101

Tradições Negras e Políticas Brancas

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Apresentação de slides com a síntese do ensaio antropológico-fotográfico realizado para o MPS. Autor Gabriel O. Alvarez, fotografo Luiz Santos. Neste ensaio antropológico fotográfico apresentamos diversos grupos tradicionais de matriz africana e analisamos sua inserção na política social. No trabalho abordamos remanescentes de quilombos, irmandades negras, candomblés e maracatus. A estratégia de pesquisa foi entrar pela tradição cultural, para analisar como chegam até eles as políticas previdenciárias.

Citation preview

Page 1: Tradições Negras e Políticas Brancas
Page 2: Tradições Negras e Políticas Brancas

Tradições Negras e Políticas Brancas:

Previdência Social e

populações afro-brasileiras

Ministério da Previdência SocialSecretaria de Previdência Social

Page 3: Tradições Negras e Políticas Brancas

Distribuição da população por cor, segundo os décimos de rendimento familias per capita - IBGE, 2002

0,02,04,06,08,0

10,012,014,016,0

1º d

écimo 2

º décimo

3º d

écimo

4º d

écimo

5º d

écimo

6º d

écimo 7

º décimo

8º d

écimo

9º d

écimo

10º déc

imo

BrancaPreta e parda

Florestan Fernandes afirmou que, no caso do Brasil, poderia-se falar de um racismo cordial, caracterizado pela invisivilização das populações negras.

Page 4: Tradições Negras e Políticas Brancas

Este trabalho teve um duplo propósito: por um lado, visibilizar as diferenças, no reconhecimento das tradições afro-

brasileiras e por outro lado observar a chegada da previdência junto a estas

diversas populações

Nos oitenta anos da previdência, inicialmente pensada para operários urbanos, brancos, nesta pesquisa

analisamos a cobertura que a previdência oferece a diferentes populações afro-

brasileiras.

Page 5: Tradições Negras e Políticas Brancas

Brejo dos Crioulos

Remanescentes de Quilombos

Page 6: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Esse local que nós tamo aqui foi fundado por trêsirmãos, que é um Moreno, Leopoldo e Manoel Novo. Elestocaram isso aqui tudinho. Então isso aqui tá com pelo menoscento e tantos anos...”

Francisco, Brejo dos Crioulos

Page 7: Tradições Negras e Políticas Brancas

-“Aí Brejos dos Crioulos conseguiu crescer. Mesmo com a malária e tudo, o pessoal vivia livre, não tinha ninguém de fora. Não existia ninguém de fora não existia nada. Vivia aquele pessoal ali.”

Francisco, liderança do Brejo dos Crioulos.

Page 8: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Meu pai falava que quando uma panela está vazia tem que procurar. Porque entrou uma fome, mas eu não sei o que era a fome, que o povo comeu a raiz de pau, mucunã.”

Sr. Manoel Sousa, 70 anos, Brejo dos Crioulos,

aposentado.

Page 9: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Ah, depois que os fazendeiros conheceu que nós tava numa boa aqui dentro dos territórios, e o fazendeiro chegou apertando para nos, apertando, apertando, apertando... e foi indo.”

Page 10: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Mas como a gente é fraca, então fica obrigada a ficar chupando o dedo... chupando dedo, chupando dedo, chupando dedo.”

Zé Guará, aposentado, 74 anos

Page 11: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Eles mesmo atirou em mim quando tava tomando a terra nossa, só não pegou né.

Aí ele matou uma cachorra pertinho de mim assim, pra tomar as terras nossas ali em baixo.

Sabe que eu nem gosto de lembrar disso, quando eu vou lembrar meu coração já bate ruim.”

Elisaria Pinheiro de Abril, 63 anos, aposentada, Brejo dos Crioulos.

Page 12: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Em casa somos eu e minha mulher, eu sustento duas mulher e a minha mulher sustenta dois homens.”

Page 13: Tradições Negras e Políticas Brancas

Córrego Misericórdia

Outros remanescentes

de Quilombos

Page 14: Tradições Negras e Políticas Brancas

Outros quilombos estãorelacionados com a população que participou da extração de ouro. Outras povoações estão relacionadas com a decadência da grande propriedade escravista.

Page 15: Tradições Negras e Políticas Brancas

As comunidades de remanescentes de quilombos vivem numa economia de subsistência ancorada nas roças. Estas populações estão formadas pelos mais velhos, os primogênitos e as crianças. Grande parte dos jovens migraram para trabalhar nas fazendas, na coleta da cana-de-açucar em São Paulo. As mulheres migram para a cidade à procura de emprego como domesticas. Os filhos destes migrantes são criados pelos avós e participam das tradições do grupo.

Page 16: Tradições Negras e Políticas Brancas

O pertencimento ao grupo está mediado pelo parentesco. Estas comunidades apresentam altos índices de endogamia, casamento entre primos. Uma identidade ancorada em um passado comum a partir do qual são construídas fronteiras sociais. Participam de uma tradição que se manifesta nos cultos, nas rezas quando alguém da comunidade morre e principalmente nas festas.

Page 17: Tradições Negras e Políticas Brancas

As tradições são performáticamente apresentadas nas festas. Os cantos, as danças, os ritmos e as vestimentas expressam uma tradição vivida emotivamente.

Page 18: Tradições Negras e Políticas Brancas

Nas festas a comunidade se reúne. É no período das festas que os migrantes retornam e participam da vida social do grupo. Nas festas acontecem os namoros que resultaram em novas famílias. Os mais velhos, os aposentados, ocupam um lugar de destaque nas festas.

Page 19: Tradições Negras e Políticas Brancas

O tipo de dança pode variar de uma região a outra e reflete as diversas origens africanas.

Page 20: Tradições Negras e Políticas Brancas

O grupo de congada do Corrego de Misericordia participa das Festas de Nossa Senhora do Rosario em Chapada do Norte (MG).

As mulheres participam da

lavagem da igreja na quinta-feira antes da festa.

As festas marcam importantes momentos sociais, como o plantio e a coleta.

Page 21: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Antes de aposentar era difícil comer carne aqui. Antes de aposentar não comia mesmo não, mas aposentando começamos a comer carne.”

Dona Furtuosa, 67 anos, aposentada, Brejo dos Crioulos

Page 22: Tradições Negras e Políticas Brancas

“A gente dá um jeito em casa com a ajuda da aposentadoria; e a gente vai tocando ai pra fora, né? Tem que gastar muito comprando remédio direto também.”

Adelina, 63 anos, Córregos da Misericórdia, aposentada.

Page 23: Tradições Negras e Políticas Brancas

“...esse meu osso dói demais, e porque eu já trabalhei demais e já trabalhei muito.

Tenho roça para acolá, o fundo de um brejo, mandei arar, tava ai com um quebradinho (da aposentadoria)... fiquei sem os quebradinho, mandei arar, qualquer ora que Deus abençoar que mandar a divina (chuva) eu corro e planto.”

Adelina, 63 anos, aposentada.

Page 24: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Nóis hoje tamo com a causa na procuradoria exigindo do governo o reconhecimento como remanescente de quilombos, né, tomá uma providência prá nóis.

Mesmo antes de gente ser reconhecido como remanescente de quilombo, o INSS tem aposentado bem à gente. Porque as terra boa tava na mão do pessoal daqui e foi o alvo dos fazendeiros, ta na mão deles. Então o pessoal não tem como prantá tudo aquilo que a gente deseja. É foram expulsos das suas terras, então, vieram juntando-se, são trabalhador rural, dependendo das nossas terra né.

Page 25: Tradições Negras e Políticas Brancas

Hoje nois encontra uma dificuldade dessa que... se não fosse o INSS mesmo a gente não se aposentava né. Tem salário maternidade, tem ajudado muito a gente né. Quem tem na casa um aposentado já ajuda, né. Eu sinto aqui que o INSS tem ajudado muito.”

Francisco, liderança

Brejo dos Crioulos.

Page 26: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Com o PREVmóvel, mudou o seguinte: a gente faz o trabalho, reúne o povo, passa a informação e organiza o atendimento. Agora com o PREVmóvel, a despesa do sindicato é só com o telefone e material de escritório.”

(Presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Chapada do Norte)

Page 27: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Os contratempos são poucos, as vitórias são maiores, o maior prêmio é o sorriso da pessoa quando aposenta, quando sabe que vai ter o dinheirinho pra receber todo mês no período certo.”

Page 28: Tradições Negras e Políticas Brancas

“A gente tem que ter carinho pelas pessoas. Falam: ó eu tô rezando procê pra sempre, todo dia eu peço a Deus pra te proteger. E isso é o lado legal da coisa.”

Page 29: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Essa alegria é o que eu acho que mais ajuda a gente a vir na região, o sorriso na boca do povo.” Valda, Técnica da previdência,

comissionada no PREVmóvel

Page 30: Tradições Negras e Políticas Brancas

Irmandade de Nossa Senhora do

Rosário dos Homens Pretos

Araçuaí – (MG)

Page 31: Tradições Negras e Políticas Brancas

As irmandades negras, que tiveram sua origem no século XVII, foram obrigadas a formalizar seus compromissos no final do século XIX. Esta medida teve por objetivo o controle do catolicismo popular. O Papa Pio IX impôs uma romanização da igreja católica e obrigou as irmandades a criarem um livro de registro com os compromissos e as atas das reuniões.

Page 32: Tradições Negras e Políticas Brancas

As irmandades eram a forma que tinham as populações negras de terem uma boa morte. Inicialmente os corpos dos irmãos eram enterrados no chão da igreja. Depois de 1850, com a aplicação de regras sanitárias, as irmandades passaram a construir seus cemitérios nos fundos da igreja.

Page 33: Tradições Negras e Políticas Brancas

Os tambores ocupam um lugar central nas tradições africanas. Pelos tambores se invocam as deidades. Os tambores estão relacionados a conhecimentos ancestrais.

A estrutura da irmandade opõe o rei aos tambozeiros. Enquanto os reinados são cíclicos, os tambozeiros têm um lugar permanente.

Page 34: Tradições Negras e Políticas Brancas

As irmandades tem uma estrutura da qual participam rei e rainha, juizes, casal de honra ou pajem; presidente, tesoureiro, secretário, procurador; capitão da bandeira e capitão do tambor.

Page 35: Tradições Negras e Políticas Brancas

A igreja pertence à irmandade. Nela se realizam as novenas, os encontros dos tambozeiros e as reuniões da irmandade.

Na igreja tem lugar as festas e a coroação. Neste espaço social a irmandade se reúne e se percebe como ator coletivo. A irmandade toma conta da igreja e nela realiza sua vida social.

Page 36: Tradições Negras e Políticas Brancas

Na igreja se hibridam o culto católico e as tradições africanas. As tradições, danças e batidas africanas se reproduzem mimeticamente nos encontros das irmandades.

A virgem Nossa Senhora do Rosário, São Benedito, e o rei Negro são as referências que oferece a Igreja católica. Estes símbolos foram reinterpretados à luz das tradições africanas.

Page 37: Tradições Negras e Políticas Brancas

A Confraria de Nossa Senhora do Rosario, em Olinda é uma das irmandades mais antigas. Data de 1632.

O alpendre, segundo o presidente da confraria era para que os tambozeiros, o pessoal do Maracatu, tocasse do lado de fora da igreja.

Page 38: Tradições Negras e Políticas Brancas

A esquerda da igreja estão as casas dos alforriados. Até a década de 1970 eles pagavam a taxa da alforria pelo uso dos terrenos à Igreja.A direita da igreja está a casa do Rei Congo. Ela foi vendida em 1975 para reparar o telhado da igreja. Pertencia à Confraria de Nossa Senhora do Rosario dos Homens Pretos.

Page 39: Tradições Negras e Políticas Brancas

Pedro Pereira dos Santos, aposentado como trabalhador da prefeitura, presidente da INSRHP Araçuaí

Seu Vicente, aposentado como trabalhador rural. Foi Rei Festeiro da INSRHP de Chapada do Norte em duas oportunidades

Page 40: Tradições Negras e Políticas Brancas

Luiz Pereira dos Santos, 88 anos, aposentado. Antigo capitão do tambor, entrou na irmandade em 1942 como tambozeiro. Ele que mostrou-se desmemoriado durante a realização da entrevista, parece revitalizado ao puxar os tambores, uma tradição que recebeu do seu pai e passou para o novo capitão.

Page 41: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Eu aposentei com um salário só, porque você trabalhando, eu trabalhei muito tempo assim de sapateiro né.

Agora a felicidade minha é de aposentar com condições de continuar trabalhando, família já criada. Porque se você tiver com família para sustentar, claro que com 200 reais não ia ter condições”

Page 42: Tradições Negras e Políticas Brancas

“O sujeito paga 40 reais que muita gente acha pesado e acaba

que fica sem pagar e a previdência fica vazia. E depois ela tem que

atender essas pessoas sem contribuição

nenhuma.”

Sr Luiz, Sapateiro, 72 anos, aposentado. Araçuaí, MG.

Page 43: Tradições Negras e Políticas Brancas

CANDOMBLÉ

Page 44: Tradições Negras e Políticas Brancas

O segredo é um valor central na organização social do candomblé. Por ser uma religião iniciática, de transmissão oral, o saber do candomblé não pode ser revelado aos não iniciados.

O ilê reproduz o axé e cultua os orixás trazidos da África. As práticas e os cantos em ioruba são passados de geração em geração.

Page 45: Tradições Negras e Políticas Brancas

O candomblé está organizado de forma hierárquica com os ebômi ou sacerdotes; iaôs ou iniciados e abias aqueles que estão em preparação para a iniciação.

Hierarquia

Page 46: Tradições Negras e Políticas Brancas

Cada casa tem seu sistema de cargos, com a ialorixá ou Mãe de Santo e o babalorixá ou Pai de Santo.

A Mãe Pequena, que auxilia nas tarefas da casa e prepara as comidas para os Orixás

Ekedes e Ogans, que não encarnam o Santo. As primeiras auxiliam os filhos de Santo quando estão em estado de transe.

Sistema de cargos

Page 47: Tradições Negras e Políticas Brancas

Entre os Ogans estão aqueles que realizam os sacrifícios, os que tocam o atabaque assim como os brancos que auxiliam e dão proteção à casa.

Os atabaques rum, rumpi, e le, têm um papel central no culto. Diversos toques são utilizados durante as festas e os sacrifícios. Eles permitem a comunicação entre o mundo dos homens e o dos Orixás.

Page 48: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Esta conta só recebemos na hora do cargo [de ebômim], após uma obrigação de sete anos. Quando nós fazemos sete anos é que temos o cargo depois da confirmação

Aí eu chego só com essa conta, com a roupa normal mas todo mundo vai saber que eu sou uma ialorixá. Pelo colar é que me identifica.”

Mãe Ditinha, aposentada.

Page 49: Tradições Negras e Políticas Brancas

No pejí -o quarto do Santo- são guardados os fundamentos e realizam-se os sacrifícios e os cultos secretos.

Por contraposição no barracão acontecem os cultos públicos, a festa.

Page 50: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Então, com essa idade toda que eu tenho de santo e de idade aqui nessa casa do Candomblé, elas todas me apóiam. Se a gente briga com o marido, se o marido larga a gente, a gente corre para aqui e ela acolhe a gente, faz com a gente filha, filha mesmo, feito uma mãe materna. Ela acolhe a gente, aqui a gente almoça, a gente janta, a gente ceia, a gente passeia, a gente faz tudo aqui nessa casa do Candomblé. Coisa boa, gostosa.” Antônia Castro, 76 anos, Terreiro Mãe Menininha do Gantois, não tem aposentadoria ou benefícios previdenciários.

Page 51: Tradições Negras e Políticas Brancas

Omolú é o Orixá que melhor representa a previdência. Ele tem seu corpo coberto por uma vestimenta feita de palha da costa. É a este orixá que se recorre em casos de necessidade por estar associado às doenças. Nas diferentes nações do candomblé também recebe os nomes de Obaluaé ou Sapatá.

Page 52: Tradições Negras e Políticas Brancas

No sincretismo com a igreja católica, Omolú ou Obaluaé são assimilados à imagem de São Lazaro na Bahia e Saõ Sebastião no Rio de Janeiro.

Page 53: Tradições Negras e Políticas Brancas

Na segunda feira, na igreja de São Lazaro, os fieis vão a tomar banho de pipocas para obter a proteção do Orixá.

“Só Omolú tem esta flor”

Page 54: Tradições Negras e Políticas Brancas

A representação de Omolú está relacionada aos ancestrais.

No seu xaxará carrega eguns.

Os eguns ou egun-gun são os espíritos dos ancestrais.

No candomblé da nação ketou eles recebem seu culto nos terreiros de egun.

Page 55: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Nunca ninguém estudou de onde veio na África, o povo não sabia dessas coisas não. Os antigos passavam só a religião mesmo. Eles morriam e a gente não sabia como se chamava o bisavô nem tataravô. Eles não falavam, eles eram muito fechados. Eles só contavam essa parte de Egun. Você sabe o que é Baba Egun?”

Pai Balbino, Alapini, terreiro Ilê Axé Opô Aganju, Lauro de Freitas, BA.

Page 56: Tradições Negras e Políticas Brancas

Terreiros de Egun

O candomblé como religião se divide em quatro partes: o culto aos orixás, nas mãos de babalorixás e ialorixás; o conhecimento das plantas e das folhas, nas mãos do babaossain; a adivinhação do Ifá, nas mãos do babalaô; e o culto dos Eguns, cujo sacerdote é o ojé.

Page 57: Tradições Negras e Políticas Brancas

Tal sacerdócio quádruplo corresponde a uma estrutura quatripartite do mundo: deuses, homens, natureza e os mortos ou a linhagem.

Os Eguns constituem a parte mais secreta do candomblé. Eles não podem ser enxergados diretamente, não podem ser tocados. O Ojé controla eles com uma vara, danko, guia os Eguns e mantém a distancia entre os mesmos e os fieis.

Page 58: Tradições Negras e Políticas Brancas

Diferente dos outros, os terreiros de Egun são comandados pelo Ojè, que tem o poder de invocar e controlar os espíritos dos ancestrais. Os eguns representam a ancestralidade africana. Exercem uma ascendência moral sobre os descendentes.

Page 59: Tradições Negras e Políticas Brancas

Diferente dos Orixás, os Eguns falam, se comunicam com seus descendentes. Eles são a força moral da linhagem, são a tradição viva, a interação entre o mundo dos vivos e Olorum, que é Deus

Page 60: Tradições Negras e Políticas Brancas
Page 61: Tradições Negras e Políticas Brancas

“O candomblé era discriminado em todos os sentidos. Anos atrás nós não tínhamos a liberdade que tem hoje. A polícia perseguia, os moleques abusavam, pessoas de posição mais elevada não queriam ser do candomblé porque achavam que era coisa para gente pequena, coisa para gente muita baixa, inclusive diziam que era “negragem”, tá entendendo?”

Mãe Ditinha

Page 62: Tradições Negras e Políticas Brancas

Para poder funcionar, os terreiros tinham que ter autorização da delegacia de jogos e costumes. As religiões afro-brasileiras eram enquadradas junto com os contraventores, prostitutas e bicheiros.

Page 63: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Aqui teve casos de polícia que ia aí a prender pai de santo e quando chega lá, dá ordem de prisão e viraram no santo. O santo veio pra envergonhar ele, para mostrar a ele que ele não poderia fazer aquilo. Tá entendendo? O Santo desceu no policial, aconteceu. Você sabe disso, não sabe?”

Page 64: Tradições Negras e Políticas Brancas

O acarajé, comida de Iansã é vendido nas ruas de Salvador.

As Baianas do Acarajé foram reconhecidas, recentemente, pela previdência como trabalhadoras artesanais.

Page 65: Tradições Negras e Políticas Brancas

Inicialmente as baianas reivindicaram um regime análogo ao da previdência rural. Como trabalhadores urbanos enquadrados num sistema bismarkiano, elas foram obrigadas a efetuar o recolhimento junto ao INSS. A forma encontrada para viabilizar estes recursos foi depositar o valor de um acarajé por dia num cofrinho, o que no final do mês era suficiente para pagar os aportes para a aposentadoria.

Page 66: Tradições Negras e Políticas Brancas

Os sacerdotes dos cultos afro-brasileiros conseguiram seu reconhecimento junto à previdência depois de um longo processo de negociação.

O impasse se resolveu depois que a Associação de Cultos Afro-Brasileiros criou um código de ética, registrado em cartório, onde são enumeradas as principais características das diferentes religiões afro.

Nesse código de ética se estabeleceu que os ebôme, devem passar por um processo formação de sete anos antes de realizar sua obrigação.

Os ebomê foram reconhecidos pela previdência como Ministro de ordem religiosa.

Page 67: Tradições Negras e Políticas Brancas

“Eu fui e fiz a aposentadoria e daí foi um reboliço, foi televisão, tive uma semana de cama, era televisão, era jornal, telefonema da Espanha, telefonema de outros países. Quer dizer, “propalou”, e aí foi um benefício muito grande, porque, nossa religião precisa de expansão, precisa porque já foi muito, como é que se diz, já foi muito discriminada.”

Mãe Ditinha, primeira ialorixá aposentada.

Page 68: Tradições Negras e Políticas Brancas

Mãe Caiudé, 72 anos, que no ano 2002 realizou sessenta anos no Santo, foi uma das primeiras mãe de Santo a receber sua aposentadoria.

Ela que participou do terreiro do Pai Rufino, tem seu terreiro que funciona na sua casa na periferia de Salvador, no bairro Caixa d´agua.

Page 69: Tradições Negras e Políticas Brancas

Mãe Luiza Guaiaku, 98 anos, importante mãe de santo da nação Gege.

Aposentada como trabalhadora rural. Na sua época a previdência não reconhecia a aposentadoria como ministro de ordem religiosa para os cultos afro-brasileiros.

Page 70: Tradições Negras e Políticas Brancas

- “Tem um provérbio africano que diz assim: "Quando um idoso falece é como se uma biblioteca inteira se incendiasse". É o nosso caso, cada mulher dessa que a gente perde, perde muito porque a nossa cultura é oral.”

Maria José, Terreiro Gantois, parceira do Programa de Estabilidade Social.

Page 71: Tradições Negras e Políticas Brancas

MARACATU

Page 72: Tradições Negras e Políticas Brancas

Assim como Rio de Janeiro tem suas escolas de samba, Recife tem seus Maracatus.

Page 73: Tradições Negras e Políticas Brancas

O Maracatu Nação ou de baque virado, não deve ser confundido com o Maracatu rural. O Maracatu nação tem uma origem mais antiga, que alguns remontam às irmandades de tradição africana.

Eles se organizam a partir das suas sedes localizadas na zona norte de Recife, na periferia da cidade, onde mora uma população majoritariamente negra e de baixa renda.

Page 74: Tradições Negras e Políticas Brancas

Os Maracatus apresentam um cortejo real. Aberto pelo porta-estandarte, que carrega a bandeira do bloco. Segue um cortejo formado pelo rei e a rainha, protegidos por um guarda sol; os personagens da corte real; as baianas ricas e os músicos. Tambores, gongue e um grande número de alfaias acompanham o Maracatu e anunciam a passagem do cortejo. A dama de paço e a calunga ocupam um lugar central.

Page 75: Tradições Negras e Políticas Brancas

“A calunga é a verdadeira dona do Maracatu”

Dona Helda, Rainha do Maracatu Nação Porto Rico

Page 76: Tradições Negras e Políticas Brancas

Cada Maracatu Nação têm suas calungas: as do Maracatu Estrela Brilhante são Joventina e Erundina; as do Maracatu Nação Gato Preto são Jupira e Laurunda; as do Maracatu Nação Encanto da Alegria são dona Brígida e dona Alice.

Page 77: Tradições Negras e Políticas Brancas

As calungas cumprem com as obrigações do candomblé, guardam resguardo no pejí, recebem alimentos e os que pegam nelas devem seguir uma serie de preceitos.

Page 78: Tradições Negras e Políticas Brancas

A sede do Maracatu funciona freqüentemente no terreiro. Uma vez por ano acontece a festa da Calunga, quando o espírito da entidade representada pela boneca desce à terra e participa da festa com os integrantes da nação do Maracatu.

Page 79: Tradições Negras e Políticas Brancas

Na festa que presenciamos, a calunga princesa Catarina encarnou em Dona Helda, Rainha do Maracatu Nação Porto Rico.

Page 80: Tradições Negras e Políticas Brancas

Na festa que presenciamos, a calunga princesa Catarina encarnou em Dona Helda, Rainha do Maracatu Nação Porto Rico.

Page 81: Tradições Negras e Políticas Brancas

Ela se apresentou no terreiro acompanhada do seu séqüito real. Depois de realizar uma evolução com cada um dos homens da Nação sentou-se numa cadeira numa das paredes da sala, recebeu saudações e conversou com cada um que se aproximou dela.

A festa se encerra com uma batida de Maracatu.

Page 82: Tradições Negras e Políticas Brancas

Os Maracatus realizam um importante trabalho social nas suas comunidades. Eles oferecem cursos de alfabetização, aulas de percussão e fabricação de instrumentos.

Com a proximidade do carnaval transformam-se em uma fonte de emprego e renda, quando tem lugar a confecção dos trajes e adereços para a festa.

Page 83: Tradições Negras e Políticas Brancas

“O dinheiro quando chega já é a conta de pagar a venda que eu compro que o senhor sabe né, muita gente aqui, pra comprar e comer não dá pra nada né. Mas, eu tenho como pagar com o Institutona mão. Tenho crédito.” Celia.

Page 84: Tradições Negras e Políticas Brancas

Na periferia é onde percebemos o maior déficit de políticas previdenciárias, seja pelos altos índices de desempregos, trabalhos informais ou não registrados e altos índices de óbitos devidos à violência.

Page 85: Tradições Negras e Políticas Brancas

Dona Mariu, 104 anos, aposentada como trabalhadora rural. Na foto aparece com sua calunga Emilia. Ela a ganhou do seu pai quando tinha 10 anos. Ela é a Rainha de honra do Maractu Estrela Brilhante de Igarassú.

Page 86: Tradições Negras e Políticas Brancas

Os Maracatus podem ser uma porta de entrada para a chegada da previdência até estas populações.

A formulação de uma política previdenciária não bismarkiana é outra das medidas a ser implementada para dar cobertura a estas populações excluidas.

Page 87: Tradições Negras e Políticas Brancas

Durante o transcurso da pesquisa observamos as estratégias implementadas pelo PEP no trabalho junto a estas populações.

No caso das populações rurais a estratégia se apóia no PREVmóvel como forma de levar os serviços da previdência até as populações rurais.

Page 88: Tradições Negras e Políticas Brancas

Em Recife, o PEP implementou estratégias de tipo universal, tendentes a atingir um público amplo, como panfletagem e divulgação na mídia. Esta estratégia não alcançou às populações visitadas. O motivo que pode ser apontado é que no Brasil, o universal é branco.

Page 89: Tradições Negras e Políticas Brancas

Em Salvador a equipe do PEP trabalhou junto às populações, com uma ação focal que teve por objetivo a inclusão social das populações não atendidas pela previdência, como as Baianas do Acarajé e os ministros das ordenes religiosas afro-brasileiras. A estratégia de comunicação direta permitiu implementar ações que se estenderam para outras populações como o “cofrinho da previdência”.

O trabalho corpo a corpo e a comunicação direta com os diferentes grupos excluídos permitiu a inclusão de amplos segmentos da população como feirantes, pescadores, trabalhadores ambulantes.

Page 90: Tradições Negras e Políticas Brancas

O princípio que orientou a pesquisa foi a tradição cultural.

A negritude não pode ser reduzida à cor da pele.

A política social não pode ser

pensada como antigamente pensava-se a

modernidade, inscrita sobre uma

tabula-rasa.

O desafio é formular uma

política que tenda à universalização

dos benefícios e que contemple a

diversidade de tradições culturais.

Page 91: Tradições Negras e Políticas Brancas

Observamos a presença ativa dos aposentados nas diferentes tradições culturais.

Aposentados rurais nas comunidades remanescentes de quilombos.

Aposentados como ministros de ordem religiosa nos candomblés.

Funcionários públicos e autônomos nas irmandades de Nossa Senhora do Rosario.

Page 92: Tradições Negras e Políticas Brancas

O sistema previdenciário foi instituído a mais de oitenta anos no Brasil. Inicialmente pensado para operários brancos urbanos e porque não católicos, só recentemente reconheceu o direito destas populações negras aos benefícios previdenciários.

A aposentadoria rural, que se fez

extensiva na constituição de

1988.

A aposentadoria para as baianas

do acarajé, reconhecidas

como trabalhadoras autônomas na década do 90.

Aposentadoria para ebômims,

como ministros de ordem religiosa

no ano 2000.

Page 93: Tradições Negras e Políticas Brancas

O principal déficit de políticas previdenciárias localiza-se nas periferias das grandes cidades, onde mora uma população majoritariamente negra, com altos índices de desemprego e trabalho informal.

Page 94: Tradições Negras e Políticas Brancas

Num país como o Brasil, onde a pobreza é negra, o principal desafio é pensar uma política previdenciária não bismarkiana, orientada para estas populações que do ponto de vista do Ministério da Previdência Social poderiam estar enquadradas em situação de risco social.

Um olhar orientado pela

tradição cultural acerta de cheio nas populações

excluídas das políticas sociais.

Neste sentido, as instituições analisadas podem ser

importantes parceiros para

estender os benefícios.

Page 95: Tradições Negras e Políticas Brancas

O reconhecimento das tradições favorece o fortalecimento e a auto-estima destas populações.

Sem auto-estima não tem inclusão social. Sem reconhecimento da diversidade se reproduz a situação de invisibilidade à que foram tradicionalmente submetidas estas populações no Brasil.

Page 96: Tradições Negras e Políticas Brancas

Os fatos sociais analisados mostram tradições culturais e formas de organização social.

As festas re-atualizam identidades de resistência cultural e revelam verdadeiras redes de relações sociais.

As diversas instituições são parceiros estratégicos para iniciativas de inclusão previdenciária.

Page 97: Tradições Negras e Políticas Brancas

As lutas pelo reconhecimento, criam uma dinâmica com profundos impactos políticos.

As políticas brancas, interpeladas desde as tradições negras deixam transparecer os principais avanços e desafios em termos de inclusão social.

As lutas pelo reconhecimento, inclusive no campo do direito à previdência, constroem, na prática, uma cidadania diferenciada.

Page 98: Tradições Negras e Políticas Brancas

Previdência Social Política de

inclusão social

Page 99: Tradições Negras e Políticas Brancas

Ministro da Previdência Social: Nelson Machado

Secretário de Previdência Social:

Helmut Schwarzer

Diretor do Depto. do Regime Geral de Previdência Social:

Coordenador-Geral de Estudos Previdenciários:

Rafael Liberal Ferreira de Santana

Page 100: Tradições Negras e Políticas Brancas

aPesquisa antropológica

Gabriel O. Alvarez

Assistentes de pesquisa

Gabriela Nunes

Selma Santos

Fotografia

Luiz Santos

Realização

Ministério da Previdência Social

Secretaria de Previdência Social

2002-2005

Page 101: Tradições Negras e Políticas Brancas

Gabriel O. Alvarez

Antropólogo

Luiz Santos

Fotógrafo