral da atividade e majorem indevidamente a contraprestação cobrada pelos prestadores.” (FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Curso de direito de saúde suplementar: manual jurídico de planos e seguros de saúde. São Paulo: MP, 2006. p. 66)

2 “[...] os mecanismos de regulação são procedimentos adotados pelas operadoras com a finalidade de controlar e supervisionar o acesso ao atendimento de assistência à saúde dispensado a seus beneficiários” (FERRON, Fabiana. Planos privados de assistência à saúde: Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2002. p. 98); “Na execução do contrato de seguro [...] deve-se bem compreender o papel que a cláusula de franquia constitui instrumento de moderação da invocação do seguro pelo segurado, de modo a preservar seu mutualismo” (MIRAGEM, Bruno. O direito dos seguros no sistema jurídico brasileiro: uma introdução. In: MIRAGEM, Bruno; CARLINI, Angélica (Org.). Direito dos Seguros: fundamentos de direito civil, direito empresarial e direito do consumidor. São Paulo: RT, 2014. p. 54).

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de saúde); as franquias (ampla e popularmente conhecidas); e as coparticipa-ções, estas últimas o objeto deste ensaio3-4.

Não obstante esta diversidade, todos estes instrumentos buscam, em re-sumo, regular a utilização dos riscos contratualmente garantidos. Daí por que a sua importância para o universo dos seguros, inclusive para o específico sistema de saúde suplementar, é evidente5. Não fosse a utilização destas ferramentas, as operadoras e seguradoras estariam, quase que irremediavelmente, à mercê de abusos e fraudes, e dos prejuízos daí decorrentes. Tratam-se, destarte, os meca-nismos de regulação, de instrumentos de inestimável importância e de grande utilidade e que, como visto, estão especialmente presentes no sistema de saúde suplementar.

2 as CopartICIpações e os planos de saÚde

As coparticipações, enquanto mecanismos de regulação empregados nos contratos de planos de saúde, tal e qual explicitado antes, agem na regulação da utilização das coberturas assistenciais, isto é, no controle do acionamento (ou da “ativação”), por parte dos beneficiários, das garantias previstas nas mi-nutas contratuais. Prestam-se, em termos mais pragmáticos, tanto para frear a

3 As franquias não se confundem com as coparticipações. Nesse sentido, invocam-se as definições veiculadas na Resolução nº 8, de 1998, do Consu, a saber: “Art. 3º Para efeitos desta regulamentação, entende-se como: I – ‘franquia’, o valor estabelecido no contrato de plano ou seguro privado de assistência à saúde e/ou odontológico, até o qual a operadora não tem responsabilidade de cobertura, quer nos casos de reembolso ou nos casos de pagamento à rede credenciada ou referenciada; II – ‘co-participação’, a parte efetivamente paga pelo consumidor à operadora de plano ou seguro privado de assistência à saúde e/ou operadora de plano odontológico, referente a realização do procedimento” (art. 3º).

4 Especificamente quanto à coparticipação: “[...] é a parte efetivamente paga pelo consumidor à operadora de plano ou seguro privado de assistência à saúde e/ou operadora de plano odontológico, referente à realização do procedimento, por exemplo, contribuição de 30% (trinta por cento) – do valor a ser pago – para cada consulta realizada” (FERRON, Fabiana. Planos privados de assistência à saúde: Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2002. p. 98); no mesmo sentido: “Co-participação é a parte efetivamente paga pelo consumidor à operadora referente a realizado do procedimento” (SILVA, José Luiz Toro da. Manual de direito da saúde suplementar: a iniciativa privada e os planos de saúde. São Paulo: M. A. Pontes Editora, 2005. p. 105).

5 Embora se referindo, a toda evidência, aos seguros de forma geral, revela-se oportuno o seguinte esclarecimento de Antonio Penteado Mendonça: “Muito embora franquia e participação obrigatória representem um ônus para o segurado, sua semelhança acaba ai. Conceitualmente são dois institutos completamente diferentes, com funções diferentes e resultados diferentes. A franquia visa baratear o seguro; a participação obrigatória, fazer que o segurado tome cuidado. Um seguro sem franquia, dependendo do tipo de cobertura, seria muito caro. Não apenas porque a seguradora teria de pagar um número maior de sinistros, mas porque ela teria de fazer a regulação de um número maior de eventos de valor baixo, que não pesam para a maioria dos segurados. Deixando por conta dos segurados os custos dos sinistros menores, que são a imensa maioria, a seguradora economiza nos custos de regulação e nos valores totais de indenização, podendo desta forma cobrar menos para indenizar os sinistros maiores, que são os que pesam no bolso. Já a participação obrigatória do segurado no sinistro é uma forma de a seguradora forçar o proprietário do bem a zelar por ele e evitar o máximo possível sua exposição a um sinistro. Na participação obrigatória o segurado torna-se sócio da seguradora na indenização. Enquanto na franquia a seguradora não paga as indenizações abaixo de um determinado valor fixo e pré-acordado, na participação obrigatória, independentemente do valor do dano, o segurado é responsável por determinado percentual da indenização, dividindo o prejuízo como sócio da seguradora. [...] Como se vê, as duas são instrumentos para baratear o seguro [...]” (MENDONÇA, Antonio Penteado. Temas de seguro. 2. ed. São Paulo: Roncarati, 2010. p. 103/104).

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utilização excessiva, como também para possibilitar a fixação de valores mais reduzidos a título de contraprestação econômica (mensalidades)6.

Não bastasse a sua utilização ter, portanto, justificação de natureza eco-nômica, fato é que a cobrança de coparticipação, nos planos de saúde, é, há muitos anos, expressamente permitida – e inclusive estimulada – por parte da legislação e das normas regulamentares pertinentes. São incontáveis os dispo-sitivos normativos, próprios do regime jurídico que disciplina a atividade das operadoras de planos de saúde, que, direta ou indiretamente, preveem a utili-zação das coparticipações.

Destes, deve-se citar, em primeiro lugar, a Lei Federal nº 9.656, de 1998, a denominada Lei dos Planos de Saúde (LPS), cujo art. 16, inciso VIII7, mencio-na, expressamente, a possibilidade de os planos de saúde prever, desde que com clareza, franquias, limites financeiros ou “percentual de coparticipação do consumidor ou beneficiário”.

Também em 1998 o Conselho de Saúde Suplementar (Consu) igualmente positivou, expressamente, a possibilidade de utilização de coparticipações pe-los planos de saúde, o fazendo por meio da sua Resolução nº 8, especialmente no art. 1º, § 2º8, de acordo com o qual as operadoras podem utilizar mecanis-mos de regulação financeira, tanto franquias quanto coparticipações.

Desde então – especialmente após o ano 2000, em que foi criada a Agên-cia Nacional de Saúde Suplementar (ANS) – foram diversas as normas cunhadas pela agência reguladora que, direta ou indiretamente, trataram das cobranças de coparticipação9. Entre estas pode-se citar, por exemplo, a Resolução Nor-mativa (RN) nº 85, de 2004, que versa especificamente sobre a concessão de autorização para o funcionamento das operadoras. Esta norma, em seu Ane-xo II, menciona, expressamente, que os planos de saúde poderão contar com “mecanismos financeiros de regulação”, seja coparticipação, seja franquia, por

6 “Sabendo que parte do custo da cobertura do seguro será carreada ao patrimônio do usuário, é certo que ele e seus dependentes serão mais parcimoniosos no uso das coberturas. A contratação de alguma forma de co-participação também implica na diminuição do custo do seguro ou da mensalidade do plano.” (BOTTESINI, Maury Ângelo; MACHADO, Mauro Conti. Lei dos planos e seguros de saúde: comentada e anotada artigo por artigo, doutrina, jurisprudência. São Paulo: RT, 2003. p. 121/122)

7 “Art. 16. Dos contratos, regulamentos ou condições gerais dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei devem constar dispositivos que indiquem com clareza: [...] VIII – a franquia, os limites financeiros ou o percentual de co-participação do consumidor ou beneficiário, contratualmente previstos nas despesas com assistência médica, hospitalar e odontológica; [...]”

8 “Art. 1º [...] § 2º As operadoras de seguros privados somente poderão utilizar mecanismos de regulação financeira, assim entendidos, franquia e co-participação, sem que isto implique no desvirtuamento da livre escolha do segurado.”

9 Conforme a Lei Federal nº 9.961, de 2000, responsável por criar a Agência Nacional de Saúde Suplementar, entre as atribuições legais desta agência encontra-se, justamente, a de “estabelecer normas relativas à adoção e utilização, pelas operadoras de planos de assistência à saúde, de mecanismos de regulação do uso dos serviços de saúde” (art. 4º, inciso VII).

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meio dos quais “o beneficiário terá que participar no pagamento de cada pro-cedimento” (item 10).

No mesmo sentido, mencionável a RN 171, de 2008, em que são disci-plinados critérios para a aplicação dos reajustes anuais dos planos de saúde. A dita norma igualmente se refere às coparticipações, estabelecendo que, nos planos individuais e familiares (aqueles firmados por pessoas físicas), as copar-ticipações não poderão sofrer reajuste em percentual superior àquele fixado pela agência reguladora, para fins de reajuste anual das mensalidades (art. 8º, parágrafo único10). Já, no que tange aos planos de natureza coletiva (aqueles contratados por pessoas jurídicas), a norma não indica limitador para eventual reajuste dos valores previstos a título de coparticipação, podendo as partes con-tratantes, em princípio, definirem as atualizações, conforme livre negociação, bastando posterior comunicação à ANS (art. 13, inciso II11).

A RN 259, de 2011, da mesma forma, também prevê a possibilidade de utilização de coparticipações pelos planos de saúde. A mencionada resolução normativa trata, em linhas gerais, das regras e dos prazos máximos para os dife-rentes tipos de atendimento. A norma prevê que, na hipótese de um beneficiário ser obrigado a pagar os custos de atendimento a que teria direito pelo plano (em uma situação de urgência, por exemplo, em que não há tempo para se dirigir ao um prestador da rede credenciada junto à operadora), fará jus ao reembolso do valor adimplido, quantia da qual poderá ser abatida a coparticipação, caso contratualmente prevista (art. 9º, § 3º12).

Outro exemplo de previsão de cobrança de coparticipação extrai-se da RN 279, de 2011. Esta norma, conhecida por tratar dos demitidos e aposentados e o seu direito de permanecerem no plano de saúde coletivo do qual gozavam enquanto empregados, igualmente cita a coparticipação. Na prática, a norma exige que, para que se cogite o mencionado direito, o ex-funcionário precisa, enquanto da vigência do contrato de trabalho, necessariamente, ter contribuído para o plano de saúde. E, ao assim fazê-lo, a resolução adverte que os paga-mentos feitos a título de coparticipação não se confundem com as mensalidades

10 “Art. 8º O índice de reajuste máximo a ser autorizado pela ANS para as contraprestações pecuniárias dos planos tratados no art. 2º, será publicado no Diário Oficial da União e na página da ANS na Internet, após aprovação da Diretoria Colegiada da ANS. Parágrafo único. Os valores relativos às franquias ou co-participações não poderão sofrer reajuste em percentual superior ao autorizado pela ANS para a contraprestação pecuniária.”

11 “Art. 13. Para os planos coletivos médico-hospitalares, com ou sem cobertura odontológica, com formação de preço pré-estabelecido, assim definidos pelo item 11.1 do anexo II da Resolução Normativa – RN nº 100, de 3 de junho de 2005, independente da data da celebração do contrato, deverão ser informados à ANS: I – os percentuais de reajuste e revisão aplicados; e II – as alterações de co-participação e franquia.”

12 “Art. 9º Na hipótese de descumprimento do disposto nos arts. 4º, 5º ou 6º, caso o beneficiário seja obrigado a pagar os custos do atendimento, a operadora deverá reembolsá-lo integralmente no prazo de até 30 (trinta) dias, contado da data da solicitação de reembolso, inclusive as despesas com transporte [...] § 3º Nos contratos com previsão de cláusula de co-participação, este valor poderá ser deduzido do reembolso pago ao beneficiário.”

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para efeitos da exigida contribuição (art. 2º, inciso I13, e que já estava previsto na LPS, art. 30, § 6º14).

A RN 387, de 2015, responsável por veicular o atual “rol de procedi-mentos obrigatórios” (tecnicamente identificada como “Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde”), também menciona as coparticipações. A mencionada norma estipula que, em havendo previsão (contratual) de cobrança de coparti-cipação para a internação hospitalar, tal se aplicará para todas as especialidades médicas (art. 22, inciso II, primeira parte15). Além disso, esta norma estabelece, especificamente no que concerne às internações psiquiátricas, que a copartici-pação só poderá incidir após o trigésimo dia de internação, e limitadamente ao percentual de 50% do valor negociado entre a operadora e o respectivo presta-dor do serviço (art. 22, inciso II, segunda parte16).

Por fim, citável, ainda, também a título de exemplo, a RN 124, de 2006, encarregada de prever as penalidades atribuíveis às operadoras, em caso de vio-lação da legislação pertinente aos planos de saúde. Entre as diversas infrações tipificadas, encontra-se, precisamente, “deixar de cumprir as regras previstas na legislação ou no contrato referentes à adoção e utilização dos mecanismos de regulação do uso dos serviços de saúde”, cuja penalidade corresponde à multa no valor de R$ 30.000,00 (art. 7117).

Em outras palavras, não faltam normas – maioria das quais cunhadas pela agência reguladora e que são inerentes ao funcionamento e às operações dos contratos de planos de saúde – que preveem, expressamente, a possibilidade de cobrança de coparticipação. Trata-se esta, pois, de uma ferramenta comum aos contratos de assistência privada à saúde e para cuja utilização as operadoras

13 “Art. 2º Para os efeitos desta Resolução, considera-se: I – contribuição: qualquer valor pago pelo empregado, inclusive com desconto em folha de pagamento, para custear parte ou a integralidade da contraprestação pecuniária de seu plano privado de assistência à saúde oferecido pelo empregador em decorrência de vínculo empregatício, à exceção dos valores relacionados aos dependentes e agregados e à co-participação ou franquia paga única e exclusivamente em procedimentos, como fator de moderação, na utilização dos serviços de assistência médica ou odontológica.”

14 “Art. 30. Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral. [...] § 6º Nos planos coletivos custeados integralmente pela empresa, não é considerada contribuição a co-participação do consumidor, única e exclusivamente, em procedimentos, como fator de moderação, na utilização dos serviços de assistência médica ou hospitalar.”

15 “Art. 22. [...] II – quando houver previsão de mecanismos financeiros de regulação disposto em contrato para internação hospitalar, o referido aplica-se a todas as especialidades médicas [...].”

16 “Art. 22. [...] contudo a coparticipação nas hipóteses de internações psiquiátricas somente poderá ser exigida considerando os seguintes termos, que deverão ser previstos em contrato: a) somente haverá fator moderador quando ultrapassados 30 dias de internação contínuos ou não, nos 12 meses de vigência; e b) a coparticipação poderá ser crescente ou não, estando limitada ao máximo de 50% do valor contratado entre a operadora de planos privados de assistência à saúde e o respectivo prestador de serviços de saúde.”

17 “Art. 71. Deixar de cumprir as regras previstas na legislação ou no contrato referentes à adoção e utilização dos mecanismos de regulação do uso dos serviços de saúde: Sanção – advertência; multa de R$ 30.000,00.”

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estão, excetuadas situações que contrariam as regras e vedações legais, ampla-mente autorizadas.

3 as proIBIções leGaIs e os temperos do CdC

Conforme explicitado, a previsão de cobrança de coparticipação, no âm-bito dos contratos de planos de saúde, apresenta-se como sendo uma medida incontroversamente lícita. Além de se justificar pelo relevante papel que desem-penha (atuando na regulação da utilização das coberturas assistenciais, repete--se), a sua existência decorre de ampla base legal e normativa.

Daí porque pode-se afirmar com segurança que, como regra geral, em havendo previsão no instrumento contratual, a cobrança de coparticipação, desde que em conformidade com o convencionado entre as partes, é válida. Este reconhecimento, contudo, não encerra o assunto; muito pelo contrário, serve apenas para indicar os contornos iniciais do regime jurídico atinente às coparticipações nos contratos de planos de saúde.

A aferição quanto à validade de determinada cobrança de coparticipa-ção, em uma situação fática concreta, pressupõe, ainda, o cotejo de outras dis-posições normativas, responsáveis por impor limites e restrições a esta rubrica, e que necessitam ser igualmente observadas e atendidas, sob pena de, do con-trário, invalidar esta cobrança.

A esse respeito, cabe citar, novamente, a Resolução nº 8 do Consu, a qual arrola diversas restrições (e/ou critérios) que devem ser observadas, sob pena de a coparticipação, no caso concreto, revelar-se ilícita. Entre estas me-rece menção a vedação de adoção de valores que caracterize “financiamento integral do procedimento por parte do usuário” ou que resulte em “fator restritor severo ao acesso aos serviços” (art. 2º, inciso VII18).

A mesma resolução proíbe, também, “estabelecer em casos de interna-ção, fator moderador em forma de percentual por evento [...]” (art. 2º, inciso VIII19), disposição que, embora potencialmente confusa, exige a atenção das operadoras. Desta norma, s.m.j., deve-se inferir que, no caso de internação hos-pitalar, a coparticipação, além de constar em valor determinado (não se admi-tindo percentual), deverá ser única por todo o atendimento prestado.

Ou seja, se o beneficiário, durante uma internação, submeter-se, por exemplo, a exames, procedimentos, etc., a cobrança não poderá ser múltipla,

18 “Art. 2º Para adoção de práticas referentes à regulação de demanda da utilização dos serviços de saúde, estão vedados: [...] VII – estabelecer co-participação ou franquia que caracterize financiamento integral do procedimento por parte do usuário, ou fator restritor severo ao acesso aos serviços.”

19 “Art. 2º Para adoção de práticas referentes à regulação de demanda da utilização dos serviços de saúde, estão vedados: [...] VIII – estabelecer, em casos de internação, fator moderador em forma de percentual por evento, com exceção das definições específicas em saúde mental.”

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isto é, não poderá se dar sobre cada uma destas situações (“eventos”), deven-do ser apenas uma, para toda a internação. É importante se ressaltar que esta vedação proíbe, apenas, a utilização de percentual por evento quando houver internação. Excetuada esta situação particular, não há, na legislação, vedação para a utilização de percentuais20. Pelo contrário, a LPS, no já referido art. 16, inciso VIII – apesar de não estipular quais os limites que seriam, ou não, acei-táveis para estes fins –, autoriza, inequivocamente, a utilização de percentuais para fins de coparticipação21. Esta constatação é especialmente válida nas inter-nações psiquiátricas, para as quais a RN 387 da ANS declaradamente permite, reprisa-se, a utilização de coparticipação na forma de percentual, desde que “limitada ao máximo de 50%” (art. 22, inciso II, b).

Da mesma forma, ainda com base na Resolução nº 8 do Consu, exige--se que as operadoras, quando da utilização dos mecanismos de regulação, informem clara e previamente ao consumidor a esse respeito, tanto no material publicitário, como no instrumento contratual, quanto no material indicador dos serviços da rede (art. 4º, inciso I22).

A estas exigências deve-se acrescentar, outrossim, as normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor (CDC – Lei Federal nº 8.078/1990), diplo-ma inegavelmente aplicável aos contratos securitários, e que, por si só, inclui outros elementos que, igualmente, precisam ser observados, sob pena de tam-bém implicar a anulação de eventual previsão contratual de coparticipação.

Das diversas regras derivadas do microssistema protetivo do consumidor, merecem destaque as seguintes: a necessidade de o consumidor ter conheci-mento prévio da existência de cobrança de coparticipação em determinados atendimentos (sob pena de ineficácia da disposição, art. 4623); a obrigatoriedade de a respectiva cláusula contratual constar com redação devidamente grifada e

20 Convém registrar que este nosso entendimento encontra posição contrária na doutrina. Neste sentido, vide, por exemplo: “A participação do segurado ou do usuário do plano não pode ser tão elevada que se constitua um entrave à utilização ou empeço ao acesso do segurado aos tratamentos estipulados. E a co-participação não pode ser estipulada em percentual do valor do tratamento ou do serviço, a não ser nos tratamentos psiquiátricos [...]” (BOTTESINI, Maury Ângelo; MACHADO, Mauro Conti. Lei dos planos e seguros de saúde: comentada e anotada artigo por artigo, doutrina, jurisprudência. São Paulo: RT, 2003. p. 122).

21 “A regulamentação não define qual o percentual máximo permitido para a franquia e a co-participação, porém estabelece que não podem caracterizar financiamento integral do procedimento por parte do usuário, ou fator restritivo severo ao acesso aos serviços. Entendemos que percentual até 50% (cinquenta por cento) não caracteriza severa restrição [...].” (SILVA, José Luiz Toro da. Manual de direito da saúde suplementar: a iniciativa privada e os planos de saúde. São Paulo: M. A. Pontes Editora, 2005. p. 105)

22 “Art. 4º As operadoras de planos ou seguros privados de assistência à saúde, quando da utilização de mecanismos de regulação, deverão atender às seguintes exigências: I – informar, clara e previamente ao consumidor, no material publicitário do plano ou seguro, no instrumento de contrato e no livro ou indicador de serviços da rede: a) os mecanismos de regulação adotados, especialmente os relativos a fatores moderadores ou de co-participação e de todas as condições para sua utilização [...].”

23 “Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.”

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destacada (de forma a se evitar a sua invalidade, art. 54, §§ 3º e 4º24); e a neces-sidade de a cláusula ser suficientemente clara, de forma a não causar dúvidas (evitando-se, assim, a sua distorção ou relativização, com base no art. 4725).

Ainda, a previsão de incidência de coparticipação não pode se reve-lar excessivamente onerosa ao consumidor, sob pena de ser declarada nula (art. 51, inciso IV26), seja por desvirtuar a própria finalidade do contrato (art. 51, § 1º, inciso II27), seja por ser, simplesmente, excessiva (art. 51, § 1º, inciso III28). Deve-se ter em mente, na aferição quanto à validade de determinada previsão de coparticipação, que o escopo do plano de saúde é, em sua essência, fornecer garantia financeira para serviços de natureza médica. O consumidor presume estar garantido e conta com o suporte financeiro do plano para o caso de ne-cessitar de atendimento médico. Daí por que a coparticipação não pode frustrar esta expectativa e desvirtuar desta finalidade, sob pena de ser, compreensivel-mente, considerada abusiva e, por consequência, nula.

Conquanto observadas e respeitadas estas diretrizes (e limitações) – que indubitavelmente se mostram adequadas e racionais na ordem jurídica vigente (humanizada, com substanciosa influência dos valores humanos e sociais) –, as coparticipações, nos planos de saúde, enquanto mecanismos de regulação, são, como regra, válidas.

Do conjunto de normas e disposições legais supramencionadas, a ou-tra conclusão não se chega, se não a de que o regime jurídico, pertinente às cobranças de coparticipações, não é dos mais simples. Não basta, portanto, (I) a previsão no contrato para que esta cobrança seja válida. A estipulação contratual, por repercutir na esfera econômica do consumidor, (II) além de com clareza, (III) deve constar com grafia suficientemente destacada, (IV) bem como deve-se garantir que o consumidor tenha, dela, ciência prévia, de forma a não lhe surpreender quando da sua materialização. Além disso, (V) a cobrança não pode, sob hipótese alguma, se dar em valor que se mostre excessivamente one-

24 “Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. [...] § 3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor; § 4º As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.”

25 “Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.”26 “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de

produtos e serviços que: [...] IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.”

27 “Art. 51. [...] § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: [...] II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual.”

28 “Art. 51. [...] § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: [...] III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.”

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roso ao consumidor, tampouco (VI) pode violar alguma das vedações previstas no ordenamento.

4 o tratamento JurIsprudenCIal no ÂmBIto do tJrs e do tJsp

Embora o panorama normativo responsável por regulamentar a utiliza-ção das coparticipações no âmbito dos planos de saúde tenha diversos detalhes e particularidades, que precisam ser observados para não incorrer em irregu-laridade, a cobrança de coparticipações, em princípio, não implica maiores dúvidas. Tendo em mente esta constatação, em tese, excetuadas situações ex-cepcionais, as coparticipações, se previstas com clareza no contrato, deveriam ser facilmente admitidas.

Entretanto, ao se analisar o tratamento conferido a este rubrica pelos Tri-bunais brasileiros, o que se verifica é que, judicialmente, a ratificação destas cobranças tem se mostrado a exceção, ao passo que a sua invalidação tem sido a regra. Com efeito, são diversos os litígios alçados à análise do Poder Judiciá-rio que versam, precisamente, sobre esta cobrança. E, compulsando a jurispru-dência, o que se verifica é que os Tribunais vêm se mostrando, quase sempre em nome da proteção dos consumidores, extremamente severos e exigentes na análise destas cobranças e, na maior parte das vezes, concluem por anulá-las.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), por exemplo, não des-conhece a importância e o papel desempenhado pelas coparticipações. Exem-plo de prova irrefutável, nesse sentido, extrai-se do seguinte trecho proclamado pelo Desembargador Ney Wiedemann Neto, no julgamento da Apelação Cível nº 70066130741, ocorrido em 19.11.2015:

A coparticipação pode ser definida como um gênero de que a franquia e os li-mites financeiros das coberturas seriam espécies. A franquia é instituto típico do direito securitário e pode ser vista como uma das medidas inibitórias das condu-tas descuidadas ou pródigas dos segurados, dos credenciados e referenciados. Sabendo que parte do custo da cobertura do seguro será carreada ao patrimônio do usuário, é certo que ele e seus dependentes serão mais parcimoniosos no uso das coberturas. A contratação de alguma forma de coparticipação também implica diminuição do custo do seguro ou da mensalidade do plano.

Ocorre que, em que pese haja este incólume reconhecimento, no TJRS a esmagadora maioria destes litígios, ainda assim, é julgada desfavoravelmente aos planos de saúde. E, para tanto, um fundamento – bastante controvertido, pois contraria, frontalmente, a própria Lei dos Planos de Saúde – tem sido a tônica deste entendimento: a utilização de percentuais. O Tribunal gaúcho, atualmente, apresenta entendimento consolidado no sentido de que a cobrança de coparticipação, apesar de ser, em si, lícita, é abusiva quando prevista em percentual (seja qual for a espécie do tratamento ou do serviço utilizado), con-

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clusão que é acompanhada do art. 51, inciso IV, do CDC. Na prática, a orienta-ção do TJRS segue o seguinte raciocínio:

A coparticipação estabelecida em percentual sobre o custo do tratamento ou valor incerto é abusiva, pois afronta a regra prevista no art. 51, inciso IV, do CDC, a qual estabelece como nulas as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou seja, incompatíveis com a boa-fé ou a eqüida-de. Além disso, a exigência de coparticipação em percentual sobre o valor do tratamento e/ou exame poderia impedir o beneficiário de utilizar o plano de saúde contratado em face do montante a ser arcado por ele ou onerá-lo com as despesas que através da contratação pretendia evitar. (TJRS, Apelação Cí-vel nº 70055294656, 6ª Câmara Cível, Rel. Sylvio José Costa da Silva Tavares, J. 31.03.2016)

São incontáveis os precedentes que poderiam ser aqui citados, com es-copo de atestar este norte jurisprudencial. A título de exemplo, seguem os se-guintes arestos, oriundos tanto da 5ª Câmara Cível quanto da 6ª Câmara Cível29 do TJRS:

AGRAVO INTERNO – DECISÃO MONOCRÁTICA EM APELAÇÃO CÍVEL – SE-GUROS – PLANO DE SAÚDE – AÇÃO DE COBRANÇA – VALORES DE CO-PARTICIPAÇÃO EM PERCENTUAIS – 1. Embora o Código de Defesa do Consu-midor não vede expressamente a exigência de coparticipação dos beneficiários no plano de saúde, tal cláusula afronta o disposto no art. 51, inciso IV, do CDC. Ainda, o art. 4º, inciso VII, da Resolução nº 8, da Agência Nacional de Saúde, prevê a necessidade de fixação em valor fixo da coparticipação, não poden-do ser cobrado em percentuais, o que é o caso dos autos. [...]. Agravo interno desprovido. (TJRS, Agravo nº 70068116524, 6ª Câmara Cível, Relª Elisa Carpim Corrêa, J. 03.03.2016)

Apelação cível. Seguros. Plano de saúde. Preliminar ilegitimidade passiva afas-tada. Cobrança de coparticipação. Não há vedação legal para a cobrança de coparticipação, desde que prevista em valor certo e determinado. A previsão contratual de coparticipação em percentual sobre o valor do tratamento/pro-cedimento coloca o consumidor em desvantagem exagerada, transferindo ao usuário o risco assumido pelo plano quando da contratação. Abusividade re-conhecida. Dever de restituição dos valores pagos a título de coparticipação que deve ocorrer na forma simples. Apelo parcialmente provido. (TJRS, Ape-lação Cível nº 70066130741, 6ª Câmara Cível, Rel. Ney Wiedemann Neto, J. 19.11.2015)

29 Órgãos regimentalmente responsáveis, no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, por julgar as ações envolvendo contratos securitários, incluindo os planos de saúde.

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APELAÇÃO CÍVEL – SEGUROS – PLANO DE SAÚDE – APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – ABUSIVIDADE DO CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COM PREVISÃO DE COPARTICIPAÇÃO EM PORCEN-TAGEM – PROCEDIMENTO CIRÚRGICO – [...]. Embora o art. 16, inciso VIII da Lei nº 9.656/1998 disponha sobre a possibilidade de previsão contratual de coparticipação do usuário nas despesas médico-hospitalares, o que também não é vedado pelo Código de Defesa do consumidor, uníssono é o entendimento desta 5ª Câmara Cível no sentido de que a cláusula que prevê a coparticipação do usuário em valores percentuais é abusiva, devendo ser declarada a sua nuli-dade, em face da desvantagem exagerada à qual fica submetido o consumidor em face da operadora de plano de saúde, com base no art. 51, IV do CDC. [...]. Recurso parcialmente provido. (TJRS, Apelação Cível nº 70066725847, 5ª Câ-mara Cível, Rel. Léo Romi Pilau Júnior, J. 11.11.2015)

Este entendimento, de tão reiterado, já foi, inclusive, aplicado em sede de embargos infringentes, tendo o 3º Grupo Cível do TJRS concluído pelo des-cabimento da cobrança de coparticipação em percentual, por ser supostamente abusiva frente ao disposto no art. 51, inciso IV, do CDC:

EMBARGOS INFRINGENTES – SEGUROS – PLANO DE SAÚDE – Inviável a exi-gência de coparticipação do segurado prevista em percentual sobre o valor das despesas de tratamento ou valor incerto, posto que totalmente abusiva e em dis-sonância com o estabelecido no art. 51, inciso IV do CDC. [...]. (TJRS, Embargos Infringentes nº 70063663843, 3º Grupo de Câmaras Cíveis, Rel. Luís Augusto Coelho Braga, J. 03.07.2015)

Em outras palavras, o TJRS entende que a previsão na forma de percen-tual é, por si só, motivo suficiente para invalidar a cobrança de coparticipação. De tão intensa esta orientação, a impressão que se tem é que esta, inclusive, independe das peculiaridades do caso concreto, assim como parece ser irrele-vante a existência de previsão contratual.

Esta orientação jurisprudencial tampouco se relativiza frente a percen-tuais reduzidos, como, por exemplo, perante previsões de coparticipação de (apenas) 10% a 20%. Basta que a previsão esteja na forma de percentuais, e não em valor fixo, que esta rubrica está, pelo menos à luz do entendimento judicial hoje dominante, no que tange ao TJRS, fadada à invalidação.

Até mesmo nos casos de internação psiquiátrica – para as quais a agência reguladora, lembra-se, autoriza clara e pontualmente a utilização de percentu-ais, desde que limitadamente a 50% – o TJRS mostra-se intransigente, confor-me se evidencia do julgamento da Apelação Cível nº 70059949354, ocorrido em 16.12.2015 e de relatoria da Magistrada Maria Claudia Cachapuz, em cuja ementa assim constou: “[...] abusividade das cláusulas que estabelecem copar-

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ticipação do beneficiário para o período excedente aos 30 dias de internação em hospital psiquiátrico [...]”.

Comparativamente, por outro lado, ao se analisar a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), o que se verifica é que o en-tendimento é menos radical. O Judiciário paulista, em linhas gerais, tampouco desconhece a importância operacional desempenhada pelas coparticipações. Nesse sentido, ilustra o seguinte trecho da fundamentação exarada pelo De-sembargador João Francisco Moreira Viegas, no julgamento do Agravo de Ins-trumento nº 2128573-03.2015.8.26.0000, ocorrido em 26.08.2015:

Há mecanismos variados de preservação do equilíbrio do contrato, assegurando ao cliente a cobertura ampla de moléstias, mas resguardando a operadora ou seguradora de surpresas ou custos excessivos que quebrem o cálculo atuarial. Um deles, usado em certas modalidades de contratos, é a contribuição parcial e limitada do consumidor para o custeio de certos serviços, mediante franquia ou coparticipação paga de modo proporcional aos custos totais. Claro que tais cláusulas devem ser destacadas, ostensivas e redigidas de modo absolutamente claro, em atenção ao princípio da transparência da oferta [...].

Nessa esteira, o TJSP, ao contrário do que se constata do Judiciário gaú-cho, mostra-se muito menos severo na avaliação da licitude das coparticipa-ções e, na maioria das vezes, ratifica estas rubricas. Para tanto, subsidia-se, essencialmente, do permissivo legal (art. 16, inciso VIII, da LPS), bem como da previsão contratual no caso concreto. Trilhando este caminho, ilustram os seguintes arestos:

Plano de saúde. Cláusula de coparticipação. Autorização expressa do art. 16, VIII, da Lei nº 9.686/1998. Cláusula redigida de forma clara, conforme preceitua o CDC. Inexistência de abusividade. Ré que agiu no exercício regular de direito ao cobrar a coparticipação após o nono dia de internação. Improcedência acer-tada. Recurso improvido. (4ª Câmara de Direito Privado, Comarca de Ibitinga, Rel. Maia da Cunha, J. 10.03.2016).

Plano de saúde. Abusividade de coparticipação. Regime autorizado (art. 16 in-ciso VIII da Lei nº 9.656/1998). Percentuais de coparticipação previstos contra-tualmente (12% para internações e 50% para atendimentos ambulatoriais) não impõem que usuários arquem com “financiamento integral do procedimento” nem restringem severamente acesso aos serviços (art. 2º inciso VII Resolução Consu nº 8/1998). Coparticipação, ademais, limitada a 25% do salário. Opera-dora demonstrou que, concretamente, coparticipação ficou mais próxima dos 20% das despesas. Regime no caso concreto não se demonstra abusivo. Recur-so improvido. (7ª Câmara de Direito Privado, Comarca de São Paulo, Rel. Luiz Antonio Costa, J. 21.07.2015)

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PLANO DE SAÚDE – FATOR MODERADOR – Co-participação que consiste na obrigatoriedade de o consumidor, além da contraprestação mensal, ao paga-mento de um percentual sobre as despesas com assistência médica, hospitalar e odontológica, abrangidas pelo plano de saúde, que tem previsão no art. 16, inciso VIII, da Lei nº 9.656/1998. Legalidade desde que contratado com regras claras, e não seja abusivo o percentual [...]. (1ª Câmara de Direito Privado, Co-marca de Bauru, Rel. Alcides Leopoldo e Silva Júnior, J. 12.05.2015).30

PLANO DE SAÚDE – Negativa de autorização para cirurgia bariátrica. Abusi-vidade. Cumprimento de todas as diretrizes de utilização. Cobertura obrigató-ria. Possibilidade, contudo, de cobrança da co-participação, pois admitida pelo ordenamento jurídico e expressamente prevista no contrato. Razoabilidade do valor exigido reconhecida [...]. (10ª Câmara de Direito Privado, Comarca de Campinas, Rel. Elcio Trujillo, J. 23.09.2014)

Ou seja, não se presencia, no âmbito do TJSP, a severidade quanto às previsões em forma de percentual, tão rechaçadas pelo Pretório gaúcho. Em re-sumo, pode-se afirmar que o Judiciário paulista confere maior prestígio e respei-to às previsões contratuais e às normas específicas aplicáveis à matéria, sendo raras as decisões que nulificam esta cobrança.

Curiosamente, o que chama atenção, quando consultada a jurisprudên-cia paulista, é que a grande maioria dos litígios que suscita esta discussão volta--se, especificamente, à cobrança de coparticipação – e à avaliação quanto à legalidade desta – quando da internação psiquiátrica do beneficiário do plano de saúde. E há decisões em ambos os sentidos, tanto ratificando a cobrança quanto a reputando inválida, o que serve para atestar a polêmica que envolve o assunto. Nesse sentido, exemplificam os seguintes precedentes:

PLANO DE SAÚDE – DETERMINAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO E CUSTEIO INTE-GRAL DAS DESPESAS DE INTERNAÇÃO EM CLÍNICA PSIQUIÁTRICA – INAD-MISSIBILIDADE – CASO EM QUE EXISTENTE CLÁUSULA EXPRESSA DE CO-PARTICIPAÇÃO A PARTIR DO 31º DIA DE INTERNAÇÃO – CASO QUE NÃO SE CONFUNDE COM LIMITAÇÃO TEMPORAL DA COBERTURA – OBRIGA-ÇÃO, POIS, QUE DEVE SE LIMITAR AO PAGAMENTO DO PERCENTUAL PRE-VISTO EM CONTRATO. INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE. DECISÃO AFAS-TADA. RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO. (6ª Câmara de Direito Privado, Comarca de São Paulo, Rel. Vito Guglielmi, J. 03.03.2016)

PLANO DE SAÚDE – CUSTEIO DAS DESPESAS COM TRATAMENTO E INTER-NAÇÃO EM CLÍNICA ESPECIALIZADA PARA TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO – COBERTURA INTEGRAL POR TRINTA DIAS COM REGIME DE COPARTI-

30 É digno de reprodução, ainda, também relativamente a este precedente, o seguinte trecho da fundamentação utilizada no voto do Desembargador Relator: “[...] Ainda que seja legal e de boa-fé a previsão do fator moderador, desde que contratado com regras claras, e não seja abusivo o percentual de 30% [...]”.

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CIPAÇÃO NOS DIAS SUBSEQUENTES – PREVISÃO CONTRATUAL – ABUSI-VIDADE – IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DE COBERTURA QUE COM-PROMETA O PRÓPRIO OBJETO DO CONTRATO – SÚMULAS NºS 92 DESTE TRIBUNAL E 302 DO STJ [...]. (9ª Câmara de Direito Privado, Comarca de São Paulo, Relª Lucila Toledo, J. 01.03.2016)

Em outras palavras, a cobrança de coparticipação, no contexto dos pla-nos de saúde, é controvertida. Embora a legislação, como regra geral, a permita, a rubrica é bastante judicializada, por iniciativa de beneficiários que, com ela, não concordam. E, quando alçada ao crivo do Poder Judiciário, o panorama verificado, para além de esclarecer a questão, confirma a polêmica que envolve o tema.

5 as reCentes “soluções” do superIor trIBunal de JustIça

A partir da expressiva divergência noticiada supra, a discussão sobre a licitude e validade das cobranças de coparticipações em contratos de planos de saúde chegou às portas do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Considerada a natureza do tema (eminentemente contratual), impende destacar não serem numerosas as decisões proclamadas pela mencionada Corte que, efetivamente, adentram no mérito desta questão, face ao impedimento decorrente da Súmula nº 531 daquele Tribunal.

Entre as que adentram no mérito desta questão, destaca-se a recente de-cisão do Recurso Especial nº 1.511.640/DF32 (de junho de 2015), proclamada pela 3ª Turma do STJ, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, verda-deiro leading case para esta matéria, na qual foram consagradas as seguintes conclusões:

a) a legislação especial admite a configuração de planos de saúde com cláusu-la de copartipação, inclusive para todos os procedimentos utilizados (art. 16, VIII, da Lei nº 9.656/1998), desde que contratados de forma clara e expressa;

31 Súmula nº 5 do STJ: “A simples interpretação de clausula contratual não enseja recurso especial”.32 Segue a ementa do leading case: “RECURSO ESPECIAL – PLANO DE SAÚDE – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO

JURISDICIONAL – NÃO OCORRÊNCIA – INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – SISTEMA DE COPARTICIPAÇÃO – PREVISÃO CONTRATUAL CLARA E EXPRESSA – ABUSIVIDADE – INEXISTÊNCIA – 1. Demanda em que se pretende o reconhecimento de abusividade de cláusula contratual que estabelece a coparticipação do consumidor após o trigésimo dia de internação. 2. O Tribunal de origem, ao decidir a questão devolvida, declinou de forma expressa todos os fundamentos que lhe serviram de razão de decidir, não havendo omissão nos termos do art. 535 do CPC. 3. A legislação especial admite a configuração de planos de saúde com cláusula de copartipação, inclusive para todos os procedimentos utilizados (art. 16, VIII, do CDC), desde que contratados de forma clara e expressa. 4. A imposição de interpretação mais favorável ao consumidor, bem como o sistema de proteção contra abusividade não correspondem à proibição genérica de limitações dos direitos contratados. 5. Atendido o direito de informação, mediante a redação de forma clara e expressa da cláusula limitativa, bem como mantido o equilíbrio das prestações e contraprestações, não há que se cogitar de abusividade. 6. A redução dos custos assumidos pelas operadoras de plano de saúde, por meio da formatação de diversos contratos disponibilizados no mercado, resultam em contraprestações igualmente inferiores, devendo prevalecer a autonomia da vontade, mantendo-se o sinalagma contratual e protegendo-se as legítimas expectativas de ambos os contratantes. 7. Recurso especial provido”.

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b) a imposição de interpretação mais favorável ao consumidor, bem como o sis-tema de proteção contra abusividade não correspondem à proibição genérica de limitações dos direitos contratados;

c) atendido o direito de informação, mediante a redação de forma clara e ex-pressa da cláusula limitativa, bem como mantido o equilíbrio das prestações e contraprestações, não há que se cogitar de abusividade; e

d) a redução dos custos assumidos pelas operadoras de plano de saúde, por meio da formatação de diversos contratos disponibilizados no mercado, re-sultam em contraprestações igualmente inferiores, devendo prevalecer a au-tonomia da vontade, mantendo-se o sinalagma contratual e protegendo-se as legítimas expectativas de ambos os contratantes.

O eminente Ministro Relator do dito precedente, de maneira louvável, registrou que, com o intuito de “viabilizar o equilíbrio sinalagmático intrínseco aos contratos de planos de saúde [...]”, o legislador autorizou “desde que cla-ramente contratada, a possibilidade de formatação de alternativas contratuais, nas quais o consumidor assume o pagamento de coparticipação em despesas médicas, hospitalares e odontológicas”. E complementou, reconhecendo que “essa absorção de parcela dos custos de utilização da rede conveniada pelo plano de saúde tem reflexo direto no valor da contraprestação” e garante o “sinalagma contratual”.

Com base neste raciocínio, o Relator consignou não enxergar “qualquer abusividade em cláusula expressa e de interpretação indiscutível pela qual se imponha a coparticipação em situações específicas [...]”. Lembrou, ainda, que o mercado oferece outras opções (de planos de saúde), cada qual com cus-tos diversos. Se o contratante optou por aderir a um plano que contemplava a coparticipação em determinada situação, deve-se presumir que a sua escolha decorreu de uma análise de custo e benefício e que estava disposto a suportá-la.

Destacou, por fim, que, nos termos dos arts. 47 e 51 do CDC, a op-ção legislativa pela interpretação favorável ao consumidor “não corresponde à conclusão de que todas as cláusulas contratuais devem ser-lhe favoráveis, mas que deverão ser extirpadas apenas aquelas aptas a desequilibrar o sinalagma contratual ou a desbordar os limites da razoabilidade”, pelo que concluiu que, “redigida a cláusula de forma clara e expressa e em consonância com a legisla-ção específica, que admite de forma ampla a coparticipação do consumidor em planos de saúde, não há que se cogitar de abusividade”.

É digno de nota que o entendimento adotado, no mencionado prece-dente, foi acompanhado à unanimidade pelos demais Ministros, tendo sido ra-tificado até mesmo pelo voto-vista do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, de acordo com o qual o enunciado normativo do inciso VIII do art. 16 da LPS “deixa clara a legalidade da cláusula contratual em questão”. O referido Minis-

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tro concluiu que a cobrança de coparticipação tampouco afronta o art. 51 do CDC, posto “estar respaldada em texto expresso de lei especial superveniente ao Código de Defesa do Consumidor”.

Desde então, o mencionado precedente foi ratificado em outros julgados, entre os quais se destacam o Recurso Especial nº 1.563.153/RS33 (J. 18.02.2016) e o Recurso Especial nº 1.415.804/SP34 (J. 17.03.2016), ambos monocratica-mente plasmados pelo em. Ministro Moura Ribeiro e que culminaram com a validação de cobrança de coparticipação, com base na mesma fundamentação invocada no leading case comentado supra.

Da leitura dos arestos comentados supra, vale notar que nenhum analisa, topicamente, a previsão de coparticipação na forma de percentual. Daí porque dos dois precedentes monocráticos supracitados35 é o primeiro, oriundo do Rio Grande do Sul, que merece especial atenção. O mencionado recurso especial foi interposto pela operadora de plano de saúde e com fundamento na violação do art. 16, inciso VIII, da LPS. Na origem, o TJRS havia considerado que a co-brança de coparticipação, em determinada situação, era ilícita, precisamente, pois havia sido cobrada na forma de percentual. A insurgência da operadora foi provida e, embora o STJ não tenha se manifestado, expressamente, sobre a forma de percentual, pode-se afirmar, face ao resultado final, que este modelo de cobrança foi, ainda que indiretamente, respaldado pela Corte Superior.

Por fim, o mesmo Ministro Marco Aurélio Bellizze, do leading case co-mentado supra, também em recente julgamento (Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 796.567/SP, J. 01.02.201636), reiterou o entendimento adotado pela 3ª Turma, destacando, desta feita, que, diante da existência de outras opções disponíveis no mercado para a contratação de plano de saúde, com custos igualmente diversos, certamente a opção eleita pelo consumidor,

33 Segue a ementa do precedente: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – PLANO DE SAÚDE – SISTEMA DE COPARTICIPAÇÃO – PREVISÃO CONTRATUAL CLARA E EXPRESSA – ABUSIVIDADE – INOCORRÊNCIA – PRECEDENTES – APELO RARO PROVIDO”.

34 Segue a respectiva ementa: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – PLANO DE SAÚDE – SISTEMA DE COPARTICIPAÇÃO – PREVISÃO CONTRATUAL CLARA E EXPRESSA – ABUSIVIDADE – INOCORRÊNCIA – PRECEDENTE – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 83 DO STJ – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA Nº 282 DO STF – RECURSO A QUE SE NEGA CONHECIMENTO”.

35 Vale esclarecer que os mencionados recursos especiais chagaram ao Superior Tribunal de Justiça por fundamentos distintos. O REsp 1.563.153/RS, em primeiro lugar, foi interposto pela operadora de plano de saúde, com fundamento na violação, por parte do TJRS, do art. 16, inciso VIII, do LPS, e que foi monocraticamente provido. Já o segundo, o REsp 1.415.804/SP, foi manejado por consumidor, o qual alegava violação a diversos dispositivos do CDC, além de existência divergência jurisprudencial, e que foi monocraticamente rechaçado, com a manutenção da decisão do TJSP, que validara a coparticipação prevista no percentual de 40%.

36 Segue a ementa deste precedente: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – PLANO DE SAÚDE – CLÁUSULA LIMITATIVA DO TEMPO DE INTERNAÇÃO PARA TRATAMENTO DE TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS – COPARTICIPAÇÃO – PREVISÃO CONTRATUAL CLARA E EXPRESSA – LEGALIDADE – DECISÃO RECONSIDERADA – AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL”.

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de contratar plano que contemplava a coparticipação, “foi a que lhe pareceu mais interessante ou aquela que estava disposto a suportar. Desse modo, em gozo de sua autonomia contratual, vinculou-se ao contrato com cláusula clara e expressa, ainda que limitativa de seus direitos”.

ConsIderações fInaIs

Os contratos de planos de saúde, enquanto inequívocos pactos de na-tureza securitária, pressupõem a utilização de mecanismos e ferramentas que são vitais às suas operações, sob pena de se revelarem economicamente insus-tentáveis e de as operadoras serem conduzidas à ruína. O mercado de saúde suplementar, ajustado a esta realidade, está intimamente vinculado a estas fer-ramentas, em especial aos mecanismos de regulação, que visam, em resumo, a controlar a utilização das coberturas contratadas.

Entre estes mecanismos de regulação ganham especial destaque as co-participações, responsáveis, na prática, por exigirem, do beneficiário do plano de saúde, o custeio de parcela da despesa de determinado atendimento médico contratualmente garantido. Tratam-se, pois, as coparticipações, de cobranças expressamente previstas e contempladas pela Lei Federal nº 9.656/1998, bem como por inúmeras normas exaradas pela ANS, agência reguladora responsável por este setor.

Conforme comentado, contudo, embora a sua importância seja indiscutí-vel à saúde das operadoras (e dos sistemas securitários), as cobranças de copar-ticipações são extremamente questionadas. Ainda que decorram de expressas previsões normativas e que estejam expressamente previstas no contrato, os beneficiários dos planos de saúde, quando se deparam com a materialização destas rubricas, frequentemente discordam da cobrança e, não raro, levam a controvérsia ao crivo do Poder Judiciário.

Dos Tribunais analisados – o TJRS, o TJSP e o STJ –, a primeira conclu-são a que se chega é a de que as coparticipações, no âmbito dos planos de saúde, são efetivamente controvertidas. As Cortes pesquisadas não apresentam entendimentos uniformes. Pelo contrário, as decisões tendem a trilhar caminhos diametralmente contrários: enquanto o TJRS inclina-se pela invalidação destas cobranças em face da sua cobrança na forma de percentual, o TJSP majoritaria-mente inclina-se pela validação desta rubrica.

A matéria, pela sua natureza contratual, não é de fácil recepção pelo STJ. Ainda assim, encontram-se precedentes daquela Corte que analisaram, topica-mente, esta cobrança e que merecem menção. Dos julgados examinados, é de inestimável importância o Recurso Especial nº 1.511.640/DF da 3ª Turma, que concluiu pela validade da cláusula que prevê a cobrança de coparticipação, desde que estabelecida em disposição clara e expressa.

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Sopesadas as decisões e o conjunto normativo comentado supra, pode--se afirmar, com segurança, que a coparticipação, no plano de saúde, é válida, desde que: esteja prevista na minuta; que a redação da cláusula seja clara e com grafia suficientemente destacada; que o consumidor tenha, dela, ciência prévia; e que a cobrança final, seja em valor pré-fixado ou seja em percentual, não represente custo excessivamente oneroso ao consumidor. Atendidas estas características, e desde que não sejam contrariadas as particularidades previstas pelas normas da agência reguladora, a cobrança de coparticipação é válida, inclusive à luz do CDC, e merece ser ratificada se questionada judicialmente.

referÊnCIas

BOTTESINI, Maury Ângelo; MACHADO, Mauro Conti. Lei dos planos e seguros de saúde: comentada e anotada artigo por artigo, doutrina, jurisprudência. São Paulo: RT, 2003.

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FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Curso de direito de saúde suplementar: manual jurídico de planos e seguros de saúde. São Paulo: MP, 2006.

MENDONÇA, Antonio Penteado. Temas de seguro. 2. ed. São Paulo: Roncarati, 2010.

MIRAGEM, Bruno. O direito dos seguros no sistema jurídico brasileiro: uma introdu-ção. In: MIRAGEM, Bruno; CARLINI, Angélica (Org.). Direito dos seguros: fundamentos de direito civil, direito empresarial e direito do consumidor. São Paulo: RT, 2014. p. 25/64.

SILVA, José Luiz Toro da. Manual de direito da saúde suplementar: a iniciativa privada e os planos de saúde. São Paulo: M. A. Pontes Editora, 2005.

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Parte Geral – Doutrina

O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema Jurídico

mARCIO evAngeLISTA FeRReIRA DA SILvADoutorando em Direito e Políticas Públicas – UniCeub, Mestre em Direito e Políticas Públicas – UniCeub, Especialista em Direito – UCM, Professor Universitário – IESB, Juiz de Direito – TJDFT.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A evolução do Direito; 2 A interpretação como forma de evolução do Direito; 3 O efeito vinculante como evolução do Direito; 4 O novo Código de Processo Civil como expressão da evolução do Direito; Considerações finais; Referências.

Introdução

O presente artigo analisa a evolução do sistema processual civil brasilei-ro diante do advento da Lei nº 13.015, de 16 de março de 2015 – o novo Códi-go de Processo Civil. Pretende-se demonstrar se da atual forma de legislar pode se inferir ou não uma evolução tendente a alterar o sistema do civil law. Com o mesmo intuito demonstrativo, o estudo compreende a análise da interpretação dos enunciados normativos como forma de evolução do Direito.

O tema, portanto, fecha-se na hipótese de os Poderes Legislativo e Judi-ciário estarem se afastando do sistema civil law diante da influência do com-mon law. O problema é se os Poderes Legislativo e Judiciário, estabelecendo o precedente jurisprudencial (súmula, tese jurídica) como fonte do Direito, com suporte em eventual influência do common law, podem estar afrontando o sis-tema civil law e criando um novo sistema jurídico híbrido.

As hipóteses iniciais propostas para a pesquisa foram no sentido de que: i) os Poderes Legislativo e Judiciário recebem influência do entorno – com-preendido como irritações provocadas pelo sistema norte-americano – e, assim, como integrantes de um sistema autopoiético, internalizaram regras (de legislar e de julgar) do common law no sistema brasileiro, afastando-se do civil law; ii) os Poderes Legislativo e Judiciário, como integrantes de um sistema autopoi-ético, recebem influência do entorno (common law), no entanto, permanecem na esteira do sistema civil law, porquanto a criação de mecanismos de vincu-lação aos precedentes (respeito ao entendimento das Cortes Superiores) não descaracterizam o sistema.

A metodologia é parte importante para o estudo, que será científico quando apresentar um “círculo racional lógico”. O método adequado apre-senta uma “sequência lógica de observação, análise, formulação de hipóteses,

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experimentação, verificação das hipóteses e formação de conclusões”. Segundo a classificação das ciências, vários são os métodos utilizados para tratar o es-tudo, mas deve-se observar a natureza do objeto da área do saber. O Direito, compreendido como ciência social, adota um conjunto de métodos, “dentre os quais destacam-se o método de abordagem e os métodos de procedimento” (Figueiredo; Souza, 2008, p. 91-92).

No presente estudo, o método de abordagem adotado foi o dedutivo e foram analisadas as teorias sobre a evolução dos sistemas jurídicos. Entre outras, foram consideradas as teorias de René David e Niklas Luhmann.

Em uma análise inicial, a pesquisa sugere que o Poder Legislativo, ao criar mecanismos de vinculação de posicionamento jurídico pelos precedentes jurisprudenciais, com suporte em eventual influência do common law, poderia estar afrontando o sistema civil law.

Ainda na análise inicial, outra sugestão encontrada foi a de que o Poder Judiciário, ao fundamentar as decisões em precedentes jurisprudenciais, bem como ao estabelecer teses jurídicas e súmulas com efeitos vinculantes, funda-do nos precedentes jurisprudenciais e com suporte em eventual influência do common law, poderia estar afrontando o sistema civil law.

No primeiro capítulo foi analisada, ainda que superficialmente, a teoria de Niklas Luhman. Verificou-se que no Direito há a necessidade de evolução para o acoplamento entre o antigo e o novo devido às variações do próprio Direito.

Na sequência foi visto que a evolução do Direito também ocorre pela interpretação que é uma constante devido às transformações fático-axiológicas, pois um texto escrito há cem anos, ao ser interpretado nos atuais dias, terá sen-tido, alcance e extensão diverso da época de sua publicação.

Em seguida, constatou-se que a evolução ocorre no momento em que se ventila a possibilidade de a legislação ceder aos novos entendimentos vincu-lantes externados nas decisões das Cortes, gerando um direito diferenciado e construído por decisões.

Ainda no desenvolvimento do presente artigo, no quarto capítulo foi ana-lisado o novo Código de Processo Civil. Constatou-se que a novel legislação trouxe vários dispositivos com nítida influência do common law, pois conferiu força normativa à tese jurídica (entre outros instrumentos), notando verdadeira evolução do Direito.

Nas considerações finais, ficou assentando que, sob a ótica da autopoie-se, em sendo o Direito dinâmico, sempre ocorrerá a evolução devido à necessi-dade de reduzir a complexidade das possibilidades do ser no mundo.

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Ao final, apresentou-se resposta ao problema inicial de que a atuação presente dos Poderes Legislativo e Judiciário sugere uma evolução constante do Direito e se estamos no caminho de uma alteração do sistema jurídico brasileiro pela influência do common law.

1 a eVolução do dIreIto

Niklas Luhmann afirma que os conceitos sobre a evolução do Direito são pouco nítidos e sem nenhuma precisão teórica e que “a evolução só se leva a cabo se tanto a diferença quanto a adaptação entre sistema e entorno se mantém, pois ‘do contrário desapareceria o objeto da evolução’” (Luhmann, p. 171-172).

Note-se que ao abordar o tema evolução do Direito, é necessário consi-derar a influência dos movimentos sociais, mormente pelo fato de que os Tri-bunais estão vinculados aos textos legislativos (Campilongo, 2012, p. 34-35).

Campilongo assevera que

a aposta dos movimentos sociais no direito – e, portanto, confiança na força do direito – pode aflorar de três modos: “contra”, “pelo”, e “após” o direito. [...] No fundo, identifica-se um obstáculo construído pelo direito e procura-se removê-lo também através do direto. [...] desse modo, ainda que de maneira não prevista ou indesejada, contribuem para o aguçamento da autorreflexão do direito, para expansão de sua capacidade de auto-observação e autocorreção de suas operações e, por fim, introdução de variabilidade no sistema jurídico. (Campilongo, 2012, p. 34-35)

A análise da evolução do Direito sob o enfoque da autopoiese e da he-teropoiese cinge-se, principalmente, à irritação que o entorno causa no sistema jurídico. Segundo Luhmann, “[...] a expectativa normativa se equilibra mediante a forma escrita, trazendo a estabilidade”. No entanto, há uma necessidade de acoplamento “entre o agora e o depois”, eis que “o texto está sujeito a con-tínuas re-observações mediante novas distinções”, sendo tarefa do intérprete, pois “todo direito assegurado mediante escritos é um direito que pode ser inter-pretado” (p. 182-183).

Citado autor afirma, quanto à evolução autopoiética, que “la evolucion se efectúa cuando se cumplen diferentes condiciones y cuando éstas se acoplan entre sí de manera condicional (= necessária)”, quais sejam: variação, seleção e estabilização do sistema (Luhmann, p. 173).

E prossegue: “A autopoiése é conditio sine qua non de toda evolução, pois pode-se alcançá-la através da alteração das estruturas”. Note-se que a evo-lução, como visto antes, depende do acoplamento estrutural, “pois a evolu-ção se efetua quando se completam diferentes condições e quando estas se

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acoplam entre si de maneira condicional de variação, seleção e estabilização” (Luhmann, p. 173).

É importante asseverar que há inúmeros fatores que influenciam os siste-mas, uma vez que “uma sociedade complexa só pode ser descrita por meio de uma teoria complexa e não há outro meio de alcançar um juízo sobre o direito da sociedade” (Luhmann, p. 79).

Conforme Bruno Amaral Machado1, “nas sociedades contemporâneas, diferenciadas funcionalmente, a economia, a religião, a arte, a moral, a ciência, a política e o direito constituem sistemas autopoiéticos, cognitivamente abertos e operativamente fechados, os quais se autodescrevem e se autorreproduzem a partir de códigos e programas próprios”.

Gunther Teubner, ao abordar o tema, narra que o Direito está em con-tato diuturno com crises políticas, movimentos sociais e variações do próprio Direito – fatores que são essenciais para a evolução. Destarte, a transformação decorre da comunicação interna do sistema jurídico (1989, p. 43).

Portanto, o Direito, nos termos de Robert Van Krieken2, “como qualquer outro sistema, tem de coordenar-se com outros sistemas e com o seu ambiente e Luhmann sugere que essa relação produz um requisito correspondente para capacidade de resposta conceitual, somando-se o encerramento normativo do direito de uma segunda dimensão ou aspecto de ‘abertura cognitiva’”.

A par disso, a evolução do Direito – enquanto subsistema – ocorre devido ao distanciamento da legislação frente às situações reais. Com efeito, “o siste-ma do Direito é operativamente fechado e cognitivamente aberto ao mesmo tempo”, ou seja, fechado na programação do legislador, mas aberto enquanto programa finalístico (Rocha, 2013, p. 43).

Conclui-se que o subsistema do Direito é ligado ao passado (legislação) e ao futuro (fatos reais) ao mesmo tempo, nascendo daí a necessidade de evo-lução, pois há irritação que gera desconforto – desencadeando o acoplamento que redunda na evolução do Direito.

2 a Interpretação Como forma de eVolução do dIreIto

No sistema do civil law, o direito positivo estabelecido no enunciado normativo não encerra os problemas da sociedade, tendo em vista que as dispu-tas diuturnas, na maioria das vezes, resolvem-se com a aplicação da norma ao caso concreto, sendo que tal aplicação é levada ao Poder Judiciário, surgindo

1 Discursos criminológicos sobre o crime e o direito penal: comunicação e diferenciação funcional. Disponível em: <https://uniceub.br/media/180340/Artigo_DiscursosCriminologicos.pdf>.

2 Law’s autonomy in action: anthropology and history in court, University of Sydney, Australia. Disponível em: <http://sls.sagepub.com/content/15/4/574>.

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o problema da aplicação do enunciado normativo abstrato ao problema real, sendo que cada litigante apresenta a sua forma de ver o enunciado normativo, apontando que norma seja aplicada (Coelho, 2001, p. 47-51).

O problema também ocorre, na maioria das vezes, quando não há uma correspondência métrica entre o que foi previsto pelo legislador e o caso do mundo, a distância entre a generalidade do enunciado normativo e a singula-ridade do caso concreto, ou seja, “a antinomia entre o abstrato e o concreto” (Coelho, 2001, p. 47-51).

Interpretar o enunciado normativo é tarefa necessária, pois a antiga máxi-ma in claris cessat interpretatio não se sustenta, tudo se interpreta (Maximiliano, 2000, p. 9). Com efeito, sempre há margem de interpretação, o enunciado nor-mativo deve ser sempre avaliado quanto à vontade e a intenção da lei, pois, como disse Ulpiano, “embora claríssimo o edito do pretor, contudo não se deve descurar da interpretação respectiva” (apud Maximiliano, 2000, p. 33).

Uma lei para obrigar “de maneira realmente efetiva” deve ser breve e clara, ou seja, acessível a todos” (Villey, 2009, p. 742). Nítido, então, que a lei deve conter expressões de fácil compreensão, bem como deve o enunciado normativo ser taxativo, certo e sem obscuridade. No entanto, convém salientar que o problema da interpretação não se cinge às leis, mas a todos os enunciados normativos, inclusive constitucionais. Com efeito, os enunciados constitucio-nais não contêm termos unívocos, ou seja, contêm palavras (símbolos linguísti-cos) que podem ter vários sentidos (Alves Junior, 2010, p. 76).

Alf Ross relata que todo enunciado normativo, seja claro ou vago, depen-de de uma interpretação, pois “nenhuma situação concreta enseja uma aplica-ção única da lei”, sendo “errôneo, também, portanto, crer que um texto pode ser tão claro a ponto de ser impossível que suscite dúvidas quanto a sua inter-pretação” (2007, p. 164-165 e 330).

Com efeito, um texto escrito há cem anos, ao ser interpretado nos dias atuais, sem dúvidas terá sentido, alcance e extensão diversos do preconizado à época de sua edição, pois há evolução social. Assim, a hermenêutica apre-senta processos que aproximam o texto normativo à realidade atual e, por isso, sempre há interpretação, não há enunciado normativo que não necessite de interpretação, pois o aplicador parte da abstração e encerra a realidade.

Quando o intérprete busca adequar o enunciado normativo aos tempos atuais, quando busca “o significado jurídico da lei, que só pode ser o seu signi-ficado atual, e não o significado histórico, aquele que lhe foi atribuído ao tempo da promulgação”, estará no caminho da interpretação progressiva/evolutiva. O intérprete, ao buscar o significado atual do enunciado normativo, expande o sentido e o alcance do aludido preceito, “incorporando novos instrumentos de analise e descortina novos horizontes” (Coelho, 2011, p. 71).

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Ao interpretar-se progressivamente, quer-se dizer que o enunciado nor-mativo terá aplicação a “situações que contempladas à luz do sentido linguísti-co natural se encontram claramente fora de seu campo de referência”. Assim se procede, estender o sentido do enunciado normativo, pelo fato de que houve uma “formulação parcial, uma revelação incompleta”, sob o argumento de que essa era a vontade do legislador, presumindo-se tal desiderato, mas “é forçoso ter ele desejado o que é desejável para o próprio juiz” (Ross, 2007, p. 179-183).

Assim, a interpretação progressiva/evolutiva atende aos progressos so-ciais, já que “a atividade interpretativa pode ser considerada um prolongamento ou até mesmo uma fase do processo legislativo”. E mais, ao longo dos séculos juristas apresentam renovadas interpretações sobre textos antigos, como, por exemplo, a Lei das XII Tábuas e a Constituição dos Estados Unidos da Amé-rica. Conclui-se, então, que as novas interpretações nada mais são do que a apresentação de elementos que originariamente já eram integrantes dos textos interpretados (Coelho, 2011, p. 41 e 71).

Segundo Inocêncio Mártires Coelho, apoiado em Radbruch, a “interpre-tação jurídica não é pura e simplesmente um pensar novo aquilo que já foi pen-sado, mas, pelo contrário, um saber pensar até o fim aquilo que já começou a ser pensado por um outro”. A interpretação do enunciado normativo de acordo com as transformações sociais são “fatores de atualização e regeneração da sua força normativa” (2011, p. 49-50, 61-62 e 70-71).

Conclui-se que o direito positivo deve evoluir pelo fato de não resolver os problemas da sociedade, e mais: não há um texto que seja tão claro que não demande interpretação evolutiva para resolver o caso concreto. Foi dito que ao texto normativo escrito há muitos anos deve ser conferido novo sentido, alcan-ce e extensão, aproximando o texto à realidade, ou seja, evoluindo diante das novas facetas da sociedade.

3 o efeIto VInCulante Como eVolução do dIreIto

O Direito e a Política permeiam a sociedade e, assim, um influencia o outro, e vice-versa, fazendo com que haja uma “autocriação histórica de uma sociedade”. O direito moderno enfrenta a complexidade das relações diuturnas e, assim, apresenta “decisões sempre diferentes”. Neste sentido, Leonel Severo Rocha afirma que “o direito moderno, ao contrário [do jusnaturalismo], para sobreviver na sociedade indeterminada, será um Direito positivo; um Direito diferenciado e construído por decisões” (p. 11-13).

Partindo de tal premissa – direito construído por decisões – é que cons-tatamos uma evolução do direito processual civil brasileiro. Com efeito, co-mumente se afirma que no Brasil o sistema jurídico é fundado no civil law. No entanto, diante das novas legislações brasileiras (a exemplo do novo Código

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de Processo Civil), constata-se uma mistura de sistemas, a saber: civil law e common law.

Antes de prosseguirmos no desenvolvimento do raciocínio sobre a evolu-ção do Direito brasileiro pela vinculação do precedente, fundamental é analisar como sãos os sistemas do Direito e as suas diferenciações em famílias (David, 2002, p. 24-25).

Sucintamente, o civil law é um sistema romano-germânico no qual o fato marcante é a compilação e a codificação em “textos harmônicos, normas costumeiras, normas escritas esparsas, decisões jurisprudenciais e doutrinárias [...]” (Soares, 2000, p. 27).

Com efeito, a partir do século XIX atribuiu-se em tal sistema papel impor-tante à lei e, assim, “os diversos países pertencentes a esta família dotaram-se de ‘códigos’” (David, 2002, p. 24-25).

O sistema do common law pertence à segunda família, “comportando o Direito da Inglaterra e os direitos que se modelaram sobre o Direito inglês”. Cabe asseverar que, ao contrário do civil law, no common law as regras exis-tem para resolver o processo, e não para serem abstratas e para o futuro (David, 2002, p. 24-25).

No Direito norte-americano, Guido Fernando Silva Soares levanta a ques-tão da existência de mais de um sentido do termo common law. Com efeito, o autor apresenta, em linhas gerais, dois sentidos. O primeiro como sendo “um sistema de direito escrito e esquematizado”, apontando a distinção entre common law e equity law. O segundo “permite aos Tribunais, na sua tarefa de distribuir justiça, definir regras abstratas do Direito”, apresentando a distinção entre common law e statute law (Soares, 2000, p. 14-15).

Pois bem, fica nítido que no Brasil o sistema adotado é o do civil law; no entanto, há vários institutos que se amoldam às regras do sistema da common law, havendo a convivência dos sistemas, ou, ainda, a existência de um sistema híbrido.

Joseph Raz, mutatis mutandi, relata que é possível a existência e convi-vência de dois sistemas jurídicos em uma sociedade; no entanto, “determinar se dois sistemas jurídicos são compatíveis ou não dependerá antes de tudo das formas de organização social de que eles fazem parte [...]”. Contudo, um siste-ma jurídico só pode existir por tempo determinado, pois “a esfera de existência efetiva de um sistema jurídico é mais estreita que sua esfera de aplicação” (Raz, 2012, p. 276-277).

Prosseguindo na análise da evolução do Direito brasileiro (civil law) pela influência do common law, cumpre asseverar que as fontes dos sistemas em co-mento são diferentes. Com efeito, no civil law “pensa-se na Constituição como

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fonte suprema de qualquer imposição, seguida por leis complementares, ordi-nárias, medidas de urgência, regulamentos, etc.” (Godoy, 2004, p. 93).

Enquanto que no common law há “institutos próprios, centrados na ati-vidade produtora de judiciário de composição, natureza, origem, recrutamento e garantias tão estranhas a protótipos que marcam nossos hábitos conceituais” (Godoy, 2004, p. 93).

Seguindo a abordagem da evolução do Direito, notadamente do sistema, no civil law é permitido ao juiz criar normas para que se alcance resultados sa-tisfatórios. A questão é de autorização ao “órgão aplicador do Direito” de “criar uma nova norma” para evitar resultados injustos ou iníquos (Kelsen, 2005, p. 214).

Kelsen, ao abordar a nova norma criada, diz que o precedente é obrigató-rio, pois trasmuda-se em norma genericamente aplicável a todos os casos seme-lhantes. No entanto, alerta que só é possível assim afirmar “onde os Tribunais estão autorizados não apenas a aplicar Direito substantivo preexistente nas suas decisões judiciais o caráter de precedentes” (Kelsen, 2005, p. 216).

Interessante notar que a teoria da autopoiese pode, no meu sentir, ser en-contrada em Kelsen, ainda que subliminarmente, quando afirma que “o Direito regula a sua própria criação, na medida em que uma norma jurídica determina o modo em que outra norma é criada e também, até certo ponto, o conteúdo dessa norma” (Kelsen, 2005, p. 181).

A calhar, no mesmo sentido, Luhmann afirma que “las ‘teorías del dere-cho’ que surgen em la práctica jurídica o en la docência del derecho son, junto con los textos del derecho vigente, la forma en la que el derecho se presenta como resultado de las interpertaciones” (Luhmann, p. 4).

Note-se que no sistema de legislação “os juízes se sentem obrigados, em alto grau, ante as declarações da legislatura e a doutrina ideológica oficial” a aderirem ao texto legal, mas, sistema de precedentes, “as decisões jurídicas anteriores” desempenham papel importante, eis que há “a exigência de que os casos análogos recebem tratamento similar, ou de que cada decisão concreta seja baseada numa regra geral” (Ross, 2000, p. 110-111).

Prosseguindo, notou-se há algum tempo que no sistema do civil law, mesmo não havendo obrigatoriedade em seguir o precedente de Cortes hierar-quicamente superiores, as Cortes inferiores e os magistrados de primeiro grau, com maior ou menor frequência, seguem os entendimentos das Cortes Supe-riores.

No sentido, confira o excerto que segue:

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Já tive alguma dificuldade em admitir, em casos dessa natureza, também a qua-lificadora que decorre do perigo comum. Mas o Superior Tribunal de Justiça, recentemente – por ocasião das notas taquigráficas, farei juntar o precedente a que me refiro, e um precedente até do nosso Tribunal, da nossa própria Turma –, entendeu por bem acolher o recurso do Ministério Público para incluir na pronúncia também a qualificadora do perigo comum, entendendo que essa ati-tude do réu no trânsito põe em risco a coletividade de pessoas que lá se encon-travam, já que, forçosamente, ele não se teria destinado especificamente apenas àquele conjunto de vítimas, mas, com a conduta que desempenharam, pode-riam ter, pelo menos em tese, se voltado contra mais pedestres e mais motoris-tas que por ali trafegavam ou transitavam. Então, filiando-me ao entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça, mantenho na pronúncia a qualificado-ra do inciso III do art. 121.3

E ainda: “O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.251.331/RS, julgado pelo regime dos recursos repetitivos previstos no art. 543-C do CPC, decidiu acerca da possibilidade de cobrança de tarifa de cadastro, desde que tenha sido contratada expressamente”4.

Assim, verifica-se que há uma força do precedente ainda que não vincu-lante, levando-nos a crer na ocorrência de interpenetração dos sistemas, pois “o magistrado de primeiro grau está afeito à observância do precedente, pois se trata de opção cômoda e coerente” (Dias, 2004, p. 71).

Antes mesmo da publicação do novo Código Civil, o Poder Legislativo havia instituído mecanismos de vinculação dos precedentes, como a Emenda Constitucional nº 45/2004, que instituiu o efeito vinculante das decisões do Su-premo Tribunal Federal nas ações declaratórias de constitucionalidade5.

Outro ponto a ser lembrado é a previsão existente de que o Supremo Tribunal Federal pode editar súmulas vinculantes6 pela Corte já citada. Ainda a título de exemplo, a Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999, que regulamen-tou o julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade, estabeleceu o efeito vinculante das decisões do Supremo Tribunal Federal em sede das referidas ações.

A Lei nº 9.704, de 17 de novembro de 1998, embora de caráter admi-nistrativo, introduziu legalmente a tese jurídica com efeito vinculante, inau-

3 Trecho retirado do voto do Desembargador Edson Alfredo Smaniotto, TJDFT, Acórdão nº 387190, 1ª Turma Criminal, julgado em 17.09.2009. Disponível em: <http://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj>. Acesso em: 20 maio 2015.

4 Trecho do voto do Desembargador Hector Valverde Santanna, TJDFT, Acórdão nº 864585, 6ª Turma Cível, julgado em 29.04.2015. Disponível em: <http://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj>. Acesso em: 20 maio 2015.

5 Art. 102 da Constituição Federal.6 Art. 103 da Constituição Federal.

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gurando a obrigatoriedade ao precedente do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. A Lei nº 13.015, de 21 de julho de 2014, trouxe também a vinculação do precedente, bem como a fixação de tese jurídica com efeito vinculante na seara da justiça trabalhista brasileira.

O novo Código de Processo Civil7 – que será objeto de capítulo especí-fico – dispõe de vários dispositivos8 que estabelecem a vinculação pelos prece-dentes, bem como a tese jurídica firmada pelas Cortes.

Conclui-se, portanto, que o Brasil tem os seus fundamentos no sistema romano-germânico no qual há a compilação e a codificação de textos norma-tivos, mas constata-se também que possui institutos que revelam a incursão em outro sistema, o do common law, pois é permitido aos Tribunais – pela vincula-ção do precedente – impor uma regra abstrata.

4 o noVo CÓdIGo de proCesso CIVIl Como expressão da eVolução do dIreIto

A disciplina do direito processual civil é voltada para a efetividade da tutela jurisdicional com segurança. O antigo Código de Processo Civil (Código Buzaid), de 11 de janeiro de 1973, já vinha sendo modificado paulatinamente9, como, por exemplo, a separação que existia entre o processo de conhecimen-to e o de execução. Pode-se dizer que as reformas que ocorreram no vetusto Código caminharam para imprimir o estímulo das partes na cooperação para a resolução das demandas, bem como para que o juiz fosse mais flexível com as formalidades, prestigiando a justiça do caso concreto (Marinoni; Mitidiero, 2011, p. 95).

Não bastassem as reformas, o Poder Legislativo brasileiro publicou um novo Código de Processo Civil, que, de acordo com a dicção de seu art. 1.045, entrará em vigor após um ano da publicação10.

Depreende-se do art. 1º do novo Código que se trata de uma codificação de normas que disciplinam a tramitação do processo civil brasileiro, estabele-cendo, entre outras prioridades, a inafastabilidade da jurisdição (art. 3º, caput), a solução consensual dos conflitos (art. 3º, § 2º), a boa-fé das partes (art. 5º) e a duração razoável do processo (art. 4º).

Trata-se de um Código extenso, com várias peculiaridades e inovações. No entanto, o que mais chama a atenção é a existência de dispositivos que

7 Promulgado em 16.03.2015.8 Arts. 489, 985, 987, 1.040, entre outros.9 Lei nº 8.952, de 1994, Lei nº 10.444, de 2002, e Lei nº 11.232, de 2005 – são as mais profundas

modificações que podemos apontar.10 Como visto antes, foi publicado em 16 de março de 2015.

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denotam uma possível alteração no sistema jurídico brasileiro – como já adian-tado anteriormente.

O novo Código de Processo Civil trouxe vários dispositivos que reafir-mam a tendência da vinculação de decisões aos magistrados no intuito de ga-rantir celeridade, segurança e isonomia aos litigantes.

Com efeito, o ordenamento jurídico brasileiro, como visto anteriormen-te, tem as suas origens no sistema civil law, ou seja, predomina como fonte primária do Direito a lei – prevalecendo a codificação. No entanto, constata-se na nova legislação processual civil que o legislador privilegiou o respeito ao precedente jurisprudencial – como no common law.

Ora, nota-se do art. 12, § 2º, II, do novo Código a possibilidade de jul-gamento em bloco “para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos”. Conforme Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, tal dispositivo re-vela que o legislador priorizou o julgamento dos casos submetidos ao Poder Judiciário com a aplicação da tese paradigmática (Wambier et al., 2015, p. 89).

Outro dispositivo que amplia a aplicação do efeito vinculante diz respei-to à concessão da tutela de evidência, pois poderá ser deferida, nos termos do art. 311, II, do novo Código, quando “houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante”. Segundo Daniel Mitidiero, a tutela de evidência é fundada em cognição sumária e se baseia na evidência do direito postulado e na “noção de defesa inconsistente”, ou seja, pelo fato de que “a defesa articulada pelo réu é inconsistente ou provavelmente o será” (Wambier et al., 2015, p. 796).

Aludido dispositivo dá cumprimento ao mandamento constitucional da duração razoável ao processo (art. 5º, LXXVIII) também previsto no art. 4º do novo Código. Note-se que a tutela de evidência, corroborando a ideia de se-gurança jurídica e celeridade, revela a preocupação do legislador em conceder antecipadamente o direito do demandante quando fundar-se o pleito em tese jurídica.

Outro dispositivo que revela a preocupação na celeridade da prestação jurisdicional é o disposto no art. 954, parágrafo único, do novo Código, que confere ao Relator a faculdade de julgar de plano os conflitos de competên-cia fundamentando a sua decisão em tese jurídica. No caso, conforme Patrícia Miranda Pizzol, “o Relator age como um juiz preparador, permitindo maior celeridade na prestação jurisdicional, na medida em que evita que um conflito sem chance de prosperar seja processado” (Wambier et al., 2015, p. 2127).

Entre outros dispositivos, o que revela a enorme intenção legislativa de vinculação das decisões é a disposição prevista no art. 927 do novo Código, pois é enfática ao dispor:

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Os juízes e os Tribunais observarão:

I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de cons-titucionalidade;

II – os enunciados de súmula vinculante;

III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria cons-titucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;

V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vincu-lados.

Como visto supra, a título de exemplo, o Livro III, que trata “Dos Proces-sos nos Tribunais e dos Meios de Impugnação das Decisões Judiciais”, estipula em várias passagens que o juiz deve seguir o entendimento esposado pelas Cortes Superiores, pelos enunciados de súmulas e por outras hipóteses de vin-culação.

É sabido que, na decisão em controle concentrado de constitucionali-dade, a súmula vinculante e a resolução de demandas repetitivas já estavam previstas antes mesmo da publicação do Código em comento. No entanto, sur-giu nova vinculação, qual seja: “Os juízes e os Tribunais observarão: [...] V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados”11.

Assim, além das vinculações já existentes no sistema, a Corte local po-derá estabelecer teses jurídicas que terão caráter obrigatório aos magistrados do Tribunal. Nos termos do art. 985, a vinculação ocorrerá na área de jurisdição do Tribunal, inclusive aos juizados especiais. Em várias passagens o legislador afirma que tal tese é vinculativa.

Os efeitos da tese jurídica vinculativa, nos dizeres de Bruno Dantas, fi-cam limitados “à área territorial de jurisdição de cada tribunal. Evidentemente, quando o incidente for julgado pelo STF ou pelo STJ, atingirá todo o território nacional” (Wambier et al., 2015, p. 2195).

O art. 987, § 2º, confirma o escólio supra, já que as decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça que apresentam teses jurídi-cas vinculativas se aplicam a todos os processos – individuais ou coletivos –, em todo território nacional.

No sentido, confira ainda Bruno Dantas:

11 Art. 927, inciso V.

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A tese jurídica fixada por estes tribunais, resultado de incidente, será aplicada no território nacional a todos os processos individuais e coletivos que versarem sobre idêntica questão de direito. Nos processos sobrestados, mas que ainda não foi proferida sentença, o juiz deverá julgar aplicando a tese fixada. Já nos processos já sentenciados, com decisão impugnada, o tribunal julga o recurso como prejudicado, se a decisão impugnada estiver de acordo com a tese firma-da, ou devolverá os autos ao juiz para adequar sua decisão ao entendimento fixado, nos caso em que a decisão encontrar-se em desacordo (Wambier et al., 2015, p. 2198).

A par disso, Luiz Guilherme Marinoni faz um alerta: o magistrado deve buscar a orientação nas teses jurídicas firmadas pelos Tribunais e pelas Cor-tes Superiores; no entanto, a orientação vinculativa deve ser extraída “da ratio decidendi ou [d]os fundamentos determinantes do precedente que se deseja aplicar” (Wambier et al., 2015, p. 2077).

Muito foi aventado até aqui sobre a importância da tese jurídica no novo sistema processual civil. Tese jurídica será aquela fixada pelos Tribunais na análise de questões controvertidas, as quais há forte dissenso doutrinário/juris-prudencial.

Com efeito, trata-se de uma evolução na forma de lidar com a justiça e de nítida influência do common law, pois dá força normativa ao precedente em sede de fixação de tese jurídica. Pode-se falar em verdadeira evolução do Direito, ou, como diria Thomas S. Kuhn, uma revolução científica paradigmá-tica, pois deixamos um modo de fazer justiça devido à crise e à insegurança e passamos a outro patamar – a vinculação pela tese jurídica, o novo paradigma.

Sobre a questão posta, Thomas S. Kuhn argumenta que há o progres-so por meio das revoluções científicas. Segundo o autor, há uma revolução científica quando o paradigma adotado não resolve mais as questões objeto de debates, nascendo posições divergentes, ou, como diria Kuhn, “campos rivais que buscam o predomínio. Quando isso ocorre, há o período de crise científica no qual busca-se descobrir uma nova abordagem para as questões problemas e, na sequência, a revolução termina com a vitória total de um dos dois campos rivais” (Kuhn, 2011, p. 203-210).

A respeito do tema pode-se afirmar que há uma insegurança jurídica em vários campos do Direito, pois questões idênticas são invariavelmente decidi-das de maneiras diversas. Parafraseando Kuhn, os manuais de direito apresen-tam soluções que são predominantes; no entanto, surgem dissidentes que criam a mencionada instabilidade jurídica. Tal variação de entendimento para casos idênticos, mutatis mutandis, pode ser chamada de crise e inicia-se o processo de revolução – a evolução do Direito. Parte-se de um paradigma (entendimen-to sobre determinada questão), surgem divergências (diferentes interpretações

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sobre a questão) e chega-se a um novo paradigma (novo entendimento predo-minante sobre a questão).

Pode-se dizer, então, que a vinculação obrigatória da tese jurídica firma-da pelos Tribunais e pelas Cortes Superiores é o novo paradigma, pois existia um entendimento sobre a questão, surgiram divergências e, por fim, como uma revolução científica, surge o novo paradigma – a tese jurídica.

Ainda sobre a vinculação do precedente, ao analisarmos a novel legisla-ção em comento, constata-se a preocupação na distribuição igualitária da justi-ça, uma evolução oriunda dos povos democráticos. Revela-se nos arts. 976 e se-guintes a previsão do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), que tem como objetivo a tutela isonômica.

Nos dizeres de Bruno Dantas, o IRDR é “o incidente processual instaura-do para, mediante julgamento único e vinculante, assegurar interpretação iso-nômica à questão jurídica controvertida em demandas repetitivas que busquem tutela jurisdicional a interesses individuais homogêneos (Wambier et al., 2015, p. 2179)”.

Assim, fica nítida a importância que foi conferida à tese jurídica, pois, conforme o aludido autor, “a decisão que o tribunal profere em IRDR, como visto, não resolve a lide, mas meramente fixa a interpretação da quaestio iuris que compõe a causa petendi. Desta forma, não há que se falar em coisa julga-da da questão de direito, mas sim de efeito vinculante (Wambier et al., 2015, p. 2194)”.

Concluindo o presente capítulo, pode-se afirmar que o novo Código de Processo Civil traz um avanço ao Direito. Pode-se dizer que ocorre uma evolu-ção autopoiética, eis que há o direito normativo que poderá evoluir de acordo com os precedentes vinculativos e as teses jurídicas que, sem dúvidas, recebem irritações diuturnas do entorno e, assim, acoplam as diferenças, introduzindo-as como fonte do Direito em conjunto com o texto normativo.

ConsIderações fInaIs

O presente articulado não pretendeu esgotar o tema evolução do Direito. Pretendeu-se demonstrar, em poucas linhas, que há uma evolução constante do Direito – da mesma forma como a sociedade evolui –, com as constantes divergências.

Nota-se de todo o argumentando que, nos dizeres de Ronald Dworkin, há uma inquietação ao aplicar uma lei antiga, pois “os juízes devem escolher entre a mão morta, porém legítima, do passado e o encanto claramente ilícito do progresso”.

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Será mesmo ilícito o encanto do progresso? Talvez não. A inquietação mencionada nos traz a ideia de evolução do atual sistema (civil law) e eventual incursão nas regras do common law.

Conforme visto no primeiro capítulo, Luhman afirma que há a evolução devido à necessidade de acoplar o agora e o depois, ou seja, há “contínuas re-observações mediante novas distinções”. Essas observações, nos dizeres de Teubner, ocorrem pelo fato de que o Direito está em contato diuturno com cri-ses políticas, movimentos sociais e variações do próprio Direito.

Portanto, há uma evolução do sistema do Direito, pois é ligado ao pas-sado (legislação) e ao futuro (fatos reais) ao mesmo tempo, nascendo a neces-sidade da evolução, pois há irritação que gera desconforto, desencadeando o acoplamento que redunda na evolução do Direito.

Vimos, também, no segundo capítulo que a evolução se dá diuturnamen-te pela interpretação, pois, conforme Hans Kelsen, a “interpretação jurídico--científica não pode fazer outra coisa senão estabelecer as possíveis significa-ções de uma norma jurídica”.

No mesmo sentido, Eros Roberto Grau argumenta que os enunciados do Direito não são completos, passando a sê-los somente quando o intérprete os aplica aos casos concretos. Conclui-se, portanto, que os variados casos concre-tos podem apresentar variadas interpretações sobre os enunciados do Direito.

Assim, não se pode olvidar que o processo de interpretação é uma cons-tante. Inocêncio Mártires Coelho, com apoio de Richard Palmer, relata que o entendimento sobre certo enunciado normativo contém o que representava à época de sua edição, mas também o que representa no presente.

E mais, com suporte em Carlos Cossio, tal autor afirma que a alteração de uma interpretação sobre certo enunciado normativo não é correção de equí-vocos, mas, como na alteração legislativa, nada mais do que renovação decor-rente de “epifenômenos de subjacentes transformações fático-axiológicas”, ou seja, é o trabalho do intérprete que revalida o enunciado às necessidades sociais e, assim procedendo, reduz o “descompasso entre os problemas sociais e as respectivas soluções legislativas”.

Corroborando a ideia de evolução pela interpretação do Direito, afir-mou-se que um texto escrito há cem anos, ao ser interpretado nos atuais dias, terá sentido, alcance e extensão diversos da época de sua publicação.

Nesse sentido, Inocêncio Mártires Coelho relata que o intérprete busca adequar o enunciado normativo aos tempos atuais para buscar “o significado jurídico da lei, que só pode ser o seu significado atual, e não o significado histó-rico, aquele que lhe foi atribuído ao tempo da promulgação” estará no caminho da interpretação progressiva/evolutiva.

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No mesmo sentido, Luhmann afirma que as variações das interpretações surgem da prática jurídica, da docência em conjunto com os textos normativos, ou seja, se apresenta como o resultado das interpretações, evoluindo diuturna-mente.

Conclui-se que o direito positivo deve evoluir pelo fato de não resolver os problemas da sociedade, e mais: não há um texto que seja tão claro que não demande interpretação evolutiva para resolver o caso concreto. Foi dito que ao texto normativo escrito há muitos anos deve ser conferido novo sentido, alcan-ce e extensão aproximando o texto à realidade, ou seja, evoluindo diante das novas facetas da sociedade.

Já, no terceiro capítulo, constatou-se que há uma evolução constante do Direito quando se assenta a possibilidade de a legislação ceder aos novos con-tornos vinculantes das decisões das Cortes.

Com efeito, Leonel Severo Rocha afirma que “o direito moderno, ao con-trário [do jusnaturalismo], para sobreviver na sociedade indeterminada, será um direito positivo; um Direito diferenciado e construído por decisões”, ou seja, o direito construído por decisões é a constatação de que ocorre a evolução do direito processual civil brasileiro.

Verifica-se, portanto, que as irritações do entorno – no sentido de novos contornos que podem ser conferidos aos textos normativos – acarretam a evolu-ção do Direito brasileiro (civil law) pela influência do common law.

No entanto, como visto, no civil law, nos dizeres de Arnaldo Sampaio de Godoy, “pensa-se na Constituição como fonte suprema de qualquer imposição, seguida por leis complementares, ordinárias, medidas de urgência, regulamen-tos, etc.”, enquanto que, ainda conforme o aludido autor, no common law há “institutos próprios, centrados na atividade produtora de Judiciário de composi-ção, natureza, origem, recrutamento e garantias tão estranhas a protótipos que marcam nossos hábitos conceituais”.

Por fim, nos dizeres de Mariângela Gama de Magalhães Gomes,

não obstante as importantes diferenças entre o ordenamento jurídico brasileiro e o sistema do common law, observa-se que, uma vez admitida a necessidade de garantir o cidadão frente à aleatoriedade da jurisprudência, os institutos exis-tentes naqueles ordenamentos podem fornecer significativas e úteis diretrizes de garantia a serem utilizadas também aqui. É que no sistema do common law, ao ser atribuído à jurisprudência um papel criativo no direito, foram criados meca-nismos que, ao invés de diminuir, aumentaram as garantias que são dadas ao indivíduo frente às alterações jurisprudenciais.

Assim, constata-se que o ordenamento jurídico brasileiro tem os seus fundamentos no sistema romano-germânico, no qual há a compilação e a co-

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dificação de textos normativos, mas constata-se, também, que possui institutos que revelam a incursão em outro sistema, o do common law, pois é permitido aos Tribunais – pela vinculação do precedente – impor uma regra abstrata.

No quarto capítulo aprofundou-se a pesquisa no novo Código de Pro-cesso Civil, texto normativo que trouxe vários dispositivos com tendências da vinculação de decisões aos magistrados.

O ordenamento jurídico brasileiro, como visto anteriormente, tem as suas origens no sistema civil law, ou seja, predomina que a fonte primária do Direito é a lei – prevalece a codificação. No entanto, constata-se na nova le-gislação processual civil que o legislador privilegiou o respeito ao precedente jurisprudencial, como no common law.

Como já afirmado, trata-se de uma evolução na forma de lidar com a justiça e de nítida influência do common law, pois confere força normativa ao precedente – tese jurídica –, verdadeira evolução do Direito ao abandonar o vetusto modo de fazer justiça.

Pode-se afirmar, assim, que o novo Código de Processo Civil traz um avanço ao Direito, sugere uma evolução autopoietica, o direito normativo po-derá evoluir de acordo com os precedentes vinculativos e as teses jurídicas que, sem dúvidas, recebem irritações diuturnas do entorno e, assim, acoplam as diferenças, introduzindo-as como fonte do Direito em conjunto com o texto normativo.

Sob a ótica da autopoiese, se conclui que, conforme Leonel Severo Rocha, o Direito é dinâmico e aspira evolução diante da necessidade constante de, como parte da estrutura social, reduzir a “complexidade das possibilidades do ser no mundo”.

Finalizando, há um sistema brasileiro fundado em textos normativos (civil law) e há influência de outro sistema (common law). Tal constatação su-gere uma evolução constante do Direito, o que poderia se inferir que estaremos no caminho da miscigenação do sistema jurídico brasileiro pela influência do common law.

Portanto, respondendo às hipóteses iniciais:

i) os Poderes Legislativo e Judiciário, como organizações, recebem in-fluência do entorno – compreendidos como irritações provocadas pelo sistema norte-americano – e, assim, como integrantes de um sistema autopoietico, inter-nalizaram regras (de legislar e de julgar) do common law no sistema brasileiro, afastando-se do civil law.

A resposta é afirmativa, pois o Direito brasileiro, em especial o sistema processual civil, recebeu forte influência do common law. Notou-se do pre-

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sente estudo que a novel legislação se afasta da lei como fonte predominante do Direito. Confere, a nova legislação, grande importância ao precedente ju-risprudencial, pois ampliou as hipóteses de vinculação das decisões de Cortes Superiores, ou seja, elevou ao caráter abstrato (anteriormente só conferido à lei) a tese jurídica firmada pelos Tribunais. Portanto, a hipótese restou confirmada.

ii) os Poderes Legislativo e Judiciário, como integrantes de um sistema autopoietico, recebem influência do entorno (common law); no entanto, per-manecem na esteira do sistema civil law, eis que a criação de mecanismos de vinculação aos precedentes (respeito ao entendimento das Cortes Superiores) não descaracterizam o sistema.

A resposta é negativa. Ao analisarmos os fundamentos do civil law, de-nota-se que ocorreu, pelo Direito brasileiro, um distanciamento. Com efeito, é sabido que no civil law há a lei e o precedente, o que, por si só, não desca-racteriza o sistema. No entanto, no aludido sistema da lei tem caráter abstrato, não o precedente. Como visto, no sistema do common law, o precedente tem caráter abstrato e, assim, se a tese jurídica é vinculativa e deve ser aplicada com caráter abstrato, na verdade houve, sim, descaracterização do sistema. Assim, a hipótese restou refutada.

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Parte Geral – Jurisprudência

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Superior Tribunal de JustiçaAgRg‑EDcl no Recurso Especial nº 1.556.587 – RN (2015/0237015‑4)Relator: Ministro Marco Aurélio BellizzeAgravante: Imobiliária Brasil e Construções Ltda.Advogados: Gênason Dantas Fonseca

Leonardo Oliveira Dantas e outro(s)Agravado: Raimundo PaivaAdvogados: Gabrielle Trindade Moreira de Azevedo e outro(s)

Anna Clara Miranda de Azevedo Peixoto

ementA

aGraVo reGImental nos emBarGos de deClaração no reCurso espeCIal – dIreIto proCessual CIVIl – emBarGos À exeCução – 1 IndeferImento de proVa testemunhal – aleGação de CerCeamento de defesa – não CaraCterIZação – 2 exeCutIVIdade do Contrato – aleGação de Que o Contrato foI assInado pelas testemunhas depoIs da CeleBração do neGÓCIo – pretensão reCursal Que ColIde Com as premIssas fÁtICas assentadas pelas InstÂnCIas ordInÁrIas – sÚmula nº 7 do stJ – 3 emBarGos de deClaração – desneCessIdade de pauta – 4 ausÊnCIa de omIssão no JulGado – 5 ConfIGuração de ato atentatÓrIo À dIGnIdade da JustIça – sÚmula nº 7 do stJ – 6 honorÁrIos adVoCatÍCIos – pretensão de redução – InVIaBIlIdade – sÚmula nº 7 do stJ – 7 aGraVo reGImental desproVIdo

1. A instância ordinária refutou a alegação de que as assinaturas das tes-temunhas foram apostas depois da celebração do negócio jurídico. Desse modo, a modificação do acórdão recorrido exigiria o reexame de provas, vedado pela Súmula nº 7 do STJ.

2. Quanto à desnecessidade de oitiva das testemunhas, a agravante não se desobrigou de rebater esse fundamento da decisão, circunstância que atrai o Enunciado nº 182 da Súmula desta Corte.

3. O julgamento de embargos de declaração opostos sob a égide do CPC/1973 não exigia a inclusão em pauta.

4. Não houve violação do art. 535, inciso II, do Código de Processo Civil, pois não se pode atribuir ao acórdão o vício de omisso apenas porque resolveu a celeuma em sentido contrário ao postulado pela recorrente.

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5. O reconhecimento da configuração de ato “atentatório à dignidade da Justiça” se faz a partir das peculiaridades fático-probatórias, as quais não podem ser objeto de reexame em recurso especial.

6. A redução da verba honorária esbarra no óbice da Súmula nº 7/STJ, quando não se mostra excessiva.

7. Agravo regimental desprovido.

AcÓrdÃo

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Ter-ceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o indeferimento do pedido de adiamento, por unanimidade, negar provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 23 de junho de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Marco Aurélio Bellizze, Relator

relAtÓrio

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze:

Trata-se de agravo regimental (fls. 963-1.023) interposto por Imobiliária Brasil e Construções Ltda. contra decisão da minha relatoria que negou segui-mento ao recurso especial assim resumida (e-STJ, fl. 905):

RECURSO ESPECIAL – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS À EXECU-ÇÃO – 1 CONTRARIEDADE OU NEGATIVA DE VIGÊNCIA A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL – INADEQUAÇÃO DA VIA RECURSAL ELEITA – COM-PETÊNCIA DO STF – PRECEDENTE – 2 VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – NÃO OCORRÊNCIA – 3 INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL – ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA – NÃO CARACTERIZAÇÃO – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADO – FALTA DE SIMILITUDE FÁTICA – NECESSIDADE DA PROVA – SÚMULA Nº 7 DO STJ – 4 ALEGAÇÃO DE QUE O CONTRATO FOI ASSINADO PELAS TESTEMUNHAS DEPOIS DA CELEBRAÇÃO DO NEGÓCIO – PRETENSÃO RECURSAL QUE COLIDE COM AS PREMISSAS FÁTICAS ASSENTADAS PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS – SÚMULA Nº 7 DO STJ – 5 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – FIXAÇÃO POR

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������151

EQUIDADE (ART. 20, § 4º, DO CPC) – PRETENSÃO DE REDUÇÃO – INVIA-BILIDADE – ATENDIMENTO AO POSTULADO DA PROPORCIONALIDADE – SÚMULA Nº 7 DO STJ – 6 CONFIGURAÇÃO DE ATO ATENTATÓRIO À DIG-NIDADE DA JUSTIÇA – SÚMULA Nº 7 DO STJ – 7 RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.

Em sua irresignação, a agravante sustenta: a) a impossibilidade de exe-cução do contrato, em razão das testemunhas terem assinado posteriormente; b) cerceamento de defesa pelo indeferimento da prova testemunhal; c) ausência de intimação para o julgamento dos embargos de declaração; e d) omissão no acórdão recorrido pois não se pronunciou sobre a ilegalidade de aplicação da penalidade prevista no inciso II do art. 600 do CPC.

Intimada, a parte agravada ofertou impugnação, pleiteando pela manu-tenção do decisum (e-STJ, fls. 1.087-1.121).

É o relatório.

voto

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze (Relator):

Inicialmente não conheço do agravo regimental de fls. 1.024-1.084 (e-STJ), em razão da preclusão consumativa.

A sentença mantida pelo acórdão recorrido atestou que “as testemunhas signatárias do contrato eram funcionários da embargante, fato que ficou incon-troverso” (e-STJ, fl. 322).

A partir disso, o Magistrado de primeiro grau refutou a tese de assinatura posterior do contrato pelas testemunhas, recorrendo, validamente, às máximas da experiência, raciocinando que, “se tivesse o embargado colhido as assina-turas a posteriori, normal seria colher assinaturas de testemunhas de seu rela-cionamento, ao invés de colher a assinatura de funcionários do embargante” (e-STJ, fl. 322).

Como se vê, a instância ordinária refutou a alegação de que as assinatu-ras das testemunhas foram apostas depois da celebração do negócio jurídico.

Desse modo, a modificação do acórdão recorrido exigiria o reexame de provas, vedado pela Súmula nº 7 do STJ.

Outrossim, não foi demonstrado a divergência jurisprudencial, pois os arestos paradigmas apontados pela agravante referem-se a contratos sem assina-tura das testemunhas, hipótese fática completamente distinta deste caso.

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152 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

O art. 131 do CPC, que trata do princípio da livre persuasão racional, estabelece que cabe ao magistrado avaliar as provas requeridas e rejeitar aque-las que protelariam o andamento do processo, em desrespeito ao princípio da celeridade processual.

No caso dos autos, o Tribunal de origem asseverou que “a magistrada a quo indeferiu as testemunhas arroladas, tendo em vista que a apelante reconhe-ceu como válido o contrato, afirmando que: ‘as datas e condições contratuais apresentadas na peça executória retratam a realidade’ (fl. 6 – v. 1). Sendo assim, não havia necessidade de realização da audiência de instrução para o fim de colher o depoimento das testemunhas” (e-STJ, fl. 460).

Verifico que a agravante não se desobrigou de rebater esse fundamento da decisão, circunstância que atrai o Enunciado nº 182 da Súmula desta Corte, segundo o qual “é inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada”.

A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – AUSÊNCIA DE IMPUGNA-ÇÃO DE FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA – INCIDÊNCIA DA SÚ-MULA Nº 182 DO STJ – DISCUSSÃO ACERCA DA APLICAÇÃO DE REGRA TÉCNICA RELATIVA AO CONHECIMENTO DO RECURSO ESPECIAL – SÚMU-LA Nº 7 DO STJ – AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO – MERA TRANSCRIÇÃO DE EMENTAS – DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO

1. Não se conhece de agravo regimental quando deixa de impugnar os funda-mentos da decisão agravada, consoante a jurisprudência sedimentada na Súmu-la nº 182 do Superior Tribunal de Justiça (“É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agrava-da”). (AgRg-EAREsp 112.843/PR, Relª Min. Eliana Calmon, Corte Especial, Julga-do em 16.10.2013, DJe 25.10.2013)

2. É inviável, em sede de embargos de divergência, discussão acerca da admis-sibilidade do recurso especial, o que ocorre, entre outros, nos casos de incidên-cia da Súmula nº 7 do STJ.

3. “Segundo o entendimento firme desta Corte, o manejo dos embargos de di-vergência deve atender ao disposto no art. 255 do RISTJ, com a caracterização do dissídio jurisprudencial a partir do cotejo analítico, não servindo a mera transcrição de ementas” (AgRg-EREsp 1196175/ES, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, Corte Especial, Julgado em 02.05.2012, DJe 15.05.2012).

4. Agravo regimental não conhecido. (AgRg-EAREsp 466.510/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, Julgado em 01.10.2014, DJe 13.10.2014)

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������153

Segundo a pacífica jurisprudência desta Casa, “a falta de intimação pré-via para a sessão de julgamento dos aclaratórios não acarreta qualquer nulida-de, porquanto, consoante disciplina do art. 537 do CPC, os embargos de decla-ração serão apreciados pelo órgão julgador independentemente de inclusão em pauta de julgamentos, de modo que não se admite a apresentação de sustenta-ção oral” (EDcl-EDcl-EDcl-EDcl-AgRg-EDcl-AgRg-EDcl-EDcl-REsp 832.013/SP, Rel. o Ministro Nefi Cordeiro, 6ª T., Julgado em 10.02.2015, DJe 23.02.2015 – sem grifo no original).

Portanto, não houve nenhuma mácula no julgamento dos embargos de declaração pelo simples fato de não terem sido incluídos em pauta.

Neste ponto, a recorrente não comprovou o dissídio pretoriano nos ter-mos exigidos pelos dispositivos legais e regimentais que o disciplinam, notada-mente por terem deixado de transcrever os trechos dos acórdãos em confronto e não terem efetuado o necessário cotejo analítico das teses supostamente di-vergentes, sendo que não configura o dissídio a mera transcrição de ementas.

Ainda que superado tal obstáculo, é inafastável a aplicação do Enun-ciado nº 83 da Súmula desta Corte que dispõe: “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.”

Não reconheço a apontada violação do art. 535, inciso II, do Código de Processo Civil, pois, de um lado, não existia omissão a ser suprida; de outro, foram apropriados e legítimos os fundamentos que sustentaram a conclusão alcançada pelo acórdão local, não se podendo a ele atribuir o vício de omis-so apenas porque resolveu a celeuma em sentido contrário ao postulado pela recorrente. Ora, de acordo com a jurisprudência desta Casa, o magistrado não está obrigado a se manifestar acerca de todos os fundamentos assinalados pelas partes, notadamente quando já houver decidido a controvérsia com base em outras justificativas.

Com relação à suposta violação dos arts. 600 e 601 do CPC, o espe-cial mais uma vez esbarra nesse verbete sumular, porque o reconhecimento da configuração de ato “atentatório à dignidade da Justiça” se faz a partir das peculiaridades fático-probatórias, as quais não podem ser objeto de reexame em recurso especial.

A propósito (sem grifo no original):

PROCESSUAL CIVIL – ART. 535 DO CPC – OFENSA NÃO CARACTERIZADA – REVISÃO DA APLICAÇÃO DE ASTREINTES – RECONHECIMENTO DE LITI-GÂNCIA DE MÁ-FÉ – VERBA HONORÁRIA – REEXAME DE PROVAS – IMPOS-SIBILIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ – AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO

1. [...].

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3. O exame da existência do elemento subjetivo necessário à caracterização dos atos atentatórios à dignidade da justiça implicaria revolvimento do suporte fático-probatório dos autos, o que é vedado em Recurso Especial. Incidência da Súmula nº 7/STJ.

4. [...].

5. Agravo Regimental improvido.

(AgRg-AREsp 667.395/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., Julgado em 28.04.2015, DJe 30.06.2015)

Por fim, a pretensão de modificação da verba honorária esbarra no óbice da Súmula nº 7/STJ, tendo em vista que o Colegiado estadual a estabeleceu a partir da complexidade da causa, do trabalho desenvolvido pelos profissionais, bem como dos demais elementos fáticos presentes no processo.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É como voto.

certidÃo de JulGAmento terceirA turmA

Número Registro: 2015/0237015-4

Processo Eletrônico AgRg-EDcl-REsp 1.556.587/RN

Números Origem: 00006823820118200130 00016827320118200130 16827320118200130 20140151386 20140151386000100 20140151386000200 20140151386000300

Em Mesa Julgado: 23.06.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AutuAÇÃo

Recorrente: Imobiliária Brasil e Construções Ltda.

Advogados: Gênason Dantas Fonseca Leonardo Oliveira Dantas e outro(s)

Recorrido: Raimundo Paiva

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������155

Advogados: Gabrielle Trindade Moreira de Azevedo e outro(s) Anna Clara Miranda de Azevedo Peixoto

Assunto: Direito civil – Coisas – Promessa de compra e venda

AGrAvo reGimentAl

Agravante: Imobiliária Brasil e Construções Ltda.

Advogados: Gênason Dantas Fonseca Leonardo Oliveira Dantas e outro(s)

Agravado: Raimundo Paiva

Advogados: Gabrielle Trindade Moreira de Azevedo e outro(s) Anna Clara Miranda de Azevedo Peixoto

certidÃo

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Após o indeferimento do pedido de adiamento, a Turma, por unanimidade, ne-gou provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Jurisprudência

8756

Superior Tribunal de JustiçaAgInt no Agravo em Recurso Especial nº 749.456 – SC (2015/0178245‑0)Relator: Ministro Moura RibeiroAgravante: OI S.A.Advogados: Everaldo Luís Restanho e outro(s)

Marcos Andrey de SousaAgravado: Fidencio de MouraAgravado: Irani J. GhionAgravado: Arlindo RosaAdvogado: Rodolfo Maurício Hirsch Neto

ementA

proCessual CIVIl – aGraVo Interno no aGraVo em reCurso espeCIal – reCurso maneJado soB a ÉGIde do nCpC – deCIsão do trIBunal de orIGem Que não admIte o apelo noBre Com fulCro no art. 543-C, § 7º, I, do CpC/1973 – InterposIção de aGraVo em reCurso espeCIal – não CaBImento – deVolução dos autos À orIGem para apreCIação Como aGraVo Interno – ausÊnCIa de ImpuGnação espeCÍfICa – deCIsão de admIssIBIlIdade – aplICação da sÚmula nº 182 do stJ – deCIsão mantIda

1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

2. A Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça admitiu que interposto agravo em recurso especial contra decisão que nega seguimento ao apelo especial com amparo no art. 543-C § 7º, I, do CPC/1973, é necessário o retorno dos autos à origem a fim de que o recurso interposto seja recebido e julgado como agravo interno pelo Tribunal de origem (AgRg-AREsp 260.033/PR, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, DJe 25.09.2015).

3. O agravo interno não impugnou as razões da decisão agravada, pois não refutou, de forma fundamentada, os óbices da incidência do art. 543-C, § 7º, I, do CPC/1973 e da Súmula nº 83 desta Corte, o que atrai a aplicação da Súmula nº 182 do STJ.

4. Agravo interno não provido.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������157

AcÓrdÃo

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, em negar provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha (Presi-dente), Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 23 de junho de 2016 (data do Julgamento)

Ministro Moura Ribeiro Relator

relAtÓrio

O Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro (Relator):

Da leitura da minuta do agravo de instrumento que deu origem a este recurso, pode-se aferir que Fidêncio de Moura, Irani J. Ghion e Arlindo Rosa (Fidêncio, Irani e Arlindo), manejaram ação visando o recebimento de com-plementação da subscrição de ações e indenização correspondente ao capital subscrito contra Brasil Telecom, atual OI S.A. (OI S.A.), que foi julgada proce-dente.

No curso do cumprimento de sentença, o Juízo de piso determinou a intimação da OI S.A. para, no prazo de 60 dias, apresentar o contrato original de participação financeira ou sua cópia, bem como para efetuar o pagamento de honorários periciais, no valor de R$ 900,00 (novecentos reais) para cada contrato, sob pena de reconhecimento da veracidade dos cálculos por aqueles ofertados.

Essa interlocutória foi desafiada por agravo de instrumento no qual OI S.A. sustentava (1) a desnecessidade de apresentação dos contratos em razão da radiografia que já está encartada nos autos; (2) que, por se tratar de prova pericial determinada de ofício, devem os honorários do perito serem pagos pe-los autores; e, (3) a inversão do ônus da prova não lhe transfere a obrigação de pagamento dos honorários periciais.

O relator do recurso originário lhe negou seguimento em decisão mono-crática fundamentada nos termos dos arts. 527, I, e 557, caput, do CPC/1973.

No julgamento do agravo regimental interposto por OI S.A., o Tribunal a quo manteve a negativa de seguimento, impondo, ainda, multa de 1% do valor corrigido da causa, com fulcro no art. 557, § 2º, do CPC/1973, nos termos da seguinte ementa:

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AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – ART. 557, § 1º, DO CPC – DECI-SÃO MONOCRÁTICA QUE NEGA SEGUIMENTO AO RECURSO POR MANI-FESTA INADMISSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE INSTRUMENTO DE MANDATO VÁLIDO – DEVER DA PARTE AGRAVANTE DE INSTRUIR O RECURSO COM AS PEÇAS OBRIGATÓRIAS NO MOMENTO DA INTERPOSIÇÃO – ALEGADA REGULARIZAÇÃO DA SITUAÇÃO – INOCORRÊNCIA – APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS JÁ CONSTANTES DOS AUTOS E DEVIDAMENTE APRECIA-DOS – INSURGÊNCIA MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE E PROTELATÓRIA – APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 557, § 2º, DO CPC – DECISÃO MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO

“Compete ao agravante zelar pela adequada formação do instrumento do agra-vo. A presença das peças obrigatórias constitui pressuposto de regularidade for-mal do recurso, pois verificada a deficiência na formação do instrumento, im-põe-se a prolação de juízo negativo de admissibilidade, ainda mais diante da impossibilidade da juntada posterior, pois já teria havido preclusão consumati-va” (Agravo (§ 1º art. 557 do CPC) em Agravo de Instrumento nº 2012.001154-3, de Jaraguá do Sul, Relª Desª Cláudia Lambert de Faria, J. 16.02.2012) (e-STJ, fl. 68).

Os embargos de declaração opostos pela OI S.A. foram rejeitados, tendo sido ela condenada ao pagamento de multa de 1% sobre o valor corrigido da causa (e-STJ, fls. 87-92).

Ainda inconformada, OI S.A. interpôs recurso especial com fundamen-to no art. 105, III, c, da CF apontando divergência jurisprudencial porque (1) os embargos de declaração não possuíam caráter protelatório, uma vez que havia omissão no aresto recorrido, o que acarretava ofensa ao art. 535, II, do CPC/1973; e, (2) o Tribunal de origem deveria ter realizado prévia diligência a fim de que o agravo de instrumento fosse completado com cópia da pro-curação outorgada ao advogado da parte, que não foi admitido em razão da incidência do art. 543-C, § 7º, I, do CPC/1973, pois o aresto recorrido coincide com a orientação desta Corte exarado no recurso representativo de controvérsia (REsp 1.41.839/SC) e da aplicação da Súmula nº 83 desta Corte.

Dessa decisão, manejou agravo em recurso especial que não foi conhe-cido nos termos da seguinte ementa:

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – RECURSO MANE-JADO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973 – AGRAVO DE INSTRUMENTO – CON-TRATO DE PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA – TELEFONIA – DECISÃO NO TRI-BUNAL A QUO QUE NEGOU SEGUIMENTO AO ESPECIAL COM BASE NO ART. 543-C, § 7º, I, DO CPC – INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO DO ART. 544 DO CPC – DESCABIMENTO – ERRO GROSSEIRO – NÃO CONFIGURAÇÃO – REMESSA DO RECURSO PELO STJ À CORTE DE ORIGEM PARA APRECIAÇÃO COMO AGRAVO INTERNO – AGRAVO NÃO CONHECIDO (e-STJ, fl. 136).

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������159

Nas razões do presente agravo interno, OI S.A. alegou que (1) houve equívoco quanto à juntada do substabelecimento conferido ao seu advogado, não sendo, portanto, caso de rejeição do recurso; e, (2) deve ser afastado o ape-go ao formalismo exagerado.

Não houve impugnação (e-STJ, fl. 148).

É o relatório.

ementA

proCessual CIVIl – aGraVo Interno no aGraVo em reCurso espeCIal – reCurso maneJado soB a ÉGIde do nCpC – deCIsão do trIBunal de orIGem Que não admIte o apelo noBre Com fulCro no art. 543-C, § 7º, I, do CpC/1973 – InterposIção de aGraVo em reCurso espeCIal – não CaBImento – deVolução dos autos À orIGem para apreCIação Como aGraVo Interno – ausÊnCIa de ImpuGnação espeCÍfICa – deCIsão de admIssIBIlIdade – aplICação da sÚmula nº 182 do stJ – deCIsão mantIda

1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

2. A Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça admitiu que interposto agravo em recurso especial contra decisão que nega seguimento ao apelo especial com amparo no art. 543-C § 7º, I, do CPC/1973, é necessário o retorno dos autos à origem a fim de que o recurso interposto seja recebido e julgado como agravo interno pelo Tribunal de origem (AgRg-AREsp 260.033/PR, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, DJe 25.09.2015).

3. O agravo interno não impugnou as razões da decisão agravada, pois não refutou, de forma fundamentada, os óbices da incidência do art. 543-C, § 7º, I, do CPC/1973 e da Súmula nº 83 desta Corte, o que atrai a aplicação da Súmula nº 182 do STJ.

4. Agravo interno não provido.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro (Relator):

O recurso não merece provimento.

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De plano, vale pontuar que o presente agravo interno foi interposto con-tra decisão publicada na vigência do novo Código de Processo Civil, razão pela qual devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016:

Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de ad-missibilidade recursal na forma do novo CPC.

Conforme já constou do relatório, no âmbito do cumprimento de senten-ça requerido por Fidêncio, Irani e Arlindo contra OI S.A., esta interpôs agravo de instrumento contra a decisão do Juízo de piso que determinou sua intima-ção para, no prazo de 60 dias, apresentar o contrato original de participação financeira ou sua cópia, bem como para efetuar o pagamento de honorários periciais, no valor de R$ 900,00 (novecentos reais) para cada contrato, sob pena de reconhecimento da veracidade dos cálculos por aqueles ofertados.

A decisão monocrática que negou seguimento ao agravo de instrumento interposto foi mantida pelo Tribunal de origem por ocasião do julgamento do agravo regimental.

Como não foi admitido o recurso especial que interpôs, manejou agravo em recurso especial, que não foi conhecido.

É contra essa decisão o inconformismo agora manejado que não merece provimento por não ter trazido nenhum elemento apto a infirmar as conclusões externadas na decisão agravada.

(1) do retorno à oriGem

Na hipótese, cuida-se de agravo em recurso especial interposto pela OI contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que denegou o apelo nobre, nos termos do art. 543-C, § 7º, I, do CPC/1973, tendo em vista o entendimento esposado no Recurso Especial nº 1.410.839/SC.

No julgamento da Questão de Ordem no Ag nº 1.154.599/SP, da relato-ria do em. Min. Cesar Asfor Rocha, DJe de 12.05.2011, esta Corte Especial as-sentou o entendimento de que não cabe agravo em recurso especial (CPC/1973, art. 544) contra decisão que a ele nega seguimento, com base no art. 543-C, § 7º, I, do CPC/1973, acrescentando que, na hipótese de a negativa de segui-mento do apelo especial ter sido efetuada de forma equivocada, pode o agra-vante manejar agravo interno ou regimental, demonstrando a especificidade do caso concreto.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������161

Entretanto, em recente modificação de entendimento, a Corte Especial desta Casa consignou que se deve levar em conta que a parte se utilizou do meio processual previsto no Código de Processo de 1973 (art. 544), o que afas-taria a possibilidade de configuração de erro grosseiro e possibilitaria observar a verdadeira função do processo, qual seja: servir de instrumento para a prestação jurisdicional de dar direitos a quem os possua.

De tal forma, o recurso deverá ser remetido à Corte de origem, para apre-ciação como agravo interno.

A propósito, veja-se o seguinte precedente:AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – DECISÃO, NO TRIBUNAL A QUO, QUE NEGA SEGUIMENTO AO ES-PECIAL COM BASE NO ART. 543-C DO CPC – INTERPOSIÇÃO DO AGRA-VO DO ART. 544 DO CPC – DESCABIMENTO – ERRO GROSSEIRO – NÃO CONFIGURAÇÃO – REMESSA DO RECURSO PELO STJ À CORTE DE ORIGEM PARA APRECIAÇÃO COMO AGRAVO INTERNO – AGRAVO PROVIDO

1. No julgamento da Questão de Ordem no Ag nº 1.154.599/SP, a Corte Espe-cial assentou o entendimento de que não cabe agravo (CPC, art. 544) contra decisão que nega seguimento a recurso especial com base no art. 543-C, § 7º, I, do CPC, podendo a parte interessada manejar agravo interno ou regimental na origem, demonstrando a especificidade do caso concreto.

2. Entretanto, o art. 544 do CPC prevê o cabimento do agravo contra a decisão que não admite o recurso especial, sem fazer distinção acerca do fundamento utilizado para a negativa de seguimento do apelo extraordinário. O não cabi-mento do agravo em recurso especial, naquela hipótese, deriva de interpreta-ção adotada por esta Corte Superior, a fim de obter a máxima efetividade da sistemática dos recursos representativos da controvérsia, implementada pela Lei nº 11.672/2008.

3. Então, se equivocadamente a parte interpuser o agravo do art. 544 do CPC contra a referida decisão, por não configurar erro grosseiro, cabe ao Superior Tribunal de Justiça remeter o recurso à Corte de origem para sua apreciação como agravo interno.

4. Agravo interno provido.

(AgRg-AREsp 260.033/PR, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, julgado em 05.08.2015, DJe 25.09.2015)

Em virtude do óbice acima apontado, fica prejudicada a análise meritória das teses destacadas no relatório.

(2) dA incidênciA do Art. 1.021, § 1º, do ncpc e dA súmulA nº 182 do stJ

Outrossim, o agravo interno, conforme acima explicitado, não impug-nou os fundamentos da decisão agravada, pois OI S.A. se limitou a debater

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tema relativo à juntada de procuração, o que não foi analisado no presente recurso.

Com efeito, o art. 1.021, § 1º, do NCPC determina que na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada, o que não foi observado no presente caso.

Ademais, em obediência ao princípio da dialeticidade, exige-se dos agra-vantes o desenvolvimento de argumentação capaz de demonstrar a incorreção dos motivos nos quais se fundou a decisão agravada, técnica ausente nas razões dessa irresignação, a atrair a incidência da Súmula nº 182 desta Corte, do se-guinte teor: É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especi-ficamente os fundamentos da decisão agravada.

Conforme já decidiu o STJ:

À luz do princípio da dialeticidade, que norteia os recursos, deve a parte re-corrente impugnar todos os fundamentos suficientes para manter o acórdão re-corrido, de maneira a demonstrar que o julgamento proferido pelo Tribunal de origem merece ser modificado, ou seja, não basta que faça alegações genéricas em sentido contrário às afirmações do julgado contra o qual se insurge.

(AgRg-Ag 1.056.913/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª T., DJe 26.11.2008)

A propósito, veja-se o precedente:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – RECURSO QUE DEIXA DE IMPUGNAR ESPECIFICAMENTE OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO ORA AGRAVADA – INOBSERVÂNCIA DO ART. 1.021, § 1º, DO CPC E INCI-DÊNCIA DA SÚMULA Nº 182 DO STJ – RECURSO MANIFESTAMENTE INAD-MISSÍVEL – APLICAÇÃO DE MULTA – ART. 1.021, § 4º, DO CPC – AGRAVO NÃO CONHECIDO

1. Inexistindo impugnação específica, como seria de rigor, aos fundamentos da decisão ora agravada, essa circunstância obsta, por si só, a pretensão recursal, pois, à falta de contrariedade, permanecem incólumes os motivos expendidos pela decisão recorrida. Desse modo, no presente caso, resta caracterizada a ino-bservância ao disposto no art. 1.021, § 1º, do CPC e a incidência da Súmula nº 182 do STJ.

2. O recurso mostra-se manifestamente inadmissível, a ensejar a aplicação da mul-ta prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, no percentual de 1% sobre o valor atua- lizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º, do citado artigo de lei.

3. Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa.

(AgInt-AREsp 825.386/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 19.05.2016, DJe 27.05.2016)

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Por derradeiro, advirta-se que eventual recurso interposto contra este acórdão estará sujeito às normas do NCPC, inclusive no que tange ao cabimen-to de multa (arts. 77, §§ 1º e 2º, 1.021, § 4º, e 1.026, § 2º, do NCPC) e honorá-rios recursais (art. 85, § 11, do NCPC).

Nessas condições, pelo meu voto, nego provimento ao agravo interno.

certidÃo de JulGAmento terceirA turmA

Número Registro: 2015/0178245-0 AgInt-AREsp 749.456/SC

Números Origem: 00278661820158240000 018080057672 018080057672001 18080057672 20140221504 20140221504000100 20140221504000101 20140221504000102 20140221504000103

Em Mesa Julgado: 23.06.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AutuAÇÃo

Agravante: OI S.A.

Advogados: Everaldo Luís Restanho e outro(s) Marcos Andrey de Sousa

Agravado: Fidencio de Moura

Agravado: Irani J. Ghion

Agravado: Arlindo Rosa

Advogado: Rodolfo Maurício Hirsch Neto

Assunto: Direito civil – Empresas – Espécies de sociedades – Anônima – Subscrição de ações

AGrAvo interno

Agravante: OI S.A.

Advogados: Everaldo Luís Restanho e outro(s) Marcos Andrey de Sousa

Agravado: Fidencio de Moura

Agravado: Irani J. Ghion

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Agravado: Arlindo Rosa

Advogado: Rodolfo Maurício Hirsch Neto

certidÃo

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Jurisprudência

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Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.425.311 – SP (2013/0386754‑6)Relator: Ministro Moura RibeiroAgravante: Sul America Companhia Nacional de SegurosAdvogados: Rubens Leal Santos e outro(s)

Nelson Luiz Nouvel Alessio e outro(s) Diogo Azevedo Batista de Jesus e outro(s) Raphael Saydi Macedo Mussi e outro(s) Miguel Cancella Nabuco

Agravado: Altamiro de Souza e outrosAdvogados: Rubens Leal Santos

João Batista Xavier da Silva e outro(s) Guilherme Lima Barreto e outro(s) Ricardo Bianchini Mello e outro(s) Felipe Martins Flores e outro(s)

ementA

CIVIl e proCessual CIVIl – aGraVo reGImental no reCurso espeCIal – seGuro haBItaCIonal – ação proposta pelos BenefICIÁrIos – presCrIção deCenal – preCedentes – InCIdÊnCIa da sÚmula nº 83 do stJ – ausÊnCIa de ImpuGnação a arGumento espeCÍfICo – aplICação, por analoGIa, da sÚmula nº 283 do stf – multa deCendIal – preVIsão Contratual – CaBImento – preCedentes – reCurso maneJado soB a ÉGIde do CpC/1973 – deCIsão mantIda

1. Nos termos da Jurisprudência firmada na Segunda Seção desta Corte Superior, a incidência da prescrição ânua, prevista no art. 206, § 6º, II, do CC/2002, aplica-se somente nas ações ajuizadas pelo segurado contra o segurador, não incidindo nas demandas propostas por mutuário de contrato de financiamento imobiliário – regras do Sistema Financeiro de Habitação –, haja vista ser considerado beneficiário do contrato de seguro adjeto ao de mútuo (AREsp 604.330/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 12.11.2014).

2. Existindo argumento capaz de manter o acórdão impugnado por suas próprias pernas, não havendo o ataque específico a tal ponto, atrai-se a incidência, por analogia, da Súmula nº 283 do STF.

3. A jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido de que é devida a multa decendial prevista em contrato quando houver atraso no

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pagamento da indenização securitária (AgRg-REsp 1.297.908/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 22.09.2014).

4. Não sendo a linha argumentativa apresentada pela seguradora capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos.

5. Inaplicabilidade do NCPC neste julgamento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 2 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

6. Agravo regimental não provido.

AcÓrdÃo

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, em negar provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha (Presi-dente), Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 23 de junho de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Moura Ribeiro Relator

relAtÓrio

O Exmo. Senhor Ministro Moura Ribeiro (Relator):

Versam os autos sobre ação de indenização securitária ajuizada por Altamiro de Souza e outros (beneficiários) contra Sul América Companhia Na-cional de Seguros (seguradora), alegando, em resumo, que adquiriram imóveis da Companhia Habitacional de Bauru, mediante financiamento no Sistema Fi-nanceiro de Habitação; que vinculado a esses contratos, aderiram ao Segu-ro Habitacional, contratado com a ré; que decorridos mais de cinco anos da comercialização, constataram o aparecimento de danos comuns nos imóveis,

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causados por vícios na construção; que a indenização por tais sinistros está contratualmente segurada pela ré. Pediram, então, a condenação da seguradora ao pagamento de indenização avençada em Contrato de Seguro Habitacional celebrado entre as partes.

A ação foi julgada parcialmente procedente para o fim de condenar a seguradora ao pagamento da quantia de R$ 389.100,00 (trezentos e oitenta e nove mil e cem reais), além da multa convencional de 2%, a cada dez dias ou fração de atraso, computada desde o sexagésimo dia após a data do recebimen-to das Comunicações de Sinistro, limitada ao valor da indenização.

O Tribunal de origem, por maioria, deu provimento ao agravo retido ma-nifestado pela seguradora para reconhecer a prescrição, extinguindo o processo com julgamento de mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC/1973, prejudica-do o seu apelo (e-STJ, fls. 1.313/1.324).

Os embargos infringentes opostos pelos mutuários foram acolhidos para restabelecer a sentença, à exceção da multa decendial (e-STJ, fls. 1.375/1.390), nos termos da seguinte ementa:

EMBARGOS INFRINGENTES – Seguro habitacional. Divergência quanto ao pra-zo prescricional. Afastamento da prescrição ânua, adotada pela maioria. Pre-valecimento da prescrição vintenária. Contagem, ademais, que tem por termo inicial o inequívoco conhecimento dos danos e da sua extensão, no caso atra-vés de laudo pericial. Danos contínuos, outrossim, que se protraem no tempo. Precedentes jurisprudenciais, inclusive desta Câmara, nesse sentido. Embargos acolhidos na esteira do r. pronunciamento minoritário (e-STJ, fl. 1.381).

Os embargos de declaração interpostos foram acolhidos (e-STJ, fls. 1.402/1.407).

Nas razões do recurso especial, a seguradora alegou, além de dissídio ju-risprudencial, que o aresto impugnado violou os arts. 178, § 6º, II, do CC/2016 ou 206, § 1º, b, do CC/2002, sustentando, em síntese, que na ação do segurado contra o segurador a prescrição é ânua, e não decenal.

Por sua vez, os beneficiários interpuseram recurso especial, com base nas alíneas a e c do permissivo constitucional, alegando, em síntese, que o aresto combatido, além de ter negado vigência aos arts. 535 do CPC/1973; e, 59 e 919, ambos do CC/2016, divergiu da jurisprudência firmada em outros tribu-nais no sentido de que é devida a multa decendial, no percentual de 2% sobre o valor da indenização devida, para cada decêndio ou fração de atraso, até o limite da obrigação principal.

Discorrem sobre o caráter acessório da multa ao dever reconhecido de pagamento da indenização securitária e da possibilidade de sua cobrança.

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Em decisões monocráticas de minha lavra, foi negado seguimento ao recurso especial manifestado pela seguradora e provido o dos beneficiários, nos termos das seguintes ementas:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – SEGURO HABITACIO-NAL – ALEGAÇÃO DE OFENSA E NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 535, II, DO CPC – OMISSÃO INEXISTENTE – ACÓRDÃO DEVIDAMENTE FUNDA-MENTADO – MULTA DECENDIAL – PREVISÃO CONTRATUAL – CABIMENTO – PRECEDENTES – APELO RARO PARCIALMENTE PROVIDO (e-STJ, fl. 1.996).

E,

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – SEGURO HABITACIO-NAL – AÇÃO PROPOSTA PELOS MUTUÁRIOS/BENEFICIÁRIOS – PRESCRI-ÇÃO DECENAL – PRECEDENTES – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 83 DO STJ – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO A ARGUMENTO ESPECÍFICO – APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DA SÚMULA Nº 283 DO STF – RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO (e-STJ, fl. 2.001).

Nas razões do regimental (e-STJ, fls. 2.010/2.015), a seguradora pede a reforma das decisões hostilizadas, sob a alegação, em síntese, 1) de que a atual jurisprudência desta Corte é de que se aplica o prazo prescricional anual; 2) não há que falar na aplicação da Súmula nº 283 do STF porque houve efetiva im-pugnação de todos os pontos do acórdão recorrido ; e, 3) não existe autorização legal nem contratual para a multa decendial.

Pleiteia, ao final, que a decisão atacada seja reconsiderada por esta eg. Terceira Turma.

A impugnação foi apresentada (e-STJ, fls. 2.019/2.035).

É o relatório.

ementA

CIVIl e proCessual CIVIl – aGraVo reGImental no reCurso espeCIal – seGuro haBItaCIonal – ação proposta pelos BenefICIÁrIos – presCrIção deCenal – preCedentes – InCIdÊnCIa da sÚmula nº 83 do stJ – ausÊnCIa de ImpuGnação a arGumento espeCÍfICo – aplICação, por analoGIa, da sÚmula nº 283 do stf – multa deCendIal – preVIsão Contratual – CaBImento – preCedentes – reCurso maneJado soB a ÉGIde do CpC/1973 – deCIsão mantIda

1. Nos termos da Jurisprudência firmada na Segunda Seção desta Corte Superior, a incidência da prescrição ânua, prevista no art. 206, § 6º, II, do CC/2002, aplica-se somente nas ações ajuizadas pelo segurado

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contra o segurador, não incidindo nas demandas propostas por mutuário de contrato de financiamento imobiliário – regras do Sistema Financeiro de Habitação –, haja vista ser considerado beneficiário do contrato de seguro adjeto ao de mútuo (AREsp 604.330/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 12.11.2014).

2. Existindo argumento capaz de manter o acórdão impugnado por suas próprias pernas, não havendo o ataque específico a tal ponto, atrai-se a incidência, por analogia, da Súmula nº 283 do STF.

3. A jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido de que é devida a multa decendial prevista em contrato quando houver atraso no pagamento da indenização securitária (AgRg-REsp 1.297.908/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 22.09.2014).

4. Não sendo a linha argumentativa apresentada pela seguradora capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos.

5. Inaplicabilidade do NCPC neste julgamento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 2 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

6. Agravo regimental não provido.

voto

O Exmo. Senhor Ministro Moura Ribeiro (Relator):

Versam os autos sobre ação de indenização securitária ajuizada por Altamiro de Souza e outros (beneficiários) contra Sul América Companhia Na-cional de Seguros (seguradora), alegando, em resumo, que adquiriram imóveis da Companhia Habitacional de Bauru, mediante financiamento no Sistema Fi-nanceiro de Habitação; que vinculado a esses contratos, aderiram ao Segu-ro Habitacional, contratado com a ré; que decorridos mais de cinco anos da comercialização, constataram o aparecimento de danos comuns nos imóveis, causados por vícios na construção; que a indenização por tais sinistros está contratualmente segurada pela ré. Pediram, então, a condenação da seguradora

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ao pagamento de indenização avençada em Contrato de Seguro Habitacional celebrado entre as partes.

A ação foi julgada parcialmente procedente para o fim de condenar a seguradora ao pagamento da quantia de R$ 389.100,00 (trezentos e oitenta e nove mil e cem reais), além da multa convencional de 2% (dois por cento), a cada dez dias ou fração de atraso, computada desde o sexagésimo dia após a data do recebimento das Comunicações de Sinistro, limitada ao valor da inde-nização.

O Tribunal de origem, por maioria, deu provimento ao agravo retido ma-nifestado pela seguradora para reconhecer a prescrição, extinguindo o processo com julgamento de mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC/1973, prejudica-do o seu apelo (e-STJ, fls. 1.313/1.324).

Os embargos infringentes opostos pelos mutuários foram acolhidos para restabelecer a sentença, à exceção da multa decendial (e-STJ, fls. 1.375/1.390).

Nas razões do recurso especial, a seguradora alegou, além de dissídio ju-risprudencial, que o aresto impugnado violou os arts. 178, § 6º, II, do CC/2016 ou 206, § 1º, b, do CC/2002, sustentando, em síntese, que na ação do segurado contra o segurador a prescrição é ânua, e não decenal.

Por sua vez, os beneficiários interpuseram recurso especial, com base nas alíneas a e c do permissivo constitucional, alegando, em síntese, que o aresto combatido, além de ter negado vigência aos arts. 535 do CPC/1973; e, 59 e 919, ambos do CC/2016, divergiu da jurisprudência firmada em outros tribu-nais no sentido de que é devida a multa decendial, no percentual de 2% sobre o valor da indenização devida, para cada decêndio ou fração de atraso, até o limite da obrigação principal.

Discorreram sobre o caráter acessório da multa ao dever reconhecido de pagamento da indenização securitária e da possibilidade de sua cobrança.

Em decisões monocráticas de minha lavra, foi negado seguimento ao recurso especial manifestado pela seguradora e provido o dos beneficiários.

É contra essas decisões o presente inconformismo, que, reitere-se, não comporta provimento.

De plano, vale pontuar que as disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são inaplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado Administrativo nº 2 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016:

Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de ad-

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������171

missibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

No mais, a linha argumentativa apresentada pela seguradora é incapaz de evidenciar o desacerto das decisões agravadas.

Nesse contexto, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo dos julgados impugnados, devendo eles serem integralmente mantidos pelos seus próprios fundamentos:

Trata-se de recurso especial interposto por Sul America Companhia Nacional de Seguros, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo que ficou assim emen-tado:

EMBARGOS INFRINGENTES – Seguro habitacional. Divergência quanto ao prazo prescricional. Afastamento da prescrição ânua, adotada pela maioria. Prevalecimento da prescrição vintenária. Contagem, ademais, que tem por termo inicial o inequívoco conhecimento dos danos e da sua extensão, no caso através de laudo pericial. Danos contínuos, outrossim, que se protraem no tempo. Precedentes jurisprudenciais, inclusive desta Câmara, nesse sen-tido. Embargos acolhidos na esteira do r. pronunciamento minoritário (e-STJ, fl. 1.381).

Embargos de declaração opostos e acolhidos (e-STJ, fls. 1.402/1.407).

Nas razões do recurso especial, a seguradora alega, além dissídio jurispruden-cial, que o aresto impugnado violou os arts. 178, § 6º, II, do CC/2016 ou 206, § 1º, b, do CC/2002, sustentando, em síntese, que na ação do segurado contra o segurador a prescrição é ânua, e não decenal.

As contrarrazões foram apresentadas (e-STJ, fls. 1.750/1.772).

O recurso foi admitido na origem (e-STJ, fls. 1.918/1.920).

É o relatório.

Decido.

Versam os autos sobre ação de indenização securitária ajuizada por Altamiro de Souza e outros contra Sul America Companhia Nacional de Seguros, alegando, em resumo, que adquiriram imóveis da Companhia Habitacional de Bauru, me-diante financiamento junto ao Sistema Financeiro de Habitação; que vinculado a esses contratos, aderiram ao Seguro Habitacional, contratado com a ré; que decorridos mais de cinco anos da comercialização, constataram o aparecimento de danos comuns nos imóveis, causados por vícios na construção; que a indeni-zação por tais sinistros está contratualmente segurada pela ré. Pediram, então, a condenação da seguradora ao pagamento de indenização avençada em Contra-to de Seguro Habitacional celebrado entre as partes.

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172 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

A ação foi julgada parcialmente procedente para o fim de condenar a segurado-ra ao pagamento da quantia de R$ 389.100,00 (trezentos e oitenta e nove mil e cem reais), além da multa convencional de 2% (dois por cento), a cada dez dias ou fração de atraso, computada desde o sexagésimo dia após a data do recebi-mento das Comunicações de Sinistro, limitada ao valor da indenização.

O Tribunal de origem, por maioria, deu provimento ao agravo retido manifesta-do pela seguradora para reconhecer a prescrição, extinguindo o processo com julgamento de mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC, prejudicado o seu apelo (e-STJ, fls. 1.313/1.324).

Opostos embargos infringentes pelos mutuários, foram eles acolhidos para resta-belecer a sentença, à exceção da multa decendial (e-STJ, fls. 1.375/1.390), nos termos da ementa suprarreferida.

A irresignação não merece prosperar.

Com relação ao pleito, anotou o acórdão impugnado que:

O r. voto vencido é do seguinte teor:

“DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO – Preservado o relatório dessa dou-ta maioria, dela divirjo, e, assim, por meu voto, dou parcial provimento ao recurso. A propósito, por proêmio, não há que se falar em prescrição ânua no caso em apreço, mas vintenária, haja vista os correspondentes danos no imóvel se terem protraído no tempo. Com efeito, registro que a prescrição ânua se refere à ação do segurado, não à do beneficiário – caso dos ape-lados –, o qual não contratou o seguro. Assim, inaplicável o art. 178, § 6º, II, do Código Civil de 1916, mas, sim, o art. 177 desse diploma, certo tam-bém ‘projetada para o futuro a satisfação do prêmio respectivo, embutido em cada parcela do financiamento habitacional, no cumprimento de aven-ça de trato sucessivo’. Por sinal, ‘Possuindo natureza progressiva, viável a aplicação do art. 177 do Código Civil, que estabelece a prescrição vinte-nária. A respeito, a Súmula nº 124 do antigo Tribunal Federal de Recursos: Prescreve em vinte anos a ação de beneficiário ou de terceiro sub-rogado nos direitos deste, fundada no seguro obrigatório de responsabilidade ci-vil’.” Outrossim, desta Corte, é presente acórdão cuja ementa é de seguinte teor.”PRESCRIÇÃO – Seguro. Contratação por agente financeiro. Regula-mentação por norma do SFH. Inaplicabilidade do art. 178, § 6º, II, do Có-digo Civil. Prescrição vintenária. Danos, ademais, de verificação contínua. Extinção afastada. Recurso provido. Ao seguro contratado pelo agente finan-ceiro e regulado pelas normas do Sistema Financeiro de Habitação não se aplica a prescrição ânua prevista no Código Civil”. Além disso, nego provi-mento ao agravo retido interposto pela ora apelante Sul América Companhia Nacional de Seguros S.A. (folhas 569/583).

[...]

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������173

Pois bem.

Contrastados os entendimentos, fica-se com o pronunciamento minoritário. E não custa declinar as razões.

Os embargantes, fortes em precedentes jurisprudenciais numerosos, inclusi-ve desta Câmara, conforme se vê de suas razões, sustentam que a prescrição é vintenária, atraindo a incidência do art. 177 do antigo CC. Isso porque está-se diante de danos contínuos, nem sempre passíveis de pronta aferição. Vale dizer, são danos que se protraem no tempo, impossibilitando a exata definição do ter-mo inicial da prescrição.

Ademais, não se tem notícia de eventual reconhecimento dos danos, nem de resposta à comunicação dos segurados. É um descaso ao aviso de sinistro. Mas o que é mais importante ainda é a necessidade da realização da prova pericial, pois é a partir dela que se tem a inequívoca ciência dos danos e da sua exten-são. No caso, esse conhecimento ficou manifesto diante da prova pericial.

Tudo isso considerado, a prescrição ânua é afastada, dando-se prevalência ao r. voto minoritário (e-STJ, fls. 1.383/1.386 – sem destaques no original).

A propósito, nos termos da Jurisprudência firmada na Segunda Seção desta Cor-te Superior, a incidência da prescrição ânua, prevista no art. 206, § 6º, II, do CC/2002, aplica-se somente nas ações ajuizadas pelo segurado contra o segura-dor, não incidindo nas demandas propostas por mutuário de contrato de finan-ciamento imobiliário – regras do Sistema Financeiro de Habitação –, haja vista ser considerado beneficiário do contrato de seguro adjeto ao de mútuo (AREsp 604.330/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 12.11.2014).

Confiram-se, ainda, os seguintes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – SEGURO HABITACIO-NAL – PRESCRIÇÃO DE VINTE ANOS (ART. 177 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916) – PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL COM DETERMINAÇÃO DE RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM

I – Reconhecimento pela decisão monocrática recorrida de que o prazo prescricional para reclamar possível defeito no imóvel adquirido sob o regi-me do SFH é de 20 anos. Precedentes do STJ.

Omissis.

IV – Agravo regimental desprovido.

(AgRg-REsp 963.306/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª T., DJe 15.04.2011 – sem destaques no original)

AGRAVO REGIMENTAL – AÇÃO ORDINÁRIA DE RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL SECURITÁRIA – SFH – PRESCRIÇÃO ÂNUA – INAPLICA-BILIDADE – SEGURO HABITACIONAL OBRIGATÓRIO – RESPONSABILI-

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174 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

DADE DA SEGURADORA – RECONHECIMENTO – PRECEDENTES – RE-CURSO IMPROVIDO.

(AgRg-Ag 1.127.448/RS, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ª T., DJe 16.03.2011 – sem destaques no original)

AGRAVO REGIMENTAL – PROCESSO CIVIL – EMBARGOS DE DECLARA-ÇÃO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – FUNGIBILIDADE RECURSAL PRA-ZO PRESCRICIONAL – ART. 177 DO CC/1916 – RECURSO MANIFESTA-MENTE IMPROCEDENTE – MULTA – ART. 557, § 2º, CPC

1. Omissis.

2. O prazo prescricional para as ações de indenização por danos de vícios de construção, nos contratos envolvendo mutuários do Sistema Financeiro da Habitação é o previsto no art. 177 do CC/1916.

3. Omissis.

4. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, a que se nega provimento. Aplicação de multa de 5% sobre o valor corrigido da causa.

(EDcl-REsp 996.494/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 4ª T., DJe 19.08.2010 – sem destaques no original)

Tem aplicação, portanto, a Súmula nº 83 desta Corte.

Além do mais, da leitura atenta das razões trazidas no recurso especial, observo que a seguradora não cuidou de afastar o fundamento de que o mais importante ainda é a necessidade da realização da prova pericial, pois é a partir dela que se tem a inequívoca ciência dos danos e da sua extensão (e-STJ, fl. 1.386).

Portanto, em se de tratando de argumento capaz de manter o acórdão impugna-do por si só, não havendo o ataque específico a tal ponto, atrai-se a incidência, por analogia, da Súmula nº 283 do STF, que estabelece que é inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fun-damento suficiente e o recurso não abrange todos eles.

A propósito, citam-se os seguintes julgados:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – RECUR-SO PROTOCOLADO VIA FAX – ART. 2º DA LEI Nº 9.800/1999 – NÃO IM-PUGNAÇÃO ESPECÍFICA DE FUNDAMENTO AUTÔNOMO – SÚMULA Nº 283/STF – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL – SÚMULA Nº 83/STJ – AFERIÇÃO DA DATA DE PROTOCOLO – SÚMULA Nº 7/STJ

1. A não impugnação específica dos fundamentos da decisão recorrida sufi-cientes para mantê-la enseja o não conhecimento do recurso. Incidência da Súmula nº 283 do STF.

Omissis.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������175

4. Agravo regimental parcialmente conhecido e desprovido.

(AgRg-AREsp 673.529/ES, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 28.08.2015 – sem destaques no original)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMEN-TOS DA DECISÃO AGRAVADA – SÚMULA Nº 283/STF – INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULA E REEXAME DE PROVA – SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – INVIA-BILIDADE – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO

1. A ausência de impugnação dos fundamentos do aresto recorrido enseja a incidência, por analogia, da Súmula nº 283 do Supremo Tribunal Federal.

Omissis.

4. Agravo regimental não provido.

(AgRg-AREsp 643.078/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., DJe 02.09.2015 – sem destaques no original)

Nessas condições, nego seguimento ao Recurso Especial.

Publique-se.

Intimem-se.

E,

Trata-se de recurso especial interposto por Altamiro de Souza e outros, com fun-damento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão proferi-do pelo Tribunal de Justiça de São Paulo que ficou assim ementado:

EMBARGOS INFRINGENTES – Seguro habitacional. Divergência quanto ao prazo prescricional. Afastamento da prescrição ânua, adotada pela maioria. Prevalecimento da prescrição vintenária. Contagem, ademais, que tem por termo inicial o inequívoco conhecimento dos danos e da sua extensão, no caso através de laudo pericial. Danos contínuos, outrossim, que se protraem no tempo. Precedentes jurisprudenciais, inclusive desta Câmara, nesse sen-tido. Embargos acolhidos na esteira do r. pronunciamento minoritário (e-STJ, fl. 1.381).

Embargos de declaração opostos e acolhidos (e-STJ, fls. 1.402/1.407).

Os mutuários alegam, em síntese, que o aresto combatido, além de ter negado vigência aos arts. 535 do CPC; e, 59 e 919, ambos do CC/2016, divergiu da juris-prudência firmada em outros tribunais no sentido de que é devida a multa decen-dial, no percentual de 2% (dois por cento) sobre o valor da indenização devida, para cada decêndio ou fração de atraso, até o limite da obrigação principal.

Discorrem sobre o caráter acessório da multa, ao dever reconhecido de paga-mento da indenização securitária, e da possibilidade de sua cobrança.

As contrarrazões foram apresentadas (e-STJ, fls. 1.795/1.798).

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176 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

O recurso foi admitido na origem (e-STJ, fls. 1.921/1.923).

É o relatório.

Decido.

Versam os autos sobre ação de indenização securitária ajuizada por Altamiro de Souza e outros contra Sul America Companhia Nacional de Seguros, alegando, em resumo, que adquiriram imóveis da Companhia Habitacional de Bauru, me-diante financiamento junto ao Sistema Financeiro de Habitação; que vinculado a esses contratos, aderiram ao Seguro Habitacional, contratado com a ré; que decorridos mais de cinco anos da comercialização, constataram o aparecimento de danos comuns nos imóveis, causados por vícios na construção; que a indeni-zação por tais sinistros está contratualmente segurada pela ré. Pediram, então, a condenação da seguradora ao pagamento de indenização avençada em Contra-to de Seguro Habitacional celebrado entre as partes.

A ação foi julgada parcialmente procedente para o fim de condenar a segurado-ra ao pagamento da quantia de R$ 389.100,00 (trezentos e oitenta e nove mil e cem reais), além da multa convencional de 2% (dois por cento), a cada dez dias ou fração de atraso, computada desde o sexagésimo dia após a data do recebi-mento das Comunicações de Sinistro, limitada ao valor da indenização.

O Tribunal de origem, por maioria, deu provimento ao agravo retido manifesta-do pela seguradora para reconhecer a prescrição, extinguindo o processo com julgamento de mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC, prejudicado o seu apelo (e-STJ, fls. 1.313/1.324).

Opostos embargos infringentes pelos mutuários, foram eles acolhidos para resta-belecer a sentença, à exceção da multa decendial (e-STJ, fls. 1.375/1.390), nos termos da ementa suprarreferida.

A irresignação merece, em parte, prosperar.

Destaco, de início, que não há falar em negativa de prestação jurisdicional, ten-do em vista que o Tribunal de origem, ao acolher os embargos de declaração opostos pelos mutuários, bem destacou que para se ter a matéria como preques-tionada, não se exige o ‘pronunciamento explícito’ acerca dos dispositivos le-gais tidos como afrontados (e-STJ, fl. 1.406).

Desse modo, é de se afastar a alegada violação do art. 535 do CPC.

Nesse sentido, vejam-se:

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRA-VO EM RECURSO ESPECIAL – RECURSO INCAPAZ DE ALTERAR O JUL-GADO – PREVIDÊNCIA PRIVADA – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – REVO-GAÇÃO – IRREPETIBILIDADE – VERBA ALIMENTAR – SÚMULA Nº 83/STJ – INCIDÊNCIA – JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE – ART. 535 DO CPC – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO – SÚMULA Nº 126/STJ – APLICAÇÃO

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������177

Omissis.

3. Não subsiste a alegada ofensa ao artigo 535 do CPC, pois o tribunal de origem enfrentou as questões postas, não havendo no aresto recorrido omis-são, contradição ou obscuridade.

4. Omissis.

5. Agravo regimental não provido.

(AgRg-EDcl-AREsp 101.836/RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., DJe 05.09.2014)

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE – NÃO OCORRÊNCIA – REEXAME DE FATOS E PROVAS – INADMISSIBILI-DADE – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL – COTEJO ANALÍTICO E SIMILITU-DE FÁTICA – AUSÊNCIA

1. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de decla-ração.

Omissis.

4. Agravo não provido.

(AgRg-REsp 1.445.492/RS, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 01.09.2014)

No mais, o Tribunal de origem, no que tange à multa decendial, reformou a sentença, afastando-a, ao fundamento de que a multa foi ajustada entre finan-ciadora e seguradora (e-STJ, fl. 1.384), não atingindo os mutuários de forma que a previsão a esse título não pode ser revertida em proveito destes últimos (bene-ficiários).

Verifica-se que o acórdão recorrido vai de encontro com a jurisprudência pa-cífica desta Corte no sentido de que é devida a multa decendial prevista em contrato quando houver atraso no pagamento da indenização securitária (AgRg--REsp 1.297.908/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 22.09.2014).

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL – SEGURO HABITACIONAL – AUSÊNCIA DE DIS-CUSSÃO EM TORNO DA CLÁUSULA DE COBERTURA DO FCVS – COM-PETÊNCIA DAS TURMAS DA SEGUNDA SEÇÃO – MULTA DECENDIAL – CABIMENTO – CARÊNCIA DE AÇÃO – NÃO OCORRÊNCIA – PRESCRI-ÇÃO – INOVAÇÃO RECURSAL

1. Omissis.

2. A multa decendial prevista em contrato é devida quando houver atraso no pagamento da indenização securitária, ficando limitada ao valor da obriga-ção principal.

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178 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

Omissis.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg-AREsp 59.338/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 12.12.2014)

AGRAVO REGIMENTAL – AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – SEGURO HABITACIONAL – VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO – FORMAÇÃO DE LITIS-CONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO COM A CEF – DESNECESSIDADE – ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA SEGURADORA E AUSÊNCIA DE COBERTURA PARA OS VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO ENCONTRADOS – INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULA E REEXAME DE PROVA – DESCABI-MENTO – SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – MULTA DECENDIAL – CABIMENTO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – LIMITAÇÃO – INSUBSISTÊNCIA DA LEI Nº 1.060/1950 EM RELAÇÃO AO CPC

Omissis.

4. Segundo precedentes desta Corte, a multa decendial, devida em função do atraso no pagamento da indenização objeto do seguro obrigatório, nos contratos vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, é devida aos mu-tuários, dado o caráter acessório que ostenta em relação à indenização se-curitária e deve estar limitada ao valor da obrigação principal.

5. Omissis.

6. Agravo Regimental improvido.

(AgRg-AREsp 377.520/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., DJe 04.11.2013)

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO (ART. 544, CPC) – AÇÃO DE INDE-NIZAÇÃO SECURITÁRIA – AUSÊNCIA DE INTERESSE DA CEF POR INEXIS-TIR LESÃO AO FCVS – RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA PELOS VÍCIOS DA CONSTRUÇÃO – APLICABILIDADE DO CDC – MULTA DE-CENDIAL CORRETAMENTE APLICADA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – IRRESIG-NAÇÃO DA SEGURADORA

Omissis.

4. A multa decendial pactuada para o atraso do pagamento da indenização é limitada ao montante da obrigação principal.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg-AREsp 189.388/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª T., DJe 23.10.2012)

RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – SEGURO HABITACIONAL – MULTA DECENDIAL – LEGALIDADE DE SUA COBRANÇA QUANDO PREVISTA NO CONTRATO – LIMITAÇÃO PELO VALOR DA OBRIGA-

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������179

ÇÃO PRINCIPAL – ART. 920 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 – RECURSO PROVIDO

É devida a multa decendial, pactuada entre as partes para o caso de atra-so do pagamento da indenização, limitada ao valor da obrigação principal (art. 920 do Código Civil de 1916).

Recurso provido.

(REsp 870.358/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., DJe 07.05.2009)

Nessas condições, dou parcial provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença.

Publique-se.

Em resumo, nos termos da Jurisprudência firmada na Segunda Seção des-ta Corte Superior, a incidência da prescrição ânua, prevista no art. 206, § 6º, II, do CC/2002, aplica-se somente nas ações ajuizadas pelo segurado contra o segurador, não incidindo nas demandas propostas por mutuário de contrato de financiamento imobiliário – regras do Sistema Financeiro de Habitação –, haja vista ser considerado beneficiário do contrato de seguro adjeto ao de mútuo (AREsp 604.330/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 12.11.2014).

Ademais, da leitura atenta das razões trazidas no recurso especial, ob-serva-se que existe argumento capaz de manter o acórdão impugnado por suas próprias pernas – fundamento de que o mais importante ainda é a necessidade da realização da prova pericial, pois é a partir dela que se tem a inequívoca ciência dos danos e da sua extensão (e-STJ, fl. 1.386) –, não havendo o ataque específico a tal ponto, atrai-se a incidência, por analogia, da Súmula nº 283 do STF.

A impugnação específica quanto ao tema é, no caso, capaz de manter o acórdão por si só, porquanto esta Corte entende que, sendo os danos ao imóvel de natureza sucessiva e gradual, sua progressão dá azo a inúmeros sinistros sujeitos à cobertura securitária, renovando seguidamente a pretensão do be-neficiário do seguro e, por conseguinte, o marco inicial do prazo prescricional (REsp 1.143.962/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 09.04.2012).

Por derradeiro, a jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido de que é devida a multa decendial prevista em contrato quando houver atraso no pa-gamento da indenização securitária (AgRg-REsp 1.297.908/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 22.09.2014).

Nesse sentido, veja-se o seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – CONTRATO DE SEGURO VINCULADO AO SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL – ALEGAÇÃO DE

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180 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

INEXISTÊNCIA DE COBERTURA SECURITÁRIA NA APÓLICE – INCIDÊNCIA DOS ÓBICES DAS SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – APLICAÇÃO DE MULTA DECEN-DIAL – POSSIBILIDADE – ATRASO NO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO – SÚMULA Nº 83/STJ – AGRAVO NÃO PROVIDO

1. Omissis.

2. Quanto à aplicação da multa decendial, faz-se mister ressaltar que a Corte de origem asseverou que, além de devida, é limitada ao valor da obrigação prin-cipal. Não se pode olvidar que, ao assim decidir, o Tribunal a quo, no ponto, orientou-se em conformidade com o entendimento promanado por esta Corte Superior, cuja posição é no sentido de que é devida a multa decendial em fun-ção do atraso no pagamento da indenização, objeto do seguro obrigatório, nos contratos vinculados ao SFH.

Incide, na espécie, pois, a Súmula nº 83/STJ.

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg-REsp 1.433.439/PR, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe 18.12.2015 – sem destaque no original)

Advirta-se que eventual recurso interposto contra este acórdão estará sujeito às normas do NCPC, inclusive no que tange ao cabimento de multa (arts. 1.021, § 4º e 1.026, § 2º) e honorários recursais (art. 85, § 11).

Nessas condições, pelo meu voto, nego provimento ao agravo regi mental.

certidÃo de JulGAmento terceirA turmA

Número Registro: 2013/0386754-6 AgRg-REsp 1.425.311/SP

Números Origem: 1532008 3330120080008670 6567794800 6567799 91813938420098260000 994093324874

Em Mesa Julgado: 23.06.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AutuAÇÃo

Recorrente: Altamiro de Souza e outros

Advogados: Rubens Leal Santos João Batista Xavier da Silva e outro(s)

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������181

Guilherme Lima Barreto e outro(s) Ricardo Bianchini Mello e outro(s) Felipe Martins Flores e outro(s)

Recorrente: Sul America Companhia Nacional de Seguros

Advogados: Rubens Leal Santos e outro(s) Nelson Luiz Nouvel Alessio e outro(s) Diogo Azevedo Batista de Jesus e outro(s) Raphael Saydi Macedo Mussi e outro(s) Miguel Cancella Nabuco

Recorrido: os mesmos

Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Sistema financeiro da habitação – Seguro

AGrAvo reGimentAl

Agravante: Sul America Companhia Nacional de Seguros

Advogados: Rubens Leal Santos e outro(s) Nelson Luiz Nouvel Alessio e outro(s) Diogo Azevedo Batista de Jesus e outro(s) Raphael Saydi Macedo Mussi e outro(s) Miguel Cancella Nabuco

Agravado: Altamiro de Souza e outros

Advogados: Rubens Leal Santos João Batista Xavier da Silva e outro(s) Guilherme Lima Barreto e outro(s) Ricardo Bianchini Mello e outro(s) Felipe Martins Flores e outro(s)

certidÃo

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Jurisprudência

8758

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoApelação Cível nº 0037897‑60.2011.4.01.3800/MGRelator(a): Juiz Federal Emmanuel Mascena de MedeirosApelante: Maria Virginia Ferreira CoelhoAdvogado: MG00042579 – Maria da Conceição Carreira Alvim e outros(as)Apelado: União FederalProcurador: AL00005348 – José Roberto Machado Farias

ementA

proCessual CIVIl – ImpuGnação ao pedIdo de assIstÊnCIa JudICIÁrIa GratuIta – afIrmação de hIpossufICIÊnCIa – renda lÍQuIda InferIor a deZ salÁrIos mÍnImos – ConCessão do BenefÍCIo – apelação proVIda

1. Trata-se de recurso de apelação interposto por Maria Virginia Ferreira Coelho contra sentença que, em sede de impugnação à assistência judiciária oposto pela União Federal, julgou procedente o pedido e revogou a gratuidade judiciária anteriormente deferida à impugnada.

2. O entendimento firmado sobre o tema no âmbito da 1ª Seção deste Tribunal é no sentido de que, para o deferimento da assistência judiciária gratuita, é necessário que a parte interessada afirme, de próprio punho ou por intermédio de advogado legalmente constituído, que não tem condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do sustento próprio ou da família. De tal afirmação resultaria presunção juris tantum de miserabilidade jurídica a qual, para ser afastada, necessita de prova inequívoca em sentido contrário.

3. De outro lado, assentou, também, a 1ª Seção, que tal benefício deverá ser concedido ao requerente que perceba mensalmente valores líquidos de até dez salários, em face da presunção de pobreza que milita em seu favor. Requisitos demonstrados na espécie dos autos. Precedentes: (Ag 2004.01.00.012796-2/BA, Rel. Juiz Federal Lincoln Rodrigues de Faria (Conv), 2ª T., DJ de 07.11.2005, p. 25) (AR 2005.01.00.034515-7/RO; Ação Rescisória, Rel. Des. Fed. Aloísio Palmeira Lima, Conv.: Juíza Fed. Monica Neves Aguiar da Silva, Órgão Julgador: 1ª S., Publicação: 15.06.2007 DJ p.4, Data da Decisão: 05.06.2007).

4. O magistrado a quo consignou na sentença que a impugnada Ma-ria Virgínia Ferreira Coelho percebe rendimento bruto no montante de

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������183

R$ 6.870,24, cuja envergadura seria bastante para afastar a presunção de miserabilidade legalmente prevista. Observa-se, pois, que a sentença não está em consonância com a orientação jurisprudencial firmada por esta Corte, que considera o rendimento líquido percebido pela parte e não o rendimento bruto.

5. Apelação provida.

AcÓrdÃo

Decide a Primeira Turma do TRF da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da impugnada, nos termos do voto do juiz relator.

Brasília, 15 de junho de 2016.

Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros Juiz Federal – Relator Convocado

relAtÓrio

O Exmo. Sr. Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros (Relator Con-vocado):

Trata-se de recurso de apelação interposto por Maria Virginia Ferreira Coelho contra sentença que, em sede de impugnação à assistência judiciária oposto pela União Federal, julgou procedente o pedido e revogou a gratuidade judiciária anteriormente deferida à impugnada.

Em suas razões recursais, a apelante alega que, para a concessão da gra-tuidade judiciária, é suficiente a simples declaração da parte de que não tem condições de arcar com as custas processuais sem prejuízo do sustento próprio, não tendo a Lei nº 1.060/1950 ou a CF/1988 condicionado o deferimento do benefício apenas às pessoas que apresentem condições de miserabilidade.

Contrarrazões apresentadas, foram os autos remetidos ao Tribunal.

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros (Relator Con-vocado):

O presente processo está vinculado ao Projeto Piloto de Aceleração de Julgamentos do Conselho Nacional de Justiça.

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184 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

Referido programa tem relevância constitucional no que diz respeito ao princípio da razoável duração do processo e o regime de julgamento das cau-sas que lhe foram atribuídas, segue regramentos, metodologia e metas a serem alcançadas, destacando-se a Portaria CNJ nº 17/2015.

mÉrIto

O entendimento firmado sobre o tema no âmbito da 1ª Seção deste Tri-bunal é no sentido de que, para o deferimento da assistência judiciária gratuita, é necessário que a parte interessada afirme, de próprio punho ou por intermédio de advogado legalmente constituído, que não tem condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do sustento próprio ou da família. De tal afir-mação resultaria presunção juris tantum de miserabilidade jurídica a qual, para ser afastada, necessita de prova inequívoca em sentido contrário.

De outro lado, assentou, também, a 1ª Seção, que tal benefício deverá ser concedido ao requerente que perceba mensalmente valores líquidos de até dez salários, em face da presunção de pobreza que milita em seu favor.

Confiram-se, a propósito, os seguintes julgados:

PROCESSO CIVIL – JUSTIÇA GRATUITA – PEDIDO EXPRESSO NA PETIÇÃO INICIAL – LEI Nº 1.060/1950, ART. 4º – ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA NÃO PODE SER NEGADA

I – “A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família” (Lei nº 1.060/1950, art. 4º, com redação dada pela Lei nº 7.510, de 04.07.1986).

II – Não repelidas as alegações da parte autora, com dados concretos, não há que se falar em negativa do seu direito aos benefícios da Assistência Judiciária Gratuita.

III – Rendimento líquido mensal inferior a 10 (dez) salários mínimos.

IV – Precedentes desta Corte e do colendo Supremo Tribunal Federal.

V – Agravo provido.

(Ag 2004.01.00.012796-2/BA, Rel. Juiz Federal Lincoln Rodrigues de Faria (Conv), 2ª T., DJ de 07.11.2005, p. 25)

CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – AÇÃO RESCISÓRIA – SERVIDOR PÚBLICO CIVIL – FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE (FUNASA) – REAJUSTE DE 28,86% – LEIS NºS 8.622/1993 E 8.627/1993 – ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO – RECONHECIMENTO DE OFÍCIO – JUSTIÇA GRATUITA – DEFE-RIMENTO

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������185

1. Fundação Pública, equiparada à autarquia, dotada de personalidade jurídi-ca própria e autonomia administrativa, tem legitimidade passiva para figurar na causa em que se discute a concessão de reajuste vencimental.

2. A União é parte ilegítima em ação na qual servidor do quadro de pessoal da Fundação Nacional de Saúde pleiteia reajuste de vencimentos.

3. Entendimento desta Seção de que a assistência judiciária deve ser deferida ao requerente que perceba menos de dez salários mínimos mensais.

4. Ação rescisória procedente para, reconhecendo a ilegitimidade passiva da União.

(AR 2005.01.00.034515-7/RO, Ação Rescisória, Rel. Des. Fed. Aloísio Palmeira Lima, Convocado: Juíza Fed. Monica Neves Aguiar da Silva, Órgão Julgador: 1ª S., Publicação: 15.06.2007 DJ p. 4, Data da Decisão: 05.06.2007)

O magistrado a quo consignou na sentença que a impugnada Maria Vir-gínia Ferreira Coelho percebe rendimento bruto no montante de R$ 6.870,24, cuja envergadura seria bastante para afastar a presunção de miserabilidade le-galmente prevista.

Observa-se, pois, que a sentença não está em consonância com a orien-tação jurisprudencial firmada por esta Corte, que considera o rendimento líqui-do percebido pela parte e não o rendimento bruto.

Pela análise da ficha financeira acostada aos presentes autos, verifica--se que a impugnada, em agosto de 2010, percebeu rendimento líquido de R$ 5.462,95 (fl. 24).

Considerando que o valor do salário mínimo, à época do julgamento do incidente de impugnação (03.04.2012), era de R$ 622,00, resta comprova-do que os rendimentos líquidos mensais da impugnada Maria Virgínia Ferreira Coelho eram inferiores a 10 (dez) salários mínimos (R$ 6.220,00), fato que per-mite o enquadramento da autora na condição de hipossuficiente, consoante precedentes desta Corte.

Vale ressaltar, como é fato notório, que o reajuste do salário-mínimo no decorrer dos anos foi muito superior ao reajuste concedido aos servidores dos diversos ramos do Poder Público, sendo certo que a renda líquida da impugna-da continuou abaixo dos 10 (dez) salários mínimos.

Assim, existindo prova documental que demonstra a condição financeira da impugnada dentro dos critérios para a concessão da gratuidade judiciária, deve ser reformada a decisão guerreada para assegurar a Maria Virgínia Ferreira Coelho o deferimento do benefício.

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ConClusão

Ante o exposto, dou provimento à apelação da impugnada, para, refor-mando a decisão recorrida, conceder a Maria Virgínia Ferreira Coelho o bene-fício da assistência judiciária gratuita.

É como voto.

tribunAl reGionAl FederAl dA 1ª reGiÃo secretAriA JudiciÁriA

19ª Sessão Ordinária do(a) Primeira Turma

Pauta de: 15.06.2016 Julgado em: 15.06.2016

Ap 0037897-60.2011.4.01.3800/MG

Relator: Exmo. Sr. Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros

Revisor: Exmo(a). Sr(a).

Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas

Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Bruno Caiado de Acioli

Secretário(a): Lilio da Silva Ramos

Apte.: Maria Virginia Ferreira Coelho

Adv.: Maria da Conceição Carreira Alvim e outros(as)

Apdo.: União Federal

Procur.: José Roberto Machado Farias

Nº de Origem: 378976020114013800 Vara: 13ª

Justiça de Origem: Justiça Federal Estado/Com.: MG

sustentAÇÃo orAl certidÃo

Certifico que a(o) egrégia(o) Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, à unanimidade, julgou nos termos do voto do Relator.

Participaram do Julgamento os Exmos. Srs. Juiz Federal Cleberson José Rocha e Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas.

Brasília, 15 de junho de 2016.

Lilio da Silva Ramos Secretário(a)

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Parte Geral – Jurisprudência

8759

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoApelação Cível – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0000153‑31.2009.4.02.5107 (2009.51.07.000153‑5)Relator: Desembargadora Federal Nizete Lobato CarmoApelante: CEF – Caixa Econômica FederalAdvogado: Cristina Cidade da Silva Guimarães Wanis e outrosApelado: Lomani Materiais de Limpeza Ltda. e outroAdvogado: sem advogadoOrigem: 02ª Vara Federal de Itaboraí (00001533120094025107)

ementA

proCesso CIVIl – apelação – exeCução por tÍtulo extraJudICIal – Contrato de emprÉstImo – fat – deVedores CItados – emBarGos – aBandono da Causa – extInção – ImpossIBIlIdade – sÚmula nº 240 do stJ – InexIstÊnCIa de reQuerImento dos exeCutados

1. A sentença extinguiu a execução, art. 267, III, do CPC/1973, conven-cido o Juízo do abandono da causa, pois a exequente, intimada pesso-almente para comprovar diligências em busca de bens dos devedores, quedou-se inerte.

2. A inércia em promover o andamento do processo enquadra-se, em princípio, no art. 267, III, do CPC, mas exige – além do cumprimento da norma do § 1º, que estabelece a prévia intimação pessoal da parte para suprir a falta em 48 horas, à vista da citação positiva da sociedade execu-tada, por oficial de justiça, e da sócia, por edital, inclusive com oposição de embargos à execução pela DPU, Curadora Especial –, o requerimento da parte executada por aplicação da Súmula nº 240/STJ. Precedentes.

3. A Súmula nº 240 do STJ preconiza que “a extinção do processo, por abandono da causa pelo autor, depende de requerimento do réu” aplica--se nas hipóteses em que a execução for embargada pelo executado.

4. Não se aplica à hipótese a sistemática estabelecida pelo CPC/2015, art. 85, que não vigorava na data da publicação da sentença, força dos arts. 14 e 1.046 e orientação adotada no Enunciado Administrativo nº 7, do STJ.

5. Apelação provida.

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AcÓrdÃo

Decide a Sexta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da Segunda Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, na forma do voto da Relatora.

Rio de Janeiro, 29 de junho de 2016.

Assinado eletronicamente (Lei nº 11.419/2006) Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo Desembargadora Federal

relAtÓrio

A Caixa apela1 da sentença2 que extinguiu a execução de título extra-judicial, proposta em abril/2009, no valor de R$ 20.609,78, art. 267, III, do CPC/19733, alegando flagrante inobservância do § 1º do art. 267 do CPC/19734, pela falta de intimação pessoal para dar andamento ao feito, pena de extinção, bem como a falta de requerimento do Réu, nos termos da Súmula nº 240/STJ5.

Contrarrazões à fl. 177. Sem parecer ministerial.

É o relatório.

Assinado eletronicamente (Lei nº 11.419/2006) Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo Desembargadora Federal

voto

Conheço da apelação de janeiro/2016, observando as diretrizes dos arts. 14 e 1.046 do CPC/2015, e a teoria do isolamento dos atos processuais6 e7.

1 Fls. 167/171.2 Fl. 28.3 Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: III – quando, por não promover os atos e diligências

que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;4 Art. 267, § 1º O juiz ordenará, nos casos dos nºs II e III, o arquivamento dos autos, declarando a extinção do

processo, se a parte, intimada pessoalmente, não suprir a falta em 48 (quarenta e oito) horas.5 Súmula nº 240/STJ: “a extinção do processo, por abandono da causa pelo autor, depende de requerimento do

réu”.6 Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados

os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.

Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

7 “No direito brasileiro predomina a teoria do isolamento dos atos processuais, segundo a qual sobrevindo lei processual nova, os atos ainda pendentes dos processos em curso sujeitar-se-ão aos seus comandos,

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������189

A sentença do Juiz Federal Carlos Adriano Bandeira deve ser reformada.

A Caixa propôs, em abril/2009, esta execução por título extrajudicial em face de Lomani Materiais de Limpeza Ltda. e Marize Sigmaringa de Souza, por inadimplência do Contrato de Empréstimo – Financiamento com Recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), de R$ 20.609,78.

A sociedade empresária foi citada em junho/2009 na pessoa do repre-sentante legal, Telmo Sigmaringa de Souza8, mas a sócia Marize Sigmaringa, co-executada, não foi localizada9.

Na diligência constritiva não foram encontrados bens penhoráveis. A ofi-ciala de justiça certificou10 que Telmo Sigmaringa, sócio e sobrinho de Marize Sigmaringa, afirmou que tentaria renegociar a dívida.

Após novas buscas para sua localização11, a executada Marize foi final-mente citada, por edital, em janeiro/201112.

Frustrados o bloqueio pelo Bacen-Jud13 e a restrição de veículos via Re-najud14, a DPU, em junho/2014, designada para atuar como Curadora Especial na defesa da executada citada por edital15 – opôs embargos à execução em julho/201516, mas a inicial foi indeferida em abril/201617, depois da sentença ora apelada, de dezembro/2015.

Em dezembro/2014 o feito foi suspenso por 60 dias para a Caixa in-dicar bens penhoráveis18, prorrogados por mais 10, em março/201519 e, em agosto/2015, mais 5 dias, para comprovar as diligências adotadas, pena de ex-tinção20. Em outubro/2015, negado o pedido de acesso ao Infojud, foi instada a comprovar as certidões que prometeu obter nos 5º e 6º Ofícios da Capital e 1º

respeitada a eficácia daqueles já praticados de acordo com a legislação revogada.” (STJ, REsp 1365272, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., DJe 13.11.2013)

Fosse pouco, o STJ editou o Enunciado Administrativo nº 2, do seguinte teor: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.”

8 Cf. Certidão do oficial de justiça à fl. 67.9 Cf. Certidão do oficial de justiça à fl. 71.10 Fl. 88.11 Fl. 89.12 Fls. 94/96.13 Fls. 116/118.14 Fls. 131/133.15 Fl. 131.16 Fl. 148.17 Processo nº 0000196-55.2015.4.02.5107.18 Fl. 142.19 Fl. 146.20 Fl. 150.

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e 2º Ofícios de Itaboraí21, pena de se configurar abandono material da causa, art. 267, III, do CPC/1973.

A Caixa não se manifestou e o processo foi extinto, sem resolução do mérito, na forma do art. 267, III, do CPC/1973.

Em primeiro lugar, angularizada a relação processual, a inércia em pro-mover o andamento do processo, art. 267, III, do CPC/197322, observado o § 1º, que exige a prévia intimação pessoal da parte para suprir a falta23, cf. certidão de fl. 162, impõe-se, ainda, requerimento do réu, consoante Súmula nº 240/STJ24, quando opostos embargos à execução25.

À vista da citação positiva da sociedade empresária, por oficial de justi-ça, e da sócia Marize Sigmaringa, por edital, descabe a extinção, de ofício, por abandono, facultando-se “[...] ao demandado opor-se à extinção da demanda por não ser a ação um direito apenas do autor, mas também parte passiva, em determinadas circunstâncias” (STJ, 4ª T., REsp 1355277/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 01.02.2016).

Veja-se o precedente deste Tribunal26:

21 Fl. 141.22 Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: II – quando ficar parado durante mais de 1 (um)

ano por negligência das partes;

III – quando, por não promover os atos e diligências que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;

§ 1º O juiz ordenará, nos casos dos nos II e III, o arquivamento dos autos, declarando a extinção do processo, se a parte, intimada pessoalmente, não suprir a falta em 48 (quarenta e oito) horas.

23 TRF 2ª R., 6ª T.Esp., AC 201051170019060, Relª Desª Fed. Nizete Lobato Carmo, J. 24.06.2013.

TRF 2ª R., 6ª T.Esp., AC 200551010021329, Rel. Des. Fed. Guilherme Couto, e-DJF2R 07.03.2012.

TRF 2ª R., 7ª T.Esp., AC 200551010237867, Rel. Des. Fed. José A. Neiva, e-DJF2R 18.03.2011.24 “A extinção do processo, por abandono da causa pelo autor, depende de requerimento do réu.”25 [...] 4. Deve ser afastada a incidência da Súmula nº 240 do STJ (A extinção do processo, por abandono da

causa pelo autor, depende de requerimento do réu), pois não há sentido em se condicionar a extinção do processo com base do art. 267, III, do CPC à necessidade de prévio requerimento por parte do executado que, apesar de citado, não têm razão para se opor ao fim do processo, eis que, somente após o bloqueio de ativos via Bacen-Jud é que este apresentou impugnação à execução (recebida como exceção de pré-executividade). 5. A execução não foi embargada pelo executado, sendo permitido ao julgador decretar, de ofício, a extinção do feito por abandono da causa pelo autor, independentemente de pedido do réu, consoante jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça. 6. Intimada pessoalmente a apelante, com a advertência prevista no art. 267, § 1º, do CPC (Lei nº 5.869/1973), para dar prosseguimento à execução de título extrajudicial, a recorrente deixou decorrer o prazo sem manifestação. A sentença de extinção deve ser mantida. (TRF 2ª R., AC 1900.51.01.734554-7, Rel. Des. Fed. José Antonio Neiva, 7ª T.Esp., e-DJF2R 15.04.2016)

[...] 4. Às execuções não embargadas é inaplicável a Súmula nº 240 do STJ. Precedentes da Corte Superior. 5. Apelação desprovida. (TF 2ª R., AC 2014.51.20.002901-8, Relª Desª Fed. Nizete Lobato Carmo, e-DJF2R 17.03.2016)

26 E também de outros TRFs:

[...] 1. É vedado ao juiz extinguir o feito sem antes intimar o autor nos termos do § 1º do art. 267. 2. A Súmula nº 240 do STJ (“A extinção do processo, por abandono da causa pelo autor, depende de requerimento do réu.”) é aplicável em hipóteses em que a parte executada citada, ofereceu defesa, mediante embargos, ou outra via impugnativa. (TRF 4ª R., AC 200971990062085, 1ª T., Relª Desª Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrère, DE 07.07.2011)

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������191

PROCESSO CIVIL – APELAÇÃO – CPC/1973 – AÇÃO DE COBRANÇA – CON-TRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO – ABANDONO DA CAUSA – EXTINÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 240 DO STJ – INEXISTÊNCIA DE REQUE-RIMENTO DOS RÉUS – 1. A sentença extinguiu Ação de Cobrança de valores de Contratos de Prestação de Serviços de Administração dos Cartões de Crédito, art. 267, III, do CPC/1973, fundada em que, intimada pessoalmente a promover atos e diligências que lhe competiam, a Caixa quedou-se inerte. 2. Angularizada a relação processual, a extinção por inércia em promover o andamento do pro-cesso, além de pressupor, força do § 1º, prévia intimação pessoal da parte para suprir a falta, necessita de pedido do réu. Aplicação do Enunciado de Súmula nº 240, do STJ. 3. Todos os devedores, citados, ofereceram contestação, e ale-garam a quitação da dívida. A negativa da Caixa em apresentar os extratos que geraram o débito remanescente cobrado não conduz a extinção, por abandono, mas ao julgamento do mérito da controvérsia, segundo as regras de distribuição do ônus da prova. 4. Apelação provida, para determinar o retorno dos autos à origem, para regular prosseguimento do feito (TRF 2ª R., AC 2012.51.01.008843-0, Relª Desª Fed. Nizete Lobato Carmo, 6ª T. Esp., e-DJF2R 17.06.2016).

DIREITO PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO MONITÓRIA – AU-SÊNCIA DE INÉRCIA – EXTINÇÃO PREMATURA DO PROCESSO – APLICA-ÇÃO DO ART. 267, III, C/C § 1º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 – I – No caso em tela, a sentença recorrida se submete às regras inseridas no Có-digo de Processo Civil de 1973, eis que é anterior à vigência do Novo Códi-go de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015). II – O ordenamento jurídico prevê a possibilidade de extinção do processo quando o autor deixar de promover os atos e diligências que lhe competir por mais de 30 (trinta) dias. No entan-to, a extinção estabelecida no art. 267, III, do Código de Processo Civil, está condicionada à intimação pessoal da parte para suprir a falta em 48 (qua-renta e oito) horas (CPC, art. 267, § 1º). III – Na hipótese dos autos, o pro-cesso foi extinto indevidamente, tendo em vista que não r estou configura-da a inércia da CEF por mais de 30 (trinta) dias. IV – De acordo com o art. 5º, § 6º, da Lei nº 11.419/2006, as intimações realizadas por meio eletrôni-co em portal próprio aos que se cadastrarem, como é o caso da Caixa Econô-mica Federal, serão consideradas como pessoais para todos os efeitos legais. V – A Súmula nº 240 do Superior Tribunal de Justiça (“A extinção do proces-so, por abandono da causa pelo autor, depende de requerimento do réu”) é aplicável nas hipóteses em que a ação/execução for embargada pelo réu/executado. Precedente do Superior Tribunal de Justiça: REsp 1355277/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., DJe 01.02.2016. VI – Apelação conheci-da e provida (TRF 2ª R., AC 2014.51.20.0000303-0, Rel. Des. Fed. José Antonio Neiva, 7ª T.Esp., e-DJF2R 18.04.2016).

Afasto a sistemática do art. 85, § 11 do CPC/201527, por não vigorar na data do recurso. Aplicação do CPC/2015, arts. 14 e 1.046, e o Enunciado Ad-ministrativo nº 7/STJ, do teor seguinte:

27 § 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado

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Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais re-cursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC.

Ante o exposto, dou provimento à apelação, devendo o processo retornar ao Juízo de origem para regular prosseguimento, nos termos da fundamentação.

É como voto.

Assinado eletronicamente (Lei nº 11.419/2006) Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo Desembargadora Federal

ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento.

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Parte Geral – Jurisprudência

8760

Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 08.07.2016Agravo de Instrumento nº 0003925‑23.2016.4.03.0000/MS2016.03.00.003925‑6/MSRelator: Desembargador Federal Wilson ZauhyAgravante: Marcelo Radaelli da SilvaAdvogado: MS006641B Marcelo Radaelli da Silva e outro(a)Agravado(a): Cia. Nacional de Abastecimento – ConabAdvogado: MS003845 Janio Ribeiro Souto e outro(a)

SP166924 Renata de Moraes Vicente SP355917B Silvia Eliane de Carvalho Dias

Parte Ré: Antonio Ramos dos Reis Dagoberto Soares Cerealista Orion Ltda.

Origem: Juízo Federal da 1ª Vara de Campo Grande > 1ª SSJ > MSNº Orig.: 00010862920004036000 1ª Vr. Campo Grande/MS

ementA

dIreIto proCessual CIVIl – aGraVo de Instrumento – ação ordInÁrIa – exeCução de sentença – honorÁrIos adVoCatÍCIos – aColhImento de ImpuGnação da parte suCumBente – deCIsão InterloCutÓrIa a desafIar a InterposIção de aGraVo de Instrumento – prInCÍpIo da funGIBIlIdade – InaplICaBIlIdade na espÉCIe – aGraVo de Instrumento ImproVIdo

Recurso interposto contra decisão que deixou de receber o recurso de apelação da agravante, ao fundamento de que a decisão que acolheu impugnação à execução de honorários não encerraria o processo, e assim, desafiaria a interposição de agravo de instrumento.

A Lei nº 8.906/1994, ao tratar dos honorários advocatícios, previu em seu art. 24, § 1º, que a execução de honorários pode ser promovida nos mesmos autos em que tenha atuado o advogado, se assim lhe convier, o que ocorreu in casu. Após o agravante ter dado início à execução dos honorários, a agravada apresentou impugnação, acolhida pelo magistrado de primeiro grau.

Nestas condições, o instrumento recursal cabível contra decisão que aprecia impugnação ao cumprimento de sentença é o agravo de ins- trumento. Registre-se que a decisão agravada não extinguiu a execução,

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hipótese em que o recurso cabível seria a apelação, mas diversamente, apenas fixou o quantum a ser executado. Precedentes.

Agravo de instrumento a que se nega provimento.

AcÓrdÃo

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento interposto, nos ter-mos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 21 de junho de 2016.

Wilson Zauhy Desembargador Federal

relAtÓrio

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Marcelo Radaelli da Silva em face de decisão que, nos autos da ação ordinária ajuizada na origem, deixou de receber o recurso de apelação interposto pelo agravante.

Alega o agravante que o processamento do cumprimento de sentença para o recebimento de honorários deu-se nos mesmos autos do processo prin-cipal. Afirma que após apresentar o valor devido, a agravada foi intimada para apresentar impugnação, tendo sido, ao final, acolhido o valor por ela apresen-tado. Inconformado, apresentou o agravante recurso de apelação por entender que a decisão recorrida colocou fim na cobrança.

Entretanto, o juízo a quo entendeu que se tratava de decisão interlocutó-ria, de modo que o veículo recursal correto seria o agravo de instrumento.

Nesta sede, o pedido de efeito suspensivo restou indeferido pela decisão de fls. 155/157.

A agravada apresentou contraminuta às fls. 158/163.

Neste ponto, vieram-me conclusos os autos.

É o relatório, dispensada a revisão, nos termos regimentais.

voto

A Lei nº 8.906/1994, que instituiu o Estatuto da Advocacia, ao tratar dos honorários advocatícios, previu em seu art. 24 o seguinte:

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������195

Art. 24. A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na fa-lência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extra-judicial.

§ 1º A execução dos honorários pode ser promovida nos mesmos autos da ação em que tenha atuado o advogado, se assim lhe convier.

§ 2º Na hipótese de falecimento ou incapacidade civil do advogado, os hono-rários de sucumbência, proporcionais ao trabalho realizado, são recebidos por seus sucessores ou representantes legais.

§ 3º É nula qualquer disposição, cláusula, regulamento ou convenção individual ou coletiva que retire do advogado o direito ao recebimento dos honorários de sucumbência. (grifei)

No caso em análise, observo que o agravante peticionou nos próprios autos principais dando início à fase de execução de sentença, relativamente ao valor de honorários aos quais faz jus. Verifico, nesse sentido, que em sua manifestação o agravante indicou o número do processo principal, como se verifica à fl. 48, não havendo requerimento de processamento da execução em autos apartados.

Depreende-se, assim, sua intenção de executar o valor de honorários nos próprios autos principais, na forma estabelecida pelo § 1º do art. 24 da Lei nº 8.906/1994.

Após o agravante ter dado início à execução dos honorários, a agravada apresentou impugnação, a qual, muito embora não tenha sido juntada neste instrumento, foi expressamente mencionada na decisão de fls. 125/128.

A impugnação apresentada pelo agravado encontra expressa previsão no trecho final do § 1º do art. 475-J do CPC/1973 (vigente à época), verbis:

Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da con-denação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requeri-mento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expe-dir-se-á mandado de penhora e avaliação.

§ 1º Do auto de penhora e de avaliação será de imediato intimado o executado, na pessoa de seu advogado (arts. 236 e 237), ou, na falta deste, o seu represen-tante legal, ou pessoalmente, por mandado ou pelo correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias.

[...] (grifei)

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Referida impugnação ao cumprimento de sentença possui natureza de incidente processual, à semelhança da exceção de pré-executividade. Neste sentido, transcrevo decisão proferida pelo C. STJ:

“PROCESSUAL CIVIL – ADMINISTRATIVO – OMISSÃO INEXISTENTE – MUL-TA DO ART. 475-J DO CPC – INCIDÊNCIA SOBRE VALOR LÍQUIDO E CER-TO – NECESSIDADE DE LIQUIDAÇÃO DO JULGADO – SÚMULA Nº 7/STJ – IMPUGNAÇÃO – REJEIÇÃO – HONORÁRIOS – DESCABIMENTO – PRECE-DENTES – [...] 2. A Corte Especial do STJ, no julgamento do REsp 1.134.186/RS, da relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, submetido ao regime dos recursos re-petitivos (art. 543-C do CPC), reconheceu que ‘não são cabíveis honorários ad-vocatícios pela rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença’, pois a impugnação ao cumprimento de sentença, prevista na parte final do art. 475-J, § 1º, do CPC, reveste-se de ‘mero incidente processual’, semelhante à ‘exceção de pré-executividade’ e que, de consequência, sua rejeição não enseja a fixação de verba honorária. 3. ‘Se a condenação não se reveste de liquidez necessária ao cumprimento espontâneo do comando sentencial, inaplicável a reprimenda prevista no art. 475-J do CPC. Precedente’ (AgRg-REsp 1335757/PR, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., Julgado em 16.10.2014, DJe 20.11.2014). 4. A alegação da recorrente de que ‘a execução em comento é por quantia certa, dependendo apenas de cálculo aritmético’, contrapõe-se à conclusão da Corte de origem de que se trata de sentença ilíquida cujos cálculos são complexos, de modo que sua alteração fica inviabilizada, ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. Agravo regi-mental improvido.” (grifei)

(STJ, 2ª T., Ag-REsp 201402328490, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 20.02.2015)

Nestas condições, o instrumento recursal cabível contra decisão que aprecia impugnação ao cumprimento de sentença é o agravo de instrumento. Registre-se, por necessário, que a decisão agravada não extinguiu a execução, hipótese em que o recurso cabível seria a apelação, mas diversamente, apenas fixou o quantum a ser executado. Neste sentido, transcrevo:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – 535 – AUSÊN-CIA DE VIOLAÇÃO – ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 461, § 6º, DO CPC E 413 DO CC – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO SÚMULA Nº 282/STF – IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.232/2005 – DECISÃO QUE RESOLVE INCIDENTE DE IMPUGNAÇÃO – RECURSO CABÍVEL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – INTERPOSIÇÃO DE RE-CURSO DE APELAÇÃO – ERRO GROSSEIRO – PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDA-DE NÃO APLICÁVEL – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 83/STJ – [...] 3. A decisão que resolve incidente de impugnação ao cumprimento de sentença apresentada posteriormente à vigência da Lei nº 11.232/2005 desafia recurso de agravo de instrumento, não sendo aplicável o princípio da fungibilidade recursal caso te-

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������197

nha sido interposto contra tal decisão recurso de apelação. Incidência da Súmu-la nº 83/STJ. 4. Agravo regimental desprovido.” (grifei)

(STJ, 2ª T., Ag-AREsp 201402581499, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 03.02.2015)

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento interposto.

Wilson Zauhy Desembargador Federal

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Parte Geral – Jurisprudência

8761

Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoEmbargos de Declaração em Apelação Cível nº 5016721‑47.2011.4.04.7100/RSRelatora: Desª Federal Salise Monteiro SanchoteneEmbargante: Sergio Cruz AzevedoAdvogado: Isabel Cristina Trapp FerreiraEmbargado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

ementA

proCessual CIVIl – emBarGos de deClaração – InexIstÊnCIa de QualQuer dos defeItos Que poderIam motIVar a oposIção – preQuestIonamento

1. Se o acórdão não apresenta omissão, contradição, obscuridade ou erro material, não cabe a oposição de embargos de declaração.

2. O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.

AcÓrdÃo

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, deci-de a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimi-dade, rejeitar os embargos de declaração, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre (RS), 06 de julho de 2016.

Desª Federal Salise Monteiro Sanchotene Relatora

relAtÓrio

A parte autora opõe embargos de declaração contra acórdão desta Tur-ma, que reconheceu a decadência do direito à revisão do ato concessório de seu benefício previdenciário.

Em suas razões, alega que não está a pretender a revisão do benefício percebido, mas discute o direito ao benefício não requerido entre a data da implementação dos requisitos legais e o requerimento administrativo. Sustenta que, havendo o segurado preenchido todos os requisitos para a aposentado-

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������199

ria em data anterior ao requerimento, este direito não caducará, não decairá, nem prejudicará o acesso a esta contraprestação, pois incorporada ao seu pa-trimônio. Diz, também, que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 630.501, reconheceu o direito de o segurado acessar prestação previdenciária não requerida mediante nova concessão em face do direito adquirido ao melhor benefício.

Requer o prequestionamento da Súmula nº 359/STF, art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, art. 6º, § 2º, da LICC e arts. 102, § 1º, 49 e 54 da Lei nº 8.213/1991.

voto

Quanto às alegações trazidas pela parte embargante, não se verifica a ocorrência de obscuridade, contradição, omissão ou erro material, nos termos do que dispõe o art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015.

Isto porque o entendimento da Turma foi no sentido de que o pedido de recálculo da renda mensal inicial com base no direito adquirido implica altera-ção do ato de concessão do benefício, porquanto é mantida a mesma Data da Entrada do Requerimento (DER) e a mesma Data de Início do Benefício (DIB), alterando-se apenas o Período Básico de Cálculo (PBC) da renda mensal inicial. Com isto, entendeu o órgão julgador que o que está em discussão é o mesmo ato de concessão, e não pedido de benefício ainda não requerido.

O objetivo, no caso, é rediscutir a causa e alcançar a reforma do julga-do, o que não é próprio do recurso utilizado. Confira-se a jurisprudência dos Tribunais Superiores:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – ALEGADA OMISSÃO E CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO – NÃO OCORRÊNCIA – QUESTÃO DEVIDAMENTE ANALISADA NO JULGAMEN-TO DE MÉRITO DO RECURSO ORDINÁRIO – PRETENSÃO DE SE REDISCU-TIR A CAUSA – FINALIDADE PARA A QUAL NÃO SE PRESTA O RECURSO – REJEIÇÃO

1. No julgamento de mérito do recurso ordinário, todas as questões postas pela parte embargante foram enfrentadas adequadamente, inexistindo, na espécie, os vícios do art. 337 do RISTF. 2. O recurso não se presta para rediscutir a causa. 3. Embargos rejeitados.

(STF, ED-RHC 124192, 1ª T., Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., DJe de 11.06.2015)

PROCESSO CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMEN-TAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – HIPÓTESES DO ART. 535 DO CPC

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– AUSÊNCIA – REDISCUSSÃO DA MATÉRIA DECIDIDA – IMPOSSIBILIDADE – EMBARGOS REJEITADOS

1. Os embargos de declaração apenas são cabíveis para sanar omissão, con-tradição ou obscuridade do julgado recorrido, admitindo-se também essa espé-cie recursal para se corrigir eventuais erros materiais da decisão. 2. No caso, o acórdão embargado dirimiu integralmente a controvérsia, ao concluir pela ausência de similitude fática entre os acórdãos confrontados nos embargos de divergência. 3. Não são cabíveis aclaratórios com nítido intuito de rediscutir as questões já decididas no aresto recorrido. 4. Embargos de declaração rejeitados.

(STJ, EDcl-AgRg nos Embargos de Divergência em REsp nº 1.217.940, 1ª S., Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 01.07.2015)

O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.

Ante o exposto, voto por rejeitar os embargos de declaração.

Desª Federal Salise Monteiro Sanchotene Relatora

extrAto de AtA dA sessÃo de 06.07.2016

Embargos de Declaração em Apelação Cível nº 5016721-47.2011. 4.04.7100/RS

Origem: RS 50167214720114047100

Incidente: Embargos de Declaração

Relator: Desª Federal Salise Monteiro Sanchotene

Presidente: Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida

Procurador: Procurador Regional da República Fábio Nesi Venzon

Embargante: Sergio Cruz Azevedo

Advogado: Isabel Cristina Trapp Ferreira

Embargado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06.07.2016, na sequência 440, disponibilizada no DE de 17.06.2016, da qual foi intimado(a) Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, o Ministério Público Federal e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígra-fe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu rejeitar os embargos de declaração.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������201

Relator Acórdão: Desª Federal Salise Monteiro Sanchotene

Votante(s): Desª Federal Salise Monteiro Sanchotene Des. Federal João Batista Pinto Silveira Desª Federal Vânia Hack de Almeida

Gilberto Flores do Nascimento Diretor de Secretaria

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Parte Geral – Jurisprudência

8762

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoApelação Cível (AC) nº 490437/PE (2007.83.00.017780‑0)

Apte.: Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

Repte.: Procuradoria Regional Federal da 5ª Região

Apdo.: Isaura Teodosio da Silva Souza e outros

Adv./Proc.: Paulo Cavalcanti de Rangel Moreira e outros

Origem: 7ª Vara Federal de Pernambuco (especializada em questões agrárias) – PE

Relator: Desembargador Federal Élio Siqueira Filho

ementA

proCessual CIVIl – exeCução de sentença – desaproprIação para fIns de reforma aGrÁrIa – IndenIZação pelas BenfeItorIas – Valor InICIalmente deposItado maIor do Que o arBItrado – dIferença a ser leVantada pelo InCra medIante ordem JudICIal, Conforme defInIdo no tÍtulo JudICIal – pretensão de faZer Compensações nos CÁlCulos de lIQuIdação – desCaBImento – ÓBICe da CoIsa JulGada

1. Caso em que, em desapropriação para fins de reforma agrária, ficou decidido que, com relação à cultura de cana de açúcar, o expropriante efetuou depósito superior ao fixado pelo vistor, cuja diferença representa um crédito, em favor do Incra, de R$ 37.069,55 (trinta e sete mil, sessenta e nove reais e cinquenta e cinco centavos), quantia que deverá ser levantada mediante autorização do Juízo.

2. Definido no título judicial que o crédito do expropriante deverá ser levantado mediante autorização do Juízo, não pode este pretender fazer compensações na liquidação do julgado para se eximir de pagar juros compensatórios sobre as diferenças ainda devidas a título de indenizações pela terra nua, em TDAs, e benfeitorias, em espécie.

3. “O processo executivo deve observar, fielmente, o comando sentencial inserido na ação de conhecimento transitada em julgado, sob pena de restar malferida a coisa julgada” (STJ, AgRg-REsp 755834/RN).

4. Apelação não provida.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������������������������������203

AcÓrdÃo

Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes nos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 30 de junho de 2016.

Desembargador Federal Élio Siqueira Filho Relator

relAtÓrio

O Senhor Desembargador Federal Élio Siqueira Filho: O Instituto Na-cional de Colonização e Reforma Agrária – Incra apela de sentença que julgou parcialmente procedentes embargos do devedor opostos à execução de título judicial formado em ação de desapropriação para fins de reforma agrária.

Decidiu a MMª Juíza sentenciante que a execução deve prosseguir com base nos cálculos da contadoria do Foro às fls. 42/46.

Nas razões de apelação, sustenta o recorrente, em síntese, que a sentença é equivocada porque não determinou a compensação do que depositou a maior inicialmente a título de indenização pelas benfeitorias, havendo, portanto, “ex-cesso de execução, na conta judicial, decorrente da aplicação de juros compen-satórios a partir da imissão na posse, muito embora o Incra haver depositado um valor maior do que o da condenação” (fl. 73).

Finda por requerer o provimento do recurso para que, modificada a sen-tença, afaste-se o excesso de execução sustentado.

Oferecidas as contrarrazões, subiram os autos.

Sob a relatoria do hoje emérito desembargador federal Francisco Cavalcanti, o apelo veio a julgamento e foi provido por esta eg. Turma na sessão de 10.02.2011, para que houvesse a compensação do crédito decorrente do depósito inicial a maior a título de indenização pelas benfeitorias com o saldo ainda devido de TDAs, concernentes à desapropriação da terra nua, na base de cálculos dos juros compensatórios (fls. 113/118).

Por força da decisão do c. STJ em recurso especial aviado nos autos (fls. 223/235), os autos voltaram para rejulgamento de aclaratórios, o que ocor-reu na sessão turmária de 10.03.2016, ocasião em que o acórdão que julgou a apelação foi anulado ao entendimento de que houve julgamento extra petita (fls. 251/255).

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Vindo-me concluso, determinei a inclusão do feito em pauta para novo julgamento da apelação.

É o relatório.

voto

O Senhor Desembargador Federal Élio Siqueira Filho: Satisfeitos os pres-supostos de admissibilidade, conheço da apelação.

Conforme relatado, discute-se em sede de embargos do devedor alegado excesso de execução de sentença que julgou ação de desapropriação para fins de reforma agrária.

A ação foi julgada parcialmente procedente para que a execução se-guisse com base nos cálculos da contadoria do Juízo às fls. 42/46, conforme sentença às fls. 67/69.

Irresignado apelou o Incra, sustentando ser descabida a incidência de juros compensatórios a partir da imissão na posse, haja vista ter depositado um valor maior do que o da condenação que lhe foi imposta no processo cognitivo.

A tese foi acolhida por esta eg. Turma ao prover o apelo, na sessão de 10.02.2011 (fls. 113/118), para que do débito da Autarquia (R$ 39.459,03) fos-se deduzido o seu crédito (R$ 37.069,54), de forma que os juros compensató-rios somente incidissem sobre a diferença de R$ 2.389,49, valores em julho de 2000.

Em sede de embargos de declaração, arguiram os exequentes a ocorrên-cia de julgamento extra petita, já que a apelação só impugnou a sentença no que homologou a conta relativa à indenização das benfeitorias, razão pela qual não poderia o Tribunal determinar o refazimento dos cálculos da indenização pela terra nua, sobre os quais já havia expressado concordância a apelante.

Os aclaratórios foram improvidos (fls. 124/127).

Interposto recurso especial, foi este provido pelo c. STJ, ao entendimento de que houve negativa de prestação jurisdicional declaratória (fls. 223/233).

Em novo julgamento, ocorrido na sessão do dia 10 de março do corren-te ano de 2016, esta eg. Turma deu provimento aos embargos de declaração para anular o acórdão formado no julgamento da apelação, haja vista que “[...] limitando-se o apelo do Incra a questionar a incidência de juros compensatórios sobre o montante devido a título de indenização por benfeitorias, mostra-se de-feso a este órgão revisional alterar os critérios de cálculos referentes à terra nua, por afronta aos limites da devolutividade do sistema recursal (tantum devolutum quantum appellatum)” (fl. 251).

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Transitado em julgado (fl. 256v), vieram os autos conclusos para novo julgamento da apelação.

Incluído em pauta, trago o feito para julgamento.

Cinge-se a questão a ser dirimida, conforme já definido por esta eg. Tur-ma, a como se dará o reembolso do valor inicialmente depositado a maior pelo apelante a título de indenização por benfeitorias, considerado o julgamento final da ação de desapropriação.

Verificando o teor do julgamento da AC 278.516/PE, que tramitou nesta eg. Corte na fase cognitiva da ação desapropriatória, constato que o tema está devidamente definido nos seguintes termos:

“Chegando a esta conclusão, observa-se que com relação à cultura de cana de açúcar, o expropriante efetuou depósito superior ao fixado pelo vistor, cuja di-ferença representa um crédito em favor do Incra em R$ 37.069,55 (trinta e sete mil, sessenta e nove reais e cinquenta e cinco centavos), quantia que deverá ser levantada pelo Incra mediante autorização do Juízo monocrático”(grifo atual).

Assim veio a transitar em julgado, após confirmação do c. STJ em sede de recurso especial (REsp 640.121/PE).

É consabido que na execução de título judicial os limites a serem obser-vados são os da decisão transitada em julgado.

Sobre o tema, cito, a título de ilustração, os seguintes precedentes do c. STJ, no que aqui interessa:

“1. A coisa julgada impede que a execução incida sobre objeto diverso ou quantum outro que não o condenatório.

2. Deveras, é ilícito interpretar o julgado para conferir elastério ao seu con-teúdo [...]” (STJ, REsp 966429/PR, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, J. 04.11.2008, DJe 01.12.2008, votação unânime) – grifei.

“A Corte Especial do STJ pacificou entendimento de que, em respeito à coisa julgada, deve prevalecer o comando expresso na sentença exeqüenda...” (STJ, AgRg-EDcl-REsp 1260916-RS, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, J. 08.05.2012, DJe 18.05.2012, votação unânime) – grifei.

“[...] O processo executivo deve observar, fielmente, o comando sentencial in-serido na ação de conhecimento transitada em julgado, sob pena de restar mal-ferida a coisa julgada.” (AgRg-REsp 755834-RN, 5ª T., Rel. Min. Gilson Dipp, J. 20.09.2005, DJ 10.10.2005 p. 428, votação unânime) – realcei.

Desse modo, não vejo como acolher a pretensão do apelante de se ver restituído mediante compensações na liquidação do julgado se no título judicial está definido que a quantia deve ser levantada mediante autorização do Juízo.

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Observo, ainda, que mesmo nos presentes embargos do devedor a ques-tão também está superada, haja vista ter sido resolvida pela decisão interlocutó-ria não recorrida que se vê às fls. 39/40, nos seguintes termos:

“A indenização das benfeitorias úteis e necessárias ocorre em dinheiro, enquan-to a indenização da terra nua se dá através de títulos da dívida agrária. Está é a regra sobre o pagamento de indenização nas desapropriações para fins de refor-ma agrária.

Outrossim, em conformidade com o disposto na sentença de fls. 351/357, con-firmada, em parte, pelo r. acórdão proferido pelo E. TRF da 5ª Região, o Incra é credor da importância de R$ 37.069,54 (trinta e sete mil, sessenta e nove reais e cinquenta e quatro centavos), haja vista que o valor arbitrado para a indeniza-ção das benfeitorias reprodutivas foi menor do que o valor inicialmente deposi-tado pelo Incra.

Compulsando os autos, verifico que o valor de R$ 95.992,56 (noventa e inço mil, novecentos e noventa e dois reais e cinquenta e seis centavos) diz respeito, exclusivamente, ao valor devido à indenização das benfeitorias supracitadas.

Não pode, assim, a Contadoria do Juízo proceder a dedução da importância de R$ 37.069,54 (trinta e sete mil, sessenta e nove reais e cinquenta e quatro cen-tavos) do valor indenizatório sob pena de o expropriado sofrer um decréscimo patrimonial indevido.

Com efeito, o valor da indenização das benfeitorias úteis e necessárias não pode ser diminuído pelo valor da indenização da terra nua e vice-versa, pois tratam-se de indenizações pagas através de meios diferentes – dinheiro e título da dívida agrária.

Retornem, dessa forma, os autos à Contadoria do Juízo a fim de que sejam efe-tuados novos cálculos, desta feita, sem a dedução do valor de R$ 37.069,54 (trinta e sete mil, sessenta e nove reais e cinquenta e quatro centavos), que deve ser levantado mediante autorização judicial.” (fls. 39/40 – grifado)

Sendo assim, não se pode olvidar que a pretensão do apelante, encontra óbice no efeito preclusivo da coisa julgada.

Nego, pois, provimento à apelação.

É como voto.

Recife, 30 de junho de 2016.

Desembargador Federal Élio Siqueira Filho Relator

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Parte Geral – Ementário de Jurisprudência8763 – Ação cautelar – caução antecipatória de penhora em execução fiscal – oferecimento de

precatório

“Processual civil. Embargos de declaração no recurso especial. Ação cautelar. Caução antecipatória de penhora em execução fiscal. Oferecimento de precatório. Recusa da Fazenda Pública. Legitimidade. Au-sência de omissão, obscuridade ou contradição. Embargos de declaração rejeitados. 1. A questão foi apre-ciada de modo adequado, e o mero inconformismo com a conclusão do julgado não enseja a utilização da via de embargos de declaração, que é limitada às hipóteses elencadas no art. 535 do CPC/1973 e atual art. 1.022 do CPC/2015. 2. Em não havendo omissão, obscuridade ou contradição, merecem ser rejeita-dos os embargos de declaração opostos, sobretudo quando contêm elementos meramente impugnativos. 3. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-REsp 1.577.021 – (2016/0003273-7) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 16.06.2016 – p. 3136)

8764 – Ação civil pública – intimação – art. 236, § 1º, do CPC/1973 – pluralidade de advogados – patrono residente em comarca diversa – substabelecimento

“Agravo regimental no recurso especial. Ação civil pública. Intimação. Art. 236, § 1º, do CPC/1973. Plura-lidade de advogados. Patrono residente em comarca diversa. Substabelecimento. Procuradores substabe-lecentes que continuaram atuando no feito. Insurgência da instituição bancária. 1. Considera-se deficiente a fundamentação do recurso especial que alega violação do art. 535 do CPC/1973, quando não demons-trado, clara e objetivamente, qual o ponto omisso, contraditório ou obscuro do acórdão recorrido que não teria sido sanado no julgamento dos embargos de declaração. Aplicação do óbice inserto na Súmula nº 284/STF. 2. A jurisprudência do STJ é no sentido de que a “interpretação do art. 236, § 1º, do CPC/1973 que melhor se coaduna com os princípios do contraditório e da ampla defesa é aquela que sustenta a nulidade da publicação da qual constou apenas o nome do procurador substabelecente, domiciliado em outra Comarca, sem consignar o nome do Advogado substabelecido exatamente com a finalidade de acompanhar o feito perante a Comarca no qual ele efetivamente tramita, independentemente de reque-rimento expresso nesse sentido ou do substabelecimento ser com ou sem reserva de poderes, mas desde que, a partir desse substabelecimento, o novo causídico tenha efetiva atuação no feito’ (EDcl-EDcl-AgRg--EAg 1244657/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, J. 15.05.2013, DJe 29.05.2013). 3. Declaração de nulidade de atos processuais deve se dar com temperamento, sempre à luz do caso con-creto. Na hipótese dos autos, não havendo nos autos manifestação no sentido de indicar no Tribunal esta-dual que o responsável pelas intimações seria o aludido advogado paranaense, é válida a intimação rea- lizada no nome do procurador que substabeleceu com reserva de poderes. 4. Agravo regimental desprovi-do.” (STJ – AgRg-REsp 1.126.410 – (2009/0041898-6) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 17.06.2016)

8765 – Ação coletiva – habilitação de crédito – juros remuneratórios

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação coletiva. Habilitação de crédito. Juros remunera-tórios. Prequestionamento. Ausência. Súmula nº 282/STF. 1. Ausente o prequestionamento, até mesmo de modo implícito, de dispositivos apontados como violados no recurso especial, incide o disposto na Súmu-la nº 282 do STF. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 835.784 – (2015/0326055-0) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 13.05.2016 – p. 1580)

8766 – Ação de guarda de menor – falecimento – mãe – pai biológico – direito de guarda assegurado – padrasto – visitação – interesse do melhor – não reconhecimento

“Agravo regimental no recurso especial. Ação de guarda de menor. Falecimento. Mãe. Pai biológico. Di-reito de guarda assegurado. Padrasto. Visitação. Interesse do melhor. Não reconhecimento. Requisitos do recurso especial. Não preenchimento. 1. Compete ao Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial, a análise da interpretação da legislação federal, motivo pelo qual se revela inviável discutir, nesta seara, a violação de dispositivos constitucionais, matéria afeta à competência do STF (art. 102, III, da Carta Magna). 2. A alegação genérica de violação do art. 535 do CPC, sem a especificação das teses que teriam sido afrontadas pelo tribunal de origem, enseja a incidência da Súmula nº 284/STF, aplicada por analogia. 3. Ausente o prequestionamento, até mesmo de modo implícito, de dispositivo apontado como violado no recurso especial, incide o disposto na Súmula nº 282/STF. 4. Tendo o tribunal de origem, com base no contexto fático dos autos, dirimido a controvérsia sob o enfoque do princípio do melhor interesse do melhor, não há como o STJ rever esse entendimento, sob pena de esbarrar no óbice da Súmula nº 7/STJ.

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5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.498.683 – (2014/0299473-8) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 16.05.2016 – p. 1714)

Comentário editorial SÍnTeSeTrata-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento ao recurso especial.

Sustentou o agravante que o padrasto tem direito à visitação da menor com base no parentesco por afinidade, pois o conceito de família “não possui um significado singular e restrito, compreende novas relações de vida, volve a vidas as pessoas, seus sentimentos, afetividade, solidariedade e igualdade”.

Alegou, consubstanciado no princípio do melhor interesse da criança, a necessidade de afastamento da Súmula nº 7/STJ, e requer a reconsideração da decisão agravada ou a submissão deste recurso à Turma julgadora.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

Oportuno se faz colacionar trecho da doutrina do ilustre jurista Guilherme Gonçalves Strenger sobre a guarda de menores:

“O novo Código Civil refere-se ao interesse do menor como princípio básico e determinante de todas as avaliações que refletem as relações de filiação. É o que se verifica das disposições constantes dos arts. 1.574, parágrafo único, e 1.586.

O interesse do menor, pode-se dizer sem receio, é hoje verdadeira instituição no tratamento da matéria que ponha em questão esse direito.

Tanto na família legítima como na natural e suas derivações, o interesse do menor é o princípio superior.

Em cada situação, cumpre ao juiz avaliar o interesse do menor e tomar medidas que o preservem, devendo a apreciação do caso ser procedida segundo dados de fato que estejam sob análise.

O interesse do menor permanece o único critério válido, mas ele é objeto de duplo pressuposto. Presu-mindo-se que, quando se trata de família natural, a união daí resultante, por sua própria natureza, não é estável, havendo sempre o risco de uma separação – razão pela qual o interesse do menor comanda que desde a origem ele seja confiado a um só de seus pais – e constatando que, na maioria dos casos, quem cria o filho menor é a mãe, deduziu-se legal e jurisprudencialmente que o interesse presumido da criança era o de que fosse confiado de imediato à mãe. Contudo, essa apreciação, a priori, pode ser descartada se se verifica que o interesse da criança exige que o poder familiar seja confiado ao pai ou ao casal.

Igualmente, os direitos e deveres acordados a um ou outro cônjuge, ou pelo menos sua extensão, depen-dem também do interesse do menor. O direito de visita e moradia do cônjuge divorciado, por exemplo, será maior ou menor ou até mesmo suprimido, segundo o interesse do menor.

Levar em conta o interesse do menor dá, além disso, ao poder familiar um caráter particular: sua organização é sempre provisória, pois o juiz poderá, a qualquer momento, revisá-la, modificando as disposições previamente tomadas.

Seja qual for a orientação legal, a verdade é que o maior bem do menor que deve guiar o juiz é o de bus-car o que é mais vantajoso quanto ao seu modo de vida, desenvolvimento, futuro, felicidade e equilíbrio.

Restaria encontrar uma definição que envolvesse a noção de interesse do menor, tão frequentemente evocado.

A questão pode ser considerada em dois níveis.

O interesse do menor seria, antes de tudo, critério de controle, isto é, instrumento que permita fiscalizar o exercício do poder familiar, sem colocar em causa a existência dos direitos dos pais. Assim, na família unida, o interesse presumido do menor é o de ser criado pelos dois cônjuges, mas, desde que um deles abuse ou mal use suas prerrogativas, o mesmo critério permitirá subtrair-lhe o poder ou controlar mais rigidamente o seu exercício.

Por outro lado, o interesse do menor é utilizado como critério de solução para que, em caso de sepa-ração, por exemplo, a atribuição do poder ou do exercício pelos pais de sua prerrogativa dependa da apreciação que faça o juiz do interesse do menor.

Tanto em um caso como no outro, o interesse do menor parece não constituir uma noção-quadro, em que cada um aceita sem saber bem o que convém e, sobretudo, sem poder pronunciar-se sobre as modalidades de sua aplicação prática.

Em face dessas observações, propomo-nos a oferecer uma definição analítica do interesse menor, de modo a dar a maior abrangência possível à sua noção.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������209

Consideram-se interesse do menor todos os critérios de avaliação e solução que possam levar à convic-ção de que estão sendo atendidos os pressupostos que conduzem ao bom desenvolvimento educacional, moral e de saúde, segundo os cânones vigentes e identificáveis, por meio de subsídios interdiscipli-nares, obtidos com a cooperação de especialistas.” (A guarda no novo Código Civil. Disponível em: www.iobonlinejuridico.com.br)

8767 – Ação de obrigação de fazer – descumprimento de contrato de mútuo – deliberação mono-crática

“Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação de obrigação de fazer decorrente de descum-primento de contrato de mútuo. Deliberação monocrática que negou provimento ao reclamo. Irresigna-ção da ré. 1. É clara e suficiente a fundamentação adotada pelo Tribunal de origem para o deslinde da controvérsia, revelando-se desnecessário ao magistrado rebater cada um dos argumentos declinados pela parte (Precedentes: AgRg-Ag 1.402.701/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 01.09.2011, DJe 06.09.2011; REsp 1.264.044/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 01.09.2011, DJe 08.09.2011; AgRg-EDcl-Ag 1.304.733/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe de 31.08.2011. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 564.197 – (2014/0200593-5) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 13.05.2016 – p. 1650)

8768 – Ação indenizatória – devolução indevida de cheques por falta de provisão de fundos – cár-tula emitida por pessoa jurídica – incidência do CDC – danos materiais – danos morais por ricochete pleiteados pela sócia da empresa – valor da indenização

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação indenizatória. Devolução indevida de cheques por falta de provisão de fundos. Cártula emitida por pessoa jurídica. Incidência do CDC. Danos materiais. Danos morais por ricochete pleiteados pela sócia da empresa. Valor da indenização. Agravo improvido. 1. Tendo o Tribunal de origem afirmado que os serviços bancários foram contratados para fomentar a atividade empresarial da sociedade recorrente, não é possível afirmar que havia relação de consumo, para efeito de incidência do CDC, sem revidar fatos e provas. Incidência da Súmula nº 7/STJ. 2. No caso, o Tribunal de origem entendeu que a mera semelhança entre o nome da sócia e o da sociedade não era suficiente para fazer presumir que a primeira tenha experimentado danos morais (por ricochete) em razão da devolução indevida de cheque emitido pela segunda. Essa conclusão não pode ser revista em recurso especial, tendo em vista, mais uma vez, a Súmula nº 7/STJ. 3. A pretensão de majoração dos danos morais, fixados em benefício da pessoa jurídica, não vem amparada em indicação de ofensa à lei federal ou em dissídio pretoriano, o que atrai a incidência da Súmula nº 284/STF. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 768.834 – (2015/0212652-2) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 16.05.2016 – p. 1669)

8769 – Ação pauliana – fraude contra credores – requisitos – demonstração – ônus da prova

“Agravo regimental no recurso especial. Art. 535 do CPC/1973. Violação. Não ocorrência. Ação pau-liana. Fraude contra credores. Requisitos. Demonstração. Ônus da prova. Reexame de provas. Súmula nº 7/STJ. 1. Não viola o art. 535 do Código de Processo Civil de 1973 nem importa negativa de prestação jurisdicional o acórdão que adotou para a resolução da causa fundamentação suficiente, porém diversa da pretendida pela recorrente, para decidir de modo integral a controvérsia posta. 2. A reapreciação das conclusões do aresto impugnado encontra óbice, no caso concreto, na Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.559.548 – (2015/0251929-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 16.05.2016 – p. 1722)

8770 – Ação reivindicatória – propriedade do bem – reexame de prova

“Agravo interno. Agravo em recurso especial. Ação reivindicatória. Propriedade do bem. Reexame de prova. 1. Não se admite o recurso especial quando sua análise depende de reexame de matéria de prova (Súmula nº 7 do STJ). 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 674.295 – (2015/0048411-2) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 17.06.2016 – p. 2084)

8771 – Ação rescisória – ajuizamento – termo inicial – prazo decadencial

“Embargos de declaração no agravo regimental nos embargos de divergência em recurso especial. Termo inicial do prazo decadencial para ajuizamento da ação rescisória. Súmula nº 401/STJ. Inexistência de dissenso sobre tese jurídica. Situações fáticas diversas. Rejulgamento do recurso especial. Impossibilida-

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de. Omissão. Ausência. Recurso rejeitado. 1. Não se verifica qualquer omissão no julgado que concluiu pela inexistência de similitude fática entre os julgados confrontados a autorizar o conhecimento dos em-bargos de divergência propostos com intuito de dirimir suposto dissenso sobre a aplicação do Enuncia-do nº 401 desta Corte. 2. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-ED-REsp 1.397.208 – (2013/0258957-8) – C.Esp. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 16.06.2016 – p. 3037)

8772 – Agravo regimental no agravo em recurso especial – Código de Processo Civil de 1973 – apli-cabilidade

“Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Código de Processo Civil de 1973. Aplicabilidade. Interposição contra provimento jurisdicional colegiado. Inadmissibilidade. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II – A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente acerca da inad-missibilidade de agravo regimental contra acórdão, revelando-se, ademais, impossibilitada a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, por constituir erro grosseiro. Precedentes da Corte Especial e das três Seções deste Tribunal Superior. III – Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-AgRg-Ag-RE 599.140 – (2014/0261872-1) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 16.05.2016 – p. 1396)

8773 – Alimentos – pensão alimentícia entre ex-cônjuges – observação

“Civil. Embargos de declaração no agravo regimental no agravo em recurso especial. Família. Alimentos. Pensão alimentícia entre ex-cônjuges. Omissão, obscuridade ou contradição. Inexistência. Pretensão de rejulgamento da causa. Impossibilidade. NCPC. Inaplicabilidade. Embargos rejeitados. 1. Inexistentes as hipóteses do art. 535 do CPC/1973, não merecem acolhida os embargos de declaração que têm nítido caráter infringente. 2. Os embargos de declaração não se prestam para sanar o inconformismo da parte com o resultado desfavorável no julgamento ou para reapreciar matéria já decidida. Precedentes. 3. Ina-plicabilidade do NCPC a este julgamento ante os termos do Enunciado nº 1 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a deci-sões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 4. Embargos declaratórios rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-Ag-REsp 696.313 – (2015/0087176-0) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 24.05.2016 – p. 3022)

Comentário editorial SÍnTeSeTrata-se de embargos de declaração contra acórdão que negou provimento ao agravo regimental em agravo em recurso especial com a seguinte ementa:

“CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – FAMÍLIA – ALIMENTOS – PENSÃO ALIMENTÍCIA – MATÉRIA EM TORNO DOS ARTS. 113, 129, 187 E 422 DO CC/2002 – TEMAS NÃO DEBATIDOS PELA INSTÂNCIA ORDINÁRIA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 211 DO STJ – IMPOSSIBILIDADE DE CONFIGURAÇÃO DO DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO NÃO IMPUGNADO – APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 283 DO STF – ALIMENTOS – AFERIÇÃO DO BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE – REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 7 DO STJ – DISSÍ-DIO JURISPRUDENCIAL INVIABILIZADO EM RAZÃO DO ÓBICE DA SÚMULA Nº 7 DO STJ – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO

1. A matéria referente à violação dos temas inseridos nos arts. 113, 129, 187 e 422 do CC/2002 não foi objeto de debate prévio nas instâncias de origem. Ausente, portanto, o devido prequestionamento nos termos da Súmula nº 211 do STJ.

2. A jurisprudência desta egrégia Corte Superior já proclamou que a ausência de prequestionamento dos referidos dispositivos de lei tidos por malferidos impede a análise do apelo nobre com fundamento no dissenso interpretativo. Precedentes.

3. Ausente impugnação a fundamento suficiente para manter o acórdão recorrido, o recurso não merece ser conhecido. Inteligência da Súmula nº 283 do STF, aplicável por analogia, ao recurso especial.

4. A conclusão do Tribunal de origem de que a alimentada não tem condições de se manter por seus próprios meios até que se concretize a partilha dos bens comuns do casal não pode ser alterada por esta Corte, sem o indispensável reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que não pode ser feito em recurso especial, em razão do óbice contido na Súmula nº 7 do STJ.

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5. O STJ tem jurisprudência pacificada no sentido de que não é possível o conhecimento do recurso especial interposto pela divergência jurisprudencial, na hipótese em que o dissídio é apoiado em fatos e não na interpretação da lei federal. Isso porque a Súmula nº 7 do STJ também se aplica aos recursos especiais interpostos pela alínea c, do permissivo constitucional. Precedentes.

6. Agravo regimental não provido.”

Na decisão monocrática por mim prolatada, o agravo em recurso especial não foi provido porque 1) não houve prequestionamento dos arts. 113, 129, 187 e 422 do CC/2002 (Súmula nº 211 do STJ); 2) o dissídio jurisprudencial não foi demonstrado nos moldes legais e regimentais; e, 3) incidem as Súmulas nºs 7 do STJ e 283 do STF.

No agravo regimental, J. E. R. T. sustentou que os arts. 113, 129, 187 e 422 do CC/2002 foram prequestionados, que não incidem os outros óbices sumulares e que o dissídio jurisprudencial foi de-monstrado.

Ao apreciar o regimental, a Terceira Turma manteve o entendimento firmado pela decisão monocrática.

Nestes aclaratórios, ele afirma que o acórdão embargado foi omisso sobre os embargos de declaração prequestionadores que manejou na origem, que, de certa parte, fez referência aos dispositivos legais citados.

Alega, ainda, que houve omissão sobre a constatação de que a incidência da Súmula nº 283 do STF não se mostra suficiente para afastar a violação aos termos dos arts. 113, 129, 187 e 422 do CC/2002, pois a recusa maliciosa da embargada em realizar a partilha é incontroversa.

O STJ rejeitou os embargos de declaração.

Analisemos os ensinamentos de Maria Helena Diniz:

“A esse respeito mais preciso é o atual Código Civil, que no art. 1.641 estatui: ‘Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação’, prin-cipalmente quando o beneficiário for menor, acrescentando, ainda, no § 1º que: ‘Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada’, e no § 2º que: ‘Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia’. [...]

Não se deve confundir a obrigação de prestar alimentos com os deveres familiares de sustento, assistên-cia e socorro que tem o marido em relação à mulher e vice-versa e os pais para com os filhos menores, devido ao poder familiar, pois seus pressupostos são diferentes. A obrigação alimentar é recíproca, dependendo das possibilidades do devedor, e só é exigível se o credor potencial estiver necessitado, ao passo que os deveres familiares não têm o caráter de reciprocidade por serem unilaterais e devem ser cumpridos incondicionalmente. Como vimos alhures, o dever de sustento dos cônjuges toma a feição de obrigação de prestar alimento, embora irregular, por ocasião da dissolução da sociedade conjugal. A rigor não se tem, nessa hipótese, propriamente o dever de prestação alimentícia, apesar de, para certos efeitos, os deveres de sustento, assistência e socorro adquirirem o mesmo caráter. [...]

Convém ainda lembrar que se na separação ou no divórcio a mulher, p. ex., renunciou ao exercício do direito à pensão alimentícia, posteriormente carecerá de ação para pleitear alimentos ao seu ex-marido, ante a insubsistência do vínculo matrimonial, mesmo que alegue alteração de sua situação econômica (RT, 620:167; EJSTJ, 20:133, 16:56); todavia, tem havido decisão em contrário (JB, 162:314).” (Curso de direito civil brasileiro, direito de família. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2002. p. 459-460 e 472)

8774 – Associação de moradores – ação de cobrança com base em enriquecimento ilícito – taxa de manutenção – proprietário de imóvel não associado – impossibilidade

“Civil e processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Associação de moradores. Ação de co-brança com base em enriquecimento ilícito. Taxa de manutenção. Proprietário de imóvel não associado. Impossibilidade. Precedentes. Recurso manejado sob a égide do CPC/1973. Recurso não provido. 1. A Segunda Seção desta Corte possui o entendimento de que as taxas de manutenção ou melhoria, criadas por associações de moradores, não obrigam os não associados ou aqueles que a elas não anuíram (REsp 1.439.163/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. p/ Ac. Min. Marco Buzzi, 2ª S., julgado sob o rito dos recursos repetitivos, DJe 22.05.2015). 2. Não há que se falar em enriquecimento ilícito do recorrido porque a existência de associação, congregando moradores com o objetivo de defesa e preservação de interesses comuns em área habitacional, não possui o caráter de condomínio, pelo que, não é possível exigir de quem não seja associado, nem aderiu ao ato que instituiu o encargo, o pagamento de taxas de manutenção ou melhoria (AgRg-AREsp 525.705/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª T., DJe 25.05.2015). 3. As

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disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são inaplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado nº 1 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.495.483 – (2014/0276496-0) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 16.05.2016 – p. 1713)

8775 – Competência – obrigação securitária – sistema financeiro de habitação

“Agravo regimental no recurso especial. Processual civil. Competência. Obrigação securitária. Sistema Financeiro de Habitação. Possível interesse da Caixa Econômica Federal. Súmula nº 150/STJ. 1. Compete à Justiça Federal a verificação da existência de interesse da Caixa Econômica Federal. Súmula nº 150/STJ. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.548.811 – (2013/0348077-5) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 16.05.2016 – p. 1719)

8776 – Contrato – juros – cobrança – previsão – possibilidade

“Recurso especial. Sistema Financeiro da Habitação – SFH. Capitalização anual de juros. Possibilidade. Encargos mensais. Imputação do pagamento. Art. 354, CC/2002. Art. 993, CC/1916. 1. Interpretação do decidido pela 2ª Seção, no Recurso Especial Repetitivo nº 1.070.297, a propósito de capitalização de juros, no Sistema Financeiro da Habitação. 2. Segundo o acórdão no Recurso Repetitivo nº 1.070.297, para os contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação até a entrada em vigor da Lei nº 11.977/2009 não havia regra especial a propósito da capitalização de juros, de modo que incidia a restrição da Lei de Usura (Decreto nº 22.626/1933, art. 4º). Assim, para tais contratos, não é válida a capitalização de juros vencidos e não pagos em intervalo inferior a um ano, permitida a capitalização anual, regra geral que independe de pactuação expressa. Ressalva do ponto de vista da Relatora, no sentido da aplicabilidade, no SFH, do art. 5º da MP 2.170-36, permissivo da capitalização mensal, desde que expressamente pactuada. 3. No Sistema Financeiro da Habitação, os pagamentos mensais devem ser imputados primeiramente aos juros e depois ao principal, nos termos do disposto no art. 354, Código Civil em vigor (art. 993 Código de 1916). Entendimento consagrado no julgamento, pela Corte Especial, do Recurso Especial nº 1.194.402/RS (Rel. Min. Teori Albino Zavascki), submetido ao rito do art. 543-C. 4. Se o pagamento mensal não for suficiente para a quitação sequer dos juros, a determinação de lança-mento dos juros vencidos e não pagos em conta separada, sujeita apenas à correção monetária, com o fim exclusivo de evitar a prática de anatocismo, encontra apoio na jurisprudência atual do STJ. Precedentes. 5. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.095.852 – PR – (2008/0211803-7) – 2ª S. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 19.03.2016)

Comentário editorial SÍnTeSeO presente acórdão cuida de recurso especial interposto pela Caixa Econômica Federal – CEF, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal em face de acórdão proferido pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:

“ADMINISTRATIVO – AÇÃO ORDINÁRIA – MÚTUO HABITACIONAL – SISTEMA FINANCEIRO DA HA-BITAÇÃO – TABELA PRICE – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS – AMORTIZAÇÃO NEGATIVA – CRITÉRIOS – CONTA APARTADA – PRECEDENTES – 1. O mútuo de dinheiro é contrato oneroso, sujeito ao paga-mento de juros proporcionais ao tempo de resgate da dívida, não sendo admissível intervenção maior se os índices dos salários não acompanham os da inflação. Pelas regras do PES existe a amarração da prestação, mas não do saldo devedor. O dinheiro que foi emprestado recebe correção monetária e há uma defasagem que o mutuário sabe que existe. 2. ‘O contrato de empréstimo bancário vinculado ao SFH não admite pacto de capitalização de juros, em qualquer periodicidade. Agravo no recurso especial desprovido’ (AgRg-REsp 622550/RN, Relª Min. Nancy Andrighi, DJ 01.07.2004 p. 194) 3. ‘O sistema de amortização previsto na legislação de regência não acolhe a possibilidade da criação de outro que preveja apropriação dos juros em conta apartada, quando insuficientes os encargos mensais, atualizada de acordo com o contrato, sendo as parcelas de amortização, quando não pagas, incorporadas ao saldo devedor’ (REsp 788.406/SC, (2005/0170602-3), Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito. Data do Julgamento: 21 de novembro de 2006). 4. As cotas percentuais que compõem a prestação (capital e juros) devem ser mantidas quando da amortização, sem preferência para uma ou outra. 5. Sentença parcialmente reformada. Opostos embargos de declaração pela recorrida alegando omissão no julgado, o acórdão foi complementado nos seguintes termos: Processual Civil. Apelação. Efeito devolutivo.”

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������213

Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, onde bancos só podem cobrar a capitalização anual dos juros de cliente que utiliza o limite do cheque especial se essa cobrança estiver prevista no contrato assinado entre a instituição financeira e o titular da conta-corrente.

A decisão foi tomada pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em julgamento de recurso apresentado por um banco do Paraná.

Na decisão, uma instituição financeira foi proibida de cobrar juros porque não apresentou o contrato assinado pelo cliente que previa a cobrança.

A instituição financeira foi também condenada ao pagamento de multa de 10% sobre o valor corrigido da causa (R$ 1.000,00 em 15 de dezembro de 2003).

O relator mencionou que o entendimento do STJ é de que a cobrança de juros capitalizados em periodi-cidade anual nos contratos bancários somente é possível mediante “expressa pactuação”.

Considerando a ausência de pactuação expressa da capitalização anual, o acórdão do Tribunal de Jus-tiça do Paraná está em conformidade com o entendimento do STJ.

O Tribunal de Justiça do Paraná salientou ainda que a cobrança de tarifas bancárias não precisa estar pactuada em contrato porque representam a remuneração pelos serviços efetivamente prestados pela instituição financeira, sendo devidamente regulamentadas pelo Banco Central.

Vale trazer trecho do voto do relator:

“Sumariando esta uniformização da jurisprudência, transcrevo a seguinte passagem do voto do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino no AgRg-EDcl-Ag 1.082.314, Julgado em 07.06.2011:

‘Com efeito, a capitalização anual dos juros nos contratos de mútuo em geral, atualmente autorizada expressamente pela regra do art. 591 do CC/2002, já era permitida pelo art. 1.262 do CC/2016. Registre-se que, nos negócios jurídicos bancários, a capitalização dos juros pode ser pactuada inclusive com periodicidade inferior à anual, nos contratos celebrados a partir de 31.03.2000, com fulcro no art. 5º da MP 2.170-36. De todo modo, para os contratos celebrados anteriormente a 31.03.2000, já era possível pelo menos a capitalização anual como no mútuo em geral, segundo o precedente unifor-mizador da matéria no âmbito da Segunda Seção (EREsp 917.570/PR)’.

Confira-se:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL – CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO – JUROS REMUNERATÓRIOS – AUSÊNCIA DE PACTUAÇÃO EXPRESSA – TAXA MÉDIA DE MERCA-DO – PREQUESTIONAMENTO – INEXISTÊNCIA – SÚMULAS NºS 282 E 356/STF – CAPITALIZAÇÃO ANUAL DOS JUROS – CABIMENTO – TEMA PACIFICADO – I – As questões não enfrentadas pelo Tribunal estadual recebem o óbice das Súmulas nºs 282 e 356 do C. STF, não podendo, por falta de prequestionamento, ser debatidas no âmbito do recurso especial. II – Cabível a capitalização anual dos juros nos contratos bancários firmados anteriormente à vigência da Medida Provisória nº 1.963-17, de 31.03.2000. Precedente uniformizador da 2ª Seção (EREsp 917.570/PR, Relª Min. Nancy Andrighi, por maioria, DJU de 04.08.2008). III – Agravo desprovido. (AgRg-REsp 1062746/PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4ª T., Julgado em 09.09.2008, DJe 20.10.2008)”

Em face do exposto, o Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial para determinar a imputação dos pagamentos mensais primeiramente aos juros e depois ao principal da dívida contraída pela mutuária, bem como para permitir a capitalização em periodicidade anual dos juros vencidos e não pagos.

8777 – Contrato – resolução – parceria pecuária – expressa previsão de multa – julgamento anteci-pado da lide

“Agravo interno. Agravo em recurso especial. Parceria pecuária. Resolução do contrato. Expressa previsão de multa. Julgamento antecipado da lide. Interpretação de cláusulas contratuais e reexame de prova. 1. É inviável a análise do recurso especial quando dependente de reexame de matéria de prova (Súmula nº 7 do STJ). 2. Não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o Juízo embasa sua convicção em prova suficiente para fundamentar as conclusões expostas na sentença. Precedentes. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 827.771 – (2015/0307308-0) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 17.06.2016 – p. 2109)

8778 – Contrato de participação financeira – cumprimento de sentença – critério para cálculo de indenização

“Agravo interno no agravo em recurso especial. Contrato de participação financeira. Cumprimento de sentença. Critério para cálculo de indenização das ações da telefonia celular. Razões dissociadas. Súmula

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nº 284/STF. Agravo interno desprovido. 1. As razões apresentadas no presente agravo interno encontram--se dissociadas do que foi decidido na decisão monocrática, circunstância que caracteriza deficiência na fundamentação do recurso especial e atrai, por analogia, o óbice da Súmula nº 284 do eg. Supremo Tribu-nal Federal. 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 802.599 – (2015/0268461-0) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 13.05.2016 – p. 1671)

8779 – Contrato de participação financeira – cumprimento de sentença – fundamentos da decisão agravada não impugnados

“Agravo interno no recurso especial. Contrato de participação financeira. Cumprimento de sentença. Fun-damentos da decisão agravada não impugnados. Agravo não conhecido. 1. Na hipótese em exame, aplica--se o Enunciado nº 3 do Plenário do STJ: ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC’. 2. É inviável o agravo interno que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada (CPC/2015, art. 1.021, § 1º). 3. O recurso mostra-se manifestamente inadmissível, a ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, no montante equivalente a 1% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º do citado artigo de lei. 4. Agravo interno não conhe-cido, com aplicação de multa.” (STJ – AgInt-REsp 1.265.727 – (2011/0142307-1) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 17.06.2016 – p. 2148)

8780 – Dano moral – não caracterizado – inscrição indevida comandada pelo suposto credor – ano-tações anteriores

“Recurso especial. Omissão. Não ocorrência. Dano moral. Não caracterizado. Inscrição indevida coman-dada pelo suposto credor. Anotações anteriores. Súmula nº 385/STJ. 1. O acórdão recorrido analisou todas as questões necessárias ao deslinde da controvérsia, não se configurando omissão alguma ou negativa de prestação jurisdicional. 2. ‘Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indeniza-ção por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento’ (Súmu-la nº 385/STJ). 3. Embora os precedentes da referida súmula tenham sido acórdãos em que a indenização era buscada contra cadastros restritivos de crédito, o seu fundamento – ‘quem já é registrado como mau pagador não pode se sentir moralmente ofendido por mais uma inscrição do nome como inadimplente em cadastros de proteção ao crédito’, cf. REsp 1.002.985/RS, Rel. Min. Ari Pargendler – aplica-se também às ações voltadas contra o suposto credor que efetivou a inscrição irregular. 4. Hipótese em que a inscrição indevida coexistiu com quatorze outras anotações que as instâncias ordinárias verificaram constar em nome do autor em cadastro de inadimplentes. 5. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – REsp 1.386.424 – (2013/0174644-5) – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 16.05.2016 – p. 1378)

Comentário editorial SÍnTeSeTrata-se de recurso especial interposto em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado:

“INDENIZAÇÃO – INSCRIÇÃO NEGATIVA – COBRANÇA INDEVIDA – CANCELAMENTO DEVIDO – APONTAMENTO LEGÍTIMO ANTERIOR NÃO DEBATIDO – DANO MORAL – NÃO CABIMENTO – Enseja o cancelamento da inscrição do nome do devedor no cadastro de inadimplentes quando procedida indevidamente, oriunda de cobrança irregular de valores, sendo de se condenar a ré, que agiu negligen-temente, no dever de reparar os danos perpetrados. Preexistente legítima inscrição do nome da parte, nos cadastros de proteção ao crédito, não debatida, não se mostram cabíveis os danos morais.”

Em suas razões, alegou a parte recorrente violação dos arts. 128, 131 e 535, incisos I e II, do Código de Processo Civil, arts. 6º, inciso VI, 14, caput e 17, Código de Defesa do Consumidor, e arts. 186 e 927 do Código Civil, a albergar as seguintes teses recursais: (a) negativa de prestação jurisdicional; (b) julgamento citra petita; e (c) ocorrência de abalo moral.

Por meio de decisão, o recurso especial foi afetado ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil para a consolidação do entendimento desta Corte sobre a “ocorrência de dano moral indenizável na hi-pótese de inscrição em cadastro de inadimplentes com base em dívida inexistente, quando preexistente legítima inscrição anterior”.

O STJ deu provimento ao recurso.

Veja o posicionamento do Relator:

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“A inscrição indevida do devedor em cadastro de inadimplentes promovida pelo credor causa dano moral mesmo que existam inscrições anteriores ativas, o que deverá ser avaliado no momento do arbitramento da indenização.

(ii) Caso concreto:

Voto no sentido de dar provimento ao recurso especial para condenar a demandada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com correção monetária a partir desta data e juros de mora desde o evento danoso, prejudicadas as demais questões suscitadas.”

O ilustre Jurista José Carlos Arouca assim disciplina sobre o dano moral:

“Dano moral, como conceituado por Pinho Pedreira, é todo e qualquer dano extrapatrimonial, afastando ‘as definições que o identificam com os sofrimentos que pode experimentar uma pessoa e que se expres-sam por meio da dor física ou moral, do menoscabo de sentimentos, da pena moral, das inquietações, dos padecimentos não suscetíveis de apreciação “econômica”’. Não há, também, como vinculá-lo a direitos personalíssimos.

O dano moral, no ensinamento de Carlos Alberto Bittar, qualifica-se ‘em razão da esfera da subjetivi-dade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se, portanto, como tais, aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração pessoal)’.

O dano moral deriva do simples fato da violação, tornando-se, pois, desnecessária a prova do reflexo. A indenização, por conseguinte, será fixada mediante arbitramento, na forma do art. 606, II, do CPC.

A reparação, seguindo-se a teorização de Bittar, deve levar em conta a situação da vítima, a posição do lesante, seu patrimônio, a gravidade do fato, seus reflexos. Mas, além disso, deve ter efeito inibitório de repetição de práticas semelhantes.

[...]

Não foi fácil determinar parâmetros para a aferição do dano e sua valoração. Num primeiro momento, lembra Beatriz Della Giustina, a falta de meios, mas principalmente de precedentes e um pouco de coragem para avançar, apelou-se para o Código Eleitoral (Lei nº 4.737/1965), servindo-se mesmo de dispositivos legais do antigo Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/1962), arts. 81 a 88, que enumera as formas delituosas que podem produzir o dano moral (arts. 289 e ss.), com o objetivo de assegurar sua reparação quando ocasionados por propaganda eleitora injuriosa ou deletéria (art. 243, §§ 1º e 2º), para a Lei de Imprensa, nº 5.250/1967, que, regulando a liberdade de manifestação do pensamento e de informações, dispõe no art. 49, I: ‘Aquele que no exercício da liberdade de manifesta-ção de pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar: I – os danos morais e materiais nos casos previstos no art. 16, II e IV, no art. 18 e de calúnia, difamação ou injúria’. Estabelece, ainda, nos arts. 53 e 54, clara distinção entre indenização por dano moral e indenização por dano material. O art. 53, I a III, por sinal, dispõe como deverá o Magistrado proceder no arbitramento do quantum indenizatório.

Na vigência do Código Civil de 1916, acenava-se ao art. 1.533 para o arbitramento da indenização, ‘de maneira equitativa, prudente, não abusiva, atentando para a capacidade de pagar do que causou a situação, de modo a compensar a dor sofrida pelo lesionado e inibir a prática de outras situações semelhantes’. Na opinião de Sérgio Pinto Martins, ‘uma forma de pagamento, completa, seria a aplica-ção analógica da indenização dos arts. 477 e 478 da CLT, do pagamento de um salário por cada ano de serviço trabalhado pelo empregado, considerando-se ano o período igual ou superior a seis meses’, lembrando a regra do art. 948 do antigo Código Civil, o qual explicita que ‘nas indenizações por fato ilícito prevalecerá o valor mais favorável ao lesado’. Refere-se, mais, à decisão do TRT da 8ª Região, sendo Relator o Juiz José Maria Quadros de Alencar, que condenou o infrator ao pagamento de um piso e meio da convenção coletiva, pelo período em que ficou desempregado. E, dentre outras hipóteses, o fornecimento de carta de referência, publicação de nota na imprensa local dando conta do rompimento do contrato de trabalho sem que para tanto tivesse contribuído o empregado.

O Código Civil vigente, no art. 946, remete à Lei processual a fixação do valor das perdas e danos, se a obrigação for indeterminada. A indenização, todavia, na forma do art. 944, ‘mede-se pela extensão do dano’.

O art. 1.533 do diploma anterior foi substituído pelo art. 946: ‘Se a obrigação for indeterminada, e não houver na Lei ou no contrato disposição fixando a indenização devida pelo inadimplente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a Lei processual determinar’.

Para Orlando Teixeira da Costa, ‘na fixação do valor, o julgador, normalmente, subordina-se a alguns parâmetros procedimentais, considerando a extensão espiritual do dano, a imagem do lesado e a do que lesou, a intenção do autor do ato danoso, como meio de ponderar o mais objetivamente possível direitos à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem da pessoa’.

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De nossa parte, lembramos Graciliano Ramos, que, sem pensar no tema, mas em função dos males causados pelo homem, distinguia o capitalista abastado e o proletário sem nada; o intelectual com grande capacidade de discernimento e o inculto, com formação rudimentar. A reparação do dano deve ter presente o perfil do ofendido e do ofensor, isto é, do empregado e do empregador, e, na hipótese colocada, no poderio econômico da empresa, no seu porte, a gravidade do ato ofensivo, a profundidade do dano causado e sua repercussão, interna, no âmbito da empresa, e externa, no meio em que se situa o trabalhador, familiar e social.” (Dano moral. Disponível em: online.sintese.com)

8781 – Danos materiais e morais – ação de indenização – excludente de responsabilidade – dever de indenizar não configurado

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos materiais e morais. Excludente de responsabilidade. Dever de indenizar não configurado. Ausência de impugnação específica dos fundamentos da decisão agravada. Incidência da Súmula nº 182/STJ. Agravo não conhecido. 1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a parte agravante deve infirmar os fundamentos da decisão impugnada, mostrando-se inadmissível o agravo que não se insurge contra todos eles. 2. O agra-vante refuta a incidência da Súmula nº 282/STF, ônus pelo qual não se desincumbiu nas razões do agravo em recurso especial, pugnando, no mais, pela necessidade de apreciação e provimento de seu recurso, o que atrai, sabemos todos, a incidência do Enunciado nº 182 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça. 3. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 851.374 – (2016/0020082-0) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 16.05.2016 – p. 1705)

8782 – Direito intertemporal – recurso especial – modalidade retida – retenção determinada na vigência do CPC/1973 – inaplicabilidade do CPC/2015

“Embargos de declaração. Processual civil. Direito intertemporal. Recurso especial. Modalidade retida. Retenção determinada na vigência do CPC/1973. Inaplicabilidade do CPC/2015. Enunciado Adminis-trativo nº 2/STJ. Rediscussão do acórdão embargado. Descabimento. 1. Controvérsia acerca de decisão que determinou a retenção de recurso especial. 2. Decisão interlocutória do juízo de origem que, sim-plesmente, determinou a expedição de ofícios a instituição financeira para obter informações acerca da situação patrimonial do ex-cônjuge, no curso de um procedimento autônomo de inventário e partilha de bens oriundos da dissolução da sociedade conjugal. 3. Retenção do recurso especial determinada na vi-gência do CPC/1973. 4. Extinção da modalidade recursal retida pelo CPC/2015. 5. Esclarecimento acerca da impossibilidade de aplicação retroativa do CPC/2015 para desconstituir o ato jurídico perfeito (art. 5º, inciso XXXVI, da CF/1988). 6. Aplicabilidade do CPC/1973 à espécie. 7. ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça’ (Enunciado Administrativo nº 2/STJ). 8. Retenção do re-curso especial mantida. 9. Descabimento de rediscussão do julgado em sede de embargos de declaração. 10. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-REsp 1.494.314 – (2014/0032942-4) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 16.05.2016 – p. 1712)

Comentário editorial SÍnTeSeTrata-se de embargos de declaração opostos por M. A. A. de S. contra acórdão assim ementado:

“AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – DIVÓRCIO – PARTILHA – EXPE-DIÇÃO DE OFÍCIO A INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS – MERA OBTENÇÃO DE INFORMAÇÕES – QUESTÃO NITIDAMENTE INTERLOCUTÓRIA – RETENÇÃO DO RECURSO ESPECIAL – NECESSIDADE – ART. 542, § 3º, CPC – 1. Caráter meramente interlocutório da decisão que determina a expedição de ofício a insti-tuições financeiras como medida instrutória no curso de processo de partilha que sucede decretação do divórcio. 2. Limitação constitucional da jurisdição desta Corte Superior ao julgamento de causas decididas (art. 105, inciso III, da Constituição Federal), admitindo-se, excepcionalmente, o conhecimento de ques-tões interlocutórias quando evidente o risco de negativa de prestação jurisdicional ou de dano irreparável à parte, hipóteses não verificas na espécie. 3. Necessidade de retenção do recurso especial, nos termos do art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil. 4. Agravo regimental desprovido.”

A parte embargante alegou, essencialmente, (a) inexistência do regime da retenção após a entrada em vigor do CPC/2015, e (b) existência de coisa julgada acerca da data da partilha.

O STJ rejeitou os embargos de declaração.

Humberto Theodoro Júnior assim escreve sobre o direito intertemporal:

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������217

“Por afetar diretamente o direito subjetivo, e não apenas a pretensão, a decadência, nos casos de inova-ção legislativa quanto aos prazos, não observa as mesmas regras aplicáveis à prescrição. Estas incidem desde logo, para encurtar ou ampliar os prazos prescricionais em curso. Já para a decadência, as regras do direito intertemporal são as próprias do direito de ação, já que esse tipo de direito e o prazo para exercê-lo se consideram inseparáveis.

Os prazos prescricionais podem ser alterados e aplicados imediatamente a fatos pretéritos porque não se referem ao direito material da parte, mas apenas ao remédio processual utilizável para reagir contra a violação do direito. Já quando se trata de decadência, o prazo de exercício do direito integra o próprio direito, de sorte que alterá-lo implicaria ‘ofender direito adquirido’, direito que nasceu e se consolidou antes da nova lei. Qualquer redução de prazo, em termos de decadência, no direito brasileiro, ‘seria inconstitucional’, em face do art. 5º, XXXVI da CF.

Alterada, portanto, a lei disciplinadora do prazo decadencial, a lei nova não atinge os prazos em curso. A decadência do direito nascido no regime da lei velha continua por ela regida, ainda que o prazo só venha a se consumar sob o império da lei nova.

‘Ao contrário do que acontece com a prescrição, em caso de decadência em curso, o prazo e o modo de contá-lo obedecem aos postulados antigos, embora o fenômeno jurídico mencionado se prolongue pelo império de preceitos posteriores’ (MAXIMILIANO, Carlos. Direito intertemporal..., n. 221, p. 259).

Há, contudo, que se admitir a possibilidade de a lei nova ter como objetivo alterar os prazos decaden-ciais ainda não consumados, em casos, por exemplo, de sua ampliação, quando então não se ofenderia o direito adquirido.

A hipótese é viável, mas só se deve entender que o prazo decadencial modificado afeta as situações emergentes da lei anterior se a nova disposição legal assim o determinar. Ao contrário, se há silêncio no texto inovador em termos de prazo decadencial, não será aplicado em regra aos que se iniciaram sob o império da lei anterior.” (Prescrição e decadência no novo Código Civil: alguns aspectos relevantes. Disponível em: http://online.sintese.com)

8783 – Direito securitário – negativa de prestação jurisdicional – não ocorrência – seguro de auto-móvel – perda total do veículo – indenização

“Recurso especial. Civil. Direito securitário. Negativa de prestação jurisdicional. Não ocorrência. Seguro de automóvel. Perda total do veículo. Indenização. Apuração. Valor médio de mercado do bem. Tabe-la Fipe. Data da liquidação do sinistro. Abusividade. Adequação. Dia do sinistro. Princípio indenitário. 1. Cinge-se a controvérsia a saber se a indenização securitária decorrente de contrato de seguro de auto-móvel deve corresponder, no caso de perda total, ao valor médio de mercado do bem (tabela Fipe) apura-do na data do sinistro ou na data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro). 2. O Código Civil de 2002 adotou, para os seguros de dano, o princípio indenitário, de modo que a indenização securitária deve corresponder ao valor real dos bens perdidos, destruídos ou danificados que o segurado possuía logo antes da ocorrência do sinistro. Isso porque o seguro não é um contrato lucrativo, mas de indenização, devendo ser afastado, por um lado, o enriquecimento injusto do segurado e, por outro, o estado de prejuízo. 3. Nos termos do art. 781 do CC, a indenização no contrato de seguro possui alguns parâmetros e limites, não podendo ultrapassar o valor do bem (ou interesse segurado) no momento do sinistro nem podendo exceder o limite máximo da garantia fixado na apólice, salvo mora do segurador. Precedentes. 4. É abusiva a cláu-sula contratual do seguro de automóvel que impõe o cálculo da indenização securitária com base no valor médio de mercado do bem vigente na data de liquidação do sinistro, pois onera desproporcionalmente o segurado, colocando-o em situação de desvantagem exagerada, indo de encontro ao princípio indenitário. Como cediço, os veículos automotores sofrem, com o passar do tempo, depreciação econômica, e quanto maior o lapso entre o sinistro e o dia do efetivo pagamento, menor será a recomposição do patrimônio garantido. 5. A cláusula do contrato de seguro de automóvel a qual adota, na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização securitária deve observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro). 6. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.546.163 – (2014/0270914-7) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 16.05.2016 – p. 1718)

8784 – Embargos de declaração no agravo regimental no recurso especial – Código de Processo Civil de 2015 – aplicabilidade

“Processual civil. Embargos de declaração no agravo regimental no recurso especial. Código de Processo Civil de 2015. Aplicabilidade. Omissão. Ausência de vícios. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação

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do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II – A fundamentação adotada no acórdão é suficiente para respaldar a conclusão alcançada, pelo quê ausente pressuposto a ensejar a oposição de embargos de declaração. III – Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-Ag-REsp 840.356 – (2016/0011476-0) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 16.05.2016 – p. 1443)

8785 – Execução – ajuizamento em face de sócios-avalistas de pessoa jurídica em recuperação judi-cial – suspensão da ação – impossibilidade

“Conflito de competência. Direito empresarial e processual civil. Execução ajuizada em face de sócios--avalistas de pessoa jurídica em recuperação judicial. Suspensão da ação. Impossibilidade. Autonomia das obrigações assumidas no título de crédito. Precedentes do STJ. 1. O disposto no art. 49, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, prevê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (REsp 1.333.349/SP, DJe 02.02.2015) 2. A exceção prevista no art. 6º, da Lei de Falências somente alcança os sócios solidários, presentes naqueles tipos societários (em nome coletivo) na qual a responsabilidade pessoal dos associados não é limitada às suas respectivas quotas/ações. 3. O deferimento do pedido de recuperação judicial não obsta o prosseguimento de eventual execução movida em face de seus respectivos avalistas, tendo em vista o ca-ráter autônomo da garantia cambiária oferecida. Precedentes do STJ. 4. Conflito conhecido para declarar o prosseguimento da execução da cédula de crédito bancária junto ao Juiz de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP.” (STJ – CC 142.726 – GO – (2015/0207184-8) – 2ª S. – Rel. Min. Marco Buzzid – 01.03.2016)

Comentário editorial SÍnTeSePassamos a comentar o acórdão que trata de conflito positivo de competência.

Foi instaurado por Nutrisal Indústria e Comércio de Suplementos Para Alimentação Animal Ltda. e outros, apontando como suscitados o Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Rio Verde/GO, onde se proces-sa a recuperação judicial da suscitante e o Juízo da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP, no qual tramita a execução de cédula de crédito rural ajuizada pelo Banco ABC Brasil S/A, ora interessado.

Consta dos autos, que os sócios da empresa respondem também a uma ação de execução de cédula de crédito rural, no valor de R$ 1.500.000,00, garantida originalmente por 1.944,46 toneladas de soja a granel a serem pagas em quatro parcelas.

Na ação de conflito de competência, os sócios requerem a suspensão da execução, alegando que o plano de recuperação apresentado inclui o pagamento da dívida.

Defendem, ainda, que o plano de recuperação da empresa já foi apresentado e nele consta o arrolamen-to do presente débito no rol de credores. Além disso, o próprio Administrador Judicial da empresa, em manifestação coligida na Impugnação de Crédito oposta pelo Banco ABC entendeu pela permanência desses haveres na classe de credores com garantia real.

O relator salientou que o processo de execução não foi ajuizado contra a fabricante de suplementos para alimentação animal, mas sim contra os sócios da empresa, identificados como avalistas da dívida.

O entendimento do STJ é no sentido de que os credores do devedor em recuperação judicial conservem seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.

No caso em análise, no entanto, a empresa em processo de recuperação é limitada, respondendo os seus sócios tão somente ao valor das cotas integralizadas.

Diversamente das sociedades em nome coletivo, onde a solidariedade é inerente à sua constituição, na sociedade limitada os sócios podem restringir as perdas, porquanto respondem somente pelo capital social, uma vez integralizado totalmente.

O relator lembrou ainda que o avalista é responsável por obrigação autônoma e independente, exigível inclusive se a obrigação for nula, falsa ou inexistente.

Logo, o deferimento do pedido de recuperação judicial não obsta o prosseguimento de eventual exe-cução movida em face de seus respectivos avalistas, tendo em vista o caráter autônomo da garantia cambiária oferecida.

Vale trazer trecho do voto do relator:

“Nesse diapasão:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC) – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO EM RELAÇÃO AO AVALISTA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������219

CONHECEU DO AGRAVO PARA NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL – INSURGÊNCIA DO EXECUTADO/AVALISTA – 1. Por força da autonomia da obrigação cambiária, o processamento de recu-peração judicial deferido à empresa coexecutada não suspende a execução em relação aos coobrigados. Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg-AREsp 457.117/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª T., Julgado em 01.04.2014, DJe 07.04.2014)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – DEFERIMENTO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL À EMPRESA – EXTENSÃO DOS EFEITOS A COOBRIGADOS AVALISTAS – NÃO CABIMENTO – 1. Por força da autonomia da obrigação cambiária, o processamento de recuperação judicial deferido à empresa coexecutada não suspende a execução em relação aos coobrigados. 2. Agravo regimen-tal não provido. (AgRg-AREsp 276.695/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., Julgado em 18.02.2014, DJe 28.02.2014)

AGRAVO REGIMENTAL – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – DEFERIMEN-TO – EMPRESA COEXECUTADA – PEDIDO DE SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO EM RELAÇÃO AOS AVA-LISTAS – IMPOSSIBILIDADE – OBRIGAÇÃO CAMBIÁRIA AUTÔNOMA – ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ – SÚMULA Nº 168/STJ – 1. Não há como abrigar agravo regimental que não logra desconstituir os fundamentos da decisão atacada. 2. Ambas as Tur-mas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça possuem entendimento de que o deferimento do pedido de processamento de recuperação judicial à empresa co-executada não autoriza a suspensão da execução em relação a seus avalistas, por força da autonomia da obrigação cambiária. 3. Não cabem embargos de divergência quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sen-tido do acórdão embargado. (Súmula nº 168/STJ).

4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg-EREsp 1095352/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª S., Julgado em 22.05.2013, DJe 24.05.2013)

AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – AS AÇÕES E EXECUÇÕES MOVIDAS CONTRA OS AVALISTAS NÃO SE SUSPENDEM POR FORÇA DO DEFERIMEN-TO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA COOBRIGADA – 1. Decorre do art. 6º da Lei nº 11.101/2005 a suspensão das ações e execuções que se voltem contra o patrimônio da sociedade em recuperação. 2. O art. 49, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, prevê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso. 3. A obrigação que decorre do aval é autônoma, não tendo a sua eficácia suspensa pelo deferimento da recuperação judicial da sociedade garantida. Precedentes. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg-CC 116.173/AL, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª S., Julgado em 10.04.2013, DJe 15.04.2013)

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE EXECUÇÃO JUDICIAL HIPOTE-CÁRIA – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – DEFERIMENTO – EM-PRESA COEXECUTADA – PEDIDO DE SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO EM RELAÇÃO AOS AVALISTAS – IMPOSSIBILIDADE – OBRIGAÇÃO CAMBIÁRIA AUTÔNOMA – O deferimento do pedido de proces-samento de recuperação judicial à empresa coexecutada não autoriza a suspensão da execução em relação a seus avalistas, por força da autonomia da obrigação cambiária. Agravo no recurso especial não provido. (AgRg-REsp 1378984/RS, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., Julgado em 06.08.2013, DJe 19.08.2013)

RECURSO ESPECIAL – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – NÃO OCORRÊNCIA – QUESTÃO DA COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO FALIMENTAR – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 211/STJ – PROCESSAMENTO DO PEDIDO DE RECUPERAÇÃO JUDI-CIAL – DEFERIMENTO – SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO EXCLUSIVAMENTE EM FACE DA EMPRESA CO-EXECUTADA – POSSIBILIDADE – OBRIGAÇÃO CAMBIÁRIA – AUTONOMIA – PROSSEGUIMENTO – EXECUÇÃO – AVALISTAS – RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO – I – Não há omissão no aresto a quo, no qual se examinou os temas relevantes para deslinde da con-trovérsia, ainda que o resultado não tenha sido favorável à parte recorrente. II – O tema atinente à competência absoluta do Juízo Falimentar não foi objeto de deliberação, sequer implícita, na Instância a quo, o que convoca o óbice da Súmula nº 211/STJ. III – O deferimento do pedido de processamento de recuperação judicial à empresa coexecutada, à luz do art. 6º, da Lei de Falências, não autoriza a suspensão da execução em relação a seus avalistas, por força da autonomia da obrigação cambiária. IV – Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido. (REsp 1095352/SP, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ª T., Julgado em 09.11.2010, DJe 25.11.2010)”

8786 – Justiça gratuita – ausência de comprovação – deserção

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Justiça gratuita. Ausência de comprovação. Deserção. Decisão mantida. Agravo regimental improvido. 1. A exigência de preparo somente é mitigada em razão de manifestação judicial deferindo a gratuidade de justiça, decisão esta não encontrada nos autos. Recurso

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deserto. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 774.763 – (2015/0219329-9) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 16.05.2016 – p. 1671)

Comentário editorial SÍnTeSeCuida-se de agravo regimental interposto contra decisão do Ministro Presidente do STJ que negou seguimento ao agravo em recurso especial.

Nas razões do agravo regimental, os agravantes asseveram que, para a obtenção do benefício da assis-tência judiciária gratuita, é suficiente a mera alegação, na petição inicial, de que a parte não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários advocatícios.

Requerem a reconsideração da decisão agravada ou sua reforma pela Turma julgadora.

O STJ negou provimento ao presente agravo regimental.

O Relator assim aduziu:

“Não se extrai dos autos a decisão que deferiu o benefício em comento e, embora não se faça ‘neces-sário para o processamento do recurso que o beneficiário refira e faça expressa remissão na petição recursal acerca do anterior deferimento da assistência judiciária gratuita’, falta na petição do agravo regimental a identificação da decisão em questão. Ao contrário do que se alega, a sentença condenou os ora agravantes ao pagamento das custas e honorários advocatícios, o que foi mantido pelo Tribunal estadual. Além disso, há comprovante de recolhimento de taxa judiciária, o que corrobora o fato de que não houve a concessão do benefício alegado.

Portanto, ausente o devido preparo, bem como inexistente decisão concessiva do benefício da justiça gratuita, correta a decisão que concluiu pela deserção do recurso especial.”

O ilustre Jurista Nehemias Domingos de Melo assim disciplina sobre a justiça gratuita:

“O acesso à justiça não pode ficar à mercê da possibilidade econômica da parte fazer frente às despe-sas processuais, visto que tal acesso consiste na proteção de qualquer direito, sem qualquer restrição econômica, social ou política. É importante destacar que não basta a simples garantia formal da defesa dos direitos e o acesso aos tribunais, mas a garantia da proteção material destes direitos, assegurando a todos os cidadãos, independentemente de classe social, a ordem jurídica justa.

De outro lado, o Estado tem o dever de conceder a todos o acesso ao Judiciário sem a necessidade de antecipação das despesas processuais. Seria absurdo, para dizer o mínimo, que o ingresso em juízo fosse possível apenas aos que detêm situação econômica abastada. A função do Estado-Juiz é decidir os litígios e trazer a paz social nas relações intersubjetivas, logo esta máxima estaria prejudicada se a maioria da população pobre não pudesse defender seus direitos.

A luta da população por saúde, educação, trabalho, segurança, dentre outras, deveria incluir outra reivindicação, qual seja, a de Justiça Gratuita para todos. A Justiça é monopólio do Estado, logo seu acesso deveria ser livre e gratuito para aqueles que pleiteassem tal benefício. Se a campanha por justiça gratuita prosperar, podemos até sugerir um slogan: ‘Justiça Gratuita para Todos!’.

O Professor Gabriel de Rezende Filho, já nos idos de 1954, preconizava que ‘a justiça deve estar ao al-cance de todos, ricos e poderosos, pobre e desprotegidos, mesmo porque o Estado reservou-se o direito de administrá-la, não consentindo que ninguém faça justiça por suas próprias mãos. Comparecendo em juízo um litigante desprovido completamente de meios para arcar com as despesas processuais, inclusi-ve honorários de advogado, é justo seja dispensado do pagamento de quaisquer custas...’.

Partilhando do mesmo pensamento, Vicente Grecco Filho afirma de forma peremptória que ‘uma justiça ideal deveria ser gratuita. A distribuição da justiça é uma das atividades essenciais do Estado e, como tal, da mesma forma que a segurança e a paz pública, não deveria trazer ônus econômico aqueles que dela necessitam. Todavia, inclusive por tradição histórica, a administração da justiça tem sido acompa-nhada do dever de pagamento das despesas processuais, entre as quais se inclui o das custas que são taxas a serem pagas em virtude da movimentação do aparelho jurisdicional’.

José Renato Nalini, festejado pelo Juiz Eduardo Bezerra de Medeiros Pinheiros, vai mais longe ao afirmar que ‘do juiz se exige não apenas reequilibrar as situações díspares, mas ainda oferecer seu talento, desforço pessoal e inteligência para ampliação real do rol de atendidos pela Justiça. E para isso é necessário desenvolver uma concepção consentânea do princípio fundamental da isonomia. Não é uma opção preferencial pelos pobres, no sentido da teologia da libertação. Mas a constatação de que a pobreza extrema é inconciliável com o exercício da igualdade e liberdade’.

Na realidade social em que vivemos, entendemos que incumbe ao Poder Judiciário abandonar o mundo da ficção jurídica, da abstração da norma, do ‘faz de conta’ e efetivar a concretização de direitos fun-damentais consagrados pela Constituição do Brasil (direito à igualdade, devido processo legal material,

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direito à ampla defesa, proteção do consumidor, direito à assistência judiciária integral), assumindo, assim, uma postura ativa – e não neutra – na busca da justiça processual.

Assim, cabe ao juiz da causa analisar cada situação em particular e, na dúvida pro misero, até porque o benefício da justiça gratuita não há de ser estendido apenas aos miseráveis, mas sim a todo aquele cuja situação econômica não lhe permite pagar custas processuais e honorários de advogado, que, em muitos casos, se torna extremamente oneroso, independentemente do salário ou dos bens que possua o postulante. Assim, é irrelevante que a parte seja proprietária de bens ou tenha colado grau superior, pois, não obstante isso, poderá, num dado momento de sua vida, não ter disponibilidade de numerários suficientes para fazer frente às despesas processuais.” (Da justiça gratuita como instrumento de demo-cratização do acesso ao Judiciário. Disponível em: http://online.sintese.com)

8787 – Loteamento irregular – responsabilidade pela regularização – Súmula nº 283/STF

“Administrativo e processual civil. Loteamento irregular. Responsabilidade pela regularização. Recurso especial com seguimento negado. Súmula nº 283/STF. Recurso interno que veicula razões recursais dis-sociadas do fundamento da decisão. Aplicação da Súmula nº 284/STF. Agravo regimental não conhecido. 1. Não se conhece do Agravo Regimental que veicula razões recursais dissociadas do fundamento da deci-são recorrida, ante a incidência da Súmula nº 284/STF. 2. A decisão agravada negou seguimento ao Recurso Especial verificando que não foi impugnado especificamente fundamento essencial do acórdão recorrido, qual seja, de que o desprovimento da Apelação se deu não pela negativa de responsabilidade do loteador, mas sim pela circunstância particular de serem estes meros possuidores do imóvel em questão, não osten-tando título dominial, requisito necessário para a regularização do loteamento, não podendo sujeitar-se à obrigação que lhe é cabível. 3. No Regimental, o Agravante não tenta rebater esse fundamento, indican-do como motivo norteador do óbice matéria diversa daquela indicada no decisum agravado, razão pela qual se verifica que suas razões são dissociadas. 4. Agravo Regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-REsp 1.298.172 – (2011/0247596-6) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 16.05.2016 – p. 1477)

8788 – Petição eletrônica – subscrição digital – advogado subscritor sem procuração nos autos – recurso inexistente

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Petição eletrônica. Subscrição digital. Advogado subs-critor sem procuração nos autos. Recurso inexistente. Súmula nº 115/STJ. Agravo não conhecido. 1. Tra-tando-se de recurso interposto por meio eletrônico, a petição é considerada assinada pelo advogado por-tador do certificado digital que a encaminhou. Se ausente a procuração do advogado subscritor do agravo regimental, o recurso deve ser considerado inexistente, pela aplicação do verbete sumular nº 115 do STJ. Precedentes. 2. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 789.451 – (2015/0236555-1) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 16.05.2016 – p. 1678)

8789 – Preclusão consumativa – multiplicidade de petições – admissibilidade

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Multiplicidade de petições. Preclusão consumativa. Admissibilidade. Ausência de impugnação da decisão agravada. Art. 544, § 4º, inciso I, do Código de Processo Civil. 1. A multiplicidade de recursos interpostos pela mesma parte litigante, ante a incidência da preclusão consumativa, resulta no não conhecimento daqueles que foram protocolizados por último. 2. Incumbe ao agravante infirmar especificamente todos os fundamentos da decisão agravada, demons-trando o seu desacerto, de modo a justificar o cabimento do recurso especial interposto, sob pena de não ser conhecido o agravo (art. 544, § 4º, inciso I, do CPC). 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg--Ag-REsp 801.476 – (2015/0262886-0) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 16.05.2016 – p. 1684)

8790 – Recuperação judicial – discussão sobre inclusão de crédito em plano de recuperação judicial – ação de indenização por danos morais – “demanda ilíquida” – crédito referente à ação indenizatória

“Recurso especial. Recuperação judicial. Violação ao art. 535 do CPC. Não ocorrência. Discussão sobre inclusão de crédito em plano de recuperação judicial. Ação de indenização por danos morais. ‘Demanda ilíquida’. Aplicação do § 1º do art. 6º da Lei nº 11.101/2005. Crédito referente à ação indenizatória. Obri-gação existente antes do pedido de soerguimento. Inclusão no plano de recuperação. Violação ao art. 59 da Lei nº 11.101/2005. Recurso provido. 1. Não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo

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Civil, pois o eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha a examinar uma a uma as alegações e os argumentos expendidos pelas partes. Ademais, não se con-figura omissão quando o julgador adota fundamento diverso daquele invocado nas razões recursais. 2. No caso, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença conde-natória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso. 3. A ação na qual se busca indenização por danos morais – caso dos autos – é tida por ‘demanda ilíquida’, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto. 4. Tratando--se, portanto, de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial. Interpretação do § 1º do art. 6º da Lei nº 11.101/2005. 5. Segundo o caput do art. 49 da Lei nº 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. 6. A situação dos autos demonstra que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, bem como a sentença que reconheceu a exis-tência de dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação, ocorreram antes do pedido de recuperação judicial. 7. Na hipótese de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato pree-xistente ao momento da recuperação judicial, é necessária a sua habilitação e inclusão no plano de recu-peração da sociedade devedora. 8. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.447.918 – (2014/0081270-0) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 16.05.2016 – p. 1737)

8791 – Recuperação judicial – execução – crédito extraconcursal – penhora sobre faturamento das empresas

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Processual civil (CPC/1973). Empresas em recuperação judicial. Execução. Crédito extraconcursal. Penhora sobre faturamento das empresas. Reexame de matéria fática. Incidência da Súmula nº 7/STJ. Fundamentos não impugnados. Aplicação, por analogia, da Súmula nº 283/STF. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 558.407 – (2014/0193391-9) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 17.06.2016 – p. 2058)

8792 – Recurso – falta de demonstração do preparo – interposição do apelo – guia de recolhimento – falta de juntada

“Agravo regimental em recurso especial. Decisão da presidência desta Corte que inadmitiu o processa-mento do recurso ante a falta de demonstração do preparo quando da interposição do apelo, pela falta de juntada da respectiva guia de recolhimento. Agravo regimental a que se nega provimento. 1. É firme o entendimento desta Corte de que a comprovação do preparo do Recurso Especial deve ser feita mediante a juntada, no ato da interposição do recurso, das guias de recolhimento devidamente preenchidas, além dos respectivos comprovantes de pagamento, ambos de forma visível e legível, sob pena de deserção, de modo que, a juntada apenas do comprovante de pagamento das custas processuais, desacompanhado da respectiva guia de recolhimento, é insuficiente à comprovação do preparo. Precedente da Corte Especial: AgRg-EAREsp. 562.945/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe 15.06.2015. 2. A juntada posterior da respectiva guia de recolhimento não afasta a deserção do Recurso Especial, na medida em que é seguro o entendimento no âmbito do STJ na compreensão que se faz necessário que o recorrente demonstre, no ato da interposição e de acordo com a legislação pertinente, a regularidade do preparo do Apelo Especial. 3. Há, porém, entendimento flexibilizando tal regra, ao afirmar que a comprovação do pagamento das custas relativas ao preparo por meio de guia de depósito do Banco do Brasil contendo todos os elementos de identificação do processo afastava a deserção mesmo ausente a GRU (EDcl-AgRg-AREsp. 211.961/RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, Rel. p/ Ac. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 19.12.2013). 4. Ocorre que este entendimento não se amolda ao caso concreto, haja vista que o comprovante de pagamento de cus-tas apresentado quando da interposição do recurso não contém o número do processo a que se refere, nem outro elemento que sirva para a sua identificação, não servindo, de fato, a demonstração do regular preparo do recurso, que só seria possível através da verificação da identidade entre a referência numérica do pagamento constante da GRU e aquela consignada no comprovante de quitação respectivo. 5. Agra-vo Regimental desprovido.” (STJ – AgRg-EDcl-REsp 1.543.986 – (2015/0174771-8) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 16.05.2016 – p. 1512)

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8793 – Recurso incapaz de alterar o julgado – admissibilidade – decisão agravada – ausência de impugnação

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Recurso incapaz de alterar o julgado. Admissibili-dade. Decisão agravada. Ausência de impugnação. Art. 544, § 4º, inciso I, do Código de Processo Ci-vil/1973. 1. Incumbe ao agravante infirmar especificamente todos os fundamentos da decisão agravada, demonstrando o seu desacerto, de modo a justificar o cabimento do recurso especial interposto, sob pena de não ser conhecido o agravo (art. 544, § 4º, inciso I, do CPC/1973). 2. Agravo regimental não provi-do.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 795.256 – (2015/0256837-0) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 16.05.2016 – p. 1683)

8794 – Registro – titular de serviços notariais – perda da delegação – magistrado como única autori-dade processante – previsão na Lei Federal nº 8.935/1994 e na Lei Estadual nº 11.183/1998 – ausência de vício

“Processual civil. Administrativo. Disciplinar. Titular de serviços notariais e de registro. Perda da dele-gação. Embargos de declaração. Alegação de omissão. Magistrado como única autoridade processante. Previsão na Lei Federal nº 8.935/1994 e na Lei Estadual nº 11.183/1998. Ausência de vício. Alegado cer-ceamento. Indeferimento de adiamento para distribuição de memoriais. Inexistência. Precedente. Mérito. Rediscussão. Impossibilidade. Rejeição. 1. Embargos de declaração foram opostos contra acórdão que negou provimento ao recurso ordinário interposto contra decisum que firmou a inexistência de direito líquido e certo à anulação de processo disciplinar instaurado contra titular de serventia extrajudicial sob a alegação de que deveria ter sido o regrado pela Lei nº 10.098/1994 (Estatuto e Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio Grande do Sul); alega omissão e cerceamento de defesa. 2. Não há a omissão alegada; há apenas a postulação de reapreciação do mérito, tendo sido o acórdão claro e completo, ao indicar que, no caso concreto, não há falar em nulidade pela instauração e pro-cessamento da recorrente pelo magistrado local; tal proceder é previsto no art. 18, I e II, da Lei Estadual nº 11.183/1998, com amparo no art. 73 da Lei Estadual nº 7.359/1980 (Código de Organização Judiciária do Estado) e no art. 37 da Lei Federal nº 8.935/1994. 3. O indeferimento do pedido da parte de adiamento de julgamento em razão do pleito de distribuição de memoriais não configura o alegado cerceamento de defesa: ‘[...] A apresentação de memoriais não é ato substancial e intrínseco à defesa, motivo pelo qual o indeferimento da retirada do processo de pauta para julgamento, para ensejar a sua apresentação, não acarreta cerceamento de defesa [...]’ (RMS 15.674/MG, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., DJ 22.04.2003, p. 196). 4. Não existem vícios. Há irresignação da parte embargante com o resultado do julgado, que, em razão da inexistência de nenhum vício, determina a rejeição dos embargos de declaração. Precedentes: ED-MS 26.696/DF, Relª Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, Processo Eletrônico publicado no DJe-218 em 06.11.2014; e ED-AgR-MS 26.111/DF, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª T., Acórdão Eletrônico publicado no DJe-100 em 28.05.2013. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-MS 49.893 – (2015/0307377-4) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 16.05.2016 – p. 1531)

8795 – Representação processual – advogado subscritor – agravo e do recurso especial

“Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Falha na representação processual do advogado subscritor do agravo e do recurso especial. Súmula nº 115/STJ. Incidência. Inaplicabilidade do art. 13 do CPC/1973 na instância especial. Precedentes. 1. A ausência de completa cadeia de subs-tabelecimentos conferindo poderes ao subscritor do agravo e do recurso especial atrai a incidência da Súmula nº 115 deste Superior Tribunal, cujo teor é o seguinte: ‘Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos’. 2. Não se afigura aplicável a providência do art. 13 do CPC/1973, uma vez que o vício de representação é considerado insanável na instância extraordinária. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 836.026 – (2015/0326851-8) – 2ª T. – Relª Min. Diva Malerbi – DJe 16.06.2016 – p. 3086)

8796 – Responsabilidade civil – inscrição em cadastro de inadimplentes – existência de inscrições anteriores

“Agravo interno no agravo em recurso especial. Responsabilidade civil. Inscrição em cadastro de inadim-plentes. Existência de inscrições anteriores. Súmula nº 385/STJ. Alegação de violação do art. 334, III, do CPC/1973. Preclusão. Ausência de prequestionamento. Súmula nº 211/STJ. Agravo improvido. 1. A questão referente à ausência de impugnação, sob o enfoque do conteúdo normativo do art. 334, III,

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do Código de Processo Civil/1973 foi apresentada apenas nos segundos embargos de declaração, tendo ocorrido a preclusão dessa questão. 2. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 841.856 – (2016/0002736-2) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 17.06.2016 – p. 2118)

8797 – Responsabilidade civil por fato de outrem – CC/1916 – responsabilidade dos pais pelos atos ilícitos praticados pelo filho menor – valor indenizatório

“Embargos de declaração no agravo regimental no recurso especial. Responsabilidade civil por fato de outrem. CC/1916. Responsabilidade dos pais pelos atos ilícitos praticados pelo filho menor. Valor indeni-zatório. Atração do Enunciado nº 7/STJ. 1. A revisão do valor da indenização por danos morais somente se entrega a esta Corte Superior, na via do recurso especial, quando presente o exacerbo ou a irrisoriedade do valor arbitrado. Inexistência de qualquer vício a fazer acolhido os aclaratórios, estando presente apenas o intuito de revisão do entendimento manifestado por este sodalício. 2. Intuito protelatório reconhecido, na esteira do art. 538, parágrafo único, do CPC/1973. 3. Embargos de declaração rejeitados, com aplica-ção de multa.” (STJ – EDcl-AgRg-REsp 1.549.893 – (2013/0071898-6) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 13.05.2016 – p. 1621)

8798 – Seguro de vida – acidente de trânsito – indenização da garantia básica

“Agravo interno no agravo em recurso especial. Seguro de vida. Acidente de trânsito. Indenização da garantia básica. Ausência de prequestionamento. Súmula nº 211/STJ. Embriaguez do segurado. Condição determinante do acidente. Súmula nº 7/STJ. Agravo interno não provido. 1. Na hipótese em exame, aplica--se o Enunciado Administrativo nº 2 do STJ: ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (rela-tivos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.’ 2. As questões federais não enfrentadas pelo Tribunal estadual, a despeito da oposição do embargos de declaração, recebem o óbice das Súmulas nºs 282 e 356 do STF e 211 do STJ, não podendo, por falta de prequestionamento, ser debatidas no âmbito do recurso especial. 3. Em casos de acidente de trânsito, a embriaguez do segurado, por si só, não pode ser considerada causa de agravamento de risco, a exonerar, em qualquer hipótese, a seguradora. A seguradora somente fica exonerada de pagar a inde-nização quando demonstrado que o agravamento do risco pela embriaguez influiu efetivamente para a ocorrência do sinistro. 4. Alterar a conclusão do Tribunal de origem, para afirmar que a embriaguez da parte recorrente não determinou a ocorrência do acidente, demanda o reexame de fatos e provas, ativi-dade não realizável nesta via especial. Incidência da Súmula nº 7/STJ. 5. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 777.415 – (2015/0225640-6) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 13.05.2016 – p. 1668)

8799 – Seguro DPVAT – indenização – credor putativo – teoria da aparência

“Recurso especial. Civil. Seguro DPVAT. Indenização. Credor putativo. Teoria da aparência. 1. Pela apli-cação da teoria da aparência, é válido o pagamento realizado de boa-fé a credor putativo. 2. Para que o erro no pagamento seja escusável, é necessária a existência de elementos suficientes para induzir e convencer o devedor diligente de que o recebente é o verdadeiro credor. 3. É válido o pagamento de indenização do DPVAT aos pais do de cujus quando se apresentam como únicos herdeiros mediante a entrega dos documentos exigidos pela lei que dispõe sobre seguro obrigatório de danos pessoais, hipótese em que o pagamento aos credores putativos ocorreu de boa-fé. 4. Recurso especial conhecido e provido.” (STJ – REsp 1.601.533 – (2012/0115489-7) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 16.06.2016 – p. 3216)

8800 – Título de crédito – duplicata mercantil – aceite em separado – ato formal – ausência de efi-cácia cambial – falta de executividade – instrução de ação monitória – possibilidade

“Recurso especial. Comercial. Negativa de prestação jurisdicional. Não ocorrência. Embargos à execução. Títulos de crédito. Duplicata mercantil. Aceite em separado. Inadmissibilidade. Ato formal. Ausência de eficácia cambial. Falta de executividade. Prova da relação negocial. Instrução de ação monitória. 1. Cinge--se a controvérsia a saber se é possível o aceite em separado na duplicata mercantil. 2. O aceite promovido na duplicata mercantil corresponde ao reconhecimento, pelo sacado (comprador), da legitimidade do ato de saque feito pelo sacador (vendedor), a desvincular o título do componente causal de sua emissão (com-pra e venda mercantil a prazo). Após o aceite, não é permitido ao sacado reclamar de vícios do negócio causal realizado, sobretudo porque os princípios da abstração e da autonomia passam a reger as relações,

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doravante cambiárias (art. 15, I, da Lei nº 5.474/1968). 3. O aceite é ato formal e deve se aperfeiçoar na própria cártula (assinatura do sacado no próprio título), incidindo o princípio da literalidade (art. 25 da LUG). Não pode, portanto, ser dado verbalmente ou em documento em separado. De fato, os títulos de crédito possuem algumas exigências que são indispensáveis à boa manutenção das relações comerciais. A experiência já provou que não podem ser afastadas certas características, como o formalismo, a car-tularidade e a literalidade, representando o aceite em separado perigo real às práticas cambiárias, ainda mais quando os papéis são postos em circulação. 4. O aceite lançado em separado à duplicata não possui nenhuma eficácia cambiária, mas o documento que o contém poderá servir como prova da existência do vínculo contratual subjacente ao título, amparando eventual ação monitória ou ordinária (art. 16 da Lei nº 5.474/1968). 5. A duplicata despida de força executiva, seja por estar ausente o aceite, seja por não haver o devido protesto ou o comprovante de entrega de mercadoria, é documento hábil à instrução do procedimento monitório. 6. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.334.464 – RS – (2012/0148102-3) – 3ª T – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 28.03.2016)

Comentário editorial SÍnTeSeO vertente acórdão trata de recurso especial interposto pelo recorrente, com fundamento no art. 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Consta dos autos que a recorrente apresentou embargos à execução movida pelo recorrido, aduzindo, entre outras alegações, que os títulos exequendos (duplicatas) não foram aceitos ou protestados, de modo que careceriam de exigibilidade.

Em sua defesa, a exequente asseverou que é endossatária das duplicatas, visto ser uma empresa de fomento mercantil, tendo sido satisfeito o requisito da exigibilidade, pois o aceite foi dado em separado: não nas próprias cártulas, mas em documento autônomo.

O magistrado a quo, entendendo que as duplicatas haviam circulado no mercado por endosso, a ensejar a abstração, bem como que o aceite em separado era válido, julgou improcedentes os embargos do devedor.

Irresignada, a embargante interpôs recurso de apelação, o qual não foi provido pela Corte de Justiça estadual.

O acórdão recebeu a seguinte ementa:

“EMBARGOS DO DEVEDOR – DUPLICATAS – ENDOSSO – ACEITE REALIZADO EM APARTADO, ANTES DA OPERAÇÃO DE DESCONTO E REMETIDO À ENDOSSATÁRIA – VALIDADE – ARTS. 7º, DA LEI DE DUPLICATAS E 29 DA LUG – PENHORA DE DINHEIRO – REGULARIDADE

Causa espécie e denuncia a má-fé a insurgência posterior, sendo regular o aceite dado em separado, permitido, segundo a doutrina, nos termos do art. 7º da Lei de Duplicatas, como também admitido pelo art. 29, da Lei Uniforme de Genebra.

Modo igual, não se sustenta a insurgência da apelante quanto à penhora on-line efetivada, sabido que valores em espécie precedem a ordem da penhora, não evidenciado, ainda, que lesões irreparáveis possam advir da medida, como bem decidiu o magistrado. Apelação desprovida.”

Vale trazer trecho do voto do relator:

“O principal efeito do aceite na duplicata é o reconhecimento, pelo sacado (comprador), da legitimida-de do ato formal de saque promovido pelo sacador (vendedor), a desvincular o título do componente causal de sua emissão. Por isso é que, após o aceite, não é permitido ao sacado reclamar de vícios do negócio causal realizado, sobretudo porque os princípios da abstração e da autonomia passam a reger as relações, doravante cambiárias.

Assim, na duplicata, quando o sacado promover o aceite no título, a dívida, que era somente obri-gacional, passará também a ser cambiária, permitindo o acesso à via executiva, já que nascerá um legítimo título executivo extrajudicial (art. 15, I, da Lei nº 5.474/1968). Em outras palavras, o aceite na duplicata mercantil transforma o comprador (relação de compra e venda mercantil a prazo) em devedor cambiário do sacador ou, ainda, do endossatário, caso o título tenha sido posto em circulação por meio do endosso.

Cumpre ressaltar, ademais, que mesmo as duplicatas sem aceite podem possuir força executiva se protestadas e acompanhadas dos comprovantes de entrega de mercadorias, em não havendo recusa do aceite pelo sacado (art. 15, II, da Lei nº 5.474/1968).

No que tange à forma do aceite, não há como afastar uma de suas características intrínsecas, que é o formalismo. Desse modo, tal ato deve ser formal e se aperfeiçoar na própria cártula, incidindo o

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princípio da literalidade. Nos termos do art. 25 da LUG, “O aceite é escrito na própria letra. Exprime-se pela palavra ‘aceite’ ou qualquer outra palavra equivalente; o aceite é assinado pelo sacado. Vale como aceite a simples assinatura do sacado aposta na parte anterior da letra”. Não pode, portanto, o aceite ser dado verbalmente ou em documento em separado. De fato, os títulos de crédito possuem algumas exigências que são indispensáveis à boa manutenção das relações comerciais. A experiência já provou que não podem ser afastadas certas características, como o formalismo, a cartularidade e a literalidade, representando o aceite em separado perigo real às práticas cambiárias, ainda mais quando os papéis são postos em circulação.

Por pertinente, cumpre transcrever a seguinte lição de Carvalho de Mendonça:

“[...]

724. Onde deve ser firmado o aceite. Se o sacado, apresentada a letra de câmbio, resolve aceitá-la, deve firmar o aceite no anverso da própria letra, lançando-o transversalmente no extremo esquerdo. Tal o estilo quanto ao posto dessa declaração. Como, porém, essa assinatura é firmada também transver-salmente. Não há aceite verbal ou lançado em ato ou papel separado, ainda que mencionado na letra; a obrigação cambial deve constar do título; é formal. Essa razão é decisiva no sistema da nossa lei. Se não bastasse esta razão, deveríamos ter presentes as palavras de Pappaert, delegado do Tribunal de Comércio de Alost (Bélgica) no Congresso de Bruxelas de 1888: ‘A prática de 30 anos ensinou-me que o aceite por meio de ato separado constitui um perigo real. Muitas vezes, torturam-se os termos do ato separado; uma das partes pretende que este importa um aceite, a outra sustenta o contrário; daí custoso processo. Desde que se deve aceitar, por que não fazê-lo sobre o próprio título?’ (Actes, p. 491).

Se, portanto, o sacado dá o aceite em papel ou documento separado da letra, recusa aceitá-la.

Pode, entretanto, o sacado firmar o aceite em um dos exemplares da letra de câmbio” (MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. 1. ed. Campinas: Russell Editores, v. III, t. II, 2003. p. 300/301).

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento à reforma, reformando a decisão cole-giada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

8801 – União estável – ação de reconhecimento – homem casado – ocorrência de concubinato – separação de fato não provada

“Direito de família e processual civil. Recurso especial. Ação de reconhecimento de união estável. Ho-mem casado. Ocorrência de concubinato. Separação de fato não provada. Necessidade de reexame de prova. Súmula nº 7/STJ. Agravo não provido. 1. A jurisprudência do STJ e do STF é sólida em não reco-nhecer como união estável a relação concubinária não eventual, simultânea ao casamento, quando não estiver provada a separação de fato ou de direito do parceiro casado. 2. O Tribunal de origem estabeleceu que o relacionamento entre a autora e o de cujus configura concubinato, uma vez que, conforme consig-nado no v. acórdão recorrido, as provas documental e testemunhal presentes nos autos não corroboram a versão de que o falecido estava separado de fato no período do alegado relacionamento. 3. A inversão do entendimento firmado nas instâncias ordinárias, na forma pleiteada pela agravante, demandaria o reexame de provas, o que é defeso em sede de recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo regi-mental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 748.452 – (2015/0176370-8) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.03.2016 – p. 4103)

Comentário editorial SÍnTeSeTrata-se de agravos internos interpostos contra decisão monocrática desta relatoria, que negou provi-mento ao agravo em recurso especial, porquanto se entendeu que a pretensão de reconhecimento de união estável demandaria, no caso, o reexame do suporte fático-probatório dos autos, medida essa que encontra óbice na Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça.

A agravante, em suas razões recursais, afirma, em síntese, que, “no caso recorrido, a Agravante não está reexaminando as provas constantes aos autos. Em que pese destacá-las, o ponto de divergência se dá pelo entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina no que concerne à valoração da prova, isso porque, conforme se constata do acórdão guerreado, o Tribunal Catarinense, não obstante o reconheci-mento de que a Agravante manteve relacionamento amoroso com o de cujus, não se configura o instituto da União Estável” (e-STJ, fl. 603) e que “no corpo de suas razões recursais demonstrou claramente a divergência entre a decisão do Tribunal Catarinense e dos julgados dos Tribunais de Pernambuco e do Rio Grande do Sul, não havendo razão na inadmissão do recurso, porquanto seu pressuposto está devidamente preenchido no caso concreto”.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ������������������������������������������������������������������������������227

O relator assim escreveu:

“É necessário esclarecer, desde logo, que inexiste ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil, por-quanto as questões submetidas ao Tribunal de origem foram suficiente e adequadamente apreciadas, com abordagem integral do tema e fundamentação compatível, motivo pelo qual o acórdão recorrido não padece de omissão, contradição ou obscuridade.

Com efeito, a Corte local enfrentou o tema posto por ocasião da interposição do recurso de apelação e dos embargos declaratórios opostos na sequência, expondo, de maneira clara, as razões pelas quais entendeu não ser possível o reconhecimento de união estável entre pessoa casada e terceiro, especial-mente quando não demonstrada a ocorrência de separação de fato ou de direito.

Registre-se, ademais, que, conforme o entendimento pacífico desta Corte, o julgador não está obrigado a responder a todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para decidir a controvérsia.”

Sobre a diferença entre união estável e concubinato no novo Código Civil, vejamos as lições de Marco Túlio Murano Garcia:

“Da mesma forma, o NCCB fez clara distinção entre união estável e concubinato, a primeira materializa-da pela união entre pessoas que abraçam o relacionamento de fato livremente, por opção, a despeito de poderem se casar, se quiserem, ou seja, a união entre pessoas não impedidas de se casar e o segundo caracterizado pela união de pessoas impedidas de se casar, que então optam pelo relacionamento de fato diante da impossibilidade de contraírem núpcias.

A distinção é mais relevante do que pode parecer num primeiro espasmo. O legislador fez clara distinção entre as figuras do ‘concubinato puro’ (= união de pessoas livres para o casamento) e do ‘concubinato impuro’ (= união de pessoas impedidas), definindo o ‘concubinato puro’ como união estável, digna de toda proteção como instituto de direito de família e o ‘concubinato impuro’ simplesmente como concu-binato, cujos efeitos parecem estar fora do âmbito do direito de família, aplicando-se a tal espécie de relação às teorias da sociedade de fato e da indenização por serviços prestados, forte no princípio que veda o enriquecimento sem causa.

De fato, o primeiro problema que se apresenta diante da distinção claramente efetivada pelo NCCB é este: como será tratado o concubinato.” Isto porque o NCCB criou 2 (dois) institutos que são distintos. A união estável, cujos efeitos vieram definidos e o concubinato, para o qual não houve nenhuma previsão de eficácia ou de tratamento, o que ficará por conta da jurisprudência.

Antes de prosseguir referindo esta questão da regulação da eficácia do concubinato, pedimos vênia para abrir um parêntese e mencionar que concordamos com esta distinção entre união estável e concubinato, inclusive do ponto de vista do seu principal efeito, que é o de excluir o concubinato da proteção que se dá à família oriunda do casamento, da união estável e também à monoparental. Tenho, principalmente no que diz com os relacionamentos que envolvem pessoas casadas, e neste tanto forte na opinião de Rodrigo da Cunha Pereira, que o primado da monogamia exige tal postura do legislador. Ou abolimos a monogamia ou negamos eficácia aos relacionamentos adulterinos ou paralelos, sob pena de instalarmos a insegurança jurídica, que deve ser evitada a todo custo.

Houve um tempo em que era justificável a proteção de relações adulterinas, diante da dificuldade que representava dissolver um casamento, seja do ponto de vista da moral social (resistência e preconceito), seja do ponto de vista jurídico (acesso muito estreito, primeiro apenas à separação e depois ao divórcio), de sorte que muitas pessoas só encontravam o caminho da felicidade e da realização pessoal por meio de relações adulterinas. Não por sua vontade, e sim por imposição legal e social.

Hoje, todavia, as coisas não se passam mais desta maneira. A sociedade é muito mais tolerante e o direito, sobretudo depois do advento da CF/1988, consagrou enorme abertura para a separação e para o divórcio, não se justificando mais, sob nenhum prisma, que uma determinada pessoa escolha o caminho de um relacionamento clandestino. Se faz esta escolha, o faz livremente, não sendo lídima a intenção de, posteriormente, pretender extrair efeitos desta relação, sobretudo em detrimento da posi-ção do cônjuge, quase sempre ignorante quanto ao relacionamento paralelo.

E não vai aqui nenhuma carga de preconceito. Muito pelo contrário, posto que somos mesmo a favor da poligamia institucionalizada, da qual poderão ser adeptos aqueles que livremente escolherem. Tudo é uma questão de liberdade e autodeterminação. Ou você se casa ou não se casa! Admitimos mesmo, sem maiores considerações, que alguém possa viver um relacionamento paralelo ao casamento, se isto lhe trouxer satisfação pessoal, mas daí a querer extrair efeitos jurídicos, pessoais (ex.: alimentos) e patrimoniais (ex.: partilha de bens) de tal relacionamento é outra coisa.

O que não se pode admitir, tanto do ponto de vista do cônjuge ignorante (que desconhece o relaciona-mento paralelo) quanto de terceiros que travem relações negociais com qualquer dos partícipes de uma relação com esta marca, é que possam vir a ter seus negócios questionados ou afetados, por exemplo,

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por uma demanda de índole patrimonial entre os concubinos, nos quais se possa questionar a alienação de bens imóveis adquiridos durante o concubinato e mediante esforço comum. Também não parece legítimo obrigar o cônjuge alheio ao relacionamento paralelo a dividir patrimônio e/ou um benefício de aposentadoria com o concubino sobrevivente.

Admissível, em tese, seria proteger – até mesmo sob os auspícios da união estável (no mínimo quanto à partilha de patrimônio que tivesse auxiliado a adquirir, direta ou indiretamente) – o concubino de boa-fé, ou seja, aquele que vivesse uma relação paralela ignorando o estado de casado do outro, aplicando--se, nesta hipótese, a teoria do casamento putativo, que socorre o cônjuge que ignorar vício capaz de implicar na nulidade ou na anulação do casamento. Isto em nome da boa-fé.

O TJRS, em recente julgado, que muito embora prolatado antes da vigência do NCCB, ainda se mostra atual ante o raciocínio que desenvolvemos, decidiu exatamente o seguinte:

‘A união estável é entidade familiar e o nosso ordenamento jurídico sujeita-se ao princípio da mono-gamia, não sendo possível juridicamente reconhecer uniões estáveis paralelas, até porque a própria recorrente reconheceu em outra ação que o varão mantinha com outra mulher uma união estável, que foi judicialmente declarada. Diante disso, o seu relacionamento com o de cujus teve cunho meramente concubinário, capaz de agasalhar uma sociedade de fato, protegida pela Súmula nº 380 do STF. Essa questão patrimonial esvaziou-se em razão do acordo entabulado entre a autora e a sucessão. Recurso desprovido, por maioria.’ (AC 70001494236, 7ª C.Cív., Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, DOERS 14.02.2001)

Importante também foi a consagração pelo NCCB da ressalva há muito acolhida pela doutrina e juris-prudência, no sentido que a separação de fato e a separação judicial de um dos partícipes da união estável, em que pese o impedimento formal para o casamento determinado por tais situações, não inibe o aperfeiçoamento ou caracterização da união estável.

Com efeito, em que pese o separado de fato ainda ser formalmente casado e, portanto, impedido de se casar, o fato é que a separação de fato, sobretudo depois do lapso de 2 (dois) anos após o qual é possível o divórcio direto, na prática, produz efeitos tão densos quanto à separação judicial, não sendo justificável que um casamento, que nesta altura está relegado a uma mera reminiscência cartorial, possa ser obstáculo para a caracterização da união estável.” (GARCIA, Marco Túlio Murano. União estável e concubinato no novo Código Civil. Juris SÍNTESE, Porto Alegre: IOB-Thomson, maio/jun. 2005. 53 CD-Rom)

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Seção Especial – Com a Palavra, o Procurador

O NCPC e o Princípio Constitucional da Presunção da Inocência

El Nuevo CPC Brasileño y el Principio Constitucional de la Presunción de Inocencia

LeOnARDO OLIveIRA SOAReSProcurador do Estado de Minas Gerais, atualmente na condição de Advogado Regional em Ipatinga. Mestre em Direito Processual pela PUC-MG, Membro da Academia Brasileira de Direito Processual e do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, Professor de Teoria Geral do Processo e Processo Civil na Faculdade de Direito de Ipatinga (MG).

O novo – e não necessariamente melhor – diploma normativo irá disci-plinar o exercício da jurisdição cível brasileira1. Realmente, a partir de 18 de março do ano corrente, inicia-se, enfim, a vigência da Lei nº 13.105/2015, já alterada pela Lei nº 13.256, publicada em 5 de fevereiro de 2016 no Diário Oficial da União.

Com maior ou menor entusiasmo, a comunidade jurídica e, de resto, a sociedade brasileira como um todo projetam possíveis impactos do NCPC no funcionamento da justiça pátria.

De imediato, por intermédio de algumas indagações, ilustram-se perple-xidades que o diploma processual em evidência pode suscitar. Confiram-se2:

a) O denominado “sistema multiportas” de acesso à justiça, previsto no art. 3º, § 3º, do NCPC3, contribuirá, com efeito, para a pacifi-cação social? Ou servirá como pano de fundo para a criação de política judiciária voltada à redução meramente quantitativa de de-mandas apreciadas ou passíveis de serem submetidas a exame pelo Poder Judiciário?

1 Sem prejuízo, em todo caso, da incidência subsidiária e supletiva do NCPC nos processos eleitorais, trabalhistas e administrativos, conforme dispõe o art. 15 da Lei nº 13.105/2015.

2 A fim de explicitar o alcance dos questionamentos, entendeu-se por bem transcrever os artigos do NCPC citados no texto.

3 “Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.

§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.

§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.

§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”

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b) O princípio da fundamentação analítica, disposto no art. 11 e deta-lhado no art. 489 do NCPC4, terá o condão de modificar o posicio-namento uniforme em todos os graus de jurisdição a respeito do que se entende por decisão fundamentada?

c) Desde quando vetada, ou, melhor, restringida a atuação oficiosa do juiz no processo, assegura-se o exercício pleno do direito ao con-traditório dinâmico (arts. 9º e 10 do NCPC)5, com o afastamento de pronunciamentos surpresa?

d) Afigura-se compatível com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana o estímulo à autocomposição tout court, mate-rializado, v.g., na possibilidade de aplicar-se multa ao litigante – ao autor ou ao réu, é bom que se diga – que deixe de comparecer

4 “Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.”

“Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

I – o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

§ 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

§ 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.”

5 “Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.

Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:

I – à tutela provisória de urgência;

II – às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III;

III – à decisão prevista no art. 701.

Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.”

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ������������������������������������������������������������������������231

de forma injustificada à audiência de conciliação ou de mediação

(art. 334, § 8º, do NCPC6)?

e) Dito estímulo levará à redução do número de recursos, notadamen-

te da apelação?

f) A supressão do agravo retido propiciará celeridade aos julga mentos?

g) A cognominada sucumbência recursal (art. 85, § 11, do NCPC)7 irá

inibir ou estimular a interposição de recursos?

6 “CAPÍTULO V

DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO OU DE MEDIAÇÃO

Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.

§ 1º O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, observando o disposto neste Código, bem como as disposições da lei de organização judiciária.

§ 2º Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes.

§ 3º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.

§ 4º A audiência não será realizada:

I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;

II – quando não se admitir a autocomposição.

§ 5º O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência.

§ 6º Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por todos os litisconsortes.

§ 7º A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da lei.

§ 8º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.

§ 9º As partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos.

§ 10. A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir.

§ 11. A autocomposição obtida será reduzida a termo e homologada por sentença.

§ 12. A pauta das audiências de conciliação ou de mediação será organizada de modo a respeitar o intervalo mínimo de 20 (vinte) minutos entre o início de uma e o início da seguinte.”

7 “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 1º São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.

§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I – o grau de zelo do profissional;

II – o lugar de prestação do serviço;

III – a natureza e a importância da causa;

IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:

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h) Considerada a disciplina procedimental do incidente de resolução

I – mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;

II – mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;

III – mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;

IV – mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;

V – mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.

§ 4º Em qualquer das hipóteses do § 3º:

I – os percentuais previstos nos incisos I a V devem ser aplicados desde logo, quando for líquida a sentença;

II – não sendo líquida a sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando liquidado o julgado;

III – não havendo condenação principal ou não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, a condenação em honorários dar-se-á sobre o valor atualizado da causa;

IV – será considerado o salário-mínimo vigente quando prolatada sentença líquida ou o que estiver em vigor na data da decisão de liquidação.

§ 5º Quando, conforme o caso, a condenação contra a Fazenda Pública ou o benefício econômico obtido pelo vencedor ou o valor da causa for superior ao valor previsto no inciso I do § 3º, a fixação do percentual de honorários deve observar a faixa inicial e, naquilo que a exceder, a faixa subsequente, e assim sucessivamente.

§ 6º Os limites e critérios previstos nos §§ 2º e 3º aplicam-se independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito.

§ 7º Não serão devidos honorários no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública que enseje expedição de precatório, desde que não tenha sido impugnada.

§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

§ 9º Na ação de indenização por ato ilícito contra pessoa, o percentual de honorários incidirá sobre a soma das prestações vencidas acrescida de 12 (doze) prestações vincendas.

§ 10. Nos casos de perda do objeto, os honorários serão devidos por quem deu causa ao processo.

§ 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento.

§ 12. Os honorários referidos no § 11 são cumuláveis com multas e outras sanções processuais, inclusive as previstas no art. 77.

§ 13. As verbas de sucumbência arbitradas em embargos à execução rejeitados ou julgados improcedentes e em fase de cumprimento de sentença serão acrescidas no valor do débito principal, para todos os efeitos legais.

§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.

§ 15. O advogado pode requerer que o pagamento dos honorários que lhe caibam seja efetuado em favor da sociedade de advogados que integra na qualidade de sócio, aplicando-se à hipótese o disposto no § 14.

§ 16. Quando os honorários forem fixados em quantia certa, os juros moratórios incidirão a partir da data do trânsito em julgado da decisão.

§ 17. Os honorários serão devidos quando o advogado atuar em causa própria.

§ 18. Caso a decisão transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor, é cabível ação autônoma para sua definição e cobrança.

§ 19. Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei.”

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de demandas repetitivas (arts. 976 a 987 do NCPC)8, pode dizer-se

8 “DO INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS

Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente:

I – efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito;

II – risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.

§ 1º A desistência ou o abandono do processo não impede o exame de mérito do incidente.

§ 2º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono.

§ 3º A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja o incidente novamente suscitado.

§ 4º É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva.

§ 5º Não serão exigidas custas processuais no incidente de resolução de demandas repetitivas.

Art. 977. O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente de tribunal:

I – pelo juiz ou relator, por ofício;

II – pelas partes, por petição;

III – pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição.

Parágrafo único. O ofício ou a petição será instruído com os documentos necessários à demonstração do preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente.

Art. 978. O julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles responsáveis pela uniformização de jurisprudência do tribunal.

Parágrafo único. O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente.

Art. 979. A instauração e o julgamento do incidente serão sucedidos da mais ampla e específica divulgação e publicidade, por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça.

§ 1º Os tribunais manterão banco eletrônico de dados atualizados com informações específicas sobre questões de direito submetidas ao incidente, comunicando-o imediatamente ao Conselho Nacional de Justiça para inclusão no cadastro.

§ 2º Para possibilitar a identificação dos processos abrangidos pela decisão do incidente, o registro eletrônico das teses jurídicas constantes do cadastro conterá, no mínimo, os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos a ela relacionados.

§ 3º Aplica-se o disposto neste artigo ao julgamento de recursos repetitivos e da repercussão geral em recurso extraordinário.

Art. 980. O incidente será julgado no prazo de 1 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.

Parágrafo único. Superado o prazo previsto no caput, cessa a suspensão dos processos prevista no art. 982, salvo decisão fundamentada do relator em sentido contrário.

Art. 981. Após a distribuição, o órgão colegiado competente para julgar o incidente procederá ao seu juízo de admissibilidade, considerando a presença dos pressupostos do art. 976.

Art. 982. Admitido o incidente, o relator:

I – suspenderá os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região, conforme o caso;

II – poderá requisitar informações a órgãos em cujo juízo tramita processo no qual se discute o objeto do incidente, que as prestarão no prazo de 15 (quinze) dias;

III – intimará o Ministério Público para, querendo, manifestar-se no prazo de 15 (quinze) dias.

§ 1º A suspensão será comunicada aos órgãos jurisdicionais competentes.

§ 2º Durante a suspensão, o pedido de tutela de urgência deverá ser dirigido ao juízo onde tramita o processo suspenso.

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que tal instituto contribuirá, de fato, para a racionalização do fun-cionamento da justiça?

i) Em relação ao processo de tomada de decisões jurisdicionais, é pos-sível afirmar que a observância da coerência e da integridade, con-

§ 3º Visando à garantia da segurança jurídica, qualquer legitimado mencionado no art. 977, incisos II e III, poderá requerer, ao tribunal competente para conhecer do recurso extraordinário ou especial, a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos em curso no território nacional que versem sobre a questão objeto do incidente já instaurado.

§ 4º Independentemente dos limites da competência territorial, a parte no processo em curso no qual se discuta a mesma questão objeto do incidente é legitimada para requerer a providência prevista no § 3º deste artigo.

§ 5º Cessa a suspensão a que se refere o inciso I do caput deste artigo se não for interposto recurso especial ou recurso extraordinário contra a decisão proferida no incidente.

Art. 983. O relator ouvirá as partes e os demais interessados, inclusive pessoas, órgãos e entidades com interesse na controvérsia, que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, poderão requerer a juntada de documentos, bem como as diligências necessárias para a elucidação da questão de direito controvertida, e, em seguida, manifestar-se-á o Ministério Público, no mesmo prazo.

§ 1º Para instruir o incidente, o relator poderá designar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e conhecimento na matéria.

§ 2º Concluídas as diligências, o relator solicitará dia para o julgamento do incidente.

Art. 984. No julgamento do incidente, observar-se-á a seguinte ordem:

I – o relator fará a exposição do objeto do incidente;

II – poderão sustentar suas razões, sucessivamente:

a) o autor e o réu do processo originário e o Ministério Público, pelo prazo de 30 (trinta) minutos;

b) os demais interessados, no prazo de 30 (trinta) minutos, divididos entre todos, sendo exigida inscrição com 2 (dois) dias de antecedência.

§ 1º Considerando o número de inscritos, o prazo poderá ser ampliado.

§ 2º O conteúdo do acórdão abrangerá a análise de todos os fundamentos suscitados concernentes à tese jurídica discutida, sejam favoráveis ou contrários.

Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada:

I – a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região;

II – aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do tribunal, salvo revisão na forma do art. 986.

§ 1º Não observada a tese adotada no incidente, caberá reclamação.

§ 2º Se o incidente tiver por objeto questão relativa a prestação de serviço concedido, permitido ou autorizado, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.

Art. 986. A revisão da tese jurídica firmada no incidente far-se-á pelo mesmo tribunal, de ofício ou mediante requerimento dos legitimados mencionados no art. 977, inciso III.

Art. 987. Do julgamento do mérito do incidente caberá recurso extraordinário ou especial, conforme o caso.

§ 1º O recurso tem efeito suspensivo, presumindo-se a repercussão geral de questão constitucional eventualmente discutida.

§ 2º Apreciado o mérito do recurso, a tese jurídica adotada pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça será aplicada no território nacional a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito.”

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forme prevê o art. 926 do NCPC9, ensejará “legítima” valorização do princípio constitucional da isonomia?

Decerto, não se nega possam ser desenvolvidos outros tantos e mais con-tundentes questionamentos. No entanto, acredita-se, os apresentados supra já permitem inter-relacionar os elementos textuais que dão título ao escrito.

Pois bem. Diferentemente do que se supõe no plano social e, também, em alguma medida, no universo jurídico, o direito não tem vida própria.

Serão, pois, os operadores do Direito – cotidianamente, e a partir de uma prévia compreensão de mundo – que emprestarão significado às regras e aos princípios processuais do NCPC.

Mas e o princípio constitucional da presunção de inocência? Sim, qual a relação, ao fim e ao cabo, entre o NCPC e o princípio constitucional em tela?

Bem, a controversa e, por que não dizer com todas as letras, questionável interpretação a que chegou o STF no julgamento do HC 126.29210 reforça so-bremodo a responsabilidade ética que recai sobre cada um de nós, operadores do Direito, nesse momento histórico e conturbado, sobre mais de um prisma, vivenciado no País.

Responsabilidade, por certo, que ganhará novos contornos com o início de vigência do NCPC, em 18 de março de 2016, haja vista a compreensão dos comandos processuais afins que haverá de ser levada a cabo diacronicamente, e que pode ser traduzida nesta última (ingênua?) indagação: Para qual funcio-namento da “justiça” desejamos contribuir?

referÊnCIas

BARBOSA, Renato Kim. A impunidade e o alcance do princípio da presunção de ino-cência. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-mar-02/impunidade-alcance--principio-presuncao-inocencia#author>. Acesso em: 2 mar. 2016.

9 “Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.

§ 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.

§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.”

10 Comentários críticos ao propósito podem ser lidos em YAROCHEWSKY, Leonardo Isaac. Com decisão do Supremo, presunção de inocência está na UTI. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-fev-17/leonardo-yarochewsky-presuncao-inocencia-uti>. Acesso em: 1º mar. 2016; e STRECK. Lenio. Teori do STF contraria Teori do STJ ao ignorar lei sem declarar inconstitucional. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-fev-19/streck-teori-contraria-teori-prender-transito-julgado>. Acesso em: 1º mar. 2016. Em defesa do posicionamento do STF, consultem-se GIMENES, José Jácomo. Exigência de culpa e trânsito em julgado para prisão é uma ilação. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-fev-25/exigencia-culpa-transito-julgado-prisao-ilacao#author>. Acesso em: 2 mar. 2016; e BARBOSA, Renato Kim. A impunidade e o alcance do princípio da presunção de inocência. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-mar-02/impunidade-alcance-principio-presuncao-inocencia#author>. Acesso em: 2 mar. 2016.

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GIMENES, José Jácomo. Exigência de culpa e trânsito em julgado para prisão é uma ila-ção. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-fev-25/exigencia-culpa-transito--julgado-prisao-ilacao#author>. Acesso em: 2 mar. 2016.

YAROCHEWSKY, Leonardo Isaac. Com decisão do Supremo, presunção de inocência está na UTI. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-fev-17/leonardo-yaro-chewsky-presuncao-inocencia-uti>. Acesso em: 1º mar. 2016.

STRECK, Lenio. Teori do STF contraria Teori do STJ ao ignorar lei sem declarar inconsti-tucional. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-fev-19/streck-teori-contraria--teori-prender-transito-julgado>. Acesso em: 1º mar. 2016.

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Clipping Jurídico

Por indício de fraude, Justiça Federal anula casamento de sogro com noraParentesco por afinidade em linha reta não se dissolve mesmo com o fim da relação que o originou. Dessa forma, uma mulher não pode se casar com seu ex-sogro, pois esse ato é nulo. Com esse entendimento, a 10ª Vara Federal de Fortaleza anulou um casamento de um homem (já morto) com sua ex-nora e determinou que ela ressarça a União em R$ 190 mil de pensões ilegais. A pensão foi instituída em 2004 por meio de portaria que declarou o militar aposentado morador de Fortaleza anis-tiado político. De acordo com a Advocacia-Geral da União, a autora do processo, a transferência do benefício, que girava em torno de R$ 14,5 mil, foi obtida pela mulher em novembro de 2013, mesmo ano do seu casamento, em junho, e do óbito do marido. Os advogados da União, no entanto, consideraram que não caberia o pedido administrativo, pois a certidão de casamento era ilegal. Segundo a AGU, o art. 1.521 do Código Civil impede o casamento de parentes em linha reta, entre eles sogro e nora. O interesse da União em anular o ato também encontrava respaldo nos arts. 166 e 168 do Código, que indicam, respectivamente, ser “nulo o negócio jurídico” quando houver intenção de “fraudar a lei imperativa”, e a nulidade pode ser alegada por qualquer interessado que a requer na justiça. Nas audiências do pro-cesso, a esposa alegou desconhecer a proibição e que o casal buscou as vias legais para fazer o casamento. Ela afirmou, ainda, que se divorciou do filho do ex-militar em 2010 e, a partir de então, passou a ter uma relação conjugal com o sogro. Por outro lado, a AGU alegou, entre outros fatos, evidente objetivo de fraude no casa-mento em razão da diferença de idade de 39 anos entre o aposentado, casado aos 92 anos, e a ré, o que afastaria qualquer possibilidade de constituírem família. A partir do conjunto de provas e depoimentos apresentados e considerando o gasto da União com a pensão, a Advocacia-Geral pediu liminar para suspender o pagamen-to, além da declaração de indisponibilidade dos bens da esposa para assegurar o ressarcimento pelos valores pagos desde a morte do aposentado. Também requereu que fosse decretada a nulidade do casamento. O caso foi analisado pela 10ª Vara Federal de Fortaleza. O juízo de primeira instância acolheu os argumentos e deferiu liminar favorável à União. A sentença destacou, entre outros fundamentos, que “o parentesco por afinidade em linha reta não se dissolve mesmo com o fim da relação que o originou. Portanto, sogro não pode casar com nora, mesmo que seja viúvo e a nora, divorciada, sob pena de ofensa a preceito de ordem pública, o que enseja a nulidade absoluta do casamento”. Processo nº 0801532-22.2015.4.05.8100. (Con-teúdo extraído do site da Advocacia-Geral da União)

Se autorizada, venda de imóvel de empresa em recuperação não é fraudeSe a Justiça aprova a alienação de imóvel de empresa em recuperação judicial, a operação não constitui fraude à execução. Com esse fundamento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça rejeitou recurso de um banco em processo de execução movido contra uma empresa. A instituição financeira alegou fraude à execução, pois, durante tramitação da apelação contra a sentença que extinguiu o processo, um dos imóveis da companhia, já em processo de recuperação judicial, foi alienado a terceiro. Em seu recurso, o banco afirmou que a fraude foi caracterizada porque a transferência do bem coloca a empresa em estado de insolvência. Para a instituição financeira, a operação viola quatro decisões anteriores do Tribunal de Justiça de

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São Paulo e do Tribunal de Justiça do Paraná, no que se refere à não sujeição dos créditos de sua titularidade à recuperação judicial da empresa devedora. Esse não foi o entendimento dos ministros do STJ. Para o Relator do recurso, Ministro Moura Ribeiro, a decisão do Tribunal paulista de não acatar os argumentos do banco no sentido de que houve fraude à execução está correta. O ministro justifica que, mes-mo em situação de execução, o banco não é imune ao que se passa no processo de recuperação judicial da executada. No caso concreto, a alienação do imóvel foi feita de forma legal, com autorização do juízo competente, portanto, não é possível caracterizar nenhuma espécie de fraude à execução. Para Moura Ribeiro, não é pos-sível provar a má-fé do processo de alienação do imóvel com base nas alegações do recurso da instituição financeira. Para chegar a essa conclusão, seria necessário um novo exame das provas, o que não é permitido em recurso especial em virtude da Súmula nº 7 do STJ. O magistrado destacou também que a questão da insolvência da empresa não foi analisada no Tribunal de origem e que esse argumento é apenas uma alegação da instituição financeira. “Percebe-se nos autos a insistência do ban-co em dar continuidade ao processo de execução e, nesse desiderato, querer fazer prevalecer sua tese de que é imune ao que se passa e ao que se decide no juízo da recuperação judicial, especialmente às normas jurídicas que disciplinam esse instituto”, concluiu o ministro. No caso julgado pelos ministros, um banco e uma empresa firmaram 11 contratos de câmbio de compra, no valor de R$ 15 milhões. Posteriormente, as exportações não foram concluídas, o que gerou um pedido de restituição de valores por parte do banco. Já em execução, a empresa entrou em processo de recuperação judicial, sendo adquirida por outro grupo. Após o início da recuperação, um dos imóveis da empresa foi alienado a terceiros. Para o banco, a venda do bem configura fraude na execução. A posição do STJ é a de que os ar-gumentos da instituição financeira não procedem, já que a alienação não foi feita à revelia da legislação ou com indícios de má-fé. O Ministro Moura Ribeiro destacou que a alienação faz parte do plano de recuperação judicial da empresa, tendo aval do juízo competente e sem evidências de ilegalidade. REsp 1.440.783. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Falta de pagamento em venda de imóvel permite correção monetária

O não repasse de montante devido pela venda de imóvel deve ser compensado com lucros cessantes e correção monetária, além do valor devido. O entendimento foi aplicado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça para que o ex-sócio de uma empresa recebesse os valores retidos por seus dois ex-parceiros no negócio após a venda do escritório dos três. O autor da ação e um dos réus mantiveram uma socie-dade para atuar no desenvolvimento de projetos sociais e adquiriram, em 2001, um escritório, registrado em nome do segundo acusado, que é filho do primeiro réu. Em 2007, a sociedade acabou, e os envolvidos decidiram vender o imóvel. Em 2009, o réu que tinha o imóvel em seu nome cedeu o bem integralmente ao seu pai (primeiro réu). No mesmo ano, o escritório foi vendido por R$ 515 mil, sendo pago R$ 463,5 mil no ato da venda. Os outros R$ 51,5 mil foram depositados depois de assinada a escritura pública de compra e venda, o que ocorreu em 2011. Porém, nenhum va-lor foi repassado ao autor da ação, que, de acordo com os réus, teria se recusado a receber o montante a que tinha direito. Esse imbróglio motivou uma ação na Justiça

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do Rio de Janeiro, parcialmente atendida em primeiro grau e reformada em segunda instância. Em primeira instância, foi determinado o pagamento, pelos dois réus, de R$ 257,5 mil ao autor. Esse montante, correspondente a 50% do valor do imóvel à época de venda, seria pago com correção monetária determinada pela Corregedoria--Geral da Justiça. A decisão motivou recursos das duas partes. No Tribunal de Justiça do RJ, o relator do caso, monocraticamente, negou provimento ao recurso do autor e proveu em parte o dos réus, declarando a extinção do feito principal sem resolução do mérito. O desembargador argumentou que houve perda de objeto, pois os réus depo-sitaram o valor devido. A decisão foi questionada novamente pelas duas partes. A 14ª Câmara Cível do TJRJ, por unanimidade, concedeu parcialmente o recurso do autor para que uma nova avaliação do imóvel fosse feita. O questionamento dos réus foi negado. Além disso, o Colegiado, de ofício, alterou o termo inicial dos juros de mora para a data do evento danoso. Novamente, a decisão foi questionada pelas partes. O autor da ação alegou que houve indevido rejulgamento da apelação da parte contrá-ria e que a análise da dívida dos lucros cessantes não foi correta por se desconsiderar fato incontroverso nos autos e não valorar adequadamente a prova oral. O autor da ação também questionou a definição do termo inicial dos juros de mora e a extinção da ação principal sem julgamento de mérito. Já os réus argumentaram que o valor estipulado é indevido porque eles não foram condenados a pagar parte do ganho de capital sobre a valorização do imóvel. Para o Relator do caso, Ministro João Otávio de Noronha, os réus tinham plena consciência de que deveriam depositar o valor devido ao autor da ação logo depois da venda, sendo justa a cobrança de juros. Ele disse ainda que é lógico e devido o pagamento de valores após a reavaliação do imóvel, já que tal pedido consta na ação movida pela parte desfavorecida. “Dessa forma, não há falar em julgamento extra petita; por conseguinte, desautorizado estava o Tribunal a quo a rever a causa em embargos de declaração para afastar o deferimento dos lu-cros cessantes relativos à valorização do imóvel”, explicou Noronha. Com a decisão, o ex-proprietário receberá a diferença do valor atualizado do imóvel, além de juros calculados desde a data da transação. REsp 1.590.479. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Prazos processuais de Juizados Especiais passam a ser contados em dias corridos

Desde o dia 01/07, os prazos de processos que correm nos Juizados Especiais Cíveis e nos Juizados da Fazenda Pública passaram a ser contados em dias corridos. Isso é o que determinam o Enunciado Cível nº 165 e o Enunciado da Fazenda Pública nº 13, aprovados em junho no 39º Encontro do Fórum Nacional de Juizados Espe-ciais (Fonaje), que ocorreu em Maceió. Também foi estabelecido que, nos JECs, o juízo prévio de admissibilidade do recurso seja feito em primeiro grau. O enten-dimento foi consolidado no Enunciado Cível nº 166. Além disso, os magistrados presentes no encontro lançaram a Carta de Maceió, que firmou a necessidade de preservação da “autonomia e a independência do sistema de Juizados Especiais em relação a institutos e a procedimentos incompatíveis com os critérios informadores definidos no art. 2º da Lei nº 9.099/1995 [que criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais], notadamente os previstos no novo Código de Processo Civil”. A con-tagem de prazos processuais em dias corridas nos JECs era defendida pela Corre-gedora Nacional de Justiça, Ministra Nancy Andrighi. Para ela, a adoção da nova

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regra prevista no novo CPC – contagem em dias úteis – atenta contra os princípios fundamentais dos processos analisados pelos Juizados Especiais, como a simplicida-de, a economia processual e, sobretudo, a celeridade. Desde sua entrada em vigor, a lei que criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais convive com o Código de Processo Civil de 1973. Assim, segundo a corregedora, ficou estabelecido que as disposições do CPC não se aplicam ao rito dos processos em tramitação nos Juiza-dos Especiais Cíveis na fase de conhecimento, mas apenas na fase de cumprimento de sentença. (Conteúdo extraído do site Consultor Jurídico)

Ação só pode ser extinta por abandono do autor se réu pedir

O processo só pode ser extinto por abandono do autor se houver pedido do réu. Esse foi o entendimento firmado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao afastar a extinção de uma ação que busca apurar cotas no caso de dissolução de sociedade de uma clínica médica. Dos 20 integrantes do litígio, 19 foram devidamente citados. O autor da ação alegou que o processo foi extinto por abandono pelo juiz, de ofício, ou seja, sem o requerimento da parte ré. Além disso, ele argumentou ter sido intimado para dar andamento ao processo em um endereço errado. Para o Relator do pro-cesso no STJ, Ministro Villas Bôas Cueva, o acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina não está de acordo com a jurisprudência da Corte. Segundo o relator, é pa-cífico o entendimento do Tribunal de que a extinção do processo por abandono da causa pelo autor depende de requerimento do réu (Súmula nº 240 do STJ). Ademais, só pode ser efetivada após a sua devida intimação, com o esgotamento de alternativas para localização da parte. No caso analisado, a tentativa de localização do litigante foi feita em endereço desatualizado, que constava em outra ação, mas não era o atual local de moradia do autor. Após a tentativa frustrada, o juiz da causa extinguiu a de-manda, alegando abandono do autor. Em seu voto, Villas Bôas Cueva destacou que a Súmula nº 240 do STJ foi incorporada ao Código de Processo Civil de 2015, facilitan-do a resolução de demandas similares. O verbete diz que a extinção do processo não pode ser determinada de ofício, pressupondo o requerimento da parte ré na ação. O magistrado lembrou que o caso discutido é singular no STJ e que os autos demonstram que não houve a correta intimação do autor, o que impossibilita a extinção com a justificativa de abandono. “A extinção do processo por abandono da causa pelo autor pressupõe a sua intimação pessoal que, se for frustrada por falta de endereço correto, deve se perfectibilizar por edital”, finalizou Villas Bôas Cueva. REsp 1.596.446. (Con-teúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Pedidos de recuperação judicial sobem mais de 100% no primeiro semestre de 2016

Os pedidos de falência no Brasil registraram alta de 26,5% no 1º semestre de 2016 em relação ao mesmo período de 2015. A pesquisa, feita pelo Serviço Central de Prote-ção ao Crédito (SCPC), também aponta que, nos seis primeiros meses deste ano, as fa-lências decretadas subiram 11,3% em relação ao período equivalente do ano anterior. Quanto aos pedidos de recuperação judicial e às recuperações judiciais deferidas, no acumulado do semestre, seguiram tendência de alta, registrando 113,5% e 118,8%, respectivamente. Os dados mostram a fraqueza da economia brasileira, mas, pelo me-

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nos em um primeiro momento, significam também mais trabalho para os escritórios de advocacia. Em evento sobre gestão de escritórios em junho, a Advogada Thalita de Marco Vani, do Saeki Advogados, contou que os serviços de recuperação judicial e cobranças aumentaram devido ao momento econômico. Para Fernando Augusto Fernandes, sócio do Fernando Fernandes Advogado, “a crise econômica gera deman-da na advocacia e dificuldades nos recebimentos”. O crescimento das falências no primeiro semestre de 2016 é bem mais significativo do que o observado no primeiro semestre de 2015, quando os pedidos acumulavam alta de 9,2%. Para o SCPC, a fraca atividade econômica e os elevados custos atingiram fortemente o caixa das empresas ao longo de 2015, e os pedidos de falência fecharam aquele ano com crescimento de 16,4%. Já as recuperações cresceram 51,0%. A tendência de alta não só continuou como se intensificou no primeiro semestre deste ano. A pesquisa detalha também como estão distribuídas as falências e recuperações judiciais por porte de empresa no primeiro semestre de 2016, a partir dos critérios de porte de empresa adotados pelo BNDES. As pequenas empresas, por exemplo, representam cerca de 86% dos pedi-dos de falências e 92% das falências decretadas. Tanto nos pedidos de recuperação judicial como nas recuperações judiciais deferidas, as pequenas empresas também correspondem ao maior percentual: 93% e 92%, respectivamente. Na divisão por setor da economia, o setor de serviços foi o que representou mais casos nos pedidos de falência (40%), seguido do setor industrial (34%) e do comércio (26%). Embora não seja o setor responsável pelo maior percentual de falências, o setor industrial foi o único que cresceu acima dos 26,5%, subindo 30,6%. Serviços cresceram 29,5% e comércio, 16,3%. (Conteúdo extraído do site Consultor Jurídico)

Marca conhecida no exterior não pode ser registrada em outro país

A Convenção da União de Paris – ratificada no Brasil pelo Decreto nº 75.572/1975 e pela Lei nº 9.279/1996 – impede o registro, nos países signatários, de marcas simi-lares ou idênticas às conhecidas internacionalmente, mesmo que essas não tenham registro específico na nação. O entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que manteve a nulidade de um registro feito no Instituto Nacional da Pro-priedade Industrial (Inpi) por companhia nacional que poderia ser confundido pelos consumidores com uma empresa internacional. A autora da ação recorreu ao STJ para manter a marca, pois o pedido foi negado em segunda instância. A Corte Re-gional entendeu que a marca registrada pela companhia brasileira era igual à da em-presa internacional, além de as duas envolvidas na ação atuarem no mesmo ramo, o de suplementação alimentar. Ao negar o recurso da autora, o Relator do recurso no STJ, Ministro João Otávio de Noronha, argumentou que as alegações de que a marca estrangeira não é conhecida no Brasil, feitas pela empresa nacional, não procedem. O relator ressaltou que o público-alvo é especializado, podendo ter conhecimento do produto, independentemente da representação comercial ou registro específico efetuado no Brasil. Para ministro, o fato de a marca brasileira pedir e conseguir o re-gistro em uma categoria diferente da estrangeira não é uma brecha que pode validar o pedido. Noronha lembrou que as marcas mundialmente notórias são protegidas no Brasil, mesmo sem registro específico no país. “O art. 6º bis, 1, da Convenção da União de Paris, que foi ratificado pelo Decreto nº 75.572/1975 e cujo teor foi confirmado pelo art. 126 da Lei nº 9.279/1996, confere proteção internacional às

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marcas notoriamente conhecidas, independentemente de formalização de registro no Brasil, e veda o registro ou autoriza seu cancelamento, conforme o caso, das marcas que configurem reprodução, imitação ou tradução suscetível de estabelecer confusão entre os consumidores com aquela dotada de notoriedade”. Para o minis-tro, o fato de a marca brasileira pleitear e obter o registro em uma categoria diferente da marca estrangeira não é uma brecha a validar o pedido. Segundo os magistrados, para a proteção de marcas, basta comprovar a similaridade do produto em questão. Noronha destacou que, como o Tribunal de origem analisou as provas e chegou à conclusão de que há a possibilidade de confusão e concorrência desleal, o STJ não pode reexaminar o caso para firmar entendimento diferente, conforme a Súmula nº 7 da Corte. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Em agosto, entra em vigor a Convenção de Haia no Brasil

Depois de mais de 50 anos de espera, no dia 29 de janeiro de 2016, a Presidên-cia da República, por meio do Decreto nº 8.660, oficializou a adesão do Brasil à Convenção de Haia, de 5 de outubro de 1961, a qual regulamenta a eliminação da exigência de legalização de documentos públicos estrangeiros, também conhecida como “Convenção da Apostila”. Antes da publicação do referido decreto, o Brasil possuía acordos de simplificação similares apenas com a França, por meio do Acor-do de Cooperação em Matéria Civil, regulamentado pelo Decreto nº 3.598, de 12 de setembro de 2000, e com a Argentina, por meio do Acordo sobre Simplificação de Legalizações de Documentos Públicos, firmado entre os Ministérios das Relações Exteriores do Brasil e da Argentina, respectivamente. Ainda, existem acordos firma-dos com a Itália, regulamentados por meio do Decreto nº 1.476, de 2 de maio de 1995, e com os Estados-parte do Mercosul, a República da Bolívia e a República do Chile, aprovados por meio do Decreto nº 6.891, de 2 de julho de 2009. Vale ressal-tar que a adesão à Convenção da Apostila não invalida tais acordos, tendo em vista que eles tratam de diversas outras matérias de interesses dos signatários. A Conven-ção da Apostila estabelece as condições para que os documentos públicos oriundos dos países signatários tenham validade, para todos os efeitos legais, nos demais países signatários de tal convenção e tem por objetivo agilizar e simplificar os trâmi-tes necessários para o reconhecimento mútuo de documentos públicos no país de origem e no exterior. Aplica-se a Convenção da Apostila aos documentos públicos de um Estado-parte que devam produzir efeitos no território de outro Estado-parte, desde que provenientes de uma autoridade ou de um agente público, do Judiciário, da Administração Pública, do Ministério Público, bem como atos notariais, incluin-do as declarações oficiais apostas em documentos de natureza privada, atestando seu registro, sua existência e o reconhecimento de assinatura. Desta forma, a partir da entrada em vigor da Convenção da Apostila no Brasil (a qual está prevista para o dia 14 de agosto de 2016), os documentos oriundos dos Estados-partes da Con-venção da Apostila estarão dispensados da exigência de legalização diplomática ou consular para que tenham validade e produzam efeitos no Brasil. Referidos procedi-mentos de legalização serão substituídos pela aposição da “Apostille”, que consiste em um certificado utilizado em âmbito internacional como facilitador de transações comerciais e jurídicas, por consolidar toda a informação necessária para conferir validade a um documento público em outro Estado-parte da Convenção da Aposti-

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – CLIPPING JURÍDICO ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������243

la. As “Apostilles” são apostas pela autoridade competente designada pelo governo do local de origem do documento. Embora o Brasil ainda não tenha informado que autoridade ficará a cargo da “Apostille”, no final de 2015, foram instituídos, por meio das Portarias nºs 155/2015 e 52/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça, dois grupos de trabalho para desenvolvimento do sistema de emissão da “Apostille” e para organização e tradução dos documentos relativos à Convenção da Apostila, que deverão concluir suas atividades até o início de julho de 2016. É importante destacar que a Convenção da Apostila não será aplicável a documentos emitidos por agentes diplomáticos e/ou consulares, bem como a documentos admi-nistrativos vinculados a operações comerciais e aduaneiras. Na prática, sob o ponto de vista empresarial, a adesão do Brasil à Convenção da Apostila contribuirá com a significativa diminuição de tempo e custo do trâmite à representação de investidores estrangeiros nas assembleias gerais de companhias nacionais, por exemplo. Embora seja permitida a participação remota desses investidores por meio eletrônico, essa forma de votação ainda é timidamente utilizada pelas companhias brasileiras. O mais usual é a nomeação de procurador para a representação do investidor, que, por ter sua validade no Brasil condicionada à legalização consular mandatória, nem sempre é concluída em tempo hábil à participação do representante legal na deli-beração assemblear. Entendemos que a adesão do Brasil à Convenção da Apostila é salutar e sem dúvida é um passo certeiro para reduzir a burocracia e aprimorar as relações comerciais entre sociedades brasileiras e investidores estrangeiros. (Con-teúdo extraído do site Consultor Jurídico)

Fechamento da Edição: 08�07�2016

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Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição o seguinte conteúdo:

artIGos doutrInÁrIos

• Princípio da Instrumentalidade, do Contraditório, da Ampla Defesa e Modernização do Processo Civil

José Augusto Delgado Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

• Honorários Advocatícios Sucumbenciais e o Artigo 29-C da Lei nº 8.036

Julio Pinheiro Faro Homem de Siqueira e Junio Graciano Homem de Siqueira

Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

• Cobrança de Honorários Advocatícios Sucumbenciais e Contratuais Francisco Gérson Marques de Lima Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

• Prova Emprestada: Algumas Considerações Carla Heidrich Antunes, Caroline Ribeiro Bianchini e Fernando

Magaldi Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

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Índice Alfabético e Remissivo

Índice Geral

DOUTRINAS

Assunto

Valor da Causa – dano Moral – noVo CPC•Novo Código de Processo Civil e o Valor da

Causa nas Ações de Reparação por Danos Extra-patrimoniais (Felipe Cunha de Almeida) ................9

•O Pedido de Reparação por Danos Morais e o Valor da Causa em Causas Cíveis e Tra-balhistas Segundo o CPC de 2015 (Marcelo Muritiba Dias Ruas) .............................................25

•Valor da Causa no Novo CPC (Eduardo Henriquede Oliveira Yoshikawa) ........................................35

Autor

Eduardo HEnriquE dE oliVEira YosHikawa

•Valor da Causa no Novo CPC ..............................35

FEliPE CunHa dE alMEida

•Novo Código de Processo Civil e o Valor da Causa nas Ações de Reparação por Danos Extrapatrimoniais ...................................................9

MarCElo Muritiba dias ruas

•O Pedido de Reparação por Danos Morais e o Valor da Causa em Causas Cíveis e Trabalhistas Segundo o CPC de 2015 ......................................25

Índice Geral

DOUTRINAS

Assunto

duração razoáVEl do ProCEsso

•Duração Razoável do Processo e Sua Aplica-ção no Novo Código de Processo Civil (CarlosHenrique Soares) .................................................39

intErPrEtação JurídiCa

•Argumentos Consequencialistas: Legitimidadeou Arbitrariedade? (Daniela Copetti Cravo)..........85

ordEM ProCEssual

•A Alteração da Ordem Processual no Novo CPC – Aspectos Gerais e o Direito Empresarial(Luiz Fernando Valladão Nogueira) .....................71

PossE

•Das Ações Possessórias, Habilitação e Restau-ração de Autos no Novo Código de Processo

Civil – Lei nº 13.105/2015 (Rogério Montai de Lima) ..............................................................99

sEguro saúdE

•A Cobrança de Coparticipação e os Planos de Saúde: Análise do Regime Jurídico (Augusto Franke Dahinten, Bernardo Franke Dahintene Paulo Roberto do Nascimento Martins) ...........110

sistEMa JurídiCo

•O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema Jurídico (Marcio Evangelista Ferreira da Silva) .............................................................130

Autor

augusto FrankE daHintEn, bErnardo FrankE daHintEn E Paulo robErto do nasCiMEnto Martins

•A Cobrança de Coparticipação e os Planos deSaúde: Análise do Regime Jurídico ....................110

bErnardo FrankE daHintEn, augusto FrankE daHintEn E Paulo robErto do nasCiMEnto Martins

•A Cobrança de Coparticipação e os Planos deSaúde: Análise do Regime Jurídico ....................110

Carlos HEnriquE soarEs

•Duração Razoável do Processo e Sua Aplicaçãono Novo Código de Processo Civil ......................39

daniEla CoPEtti CraVo

•Argumentos Consequencialistas: Legitimidadeou Arbitrariedade? ...............................................85

luiz FErnando Valladão noguEira

•A Alteração da Ordem Processual no Novo CPC– Aspectos Gerais e o Direito Empresarial ............71

MarCio EVangElista FErrEira da silVa

•O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema Jurídico ............................................130

Paulo robErto do nasCiMEnto Martins, bErnardo FrankE daHintEn E augusto FrankE daHintEn

•A Cobrança de Coparticipação e os Planos deSaúde: Análise do Regime Jurídico ....................110

rogério Montai dE liMa

•Das Ações Possessórias, Habilitação e Restau-ração de Autos no Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015 ...................................99

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246 ��������������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Assunto

dEsaProPriação

•Processual civil – Execução de sentença – Desa-propriação para fins de reforma agrária – Inde-nização pelas benfeitorias – Valor inicialmente depositado maior do que o arbitrado – Diferen-ça a ser levantada pelo Incra mediante ordem judicial, conforme definido no título judicial – Pretensão de fazer compensações nos cálcu-los de liquidação – descabimento – Óbice da coisa julgada (TRF 5ª R.) ..........................8762, 202

EMbargos dE dEClaração

•Processual civil – Embargos de declaração – Inexistência de qualquer dos defeitos que pode-riam motivar a oposição – Prequestionamento (TRF 4ª R.) ...............................................8761, 198

ExECução

•Processo civil – Apelação – Execução por título extrajudicial – Contrato de empréstimo – FAT – Devedores citados – Embargos – Abandono da causa – Extinção – Impossibilidade – Súmula nº 240 do STJ – Inexistência de requerimentodos executados (TRF 2ª R.) .......................8759, 187

Honorários dE adVogado

•Direito processual civil – Agravo de instrumen-to – Ação ordinária – Execução de sentença – Honorários advocatícios – Acolhimento de impugnação da parte sucumbente – Decisão interlocutória a desafiar a interposição de agra-vo de instrumento – Princípio da fungibilidade – Inaplicabilidade na espécie – Agravo de ins-trumento improvido (TRF 3ª R.) ...............8760, 193

Justiça gratuita

•Processual civil – Impugnação ao pedido de assistência judiciária gratuita – Afirmação de hipossuficiência – Renda líquida inferior a dez salários mínimos – Concessão do benefício – Apelação provida (TRF 1ª R.) ...................8758, 182

ProVa

•Agravo regimental nos embargos de declaração no recurso especial – Direito processual civil – Embargos à execução – 1 Indeferimento de prova testemunhal – Alegação de cerceamento de defesa – Não caracterização – 2 Executivi-dade do contrato – Alegação de que o contrato foi assinado pelas testemunhas depois da ce-lebração do negócio – Pretensão recursal que colide com as premissas fáticas assentadas pe-las instâncias ordinárias – Súmula nº 7 do STJ – 3 Embargos de declaração – Desnecessidade de pauta – 4 Ausência de omissão no julgado – 5 Configuração de ato atentatório à dignidade

da justiça – Súmula nº 7 do STJ – 6 Honorários advocatícios – Pretensão de redução – Inviabi-lidade – Súmula nº 7 do STJ – 7 Agravo regi-mental desprovido (STJ) ...........................8755, 149

rECurso

•Processual civil – Agravo interno no agravo em recurso especial – Recurso manejado sob a égi-de do NCPC – Decisão do tribunal de origem que não admite o apelo nobre com fulcro no art. 543-C, § 7º, I, do CPC/1973 – Interposi-ção de agravo em recurso especial – Não ca-bimento – Devolução dos autos à origem para apreciação como agravo interno – Ausência de impugnação específica – Decisão de admissibi-lidade – Aplicação da Súmula nº 182 do STJ – Decisão mantida (STJ) ..............................8756, 156

sEguro

•Civil e processual civil – Agravo regimental no recurso especial – Seguro habitacional – Ação proposta pelos beneficiários – Prescrição de-cenal – Precedentes – Incidência da Súmula nº 83 do STJ – Ausência de impugnação a ar-gumento específico – Aplicação, por analogia, da Súmula nº 283 do STF – Multa decendial – Previsão contratual – Cabimento – precedentes – Recurso manejado sob a égide do CPC/1973 – Decisão mantida (STJ) ...........................8757, 165

EMENTÁRIO

Assunto

ação CautElar

•Ação cautelar – caução antecipatória de pe-nhora em execução fiscal – oferecimento deprecatório ................................................8763, 207

ação CiVil PúbliCa

•Ação civil pública – intimação – art. 236, § 1º, do CPC/1973 – pluralidade de advogados – pa-trono residente em comarca diversa – substa-belecimento .............................................8764, 207

ação ColEtiVa

•Ação coletiva – habilitação de crédito – juros remuneratórios ........................................8765, 207

ação dE guarda dE MEnor

•Ação de guarda de menor – falecimento – mãe – pai biológico – direito de guarda assegura-do – padrasto – visitação – interesse do melhor – não reconhecimento .............................8766, 207

ação dE obrigação dE FazEr

•Ação de obrigação de fazer – descumprimen-to de contrato de mútuo – deliberação mono-crática ....................................................8767, 209

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RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������247

ação indEnizatória

•Ação indenizatória – devolução indevida de cheques por falta de provisão de fundos – cár-tula emitida por pessoa jurídica – incidência do CDC – danos materiais – danos morais por rico-chete pleiteados pela sócia da empresa – valorda indenização ........................................8768, 209

ação Pauliana

•Ação pauliana – fraude contra credores – requi-sitos – demonstração – ônus da prova......8769, 209

ação rEiVindiCatória

•Ação reivindicatória – propriedade do bem – reexame de prova ...................................8770, 209

ação rEsCisória

•Ação rescisória – ajuizamento – termo inicial – prazo decadencial ................................8771, 209

agraVo rEgiMEntal

•Agravo regimental no agravo em recurso es-pecial – Código de Processo Civil de 1973 – aplicabilidade ..........................................8772, 210

aliMEntos

•Alimentos – pensão alimentícia entre ex-côn-juges – observação ..................................8773, 210

assoCiação dE MoradorEs

•Associação de moradores – ação de cobrança com base em enriquecimento ilícito – taxa de manutenção – proprietário de imóvel não asso-ciado – impossibilidade ...........................8774, 211

CoMPEtênCia

•Competência – obrigação securitária – sistema financeiro de habitação ...........................8775, 212

•Contrato – juros – cobrança – previsão – possi-bilidade ...................................................8776, 212

Contrato

•Contrato – resolução – parceria pecuária – ex-pressa previsão de multa – julgamento anteci-pado da lide ............................................8777, 213

•Contrato de participação financeira – cum-primento de sentença – critério para cálculo de indenização ........................................8778, 213

•Contrato de participação financeira – cumpri-mento de sentença – fundamentos da decisão agravada não impugnados .......................8779, 214

dano Moral

•Dano moral – não caracterizado – inscrição in-devida comandada pelo suposto credor – ano-tações anteriores ......................................8780, 214

dano MatErial

•Danos materiais e morais – ação de indeniza-ção – excludente de responsabilidade – dever de indenizar não configurado ..................8781, 216

dirEito intErtEMPoral

•Direito intertemporal – recurso especial – mo-dalidade retida – retenção determinada na vigência do CPC/1973 – inaplicabilidade doCPC/2015 ................................................8782, 216

dirEito sECuritário

•Direito securitário – negativa de prestação ju-risdicional – não ocorrência – seguro de auto-móvel – perda total do veículo – indenização ................................................................8783, 217

EMbargos dE dEClaração

•Embargos de declaração no agravo regimental no recurso especial – Código de Processo Civil de 2015 – aplicabilidade .........................8784, 217

ExECução

•Execução – ajuizamento em face de sócios--avalistas de pessoa jurídica em recuperação judicial – suspensão da ação – impossibilidade ................................................................8785, 218

Justiça gratuita

• Justiça gratuita – ausência de comprovação – deserção ..................................................8786, 219

lotEaMEnto

•Loteamento irregular – responsabilidade pelaregularização – Súmula nº 283/STF..........8787, 221

PEtição

•Petição eletrônica – subscrição digital – advo-gado subscritor sem procuração nos autos –recurso inexistente ...................................8788, 221

PrEClusão

•Preclusão consumativa – multiplicidade de pe-tições – admissibilidade ...........................8789, 221

rECuPEração JudiCial

•Recuperação judicial – discussão sobre in-clusão de crédito em plano de recuperação judicial – ação de indenização por danos mo-rais – “demanda ilíquida” – crédito referente àação indenizatória ..................................8790, 221

•Recuperação judicial – execução – crédito ex-traconcursal – penhora sobre faturamento das empresas .................................................8791, 222

rECurso

•Recurso – falta de demonstração do preparo – interposição do apelo – guia de recolhimento –falta de juntada ........................................8792, 222

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248 ��������������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 102 – Jul-Ago/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

•Recurso incapaz de alterar o julgado – admissi-bilidade – decisão agravada – ausência de im-pugnação .................................................8793, 223

rEgistro

•Registro – titular de serviços notariais – perda da delegação – magistrado como única auto-ridade processante – previsão na Lei Federal nº 8.935/1994 e na Lei Estadual nº 11.183/1998 – ausência de vício ..................................8794, 223

rEPrEsEntação ProCEssual

•Representação processual – advogado subscri-tor – agravo e do recurso especial ............8795, 223

•Responsabilidade civil – inscrição em cadastro de inadimplentes – existência de inscrições an-teriores ....................................................8796, 223

rEsPonsabilidadE CiVil

•Responsabilidade civil por fato de outrem – CC/1916 – responsabilidade dos pais pelos atos ilícitos praticados pelo filho menor – valor in-denizatório ..............................................8797, 224

sEguro

•Seguro de vida – acidente de trânsito – indeni-zação da garantia básica ..........................8798, 224

•Seguro DPVAT – indenização – credor putati-vo – teoria da aparência ..........................8799, 224

título dE Crédito

•Título de crédito – duplicata mercantil – aceite em separado – ato formal – ausência de eficácia cambial – falta de executividade – instrução de ação monitória – possibilidade ................8800, 224

união EstáVEl

•União estável – ação de reconhecimento – ho-mem casado – ocorrência de concubinato – se-paração de fato não provada ...................8801, 226

seção especial

COM A PALAVRA, O PROCURADOR

Assunto

PrEsunção dE inoCênCia

•O NCPC e o Princípio Constitucional da Pre-sunção da Inocência (Leonardo Oliveira Soares) ..........................................................................229

Autor

lEonardo oliVEira soarEs

•O NCPC e o Princípio Constitucional da Pre-sunção da Inocência ..........................................229

CLIPPING JURÍDICO

•Ação só pode ser extinta por abandono do au-tor se réu pedir ..................................................240

•Em agosto, entra em vigor a Convenção de Haiano Brasil ............................................................242

•Falta de pagamento em venda de imóvel permi-te correção monetária ........................................238

•Marca conhecida no exterior não pode ser re-gistrada em outro país ........................................241

•Pedidos de recuperação judicial sobem maisde 100% no primeiro semestre de 2016 ............240

•Por indício de fraude, Justiça Federal anula casa-mento de sogro com nora ..................................237

•Prazos processuais de Juizados Especiais pas-sam a ser contados em dias corridos .................239

•Se autorizada, venda de imóvel de empresa emrecuperação não é fraude ..................................237