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1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE SANTA CRUZ Rua Lourenço da Rocha, nº 128, bairro Centro, Santa Cruz/RN. CEP: 59.200-000. Fone/Fax: (84) 3291-6929 EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE SANTA CRUZ-RN O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, por sua Promotora de Justiça, com atuação junto a 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Santa Cruz, com fundamento nos preceitos insertos nos artigos 127 e 129 da Constituição Federal, artigo 25, incisos IV da Lei 8.625, de 12.02.93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), e demais dispositivos legais aplicados à espécie, vem perante Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA Com pedido de antecipação de tutela Em face do Município de Japi, pessoa jurídica de direito público interno, que tem como representante constitucional, o Exmo. Sr. Prefeito xxxxx, com endereço profissional situado na Rua xxxxx, na pessoa de quem deverão ser realizadas todas as intimações em caso de inexistência de um representante judicial do município, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas:

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EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE SANTA CRUZ-RN

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, por sua Promotora de Justiça, com atuação junto a 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Santa Cruz, com fundamento nos preceitos insertos nos artigos 127 e 129 da Constituição Federal, artigo 25, incisos IV da Lei 8.625, de 12.02.93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), e demais dispositivos legais aplicados à espécie, vem perante Vossa Excelência propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICACom pedido de antecipação de tutela

Em face do Município de Japi, pessoa jurídica de direito público interno, que tem como representante constitucional, o Exmo. Sr. Prefeito xxxxx, com endereço profissional situado na Rua xxxxx, na pessoa de quem deverão ser realizadas todas as intimações em caso de inexistência de um representante judicial do município, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas:

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I - DOS FATOS

O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, buscando apurar a realidade da atenção pré-natal e obstétrica, puerperal e neonatal no âmbito do Município de Japi, instaurou em 22 de agosto de 2012 o Inquérito Civil Público n. 31/2012, através da Portaria nº 31/2012 (fls. 02/05), e na mesma data, foi expedida a Recomendação nº 11/2012 para que fossem estruturados os serviços de saúde que realizam a atenção ao pré-natal, parto, recém-nascido e ao puerpério no âmbito da competência municipal (fls. 06/11).

Foi expedido ofício requisitório nº 626/2012 solicitando informações à Secretaria Municipal de Saúde sobre assistência à saúde no município referente ao atendimento do pré-natal até a Atenção Obstétrica, v.fls. 26/27.

A Secretaria Municipal de Saúde de Japi, por meio do ofício nº 060/2012, datado de 06/11/2012, encaminhou as informações solicitadas, apontando que o município não possuía serviço de atenção obstétrica de alto risco por não possuir UTI e UCI, sendo as parturientes encaminhadas para o Hospital Universitário Ana Bezerra, em Santa Cruz/RN. Além disso informaram que quanto aos exames ultrassonográficos, estes são realizados mensalmente em sua unidade mista através da contratação de um profissional médico ultrassonografista, como também garantem a realização do teste do pezinho, sendo este ser realizado pela equipe de enfermagem da Unidade Mista Torquata Leopoldina da Costa (fls. 31/33).

Consta das fls. 47/48 ofício oriundo do Hospital Universitário Ana Bezerra, informando que existe pactuação com os municípios da região do Trairi para execução de serviços de atenção à saúde de nível ambulatorial e hospitalar de usuários do SUS conforme Convênio que consta às fls. 49/81.

Em resposta ao Ofício n° 201/2013- 1ª PmJSC (fl. 42), datado de 05 de fevereiro de 2013, a Secretaria Municipal de Saúde por meio do Ofício n° 009/2013 (fl. 84), expedido em 22 de março de 2013, esclareceu que o município não realiza parto normal e cirúrgico de baixo risco, sendo as parturientes referenciadas para o município de Santa Cruz/RN, tendo como prestador o Hospital Universitário Ana Bezerra, conforme pactuado. Ainda, informa que dispõe de três ambulâncias, das quais duas estão em bom estado e a outra não apresenta condições de uso.

Relatório circunstanciado emitido pelo assessor ministerial David Hamilton Gomes informa as condições de funcionamento das unidades básicas de saúde, utilizando como instrumento o check list produzido pelo CAOP Saúde (fls. 93/97). Foram visitadas 04 (quatro) unidades de saúde: Unidade Mista Torquata Leopoldina da Costa, Unidade Básica do Centro (por amostragem), Unidade Básica Alto Bela Vista e Unidade Básica da zona rural.

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Do relatório constata-se que as instalações físicas das quatro unidades de saúde apresentam estrutura regular, dispondo dos equipamentos necessários ao funcionamento, além de pessoal qualificado. Ademais, constatou-se algumas problemáticas estruturais na Unidade Básica do Centro, tais como a existência de apenas um banheiro para funcionários e pacientes, não apresentando condições de acessibilidade, bem como fora constatado a existência de piso inadequado nas salas da unidade.

De posse dessas informações, despachou-se determinando o envio de minuta de Termo de Ajustamento de Conduta ao Prefeito, para que informasse se tinha ou não interesse em assinar (fls. 111/116), o que foi cumprido com a expedição do Ofício n.1090/13, datado de 28 de novembro de 2013, v.fls.117.

Quanto as irregularidades, a Secretaria Municipal de Saúde não se manifestou sobre as providências e também o Prefeito não se pronunciou sobre a possibilidade de assinatura do TAC.

Às fls. 129 e 152 foram juntados os Ofícios CREMERN n° 414/2014 e n° 411/2014 – DEFIS, expedidos em 26 de maio de 2014, nos quais o Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte através do Departamento de Fiscalização (DEFIS), encaminha relatórios de vistorias realizadas na Unidade Básica de Saúde Dr. Antônio Batista Barros e na Unidade Mista de Saúde Torquata Leopoldina da Costa, em Japi-RN.

A respeito da inspeção na Unidade Básica de Saúde Dr. Antônio Batista Barros, consta o termo de fiscalização 19/2014/RN (fls. 130-151), do qual depreende-se tais deficiências: recepção com área física inadequada, subdimensionada, sem climatização e com poucas cadeiras para os pacientes; banheiro único para ambos os sexos, servindo tanto para funcionários como para pacientes, bem como inexistência de acessibilidade para pacientes com necessidades especiais; condições de acessibilidade da unidade não apresentam fluxo de atendimento adequado; e cozinha com péssimas condições de higiene e iluminação.

Consoante a vistoria realizada na Unidade Mista de Saúde Torquata Leopoldina da Costa, termo de fiscalização 18/2014/RN (fls. 153-160), foram elencadas as seguintes problemáticas: deficiência de alguns equipamentos e materiais; higienização de alguns ambientes ineficientes; e sala de parto desativada, utilizada somente pela parturiente no período expulsivo, caso contrário será encaminhada para o Hospital Universitário Ana Bezerra.

Desta feita, após o monitoramento deste órgão ministerial das ações da Secretaria Municipal de Saúde tomadas para resolver os problemas relacionados à oferta regular do pré-natal e a não realização de partos de risco habitual, bem como realização de diversas providências ministeriais com o objetivo de solucionar o problema (audiências, recomendações, proposta de termo de ajustamento de conduta sem disposição do prefeito em firmá-lo), sem haver emergido uma solução

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corretiva adequada à gravidade do contexto (ressaltando-se o lapso temporal entre a inspeção realizada pela Promotoria e aquela feita pelo CREMERN sem a constatação de melhorias nesse período), busca-se a via judicial como forma de assegurar maior efetivação do direito à saúde das gestantes do Município de Japi/RN.

II- DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROPOSITURA DA AÇÃO

A Constituição Federal, em seu art. 129, ao tratar das funções institucionais do Ministério Público, dispõe no inciso II, que a ele cabe zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos aos direitos constitucionalmente assegurados, devendo nesse intento promover as medidas necessárias à sua garantia.

A saúde é compreendida como um direito social alçado a categoria de direito fundamental, além de ser reconhecido pelo artigo 196 da Constituição como de relevância pública, encaixando-se dentre os direitos que merecem a proteção do Ministério Público. Isso porque, por se tratar de defesa do direito à saúde, implica, em última análise, em um pressuposto inarredável do direito fundamental à própria vida, bem máximo e primeiro do indivíduo.

Prosseguindo, o inciso III do mesmo artigo expressa um dos instrumentos hábeis a essa garantia, determinando ser o Ministério Público parte legítima para promover o inquérito civil e a ação civil pública para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Reforçando essa atribuição ministerial, a Lei nº 7.437/75, que disciplina a ação civil pública e foi recepcionada pela Lex Mater de 1988, também prevê o Ministério Público como parte legítima para a proposição da Ação Civil Pública, para a tutela dos bens e interesses listados em seu artigo 1º.

Ademais, essa mesma atribuição é consagrada no inciso IV, do art. 25, da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), ao impor a incumbência de promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos.

Igualmente, a Lei Complementar Estadual n.º 141/96 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte), em consonância ao comando constitucional já comentado e à Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, legitima o Parquet, em seus artigos 62, inciso I e 67, inciso IV, alínea “d”, a manejar a ação civil pública na defesa de interesses difusos e coletivos.

Ora, se a Lei Maior preceitua que “a saúde é direito de todos e dever do Estado” (art. 196), qualificando as ações e serviços de saúde como “de relevância

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pública,” cujo efetivo respeito cabe ao Ministério Público velar – instituição esta à qual incumbe não só a defesa dos interesses difusos e coletivos (art. 129, inciso III, CF/88), mas também dos individuais indisponíveis (art. 127, caput, CF/88), dentre os quais há de se inserir, forçosamente, o direito à saúde e, consequentemente, à vida –, não se tem como negar a pertinência da legitimidade ativa do Parquet, mormente quando a defesa de tal ordem de interesses seja inerente a toda a coletividade, como no caso vertente.

Assim, tendo a presente ação o objeto de resgatar o respeito ao disposto nos artigos 6º, caput – proteção à maternidade, 196 e 197 da Constituição Federal, determinando ao Poder Público que envide esforços no sentido de fornecer ações e serviços de saúde à população; bem como que, no caso em espeque, objetiva o pronto atendimento pelo Município de Japi às gestantes, especialmente no que concerne ao acesso adequado ao pré-natal e à garantia da integralidade da atenção materno-infantil, diretamente ou por meio de pactuação, revela-se indiscutível a legitimidade do Ministério Público para a sua propositura, na defesa dos interesses difusos dos usuários do SUS, que têm os seus direitos violados, diante da não disponibilização, de maneira regular, pelo município, de atenção materno-infantil.

III - DA LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO

Já no preâmbulo constitucional, denota-se que o Estado brasileiro possui, entre as metas a serem alcançadas, o bem-estar, visando a consolidação de um Estado Democrático. E entre as várias facetas que integram o objetivo do bem-estar, indiscutivelmente encontra-se o respeito ao direito à saúde.

No que toca à saúde, mais precisamente em relação à competência administrativa, entendida esta na tarefa de fazer concretizar o comando constitucional que trata o tema como direito social, o artigo 196 da CF determina que a sua efetivação é dever do Estado:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Para regulamentar os aspectos relacionados ao direito à saúde, foi instituída a Lei 8.080/90, chamada de Lei Orgânica da Saúde, a qual no seu artigo 7º, determina a descentralização dos serviços de saúde, priorizando a sua municipalização:

Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios; (…)

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Essa Lei Federal trouxe elementos norteadores para a garantia de acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, tendo como base a descentralização da prestação dos serviços de assistência de forma integral e hierarquizada, possibilitando o atendimento ao cidadão no local mais próximo de seu ambiente.

Nesse esteio, assim dispõe a Lei 8.080/90 no que diz respeito às competências municipais:

Art. 18. À direção municipal do Sistema Único de Saúde - SUS compete:I – planejar, organizar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde e gerir e executar os serviços públicos de saúde; [...]V – dar execução, no âmbito municipal, à política de insumos e equipamentos para a saúde; […]

A Política Nacional de Saúde do Ministério da Saúde, dessa forma, está centrada na municipalização da saúde, em que todos os municípios brasileiros são os responsáveis diretos por essa assistência para sua população residente, com apoio técnico e financeiro dos estados e da união.

Corroborando essa política, a Portaria nº 399/GM, de 22 de fevereiro de 2006, que lançou o Pacto pela Saúde 2006 – Consolidação do SUS -, e aprova as Diretrizes Operacionais do referido Pacto, quanto às responsabilidades gerais da gestão do SUS, institui para os municípios os seguintes deveres:

Todo município é responsável pela integralidade da atenção à saúde da sua população, exercendo essa responsabilidade de forma solidária com o estado e a união;Todo município deve:[...] assumir a gestão e executar as ações de atenção básica, incluindo as ações de promoção e proteção, no seu território; assumir integralmente a gerência de toda a rede pública de serviços de atenção básica, englobando as unidades próprias e as transferidas pelo estado ou pela união; [...] organizar o acesso a serviços de saúde resolutivos e de qualidade na atenção básica, viabilizando o planejamento, a programação pactuada e integrada da atenção à saúde e a atenção à saúde no seu território, explicitando a responsabilidade, o compromisso e o vínculo do serviço e equipe de saúde com a população do seu território, desenhando a rede de atenção e promovendo a humanização do atendimento; organizar e pactuar o acesso a ações e serviços de atenção especializada a partir das necessidades da atenção básica, configurando a rede de atenção, por meio dos processos de integração e articulação dos serviços de atenção básica com os demais níveis do sistema, com base no processo da programação pactuada e integrada da atenção à saúde; [...] garantir a estrutura física necessária para a realização das ações de atenção básica, de acordo com as normas técnicas vigentes; […].

Com efeito, o município é erigido à condição de ente executor da política de saúde por excelência, adequando as diretrizes gerais do SUS às suas

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peculiaridades, visando dar resolutividade aos problemas de saúde que existem em sua circunscrição territorial.

Observa-se, assim, que a regra é a descentralização, entendida esta como a concessão de autonomia administrativa ao gestor, em sua esfera de atuação, para detectar e resolver suas necessidades na seara sanitária.

Considerando-se que a atenção materno-infantil é uma das linhas prioritárias de assistência à saúde preconizadas pelo SUS e que devem ser disponibilizadas pelo município, existindo inclusive programa específico do Ministério da Saúde voltado ao fomento dessa temática, o Projeto Rede Cegonha, o qual, dentre outras medidas, transfere recursos financeiros aos municípios cadastrados a fim de que estes estruturem sua rede (registre-se que o município de Japi esta cadastrado e recebendo tais recursos), fica claro que é de sua responsabilidade disponibilizar a sua população uma assistência integral e de qualidade.

A Portaria nº 1.459/2011, que institui a Rede Cegonha, dispõe que:

Art. 9°. Para operacionalização da Rede Cegonha cabe:III - ao Município, por meio da Secretaria Municipal de Saúde: implementação, coordenação do Grupo Condutor Municipal da Rede Cegonha, financiamento, contratualização com os pontos de atenção à saúde sob sua gestão, monitoramento e avaliação da Rede Cegonha no território municipal.

Por essas razões, resta patente a legitimidade do município de Japi em figurar no polo passivo da demanda, pois a ele, como ficou demonstrado, cabe a responsabilidade pela estruturação de sua rede de serviços de saúde, principalmente no que pertine à atenção materno-infantil.

IV – DO DIREITO QUE SE BUSCA TUTELAR

O direito à saúde, tal como assegurado na Constituição de 1988, configura direito fundamental de segunda geração. Nesta geração, estão os direitos sociais, culturais e econômicos, que se caracterizam por exigirem prestações positivas do Estado.

Não se trata mais, como nos direitos de primeira geração, de apenas impedir a intervenção do Estado em desfavor das liberdades individuais, mas sim de exigir do Estado que materialize esses direitos por meio de políticas de execução.

Além disso, a Constituição faz menção expressa, em diferentes momentos, a proteção à maternidade e à infância, do que se infere a especial atenção que deve ser dada às linhas de cuidado voltadas à assistência materno-infantil.

Nesse contexto, é o que afirmam o texto dos seus artigos 6º e 201, inciso II:

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Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: […] II - proteção à maternidade, especialmente à gestante.

Visando concretizar esses mandamentos constitucionais, o legislador estabeleceu preceitos que tutelam e garantem o direito à saúde, por meio da Lei Orgânica da Saúde, a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990.

Ela estabelece, em seu art. 2º, que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Poder Público prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, assegurando acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. Bem como incumbe ao município, em seu artigo 18, a competência para executar as ações e serviços de saúde de acordo com as políticas nacionais sanitárias.

Essa execução deve ocorrer observando-se os princípios expressamente previstos na Lei do SUS, no seu artigo 7º, com destaque para a universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; integralidade e igualdade da assistência à saúde. Além de, como já mencionado, descentralização dos serviços para o município.

Dentre as ações e serviços de saúde trazidos pela legislação, estão abrangidas as ações de cuidado e proteção à gestante e ao neonato, a assistência materno-infantil, existindo programas específicos sobre a temática visando à prevenção dos riscos que possam advir da gestação tanto para a mãe quanto para a criança, assim como buscando a humanização do pré-natal, parto e puerpério, os quais devem ser tidos como prioritários como forma de reduzir as altas taxas de mortalidade materna e fetal no país como um todo e, especialmente, nas regiões norte/nordeste.

IV.1 – Importância da atenção materno - infantil como mecanismo de redução da mortalidade materna e neonatal

Além da proteção constitucional e infraconstitucional do direito à saúde das mulheres e crianças, tem-se dentre os oito “objetivos do milênio” estabelecidos no ano 2000 pela Organização das Nações Unidas (ONU), a REDUÇÃO DA MORTALIDADE INFANTIL, em pelo menos 15% até 2015, e a MELHORIA DA SAÚDE DAS GESTANTES, com vistas à diminuição das desigualdades.

A redução da mortalidade materna e infantil restou inserida, ao lado de apenas cinco outras prioridades, nas ações que integram o Pacto pela Vida/Pacto pela Saúde de âmbito nacional, em sua primeira edição, no ano de 2006, por ato deliberativo dos três entes federativos, na CIT/Ministério da Saúde, visando

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justamente impulsionar as linhas de cuidados essenciais voltados a esse tema, sendo reafirmada na edição do Pacto no ano de 2009.

No Rio Grande do Norte, a maioria dos óbitos de recém-nascidos e dos óbitos maternos ocorrem por causas evitáveis, em sua maioria relacionadas à falta de atenção adequada à mulher durante a gestação e parto, e também ao feto e ao bebê.

Essa falha no atendimento à gestante e ao neonato interfere diretamente nos níveis de óbito, pois o acompanhamento regular da gestação por meio do pré-natal, impacta de forma perceptível nos índices de mortalidade ao prevenir riscos e propiciar o tratamento adequado das intercorrências durante a gestação e o parto.

Diante disso, mostra-se imprescindível a exigência feita por meio desta ação, visto que o pré-natal é indispensável por reduzir as chances de mortes maternas por causas obstétricas, bem como neonatais por causas ligadas à gestação e ao parto. Devendo ser cobrado do município quando a atenção pré-natal, obstétrica, neonatal e puerperal são negligenciadas.

IV.2 - Rede Cegonha e a estruturação da atenção materno-infantil

Cumpre ainda destacar aqui com mais ênfase a existência do programa do Governo Federal – Ministério da Saúde – para enfrentamento das questões afetas à atenção materno-infantil e que deve ser seguido pelos municípios na estruturação de sua rede, por meio de adesão ao projeto. Como já linhas linhas atrás, foi nominado de Rede Cegonha.

A Rede Cegonha é uma estratégia do Ministério da Saúde, instituída através da Portaria GM/MS nº 1.459, de 24 de junho de 2011, para assegurar a melhoria no acesso, na cobertura e na qualidade do acompanhamento do pré-natal, da assistência ao parto e puerpério, e é operacionalizada pelo SUS, fundamentada no princípio da humanização da assistência.

Nessa linha, a instituição da referida estratégia tem o objetivo de assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como à criança o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e desenvolvimento saudáveis, em consonância com o artigo 1º, da Portaria nº 1.459/2011.

Mais adiante, em seu artigo 4º, a portaria determina que a rede deve ser organizada de modo que se tenha garantido o provimento contínuo de ações de atenção à saúde materna e infantil para a população de determinado território, mediante a articulação dos distintos pontos de atenção à saúde, do sistema de apoio, do sistema logístico e da governança da rede de atenção à saúde, seguindo as seguintes diretrizes:

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I - garantia do acolhimento com avaliação e classificação de risco e vulnerabilidade, ampliação do acesso e melhoria da qualidade do pré-natal;II - garantia de vinculação da gestante à unidade de referência e ao transporte seguro;III -garantia das boas práticas e segurança na atenção ao parto e nascimento;IV - garantia da atenção à saúde das crianças de zero a vinte e quatro meses com qualidade e resolutividade; eV -garantia de acesso às ações do planejamento reprodutivo.

Para a estruturação da rede deve-se ter por base a atenção básica em saúde e buscar-se o seu fortalecimento, na perspectiva de uma rede de atenção integrada, em todos os seus princípios, de modo que tenha capacidade cada vez mais ampliada de cuidar da gestante de forma integral, a partir de quatro componentes: o Pré-natal; o Parto e Nascimento; Puerpério e Atenção Integral à Saúde da Criança; e Sistema Logístico: Transporte Sanitário e Regulação.

Além do que a Rede Cegonha concretiza-se por meio da adesão de municípios, que a partir da correta alimentação dos sistemas informacionais do Ministério da Saúde, habilitam-se para receber recursos federais voltados às ações específicas do programa, de acordo com cada um dos componentes.

Diante disso, o município deve disponibilizar em seu território, pelo menos, o componente pré-natal para gestações de risco habitual e pactuar a gestação de alto risco e a atenção obstétrica (partos) com outros municípios, se houver necessidade, para garantir que a assistência materno-infantil seja integral, principalmente, no caso de adesão a Rede Cegonha e o recebimento de recursos.

Ocorrendo a pactuação acima citada que, em linhas gerais, é o encaminhamento, previamente acordado entre entes, de pacientes para realização de parto outros municípios, o ente municipal encaminhador deve propiciar também o transporte regular e adequado das gestantes para os municípios executores, prioritariamente por meio de ambulâncias próprias.

Nessa perspectiva, existem vários aspectos a serem observados para se considerar o pré-natal qualificado. Esses aspectos complementam-se e representam marcadores de qualidade, que deverão ser buscados por todos no âmbito da Rede Cegonha. São eles:

I - Componente PRÉ-NATAL:a) realização de pré-natal na Unidade Básica de Saúde (UBS) com captação precoce da gestante e qualificação da atenção;b) acolhimento às intercorrências na gestação com avaliação e classificação de risco e vulnerabilidade;c) acesso ao pré-natal de alto de risco em tempo oportuno;d) realização dos exames de pré-natal de risco habitual e de alto risco e acesso aos resultados em tempo oportuno;e) vinculação da gestante desde o pré-natal ao local em que será realizado o parto;

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f) qualificação do sistema e da gestão da informação;g) implementação de estratégias de comunicação social e programas educativos relacionados à saúde sexual e à saúde reprodutiva;h) prevenção e tratamento das DST/HIV/Aids e Hepatites; ei) apoio às gestantes nos deslocamentos para as consultas de pré-natal e para o local em que será realizado o parto, os quais serão regulamentados em ato normativo específico.

Da investigação realizada no município de Japi, constatou-se a adesão do município a Rede Cegonha e também o recebimento por ele de parcelas referentes ao projeto, o que obriga o município a programar e executar as ações da assistência materno-infantil, sempre tendo por norte a portaria de instituição da rede.

No sentido inverso, constata-se no município, apesar da adesão, deficiências na prestação dos serviços, principalmente no concernente à estrutura física das unidades, conforme relatórios de inspeções realizadas nas unidades de saúde do município pela Promotoria e pelo CREMERN.

Esta ação, portanto, volta-se especialmente à questão do pré-natal em Japi e à garantia do transporte das gestantes para atendimento dos demais componentes da assistência em outros municípios, porém é preciso atentar para a realidade existente no município de realização de parto quando a gestante já esta no período expulsivo do bebê, como afirma a própria gestão, o que por si só já exige a adequação do serviço de saúde local.

IV.3 – Da situação da assistência materno-infantil no Município de Japi/RN

Os fatos narrados demonstram que, ao contrário do que dispõe a legislação constitucional e infraconstitucional, o Sistema Único de Saúde, por intermédio de seu órgão com atribuição no Município de Japi, não tem fornecido o integral e adequado atendimento à gestante, na medida em que não oferece de forma completa o pré-natal, o fazendo apenas parcialmente em unidades de saúde que não estão adequadas a prestação desse serviço.

É o que se percebe da análise tanto do relatório de inspeção às fls. 93/97, realizada pela Promotoria na unidade básica de saúde do centro, quanto da fiscalização feita pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte - CREMERN (fls. 129/151), destacando-se: carência de materiais educativos, com prejuízo na realização dos programas educativos, não existindo grupo de gestantes; bem como ausência de computador, o que dificulta a gestão da informação, fator importante para o bom andamento da estratégia da Rede Cegonha, a qual o município de Japi aderiu. Quanto à estrutura física, o mais grave se mostra na ausência de piso adequado na unidade.

E, ainda, verificou-se a ausência de alguns equipamentos necessários às consultas; de normas e rotinas técnicas de limpeza; de central de esterilização; de um banheiro exclusivo para servidores; e de descarte com segurança ambiental do lixo.

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Já quanto à Unidade Mista Torquata Leopoldina da Costa, através do termo de fiscalização 18/2014/RN (fls. 152/160), apresentado pelo CREMERN, observou-se deficiência de recursos humanos; que a farmácia não apresenta estrutura adequada, possuindo caixas de medicamentos pelo chão; e que há uma sala de parto equipada com mesa de parto, foco, sonar, e berço aquecido quebrado, porém encontra-se desativada.

Ademais, embora o município afirme que não disponibiliza a atenção obstétrica, informou que utiliza a sala de parto mencionada para atendimento às gestantes que chegam à unidade em período expulsivo e isso já caracteriza uma forma de atendimento obstétrico. Devendo, portanto, ser realizada de acordo com os ditames legais e as orientações do MS por meio de suas portarias e programas.

Por essa razão, é preciso exigir-se do município a adequação da sua sala de parto, para receber e realizar o atendimento das gestantes em período expulsivo de forma qualificada e segura, observando as regras da Rede Cegonha e da RDC nº 36/2004, da ANVISA, quanto às salas de parto.

Segundo a RDC 36/2008, que dispõe sobre o regulamento técnico para funcionamento dos serviços de atenção obstétrica e neonatal, os serviços que prestam assistência ao parto normal sem distócia – parto sem cortes, sem intervenções invasivas, é tão somente o ato natural da expulsão do bebê - devem ter disponíveis os seguintes equipamentos e materiais:

1 - estetoscópio clínico; 2 - esfigmomanômetro; 3 - fita métrica; 4 - estetoscópio de Pinard ou sonar (detector fetal); 5 - amnioscópio; 6 - mesa auxiliar; 7 - foco de luz móvel; 8 - instrumental para exame ginecológico, incluindo espéculo vaginal e pinça de Cheron; 9 - material necessário para alívio não farmacológico da dor e de estímulo à evolução fisiológica do trabalho de parto, tais como: a) barra fixa ou escada de Ling; b) bola de Bobat ou cavalinho; 10 - instrumental para parto normal; 11 - mesa para refeição; 12 - camas hospitalares reguláveis ou cama para pré-parto, parto e pós-parto, 01 (uma) por parturiente; 13 - poltrona removível destinada ao acompanhante, 01 (uma) para cada leito; 14 - relógio de parede com marcador de segundos, 01 (um) por ambiente de parto.

Questão que também merece uma tutela jurisdicional é a garantia às gestantes de transporte adequado e regular aos municípios em que realizarão o pré-

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natal de alto risco e o parto, o que deve ser feito por meio de ambulâncias pertencentes ao município de Japi.

Conforme informações colhidas nos autos do IC, verificou-se que o município dispõe de 3 ambulâncias, mas apenas duas em condições de uso. Levando-se em conta que o município pactou todos os seus partos para outros municípios, é imprescindível a realização desse transporte de maneira segura e eficiente, o que requer que o ente municipal disponha de ambulâncias em bom estado de conservação para utilizar quando demandadas, sem nenhum prejuízo para as usuárias.

Assim, deve ser mantido o número de ambulâncias existentes em funcionamento (três), com a compra de nova ambulância, em face da falta de condições de uso de uma das disponíveis.

Diante disso, constata-se que o município disponibiliza o serviço, porém de forma deficiente, mostrando-se relevante invocar o princípio da eficiência da Administração Pública, a qual não cumpre apenas realizar o serviço, mas fazê-lo de modo a conseguir o melhor resultado possível.

Não há dúvidas, portanto, quanto ao dever do Município de Japi de garantir às gestantes a realização do pré-natal com qualidade e segurança sanitária, impondo-se a adequação física imediata de suas unidades de saúde, bem como a dotação dos equipamentos e materiais necessários à correta prestação do serviço, e ainda disponibilização de transporte sanitário seguro.

V- DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

Acerca da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional pleiteada, dispõe o artigo o 273 do Código de Processo Civil:

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

De acordo com o dispositivo acima, os pressupostos autorizadores para concessão da tutela antecipatória compreendem a fumaça do bom direito e o perigo da demora.

Em sede de ação civil pública, essa medida pode também ser adotada, tendo por base o artigo 12 da Lei nº 7.347/85, que autoriza a concessão de medida liminar, nos seguintes termos: “poderá o Juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo”.

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De igual modo, mister que estejam presentes os requisitos do fumus boni iuris, que vem a ser a plausibilidade do direito substancial invocado e do periculum in mora, configurado em um dano potencial, um risco que corre o processo principal de não ser útil ao interesse demonstrado pela parte, em caso de demora na sua apreciação.

O fumus boni iuris, ou seja, a plausibilidade do direito invocado, está aqui representado pela inobservância das disposições contidas na Constituição Federal, artigos 1°, incisos II e III, e artigos 196 e seguintes, além das determinações da Lei 8.080/90, ao constatar-se a negligência do município na prestação dos serviços sanitários, especialmente referentes à gestante, dever este que encontra amparo constitucional e legal.

Outrossim, resta demonstrado tal requisito, diante das deficiências do serviço público municipal que presta atenção pré-natal, no que concerne à estrutura física, já ocorrendo outras tentativas por parte da Promotoria de estruturar o serviço do município de Japi extrajudicialmente, sem sucesso.

De outro lado, o periculum in mora é patente, vez que existe a potencialidade de danos emergirem sobre essas pacientes e sua futura prole, em razão da demora ou dificuldade de garantir o atendimento pré-natal adequado e de qualidade, com probabilidade contínua e ininterrupta de produção de danos à gestante e seu bebê, até porque as unidades, apesar das graves deficiências, continuam ofertando atendimento diariamente, ou seja: a profusão de danos e/ou mesmo o potencial lesivo desse contexto fático se renova diariamente.

Nesse sentido, já decidiu o juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal, em sede de tutela antecipada, na Ação Civil Pública que tramita sob o nº 0806270-21.2013.8.20.0001, que trata de situação análoga a da presente ação, conforme trecho da decisão que se transcreve abaixo:

A Lei nº 8.080/90, que criou o Sistema Único de Saúde, face às exigências do parágrafo único do art. 198, da CF, reforça a obrigação do Estado, latu sensu, à política de gestão de aplicação de recursos mínimos para as ações e serviços públicos de saúde. No mesmo sentido, a jurisprudência do e. Supremo Tribunal Federal que reconhece o dever do Estado, modo indistinto por todos os seus entes federados - União, Estados, Distrito Federal e Municípios -, de assegurar o direito à saúde, na forma dos artigos 6º, 23, II e 196, todos da Constituição Federal. Desta forma, o Município de Natal tem obrigação de incluir em seu orçamento os recursos necessários para a saúde, especialmente para permitir o funcionamento das unidades de pronto atendimento tão necessárias à população. Tal não significa interferência de uma esfera de poder em uma outra, mas tão somente o cumprimento da norma constitucional, tanto que a melhor doutrina assim se posiciona: "A harmonia entre os poderes verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. De outro lado, cabe assinalar que nem a divisão de função entre os órgãos nem sua independência são absolutas. Há interferências, que visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à busca do

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equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados."(in José Afonso da Silva "Curso de Direito Constitucional Positivo", Malheiros, 9ª.ed., 1993, p. 101) Assim sendo, a pretensão antecipatória deverá ser acolhida, para que o Município de Natal promova o atendimento médico necessário à população, desta feita, através de adoção de medidas que permitam o funcionamento da unidade de pronto atendimento.

O mesmo juízo, noutra decisão manteve o mesmo entendimento (ACP nº 0801408-75.2011.8.20.0001):

Pois bem, conforme se dessume dos autos, o Ministério Público elencou a série de irregularidades nas obras de reforma do Posto de Saúde e o inadequado serviço prestado a população. Desse modo, em juízo inicial, restando suficientemente demonstrada a verossimilhança jurídica favorável à pretensão da autora, diante da inercia do titular da Secretaria Municipal de Saúde em prestar informações sobre o fato e pedido inicial, impõe-se ao Município de Natal a obrigação de prestação de serviço de saúde eficiente e de qualidade a toda a população da comunidade da Africa, na Redinha. Diante do exposto, defiro a antecipação dos efeitos da tutela requerida quanto ao pedido formulado na inicial.

Com isso, resta demonstrado que todos os requisitos legalmente exigidos para o deferimento da antecipação do provimento jurisdicional encontram-se presentes.

VI - DOS PEDIDOS

Diante do exposto, o Ministério Público vem requerer:

1) O deferimento da tutela antecipada, em todos os seus termos, mediante prévia oitiva da Fazenda Pública, no prazo de 72 horas, de acordo com o art. 2º da Lei nº 8.437/92, da seguinte forma:

1.A) Determinar ao Município de Japi que elabore o plano para execução das ações do Projeto Rede Cegonha, no que pertine ao componente pré-natal, tendo em vista os recursos recebidos provenientes de sua adesão, em até 30 dias;

1.B) Determinar ao Município de Japi, por seu Prefeito e sua Secretaria de Saúde, inclusive com intimação pessoal de ambos, no prazo de até cento e vinte dias e de forma contínua, garantam o pleno funcionamento da Unidade de Saúde do Centro e da Unidade Mista Torquata Leopoldina da Costa, assegurando os equipamentos, medicamentos, insumos e recursos humanos necessários ao atendimento eficaz e satisfatório à saúde das gestantes, nos seguintes termos:

1.BI) Quanto à estrutura física:

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a) Na Unidade de Saúde do Centro:

– Adequação do piso, tornando-o estável e antiderrapante;– Construção de banheiro exclusivo para servidores;– Dotar a unidade de sala de preparo de pacientes e sala de curativos.

b) Na Unidade Mista:

– Correção de infiltração e mofo nas paredes;– Adequação das instalações elétricas e hidráulicas;– Correção da climatização da farmácia e organização do ambiente, com a retirada das caixas de medicamentos do chão, instalando prateleiras para estocá-los corretamente;– Reativação da sala de parto, para adequada acolhida das gestantes no período expulsivo, adquirindo os itens faltantes para a realização de um parto sem distócia, nos termos da RDC 36/2008, devidamente listados.

1.BII) Quanto aos equipamentos, medicamentos, insumos e recursos humanos necessários ao atendimento eficaz e satisfatório:

a) Na Unidade de Saúde do Centro:

– guarnecer de um computador destinado à gestão das informações, principalmente no que concerne à alimentação dos sistemas informacionais da Rede Cegonha, com acesso a internet;– fornecer material educativo, criando e mantendo sem interrupção o grupo de gestantes;– dotar o consultório ginecológico de: banqueta giratória ou mocho, buzina de Kobo, glicosímetro, lanterna clínica para exame, negatoscópio ou outro meio digital para leitura de imagem, e papel toalha/sabonete líquido;– manejo correto do descarte do lixo, de acordo com a RDC nº 306, de 7 de dezembro de 2004, que dispõe sobre o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde.

b) Na unidade mista:

– dotar a unidade de recursos humanos suficientes para fechar a escala de plantões de profissionais médicos, pois em alguns dias da semana o período diurno fica desfalcado;– providenciar, e manter regularmente, a higienização adequada dos ambientes da unidade.

1.D) Que seja intimado pessoalmente o Senhor Secretário Municipal de Saúde, para cumprir com exatidão os provimentos mandamentais dessa decisão com observância dos prazos determinados por Vossa Excelência, sob pena de constituir

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ato atentatório ao exercício da jurisdição, nos termos do parágrafo único do art. 14 do Código de Processo Civil, e pagamento de multa no valor de RS 1.000,00 (Hum mil reais) por dia de descumprimento, sem prejuízo das eventuais sanções criminais, civis e administrativas;

2) Requer, também, que se determine a citação do Município de Japi, através de seu Procurador Geral, ou de quem o represente judicialmente, para responder a presente ação no prazo legal, sob pena de revelia;

3) No mérito, requer seja confirmada a tutela antecipada concedida, em todos os seus termos, para condenar o Município de Japi, através de sua Secretaria de Saúde, a:

3.A) Adequar a estrutura física das suas unidades de saúde, nos seguintes termos:

a) Na Unidade de Saúde do Centro:

– Adequação do piso, tornando-o estável e antiderrapante;– Construção de banheiro exclusivo para servidores;– Dotar a unidade de sala de preparo de pacientes e sala de curativos.

b) Na Unidade Mista:

– Correção de infiltração e mofo nas paredes;– Adequação das instalações elétricas e hidráulicas;– Correção da climatização da farmácia e organização do ambiente, com a retirada das caixas de medicamentos do chão, instalando prateleiras para estocá-los;

– Reativação da sala de parto, para adequada acolhida das gestantes no período expulsivo, adquirindo os itens faltantes para a realização de um parto sem distócia, nos termos da RDC 36/2008, devidamente listados.

3.B) garantir o pleno funcionamento das unidades, assegurando os equipamentos, medicamentos, insumos e recursos humanos necessários ao atendimento eficaz e satisfatório às gestantes de Japi, nos seguintes termos:

a) Na Unidade de Saúde do Centro:

– guarnecer de um computador destinado à gestão das informações, principalmente no que concerne à alimentação dos sistemas informacionais da Rede Cegonha, com acesso a internet;– fornecer material educativo com a criação e manutenção sem solução de continuidade do grupo de gestantes;

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– dotar o consultório ginecológico de: banqueta giratória ou mocho, buzina de Kobo, glicosímetro, lanterna clínica para exame, negatoscópio ou outro meio digital para leitura de imagem, e papel toalha/sabonete líquido;– manejo correto do descarte do lixo, de acordo com a RDC nº 306, de 7 de dezembro de 2004, que dispõe sobre o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde.

b) Na unidade mista:– dotar a unidade de recursos humanos suficientes para fechar a escala de plantões de profissionais médicos, pois em alguns dias da semana o período diurno fica desfalcado;– providenciar, e manter regularmente, a higienização adequada dos ambientes da unidade.

3.C) Adquirir uma ambulância, em substituição a que não possui mais condições de uso, para garantir o transporte regular das gestantes para os locais onde receberão atendimento obstétrico, bem como manter a frota em perfeitas condições de uso para fins de transporte sanitário;

4) A dispensa do pagamento de custas processuais, emolumentos e outros encargos, desde logo, em face do previsto no artigo 18 da Lei nº 7.347/85 e do art. 87 da Lei nº 8.078/90; e

5) Por fim, sejam as intimações do autor feitas pessoalmente, mediante entrega dos autos na 1ª Promotoria de Justiça de Santa Cruz, situada no endereço declinado acima, com vista dos autos, em face do disposto no art. 236, § 2º, do Código de Processo Civil e no art. 149, inc. XX, da Lei Complementar Estadual nº 141/96.

Protesta provar o alegado por meio de prova testemunhal, pericial, documental e, inclusive, inspeção judicial, acompanhando a presente petição os autos do Inquérito Civil nº 031/2012 – 1ªPmJSC.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais), para efeitos meramente fiscais.

Nestes termosPede deferimento.

Santa Cruz/RN, de outubro de 2014.

RELVA GARDENE ROLIM DOS SANTOSPromotora de Justiça