View
77
Download
0
Embed Size (px)
DESCRIPTION
Education
ISSN: 1517-7599
PERFORMANCE MUSICAL 2001
P 6s -G RADUA
Editorial
o Programa de P6s-Gradua~ao da Escola de Musica da UFMG tern 0 prazer de apresentar 0 Volume 4 de PER MUSI - Revista de Performance Musical. Alem de tratar de assuntos especfficos como tecnicas e praticas de performance, decisoes de interpretacao, re-criacc3o musical, improvisa~ao , gestual e intera~ao com 0 publico, PER MUSI tambem abriga temas resultantes de interfaces da performance musical com Qutras areas (musicologia historiea,
educa~ao musical, composi~ao, analise, tecnologia, medicina , filosofia ... ).
No presente volume, tres interpretes/analistas exploram a interface da performance com a analise musical em obras significativas do repertorio brasileiro do seculo XX. Fernando Rocha discarre sabre a presenc;a de elementos indeterrninados, improvisat6rios e aleat6rios em uma
pe~a para caixa clara de Carlos Stasi. Luciana Monteiro de Castro apresenta uma analise multifacetada e sugere criterios para a interpretacao de uma canyao de Helza Cameu . Partindo de uma hipotese surgida ap6s diversas experiencias interpretativas, Cristina Capparelli Gerling realiza uma investiga~ao detalhada sobre a presen~a do elemento octat6nico nas tres ultimas
pe~as para piano de Bruno Kiefer. Explorando a interface da performance musical com a fisiologia , Sonia Ray aponta a presenCa de elementos provenientes das artes marciais nos exerclcios criados pel a contrabaixista Diana Gannett. A partir da perspectiva da educa9ao musical, Keith Swanwick reflete sobre a natureza do fazer musical, apontando importantes implicac6es para urn ensina de musica que venha a ser realmente musical.
A diversidade de facetas da perfonnance musical abordadas neste volume confirma a vocacao de PER MUSI de servir como urn forum para a comunidade academica dedicada a pesquisa envolvendo a realiza~ao musical.
Born proveito!
~~ Andre Cavazotti Editor-Chefe de PER MUSI ([email protected])
PER MUS'- Revlsta de Performance Musical e um espaco democralico para a reflexao intelectual na area de musica, onde a diversidade e 0 debate sao bem-vindos. As ideias aqui expressas nao refletem a oplnlao da Comissao Editorial ou do Conselho Consultive.
Editor-Chefe Prof. Or. Andre Cavazottl (UFMG)
Comlsslo Edftorlal Prof. Or. Fausto Borem (UFMG)
Profa. Maria In6z Lucas Machado (UFMG) Prof. Or. Mauricio Veloso Queiroz Pinto (UFMG)
Profa. Ora. Sandra Loureiro de Freitas Reis (UFO?) Con$8lho Consultlvo do Volume 4:
Prof. Or. Arthur Andres (UFMG) Profa. Ora. Cecilia Cavalieri Franva (UFMG)
Prof. Or. Esdras Silva (UNICAMP) Prof. Or. Fausto Borem (UFMG)
Prof. Or. Fernando lazzetta (USP) Profa. Ora. Ingrid Barancoskl (UNI-RIO)
Profa. Ora. Martha Tupinamba de UlhOa (UNI-RIO) Profa. Ora. Regina Marcia Simao Santos (UNI-Rl0)
Profa. Ora. Salomea Gandelman (UNI-RIO) Profa. Ora. Sandra Loureiro de Freitas Reis(UFOP)
Profa. Ora. Vanda lima Bellard Freire (UFRJ) Universldade Federal de Minas Gerais
Reitor Prof. Or. Francisco Cesar de Sa Barreto Vice-Reitora Profa. Ora. Ana Lucia Almeida Gazzola
PrO-Reltorla d. P6s-Gr.aduaclo Prof. Or. Ronaldo AntOnio Neves Marques Barbosa
PrO-Reitoria de Pesqulsa Prof. Or. Paulo Sergio Lacerda BelrAo
Escola d. Muslca da UFMG Prof. Dr. Claudio Urgel Pires Cardoso, Dlretor
Programa de Pos-Graduacio em Muslca da UFMG Prof. Dr. Lucas Bretas, Coordenador
Secreta.ria de P6s-Graduaclo, Mestrado em Muslca Marll Sliva Coura
Revlslo Profa. Maria In6z Lucas Machado
Arta-Final Jussara Ubirajara I Romero Harlem (Centro Audiovisual - UFMG)
PER MUSI: Revista de Performance Musical- v.4, 2001 Belo HoriZonte: Escola de Musica da UFMG, 2001 -
V.: il.; 28x22 em. Semestral ISSN: 1517-7599
Musica - Peri6dicos. 2. Performance Musical- Perl6dicos. 3. Interpretac;ao Musical - Peri6dicos
I. Escola de Musica da UFMG
SUMARIO
Uma investiga~ao analitico-interpretativa sobre a can~ao Crepusculo de outono de Helza Cameu ................................ 5 An analytical-interpretive investigation of the song Crepuscufo de outono by Helza Cameu
Luciana Monteiro de Castro
Partitura completa de Crepusculo de outono ............................... .. .... 23 Complete score of Crepuscufo de autono
Helza Cameu
Teaching music musically .... ....... ........ ................. .. ............ .. ...... ........... 29 Ensinando mOsica musicalmente
Keith Swan wick
Indetermina~ao na obra Cam;ao Simples de Tambor de Carlos Stasi ....................................... 37 Indeterminacy in Can!t8o Simples de Tambor by Carlos Stasi
Fernando Rocha
Terra Selvagem, Lamentos da Terra e Alternancias: o componente octatonico nas ultimas tres pe~as para piano de Bruno Kiefer .. .................................................... ............. 52 The octatonic component in Bruno Kiefer's last piano pieces
Cristina Capparelli Gerling
Os Phases Warm-up Exercises de Diana Gannett: apresenta~ao e extensao as cordas orquestrais ............................... . 72 Diana Gannett's Phases Warm-up Exercises: presentation and extension to string instruments
Sonia Ray
gilHighlight
Uma investiga~ao analitico-interpretativa sobre a can~ao Crepusculo de outono de Helza Cameu
Luciana Monteiro de Castro (UEMG) e-mail: [email protected]
... Quem e Helza Camllu? Antes de mais nada, nao e urna amadora. [ ... J Apesar disSQ, sua obra continua quase que desconhecida e e bern passlvel que ate urn ou outro dos seus companheiros e amigos sa aproximasse do concerto de sexta-feira' com certas duvidas e reeeies. Por que a compositora tera preferido manter-se ~o lange do campo de batalha de todo musico? Por duvidar. ela tambem? Por urn pouco de altivez diante do volga sciocco2 que deveria julga-Ia? Renzo MassaranP
Resumo: Analise integrada da can-;ao CrepliscuJo de Qutono Op. 25 n.2 (1943) para canto e piano da compositora Helza Cameu (1903-1995), abordando aspectos harmOnicas. formais, poeticos e a relacao texto-musica. Constata a utilizacao da Sene de Fibonacci e emprego de elementos da linguagem impressionista na sua estruturayao. Aborda tambem aspectos da vida da compositora e faz referlmcias ell sua obra e III importancia de seu resgate. Palavras-chave: Helza Camau, cancao brasileira, interpretacao, analise musical.
An analytical-interpretive .investigation of the song Crepusculo de outono by Helza Cameu Abstract: An integrated analysis of the song Crepusculo de outono (Autumn twilight) Op.25 n.2 (1943) by Brazilian composer Helza Cam~u (1903-1995) for voice and piano, including harmonic formal and poetic aspects as well as text painting. It also explains how Fibonacci'series and impressionist elements are used in the structure of the song. Finally, it presents aspects of the composer's life and the importance of divulging her work. Keywords: Helza Cam~u, Brazilian song, interp,retation .
Introdu9ao
" ,
Helza Cameu nasceu em 1903 no Rio de Janeiro e faleceu na mesma cidade em 1995. Aluna de piano de Alberto Nepomuceno no Instituto Nacional de Musica, passou a cia sse de Joiio Nunes com a enfermidade do primeiro, concluindo 0 curso com medalha de ouro. Afastada dos palcos pelas pressoes paternas e pelo pr6prio temperamento, passou a dedicar-se a composic;ao, estudando contraponto com Francisco Braga eAssis Republicano, harmonia com Agnelo Fran~a, alem de canto, violino e violoncelo. Conclui 0 curso de composi~iio no Conservat6rio Brasileiro de Musica sob a orientac;ao de Lorenzo Fernandez, que muito a
1 Refere-se a data de urn dos concertos com obras de Helza Cameu realizado em 1965. 2 Jutgamento de um publico tolo. 3 Critico musical e compositor italiano, residente no Rio de Janeiro, cujo artigo foi escrito para 0 Jamal do
Commercia, em 1965.
5
CASTRO, LlfCiana Monteiro de. Urna investigao;lio anatitico-interpretallve sobre a cano;lio ... Ptlr Musi. Belo Horizoote. yA , 2001 . p. 5-22
incentivou. A convite deste, foi uma das fundadoras da Academia Brasileira de Musica, sendo uma das tres mulheres entre os 46 membras. Junto a Villa-Lobos, trabalhou no ensino do Canto Orfeonico. De personalidade forte, acabou por abandonar 0 projeto, dissentindo de suas diretrizes, sem perder a amizade e a admira~ao que obtivera de Villa-Lobos.
Helza Cameu trabalhou na Radio MEC de 1955 a 1973 como redatora de programas musicais. Foi membra da Sociedade Internacional de Musica Contemporanea e, no Museu do Indio e Museu Nacional trabalhou na anc:illise e cataloga~ao de grava~6es recolhidas entre tribos indigenas. A partir de suas extensas pesquisas sobre 0 tema, elaborau 0 livra IntroduqBo ao estudo da mus;ca ;nd;gena brasileira, uma das primeiras referencias do assunto no pais.
A vasta pradu~ao musical de Helza Cameu e, entretanto, a mais surpreendente vertente de seu trabalho. Suas composi~6es abrangem cerca de 90 pe~as para canto e piano (e canto e orquestra) e mais de 30 harmoniza~oes de cantos populares, numera consideravel para 0 panorama nacional. Compos 40 pec;as para piano, 12 peltas para violino, peltas para viola, violoncelo, contrabaixo, orgao, f1auta, fagote, clarineta e cora, alem de suites para cordas, quinteto de sopros, uma cantata e 4 'quadras' sinfonicos, obras que a situam como uma das primeiras compositoras de musica sinf6nica no Brasil. Seu Quarteto de Cordas Op. 12 recebeu em 1936 0 2" premio em concurso instituldo pelo Departamento Municipal de Cultura de Sao Paulo, dirigido por Mario de Andrade; em 1944, em concurso promovido pela Orquestra Sinfonica Brasileira, seu quadro sinfonico Suplicio de Felipe dos Santos recebeu 0 1" premio, cabendo 0 20 premio a obra de Claudio Santoro Numa usina de a90.
Diante de urn curricula como este, restaria ao leitor indagar as raz6es do esquecimento do qual Helza Cameu tanto se ressentiu. Estariam ligadas a personalidade retraida da compositora? Seria vitima de preconceitos? Buscando respostas para estas questoes e objetivando 0 resgate do nome e da musica da compositora, realizamos em curso de Mestrado na UFMG, sob orienta9ao do Prof. Dr. Fausto BOrE;m, pesquisa biografica e estudos sobre a obra para canto e piano de Helza Cameu, enfocando a Can9aO CrepiJsculo de outono, n.2 da Suite Liricas Op. 25, de 1943, sobre poema de Manuel Bandeira (1886-1968). 0 presente artigo apresenta uma analise da canltao, abordando aspectos da forma, harmonia, melodia, ritmo, relac;oes matematicas e relac;oes texto-musica que possam fundamentar sua pratica interpretativa.
Forma e harmonia em Crepusculo de autano Crepusculo de outono foi escrita sobre as 6 estrafes do poema hom6nimo de Manuel Bandeira, estando dividida em duas partes, as quais denominamos Parte I e Parte II. Cada parte e estruturada em 3 se90es musicais, correspondentes a 3 estrofes, denominadas A, Be" na Parte I e C, DeC' na Parte II. A semelhan9a musical entre as se90es A e A' e a independencia da Sec;ao B, e igualmente entre C, C'e D, caracterizam a forma ternaria do Lied.
Apresenta estrutura harmonica ambigua, mesclando elementos predominantemente modais a elementos tonais. A armadura de clave, referente as tonalidades de Sol menor ou Sib Maior, permite "giros" par regi6es de diferentes modos eclesiasticas, sem usa excessivo de acidentes. Pope-se considerar que a obra se direciona para regioes "locais" definidas pela forlta polarizadora de "notas focais" . Nas Se90es A (c.1 - 21) e "(c. 36 - 53) da Parte I, 0 piano executa ostinato de colcheias,
6
CASTRO, Luciana Monteiro de. Uma investig~ Inalitioo-interpretativlllObte I CI~ .. . Per Musi. Beta Horizonle, v.4, 2001. p. 5-22
inieialmente em dlades de S" justas (e.1 -10 e e. 38 - 43) em movimento deseendente e paralelo, pereorrendo tres oitavas (Ex. 1). Estas dlades sem ter~as, de natureza tonal amblgua, dificultam a confirmar;ao de uma tonalidade maior au menor e realr;am a canMer modal do treeho. Piano e canto revelam, entre as e.1 - 8, notas do modo e6lio em La (eseala La - Si - 0 6 - Re - Mi - Fa - SoD. A reeorreneia das dlades La - Mi no piano, com a La no baixo, insinua um pedal em La. A presen,a do Sib na linha do canto (e.S) gera ambiguidade modal , e sugere a modo frigio em La (eseala La - Sib - 06 - Re - Mi - Fa - SoD, paden do tambem ser justifieado par incluir-se no treeho de eseala de tons inteiros (Ex.1).
[2J J-b
canlo @ ~ i * ~JilJ Jill ~e o ere-pus- cu-lo cal"
~r'\ q~ ciano .... ....... ~
Tons inleiros
IJ pliiJW'w W man- - so co-roo u rna ben ~io.
r"~ 0 ::' ~, .... r- .... l"' ~ ....
" .J
Ex. 1 - Ostinato de diades de 5" paralelas no piano e trecho de escala de tons inteiros no canto (c. 5) .
Do e.10 ao e.12 (Ex. 2) e apresentada uma sequencia de aeordes de 7': La - Mi - Sol (sem a ter,a) e Mi - Sol- Si - Re (c.10), Re - Fa - La - 0 6 e Sol- Si - Re - Fa (c. 11), acordes amblguos que podem ser considerados passagens pelos I, V, IV e VII graus do modo e61io em La au do IV, I, VII e III graus modo eolia em Mi.
/'\ f\ /'\ canto
Dir-se- D. quc o k cho - "'. pri d, ,~ 1ft - t ... h== "- ~" ~---~ ql'--i ...... ....; ij; I.:',JJ W
- - :: piano
, .
'-'
Ex. 2 - Sequencia de acordes de 7 menor, baseados nas notas da escala do modo e61io em La.
7
CASTRO. Luciana Monteiro de. Uma Invesliga,.:lo anal itico-lnterpmtaliva sob". 8 canciO ... Per AIusi. BeIo 1iorizDntB . .... 4. 2001 . p. $.22
Entre os c. 15 -17, ocorre uma passauem pel a regiao focal de Sol (Ex.3). Pode-se considerar que esse trecho esteja na tonalidade de Sol menor, devido a presenc;a da 'sensivel' Fa", Uma passagem pelo modo frigio em Sol (escala So/- Lab - SIb - 06 - Re - Mib - Fa) e percebida entre c.19 - 21, finalizando a se9aoA na regiao focal de Sol (Ex.4). 0 Reb, estranho a escala frigia em Sol (c.19), pode ser considerado nota de passagem, vista que 0 R(m e repetido na harmonia (c.21).
A Sec;ao B, iniciada no I grau do modo frigio em Sol no c. 22, apresenta uma sequencia de acordes de r menor,S'" aum. e r maior sem resoluc;6es, seguida no c.25 do acorde de 11'" (SIb - Re - Fa - La - Min) e do acorde de quintas tematicas sobrepostas La - Mi (m.e.) e Sol - Re (m.d.). A partir do c. 27, ocorre uma sequencia ascendente de acordes de 5~ aum., com cromatismos (Ex.5). Este trecho dissonante cria tens6es que s6 irao se dissipar no acorde perfeito maior do c.30, seguido de arpejos do I grau do modo d6nco em Re (Ex.6). A regiao focal de Re gera uma forc;a atrativa de subdominante modal (IV grau) em relac;ao ao trecho seguinte, no modo eolio em La (regiao focal de La) reapresentado na se9ao K Assim, a passagem de B para A' pode ser ouvida como uma cadencia plagal.
r r b~ (: - van - g~ - Ii cal pen
~ !=:::'::. #!." ~;L'\ ~~ ~~ # G:" i.1t L-' ~ piano ~ "--I...f
...... ......... .... I..J'
-....I.J ..... ......
:
v -" IV III
Ex. 3 - Passagem do V ao I grau da nota focal Sol.
canto [3J ,wrTfD~~ IF ~'B pJJfr- . J
As fe - ri - das que a vi - cia a- briu em ca-da pei - to.
piano
Ex. 4 - as trechos assinalados (c. 19 - 21), exceto pelo Reb, apresentam notas do modo frigio em Sol
8
CASTRO, Luciana Monteiro de. Urne inV'8stlg~ analffieo.intetpfetatiVa sabre II CII~ "" Musi. Belo Horizonle, vA. 2001. p. 5-22
canto -. -'
f Urn Ii-n.o plan - ae A fU-e . 0:' . nc-rna omw--md-nodo ~ r- r. 1 1
.
. . .
.
. . .
plano ~ . I~ .. -. .- mf . .. '
.. ' . .. '
.. ' . .
.
.
.
.
. . .
'-- ~ : ~ . ~. ~. ~ : =<
~ . ~ .
Ex. 7 ~ Modo eolia em Sol, com acorde de I grau com sexta acrescentada, assinalado no c.54, e sobreposicao de acordes, assinalados no c. 55.
0 canto ~ ~ "~ JjlJlJ\l $' $ Jl ,~~~~~~~ ~ j JJ"Wi) jlW~~~,
A pe_nu h4n0.b.nn.
CASTRO, Luciana Mont.,jro da. Uma investigayio analltico-intefl)l"etativ9 sobre a C9~o ... Par Mus;. Belo Horironte. vA. 2001. p. 5-22
Quadro I - Resumo do percurso harmOnlco de Crepusculo de outono
A
B
[1 - 7) modo e61io em La: i -
vi -
VII [8 -12) modo e6lio em La : i _i, _v,_ VI _ iv_VII, [13-18) modo e61io em Sol (ou Sol menor) VI
-
V _ iv, _ iii_i, [ 19 - 21) modo frfgio em Sol
[22-24) modo frigio em Sol [25-26) modo frfgio em Sol [27 -30) sequenc. de acord. aum
em cromatismo [ 31 - 35) modo d6rico em Re
[36-41) modo e6110 em La [42-45) modo e61io em La [46-49) percurso modulat6rio [50-53) modo frfgio em Sol
[ 54 - 59 J modo e6lio em Sol [ 59 - 61] modo e6lio em Sol [ 62 - 65] modo eolio em Sol [ 65 - 66] modo e6lio em Sol
[67-70) modo e6lio em Sol [71-73) modo e6lio em Sol [74-75) modo e6lio em Sol
[76-79) modo e6lio em Sol [80-81) modo e61io em Sol [82-84) modo e61io em Sol [85-87) modo e6lio em Sol
i, _iv,_vii,_i
i _ i, _ i'. "ivdeLa
i vi VII - -
i _ i, _ V,_ VI _IV _ VII, VI V _ iv, _iii_i,
-
i, _ iv, _ vii, _ i
i..., _i', _iv_i i. _vii,_i. _vii_i
i, _ VI, _ i, _i7, _ vi+ (alemA) _ i. ( ou b Ii) VI,_ vi, (ou I'l) _ btl _ i._ iv
VI~) nVllioo niii,_ ie.:
. '1 . , IlIoo _I , _IV_1 i. _vii, _i. _vii_i illoo _ vii, _ i, _I, iv _I, iv
- -
bii, -
vii, _ i600
11
Zona focal: La
Zona focal: Sol
Zona focal: La
Zona focal: Sol
> Zona focal: La
,
CASTRO. Luciana Motlteiro de. Umall'lyastlg~ anal~terpretativa sobra a ca~ ... Per MusJ. 8alo Horlzor'lifl. y .... 2001. p. 5-22
Melodia Em Crepusculo de outono a canto apresenta uma melodia principal. 0 piano acompanha ritmica e harmonicamente a voz, sem descrever melodias secundarias. 0 ambito vocal encontra-se entre 0 62 e Sol .. , havendo varios trechos com notas de alturas repetidas, especial mente MiJ e Re3, levando a utiliza~ao predominante do registro vocal medio, com breves incursoes pelo registro agudo. As vozes medias e medio-agudas sao as mais adequadas it interpreta9ao desta can9ao.
Os contornos mel6dieos desenvolvem-se segundo a neeessidade de expressar tensoes, relacionada a conota9ao poetica. Na Parte I, se90es A e 1
CASTRO. l uciana Mont~ de. Uma Irwestig~ analitlco-lntetptetativa sobre I ean.;lo ... Ptlr MInI. Belo Horizonte. Y.4. 2001 . p. 5-22
__ +.So/ .... Mib ----.:: . S' ';;:-'06# So/--- Ib ~
_ _ +. Re ~Mi (c. 67 - 70) (c. 71 - 73) (c. 74 - 75) Sib ~Lab
A supremacia de tensces na Parte II e tambem confirmada pelo uso de notas de reg ices mais extremas do ambito da can9iio.
Desenhos esquematicos dos contornos mel6dicos presentes na obra podem ser apreciados junto aos versos do poema:
Parte I
o crepuscu/o cai manso como uma ben,ao
Dir-se-a que 0 rio chera a prisao do seu leito.
As grandes maos das sombras evangelicas pensam
As feridas que a vida abriu em cada peito.
o outono amare/ece e despoja os /ari90s Um corvo passa e grasna e deixa esparso no ar
o terror augura/ de encantos e feiti,os.
As flares morrem. Toda a relva entra a murchar.
Os pinheiros porem vi9am e serao breve
Todo a verde que a vista espairecendo vejas Mais negros sabre a alvura inanime da neve,
A/tos e espirituais como flechas de igrejas.
13
,,---.... [1 -7) ,,---.... [8 -12)
~ [13-18) ~ [19-21)
---._ [22-24) ~ [25-30)
~ ~ [31-35)
,,---.... [36 - 41) ,,---.... [ 42 - 45)
~ [46-49) ~ [50-53)
CASTRO, Luciana Monteiro de. Urns jnvestiga~io analitico-lr,terpretativa sabre 8 can~o .. Per Mu$/. 8 elo Horizonte, V . , 2001. p. 5-22
Parte II
Urn sino plange. A sua voz ritma 0 murmurio ~ [ 54 - 59) Do rio, e isso parece a voz da solidao. -------.. [ 59 - 61 ) E essa voz enche 0 vale ... o horizonte purpureo... __ [ 62 - 65)
Consoladora como urn divino perdao. -- [ 65 - 66)
o sol fundiu a neve. A folhagem vermelha } [ 67 - 70 ) Reponta. Apenas hfl nos barrancos retortos, /\,/,\,A f/ocos, que a luz do poente estatica semelha [ 70 - 73 ) A urn rebanho infeliz de cordeirinhos mortos. [74-75)
A sombra casa os sons, (casa os sons,) numa grave harmonia . ~ [ 76 - 78)
E tamanha esperanqa e uma tao grande paz -------.. [79 - 81 ) Avultam do clarao que cinge a serrania, __ [ 82 - 84) Como se houvesse aurora e 0 mar cantando atcas. -- [ 85 - 87)
Ritmo A Parte I de Crepusculo de outono estrutura-se em compassos quaternarios simples 4/4 e, na Parte II, em compassos quaternarios compostos 1218. 0 piano apresp.nta padroes ritmicos bem definidos a cada secao, que atuam como elementos de definiyao da textura e da tensao.
Nas Se90es Ae "' , 0 padriio ritmico e urn continuum de colcheias em movimento descendente, que confere baixa densidade ritmica e textura rarefeila as seq6es e eslabilidade, numa ambiencia de calma e estaticidade (Quadro II).
Na Se9iio B, 0 piano apresenta, entre os c. 22 - 27, urn acompanhamento no estilo recitativo com acordes em semibreves e curtos adensamentos ritmicos em minimas. No final da Secao
14
CASTRO. Luciana Monteiro de. Uma Invesl~ llI'Ialltlc;o.ln~IIva.obre, CII~o ... Per Mu$J. Belo Horizonie'. '1.4. 2001. p. $.22
B (C. 31 - 35), a piano realiza grupos de tercinas em movimento ascendente a cada compasso, sob as indica90es de calma e pp, padrao frequente em cadeneias e pontes, preparando a retorno a estabilidade ligeiramente alterada no inlcio da Se9ao B (veja Quadro II).
Nas Seyoes C e C', 0 piano apresenta novo padrao: a cada urn dos 4 tempos do compasso, a m.e . e a m.d. do piano articulam acordes em semfnimas pontuadas sob a indicayoes de expressao Com gravidade e de andamento J. = 44 (Quadro III). Entre C e C' apresenta-se a Se9ao D, cuja padrao rltmico gera as maiores tensoes da obra: tremulos na m.d . com articula9ao do prirneiro, segundo e quarto tempos pela m.e.
Se a piano desenvolve ritmos regulares, a canto e silabica e alterna calcheias, semlnimas e mfnimas na escansao das srlabas poeticas, sem regularidade que defina um padrao ritmico.
Pade-se afirmar que a regularidade da figura9ao rltmica no piano em cada uma das se90'es e os contrastes entre os pad roes apresentados definem a forma tripartida da canr;ao e conferem unidade a abra. Enquanto nas Se90es A e />:, analogamente as Se90es C e C', com ritmos nitidamente articulados e repetidos, M ambiencia de estaticidade e monotonia, nas se90es B e D, com ritmos de contornos pouco defin idos, htl ambientes de maior tensao musical.
A
Dfades de colcheias em movimento dlreto
descendents e paralelo
Parte I Campassa quaternaria simples 4/4
B [22, ____ 30, ___ ~35 I
Acordes em semlbfeves no estll0
recitativo
Arpejos de lerelnas em movimenlo ascendenle
,
A' [ 75 _____ 861
Dlades de colcheias em movlmenlo direlo
descendente e paralelo. como na seyao A
Quadro II - Estruturacao ritmica do piano na Parte I de Crepusculo de outono.
15
CASTRO, lucUona Monteiro de. Urns invesfiOaCJO "'11lli!;oo-interprelativa sobre. CII~ . Per Musi. Belo Honzonte , Y . . 2001 . p. 5-22
Parte II Compasso quaternario composto 12/8 C D C'
[54 65J [ 66 74J [ 75 86 J 4 tempos po!' compasso em 1 Tr~mulos executados pela m.d. rom 1 4 tempos por compasso em
semlnimas pontuadas articulados 1 marca~ do quarto tempo pela m.e 1 . semlnimas pontuadas pela m.e. 1 1
articulados pela m.e.
llV' t fllJJ, J J1 1 1 fP?~:1&$ 1 ~ ~I, 1 -E cs.sa voz cn
CASTRO. Luciana Monteiro de. Uma inV'tllig~ Inalllico-interpretativa sobra a cant;:Io ... Per MuJi. allo Horizont., v.4. 2001 . p. 522
A Set;:ao A de Crepusculo de ouiono tem 21 compassos, a Set;:ao B tem 14 compassos e a SeeaoA'tem 18 compassos, perfazendo 53 compassos na Parte I; a Seeao C tem 12 compassos, a Set;:ao D tem 9 compassos e a Set;:ao C' tem 12 compassos, perfazendo 33 compassos na Parte II. No total , a caneao tem 87 compassos, Multiplicando-se 0 quociente SA pelos numeros de compassos das Partes I e II, verifica-se uma apraximat;:ao bastante grande com as numeros da SMe de Fibonacci:
87 (no de compassos da caneao) x 0,618 = 53 (nO de compassos da Parte I); 53 (no de compassos da Parte I) x 0,618 = II (nO de compassos da Parte II); 33 (no de compassos da Parte II) x 0,618 = ~ (pr6ximo de 21 = nO de compo da Seeao A).
Obse/Va-se ainda que nos numeras dos compassos coincidentes com os numeros da Serie de Fibonacci. au pr6ximo a eles, ocorrem eventos musicais relevantes. Considerando as numeros da Serie 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21 , 34, 55, 89 observam-se os eventos:
C. 1 = in lcio da Secao A e Parte I C. 2 = final da introdueao A C. 3 = entrada do canto C. 5 = trecho de escala de tons inteiros C. 8 = retorno ao modo inicial, com repetit;:ao da harmonia do c. 1 C. 13 = novo retorno ao modo inicial, com repeti
CASTRO, Luciana Mof\Ie!ro da. oma inVft~ anllftico.lntetprataliv8 sobfe 8 ca~ ... ~ """$1. Selo Horilonte. v.4, 2001. p. 5-22
Alem dos modos ec1esiasticos estarem associado ao "sagrado", a ideia de religiosidade presente no poem a e sublinhada por palavras como "manso", "ben9fio", "evange/icas" e par articulat;5es proprias do cantochao, com a emprego do ritmo silabico e melismatico, como em "man so" (c.5), Apesar do emprego de sequencias de acordes de 7" sem resolu9ilo nile ser usual na musica sacra do passado, a linguagem musical e ainda coerente com a linguagem Iiten3ria, pais a 'sugestao' e as 'ambigUidades' produzidas por tais acordes sao fundamentais na estetica simbolista, na qual se baseia 0 poema Crepuscu!o de oulono.
2' Estrofe (5e~30 B): v.5 0 outono amarefece e despoja as /ari90s. v.6 Um corvo passa e grasna a deixa asparso no ar v.7 0 terror augura/ de encantos a feiti90S. v.8 As flares marrero. Toda re/va entra a murchar.
A Se9ao B se desenvolve no estilo recitativo, apropriado ao discurso e a narrativa (SADIE, 1994, p,769), preparando ou sucedendo trechos melodiosos em que preponderam sugestoes de sentimentos e devaneios, Da contempla98o da calma paisagem na l ' estrole, passa-se as vis5es perturbadoras da 28 estrofe. 0 recitativo atua aqui como uma "chamada" a realidade ardua e palpavel.
No verso 6, quando 0 poema diz "uro corvo passa e grasna", e indicado urn decrescendo, que sugere um ruido que se distancia gradativamente. Entretanto, 0 cervo Mdeixa esparso no ar a lerror augural de encanlos e feili.os" (versos 6 e 7) e provoca afli90es, refletidas no crescendo, no animando e no aumento de densidade rftmica do piano, que executa acordes de minimas, ao inves das semibreves anteriores, Ha nesta estrole alitera90es do Ir/, IRI e lsi, relor9ando 0 aspecto iuduo das palavras "corvo", "g[a~na ", "ewa[so", "terret', "augu[al" e seu carater dramatico. A linha do canto refort;a a aspereza do texto com 0 uso de ritmos marcades, em colcheias pontuadas e semicolcheias.
A ten sao presente na Se9ao B, relor9ada pel a varia9ao de dinamicas, pel as alitera90es e pelo adensarnento rftmico na linha do canto, e sublinhada na harmonia. Nos versos 6 e 7 a seq(j~ncia de acordes dissonantes com cromatismos nas vozes internas do piano enfatiza as sensat;oes de indefiniQao e rn isterio provocadas pelas palavras ~ esparso", "terror', "augura/", "encantos" e "fei/i.os", A ten sao acumulada s6 se dissipa com a chegada a urn acorde perfeito maior, junto de urn decrescendo e urn cedendo sob a palavra "feiti90s". Vitima destes "encantos e feiti90s", o 'eu !irico' passa da visao perturbadora a visao rnelanc6lica e apaziguadora das "flores" e da "relva" que murcham no outono (verso 8). Sob este verso, 0 piano descreve arpejos ascendentes em tercinas no I grau do modo d6rico em Re, em pp, Este movimento sa converte em 'ponte', remete a musica a estaticidada contemplativa da Se9aO",
3' Estrofe (5e93o A'): 11.9 Os pinheiros pOl'em vi.am, e serBo breve 11.10 Todo a verde que a vista espairecendo vejas, 11.11 Mais negros sabre a a/vura inimime da neve, 11.12 Altos e espiriluais como fiechas de igrejas,
19
acordes de 78 de dominante e 78 S dim. e por cromatismos utilizados como as "variac;oes de cores" sugeridas no poem a, onde os tons dos "fIocos de neve', da "/uz do poenle" e das "fa/has verme/has" se mesclam.
6' Estrofe (Se~ao C'): v.21. A sombra casa os sons numa grave harmonia. v.22. E lamanha esperan,a e uma lao grande paz v.23. Avullam do clarao que cinge a serrania, v.24. Como se houvesse aurora e a mar cantando atras.
A Secao C' inicia-se na dlnamica do p, em subito contraste com 0 f e a tensao da SeCao D. A dinamica de p, que perdura nos versos 21 e 22, sublinha urn esmaecimento das tensees acumuladas em D, confirmando a finaHzaC;ao apaziguadora dos versos "a sombra casa as sons numa grave harmonia" e "tamanha esperanc;a e uma faD grande paz". Entretanta, seguem uma indicaCao de crescendo no verso 23 junto da palavra "avullam', urn aumento da densidade hanmonica no verso 24, urn impulso mel6dico acentuado pelo saito de 5J (c.84 - 85) e urn 'B/argando nos c. 86 -87: depois do "crepuscu/o"viria a "aurora" e atras da "'serrania n existiria 0 "mar' - , au seja, haveria esperanc;a, atinal.
Conclusao Uma das razees para 0 esquecimento e consequente desconhecimento da obra de Helza Cameu pode estar relacionada ao seu estila composicional e as circunstancias hist6ricas em que se desenvolveu sua carreira. Helza sofreu, de certa forma, urn ostracismo gerado por ideologias de processos composicionais (como Nacionalismo e Serialismo) que detenminaram os rumos da vida musical brasileira durante 0 perlodo de sua maior produtividade musical , entre os anos 30 e 50. A despeito da sua evidente postura nacionalista, Helza Cameu nao privilegiou tamas falcl6ricos au populares, apesar de empregar criteriasamente temas indigenas e ritmos populares urbanos'ern suas obras. Sua obra, ainda que demonstrasse firme interesse pelo nacional e pelo moderno, apresentou propositais e evidentes tracos da musica europeia, como se percebe em Crepusculo de oulono e, apesar de ter participado de associac6es de musica conternporanea da epoca, nao desprezou elementos musicais tradicionais.
o poema Crepusculo de oulono foi escrito em 1913, ana em que Debussy concluia seus preludios. Conhecedora da obra pianistica de Debussy, Helza Cameu certamente buscou na canc;ao urna coneX80 entre 0 simbolismo de Bandeira e 0 impressionismo debussyano, remetendo 0 poeta ao seu ambiente inspirador, a Europa impressionista.
Tendo a oportunidade de interpretar Crepuscu/o de oulono antes e depois de urn estudo analitico-interpretativo, verificamos que a interpretacao rna is coerente e eficiente se deu ap6s 0 reconhecimento dos processos composicionais da obra. A analise musical associada ao estudo das relacoes texto-musica assegurou justificativas para decisOes interpretativas. ainda que pessoais, subjetivas e nao definitivas. Observamos que a musica em Crepuscu/o de oulono partiu da ambiguidade literaria, da sugestao do 'concreto' pelo 'abstrato', do crepusculo como metatora que progrlde da monotonia ate uma alegoria da esperance. A ambiguidade literaria foi confinmada nos confrontos entre modalismo e tonalismo, nas sobreposicoes de acordes, nos encadeamentos sem resolucoes tradlclonals e na propria forma da obra, urn Lied-bipartido.
21
CASTRO, Luciana Monteiro de. Uma Inveslig~o analjijco-Interpretatilla $Obnl a ca~ ... Per Musi. Belo Horizonte. vA. 2001. p. S22
Como interpretes, coube-nos evidenciar contrastes e manter ambiguidades, par meio de decis6es relacionadas as graduac;6es da dinamica, ao usa da voz - lisa au com vibrato, aos tipos de ataques e timbre vocais, as respirac;6es e articulac6es de frases, a enfase dada a certas palavras ou fonemas e mesmo as decis6es sabre a usa dos pedais do piano, uma vez que a ambigGidade harmonica mostrou-se um elemento estrutural. As tendencias impressionistas presentes na obra apontam para uma interpretacao rica em sutllezas e despida de exageros.
A analise e a interpretacao de Crepusculo de auiona revelaram, final mente, uma obra com elevado grau de elaboracao e eficiencia, no que concerne a sua escrita idiomatica para voz e piano. Acreditamos que a compositora Helza Cameu, pela diversidade, refinamento e qualidade estatica de sua obra, ora exemplificada em Crepusculo de autono, mereca retomar e ampliar seu lugar no panorama da musica brasileira.
Referencias bibliogr3ficas
ACADEMIA BRASILEIRA DE MUSICA. Ficha biografica de Helza Cameu. In: Jomal do Commercio, 5 de marc;:o . de 1961.Rio de Janeiro.
BENNET, Roy. Uma breVe hist6ria da musica. Trad. Maria Tereza Resende Costa. 3ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986.
BENT, Ian. Analysis. In: SADIE, Stanley ed. The New Grove Dictionary of Music and Musicians. London: Macmillan & CO.,1980. v.1. p. 340-388. CAM~U, Helza. A influfmcia de Debussy na pianisfica brasileira. Rio de Janeiro:1962. (Rascunhos arquivados na
Biblioteca Nacional). GOLDSTEIN, Norma: Versos, sons e rilmo. Sao Paulo, Atica, 1989. Disponivel na internet: HOWAT, Roy. Debussy in proportion. London: Cambridge University Press, 1983. 235p. LA RUE, Jan. Guidelines for Style Analysis. New York: W.W. Norton & Company, Inc.,1970. MARTINS, Jose Eduardo. a som plan/stico de Claude Debussy. Sao Paulo: Novas Metas, 1982. 256p MASSARANI, Renzo. Helza Cam~u. In: Jornal do Brasil, 4 de novembro de 1965.
MOIS~S, Massaud. a Simbolismo. 3.ed. Sao Paulo: Cultrix, 1969. 293p. MURICY, Jose Candido de Andrade . Panorama do movimento simbo/ista brasileiro. 2.ed. v. 1, V.3. Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1952. PASCOAL, Maria Lucia. Tecnicas de composi~ao nos "Pre/udios de Debussy". In: III ENCONTRO NAC10NAL DE
PESQUISA EM MOSICA, 1987, p.391-403. Ouro Preto: UFMG, 1988. REIS, Sandra Loureiro de Freitas. A finguagem oculta da arte impressionista. Belo Horizonte: Maos Unidas, 2001.
447p. SADIE, Stan ley. Dicionarlo Grove de musics. Ediyao concisa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. 1048p. SCHAFER, Murray. 0 ouvido pensante. Trad. de Marisa Trench O. Fonterrada, Magda R. G. da Silva, Maria Lucia
Pascoal . Sao Paulo: UNESP, 1991 . 399p.
Observa~ao: a capia anexada de Crepuscufo de oulono, da qual foram extrafdos as exemplos musicais, foi realizada em 2001 e baseou-se integralmente na versao original da obra, um manuscrito aut6grafo datado de 1943, atualmente em posse da autora deste artigo. A Biblioteca Nacional edltou em 1999 uma versao de Crepuscufa de aulana, baseada em um manuscrito de 1967. que divergente em alguns pontos do manuscrito de 1943.
Luciana Monteiro de Castro formou-se em Canto em 1996 pela Escola de Musica da UFMG e concluiu Mestrado em performance na mesma escola. em 2001. Formou-se em Canto no Conservat6rio Nacional de Lisboa em 1992 com balsa de estudos do govemo portugues. ~ professora de Canto no curso de Graduac;:Ao da Escola de MlJsica da UEMG desde 1995 e do curso de Especlallzac;::io em Musica Brasileira desda 2001 .
22
-.
I ' m,. w co- .. ~_
" ,.-....
"-..lJ' ..........., ~
Crepusculo de outono Sufte Lulcas, Op.25 n.2
I
.... - ....
~ ------- ~--- ~-------........ J ........ cr ... ...J
quco ri - 0
Helza Caml!1I
c:re-ptq. cu - \0 CII;,
t;---
" ;:""""
.... If .... LJ ....... I."J
C6pia do manuscrito autografo de 1943 feita por Luciana Monteiro de Castro em 200 I
23
CAMU. Helu. P.rtiturlI completa de 0epIi1CUlo de 0tK0n0. "., Mu,1. 8.10 Hortzonte, v.4, 2001 . p. 23-28
e - van - gt - li-w
.... -M
=--
ro.
f o ou -to-no I-ma-re , - ,
M fe-ri- que. vi - da . -briuem ~
1&- ri- 9Qt.
CI - par -10 no at 0 let_lOr au -Bu naJ de en-QalI-t05 CI fei ti .9Ot'.
MOo 1111 mor mn. relVI en- mur
24
Illi ~ r...,.1 -
'w. r.. Os pi nhci-1t)I po-rtm
~ ' . J9 .,
-
~ ,; . "'"
< .. x- rio ... ""'
. ~ To. doo VeT ' dequea - -
.b ~~ "'- ~""'" L-.., L__.., ""
~~ ........ J ....... 1o"J ... .... ........ " ......... '-l
-,
~ . ".. IO-brea", vu . m i - nI.-ni-me da nc - \ 'C, Al . "" f . - ~~ J0 !~I ~~ ;0. !~ 't~"'" "'-~ ........ '-I....l ..... .... ......... ..... ' .... , . .
25
67 VIII pouco IIItJ/1
~
Inco/or
- if . . .
poo ta.
til Ii ca
CAMI!U. Helvo. p",rti'ura comlllet!l de Ct1I"uSCtlIo de Outono_ Par AlliN. Belll Horizllll'e. 11.4. 2001. n. 23-2A
-
o sol fundiu .~ - ~. A Co . lha-gem vcr~~~ . CrtK.
, "-
-
= !- If !. 'f
. .
. .
. ,
A pe . nu hi nos bat-rancos reo tor los
A 110m-bill ca - sa os sons v
ca - sa (IIi !IOfUI v
27
crest:'
cor dei ri nhas mot los.
" ni - n.
- lha ~ -
! .
~ . y
p
E .-
CAMI!U. HtttzII. p,rtitunI completa de CnlpUscub de Outono. p., MuaI. BeIo Horizonte, v.4. 2001, p. 23-28
A-w]_tam do el" rio que cin .go ' XT-I"I. C,.,IC.1llMl1O
CREPUSCULO DE OUTONO
o crcpusculo eai, manso como uma ben~o. Dir-JC hi que 0 rio chora a prisao do seu leilo ... As grundcs mios da sombm evnngelicas pensarn. As f(:ridas que a vida abriu em carla peilo.
o oUlono amarelece e despoja os lari~os. Um corvo passa e geasna, e deixa esparso no at o terror augurnl de canlos e feili~os. As flores morrem. Toda a relva cnlra a murchar.
Os pinheiros porem vi~ e smo em breve Todo 0 verde que a vista espairecc:ndo vejas, Maia negros sobre a atvurn ininime cia neve, Alios e espirituais com flcchas de igrejas.
28
Em "A Cinza das horns"
Urn sino plange. A sua voz rilma 0 munnurio Do rio, e isso pare
Teaching music musically 1
Keith Swanwick (University of London)
Abstract: In this presentation I shall propose that music is a form of discourse. This has three fundamental principles for music teachers and these principles present some implications for teaching methods and curriculum structure. I use the word 'discourse' in an everyday, non-technical sense. Associated terms include 'argument' , 'interchange of ideas', 'conversation', 'expression of thought' and. most important, 'symbolic form'. Discourse manifests itself in a variety of ways, not only through words. I wish to argue that music is part of a web of human discourse, rather than some curious activity separated from life in general. I shall also argue that music is not object but always contemporary event. Musical processes have a degree of cultural autonomy with multiple interpretations, uses and responses. Keywords: music education, musical processes, Swanwick, discourse.
,;- . r .-
"'~ Resumo: Nesta ap{esenta~ao eu proponho que'a-musica e uma forma de discurso, 0 que traz tres principios
-fundamenta}s para~p'~ofessores- de mus1ca.~ Esfes princrpjos.~pr.~sentam .algumas implicaes para os metodos de ensino .e currfculos.AE..alavra ,'(fiscurso' e utilizad~l a9(Ji
SWANWICK. Keith. Teaching music musically. Per Mu$/. Belo H0ri2:ontB. Y.4. 2001. p. 29-36
the idea of music as a form of discourse three fundamental principles for music teachers which arise from this view some implications of these principles forteaching methods and curriculum structure.
use the word 'discourse' in an everyday, non-technical sense. Associated terms include 'argument', 'interchange of ideas', 'conversation', 'expression of thought' and, most important, 'symbolic form'. Discourse manifests itself in a variety of ways, not only through words. I wish to argue that music is part of a web of discourse rather some curious activity separated from life in general.
Following the philosopher Karl Popper, I shall maintain that each of us is aware of a subjective 'world' that we recognise as 'ourselves' and of a world we perceive as being outside of ourselves, consisting of other people, objects and events and the natural world. These two worlds - the inner and outer - are linked by what Popper called 'World Three'. This world of discourse and is full of ideas articulated in symbolic forms: inventions, questions. theories, ideas in books, music, art, science, mathematics and so on. This world is where we have the possibility of meeting the minds and cultures of others (POPPER, 1972). Discourse significantly enhances and enriches our understanding of ourselves and the world. Music is no exception. It can be found in all cultures, often interwoven with dance and ceremony, with ritual and healing. It takes a central role in celebrating significant life events: birth, adolescence; marriage, death.
Discourse does not merely reproduce, it also modifies the symbolic form in which it appears. Take for instance the daily extension and evolution of languages evidenced in the rapid revision of dictionaries. And discourse can appear in new or fresh combinations or symbolic forms, such as film, television and internet publishing. Discourse is a useful generic term for all meaningful interchange. It encompasses the trivial and the profound , the obvious and the recondite, the new and the old, the complex and the simple, the technical and the vernacular. As with any other medium of thought, musical discourse can be socially reinforcing or culturally provocative, soporific or challenging. Discourse fills the space between us with ideas and negotiations. It is a market place where we trade what we think we know. Even though we may not approach universal truths we can at least arrive at some places of negotiation. This is possible only through symbolic processes, through creating and sharing meaning and values. These meanings and values are obviously social products, to the extent that they are 'creations that are formed in and through the defining activities of people as they interact (BLUMER, 1969, pA-5). These defining activities are the discourses of language, mathematics, science, art, music and so on. There can be no significant interaction without interpreting minds engaged within symbolic forms.
Each individual exists in a particular set of discursive forms deriving from the social institutions in which she or he finds herself or himself. The resolution of these tensions, contradictions, and incompatibilities, provides a constant source of dialogue .. . (KRESS, 1985, p.31).
I take it that education is concerned with studying, engaging in and developing these discursive forms, forms which are plural rather than singular. They are not Platonic, essentialist, Intrinsic or invariant universals but are constantly evolving, always 'reforming', Nor are they sets of fixed, socially conditioned actions without the possibility of reflection, reconstitution or resistance.
30
SWNIWICK,Kei1h. Tetd'llng music musiealy. Per MUM. Bela Horizonle, v t, 2001. p. 2S-36
From this perspective we can see that music not only has a role in cultural reproduction and social affirmation but also has potential for individual development, for cultural renewal , for social evolution, for change. Music shares with all forms of discourse four major psychological characteristics.
We internally represent actions and events to ourselves; we imagine. We recognise and generate relationships between these images. We employ systems of signs, shared vocabularies. We negotiate and exchange our thinking with others.
This way of looking at music gets us away from defining it as an essentially 'aesthetic' activity. This difficult and problematic word tends to be defined in a multiplicity of ways and is very often an unsatisfactory confusion of several different concepts, including the aesthetic, the artistic and Ihe affective. For example, Bennett Reimer sees the 'aesthetic', 'artistic' and 'intrinsic' as interchangeable (REIMER, 1989) and Peter Abbs views aesthetic experience as those encounters which are highly memorable or overwhelmingly affective. If we take the view that there is a special kind of experience called the aesthetic then we are likely to push all the arts together into this overall category. This is so for Peter Abbs who advocates the idea of a 'generic community' of the arts. This aesthetic community has three shared characteristics that distinguish it from other areas of human activity (ABBS, 1994, p.92).
1. All the arts 'create forms expressive of life'. 2. All for their meanings 'depend upon their formal constructions that cannot be
extracted or translated without Significant loss'. 3. They require 'not a critical response but an aesthetic response - a response through
feeling, the senses, and the imagination'.
Thus stated, the problem becomes fairly clear. The first of these defining statements must surely apply to al/ forms of discourse, unless a very restricted meaning is placed upon the phrase 'expressive of life'. Science and philosophy, for instance, also create meaningful expressive or communicative forms. The second statement may appear to be more artistically distinctive but is also true of interpersonal relations, sexuality and humour, in fact of all intuitive or holistic ways of taking the world. And I suspect that much advanced thinking in mathematics might also depend on 'formal constructions'. The third statement containing the idea of aesthetic response seems more easily justified, even if the argument is somewhat circular. Even here though, it is difficult to imagine artistic participation, let alone teaching the arts, which is divorced entirely from critical awareness. In any case, is this aesthetic response through the senses not also characteristic of eating, drinking, participation in games and in the enjoyment of nature? So it seems that all three of Abb's allegedly distinctive 'aesthetic' characteristics appear to be shared with several other forms of symbolic discourse.
We are all surely on the side of the aesthetic rather than its opposite, the anaesthetic. But the main problem of special pleading for the arls based on the supposed unifying Idea of the aesthetic is that It reactivates the underlying old and unhelpful division between the 'affective' and the 'cognitive', between feeling and thinking. This dichotomy is of course false. As John Dewey reminds us: "The
31
SWANWICK. Keith. Teaching music ITII.Isleally. PM lofusJ. Bela Horizonte, v.4, 2001 . p. 29-36
odd notion that an artist does not think and a scientific inquirer does nothing else is the result of converting a difference of tempo and emphasis into a difference in kind" (DEWEY, 1934, p.15).
What differentiates music, literature and the other arts from the sciences is the strength of connection with personal and cultural histories - a matter of degree. There is a strong awareness of the quality of arts activity which is frequently the focus of the experience itself. However, we ought not to bundle the arts together as if they all do the same thing, Each has its own history and methodology. There is no common ingredient in artistic processes beyond this concern with subjective impact and metaphoric playfulness. A painter thinks in paint, a musician in sound, a writer in words.
Psychologically speaking we can picture musical discourse in several layers of metaphorical transformation. Sounds are transformed by our minds into expressive shapes, into sonorous gestures. These gestures are perceived as positioned in relationships with each other, as musical form. And at times these new forms relate strongly to our personal histories and produce powerful affective responses, informing what Langer called the life of feeling . When attempting to describe the third of these transformations, terms such as 'aesthetic experience', 'flow' and 'peak experience' are interchangeable. This strong sense of personal significance occurs frequently enough to motivate many people to put themselves in the way of musical experiences. Furthermore, this third metaphorical shift is only possible when approached through the two previous transformations. Only when tones become gestures and when these gestures evolve into interlocking forms can music relate to and inform the shapes and patterns of our previous life experiences. Only then does the symbolic form of a musical performance becorne able to be 'mapped' on to the form of human feelings. These metaphorical processes are internal, invisible, but we can observe their effects in the various layers of musical activity. I call these layers materials, expression, form and value.
This perspective of music as discourse has a profound effect on how we conceive of music education and leads me now to propose three fundamental principles.
First principle: care for music as discourse In my early research I found that very young children can identify and respond to expressive gestures in music. Th is may be called the semantic layer of musical experience. Li?ter research shows that by the age of 9 or 10, most children can also respond to and produce interesting musical structures . Children as young as seven are able to consistently describe small musical changes in terms of activity, size, weight, level of outward-Iookingness and flexibility. Music that is perceived as more or less 'sad' is also heard as passive, heavy, stiff and inward-looking . Music is thus closely related to posture and gesture . There are implications here for music ~nd movement.
One aim of the music teacher is to bring music from the background into the foreground of awareness. Whenever music sounds, whoever makes it and however simple or complex the resqurces and techniques may be, the musical teacher is receptive and alert, is really listening and expects students to do the same. The smallest meaningful musical unit is the phrase or gesture, not an intelVal, beat or measure.
32
SWANWICK. Keith. Te.ehfig music 1TlI.I$ieal1y. Per MU3i. Elelo Horironte. v.4. 2001 . p. 29-36
The particular teaching method is nowhere near so important as our perception of what music is and what it does. Running alongside any system or way of working will be the ultimate question - is this really musican Is there a feeling for expressive character and a sense of structure in what is done or said? To watch an effective music teacher at work (rather than a 'trainer' or 'instructor'), is to observe this strong sense of musical intention linked to educational purposes: skills are used for musical ends, factual knowledge informs musical understanding. Music history and the sociology of music are seen as accessible only through the doors and windows of particular musical encounters. For it is only in these encounters that tl)e possibilities exist to transform tones into tunes, tunes into forms and forms into significant life events. In my book, Teaching Music Musically, I draw attention to those features of discourse which music shares with other forms and I identified three ways in which music functions metaphorically (SWANWICK, 1999). Through the process of metaphor we:
tr~nsform tones into 'tunes', gestures transform these 'tunes'. these gestures into structures transform these symbolic structures into significant experience.
Second principle: care for the musical discourse of students Discourse - musical conversation - by definition can never be a monologue. Each student brings a realm of musical understanding into our educational institutions. We do not introduce them to music, they are already well acquainted with it, though they may not have SUbjected it to the various forms of analysis that we may feel are important for their further development. We have to be aware of student achievement and autonomy, to respect what the psychologist Jerome Bruner has called 'the natural energies that sustain spontaneous learning': curiosity; a desire to be competent; wanting to emulate others; a need for social interaction.
Some recent pieces of research help to illuminate this principle.
Jane Cheung in Hong Kong studied the effect of different computer programmes on children's composing (CHEUNG, 2001). She adapted Bemstein's concepts of:
classification (the choice of materials and topics, whether determined by the teacher or in part by the student)
framing (the style of the teaching/leaming transaction, whether didactic or more involving of student choice)
When secondary school children worked with a more flexible Information Technology programme they were more freely inventive. They produced musical compositions that were more imaginative. More of the musical layers were evident. Weaker classification and weaker framing allows students to bring their own musical ideas to the educational transaction.
A range of different musical activities also allows students to participate in their own way. Engagement with music from different angles strengthens musical understanding. For example, Jose Godinho worked with children in their 5th school year in a Portuguese school. With two
33
SWANWlCK. Keith. Teaching music muaicalty. Per Mus;. Belo Horizonte, .... 4. 2001. p. 29..a6
matched groups he investigated the difference in ability to recognise an aural presentation of a phrase from music they had previously either followed in simplified notation (audience-listening group) or performed along (audience-performing group) with the recording from the same notation. Children in the audience-performing group acquired stronger images. Performance thus seems to have a positive effect on attentive listening and mental representation (GODINHO, 2000).
The level of a student's musical understanding may depend on the activity. For example, the work of Cecilia Cavalieri Fran9a here in Bela Horizonte is illuminative. The same children tend to play published compositions less musically than they do when they perform their own work (FRANt;A SILVA, 1998). We can speculate about the reason why. It may have to do with technical level or with musical ownership. The important thing is that the second principle is at work - care for the musical discourse of students. Composing gives the possibility of choice of idiom and technical level. Performing gives a technique to enable compositional expression. Audience-listening widens the possibilities and builds up the internal dynamic library. We should notice though that the level of freedom to make musical decisions changes with the activity, especially in schools. If students are listening to music already selected for them, (strongly classified) then there is little room for choice. In performance there might be more scope provided that the performing group is small and that excessive technical demands do not preoccupy the attention. When composing th~re can be optimum levels of decision-making.
Third principle: fluency first and last I make this point briefly. If music is a form of discourse then it is analogous in some ways with language, though, of course, not identical. The acquisition of language seems to involve several years or more of mainly aural and oral engagement with other 'Ianguagers'. We have to look for the equivalent, of engagement with other 'musicers', long before any written text or other analysis of what is essentially intuitively known. I recall Jose Maria Neves in 1976 talking to teachers in Silo Joilo del Rey about a village which had 40 Samba masters. Only one of these used notation and he 'was a nuisance'.
Principles in practice What follows is an example of one teacher at work, someone who is at least trying to hold in mind this first principle, that we care for music as many-layered discourse. I trust the reader will excuse the personal nature ofthis illustration and the necessary analytical detail that accompanies Its description.
Papua New Guinea, March, 1987 Outside the clouds drifted over the high mountains. Inside the University of Goroka, on tables in the music room , student teachers were engrossed in cutting up sago stems into manageable lengths. They had rarely if at all seen sago before, since it grows only at much lower altitudes. Working in pairs and following a demonstration by their teacher, with bush knives they expertly made incisions of two parallel lines about a centimetre apart down most of the length of the outer surface of the sago stem. The last couple of centimetres at each end was left undisturbed and made secure with twine. Inserting a knife halfway along the stem they lifted the strip away from the body of the sago until it resembled a small bow without an arrow. A small piece of
34
SWANWICK, Keith. Teaching music musically. Per Mu$l. Belo Horizonle, vA . 2001. p. 29-36
bamboo was wedged underneath the strip, forming a kind of bridge. A second piece of bamboo was introduced in the same way and it was seen that these two bridges beneath the stretched sago strip created three different lengths of 'string', giving off different pitched sounds when plucked or struck. The students had to decide how best to tune these three notes. And this was quite tricky, for shifting the bridge in one direction affected the length of the strip on either side.
In the space of just over half an hour they had made sago zithers. With these three chosen pitched notes and using short bamboo beaters each pair of students invented and performed a short piece of music. Then came a revelation. Photographs and tape recordings were introduced of distant tribesmen playing sago zithers in a manner that can only be described as virtuosic. The students looked at their home-made zithers, remembered their own musical inventions and found themselves moving along new musical pathways into a part of the culture of their nation previously unknown. We were to some extent able to gain access to and sympathise with the musical minds of strangers from a remote place in a country where inter-tribal confrontation and violence seemed never far away.
What so strongly characterises this particular transaction and many other rich educational encounters which I have been involved or privileged to witness, is not so much the novelty of new musical 'accents' but the three levels of metaphor running through the presentation and production of music. These Papua New Guineans became musicians. That is to say, they heard and organised sound materials as if they were expressive shapes: they heard these shapes as if they had a life of their own and were organically connected: they began to engage with the 'accents' of others, to refresh their perspectives, to feel as if 'the entire world is as a foreign place'. This is what I mean by teaching music musically.
Notice the pedag()gical process. The session moved from understanding and parlicipating in musical experience towards understanding the cultural context - not the reverse. This was not cultural studies but music - an important distinction.
Music is a way of knowing, a way of being in a culture, a way of thinking and feeling. It is not an example of something else, of rondo form, of a symphony, orofthe culture of Brazil's North East Or of music making on the shores of Papua New Guinea. We all know this really. And we must always be vigilant to see that the music in schools, in classrooms and studios is a direct and powerful experience of discourse.
Finally, some points for thought
Music is not object: it is always contemporary event. There are multiple interpretations, uses and responses. Musical processes have a degree of cultural autonomy.
In music we meet in the market place of ideas. The aim of music education is bring Its share of products in this area of trade. For it is in 'World Three' that we meet, partiCipate in the discourse of music rather than about music. It is a place of significant transactions.
35
SWANWICK. Ke ith. Teaching music musically. PM'Mull. Bllio Horizontll, v .. 2001. ~. 29-38
Bibliographic references: ABBS, P. The educational imperative. London: Falmer Press, 1994. BLUMER, H. Symbolic interactionism: perspective and method. Berkeley: University of California Press, 1969. DEWEY, J. Art as experience. New York: Capricorn Books, 1934. GOOINHO, J . C. D. N. Audience-listening and audience-performing: a study of the effect of context on mental
representation of music. Tese de Doutorado. London: Institute of Education. Music and Drama Opt., University of London, 2000.
CHEUNG, Jane Wai Yee. The effects of computerised music instruction on the attitude and achievement of children: with special reference to strong and weak framing. Tese de Doutorado. London: Institute of Education, Music and Drama Opt., University of London, 2001 .
KRESS, G. Linguistic processes in sociocultural practice. Oxford: Oxford University Press, 1985. POPPER, K. Objective knowledge. Oxford: Clarendon Press, 1972. REIMER, B. A philosophy of music education. Englewood Cliffs. N.J.: Prentice Hall. 1989. SILVA, M. Cecilia C. Franr;;:a. Composing. perfonning and audience-listening as symmetrical indicators of musical
understanding. Tess de Doutorado. London: Institute of Education, Music and Drama Opt. , University of London. 1998. .
SWANWICK, K. Teaching music musicafly. London and New York : Routledge, 1999.
Keith Swanwick is Dean of Research and Professor of Music Education at the Institute of Education, University of London. He has been musically active throughout his career, notably as a conductor, and has taught at secondary. post-16 and university levels: He is the author of a number of books on music and music education. Including Teaching Music Musically (London: Routledge, 1999), Music, mind and education (London; Routledge, 1988) and A basis for music education (London: Routledge, 1979).
36
Indeterminaqao na obra Cam;ao Simples de Tamborde Carlos Stasi
Fernando Rocha (UFMG) e-mail: [email protected]
Resumo: Este artigo discute as conceitos de indetennina~ao, aleatoriedade e improvisayao, encontrados na musica da segunda metade do seculo Xx. Com a analise da obra Can~ao Simples de Tambor, de Carlos Stasi, pode-s8 verifiear e exemplifiear como estes conceitos pod em ser utilizados como verdadeiros recursos composicionais. Palavras-chave: Carlos Stasi. indeterminayao, aleatoriedade, improvisayao, percussao. musica do seculo XX.
Indeterminacy in Canlfao Simples de Tambor by Carlos Stasi Abstract: This article discusses the concepts of indeterminacy, aleatory and improvisation found in the music 'from the second half ofthetw~nW:~th century. In the analysis of Cantyao Simples de Tambor by Carlos Stasi, itwas possible to verify and,.exemplify how these concepts can be used as true compositional resources. Keywords: Carlos Sta~i, indeterm'inacy, aleatory, improvisation, percussion, twentieth-century music.
Can,ao Simples de Tambor, escrita pelo compositore interprete Carlos Stasi,' em 1990, e urn solo para caixa clara em seis movimentos, nos quais sao utilizadas diversas possibilidades timbrfsticas do instrumento, organizadas, em certos momentos, de maneira a produzir verdadeiras melodias. Eo interessante notar que, nos cinco primeiros movimentos, a caixa e empregada com a esteira desligada, praduzindo uma sonoridade mais escura e, deste modo, distante da sua sonoridade usual de esteira ligada, que a caracteriza como instrumento militar marcial. No ultimo movimento, ja com a esteira ligada, ocorre uma melodia de timbres tao bern definida que a can3ter militar do instrumento acaba sendo mais uma vez amenizado. 0 nome da peC;:8 ("can9ao") reflete este uso mais suavizado do instrumento e as proprias melodias que ela apresenta, especial mente a do sexto movimento.
Stasi explora, no decorrer da pec;:a, alguns recursos bastante inusitados no instrumento, como toca-Io com uma vara de pescar au com uma bola de ping-pong ou, ainda, sopra-Io. Este material sonora e trabalhado de forma a integra-Io a uma estrutura formal bastante clara, que e encontrada em seus diversos movimentos. Os recursos inusitados apresentados funcionam tarn bern como elementos cenicos. 0 contrale da bola de ping-pong pelo interprete, no terceiro movimento, 58 assemelha ao de um malabarista; uma vara de pescar em urn concerto e urn
1 Cartos Stasi e professor de percussao do Instituto de Artes da UNESP, em Sao Paulo. Em 1995 concluiu 0 mestrado em performance. na CalArts. nos Estados Unidos. e em 1999 tornou-sa PhD em Ci~ncias Humanas, com especializ3C;:c3o em Musica, pela Universidade de Natal, em Durban, Arrica do SuI. Alem de compositor e interprete, tambEtm atua como pesquisador, possuindo grande interesse em instrumentos raspadores (como 0 reca-reca), tendo, inclusive. fundado 0 RECO - Centro de Estudos.
37
ROCHA, Fernando. Indetermin~ na obna Cent;io Simpln de Tambor ... Per MllII. Belo Hotizonte. vA. 2001 . p. 3151
elemento totalmente inesperado e causa um certo espanto na plab~ia, assim como os sopros e olhares em direc;ao ao instrumento, no quinto movimento. A arte da musica vai, deste maneira, um pouco alem da ideia de sons organizados, fundindo-se a outras linguagens artlsticas. especial mente, ao teatro, II arte da representacao.
Outro aspecto importante da obra, e que sera 0 centro de atenc;ao deste artigo, e a ocorrencia de diferentes formas de indetenninac;ao, as quais Stasi utiliza como verdadeiros recursos composicionais.
1. INDETERMINACAO,IMPROVISACAo EALEATORIEDADE Os termos aleatoriedade e indeterminaCao sao muitas vezes empregados quase sem nenhuma distinCao. No dicionario The New Grove (SADIE, 1980), por exemplo, 0 verbete "indeterminacy" remete ao "aleatory". 0 conceito de improvisac;ao, na musica contemporanea, tambem e frequentemente associado ao de musica aleat6ria, geralmente de fonna equivocada. Para analisar mais a fundo os tres conceitos, vejamos como eles aparecem no Novo Aurelio Seculo XXI: 0 dicionario da" lingua portuguesa (FERREIRA, 1999), no Dicionario Grove de Musica (SADIE, 1994), e na Encic/opedia da Musica do SeculoXX(GRIFFITHS, 1995). Segundo a Novo Aurelio Seculo XXI:
Aleat6rio : N1. Dependente de (atores incertos, sujeitos ao aeaso ... (p .90) . Improvisar: M2. Falar, escrever ou compor, sam prepara~ao, de improviso .. ."; de Improviso: -1. De repente ( ... ) 2. sem preparacao previa .. ."; improviso: M2. Produto Intelectual inspirado na propria ocasiao e feito de repente, sem prepare .. ." (p.10B7). Indeterminado: M1. Que nao e daterminado ou fixo ... (p.1100); determlnar: -2. Indicar com precisao .. ." (p.67l) .
De acordo com 0 Dicionaria Grove de Musica:
Aleatoria, musica: Mgenero de musica em que certas escolhas na composi~ao ou na reaiizac;ao soo. em maior ou menor grau, deixadas ao acaso ou a vontade de cada interprete.N (p.19).
lmprovisa~ao : Ma criacao de uma obra musical, ou de sua forma final. a medida que esta sendo executada. Pode slgnificar a composicao imediata da obra pelos executantes, a elaborat;ao ou ajusae de detalhes numa obra jil existente, ou qualquer colsa dentro desses limites." (p.450). (Nao h6 0 verbeta Indeterminat;Ao, na edi~o concisa em portugues e, na ed ioao original completa em ingles, 0 verbete indeterminacy remete ao aleatory)
Segundo GRIFFITHS (1995): Aleat6rio : M(do lalim alea = dados de jogar) . Adjetivo usado para a muslca em que 0 compositor deixa deliberadamente margem para ocorr~nclas casuais ou op~oes do interprete [ ... ] 0 termo e normalmente reservado para a musica do s~culo XX ... " (p.3).
Improvisa~ao : MArte que jil estava em decHnio muito antes do inlcto do sec. xx, com 0 costume de por na paula cadencias e ornamentos [ ... ) Contudo, varios tipos de improvisae;:ao voltaram a ser praticados nos anos 50, com 0 advento da composie;:Ao aleatoria, da notae;:ao grilfica e da indeterminayao, embora a imprevisae;:ao no sentldo antigo, permitindo a exibioao do virtuosismo nurn mundo musical prescrito, seja mais uma caracterfstica do jazz ... (p.107-10B).
Indetermina~ao: MTermo usado por Cage e por ale preferido para a composlc~o aleatoria. Cage fazia uma distine;:ao entre 'obras indeterminadas ns composie;:ao' (p , ex., uma partitura convenclonal produzida por operae;:oes casuais) e as 'indeterminadas na execuciio' (p. ex., a partilura deixa varia decisoes para os musicos)." (p.10B).
38
ROCH.t., Fernando. Indetenninlll;to na o/mI Ca~ Simples de TIIt7lbc:rt" . Par Musl. Sab Horizoole, v.". 2001. p. 37 51
Uma primeira observa9ao a ser feita sobre estas defini90es e a ideia de que na musica indeterminada existem elementos deixados a merc~ do acaso ou da escolha do interprete. a termo aleat6rio vem do latim "alea", que significa dados de jogar, e, desta forma, esta diretamente ligado a ideia de acaso. Por outro lado, 0 tenno improvisa.;ao implica numa tomada de decis5es pelo interprete, no momenta em que executa a obra, 0 que e bastante diferente de um produto oriundo do acaso. Aleatoriedade e improvisa9ao apresentam-se, assim, como duas formas distintas de indetermina9ao.
Em Techniques of the Contemporary Composer, David Cope afirma que indetermina9ao e qualquer processo cujo produto final, ou partes deste produto, nao podem ser completamente previstos (COPE, 1997,161). Do ponto de vista musical, qualquer obra, na qual 0 compositor deixa certas decis5es para 0 interprete, ou a merce do acaso, pode ser considerada indeterminada. Apesar de Cope nao utilizar 0 tenno aleat6rio, ele cita a tomada de decis6es do compositor a partir de processos probabilisticos, como 0 jogo de dados, urn dos casos possfveis de indetermina9iio. Voltando a origem da palavra aleat6rio (alea = dados de jogar) , pode-se inferir que este tipo de indetermina9ao e um processo aleatorio. A improvisa9ao e colocada por Cope como urn dos outros casos possiveis de indetermina9ao e ocorre, quando 0 compositor deixa, intencionalmente, para 0 interprete a decisao sobre certos elementos do discurso musical (como alturas, ritmos e timbres). E realmente importante dilerenciar aleatoriedade de improvisa9ao. Uma obra composta com 0 auxllio de algum processo randOmico e considerada aleat6ria, porem pode apresentar em sua nota980 urn alto grau de precis80, nao conferindo, assim, ao interprete nenhum momenta de improvisa980.
A aleatoriedade normalmente oj associada a uma indetermina9ao na composi9ao, porem ela tambem pode ocorrer no momento da performance, quando algum fator randamico, propositalmente colocado pelo compositor na obra, interfere no resultado sonora da execu9ao. Em uma oficina ministrada em 1994 na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) pelo compositor Marco Antonio Guimaraes, os alunos compuseram urna pe9a que utilizava as cartas de um baralho. Cada uma delas recebeu um determinado significado musical. Durante a performance, as cartas eram misturadas e iam sendo sorteadas uma a uma, orientando a execu9ao. Neste caso, e nltida a presen98 da aleatoriedade na performance .
A n0980 de improvisa9ao, na musica contemporanea, aparece tambem associ ada ao usa de nota90es graficas, isto e, grafias musicais nao tradicionais. A interpreta9ao de obras com estas nota90es normal mente e considerada um tlpo de improvisa9ao, 0 que nem sempre e verdade. Assim como a nota9ao convencional, algumas destas novas nota9Oes podem significar uma orienta9ao bastante preclsa ao interprete. Pode nao haver, necessaria mente, espa90 para jrnprovisa98o, mas sim urn tipo diferente de controle do compositor, utilizando-se de urna nota9ao mais adequada a sua obra, como acontece, por exemplo, em Sonancias para piano e percussfio de Marlos Nobre (Fig. 1). Apesar de conter elementos indeterminados, especlalmente no que dlz respeito a dura9ao das notas, nao ha trechos aleat6rios ou de improvisa9ao, po is 0 controle do compositor sobre 0 produto final e bastante eletivo.
Percebe-se que nem toda indetermina9ao na performance implica em improvlsa9ao. Pode haver uma aleatoriedade, ou, ainda, um tipo diferente de controle por parte do compositor, a partir de nota90es nao convencionais. Na verdade, qualquer nota9ao sempre gera alguma
39
ROCHA. Fllmlilldo. tnde\en'nin~o rill obit! Cltn#o Sln1pJes d. Tembor ... Pur Mu~. Belo HoriZon\e. v.4, 2001 . p. 3751
= Jf
, ,
~~ :
Ognl Tpo . Mttronomo 42 eea. (3 beat$ 01 42)
Fig.1: Marlos Nobre: Sonancias para piano e percussao
lento , :lcce l. - .
imprecisao e, desta forma, qualquer musica escrita poderia ser chamada de indeterminada. 0 conceito de indetermina'Y8o s6 pede ser melhor compreendide em fUOf;ao de grau, e nao de maneira absoluta . Neste sentido, a nota9ilo tradicional pode ser considerada bastante "deterrninada", pois 0 seu desenvolvirnento propiciou ao compositor urn alto grau de precisao na indica'Y8o de elementos essencials do discurso musical ocidental, especial mente as alturas e dura90es. Assim e 0 repertorio do periodo romantico e grande parte das pe9as compostas no come90 do seculo XX, por compositores como Debussy, Stravinsky e Schoenberg , nas quais
40
ROCHA. Fcmoooo. tndelerminaCio na obnI C.""o SbnpIes d. raltlbol" ... Per Mu$i. Belo Horizonte. v.4. 2001. P. 37-51
todas as alturas encontravam-se determinadas e os ritmos e, tambem , as dinamicas eram especificados com bastante precisao.
Concluindo, indeterminat;ao e um processo no qual 0 resultado sonoro nao pode ser previsto com urn alto grau de precisao. Aleatoriedade e improvisayao sao duas form as posslveis de indeterminayao, sendo que, na primeira. ha 0 governo do acaso e, na segunda, do interprete. A aleatoriedade pode ocorrer no processo composicional, quando 0 compositor utiliza algum processo rand6mico, como um sorteio de dados, para decidir sobre os elementos da obra , ou mesmo na performance, quando 0 interprete tambem nao controla 0 produto final. Este ultimo recurso e explorado por Carlos Stasi, na Can9iio Simples de Tambor, como sera mostrado a frente. Na improvisa9ao, 0 compositor deixa, deliberadamente, elementos para a escolha do interprete, no momento da performance. Considerar que uma obra e indeterminada pel a liberdade do interprete e uma questao de grau de indeterminat;80 registrado na partitura. A improvisa9ao acontece, quando este grau e elevado, podendo ser detectada uma inten9ao deliberada do compositor em deixar certas decisoes, para serem tomadas pelo interprete no momento da performaQce. Neste caso, 0 controle do produto final pelo compositor diminui e 0 interprete passa a ser um verdadeiro co-autor da obra.
2. tNDETERMINACAO NA CAN9Ao SIMPLES DE TAMBOR A obra Can980 Simples de Tambor e uma boa referEincia para exemplificar as diferen9as entre os termos discutidos na set;ao anterior, e tambem para mostrar como um compositor pode util iza-Ios como verdadeiros recursos composicionais . Apesar do tema deste artigo ser indetermina9ao, urn primeiro aspecto a se notar e a grande preocupa9ao do compositor em determinar perfeitamente os timbres. Mesmo propondo recursos pouco comuns, Stasi controla o som produzido a partir de instru90es bern claras, como pode ser visto na partitura (Fig. 4). Tambem a forma e cuidadosamente trabalhada e definida pelo compositor. 0 primeiro movimento, par exemplo, possui uma estrutura ternaria ABC, com coda. (ver Anexo 1).
Dentro desta organiza9iio bern rigorosa, surgem alguns trechos com indetermina9iio durante a pe9a. 0 primeiro deles ocorre no pr6prio primeiro movimento (Fig. 2) com a interprete tendo a liberdade de decidir de que maneira ira combinar os eventos apresentados pelo compositor entre as compassos 24 e 30 e quantas vezes ira tocar cada urn deles. Vale notar que todos estes eventos
mant~m a frase inicial, porem ela vai ficando camuflada atras dos sons dos "rim shots'" que vao sendo acrescidos. Assim, ha a presen98 de duas frases, uma deterrninada pelo compositor (a Irase inicial) e outra sobre a qual 0 interprete tern a liberdade de escolha (a entrada dos "rim shots,) .
No segundo movimento (Fig. 2), ha urn outro trecho de indetermina9iio. Stasi propoe que 0 interprete execute repetidas colcheias, tocando a baqueta da mao direita sabre a da esquerda, enquanto mantem esta sobre a pele. A baqueta da esquerda produzira ritmos irregulares, a partir dos rebotes produzidos pela pele. 0 resultado final e uma simultaneidade de uma Irase ritmica precisa, no caso, as colcheias, contra a aleatoriedade dos ritmos produzidos pel a baqueta esquerda. 0 final do movimento e a aflrma9iio das colcheias, com a indica9ao pelo compositor "sem rebates".
2 "rim shot" e 0 tenno normalmente utilizado para se referir ao timbre da caixa, produzido ao se tocar com a baqueta simultaneamente na pele e no aro.
41
ROCHA. Fernando. Indetetlflina9iio na obl1l Ca~1o Simples da Tambor ... Per Musl. Seb Horizonte, 1f.4. 2001. p. 37-51
can(lB.o Simples de tambor 1 (arlQ~ Stasi t.n 0
J. 88-!'
3. .! -,- -,- -,- ' ,....,--,- .
I: noo 1jD)pJ)U) c I !~t ii11JldJ)~W1~Jil ~ .................................. -.' rr ",r. ~r .
fr;~;ra kltT/o, ml$/~r~ odltl -C'o.cl .. tvo.~ k. do 6;"'f6 ~o cO"'fl.
ROCHA, Fernando. Indeterminaclo na obfa ~io Simples de Tambor ... Per Musi. Belo Horironte. v.4. 2001. p. 31-51
J ~ 11.1'~ ',0, Co '
I Ud#~m I if IJnnm IJJjn m ~ 1[r.tPt. .
",p ~.u TiT)
IE;; I r
J, 1~8- 1 ~~ ~lJ. li~ 1 n n I 0
rr r F
2
~ .... ve ___
Fig. 2 - Carlos Stasi: Can~ao Simples de Tambor- primeiro e segundo movimentos.
43
ROCHA, Fllmando. IndelenrWl~ l1li obfa ~ S~.s de Tambof .. ~ Mull. Belo HorIzontll . .... 4. 2001 . p. 31 51
No terceiro movimento (Fig. 3) aparece uma indicat;ao textual "improvise sabre motivos serne/hanfes". Estes motivos sao os timbres e ritmos produzidos com a bola de ping-pong. Depois de apresentar varias possibilidades sonoras do uso da bola na caixa, 0 autor da liberdade ao interprete de improvisar sobre eles, explorando este recurso inovador introduzido na pet;a. o improviso funciona como uma set;ao de desenvolvimento, ap6s 0 qual e retomada a ideia inicialmente apresentada no movimento, isto e, a bolinha girando ao redor da caixa. Este movimento introduz uma mudant;a de foco na percept;:ao da obra musical, trazendo fen6menos nao necessariamente sonoros (especialmente 0 controle da bola girando). Porem, mesmo estes fenomenos sao organizados a partir da sua resultante sonora e nao aparecem apenas como efeitos teatrais.
o quarto movimento (Fig. 3) talvez seja 0 mais interessante para os objetivos deste artigo. Nele acontece uma grande aleatoriedade no processo interpretativo. 0 interprete deve tocar uma frase ritmica totalmente definida com uma vara de pescar sobre a caixa. Como a vara e muito flexivel, a resultante sonora torna-se totalmente aleat6ria. Assim como no segundo movimento, e interessante notar a simultaneidade de duas frases, uma determinada pelo compositor (tocada pelas maos) e outra aleal6ria (vara percutindo na caixa). No decorrer do mqvimento, 0 interprete passa a ter a liberdade para improvisar os ritmos com as maos, mas a resultante na caixa continua aleat6ria. E a afirmayao da aleatoriedade, ao contra rio do que aconteceu no segundo movimento. E interessante notar, que em todos os exemplos relatados ate aqui ocorreu uma simultaneidade de Irases ou ideias, uma determinada pelo compositor ou improvisada pelo interprete e outra aleatoria . Conforme relato do proprio compositor, esta simultaneidade se assemelha a certos problemas da comunicat;:ao, provavelmente jii vividos por todos nos. As vezes, uma mesma frase provoca diferentes entendimentos em diferentes pessoas. Carlos Stasi, nesta obra, aproveita-se muito bern de recursos de indetermina
3 " .... J~
,llJJ rmJmffiJ
....
mJ rIDJIDmJ I , '- .
Fig. 3 - Carlos Stasi; Cancao Simples de rambor - terceiro, quarto e quinto movlmentos.
45
ROCHA, FemMdo. Indetennin~ nil obra ~Io Simple. de Ta'IIbor p., Mulll. Bela Horizonte, v . , 2001 . p. 37-51
rio .
,.. ' __ '_ .... 3 ........
1ft ' tJ 1, J M 1 I ~ rn ill OJ 1 I to 1 t 11 r J F J t I -I lilJ I "1'1 .. \..I ~ "r~~ t .. ~ '~f'o ... .",.J, .,.I I;b., e.nla:-o rCLft I ri~v It e", 5 i II t'\cio I 0\ ~~ ~Q..'Ct.. 0 f .... ~t \tIt I'\to e JI. v'" Ie lit SIQ p' 0 t rn ~UQ. dl re~ .
5 lptox.iml!. -~f. Jo iMt"" fO\(nto P., .. I,/\v" ""omt.tos y .. ... d. leb. ho b., ...
ROCHA, Femllndo. Indetermln~ na obra C.""" SImples de Taonbot ... PM Mu$l. BeID Horilonte, v . . 2001. p. 3Ni1
In5tru~oes
Fig. 5 - Carlos Stasi: Cancao SImples de Tambor - instru~Oes
48
ROCHA, Fernando. Indeterminar;llo ria obra Cancllo Simp/8$ de Tllmbor ... PftrMusi. Belo HOfizonle. v.4. 2011. p. 31-51
4. ANEXO 1: FORMA DO PRIMEIRO MOVIMENTO
I Se~iio A 22 33 So~ao C 41 Coda 45
I I I I I 1 a 78blOll 0 1314d 18190'2 12202324 f3031g3233h3637i3839j40 141 0" 45
Caraeteristiea de eada se
ROCHA, Femsndo. In cletermln~o na obra Conf40 Simples de Tambor Per Musi. eelo Horizonte. 11.4. 2001. p. 37-51
Vi sao geral: Este movimento possui uma forma terniuia, com uma coda que retorna 0 mesmo evento que fecha a sel;80 A. A prirneira sel;ao apresenta 0 recurso da melodia de timbres. A sel;8o a, 0 recurso de translormal'ao de Irase a partirda adil'ao de mais notas, alem de ser urn trecho com indetermina98o, e a se980 C apresenta urn processo de dirninuil;ao do tamanho das frases. B e C parecern existir como contrapontos urna da outra, a primeira formando e levando a urn grupo de notas agressivas repetidas e a segunda operando no sentido oposto e levando ao silencio.
Fernando Rocha e professor de Percussao da Escola de Musica da UFMG. Bacharel em Percussao pelo Instituto de Artes da UNESP, concluiu em 2001 0 seu mestrado em Musica pera UFMG, com a pesquisa ~A improvisa98o !18 Musica Indeterminada: analise e performance de tras obras brasileiras para percussao".
51
Terra Selvagem, Lamentos da Terra e Alternancias: o componente octatonico nas ultimas tres pe!;as para piano de Bruno Kiefer
Cristina Capparelli Gerling (UFRGS) e-mail: [email protected]
Resume: Tendo gravado a obra para piano solo de Bruno Kiefer, constatei a preSeny8 de sonoridades recorrentes cuja conformacao coincide com 0 conteudo intervalar das coleyoes octatOnicas. Estas configurar;oes intervalares e as sonoridades decorrentes contribuem na fonnacao de urn universe sonoro caracteristico. Para defini-Io, mapeei as gestos musicais de cada urna das Ires ultimas pacas para piano Terra Selvagem, Lamentos da Terra e Altemimciasutilizando 0 programa PCN~ de Jamary Oliveira. Esle texto e a resultado desta interpretar;8o analitica. Palavras-chave: Bruno Kiefer, analise musical, componente octat6nico, musica brasileira para piano, performance musical.
c
.0'-'" .... . "
The oc"tatonic cdmpdmi nt in Bruno Kiefer's last piano pieces ~ .'t:\---; 'f< ";:.4'ii .... .;;.0,. ~,.~. -' ~
Ab'stract:=O"u"r ing the recordIng of Bruno Kiefer's (~923:1987),"oonfplete works for piano, I noticed that the musical gesturesjn the last three ~p,i
GERlING. Cristina Cappareli. Ten'll S.tv.gem, ~'O$ da T6fTI . Altemlndas ... Per Mu$l. Belo Horizon\e. Y.4. 2001. p. 52-71
No coletivo de suas composi~6es para piano, a reitera~ao de elementos ritmico-mel6dicos baseados em estruturas delineadas de forma marcante e, sem duvida, 0 denominador comum. Estes gestos re iterados tendem a criar um conteudo ilusoriamente homogeneo e cujo can~ter obstinado pode parecer obsessivo. 0 que de fato acontece a que as configura90es motivicas de perfis distintos e individualizados sao agrupadas e reagrupadas, e por vezes transform ad as. Utilizando a metafora organicista, podemos dizer que em sua obra, Kiefer utiliza as forma~6es motfvicas como col6nias de celulas. Estas "celulasn , atraves de suas descendencias e
muta~6e s, ao migrarem de uma pe~a para outra determinam a unidade estilistica . Compreender a complexidade estillstica da musica para piano de Bruno Kiefer atravas do rnapeamento destas eelulas e evidenciar os elementos comuns na sua origem sao os objetivos deste trabalho .
Bruno Kiefer tinha uma visao lucida da perspectiva hist6rica e dos processos cornposicionais empregados por compositores deste saculo. Admirava e conhecia as obras de Debussy, Hindemith, Bart6k. Schonberg, Stravinsky. Webern e Berg. No entanto, nao e apenas na busea de influ~ncias deste ou daquele compositor que encontraremos 0 rumo de seu pensamento musical. Sua individualidade estilfstica nao deve ser atribuida a busea do novo ou inusitado,
porque os nossos compositores bravamenta optaram pelo caminho mais arduo, mais complexo e (tambem) mais fertil: 0 da personalidada individual que se transborda em musica. E destes compositores pessoais, destes compositores que filtram atraves de seus pr6prios olhos a
experi~ncia cotidiana para transforma-Ia em musica, certamente Bruno Kiefer asia entre os primeiros (CHAVES, 1983).
No conjunto da obra pianfstica escrita entre 1956 e 1984 (KIEFER, 1994, p. 93-99; inclu i informa90es sobre a obten9ao de partituras) percebe-se a convivencia de sonoridades aparentemente paradoxais. Algumas sao agressivamente dissonantes e asperas com contorno e apresenta9ao decididamente p6s-tonal. Outras forma90es de esca las, modos, encadeamentos e intervalos caracteristicamente consonantes trafegam no limiar da tonalidade tom ada no seu sentido mais amplo. A relutancia em abandonar 0 tonal a nltida nas primeiras obras; ja na Segunda Sonata (1959), a agressividade articulada pela dissonancia e estatisticamente dominante. Nas ultimas obras da decada de oitenta processa-se uma sintese e 0 compositor atinge um novo patamar de conviv~ncia entre estes do is elementos aparentemente contradit6rlos.
Nas obras compostas ate 1969, ano de composi9aO do Triptico, podemos observar as seguintes caracterrsticas: uso de uma linguagem diatonica com doses moderadas de cramatismo e lampejos de uma funcionalidade hann6nica como em Ares de Mo/equa e Poema para Ti (1956). A dissoluyao das fronteiras entre consonancia e dissonancia pela utiliza~ao de tons estranhos agregados a acordes diatonicos ocorre nas duas peyas de 1957, Toccata e Duas Pe(}as Serias. A Toccata exibe urn grau de elevado virtuosismo, 0 compositor demonstra urn conhecimento s61ido das possibilidades instrumentais contidos nos padrees de escrita pian istica. 0 cenario desta composi9iio e urn forte prenuncio do estilo que adotara nos pr6ximos anos , mas asta composi9aO ainda exibe uma continuidade associada aDs procedimentos do barraco, estilo preferencial do compositor enquanto professor de hist6ria da musica.
53
GERLING, Cristina C.pparelll, TtHTI S&Iv. pem, l amenlO$ da Terra e Altem.nciBl ... PfIr Mum. Bela Horb:oote. v.4, 2001. p. 52-71
o emprego consistente de motivos de contomos distintos e de repeti90es frequentes na Primeira Sonata (1958), sua primeira composi9ao publicada para piano, passa a ser uma possibilidade composicional. A sintaxe musical baseia-se no emprego de sonoridades distantes, no uso de paralelismos cordais e na utiliza~ao simultanea de mais de urn modo ou regiao tonal. Obedecendo aos canones formais, utiliza-se de urn primeiro movimento de sonata, urn segundo movimento de andamento moderado e cantabile , e, como ultimo movimento, uma fuga finalizada par uma seC;ao de toccata .
o espa90 reservado as consoniincias e drasticamente reduzido na Segunda Sonata (1959), onde o compositor opta por formac;oes cromaticas recorrentes dos intervalos de segundas, trftonos, setimas e nonas nos tres movimentos que a integram. Nas passagens em cantilena, nota-se 0 uso de sonoridades tradicionais desvinculadas dos canones de encadeamentos. 0 primeiro movimento caracteriza-se pel a eloqGencia, pela explora~ao de registros extremos e pela emotividade dos gestos pianisticos. Esta obra representa uma etapa importante na defini9iio de um perfil composicional singular, pais a homogeneidade do discurso do primeiro movimento e gradualment