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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA INSTITUTO-GERAL DE PERÍCIAS DEPARTAMENTO MÉDICO-LEGAL LESÃO CORPORAL - OUTROS LAUDO PERICIAL Nº 155470/2018 Solicitação/Ofício Sol.: 11636/2018 de 09/10/2018 Órgão Solicitante: 100302 - 2ª DELEGACIA DE POLICIA DE PORTO ALEGRE / PORTO ALEGRE Órgão Destino: 100301 - 1ª DELEGACIA DE POLÍCIA DE PORTO ALEGRE / PORTO ALEGRE Ocorrência Polícia Civil: 11636/2018 - 100302 Protocolo: 98123/2018 Ao(s) 9 de outubro de 2018 à(s) 19 hora(s) e 04 minuto(s) nesta cidade de Porto Alegre, no(a) Av. Ipiranga, 1807, à requisição do Sr.(a) titular do(a) 2ª DELEGACIA DE POLICIA DE PORTO ALEGRE, difusão 1ª DELEGACIA DE POLÍCIA DE PORTO ALEGRE, compareceu o(a) perito(a) oficial Eduardo Sörensen Ghisolfi para proceder o exame em THASSIA VASCONCELLOS NEIS, filho(a) de Luis Alexandre Neis e Cláudia Maria Pellegrino Vasconcellos, nascido(a) em 20/10/1998, RG nº 7104815126, descrevendo o que encontrou e respondendo aos seguintes quesitos: - PRIMEIRO, se há ofensa à integridade corporal ou à saúde do periciado; - SEGUNDO, qual o instrumento ou meio que produziu a ofensa; - TERCEIRO, se foi produzida por meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia ou tortura, ou por outro meio insidioso ou cruel (resposta especificada); - QUARTO, se resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias; - QUINTO, se resultou perigo de vida; - SEXTO, se resultou debilidade permanente ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função (resposta especificada); - SÉTIMO, se resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável ou deformidade permanente (resposta especificada); - Em consequência, passou o perito a fazer o exame requisitado e as investigações que julgou necessárias, concluídas as quais, declarou o seguinte: HISTÓRICO: A periciada comparece para realizar o exame de corpo de delito referindo ter sido agredida, no dia anterior, por duas pessoas que a teriam imobilizado e por uma terceira que teria realizado uma inscrição em sua “barriga”. Nega haverem restado outras marcas ou qualquer outra lesão. Reitera haver apenas uma lesão, a qual, segundo ela, teria o aspecto de uma “suástica” e que teria vindo a este local, ao Departamento de Medicina Legal, para realizar o exame, segundo ela nos informou, orientada pelos policiais que a atenderam, para poder mostrar a inscrição, o que lhe permitiria ingressar com queixa. 1. Descrição: Na ectoscopia das partes corporais desnudas – a saber, a cabeça, os antebraços e as mãos – não foram observadas escoriações, equimoses, aumentos de volume ou qualquer outra lesão digna de nota (Fotografia 1). A periciada, mais de uma vez, reiterou que não lhe restaram outras lesões, pois ela não teria, de forma alguma, reagido ao ataque e que, ao ser imobilizada pelos supostos agressores, os quais lhe teriam segurado apenas pelos braços, como ela estaria usando uma roupa com mangas muito macias, estas lhe teriam protegido. Mais de uma vez, afirmou não ter havido luta corporal entre ela e os agressores, apenas a imobilização pelos braços, ao que ela teria ficado, de pronto, paralisada. Solicitamos à periciada que mostrasse a lesão que havia restado. A periciada ergueu, então, a blusa, deixando à mostra apenas a região lateral esquerda do tronco, evidenciando, na região de transição toracoabdominal, uma figura formada por escoriações lineares, inscrita sobre uma região que pode ser aproximada por um losango equilátero (um quadrado, de fato) cujo lado mede aproximadamente 10 centímetros (Fotografia 2). Av. Ipiranga, 1807 Página 1 de 12

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LAUDO PERICIAL Nº 155470/2018

Solicitação/Ofício Sol.: 11636/2018 de 09/10/2018Órgão Solicitante: 100302 - 2ª DELEGACIA DE POLICIA DE PORTO ALEGRE / PORTO ALEGREÓrgão Destino: 100301 - 1ª DELEGACIA DE POLÍCIA DE PORTO ALEGRE / PORTO ALEGREOcorrência Polícia Civil: 11636/2018 - 100302Protocolo: 98123/2018

Ao(s) 9 de outubro de 2018 à(s) 19 hora(s) e 04 minuto(s) nesta cidade de Porto Alegre, no(a) Av. Ipiranga,1807, à requisição do Sr.(a) titular do(a) 2ª DELEGACIA DE POLICIA DE PORTO ALEGRE, difusão 1ªDELEGACIA DE POLÍCIA DE PORTO ALEGRE, compareceu o(a) perito(a) oficial Eduardo SörensenGhisolfi para proceder o exame em THASSIA VASCONCELLOS NEIS, filho(a) de Luis Alexandre Neis eCláudia Maria Pellegrino Vasconcellos, nascido(a) em 20/10/1998, RG nº 7104815126, descrevendo o queencontrou e respondendo aos seguintes quesitos: - PRIMEIRO, se há ofensa à integridade corporal ou à saúdedo periciado; - SEGUNDO, qual o instrumento ou meio que produziu a ofensa; - TERCEIRO, se foi produzidapor meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia ou tortura, ou por outro meio insidioso ou cruel (respostaespecificada); - QUARTO, se resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias; -QUINTO, se resultou perigo de vida; - SEXTO, se resultou debilidade permanente ou perda ou inutilização demembro, sentido ou função (resposta especificada); - SÉTIMO, se resultou incapacidade permanente para otrabalho, ou enfermidade incurável ou deformidade permanente (resposta especificada); - Em consequência,passou o perito a fazer o exame requisitado e as investigações que julgou necessárias, concluídas as quais,declarou o seguinte: HISTÓRICO: A periciada comparece para realizar o exame de corpo de delito referindoter sido agredida, no dia anterior, por duas pessoas que a teriam imobilizado e por uma terceira que teriarealizado uma inscrição em sua “barriga”. Nega haverem restado outras marcas ou qualquer outra lesão. Reiterahaver apenas uma lesão, a qual, segundo ela, teria o aspecto de uma “suástica” e que teria vindo a este local, aoDepartamento de Medicina Legal, para realizar o exame, segundo ela nos informou, orientada pelos policiaisque a atenderam, para poder mostrar a inscrição, o que lhe permitiria ingressar com queixa.

1. Descrição:

Na ectoscopia das partes corporais desnudas – a saber, a cabeça, os antebraços e as mãos – não foramobservadas escoriações, equimoses, aumentos de volume ou qualquer outra lesão digna de nota (Fotografia 1).

A periciada, mais de uma vez, reiterou que não lhe restaram outras lesões, pois ela não teria, de formaalguma, reagido ao ataque e que, ao ser imobilizada pelos supostos agressores, os quais lhe teriam seguradoapenas pelos braços, como ela estaria usando uma roupa com mangas muito macias, estas lhe teriam protegido.Mais de uma vez, afirmou não ter havido luta corporal entre ela e os agressores, apenas a imobilização pelosbraços, ao que ela teria ficado, de pronto, paralisada.

Solicitamos à periciada que mostrasse a lesão que havia restado. A periciada ergueu, então, a blusa,deixando à mostra apenas a região lateral esquerda do tronco, evidenciando, na região de transiçãotoracoabdominal, uma figura formada por escoriações lineares, inscrita sobre uma região que pode seraproximada por um losango equilátero (um quadrado, de fato) cujo lado mede aproximadamente 10 centímetros(Fotografia 2).

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Fotografia 1 – Imagem da periciada no momento do exame de corpo de delito.

Fotografia 2 – Imagem da inscrição que motivou o encaminhamento ao exame de corpo de delito.

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Essa inscrição é formada por escoriações, isto é, por lesões produzidas por um instrumento com açãocontundente, o qual provocou abrasão das camadas superficiais da pele, levando ao destacamento das célulasepidérmicas e ao rompimento de pequenos vasos capilares sanguíneos presentes na derme superficial,provocando extravasamento de gotículas de sangue, como sói acontecer em lesões superficiais. É digno de notaque as escoriações já evidenciavam, no momento do exame, sinais incipientes de reepitelização, a qual começa,tipicamente, entre 24 e 48 horas após a lesão, podendo esse intervalo de tempo variar um pouco, conforme aregião do corpo em que são observadas as lesões (FRANÇA, 2017; HÉRCULES, 2014). A figura que motivouo presente exame localiza-se na região anterolateral esquerda do tronco e consiste em uma série de escoriaçõeslineares, formando uma cruz a qual apresenta morfologia peculiar, com elementos que lembra, em parte, tantouma cruz potenteia quanto uma cruz gamada (HERDER LEXIKON, 1998), cujas hastes estão dispostas deforma ortogonal entre si e são formadas por múltiplos traços de escoriação cada uma delas, os maiores dessestraços, aqui tomados como referência, medindo 102 mm. Ademais, a cruz é formada por hastes que sedirecionam de forma inclinada em relação ao eixo craniocaudal, de modo que essas hastes estão inclinadas emangulação próxima de 45 graus com esse eixo de referência. Nas extremidades das hastes que formam oentrecruzamento, ao centro da figura, localizam-se múltiplos traços que se orientam, em relação às hastes, deacordo com ângulos próximos do ângulo reto, à moda de serifas. Observação: estamos aqui utilizando, para finsmeramente descritivos, o vocábulo “serifa”, o qual denota os traços que acompanham certos tipos de letras queapresentam pequenas barras transversas às suas hastes, como é o caso, por exemplo, da letra “I” maiúscula dotipo “Times New Roman” (Fotografia 3).

Fotografia 3 – Imagem da inscrição que motivou o encaminhamento ao exame de corpo de delito, obtidacom maior detalhamento, por aproximação.

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Cada uma das hastes e das serifas das hastes é formada por múltiplos traçados de escoriação, variandoem número para cada região, geralmente entre 2 e 5 traçados, sempre lineares e de aspecto marcadamentecontínuo, os quais variam pouco de tonalidade, uns poucos mais fracamente marcados sobre a pele, a maioria,por sua vez, um pouco mais escuros, denotando extravasamento capilar e a presença de uma pequena crostasero-hemática recobrindo a lesão. Podem ser identificados, pelo menos, vinte (20) traçados de escoriações, osquais são compatíveis com momentos gráficos distintos. Cada um desses momentos gráficos distintoscorresponde a um movimento próprio do punho escritor, em que o agente produtor dos grafismos o faz semafastar o instrumento produtor do suporte que recebe o grafismo (DEL PICCHIA e cols., 2005). Nesse sentido,cada momento gráfico pode ser distinguido do movimento que originou outro momento de traçado, na hipótesede haver sido utilizado um instrumento de ponta única (Imagem 1).

Imagem 1 – Individualização dos momentos gráficos próprios nos traçados presentes no hipocôndrio esquerdo.

Os traçados de escoriação são, de toda forma, majoritariamente superficiais, não transpassandototalmente a pele. Embora seja possível visualizar alguns traçados marcados um pouco mais sutilmente, o quechama a atenção é a grande uniformidade dos traçados de escoriação produzidos, os quais adentram a epidermede forma similarmente superficial. Também é particularmente digno de nota que os traçados estão relacionadosentre si por marcado grau de paralelismo ou de ortogonalidade. Além disso, os traços de escoriação queapresentam desvio significativo, sem inflexão durante a sua produção, isto é, aqueles que se curvamsignificativamente em algum momento, são o traçado mais fino que se observa na haste principal que estáalinhada de cima para baixo e da direita para a esquerda (indicado pelo índice “16” na Imagem 1) e o traçomais externo da serifa da haste transversa (indicado pelo índice “6” na Imagem 1), serifa esta que, porconstrução, tende a ser paralela à haste descrita imediatamente antes e está localizada na porção caudal direita

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da figura em tela. Nestes dois elementos, observa-se um encurvamento dos traçados, o qual se localiza junto auma região de inflexão natural da superfície curva da pele, onde começa a se pronunciar o panículo adiposo dacintura abdominal. Mesmo nessas regiões onde a superfície cutânea muda de direção, se observa apenas umamudança muito pequena na profundidade dos traços, o que indica que eles teriam sido produzidos de formabastante cuidadosa. Observa-se um único ponto em que o traçado parece mudar de direção, o qual está indicadopelos índices “2a" e “2b” na Imagem 1, não podendo se afirmar, nesse ponto em particular, se ocorre a soma dedois momentos gráficos, isto é, se são um ou dois momentos, na forma de um retoque gráfico ou se teria havidomudança da direção sobre a qual se produzia o traçado; ainda assim, mesmo nessa região, não háaprofundamento das lesões, denotando zelo na sua produção.

Ao solicitarmos que a periciada mostrasse a região contralateral do tronco para fins de comparação coma área inicialmente examinada, foi possível observar, parcialmente, que ali havia outro elemento de escoriaçãolinear, o qual acabou por revelar-se em outra figura (Fotografia 4).

Fotografia 4 – Uma segunda inscrição, evidenciada durante o exame de corpo de delito.

A periciada mencionou não haver percebido a presença dessa lesão, antes deste exame de corpo dedelito. Deparamos, então, com uma figura formada por dois traços relativamente retilíneos, embora menosretilíneos do que os da região contralateral, formando uma cruz. Considerando-se a periciada em pé, e vista defrente, a haste maior está dirigido verticalmente e mede 90 mm e a haste menor, situando-se ortogonalmente àoutra, dirige-se horizontalmente e mede 60 mm. Os traçados de escoriação presentes nessa região do tronco sãomais simples e são, também, superficiais e contínuos, não atravessando – reiteramos – inteiramente a pele. Ahaste vertical apresenta-se composta na sua região inferior (caudal) por dois traçados, que se afastam de formaquase paralela. Podem ser identificados, portanto, neste grafismo, pelo menos, três traçados de escoriações, os

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quais são compatíveis com momentos gráficos distintos, considerando-se o uso de um instrumento de pontaúnica (Fotografia 5).

Fotografia 5 – Imagem da segunda inscrição, evidenciada durante o exame de corpo de delito, obtidacom maior detalhamento, por aproximação.

Na região situada no quadrante superior lateral da figura observa-se uma pequena mancha equimóticaviolácea, aproximadamente circular com cerca de 10 mm de diâmetro, de aspecto similar as que poderiam serproduzidas por digitopressão (ver região circulada na Imagem 2).

Após a evidenciação da segunda lesão, a que tem formato de cruz, na região anterolateral direita dotronco, a periciada consentiu em realizar as fotografias das lesões identificadas, mas não consentiu emprosseguir com o exame visual de outras regiões corporais.

2. Discussão:

A ausência de outras lesões observáveis nas partes corporais em que a periciada deixou-se examinar, asaber, a face, os antebraços, a superfície das mãos e dedos e a superfície da parede anterior do abdômen, excetoas múltiplas escoriações lineares e superficiais e uma pequena mancha equimótica, fracamente marcada,descritas anteriormente, é indicativa de que, se houve algum embate corporal entre a periciada e os supostosagressores, estes não teriam empregado meios adicionais que fossem efetivos em produzir outras lesões.

As escoriações lineares, como as que são aqui observadas, são usualmente produzidas por uminstrumento que tenha uma ponta, isto é, um vértice, que possa funcionar como uma estrutura que possapromover o destacamento de células da pele, provocando uma lesão que é apenas superficial. O instrumento,

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neste contexto, funciona de forma contundente, causando abrasão e não um ferimento inciso, o qual, por suavez, teria os bordos afastados entre si, o que não é o caso em nenhum dos traçados observados. As lesõesabrasivas aqui evidenciadas poderiam ser produzidas pela aplicação de uma força (e, portanto, de uma pressão),através, potencialmente, do emprego de diversos objetos.

Imagem 2 – Individualização dos traçados dos grafismos presentes na região anterolateral direita dotronco (na transição entre o hipocôndrio e o flanco).

A guisa de esclarecimento, exemplificamos a seguir alguns destes possíveis objetos, na forma de umalista, a qual – ressaltamos – não tem a intenção de ser exaustivamente abrangente. Isto é, não é possível limitaros objetos passíveis de serem utilizados na produção das lesões aqui descritas apenas aos que são aquielencados. Nesse sentido, entre os possíveis instrumentos empregados poderíamos considerar, sempre a títulode ilustração: arames, lâminas metálicas (como a de um canivete, ou mesmo a de uma faca, desde que usadasatravés da sua ponta ou aresta e, menos provavelmente, através do gume propriamente dito), grampos de cabeloou outras bijuterias ou joias, pregos, superfícies vítreas não polidas, pedaços de latas, agulhas ou outras hastes(que poderiam ser, por sua vez, de uma gama variada de materiais, desde que suficientemente rígidas edelgadas, ao menos em uma das suas extremidades, para que se pudesse produzir escoriações lineares como asque foram observadas na periciada). No entanto, para que a força empregada ao se produzirem as lesões nãoprovocasse dano desmedido e acabasse por atravessar integralmente a pele, o que acabaria por provocar umcorte, isto é, um ferimento inciso, é condição necessária que o agente produtor dessas lesões tenha tido bastantehabilidade e cuidado ao executar os movimentos que originaram as inscrições relatadas, bem como que eletenha tido tempo adequado para produzir as lesões e, idealmente, um ambiente propício.

Como se trata de lesões (do tipo escoriação), em sua maioria, formando traçados retilíneos, regulares emarcadamente contínuos, compondo-se, entre si, através de paralelismo ou de ortogonalidade muitosignificativos, os quais foram necessários para produzir as lesões evidenciadas, principalmente, na forma da

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figura relativamente complexa que é a da cruz situada na região anterolateral esquerda do tronco e, ademais,por não haver aprofundamento da lesão, de forma a não transpassar a pele em sua totalidade, conclui-se que afigura produzida poderia ser mais facilmente produzida com o consentimento ou com a colaboração da própriapericiada, ou, alternativamente, ao menos, com marcada incapacidade dela em reagir, ainda queinvoluntariamente, aos estímulos que seriam esperados diante de uma agressão. Dificilmente poderiam aslesões evidenciadas serem, em sua ampla maioria, tão retilíneas, contínuas, aproximadas e pouparem ascamadas mais profundas da pele, se a vítima tivesse preservada a sua capacidade de reação ante uma agressão,seja por medo, por susto, por reflexo, ou mesmo por cócegas ou por qualquer outra situação que tivesseprovocado o seu movimento corporal em relação ao instrumento produtor das lesões. Mesmo a movimentaçãodo tronco, e, portanto, da superfície da pele na região, acompanhando os movimentos ventilatórios poderia vir aprejudicar o resultado observado nas figuras produzidas, se não houver cuidado especial nesse sentido.

Verificam-se, pelo menos, 23 (vinte e três) momentos gráficos distintos, isto é, o punho escritor queproduziu as lesões em tela executou pelo menos 23 (vinte e três) gestos gráficos distintos para produzir osgrafismos que foram possíveis de evidenciar no exame de corpo de delito. Vinte (20) momentos para a figuralocalizada à esquerda no tronco, e três (3) momentos para a figura localizada à direita. Esses grafismos ocorremna forma de escoriações lineares, as quais, em linguagem mais coloquial e menos técnica, correspondem a“arranhões”. Esse número pode variar, se considerarmos alguns dermatografismos já em resolução, os quaisaparecem como linhas finas de tonalidade rósea, desprovidas da crosta hemática. Como alguns traçados jáestavam em fase de reepitelização, isto é, desvanecendo, como é o caso dos traçados indicados por “4” e “5” naImagem 1, é possível que o número de gestos gráficos tenha sido ainda maior e não tenha restado, no momentodo exame, lesão observável para algum gesto adicional, dado o hiato de tempo entre a ocorrência da suaprodução e o momento do exame. Além disso, é digno de nota que eventuais lesões que fossem, por natureza,mais superficiais, tenderiam a desaparecer primeiro. Quanto ao tempo que seria necessário para produzir oconjunto desses grafismos, não há como determiná-lo com exatidão, haja vista que esse tempo dependeria apriori de diversos fatores. Nesse sentido, poderíamos elencar, para citar alguns: a habilidade do punho executordos grafismos (isto é, a destreza do indivíduo que os produziu); a natureza do objeto utilizado comoinstrumento para a execução dos grafismos (características como o seu fio ou gume, o peso, o tamanho e a suaflexibilidade, entre outras); e a natureza do ambiente em que as lesões foram produzidas (se a vítima estava emdecúbito, sentada, ou em pé, se o ambiente era bem iluminado ou não, se era um ambiente sossegado outumultuado, se a vítima estava em condições de reagir ou não). Todos esses fatores são capazes de influenciarde modo importante o processo de produção de lesões como as que aqui são analisadas. Fatores esses que nãosão plenamente possíveis de serem conhecidos através do exame de corpo de delito realizado na periciada, porsi só, apenas. É digno de nota, deve-se admitir, no entanto, como um ponto de partida, que deva existir umarelação de compromisso entre o tempo em que as lesões em questão levariam para serem produzidas e aqualidade do grafismo produzido. Em outras palavras, pode-se concluir que as lesões tenham sido produzidascautelosamente, de modo a não causarem dano às camadas profundas da pele, provocando alterações que sãoapenas superficiais. Não seria esperado produzirem-se lesões como estas, com as características das que foramevidenciadas neste exame de corpo de delito, por um agressor que agisse de forma tempestuosa edemasiadamente rápida, como se esperaria que fosse o caso em situações de agressões furtivas e em ambientesadversos.

Adicionalmente, é digno de nota, as lesões evidenciadas situam-se em regiões da superfície corporal queseriam facilmente acessíveis às mãos da própria periciada. Chama a atenção o fato de que, se pensarmos nahipótese de serem as lesões autoinfligidas e o agente, no caso, fosse destro, seria mais confortável para eleproduzir lesões em áreas mais caudais no tronco à direita e um pouco mais cefálicas na esquerda, o quereproduz o caso em tela. Em outras palavras, sendo destro e mantendo o braço menos fletido, de forma aproduzir as lesões com o menor esforço possível, se produziriam lesões em território mais próximo ao flanco naregião anterolateral direita e mais próximo ao hipocôndrio em região anterolateral esquerda.

Nesse sentido, gostaríamos de mencionar que há um trabalho, publicado por autores ligados ao Institutode Medicina Legal de Freiburg na Alemanha, no qual são relatados dois casos de lesões autoinfligidas em queadolescentes marcaram na própria pele símbolos associados à Alemanha nazista (FALLER-MARQUARDT ePOLLAK, 2005). Esses autores preconizam que as características morfológicas típicas das lesões

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autoinflingidas são: localização em partes facilmente acessíveis do corpo, multiplicidade de lesões singulares,com curso linear ou levemente recurvado, lesões não penetrantes e de profundidade similar, arranjadas emgrupo e sobre uma área definida, ausência de lesões de defesa e de dano às vestimentas. A única dessascaracterísticas que não pôde ser avaliada no trabalho que ora relatamos foi a integridade das vestes, uma vezque a vítima compareceu em dia diferente do que ocorreu a produção das lesões, usando, supostamente, outrasvestes. Todas as outras características citadas por Faller-Marquardt e Pollak, da Universidade de Friburgo, sãotambém verificadas no presente caso, a exemplo dos casos que eles relataram. É digno de nota, o trabalhodesses autores, em sua parte final, aborda uma discussão sobre as razões pelas quais os autoperpetradores delesões de pele costumam provocar dano em si próprios, usando grafismos com temática nazista (FALLER-MARQUARDT e POLLAK, 2005). Lesões espelhadas, isto é, em imagem especular, também têm sidoregistradas em situações de autoprovocação (WINSKOG, 2011). No caso em tela, a imagem espelhadalembraria a de uma suástica, como a que a Alemanha utilizou durante a Segunda Guerra Mundial.

No entanto, isoladamente, essas considerações não permitem, por si só, concluir em definitivo nadireção de que as lesões em análise tenham essa natureza. Também é preciso considerar que, como se trata detraçados simples, majoritariamente linhas retas, não há neles elementos personalísticos que pudessemindividualizar o traçado, permitindo, como elemento de convicção, a identificação inequívoca da autoria dografismo, isto é, do punho escritor que as produziu (DEL PICCHIA e cols., 2005). Nesse sentido, embora nãoseja possível afirmar categoricamente que a lesão seja autoinfligida, pode-se concluir, com convicção, que apossibilidade de uma agressão que tenha acontecido sem que tenha havido alguma forma de colaboração daparte da vítima ou sem que tenha havido marcada incapacidade de reação da parte dela é muitíssimo diminuta.A ausência de lesões de defesa (FALLER-MARQUARDT e POLLAK, 2005; POLLAK e SAUKKO, 2000),como cortes ou contusões, particularmente nas mãos e nos antebraços também corroboram a tese de que nãoteria havido reação da parte da periciada.

O fato de as escoriações estarem já em processo de reepitelização permite esperar que o processo decicatrização, uma vez em curso, seja efetivo e que não restem cicatrizes relacionadas a este evento. Por outrolado, como se trata de uma lesão já em processo de recuperação (cicatrização), alguns aspectos do examepericial restam prejudicados, dado o hiato de tempo entre a produção da lesão e o comparecimento ao exame decorpo de delito. A mesma consideração, no entanto, ressaltamos, não se aplica às possíveis equimoses, as quaisuma vez que tivessem sido produzidas, permaneceriam mais tempo evidentes ao exame, por, pelo menos, maisalguns dias. Ademais, o não consentimento da periciada em prosseguir com o exame de corpo de delito, nabusca de outras possíveis evidências, as quais pudessem eventualmente estar presentes em outras regiõescorporais, se constitui em um potencial limitador para o presente estudo pericial.

3. Conclusões

Do que acaba de se expor, conclui-se:i) A periciada apresenta lesão.ii) O instrumento que produziu as lesões é contundente.iii) As lesões não resultaram incapacidade para as ocupações habituais.iv) As lesões não resultaram em debilidade permanente ou perda ou inutilização de membro, sentido

ou função.v) Não há evidência de lesões de defesa que indiquem ter havido reação da vítima. vi) As lesões são escoriações superficiais, de profundidade uniforme, contínuas, situadas em regiões

do corpo facilmente acessíveis às mãos da própria vítima e que apresentam padrão deparalelismo e ortogonalidade que demandaram cuidado na sua produção. As lesões verificadasapresentam, portanto, características compatíveis com as de lesões autoinfligidas, embora nãohaja, a partir exclusivamente dos resultados do exame de corpo de delito, elemento de convicçãopara se afirmar que efetivamente foram autoprovocadas. Nesse sentido, pode afirmar-se que aslesões foram produzidas: ou pela própria vítima ou por outro indivíduo com o consentimento davítima ou, pelo menos, ante alguma forma de incapacidade ou impedimento da vítima emesboçar reação.

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LESÃO CORPORAL - OUTROSLAUDO PERICIAL Nº 155470/2018

4. Respostas aos quesitos oficiais

Primeiro: se há ofensa à integridade corporal ou à saúde do periciado.Resposta: Sim.Segundo: qual o instrumento ou meio que produziu a ofensa.Resposta: Instrumento contundente.Terceiro: Se foi produzida por meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia ou tortura, ou por outro meio

insidioso ou cruel.Resposta: Não temos elementos para responder.Quarto: Se resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias.Resposta: Não.Quinto: Se resultou perigo de vida.Resposta: Não.Sexto: Se resultou debilidade permanente ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função.Resposta: Não.Sétimo: Se resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou

deformidade permanente;Resposta: Não.

5. Respostas aos quesitos complementares, os quais foram formulados através do ofício 363/2018, de15 de outubro de 2018:

“1. Foi possível constatar alguma lesão no nariz ou nas costelas da vítima que indicasse agressão comsocos, assim como lesões nos braços que indicasse que a mesma foi segurada/contida/imobilizada contra suavontade por duas pessoas?”

Resposta: Não havia no momento do exame, lesões na face ou nas mãos e nos antebraços que sejamcaracterísticas de lesões de defesa ou de que tenha havido embate corporal. Não foi possível examinarcompletamente os braços da periciada, na ausência do consentimento e ante a alegação da periciada de que nãohavia ali lesões. Na parede abdominal, junto ao gradil costal direito, havia uma lesão muito pequena na formade uma equimose violácea, com características das que são produzidas por digitopressão, a qual poderiainclusive haver sido produzida pelo simples apoio do punho escritor que produziu os grafismos presentes noflanco direito.

“2. Os arranhões apresentados como lesão foram produzidos por que tipo de instrumento? Osferimentos foram profundos ou superficiais? Houve perfuração da pele? É possível dizer se houvesangramento profuso de tais lesões ou algum tipo de sangramento?”

Resposta: Os arranhões são, em linguagem técnica, escoriações lineares, de caráter superficial, havendorompimento da integridade das camadas superficiais da pele, no entanto, sem atingir o tecido subcutâneo,motivo pelo qual não se observam, no caso em tela, cortes, ou ferimentos incisos, em que os bordos estariamafastados entre si. Ao atingir as camadas mais profundas da pele, ocorre porejamento de sangue através dosvasos capilares lesionados, o qual costuma ser autolimitado, isto é, em pequena quantidade, formando umacrosta sero-hemática que recobre a área de escoriação.

“3. Em razão das agressões alegadas, seria possível que a vítima não apresentasse nenhuma marca48h após o fato quando esteve na delegacia prestando depoimento, levando em consideração sua cor depele?”

Resposta: Na ocorrência de socos desferidos contra o rosto e as costelas seria plausível esperar lesõesremanescentes, principalmente na forma de escoriações e equimoses violáceas. Eventualmente, poderiam serobservadas fraturas de ossos nessas regiões. A gravidade das lesões remanescentes dependeriafundamentalmente da força empregada. Nesse sentido, e na ausência de lesões expressivas, podemos concluirque, se houve agressões como as que foram elencadas no questionamento, os agressores teriam empregadopouca força. Não se pode excluir a hipótese de que não tenha havido agressão nos moldes do declarado pelapericiada.

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“4. Quantos arranhões/cortes foram verificados no corpo da vítima? Quanto tempo levaria para fazertodos esses arranhões/cortes?”

Resposta: Verificam-se, pelo menos, 23 (vinte e três) momentos gráficos distintos, isto é, o punhoescritor que produziu as lesões em tela executou pelo menos 23 (vinte e três) gestos gráficos distintos paraproduzir os grafismos que foram possíveis de evidenciar no exame de corpo de delito. Vinte (20) momentospara a figura localizada à esquerda no tronco, e três (3) momentos para a figura localizada à direita. Essesgrafismos ocorrem na forma de escoriações lineares, as quais, em linguagem mais coloquial e menos técnica,correspondem a “arranhões”. Esse número pode variar, se considerarmos alguns dermatografismos já emresolução, os quais aparecem como linhas finas de tonalidade rósea, desprovidas da crosta hemática. Comoalguns traçados já estavam em fase de reepitelização, isto é, desvanecendo, como é o caso dos traçadosindicados por “4” e “5” na Imagem 1, é possível que o número de gestos gráficos tenha sido ainda maior e nãotenha restado, no momento do exame, lesão observável para algum gesto adicional, dado o hiato de tempo entrea ocorrência da sua produção e o momento do exame. Além disso, é digno de nota que eventuais lesões quefossem, por natureza, mais superficiais, tenderiam a desaparecer primeiro. Quanto ao tempo que serianecessário para produzir o conjunto desses grafismos, não há como determiná-lo com exatidão, haja vista queesse tempo dependeria a priori de diversos fatores. Nesse sentido, poderíamos elencar, para citar alguns: ahabilidade do punho executor dos grafismos (isto é, a destreza do indivíduo que os produziu); a natureza doobjeto utilizado como instrumento para a execução dos grafismos (características como o seu fio ou gume, opeso, o tamanho e a sua flexibilidade, entre outras); e a natureza do ambiente em que as lesões foramproduzidas (se a vítima estava em decúbito, sentada, ou em pé, se o ambiente era bem iluminado ou não, se eraum ambiente sossegado ou tumultuado, se a vítima estava em condições de reagir ou não). Todos esses fatoressão capazes de influenciar de modo importante o processo de produção de lesões como as que aqui sãoanalisadas. Fatores esses que não são plenamente possíveis de serem conhecidos através do exame de corpo dedelito realizado na periciada, por si só, apenas. É digno de nota, deve-se admitir, no entanto, como um ponto departida, que deva existir uma relação de compromisso entre o tempo em que as lesões em questão levariam paraserem produzidas e a qualidade do grafismo produzido. Em outras palavras, pode-se concluir que as lesõestenham sido produzidas cautelosamente, de modo a não causarem dano às camadas profundas da derme,provocando alterações que são apenas superficiais. Não seria esperado produzirem-se lesões como estas, comas características das que foram evidenciadas neste exame de corpo de delito, por um agressor que agisse deforma tempestuosa e demasiadamente rápida, como se esperaria que fosse o caso em situações de agressõesfurtivas e em ambientes adversos. Vide, adicionalmente, na íntegra, o item “2. Discussão”.

“5. Os arranhões/cortes são retilíneos ou irregulares, feitos de forma firme ou hesitante? Há evidênciasde alguma resistência por parte da vítima no traçado dos arranhões/cortes?”

Resposta: Os traçados são superficiais, não cortando, portanto, a totalidade da derme. Sãomajoritariamente traços retilíneos, o que é indicativo de que tenham sido produzidos de maneira cuidadosa, emmovimento uniforme e razoavelmente constante, denotando um bom controle do instrumento por parte doagente que produziu as lesões e demandando a imobilidade relativa do suporte (isto é, da superfície corporal davítima) para que o instrumento que produziu os grafismos mantivesse pressão suficiente para produzi-los, sem,por outro lado, causar aprofundamento da lesão. Não há evidência de movimentos de defesa característicos desituações de agressão em que a vítima mantém a capacidade de reagir preservada. Vide, adicionalmente, naíntegra, o item “2. Discussão”.

“6. Quais as características de cortes/arranhões quando há resistência da vítima? As lesões na vítimasão compatíveis com tais características?”

Resposta: Quando há resistência da vítima, são esperadas lesões menos superficiais, lesões que seaprofundam transpondo a integridade da pele, causando danos de maior monta, provocando cortespropriamente ditos, isto é, ferimentos incisos, pois haveria menor grau de controle sobre o instrumento produtordas lesões. São esperados traçados menos retilíneos. Não seria esperado encontrar um resultando em que tantostraçados mantenham as relações de paralelismo ou de ortogonalidade entre si, de modo particularmenteestético, como as que são evidenciadas nas lesões descritas neste trabalho. As lesões de defesa são um critériocrucial de evidência do envolvimento de outra pessoa, sendo altamente específicos em provar que uma pessoafoi atacada com um instrumento delgado (pontiagudo) e, além disso, capaz de demonstrar que a vítima estava,

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ao menos inicialmente, consciente e capaz de reagir ao ataque (POLLAK e SAUKKO, 2000). Em síntese, podese afirmar com convicção que as lesões produzidas na vítima não são compatíveis com as que seriam esperadas,na hipótese de ter havido efetiva resistência da parte dela à ação de um agente agressor. Vide, adicionalmente,na íntegra, o item “2. Discussão”.

“7. É possível determinar se o corte/arranhões foram feitos por pessoa destra ou canhota? Qual aposição do instrumento no momento em que foram praticadas as lesões?”

Resposta: Com base exclusivamente nos exames realizados não é possível determinar se as lesõesforam produzidas por pessoa destra ou canhota, pois, tanto o sentido do traçado, do gesto gráfico, quanto aposição relativa entre o agente que produziu e o que sofreu as lesões não são, de todo, conhecidos, nessemomento.

“8. Outros dados julgados úteis.”Resposta: Sugere-se, a critério das autoridades responsáveis, visando ampliar os estudos acerca do

ocorrido, uma solicitação de perícia visando ao confronto entre as imagens da lesão que foram disponibilizadasatravés dos veículos de comunicação, na internet, bem como eventuais imagens outras das lesões da vítima, queestejam disponíveis aos investigadores, e as imagens que foram obtidas neste exame de corpo de delito.

Acompanham o presente laudo pericial 5 fotografias obtidas pela Fotógrafa Criminalística Roseli daSilva Richter e registradas neste Departamento, sob o número 0188/18.

ReferênciasDEL PICCHIA FILHO, José et al. Tratado de documentoscopia: “da falsidade documental”. 2ª. Edição. SãoPaulo: Editora Pillares, 2005.Dicionário de símbolos - HerderLexikon. 3ª edição. São Paulo: Editora Cultrix, 1998.FALLER-MARQUARDT, M. e POLLAK S. Self-inflicted injuries with negative political overtones. Forensic Science International 159 (2006) pp. 226–229.FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina legal. 11ª. Edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.HÉRCULES, Hygino de Carvalho. Medicina legal: texto e atlas. 2ª. Edição. São Paulo: Editora Atheneu, 2014.POLLAK, S. e SAUKKO, P.J.. Defense wounds, in: J.A. Siegel, P.J. Saukko, G.C. Knupfer(Eds.), Encyclopedia of Forensic Sciences, Academic Press, London, 2000 , pp.374–378.WINSKOG, C. True ‘mirror image’ lesions due to self-inflicted injury. Forensic Sci Med Pathol (2011), 7:304–305.

E, como nada mais houvesse para constar, encerro o presente. Eu, Helena Varlessa Boza, que o digitei e osubscrevo.

Luciano HaasPerito Médico-Legista

Eduardo Sörensen GhisolfiPerito Médico-Legista

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