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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X VIOLÊNCIA DE GÊNERO 1 E PATRIARCADO: A MARCHA DAS DESTINADAS NO CONTEXTO DA GUERRA DO PARAGUAI 2 Amanda Pavan 3 Resumo: O ano de 1868 representou para inúmeras paraguaias o início de uma marcha penosa que se estenderia até o final de 1869. Já passado três anos de guerra, entremeio às condições nefastas que ela pode apresentar, no Paraguai, um fenômeno manifestado pela migração de várias mulheres de elite para os desertos do Igatemi, foi expressivo da violência de gênero e também do poder simbólico patriarcal. Na guerra do Paraguai (1864-1870) as mulheres destinadas são aquelas consideradas traidoras do governo, ou por serem esposas de homens que o próprio governo julgava traidores, ou por terem enfrentado Francisco Solano López -ditador da época- e suas decisões de alguma forma. Em ambos os casos, as mulheres foram destinadas ao degredo, por isso tal denominação. Realço neste trabalho como se deu a intensificação da violência contra a mulher paraguaia no aspecto físico, moral e, sobretudo, sexual, no palco desta guerra. Este estudo está amparado pelas memórias de Dorothéa Duprat de Lasserre, uma “destinada” que sobreviveu e pôde resgatar, através das palavras, vidas que foram perdidas, não só pelas condições a que foram expostas mas, sobretudo, pelo ímpeto masculino. Desta última condição, ressalto a figura de Pancha Garmendia, outra destinada, que foi condicionada ao desterro pela sua recusa em se submeter aos desígnios de López. Não obstante, me ocupo das memórias a fim de estabelecer um parâmetro mais conciso sobre as violências perpetradas contra a mulher nesta guerra. Palavras-chave: Destinadas, Guerra do Paraguai, Gênero, Violência Introdução Este artigo tem o propósito de apresentar, à quem o lê, um pouco da História das mulheres durante o conflito conhecido como Guerra do Paraguai 4 . Especificamente, trato do fênomeno conhecido pelos/las autores/as como a marcha das destinadas, ocorrido nos últimos anos da contenda, trazendo à tona a trajetória de duas protagonistas que são, senão, a expressão mais nítida da violência de gênero durante uma guerra de grandes proporções. Desta forma, visualizando o cotidiano destes sujeitos históricos, elucidamos, também, o tratamento despendido às mulheres durante os conflitos bélicos, de forma geral. Antes de iniciarmos o desenvolvimento da temática, é importante fazermos uma ressalva: devemos rejeitar qualquer caráter de fixidez ou de “normalidade”, por muitas vezes apresentada e 1 Entendo como “violência de gênero” uma relação social ou sexual hostil respaldada em diferenças percebidas entre os sexos. Desta forma, a violência entre gênero ocorre puramente pela construção de uma perspectiva essencialista que foi assimilada social e culturalmente. (SCOTT, 1995) 2 Utilizo aqui a denominação popularmente conhecida/aceita entre historiadores/as: “Guerra do Paraguai”. Entretanto, considero importante ao leitor estar à par das outras maneiras de se referir ao conflito. Deve-se levar em conta que cada denominação congrega uma determinada abordagem em relação às “origens” da contenda. São, portanto, “Guerra da Tríplice Aliança”, “Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai”, “Guerra Total” e “Guerra Grande”, as comumente encontradas na historiografia. 3 Pós-graduanda em História e Cultura no Brasil, pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul/SP; graduada em História pela Universidade Paranaense/PR. E-mail: [email protected]

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Seminrio Internacional Fazendo Gnero 11 & 13th Womens Worlds Congress (Anais Eletrnicos),

Florianpolis, 2017, ISSN 2179-510X

VIOLNCIA DE GNERO1 E PATRIARCADO: A MARCHA DAS

DESTINADAS NO CONTEXTO DA GUERRA DO PARAGUAI2

Amanda Pavan3

Resumo: O ano de 1868 representou para inmeras paraguaias o incio de uma marcha penosa que se estenderia at o

final de 1869. J passado trs anos de guerra, entremeio s condies nefastas que ela pode apresentar, no Paraguai, um

fenmeno manifestado pela migrao de vrias mulheres de elite para os desertos do Igatemi, foi expressivo da

violncia de gnero e tambm do poder simblico patriarcal. Na guerra do Paraguai (1864-1870) as mulheres destinadas

so aquelas consideradas traidoras do governo, ou por serem esposas de homens que o prprio governo julgava

traidores, ou por terem enfrentado Francisco Solano Lpez -ditador da poca- e suas decises de alguma forma. Em

ambos os casos, as mulheres foram destinadas ao degredo, por isso tal denominao. Realo neste trabalho como se deu

a intensificao da violncia contra a mulher paraguaia no aspecto fsico, moral e, sobretudo, sexual, no palco desta

guerra. Este estudo est amparado pelas memrias de Dorotha Duprat de Lasserre, uma destinada que sobreviveu e

pde resgatar, atravs das palavras, vidas que foram perdidas, no s pelas condies a que foram expostas mas,

sobretudo, pelo mpeto masculino. Desta ltima condio, ressalto a figura de Pancha Garmendia, outra destinada, que

foi condicionada ao desterro pela sua recusa em se submeter aos desgnios de Lpez. No obstante, me ocupo das

memrias a fim de estabelecer um parmetro mais conciso sobre as violncias perpetradas contra a mulher nesta guerra.

Palavras-chave: Destinadas, Guerra do Paraguai, Gnero, Violncia

Introduo

Este artigo tem o propsito de apresentar, quem o l, um pouco da Histria das mulheres

durante o conflito conhecido como Guerra do Paraguai4. Especificamente, trato do fnomeno

conhecido pelos/las autores/as como a marcha das destinadas, ocorrido nos ltimos anos da

contenda, trazendo tona a trajetria de duas protagonistas que so, seno, a expresso mais ntida

da violncia de gnero durante uma guerra de grandes propores. Desta forma, visualizando o

cotidiano destes sujeitos histricos, elucidamos, tambm, o tratamento despendido s mulheres

durante os conflitos blicos, de forma geral.

Antes de iniciarmos o desenvolvimento da temtica, importante fazermos uma ressalva:

devemos rejeitar qualquer carter de fixidez ou de normalidade, por muitas vezes apresentada e

1 Entendo como violncia de gnero uma relao social ou sexual hostil respaldada em diferenas percebidas entre os sexos. Desta forma, a violncia entre gnero ocorre puramente pela construo de uma perspectiva essencialista que foi

assimilada social e culturalmente. (SCOTT, 1995) 2 Utilizo aqui a denominao popularmente conhecida/aceita entre historiadores/as: Guerra do Paraguai. Entretanto,

considero importante ao leitor estar par das outras maneiras de se referir ao conflito. Deve-se levar em conta que cada

denominao congrega uma determinada abordagem em relao s origens da contenda. So, portanto, Guerra da

Trplice Aliana, Guerra da Trplice Aliana contra o Paraguai, Guerra Total e Guerra Grande, as comumente

encontradas na historiografia. 3 Ps-graduanda em Histria e Cultura no Brasil, pela Universidade Municipal de So Caetano do Sul/SP; graduada em

Histria pela Universidade Paranaense/PR. E-mail: [email protected]

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reforada em trabalhos acadmicos. Dito isto, na pesquisa histrica, conveniente adotarmos uma

postura crtica no af de melhor colocarmos em prtica o conceito proposto por Jacques Derrida da

desconstruo (apud Scott, 1995, p. 84). Isto significa que ao tratarmos sobretudo do gnero,

devemos levar em conta o significado que atribudo este, o contexto em que este foi produzido

e a forma como ele operado, de forma a efetivar as proposies de Derrida. acatando estas trs

premissas, portanto, que este artigo foi articulado.

Mas o que o gnero, afinal? O gnero , acima de tudo, uma construo, e do processo de

assimilao das constantes ocultas que ocorre sua reproduo. Para compreendermos sua dinmica,

Joan Scott (1995) sugere, tal como Derrida, uma anlise do processo de significao empreendido

em cada contexto na tentativa de elucidar muitos aspectos que, de outra forma, seriam obscurecidos.

Nisso, ao tratar do processo de reproduo da oposio binria e desigual de gnero, ela

problematiza:

Como podemos explicar a forma pela qual as crianas parecem aprender essas associaes

e avaliaes mesmo quando elas vivem fora de lares nucleares, ou no interior de lares onde

o marido e a mulher dividem as tarefas familiares? Penso que no podemos fazer isso sem

conceder uma certa ateno aos sistemas de significado, quer dizer, aos modos pelos quais

as sociedades representam o gnero, servem-se dele para articular as regras de relaes

sociais ou para construir o significado da experincia. Sem significado, no h

experincia; sem processo de significao, no h significado. (SCOTT, 1995, p. 82, grifos

meus).

Servindo-se desta mxima, no poderamos entender a dinmica de gnero na Guerra sem

antes problematizarmos os sistemas de significado produzidos no seio do conflito. O que quero

dizer que, se de um lado, h sujeitos engajados no processo de produo de significado, de outro,

h aqueles responsveis por tornar sua significao efetiva. Em outras palavras, as representaes

de gnero, na medida em que so assimiladas, determinam uma tomada de atitude. Segundo o

historiador Luc Capdevila, as guerras vm, de fato, influenciando na organizao das diferenas

sexuais desde a Pr-Histria. (Capdevila, 2007, p. 10). Mas como isso ocorre? Ora, atravs da

produo de significados! E , sobretudo, atravs daquilo que constitui os arquivos de guerra que

esse processo adquire relevncia.

As fronteiras de gnero nas representaes femininas da imprensa

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Todo fenmeno histrico deixa sua memria, podendo ela ser oral ou escrita. No caso da

Guerra, ela foi substancialmente escrita, e, mais precisamente, iconogrfica. Pinturas, fotografias e

gravuras divulgadas pela imprensa paraguaia, tinham como objetivo no apenas a manuteno de

uma identidade nacional, mas sobretudo, de gnero. Para uma populao onde a educao era

limitada, o usufruto das imagens para melhor abstrao significativo e permitiu expandir o raio de

alcance dos peridicos5. No obstante, estas imagens compunham mensagens de mobilizao moral,

veiculando representaes sexuadas da nao, as quais estruturavam o imaginrio da populao

mestia. importante ressaltar que as representaes que retratavam a mulher foram bastante

escassas. No geral, a imprensa de guerra centrou as atenes na ofensa ao inimigo e no

enaltecimento do exrcito paraguaio. No entanto, numa anlise meticulosa, foi possvel encontrar

valiosas referncias de gnero, que sero abordadas no desenrolar deste texto.

Segundo Luc Capdevila, as representaes femininas agrupam-se em trs grandes tipos: os

travestismos do inimigo os ridiculariza em suas funes de autoridade (poltica e militar), as

alegorias femininas que representam as instituies (a Repblica, a Justia etc.) e, ainda, as

paraguaias na guerra. (2007, p. 18). Para a primeira categoria, o historiador elucida os jogos de

gnero que formavam parte de um mecanismo de difamao do inimigo. Segundo ele, no a

feminilidade que ridcula [], e sim as diferenas sexuais. O travestismo particularmente

empregado para ridicularizar o adversrio. No entanto, o autor comenta que com o passar do

tempo alguns personagens da guerra foram feminilizados, tais como o presidente Mitre e o

ministro da guerra Juan Gelly y Obes, refletindo claramente uma viso misgina que entende as

caractersticas femininas como o signo da inferioridade e da desordem. (2007, p. 14-15).

A segunda categoria, traz a mulher sob forma alegrica, mas que congrega uma inegvel

distino de gnero, como bem explica Capdevila:

Em contrapartida, as verdadeiras mulheres vm equilibrar o quadro do eu coletivo

paraguaio. A Repblica, as instituies oriundas do direito so geralmente representadas

sob as formas de uma estatutria feminina neoclssica, ao passo que o povo em armas e o

Estado so simbolizados pelas figuras masculinas do leo e do marechal Lpez. Essa

presena feminina na construo simblica obedece a cdigos estticos, mas corresponde

tambm a um imaginrio da diviso dos valores polticos: o feminino est associado ao

direito, encarna a nao cvica, enquanto o masculino representa a fora, a violncia

legtima e o poder. (CAPDEVILA, 2007, p. 18).

5 Segundo Luc Capdevila, a taxa de alfabetizao no Paraguai pr-guerra havia crescido muito, podendo ser comparado

pases como Prssia e Frana, mas esta levava em conta uma educao que era restrita apenas homens. As mulheres,

neste contexto, eram majoritariamente analfabetas. (CAPDEVILA, 2007, p. 13).

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curioso, todavia, a forma como a paraguaia foi incorporada nas imagens. Enquanto

gnero, ela no foi sistematicamente excluda das gravuras em que o povo paraguaio retratado.

Pelo contrrio, atos de bravura foram narrados, sobretudo, o momento da guerra o qual nos

interessa: a marcha das destinadas.

Na Guerra do Paraguai a expresso mais ntida da violncia de gnero se deu nos dois

ltimos anos de guerra, mais precisamente, a partir do momento em que se iniciou a evacuao de

Assuno. A presena feminina nesta etapa do conflito foi to marcante que inclusive a imprensa

empenhou-se em registrar fenmeno das destinadas. Constituindo ambies estratgicas, as

representaes femininas da mulher paraguaia introduziram-se no imaginrio popular. Todavia, o

que nos convm agora, entender como ocorreu o exlio das paraguaias e de que forma a violncia

se manifestou, para somente aps, compreendermos de fato como as representaes de gnero

estiveram articuladas para alm da imprensa na nsia de reforar as fronteiras de gnero,

significando assim o fortalecimento dos enquadramentos morais j estabelecidos.

A marcha das destinadas e a violncia de gnero

Ao se falar de marcha das destinadas, as/os autoras/es frequentemente apontam dois grupos

que compem a marcha: o das residentas e o das traidoras. Genericamente, a composio de cada

grupo no determinava que, por exemplo, as residentas vivenciassem condies distintas ou at

mesmo privilegiadas em detrimento das traidoras. Mas o que as/os autoras/es tm consentido que

a razo pela qual elas foram condenadas ao exlio so opostas. Vejamos o que o historiador Alberto

Moby Ribeiro da Silva diz a respeito:

importante dizer que mesmo no havendo uma rgida barreira entre a origem de classe

dessas mulheres e sua designao como residentas ou destinadas, no ps-guerra, a posio

ocupada pelas mulheres segundo essa classificao ser fundamental para situ-las

socialmente. verdade que existiam, de fato, relacionamentos familiares e afetivos

interclasses e que, por outro lado, nem todos os membros da burguesia foram considerados

traidores o que seria extremamente absurdo e nem todos os homens do povo estiveram

isentos, a priori, de qualquer culpa. Por isso, tambm, era no pouco comum encontrar

mulheres em cujas famlias pudessem ser identificados igualmente bravos patriotas e vis

traidores. Mas essas excees apenas nos mostram o caos da guerra e, de certa maneira, o

grau de isolamento em que Lpez posto, em consequncia de sucessivas derrotas

militares, escondendo-se, atrs de uma aparente convico da vitria e da violncia em

consequncia dessa certeza, sua absoluta fragilidade. (SILVA, 1998, p. 52, grifos do

autor).

O autor, no trecho acima, questiona-se sobre as fronteiras social-econmicas inexorveis que

as classificaes deixam entrever, a priori. No havia distino social to clara assim, naquele

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contexto. Todavia, ttulo de compreenso, essas classificaes/categorias denotam uma tomada de

atitude diferenciada por parte de Lpez e da imprensa, para com as mulheres de grupos sociais

distintos.

Sobre o termo residenta, o historiador Guido Rodrguez Alcal expe o seguinte: Compe

parte do folclore local sobre a idealizao da guerra e, dentro desta idealizao, o culto romntico

residenta, herona do Paraguai, que acompanhou, pacientemente, o homem em todos os

infortnios da guerra. (Alcal, 1991)6. Este significado proposto por Alcal do que seriam as

residentas sustenta um tom bastante romntico e idealista, e a imprensa de guerra tem um papel

sumrio na produo deste arqutipo. Segundo Luc Capdevila, ao celebrar o patriotismo, exaltando

os sentimentos de coragem e bravura das paraguaias, as gravuras lembravam aos combatentes seu

dever de proteger suas companheiras, deixando entender que elas, voluntrias e corajosas, estariam

em condies de substitu-los, caso no fossem dignos das exigncias que acompanhavam sua

virilidade. (Capdevila, 2007, p. 20). Portanto, o patriotismo das paraguaias que doaram suas jias

em prol do conflito motivo pelo qual so conhecidas est bem longe de ser aquilo que elas

teriam sentido, de fato. A descrio de Beatriz Rodrguez Alcal confirma isso:

[] o vocbulo Residenta possui uma alta significao e sinnimo de dor, abnegao e

sacrifcio, porque utilizamos-o para denominar o pattico xodo empreendido em posse da

bandeira, pelas mulheres, pelos idosos e pelas crianas, ante a iminncia da chegada do

invasor. [] Porque se muitas naes da Terra podem gabar-se do herosmo de suas

mulheres, somente o Paraguai pode gloriar-se de dever sua existncia exclusivamente s

mulheres.

J que foi Ela quem teve de remover os escombros e as cinzas para reanimar a vida ptria

covardemente assassinada. Foi Ela quem se multiplicou em mil partes para ser me e pai;

mestre e educadora; foi Ela quem empunhou o arado e fundou escolas e asilos para acolher

s crianas na total orfandade; foi artes e assentou as destroadas bases da economia

nacional. (ALCAL, 2003 apud BENTEZ, 2011, p. 14).

Esta descrio parece ser uma das que mais se aproxima do relato produzido por Madame

Dorotha Duprat de Lasserre, uma tambm destinada que viu e viveu situaes deplorveis no

curso da guerra. Mas, antes de tratarmos de Duprat, resta-nos conhecer a outra categoria de

destinadas, esta mais numerosa, que determinou a tecitura da Histria das mulheres na guerra: as

traidoras. Como o prprio nome j denuncia, as traidoras so aquelas que, pelo seu grau de

parentesco com rus polticos, traram a ptria. No contexto da guerra, os rus polticos poderiam

ser simples opositores ideolgicos do governo, no tendo ocorrido uma resistncia ativa, na

6 O trecho encontra-se disponvel na verso online do livro, que est parcialmente disponvel em:

. Acesso em: Junho de 2017. Procedi a livre traduo das citaes do espanhol

para o portugus.

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definio do terico portugus Joo Bernardo (1998). Portanto, a mera ameaa de contradio aos

interesses do governo, j era indicativo de conspirao contra os objetivos da nao.

As duas categorias, como foi mencionado, se formaram somente aps a evacuao de

Assuno. As traidoras, ou melhor dizendo, a grande parte das destinadas, s se transformaram

propriamente em destinadas quando foram enviadas para a localidade de Yh e, posteriormente,

para Espadn, onde se configurou um campo de concentrao apenas de mulheres.

Embora a marcha tenha iniciado-se em fins do ano de 1868, desde o incio do conflito as

mulheres, de forma geral, sofreram com os processos migratrios. Guido Rodrguez Alcal (1991)

relata um episdio ocorrido em 1866, onde j possvel visualizar o tratamento distinto que era

despendido s mulheres: ao iniciar o processo de evacuao do Sul do Paraguai, logo no incio do

conflito, as tropas paraguaias percebem que a comida escasseava. A deciso tomada pelo chefe para

resolver o problema da escassez foi destinar as 900 mulheres que se encontravam na regio da villa

del Pilar, para a regio do Chaco. Desta marcha, o autor descreve o sofrimento sentido:

Estas mulheres, com seus filhos e muitos idosos e idosas, seguiram a mesma trajetria do

marechal Lpez at San Fernando, de onde foram internadas ao norte do arroio Pykysyry.

A metade de toda essa gente morreu nessa va crucis de fome, penrias e privaes de todo

o gnero desde o momento em que no tinham como alimentar-se, nem adquirir roupas,

pois apenas puderam levar de suas casas aquilo que lhes puseram. (ALCAL, 1991, p. 41).

comum verificarmos nas narrativas masculinas uma certa inclinao a vangloriar ou

enaltecer determinadas atitudes tomadas por mulheres. Nas obras memorialsticas, os raros

momentos em que as mulheres saram do anonimato, o foram porque demonstraram alguma atitude

herica. No obstante, a prpria imprensa reforava o arqutipo da herona, exaltando os casos em

que as mulheres demonstraram coragem. Podemos conferir isto neste trecho:

Dotada do mais rico caudal de sentimento que o que foi outorgado ao homem, toda mulher

acha naturalmente maior encanto no cumprimento do dever por amor; mas a mulher

paraguaia tem se distinguido de uma maneira excepcional em relao s demais de seu

sexo []. Ento, a mulher paraguaia, sem deixar o fuso e a agulha, foi substituir os

homens no cultivo da terra. Ela escutou em seu corao a sagrada voz do dever, que a

chamava a esse trabalho por amor e por gratido. (CABICHU, 1867 apud SILVA, 1998, p.

124-125, grifos do autor).

As impresses publicadas pelo peridico Cabichu no poderiam ser tidas de outra forma.

Parafraseando Pierre Bourdieu (2014), a sociedade paraguaia cuja estrutura social compunha

instituies solidamente estabelecidas possua terreno frtil para a reproduo de uma viso

androcntrica. Expresso disso a noo de que as mulheres substituiriam os homens nos

trabalhos tidos como masculinos, tal como exposto no trecho acima. Ora, o esforo fsico (do

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cultivo da terra), a brutalidade (das torturas e mortes) e a coragem (da disposio guerra) so

aptides que no se permitem, na lgica androcntrica, como femininas. E o herosmo, podemos

constatar, s vangloriado pois culturalmente ele percebido como masculino, cabendo s

mulheres, nesse contexto, o apoio ao heri, a discrio e o sentimento de que, ao lado deste, estar

protegida. Ou seja, ela deve trabalhar na manuteno de sua prpria vulnerabilidade. Todavia,

quando a mulher assume essa posio, ela elevada ao escalo da perfeio masculina.

No decorrer da pesquisa, foram muito escassos as referncias violncia sexual. No entanto,

encontramos indcios bastante valiosos que nos permitem visualizar a experincia vivida pelas

mulheres no final da guerra em que, constituindo maioria da populao, viram-se presas fceis

dos inimigos que ocupavam Asuncin. O cronista Richard Burton relata um episdio que vivenciou

ao visitar uma Catedral de Asuncin: surpreso com o atrevimento de um francs Frre

ignorantin que, ao ser perturbado em seu sexo arrebatado com uma jovem paraguaia bonita, olhou-

me furioso l do seu canto, como se fosse eu que estivesse desrespeitando o lugar. (Burton apud

Cawthorne, 2015, p. 206).

Alm de Richard Burton, o escritor e tambm militar Arturo Bray captou momentos em que

nos possvel denotar a violncia sexual: O amor livre reinava nas ruas e nas plazas, sendo as

300 mulheres paraguaias que caram em mos do inimigo aps [a batalha de] It-Ybat vtimas

desse vandalismo. (Bray, 1983 apud Silva, 1998, p. 82).

Todavia, o relato mais surpreendente e minucioso encontrado foi este:

Nas praas, ruas e centros de reunio, o amor era livre para os componentes das foras

invasoras, onipotentes sobre os que caam sob sua dominao. As 300 mulheres que foram

sequestradas em Abay [Ava?], as que caram em Angostura e outras mais foram vtimas de

seus instintos sensuais.

O general Garmendia resume em poucas palavras a primeira imolao daquelas 300

desgraadas mulheres dizendo: que como as heronas Galas, tinham presenciado o

combate (de Abay), caram tambm no botim da vitria; a soldadesca desenfreada abriu as

vlvulas sua feroz lascvia e estas infelizes que tinham visto seus esposos, filhos e

namorados perecerem, sofreram ainda os ultrajes da luxria na noite mais negra de suas

vidas. No sei como no morreram! (DECOUD apud SILVA, 1998, p. 82).

Tambm possvel verificar indcios da violncia masculina relatados atravs de metforas,

tal como o de Dionsio Cerqueira:

Ao passar por baixo de um laranjal, vi mulheres escondidas na ramalhada, transidas de

pavor, algumas com os filhos nos braos. Embaixo, soldados convidavam-nas a descer, e

elas, como o galo da fbula, desconfiavam das lbias das velhas raposas, que alis, de

crer, no tinham desejos sanguinrios. (CERQUEIRA apud SILVA, 1998, p. 83).

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Mme Dorotha Duprat de Lasserre e Pancha Garmendia: as duas faces do desterro

com muita dificuldade que podemos encontrar menes sobre a experincia feminina na

guerra nos relatos de memorialistas. No foi sem sorte que sobreviveu ao tempo um dos relatos

mais ricos em detalhes e, o mais importante, escrito por uma mulher que vivenciou todo o suplcio

da marcha das destinadas.

De origem francesa, Madame Dorotha Duprat de Lasserre integrava a alta elite do

Paraguai. Foi condicionada ao exlio em virtude da suposta traio de seu marido, e apenas

escreveu suas memrias na ocasio do resgate, pelas tropas Aliadas, das famlias remanescentes da

marcha. Nisto, o coronel Dr. Pinheiro Guimares havia questionado-a sobre a escrita e publicao

de suas memrias, visando legitimar os crimes cometidos por Francisco Solano Lpez, e defender a

ideia de que Lpez foi um tirano que sacrificou todo seu povo por causa de seu egosmo em

prosseguir com o conflito, mesmo quando os Aliados j haviam avanado consideravelmente.

No devemos deixar de considerar, a despeito disso, que as memrias de Duprat, mesmo que

valiosas para uma abordagem de gnero, constituem-se claramente na listagem de obras

pertencentes disputa historiogrfica caracterizada por lopiztas e antilopiztas. Tal que, logo no

incio da obra, Jos Montenegro escreve o seguinte prefcio: No fra de proposito lanar

publicidade mais uma pagina interessante sobre a historia da ominosa dictadura do marechal Solano

Lopez, cujo desfecho repercutio to dolorosamene na Amrica do Sul e mui particularmente no

Brazil. (Lasserre, 1893, p. V).

Outra questo a ser apontada que, mesmo nos valendo de um discurso feminino, no

podemos deixar de considerar a obra como marcada pela fronteira entre os sexos. Em vrios

momentos podemos perceber uma ntida inclinao aos valores de um quadro moral patriarcal.

Vejamos este trecho:

No dia seguinte se apresentaram dois sargentos querendo nos obrigar a ir pessoalmente

cortar pus na matta para fazer hastes de lanas de cavallaria: usei de mil subterfugios para

esquivar-me a esse trabalho pesado a que no estava acostumada; alm disso o estado de

fraqueza e abatimento em que estava, depois de uma molestia debilitante e uma marcha

atravez do deserto em um percurso de mais de duzentos kilometros, tornava imposvel

qualquer esforo physico.

Senhoras delicadas, acostumadas a viver commodamente, eramos tratadas como escravas

pelos que tinham ordem de nos fazer soffrer! (LASSERRE, 1893, p. 53, grifos meus).

Esta revelao demonstra, portanto, um sintoma da aprendizagem dos valores tidos como

femininos, que so a da resignao, do silncio e da abnegao. Todavia, seus relatos no deixam de

ser valiosos para a compreenso da realidade da guerra e da violncia de gnero.

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Ao amanhecer cahia uma chuva finissima e continua, extremamente incommodativa.

Ordenou-se a marcha: apertadas umas contra as outras para no molhar os vestidos,

partimos recebendo pela frente o aoite do vento e do graniso. As ameaas, os gritos da

soldadesca da escolta choviam de traz, de momento a momento ouvia-se tambem o grito de

dor soltado por alguma desgraada que era alcanada pelo chicote dos guardas ou pela

lana que lhe rasgava as carnes; no se sahia, porm, com facilidade daquella lama infecta

e visguenta. (LASSERRE, 1893, p. 64).

Considerando que a violncia no se dava apenas nos aspectos fsicos e morais, temos em

Pancha Garmendia outra expresso da incidncia do Patriarcado sob a vida das mulheres

paraguaias. Pancha doi adotada por Jos de Barrios e Manuela Daz de Bedoya, uma famlia da elite

assuncena, que participava de todos os eventos sociais da poca. A famlia Barrios Bedoya, segundo

Mary Monte, era parente prxima dos Lpez, e por isso compareciam as mesmas reunies e

eventos. (Moreira, 2013). Foi na ocasio dos vrios eventos que Pancha teria conhecido o ditador

Lpez.

Segundo uma carta endereada Juan Crisstomo Centurion do General Aveiro, Pancha

Garmendia deu claros sinas de conspirao, atitude esta que era facilmente percebida e comentada

pela elite asuncena, e que, no entanto, Lpez sempre a livrou de ser presa ou mandada para o

desterro:

[Pancha] era por repetidas vezes e por distintas pessoas importantes, acusada de

cumplicidade na conspirao ou seja, revoluo que se perseguia. O Marechal sempre

apagava o mesmo tal nome da lista que se apresentava sem dizer uma palavra, no obstante

as acusaes e a seriedade das pessoas de elevada posio social que em suas declaraes a

incluam. (AVEIRO apud CENTURIN, 1894, p. 225).

Alm do mais, Pereira afirma que Pancha era bem quista por vrios homens, inclusive, pelo

general Lpez.

Era o carinho, a jia, o orgulho de Assumpo, que nella via o esplendor da sua raa e

talvez a imagem da sua belleza moral. Appareceram-lhe pretendentes mo de esposa

como era natural. No contavam, porm com o Generalito, que a destinava ara si, como

tinha feito com tantas outras. O primeiro dos seus admiradores, D. Pedro Egusquiza, foi

recrutado para o exercito e mandado para o deserto. Os outros retrahiram-se. O bravo

Generalito, que, para o Sr. O Leary, o typo das perfeies, redobrou de insistncia.

Panchita nunca lhe de:u uma esperana. No era da massa de que se fazem as barregs,

mesmo de dspotas. A sua resistncia cresceu proporo da audcia do monstro, que s

recuou ao v-la prestes a despenhar-se no tumulo para fugir-lhe. (PEREIRA apud

DOURADO, 2005, p.23)

Segundo os relatos, Pancha teria sido condenada marcha pela sua recusa em submeter-se

aos desgnios de Lpez. No entanto, na carta de Aveiro no consta que ambos teriam tido um

relacionamento mais ntimo, apenas infere sobre as conspiraes das quais ela era acusada. De

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qualquer forma, as duas atitudes refletem naquilo que, j percebemos, ocorreu com inmeras

paraguais: foram condicionadas um fim trgico pelo mpeto masculino.

Consideraes Finais

Partindo do pressuposto de que o acontecimento histrico contnuo, no podemos cair na

iluso de que somos capazes de recortar, grosso modo, os fatos, e preench-los de teoria no

sentido e torn-lo inteligvel, tal qual ele foi. O acontecimento histrico no pura abstrao.

Pode sim, partir das estruturas subjetivas da conscincia humana no momento em que a Histria

construda, mas a partir do momento em que ela (no sentido de existir), os indivduos histricos

passam a existir tambm. E, para no incorrermos no risco de, como diz Febvre, agarrar o indivduo

por este ou aquele membro, pela perna ou pelo brao, em vez de pela cabea, resultando,

fatalmente, na prpria mutilao do sujeito histrico (1985, p. 30), devemos sempre levar em conta

as variadas dimenses pelas quais o acontecimento real constitudo. Foi pensando em uma dessas

dimenses que utilizei o gnero enquanto categoria de anlise. Somente assim, pude responder

algumas daquelas provocaes feitas no incio do artigo, e, consequentemente, elucidar as relaes

de poder que embrenham-se nas determinaes objetivas e subjetivas da vida humana.

Dito isto, o estudo do fenmeno das destinadas pde revelar a dinmica das relaes de

gnero nesse contexto da guerra. A forma desigual com que o gnero operado foi expresso de

muitas formas. Mas foi na violncia contra as paraguaias que ela mais se manifestou. Seja de forma

simblica, sexual ou moral, elas sempre tiveram como pressuposto as diferenas percebidas entre os

gneros, como pudemos perceber na anlise das representaes e na teoria social e de gnero

empreendida por autores como Joan Scott e Pierre Bourdieu. No entanto, foi na recusa intransigente

de Lpez em armar as mulheres para que estas defendessem a ptria ativamente que percebemos a

evidncia do Patriarcado. Lpez preferiu, por outro lado, distribuir lanas crianas, a se arriscar a

deixar mulheres no front de batalha. Este esforo pode ser compreendido na maneira em que,

mesmo na guerra, e na viso de Lpez, principalmente, devia-se eliminar, todo custo, os riscos de

embaralhamento na dinmica de gnero. A marcha das destinadas enquanto um fenmeno de

mulheres representa, seno, a manuteno da invisibilidade feminina, no af de impedi-las de serem

aladas ao patamar da excelncia masculina, lanando, desta forma as bases para a perpetuao

do patriarcado.

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Gender violence and patriarchy: the destined womens march among the context of the

Paraguayan War

Astract: The year 1868 represented for countless Paraguayans the beginning of a painful march that

would extend until the end of 1869. After three years of war, among the nefarious conditions that

which can present, in Paraguay, a phenomenon manifested by the migration of several women of a

high class to the deserts of Igatemi, was expressive of the violence of gender and also of the

patriarchal symbolic power. In the Paraguayan War (1864-1870) the destined women are those who

were considered betrayers of the government, or because they were the wives of men whom the

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government judged to be betrayers, or because they confronted Francisco Solano Lpez the

president - and their decisions in some way . In both cases, women were sentenced to deportation

and, therefore, the denomination. I emphasize how the violence against the Paraguayan woman

intensified in the physical, moral and, above all, sexual aspect, in the scene of this war. This study is

supported by the memories of Dorotha Duprat de Lasserre, a destined woman who survived and

was able to rescue through the words, lives that were lost not only by the conditions to which they

were exposed but, mainly, by the masculine impetus. In the latter case, I emphasize the figure of

Pancha Garmendia, another destined woman, who was conditioned to exile by his refusal to submit

to the Lopez designs. Nevertheless, I deal with the memoirs in order to establish a more concise

parameter on the violence perpetrated against women in this war.

Keywords: Destined women. Paraguayan war. Gender. Violence.