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[email protected] @jornallona Curitiba, quinta-feira, 5 de maio de 2011 Ano XII - Número 622 Jornal-Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade Positivo lona.up.com.br A influência da moeda americana no cotidiano do brasileiro Pág. 4 e 5 O dia a dia, as am- bições e as dificul- dades de dois gays em Curitiba Pág. 8 Perfil Especial Colunas A força dos movimentos estudantis e a personalidade da moda Pág. 6 Defensoria Pública é exigida no Paraná O único jornal-laboratório DIÁRIO do Brasil Marcos Monteiro Decisão da união civil entre homossexuais deve sair hoje Apenas o estado do Paraná e de Santa Catarina ainda não possuem defensoria pública no Brasil, o movimento Defensoria Já quer mudar essa situação. Pág 3 A votação do reconhecimento da união estável entre pessoas de mesmo sexo foi adiada para essa quinta-feira pelo presidente do Supremo Cezar Peluso. A expec- tativa é favorável para aprovação da Proposta de Emenda Consti- tucional (PEC). Pág. 8

LONA 622-05.05.2011

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JORNAL LABORATÓRIO DIÁRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE POSITIVO.

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Curitiba, qunta-feira, 5 de maio de 2011

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Curitiba, quinta-feira, 5 de maio de 2011 Ano XII - Número 622

Jornal-Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade Positivolona.up.com.br

A infl uência da moeda americana no cotidiano do brasileiro

Pág. 4 e 5

O dia a dia, as am-bições e as difi cul-dades de dois gays em Curitiba

Pág. 8

Perfi lEspecial ColunasA força dos movimentos estudantis e a personalidade da moda

Pág. 6

Defensoria Pública é exigida

no Paraná

O único jornal-laboratório

DIÁRIOdo Brasil

Marcos Monteiro

Decisão da união civil entre homossexuais deve sair hoje

Apenas o estado do Paraná e de Santa Catarina ainda não possuem defensoria pública no Brasil, o movimento Defensoria Já quer mudar essa situação.

Pág 3

A votação do reconhecimento da união estável entre pessoas de mesmo sexo foi adiada para essa quinta-feira pelo presidente do Supremo Cezar Peluso. A expec-tativa é favorável para aprovação da Proposta de Emenda Consti-tucional (PEC).

Pág. 8

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Curitiba, quinta-feira, 5 de maio de 2011 2

Expediente

EditorialAs notícias referentes a morte

de Osama bin Laden, líder da al-Qaeda e principal mentor do atentado do 11 de Setem-bro, pode servir de barômetro acerca dos dilemas envolvendo as coberturas para jornalismo impresso e para jornalismo de televisão, rádio e internet.

É salutar entender que o impresso não é capaz de acom-panhar o ritmo e a dinâmica de mídias especializadas em instantaneidade. Entretanto, o caso Osama é importante para entender a importância do jor-nalismo impresso no contexto contemporâneo.

Enquanto, a rádio, a inter-net e a televisão navegavam num mar de contradições e especulações no domingo a noite, as gráficas dos grandes jornais brasileiros tiveram que atrasar suas máquinas para imprimir a notícia mais ime-diata e essencial.

Diferente de algumas mídi-as, o impresso periga sempre entre a atualidade e o obsole-to, já que a sua notícia já pode madrugar antiga. Então, por que ler impressos? A resposta é, ao mesmo tempo, simples e

profunda. O jornalista de im-presso tem um compromisso específico com a informação, o que está grafado nas pági-nas de seu périódico têm que oferecer comprovação do que houve, ele não pode cair na vala comum do boato e da es-peculação. Um site pode retifi-car sua informação, apagar seu post, uma rádio pode reconstruir seu texto, a televisão pode sim-plesmente adequar suas passa-gens. O impresso não.

Nessa edição, estamos modestamente acompanhando os desdobramentos da votação sobre o casamento gay, assunto envolvido em aura de polêmica e defesa de direitos humanos. A responsabilidade de escrever factual sobre um tema dessa grandeza é imensurável.

Esperamos conseguir ofe-recer informação de credi-bilidade, com aferição detal-hada e analítica, pois sabemos que o papel não pode receber qualquer coisa. O que está inscrito permanece - e a per-manência é uma grande justi-ficativa para a existência dos impressos.

Boa leitura a todos.

. O projeto de lei para o novo Código Florestal, do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), es-tará em votação na Câmara dos Deputados nos próximos dias. Um dos pontos mais discrepantes em pauta na discussão é a isenção de Reserva Legal obrigatória a pequenos agricultores com área de até quatro módulos fiscais (en-tre 20 a 400 hectares, dependendo da região). Eles não precisarão reflorestar a área desmatada que possuem em sua propriedade, se não tiverem empregados e se sua fonte de renda for restrita ao próprio estabelecimento.

A falta da mata nativa preju-dica drasticamente o solo, re-duzindo sua fertilidade, além de diminuir a qualidade da água e do ar, que vão gradualmente sendo poluídos pelas atividades humanas. A devastação das ma-tas é capaz de alterar até mesmo as condições climáticas de algu-mas regiões. Para se ter uma ideia da gravidade do desmatamento, a Mata Atlântica, que cobria todo o litoral brasileiro, hoje está redu-zida a apenas cerca de 4% de sua área original. O estado do Mato Grosso tem quase 40% de sua vegetação natural devastada.

Há outros pontos problemáti-

cos no projeto de lei: as Áreas de Preservação Permanentes (APPs) ao longo dos rios sofre-riam uma redução de 30 para 15 metros de largura, caso o espaço já esteja ocupado por lavouras ou construções; haverá liberação de ocupação nas encostas e morros, e - uma das mais indignantes pro-posta do novo Código - serão sus-pensas as multas aplicadas para aqueles que devastaram regiões de preservação até julho de 2008.

A população está se manifes-tando não somente em Curitiba, mas em outras capitais e cidades. Na capital paranaense os mani-festantes colheram há poucos dias, mais de 44 mil assinaturas contra o novo Código, que serão entregues no Congresso Nacional pelos deputados Dr. Rosinha (PT) e Rosane Ferreira (PV).

A boa expressão da opinião pública nesses manifestos gera uma pergunta fundamental: de quem é a mata natural do Brasil? A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, e os demais biomas que existem num país com mais de 8 milhões e 500 mil quilômetros quadrados de área são da popu-lação. Todo o desmatamento e os danos diretos à natureza surtem efeito nas pessoas, que são afe-

tadas pela alteração do clima, deslizamento de encostas e redução na qualidade do ar.

A natureza nacional é nossa. Não somente daqueles que gov-ernam o país, tomando decisões que beneficiam a parcela minori-tária de grandes proprietários de terra - que ficarão isentos de suas multas estrondosas pelos crimes que cometeram -, e prejudicam uma boa maioria. Mesmo assim, não houve nenhuma consulta popular a respeito dessas mudan-ças no Código Florestal.

A Floresta Amazônica brasileira representa 40% das reservas florestais úmidas ainda existentes no planeta e uma redução na necessidade de preservação apenas ampliaria a velocidade da devastação.

É necessário um contraponto na necessidade que o cresci-mento econômico teoricamente exige de destruição da natureza, num país emergente como o Brasil. Existem possibilidades de adaptação e compensação. O reflorestamento e o cuidado com a vegetação e a água que dão vida aos cultivos da área ru-ral são atitudes que, no mínimo, o homem deve como agradeci-mento à natureza.

Natureza em xeque Dafne Hruschka

Reitor José Pio Martins

Vice-Reitor e Pró-Reitor de Administração Arno Gnoatto

Pró-Reitor de Graduação Renato Casagrande

Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Bruno Fernandes

Coordenação dos Cursos de Comunicação SocialAndré Tezza Consentino

Coordenadora do Curso de Jornalismo Maria Zaclis Veiga Ferreira

Professores-orientadores Elza Aparecida de Oliveira Filha e Marcelo Lima

Editores-chefes Daniel Zanella, Laura Bordin, Priscila Schip

O LONA é o jornal-laboratório do Curso de Jornalismo da Universi-dade Positivo. Rua Pedro Viriato Parigot de Souza, 5.300 -

Conectora 5. Campo Comprido. Curitiba -PR CEP 81280-30

Fone: (41) 3317-3044.

Imediatamente no dia seguinte à visita de parlamen-tares paraguaios, a Comissão de Relações Exteriores do Senado aprovou o projeto de decreto legislativo (PDS 115/11) que triplica o valor repassado ao Paraguai pela energia exceden-te da hidrelétrica de Itaipu. O texto foi aprovado com regime de urgência e deve passar pelo plenário do Senado nesta se-mana com o mesmo ritmo, um tanto quanto apressado.

Ao que tudo indica será aprovado novamente. Além de não encontrar muita resistên-cia na Casa, o presidente da comissão, senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL), dis-ponibilizou o texto por apenas meia hora, o que não permite a ninguém um voto mais refletido. Se for aprovado em plenário, o texto passa a vigorar sem passar por outras comissões, tampouco necessita de sansão presidencial.

As opiniões daqueles que detêm o poder concedido

O que há por trás de um aumento?Flavio Seig

pelo povo nas mãos foram fa-voráveis, começando pelo presi-dente do Senado paraguaio, Oscar Gonzáles Daher. Ele afir-mou, em sua passagem pelo Brasil, que tal ampliação de re-cursos vai contribuir para todo o Mercosul e não apenas para o desenvolvimento de seu país – como é de se esperar.

A senadora que representa nosso estado, Gleisi Hoffmann (PT-PR), também relatora do projeto e ex-diretora da Itaipu, considera que a aprovação do decreto faz parte de um “jogo de ganha-ganha” e que nosso país não deve esquecer que pos-suímos 300 mil brasileiros vi-vendo em território paraguaio. Ela ainda sustenta que a medida vai beneficiar a população que vive na fronteira. A senadora declarou para a agência de notí-cias do Senado que “os recursos do aumento poderão ser rever-tidos em obras no Paraguai que beneficiariam inclusive brasileiros que residem em ter-

ritório paraguaio”.O paradoxo maior apresen-

tado por Gleisi Hoffmann foi afirmar que o valor dos paga-mentos feitos pelo Brasil ao país vizinho não será arcado pelo consumidor brasileiro. Mesmo que não haja repasse imediato para as contas de energia elé-trica que chegam a nossas casas, o tesouro nacional é alimentado com as riquezas produzidas por todos os cidadãos – e con-sumidores – brasileiros. Por isso mesmo, a aprovação de um de-creto legislativo que aumenta consideravelmente as quantias retiradas dos nossos cofres e repassadas aos nossos vizinhos careceu de maior reflexão, inclu-sive da iniciativa popular. Vale indagar qual a verdadeira in-tenção por trás deste aumento, visto que ele não nos dá garan-tia alguma de em 2023, quando expirar o primeiro acordo sela-do entre países, continuaremos usufruindo do excedente pro-duzido pela hidrelétrica.

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Curitiba, qunta-feira, 5 de maio de 2011

Mobilização exige criação de Defensoria Pública no Paraná

O movimento “Defen-soria já!” realizou, na tarde de ontem, uma mobilização em frente ao prédio histórico da Universidade Federal do Paraná, na Praça Santos An-drade, exigindo a criação de uma defensoria pública no Paraná. Os manifestantes percorreram outros noves lo-cais públicos, como a Praça Tiradentes e a Boca Maldita.

A estudante de direito Ana Raggio, integrante do Institu-to de Defesa dos Direitos Hu-manos (IDDEHA), disse que a manifestação é importante para mostrar a importância da defensoria para a popula-ção, que, com isso, exigirá ela seja criada no Paraná. Ana co-mentou que o maior problema do movimento é o desconhe-cimento da população quan-to ao direito à defensoria.

A defensoria pública é um órgão mantido pelo governo para defender os direitos da população que não tem acesso a advogados. A Constituição de 1998 prevê a criação de de-

Instituição tem a função de garantir o acesso à justiça para cidadãos que não têm condições de pagar advogado

Camila Tuleski TebetRodolfo May

A Constituição de 1988 é clara: “Todo cidadão brasileiro temo direito de um advogado de gratuitamente.” E no Brasil todas as unidades da federação têmDefensoria Pública, menos os estados de Paraná e Santa Catarina.

Desta forma apenas a elite brasileira goza dos ser-viçosjurídicos e direitos constitucionais. O próprio Estado está nos privando deexercer direitos fun-damentais, como reivindicar moradia, defesa em tribunal,direito a terra e tantos outros que são fundamen-tais para o bem-estar eliberdade de qualquer brasileiro.

Ter Defensoria Pública significa política pública para umapopulação economicamente carente ter aces-so á justiça, direitos sociais,atendimento a multiplici-dade de interesses e tudo que fere a dignidade humana.

Justiça ao alcance de todosVinicius Ferreira

ANÁLISE

fensorias em todos os estados brasileiros, mas a medida ain-da não foi cumprida no Paraná.

O artigo 5º da Constituição Federal garante a todo cidadão – brasileiro ou estrangeiro – o direito fundamental de acesso à justiça, ainda que não tenha condições financeiras de pagar um advogado particular.

Para assegurar esse di-reito foi criada – através do artigo 134 – a Defenso-ria Pública que garante aos brasileiros condições de se defender em processos, bus-car auxílio em relação a uma nova lei ou qualquer dificul-dade perante o judiciário.

Para a professora de di-reito Priscilla Placha Sá, o ob-jetivo da defensoria é, além de esclarecer juridicamente a população, “prestar assesso-ria que possa viabilizar uma conciliação, uma mediação ou, caso não seja possível,

ingressar com as medidas judiciais ou contestá-las”.

Priscilla faz parte do movi-mento Pró-Defensoria, que reúne grandes nomes do di-reito estadual e organiza mobi-lizações para esclarecer à pop-ulação as vantagens do órgão.

Para quem integra o movi-mento, a criação da instituição depende da vontade política. “Considerando que a iniciativa da proposição legislativa é a do governador do estado, a única resposta que encontramos é de que não houve vontade política nesses anos”, afirma.

O projeto de criação da in-stituição foi sugerido apenas na gestão do ex-governador Orlando Pessuti, ou seja, 23 anos após a Constituição.

O projeto foi reescrito pelo governador Beto Richa,

que solicitou que fosse dada urgência ou prioridade à vota-ção na Assembleia Legislativa. Ou seja, a votação deve trami-tar em 45 dias, passando pelas comissões e votações plenárias.

Como os artigos 5º e 134 da Constituição garantem ao cidadão a defesa jurídica e as-sistência da Defensoria Públi-ca, não cumpri-los seria ir con-tra o maior documento jurídico nacional. “No nosso enten-dimento, o estado do Paraná é descumpridor da Consti-tuição”, conclui Priscilla.

Ainda segundo Priscilla, depois de sancionado o pro-jeto, o concurso público para a seleção de defensores e do grupo de apoio (que en-globa, por exemplo, psicólo-gos e assistentes sociais) de-verá ser feito em até 90 dias.

Movimento Defensoria Já conscientiza a população sobre a necessidade de uma Defensoria Pública no estado

Marcos Monteiro

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Curitiba, quinta-feira, 5 de maio de 2011

Thomas Mayer Rieger

Figura carimbada dos veícu-los noticiosos, o dólar esta-dunidense (USD ou US$) tem importância vital na economia brasileira. Escutam-se termos como “cotação”, “aumento do dólar”, “queda do dólar”, “balança comercial” e outros que fazem parte do grande glossário do “economês”, a misteriosa e in-compreensível língua falada por quem é ligado aos estudos das ciências econômicas. Mesmo tendo grande im-portância, é comum encontrar pessoas que entendem pouco ou nada a respeito do dólar e os seus verdadeiros impactos na economia do Brasil. Apesar de trabalhosa, a compreensão do sistema econômico que envolve o dólar não é nenhum bicho de sete cabeças. Compreendê-lo é, na verdade, extremamente posi-tivo.

Balança Comercial

A moeda dos Estados Uni-dos não está só presente quando se vai ao exterior. Ela integra a chamada “Balança Comercial”, que pode ser verificada por uma conta simples: o valor das im-portações, ou seja, tudo o que foi comprado do exterior, sub-traído do valor das exportações. Se o valor da balança comercial for positivo (vendeu-se mais do que se comprou), ela é chamada de superavitária. Se o valor for negativo (comprou-se mais do que se vendeu), a balança passa a ser chamada de deficitária. A participação do dólar é fundamental: as operações de comércio com o exterior são normalmente negociadas nessa moeda. Sendo assim, quanto menor o valor do dólar em rela-ção ao real, maior compensação em se importar. Quando o opos-to acontece, é mais vantajoso

aumentar o volume de exporta-ções para maximizar o lucro.

Alta e baixa

Todos os países estão sujei-tos à influência da chamada taxa de câmbio, que nada mais é que o preço que uma moeda estrangeira custa em moeda na-cional. Por exemplo: se a taxa de câmbio do dólar estiver a 1,65, quer dizer que um dólar custa R$ 1,65.

Existem dois modelos de taxa de câmbio: a fixa e a flutuante. É uma ideia simples: o “câmbio fixo” estipula um valor determinado para a taxa de câmbio. O sistema de câm-bio fixo brasileiro anterior a 1999 determinava, por exem-plo, que US$ 1 era equivalente a R$ 1, valor que não poderia ser alterado por certo período tempo. No Brasil tem-se hoje um sistema de “câmbio flutuante”, que varia de acordo com oferta e a demanda de moeda. O dó-lar vai subir se houver muita demanda por ele, ou seja, muita saída de dólar do país. Em con-trapartida, o dólar vai cair se ex-istir muita oferta, ou seja, muita entrada da moeda no país. Aí fica o questionamento: qual valor de dólar é mais vantajoso, o alto ou o baixo? A economista Patrícia Tendolini explica que essa é uma questão relativa: “Deve-se perguntar a quem se destina esse dólar. Um dólar alto beneficia os exportadores, que vão receber uma moeda com valor alto em troca de suas vendas. Já um dólar baixo ben-eficia os importadores, que têm que pagar em dólar”.

Dólar no dia a dia

A variação do preço do dó-lar pode ser sentida também no bolso dos consumidores em

atos corriqueiros como uma simples ida ao supermercado ou à padaria. Isso se evidencia no preço de um dos alimen-tos mais comuns da mesa do brasileiro: o pãozinho. Apesar de majoritariamente agrícola, o Brasil importa uma grande quantidade de trigo, que é o in-grediente básico do pão. “Todos os produtos que dependam de algum tipo de insumo (bem ou serviço utilizado na produção de outro bem ou serviço) im-portado terão seu preço variado em decorrência da variação do dólar”, explica Patrícia. A lógica se reproduz em vários outros setores de produtos im-portados ou cujos componentes sejam produzidos no exterior. Apesar dos impostos, produtos como os equipamentos de infor-mática, automóveis, vestuário e setores como o turismo têm seu preço variado de acordo com a moeda norte-americana. Se-gundo Patrícia, o consumidor brasileiro, independentemente da classe social, prefere um dó-lar baixo, já que isso possibilita a compra de produtos importa-dos, que ficam com um preço mais acessível. O que muda entre as classes é a percepção da variabilidade do preço do dólar: “O que uma família de classes C e D faz com a renda? De modo geral, ela paga o aluguel, compra peças de vestuário e paga a comida. O que é importado? Pouca coisa, como o trigo”, afirma a econo-mista. A situação muda no caso das classes A e B, que têm um padrão de consumo diferencia-do. Além do básico, essas famí-lias têm a tendência de consum-ir produtos importados com um custo elevado, como computa-dores, televisores e gadgets ele-trônicos. “Por exemplo: a minha diarista não sabe se o dólar está subindo ou descendo. Não é por ignorância, mas porque ela

sofre menos impacto. Se con-siderarmos uma família de classes A e B, há maior percep-ção da variabilidade, já que os produtos consumidos por ela sofrem mais diretamente com a variação do dólar”, comenta.

Como economizar

Com o aumento do dólar, o consumidor logicamente foge de produtos importados, já que seus preços estarão mais caros do que o normal. O comporta-mento comum é o de comprar produtos da indústria nacio-nal, cujos preços naturalmente estarão mais interessantes. Ex-istem, entretanto, exceções à regra. “Houve um momento em que a Europa enfrentou problemas com a carne. Eles começaram, então, a importar muita carne do Brasil. O vol-ume de carne exportada era tão grande que o preço aqui no país subiu”, conta Patrícia. Quando o dólar estiver muito alto, é pos-sível que o nível de exportações de produtos, normalmente ag-ropecuários, supere expectati-vas e não mais consiga suprir a demanda nacional. Com a escassez da oferta, os preços acabam subindo.

Jogo de Equilíbrio

A indústria brasileira de-pende muito do valor da moe-da dos Estados Unidos para fechar suas próprias balanças. A matemática é muito simples e compreensível: se o valor do dólar estiver muito alto, há a tendência de os consumidores prestigiarem o produto na-cional, o que é bom para a in-dústria doméstica. Agora, se o preço do dólar estiver em baixa, os produtos importados estarão mais acessíveis e atrativos, fa-zendo a alegria dos consumi-dores e gerando desespero da

Dólar baixoSe o dólar atinge cotações baixas, o valor do real brasileiro acaba subindo. Nessas situações, os setores importadores se benefi-ciam, assim como o con-sumidor de produtos im-portados. Há destaque para os bens de capital, que são as máquinas necessárias na produção de outros bens. Normalmente comprados do exterior, eles acabam se tornando mais baratos.

O Valor do DólarA influência do valor da moeda americana no cotidiano do brasileiro

indústria nacional. Todas as economias do globo

funcionam como um jogo de equilíbrio, como contrapesos e balanças: uma alteração em qualquer um dos seus setores acaba afetando a economia como um todo. Uma maior taxa de in-flação, por exemplo, afeta tanto o consumidor doméstico quanto o importador de mercadorias brasileiras, para bem ou para mal. Em outras palavras, não há quem saia ganhando em todos os momen-tos. As flutuações e variações são constantes e imprevisíveis. O impor-tante, na economia, é saber jogar.

Quando o valor do dólar está em alta, quem nor-malmente comemora são os setores que exportam produtos para o exterior. No Brasil, a pauta de ex-portação é focada em bens agrícolas, como o café e a soja. Portanto, quem ex-porta produtos dessa área para o exterior acaba se dando melhor em perío-dos como esse.

Dólar alto

A meta da inflação estabelecida para 2011 é de 6,5%. Em 2010, a inflação oficial fechou

com alta de 5,91%, maior nível desde 2004, quando o índice fechou em 7,6%. Entretan-to, o governo estuda rever suas metas para

esse ano.

Ao lado dos alimentos, o preço do álcool e da gasolina são os grande vilões nos índices atuais de inflação. A gasolina fechou o mês

de abril com alta de 4%.

Inflação Combustíveis

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ECONOMIA 4

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Ao chegar de alguma viagem ao exterior, é co-mum as pessoas carregarem aquele restinho de moeda estrangeira na carteira. Ape-sar de essa ser uma prática corriqueira, o especialista em comércio exterior Mar-celo Grendel explica que ela não está totalmente de acordo com as leis brasilei-ras: “A legislação diz que o cidadão brasileiro não pode portar moeda estrangeira enquanto ele estiver no país. Se o cidadão retornar de via-gem e sobrar moeda em seu poder, ele obrigatoriamente tem que entregar essa moe-da aos cofres do Banco Cen-tral, através da conversão para reais”. De acordo com a legis-lação, quem portar um valor superior a dez mil reais ou o equivalente em moeda estrangeira deve declarar o montante à autoridade adua-neira. Essa quantia não pre-cisa ser exclusivamente em dinheiro. Cheques e travel-

ler’s check (cheques corre-spondentes a uma determi-nada quantia de dinheiro que devem ser trocados pela moeda local na hora da via-gem) também estão inclusos nessa regra. Esse tipo de operação não é feito em qualquer lugar, apenas em locais es-pecíficos: “Todos os bancos fazem operações de câm-bio, mas não toda agência bancária, apenas as especializa-das. Existem também as chama-das ‘casas de câmbio’, o lugar onde a própria pessoa faz a troca efetiva de cédulas de moeda nacional por moeda estrangeira ou vice-versa”, explica Grendel.

Diferenças

Existem diferenças em trocar moedas em agências bancárias e em casas de câm-bio. A questão é: onde essa conversão é mais vantajosa? A resposta não é definitiva. Ela depende das intenções

de cada consumidor. Em termos de preço, as agên-cias bancárias especializadas saem na frente. De acordo com Grendel, elas utilizam uma menor taxa de câmbio, o que se torna mais vanta-joso para o consumidor. “O banco normalmente não tem uma reserva muito grande de papel moeda estrangeiro, principalmente pelo risco que ele corre com a variação cambial”, explica Grendel. O banco acaba praticando uma “troca virtual”: papel moeda, o dinheiro físico, em troca de dinheiro virtual, o dinheiro em conta, com o valor corrigido. As casas de câmbio, em contrapartida, utilizam uma taxa de câmbio mais el-evada, mas têm mais moeda estrangeira em reserva. Em outras palavras: apesar de pagar mais caro, é mais ga-rantido que se consiga trocar papel moeda estrangeiro por papel moeda nacional, o que configura uma “troca real”.

A legislação diz que o cidadão

brasileiro não pode portar moeda

estrangeira enquan-to ele estiver no país.

Marcelo Grendel, especialista em comércio

exterior

Conversão de MoedasA infl uência do valor da moeda americana no cotidiano do brasileiro

Lucro e Prejuízo

É possível obter lucro com a conversão de moeda es-trangeira para a nacional. O estudante Guilherme Lud-wig (19) conta que, antes de ir aos Estados Unidos, com-prou seiscentos dólares a um preço de um real e noventa centavos “Voltei ao Brasil com cem dólares no bolso, e a cotação havia subido a R$ 2,20. Deu para garantir algum lucro, mesmo que pequeno”, explica. O oposto também acon-tece: o estudante Gustavo Vieira (20), participou de um cruzeiro e teve que com-prar dólares. “Na época, a cotação do dólar estava a R$ 1,75 e tive que comprar US$ 400. Ao voltar de viagem,

nal, qual a hora certa para se realizar conversões de moedas? Logicamente se pensa em guardar a moeda estrangeira até que sua cota-ção atinja um valor interes-sante para a troca. Como já explicado por Grendel, isso é ilegal: “Isso seria passível de sanção ju-rídica porque seria consid-erado um investimento em moeda estrangeira no país. A pessoa acaba correndo o risco de ter a quantia con-fiscada, de ter de pagar uma multa ou, dependendo da monta, ter que explicar a origem do dinheiro. Existem muitos casos nos quais a in-vestigação acaba também terminando na prisão da pessoa. É um risco sério que se corre”, avisa. Não há como saber exata-mente quando e em quanto as cotações irão variar, mas estimativas são sempre pos-síveis. Uma dica é prestar atenção nas variações de anos anteriores, já que elas têm a tendência de se repe-tir. “Planejamento” é a pala-vra de ordem.

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sobraram cinquenta e sete dólares”, conta. Naquele momento o preço dólar es-tava na faixa de R$1,65. Ao trocar esses dólares por reais, ele acabou perdendo dinheiro. O raciocínio é o seguinte: ao se comprar moeda es-trangeira por um valor baixo e revendê-la por um valor alto, obtém-se lucro com a conversão. Em con-trapartida, ao se comprar moeda estrangeira por um valor alto e revendê-la num período em que sua cotação estiver baixa, acaba-se tendo prejuízo com a conversão. Portanto, portar moeda es-trangeira é sempre um risco, tanto para o consumidor quanto para casas de câm-bio e agências bancárias es-pecializadas, que também estão sujeitas a essas flutua-ções de mercado.

Hora de trocar Fica uma questão difícil de ser respondida: mas afi-

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O Curso de Direito da UP promove nesta quinta-feira conferência aberta a toda comuni-

dade acadêmica. O palestrante é o Secretário Nacional de Justiça, o Prof. Dr. Paulo Abrão

Pires Junior

O tema da palestra é “A eficácia da lei de anistia no Brasil e as graves violações

aos direitos humanos durante o regime de exceção”.

A palestra começa às 19 horas,no auditório bege.

Direito Anistia

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Curitiba, quinta-feira, 5 de maio de 2011

O hair stylist Marcos Pro-ença afirma que só existem dois tipos de garotas: as que são it e as que não são. Mas o que se-ria exatamente uma it girl? Al-guns entendidos do assunto afirmam que ser uma it girl vai mais além do que estar sempre na moda, usando tudo o que há de mais caro no mercado.

As it girls são meninas-referência no mundo da moda, sim, mas quem acha que é somente este quesi-to que é levado em conta se engana completamente.

Fernanda Pereira, diretora do núcleo de pesquisas da Delta Sys, afirma que essas meninas precisam de muito mais do que roupas bonitas para serem con-sideradas as “influenciadoras da moda”. Fatores como comporta-mento também são levados em conta, pois as it girls possuem um grande círculo de amigos, são independentes, já moraram fora, viajam com frequência e circulam em diferentes lugares.

Além dessas características, Fernanda acrescenta que essas meninas geralmente namoram ou são casadas e a relação com os cabides vem, geralmente, da her-ança materna. Gostam de ativi-dades que exercitem a criativi-dade e que estão ligadas à arte.

O termo foi utilizado pela primeira vez pelo romancista

Tribos Urbanas

Elynor Glim para descrever a atriz Clara Bow, quando esta surgiu em 1927 no filme - mudo “It”. O termo sur-giu justamente porque ela vivia uma personagem sensual e poderosa, que na época passou a caracterizar esse novo rótulo que hoje é utilizado para nomear as ditadoras de tendência atual.

Uma das mulheres que tem seu nome ligado ao termo it girl é a modelo Kate Moss. Aos 37 anos, ela segue como uma das principais opções do mer-cado publicitário pelo poder de influência que conseguiu ao longo de sua carreira.

Outro nome que compõe a lista de it girls pelo mundo é Alexa Chung, que com 26 anos possui um estilo que, como ela mesma descreve, é baseado em ícones de beleza masculinos, ou seja, tudo o que não exige muito esforço.

O surpreende é que, mes-mo sendo ícones, não são consumidoras descontro-ladas, como alguns acham. Quem gosta de moda con-some de maneira proveitosa e consciente, porque considera o momento da compra uma decisão importante, pensada. Então se no início você acha-va supercomplicado fazer parte desse mundo, perce-beu que o importante aqui não é vestir a capa da Vogue todo mês, mas sim adaptar as tendências ao seu estilo e ao modo como você vive.

A moda não pode ser algo for-çado, pois se não se torna vulgar. E não adianta ter o armário, closet ou o que for abarrotado de roupas se não houver a palavra bom-senso no vocabulário. A palavra-chave aqui é personalidade e nada mais. Então se um dia você son-hou em se tornar uma it girl siga o conselho fiel da jornalista Ales-sandra Garattoni: “Tenha inspira-ções. Não seja a cópia de alguém”.

Suelen Lorianny@sulorianny

Cursa o 5º período da noite e publica seus textos no endereço http://www.revolucaonopalco.wordpress.com

Camila Rehbein

Os jovens sempre cum-priram um papel importante na história da sociedade. Poderia citar momentos em diversas décadas nas quais estudantes marcaram pre-sença. O fator histórico que sempre se retoma ao falar de movimento estudantil vale muito para a formação atual de um estudante militante. Caras pintadas, Maio de 68, Revolução Constitucionalista, criação da UNE, Diretas já!, Impeachment do presidente Collor. Em todos esses mo-mentos os estudantes estavam lá. Mas a atividade não pode ficar por aí e essa nostalgia eu deixo para outra hora.

Se você for procurar pelo significado de movimento es-tudantil, irá encontrar algumas descrições como “movimento policlassista” ou “os sujeitos são os estudantes” e até mes-mo “é um movimento social da área de educação”. Palavras bonitas, mas até aonde todos esses termos realmente sig-nificam a verdadeira essência?

O corpo discente se renova periodicamente nas institu-ições de ensino, consequent-emente, os estudantes que participam de movimento também deveriam se renovar.

O movimento estudan-

til tem como objetivo lu-tar pelas causas estudantis e sociais. Fazer a diferença dentro da universidade e ao seu redor também. Não co-locar as forças na individu-alidade e sim no coletivo. É, na teoria parece muito lindo. Simples. Infelizmente, em pleno século XXI, somos jo-vens de uma sociedade que nos ensina a sermos individ-uais e lutarmos por nós mes-mos, somos filhos da geração coca-cola, somos fãs do sofá.

Exageros a parte e con-tradição a favor, em um mo-mento a individualidade fala mais alto quando cada um de-cide por si se continua parado ou se vai dar a cara à tapa. Mas só nesse momento, pode ser?

O movimento está aqui para mudar o hoje e o amanhã. Em muitos anos os estudantes mudaram rumos de uma so-ciedade. É fato, o que fazemos agora irá repercutir alguns anos e quem sabe, traçar um novo caminho de um país. A atividade preferida dos mili-tantes estudantis está em sair às ruas e buscar por mudança através das suas indignações. Às vezes nos esquecemos do poder que temos como es-tudantes, esse poder não fi-cou lá atrás, ele ainda existe.

Não acabou no passado

Movimento Estudantil

divulgação

@camilarehbein

Cursa o 3º período da manhã e publica seus textos no endereço http://monapety.tumblr.com/

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Curitiba, qunta-feira, 5 de maio de 2011

Sou gay, e agora?PERFIL

Evelyn Bueno

Os meninos da vizinhança achavam Guilherme estranho, ele não gostava de brincar de lutinha. Murilo, que morava do outro lado do bairro, gos-tava de se vestir de menina. Havia uma irmã mais nova e uma mais velha, havia um pai meio bravo e uma mãe com-preensiva. E havia um mun-do, gigante e preconceituoso.

Mas isso foi há muito tem-po, hoje até quem não sabe quem Murilo e Guilherme são percebe que um conjunto de mudanças transformaram uma confusão de identidade em duas pessoas felizes consigo.

Quando os conheci ambos estavam “trancados” em um armário. Murilo tinha a chave, mas faltava a coragem para abrir. Guilherme não sabia nem que o armário tinha uma fechadura e por muitas vezes eu quis falar que ele poderia sair de lá de dentro se quisesse.

No mundo de criança, o pequeno Gui achava tudo normal, não tinha como per-ceber a gravidade do que en-frentaria com o tempo. Muh sempre soube que no fundo era diferente e que mais tarde

também iriam acontecer cer-tas coisas. Olhar nos olhos do pai era tarefa difícil, mas certo dia eu percebi que ambos os armários estavam abando-nados e com as portas abertas.

“Filho, sua opção sexual só diz respeito a você”, foi o que Muh ouviu do pai em um abraço que curou muitas das suas noites mal dormi-das. “Pai, gosto de meninos”, como falar? Consequências boas ou ruins podem vir de um momento confessionário como esse. Guilherme contou para a mãe em tom de “che-gou a hora” e ouviu um “eu já sabia”. “Na verdade eu acho que todos os pais já sabem, apenas escondem isso com medo ou até mesmo vergonha do que tem em casa”. Hoje Gui sabe que essa questão complexa se resolve na boa e velha conversa olho no olho.

Murilo tinha 14 anos e namorava uma menina. Quan-do conheceu o irmão dela per-cebeu que algo diferente acon-teceu e passou a lutar contra o que sentia. Acabou descobrin-do que ser “diferente” no seu caso, era ser gay. Terminou o namoro com a garota e ficou oito meses com o ex-cunhado.

Gui e Muh estuda-vam juntos no ensino médio. Gui, às vezes, se distraia e cruzava as pernas; os co-legas o olha-vam de canto. Murilo, ex-tremamente curioso, não passava um dia sequer sem me falar que aquele tal de Gui era gay, “um gay muito gay”. Ele se aproxi-mou, tentou uma amizade, mas Guilherme c o n t i n u o u impassível .

Sabia que o interesse era sa-ber se ele era ou não era.

Na lista de desafios diários dos dois o número um era ser aceito por todos que os rodeavam, ou seja, o colégio era diariamente uma jaula de leões famintos que- ren-do um pedaço deles. Colégio católico, regras de comporta-mento e dois peixes fora do aquário. Era como se existis-sem duas pessoas num corpo só. Uma era a que estava por dentro, querendo sair, que deveria sair. A outra era a forma, o que os olhos alheios viam e que não aceitavam.

“Eu quero pintar as unhas! Eu vou pintar as unhas, pô! Eu gosto”. E pintou. O pai de Guilherme mal conseguia almoçar. Olho na comida, olho nas unhas do filho. Ora comida, ora unhas. Primeira aula, oito da manhã, 20º C em Curitiba e Murilo de moletom e capuz. A professora diz uma, duas, três vezes, “tire o capuz”, e ele diz quatro vezes, “não”. O que tinha acontecido era que o ca-belo tinha ficado meio blond, sabe como? Uma tinta mal passada deixou o cabelo de Murilo digamos, cor de burro quando foge. Eram hábitos femininos saindo pelos poros.

Foi a convivência e a iden-tificação tímida que os fizeram perceber que talvez houvesse uma resposta de um para uma pergunta de outro. Amigos enfim. E numa balada matinê para adolescentes, os dois, na mais perfeita forma e alegria, souberam que podiam confiar seus segredos um ao outro. Afinal, naquele lugar, beijar meninos era quase uma lei. Era bom, eram bonitos e a en-trada era barata. Cinco man-gos e um carimbo no pulso escrito Manhattam. Perderam as contas de quantas vezes foram nesse esse lugar. A tal balada matinê em que en-travam menores de idade deu conhecimento sobre esse mundo gay aos dois, que mais tarde passaram a frequen-tar lugares de gays adultos.

No centro de Curitiba funciona o Cat’s night club,

descrito pe-los dois como o lugar onde gays, lésbicas e travestis são iguais, onde o preconceito fica do lado de fora. Há um tipo de grande quarto escuro chama-do dark room, onde as fanta-sias podem ser libertadas sem que ninguém interfira. Foi aí que os dois d e s c o b r i r a m o sexo. Sexo com uma pes-soa do mesmo sexo. O êxtase.

“Ninguém escolhe ser gay ou heterossexual d e p e n d e n d o do seu dia, es-tado de espírito

Gui no Cat’s Night Club

Murilo em dia de Manhattam

Arquivo pessoal

ou humor. Isso é um fato de nascença que nenhum de nós pode mudar”. Mu e Gui aceitaram quem são e abra-çaram a felicidade. “Sou gay querida, algum problema?”, na farmácia, no ônibus, na rua, essa era a resposta para olhares da cabeça aos pés de gente que não fazia a menor idéia do que era “aquilo”.

Guilherme é afeminado. Não tem barba porque a na-tureza foi gentil em não pôr barba nesse caso especial. Rosto, jeito e voz de menina, quase uma menina. Murilo, visto de longe, até consegue se camuflar no meio de heteros-sexuais, mas se abre a boca para falar uma palavra, se en-trega, pois a voz é feminina.

Formando-se em designer de interiores, Gui pegou o di-ploma sem jeito e comemorou ao estilo clássico. Muh na pla-teia orgulhoso do amigo diz: “Quando eu me formar, vou pegar o diploma, passar a mão no microfone de quem for e falar que apesar do pre-conceito, dos olhares tortos nos corredores eu consegui! E eu tô aqui pra falar que eu

sou gay mesmo, mas que nin-guém é melhor que ninguém!” E ele vai falar, não tenho dúvida.

Drogas, sexo, travestis, pro-grama, pílulas de hormônio, es-maltes, ausência de pelos. Tudo isso era tão íntimo da realidade dos dois que parecia que quase nada os assustava. Gui já cansou de correr de skin heads no centro da cidade. Murilo sabe dar umas porradas mas não se mete com homofóbicos. Desde que se acer-taram com a própria identidade, os dois já foram a quatro para-das gays - festa que comemora o orgulho gay, que luta pelos direitos dos homossexuais e que leva para a Avenida Cândido de Abreu milhares de homens e mulheres que fogem dos pa-drões da sociedade. Guilherme dança e flerta com quem passa. Murilo observa e repreende o amigo “Tá louca, viada?”

Alguns gays casam, ado-tam filhos, saem fantasia-dos de casais no carnaval, viajam para a parada gay de São Paulo. No fundo o que todos que-rem é ser feliz. Porque, afinal minha gente, quem não quer amar? Amor é tudo de bom!

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Curitiba, quinta-feira, 5 de maio de 2011

NÃOA união entre duas pes-

soas do mesmo sexo divide opiniões e levanta questio-namentos: a família tradi-cional perderá seu conceito de importância? É o que pronunciam a igreja católica e denominações evangé-licas que se posicionaram contra a aprovação de um projeto de lei, na Argentina. A nova constituição do país determina a igualdade entre casais heterossexuais e ho-mossexuais, ou seja, estipula que casais gays podem ado-tar crianças, obter benefícios previdenciários e heranças.

No Brasil, a discussão sobre a possível aprovação de um projeto de lei gera polêmica e faz refletir so-bre um ponto em especial: a adoção. Isso acarretaria

consequências não tão fa-voráveis, pois possibilitará que crianças cresçam num meio deturpado e não pos-suam o conceito tradicio-nal de família. A união em si não é o problema, pois as pessoas tem o direito de se relacionarem com quem bem entenderem. Mas a pos-sibilidade de adoção acar-retará consequências psi-cológicas para tais crianças. Dilema, como por exemplo, o fato de elas possuírem dois pais ou duas mães, diferentemente de outras crianças do mesmo convívio social, é exemplo do tipo de problema que a adoção por casais gays traria como consequência. Por isso, a aprovação desse projeto não trará mais liberdade para casais homossexuais e sim dilemas sobre o atual con-ceito de “família correta”.

Pamela Castilho

Na Argentina já é reco-nhecida a união estável de pessoas de mesmo sexo. O que faz com que o Brasil não tenha a mesma atitude? A falta de apoio das enti-dades religiosas do país, que não aceitam a homossexu-alidade como uma orienta-ção sexual. Do mesmo jeito que, durante a campanha eleitoral, Dilma Rousseff foi alvejada por querer repen-sar a descriminalização do aborto, as autoridades do poder brasileiro têm medo de uma reação negativa por parte da população. Não há por que pensar assim. Ho-mossexuais devem ter os mesmos direitos e deveres civis que um he-terossexual tem. Sexualidade não define cidadania. Hoje, 78 direitos

garantidos aos casais heter-ossexuais, são negados aos casais homoafetivos. O prin-cipal deles é o não-reco-nhe-cimento da união estável. Não se luta pela liberdade de ter um casamento no re-ligioso, e sim, ter direitos iguais a um casal hétero. Direito à herança, direito à adoção, direito usufruto dos bens do parceiro. Direitos que são assegurados a um casal. Não deveria impor-tar se o casal é formado por homem e mulher ou homem e homem ou mulher e mul-her. O que importa é que eles são um casal, e tem direito a ser um casal, legalmente. Hoje no Brasil, ser um casal homossexual é estar fora da lei. Tudo o que se luta é por direitos iguais. Há de se res-peitar a diversidade. Há de se garantir direitos a todos. Sexualidade é o de menos.

SIMLaura Beal Bordin

Marcos Monteiro

Decisão adiada pelo STF

1. Não têm reconhecida a união estável2. Não podem somar renda para aprovar financiamentos3.Não inscrevem parceiros como dependentes da previ-dência4. Não têm garantia à metade dos bens em caso de separa-ção5. Não podem assumir a guarda do filho do cônjuge6. Não têm licença-luto, para faltar ao trabalho na morte do parceiro7. Não têm direito à herança8. Não têm usufruto dos bens do parceiro9. Não têm direito à visita ín-tima na prisão10. Não podem declarar par-ceiro como dependente do Imposto de Renda (IR)

10 direitos que casais heteros têm e

homossexuais não

Deve sair hoje a decisão do reconhecimento da união es-tável entre pessoas domesmo sexo. O Supremo Tribunal Fed-eral (STF) começou a votar on-tem à tarde, masadiou a decisão.

Até às 19 horas de ontem ap-enas o relator Ayres Britto havia dado o seuvoto, que foi favoráv-el ao reconhecimento. O presi-dente da Corte, Cezar Peluso,já se declarou favorável, mas ainda não deu seu voto oficial, junta-mente com osoutros 10 ministros.

Na sessão de hoje, os minis-tros devem analisar o pedido da ProcuradoriaGeral da República (PGR) para que a união de ca-sais homoafetivos sejareconhe-cida como “entidade familiar”.

Hoje, a Constituição brasileira reconhece como entidade familiar apenas oscasais formados por um homem e uma mulher. A proposta da PGR tramita no STFdesde 2009.

O governo do Rio de Janeiro fez o mesmo pedido em 2008. O gover-nador doestado, Sérgio Cabral, quer incluir os casais gays no regime de previdência e assistência,além de outros benefícios que são confe-ridos aos servidores estaduais que-comprovam uma união estável.

Dados no Censo 2010, divulga-dos nesta semana, revelam que o Brasil tem pelomenos 60 mil casais homossexuais, sendo essa a primei-ra edição do recenseamentoque contabilizou a população que vive com um parceiro do mesmo sexo.

A união é defendida por movi-mentos gays de todo o Brasil. Eles afirmam que,sem a aprovação da união, os homossexuais não têm uma série direitos constitucionais.

Laura Beal Bordin