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Universidade Federal do Pará Núcleo Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento Científico Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas José Alexandre da Silva Valente A CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS RELACIONADOS COM OS MOVIMENTOS TERRA-LUA-SOL POR ALUNOS DA E.J.A. À LUZ DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL Belém 2007

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Universidade Federal do Pará Núcleo Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento Científico

Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas

José Alexandre da Silva Valente

A CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS RELACIONADOS COM OS MOVIMENTOS TERRA-LUA-SOL POR ALUNOS DA

E.J.A. À LUZ DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL

Belém 2007

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José Alexandre da Silva Valente

A CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS RELACIONADOS COM OS MOVIMENTOS TERRA-LUA-SOL POR ALUNOS DA E.J.A.

À LUZ DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL

Dissertação apresentada para obtenção do grau de Mestre em Educação em Ciências e Matemáticas, Núcleo Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento Científico, Universidade Federal do Pará. Área de concentração: Educação em Ciências. Orientador: Prof. Dr. Cícero Roberto Teixeira Regis. Co-orientador: Prof. Dr. José Moysés Alves.

Belém 2007

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José Alexandre da Silva Valente

A CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS RELACIONADOS COM OS MOVIMENTOS TERRA-LUA-SOL POR ALUNOS DA E.J.A.

À LUZ DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL

Dissertação apresentada para obtenção do grau de Mestre em Educação em Ciências e Matemáticas, Núcleo Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento Científico, Universidade Federal do Pará. Área de concentração: Educação em Ciências.

Data de aprovação: 16/07/2007 Banca Examinadora: ______________________________________________– Orientador Prof. Dr. Cícero Roberto Teixeira Régis Doutor em Geofísica Universidade Federal do Pará ______________________________________________– Co-orientador Prof. Dr. José Moysés Alves Doutor em Psicologia Universidade Federal do Pará ______________________________________________ Profa. Dr. Ruy Guilherme Castro de Almeida Doutor em História da Ciência Universidade do Estado do Pará ______________________________________________ Prof. Dr. Licurgo Peixoto de Brito Doutor em Geofísica Universidade Federal do Pará

iv

Ofereço,

Aos meus pais, Waldomiro e Perpétua Valente pelo

carinho e pelo amor que sempre me dedicaram

durante toda minha existência.

Aos meus irmãos Aldo, Bela, Socorro, Assis e André

pelo companheirismo desde a infância.

A minha amável esposa Isabel pelo amor, pelo

carinho a mim dedicado nessas duas décadas de

convívio, pela paciência, pelo incentivo e pelas suas

orações.

Aos meus queridos filhos Alex, Adriano e André pela

alegria de nosso convívio.

v

AGRADECIMENTOS

A Deus que por sua infinita graça me permitiu a conclusão deste trabalho.

Aos meus pais Waldomiro e Perpétua Valente pela minha existência, pelo

cuidado, pelo carinho e pela preocupação para comigo durante todo o transcorrer

deste curso

A minha esposa Isabel e aos meus filhos Alex, Adriano e André pela

paciência, tolerância, amor e oração sem as quais não seria possível concluir este

trabalho

Aos irmãos na fé da Comunidade Evangélica Integrada da Amazônia pelas

orações e incentivos durante toda a construção deste trabalho.

Ao professor, amigo e agora também Orientador Dr. Cícero Roberto Teixeira

Régis, pela amizade, atenção, sugestões e conselhos em todas as fases de

elaboração deste estudo..

Ao professor e co-orientador Dr. José Moysés Alves, pela amizade, pelas

sugestões, conselhos e criticas não só durante o exame de qualificação, mas

durante todo o transcorrer da construção desta pesquisa.

Ao professor Dr. Licurgo Peixoto de Brito pela participação em meu exame de

qualificação, defesa de dissertação e pelas sugestões e críticas oferecidas para a

elaboração deste trabalho.

Ao professor Dr. Ruy Guilherme Castro de Almeida pela participação em

minha defesa de dissertação e pelas sugestões e críticas oferecidas para a

elaboração deste trabalho.

Ao professor Msc. Odifax Quaresma Pureza pelo companheirismo, incentivo,

leitura, críticas e sugestões elaboradas, que foram fundamentais para que esse

trabalho fosse concluído com êxito.

vi

A minha irmã e professora Msc. Maria do Socorro da Silva Valente pelo

carinho, pela leitura, critica e sugestões elaboradas.

Aos professores do programa do Mestrado do Curso de Pós-graduação em

Ensino de Ciências e Matemáticas pela troca de experiências, pela contribuição no

que diz respeito aos referenciais teóricos e leituras necessárias para a construção

desta pesquisa.

Ao estudante do curso de licenciatura em física Jerry Williams, estagiário da

disciplina física da Escola de Aplicação da UFPa, pelo assessoramento nas várias

atividades da ação pedagógica desta pesquisa.

Aos funcionários do NPADC: Luciana Maciel Cascaes, Lourdes Maria

Trindade Gomes, Kleber Avino Teixeira e Romildo Cripertino, pela atenção e ajuda

durante o dia a dia do curso.

Aos colegas e amigos do curso de mestrado pela convivência durante os

vários meses de estudo e em particular: a Ivan Neves, Jeedir Gomes, Ana Cristina

Viseu, Rogério Gonçalves, José Ricardo, Eduardo Paiva e Ana Claudia Boadana

pela amizade e companheirismo durante as jornadas de estudos.

Aos outros amigos e colegas de trabalho Odifax Quaresma, Ivan Neves,

Nelson Coelho, Rui Guilherme, Rogério Gonçalves, Conceição Gemaque, Gerson

Pinto, Waldemir, Antonio Silva, Valdemar Moraes, Natanael Cabral, Carlos Nobre e

Joana D’arc pela amizade e coleguismo.

Aos alunos e alunas da turma 1ª Etapa do ensino médio da EJA do ano letivo

de 2005 da Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará onde essa

pesquisa foi realizada, pela parceria sem a qual este estudo não seria viabilizado.

A Universidade Federal do Pará pela oportunidade concedida.

A todos que contribuíram para realização deste trabalho e que por ventura

esqueci de citar.

vii

“De tudo, ficaram três coisas:

A certeza de que estamos sempre

começando...

A certeza de que é preciso continuar...

A certeza de que seremos interrompidos

antes de terminar...

Portanto devemos

fazer da interrupção um caminho novo...

Da queda um passo de dança...

Do medo, uma escada...

Do sonho, uma ponte...

Da procura... um encontro"

(Fernando Pessoa)

viii

SUMÁRIO RESUMO............................................................................................................... ix ABSTRACT........................................................................................................... x 1 – MOTIVAÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DESTA PESQUISA......................... 11 1.1 – Reflexões Pessoais de Minha Formação ................................................. 11 1.2 – Conseqüências de Um Novo Olhar .......................................................... 13 1.3 – Uma Primeira Experiência ......................................................................... 17 1.4 – A Construção de Um Novo Trabalho ....................................................... 18 1.4.1 – Metas Estabelecidas Para Este Estudo .................................................... 18 1.4.2 – As Etapas Deste Trabalho......................................................................... 19 1.4.3 – Algumas Referências de Trabalhos Ligados ao Ensino da Astronomia ... 19 2 – UM POUCO DA HISTÓRIA DA ASTRONOMIA............................................. 24 2.1 – A Cosmologia Primitiva ............................................................................. 25 2.2 – O Problema dos Planetas .......................................................................... 33 2.3 – A Astronomia Ptolomaica ......................................................................... 35 2.4 – A Astronomia Copernicana ....................................................................... 37 3 – A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA)........................................... 44 4–COMPREENDENDO OS PRESSUPOSTOS DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL............................................................................................................ 51 5 – OS ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA.................................... 60 5.1 – Local e Sujeitos da pesquisa .................................................................... 60 5.1.1 – Perfil Sócio-Econômico-Cultural dos Sujeitos Desta Pesquisa ................. 61 5.2 – A Coleta de Informações ........................................................................... 66 5.3 – Uma Ferramenta Metodológica ................................................................. 71 6 – ANÁLISE DE RESULTADOS OBTIDOS ....................................................... 74 6.1 – A Verificação Inicial ................................................................................... 74 6.2 – A Verificação Final ..................................................................................... 81 6.3 – Comparação entre a Verificação Inicial e a Verificação Final ................ 83 6.4 – Trajetória da Construção do Conhecimento dos Estudantes ............... 83 6.4.1 – Percurso da estudante ANA ...................................................................... 84 6.4.2 – Percurso do estudante NOÉ ..................................................................... 90 6.4.3 – Percurso da estudante LIA ....................................................................... 101 7 – CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 120 REFERÊNCIAS..................................................................................................... 127

APÊNDICES.......................................................................................................... 132

ix

RESUMO A construção de conceitos científicos no âmbito escolar ainda precisa ser melhor compreendida. No caso de conceitos relacionados à astronomia, as pesquisas ainda são escassas no Brasil, principalmente quando se trata da Educação de Jovens e Adultos (EJA). O presente estudo objetivou compreender, à luz da Teoria Histórico-Cultural, as formas através das quais estudantes da EJA constroem conceitos relacionados com os movimentos do sistema Terra-Lua-Sol, em suas interações com o professor e os colegas em sala de aula. A pesquisa foi realizada em uma turma do ensino médio da EJA da Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará. A turma era formada por 19 estudantes, com idades variando entre 16 e 37 anos. A coleta de informações foi feita durante um semestre letivo, inicialmente através de questionários. Eles continham perguntas abertas sobre a temática, a fim de investigar as concepções prévias dos estudantes. Posteriormente, as aulas em que o assunto foi ensinado foram gravadas em áudio e vídeo. Nestas aulas os alunos elaboraram individualmente e coletivamente explicações para a sucessão dia-noite na terra. Os grupos foram formados espontaneamente pelos alunos e, em seguida, foram recombinados pelo professor. Os registros foram transcritos e analisados microgeneticamente. As respostas dos estudantes ao questionamento inicial que tratava sobre a sucessão do dia e da noite na Terra foram categorizadas em quatro níveis A, B, C e D desde o mais afastado até o mais próximo do conceito escolar cientificamente aceito. Os resultados obtidos mostraram que 13 estudantes melhoram o perfil conceitual, pois migraram dos níveis A, B ou C para o nível D da categoria de respostas, ou seja, estes estudantes entendiam que a sucessão dia-noite era decorrente do movimento de rotação da terra. Os outros seis estudantes, que já se encontravam no nível D, permaneceram nesse nível, porém melhoraram suas explicações em relação as suas respostas iniciais. Foram selecionados três estudantes para a análise microgenética dos percursos da construção de seus conhecimentos. Eles tinham suas respostas escritas iniciais classificadas nos níveis A ou B e durante suas interações com o professor e com os colegas incorporaram elementos do discurso científico, conseguindo elaborar explicações teóricas para o fenômeno observado. Os resultados ilustram diferentes mecanismos de ajuste da ajuda educacional oferecida pelo professor e pelos colegas, que salientam a importância de uma abordagem dialógica e do trabalho com diferentes formatos de grupos em sala de aula. Palavras-chave: Ensino de Astronomia, Formação de Conceito, Teoria Histórico-cultural, Educação de Jovens e Adultos

x

ABSTRACT

Constructing scientific scholar concepts still needs to be better understood. Focusing on Astronomy concepts, researches are still scarce in Brazil, especially those related to Education for Young and Adult Learners (“Educação de Jovens e Adultos – EJA). This paper goal was to comprehend, through the historic and cultural theory, EJA students construction of concepts related to movements of the Earth-Moon-Sun system, in their interactions with the teacher and schoolmates in the classroom. The research was conducted in an “EJA – Ensino Médio” class at the Application School – Federal University of Pará. The class had 19 students, from 16 to 37 years old. The data collection took place during the term semester, beginning with questionnaires. They had open questions about the theme in order to investigate the students’ previous conceptions. After that, the thematic classes were audio and video recorded. During the classes the students gave explanations for the day-night succession on Earth, individually or in groups spontaneously formed by the students, and then they were reorganized by their teacher. The registers were transcribed and analyzed in a micro-genetic way. The students’ answers to the initial question about the day-night succession on Earth were categorized in four levels A, B, C and D, from the farthest and the closest scientifically accepted scholar concept. The achieved results showed 13 students made the conceptual profile better, because they migrated from the A, B or C levels to the D one in the answers category, that is, these students understood that the day-night succession was a result of the Earth rotation movement. The other 6 students, already at the level D, kept in that level, although they improved their explanation if we compare their first and last answers. Three students were selected in order to analyze their micro-genetic knowledge construction process. They had their initial written answers classified in A or B levels, and during the interactions with their teacher and the other students, they achieved the scientific discourse elements, giving theoretical explanations to the observed phenomenon. The results show different adjustment mechanisms of Educational help offered by the teacher and the students, they show the importance of a dialogist approach and a work with different group formats in the classroom. Key-words: Astronomy teaching, Concept formation, Historic and Cultural Theory, “Educação de Jovens e Adultos”.

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1 MOTIVAÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DESTA PESQUISA

1.1 Reflexões Pessoais Sobre Minha Formação

Sempre me incomodaram, nesses 17 anos como educador e onze anos

trabalhando na Escola de Aplicação da UFPA, as dificuldades apresentadas por

alunos do ensino médio no que concerne à aprendizagem de conteúdos

relacionados com a Física.

Por muito tempo me conformei com o fato dos alunos serem “fracos” e de não

“conseguirem” alcançar o conhecimento científico. Em tese achava-os tendo uma

“mente vazia” e que aquilo que deveria ser ensinado teria que de alguma forma

preencher suas “massas cinzentas”. Observava que em alguns poucos alunos “bem

dotados” o conhecimento “permeava” com bastante facilidade, enquanto outros

pareciam “opacos” a aprendizagem.

Durante anos acreditei que para ensinar bastava conhecer profundamente o

assunto e estar qualificado pela academia, ou seja, diplomado, e “acabado” para

então exercer o magistério. Hoje, percebo que essa formação não é suficiente. A

prática docente ao longo dos anos produziu em mim inquietações que me

mostraram a necessidade de uma formação continuadas.

Posso compreender, em parte, o porquê de pensar daquela forma, quando

olhando para trás percebo que recebi, durante toda minha formação, um ensino

bastante fragmentado sem haver uma real interconexão entre as disciplinas. Além

disso, o ensino era pautado em regras e leis que não poderiam ser questionadas,

sugerindo apenas a “reprodução” do conhecimento. Este tipo de formação de

alguma forma acabou refletindo em minha prática docente. Acabei levando aos

meus alunos um ensino sem um significado mais efetivo, produzindo como

conseqüência certo distanciamento não só entre professor e aluno, mas também

entre o aluno e o objeto do conhecimento.

Mesmo no curso de Licenciatura em Física (cito desta forma por também ser

graduado em engenharia) ou no curso de Especialização em Física Moderna e

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Contemporânea, não tive qualquer oportunidade de ter contato com o estudo da

Alfabetização Científica nem com a Epistemologia da Ciência de uma forma mais

contundente. A falta desse embasamento científico produziu em mim um educador

com pouca criticidade e sem uma visão mais ampla sobre a ciência, buscando ser

principalmente um especialista das leis físicas e matemáticas.

A minha entrada no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências

e Matemáticas (PPGECM) do NPADC/UFPa me oportunizou ter contato com Morin,

Capra, Bachelard, Feyerabend, Boaventura Santos, Kunn entre tantos outros

autores e leituras que me fizeram enxergar também um outro lado do ensino e da

ciência, produzindo a quebra de alguns paradigmas pessoais e profissionais, e como

comento em um artigo1 produzido em uma das disciplinas deste Programa: foi

possível “mergulhar em um mundo novo, pós-moderno, compreendendo o passado

e projetando o futuro da ciência”

Neste mergulho foi possível ter contato com Sacks (1995) em “Um

antropólogo em Marte: sete histórias paradoxais” onde me identifiquei com Virgil,

personagem de uma das histórias, denominada “Ver e não Ver”. Compreender que

sua cegueira não representava necessariamente uma falta de visão e que a forma

de enxergar é que precisava ser outra. Uma citação é tocante:

‘È preciso morrer como uma pessoa que vê para poder renascer como um cego’, e a recíproca é igualmente verdadeira: é preciso morrer como um cego para renascer como uma pessoa que vê. É o ínterim, o limbo - ‘entre os dois mundos, um morto, / o outro impotente a nascer’ - , que é tão terrível. (SACKS, 1995, p.152, grifos do autor)

Importa dizer que se faz necessário renascer em uma nova visão, ou ficar

cego a fim de enxergar um novo caminho. Em nossa prática pedagógica tantas

vezes somos inflexíveis a mudanças e deixamos nos levar pela mesmice e não

queremos sequer olhar em outra direção, quanto mais retirar as escamas de nossos

olhos a fim de enxergar o que não vemos. É muito fácil para nós continuarmos

naquilo que já vínhamos fazendo, afinal de contas aprendemos assim e porque não

1 VALENTE, J. A. S. Uma viagem epistemológica: Minhas experiências e reflexões como educador. Artigo final da disciplina Base Epistemológica da Ciência do PPGECM. Belém: NPADC, 2004.

13

continuar reproduzindo da mesma maneira, ser o educador “Gabriela”2 me parecia

sempre refletir a lei do menor esforço.

1.2 Conseqüências de Um Novo Olhar

Diante das transformações experimentadas, passei a analisar a minha prática

docente com outro olhar, buscando enxergar em cada assunto a ser abordado um

novo desafio e em cada aluno, ou colega de trabalho, um companheiro.

O estudo da gravitação universal e consequentemente da astronomia se

tornou o primeiro desses novos desafios, levando-me a um trabalho3 que me

motivou a construir esta pesquisa.

Da experiência vivida e refletindo a partir de novas leituras é interessante

observar que muitas pessoas cada vez mais vêm se afastando do Universo que as

cerca, talvez o surgimento da luz elétrica entre outras descobertas tecnológicas as

deixem menos curiosas, não sei, mas as palavras de Alves (1981) em seu livro

Filosofia da Ciência: introdução ao jogo e suas regras podem melhor expressar

esse sentimento:

Ver as estrelas? Quem se incomoda? Quem tem tempo? Quem sabe? Para ver é necessário saber... Aos poucos elas se vão do espaço, pela luz elétrica e pela fumaça. E o céu perdeu o encanto. Os deuses e anjos que lá moravam foram expulsos. O firmamento foi, assim, separado do nosso destino, a não ser para aqueles que ainda acreditam na astrologia... a ciência desencantou, tirou o encanto, a magia, a aura sagrada, do universo. (ALVES ,1981, p.54, grifo meu)

Alves (1981) cita essas palavras como uma reflexão a respeito do pensar a

Ciência e os conflitos desta com o saber popular. Entretanto sem esse avanço da

tecnologia não se poderia conhecer o que se sabe hoje a respeito do universo. A

descoberta de novas galáxias ou novos planetas em nosso próprio sistema solar, a

2 Referência à música de Dorival Caymmi “Modinha para Gabriela” tema da telenovela “Gabriela“, lançada em 1975, pela Rede Globo, baseada na obra “Gabriela cravo e canela” de Jorge Amado. Um trecho desta música ressalta: “... eu nasci assim, e sou mesmo assim, vou ser sempre assim ...” 3 VALENTE, J. A. S.; NEVES, I. C. F.; PAIXÃO, A. C. B.; LIMA, R. F. Análise da evolução conceitual de alunos do primeiro ano do ensino médio regular em um tópico de gravitação universal. Artigo final da disciplina Pensamento e Linguagem do PPGECM, Belém: NPADC, 2004.

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possibilidade do envio de sondas e robôs a fim de rastrear planetas e satélites

despertam cada vez mais a curiosidade do ser humano. Quero, portanto, inferir que

a Ciência talvez tenha despertado o homem para outros encantos, mesmo que o

“progresso” tenha trazido à necessidade de “transformar a noite em dia”.

O desenvolvimento tecnológico tem sido, sem sombra de dúvidas, um fator

marcante para as mudanças das condições de vida da população, trazendo de um

lado melhorias em diversas áreas e de outro criando dificuldades como efeito

colateral, tanto deste avanço, quanto da política mundial, que provocam crises

sociais e ambientais.

Segundo Capra, uma crise mundial pela qual passa a humanidade afeta todos

os aspectos da vida dos seres humanos, a saúde, o modo de vida, a qualidade do

meio ambiente, das relações sociais, a economia, tecnologia e política. Ele faz

referência que na década de setenta não havia só a ameaça de guerra nuclear, mas

as construções de usinas nucleares configuravam perigo para a humanidade. A

energia oriunda dessas usinas foi por muito tempo considerada limpa, segura e

barata, conforme apontavam as pesquisas nesse setor. Hoje, uma preocupação

maior é o aquecimento global, proveniente da queima de combustíveis fósseis e

florestas, que poderá tornar esse quadro mais grave ainda. O aumento populacional

irregular e o crescimento tecnológico produziram conseqüências globais e “tem

contribuído de várias maneiras para uma grave deterioração do meio ambiente

natural, do qual dependemos completamente”.(CAPRA, 1992, p.19-20)

Levando-se em conta o que foi comentado até o momento, considero

necessário que os educandos posicionem-se diante desses temas de modo a ter

condições de exercer sua cidadania e para isso o uso e o entendimento da

linguagem científica escolar se torna importante.

Chassot nos fala sobre a necessidade da alfabetização cientifica como sendo

fundamental ao exercício da cidadania uma vez que a alfabetização científica seria:

[...] o conjunto de conhecimentos que facilitariam aos homens e mulheres fazer uma leitura do mundo em que vivem,... Assim como exige-se que os alfabetizados em língua materna sejam cidadãs e cidadãos críticos, em oposição, por exemplo, àqueles que Bertolt Brecht classifica como analfabetos políticos, seria desejável que os alfabetizados

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cientificamente não apenas tivessem facilitada a leitura do mundo em que vivem, mas entendessem a necessidade de transformá-lo, e transformá-lo para melhor. (CHASSOT, 2003, p.38, grifo do autor)

A escola, portanto passa a ter grande importância nesse contexto, pois, cabe

a ela também um papel decisivo na formação conceitual e na linguagem de seus

estudantes além de sua formação enquanto cidadãos. No entanto, é possível notar

que ela não vem nem acompanhando a velocidade do avanço tecnológico nem

induzindo seus alunos a perceber o encanto do universo de uma forma mais natural

e abrangente, como nos evidenciou Alves (1981), citado anteriormente.

O professor por sua vez se mostra quase sempre sobrecarregado,

desatualizado e desestimulado, em função dos baixos salários e da carga horária

excessiva a que ficam submetidos esses profissionais, como fruto de políticas

governamentais e não-governamentais que os levam a não terem disponibilidade de

tempo nem recursos financeiros para se atualizarem. Porém, sua participação é,

sem dúvida, fundamental a fim de que se produzam mudança nesse quadro

educacional.

No contexto de um ensino de ciências que levasse em conta uma educação

cientifica que estivesse fundamentada na ação e na construção social e cultural,

ganhou força no inicio da década de 80, nos Estados Unidos, o enfoque

Ciência,Tecnologia e Sociedade (CTS).

O enfoque CTS segundo Roby (1981, apud SANTOS e SCHNETZLER, 2000,

p.61) visa:

Trazer aos estudantes conhecimento que os levem a participar da sociedade, na busca de alternativas de aplicações de ciência e tecnologia, dentro da visão de bem estar social.

Nesse sentido o estabelecimento de uma relação entre a tríade Ciência,

Tecnologia e Sociedade (CTS) e o ensino; entre a educação e os princípios da

cidadania e nesse bojo o ensino da Física precisa ser contextualizado para que haja

um entendimento significativo por parte do educando.

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Essa contextualização deve ocorrer de tal maneira a envolver não só o dia-a-

dia do estudante como também o que está acontecendo no mundo que os cerca, a

fim de estimulá-lo a ter idéias globais para que sirvam de subsídios a tomadas de

decisões em suas vidas.

Não é possível sermos coniventes com a situação do ensino de ciências que

acontece na maioria das escolas em nosso país, bem citada por Pureza (2004,

p.04):

O ensino de ciências que se faz atualmente no interior de nossas escolas, sejam elas públicas ou particulares, corresponde ainda, a) ao modelo de transmissão-recepção, que se caracteriza pelo verbalismo do professor e pelo esforço de memorização dos alunos; b) do conhecimento transmitido pelo mestre, que é considerado o detentor do saber, sendo o aluno tratado como alguém cuja mente encontra-se vazia, com possibilidade de ser preenchida com informações geralmente descontextualizadas, que na maioria das vezes não fazem nem um sentido para o aprendiz.

É comum na prática docente o uso do termo “compreensão” com intuito de

configurar a idéia de “memorização”, que implica na forma mecânica de fixar o

conhecimento, conteúdos e informações sem que haja necessariamente uma

aprendizagem significativa.

Vale salientar que essa concepção linear de ensino e aprendizagem presente

ainda nos dias de hoje remonta à concepção epistemológica do século 19 e do

período medieval. Essa forma de pensar é proveniente do positivismo e do

empirismo que consideram que o conhecimento é um conjunto de informações

passível de absorção pelo aluno pelo uso quase exclusivo da memória (ARAGÃO ,

2002).

No entanto, um novo paradigma do presente século não mais considera os

alunos como “página em branco”, levando em conta, portanto, o seu conhecimento

de mundo obtido, seja no seu cotidiano, seja no âmbito escolar e considerando que

os conhecimentos novos não são simplesmente acrescentados ou juntados a seus

conhecimentos prévios sem que haja uma interação entre partes envolvidas. Esse

tipo de reflexão pode ser encontrado na teoria da aprendizagem significativa de

Ausubel (1968) ou na abordagem sócio-interacionista de Vygotsky (2000) sobre a

qual tratarei posteriormente.

17

1.3 Uma Primeira Experiência.

Dentro desta nova visão construí um trabalho4 na disciplina Pensamento e

Linguagem oferecida pelo PPGECM, tratando sobre a análise da evolução

conceitual em um tópico da Gravitação Universal em uma turma de 1° ano do ensino

médio regular da Escola de Aplicação da UFPA.

Aquele trabalho visava verificar a evolução conceitual a partir das

concepções prévias dos alunos sobre a ocorrência sucessiva de dia e noite na

Terra e a diferença de horários em diferentes pontos do planeta. Foi possível

investigar o conhecimento prévio dos alunos através de um pré-teste em forma de

questionário contendo duas perguntas abertas sobre o tema. Após o teste foi

distribuído um texto sobre o assunto para que eles lessem individualmente. Em um

outro momento (outro dia) retornamos para discutir sobre os mesmos

questionamentos, só que agora a classe toda foi dividida em grupos a fim de

estimular a interação entre os alunos e destes com o professor, este momento foi

filmado e gravado a fim de podermos analisar as interações microgeneticamente.

Em seguida, foi realizado um pós-teste, a fim de verificar se ocorreu ou não

evolução conceitual. Do pré-teste foi possível observar que alguns dos alunos ainda

mantinham cognitivamente um modelo geocêntrico de Universo, há muito

ultrapassado cientificamente, ou um hibrido dos modelos geocêntrico e heliocêntrico

além de outros conhecimentos prévios relacionados com este assunto. Vale

ressaltar que não foi possível fazer uma avaliação mais efetiva da interação ocorrida

em sala de aula em função do tempo e da qualidade do áudio que dificultaram uma

melhor transcrição.

Porém, um importante aspecto na execução deste trabalho inicial foi

compreender, na prática, que os alunos não são “tabulas rasas” e que esses

conhecimentos, que são construídos no meio em que vivem, na interação com as

pessoas ou com os veículos de comunicação de massa, podem ser utilizados no

ensino como suporte para uma evolução conceitual, ou ainda, para gerar um conflito

4 VALENTE, J. A. S.; NEVES, I.C.F.; PAIXÃO, A.C.B.; LIMA, R.F. Análise da evolução conceitual de alunos do primeiro ano do ensino médio regular em um tópico de gravitação universal. Artigo final da disciplina Pensamento e Linguagem do PPGECM, Belém: NPADC, 2004.

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cognitivo a fim de produzir efetivamente essa evolução. Assim, as interações

professor–aluno, aluno-aluno ou aluno-texto se tornaram para nós fundamentais.

Outro aspecto de igual importância foi analisar esse processo de ensino-

aprendizagem como um professor-investigador, algo que não é comum entre os

professores de um modo geral. Neste sentido, aquele trabalho me permitiu refletir

sobre a minha prática, criando ferramentas conceituais e metodológicas novas.

1.4 A Construção de Um Novo Trabalho.

O trabalho citado acima me motivou a elaborar esta dissertação na

perspectiva, agora, de compreender como os alunos da 1ª Etapa do ensino médio

da Educação de Jovens e Adultos (EJA) constroem seus conceitos sobre fenômenos

relacionados aos movimentos do sistema Terra-Lua-Sol, segundo a Teoria Histórico-

Cultural de Vygotsky.

A escolha da turma da EJA deve-se ao fato de ser neste nível de ensino que

tenho desenvolvido minha atividade docente nos últimos anos. Decidi usar a Teoria

Histórico-Cultural de Vygotsky por atender as expectativas desta pesquisa já que ela

tem se mostrado frutífera para o estudo da construção de conhecimento em sala de

aula. Esta teoria será melhor detalhada no decorrer deste trabalho

1.4.1 Metas Estabelecidas Para Este Estudo.

A fim de apreender de que maneira os estudantes da 1ª Etapa do ensino

médio da EJA (Educação de Jovens e Adultos) constroem seus conceitos sobre

fenômenos relacionados aos movimentos do sistema Terra-Lua-Sol analisado

segundo a Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky, as seguintes metas foram

estabelecidas: (1) identificar que conhecimentos prévios os alunos da 1ª Etapa da

EJA demonstraram possuir através de questionamentos propostos relativos a este

tema; (2) avaliar a evolução do conhecimento desse conceito durante e após o

processo ensino-aprendizagem e (3) analisar na interação em sala de aula a

construção deste conhecimento.

19

1.4.2 As Etapas Deste Trabalho

Em uma primeira etapa deste trabalho busquei as concepções prévias dos

sujeitos da pesquisa através de questionários, com perguntas abertas e solicitação

de desenhos, de como os sujeitos da pesquisa concebiam os seguintes fenômenos

relacionados aos movimentos do sistema Terra-Lua-Sol: a sucessão do dia e noite

na Terra, os fusos horários, a formação dos eclipses e as fases da Lua.

Em uma segunda etapa, provoquei a discussão em sala de aula somente

sobre o fenômeno da sucessão do dia e da noite na Terra observando a interação

entre os alunos e destes com o professor a fim de analisar de que forma essas

interações contribuíram para a construção do conhecimento.

Quero esclarecer que, até o momento de obter dos alunos suas concepções

prévias, imaginava que seria possível analisar para esse trabalho a construção do

conhecimento dos outros fenômenos relacionados ao movimento Terra-Lua-Sol,

porém o tempo exíguo e volume de informações a ser processadas nos levaram a

optar por analisar apenas o fenômeno da sucessão do dia e da noite na Terra.

Finalmente, os sujeitos da pesquisa responderam por escrito e

individualmente as mesmas perguntas iniciais a fim de identificar se houve de fato

evolução conceitual.

Utilizei, portanto, como base para fundamentar este estudo a abordagem da

psicologia histórico-cultural de Vygotsky (2000), seus seguidores e colaboradores

usando como ferramenta de análise do processo de ensino e de aprendizagem a

análise microgenética a fim de compreender a construção de conhecimentos nas

interações em sala de aula.

1.4.3 Algumas Referências de Trabalhos Ligados ao Ensino da Astronomia

Convém esclarecer que no nível médio o ensino da astronomia está incluso

como sendo assunto relacionado ao estudo da Gravitação Universal, que de um

modo geral faz parte do conteúdo programático da disciplina Física,

20

costumeiramente ministrado na série inicial do ensino médio, tanto da EJA como do

ensino regular. Já no ensino fundamental o estudo da astronomia está quase

sempre vinculado à disciplina ciências.

Em trabalho publicado na XXIX Reunião Anual da Sociedade Astronômica

Brasileira, Bretones (2003) buscou identificar a produção de teses e dissertações

defendidas no Brasil relativas ao ensino de Astronomia e conhecer as principais

tendências da pesquisa nesse campo. Seu levantamento bibliográfico ocorreu junto

ao Centro de Documentação em Ensino de Ciências (CEDOC) da Faculdade de

Educação da UNICAMP e ao Banco de Teses da CAPES, disponível na Internet.

Ele identificou 16 pesquisas produzidas entre 1973 e 2002 sendo 3 teses de

doutoramento e 13 dissertações de mestrado, constatou que 43,7% dos trabalhos

foram produzidas na USP e 18,8% na UNICAMP. Com menor percentual,

apareceram a UNESP e a UFMT com 12,5% cada uma, seguido da UFRJ com 6,3%

.

Bretones (2003) verificou que o nível escolar predominante nesses estudos

era o Ensino Fundamental com 43,7% dos trabalhos e destes 62,5% de 5a a 8a

séries e 37,5% de 1a a 4a séries. Ele cita também que ocorreram estudos

relacionados ao Ensino Médio e Superior com 25% cada, além de Ensino não

escolar com 6,3%. Ele constatou, portanto haver uma maior preocupação com o

Ensino de Astronomia nos níveis iniciais de escolaridade, em detrimento de níveis

mais avançados.

Segundo Bretones (2003) as principais tendências temáticas das pesquisas

eram relacionadas a Conteúdo e Método (56,3%), a Concepções do Professor

(43,8%), a Currículo e Programas (37,5%) e a Recursos Didáticos (37,5%).

Outros focos também foram identificados por Bretones (2003), porém em

menor percentual de pesquisa entre eles aqueles relativos a Concepções do Aluno

(31,3%), a Formação de Professores (25%), a Formação de Conceitos (12,5%) e a

Programas de Ensino Não Escolar (6,3%).

21

Percebe-se, portanto um indicativo de um percentual pequeno de pesquisa

sobre a concepção de alunos (5 trabalhos) e um percentual menor ainda sobre a

formação de conceitos nesta área de ensino (2 trabalhos). Não ocorrendo no

levantamento feito por Bretones (2003) qualquer trabalho envolvendo a EJA (muito

menos na sua modalidade de ensino médio).

Um trabalho importante a destacar no Brasil é o de Bisch (1998), que analisou

a natureza e o conteúdo do conhecimento de estudantes e professores do ensino

fundamental da cidade de São Paulo a respeito de conceitos relacionados com a

astronomia, buscando discernir os traços fundamentais desse conhecimento. Pelas

palavras do próprio autor ele destaca que constatou em alunos e professores:

um realismo ingênuo, um conhecimento conceitual feito de chavões reinterpretados e a representação qualitativa/topológica do espaço. ... acham-se profundamente imbricados e são determinantes na forma de representação do universo de crianças e professores. (BISCH, 1998, p.270)

Um outro trabalho de importância significativa foi o desenvolvido por Compiani

(1996) que buscou em um processo de ensino aprendizagem, realizado com 18

alunos de uma 5a série do ensino fundamental abordando o tema “Formação do

Universo”, identificar e interpretar a (possível, ou não) evolução conceitual dos

alunos sobre o tema em questão, à luz da mediação pelo professor, onde o referido

autor era o professor-pesquisador.

Nos EUA, Kikas (1998) realizou um estudo sobre a influência do tipo de

instrução na capacidade de crianças de definir e explicar vários conceitos ligados a

fenômenos da astronomia e entre eles o fenômeno da sucessão do dia e da noite na

Terra. A pesquisa foi realizada com um grupo de alunos (10 -11 anos) do 5º ciclo do

ensino fundamental, sendo feita nova verificação do conhecimento quando os

mesmos alunos estavam no 9° ciclo, após quatro anos.

O processo de ensino foi gravado com posterior transcrição, bem como as

entrevistas com os estudantes tanto na época em que eles estavam no 5º ciclo como

quando estavam no 9º ciclo. Kikas (1998) destacou que o processo de ensino em

22

questão estava centrado no professor e que o uso do livro texto, pelo professor,

explorava a memorização dos conceitos.

Ele observou que dois meses após o processo de ensino, quando os alunos

ainda estavam no 5º ciclo, alguns estudantes respondiam de forma cientificamente

correta a respeito do fenômeno, porém, quatro anos depois, muitos deles voltaram a

utilizar as concepções do senso comum para explicar o fenômeno ou fizeram uso de

uma explicação sintética (reducionista), pois não podiam recordar as explanações

científicas.

Kikas (1998) esclarece que possivelmente a metodologia de ensino tenha

sido o grande fator de influência uma vez que “professor confiou extremamente no

livro texto. Falou sobre o Sol como o centro do sistema planetário, extraiu um

esquema no quadro-negro. Os estudantes memorizaram a informação nova

(definições, explanações) mas, não a discutiram” (p.452) e como nas palavras de

Lemke (1990, apud KIKAS, 1998) “Não era ‘ciência falando’ mas ‘memorizar a

ciência’ “. Kikas ainda afirma que “Nós não podemos deduzir o modelo heliocêntrico

somente com base na nossa percepção sensorial” (KIKAS, 1998, p. 452)

Portanto, dos levantamentos feitos até o momento para realização da

presente pesquisa podemos concluir, que das teses e dissertações realizadas no

Brasil sobre o ensino da astronomia, poucas foram aquelas que objetivavam

identificar a concepção dos alunos, sendo que a maior parte delas envolvia

estudantes do ensino fundamental regular, a respeito de temáticas relacionadas com

ensino de astronomia. Muito poucas investigaram a formação dos conceitos. Não

ocorrendo indicações deste tipo de trabalho envolvendo a Educação de Jovens e

Adultos (EJA).

Um outro aspecto a destacar corresponde ao fato de que a realização da

presente pesquisas sobre o ensino de astronomia tem se concentrado na região

centro-sul de nosso país.

Esta dissertação, realizada no norte do Brasil, se propõe a verificar não só

como pensam, mas como os alunos da EJA constroem o conceito relacionado com

23

os movimentos Terra-Lua-Sol, além de analisar as possíveis evoluções conceituais

dos referidos estudantes.

Inclinei-me nesta pesquisa a definir uma ação pedagógica que explorasse as

idéias dos alunos e que eles pudessem discutir entre eles e comigo a fim de

compreender como ocorre a sucessão do dia e da noite na Terra fazendo uso de

instrumentos (esferas de isopor) capazes de representar os corpos celestes

envolvidos (Terra-Lua-Sol).

Creio que a escolha de trabalhar com uma turma da EJA tornou-se um

desafio diante da complexidade social na qual estão envolvidos os sujeitos desta

pesquisa e ao mesmo tempo empolgante em função dos possíveis resultados

obtidos, seja em função da faixa etária, seja em função da história de vida e

conhecimento de mundo bastante variável dos referidos sujeitos.

A análise da interação professor-aluno ou aluno-aluno, a partir da abordagem

Histórico-Cultural em que se baseia essa pesquisa, envolvendo a evolução

conceitual no ensino da astronomia, poderá ser uma contribuição significativa para

aqueles que trabalham com este tema no ensino médio da EJA.

24

2. UM POUCO DA HISTÓRIA DA ASTRONOMIA.

Este capítulo pretende melhorar a compreensão da história da ciência, a fim

de servir de parâmetro para o entendimento do pensamento dos estudantes desta

pesquisa. Neste capitulo procuro traçar e descrever historicamente alguns modelos

de mundo idealizados desde a antiguidade até o modelo vigente,

Quero inferir aqui que para um professor reflexivo que deseja mediar

discussões a fim de melhor encaminhar suas ações pedagógicas em sala de aula

em um tema clássico, como o abordado nesta dissertação, este capítulo poderá ser

uma valiosa contribuição.

Diante das respostas obtidas dos sujeitos de minha pesquisa por ocasião do

pré-teste5. Foi possível observar uma concentração bastante significativa de

respostas, cerca de 43% da totalidade dos alunos, categorizadas como um discurso

cotidiano ou religioso ou ainda associando a sucessão do dia e da noite na Terra a

um movimento do Sol ao redor da Terra (modelo geocêntrico).

Questionei-me então sobre os porquês do surgimento dessas respostas entre

os alunos da EJA uma vez que esse paradigma já está superado pela ciência. É

bem verdade que alguns estudos como o de Bisch (1998) e o de Beraldo (1997)

mostraram esse perfil de respostas entre crianças em idade escolar.

Esse questionamento me motivou a investigar no ponto de vista do cenário

histórico os meandros da construção do paradigma geocêntrico (estabelecido pelas

idéias aristotélico-ptolomaicas) e sua substituição pelo paradigma heliocêntrico

(estabelecido pelas idéias copernicanas) buscando compreender as variadas

respostas apresentadas pelos sujeitos dessas pesquisas.

5 Um dos objetivos do pré-teste era identificar as concepções prévias dos sujeitos da pesquisa quando lhe era perguntado sobre a explicação da sucessão do dia e da noite na terra e através deste questionamento buscamos identificar o “modelo de mundo” idealizado por eles.

25

2.1 A Cosmologia Primitiva

A história da cosmologia primitiva retrata um universo de um céu alicerçado

nas observações daquilo que se podia imaginar ou ver a olho nu. Todas as

civilizações e culturas que se tem conhecimento buscaram respostas sobre: “Como

é a estrutura do universo?”. As respostas são diversas, no entanto as civilizações

ocidentais originárias da Grécia helênica deram mais atenção ao céu e acabaram

por obter as respostas mais condizentes a este questionamento.

Para os babilônicos o mundo era uma ostra redonda e a Terra uma montanha

oca no seu centro a flutuar nas águas do fundo da ostra. Na porção superior da ostra

sua cúpula suportava águas, que davam origem as chuvas. Do oriente para o

ocidente moviam-se o Sol, a Lua e as estrelas através da cúpula (GATTI, 2005).

Na concepção chinesa de mundo, Figura 1, o céu representava um grande

manto e a inclinação da Terra era necessária para justificar o movimento dos rios em

determinada direção.

Figura 1 - Concepção chinesa de mundo.

Fonte: TOMILINÉ, 1985, p.23

Para os hindus, a Terra era um grande disco plano e no seu centro

encontrava-se o Monte Meru, ao redor do qual o Sol , a Lua e as estrelas giravam. A

Figura 2 ilustra esta concepção.

26

Figura 2 - Concepção hindu de mundo Fonte: (TOMILINÉ, 1985, p.21)

Na cosmologia antiga: “o céu é uma moldura para a terra, e está povoado de

figuras míticas cujo nível na hierarquia espiritual normalmente aumentava com a

distância ao ambiente terrestre”.( KUHN, 2002, p.25)

No Egito antigo, o universo era uma caixa, a Terra era representada como

uma travessa alongada cujas dimensões eram paralelas ao rio Nilo e o seu fundo

liso era a bacia aluvial, as suas bordas onduladas e curvas eram as montanhas que

limitavam o mundo terrestre. Por cima da travessa havia o deus do Ar, que segurava

uma cúpula de travessa invertida representando o céu. Por baixo da travessa havia

o deus da Água com uma terceira travessa que limitava inferiormente o universo. O

Sol era o deus Rá com seus dois barcos um para viagem diurna através do ar e

outro para a viagem noturna através da água. As estrelas movidas como pequenos

deuses estavam pintadas e dispersas sobre a abóbada celeste. A Figura 3 procura

ilustrar a concepção de mundo dos egípcios.

Figura 3 - Concepção de mundo de acordo com os egípcios. O céu era a morada

dos deuses e o Egito ficava no centro do mundo. Fonte: (http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0182/aberto/mt_66939.shtml)

27

A estrutura de universo idealizada pelos antigos egípcios representava o

mundo que eles conheciam, uma vez que viviam num terreno alongado limitado por

água na única direção que haviam explorado, o céu era uma cobertura simétrica

tanto de dia como a noite. A mundividência desta civilização não diferia muito de

outras civilizações antigas como a Índia e a Babilônia em muitos fragmentos

cosmológicos, sendo também extremamente influenciada miticamente.

Kuhn (2002, p.22), ao comentar a respeito da cosmologia nas civilizações

antigas, assevera que:

Aparentemente, todos os esboços da estrutura do universo preenchem uma necessidade psicológica: fornecem uma orientação para as atividades diárias do homem e para as atividades de seus deuses. Ao explicar a relação física entre o habitat do homem e o resto da natureza, eles integram o homem no universo e fazem-no sentir-se em casa.

A necessidade do homem “inventar” uma cosmologia se deu em virtude da

busca de uma mundividência capaz de satisfazer e dar sentido a todas as suas

ações práticas e espirituais.

No entanto, o homem não se limitou somente a sua satisfação psicológica,

mas buscou explicações para os fenômenos observados, resultando no

desenvolvimento do pensamento cosmológico levando-o a delegar a elaboração de

sua cosmologia a especialistas como astrônomos, que quantificavam e qualificavam

tais fenômenos.

Os babilônicos e egípcios desde o século XX a.C., ou antes ainda, já

empreendiam observações sistemáticas do movimento do Sol. Estas civilizações

desenvolveram um relógio de Sol primitivo, o gnomon, que consistia de uma vara

graduada cuja extremidade da sua sombra marcava uma linha reta a cada momento

do dia fornecendo com isso a direção do Sol, essas observações faziam do Sol um

medidor de tempo e a observação sistemática gerou os calendários daqueles povos.

A Figura 4 busca ilustrar o uso de um gnomon.

28

Figura 4 - Ilustração de uso de um gnomon rudimentar. Fonte:(http://williamcalvin.com/img/gnomon.gif)

Esse movimento aparente do Sol era estudado tomando por base os pontos

cardeais e a observação do seu nascer no leste e de se pôr no oeste, levando em

conta também que tanto a posição do seu aparecer, quanto o comprimento da

sombra do gnomon e a duração do dia variava de um dia para o outro conforme a

estação do ano o que levou a classificação do que denominamos hoje de solstícios6

de verão e de inverno e equinócio7 da primavera e outono. A Figura 5 busca elucidar

esse movimento.

6 O Solstício acontece no momento em que o Sol em seu aparente movimento alcança o seu maior afastamento da linha do equador em latitude. Ocorre duas vezes ao ano em 22 de dezembro e 22 de junho, em anos normais (não bissestos). No hemisfério Sul o solstício de verão é em dezembro e o de inverno é em junho, ocorrendo o inverso no hemisfério Norte. Quando ocorre um solstício no inverno significa que esse dia é o menor do ano e a a noite a mais longa. Quando ocorre no verão significa que é o maior dia do ano e a menor noite 7O Equinócio acontece no momento em que o Sol em seu aparente movimento cruza o plano do equador terrestre (a linha do equador terrestre projetada na esfera celeste).Ocorre duas vezes ao ano em 21 de março e 23 de setembro. No hemisfério Sul o equinócio de outono é em março e o de primavera é em setembro, ocorrendo o inverso no hemisfério Norte.Quando ocorre um equinócio significa que nesse dia o dia e a noite têm duração igual

29

Figura 5 - Relação entre a posição do nascer do sol, a elevação do Sol

ao meio-dia e a variação sazonal da sombra do gnomon. Fonte: (KUHN, 2002, p.26)

Esses movimentos de avanço e recuo do nascer do Sol ao longo do horizonte

são correlacionados com as estações do ano, o que levou muitos povos antigos a

acreditarem que o Sol controlava as estações e, portanto idolatravam o Sol como um

deus e nesse sentido dependiam da ação deste deus para o sucesso de suas

atividades agrícolas.

Para aqueles povos as estrelas, por sua vez, teriam um movimento regular e

mais simples que o Sol, porém sempre exigiram uma observação sistemática

bastante longa de quem às analisava e neste sentido Kunh (2002, p.29) faz um

paralelo entre o comportamento das pessoas nos dias de hoje em comparação com

as pessoas da antiguidade:

Atualmente, poucas pessoas passam muito tempo fora de casa à noite e, quando o fazem, a sua observação do céu é frequentemente obscurecida pelos edifícios e pelas luzes das ruas. Além disso, a observação do céu já não tem um papel direto na vida do homem comum. Mas na antiguidade, as estrelas eram uma parte importante do ambiente normal do homem, e os corpos celestes tinham uma função universal como medidores de tempo e calendários. Nestas circunstâncias, a capacidade de identificar estrelas com um olhar era relativamente comum.

Os astrônomos até então se limitavam a relatar observações astronômicas

sem fornecer informações estruturais mais concretas, como por exemplo, a

composição dos corpos celestes, ou as suas distâncias, ou ainda, o tamanho, a

posição ou a forma da Terra. A análise se prendia exclusivamente naquilo que seus

olhos podiam alcançar.

30

No entanto, essas observações aliadas à imaginação daqueles que se

dedicavam a estes estudos permitiram formular teorias na tentativa de explicar esses

fenômenos, desencadeando então uma cosmologia com um cunho científico. Entre

os mais antigos registros deste pensamento cosmológico destaca-se aquele

idealizado por Anaximandro de Mileto no século VI a.C. Segundo Anaximandro

As estrelas são porções comprimidas de ar, como a forma de rodas [rotativas] cheias de fogo, e emitem chamas a partir de pequenas aberturas... O sol é um círculo vinte oito vezes maior do que a terra; é como uma roda de carruagem, cujo aro é côncavo e cheio de fogo, que brilha em certos pontos de aberturas como os bicos de foles... Os eclipses do sol dão-se através do orifício onde o fogo encontra a saída fechada. A lua é um círculo dezenove vezes o tamanho da terra, é como uma roda de carruagem, cujo aro é côncavo e cheio de fogo, como o do sol, e está colocada obliquamente, assim como também o sol está, tem uma saída como a de um fole; os seus eclipses dependem das voltas da roda. (KUHN, 2002, p.42).

Observa-se aqui que os gregos, diferentemente dos egípcios, substituíram os

deuses por mecanismos terrestres comuns ao seu dia a dia, representando uma

concepção mais evoluída do pensamento astronômico. Nesta concepção já é levado

em conta um pensamento mais estrutural esboçando uma comparação dimensional

entre os entes astronômicos ainda que esta não corresponda a verdade científica

que se conhece hoje.

Vale ressaltar que as informações históricas deste período são pouco

precisas pelo fato de corresponderem a fragmentos, o que dificulta o estudo da

evolução da concepção astronômica grega. Porém, a partir do século IV a.C. os

registros são mais confiáveis e muitos filósofos daquele século já imaginavam a terra

como uma pequena esfera suspensa de forma estacionária localizada no centro de

uma outra esfera gigante e rotativa contendo as estrelas. Exteriormente a esfera das

estrelas não havia matéria ou espaço, reinava o “nada”. O Sol, a Lua e os planetas

moviam-se no espaço entre a esfera terrestre e a esfera das estrelas.

È importante destacar que os pitagóricos, no século V a.C, passaram a

introduzir a idéia de uma Terra com formato esférico e esta concepção foi fortalecida

por Platão, entre os anos 428 a 347 a.C, que imaginava ainda que os corpos

31

celestes descreviam movimentos circulares uniformes. Seguidor de Platão,

Aristóteles (384 a 322 a.C), passa a ser um defensor desta tese. A Figura 6 ilustra a

cosmologia idealizada por Aristóteles com universo finito.

Figura 6 - Ilustração da cosmologia aristotélica Fonte: (http://html.rincondelvago.com/genesis-de-la-astronomia-moderna.html)

Essa concepção de mundo, que Kunh (2002) denomina de “Universo de duas

esferas”, não foi à única que surgiu na antiguidade, mas foi a que ganhou mais

simpatizantes e foi deixada como herança que influenciou o mundo principalmente

até o período medieval.

Vale a pena destacar alguns modelos antigos que competiam com o modelo

das duas esfera (a esfera da Terra e a esfera das estrelas) e que não se projetaram

no cenário astronômico ou cosmológico no período em que foram idealizados.

a) O proposto pelos atomistas gregos Leucipo e Demócrito no Séc.V a.C

concebia um universo composto por infinitas partículas indivisíveis que se

deslocavam em infinitas direções. O Sol e a Terra eram apenas um dos

corpos constituído pela agregação dessas partículas (átomos) que estava em

movimento e esta última não ocupava o centro do universo eles postulavam

também que haveria de existir outros sóis e terras entre tantas outras

estrelas.

32

b) Os seguidores de Pitágoras no século V a.C. propunham uma cosmologia em

que existia uma esfera gigante das estrelas que girava constantemente e no

centro desta esfera havia um grande fogo que era um altar ao deus Zeus e

que o Sol, os outros corpos celestes e a Terra executavam translação em

torno deste fogo central que só não era visto da terra porque as região

habitadas eram voltada contra este centro.

c) No século IV a.C , Heráclides propôs um modelo de uma Terra central dotada

de um movimento de rotação diário e que as esferas das estrelas eram fixas.

Ele propunha ainda que Vênus e Mercúrio giravam ao redor do Sol e que este

último executava translação em torno da Terra

d) Nos meados do século III a.C, Aristarco de Samos, propõe então um universo

onde o Sol era o centro e a Terra e a esfera das estrelas circulavam em torno

do Sol.

Convém salientar que as idéias dos atomistas gregos Leucipo e

Demócrito bem como as de Aristarco de Samos, apesar de muito próximas do

paradigma vigente atualmente, não ganharam espaço entre os filósofos e os

astrônomos daquela época e inclusive eram ridicularizadas também na idade média.

Primeiro, porque essas idéias não pareciam ser mais eficientes que a do “universo

das duas esferas”, que era o senso comum da época. Segundo, porque para os

astrônomos os corpos celestes como estrelas e planetas tinham comportamento

praticamente invariável diferindo bruscamente da Terra onde a vegetação, os

animais e as civilizações nasciam e morriam e a estrutura terrestre poderia ser

alterada por inundações e fenômenos meteorológicos, ou seja, a Terra teria então

um caráter corruptível. Terceiro, porque parecia um absurdo considerar um

movimento para a Terra uma vez que se assim o fosse as nuvens, o ar ou qualquer

coisa que não estivesse ligada a Terra ficaria para trás ou então os elementos que

estivessem ligados a ela como pessoas e árvores seriam arremessadas para fora

dela e esses efeitos não eram observados, logo o senso comum da época levava-os

a considerar que a Terra só poderia estar em repouso.

Um outro argumento, ainda mais forte que os anteriores, estava ligado a um

aspecto da filosofia espiritual, uma vez que um pensamento dedutível pela igreja era

33

de que, se o homem foi criado a imagem e semelhança de Deus e uma vez que a

Terra é a morada da sua criação, logo deve ser ela o centro do universo.

2.2 O Problema dos Planetas

O modelo do universo das duas esferas explicaria de forma eficiente o

movimento do Sol e das estrelas até pelo menos a invenção do telescópio, quando a

observação deixou de ser somente a olho nu (cerca de meio século após

Copérnico). Porém, o movimento de outros corpos celestes também era de interesse

dos astrônomos como o movimento dos planetas, por exemplo. E foi exatamente a

análise do movimento dos planetas que provocou a revolução, através de

Copérnico.

A palavra grega planeta significa “errante” e foi assim utilizada para distinguir

estes corpos daqueles que se mantinham fixos na esfera das estrelas, já que os

planetas se moviam durante o ano, em relação às estrelas distantes. Para os gregos

o Sol e a Lua eram considerados planetas assim como Mercúrio, Vênus, Marte,

Júpiter e Saturno os únicos conhecidos naquela época e os cometas não eram

considerados corpos celestes antes da revolução copernicana.

Diferente do Sol e da Lua, os outros planetas apareciam no céu como pontos

de luz e, portanto poderiam ser confundidos com uma estrela para alguém pouco

experiente na observação. No entanto, a grande diferença estava no fato dos

planetas não manterem um percurso uniforme, ou seja, durante o seu deslocamento

para leste, em relação às estrelas, eles sofriam interrupções resultando em

pequenos deslocamentos para oeste também chamados de movimentos

retrógrados. A Figura 7 ilustra o retrocesso de Marte em relação à constelação de

Taurus. Além disso, o brilho desses planetas variava conforme o seu deslocamento.

34

Figura 7 - Ilustração do movimento retrógrado de Marte Fonte: (KUHN, 2002, p.64)

Porque os planetas executam este movimento retrógrado? Foi um grande

questionamento desde Platão até Copérnico.

Muitas soluções surgiram para tentar explicar este fato e uma dessas foi a

introdução dos conceitos de epiciclos e deferentes, propostos pelos astrônomos e

matemáticos gregos Apolônio e Hiparco, dos meados do século III até o final do

século II a.C.

Esse mecanismo matemático consistia em movimento uniforme do planeta

em um pequeno círculo (epiciclo) sobre um ponto de uma circunferência (deferente)

sendo o centro da mesma o centro da Terra. A Figura 8 ilustra esse processo.

Figura 8 - Sistema epiciclo-deferente de um planeta P em torno da Terra T (a); combinação do movimento do epiciclo com o deferente para um observador na Terra (b) Fonte: (KUHN, 2002, p.77)

35

Vale ressaltar que esse mecanismo passava a explicar o movimento

retrógrado dos planetas uma vez que a composição do movimento do planeta no

epiciclo e no deferente fazia aparecer o retrocesso do planeta, bem como o aumento

do brilho ao aproximar-se da Terra.

2.3 A Astronomia Ptolomaica

O modelo proposto pelo astrônomo Ptolomeu, 150 anos d.C., em seu livro

Almagesto, retrata o modelo cosmológico de Aristóteles, e faz uso do sistema

epiciclo-deferentes para explicação do movimento retrógrado dos planetas. É bom

destacar que a obra de Ptolomeu foi a referência em astronomia até o século XVII e

como Kuhn (2002, p.88) comenta “foi o primeiro tratado matemático sistemático a

dar uma explicação completa, pormenorizada e quantitativa de todos os

movimentos celestes”.

Na verdade, a expressão astronomia ptolomaica utilizada na literatura deve-

se ao fato do trabalho de Ptolomeu ter substituído aqueles de seus predecessores.

Além de que, suas técnicas foram amplamente utilizadas por seus seguidores, que

raramente ou nunca, pesquisaram modificações dessa técnica (KUHN, 2002, p.88).

Seu trabalho, inclusive, influenciou grandemente a Copérnico.

No sistema ptolomaico, a Terra ocupava o centro do universo, porém os

outros corpos celestes movimentavam-se com trajetórias circulares não

necessariamente ao seu redor, ou seja, o Sol, por exemplo, descrevia o movimento

circular com velocidades constantes ao redor de um ponto fixo fora do centro do

universo (excêntrico). Desta forma, com o uso de órbitas excêntricas, epiciclos

maiores e epiciclos menores sobre os maiores, com diferentes velocidades de

rotação, seu sistema explicava a trajetória do Sol e dos planetas em torno da Terra.

Segundo Ptolomeu os planetas também giravam em órbitas circulares com

velocidade constante não diretamente ao redor da Terra, mas sobre um epiciclo de

pequeno raio. O centro desta circunferência girava em torno da Terra através dos

deferentes. A composição desses dois movimentos era capaz de reproduzir o

36

movimento retrógrado dos planetas. As Figuras 9 e 10 esquematizam essa

explicação. Ptolomeu fez uso de mais de um epiciclo para descrever a órbita de um

planeta a fim de adequar a trajetória prevista àquela observada.

Figura 9 - Esquema epiciclo-deferente idealizado por Ptolomeu onde C representa centro no qual o planeta gira

Fonte: (BRAGA; GUERRA; REIS, 2003, p.65)

Figura 10 - Efeito combinado dos movimentos. Fonte: (BRAGA ; GUERRA; REIS, 2003, p.66)

Como Ptolomeu não conseguiu demonstrar completamente o movimento de

todos os planetas, uma vez que o movimento retrógrado dos planetas era irregular

ele utilizou-se de um outro artifício denominado de equanto (ponto deslocado do

centro geométrico C da órbita circular do planeta) (Figura 11) que seria uma

variação do excêntrico na tentativa de melhor adaptar a trajetória prevista daquela

37

observada dos planetas em função da não-periodicidade dos movimentos

retrógrados dos planetas .

Figura 11 - Esquema mostrando o equanto E idealizado por Ptolomeu. Fonte: (BRAGA ; GUERRA; REIS, 2003, p.67)

O uso dos epiciclos e deferentes por Ptolomeu criou um pequeno problema

relativo ás esferas cristalinas ou esferas das estrelas fixas, uma vez que os planetas

não estariam mais presos a elas como imaginava Aristóteles. Mas isto não seria uma

pedra de tropeço para os astrônomos que seguiam a linha ptolomaica, já que seu

sistema era adequado ao mundo medieval e não feria as bases religiosas da época.

A Terra continuava a ocupar imóvel o centro do universo.

2.4 A Astronomia Copernicana

A maioria dos textos da antiga astronomia, bem como o Almagesto, foram

traduzidas para o latim no século XII, depois da reconquista européia, após o

domínio mulçumano. Esses textos passaram então a ser introduzidos

sistematicamente nas universidades medievais de toda Europa. O astrônomo

polonês Nicolau Copérnico serve-se dessa fonte no final do século XV, recebendo a

influência da filosofia aristotélica-ptolomaica. No entanto, um questionamento se faz

necessário: como poderia Copérnico prenunciar uma revolução astronômica se a

construção de seu saber estava ligada tão intimamente àquela fonte?

38

Faz-se necessário compreender aspectos importantes nos períodos que

permearam ou antecederam a Copérnico.

Durante parte do renascimento e ao longo da idade média, a igreja católica

era a instituição com autoridade intelectual, exercendo esta ação por toda a Europa.

As universidades eram de alguma forma ligadas à igreja e os eruditos europeus

faziam parte do clero. A ação da igreja era determinante para o crescimento ou não

da astronomia e da ciência. Em determinados momentos ela foi a estimuladora do

crescimento científico e em outros, como no período medieval, ela se tornava

anticientífica.

No entanto, a partir do século XIV a Europa sofreu fortes mudanças políticas,

culturais e sociais, durante o Renascimento e a Reforma, incluindo a substituição

das monarquias por estados-nações. Surgiu uma aristocracia comercial, atrelada à

inovação das instituições econômicas, que passou a se opor a aristocracia da igreja

e da nobreza rural, além do bem sucedido movimento provocado por Lutero e

Calvino. Tudo isso acabou por contribuir também para a aceitação da inovação

proposta por Copérnico.

Aquele período foi marcado pelas descobertas de novos territórios, como a

costa da África e as Américas, através das grandes navegações que passavam a

exigir melhores mapas e técnicas de navegação para o sucesso das viagens. Neste

sentido, o conhecimento sobre os céus passou a ser cada vez mais buscado,

exigindo astrônomos mais competentes.

Kuhn (2002, p.141) comenta a respeito desse período que:

Os homens aprenderam rapidamente o quão estavam erradas as antigas descrições sobre a forma da Terra. Em particular aprenderam como Ptolomeu podia estar errado, pois Ptolomeu fora o maior geógrafo assim como o maior astrônomo e astrólogo da antiguidade.

O fato de o homem poder corrigir a geografia ptolomaica foi um prenuncio

para mudanças que estariam para ocorrer.

39

Um outro fato importante diz respeito à necessidade da reforma do calendário

Juliano. Já solicitada pelo menos desde o século XIII, entrou em um curso de

exigência ainda mais acirrada no século XVI pelas instituições políticas, econômicas

e administrativas daquela época, que buscavam uma forma eficaz de estabelecer

datas.

Neste sentido, a igreja toma para si esta necessidade, buscando em

Copérnico a reforma deste calendário. No entanto, Copérnico solicitou adiamento

desta reforma, pois ele sabia que as bases da astronomia (ptolomaica) não

permitiriam a construção de um calendário mais confiável. Ele alegava que os

matemáticos estavam inseguros em relação ao movimento do Sol e da Lua e que

não conseguiam explicar sequer o ano sazonal, ou seja, havia uma necessidade de

uma reforma na astronomia.

Outra influência importante sobre o pensamento de Copérnico estava ligado

ao movimento humanista do Renascimento e não que esse movimento defendesse

necessariamente a ciência, mas porque de alguma forma começou a produzir cortes

sobre a ciência ptolomaica, levando também os cientistas renascentistas a uma

tendência transcendental. Copérnico e seus sucessores8 passaram a crer na

possibilidade de que os fenômenos estivessem ligados a uma geometria e a uma

aritmética simplificada e regular e a uma nova visão de que o Sol seria a fonte das

forças e dos princípios vitais do universo.

Fruto desta corrente neoplatônica do movimento humanista, Copérnico em

sua obra De Revolutionibus Orbium Caelestium (Sobre a Revolução dos Corpos

Celestes) reafirma seu pensamento heliocêntrico quando diz:

No centro de tudo, está o Sol entronado. Neste belíssimo templo, poderíamos nós colocar esta luminária noutra posição melhor de onde ela iluminasse tudo ao mesmo tempo? Ele é corretamente chamado a Lâmpada, a Mente, o Governante do Universo; Hermes Trimegisto chama-lhe o Deus Visível, a Eletra de Sócofles chama-lhe O que tudo vê. Assim, o Sol senta-se como que num trono real governando os seus filhos, os planetas que giram à sua volta. (KUHN, 2002, p.147)

8 Galileu e Kepler que defenderam o trabalho de Copérnico receberam também esta influência humanista.

40

O modelo estabelecido por Copérnico tinha, então, o Sol como centro. No

entanto é bom destacar a premissa metafísica da revolução copernicana comentada

por Pooper (apud SILVEIRA, 2002, p.408, grifo no original)

“Sua idéia de colocar o Sol, em lugar da Terra, no centro do universo, não resultou de novas observações, mas sim de uma nova interpretação de fatos bastante conhecidos há muito tempo, à luz de concepções semi-religiosas, platônicas e neoplatônicas” [...]. Para os platônicos e neoplatônicos o Sol “tem a mesma função no universo das coisas visíveis do que a idéia do bem no universo das idéias”.[...] O Sol, por conferir, luz, vitalidade, crescimento e progresso às coisas visíveis, deve ocupar o status mais elevado na ordem das coisas da natureza. “Se o Sol tinha um papel tão importante, se merecia o status de divino (...), não poderia girar em torno da Terra. O único local apropriado para uma estrela de tal nobreza era o centro do universo. Por isso, a Terra devia girar em volta do Sol”.

Copérnico desenvolveu sua teoria em um período em que alguns líderes

religiosos, como seu tio, um bispo de Frauenburg, se mostravam abertos a outras

concepções, ainda que a igreja tomasse como verdade os princípios aristotélico-

ptolomaicos, segundo Braga; Guerra; Reis (2004) “raros eram os religiosos que

tinham objeções ao sistema centrado no sol”, inclusive o papa Clemente VII expôs a

teoria de Copérnico em 1533 para toda cúria romana e o papa Paulo III, seu

sucessor, continuou incentivando-o e para isso até solicitou ao cardeal Shonberg a

escrever ao astrônomo, em 1536, a fim de obter o manuscrito de seu livro (De

Revolutionibus Orbium Caelestium) para ser publicado com o aval da igreja, o que

não ocorreu.

No entanto, as reações iniciais contrárias ao modelo copernicano vieram de

Lutero e Calvino, revolucionários protestantes, ao considerarem o heliocentrismo

uma afronta às sagradas escrituras. O prefácio apócrifo da obra De Revolutionibus

Orbium Caelestium, escrito pelo luterano Andréas Osiander, afirmava que as

hipóteses da obra não representariam a verdade do universo e serviam apenas para

facilidade dos cálculos astronômicos.

No século XVII, os papeis dos protestantes e dos católicos se invertem. Os

protestantes passam a aceitar a hipótese copernicana como verdade e a igreja

católica é que passa a condenar o heliocentrismo, inclusive incluindo a obra de

Copérnico no Índex (dos livros proibidos de serem lidos).

41

Apesar de Copérnico ter construído um modelo mais simples que o de

Ptolomeu, ou seja, que necessitava de menos recursos geométricos, ambos eram

praticamente equivalentes no que diz respeito às previsões dos movimentos dos

planetas, de acordo com as observações da época. O modelo proposto por

Copérnico, como ilustra a Figura 12, ainda mantinha a estrutura geométrica do

modelo ptolomaico: as órbitas ainda eram circulares e os movimentos uniformes.

Ainda eram necessários epiciclos, mas em menor número, para ajustar os

movimentos às observações.

Figura 12 - Ilustração do Modelo Copernicano O modelo cosmológico de Copérnico simplificava as coisas ao colocar os planetas, inclusive a Terra, orbitando circularmente ao redor do Sol, no centro. Fonte: (www.library.rdg.ac.uk/.../copernicusdiagram.jpg)

No entanto, o sistema proposto por Copérnico em sua essência iria impor

mudanças significativas no mecanismo do Universo. De acordo com Braga; Guerra;

Reis (2004, p.72):

O movimento dos astros deixava de estar ligado ao primeiro motor aristotélico, situado além da esfera das estrelas fixas,e passava a depender da distância dos planetas em relação ao sol. Fora isso, ao colocar a Terra longe do centro do universo, apenas como um simples planeta, Copérnico impunha uma revisão da Física aristotélica. Os corpos pesados continuavam caindo em direção a Terra, mas esta não estava mais no centro. Era preciso,então, para aceitar o sistema copernicano admitir que a Terra era o centro de sua própria gravidade, uma vez que a queda dos

42

corpos não se dava mais para o centro do universo, agora ocupado pelo Sol.

Percebe-se, portanto, que a aceitação do sistema copernicano não significava

tão somente a substituição da Terra pelo Sol. Implicava na elaboração de uma nova

Física, capaz de explicar diversos fenômenos, que a ciência aristotélica explicava

naquela época.

Nesse sentido, a revolução copernicana somente aconteceu com os

seguidores, simpatizantes e adeptos como: Tycho Brahe (apesar dele não ter

aceitado o sistema copernicano em sua totalidade), Kepler, Galileu, Newton entre

outros, que fizeram ajustes e buscaram explicações capazes de confirmar que o

modelo copernicano era o que mais se adequava à realidade do universo. A

contribuição de Galileu (1564-1642) foi decisiva, pois com a invenção e o uso da

luneta e o seu olhar para o céu tornou-se um defensor público das idéias

copernicanas, enfrentando inclusive o poderio da igreja católica. As pesquisas de

Newton (1643-1727), por sua vez, foram primordiais para o estabelecimento das leis

que regem a gravitação universal.

Em síntese, o modelo proposto por Copérnico não parecia alterar na prática o

entendimento dos fenômenos relacionados com o sistema Terra-Lua-Sol-Esfera das

estrelas, porém deixou margem para que outros interpretassem seu modelo,

produzindo modificações e implementando-o a fim de provocar de fato a revolução

copernicana.

Nos dias de hoje, as pesquisas científicas aliadas aos recursos tecnológicos

não deixam dúvidas não só das hipóteses levantadas pelos sucessores

copernicanos, mas também que o universo é um espaço a ser conquistado pelo ser

humano em muitos âmbitos, principalmente naquele associado ao conhecimento

científico.

Convém refletir, no entanto, que o entendimento dessa forma de pensar o

movimento Terra-Lua-Sol, segundo um modelo heliocêntrico, não é tão elementar.

Primeiro, porque pelos fatos históricos associados, podemos perceber a forte

43

tendência do observador de tomar a Terra como referência (ponto fixo), corroborado

ainda pelo convívio em nosso dia-a-dia de variados fenômenos que percebemos do

ponto de vista da Terra como: o movimento do Sol, a presença das estrelas durante

a noite, a sucessão do dia e da noite na Terra, as fases da Lua, os eclipses, entre

outros. Segundo, porque não é possível deduzir o modelo heliocêntrico tomando

como base a nossa percepção sensorial. Nesse sentido, o presente estudo procurou

compreender como estudantes da EJA pensam e constroem seus conhecimentos a

respeito do movimento Terra-Lua-Sol.

44

3 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA)

Neste capítulo apresento um breve histórico de como se estabeleceu a EJA

no Brasil, buscando caracterizar não só a sua fundamentação legal como o perfil do

educando que participa dessa modalidade de ensino. Também aponto a

necessidade de uma reflexão, por parte dos professores e gestores que lidam com

essa modalidade da educação, sobre realidade vivenciada por esses estudantes.

Embora a discussão sobre o analfabetismo no Brasil venha desde a Colônia e

o Império, somente no século XX, em especial nos anos de 1940, passou a ser visto

como um problema nacional, pois os dados censitários daquele ano evidenciaram

índices de 55% de analfabetos para a população de 18 anos ou mais (FÁVERO,

2004).

Após o período da ditadura de Vargas, entre 1937 e 1945, e com o

movimento de redemocratização aliado às iniciativas da Organização das Nações

Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a União lança a primeira

Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA) em plano nacional, em

1947. No mesmo ano aconteceu o I Congresso Nacional de Educação de Adultos,

com o slogan: “ser brasileiro é ser alfabetizado”. Suas ações, entretanto, se

restringiam à alfabetização, embora sua proposta visasse uma educação mais

ampla, compreendendo a aprendizagem da leitura e da escrita, as operações

elementares de cálculo, as noções básicas de cidadania, higiene e saúde, geografia

e história pátria, puericultura e economia doméstica para as mulheres (FÁVERO,

2004).

Além da ação integrada com os governos estaduais e municipais, a

campanha também contava com a colaboração da sociedade civil organizada como

as igrejas, organizações culturais e esportivas para o atendimento das populações

consideradas analfabetas (FÁVERO, 2004).

45

Segundo Paiva (1970), no Brasil, até a Segunda Guerra Mundial, a educação

de adultos foi integrada à educação chamada popular, isto é, uma educação para o

povo, que significava a difusão do ensino elementar.

Com a elaboração da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional, promulgada em 1961, vieram novas funções para a educação brasileira,

gerando nova perspectiva para a educação básica e para a educação de

adolescentes e adultos, em particular (BRASIL, 1961).

A proposta dos sociólogos e técnicos de educação do Ministério da Educação

e Cultura / Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (MEC/Inep) era reestruturar

todo o sistema municipal de ensino, regularizando a matrícula das crianças de sete a

dez anos e criando classes emergenciais para os adolescentes que não tiveram

acesso à escola naquela idade ou dela tenham saído precocemente, sendo

organizadas classes de alfabetização para jovens e adultos analfabetos (FÁVERO,

2004).

Com esses objetivos, foram iniciadas experiências-piloto em alguns

municípios das regiões brasileiras, como em Santarém – PA. Entretanto, essa

proposta teve curta duração (MOREIRA, 1960 apud FÁVERO, 2004).

Um novo entendimento do problema do analfabetismo já havia sido percebido

no II Congresso Nacional de Educação de Adultos, em 1958. Um dos seus relatores,

Paulo Freire, refletiu sobre a educação de adultos e as populações marginais dos

mocambos – as favelas nordestinas construídas sobre palafitas – em Pernambuco,

inserindo as causas do analfabetismo nos problemas sócio-econômicos da região e

na ausência das escolas primárias (FREIRE et al, 1958).

A partir desse Congresso, surgiu a idéia de um programa permanente de

enfrentamento do problema da alfabetização, que desembocou no Plano Nacional

de Alfabetização de Adultos, dirigido por Paulo Freire e extinto pelo Golpe de Estado

de 1964, depois de um ano de funcionamento. A educação de adultos era entendida

a partir de uma visão das causas do analfabetismo, como educação de base,

articulada como “reformas de base”, defendidas pelo governo popular/populista de

46

João Goulart. Os CPCs (Centro Populares de Cultura), extintos logo depois do golpe

militar de 1964, e o MEB (Movimento de Educação de Base), apoiado pela Igreja e

que durou até 1969, foram profundamente influenciados por essas idéias (GADOTTI,

1995). O MEB tinha como meta implantar, no primeiro ano de funcionamento, quinze

mil escolas radiofônicas para a alfabetização de cerca de 500 mil pessoas

(FÁVERO, 2004).

Em 1962, por iniciativa da Prefeitura de Recife e com o apoio da União, foi

criado o Movimento de Cultura Popular (MCP), que realizou a proposta de

atendimento educacional tanto para crianças quanto para adultos. Com o MCP

nasceu o Sistema Paulo Freire de Alfabetização de Adultos, o qual recusou o

sistema de trabalho da escola tradicional e transformou a aula em um debate, o

professor em um animador e a educação de adultos em um movimento de

conscientização (FÁVER0, 2004).

Com o golpe de 1964, os movimentos de educação e cultura popular do início

dos anos 60 foram desmobilizados. Apenas o MEB continuou, com sacrifícios,

tentando firmar-se na Amazônia. Após 1964, nasce a Cruzada ABC – Ação Básica

Cristã - um movimento conservador dos missionários protestantes do Recife,

sustentado por verbas da Aliança para o Progresso, e impulsionado pela distribuição

dos Alimentos para a Paz. Fortemente proselitista e em clara oposição ao Sistema

Paulo Freire, a Cruzada ABC reeditou as cartilhas de alfabetização e os livros pós-

alfabetização utilizadas pela CEAA nos anos 1950. Sua tarefa era neutralizar as

idéias difundidas pelas campanhas anteriores, principalmente em relação àquelas

inspiradas nas orientações do pensamento marxista. A Cruzada ABC foi substituída

em 1970 pelo MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização) que, por sua vez,

permaneceu até 1985 (MENEZES e SANTOS, 2002).

O MOBRAL foi criado pela Lei número 5.379, de 15 de dezembro de 1967,

propondo a alfabetização funcional de jovens e adultos, visando "conduzir a pessoa

humana a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a

sua comunidade, permitindo melhores condições de vida" (BRASIL, 1968; CORRÊA,

1979).

47

Buscando novas saídas para garantir sua continuidade, o MOBRAL foi se

modificando aos poucos. Assim, depois do começo com a campanha de

alfabetização de adultos, descobriu que a Lei de sua implantação referia-se à

"educação continuada de adolescentes e adultos" e criou o Plano de Educação

Continuada para Adolescentes e Adultos. A partir daí, vários outros programas foram

criados, como o Programa de Educação Integrada, o Programa Cultural, o Programa

de Profissionalização, o Programa de Diversificação Comunitária, o Programa de

Educação Comunitária para a Saúde, o Programa de Esporte e o Programa de

Autodidatismo (BELLO, 1993).

Dessa forma, a Lei de Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus –

LDB 5692 / 71 (BRASIL,1971), sancionada em 1971, apesar de representar algum

avanço, por contemplar o caráter supletivo da EJA, destinava-se a suprir a

necessidade escolarização regular de jovens e adultos que não a tinham concluído

na idade própria. Porém, na sua essência, não diferia dos objetivos do MOBRAL

com relação a profissionalização para o mercado de trabalho e pela percepção de

que a leitura e a escrita figuravam apenas como uma decodificação de signos.

Contudo, somente com a Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional – LDB 9.394 / 96 (BRASIL, 1996), um novo cenário na

educação brasileira tomou corpo no aparato legal, à semelhança de um movimento

que vinha ocorrendo em outros países. No âmbito internacional, a Declaração de

Educação Básica para Todos – crianças, jovens e adultos, de Jomtien, na Tailândia,

1990, entendeu que a alfabetização de jovens e adultos seria uma primeira etapa da

educação básica, trazendo a idéia de que a alfabetização não podia ser separada da

pós-alfabetização, isto é, separada das “necessidades básicas de aprendizagem”.

Posteriormente viria a V Conferência de Educação de Adultos (V Confitea), em

1997, Hamburgo (Alemanha), firmando a Declaração de Hamburgo e a Agenda para

o Futuro (UNESCO, 1997).

Dessa forma, duas vertentes importantes passaram a configurar a educação

de jovens e adultos pós-Hamburgo. A primeira, a da escolarização, assegurando o

direito à educação básica a todos os sujeitos, independente da idade, por passar a

ser vista a educação como direito humano fundamental. A segunda, a da educação

48

continuada, entendida pela exigência do aprender por toda a vida, independente da

educação formal, incluindo-se nessa vertente as ações educativas de gênero, de

etnia, de profissionalização, questões ambientais etc..., assim como a formação

continuada de educadores, estes também jovens e adultos em processo de

aprendizagem. Essa vertente passou a constituir o verdadeiro sentido do EJA, por

ressignificar os processos de aprendizagem pelos quais os sujeitos se produzem e

se humanizam, ao longo de toda a sua vida (PAIVA, 2004).

O Parecer da CEB/CNE 11/2000 (Câmara de Educação Básica / Conselho

Nacional de Educação) explicita para o EJA três funções: a reparadora (que

desenvolve a escolarização não conseguida quando criança); a equalizadora (que

cuida de pensar politicamente a necessidade de oferta maior para quem é mais

desigual do ponto de vista da escolarização); a qualificadora (entendida como o

verdadeiro sentido da EJA, por possibilitar o aprender por toda a vida, em processos

de educação continuada) (BRASIL, 2000).

Um aspecto a considerar sobre a EJA é que, embora no início dos anos 40,

época em que começou a sistematização desse tipo de ensino em nosso país, o

perfil das pessoas que procuravam esta modalidade de ensino situava-se entre os

mais adultos, na atualidade um novo sujeito vem se configurando ao longo dos anos:

a juventude, uma vez que os jovens buscam cada vez mais cedo um posto no

mercado de trabalho (ANDRADE, 2004).

Embora a presença de jovens seja cada vez mais preponderante nessa

modalidade de ensino, o que a tem caracterizado é o desacordo entre a faixa etária

desses estudantes e a correspondente escolaridade na modalidade regular. Alia-se

a isto, o insucesso durante a vida estudantil provocado por constantes reprovações

e abandonos de estudos.

Há que se entender, no entanto, que atualmente, embora seja claro que a

educação de jovens e adultos tenha a função de formar para a cidadania e preparar

para o mundo do trabalho, funções estas diversas para os adultos e para os jovens,

as escolas não estão preparadas para trabalhar com estas diferenças. Elas ainda

49

reproduzem, tanto nos cursos regulares noturnos como nos supletivos, as mesmas

práticas e as mesmas normas usadas para crianças (FÁVERO, 2004).

Nesse sentido, a escola deve oportunizar medidas estimuladoras e igualitárias

a fim de que os educandos da EJA possam ter acesso a um conhecimento, que

possa ser construído levando-se em conta os seus saberes prévios, as suas

histórias de vida e as informações do seu dia-a-dia. Servindo esses saberes de

ponto de partida para a construção de novos conhecimentos.

O professor por sua vez deve refletir a própria prática observando que muitas

metodologias utilizadas no ensino regular são pouco eficientes quando aplicadas na

EJA. Além disso, é necessário que se mostrem sensíveis às questões de ordem

social a que estão submetidos os referidos alunos, seja pela discriminação, seja pela

disponibilidade de tempo tantas vezes escassa em função da jornada de trabalho

diária quase sempre superior a oito horas.

O conhecimento do aluno, os conteúdos selecionados e a capacidade de

compreensão e interação com a reorganização do conhecimento são os principais

aspectos a serem observados pelo professor que está envolvido com essa

modalidade de ensino, segundo Piconez (2003). Dessa forma, o professor precisa

se fazer um mediador do conhecimento socializado e desenvolvido em sala de aula.

O poder público precisa não só oferecer a estrutura em todos os seus

aspectos (física, recursos materiais, financeiros e etc.) para dar suporte às escolas,

como também promover a formação continuada de professores visando melhor

capacitá-los para trabalharem com essa modalidade de ensino.

A EJA não deve se constituir como um ensino de segunda categoria ou de

segunda mão, como comenta Lobo e Carvalho (2004), mas precisa se configurar em

uma modalidade de ensino supletivo em que os elementos envolvidos, alunos e

professores, se sintam estimulados, valorizados e tenham confiança de que estão

construindo o conhecimento de forma significativa, a fim de oportunizar a melhoria

da qualidade educacional.

50

Mediante o acima exposto, percebe-se a necessidade de reformular

estratégias, construir novas formas de mediação da aprendizagem, compreender

melhor a realidade vivenciada pelos alunos do EJA a fim de se obter, de uma forma

mais plena, os reais propósitos da educação para este grupo de educandos.

51

4 COMPREENDENDO OS PRESSUPOSTOS DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL

Este capítulo tem por objetivo levantar, junto à teoria histórico-cultural de

Vygotsky e seus colaboradores, elementos que subsidiem a análise do processo

ensino-aprendizagem dentro do contexto escolar.

Assevera Damazio (1997) que o cotidiano escolar vem se transformando num

espaço onde é possível perceber as regularidades e as contradições sociais uma

vez que convivem nele pessoas e classes sociais com experiências e histórias

singulares, individuais e coletivas. Essas pessoas fazem parte de espaços culturais

particulares, que são determinantes das diferenças de seu pensamento e

comportamento, além das suas diferenças de ordem orgânica e física.

Quero, portanto tomar o comentário de Freitas (1994, p.322), a partir das

idéias de Vygotsky e Bakhtin, ao fazer referência ao espaço escolar como um

ambiente de construção de conhecimento:

[...] pode-se pensar numa nova dimensão do espaço escolar que possibilita a manifestação da diferença dos modos e esquemas de construção do conhecimento acompanhada de um trabalho pedagógico que se transforma numa ação compartilhada, num espaço de elaboração conjunta. Ao se valorizar essa interação dialógica, o aluno não é mais um agente passivo e receptivo, mas um sujeito que age e, pelo seu discurso, se faz ouvir, recriando-se no seio de outras vozes. A visão compartilhada, permeando o espaço pedagógico, humaniza o processo educacional.

A escola precisa ser vista também como um espaço onde o conhecimento

deva ser construído e reconstruído dentro de uma perspectiva histórico-cultural e,

nesse espaço, o ensino da Física precisa se encaixar. As concepções científicas

sofreram transformações ao longo do tempo tornando-se cada vez mais formais e

fazendo uso de uma linguagem nem sempre acessível a todos. Então, os

profissionais da área do ensino da Física devem mover ações diferenciadas, em

suas aulas, a fim de promover o desenvolvimento das concepções cientificas no

pensamento de seus educandos.

Como este trabalho visa analisar como estudantes da 1ª Etapa do ensino

médio da EJA (Educação de Jovens e Adultos) constroem seus conceitos sobre

52

fenômenos relacionados aos movimentos do sistema Terra-Lua-Sol, a luz da Teoria

Histórico-Cultural de Vygotsky, convém compreender como o referido teórico

concebe a relação entre o conceito científico e o conceito não-científico.

Para Vygotsky (2000, p.107) os conceitos científicos ou não-espontâneos são

aqueles adquiridos como conseqüência de um ensino formal (escolar, por exemplo)

enquanto os conceitos espontâneos ou cotidianos (não-científicos) são provenientes

da experiência individual de cada pessoa no seu meio social. Segundo o referido

autor e seus seguidores, esses dois tipos de conceitos constroem-se em sentidos

opostos:

o desenvolvimento dos conceitos espontâneos da criança é ascendente, enquanto o desenvolvimento de seus conceitos científicos é descendente, para um nível mais elementar e concreto. (VYGOTSKY , 2000, p.135, negrito meu)

No entanto, esses conceitos são intimamente interligados uma vez que se faz

necessário, por um lado, que o conceito espontâneo atinja um determinado nível de

abstração para que a criança possa conceber um conceito científico correspondente.

Por outro lado, é necessário que o conceito científico se relacione a vivências

concretas a fim de não se tornar apenas uma forma verbal vazia

Fica claro, portanto que os conceitos científicos podem ser adquiridos em

atividades que levam os educando ao pensamento científico, sendo a escola um dos

ambientes propícios para esse fim, enquanto que os conceitos espontâneos são

adquiridos em atividades hodiernas, baseada no “senso comum” e na percepção

sensorial do aprendiz ,

Os conceitos científicos não são aprendidos de forma mecânica, como

comenta Vygotsky (2000, p.107):

O desenvolvimento dos conceitos não espontâneos tem que possuir todos os traços peculiares ao pensamento em cada nível do desenvolvimento, porque esses conceitos não são aprendidos mecanicamente, mas evoluem com a ajuda de uma vigorosa atividade mental por parte da própria criança.

A distinção entre as duas concepções é que na espontânea a atenção do

aprendiz

53

gira em torno do objeto representado e não do ato de pensamento que o capta. Contrariamente, os conceitos científicos, que se relacionam de modo muito diferente com o objeto, estão mediatizados por outros conceitos graças ao seu sistema hierárquico interno de interrelações. (VYGOTSKY, 2000).

Podemos considerar o ambiente escolar como um palco para o aprendizado

de conhecimentos científicos e a sala de aula, um cenário onde alunos e professor

são os atores de uma peça, cujo tema é o “conhecimento”. No espetáculo a ser

encenado, eles podem interagir e negociar de tal maneira que seja possível produzir

a construção do conhecimento. Neste caso, o professor passa a ter o papel de

mediador no processo ensino aprendizagem.

Em seus estudos, Vygotsky buscou compreender de que maneira ocorria o

processo de desenvolvimento das funções cognitivas e do pensamento do homem

inserido em uma realidade histórica e cultural. Ele estabeleceu que a interação entre

as pessoas era a gênese do desenvolvimento cultural necessário para formação do

indivíduo e para o desenvolvimento histórico da espécie humana. Neste contexto,

Vygotsky buscou não só o entendimento da maneira como funcionam as funções

psicológicas superiores, mas também de que forma as funções psicológicas

elementares vão sendo transformadas, a partir da internalização de sistemas de

signos por mediação cultural, em funções psicológicas superiores.

As funções psicológicas elementares partem de uma linha de origem

biológica, enquanto as superiores de uma linha essencialmente cultural, porém

essas linhas são imbricadas no desenvolvimento cognitivo do ser humano. Uma

distinção bastante clara entre essas funções é aquela feita por Oliveira (1993, p.26):

O ser humano tem a possibilidade de pensar em objetos ausentes, imaginar eventos nunca vividos, planejar ações a serem realizadas em momentos posteriores. Esse tipo de atividade psicológica é considerado “superior” na medida em que se diferencia de mecanismos elementares tais como ações reflexas (a sucção do seio materno pelo bebê, por exemplo), reações automatizadas (o movimento da cabeça na direção de um som forte repentino, por exemplo) ou processos de associações simples entre eventos (o de evitar o contato da mão com a chama de uma vela, por exemplo).

No estudo de Vygotsky o conceito de mediação é de fundamental importância

para o entendimento do processo psicológico superior. Segundo Oliveira (1993,

54

p.26) mediação é “o processo de intervenção de um elemento intermediário numa

relação”, ele toma o exemplo de aproximar a mão da chama de uma vela, se o

individuo retira a mão rapidamente no momento em que sentiu a dor a relação é dita

direta, se, porém, o individuo retira a mão por que alguém lhe disse que sua mão

poderia queimar, então a relação é dita mediada.

As funções psicológicas superiores resultam, portanto de estímulos artificiais

(elementos mediadores) através dos quais o homem pode controlar-se e regular-se

no meio social em que se encontra. Já nas funções elementares a relação do

individuo com o meio ocorre de forma direta a partir das impressões imediatas que

ele tem do ambiente.

Os elementos mediadores que vão possibilitar o desenvolvimento de ordem

cultural no ser humano, segundo Vygotsky, são os instrumentos e os signos.

A idéia de instrumento está atrelada à concepção marxista. Vygotsky

entendeu o instrumento como sendo um elemento interposto entre o trabalhador e o

objeto de seu trabalho, ampliando as possibilidades de transformação da natureza.

A foice, por exemplo, corta muito mais e melhor a plantação que a mão humana,

sendo, portanto um mediador entre o homem e a natureza.

Se por um lado os instrumentos relacionam o trabalho com a transformação

da natureza, por outro lado os signos se comportam como instrumentos da atividade

psicológica e podem ser definidos como:

elementos que representam ou expressam outros objetos, eventos, situações. A palavra mesa, por exemplo, é um signo que representa o objeto mesa; o signo 3 é o símbolo para a quantidade três; o desenho de uma cartola na porta de um sanitário é um signo que indica ‘aqui é o sanitário masculino’. (OLIVEIRA, 1993, p.30)

Estímulo

Mediada

Resposta Direta

55

A utilização de signos como instrumentos psicológicos têm inúmeras

aplicações a fim de auxiliar nas atividades mentais tais como fazer uma planilha de

tarefas para um dia de trabalho, ou utilizar um mapa para encontrar uma cidade

durante uma viagem. Esse uso pode produzir um acréscimo na atenção e na

memória, levando o individuo a certa autonomia.

No estudo da formação dos conceitos científicos, como é o caso da presente

dissertação, a palavra tem papel prioritário, pois neste caso ela é o signo que faz a

mediação no processo psicológico superior. Nas palavras do próprio Vygotsky:

Na formação de conceitos, esse signo é a palavra, que no principio tem papel de meio na formação de um conceito e posteriormente, torna-se o seu símbolo (VYGOTSKY, 2000, p.70)

Para Vygotsky, na relação entre pensamento e linguagem o significado é o

componente essencial da palavra e é ao mesmo tempo, um ato de pensamento,

uma generalização e onde o pensamento e a fala se unem em um pensamento

verbal.

Para Vygotsky o significado de uma palavra representa:

um amalgama tão estreito do pensamento e da linguagem, que fica difícil dizer se se trata de um fenômeno da fala ou de um fenômeno do pensamento. Uma palavra sem significado é um som vazio; o significado, portanto, é um critério da ‘palavra’, seu componente indispensável. Pareceria, então, que o significado, poderia ser visto como um fenômeno da fala. Mas, do ponto de vista da psicologia, o significado de cada palavra é uma generalização ou um conceito. E como as generalizações e os conceitos são inegavelmente atos de pensamento, podemos considerar o significado como um fenômeno do pensamento. Daí não decorrer, entretanto, que o significado pertença formalmente a duas esferas diferentes da vida psíquica. O significado das palavras é um fenômeno de pensamento apenas na medida em que o pensamento ganha corpo por meio da fala, e só é um fenômeno da fala na medida em que esta é ligada ao pensamento, sendo iluminada por ele. É um fenômeno do pensamento verbal, ou da fala significativa - uma união da palavra e do pensamento. (VYGOTSKY, 2000, p.150)

Como é no significado que se imbrica o intercâmbio social e o pensamento

generalizante (funções básicas da linguagem) ele vai estabelecer a mediação

simbólica entre o homem e mundo real constituindo o que Oliveira (1993) chama de

56

“filtro” através do qual o indivíduo é capaz de compreender o mundo e agir sobre ele.

O sistema de relações e generalizações imbuídas em uma palavra altera-se

ao longo do desenvolvimento do ser humano: uma criança ao aprender a palavra

“Lua” pode utilizar a mesma palavra para relacionar com um “lustre” aceso durante a

noite, mas à medida que vai interagindo com pessoas mais experientes (adultos e

crianças mais velhas) vai conseguindo distinguir uma coisa da outra, até que

consiga aprender que a Lua é um satélite natural da Terra.

Considero neste contexto que um adulto, como é o caso dos sujeitos desta

pesquisa, que não tenha tido a oportunidade de discutir os conceitos relacionados

aos fenômenos associados com a gravitação ou a astronomia dentro de um cunho

cientifico escolar, traz para escola, apenas as concepções do senso comum. Ao se

incluir em um ambiente escolar, por exemplo, seus sistemas de relações e

generalizações se alteram com o seu aprendizado, resultando em desenvolvimento

intelectual.

Do ponto de vista de Vygotsky, o grande mediador, que faz emergir o

processo mental superior é o “sistema de signos”, que tem origem social elaborada

no decorrer da evolução histórica e cultural da espécie humana. Os signos são de

natureza cultural e tem caráter convencional e arbitrário. Apropriamo-nos e os

usamos em situações de interação social com outras pessoas que já os dominam e

são capazes de transmiti-los para nós e é exatamente isso que justifica a tese da

origem social dos processos psicológicos superiores. (SALVADOR, 1999).

Vygotsky argumenta que todos os processos psicológicos superiores surgem

primeiramente no âmbito das relações sociais sob a forma de processos

interpsicológicos (intermentais) até que se transformem em processos

intrapsicológicos (intramentais), ou seja, primeiramente são regulados e controlados

a partir da interação social com outras pessoas até que sejam regulados e

controlados pelo próprio indivíduo. Este processo é denominado de processo de

internalização.

57

A internalização, que compreende essa passagem de uma função a partir do

plano social até o plano mental, ocorre quando o indivíduo (uma criança por

exemplo) começa a usar sozinho os signos que utilizou anteriormente com outras

pessoas mais experientes (um adulto por exemplo) para regular a atividade.

Vygotsky considera este fato como lei genética geral do desenvolvimento cultural. A

terminologia “genética” tem sentido de origem, e a lei pode ser enunciada como:

Qualquer função no desenvolvimento cultural da criança aparece em cena duas vezes, em dois planos - primeiro social, depois psicológico, primeiro entre as pessoas como categoria interpsicológica, depois – dentro da criança ( VYGOTSKY, 1929, p.26)

A internalização deve ser compreendida como um processo de reconstrução

interna de uma atividade externa, não representando um processo passivo de cópia,

ao invés disso deve ser entendida como um processo onde criamos e modificamos o

funcionamento intramental a partir da reconstrução das formas de mediação e dos

processos utilizados na atividade conjunta ou intermental.

No contexto escolar, as interações professor/aluno e aluno/aluno são de

fundamental importância na (re)construção de conceitos. Deve-se estimular a

participação dos estudantes, uma vez que a (re)construção do conhecimento ocorre

primeiro no plano social para depois ocorrer no plano psicológico.

Dentro do entendimento do processo de internalização, segundo Oliveira

(1993) Vygotsky estabeleceu o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal

(ZDP), que pode ser compreendido como uma região dinâmica em que se realiza a

transição desde o funcionamento intermental até o intramental. Neste particular é

possível defini-la como a diferença que existe entre o nível das atividades que o

individuo é capaz de fazer com a ajuda de outras pessoas e o nível das atividades

que ele pode efetuar de forma independente.

A partir da definição de ZDP distingue-se dois níveis de desenvolvimento: um

relacionado com as capacidades que o individuo já adquiriu e utiliza de forma

individual autonomamente (processos intramentais), que Vygotsky denominou de

Nível de Desenvolvimento Real (NDR) e outro limitado pela capacidade que o

58

indivíduo tem a adquirir e que ele é capaz de realizar mediado pela orientação,

colaboração e ajuda de outras pessoas mais instruídas (processos intermentais),

que Vygotsky denominou de Nível de Desenvolvimento Potencial (NDP).

A Figura 13, abaixo, procura ilustrar de forma gráfica a idéia da zona de

desenvolvimento proximal (ZDP), de nível de desenvolvimento real (NDR) e do nível

de desenvolvimento potencial (NDP), inferindo a configuração de internalização a

partir das leituras feitas sobre a teoria de Vygotsky.

Figura 13 – Esquema do processo de internalização

Uma pessoa pode apresentar diferentes níveis de desenvolvimento potencial

e, portanto adentrar em diferentes ZDPs dependendo de com quem e de que forma

interage. Segundo Salvador (1999, p.108):

as pessoas não possuem um único nível geral de desenvolvimento potencial, mas diferentes níveis- e diferentes ZDPs possíveis- em relação a diferentes âmbitos do desenvolvimento, tarefas e conteúdos.

Acredito, então, que o espaço de sala de aula torna-se efetivamente um

ambiente em que o educando adentra em diferentes ZDPs a partir da mediação

produzida nas interações professor-aluno e aluno-aluno e onde a linguagem daquele

ambiente escolar passa a ter significado efetivo na mente e na formação social do

estudante.

Atuação meio Interpsicológico

Atuação meio Intrapsicológico

59

Convém salientar que nesse espaço social (sala de aula), em que ocorrem

processos de construção de conhecimento, as interações não são exclusivamente

“harmônicas”, mas segundo Góes (2001) as interações não só com os colegas, mas

com o professor também, são impregnadas de disputas, antagonismo e

qualificações/desqualificações pessoais, apesar da ocorrência de momentos de

parceria e cooperação entre as partes.

Em síntese, o entendimento dos pressupostos da teoria histórico-cultural e

sua aplicação no contexto escolar, a partir dos conceitos de ZDP, internalização e

mediação, torna-se uma alternativa para compreender de que maneira os

estudantes constroem os conceitos científicos escolares no espaço social da sala de

aula.

60

5 OS ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

5.1 Local e Sujeitos da pesquisa

O presente estudo foi desenvolvido em uma turma da primeira etapa da

Educação de Jovens e Adultos, do ensino médio noturno da Escola de Aplicação da

Universidade Federal do Pará. A escola funciona em três turnos do ensino infantil ao

ensino médio, sendo o período noturno destinado à Educação de Jovens e Adultos

(EJA) e ao Curso de Magistério Habilitação em Educação Infantil. A Escola de

Aplicação fica situada no bairro Montese (antiga Terra Firme), periferia da capital

paraense, sendo um dos bairros mais pobres e violentos de nossa cidade, cuja

realidade é bastante conhecida pelos sujeitos da pesquisa.

A turma que participou desta pesquisa iniciou o ano letivo com 39 alunos,

tendo idade variando de 16 a 55 anos sendo 20 do sexo masculino e 19 do sexo

feminino. Nesta pesquisa os alunos foram identificados por três letras maiúsculas

(por exemplo NOÉ, ANA, EDU,...) representando nomes fictícios. Convém salientar

que no início da coleta de informações a turma já estava reduzida a 23 alunos.

Concluíram o ano letivo 20 alunos sendo 19 entre aqueles que haviam participado

do início da coleta de informações e mais um aluno que se agregou a turma durante

o andamento da pesquisa. A evasão tem sido uma constante em turmas que

funcionam no ensino noturno na grande maioria das escolas públicas em nosso pais.

(INEP, 2004).

A pesquisa foi realizada por mim, que sou o próprio professor da disciplina

Física, os encontros foram realizados no horário regular das aulas da turma (uma

vez por semana). Contei também com a ajuda de um estagiário do curso de

licenciatura em física da UFPa que me assessorou durante toda a coleta de

informações. O inicio do levantamento empírico ocorreu no mês de junho de 2005

findando no mês de março de 2006, vale ressaltar que durante esse período além de

uma reforma na estrutura física da instituição ocorreu paralisação dos servidores

públicos por quase quatro meses, o que justifica o término desse levantamento

somente no ano seguinte.

61

5.1.1 Perfil Sócio-Econômico-Cultural dos Sujeitos Desta Pesquisa

Para melhor conhecer o perfil social, econômico e cultural dos estudantes que

constituíram essa turma, objeto dessa pesquisa, foram analisadas as informações

obtidas de um questionário (ver Anexo 2) respondido por 20 alunos da turma 1ª

Etapa do Ensino Médio da Educação de Jovens e Adultos (EJA), durante o ano

letivo de 2005.

Dentre os estudantes que fizeram parte desta etapa da pesquisa, constatei

que a maioria era do sexo masculino (60%), com faixa etária de 16 aos 37 anos,

com maior concentração entre 16 e 20 anos (75%), solteiros (70%), pertencentes à

religião católica (65%), desempenhando algum tipo de atividade remunerada (75%).

As ocupações referidas mais freqüentemente foram autônomos (20%), militar,

atendente e ajudante de pedreiro (10% cada), com renda familiar em torno de um e

dois salários mínimos (40%) (ver Tabelas 1 e 2).

Tabela 1 – Sexo, idade, estado Civil e religião dos estudantes

Fonte: Ficha de investigação: Questionário Sócio-Economico-Cultural (Apêndice B)

Variáveis nº % Sexo

masculino 12 60 feminino

8 40

Idade 75 15 20 ן----ן 16 10 2 25 ן----ן 21 10 2 30 ן----ן 26 0 0 35 ן----ן 31 40 ן----ן 36

1 5

Estado civil solteiro 14 70 casado 2 10

união consensual

4 20

Religião católica 13 65

evangélica 6 30 outros 1 5

62

Tabela 2 – Ocupação e renda familiar dos estudantes

Fonte: Ficha de investigação: Questionário Sócio-Econômico-Cultural (Apêndice B)

No que diz respeito à situação de moradia e saneamento, procedência por

bairro e para a escola, além dos meios de transporte utilizados, 85% reside em casa

própria, 90% possuem saneamento básico (35% completo e 55% incompleto), 45%

procedem do bairro Montese (antiga Terra Firme, onde fica localizada a escola) e

25% do bairro do Marco, 80% vinham direto de casa para escola, 50% utilizavam

ônibus e 50% vinham a pé ou bicicleta até a escola (ver Tabela 3).

Variáveis nº % Ocupação

autônomo 4 20 militar 2 10

atendente 2 10 ajudante de pedreiro 2 10

modelo 1 5 empregado em reprografia 1 5 empregado em lanchonete 1 5

serviços gerais 1 5 dona de casa 1 5

estudante 4 20

Renda familiar até 1 salário mínimo 1 5

entre 1 e 2 salários mínimos 8 40 entre 2 e 3 salários mínimos 2 10 entre 3 e 4 salários mínimos 3 15 entre 4 e 5 salários mínimos 3 15 acima de 5 salários mínimos 4 20

63

Tabela 3 – Situação de moradia, Saneamento e meio de transporte utilizado e procedência para a escola

Fonte: Ficha de investigação: Questionário Sócio-Econômico-Cultural (Apêndice B)

Em relação aos meios de comunicação, todos os participantes relataram

possuir televisão, 95% telefone e 80% aparelho de som. Quanto às atividades de

lazer, a totalidade dos estudantes relatou que escutavam rádio e/ou assistiam

televisão, 75% praticavam esporte, 70% freqüentavam a igreja e 60% liam livros.

Entre as leituras mais referidas eles citavam o jornal, com 40%, bíblia e romance,

com 30% cada conforme é apresentado na Tabela 4.

Variáveis nº % Moradia

Própria 17 85 Alugada 2 10 Cedida 1 5

Saneamento básico Completo 7 35

Incompleto 11 55 não possui

2 10

Procedência por bairro Terra Firme 9 45

Marco 5 25 Pedreira 1 5 Canudos 1 5 Umarizal 1 5

Marambaia 1 5 Coqueiro 1 5

Distrito Industrial

1 5

Procedência para a escola de casa 16 80

do trabalho 3 15 de outro local 1 5

Meios de transporte mais utilizado Ônibus 10 50

a pé 8 40 bicicleta

2 10

64

Tabela 4 – Perfil dos estudantes avaliados quanto aos meios de comunicação e atividades de lazer

Fonte: Ficha de investigação: Questionário Sócio-Econômico-Cultural (Apêndice B)

No que diz respeito à escolaridade de seus ascendentes, 45% dos estudantes

relataram que seus pais têm até o ensino fundamental e somente 10% o superior

completo. Com relação à trajetória escolar do próprio estudante a maioria estudou

em escola pública (85%) no curso regular da primeira e da segunda fase do

fundamental (90% e 75 % respectivamente a cada fase). Vale destacar que 65% dos

estudantes reportaram terem ficado retidos em alguma das séries conforme Tabela

5.

Variáveis nº % Meios de comunicação

televisão 20 100 telefone 19 95

aparelho de som 16 80 DVD 13 65

videocassete 5 25 computador

4 20

Lazer rádio / televisão 20 100

esporte 15 75 igreja 14 70 leitura 12 60

cinema / teatro / show 10 50 internet 9 45 pintura 6 30

passeio

2 10

Leitura jornal 8 40 bíblia 6 30

romance 6 30 revista científica 5 25

gibi 4 20 livro didático 3 15

revista de moda 2 10

65

Tabela 5 – Perfil dos estudantes avaliados quanto a escolaridade de seus pais e quanto a sua própria trajetória escolar.

Fonte: Ficha de investigação: Questionário Sócio-Econômico-Cultural (Apêndice B)

Quando perguntados a respeito do que os motivavam a estudar na EJA, a

maioria relatou a necessidade de um melhor emprego (com 45% das respostas)

seguido do desejo de cursar uma universidade (40%) e apenas 5% fizeram

referência à dificuldade de estudar o ensino regular. Sobre o contato inicial dos

estudantes com temas ligados a astronomia, 50% relatou terem tido esse contato na

escola, 30% fora dela e 20% dizem não terem tido nenhum contato prévio com a

temática, conforme é apresentado na Tabela 6

Variáveis nº % Escolaridade dos pais

ensino fundamental incompleto 4 20 ensino fundamental completo 2 10

ensino médio incompleto 3 15

Ensino médio completo 8 40 ensino superior incompleto 1 5

ensino superior completo 2 10

Trajetória escolar dos sujeitos da pesquisa

Ensino fundamental – primeira fase regular 18 90

supletivo 2 10

escola pública 17 85 escola privada

3 15

Ensino fundamental – segunda fase

regular 15 75

supletivo 5 25

escola pública 17 85

escola privada

3 15

Retido em alguma série

Sim 13 65

não 4 20

não informaram 3 15

66

Tabela 6 – Perfil dos estudantes avaliados quanto aos motivos que o levaram a estudar na EJA e quanto ao contato inicial com a astronomia.

Fonte: Ficha de investigação: Questionário Sócio-Econômico-Cultural (Apêndice B)

5.2 A Coleta de Informações

Na coleta de informações inicial, busquei, em uma primeira aula, através de

um pré-teste9 (ver Apêndice 1) com perguntas abertas e solicitação de desenho,

identificar a concepção prévia dos alunos no sentido de conhecer seu entendimento

sobre a sucessão do dia e da noite na Terra, fenômeno associado ao movimento

Terra-Lua-Sol.

Ainda nesse pré-teste incluí questões, inquirindo os alunos a respeito de sua

idade, sexo, profissão, tempo sem estudar, naturalidade entre outras informações.

Os 23 alunos que participaram desta primeira etapa da coleta de informações

construíram individualmente suas respostas escritas.

A partir dessas respostas escritas, elaborei uma categorização das

concepções prévias observadas (Quadro 1, p.75) cujo objetivo foi de classificar as

respostas dos alunos em níveis de proximidade dos conceitos científicos.

9 No pré-teste também foram incluídas outras perguntas abertas relativas ao movimento Terra-Lua-Sol e que não foram utilizadas para a análise desta pesquisa, tais como: (2) Como você explica o fato de que quando em Belém são 10:00 h, no Rio de Janeiro também será 10:00 h, mas em Santarém será ainda 9:00 h? Ou seja por que os locais têm fusos horários diferentes? ; (3) O que é e como você acha que acontece um eclipse da Lua? E do Sol? Faça um desenho ilustrando suas explicação(ões); (4) Como você explica a existência das fases da Lua? Faça um desenho capaz de ilustrar esse acontecimento.

Variáveis nº % Motivos que o levaram à EJA

melhor emprego 9 45 cursar universidade 8 40

exigência do mercado de trabalho 1 5 compreender melhor a sua realidade 1 5

dificuldade em fazer ensino regular 1 5 “Contatos imediatos com a astronomia”

na escola – 1ª etapa ensino fundamental 6 30 na escola – 2ª etapa ensino fundamental 4 20

fora da escola 6 30 nenhum contato prévio 4 20

67

Em um segundo momento, outra aula, conduzi os alunos para que se

organizassem em grupos espontâneos (a escolha dos componentes de cada grupo

foi feita pelos próprios alunos de acordo com suas afinidades) com no máximo cinco

alunos e no mínimo quatro. Sendo que dos 17 alunos que participaram deste

momento foram formados 3 grupos com 4 alunos e 1 grupo com 5 alunos. Esses

grupos foram denominados de grupos Ge1, Ge2, Ge3 e Ge4.

A estratégia de trabalhar em grupos possibilitou a interação diversificada entre

os alunos e destes com o professor. Esta estratégia também era defendida por

Piaget, ele argumentava que:

a colaboração dos alunos entre si era necessária dada a dificuldade do professor em se fazer compreender ou transmitir diretamente os conteúdos. Segundo o autor, o sujeito é ativo, mas o pensamento racional não está pré-formado. A lógica nasce da discussão com os outros. A formação da personalidade, tanto no sentido de tomada de consciência do eu, quanto no sentido de situar-se entre diferentes perspectivas, é resultante do atrito com os outros, da oposição de vontades e opiniões, da discussão, dos conflitos e da compreensão mútua. Ele argumentava que o trabalho em grupo favorecia a autonomia moral e intelectual do sujeito (Trabalho aguardando publicação10).

Não se deve esquecer que também Vygotsky tinha como tese que a reflexão

pessoal ou individual acontecia originalmente na discussão com o outro, e que a

colaboração com o outro (adulto ou parceiro mais capaz) possibilita que o indivíduo

consiga fazer muito mais do que ele poderia fazer sozinho. (VYGOTSKY, 2000).

Após a formação dos grupos espontâneos, foram devolvidas aos alunos as

suas respostas escritas individuais do pré-teste, com o objetivo facilitar o processo

de interação entre eles em cada grupo. Uma das finalidades desta etapa foi a de

provocar a discussão entre os alunos a respeito da temática bem como obter dos

alunos uma resposta coletiva que representasse o consenso entre os estudantes.

Ainda nesta aula, após essa discussão inicial (fazendo o uso das respostas

escritas individuais dos alunos), distribuí para cada grupo três esferas de isopor de

tamanhos diferentes e solicitei que eles as identificassem como Terra, Lua e Sol e

que as usassem para facilitar o entendimento entre os componentes do grupo.

10 COSTA, A. R. ; OLIVEIRA, J. P. ; ALVES, J. M; Analisando a construção de explicações individuais e coletivas em aulas sobre ligações iônicas, na 8a. série. Artigo aceito pela Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciências (RECC) e aguardando publicação.

68

O uso das esferas de isopor para representar os corpos celestes tinha a

finalidade de proporcionar as condições necessárias de modo a auxiliar nas

discussões e proposição de um modelo explicativo para o fenômeno da sucessão do

dia e da noite na Terra. O uso deste material também foi aplicado com sucesso por

Caniato (1989) no projeto ciência integrada.

No terceiro momento, após uma semana, reorganizei os alunos em grupos

diferentes, que denominei de recombinados (a escolha dos componentes de cada

grupo foi feita segundo um critério e não mais pelos próprios alunos). Chamei estes

grupos de GrW, GrX, GrY e GrZ. A escolha dos componentes de cada grupo se deu

de acordo com as respostas ao pré-teste. Em cada grupo, inclui pelo menos um dos

alunos com o pensamento mais próximo do conhecimento escolar cientificamente

aceito e que durante atividade anterior tivesse demonstrado boa participação nas

discussões. Os outros alunos tinham pensamentos mais divergentes (com nível bem

diferente) e, de preferência, não tinham participado do mesmo grupo anterior.

A intenção de recombinar os grupos foi para privilegiar e diversificar as

interações entre os alunos e deles para comigo, uma vez que segundo Mercer

(1998) a ZDP (zona de desenvolvimento proximal) é um atributo do evento e não de

um individuo, ou seja, na interação discursiva cada estudante com seus variados

saberes influencia com contribuições para a ZDP.

A estratégia de recombinar os grupos foi utilizada com sucesso por Costa

(2005) e por Pessoa e Alves (2007) em trabalhos que visavam a análise da

construção de conceitos científicos escolares de química, em salas de aula do

ensino fundamental e médio.

A atividade no grupo recombinado também contou com as esferas usadas na

aula anterior. Nesta etapa busquei participar mais ativamente das discussões de

cada grupo, solicitando que os alunos fornecessem uma resposta consensual para a

temática.

69

Também participaram deste momento 17 alunos, sendo que um dos alunos

da atividade anterior não participou desta etapa e um outro aluno que não havia

participado de qualquer das atividades anteriores agregou-se a um dos grupos.

No quarto momento, os grupos recombinados, reuniram-se por algum tempo,

e posteriormente apresentaram suas respostas finais de forma oral e/ou utilizando o

quadro branco para exposição de seus desenhos ou ainda fazendo o uso das

esferas para demonstração.

A minha ação foi no sentido de conduzir a atividade complementando,

mediando e discutindo as respostas apresentadas. Nesse momento, participaram 20

alunos, sendo 19 alunos dos 23 que participaram do primeiro momento da pesquisa

e 1 que passou a fazer parte da turma a partir do dia em que recombinamos os

grupos. Nesse particular foi necessário que eu distribuísse os faltosos do segundo

e/ou terceiro momento em cada grupo recombinado para participarem desta etapa.

Em um quinto momento, todos os alunos que participaram do quarto

momento responderam individualmente a um pós-teste, contendo as mesmas

perguntas do pré-teste.

As respostas obtidas no pós-teste foram comparadas com aquelas obtidas no

pré-teste a fim de identificar as possíveis evoluções conceituais alcançadas pelos

estudantes a partir da intervenção pedagógica.

Nesta comparação levei em consideração todos os alunos que participaram

do primeiro momento e do quinto momento e que haviam participado em pelo menos

um dos momentos intermediários. Justifico essa conduta pelo fato de ser uma

realidade na EJA a ausência freqüente de alunos por motivos diversos: em função

do trabalho (muitos trabalham no comércio ou outra atividade), por motivo de doença

de pessoas da família (como no caso de filhos, cônjuge entre outros), por problemas

financeiros que os impedem de chegar à escola (falta recurso para o transporte)

entre outros problemas. Nesse sentido a participação dos faltosos em qualquer um

dos momentos já citados pode ter influenciado em sua resposta final.

70

Ainda no quinto momento da pesquisa apliquei o questionário (ver Anexo 2)

para coleta de informações sócio-econômico-cultural dos estudantes.

Vale ressaltar que busquei durante todos os momentos das atividades com a

classe manter um discurso dialógico, buscando mediar às discussões, muito embora

em certos momentos precisei fazer uso de um discurso de autoridade para tentar

construir, reconstruir ou desconstruir conceitos que pareciam ou não internalizados

pelos estudantes.

Busquei também transferir para os estudantes a responsabilidade pela

utilização das idéias científicas, dando suporte na internalização do entendimento do

fenômeno físico estudado.

Planejei as atividades com o intuito de obter dos alunos a compreensão da

sucessão do dia e da noite como dependente exclusivamente da rotação da Terra

além do entendimento do modelo astronômico envolvendo os três corpos celestes

Terra-Lua-Sol,

Utilizei como procedimento para coleta de informações sobre o processo

ensino-aprendizagem a metodologia proposta por Lüdke e André (1986) de registrar

em vídeo e áudio o evento pedagógico. Isto aconteceu nas aulas em que foram

formados os grupos espontâneos e recombinados, sendo utilizados para esse fim

dois gravadores, além de uma filmadora portátil. Para isso foram escolhidos dois

grupos espontâneos para gravações em áudio de toda a atividade sendo que a

filmadora fazia tomada dos grupos em geral. No momento em que foram

recombinados os grupos, a filmadora fazia a tomada dos instantes em que eu estava

interagindo com os grupos. O estagiário, que me assessorava durante as atividades,

operava a filmadora.

Para as transcrições e análise das aulas, me apropriei de uma ferramenta

metodológica - a análise microgenética - por que além de identificar, de forma

precisa, os vestígios de aprendizagem, também está inclusa no contexto da Teoria

Histórico-Cultural e semiótica dos processos psicológicos do ser humano (GOÉS,

2000).

71

5.3 Uma Ferramenta Metodológica

A análise microgenética é um instrumento utilizado para identificar de forma

minuciosa indícios de aprendizagem, demandando, portanto planejamento, tempo e

atenção a pormenores e detalhes, que acontecem na relação dialógica e durante a

construção do conhecimento.

Goés (2000, p.14), sustentada em Wertsch, nos afirma que este tipo de

análise:

envolve o acompanhamento minucioso da formação de um processo, detalhando as ações dos sujeitos e as relações interpessoais, dentro de um curto espaço de tempo. ...É uma espécie de ‘estudo longitudinal de curto prazo’ e uma forma de identificar transições genéticas, ou seja, a transformação nas ações do sujeito e a passagem do funcionamento intersubjetivo para o intra-subjetivo.

Góes (2000, p.14) discorda de Wertsch argumentando que não basta para

caracterizar a análise microgenética a transição genética do processo intersubjetivo

para o intrasubjetivo e muito menos a curta duração do evento em si, mas o fato de

que a analise microgenética:

não é micro porque se refere à curta duração dos eventos, mas sim por ser orientada para minúcias indiciais- daí resulta a necessidade de recortes num tempo que tende a ser restrito. É genética no sentido de ser histórica, por focalizar o movimento durante processos e relacionar condições passadas e presentes, tentando explorar aquilo que no presente, está impregnado de projeção futura. É genética, como sociogenética, por buscar relacionar os eventos singulares com outros planos da cultura, das práticas sociais, dos discursos circulantes, das esferas institucionais.

A fim de ampliar a concepção da análise microgenética como uma maneira de

compreender o que acontece em sala de aula de ciências, Mortimer (2000)

introduziu diferentes planos de análise, que referem aos diversos momentos do

discurso em sala de aula e que estão associadas à sistematização das ações do

professor para alcançar certo objetivo. A apresentação desses diversos planos de

análise no desenrolar de uma temática, durante uma aula, permite compreender os

momentos mais importantes desse processo de aprendizagem.

72

Mortimer e Scott (2002) propõem como ferramenta de análise do discurso

categorias, geradas nas explicações em sala de aula de ciências, baseadas nos

seguintes aspectos: (1) Nos focos do ensino (Intenção do professor e Conteúdo),

(2) na abordagem (Abordagem Comunicativa) e (3) nas ações (Padrão de

Interação e Intervenções do Professor). Esses autores consideram como principal

fundamento a abordagem comunicativa uma vez que a intenção do professor e o

conteúdo a ser ensinado são permeados por diversas intervenções pedagógicas

através de variados padrões de interações

No que diz respeito às intenções do professor, o professor pode: criar um

problema; explorar a visão dos estudantes; introduzir e desenvolver a ‘estória

científica`; guiar os estudantes no trabalho de suas idéias científicas além de dar

suporte ao processo de internalização; guiar os estudantes na aplicação das idéias

científicas e na expansão de seu uso, transferindo progressivamente para eles o

controle a responsabilidade por esse uso; manter a narrativa sustentando o

desenvolvimento da ‘estória científica`.

Dentro do aspecto relacionado ao conteúdo, Mortimer e Scott (2002, p.5)

estruturaram a análise do discurso em termos de categorias que podem ser

consideradas como fundamentais da linguagem social da ciência escolar tomando

como referencia a distinção entre a descrição, a explicação e a generalização, em

que :

Descrição: envolve enunciados que se referem a um sistema, objeto ou fenômeno, em termos de seus constituintes ou dos deslocamentos espaço-temporais desses constituintes Explicação: envolve importar algum modelo teórico ou mecanismo para se referir a um fenômeno ou sistema específico Generalização: envolve elaborar descrições ou explicações que são independentes de um contexto específico.

Diante do exposto Mortimer e Scott (2002) reconhecem nas interações

professor/aluno ou aluno/aluno quatro tipos de discurso em duas dimensões

diferentes: discurso dialógico ou de autoridade e discurso interativo ou não

interativo

73

A explicação da combinação entre esses discursos fica mais esclarecida nas

palavras de Mortimer e Scott (2002, p.6):

a) Interativo/dialógico: o professor e estudantes exploram idéias, formulam perguntas autenticas e oferecem, consideram e trabalham diferentes pontos de vista. b) Não-interativo/ dialógico: professor reconsidera, na sua fala, vários pontos de vista, destacando similaridades e diferenças. c) Interativo/ de autoridade: professor geralmente conduz os estudantes por meio de uma seqüência de perguntas e respostas, com o objetivo de chegar a um ponto de vista específico. d) Não-interativo/ de autoridade: professor apresenta um ponto de vista especifico.

Os padrões interativos podem ocorrer com uma Iniciação por parte do

professor, seguida de uma Resposta do aluno e uma Avaliação do professor numa

tríade denominada [ I-R-A ]. No entanto, pode ocorrer que o professor venha

interferir na discussão a fim de sustentar a elaboração de um enunciado de seu

aluno com intervenções rápidas repetindo parte do que ele tenha acabado de falar,

neste caso, o professor está fornecendo um Feeedback ao aluno para que ele

elabore melhor a sua fala. Desta forma é provocado uma cadeia do tipo [ I-R-P-R-

P..., ou I-R-F-R-F ] onde o P representa permitir o prosseguimento da fala do aluno.

Na presente pesquisa, trabalhei com esse sistema de categorias na análise

do processo ensino-aprendizagem, não esquecendo que além do discurso verbal em

sala de aula, outros modos de comunicação não-verbais (do tipo: gestos, posturas,

expressões faciais, sorriso, silêncio, entre tantos outro tipos) também permearam no

ambiente e influenciaram na comunicação verbal. Aqueles que considerei relevantes

foram comentados nas transcrições das falas, na tentativa complementar esta

análise.

74

6. ANÁLISE DE RESULTADOS OBTIDOS 6.1 A Verificação Inicial

O objetivo da utilização do pré-teste em forma de questão aberta com

solicitação de desenho, foi a de identificar o conhecimento conceitual que os

estudantes demonstravam ter sobre a sucessão do dia e da noite na Terra,

fenômeno associado ao movimento do sistema Terra-Lua-Sol.

A partir das respostas obtidas, pude compreender que concepções eles

possuíam a respeito desta temática. Essas respostas serviram de ponto de partida

para o planejamento da ação pedagógica, que estruturou o processo de ensino,

servindo ainda de parâmetro para a verificação da evolução conceitual dos referidos

estudantes.

As respostas obtidas no questionamento do pré-teste (Como você explica a

ocorrência sucessiva de dia e noite na Terra? Faça também um desenho capaz

de ilustrar esse fato) foram analisadas e categorizadas (Quadro 1) em quatro

níveis (A, B, C e D) de acordo com a aproximação das respostas ao conceito

escolar, cientificamente aceito, em ordem crescente das idéias apresentadas pelos

sujeitos deste estudo. O nível A corresponde aquele mais afastado do conceito

científico escolar, enquanto que o nível D, corresponde ao mais próximo.

Vale ressaltar que para alguns níveis de categorias de respostas construí

algumas subcategorizações. A categorização teve o intuito de classificar

qualitativamente as respostas prévias dadas pelos alunos. O desenho solicitado no

questionamento serviu de apoio para melhor esclarecer a idéia dos estudantes.

Uma das intenções do questionamento foi identificar o “modelo de mundo”,

entendido aqui como sendo geocêntrico ou heliocêntrico, dentro de uma perspectiva

científica escolar associada a este nível de ensino. Em função das respostas

obtidas, nem sempre foi possível identificar o modelo expresso pelos alunos como

geocêntrico ou heliocêntrico, o que justifica em alguns dos níveis da categorização

não aparecer o modelo associado. As categorias elaboradas estão listadas no

Quadro 1.

75

Nível Categoria de Respostas

Subcategorias de Respostas Modelo de Mundo

A

Não-científico escolar (Sobrenatural ou Finalistico)

Discurso religioso -

Discurso do cotidiano

B

Explica a sucessão através da translação do Sol

Relaciona a sucessão a um movimento do Sol ao redor da Terra.

Geocêntrico

C

Explica a sucessão através da Translação da Terra

Relaciona a sucessão à translação associando a Lua à noite e o Sol ao dia.

Heliocêntrico

Relaciona a sucessão à translação sem associar a Lua à noite e o Sol ao dia.

Heliocêntrico

D

Explica a sucessão através da rotação da Terra

Relaciona a sucessão à rotação da Terra associando a Lua à noite e o Sol ao dia (Sol e Lua parados).

-

Relaciona a sucessão à rotação da Terra, não mencionando o movimento translação da Terra em relação ao Sol e da Lua em relação à Terra.

-

Relaciona a sucessão exclusivamente à rotação da Terra, distinguindo o movimento de translação ao redor do Sol e da translação da Lua em relação à Terra.

Heliocêntrico

Quadro 1-Categorias de análise referentes às explicações dos sujeitos investigados sobre a sucessão do dia e da noite na Terra e a identificação do modelo de mundo

Na Tabela 7 é exibida a identificação, o sexo, a idade e a distribuição da

freqüência das concepções apresentadas pelos estudantes que participaram do pré-

teste em função dos níveis das categorias estabelecidas no Quadro 1. Vale ressaltar

que considerei nessa análise apenas os estudantes que participaram do pré-teste,

do pós-teste e participaram também de pelo menos uma das atividades pedagógicas

que antecederam ao pós-teste.

76

Tabela 7- Classificação das respostas dos sujeitos segundo os níveis estabelecidos por categoria

Estudante Sexo Idade Nível EDI F 30 A NOÉ M 36 A ISA F 19 A NEI M 22 A LEA F 16 A ANA F 17 A LIA F 17 B EDU M 17 B BIA F 18 C MEL F 18 C IAN M 17 C ELI M 21 C GIL M 19 C LÉO M 18 D TED M 18 D IVO M 18 D EVA F 26 D RUI M 20 D VIC M 18 D

A Figura 14 ilustra a distribuição do número de alunos em função dos níveis

de resposta nas quais as letras logo abaixo da envoltória representam os níveis de

respostas estabelecidos e os números entre parênteses ao lado dessas letras

indicam a quantidade de estudantes que tiveram respostas classificadas com o nível

considerado. A seta da figura indica a ordem crescente das idéias apresentadas

pelos sujeitos deste estudo em relação ao conceito científico escolar aqui

investigado.

77

Figura 14 – Distribuição de freqüência das concepções prévias dos alunos em função do nível de respostas

No nível A da categorização foram agrupadas as respostas de seis

estudantes (EDI, NOÉ, ISA, NEI, LEA e ANA) , representando 31,57% da totalidade

dos sujeitos, cuja percepção a respeito da sucessão do dia e da noite na Terra

estava relacionada com um discurso religioso ou um discurso do cotidiano.

O discurso religioso era relacionado com uma concepção associada ao

sobrenatural como a resposta dada pelo aluno NEI ao dizer “Que Deus viu o dia era

bom e ele fez a noite, que era bom para o descanso”.

O discurso do cotidiano prendeu-se a respostas com um cunho finalístico que

destacavam as atividades humanas durante o dia ou durante a noite, como

exemplifica a resposta dada pela aluna LEA ao dizer: “... por que as pessoas têm

necessidades de se movimentarem, os animais também. As pessoas para se

locomoverem utilizam carro, bicicleta,.... Então o mundo não para dia e noite. De

manhã quando acordam vão trabalhar ....”.

Os desenhos em alguns casos identificam pessoas trabalhando ou dormindo

e em outros a aparência do dia e da noite como aqueles expressos pelas alunas ISA

e ANA nas Figuras 15 e 16 respectivamente.

EDI NOÉ ISA NEI LEA ANA

LIA EDU

BIA MEL IAN ELI GIL

LÉO TED IVO EVA RUI VIC

A (6) B (2) C (5) D (6)

78

Figura 15 - Desenho da aluna ISA no pré-teste

Figura 16 - Desenho da aluna ANA no pré-teste

No trabalho inicial que motivou esta pesquisa, o mesmo questionamento foi

feito a alunos do 1º ano do ensino médio regular diurno e não apareceram estes

tipos de respostas.

Com relação ao discurso dos classificados no nível B da categorização foram

agrupadas as respostas de dois estudantes (LIA e EDU), representando 10,52% da

totalidade. Ficou bem evidente o entendimento de que a sucessão do dia e da noite

na Terra para esses alunos estava associada ao movimento do Sol ao redor da

Terra e, portanto, o estabelecimento de uma concepção eminentemente geocêntrica.

Este foi o caso da aluna LIA ao dizer: “ é quando o Sol está em rotação e uma parte

da Terra fica escuro e o outro fica claro”. O seu desenho também confirma este fato

como está exibido na Figura 17. Fica claro, através da análise de seu desenho, que

o termo rotação utilizado pela estudante em seu discurso na verdade refere-se à

translação do Sol ao redor da Terra.

79

,

Figura 17 – Desenho da aluna LIA no pré-teste

No nível C que reúne as respostas de 26,41% dos sujeitos pesquisados

foram agrupados cinco estudantes (BIA, MEL, IAN, ELI e GIL) e nas respostas de

todos eles existe uma associação da sucessão do dia e da noite na Terra a uma

translação da Terra em torno do Sol. Isto fica claramente exemplificado na resposta

do aluno IAN ao relatar que “Isso porque a Terra gira em torno do Sol”. A Figura 18

mostra o desenho do referido aluno, confirmando a sua idéia.

Figura 18 – Desenho do aluno IAN no pré-teste

No nível D foram categorizadas as respostas de seis estudantes (LÉO, TED,

IVO, EVA, RUI e VIC) representando 31,57% dos sujeitos pesquisados. Neste caso,

os alunos reconheceram que a sucessão do dia e da noite na Terra estava

relacionada à rotação da Terra.

Neste nível alguns estudantes atribuíram a sucessão á rotação da Terra,

associando a Lua à noite e o Sol ao dia (Sol e Lua parados) como no caso do aluno

LÉO ao relatar: “... a Terra vive girando em torno do Sol e da Lua que vivem parados

e não se movimentam em torno da Terra, mas sim a Terra vive girando em torno do

Sol e da Lua, ocasionando assim o aparecimento do dia e da noite.”. A Figura 19

mostra o desenho do referido aluno complementando sua idéia.

80

Figura 19 – Desenho do aluno LÉO no pré-teste

Ainda neste nível outros estudantes atribuíram a sucessão à rotação da Terra,

não mencionando o movimento translação da Terra em relação ao Sol e/ou da Lua

em relação à Terra, como no caso do aluno RUI ao dizer: “O dia e a noite existe

devido ao movimento da Terra, que faz a rotação”. A Figura 20 mostra o desenho do

referido aluno complementando sua idéia.

Figura 20 – Desenho do aluno RUI no pré-teste

Vale ressaltar que neste nível, apesar dos estudantes compreenderem que a

sucessão está associada à rotação da Terra, eles parecem não distinguir o

movimento de translação da Terra ao redor do Sol e a translação da Lua em relação

a Terra.

Concluo, portanto que grande parte dos sujeitos da pesquisa apresentava

concepções fortemente ligadas aos conceitos espontâneos, sendo que em muitos

deles os significados das palavras ainda não apareciam dentro de um contexto

científico escolar.

81

6.2 A Verificação Final

Após o processo de ensino e de aprendizagem foi realizado um pós-teste,

com o mesmo instrumento utilizado no pré-teste, a fim de identificar a ocorrência da

evolução da forma de pensar dos estudantes em relação à sucessão do dia e da

noite na Terra.

As respostas dos estudantes foram classificadas de acordo com aquelas

categorias estabelecidas no pré-teste.

A Figura 21 ilustra a distribuição do numero de alunos em função dos níveis

de resposta no pós-teste, em função das categorias já estabelecidas.

Figura 21 – Distribuição de freqüência das concepções dos alunos em função do

nível de respostas após o processo de ensino e aprendizagem

Todos os dezenove (19) estudantes que participaram do pós-teste

enquadraram-se na categoria D de resposta, ou seja, todos os alunos passaram a

reconhecer, após o processo de ensino e aprendizagem, que a sucessão do dia e da

noite estava associada à rotação da Terra.

A (0) B (0) C (0) D (19)

EDI, NOÉ ISA, NEI

LEA, ANA LIA, EDU BIA, MEL IAN, ELI GIL, LÉO TED, IVO EVA, RUI

VIC

82

No entanto, esta categoria de resposta, como já foi comentado anteriormente

possui subcategorizações, sendo a última subcategoria11 mais completa que as

anteriores. É importante observar que nenhum estudante que realizou o pré-teste

havia sido ainda enquadrado nessa subcategoria.

Nesse sentido, nove estudantes (ANA, EDU, IAN, LÉO, TED, IVO, EVA, RUI

e VIC) desta categoria responderam de acordo com essa subcategoria, ou seja,

atribuindo a sucessão exclusivamente á rotação da Terra, porém distinguindo esse

movimento do movimento de translação ao redor do Sol e da translação da Lua em

relação à Terra.

A resposta dada pelo estudante IVO exemplifica bem essa subcategoria:

“Essa sucessão se dá, porque a Terra exerce um movimento chamado de rotação

que faz com que apenas um lado da Terra receba a luz do Sol. Seria a parte voltada

para o Sol e como existe esse movimento de rotação os lados se revezam fazendo

com que o lado voltado para o Sol seja dia e o outro lado seja noite.”

O seu desenho, que é mostrado na Figura 22, complementa o pensamento do

estudante que parece ter compreendido que a Lua faz translação em torno da Terra

e esta última translada ao redor do Sol de acordo com o modelo científico escolar

vigente.

Figura 22 – Desenho do aluno IVO no pós-teste

11 Atribui a sucessão exclusivamente a rotação da Terra (distinguindo do movimento de translação ao redor do Sol e da translação da Lua em relação à Terra.) estabelecendo um modelo heliocêntrico.

83

6.3 Comparação entre a Verificação Inicial e a Verificação Final

Na comparação entre os resultados do pré-teste e do pós-teste foi possível

observar que dos 19 estudantes que participaram das verificações inicial e final e de

pelo menos uma das etapas do processo ensino-aprendizagem: treze (13)

estudantes demonstraram melhoria do perfil conceitual, pois migraram dos níveis A,

B ou C para o nível D de categorização de resposta. Os outros seis (06) estudantes

que já eram do nível D permaneceram nesse nível, porém eles migraram para a

última subcategoria desse nível caracterizando uma melhoria qualitativa em suas

respostas em comparação com aquelas fornecidas em suas respostas iniciais.

6.4 Trajetória da Construção do Conhecimento dos Estudantes

A seguir, apresento a trajetória da construção do conhecimento de três

estudantes, que participaram de todas as etapas desta pesquisa, ou seja, do pré-

teste, do grupo espontâneo, do grupo recombinado e do pós-teste.

Escolhi estudantes que na verificação inicial tiveram suas respostas

categorizadas nos níveis A e B e que na verificação final apresentaram respostas

categorizadas no nível D. O objetivo aqui foi de contemplar as trajetórias da

construção do conhecimento de estudantes que estavam inicialmente mais

afastados do nível D, considerado o mais próximo do conhecimento escolar

cientificamente aceito. Dentro desse parâmetro escolhi aqueles estudantes dos

quais eu tinha os registros de gravação em áudio e/ou vídeo tanto no grupo

espontâneo como no grupo recombinado.

Os estudantes que escolhi para a análise de suas trajetória foram ANA, NOÉ

e LIA. A Tabela 8 apresenta a categorização de suas respostas no pré-teste e no

pós-teste bem como sua idade e sexo.

84

Tabela 8- Categorização das respostas dos estudantes escolhidos para análise da trajetória da construção do conhecimento.

Estudante Sexo Idade Nível Pré-teste

Nível Pós-teste

ANA F 17 A D NOÉ M 37 A D LIA F 17 B D

Nesta seção apresento e analiso as respostas desses estudantes nos

diversos momentos de sua participação a fim de compreender de que forma os

referidos estudantes construíram o seu conhecimento. Adotarei na análise das

interações o uso da 3ª pessoa para os momentos em que falar a respeito da minha

ação fazendo referência ao professor. Manterei a primeira pessoa ao relatar minhas

ações enquanto pesquisador.

6.4.1 Percurso da estudante ANA

Em seu pré-teste a estudante ANA forneceu uma resposta que permitiu

caracterizar o seu pensamento inicial, a respeito da sucessão do dia e da noite na

Terra, consistente com o nível A das categorias propostas neste estudo. Ela

estabeleceu, em sua resposta, em primeiro lugar, uma associação do dia com o Sol

e da noite com as estrelas. Ou seja, segundo ela, durante “o dia nós temos o Sol

para iluminar o céu azul” e “quando chega à noite fica escuro e o céu cheio de

estrelas...”. Em segundo lugar, estabeleceu, ainda, uma relação entre a atividade

humana durante o dia e a noite, ao afirmar que, ”(...) o dia nós temos para trabalhar

e a noite para descansar, mas muitas vezes à noite trabalhamos”. O seu desenho

complementa o seu pensamento e já foi mostrado na Figura 16 (p.78).

Na atividade seguinte, que consistia em que os estudantes, organizados

espontaneamente em grupos, procurassem buscar um consenso, a partir das suas

respostas iniciais, a respeito da sucessão entre o dia e a noite na Terra, a estudante

mostrou-se pouco participativa (quase não falava e por mais de uma vez se

ausentou da sala de aula). Isto aconteceu quando os estudantes interagiram entre si

e também no momento em que o professor interagiu com o grupo.

85

No entanto, a partir das discussões estabelecidas, o grupo apresentou como

consenso, uma resposta escrita acerca da sucessão do dia e da noite na Terra, que

categorizei no nível D. O grupo respondeu que ”O dia e a noite ocorre na Terra

devido o movimento de rotação, que a Terra exerce sobre si própria, ou do eixo

central”.

A resposta fornecida pelo grupo, tanto na forma escrita como em sua

ilustração, deixa claro, ainda, uma forma de pensar condizente com o modelo

heliocêntrico para o sistema solar: “A Terra, em seu movimento de rotação, gira em

torno do Sol, enquanto a Lua gira em torno da Terra”.

A resposta inicial da estudante ANA não permitiu inferir o modelo de sistema

solar que poderia ser associado ao seu modo de pensar antes do processo de

ensino. No entanto, como será observado, em relação a sua participação na próxima

fase deste processo, a estudante não compartilhou do consenso construído em seu

grupo. Como já foi mencionado acima, a estudante pouco interagiu com os demais

estudantes do grupo durante as discussões realizadas nesta fase e, apesar de não

compartilhar das idéias apresentadas pelo grupo como consenso, também não

defendeu a sua forma de pensar. Além disso, ao que parece, não foi influenciada

pelas idéias defendidas durante as discussões que presenciou no grupo.

Na terceira fase deste processo, em que os estudantes foram redistribuídos

nos diversos grupos (grupo recombinado), as manifestações iniciais da estudante

ANA giraram em torno de um pensamento condizente a um modelo de sistema solar

geocêntrico. No entanto, diferente do que aconteceu na fase anterior, em que a

estudante não emitiu opinião durante as discussões travadas no grupo a que

pertencia, nesta fase seu posicionamento mudou durante as discussões. A

estudante apresentou, em seu pós-teste, uma idéia diferente da inicial, em relação à

sucessão entre dia e noite na Terra.

Esta idéia pode ser percebida no episódio apresentado a seguir (Quadro 2),

que vai do turno 11 ao turno 29. A estudante ANA contrapõe a sua idéia à do

estudante ELI, que no turno 11, buscou apoio do professor para defender a idéia de

que “o Sol não se movimenta, né?”. A estudante, então se manifesta, inicialmente no

86

turno 16, afirmando, “Não, o Sol se movimenta sim! Se movimenta!”,

complementando esta posição, no turno 18, oferece uma explicação, possivelmente

baseada no conhecimento construído no cotidiano, para o seu ponto vista: “Por que

quando o Sol vai nascendo de dia, a gente vê, ele se movimenta não é?”,

caracterizando uma idéia coerente com o modelo geocêntrico para o sistema solar

(que categorizei como de nível B).

Vale ressaltar que, apesar da resposta de consenso apresentada no grupo

espontâneo ter sido mais próxima do pensamento científico escolar, fica evidente

que a estudante não havia internalizado a concepção apresentada pelo seu grupo

(espontâneo). Ao que tudo indica a mudança na concepção de modelo de sistema

solar da estudante ocorreu neste segmento, uma vez que, após as suas

manifestações, aconteceu uma seqüência de manifestações, em favor do

movimento da Terra em torno do Sol, pelos estudantes ELI, no turno 19, “Não, por

que é a Terra, né Professor?”, IVO, nos turnos 20, “É a Terra é quem está se

movimentando” e 22, “A Terra é quem se movimenta”. Esses estudantes foram

apoiados pelo professor no turno 23, ao complementar à última manifestação de

IVO: “Se movimenta em torno do Sol”.

Com esta manifestação o professor dá por encerrada esta polêmica em favor

de um modelo heliocêntrico para o sistema solar, ao mesmo tempo em que busca

dar continuidade às manifestações dos estudantes, ao questioná-los: “para que

aconteça a sucessão, o que é necessário?”.

Este questionamento foi respondido pela estudante LEA, no turno 24, “Que

haja movimento da Terra. No turno 25, o professor solicita uma complementação

para esta manifestação, questionando, “Mas, como é esse movimento?”. A este

questionamento segue-se , no turno 26, a manifestação de IVO , mostrando o tipo

de movimento com gestos, rotacionando a esfera de isopor que representava a

Terra. Isto foi seguido pela manifestação de LEA, “Movimento de rotação” (turno 27)

e apoiada por IVO, “Movimento de rotação” (turno 28). O professor se dá por

satisfeito no turno 29: “Ok!”

87

Após o seu posicionamento inicial, a estudante ANA não volta a se manifestar

mais neste segmento. Vale ressaltar, no entanto, que a sua postura no grupo,

diferentemente do que aconteceu na fase anterior, é de uma observadora atenta em

relação às manifestações dos demais integrantes do grupo e destes com o

professor. Isto deve explicar a mudança de pensamento, em relação ao seu modelo

de sistema solar, manifestado no pós-teste.

Em decorrência destas discussões os estudantes deste grupo elaboraram em

relação ao fenômeno da sucessão entre o dia e noite na Terra, uma resposta escrita

nos seguintes termos: “Nós concluímos que o fenômeno do dia e [da] noite ocorre

pelo movimento de rotação que a Terra exerce em torno de si mesma”. Resposta

esta, que categorizei no nível D.

Como já mencionei anteriormente, a estudante ANA forneceu uma resposta

escrita em seu pós-teste que, ao mesmo tempo em que relaciona a sucessão do dia

e da noite na Terra com o movimento de rotação da mesma, demonstra aceitar o

modelo Heliocêntrico para o Sistema Solar, ao afirmar que, “é porque a Terra gira

em torno de si mesma e ao mesmo tempo que ela gira em torno de si ela faz a

translação [em torno] do Sol”. Esta resposta sugere que a estudante internalizou e

tomou como seu o discurso construído no espaço social do grupo do qual participou

nesta fase da ação pedagógica.

Em relação às ações desenvolvidas em sala de aula, que proporcionaram a

oportunidade para que a estudante revisse a sua posição em relação à sucessão do

dia e da noite na Terra, a atuação do professor ocorreu com a intenção de explorar

a visão e entendimento dos estudantes, como é o caso do questionamento

realizado no turno 23: “(...) para que aconteça a sucessão, o que é necessário?”.

Em função do questionamento realizado no turno 23 , a estudante LEA, no

turno 24, se manifestou afirmando que é necessário “Que haja movimento da Terra”,

no que o professor, no turno 25, buscou intervir com o intuito de checar o

entendimento dos estudantes, sugerindo uma complementação à sua resposta, ao

questionar: “Mas, como é esse movimento?”. No turno 27, a estudante

complementou afirmando que é o “Movimento de rotação”, o que indicaria um

88

discurso caracterizado como uma explicação, pois ao usar o termo rotação, utilizou

um modelo teórico para se referir ao tipo de movimento que caracteriza fenômeno

em estudo.

Na sua atuação, o professor interagiu no sentido de conduzir os estudantes,

por meio de uma seqüência de perguntas e respostas, com o objetivo de

chegar a um ponto de vista específico, que é a associação do fenômeno da

sucessão do dia e da noite na Terra, com o seu movimento de rotação,

caracterizando uma abordagem comunicativa, cujo padrão de interação,

aconteceu a partir de uma iniciação do professor (turno 23 – para que aconteça a

sucessão, o que é necessário?), resposta da estudante (turno 24 – Que haja

movimento da Terra), novo questionamento do professor (turno 25 – Mas, como é

esse movimento?), nova resposta da estudante (turno 27 – Movimento de rotação).

O Sol se movimenta sim!

T Sujeito Diálogo (continua) 11 ELI -Professor, professor...O Sol não se movimenta, né? 12

Prof

-De certa forma, Sim! Mas, tu estás considerando que ele não execute qualquer movimento?

13 ELI -Não... 14 ANA -Mas, o Senhor está querendo saber o quê? 15

Prof

-Nós estamos querendo saber o quê...? Como ocorre a sucessão do dia e da noite na Terra?

16

ANA

-Não, o Sol se movimenta sim! Se movimenta! (Ela estava com a esfera que foi caracterizada como sendo o Sol- Nesse momento o aluno IVO tenta tapar a boca da ANA para que ela não continuasse a falar, Mas o professor apelou para que ela expusesse o seu pensamento)

17 Prof -Eu acho que é importante, sim, que a ANA...Pode falar 18

ANA

-Por que quando o Sol vai nascendo de dia, a gente vê, ele se movimenta não é? (Referindo-se aquilo que se vê e demonstrando com os braços para cima)

19 ELI -Não, por que é a Terra, né professor? 20 IVO -É a Terra é quem está se movimentando (gesticulando com as mãos) 21

Prof

-Existe aí duas questões, não é? Ou a Terra está parada e o Sol é quem está se movimentando, que é o que se vê, ou então, uma outra possibilidade. Qual é a outra possibilidade? (Dirigindo a pergunta ao IVO- Neste momento o professor quer que o aluno expresse a sua idéia)

22

IVO

-A Terra é quem se movimenta ...(Referindo-se a translação da Terra com as mãos)

23

Prof

-Se movimenta em torno do Sol. Tudo Bem. Agora eu te pergunto o seguinte se tu estás considerando que o Sol está parado. A pergunta que eu faço é: para que aconteça a sucessão, o que é necessário?

24 LEA -Que haja movimento da Terra 25 Prof -Mas, como é esse movimento?

89

T Sujeito Diálogo (continuação) 26

IVO

(ele não responde imediatamente com palavras, mas com as mãos rotaciona a esfera considerada como Terra)

27 LEA -Movimento de rotação 28 IVO -Movimento de rotação 29 Prof -Ok! ... QUADRO 2 - Transcrição de um trecho dos diálogos do grupo recombinado do qual participou a aluna ANA. LEGENDA: T - Turno

Em síntese, o percurso da estudante ANA, que buscamos acompanhar neste

estudo, ocorreu a partir de um pensamento inicial, em que associava o dia com o Sol

e a noite com as estrelas, ou ainda, uma relação entre a atividade humana e o dia e

a noite, consistente com o nível A.

Após as interações entre os estudantes do grupo do qual a estudante fazia

parte e entre estes e o professor, a estudante demonstrou, em seu pós-teste, uma

evolução conceitual, ao relacionar o fenômeno em estudo ao movimento de rotação

da Terra, bem como demonstrando considerar o modelo Heliocêntrico para o

Sistema Solar, pensamento, este, consistente com o nível D das categorias

propostas.

Para que este resultado fosse alcançado foi importante a interação ocorrida

no plano social da sala de aula, com a estudante mostrando, a partir de sua resposta

no pós-teste, ter internalizado as idéias discutidas com o professor e com os

colegas.

Neste processo, a atuação do professor ocorreu com a intenção de explorar

a visão e entendimento dos estudantes, acerca do tema em questão. Ele interviu

com o intuito de checar este entendimento, interagiu no sentido de conduzir os

estudantes, por meio de uma seqüência de perguntas e respostas, com o

objetivo de chegar a um ponto de visto específico, que era a associação do

fenômeno da sucessão do dia e da noite, com o movimento de rotação da Terra. A

interação professor-alunos caracterizou-se como uma abordagem comunicativa do

tipo interativa de autoridade, cujo padrão de interação, aconteceu a partir de uma

iniciação do professor, resposta do estudante, novo questionamento do professor,

90

nova resposta do estudante. O conteúdo construído nestas interações foi uma

explicação.

6.4.2 Percurso do estudante NOÉ

O estudante NOÉ, respondeu por escrito, em seu pré-teste, um pensamento

inicial condizente com o nível A das categorias propostas neste estudo. Ele apoiou-

se em um discurso religioso, dando ênfase a um aspecto criacionista em relação ao

tema em questão: “E disse Deus, haja luz e chamou Deus de dia e também disse

Deus, haja trevas e chamou Deus de noite. Então posso afirmar que o Senhor Deus

foi quem criou dia e noite”.

Os estudantes do grupo espontâneo do qual NOÉ participou estabeleceram

uma discussão inicial (Quadro 3), buscando a compreensão do objetivo da atividade.

O professor então se manifestou, no turno 33, criando um problema com o intuito

de engajar os estudantes, intelectual e emocionalmente, no desenvolvimento

inicial da estória científica: “O que é que está influenciando para que aconteça a

sucessão do dia e da noite? Esta é a pergunta chave”.

Em função da orientação recebida, o estudante GIL, no turno 34, levantou

uma hipótese na tentativa de explicar a questão em estudo, ao sugerir que a Lua, no

movimento que realiza ao acompanhar a Terra, deveria posicionar-se entre o Sol e a

própria Terra para que ocorresse a noite. Esta hipótese sugeriu a idéia de

movimento da Terra em relação ao Sol. No entanto, na transcrição das falas de GIL

não fica claro se ele concebe a existência de um movimento da Lua em relação a

Terra.

A este respeito o estudante NOÉ, que no pré-teste invocou um discurso

religioso para explicar a origem do dia e da noite, manifestou-se no turno 37,

afirmando que “... o Sol fica em repouso e a Terra fica girando”, o que sugere uma

idéia compatível com o modelo heliocêntrico para o sistema solar. Deste modo, tanto

GIL no turno 34, como NOÉ, no turno 37, desenvolveram um discurso no plano

social do grupo cujo conteúdo pode ser caracterizado como uma explicação, pois

91

se utilizaram de um modelo teórico (movimento relativo da Terra em relação ao Sol)

para se referirem ao fenômeno em estudo.

Por outro lado, a manifestação, no Turno 38, do estudante ELI mostrou que o

mesmo não compartilhou da idéia acima quando afirmou que “A Terra não gira em

torno do Sol (referindo-se a translação)”. Tanto NOÉ no turno 39, quanto GIL, no

turno 40, contestaram esta afirmação sem, no entanto, conseguirem demover ELI

desta idéia. No turno 42, ELI reafirma a sua posição a este respeito afirmando que:

“Não tem nada a ver NOÉ”.

A minha opinião é de que o Sol fica em repouso e a Terra fica girando T Sujeito Diálogo 33

Prof

-O que é que está influenciando para que aconteça a sucessão do dia e da noite? Esta é a pergunta chave.

34

GIL

-Quando a Lua acompanha a Terra pode bloquear a passagem da luz, pode ser! Por que tu falou que a Lua acompanha a Terra, né, então...quando ela passar na frente do Sol ela deve bloquear ... Influenciar a passagem da Luz para Terra ...

35

NOÉ

-Tem que ligar para "São Jorge", quando ele vier pegar o dragão tu perguntas (Todos riem). O ELI não falou nada!

36 ELI -Eu é que dei a pergunta! 37

NOÉ

-Na minha opinião é de que o Sol fica em repouso e a Terra fica girando (referindo-se ao movimento de translação).. A Terra não gira assim do jeito que tu estás pensando não

38 ELI -A Terra não gira em torno do sol (referindo-se a translação) 39 NOÉ -Não... ela gira, fica o tempo todo naquele negócio... 40 GIL -Ela fica girando né. 41 NOÉ -É assim que a Terra fica 42 ELI -Não tem nada haver NOÉ(em seguida ri) QUADRO 3 - Transcrição de um trecho dos diálogos iniciais do grupo espontâneo do qual participou o aluno NOÉ. LEGENDA: T - Turno

Após um período de discussões entre os membros da equipe em torno da

ocorrência ou não dos movimentos relativos de Terra, Lua e Sol, em que inclusive foi

debatida a questão relativa à formação dos eclipses, o estudante NOÉ, no turno 105

(Quadro 4), manifestou a sua opinião sobre o tema em questão, ao afirmar: “então a

Terra gira em torno dos dois”, ou seja, que a Terra girava em torno tanto do Sol

quanto da Lua.

92

O modelo proposto por NOÉ parece corresponder a um movimento de

translação da Terra em torno tanto do Sol como da Lua, sugerindo que neste

movimento, ora o alinhamento ocorreria com o Sol ocupando a posição entre a Terra

e a Lua, ora seria a Lua que estaria localizada entre o Sol e a Terra. Vale notar que

no segmento anterior a manifestação de NOÉ sugere o movimento de translação da

Terra em relação ao Sol que estaria em repouso.

Contrapondo-se a este modelo, o estudante ELI, no turno 107, sugere outra

possibilidade, levando em consideração a questão do alinhamento entre os três

astros, segundo a qual, “a Terra gira entre os dois”, ou seja, diferentemente do

modelo anterior, a Terra executaria um movimento de rotação entre a Lua e o Sol.

A Terra gira entre os dois

T Sujeito Diálogo 100

ELI

-Mas Professor esse negócio de eclipse é quando os dois se unem ou quando há um alinhamento?

101 Prof -Quando há um alinhamento 102 ELI -Num alinhamento, né? 103

Prof

-Um alinhamento em que um está aqui e o outro está aqui (demonstrando com as mãos a mesma direção)

104 ELI -Não, um alinhamento que o senhor fala é na mesma direção, né? 105 NOÉ -Então a Terra gira em torno dos dois! 106 VIC -Mas ai tu falastes (dirigindo-se ao ELI) que no alinhamento da Lua .., 107 ELI -Não, então a Terra gira entre os dois QUADRO 4 - Transcrição de um trecho dos diálogos já em andamento do grupo espontâneo do qual participou o aluno NOÉ. LEGENDA: T - Turno

Em seguida a essa discussão inicial, gerada a partir das respostas escritas

apresentadas no pré-teste, o professor forneceu três esferas de isopor, de dimensões

diferentes, a cada grupo, sugerindo que os estudantes utilizassem as mesmas para

caracterizar a Terra, a Lua e o Sol. A intenção era proporcionar as condições

necessárias de modo a auxiliar às discussões e proposição de um modelo explicativo

para o fenômeno da sucessão do dia e da noite na Terra.

De posse das três esferas, os estudantes desenvolveram uma discussão no

sentido de definirem qual delas, em função de seu tamanho, era mais adequada para

representar cada um dos astros em questão. Após a definição de que esfera

93

representaria qual dos astros, a discussão passou a ocorrer a respeito do modelo de

movimento relativo entre o Sol, a Terra e a Lua.

Nesta discussão, um modelo explicativo sustentado por ELI para a sucessão

do dia e da noite na Terra estava diretamente associado com a presença da Lua. Ou

seja, seria a Lua que se interporia entre o Sol e a Terra, impedindo que esta

recebesse a luz emitida pelo Sol, caracterizando, deste modo, a noite na Terra.

Durante o dia a Lua ocuparia outra posição.

Na proposição deste modelo não surgiu nenhum questionamento a respeito de

como poderia ser explicado o fato de que enquanto em um ponto do planeta é noite

em outro pode ser dia. Para o caso da Lua aparecer durante o dia NOÉ aventou com

apoio de ELI a possibilidade de ser apenas o reflexo da mesma que estaria sendo

observado.

A resposta escrita, apresentada como consenso pelo grupo do qual participou

NOÉ nesta fase, estabeleceu para a sucessão do dia e da noite na Terra, uma

proposição que pode ser caracterizada como condizente com o nível C da

categorização proposta neste estudo. De acordo com esta proposição, “O sol está em

repouso em relação à Terra e a Lua, no entanto, a Lua acompanha o movimento da

Terra. Portanto, quando em determinado ponto da Terra é dia o outro é noite, fazendo

assim uma sucessão do dia e noite.”

A partir da resposta escrita e da representação esquemática apresentada pelo

grupo, Figura 23, como complementação para esta resposta, podemos inferir que o

grupo apontou para uma representação de sistema solar onde a Terra translada ao

redor do Sol e a Lua ao redor da Terra. Por outro lado, nem a resposta escrita, nem a

representação esquemática proposta apontam para o movimento de rotação da

Terra.

Deste modo, de acordo com a representação esquemática apresentada, a

sucessão do dia e da noite na Terra estaria relacionada com o movimento de

translação da Lua em torno da Terra. Seria dia na região da Terra voltada para o Sol

e noite na região oposta. Depois de algum tempo a Lua ocuparia a posição entre o

94

Sol e a Terra, o que explicaria o fato de ser noite na face onde antes era dia, não

explicando, no entanto, o que ocorreria em relação à face oposta neste momento.

Figura 23 -Desenho contido na resposta do grupo espontâneo (Ge1) do qual NOÉ participou.

Na terceira fase, o professor reorganizou os grupos, de modo que cada um

deles contasse com a presença de pelo menos um estudante que explicasse o

fenômeno em estudo a partir do movimento de rotação da Terra. A expectativa do

professor era que este estudante atuasse como um líder ou tutor nas discussões

que seriam realizadas pelo grupo.

No grupo em que foi alocado o estudante NOÉ, composto por cinco

estudantes, o estudante RUI era o que demonstrava esta forma de pensar, como

pode ser observado no diálogo a seguir, entre o professor e os estudantes,

apresentado no segmento que vai do turno 27 ao turno 41 (Quadro 5).

Vale ressaltar que, nesta fase, optou-se por analisar as interações ocorridas

entre o professor e o grupo de estudantes, tendo em vista que o objetivo desta

discussão era a construção de um consenso, pelos estudantes, de um modelo que

explicasse a sucessão do dia e da noite na Terra, o mais próximo do conhecimento

científico escolar atualmente aceito.

O diálogo é iniciado pelo professor, no turno 27, ao questionar se os

estudantes “chegaram a um consenso”. Foi o estudante RUI, no turno 28, que

ofereceu uma explicação: “O dia e a noite ocorre devido ao movimento de rotação

95

que a Terra exerce. Quando um lado do globo está iluminado, o outro não está

criando o dia e a noite”.

Ao ser solicitado pelo professor, no turno 29, que demonstrasse isso

utilizando as esferas, o estudante, após demonstrar o movimento de rotação da

Terra, realizou também o movimento de translação. Ao perceber este fato, o

professor, no turno 35, inquiriu o estudante sobre este movimento: “É esse

movimento aqui? (translacionando a esfera que representa a Terra)”. A que o

estudante respondeu, no turno 36, como sendo “o de rotação sobre o Sol”, sendo

corrigido pelo estudante NOÉ, no turno 38, ao afirmar que era o de translação.

O professor voltou então a inquirir, no turno 39, “E a sucessão?”. A que o

estudante RUI, no turno 40, respondeu, afirmando que: “Mas, é devido a esse

movimento (rotaciona a esfera)”. O professor, no turno 41, se deu por satisfeito

quanto à explicação apresentada, que atribuía à sucessão do dia e da noite ao

movimento de rotação da Terra, no entanto, o professor deixou uma questão para o

grupo: “E a Lua como fica nesse processo?”

Observe que o estudante NOÉ, cujas idéias, em relação a este tema, estão

sendo analisadas neste estudo, não externou indícios de que estava ou não de

acordo com a proposição até então apresentada, ou seja, até este momento, nada

indica que este estudante tinha modificado a sua posição em relação ao tema em

discussão.

Neste segmento a intenção do professor, tanto no turno 29 como no turno 35,

ocorreu no sentido de explorar a visão dos estudantes, o que possibilitou que RUI,

no turno 28, fornecesse uma explicação para a sucessão do dia e da noite. A

abordagem comunicativa caracterizou-se como interativa de autoridade, uma vez

que o professor atuou no sentido de conduzir os estudantes rumo à explicação que

estava sendo buscada, gerando padrões de interação do tipo I – R – A, em que

ocorre uma iniciação por parte do professor (turno 27), a resposta do estudante

(turno 28) e a avaliação do professor (turno 29), bem como do tipo I – R – F – R – F,

onde o professor, nos turnos 31 (Sim) e 33 (Ok! Legal) fornece um feedback para

que os estudantes possam elaborar um pouco mais as suas idéias. As intervenções

96

do professor ocorrem no sentido checar o entendimento dos estudantes, como é

o caso do turno 37 e do turno 39 em que o mesmo inquiriu os estudantes para que

esses explicassem melhor as suas idéias sobre o tema em discussão.

Mas, é devido a esse movimento (rotaciona a esfera) T Sujeito Diálogo

27 Prof -Chegaram a um consenso, como está ai? 28

RUI

-O dia e a noite ocorre devido ao movimento de rotação que a Terra exerce. Quando um lado do globo está iluminado, o outro não está criando o dia e a noite.

29 Prof -Certo, então me explica usando os modelos (as esferas). 30 RUI -Aqui é a Terra, aqui é o Sol (tomando eles na mão). 31 Prof -Sim. 32

RUI

-Nesse pontinho aqui, nós marcamos aqui o lado que é dia e o outro que é noite.

33 Prof -Ok! Legal. 34

RUI

-Uma parte está clara é dia e a outra está escura é noite. Aí ele faz esse movimento (ele toma a esfera da Terra e a rotaciona em sua mão)

35

Prof

-Devido a esse movimento? (o professor rotaciona a esfera da Terra junto com o aluno para confirmar se era isso mesmo, neste momento o aluno também translaciona a esfera e o professor continua inquirindo) -E esse movimento aqui?(Translacionando a esfera da Terra)

36 RUI -Esse movimento aqui? É o de rotação sobre o Sol. 37 Prof -Rotação? 38 NOÉ -Translação. 39 Prof -E a sucessão? 40 RUI -Mas, é devido a esse movimento (rotaciona a esfera) 41 Prof -Ok! (sacudindo a cabeça confirmando). E a Lua como fica nesse processo? QUADRO 5 - Transcrição de um trecho dos diálogos iniciais do grupo recombinado do qual participou o aluno NOÉ. LEGENDA: T - Turno

É, no entanto, no segmento seguinte, que vai do turno 82 ao turno 122

(Quadro 6), que o estudante NOÉ irá demonstrar uma mudança na sua forma de

pensar em relação a este tema. Este estudante iniciou o segmento demonstrando

ainda relacionar a sucessão do dia e da noite na Terra com a Lua e terminou por

conceber a idéia de sucessão relacionada com o movimento de rotação da Terra.

No segmento em questão, que iniciou com o professor inquirindo os

estudantes sobre sua conclusão acerca da participação ou não da Lua na sucessão

do dia e da noite na Terra, o estudante NOÉ, no turno 84, afirmou que, “se não

97

existisse a Lua, haveria uma escuridão total, por que a Lua ela reflete o Sol, a Lua é

apenas...”

Frente a esta manifestação o professor, no turno 85, questionou ao estudante

RUI, se ele concordava com a manifestação de NOÉ. O estudante respondeu, no

turno 86, que a Lua não tinha nada a ver com o fato em questão.

Quem se contrapôs à idéia defendida pelo estudante RUI foi a estudante LIA,

no turno 87, ao questionar: “Não tem?” e, prosseguindo, “como tu me explicas

quando no interior é Lua cheia e ela clareia rapidamente?”

A explicação a este questionamento é oferecida por RUI ao afirmar, no turno

88, que isso ocorre, “porque a Terra está em rotação e a Lua gira em torno da Terra,

quando aqui é noite (lado não voltado para o Sol), se a Lua aparecer ela reflete a luz

do Sol”, complementando, ainda, “a Lua funciona como um espelho, refletindo os

raios solares, que atingem a Terra” (turno 92). Esta explicação é aceita por LIA

(turno 89) e aplaudida por EDU (turno 90) e ISA (turno 91).

O estudante NOÉ demonstrou não estar convencido acerca desta idéia. Por

este motivo o professor, no turno 95, voltou a questioná-lo: “Se não tivesse a Lua

existiria a sucessão do dia e da noite na Terra?”. O estudante respondeu, “sem a

Lua não dá” (turno 96). O professor, então, voltou a questionar: “O que é a sucessão

do dia e da noite?” (turno 97).

NOÉ respondeu, no turno 98, que é “aquele movimento repetitivo que

acontece...dia , Sol, ...dia, Sol e assim sucessivamente”, e foi contestado por RUI

que, rotacionando a esfera que representa a Terra, afirmou que “a sucessão

acontece devido à rotação” (turno 99).

NOÉ tentou, ainda, argumentar, manifestando-se, no turno 100, nos seguintes

termos: ”A Lua é de suma importância, não sei se para o Sol ou para a Terra... Mas,

eu sei que tem a ver”. Frente a esta manifestação o professor voltou a inquirir se

“aconteceria a noite e o dia sem a Lua?” (turno 101), ao que todos responderam, no

turno 102, que existiria.

98

Ao que parece, a convicção dos estudantes por um lado, e a insistência do

professor por outro, contestando a relação entre a Lua e a sucessão do dia e da

noite na Terra, atuaram no sentido de contribuir com uma mudança da compreensão

de NOÉ, em relação a este tema, uma vez que, na seqüência de suas

manifestações, ele admitiu, no turno 104, após gesticular com as mãos imitando o

movimento de rotação da Terra, que o mesmo “É um movimento perfeito” e, no turno

121, questionando o professor, “Sem a Lua então não aconteceria também, o quê?”.

Neste segmento como, por exemplo, nos turnos 95 e 97, o professor atuou

com a intenção de explorar a visão dos estudantes a respeito do tema em

discussão. O conteúdo discursivo gerado caracterizou-se como uma explicação,

como ocorreu, por exemplo, no turno 88, no qual o estudante RUI respondeu ao

questionamento da estudante LIA, em relação à fase da Lua denominada de Lua

cheia. A abordagem comunicativa foi interativa de autoridade, pois o professor

manifestou-se no sentido obter uma explicação o mais próximo possível daquela

aceita pelo conhecimento científico escolar sobre o tema, gerando padrões de

interações do tipo I – R – A. Isto ocorre, por exemplo, entre os turnos de 112 a 121,

em uma seqüência de perguntas e respostas entre o professor e o estudante NOÉ,

seqüência esta, que pode caracterizar uma intervenção por parte do professor, no

sentido de marcar o significado chave para o caso da Lua não ter participação

para a existência da sucessão do dia e da noite na Terra.

Sem a Lua então não aconteceria também, o quê? T Sujeito Diálogo (continua)

82 Prof -Fecharam uma resposta, uma conclusão 83

RUI

-Sim, temos aqui o Sol, a Terra. Aqui dia e aqui noite (já havia colocado essas informações na esfera que representava a Terra)

84

NOÉ

-Se não existisse a Lua, haveria uma escuridão total, por que a Lua ela reflete o Sol, a Lua é apenas...

85 Prof -Tu concordas com ele (reportando-se ao João). 86 RUI -A Lua não tem nada a ver 87

LIA

-Não tem? E sim , e como tu me explicas quando no interior é Lua cheia e ela clareia rapidamente?

88

RUI

-É simples, por que a Terra está em rotação e a Lua gira em torno da Terra, quando aqui é noite (lado não voltado para o Sol), se a Lua a aparecer ela reflete a luz do Sol.

89 LIA -Há , é. 90 EDU (aplaude o RUI) 91 ISA (aplaude o RUI)

99

T Sujeito Diálogo (continuação) 92

RUI

-A Lua funciona como um espelho, refletindo os raios solares que atingem a Terra.

93

LIA

-E isso acontece e reflete ao redor da Lua (referindo-se ao movimento da Lua ao redor da Terra, gesticulando com as mãos)

94 NOÉ (Refuta as palavras de RUI- mas, não foi possível descrever o que ele falou) 95

Prof

-Me diz uma coisa (reportando-se ao NOÉ): eu volto a perguntar? Se não tivesse a Lua existiria a sucessão do dia e da noite na Terra?

96 NOÉ -Haa, sem a Lua não dá... 97 Prof -O que é a sucessão do dia e da noite? 98

NOÉ

-É aquele movimento repetitivo que acontece...dia , Sol, ...dia, Sol e assim sucessivamente

99

RUI

-(toma a esfera da Terra e começa a rotacionar) A sucessão acontece devido a rotação ... Um lado claro e o outro escuro.

100

NOÉ

-... A Lua é de suma importância, não sei se para o Sol ou para a Terra... Mas, eu sei que tem haver

101

Prof

-Mas, para acontecer o dia e a noite a Lua é necessária ou não? A Lua é necessária? Aconteceria a noite e o dia sem a Lua?

102 Todos -Aconteceria 103

RUI

-É esse movimento que faz o dia e a noite (toma a esfera da Terra e rotaciona)

104

NOÉ

-(gesticula com as mãos um movimento de rotação da Terra) É um movimento perfeito

105 Prof -O que é que não aconteceria? 106 NOÉ -Se não tivesse a Lua? Não se enxergaria nada, seria escuridão total 107 Prof -Mas, a escuridão total é noite ou não é noite? 108 NOÉ -É noite 109 Prof -Mas, seria realmente escuridão total? 110 NOÉ -Seria, porque... 111

RUI

-Eu acho que não, por que ela (a Terra) recebe a energia Solar (rotaciona a esfera da Terra)

112 Prof -NOÉ, e quando é Lua minguante? 113 NOÉ -A Lua minguante? É..., ela está fraquinha, né... 114 Prof -Está quase no "fim", não é? 115 NOÉ -É , tá quase no fim 116 Prof -É escuridão total? 117 NOÉ -É...verdade 118 Prof -Não é escuridão total, você vê as estrelas, não vê? 119 NOÉ -É... Vê as estrelas... 120 Prof -Procurem então sintetizar a respostas de vocês 121 NOÉ -Sem a Lua então não aconteceria também, o quê? 122

Prof

-Algumas coisas não aconteceriam, por exemplo, a Lua tem relação intima com as marés, os eclipses...

QUADRO 6 - Transcrição de um trecho dos diálogos do grupo recombinado do qual participou o aluno NOÉ. LEGENDA: T - Turno

100

A resposta escrita apresentada como consenso por este grupo estabeleceu

um modelo para a sucessão do dia e da noite na Terra muito mais próximo daquele

aceito pelo discurso científico escolar, o que permitiu classificar a idéia apresentada

como condizente com o nível D das categorias propostas neste estudo. Nas

palavras apresentadas pelo próprio grupo eles dizem: “O dia e a noite ocorre devido

ao movimento de rotação que a Terra exerce. Logo quando um lado do globo está

iluminado pelos raios solares, o outro não está, criando assim o dia e a noite”.

Em seu pós-teste o estudante NOÉ apresentou uma resposta escrita

compatível com o nível D, demonstrando que havia internalizado o discurso

construído no plano social do último grupo do qual fez parte, tomando-o como seu e

reestruturando de acordo com a sua interpretação as idéias ali debatidas. Isto fica

evidenciado a partir da externalização por ele apresentada em sua resposta escrita

individual final: “A Terra faz movimento de rotação, ou seja, gira em torno de si

mesma, sem a interferência da Lua. Levando 24 horas para completar uma volta

inteira”.

Em síntese, o estudante NOÉ, que no seu pré-teste demonstrava ter uma

idéia acerca da sucessão do dia e da noite na Terra compatível com o nível A das

categorias propostas para classificar as respostas dos estudantes neste estudo,

após interagir com os colegas e com o professor, alterou a sua forma de pensar

sobre o tema em questão, a ponto de apresentar, em seu pós-teste, uma resposta

escrita compatível com o nível D, a mais próxima do modelo cientifico escolar aceito.

A interação social em sala de aula configurou-se como um fator determinante

para a evolução conceitual do estudante. É notório que as mudanças de

pensamento demonstrado pelo mesmo ocorreram devido à compreensão do modelo

científico escolar vigente, proporcionado pelas interações do estudante com os

demais colegas, tanto espontâneo, como recombinado, dos quais participou, bem

como, das interações com o professor nos diversos momentos das discussões

implementadas.

101

6.4.3 Percurso da estudante LIA

A estudante LIA, em seu pré-teste, apresentou uma resposta escrita

categorizada no nível B. Estabeleceu um discurso compatível com o modelo

geocêntrico para o sistema solar (modelo ptolomaico):“Quando o Sol está em

rotação uma parte da Terra fica escuro e a outra fica claro”. Convém esclarecer que

a estudante fez uso do termo rotação, no lugar de translação, termo mais apropriado

nesse caso, como pode ser observado na Figura 24 a seguir, proposta pela

estudante como complementação da resposta escrita fornecida no pré-teste.

Figura 24 - Desenho da Aluna LIA no Pré-teste

Em seguida os estudantes, organizados de forma espontânea em grupos,

procuraram construir um consenso, a partir das suas respostas fornecidas no pré-

teste, para o tema objeto deste estudo.

O diálogo iniciou (Quadro 7) com a estudante EVA, no turno 19, inquirindo

sobre o significado do desenho proposto por LIA. Após o posicionamento de LIA, no

turno 20, acerca do significado de sua representação, EVA manifestou-se opondo-se

à idéia apresentada, afirmando que: “quem tem movimento é a Terra, o Sol fica

parado lá no mesmo lugar” (turno 21) e, reforçando, no turno 23, “quem gira é a

Terra, é aquele movimento que tem 365 dias ao redor do Sol”. Deste modo, EVA

contrapõe, ao modelo geocêntrico de LIA, o modelo heliocêntrico, oferecido pela

cultura científica escolar.

Vale ressaltar que as idéias referentes ao sistema planetário geocêntrico e

heliocêntrico ainda não haviam sido objeto de discussão nesta sala de aula de física,

102

o que vale dizer que a estudante EVA estava compartilhando com seu grupo um

conhecimento oriundo de outro espaço social.

Em função da rejeição de seu modelo por EVA, LIA, inicialmente, no turno 22,

tentou ainda uma defesa do seu modo de pensar (“Não! O Sol se movimenta!”) para,

logo em seguida, no turno 24, dar indício de que estaria reconsiderando a validade

deste modelo, ao lançar uma interrogação: “Será?”

No entanto, nos turnos seguintes deste segmento, após as considerações

realizadas por EVA, nos turnos 25, 27 e 29, de que o modelo apresentado sugeria

que o Sol girava em torno da Terra, a estudante LIA reafirmou o seu modelo

geocêntrico. Primeiro no turno 28 (“Pois é! Realmente, foi para entender isso

mesmo”) e, em seguida, no turno 30, após a indagação de EVA : “Foi o que tu

compreendeste?”, ao responder: “É...”

A análise deste segmento indica que a estudante EVA contrapôs a sua idéia

de modelo planetário à idéia apresentada por LIA em sua representação, o que

sugere uma abordagem comunicativa, para o trecho que compreende os turnos de

19 a 24, do tipo interativo de autoridade.

No entanto, no trecho seguinte, que vai do turno 25 ao turno 30, mesmo com

a dúvida demonstrada por LIA, no turno 24 (será?), EVA passou a atuar no sentido

de explicitar a idéia apresentada por LIA em seu esquema, dando mostras de que

não pretendia contestar mais aquela idéia, ao indagar, no turno 29, “foi o que tu

compreendeste?”. Neste sentido, a abordagem comunicativa deste trecho pode

ser interpretada como sendo interativa dialógica, pois, pelo menos

temporariamente, a estudante EVA aceitou o ponto de vista de LIA.

Não! O Sol se movimenta! O Sol se movimenta! T Sujeito Diálogos (continua) 19 EVA -Por que esses pontinhos aqui o que é que ele está explicando?

(referindo-se ao desenho da LIA) 20 LIA -Ele explica que o Sol se desloca para outra posição, ai vai ficar

exatamente ao contrário 21 EVA -Quem tem movimento é a Terra, o Sol fica parado lá no mesmo

lugar

103

T Sujeito Diálogo (continuação) 22 LIA -Não! O Sol se movimenta! O Sol se movimenta! 23 EVA -O universo gira em torno do Sol, ele fica ali no centro. Quem gira,

quem gira é a Terra. É aquele movimento que tem 365 dias ao redor do Sol. O nosso planeta

24 LIA -Será? 25 EVA -O que as pontilhadas querem, para mim.., para mim.., está

demonstrando é que é o Sol que gira em torno da Terra e não a Terra em torno do Sol.(referindo-se novamente ao desenho da LIA)

26 LIA -Pode falar... pode falar 27 EVA -Se eu estiver errada ,tu podes me corrigir. Mas, não está

parecendo que o Sol gira ao redor da Terra? (falando para todos da equipe)

28 LIA -Pois é! Realmente, foi para entender isso mesmo. 29 EVA -Foi o que tu compreendeste? 30 LIA -É...

QUADRO 7 - Transcrição de um trecho dos diálogos iniciais do grupo espontâneo do qual participou a aluna LIA LEGENDA: T - Turno

No segmento a seguir (Quadro 8), que vai do turno 42 ao turno 53, EVA

apresenta vários argumentos no sentido de convencer LIA a respeito da validade do

modelo heliocêntrico para o sistema solar.

É neste sentido que EVA se manifestou, inicialmente em relação ao

movimento de rotação, no turno 42, “Presta atenção LIA... A Terra faz um giro

completo em.., ela faz isso aqui em 24 horas (...)”, no turno 44, agora em relação

tanto ao movimento de rotação como o de translação, “Ai, aqui está o Sol, ai ela gira

em torno dela mesma, é isso ai, mas ela continua girando, assim, para ela dar essa

volta ao redor do Sol (...)” complementando ainda no mesmo turno a respeito do

movimento de translação: “Ela fica girando assim, olha, todo dia, para fazer esse

giro, ela dura um ano ou 365 dias ou um ano ou o ano bissexto 366 dias”.

No entanto, LIA, que inicialmente dava indícios de que poderia rever sua

concepção em relação a este tema (“Então, digamos que não é o Sol, que o Sol não

se movimenta, que ele permanece sempre naquele.”), utilizou-se das evidências

observacionais do seu cotidiano, de modo a refutar este modelo, como pode ser

visto no turno 45, ”Então, como podemos explicar..., não sei se você já reparou. O

Sol está ali naquele lugar, depois quando a gente vê , o Sol já está batendo naquele

do outro lado. Não sei se você já reparou?”, no turno 50, “Sim, pois é, não sei se

104

vocês já repararam, você está num lugar, assim a gente vê, até mesmo na praia, ou

em casa estendendo [a roupa], ou qualquer coisa assim. O Sol está num lugar né! Aí

tu vai escolher justamente aquele lugar onde o Sol está batendo mais forte, né!” e no

mesmo turno”. Depois ele não muda de lugar? Ele já vai para outro lugar, ou você

muda as coisas, porque ele vai pegar em outro lugar”.

Ao que parece, EVA percebeu que não tinha argumentos capazes de

defender suas idéias frente aos argumentos apresentados por LIA e desistiu do

intento de tentar convencê-la, buscando, para isso, a ajuda do professor, como

representante do conhecimento científico escolar naquele espaço.

Neste segmento a estudante EVA contrapôs a sua idéia de modelo planetário

à idéia defendida por LIA, o que sugere uma abordagem comunicativa do tipo

interativo dialógica uma vez que não há uma sobreposição de um ponto de vista

em relação ao outro, ou seja, as duas idéias estabelecidas aparecem como válidas.

É importante inferir aqui que os argumentos cotidianos de LIA naquele momento

pareciam mais “convincentes” e EVA não conseguiu argumentar que o movimento

aparente do Sol acontecia devido ao movimento real da rotação da Terra. Acredito

que isso se deva a dificuldade que EVA deve ter encontrado para dar uma

explicação desse modelo fazendo uso somente de sua percepção sensorial.

...quando a gente vê, o Sol já está batendo naquele do outro lado. T Sujeito Diálogos (continua)

42 EVA Presta atenção LIA. A Lua está aqui é a Terra. A Terra faz um giro completo em, ela faz isso aqui em 24 horas, 12 horas ela faz de frente para o Sol e a mesma parte que está de frente para o Sol depois de 12 horas ela fica de frente da Lua e das estrelas

43 LIA -Então, digamos que não é o Sol, que o Sol não se movimenta, que ele permanece sempre naquele...

44

EVA -Ai, aqui está o Sol, ai ela gira em torno dela mesma, é isso ai, mas ela continua girando, assim, para ela dar essa volta ao redor do Sol que o sistema solar determina. -Ela fica girando assim, olha, todo dia, para fazer esse giro, ela dura um ano ou 365 dias ou um ano ou o ano bissexto 366 dias. -Entendeu, então o Sol fica parado ali, olha.

45 LIA -Então, como podemos explicar..., não sei se você já reparou. O sol está ali naquele lugar, depois quando a gente vê, o Sol já está batendo naquele do outro lado. Não sei se você já reparou?

46 EVA -É.

105

T Sujeito Diálogo (continuação) 47 ROM -Tá certo. 48 LIA -Mas ai é que está. Não é a Terra, mas o Sol que está ali

realmente...(se movimentando) 49 EVA -Pois é, então, olha o que a LIA disse, então vamos todos escutar,

fala LIA 50

LIA

-Sim, pois é, não sei se vocês já reparam, você está num lugar, assim a gente vê, até mesmo na praia, ou em casa estendendo, ou qualquer coisa assim. O Sol está num lugar ne! Aí tu vai escolher justamente aquele lugar onde o Sol está batendo mais forte, né! -Depois ele não muda de lugar ele já vai para outro lugar, ou você muda as coisas, porque ele vai pegar em outro lugar

51 EVA -O que entendi uma vez, lendo, é que às vezes a gente vive de cabeça para baixo. -Eu ouvi dizer...Eu não me lembro mais....Que nós ficamos de cabeça para baixo, mas nós não sentimos. -Não é verdade? Vocês já ouviram falar isso?

52 LIA -Eu não! Nunca ouvi falar. 53 EVA -Com licença, então. Vamos chamar o professor.

QUADRO 8 - Transcrição de um trecho dos diálogos do grupo espontâneo do qual participou a aluna LIA LEGENDA: T - Turno

A presença do professor foi solicitada no grupo. EVA buscou apoio para

defender sua posição que foi contestada por LIA. Esta, por seu lado, não deu

indícios, até então, de que pudesse vir a aceitar uma idéia relacionada com o

modelo heliocêntrico para o sistema solar.

Neste sentido, foi que no segmento seguinte (Quadro 9 que vai do turno 59 ao

turno 75) EVA solicitou a opinião do professor, no turno 59, acerca das idéias que

vinha defendendo no grupo, pois, como afirmou, no turno 63 (No caso, ela acha que

o Sol gira em torno da Terra, mas eu sei que isso não é verdade. Eu acho né, mas

não posso afirmar), não teria argumentos capazes de sustentar essa posição, o que

a faz questionar o professor, no turno 65: “Eu queria saber, professor, por quê?”

O professor, no entanto, em vez de fornecer uma resposta para o

questionamento de EVA voltou à atenção para LIA, ao inquiri-la, no turno 68, sobre a

sua opinião sobre o tema em questão (O que é que tu achas LIA: O Sol está fixo e a

Terra é quem está girando, ou tu achas que a Terra é quem está fixa e o Sol é que

está girando?).

106

LIA forneceu sua opinião a este respeito no turno 73, ao afirmar que, “No

caso, (...) digamos que é a terra que (...) vai ficar sem se mover e é o Sol que vai

mudar de posição”. No entanto, antes desta manifestação, LIA ofereceu indícios de

que já não tinha tanta certeza a cerca de sua idéia a respeito de um modelo para o

sistema solar, ao manifestar-se, no turno 69, nos seguintes termos: “Eu acho que, ...

não sei, nada”.

Ante a negativa de EVA a este posicionamento (turno 74: Eu não aceito!...), o

professor propõe para as estudantes a tarefa de uma tentar convencer a outra

acerca do seu ponto de vista, ao manifestar-se no turno 75: “Então, convence ela!

(dirigindo-se a EVA), ou então, convence ela! (dirigindo-se a LIA).

O professor atuou, neste segmento, com a intenção de explorar as visões e

entendimentos dos estudantes a respeito do tema em discussão, como ocorre, por

exemplo, em sua manifestação no turno 68, em que questionou LIA sobre qual dos

dois astros, Terra ou Sol, estaria em movimento, caracterizando, ainda, uma

intervenção no sentido de checar o entendimento da referida estudante em torno

do tema.

A manifestação do professor, no turno 75, quando transferiu para as duas

estudantes a responsabilidade de uma tentar convencer a outra a respeito do seu

ponto de vista particular, sugere uma abordagem comunicativa que pode ser

caracterizada como interativa dialógica, uma vez que, pelo menos

temporariamente, não marcou posição em relação a um dos modelos em discussão.

107

Então, convence ela! T Sujeito Diálogos

59 EVA -Professor...Professor..Professor Alexandre, por favor , professor.... -Nós estamos conversando, uma coisa, e gostaríamos de sua opinião

60 Prof. -Tudo bem. 61

EVA -Porque aqui no nosso desenho, Cadê o desenho? -Tá aqui, ela (referindo-se a LIA) acha que o Sol gira em torno da terra. - Eu e vamos dizer que até o NEI, porque a ISA se referiu mais ao que a gente faz de dia e de noite no desenho dela. -Cadê o do NEI? Cadê o teu NEI?- Tá aqui -Então nós estávamos numa certa enrolaçãozinha. -Quando nós estamos em nossa casa no lado do varal está Sol, quando é mais tarde não tá. -Então, quando eu estudei, não lembro...que a gente fica de cabeça para baixo, isso é verdade mesmo? Nós não nos sentimos ficar de cabeça para baixo, em algum momento do dia.

62 Prof -Mas, em relação a quê, que tu achas que a gente está de cabeça para baixo?

63 EVA -No caso, ela acha que o Sol gira em torno da Terra, mas eu sei que isso não é verdade. Eu acho né, mas não posso afirmar

64 TODOS Todos riem... 65

EVA -A Terra gira em torno dela mesma em um dia e 365 dias em torno do Sol, ao redor do Sol, e essa indicação dela (referindo-se a LIA) devido o Sol está num lugar e que depois ele, está do outro lado do horizonte, uma coisa assim ... não é verdade. - Eu queria saber professor por quê?

66 Prof -Mas, olha só, ...a explicação ... ( o Professor é interrompido) 67 EVA -Porque, o que eu achei que é a explicação foi que nós ficamos de

cabeça para baixo, então na posição, o Sol fica ali parado, mas a gente se movimenta, então passa para o outro lado o Sol.

68 Prof. -O que é que tu achas LIA: O Sol está fixo e a Terra é quem está girando, ou tu achas que a Terra é quem está fixa e o Sol é que está girando?

69 LIA -Eu acho que, ... não sei, nada... 70 EVA -É a Terra ... 71 LIA -É..... 72 EVA -Porque se tu fores olhar para o globo terrestre, ali está o mapa,

não é, porque um lado do mapa está aparecendo pro Sol, depois ele vai virando .. até aparecer o outro lado.

73 LIA - No caso, do outra posição é, digamos que é, a Terra que é que vai ficar sem se mover e é o Sol vai, ... mudança de posição.

74 EVA -Eu não aceito!... 75 Prof -Então, convence ela! (dirigindo-se a EVA) , ou então, convence ela!

(dirigindo-se a LIA) QUADRO 9 - Transcrição de um trecho dos diálogos do grupo espontâneo do qual participou a aluna LIA em que o professor participa da discussão LEGENDA: T - Turno

108

Na seqüência do diálogo (Quadro 10) que estava se desenvolvendo no grupo,

a estudante EVA, no turno 84, voltou a interpelar o professor, na tentativa de que

este emitisse a sua opinião sobre a validade de um dos dois modelos em discussão.

No entanto, o professor se manifestou buscando a participação de ISA e de NEI no

diálogo (turno 85), que estava totalmente centrado nas duas estudantes

anteriormente referidas, LIA voltou a oferecer indícios de que estaria prestes a

abandonar, pela segunda vez, o ponto de vista que vinha defendendo, ao se

manifestar, no turno 88, nos seguintes termos: “Não, tudo bem, eu realmente, eu já

cheguei a seguinte conclusão”, conclusão está, que não é explicitada pela

estudante, por ser interrompida pelo próprio professor, como pode ser observado no

turno 89 do diálogo transcrito a seguir.

A gente está querendo saber quem está certo ou quem está errado?

T Sujeito Diálogos 84 EVA -A gente está querendo saber quem está certo ou quem está

errado? 85

Prof

-..o modelo que a EVA está pensando e o modelo que a LIA está pensando, não é? -Todos os dois modelos de alguma forma acaba mostrando, não é? uma, uma...o que a gente olha , o que a gente nota, não é? ...Agora, qual é o que tu pensas ISA ? Qual é o que tu pensas NEI? -Tu achas que, a forma como a EVA está pensando é mais próxima do que tu pensas? -A mesma coisa eu falo para ti NEI ou é o que a LIA, é mais próximo daquilo que tu pensas, não é?

86 ISA -Tem que se mover mais rápido pra gente não poder cair 87 EVA -Eu ouvi em algum lugar ... 88 LIA -Não, tudo bem, eu realmente, eu já cheguei a seguinte conclusão 89 Prof -Tudo bem, vamos imaginar que você fique de cabeça para baixo,

por que é que você não cai? QUADRO 10 - Transcrição de um trecho dos diálogos do grupo espontâneo do qual participou a aluna LIA em que o professor novamente participa da discussão. LEGENDA: T - Turno

Somente no trecho de diálogo mostrado abaixo (Quadro 11), que iniciou com

a estudante ISA (turno 102) tentando oferecer sua contribuição para a discussão em

pauta, conforme havia sido solicitado pelo professor no trecho anterior, é que LIA, ao

interromper a fala de ISA (turno 106), apresentou a conclusão anunciada

109

anteriormente, nos seguintes termos (turno 107): “Eu cheguei no meu consenso. O

meu consenso, digamos, é como o Professor falou, né! Digamos que o Sol vai ficar

ali parado e a Terra é que vai se movimentando aos poucos sem que a gente

perceba. Vai fazendo com que o Sol vai ficando ali para trás. Aí vai escurecendo

entendeu?”

O percurso de LIA, nesta fase inicial da intervenção pedagógica, merece

algumas considerações no sentido de que: em primeiro lugar, a mudança

demonstrada pela estudante, no turno 107, pareceu ter ocorrido em função da

oposição assumida pela estudante EVA, durante todo o trajeto em que o tema em

questão foi discutido, visto que, pelo menos de forma explicita, o professor não se

posicionou a favor de uma ou de outra das posições defendidas pelas estudantes.

Em segundo lugar, na transcrição não aparece claramente em que momento LIA é

convencida de que o modelo que se opunha ao seu mostrava-se mais adequado

para explicar a sucessão do dia e da noite na Terra. Em terceiro lugar, o

posicionamento da estudante no turno 107, além de optar por um modelo

heliocêntrico, procurou dar uma explicação em relação ao fenômeno da sucessão

entre o dia e a noite na Terra, mesmo que tenha deixado claro que a estudante

estivesse pensando em termos de rotação da Terra. Em quarto lugar, a estudante

buscou apoio na autoridade do professor, como representante do conhecimento

científico escolar em sala, para justificar seu posicionamento no turno 107 (Eu

cheguei no meu consenso. O meu consenso, digamos, é como o Professor falou,

né!), mesmo que, como já foi destacado, o professor não tinha tomado partido por

nem uma das idéias em discussão. No entanto, quero inferir que a estudante LIA

pode ter mudado sua forma de pensar quando compreendeu que o movimento

aparente do Sol poderia ser explicado pelo movimento de rotação da Terra. A

oposição de EVA pode ter contribuído para que ela considerasse essa hipótese,

além do professor e de seus outros colegas que poderiam ter apoiado essa

concepção heliocêntrica, mesmo que de forma não verbal.

110

Eu cheguei no meu consenso T Sujeito Diálogos

102 ISA -Pois é, nesta situação que a gente está discutindo e como o professor estava perguntando o que eu achava ... -eu não sei ... (ocorre uma interrupção da exposição de sua idéia por uma das alunas)

103 EVA -Não está filmando, só está gravando a sua voz... 104 ISA -Mas, eu quero falar! 105

LIA -Então fale! (todos riem) -Não fique rindo, você só vive rindo minha filha, não fique encabulada. -O que você acha?

106 ISA -O que eu acho...( ela novamente é interrompida) 107 LIA -Eu cheguei no meu consenso. O meu consenso, digamos, é

como o Professor falou, né! -Digamos que o Sol vai ficar ali parado e a Terra é que vai se movimentando aos poucos sem que a gente perceba. Vai fazendo com que o Sol vai ficando ali para trás. Aí vai escurecendo entendeu?

QUADRO 11 - Transcrição de um trecho dos diálogos do grupo espontâneo do qual participou a aluna LIA estabelecendo uma posição conclusiva LEGENDA: T - Turno

O professor distribuiu ao grupo três esferas de isopor de volumes diferentes e

solicitou que os estudantes caracterizassem, cada uma delas, como sendo o Sol, a

Terra e a Lua. Os estudantes deveriam, então, utilizar estas esferas para propor um

modelo explicativo para o fenômeno da sucessão do dia e da noite na Terra.

Após uma discussão inicial com o objetivo de definir que esfera representaria

qual dos astros, os estudantes voltaram-se, então, para a busca de uma explicação

para o fenômeno.

O segmento a seguir (turnos 114 a 135) mostra que as discussões

(Quadro12), neste grupo, continuavam polarizadas entre as estudantes LIA e EVA,

com o diferencial de que, neste momento quem mostrava segurança em suas

manifestações era LIA.

É neste sentido que LIA, no turno 117, reafirmou a conclusão a que chegou

anteriormente em relação ao movimento da Terra em relação ao Sol. No entanto, foi

a proposição de EVA (turno 118) que foi aceita por LIA (turno 119) e pelos demais

111

estudantes do grupo, visto que não houve manifestação em contrário, de que “a Lua

permanece paradinha” (turno 118), enquanto a Terra movimentar-se-ia em relação

ao Sol. Apesar da manifestação de EVA no turno 120 ao dizer; ”Tem uma coisa meio

confusa aqui”, esta proposição não foi retomada neste segmento.

As atenções das estudantes voltaram-se, então, para os movimentos de

rotação e translação da Terra. No turno 121 LIA iniciou afirmando que “a Terra gira

em torno dela”, no que foi acompanhada por EVA, no turno 122, para em seguida

LIA nomear esse movimento no turno 125 (Num movimento de rotação).EVA, no

entanto, mostrava dúvida quanto à nomeação conferida a este movimento no turno

126 (Eu acho, né!) e no turno 134 (De rotação? É esse o nome? Translação...,tem

dois tipos de giro, pera lá!), o que levou LIA a reafirmar, no turno 135, que esse

movimento “é de rotação!”.

O diálogo desenvolvido entre as duas estudantes continuou sendo no sentido

da construção de uma explicação. Podemos caracterizar a atuação de LIA como

uma abordagem comunicativa interativa de autoridade, visto que, além de

direcionar a escrita da resposta do grupo, em relação à dúvida demonstrada por

EVA nos turnos 126 e 134, foi enfática em afirmar que este tipo de movimento “é de

rotação” (turno 135).

A Terra gira em torno dela T Sujeito Diálogos (continua)

114 EVA -Agora nós precisamos chegar a uma conclusão com relação a essa outra parte. Olha a pergunta? O que você explica a ocorrência sucessiva do dia e da noite na Terra e faça um desenho capaz de ilustrar esse fato. -O que nós todos pensamos e colocarmos ... pronto!

115 LIA -Pois é... 116 EVA - Agora ta. O que nós chegamos a conclusão? 117

LIA -Por que eu? -Chegamos a conclusão que o Sol permanece parado e a Lua vai se movimentando sem que nós notemos, a Terra quer dizer.

118 EVA Porque a Lua permanece paradinha 119 LIA -Vai coloca ai permanece no mesmo lugar 120 EVA -Tem uma coisa meio confusa aqui... 121 LIA -A Terra gira em torno dela 122 EVA -Terra gira em torno dela mesma, é isso aqui, oh!

112

T Sujeito Diálogos (continuação) 123 LIA -Digamos que Deus... Dá pra entender que a Terra gira em

torno de outra Terra, a Terra gira em torno da Terra 124 EVA / LIA -A Terra gira em torno dela mesma (as duas falam ao mesmo

tempo) 125 LIA -Num movimento de rotação 126 EVA -Eu acho, né. 127 LIA -E a Terra se movimenta 128 EVA -A Terra fica metade dia e metade Sol 129 LIA -Pois é. 130 EVA -Aliás, metade dia e metade noite 131 LIA -Digamos que vamos colocar que ela faz.... 132 EVA -E agora continua ai dizendo que a Terra... Calma, pera ai

vamos tentar...a Terra faz um giro dela mesma, né , como é que vamos colocar?

133 LIA -Faz um giro de rotação T Sujeito Diálogo

134 EVA -De rotação?É esse o nome?..Translação...tem dois tipos de giro pera lá.

135 LIA -É de rotação! QUADRO 12 - Transcrição de um trecho dos diálogos finais do grupo espontâneo do qual participou a aluna LIA LEGENDA: T - Turno

A participação do professor, após a distribuição das esferas, aconteceu no

segmento apresentado abaixo (turnos 149 a 163) (Quadro 13), que iniciou, com a

estudante LIA apresentando a conclusão do grupo, em relação aos movimentos

relativos de Lua, Terra e Sol, nos seguintes termos: “Que a Lua gira em torno da

Terra e que a Terra gira em torno do Sol” (turno 149), demonstrando, nesta fase da

ação pedagógica, ter aceitado como seu o discurso da ciência escolar a respeito

deste tema.

O professor, então, direcionou as estudantes para a construção da

explicação, ao pronunciar-se, no turno 152 (E para que aconteça a sucessão do dia

e da noite? O que faz acontecer para ser dia e ser noite?), reforçando no turno 154

[Me mostra aqui nos modelos (referindo-se às esferas). Como acontece isso?].

A explicação foi fornecida em seguida, numa seqüência de verbalizações das

estudantes LIA e EVA, que iniciou com a afirmação de que o Sol fica parado (turno

113

155), de que a Terra faz um movimento de rotação em 24 horas (turno 156), sendo

que a parte que está voltada para o Sol fica dia e, no lado oposto, fica noite por não

ter iluminação solar (turno 158), complementada com a afirmação de que a Lua gira

em torno da Terra e a Terra gira em torno do Sol (ainda no turno 158) e concluiu

com a afirmação no turno160 de que: “esse giro (referindo-se a translação) ocorre

em 365 dias”.

O professor, então, fez um último questionamento a respeito da existência ou

não de uma relação entre a Lua e a noite, no turno 161 (Tá! Agora me diz uma

coisa: quando for dia, tem Lua ou não tem Lua?), ao qual as estudantes em coro

respondem que “tem Lua sim” (turno 162), com a estudante LIA, no turno 163,

complementando esta resposta, acrescentando que: “Ela não fica bem visível por

causa da luminosidade do Sol”.

Mais uma vez, neste segmento, o professor atuou com a intenção de

explorar a visão dos estudantes em relação ao fenômeno da sucessão do dia e da

noite na Terra, ao questioná-los, neste sentido, nos turnos 152 e 154. Sua

intervenção aconteceu no sentido de marcar um significado chave, quando

solicitou, no turno 150, que a estudante repitisse a sua afirmação anterior.

O conteúdo do discurso continuou relacionado à construção de uma

explicação. A abordagem comunicativa pode ser caracterizada como interativa

de autoridade, visto que o professor trabalhou com o objetivo de propiciar o

desenvolvimento de uma visão o mais próxima possível do conhecimento científico

escolar para o tema em questão, sendo que o padrão de interação é do tipo I – R –

A – R –A, ou seja, iniciação por parte do professor (turno 152/154), resposta do

estudante (turno 155/156), avaliação por parte do professor (turno 157),

possibilitando que o estudante continue a elaborar seu raciocínio (turno 158).

114

Que a Lua gira em torno da Terra e que a Terra gira em torno do Sol

T Sujeito Diálogos 149 LIA -Que a Lua gira em torno da Terra e que a Terra gira em torno

do Sol (falando muito baixo) -Chegamos a essa conclusão

150 Prof -Repete! 151 LIA -Que a Lua gira em torno da Terra 152 Prof -E para que aconteça a sucessão do dia e da noite? O que

faz acontecer para ser dia e ser noite? 153 LIA -Faz acontecer que a Lua enquanto o Sol está parado a Lua

se movimenta sem que a gente perceba... 154 Prof - Me mostra aqui nos modelos (referindo-se as esferas). Como

acontece isso? 155 LIA -O Sol fica parado, professor, faz com que a Terra... 156 EVA -A Terra faz um giro (rotação mostrando na esfera caracterizada como

Terra) em 24 horas e 24 horas 157 Prof -Certo 158

EVA -A parte que está de frente para o Sol fica dia e a parte que está ... fica noite porque não tem iluminação solar neste lado. Ela faz isso aqui (mostrando para o modelo). - A Lua gira em torno da Terra e a Terra gira em torno do Sooll... -Ok!

159 Prof -Certo! 160 EVA -E esse giro (referindo-se a translação) ocorre em 365 dias 161 Prof -Tá! Agora me diz uma coisa: quando for dia, tem Lua ou não

tem Lua? 162 EVA/ LIA -Tem Lua sim 163 LIA -Ela não fica bem visível por causa da luminosidade do Sol

QUADRO 13 - Transcrição de um trecho dos diálogos finais do grupo espontâneo do qual participou a aluna LIA com a participação do professor na discussão LEGENDA: T - Turno

A resposta escrita apresentada pelo grupo espontâneo do qual participou a

estudante LIA, estabeleceu a sucessão do dia e da noite na Terra compatível com o

nível D da categorização proposta neste estudo. Os estudantes afirmaram: “que o

Sol permanece no mesmo lugar, que a Terra é quem gira em torno do Sol. A Terra

se movimenta fazendo com que outros pontos da Terra recebam a luz do Sol e ao

mesmo tempo a outra parte da Terra vai escurecendo, por isso temos o dia e a

noite. A Terra gira em torno dela mesma num movimento de rotação e leva 24 horas

para fazer esse giro, a parte da Terra que fica de frente pro Sol é dia e a outra é

115

noite. A Lua permanece parada esperando que a noite chegue para poder brilhar. A

Lua gira em torno da Terra e a Terra gira em torno do Sol”.

Convém esclarecer que, apesar da resposta escrita do grupo ter sido

classificada como compatível com o nível D das categorias propostas neste estudo,

apesar ainda, das estudantes LIA e EVA terem demonstrado compreender a

cinemática do movimento desses corpos celestes, concebendo a idéia do modelo

heliocêntrico, com a translação da Lua ao redor da Terra, conforme pode ser

observado em vários momentos do percurso analisado, pode-se notar, ainda, na

resposta escrita uma contradição, pois aparece no discurso “A Lua permanece

parada esperando que a noite chegue...” e logo em seguida “A Lua gira em torno da

Terra e a Terra gira em torno do Sol”, além de demonstrar no desenho da Figura 25,

um apelo para uma Lua como elemento indispensável na formação da noite. A Lua

falcada12 é apresentada com um elemento fortemente ligada ao cotidiano, ou seja,

ainda há um híbrido entre o conhecimento construído nas relações cotidianas com

esse fenômeno e a compreensão do conhecimento científico escolar.

Figura 25 - Desenho contido na resposta do grupo espontâneo (Ge3) no qual LIA participou

Na continuidade desta seqüência didática, em que os estudantes foram

reorganizados em novos grupos (grupo recombinado) a participação da estudante

LIA ocorreu de forma mais discreta, diferindo bastante da sua participação no grupo

anterior, em que era dominante o seu diálogo com a estudante EVA e com o

professor.

Já analisamos as ações discursivas deste grupo quando tratamos a respeito

do percurso do estudante NOÉ. Convém relembrar que esse grupo encaminhou

12 Lua falcada é a representação da Lua em forma de foice.

116

muito bem a idéia da sucessão do dia e da noite na Terra, dissociado da presença

da Lua.

A participação de LIA neste grupo ocorreu no segmento mostrado a seguir,

que vai do turno 82 ao turno 93 (Quadro 14). Convém esclarecer que os estudantes,

anteriormente a este segmento, já haviam discutido a respeito da sucessão do dia e

da noite na Terra.

Este segmento iniciou com o estudante RUI, no turno 83, sintetizando uma

conclusão a que teria chegado o grupo: “Sim, temos aqui o Sol, a Terra. Aqui dia e

aqui noite (já havia colocado essas informações na esfera que representava a

Terra)”.

NOÉ, no entanto, manifestou-se, no turno 84, no sentido de buscar relacionar

a presença da Lua com a noite na Terra, idéia que foi repelida pelo estudante RUI

(turno 86: “A Lua não tem nada a ver”). A estudante LIA interpelou, então, o

estudante RUI, no turno 87, nos seguintes termos: “Não tem? (...) e como tu me

explicas quando no interior é Lua cheia e ela clareia rapidamente?”.

RUI, por sua vez, esclareceu no turno 88 que isso ocorre “(...) por que a Terra

está em rotação e a Lua gira em torno da Terra, quando aqui é noite (lado não

voltado para o Sol) se a Lua aparecer ela reflete a luz do Sol”. A estudante LIA

mostrou-se satisfeita com a esta explicação, uma vez que, no turno 89 ela

expressou-se da forma a seguir: “Há! é” (essa expressão estabelece uma interação

de concordância).

RUI ainda complementou sua explicação, no turno 92, declarando que “A Lua

funciona como um espelho refletindo os raios solares [que] atingem a Terra”, o que

leva LIA a manifestar-se da seguinte forma: “E isso acontece e reflete ao redor da

Lua (referindo-se ao movimento da Lua ao redor da Terra, gesticulando com as

mãos)”, o que indica que a estudante parece ter compreendido que a luminosidade

apresentada pela Lua é apenas um reflexo da luz solar. O gesto realizado pela

estudante com as mãos demonstra entendimento de que a sucessão do dia e da

noite na Terra não depende da Lua.

117

Neste segmento, a intenção do professor no turno 85 foi a de explorar a

visão dos estudantes a respeito do tema em discussão o que caracterizaria uma

intervenção no sentido de checar o entendimento do estudante NOÉ em relação a

influencia da Lua na sucessão do dia e da noite na Terra.

O conteúdo discursivo gerado caracteriza-se como uma explicação, como

ocorre, por exemplo, no turno 88, onde o estudante RUI responde ao

questionamento da estudante LIA, no turno 87, em relação à fase da Lua

denominada de Lua cheia. A abordagem comunicativa é interativa de autoridade,

diante do posicionamento do estudante RUI, ao contrapor-se à idéia apresentada

por NOÉ.

A Lua funciona como um espelho

T Sujeito Diálogos 82 Prof -Fecharam uma resposta, uma conclusão 83

RUI

-Sim, temos aqui o Sol, a Terra. Aqui dia e aqui noite (já havia colocado essas informações na esfera que representava a Terra)

84

NOÉ

-Se não existisse a Lua, haveria uma escuridão total, por que a Lua ela reflete o Sol, a Lua é apenas...

85 Prof -Tu concordas com ele (reportando-se ao RUI).

86 RUI -A Lua não tem nada a ver 87

LIA

-Não tem? E sim , e como tu me explicas quando no interior é Lua cheia e ela clareia rapidamente?

88

RUI

-É simples, por que a Terra está em rotação e a Lua gira em torno da Terra, quando aqui é noite (lado não voltado para o Sol), se a Lua aparecer ela reflete a luz do Sol.

89 LIA -Há , é. 90 EDU ( aplaude o RUI) 91 ISA ( aplaude o RUI) 92

RUI

-A Lua funciona como um espelho, refletindo os raios solares que atingem a Terra.

93

LIA

-E isso acontece e reflete ao redor da Lua (referindo-se ao movimento da Lua ao redor da Terra, gesticulando com as mãos)

QUADRO 14 - Transcrição de um trecho dos diálogos do grupo recombinado do qual participou a aluna LIA LEGENDA: T - Turno

A resposta escrita apresentada como consenso por este grupo recombinado

estabeleceu para a sucessão do dia e da noite na Terra uma idéia que pode ser

classificada no nível D das categorias propostas para este estudo, ou seja, os

118

estudantes afirmaram que “O dia e a noite ocorre devido ao movimento de rotação

que a Terra exerce. Logo quando um lado do globo está iluminado pelos raios

solares, o outro não está, criando assim o dia e a noite”, idéia esta que pode ser

complementada através do desenho apresentado na Figura 26 pelos estudantes.

Figura 26 - Desenho contido na resposta do grupo recombinado (GrZ) no qual LIA participou.

Em seu pós-teste a estudante LIA apresentou uma resposta compatível com

o nível D da categorização apresentada neste estudo. Sua manifestação pareceu

indicar que a estudante internalizou a idéia de que a sucessão ocorre em função da

rotação da Terra, tornando o discurso construído no espaço social dos grupos que

participou na sala de aula, reelaborando o mesmo e externalizando como seu nos

seguintes termos: “É por causa do movimento de rotação que a Terra faz”, idéia esta

complementada pelo desenho proposto pela estudante em questão na Figura 27.

Figura 27 - Desenho da aluna LIA em seu pós-teste

Em síntese, a estudante LIA que no seu pré-teste explicava a sucessão

através da translação do Sol provavelmente construído da observação empírica que

se tem do movimento do Sol tendo como referência a superfície terrestre (modelo

119

ptolomaico) fazendo uso de um discurso segundo um nível B da categoria de

respostas deste estudo, evolui conceitualmente e alcançou o nível D em sua

resposta final quando parece ter compreendido de que forma acontece o fenômeno

da sucessão do dia e da noite na Terra, de acordo com um modelo heliocêntrico.

A interação social em sala de aula foi fator determinante para a evolução

conceitual da estudante. É notório que as mudanças de pensamento da estudante

ocorreram devido à compreensão do modelo científico vigente através da interação

da estudante com os colegas dos grupos em que participou.

O grupo espontâneo foi importante para a compreensão não só do modelo de

mundo heliocêntrico como do entendimento do fenômeno da sucessão do dia e da

noite na Terra relacionada com a rotação da Terra e isso aconteceu principalmente

na sua interação com a aluna EVA, e com menor intensidade com o Professor, que

mediaram às discussões estabelecendo principalmente em certos momentos um

discurso interativo dialógico e em outros interativos de autoridade.

O grupo recombinado foi fundamental para a compreensão da sucessão do

dia e da noite na Terra como dependente da rotação da Terra dissociando o

fenômeno da presença da Lua. Nesse sentido a interação com o aluno RUI e com o

Professor foi fundamental. O uso das esferas de isopor foi importante como

facilitador da compreensão do fenômeno estudado.

120

7.CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conhecer os conceitos espontâneos de estudantes é de fundamental

importância para compreender a forma como aprendem os conceitos científicos. De

acordo com Vygotsky (2000, p.107), os conceitos científicos “não são aprendidos

mecanicamente, mas evoluem com a ajuda de uma vigorosa atividade mental...”, ou

seja, o desenvolvimento dos conceitos espontâneos e científicos se relacionam e se

influenciam.

Desta forma os resultados obtidos no pré-teste, me permitiram identificar a

forma de pensar dos estudantes sobre a sucessão do dia e da noite na Terra,

fenômeno associado ao movimento Terra-Lua-Sol.

A partir do pré-teste estabeleci categorias de respostas a fim de classificar as

respostas dos estudantes em níveis de conhecimento com o objetivo de estabelecer

um perfil de seus conhecimentos prévios. Os níveis foram de A até D, sendo o

primeiro o mais afastado e o último o mais próximo do conhecimento cientifico

escolar .

No nível A foram agrupadas as respostas de seis estudantes representando

31,57% da totalidade dos sujeitos, cuja percepção a respeito da sucessão do dia e

da noite na Terra estava relacionada com um discurso religioso ou um discurso do

cotidiano. No nível B agruparam-se as respostas de dois estudantes (10,52%), em

que o entendimento da sucessão do dia e da noite na Terra estava associada ao

movimento do Sol ao redor da Terra (geocêntrico). No nível C reuniu-se as

respostas de cinco estudantes (26,41%) que associaram a sucessão do dia e da

noite na Terra a uma translação da Terra em torno do Sol e, por último, no nível D

agruparam-se as respostas de seis estudantes (31,57%) que reconheceram que a

sucessão do dia e da noite na Terra estava relacionada à rotação da Terra.

Verifiquei, quando comparei os resultados do pré-teste com o do pós-teste,

que dos 19 estudantes que participaram das verificações inicial e final e do processo

ensino-aprendizagem 13 estudantes demonstraram melhoria do perfil conceitual,

121

pois migraram dos níveis A, B ou C para o nível D. Os outros 06 estudantes que já

se encontravam no nível D permaneceram nesse nível, porém melhoraram

qualitativamente as suas respostas em comparação com aquelas fornecidas em

suas respostas iniciais.

Esses resultados indicam que os estudantes estavam motivados a participar

das atividades propostas, que trocaram conhecimento entre si e com o professor e

que efetivamente aprenderam, pois melhoraram suas explicações em relação as

suas respostas iniciais.

Um outro aspecto a destacar corresponde ao recorrente uso no pré-teste de

argumentos religiosos para explicar a sucessão do dia e da noite na Terra indicando

que os estudantes da EJA trazem para o espaço social da sala de aula significados

desenvolvidos em outros espaços culturais. Vale ressaltar que esse tipo de

argumento não foi recorrente entre os estudantes do ensino regular no primeiro

trabalho que motivou esta pesquisa. Sugiro um estudo mais pormenorizado dessa

temática como um desafio para futuras pesquisas

Na análise dos percursos individuais da construção de conhecimentos, dos

estudantes ANA, NOÉ e LIA, que tinham suas respostas escritas iniciais

classificadas nos níveis A ou B, verifiquei, durante suas interações com o professor

e com os colegas, que eles incorporaram elementos do discurso científico,

conseguindo elaborar explicações teóricas para o fenômeno observado alcançando

o nível D. Essa mudança no conteúdo de suas respostas estava relacionada com a

compreensão do modelo planetário estabelecido pela ciência, ou seja, pelo

entendimento da sucessão do dia e da noite na Terra está associado com a sua

rotação.

Essas explicações melhor elaboradas foram resultados de diferentes

mecanismos de ajuste da ajuda educacional oferecida pelo professor e pelos

colegas. Tais mecanismos foram possibilitados pelo trabalho com diferentes

formatos de grupo e uma abordagem predominantemente dialógica em sala de aula.

122

Nas atividades de ensino de ciências e incluo nesse particular o ensino da

física e da astronomia não devemos limitar a ação dos alunos a simples observação

ou a manipulação, se faz necessário explorar seus conhecimentos prévios, seus

argumentos e seus potenciais a fim de que compreendam os fenômenos da

natureza que os cerca. Segundo Carvalho (2001, p.167) a resolução de um

problema envolve reflexão, relatos, discussões, ponderações e explicações. Nas

palavras dessa autora: ”...pretendemos com as atividades de conhecimento físico

criar condições, em situações de ensino, para levar o nosso aluno a pensar sobre o

mundo físico que o rodeia”.

Nesse sentido o meu papel como professor teve três atuações básicas. A

primeira como estruturador das atividades que foram desenvolvidas em sala de aula,

perpassando pela organização dos grupos espontâneos e reestruturação dos grupos

recombinados além do estabelecimento das tarefas a serem realizadas por esses

grupos. A segunda como regulador da interação nos grupos buscando direcionar

seus trabalhos e buscando envolver os seus membros na tarefa proposta. A terceira

como mediador e negociador da transição dos conceitos cotidiano para o científico

uma vez que no plano social da sala de aula quase sempre o professor aparece

como representante da ciência naquele espaço.

Por outro lado a interação entre os estudantes foi extremamente relevante,

pois foi possível perceber a construção de significados a partir das discussões

estabelecidas entre eles. Segundo Colomina e Onrubia (2004, p.285), referindo-se a

uma estrutura cooperativa de organização social de atividades e tarefas em grupos

em sala de aula, “...os alunos encontram na interação entre iguais amplas

oportunidades para se envolverem em um autêntico processo de construção

conjunta de metas, planos, idéias e conceitos, apoiando-se para isso na

possibilidade de coordenar e controlar mutuamente suas contribuições, seus pontos

de vistas e seus papeis na interação, [...].”. Nesse sentido muitas vezes a tutoria foi

estabelecida por um deles como ocorreu com a aluna EVA, em alguns momentos do

grupo espontâneo, mostrou-se como mediadora na tentativa de conduzir LIA ao

entendimento, seja do modelo de mundo entendido aqui como heliocêntrico, seja da

sucessão do dia e da noite na Terra relacionado com a rotação da Terra.

123

Observei, durante as discussões, que a resposta consensual dos grupos não

implicou necessariamente que tenha havido internalização dessa concepção por

todos os seus componentes. Nesse sentido, a aluna ANA, por exemplo, demonstrou

não ter internalizado o entendimento do grupo espontâneo ao qual pertencia, só

ocorrendo mudança de sua concepção no grupo recombinado. Acredito que o

estado emocional, as dificuldades enfrentadas durante o dia de trabalho quase

sempre com jornadas longas e com atividades braçais realizadas pelos estudantes

da EJA deixam os estudantes algumas vezes alheios às atividades. Daí a

necessidade de estimular a participação dos mesmos em atividades em que eles

sejam os atores principais em um ensino não mais centrado no professor. Faz-se

necessário, portanto propor atividades que desperte o interesse dos estudantes.

Também é importante estabelecer critérios que (re)combinem os componentes dos

grupos a fim de estimular a participação de todos.

Nos grupos recombinados analisados, a tônica da discussão foi o

entendimento da compreensão da sucessão do dia e da noite na Terra como

dependente da rotação da Terra, dissociando da presença da Lua. O estudante NOÉ

por exemplo, tomando como referência a resposta fornecida em seu grupo

espontâneo, bem como seus argumentos durante o início das interações no grupo

recombinado, deixou claro que sua compreensão da sucessão do dia e da noite na

Terra estava associada à translação da Terra (nível C), além de que sua concepção

sobre a noite estava fortemente associada à presença da Lua. Nesse sentido a

interação no plano social da sala de aula com o aluno RUI e com o professor da

turma, foi importante tanto para a desconstrução destas noções quanto para a

reconstrução e/ou negociação de um novo conceito. A qualidade afetiva da

mediação pode ter sido fundamental neste processo

Foi possível observar também, a partir da análise das respostas escritas

individuais iniciais e finais, das respostas consensuais dos grupos espontâneos e

recombinados e da análise das interações entre os estudantes e deles com o

professor, que os percursos individuais, que os levaram a explicações melhor

elaboradas, não foram necessariamente similares e não ocorreram como um

processo linear e progressivo. Isso também foi observado por Pessoa e Alves

(2007); Costa, Oliveira e Alves (2006) em trabalhos que analisaram a construção de

124

conceitos em aulas de química e por Gomes (2006) em aulas de biologia, e vai ao

encontro de teorias, como as desenvolvidas por Vygoysky, que consideram o

desenvolvimento do pensamento humano não como um processo cumulativo e

seqüencial, mas sujeito a mudanças algumas vezes lentas, outras vezes bruscas

num ir e vir progressivo e retrógrado.

Nesse sentido, Tudge (1996, p.152), em um estudo sobre os efeitos da

colaboração entre colegas esclarece que a concepção de zona de desenvolvimento

proximal (ZDP) da teoria de Vygotsky “se estende não apenas no sentido do avanço

da criança, mas em torno dela, de modo que, em diferentes circunstâncias, as

crianças podem ser levadas tanto a um desenvolvimento quanto a uma regressão

em seu pensamento, dependendo da natureza de suas interações sociais”. Nossos

resultados permitem afirmar isso não é diferente entre jovens e adultos.

Durante as interações discursivas, seja entre os estudantes, seja destes com

o professor, foi notório a presença em certos momentos de uma abordagem

comunicativa do tipo interativa dialógica e em outros momentos interativas de

autoridade. Vale ressaltar também que os estudantes nos grupos espontâneos e/ou

recombinados elaboravam, confrontavam e discutiam suas idéias, mesmo sem a

presença do professor. Alguns dos estudantes trouxeram para o espaço social da

sala de aula um conhecimento compatível com o conhecimento cientifico escolar e

portanto, esses estudantes em muitos momentos atuaram como mediadores (ou

tutores) compartilhando informações e estabelecendo argumentos capazes de

convencer seus pares.

Considero que o uso das esferas de isopor como ferramenta pedagógica foi

instrumento importante como facilitador da compreensão da sucessão do dia e da

noite na Terra. Uma vez que no início das discussões, durante as atividades do

grupo espontâneo, os estudantes estavam de posse apenas de suas respostas

escritas respondidas no pré-teste , num plano bidimensional (desenhos), e com isso

eles tinham dificuldade de esclarecer suas idéias. No entanto, o uso das esferas de

isopor traduziu melhor a compreensão, possibilitando estabelecer a observação em

um plano tridimensional de análise. As esferas permitiram a representação do

125

pensamento em gestos que podiam ser observado pelos outros componentes do

grupo facilitando o concordar ou discordar das idéias expostas.

Observei também, apesar de não ter sido o foco de análise, uma discussão

bastante calorosa entre os estudantes, dos diversos grupos espontâneos, sobre a

definição de qual das esferas de isopor de tamanhos diferentes representariam a

Terra, a Lua e o Sol, alguns estudantes defendiam que a Lua teria maior dimensão

que o Sol, outros estudantes contra argumentaram que o Sol parecia estar menor

por estar mais distante, outra estudante fez uso de argumentos bíblico para

convencer os demais tomando como referência o livro de Gênesis (“...o lumiar maior

para governar o dia e luminar menor para governar a noite e fez as estrelas...”)

(BÍBLIA SAGRADA, 1993, Ge 1:16). Isso reflete bem o perfil sócio-cultural dos

sujeitos da pesquisa para os quais a bíblia era o segundo livro de leitura mais

freqüente. (ver Tabela 4, p.64)

A utilização da análise microgenética foi importante para a compreensão das

interações entre os estudantes e destes para comigo, que era o professor da turma,

pois, me permitiu compreender detalhes dessa participação na construção do

conhecimento que estava em negociação no plano social da sala de aula.

O uso desta ferramenta poderá auxiliar no planejamento de minhas ações

pedagógicas futuras. Desta forma, posso rever a minha prática inovando-a a fim de

produzir melhoria na aprendizagem de meus alunos. Creio que a partir da análise

das transcrições foi possível melhorar e ajustar minhas intervenções às

necessidades dos estudantes. Creio também, que passei a dar mais atenção à voz

do aluno aprendendo a escutá-los e compreendendo que o planejamento escolar

precisa ser flexível.

Um aspecto a ser destacado corresponde ao uso da ferramenta metodológica

proposta por Mortimer e Scott (2002) que se aplica a interação professor-aluno,

nesse sentido enfrentei algumas dificuldades ao utilizá-la nas situações em que

ocorreram ricas interações entre os estudantes. Considero um desafio para futuras

pesquisas desenvolver ferramentas metodológicas adequadas para a análise das

interações entre alunos.

126

Finalmente, trabalhar com um tema que aparentemente poderia ter sido

considerado pequeno e simples (a sucessão do dia e da noite na Terra) demandou

um tempo relativamente longo. Digo isso considerando a pressão a que são

submetidos os professores para ministrarem os conteúdos curriculares. Mas

compreendo que esta pressa quase sempre compromete a qualidade da

aprendizagem. Como otimizar o tempo de forma que os alunos aprendam muitos

conteúdos de maneira significativa é uma preocupação permanente, que se a

contínua reflexão sobre a prática poderá trazer subsídios para responder.

127

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132

A P Ê N D I C E S

133

APÊNDICE A

PRÉ-TESTE UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

NÚCLEO PEDAGÓGICO DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO – NPADC PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

Curso de Mestrado em Educação em Ciências e Matemáticas Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará

Turma: 1ª Etapa do Ensino Médio Noturno

1- DADOS DE IDENTIFICAÇÃO PESSOAL: Nome:_______________________________________ Nº_____ Turma_____ Sexo: Masculino Feminino Idade: _____Anos Data:_____/_____/2005 Profissão: _________________ Horário de Trabalho: ___________________ A quanto tempo você mora na grande Belém: ________ Você é natural de que cidade:_______________________________________ Ano passado você fez a: 4ª Etapa 8ª Série 1º Ano do Médio Não Estudei Se você marcou a opção Não Estudei por quantos anos ficou sem estudar: _________ Porque você estuda a noite? Trabalho durante o dia Não consegui vaga para estudar durante o dia Porque pretendo trabalhar durante o dia Atividades domésticas Outros. Qual :_______________________________________________ O que você pretende fazer após concluir o ensino médio na escola de Aplicação ? _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Você já havia estudado física anteriormente: ( ) Sim ( ) Não Se você respondeu Sim em que ano e série isso aconteceu: _______________ Responda a cada uma das perguntas abaixo com toda sinceridade e do jeito que você souber, sem preocupação se sua resposta está certa ou errada.

1- Como você explica a ocorrência sucessiva do dia e noite na terra? Faça também um desenho capaz de ilustrar esse fato.

2- Como você explica o fato de que quando em Belém são 10:00 h, no Rio de

Janeiro também será 10:00 h, mas em Santarém será ainda 9:00 h? Ou seja por que os locais tem fusos horários diferentes ?

3- O que é e como você acha que acontece um eclipse da Lua? E do Sol?

Faça um desenho ilustrando suas explicação(ões).

4- Como você explica a existência das fases da Lua? Faça um desenho capaz de ilustrar esse acontecimento.

134

APÊNDICE B

QUESTIONÁRIO SÓCIO-ECONÔMICO-CULTURAL (As informações terão caráter confidencial, portanto fique bastante a vontade para respondê-las)

INFORMAÇÕES ECONÕMICO-SOCIAL 1)Data de nascimento: ____/ ____/_____2) Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino

3)Estado Civil: ( ) Solteiro(a) ( )Casado(a) ( )Amasiado(a) ( )Separado(a) ( ) Outro (especificar):_________

4)Você tem filhos? ( )Sim ( )Não. Caso tenha respondido Sim, quantos filhos?______

5)Local de nascimento: Cidade:_____________________ Estado:______________

6)Há quanto tempo mora em Belém?___________ anos

7)Residência atual: Rua:__________________________________Bairro:________ Há quanto tempo reside neste local: _____________

8)Sobre a sua residência/moradia ( ) Residência Própria ( ) Residência Alugada ( ) Residência Cedida ( ) Outro (especificar):_____________________________

9)Você costumeiramente vem para escola: ( ) de seu trabalho ( ) de sua casa ( ) outro lugar(especificar):________

10) Qual(is) os meio(s) de transporte você utiliza para chegar na escola ( )a pé ( )bicicleta ( )motocicleta ( )táxi ( )ônibus ( )carro próprio ( )outro (especificar):_______________

11)Qual a sua renda familiar (soma dos rendimentos dos moradores de sua casa,incluindo a sua caso possua) ( )até R$300,00 ( )entre R$300,00 e R$600,00 ( )entre R$600,00 e R$900,00 ( )entre R$900,00 e R$1200,00 ( )entre R$1200,00 e R$1500,00 ( )acima de R$1500,00

12) Assinale os serviços públicos ou privados que possui em sua residência: ( )rede de esgoto público ( )rede de abastecimento de água ( )rede de energia elétrica ( )coleta de lixo ( )telefonia celular ( )telefonia fixo ( ) outro (especificar):_______________

13) Assinale quais os aparelhos eletro-eletrônicos que você possui em sua residência ( ) televisão ( )computador ( )fogão a gás ( )geladeira ( ) aparelho de videocassete ( )aparelho de DVD ( )aparelho de Som ( )ferroelétrico ( )forno microondas ( )outro (especificar):_______

135

A RESPEITO DA ATIVIDADE PROFISSIONAL 14) Marque qual é a sua situação quanto a sua ocupação profissional ( ) Assalariado sem registro na carteira profissional.Especifique a função________ ( ) Assalariado com registro na carteira profissional.Especifique a função________ ( ) Trabalho informal. Especifique _______________________ ( )Autônomo. Especifique _______________________ ( )Atividade Doméstica. Especifique _______________________ ( )Funcionário Público: ( )Municipal ( )Estadual ( )Federal ( )Outro. Especifique _______________________

15)Assinale as alternativas as quais você associa ao trabalho: ( ) trabalho como forma de independência (dos pais,marido/esposa,etc.) ( ) trabalho como forma de exploração ( ) trabalho como satisfação pessoal, auto-realização ( ) trabalho associado à satisfação de necessidades básicas(comida, vestimentas,educação) ( ) outro: Especifique ________________________________

16) Com relação ao trabalho, qual é a situação que você se encontra atualmente? ( )nunca trabalhou,nem procurou trabalho ( )nunca trabalhou,mas está procurando trabalho ( )já trabalhou, mas está desempregado ( )está trabalhando

17)Se você já trabalho e está desempregado, há quanto tempo está sem trabalho? ( )até 1 mês ( )mais de 1 mês até 3 meses ( )mais de 3 mês até 6 meses ( )mais de 6 mês até 1 ano ( )mais de 1 ano.Há quantos anos:_________________

A RESPEITO DA ESCOLARIDADE

18)Como você estudou a 1ªfase do ensino fundamental ?

( )1ª à 4ª série(regular) ( )1ª e 2ª Etapa

Em que tipo de escola? ( )escola pública municipal ( ) escola pública estadual ( ) escola pública federal ( ) escola particular ( ) outro. (Especifique):_______________________________

Escreva o ano em que você concluiu a 1ª fase do ensino fundamental Você ficou retido em alguma dessas séries: ( ) sim ( ) não. Se sim qual(is)_____

19)Como você estudou a 2ªfase do ensino fundamental ? ( )5ª à 8ª série(regular) ( )3ª e 4ª Etapa Em que tipo de escola? ( )escola pública municipal ( ) escola pública estadual ( ) escola pública federal ( ) escola particular ( ) outro. (Especifique):_______________________________

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Escreva o ano em que você concluiu a 2ª fase do ensino fundamental Você ficou retido em alguma dessas séries: ( ) sim ( )não. Se sim p115qual(is)___________ 20) Antes de você ingressar na 1ªEtapa (EJA) do ensino médio da escola de aplicação, você já havia iniciado o Ensino Médio (antigo 2º grau) em outra escola? ( ) Sim ( )Não

Em caso afirmativo, especifique até que série e ano você cursou:_______ Foi em ensino: ( )Regular ou ( )Supletivo Foi em escola: ( )Pública ou ( )Privada

Por quanto tempo você ficou fora da escola, antes de iniciar seus estudos na 1ªEtapa (EJA) do ensino médio da escola de aplicação.: __________________

21) Há quanto tempo você estuda na escola de aplicação? ( ) desde o ensino fundamental- em qual série?:_______ . Em que ano?_______ ( ) A partir do ensino médio- em qual série?:_______ . Em que ano?_______

22) A respeito da escolaridade de seus pais a)Qual o grau de escolaridade de sua mãe? ( ) não possui escolaridade ( )Em fase de alfabetização ( ) Ensino fundamental- 1 ª fase(1ª a 4ª série ou equivalente) incompleto ( ) Ensino fundamental- 1 ª fase(1ª a 4ª série ou equivalente) completo ( ) Ensino fundamental- 2 ª fase(5ª a 8ª série ou equivalente) incompleto ( ) Ensino fundamental- 1 ª fase(5ª a 8ª série ou equivalente) completo ( ) Ensino Médio incompleto ( ) Ensino Médio completo ( ) Ensino Superior ( ) Outro. Especifique_________________

b)Qual o grau de escolaridade de seu pai? ( ) não possui escolaridade ( )Em fase de alfabetização ( ) Ensino fundamental- 1 ª fase(1ª a 4ª série ou equivalente) incompleto ( ) Ensino fundamental- 1 ª fase(1ª a 4ª série ou equivalente) completo ( ) Ensino fundamental- 2 ª fase(5ª a 8ª série ou equivalente) incompleto ( ) Ensino fundamental- 1 ª fase(5ª a 8ª série ou equivalente) completo ( ) Ensino Médio incompleto ( ) Ensino Médio completo ( ) Ensino Superior ( ) Outro. Especifique_________________

c) Em que trabalha ou trabalhou sua mãe:_____________________________ d) Em que trabalha ou trabalhou seu pai:_____________________________

23) Marque a(s) alternativa(s) que você considera como motivo para você ter optado, retomado ou dado continuidade as seus estudos no ensino médio noturno da escola de aplicação ( )exigência do seu trabalho atual ( )a fim de conseguir um emprego ( )a fim de conseguir um emprego melhor ( )a fim de fazer novas amizades ( )a fim de cursar uma universidade ( )apenas para satisfação pessoal ( )para compreender melhor o mundo que o cerca ( )Outros motivos. Especifique-os_______________________________________

Dentre as alternativas que você marcou, há alguma que você considerou a mais importante para motivá-lo em sua opção de estudos nessa escola? Qual?______________________________________________________________

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A RESPEITO DA ATIVIDADE CULTURAL

24) Qual a sua religião? ( )católica ( )evangélica ( )espírita ( )umbandista ( )ateu ( )outra. Especifique:___________________________

25)Assinale as atividades de lazer que você costuma participar: ( )esporte ( )leitura ( )assistir TV ( )escutar rádio AM ( ) escutar rádio FM ( )ir a igreja ( )ir ao teatro ( )ir ao cinema ( )ir a shows ( )pintura ( )internet ( )outra. Especificar:_____________

26) O tipo de leitura que você mais faz: ( )romance ( )gibi ( )revista científica ( )revista de moda ou similar ( )jornal ( )não costumo fazer leitura ( )livro didático ( )bíblia sagrada ( )outra. Especificar:_____________

27)O tipo de programa de televisão que você costuma ver ( )novela de época ( )tele jornal ( )desenho animado ( )novela contemporânea ( )programa de auditório ( )filmes ( )não costumo ver televisão ( )outro. Especificar:_____________

28)O tipo de filmes que você costuma ver: ( )de suspense ou terror ( )romântico ( )comédia ( )filme de inspiração religiosa ( )policial ( )filmes de drama ( )aventura ( )ficção científica ( )não costumo ver filmes ( )outro. Especificar:_____________

29)Seu primeiro contato com assuntos ligados a astronomia ocorreu: ( )Na escola com seus professores ( )em filmes de ficção científica ( )em livros de ficção científica ( )em revista em quadrinhos ( )em livros de ciências ( )em programas de televisão ( )outro. Especificar:_____________

30)Você lembra de ter estudado algum tema ligado a astronomia: ( ) no ensino fundamental (1ºCiclo). Que assuntos?_______________ ( ) no ensino fundamental (2º ciclo). Que assuntos?_______________ ( ) no ensino médio. Que assuntos?_______________ ( )nunca havia estudado antes ( ) outro. Especificar:_____________