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Papel das Proteínas da Coagulação Sanguínea na
Agressividade dos Gliomas
Mayara Regina Arruda de Souza
Rio de Janeiro
Junho de 2012
MAYARA REGINA ARRUDA DE SOUZA
Aluna do curso de Farmácia
Matrícula 0823800110
Papel das Proteínas da Coagulação Sanguínea na
Agressividade dos Gliomas
Trabalho de Conclusão de Curso, TCC,
apresentado ao curso de graduação plena
em Farmácia, da UEZO como parte dos
requisitos para a obtenção do grau de
Farmacêutica, sob a orientação do Prof.
Robson de Queiroz Monteiro e co-orientação
da Drª Tatiana Correa Carneiro Lobo.
Rio de Janeiro
Junho de 2012
S729 Souza, Mayara Regina Arruda de.
Papel das Proteínas da Coagulação Sanguínea na
Agressividade dos Gliomas. — 2012. 45 f. ; 30 cm.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em
Farmácia) — Centro Universitário Estadual da Zona
oeste, Rio de Janeiro, 2012
Bibliografia: f. 40-45.
1. Coagulação sanguínea. 2. Fator tecidual.
3. Glioblastoma. 4. Microvesículas. I. Título.
CDD 615.1
ii
Papel das Proteínas da Coagulação Sanguínea na
Agressividade dos Gliomas
Elaborado por Mayara Regina Arruda de Souza
Aluna da Faculdade de Farmácia da Universidade Estadual da Zona Oeste
Este trabalho de Graduação foi analisado e aprovado com
Grau: _________________
Rio de Janeiro, _______ de _______________ de 2012
__________________________________________________
Jamila Alessandra Perini, Doutora em Química Biológica
__________________________________________________
Daniel Escorsim Machado, Doutor em Ciências Morfológicas
__________________________________________________
Robson de Queiroz Monteiro, PhD
Presidente
RIO DE JANEIRO, RJ – BRASIL
JUNHO DE 2012
iii
A Tati,
Por toda a ajuda que me deu desde o início, me ensinando com
muita paciência e carinho. Por todo o apoio nos momentos mais difíceis
e pela orientação espetacular.
iv
Agradecimentos
Antes de tudo, agradeço a Deus por todas as obras realizadas em mim, por
toda graça concedida e por toda força que tem me dado para continuar essa
árdua caminhada.
Aos meus pais que, sem sombra de dúvidas, são os melhores pais do
mundo. Obrigada por todo o amor, apoio, compreensão, orgulho, amizade, torcida
e confiança na minha vitória. Se não fosse por vocês, nada disso estaria
acontecendo. Ao meu irmão, que mesmo com todas as brincadeiras, está sempre
ao meu lado para o que eu precisar. A minha cunhada, pelas palavras de apoio
nos momentos difíceis.
À minha querida avó, Rosa, por toda alegria demonstrada a cada passo
dado, com comemorações calorosas e muito animadas. À ‘Toinha’ pelos “puxões
de orelha” e “ombro amigo” quando necessário e à ‘tia Lizi’ por me apresentar às
análises clínicas, as quais me levaram ao mundo da Farmácia.
A todos os meus amigos, os quais não citarei para não deixar ninguém de
fora, por fazerem parte da minha vida e estarem ao meu lado quando preciso.
Ao meu querido amor, Philippe. Obrigada pelo companheirismo, dedicação,
amizade, por ouvir minhas lamúrias e me dizer palavras confortantes, por
comemorar minhas conquistas como se fossem suas, por aturar meu estresse
diário sem reclamar (muito). Seu apoio é o que me leva a continuar tentando
alcançar meus objetivos sempre.
Às minhas amigas de laboratório e fora dele, Juliana e Nathy, obrigada por
dividir comigo todos os momentos bons e ruins do ‘lab’, pelos passeios no “Nova
América” às sextas-feiras, pelas risadas incontroláveis e tantas alegrias
proporcionadas ao longo de tantos anos de amizade. Nathy, obrigada por me
ajudar a concretizar esse trabalho (que também é seu!), pelos experimentos feitos
v
comigo e sem mim, sem sua ajuda este trabalho ainda estaria pela metade com
toda certeza.
Ao Robson, agradeço por me acolher em seu grupo e por toda orientação,
principalmente nos momentos em que mais precisei. Os anos em que trabalhei
em seu laboratório foram alguns dos melhores da minha vida. Obrigada a todas
as meninas do ‘lab’, por sempre me ajudarem no que precisei, em especial a
Luize, Luciana e Flávia, vocês são demais!
E, é claro, um abraço à PRIMEIRA TURMA DE FARMÁCIA da UEZO,
minha turma nem sempre querida, mas sempre lembrada. Um obrigada especial
para meus amigos da turma Juliana, Bárbara, Tarcila, Bruno, Débora, Samira,
Rosilaine e, um beijo mais do que especial para Aline e Roberta, meninas
obrigada por tornarem esses quatro anos bem mais agradáveis e divertidos, por
estarem ao meu lado quando sorri, quando chorei, quando me estressei (às vezes
com vocês mesmas), por me ajudarem nos trabalhos acadêmicos e na vida, por
comemorarem junto comigo as minhas vitórias. Eu adoro vocês demais e espero
que nossa amizade vá além da universidade.
Ao projeto do Prof. Leopoldo de Meis, Jovens Talentosos, o qual me inseriu
na carreira científica e me apoiou financeiramente para eu chegar onde estou.
Finalmente, gostaria de agradecer à CNPq pelo importante suporte financeiro.
vi
“O sucesso é ir de fracasso em fracasso sem perder entusiasmo.”
Winston Churchill (1874-1965)
vii
Resumo
Os níveis de expressão de Fator Tecidual (TF), proteína que inicia a
coagulação sanguínea, estão fortemente correlacionados com o grau histológico
de malignidade dos gliomas. De fato, a presença de trombos vaso-oclusivos é
maior em tumores de grau IV (glioblastoma), sugerindo que as propriedades pró-
coagulantes do tumor contribuem para o seu comportamento agressivo e para o
estabelecimento de hipóxia e necrose tumorais. Nesse trabalho, as linhagens P7
e ST1 de glioma de rato, com diferentes níveis de agressividade, foram
analisadas comparativamente, com o objetivo de identificar diferenças nos
mecanismos pró-coagulantes das mesmas. Um ensaio enzimático específico
(ativação do Fator X na presença de Fator VIIa e de células P7 ou ST1) e PCR
em tempo real demonstraram a expressão constitutiva de TF pelas células P7, de
maior agressividade, em contraste com a ausência desta proteína na linhagem
ST1. Análises por citometria de fluxo, utilizando marcação com anexina V,
demonstraram que as células P7 e ST1 expõem de forma similar o lipídeo pró-
coagulante fosfatidilserina em sua membrana externa. Desta forma as duas
linhagens permitiram a montagem do complexo protrombinase (Fator Xa/Fator
Va), possibilitando a ativação de protrombina em trombina. No entanto, ensaios
de coagulação do plasma demonstraram que a somente a linhagem celular P7 foi
capaz de acelerar o tempo de coagulação. Nossos dados sugerem que o TF
produz uma significativa diferença nas propriedades pró-coagulantes destas
linhagens, sendo uma proteína possivelmente envolvida na agressividade dos
gliomas. Foram analisadas também, as microvesículas liberadas por estas células
e suas semelhanças com as mesmas.
Palavras-chave: Coagulação sanguínea, Fator tecidual, Glioblastoma,
Microvesículas.
viii
Abstract
The expression levels of tissue factor (TF), a protein that initiates blood
clotting, are strongly correlated with the histological grade of malignancy of
gliomas. In fact, the presence of vaso-occlusive thrombi is higher in grade IV
tumors (glioblastoma), suggesting that the procoagulant properties contribute to
the tumor’s aggressive behavior and for the establishment of tumor’s hypoxia and
necrosis. In that study, P7 and ST1 rat glioma cell lines with different levels of
aggression, were comparatively analyzed with the objective identifying differences
in the mechanisms of these procoagulant. A specific enzyme assay (activation of
Factor X in the presence of Factor VIIa and P7 or ST1 cells) and real-time PCR
showed the constitutive expression of TF by P7 cells, most aggressive, in contrast
to the absence of this protein in ST1 cell line. Analysis by flow cytometry, using
labeling with annexin V, showed that STI and P7 cells similarly exposed the lipid
procoagulant phosphatidylserine on its outer membrane. Thus, both cell lines
allowed the assembly of the prothrombinase complex (factor Xa / factor Va),
enabling the activation of prothrombin to thrombin. However, plasma coagulation
assays demonstrated that only P7 cell line was able to accelerate the clotting time.
Our data suggest that TF produces a significant difference in the procoagulant
properties of these cell lines, and a protein possibly involved in the aggressiveness
of gliomas. We also evaluate microvesicles released by these cell lines and their
similarities with them.
Keywords: Blood coagulation, Tissue factor, Glioblastoma, Microvesicles.
ix
Lista de Figuras
Figura 1 – Esquema representando os complexos procoagulantes ....................... 3
Figura 2 – Cascata da coagulação sanguínea ....................................................... 4
Figura 3 – Sobrevida de pacientes com câncer apresentando ou não VTE ........... 5
Figura 4 – Evolução dos graus dos gliomas ........................................................... 7
Figura 5 – Invasão do glioblastoma pelo cérebro ................................................... 8
Figura 6 – Fator tecidual contribui para o crescimento tumoral, angiogênese, metástase e trombose em pacientes com câncer ................................................ 12
Figura 7 – Papéis do complexo binário fator tecidual/fator VIIa (TF/VIIa) no organismo ............................................................................................................. 14
Figura 8 – Proteases da coagulação sanguínea, incluindo fator VIIa (FVIIa), fator Xa (FXa) e trombina, podem ativar os receptores do tipo PAR presentes na superfécie das células tumorais ........................................................................... 15
Figura 9 – Contribuição do fator tecidual (TF), proteases da coagulação e receptores ativados por proteases (PARs) para a angiogênese tumoral.............. 17
Figura 10 – Liberação de uma microvesícula ....................................................... 19
Figura 11 - Análise da expressão de TF na membrana de células das linhagens P7 e ST1...............................................................................................................27
Figura 12 - Expressão de RNAm do TF nas linhagens celulares de glioblastoma P7 e ST1................................................................................................................29
Figura 13 - As células de glioblastoma P7 promovem a ativação do FXa através do complexo tenase extrínseco.............................................................................31
Figura 14 - MVs derivadas de glioblastoma P7 promovem a ativação do FXa através do complexo tenase extrínseco.................................................................31
Figura 15 - Ativação da coagulação sanguínea in vitro.........................................32
Figura 16 - Ativação da coagulação sanguínea in vitro com as MVs...................33
Figura 17 - As células de glioblastoma P7 e ST1 promovem a formação de trombina através do complexo protrombinase.......................................................34
Figura 18 - Análise da exposição de fosfatidilserina na membrana de células das linhagens P7 e ST1................................................................................................35
x
Lista de Tabelas
Tabela 1 – Anticoagulantes endógenos (TFPI) e exógenos (NAPc2 e Ixolaris) que bloqueiam o complexo TF/FVIIa............................................................................13
xi
Sumário
Resumo .................................................................................................................vii
Abstract .................................................................................................................viii
Lista de Figuras ......................................................................................................ix
Lista de Tabelas ......................................................................................................x
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 1
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .............................................................................. 2
2.1. COAGULAÇÃO E CÂNCER ......................................................................... 2
2.1.1. Coagulação Sanguínea ........................................................................ 2
2.1.2. Distúrbios da Coagulação Sanguínea no Câncer ............................. 4
2.1.3. Biologia da Coagulação na Patogênese do Glioma .......................... 6
2.2. FATOR TECIDUAL .................................................................................... 10
2.2.1. Importância do fator tecidual para o tumor ..................................... 11
2.2.1.1. O papel do Fator Tecidual no crescimento do tumor ..................... 12
2.2.1.2. Papel do Fator Tecidual na Progressão Tumoral .......................... 13
2.2.1.3. Papel do Fator Tecidual na angiogênese ...................................... 16
2.3. MICROVESÍCULAS ................................................................................... 17
2.3.1. Microvesículas são diferentes de exossomos ................................ 18
2.3.2. Efeitos Gerais de Microvesículas ..................................................... 19
2.3.3. Microvesículas e Câncer ................................................................... 20
2.4. O MODELO CELULAR C6/ST1/P7 DE REVERSÃO FENOTÍPICA
TUMORAL/NORMAL..........................................................................................21
3. OBJETIVOS ..................................................................................................... 23
3.1. OBJETIVO GERAL .................................................................................... 23
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...................................................................... 23
4. MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................... 24
xii
4.1. CULTURA DE CÉLULAS ........................................................................... 24
4.2. PURIFICAÇÃO DE MVS SECRETADAS EM SOBRENADANTES DE
CULTURA DE CÉLULAS ................................................................................. 24
4.3. ANÁLISE DA EXPRESSÃO DE TF NA MEMBRANA DE CÉLULAS DAS
LINHAGENS P7 E ST1 ..................................................................................... 25
4.3.1. Citometria de fluxo ............................................................................. 25
4.3.2. Reações de PCR quantitativo em tempo real .................................. 25
4.3.2.1. Síntese de cDNA ........................................................................... 25
4.3.2.2. Desenho dos Óligo-iniciadores ...................................................... 26
4.3.2.3. Reação de Q-PCR ......................................................................... 26
4.4. ATIVAÇÃO DA COAGULAÇÃO SANGUÍNEA IN VITRO........................... 27
4.5. ENSAIO DE FORMAÇÃO DE FXA ........................................................... 27
4.6. ENSAIO DE ATIVAÇÃO DA PROTROMBINA ........................................... 28
4.7. AVALIAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA .......................... 28
5. RESULTADOS ................................................................................................ 29
5.1. ANÁLISE DA EXPRESSÃO DE TF NA MEMBRANA DE CÉLULAS DAS
LINHAGENS P7 E ST1 ..................................................................................... 29
5.2. ENSAIOS DE FORMAÇÃO DO FXA ......................................................... 30
5.3. ATIVAÇÃO DA COAGULAÇÃO SANGUÍNEA IN VITRO........................... 32
5.4. AVALIAÇÃO DA ATIVAÇÃO DA PROTROMBINA .................................... 33
5.5. AVALIAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA .......................... 34
6. DISCUSSÃO .................................................................................................... 36
7. CONCLUSÃO .................................................................................................. 39
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 40
1. INTRODUÇÃO
A elevada ocorrência de trombose em pacientes com câncer vem
chamando a atenção de pesquisadores de várias partes do mundo. A relação
entre a ativação da cascata de coagulação e a progressão tumoral tem sido muito
estudada, mas muitos pontos ainda não estão totalmente esclarecidos. Desta
forma é necessário novas pesquisas nessa área, a fim de que se conheça e que
se entenda todos os mecanismos utilizados pelas células tumorais para seu
crescimento e desenvolvimento, visto que a trombose é a segunda causa de
morte comum em pacientes com câncer.
Neste contexto, a pesquisa em questão trata da incidência de
tromboembolismo venoso em pacientes com glioblastoma multiforme e busca
entender essa estreita relação entre as proteínas da coagulação sanguínea e a
biologia tumoral, destacando o papel da sinalização celular mediada pelo fator
tecidual (TF) – iniciador da cascata de coagulação – juntamente com o fator VIIa
(FVIIa) e o fator Xa (FXa), formando o complexo ternário TF/FVIIa/FXa. Esse
complexo age diretamente em receptores de membrana acoplados a proteína G,
os receptores PAR (do inglês, protease activated receptor), ativando-os. Essa
ativação desencadeia uma série de sinalizações intracelulares que podem
favorecer a progressão, migração e metástase tumoral. Para estudar essa ligação
foram utilizadas duas linhagens de glioblastoma de rato com características
opostas, a P7, que é uma linhagem mais agressiva, e a ST1, que é uma linhagem
menos agressiva.
Além disso, as células de diferentes tipos tumorais liberam fragmentos de
membrana chamados de microvesículas (MVs) ou micropartículas, que carreiam
consigo características similares às das células de origem, inclusive a presença
de TF na membrana. Então, em etapa posterior, estudou-se as MVs liberadas
pelas linhagens celulares de glioblastoma, P7 e ST1 com o objetivo de descobrir
se, de fato, esses fragmentos possuem as mesmas características das linhagens
que a originaram.
Para alcançar esses resultados, além da cultura de células, foram feitos
experimentos que mimetizam as etapas da cascata de coagulação in vitro com as
células e com as microvesículas.
2
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1. COAGULAÇÃO E CÂNCER
2.1.1. Coagulação Sanguínea
O processo de coagulação sanguínea é parte integrante de um complexo
mecanismo denominado sistema hemostático, cuja função primordial consiste em
reconhecer danos vasculares e recrutar uma apropriada combinação de células e
enzimas, que levam ao tamponamento do vaso, interrompendo assim a perda de
sangue (LIMA, 2008).
A formação do coágulo de fibrina envolve complexas interações entre
proteases plasmáticas e seus cofatores, que culminam na gênese da enzima
trombina, que, por proteólise, converte o fibrinogênio solúvel em fibrina insolúvel.
Em 1964, Macfarlane e Davie & Ratnoff propuseram a hipótese da
“cascata” para explicar a fisiologia da coagulação do sangue. Nesse modelo, a
coagulação ocorre por meio de ativação proteolítica, seqüencial de zimogênios,
por proteases do plasma, resultando na formação de trombina que, então,
converte a molécula de fibrinogênio em fibrina. Esse modelo de cascata divide a
coagulação em três vias: a via extrínseca, que envolve componentes sanguíneos,
mas também, elementos que usualmente não estão presentes no espaço
intravascular; a via intrínseca, iniciada por componentes presentes no meio
intravascular; e a via comum, onde as duas outras vias convergem no ponto de
ativação do fator X (FX) (FRANCO, 2001). E esse modelo é, hoje, entendido
como inadequado do ponto de vista da fisiologia da coagulação já que essa
divisão não ocorre in vivo.
Atualmente, aceita-se que mecanismos hemostáticos, fisiologicamente
relevantes estejam associados com três complexos enzimáticos pró-coagulantes,
os quais envolvem serinoproteases dependentes de vitamina K (fatores II, VII, IX
e X) associadas a cofatores (V e VIII), todos localizados em uma superfície de
membrana contendo fosfolipídeos (COLMAN et al., 2001) – principalmente
fosfatodilserina (que fornece uma superfície negativa para suportar a formação
dos complexos) (Figura 1).
3
As diversas enzimas da coagulação convertem seus substratos
procofatores em cofatores, os quais localizam as proteases sobre as superfícies
celulares, contendo fosfatidilserina (em especial das plaquetas), em que essas
reações acontecem. Os elementos biológicos que contribuem para o componente
de fosfolipídeos da coagulação incluem tecidos vasculares lesados, células
inflamatórias e plaquetas. O principal contribuinte, em termos de números de
sítios, são as membranas de plaquetas, que, quando ativadas, expressam sítios
de ligação para os complexos FIXa/FVIIIa (complexo “tenase”) e FXa/FVa
(complexo “protrombinase”). Adicionalmente, íons Ca2+ são necessários em
diversos passos das reações da coagulação. (FRANCO, 2001).
Figura 1 – Esquema representando os complexos pró-coagulantes. O início da
coagulação se faz mediante ligação do fator tecidual (FT), com subseqüente ativação dos fatores IX e X. O complexo fator IXa/fator VIIIa ativa o fator X com eficiência ainda maior, e o fator Xa forma complexo com o fator Va, convertendo o fator II (protrombina) em fator IIa (trombina). A superfície de membrana celular em que as reações ocorrem também encontra-se representada. Adaptado de Jenny et al., 1998.
O início da coagulação dá-se quando ocorre uma exposição do sangue a
componentes que, normalmente, não estão presentes no interior dos vasos, em
decorrências de lesões estruturais (injúria vascular) ou alterações bioquímicas
(por exemplo, liberação de citocinas). Qualquer que seja o evento desencadeante,
a iniciação da coagulação do sangue se faz mediante expressão do seu
componente crítico, o fator tecidual (TF), e sua exposição ao espaço intravascular.
4
Quando há uma exacerbação do processo de coagulação sanguínea, o
organismo entra em um estado hipercoagulante, favorecendo a formação de
trombos nos vasos sanguíneos, obstruindo-os. Esse estado é chamado de
trombose (Figura 2).
Figura 2 – Cascata de coagulação sanguínea. (A) Esquema simplificado do processo de coagulação in vivo, destacando os principais zimogênios (FIX, FX, protrombina), enzimas ativas (FVIIa, FIXa, FXa, trombina) e os co-fatores (Fator tecidual, FVIIIa, FVa). As siglas FVIIa, FIX, FIXa, FX, FXa, FVIIIa e FVa representam, respectivamente, os fatores VIIa, IX, IXa, X, Xa, VIIIa e Va. (B) Formação de trombos dentro de um vaso sanguíneo. Adaptado de Lima, 2008.
2.1.2. Distúrbios da Coagulação Sanguínea no Câncer
A correlação entre trombose e câncer foi descrita pela primeira vez em
1865 pelo clínico francês Armand Trousseau (1801-1867). Desde então, a
associação entre trombose e câncer foi ampliada e estabelecida e tem sido
chamada de Síndrome de Trousseau, a qual abrange casos em que os eventos
trombóticos inexplicados precedem o diagnóstico de uma neoplasia maligna
oculta ou aparecem concomitantemente com o tumor (MEIS et al., 2010). É
estimado que quase 15% de todos os pacientes com câncer sofrerão
complicações tromboembólicas no curso de sua doença. Além disso, a taxa de
recorrência após o primeiro episódio de tromboembolismo venoso (VTE) em
pacientes com câncer é significantemente mais alta, comparada àquela vista em
pacientes sem câncer. Já foi descrito que o VTE é a segunda causa mais comum
B
A Injúria
Vascular
5
de morte em pacientes com câncer (HOFFMAN, HAIM, BRENNER, 2001) e
estudos epidemiológicos têm demonstrado que há uma significativa correlação
entre a ocorrência de trombose e um pior prognóstico da doença (Figura 3), o que
pode estar associado ao fato de pacientes com eventos tromboembólicos
apresentarem tumores de comportamento mais agressivo do que daqueles sem
trombose (SORENSEN et al., 2000).
Figura 3 – Sobrevida de pacientes com câncer apresentando ou não VTE. Curvas de sobrevida de pacientes com diagnóstico de câncer e tromboembolismo venoso ao mesmo tempo (──) e pacientes com câncer sem tromboembolismo venoso (•••••). Adaptado de Sorensen et al., 2000.
O VTE é mais comum em pacientes com carcinomas primários de
pâncreas, estômago, cólon, pulmão e doença metastática. Além de mecanismos
patogênicos relacionados ao tumor, fatores predisponentes para
hipercoagulabilidade em pacientes com câncer incluem: cirurgia, infecção,
imobilização, quimioterapia e agentes hormonais (HOFFMAN, HAIM, BRENNER,
2001).
Uma série de fatores tem sido proposta para explicar o estado trombofílico
do paciente com câncer, dentre os quais podemos citar como os mais
importantes: (i) A síntese de moléculas pró-coagulantes, especialmente TF, pelas
células tumorais; (ii) A síntese de citocinas pró-inflamatórias, por células de
algumas neoplasias, ou devido à resposta imunológica antitumoral. Estas
6
citocinas podem, por exemplo, ativar células endoteliais e monócitos a
expressarem moléculas pró-coagulantes em sua membrana externa; (iii) A
interação direta entre as células tumorais e as células vasculares, resultando na
ativação destas últimas e na consequente modulação do sistema hemostático; (iv)
A exposição do fosfolipídeo fosfatidilserina (PS) na membrana externa das células
tumorais, permitindo a geração de superfícies lipídicas que suportam a formação
dos complexos da coagulação sanguínea; e (v) O aumento dos níveis plasmáticos
de fragmentos celulares, denominados microvesículas ou micropartículas, com
atividade pró-coagulante (MEIS et al., 2010).
Neste contexto, tem-se enfatizado cada vez mais a importância do sistema
de coagulação sanguínea em diferentes processos do desenvolvimento
neoplásico, principalmente no que diz respeito à angiogênese e metástase
tumorais. Então, o estudo dos mecanismos pró-coagulantes associados ao
desenvolvimento neoplásico, responsáveis pelos estados pró-trombóticos
observados, poderia revelar não apenas possíveis alvos terapêuticos contra tal
efeito colateral (os eventos tromboembólicos), mas também contra a doença
primária, o câncer (LIMA, 2008).
2.1.3. Biologia da Coagulação na Patogênese do Glioma
Gliomas de alto-grau representam os tumores primários mais comuns do
Sistema Nervoso Central (SNC). Esses tumores extremamente letais causam um
comprometimento significativo do sistema neurológico (FADUL, ZACHARSKI,
2005) (Figura 4). Eles podem ser classificados em diferentes graus (grau I-IV) e
subgrupos histopatológicos (GESSLER et al., 2010).
7
Figura 4 – Evolução dos Graus dos Gliomas. Esquema mostrando a progressão do
astrocitoma infiltrante de acordo com a Organização Mundial de Saúde (WHO), do grau II à esquerda ao grau IV à direita. Setas indicam as células em pseudo-paliçada e a parte mais clara entre essas células indica a parte necrosada. Adaptado de Brat et al., 2003
Uma complexa cascata de eventos genéticos e celulares leva ao
desenvolvimento do glioma grau IV, também denominado glioblastoma multiforme
(GBM). Eventos genéticos que caracterizam a transição do glioma de mais baixo
grau ao glioblastoma incluem a perda de PTEN (do inglês, phosphatase and
tensin homolog) e superexpressão de VEGF, dois eventos moleculares que estão
correlacionados com o aumento da expressão de TF. A diminuição do gene
supressor de tumor PTEN, regulador chave da via PI3-K, medeia a ativação da
AKT em glioblastoma com coincidente aumento na expressão de TF (RONG et al.,
2005).
O GBM, o tumor primário mais comum do sistema nervoso central em
adultos, resulta em uma sobrevida média de menos de um ano (FADUL,
ZACHARSKI, 2005) e apresenta como principais características histológicas, as
atipias nucleares, hiperplasia microvascular, altas taxas de mitoses, de
proliferação vascular – por aumentar a quantidade do Receptor do Fator de
Crescimento Epidermal (EGFR) e fator de crescimento do endotélio vascular
(VEGF) – e de necrose, em conseqüência da hipóxia (LOUIS et al., 2007). Células
vizinhas às áreas de necrose formadas são conhecidas como “pseudo-paliçadas”,
e elas representam uma onda de células tumorais migrando para longe da zona
hipóxica central criada após a trombose intravascular. Estas células secretam
8
fatores pró-angiogênicos que promovem hiperplasia microvascular e expansão do
tumor (JENKINS et. al., 2010). Além disso, o glioma de grau IV é altamente
invasivo, mas não apresenta ocorrência de metástase para outros órgãos e é um
tumor resistente a terapias multimodais (Figura 5).
Figura 5 – Invasão do Glioblastoma pelo cérebro. (A) Fotografia mostrando o
glioblastoma invadindo áreas do cérebro diferentes da área de origem. (B) Recorrência local do glioblastoma. A massa tumoral reaparece dezessete meses após a cirurgia de retirada. Adaptado de Nakada et al., 2007
As células de glioblastoma migram e se infiltram no parênquima normal do
cérebro seguindo os tratos de substância branca, o que torna a ressecção
cirúrgica completa quase impossível. Seu rápido crescimento requer a formação
de novos vasos que são susceptíveis a hemorragias, porém essa
neovascularização não acompanha o rápido crescimento da massa tumoral. A
hipóxia e a necrose acontecem em conseqüência desse crescimento e promovem
a produção de VEGF. Isso torna os tumores menos sensíveis à radiação e à
quimioterapia. Estas características biológicas são mediadas pela secreção de
fatores solúveis, incluindo proteases, e a expressão de receptores que permitem a
interação de células tumorais com outras células e a matriz extracelular no
microambiente tumoral, enquanto regulam suas próprias vias de sinalização
intracelular de um modo autócrino (JENKINS et. al., 2010).
A
B
9
Gliomas malignos estão associados a um risco muito alto de VTE
(JENKINS et al., 2010). Alguns autores postularam que há uma potencial relação
entre a geração de trombina e a patogênese do glioma. Através de experimentos
de imunohistoquímica, observou-se a presença de trombina em amostras de
glioblastoma humano e no tumor obtido de um modelo de glioma de ratos, a
linhagem celular C6. A detecção de mRNA de protrombina nessas células sugere
que, pelo menos uma parte da trombina é derivada do tumor e outra parte é
derivada do plasma. A presença de trombina não só promoveu a proliferação das
células C6 em cultura, um efeito que foi bloqueado por um inibidor de trombina,
como também estimulou a produção de VEGF medido no sobrenadante. Em um
modelo de rato, os autores demonstraram que a administração sistêmica de um
inibidor de trombina resultou na redução da massa tumoral e aumento da
sobrevida quando comparado com o controle (FADUL, ZACHARSKI, 2005).
A ocorrência de vaso-oclusão após uma trombose intravascular poderia
levar diretamente ao desenvolvimento de hipóxia; a necrose resultante poderia
ser responsável pela indução de hiperplasia microvascular que define a histologia
do GBM (JENKINS et al., 2010).
A superexpressão de EGFR em células de glioma humano causa uma
expressão aumentada de TF, e a estimulação de EGFR leva a um aumento da
regulação de TF de maneira dose-dependente, independentemente de hipóxia
(RONG et al., 2009). As células de glioma muitas vezes expressam uma forma
oncogênica truncada de EGFR conhecido como EGFRvIII; a expressão desta
forma estimula a formação de MVs contendo EGFRvIII, levando a expressão
aumentada de TF, a produção aumentada de VEGF e angiogênese (MILSOM et
al., 2008). Mecanismos oncogênicos são responsáveis por uma maior regulação
da expressão de TF pelas células de GBM; este ambiente pró-trombótico rico em
TF poderia levar a uma trombose local, necrose induzida pela hipóxia,
angiogênese e ao crescimento do tumor periférico em gliomas (RONG et al.,
2009).
10
2.2. FATOR TECIDUAL
O fator tecidual (TF) é uma proteína transmembrana de 47 kDa pertencente
a superfamília de receptores de citocinas (GESSLER et al., 2010). TF é o receptor
da enzima FVIIa, e esta propriedade o define como o principal regulador da
cascata de coagulação sanguínea. A formação do complexo TF/FVIIa na
superfície da célula leva a conversão proteolítica do FX circulante para sua forma
ativa (FXa) (juntamente com a ativação de FIX), o qual converte pequenas
amostras de protrombina para trombina. A geração de trombina é amplificada pela
contribuição das plaquetas, FVa, FVIIIa e FIXa, resultando em uma quantidade
ainda maior de atividade da trombina e uma rápida geração de coágulos contendo
fibrina insolúvel e plaquetas.
Uma vez gerado, o complexo TF/FVIIa é capaz de interagir com as células
por meio de receptores ativados por proteases (PAR – do inglês protease
activated receptor) acoplados a proteína G, quer diretamente (PAR-2) quer via
FXa (PAR-1 ou PAR-2) ou trombina (PAR-1) (MAGNUS, GARNIER e RAK, 2010).
Em tecidos saudáveis, o escopo desta atividade é restrito pela expressão
normalmente extravascular de TF. Por isso, a formação do complexo TF/FVIIa
pode ocorrer somente sob circunstâncias muito especiais, incluindo: injúria
vascular penetrante, extravasamento de sangue, ruptura ou descontinuidade do
revestimento endotelial, indução da expressão de TF nas células endoteliais
(durante a angiogênese, por exemplo), entrada de um grande número de células
expressando TF (leucócitos inflamatórios, células cancerosas metastáticas ou
blastos leucêmicos, por exemplo) na corrente sanguínea ou MVs contendo TF na
membrana (RAK et al., 2009).
O TF, ao iniciar a coagulação sanguínea, desempenha um importante
papel na hemostasia normal, doenças cardiovasculares e trombose. A ativação da
coagulação nas proximidades de células tumorais expressando TF e a liberação
de fragmentos com atividade pró-coagulante na circulação contribui
significantemente para a trombose associada ao câncer, tromboembolismo e
síndrome de Trousseau no câncer avançado (VERSTEEG et al., 2008;
SCHAFFNER e RUF, 2008).
11
2.2.1. Importância do fator tecidual para o tumor
A transcrição de TF é induzida pela ativação de EGFR, pela perda de
PTEN e hipóxia e sua expressão está positivamente correlacionada com o grau
histológico dos gliomas e com a extensão da necrose. A expressão aumentada de
TF está ligada ao estado hipercoagulativo dos tumores, incluindo gliomas
malignos (GESSLER et al., 2010) e com progressão tumoral em vários cânceres
(SCHAFFNER e RUF, 2008).
Além de seu papel pró-trombótico, TF pode atuar como um receptor
transmembranar, como explicado anteriormente, e seu domínio intracelular está
envolvido na modulação de várias vias de sinalização intracelulares relevantes
para o crescimento do tumor, angiogênese e metástase, tais como a via de MAP
cinase p44/p42 (MAPK), via da MAPK p38 e via da PI3/Akt (GESSLER et al.,
2010; DUTRA-OLIVEIRA A. et al, 2012). O TF é expresso por todos os tipos de
cânceres. A formação do complexo TF/FVIIa na superfície das células tumorais
leva à clivagem e ativação de PAR-2. A via de sinalização TF/FVIIa/PAR-2 parece
promover trombose, crescimento, angiogênese e metástase tumoral (Figura 6)
(KASTHURI et al., 2009).
12
Figura 6 – Fator tecidual contribui para o crescimento tumoral, angiogênese, metástase e trombose em pacientes com câncer. A expressão de TF pelas células
tumorais pode aumentar o crescimento do tumor por aumentar a sobrevida celular e/ou a angiogênese. A expressão de TF pelas células tumorais no sangue aumenta a metástase pela ativação da coagulação e plaquetas. A liberação de micropartículas TF-positivas pelas células tumorais e células hospedeiras no sangue pode levar ao tromboembolismo venoso. KASTHURI et al., 2009
2.2.1.1. O papel do Fator Tecidual no crescimento do tumor
Recentemente, um estudo mostrou um papel direto do TF sobre o
crescimento do tumor. Notavelmente, a redução seletiva na expressão de TF em
células de câncer de coloretal usando um RNA de interferência reduziu
dramaticamente o crescimento do tumor em ratos (KASTHURI et al., 2009).
Interessante foi que a redução da expressão do TF não afetou o crescimento das
células in vitro, sugerindo que o crescimento do tumor mediado por TF requer um
fator presente in vivo que não está presente quando as células são crescidas in
vitro. Um provável candidato é o FVIIa, o qual poderia formar o complexo
TF/FVIIa na superfície das células tumorais in vivo levando a ativação da
sinalização dependente de PAR-2. A geração de trombina e ativação de PAR-1
nas células tumorais também pode aumentar o crescimento tumoral.
A inibição do complexo TF/FVIIa ou com um inibidor do fator tecidual ou
com uma proteína anticoagulante de nematódeo chamada NAPc2 ou com outros
13
inibidores do TF (Tabela 1) reduziu o crescimento da linhagem celular de
melanoma B16 em ratos (KASTHURI et al., 2009). Em outro estudo, ratos sem
PAR-2, mas não PAR-1, exibiram um crescimento tumoral reduzido em um
modelo de tumor mamário espontâneo (VERSTEEG et al., 2008). A ativação da
via de sinalização TF/FVIIa/PAR-2 pode aumentar o crescimento tumoral por
aumentar diretamente a sobrevida celular e/ou pelo aumento na expressão de
proteínas pró-angiogênicas, tais como VEGF e interleucina-8 (IL-8) (HJORTOE et
al., 2004).
Tabela 1 – Anticoagulantes endógenos (TFPI) e exógenos (NAPc2 e Ixolaris) que
bloqueiam o complexo TF/FVIIa. Adaptado de Meis, 2010
2.2.1.2. Papel do Fator Tecidual na Progressão Tumoral
Alguns autores sugerem que o TF contribui para a progressão tumoral
através de mecanismos pró-coagulantes e de sinalização celular (RAK et al.,
2009). Ele mantem contato direto com a célula por uma via de sinalização
independente da ativação da coagulação. A expressão de TF influencia a função
de integrinas. TF regula a migração de células epiteliais não-cancerosas
especificamente na laminina 5, uma matriz para integrinas α3β1 e α6β1. Esta via
é dependente da sinalização do domínio citoplasmático de TF e da interação
extracelular com o ligante fisiológico VIIa, o qual induz a fosforilação do domínio
citoplasmático de TF de uma maneira dependente de PAR-2 (SCHAFFNER e
RUF, 2008). O domínio citoplasmático de TF também interage com as MAPK p38,
14
p44/42 (ERK1/2), vias de Rac e estabelece sinergia com fator de crescimento
derivado de plaquetas (PDGF) induzido por quimiotaxia, enfatizando a relevância
do domínio citoplásmico para sinalização celular, levando a motilidade e migração
celular.
Recentes estudos tem mostrado que a interação de TF com integrinas é
regulada pela ligação com VIIa em células epiteliais normais, mas é constitutiva
em células de câncer de mama agressivo (SCHAFFNER e RUF, 2008).
Interessantemente, a associação induzida de TF/FVIIa com integrinas envolve
uma porção não-coagulante de TF (Figura 7), a qual é dependente da sinalização
através de PAR-2. Utilizando um anticorpo monoclonal específico para TF
(10H10), foi possível bloquear a regulação, bem como, a associação constitutiva
de TF com integrinas β1 nas células tumorais (SCHAFFNER e RUF, 2008). Este
anticorpo também potencializou o bloqueio sinalização de PAR-2 mediada pelo
complexo TF/FVIIa sem inibir a atividade coagulante de TF. Sabe-se que o fator
tecidual é expresso nas células tumorais na conformação de sinalização
(SCHAFFNER e RUF, 2008).
Figura 7 – Papéis do complexo binário Fator Tecidual/Fator VIIa (TF-VIIa) no organismo. Além de ser o iniciador da cascata de coagulação sanguínea, TF pode desencadear
uma sinalização intracelular ao ligar-se a um receptor PAR acoplado à proteína G de células tumorais, a resposta celular pode levar a progressão, migração, angiogênese e metástase (em alguns tipos de câncer) tumoral. Adaptado de Schaffner e Ruf, 2008.
Sinalização
Coagulação
Angiogênese CXCL1, VEGF, IL8
Integrina/migração
Trombina
Fibrina
Plaqueta
15
Já foi demonstrado que o FVIIa em concentrações nanomolares (ηM) pode
ativar PAR-2 quando TF e FX estão presentes. Esses resultados induzem uma
cascata de eventos na superfície da célula tumoral. FVIIa se liga ao TF, o
complexo binário TF/FVIIa converte o zimogênio inativo FX em FXa, então o FXa
cliva e ativa PAR-2 para promover a migração celular (Figura 8). TF/FVIIa
também pode ativar PAR-2 diretamente, especialmente quando TF está expresso
em altas concentrações (CAMERER et al., 2000). Vários tumores expressam
FVIIa ectopicamente in vivo e in vitro e a síntese ectópica de VIIa é suficiente para
induzir a migração da célula tumoral quando exposto a gradientes do substrato FX
(KOIZUME et al., 2006).
Figura 8 – Proteases da coagulação sanguínea, incluindo Fator VIIa (FVIIa), Fator Xa (FXa) e trombina, podem ativar os receptores do tipo PAR presentes na superfície das células tumorais. Os receptores do tipo PAR, que são acoplados à proteína G (Ptn G), medeiam aumento na atividade da Proteína cinase C (PKC) ou reduzem a atividade da Adenilato Ciclase (AC). Estes fenômenos levam à ativação da via de MAPK e, consequentemente, desencadeiam fenômenos pró-tumorais. MEIS et al., 2010
16
2.2.1.3. Papel do Fator Tecidual na angiogênese
A expressão de TF pelas células tumorais tem sido apontada como
responsável pelo crescimento e angiogênese aumentados. Alguns autores
apontam que o TF é expresso nas células endoteliais na vasculatura tumoral,
embora essa observação não seja universal. Poder-se-ia imaginar que a
expressão aumentada de TF nas células endoteliais poderia induzir a trombose e
a morte das células tumorais, ao invés de promover o crescimento. Contudo, tem
sido proposto que a expressão de TF nessas células promove um aumento da
formação de novos vasos. Um estudo mostrou que a expressão aumentada de
fator tecidual nas células tumorais está associada com a expressão aumentada
de VEGF e a um aumento no tamanho do tumor em ratos. Em tumores humanos,
níveis elevados de TF estão associados com o aumento do VEGF e da
vascularização. Estudos mostraram que, em alguns tipos de células, a
neovascularização requer a geração de trombina dependente de TF e a ativação
de PAR-1 nas células endoteliais (Figura 9) (KASTHURI et al., 2009).
17
Figura 9 – Contribuição do fator tecidual (TF), proteases da coagulação e
receptores ativados por proteases (PARs) para a angiogênese tumoral. Formação
do complexo TF/FVIIa na superfície das células tumorais ativa o sistema de coagulação. A
clivagem de PAR-2 por FVIIa ou FXa induz a expressão de várias proteínas pró-angiogênicas,
incluindo fator de crescimento vascular endotelia (VEGF), interleucina-8 (IL-8) e metaloproteinases
de matriz (MMPs). A ativação de PAR-1 pela trombina ou FXa induz um conjunto semelhante de
genes. Adaptado de Mceachron e Mackman, 2009
Como dito anteriormente, um dos mecanismos utilizados pelas células
tumorais é a liberação de partículas com atividade pró-coagulante, as
microvesículas ou micropartículas.
2.3. MICROVESÍCULAS
Durante a ativação, células eucarióticas liberam componentes de sua
membrana plasmática no espaço extracelular. Esses fragmentos circulantes,
conhecidos como microvesículas (MVs) ou micropartículas (MPs), tem sido
detectados em diversos fluidos incluindo sangue periférico (Janowska-Wieczorek
et al., 2004). Este processo, que permite uma liberação seletiva do conteúdo
celular para o entorno foi notado pela primeira vez por Wolf em 1967, como a
formação de um material particulado pró-coagulante ("poeira") em torno de
Angiogênese
Célula
Tumoral
Fibrina
Trombina
18
plaquetas ativadas (AL-NEDAWI et al., 2009). Essas estruturas vesiculares
intactas são bastante heterogêneas em tamanho (seu diâmetro pode variar de
0,1-1 µM) e composição, sendo constituídas principalmente de diferentes lipídeos
e proteínas de membrana similares àqueles presentes na célula da qual se
originam (LIMA, 2008). As microvesículas tem sido apontadas como importantes
vias de sinalização na comunicação intercelular (JANOWSKA-WIECZOREK et al.,
2005).
2.3.1. Microvesículas são diferentes de exossomos
Fluidos corpóreos humanos contem dois tipos diferentes de fragmentos
derivados das células: microvesículas e exossomos. Células eucarióticas,
incluindo células sanguíneas, endoteliais e tumorais, liberam microvesículas pelo
brotamento de partes de sua membrana externa. Exossomos surgem de
endossomos, os quais são inicialmente formados pela invaginação da membrana
plasmática. Endossomos liberam vesículas dentro de seu lúmen, ‘vesículas
intraluminais’. Endossomos contendo ‘vesículas intraluminais’ são chamados
corpos multivesiculares (MVBs). Finalmente, quando membranas dos MVBs se
fundem com a membrana plasmática, essas ‘vesículas intraluminais’ são
secretadas e são chamadas exossomos. Exossomos atingem um tamanho de 30
a 100 nM e se pode esperar que todos os tipos de células contendo MVBs
secretem exossomos, esses tipos de células incluem células hematopoiéticas,
células tumorais e células epiteliais (DOORMAAL et al., 2009).
A composição das microvesículas depende muito do tipo de célula que lhe
deu origem, embora a composição da membrana da microvesícula permaneça
distinta daquela da célula parental – muitas vezes com remodelação significativa,
permitindo funções especializadas. A este respeito, nem todas as proteínas da
membrana plasmática são incorporadas nas vesículas liberadas
(MURALIDHARAN-CHARI et al., 2010). A fosfatidilserina (PS) é transferida para a
face externa da membrana, especificamente em sítios onde ocorre a liberação
das microvesículas, enquanto a topologia das proteínas de membrana permanece
intacta (LIMA et al., 2009) (Figura 10). A externalização de PS em células
tumorais ocorre, presumivelmente, em um esforço para reprimir uma resposta
19
imunológica e promover a sobrevivência das células tumorais (MURALIDHARAN-
CHARI et al., 2010).
Figura 10 – Liberação de uma microvesícula. Microvesículas são formadas pelo brotamento da membrana plasmática, como mostrado. Nem todas as proteínas da membrana plasmática são incorporadas nas vesículas liberadas, embora a topologia de proteínas de membrana permanece intacta. Proteínas da membrana, como oncogenes e outros receptores do fator de crescimento, receptores de integrinas e moléculas MHC de classe I, proteínas solúveis, como proteases e citocinas, bem como ácidos nucléicos, tem sido encontrados em microvesículas. Microvesículas parecem ser enriquecidas em alguns lipídios, como colesterol, enquanto a fosfatidilserina é transferida para a face externa da membrana, especificamente em locais de liberação de microvesículas. Adaptado de Muralidharan-Chari et al., 2010
2.3.2. Efeitos Gerais de Microvesículas
As microvesículas (MVs) estão associadas a muitos processos patológicos
e fisiológicos no corpo humano. Membranas de MVs contem fosfolipídeos e
proteínas que, com frequência, são originadas de lipid rafts da célula parental,
incluindo receptores transmembranares, tais como fator tecidual (TF). Além disso,
proteínas intracelulares, segundos mensageiros e material genético podem ser
inclusos e especificamente incorporados nas MVs. Como consequência desta
incorporação, as propriedades funcionais e o papel biológico das MVs podem
diferir de sua célula de origem (DEL CONDE et al., 2005).
20
As MVs interagem com as células pela ligação com receptores de adesão
específicos do tipo celular. Após esta interação inicial, as membranas de MVs
podem fundir com a membrana plasmática da célula-alvo, transferindo receptores
que podem induzir a sinalização celular ou mesmo a transformação, a informação
genética e segundos mensageiros (HUNTER et al., 2008). MVs não estão apenas
envolvidas na comunicação intercelular, mas também em outros processos
incluindo regulação da apoptose, modulação da resposta imune, inflamação,
angiogênese e coagulação.
A liberação de microvesículas é um fenômeno fisiológico. Todos os tipos de
disparos bioquímicos induzem a liberação de MVs, tais como citocinas e
quimioterápicos, bem como disparos físicos, tais como hipóxia e estresse. Em
doenças, níveis anormais de MVs são observados, e seus números, origem
celular e composição são dependentes da (estado) doença (DOORMAAL et al.,
2009).
2.3.3. Microvesículas e Câncer
Embora a liberação de microvesículas ocorra sob condições fisiológicas, a
liberação aberrante de MVs pode surgir em algumas doenças, como o câncer. De
fato, comparado com controles saudáveis, o sangue de pacientes com câncer
contem níveis elevados de microvesículas derivadas de células (DOORMAL et al.,
2009). Amostras de MVs liberadas por células tumorais mostraram uma
correlação com sua invasividade tanto in vitro como in vivo.
MVs em pacientes com câncer foi documentada pela primeira vez em 1978,
quando elas foram identificadas em culturas de nódulos do baço e linfonodos de
um paciente do sexo masculino com doença de Hodgkin. Cerca de uma década
mais tarde, foi demonstrado que vesículas derivadas de membrana plasmática de
células de melanoma de camundongo altamente metastático B16 (F10) eram
liberadas espontaneamente e, quando fundidas com células de melanoma murino
fracamente metastático B16 (F1), tornou-as capazes de fazer metástase para o
pulmão (MURALIDHARAN-CHARI et al., 2010).
Esses dois estudos incentivam a novas investigações sobre o papel da
liberação de microvesículas na progressão do câncer. Desde então, a
21
transferência de materiais celulares mediada por microvesículas para as células
de adjacentes ou células remotas tem sido mostradas para afetar muitas etapas
da progressão do tumor (DOORMAL et al., 2009), incluindo angiogênese, escape
do sistema imunológico, degradação da matriz extracelular e metástase. A
liberação de microvesículas pelas células tumorais facilita a transferência de
proteínas solúveis, ácidos nucleicos, proteínas transmembranares funcionais,
receptores de quimiocina, fator tecidual e receptores tirosina quinase, tais como
EGFR e receptor do fator de crescimento epidermal humano 2 (HER2)
(MURALIDHARAN-CHARI et al., 2010).
2.4. O MODELO CELULAR C6/ST1/P7 DE REVERSÃO FENOTÍPICA
TUMORAL/NORMAL
A linhagem C6 de glioma de rato foi estabelecida a partir de um tumor
cerebral induzido quimicamente por etilnitrosouréia (Benda et al., 1968). Após
passagens alternadas in vitro e in vivo da cultura primária derivada do tumor
primário, várias linhagens clonais foram selecionadas, e o clone C6, de onde se
originou a linhagem, era o que expressava maiores quantidades de proteína S100
que, na época, foi utilizada como um marcador de células gliais (Benda et al.,
1968). Por alguns anos, esta linhagem de rato foi uma das poucas opções
disponíveis de células gliais em cultura, tendo sido intensamente utilizada como
modelo experimental para neurociências, proliferação celular e tumorigênese
(Cretu et al., 2005; Garberg et al., 2005; Goncharov et al., 2005).
Enquanto modelo de diferenciação e proliferação celular, a linhagem C6
apresenta inibição de crescimento em resposta ao tratamento com uma variedade
de agentes diferenciadores, tais como glicocorticóides (Armelin & Armelin, 1983),
ácido retinóico, 1,25-dihidroxivitamina D3 e dibutiril-AMP cíclico (Fischer et al.,
1987), dentre outros. Além disso, a linhagem C6 leva à formação de tumores
similares aos glioblastomas humanos quando injetada no cérebro de ratos
neonatos, e tem sido utilizada extensivamente como um modelo experimental de
glioblastoma in vivo (Grobben et al., 2002).
Apesar desta linhagem ser de origem clonal, já é conhecido que as
sucessivas passagens em cultura leva a uma mudança progressiva de fenótipo e
22
a uma heterogeneidade crescente (Goya et al., 1996). Com o objetivo de estudar
a parada de crescimento induzida por glicocorticóides nesta linhagem, foram
isoladas, pelo grupo da Dra. Mari Sogayar, linhagens clonais variantes a partir da
linhagem C6 (COLIN, 2006). Deste isolamento, originaram-se as linhagens
tumorais ST1 e P7 (Armelin & Armelin, 1983). A linhagem ST1 é hipersensível ao
tratamento com glicocorticóides, apresentando uma dramática reversão do
fenótipo transformado e tumorigênico, a julgar pela aquisição de morfologia
achatada e fusiforme e aumento da aderência, forte inibição do crescimento em
substratos sólido e semi-sólido in vitro assim como inibição do caráter
tumorigênico in vivo, quando injetada de forma subcutânea em camundongos
imunossuprimidos do tipo nude. A linhagem P7 é completamente refratária a este
tratamento, mantendo suas características de transformação e caráter
tumorigênico inalteradas pelo tratamento com glicocorticóides (GC).
Sabendo da relação de oposição existente entre estas linhagens, foi
desenvolvido este estudo, com o interesse de aprofundar este conhecimento.
23
3. OBJETIVOS
3.1. OBJETIVO GERAL
Avaliar se níveis de TF nas linhagens celulares de glioma ST1 e P7, e em
microvesículas derivadas das mesmas, estão correlacionados com a
agressividade tumoral.
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
a) Analisar quantitativamente a expressão de TF nas linhagens de glioma ST1
e P7;
b) Identificar as microvesículas liberadas pelas linhagens de glioma ST1 e P7;
c) Determinar a diferença nos níveis de expressão do TF nas micropartículas
liberadas pelas linhagens celulares de glioma ST1 e P7;
d) Analisar se estas micropartículas apresentam características similares às
suas células de origem, com relação ao efeito na coagulação sanguínea.
24
4. MATERIAIS E MÉTODOS
4.1. CULTURA DE CÉLULAS
As linhagens celulares ST1 e P7 de Glioma foram gentilmente cedidas pela
Profª Mari Sogayar do Instituto de Química da USP mantidas a 37ºC, em estufa
com 5% de CO2, através de duas passagens semanais em garrafas de cultura
contendo meio de cultura DMEM-F12 (Dulbecco´s Modified Eagle Medium),
acrescido de 10% (v/v) de soro fetal bovino (SFB), e suplementado com glicose
30%, 100mg/L de estreptomicina, 250mg/L de fungisona, 3,7 g/L de bicarbonato
de sódio e 2mM de L-glutamina. Após separação do sobrenadante de cultura para
posterior purificação de microvesículas, as células eram soltas com tampão
Hank's contendo 10mM de HEPES e 0,2mM de EDTA, centrifugadas a 1100 rpm
por 7 min, ressuspendidas em meio DMEM-F12 contendo 10% (v/v) de SFB e
transferidas para outra garrafa de cultura, ou ainda, mantidas a 4ºC até sua
utilização.
4.2. PURIFICAÇÃO DE MVS SECRETADAS EM SOBRENADANTES DE
CULTURA DE CÉLULAS
Sobrenadantes de cultura de células eram centrifugados primeiramente a
2000 x g por 15 min (para a eliminação de possíveis células mortas) e em seguida
mais duas vezes a 20.000 x g por 1h cada, sempre a 4ºC. O precipitado obtido
era então ressuspendido em salina tamponada por fosfato (PBS), quantificado por
contagem em um citômetro de fluxo BD FACScaliburTM (Becton, Dickinson and
Company), e conservado a -80ºC até sua utilização.
25
4.3. ANÁLISE DA EXPRESSÃO DE TF NA MEMBRANA DE CÉLULAS
DAS LINHAGENS P7 E ST1
4.3.1. Citometria de fluxo
As análises feitas no citômetro de fluxo facscalibur (Becton-Dickinson,
EUA), foram analisadas com os seguintes parâmetros: desvio frontal (ou forward
scatter), desvio lateral (ou side scatter) e sinais de fluorescência na cor verde (fl1),
cujo comprimento de onda é de 525 nm ou, na cor laranja (fl2), cujo comprimento
de onda é de 575 nm. A excitação das amostras foi realizada por laser de argônio,
ajustado para emitir 15 mw a 488 nm. Um total de 10.000 eventos foi adquirido e
os dados obtidos foram analisados utilizando o programa winmdi 2.8.
4.3.2. Reações de PCR quantitativo em tempo real
4.3.2.1. Síntese de cDNA
Amostras do RNA total das células foram utilizadas como “template” para
síntese de cDNA em uma reação de transcrição reversa. Alíquotas de 1µg de
RNA total foram submetidas a tratamento prévio com 2µl de DNase I (1U/µl
fermentas) em solução contendo tampão 5X de síntese de primeira fita Super
Scrip III (Invtrogen) e 0,5 µl de RNase OUT (40U/µl, invitrogen) em volume final de
10 µl. O tratamento ocorreu através de incubação de 10 minutos a 37°C. Em
seguida, para inativação da enzima, a amostra foi incubada a 75°C por 10
minutos. Para cada amostra de RNA previamente tratada, foi preparado reações
contendo 0,5 µl de Oligo dT (0,5g/µl, Invitrogen), 0,5 µl de “Random Primer”
(100ng/ul, Invitrogem) e 1 µl de dNTP (100mM, Invitrogen) para um volume final
de 12 µl. As amostras foram incubadas a 75°C por 10 minutos para desnaturação
das moléculas e, em seguida, foi adicionado 7 µl de uma solução contendo 2 µl
de tampão de 5x de síntese de primeira fita para a enzima Super Scrip III
(Invitrogen), 2 µl de DTT (0,1M, Invitrogen), 0,5 µl de RNase OUT (40U/ul,
invitrogen) e 2,5 µl de água Milli-Q para um volume final de 19 µl. Houve uma
nova incubação de 25°C por 10 minutos, para anelamento dos iniciadores, 42° C
26
por 2 minutos e, então, foi adicionado 2 µl da enzima Super Scrip III (200U/µl,
Invitrogen). A reação de transcrição reversa ocorreu a 42°C por 2 horas e, em
seguida, foi inativada a 72°C por 10 minutos. Com o objetivo de degradar o RNA
excedente, foi adicionado 1 µl de RNase H (5U/µl, Fermentas) em cada tubo e
posteriormente incubados a 37°C por 30 minutos, seguidos por uma incubação a
72°C por 10 minutos para inativação da enzima.
4.3.2.2. Desenho dos Óligo-iniciadores
Os iniciadores utilizados para a amplificação dos genes nos experimentos
de Q-PCR foram desenhados com o auxílio do programa computacional “Primer
Express” versão 2.0 (Applied Biosystems).
4.3.2.3. Reação de Q-PCR
As reações de PCR em tempo real foram realizadas utilizando o sistema
TaqMan. Foram feitas duplicatas de cada amostra utilizando o Universal PCR
Master Mix (Applied Biosystems) em um volume final de 15 µl, contendo os
primers forward/reverse (400 nM) probe (200 nM) e cDNA (0,250 µg). Todas as
amplificações foram realizadas no aparelho ABI Prism 7500 Sequence detection
System (PE Applied Bisystems), com a seguinte ciclagem: desnaturação à 95°C
por 10 minutos, 40 ciclos de 15 segundos à 95°C (desnaturação) e 60 segundos à
60°C (anelamento dos primers e elongação).
Foi definido um threshold (0.03) na fase exponencial de amplificação do
gene no programa GeneAmp 5700. Assim que foi estabelecido o threshold, a
partir da intersecção deste com a curva de amplificação, obteve-se o Ct da
amostra (Threshold cycle, ciclo onde a fluorescência se encontra estatisticamente
acima do background).
Em experimentos de Real-Time PCR, como em todas as técnicas de
expressão, deve-se considerar a possibilidade da variação da concentração inicial
de cDNA na análise dos dados provenientes de duas ou mais amostras. Desta
forma, para que os dados possam ser comparados, é necessário que estes sejam
previamente normalizados, ou seja, a expressão do gene alvo foi determinada em
27
função da expressão do gene controle. A quantificação das amostras foi realizada
usando GAPDH como controle.
4.4. ATIVAÇÃO DA COAGULAÇÃO SANGUÍNEA IN VITRO
A habilidade das linhagens celulares e das MVs estudadas em
potencializar a coagulação sanguínea in vitro foi avaliada através de ensaio de
recalcificação do plasma, de acordo com o seguinte protocolo: 50 µL de plasma
humano pobre em plaquetas contendo citrato de sódio (citrato de sódio 3,8%, 1:9,
v/v) foi incubado com 50 µL de células ou MVs ressuspendidas em PBS, em
diferentes concentrações – ou ainda, com 50 µL apenas de PBS (controle) -, por 1
min. a 37ºC. Adicionou-se então 100 µL de CaCl2 6,25 mM, e o tempo necessário
para ocorrência de coagulação foi monitorado em um Coagulômetro KC-4 micro
Amelung (Amelung Ltd, Diagnostic Grifols).
4.5. ENSAIO DE FORMAÇÃO DE FXa
A ativação de FX para FXa pelo FVIIa foi realizada em 50 mM HEPES,
100 mM NaCl, 5 mM CaCl2, 1 mg mL-1 BSA, pH 7,5 (tampão HEPES-
BSA). FVIIa (1 nM) foi incubado com as células (5 x 105 mL-1) ou com as MVs na
presença de 100 nM FX. Após a incubação, a reação foi interrompida a cada 5
min. (células) e a cada 10 min. (MVs) (5-20 min.) com 50 mM de Tris – HCl, 150
mM NaCl, 10 mM de ácido etilenodiaminotetracético (EDTA), 1 mg mL-1 de
polietilenoglicol (PEG) 6000, pH 7,5 (tampão Tris-EDTA ou tampão de parada) e
acrescida de 50 µL do peptídeo sintético S-2765 300µM (substrato cromogênico
para FXa) preparado em tampão Tris-EDTA. A absorbância a 405 nm foi lida a
37ºC, por 10 min., a intervalos de 6 s, através de um leitor de microplacas
Thermomax Microplate Reader (Molecular Devices). Velocidades (mOD /min)
obtidas nos primeiros minutos de reação foram utilizadas para calcular a
concentração de Fxa formado.
28
4.6. ENSAIO DE ATIVAÇÃO DA PROTROMBINA
A ativação da protrombina pelo complexo protrombinase (fator Xa/fator Va)
foi realizada em tampão HEPES-BSA. Fator Xa (10pM, concentração final) foi
incubado com Fva (1 nM, concentração final), na presença das células (5 x 105
mL-1) ou das MVs, por 2 min. a 37ºC. A reação foi então iniciada pela adição de
protrombina (500 nM, concentração final), e alíquotas de 10 µL foram removidas a
cada 1 min. e adicionadas a poços de microplaca contendo 40 µL de tampão Tris-
EDTA. Após a adição de 50 µL do peptídeo sintético S-2238 200 µM (substrato
cromogênico para trombina preparado em tampão Tris-EDTA – Chromogenix), a
absorbância a 405 nm foi lida a 37ºC, por 20 min., a intervalos de 6 s, através de
um leitor de microplacas Thermomax Microplate Reader (Molecular Devices).
Velocidades (mOD /min) obtidas nos primeiros minutos de reação foram utilizadas
para o cálculo da concentração de trombina formada.
4.7. AVALIAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA
Para detecção da exposição de PS, células e MVs foram ressuspendidas
em 150 mM de NaCl, 5 mM de KCl, 2,5 mM de CaCl2, 1 mM de MgCl2 e 10 mM
de HEPES, pH 7,3 (tampão de ligação de anexina) e incubadas com 25 µg/mL de
anexina V conjugada a fluoresceína (FITC) (Molecular Probes) por 15 min à
temperatura ambiente. As amostras foram, então, levadas ao citômetro de fluxo
BD FACScalibur™ (Becton, Dickinson and Company) (total de 10.000 eventos por
amostra), e os dados coletados analisados pelo programa BD CellQuest Pro™
(Becton, Dickinson and Company).
29
5. RESULTADOS
5.1. ANÁLISE DA EXPRESSÃO DE TF NA MEMBRANA DE CÉLULAS
DAS LINHAGENS P7 E ST1
Em primeiro lugar, foi analisada a expressão de RNAm para TF nas
linhagens P7 e ST1. Para isso, nós realizamos um PCR quantitativo em tempo
real com o objetivo de quantificar essa exposição de fator teciadual pelas duas
linhagens analisadas. O resultado mostra uma presença maior de TF na linhagem
P7 do que na linhagem ST1 (figura 11).
Figura 11 – Expressão de RNAm do TF nas linhagens celulares de glioblastoma P7 e ST1. Os níveis de expressão nas células P7 e ST1 foram determinados pelo RT-PCR quantitativo, usando primers específicos para TF.
Por meio da análise de Citometria de Fluxo, utilizando um anticorpo
monoclonal, demonstramos marcação positiva para o TF na membrana das
células P7 e ST1. Como esperado, a quantidade de TF encontrada na linhagem
P7 foi 3 vezes maior do que a encontrada na linhagem ST1, como mostrado na
figura 12.
30
Figura 12 – Análise da expressão de TF na membrana de células das linhagens P7 e ST1. Realizada através de ensaios de citometria de fluxo. A linha em verde representa a
marcação do TF para linhagem P7 (dmf 148.9), linha azul representa marcação para linhagem ST1 (dmf 39.69), linha rosa e roxa presentam os controles para P7 e ST1 respectivamente.
5.2. ENSAIOS DE FORMAÇÃO DO FXa
Para sabermos se o TF presente nas linhagens estudadas é funcional, foi
realizado um ensaio enzimático de formação do fator Xa. Como representado pela
figura 13, observou-se que, na presença das células P7, houve a ativação do
complexo tenase extrínseco e a consequente formação de FXa. Já na presença
da linhagem ST1, não foi observada a ativação do zimogênio. Sugerindo, então,
que o TF presente nas células ST1 não é funcional.
Esse mesmo experimento foi realizado também com as micropartículas e,
mais uma vez, obtivemos resultados similares aos encontrados com suas células
de origem (figura 14).
31
Figura 13 – As células de glioblastoma P7 promovem a ativação do FXa através do complexo tenase extrínseco. A ativação de FX (100nM) por FVIIa (1nM) na presença (■) das células P7 e na presença das células ST1 (▲)(concentração de células de 5.10
5 céls/ml). Os
dados são médias ± EP de três experimentos independentes.
Figura 14 – MVs derivadas de glioblastoma P7 promovem a ativação do FXa através do complexo tenase extrínseco. A ativação de FX (100nM) por FVIIa (1nM) na presença (■) das MVs originadas pelas células P7 e na presença das MVs originadas pelas células ST1 (▲)(concentração de MVs de 2.10
4 MVs/ml). Os dados são médias ± EP de três
experimentos independentes.
32
5.3. ATIVAÇÃO DA COAGULAÇÃO SANGUÍNEA IN VITRO
A fim de determinar se as linhagens celulares P7 e ST1 exibem
propriedades pró-coagulantes, foi testado primeiro o efeito destas linhagens no
tempo de recalcificação do plasma humano. Como representado na figura 15,
aumentando a concentração da linhagem celular P7, o tempo de recalcificação é
fortemente diminuído. Já quando observamos o gráfico correspondente a
linhagem celular ST1, não há uma mudança significativa. O mesmo foi feito com
as microvesículas liberadas por estas linhagens (figura 16) e o resultado foi
similar aos de suas células de origem.
Figura 15 – Ativação da coagulação sanguínea in vitro. Redução do tempo de
recalcificação do plasma humano depende da concentração de células quando comparadas ao controle somente com PBS. Foi observada a redução do tempo de coagulação apenas na presença das células P7. As células ST1 não apresentaram a capacidade de reduzir o tempo de recalcificação. Os dados representam a média ± EP de três experimentos independentes.
33
Figura 16 – Ativação da coagulação sanguínea in vitro com as MVs. Redução do tempo de recalcificação do plasma humano depende da concentração de microvesículas quando comparadas ao controle somente com PBS. Foi observada a redução do tempo de coagulação apenas na presença das MVs liberadas pelas células P7. As microvesículas liberadas pelas células ST1 não apresentaram a capacidade de reduzir o tempo de recalcificação significativamente. Os dados representam a média ± EP de três experimentos independentes.
5.4. AVALIAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA
A montagem tanto dos complexos tenase intrínseco e protrombinase é
suportado pela presença de fosfatidilserina (PS) na membrana externa das
células tais como nas plaquetas ativadas. Portanto, a presença de PS nas
linhagens celulares P7 e ST1 foi demonstrado por ensaios de citometria de fluxo
usando anticorpos anti-PS específicos (figura 17). Isto indica que as células P7
normalmente expõem PS na sua superfície, o que contribui para sua atividade
pró-coagulante.
34
Figura 17 – Análise da exposição de fosfatidilserina na membrana de células das linhagens P7 e ST1. A linha azul (P7) e linha verde (ST1) representa a fluorescência na
presença de anexina V-FITC e negativo para iodeto de propídio. A linha preta e rosa representa o controle na ausência de anexina V-FITC para as respectivas linhagens analisadas.
5.5. AVALIAÇÃO DA ATIVAÇÃO DA PROTROMBINA
A capacidade das células P7 e ST1 para ativar protrombina na presença de
FXa e seu cofator, FVa, é avaliada na figura 18, a qual mostra que sob estas
condições uma formação extremamente rápida de trombina foi observada com as
células P7, mas não foi observada com as células ST1. A ativação do zimogênio
foi diretamente correlacionada com a concentração do cofator.
35
Figura 18 – As células de glioblastoma P7 e ST1 promovem a formação de trombina através do complexo protrombinase. A ativação de protrombina humana (0,5
nM) por Fator Xa (10 pM) e Fator Va (1nM) foi realizada na presença das células P7 (■) ou na presença das células ST1(▲). A formação de trombina foi determinada adicionando-se o substrato cromogênico S-2238 (2mM) (Chromogenix, Mölndal, Suécia), e a densidade ótica medida a 405nm em um leitor de Elisa. As velocidades (mOD/min) obtidas nos primeiros minutos da reação foram usadas para calcular a quantidade de trombina formada. Os dados são médias ± DP de quatro experimentos independentes.
36
6. DISCUSSÃO
Várias evidências indicam que as propriedades procoagulantes das células
tumorais desempenham um papel importante na biologia do tumor, e esta
observação é particularmente evidente nos gliomas (GEAQUINTO et al, 2008).
Neste trabalho, nós identificamos um dos principais mecanismos
procoagulantes na linhagem celular de glioma de rato altamente agressiva, P7.
Estas células expressam TF funcional em sua superfície como demonstrado pelo
ensaio de citometria de fluxo e ensaios funcionais. Em contraste, a linhagem de
glioma de rato, ST1, apresenta TF em sua superfície, contudo ele não é funcional,
como demonstrado também pela citometria de fluxo e ensaios funcionais
respectivamente. De fato, a presença de TF nas linhagens de glioblastoma tem
sido documentada e os níveis da expressão e funcionalidade desta proteína tem
sido correlacionada com sua agressividade (AMIRKHOSRAVI et al., 1996). As
sub-linhagens celulares P7 e ST1 foram obtidas no laboratório da Drª Mari
Sogayar no Instituto de Química da Universidade de São Paulo, USP a partir de
uma linhagem de glioma de rato, C6 - que de acordo com trabalhos anteriores
possui TF em sua membrana externa e ativa, de forma exacerbada, a coagulação
sanguínea (FERNADES et al., 2006). A sub-linhagem P7 apresenta alto
crescimento in vivo, é resistente a corticoides e é de alta agressividade; em
contrapartida, a sub-linhagem ST1 apresenta baixo crescimento in vivo, não é
resistente a corticoides e é de baixa agressividade.
Nossos dados sugerem que a linhagem P7 recruta pequenas amostras de
FXa, resultando em um mecanismo incomum de atividade procoagulante, nos
quais as células ativam diretamente protrombina em trombina na ausência de
fatores exógenos da coagulação sanguínea adicionais. A capacidade das células
tumorais em recrutar FXa e promover a ativação de protrombina foi previamente
estudada na linhagem de melanoma B16-F10 (KIRSZBERG et al, 2005), de
adenocarcinoma de cólon (SAKAI et al, 1990) e outras. A trombina ativa adesão
de células tumorais a plaquetas, células endoteliais, e proteínas de matriz
subendotelial, aumenta o crescimento do tumor e estimula a angiogênese das
células tumorais (KIRSZBERG et al, 2009). Neste contexto, nós mostramos que
37
as linhagens P7 e ST1 expõem PS em sua superfície. A presença de PS é
essencial para a montagem dos complexos da coagulação levando a formação
aumentada de trombina.
A presença de fibrina no estroma do tumor tem sido documentada (NAGY
et al, 1989) e, de fato a fibrina fornece uma matriz que facilita a angiogênese
(FERNANDEZ et al, 2004). Neste contexto, a geração de trombina induzida por
TF com subseqüente deposição de fibrina está comumente referida como um dos
principais mecanismos dependentes da coagulação para a progressão do tumor
(GEAQUINTO et al, 2008).
Sendo assim, as células P7 possuem os principais componentes para
iniciar (TF) e propagar (uma membrana contendo PS) a coagulação sanguínea de
forma extremamente eficiente. A linhagem ST1 não possui esta característica por
não apresentar TF funcional.
O comportamento extremamente invasivo de tumores malignos de cérebro
leva a uma destruição considerável do tecido normal adjacente e é a principal
causa dos pobres resultados obtidos com as terapias disponíveis atualmente
(FERNANDES et al., 2006). A presença de necrose é o que tem diferenciado o
glioblastoma dos gliomas de menor grau, sendo inversamente relacionado a
sobrevida do paciente (BRAT, VAN MEIR, 2004), isto é, quanto mais alto o grau
menor é a sobrevida do paciente. Neste contexto, a oclusão vascular é um
achado frequente no glioblastoma humano e em várias linhas de evidência
indicam que a necrogênese está diretamente correlacionada com a ação pró-
coagulante do tumor.
Com exceção de leucemias, o mecanismo pelo qual células tumorais
exibindo TF ganham acesso ao sangue não foi claramente elucidada. Estudos
anteriores indicam que um mecanismo adicional para exposição de TF ao sangue
é através das microvesículas. Contudo, apenas poucos estudos tem relatado a
presença de microvesículas no sangue de pacientes com câncer, e nenhum tinha
especificamente investigado o papel de microvesículas carreando TF em sua
membrana na Síndrome de Trousseau, até agora (DEL CONDE et al., 2006).
Alguns testes realizados com as células ST1 e P7 foram realizados com as
microvesículas liberadas por elas, e os resultados encontrados foram similares
aos de suas células de origem, corroborando com estudos anteriores, que
38
mostram que as microvesículas apresentam características parecidas com as das
células que as liberaram (LIMA et al, 2009), inclusive a presença de TF em sua
membrana externa. Podemos perceber, então, que a presença de microvesículas
na corrente sanguínea é um complicador do quadro do paciente, causando
doença tromboembólica e a consequente oclusão dos vasos sanguíneos podendo
levar à morte.
Várias evidências indicam que as enzimas da coagulação saguinea
desempenham um significante papel não-hemostático na biologia tumoral através
da ativação de receptores ativados por proteases (PAR) (EVEN-RAM, 1998). A
clivagem de PAR-1 pela trombina tem sido envolvida na angiogênese
(TSOPANOGLOU, MARAGOUDAKIS, 2004). Além disso, FVIIa/FXa realizam
sinalização celular através de PAR-2, assim favorecendo a migração e invasão
como avaliado por ensaios in vitro (JIANG, 2004). Também, a clivagem de PAR-2
aumenta a produção de interleucina-8 pelas células tumorais. Esta citocina parece
desempenhar um importante papel nos gliomas (BRAT, VAN MEIR, 2004).
Portanto, a capacidade destas células tumorais para gerar altas concentrações de
enzimas da coagulação ganha importância (FERNANDES et al., 2006).
39
7. CONCLUSÃO
Com este estudo podemos concluir que, a linhagem P7 expressa de forma
constitutiva em sua membrana maior quantidade de TF, comparada com a
linhagem ST1; A linhagem de glioma mais agressiva, P7, foi a única capaz de
promover a montagem do complexo tenase extrínseco; A linhagem celular P7 foi
capaz de promover a ativação da coagulação sanguínea, de forma mais
significativa quando comparada com a linhagem menos agressiva, ST1;
As microvesículas derivadas das linhagens P7 e ST1 apresentam
características similares às suas células de origem, com relação ao efeito na
coagulação sanguinea.
De modo geral, conclui-se que os mecanismos pró-coagulantes descritos
aqui pelas células P7 e por suas microvesículas podem ser úteis para explorar
novos aspectos relativos ao papel das proteínas da coagulação do sangue no
tumor. Este potente comportamento pró-coagulante pode estar envolvido na
patogênese de gliomas de alto-grau, os quais estão frequentemente associados
tanto com distúrbios da coagulação local quanto sistêmica. Nós acreditamos que
terapias anti-TF podem provar ser particularmente úteis em casos de Síndrome
de Trousseau com níveis elevados de TF no sangue. Além disso, a investigação
do perfil de outras linhagens celulares e suas microvesículas pode ajudar ainda
mais a busca de novas estratégias terapêuticas contra tumores que afetam o
sistema nervoso central.
40
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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